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Universidade Federal da Bahia Instituto de Ciências da Saúde Lorena Marcelino Cardoso Disfunção temporomandibular: prevalência e efeitos da terapia laser de baixa potência na dor miofascial crônica Salvador 2014

Universidade Federal da Bahia Instituto de Ciências da Saúde Lorena_.pdf · encontrada na investigação diagnóstica da cefaleia, da dor lombar, ... stage sorting through Anamnesis

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    Universidade Federal da Bahia

    Instituto de Cincias da Sade

    Lorena Marcelino Cardoso

    Disfuno temporomandibular: prevalncia e efeitos da terapia laser de baixa potncia na dor miofascial crnica

    Salvador

    2014

  • 1

    UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

    INSTITUTO DE CINCIAS DA SADE

    PROGRAMA DE PESQUISA E PS-GRADUAO DOUTORADO

    PROCESSOS INTERATIVOS DE RGOS E SISTEMAS

    LORENA MARCELINO CARDOSO

    DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR:

    PREVALNCIA E EFEITOS DA TERAPIA LASER DE BAIXA

    POTNCIA NA DOR MIOFASCIAL CRNICA

    Tese apresentada ao Programa de Pesquisa e Ps-

    Graduao em Processos Interativos dos rgos e

    Sistemas, Instituto de Cincias da Sade,

    Universidade Federal da Bahia, como requisito

    parcial para obteno do ttulo de Doutor.

    Orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Correia de

    Arajo

    Co-orientador: Prof. Dr. Durval Campos Kraychete

    Salvador

    2014

  • 2

    LORENA MARCELINO CARDOSO

    DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR:

    PREVALNCIA E EFEITOS DA TERAPIA LASER DE BAIXA

    POTNCIA NA DOR MIOFASCIAL CRNICA

    Salvador

    2014

  • 3

    Ficha Catalogrfica elaborada pela BUS Biblioteca Universitria de Sade da UFBA

    C268 Cardoso, Lorena Marcelino

    Disfuno temporomandibular : prevalncia e

    efeitos da terapia laser de baixa potncia na dor miofascial

    crnica / Lorena Marcelino Cardoso. Salvador, 2014.

    144 f. : il.

    Orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Correia de Arajo.

    Co-orientador: Prof. Dr. Durval Campos Kraychete.

    Tese (doutorado) Universidade Federal da Bahia. Insti-

    tuto de Cincias da Sade, 2014.

    1. Dor crnica. 2.Sindromes da dor miofascial . 3.Sndro- me da disfuno da articulao temporomandibular. 4. Terapia

    a laser. 5.Terapia a laser de baixa intensidade. I. Universidade

    Federal da Bahia. Instituto de Cincias da Sade. II. Arajo,

    Roberto Paulo Correia de. III. Kraychete, Durval Campos. IV.

    Ttulo.

    CDU 616.8-009.7

  • 4

    LORENA MARCELINO CARDOSO

    DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR: PREVALNCIA E EFEITOS DA

    TERAPIA LASER DE BAIXA POTNCIA NA DOR MIOFASCIAL CRNICA

    Tese apresentada ao Programa de Pesquisa e Ps-Graduao em Processos Interativos dos

    rgos e Sistemas, Instituto de Cincias da Sade, Universidade Federal da Bahia.

    Banca Examinadora

    Roberto Paulo Correia de Arajo Orientador ______________________________________

    Doutor em Odontologia pela Universidade Federal da Bahia

    Universidade Federal da Bahia

    Durval Campos Kraychete Co-orientador ________________________________________

    Doutor em Medicina e Sade pela Universidade Federal da Bahia

    Universidade Federal da Bahia

    Francisco Prado Reis ________________________________________________________

    Doutor em Cincias Biolgicas pela Universidade de So Paulo

    Universidade Tiradentes, Sergipe

    Martha Simes Ribeiro _______________________________________________________

    Doutora em Tecnologia Nuclear Aplicaes pelo Instituto de Pesquisas Energticas e

    Nucleares

    Instituto de Pesquisas Energticas e Nucleares, So Paulo

    Paulo Vicente Barbosa da Rocha ______________________________________________

    Doutor em Odontologia pela Universidade de So Paulo

    Universidade Federal da Bahia

  • 5

    A minha filha querida, Jlia Cardoso Rocha, por todo carinho e compreenso.

    O amor mais despretensioso e sincero.

  • 6

    AGRADECIMENTOS

    Ao meu orientador, Professor Roberto Paulo Correia de Arajo, sempre disponvel em

    orientar e concretizar todos os anseios necessrios viabilizao da pesquisa.

    A Durval Campos Kraychete, meu co-orientador, por abrir as portas do Servio de Dor

    no Ambulatrio Magalhes Neto HUPES e pelo aprendizado.

    Ao Professor Maurcio Cardeal, por toda sua disponibilidade em colaborar nos

    momentos de dvidas.

    querida colega, Janana Trench, pela realizao das eletromiografias de superfcie e

    pela solidariedade.

    Ao colega Paulo Lopes, por toda colaborao junto aos estudantes e funcionrios da

    UNIJORGE.

    Aos colegas de ps, funcionrios e estudantes da UFBA e UNIJORGE, que

    colaboraram na composio do grupo de indivduos assintomticos para DTM na pesquisa.

    Aos meus queridos pacientes, por toda boa vontade no seu voluntariado e pela troca de

    respeito e confiana.

    A Marcelo Andrade Silva Santos, pelo apoio e eficincia.

    Aos colegas e funcionrios do Servio de Dor do HUPES, pelo acolhimento e

    presteza.

    A Alfredo Costa, por toda assistncia ao termovisor FLIR e software.

    A ABO BA, nas pessoas do seu presidente Prof. Dr. Antstenes Albernaz e Prof.

    Maria Rita Sancho por toda receptividade.

    UNIJORGE, por ter franqueado o espao e acesso a funcionrios e estudantes.

    Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPQ) e

    Fundao de Amparo Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), pelo apoio ao Projeto.

    A meus pais e amigos, pelo incentivo e carinho dedicados. Especialmente a Suzana

    Cardoso, minha me, por ter me possibilitado a formao que tive e pelos helps atendidos.

  • 7

    Quem no sabe o que busca, no identifica o que acha.

    Todo conhecimento humano comeou com intuies, passou da aos conceitos e terminou

    com ideias.

    Immanuel Kant

  • 8

    CARDOSO, Lorena Marcelino. DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR: PREVALNCIA E EFEITOS DA TERAPIA LASER DE BAIXA POTNCIA NA DOR

    MIOFASCIAL CRNICA. 2014. 144 f. il. Tese (Doutorado) Instituto de Cincias da

    Sade, Universidade Federal da Bahia, 2014.

    RESUMO

    Introduo: A dor miofascial (DMF) uma disfuno muscular que causa difundida de dor

    e comumente ignorada pelos profissionais de sade. Sua prevalncia entre os pacientes

    atendidos em clnica mdica geral e de especialidades varia de 21% a 93%, sendo comumente

    encontrada na investigao diagnstica da cefaleia, da dor lombar, cervical e de ombro, assim

    como, tambm constitui um dos subgrupos diagnsticos das disfunes temporomandibulares

    (DTMs). Seu diagnstico eminentemente clnico, no qual o exame fsico soberano.

    Objetivo: Identificar a prevalncia de DTM em pacientes de clnica de dor e avaliar os efeitos

    da terapia laser em pacientes com DMF em DTM. Metodologia: O presente estudo foi

    realizado em duas etapas, a primeira, constituiu-se em levantamento baseado nos pronturios

    do Hospital Universitrio Professor Edgar Santos HUPES, objetivando o perfil dos

    pacientes com dor atendidos no seu Servio de Dor e, a segunda, triagem, atravs do ndice

    Anamnsico de Fonseca e exame fsico, para pacientes portadores de DTM miofascial para a

    etapa experimental. A segunda etapa, um ensaio clnico, simples cego e placebo controlado,

    versou sobre os efeitos da terapia laser no tratamento de portadores de DTM miofascial

    crnica. Como ferramentas avaliativas foram empregados: questionrio de qualidade de vida

    sf-36, escala de ansiedade e depresso (HAD), escalas visual anlgica (EVA) e numrica (EN)

    de dor, algometria de presso, eletromiografia de superfcie (EMGs) e imagem por

    termografia infravermelha. Resultados: O percentual dos pacientes portadores de DMF com

    indcios de DTM (8,3%) superior ao percentual geral do servio (5,8%), evidenciando casos

    subdiagnosticados. Em relao ao ensaio clnico com terapia laser nos pacientes com DTM

    miofascial, o questionrio sf-36 no apresentou mudana significativa do quadro inicial e, em

    relao escala HAD, detectou-se um nvel de ansiedade discretamente reduzido durante a

    terapia. A terapia laser promoveu reduo na EN (p=0,016), melhoria na algometria de

    presso (p= 0,010, masseter, e p=0,028, temporal) e melhoria na EMGs dos msculos

    estudados (p

  • 9

    CARDOSO, Lorena Marcelino. DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR: PREVALNCIA E EFEITOS DA TERAPIA LASER DE BAIXA POTNCIA NA DOR

    MIOFASCIAL CRNICA. 2014. 144 f. il. Tese (Doutorado) Instituto de Cincias da

    Sade, Universidade Federal da Bahia, 2014.

    ABSTRACT

    Introduction: Myofascial pain (MP) is a muscle dysfunction that is cause widespread pain and commonly ignored by health professionals. Its prevalence among patients seen in general

    medical and specialty ranges from 21% to 93%, and is commonly found in the diagnostic

    investigation of headache, lower back pain, neck and shoulder pain, and also is one of the

    diagnostic subgroups of temporomandibular disorders (TMD).The diagnosis is mainly

    clinical, in which the physical examination is sovereign. Objective: To identify the

    prevalence of TMD in patients treated in specialized clinic in treating pain and evaluate the

    effects of laser therapy in patients with MP in TMD. Methodology: This study was conducted in two stages. The first stage was constituted in a survey based on hospital records,

    aiming the profile of patients with pain treated in the Pain Service - HUPES and in the second

    stage sorting through Anamnesis Index Fonseca and physical examination for patients with

    myofascial TMD for the experimental phase. The second stage, a clinical trial, single-blind,

    placebo-controlled, was about the effects of laser therapy in the treatment of patients with

    chronic MP in TMD. As evaluative tools were employed: quality of life questionnaire SF-36,

    anxiety and depression scale (HAD), visual analogical scale (VAS), numerical scale, the

    pressure algometry, surface electromyography and image for infrared thermography. Results:

    The percentage of patients with MP and signs of TMD (8.3%) is higher than the overall

    percentage of service (5.8%), showing undiagnosed cases. For the clinical trial with laser

    therapy in myofascial TMD was observed that in the SF-36 questionnaire there was no

    significant change in the initial framework and for the HAD scale was detected a level of

    anxiety slightly reduced during the therapy. Laser therapy promoted significant reduction of

    numerical scale (p = 0.016), improvement in the algometry (p = 0.010, masseter, and p =

    0.028, temporal) and improvement in surface electromyography of the muscles studied (p

  • 10

    LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SMBOLOS

    C = graus centgrados

    A = rea

    ACTH = hormnio adrenocorticotrfico (Adrenocorticotropic hormone)

    ATM = articulao temporomandibular

    CGRP = peptdeo relacionado ao gene da calcitonina

    CIVM = contrao isomtrica voluntria mxima

    DE = densidade de energia

    DFA = dor facial atpica

    DMF = dor miofascial

    DOMS = dor muscular de incio tardio (delayed-onset muscle soreness)

    DP = densidade de potncia

    DR = dor referida

    DTM = disfuno temporomandibular

    E = energia

    EMGs = eletromiografia de superfcie

    EN = escala numrica

    EVA = escala visual analgica

    HAD = escala de ansiedade e depresso

    HD = hrnia de disco

    HUPES = Hospital Universitrio Professor Edgar Santos

    IAF = ndice Anamnsico de Fonceca

    IASP = Associao Internacional para o Estudo da Dor (Internacional Association for the

    study of Pain)

    IL = interleucina

    IV = infravermelho

  • 11

    J = joules

    K = kelvin

    Kg = quilograma

    Kgf = quilograma-fora

    KHz = kilohertz

    KPa = kilopascal

    LASER = luz amplificada pela emisso estimulada de radiao (Light Amplification by

    Stimulated Emission of Radiation)

    Laser sham = laser placebo

    LDP = limiar de dor presso

    LED = diodo emissor de luz (light emitting diode)

    LILT = terapia laser de baixa intensidade (low intensity laser therapy)

    LLLT = terapia laser de baixa potncia, ou baixa intensidade (low-level laser therapy)

    MCP-1 = protena quimiottica de moncitos-1

    mW = miliwatts

    nm = nanmetros

    NHP = perfil de sade de Nottingham (Nottingham Health Profile)

    NT = neuralgia do trigmeo

    P = potncia

    PG = ponto gatilho

    r = raio

    RCL = resposta de contrao local, twitch

    RDC/TMD = critrios diagnsticos para pesquisa em disfuno temporomandibular

    (Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders)

    ROS = espcies reativas de oxignio (reactive oxygen species)

    SCDR = sndrome complexa da dor regional

    SDM = sndrome da dor miofascial

    SF = sndrome fibromilgica

  • 12

    Sf-36 = questionrio qualidade de vida

    SNC = sistema nervoso central

    SNP = sistema nervoso perifrico

    SP = substncia P

    TENS = estimulao eltrica nervosa transcutnea (Transcutaneous Electrical Neural

    Stimulation)

    TGF-1 = fator de transformao do crescimento 1 (transforming growth factor 1)

    TLBP = terapia laser de baixa potncia

    TNF- = fator de necrose tumoral (tumor necrosis factor )

    US = ultrassom

    UFBA = Universidade Federal da Bahia

    UNIJORGE = Centro Universitrio Jorge Amado

    W = watts

    WALT = Associao Mundial de Terapia Laser (World Association for Laser Therapy)

    = comprimento de onda

  • 13

    LISTA DE FRMULAS

    DE = E(J) /A(cm2) = [P(W) x t(s)] / A(cm

    2)

    A = x r2

    E = P(W) x t(s)

  • 14

    LISTA DE ILUSTRAES

    Quadro 1 Critrios para identificao de PG latente ou de PG ativo............ 30

    Quadro 2 Aspectos diagnsticos para SDM.................................................. 32

    Figura 1 Regio da placa terminal disfuncional, hiptese integrada........... 33

    Quadro 3 Sistema de classificao para diagnstico das DTMs................... 38

    Quadro 4 Classificao taxonmica das DTMs............................................ 38

    Quadro 5 Parmetros e resultados de artigos sobre TLBP em DMF............ 56

    Figura 2 reas de dor irradiada (em vermelho) por PGs (X em preto)... 63

    Quadro 6 Grupo de estudo............................................................................. 68

    Figura 3 Esquema teraputico e avaliativo.................................................. 69

    Figura 4 A, partes integrantes do algmetro de presso e B, calibrao e

    C, imagem em tela do grfico de um exame.................................

    72

    Figura 5 Eletromigrafo.............................................................................. 73

    Figura 6 A, Termovisor FLIR T420 e B, imagem infravermelha frontal

    de paciente do grupo de estudo.....................................................

    75

    Figura 7 A, Equipamento laser e B, Laser Check....................................... 76

    Figura 8 culos de proteo........................................................................ 77

    Figura 9 Perfil scio-demogrfico dos pacientes atendidos no Servio de

    Dor.................................................................................................

    81

    Figura 10 Resultado da aplicao do IAF nos pacientes com diagnstico

    de DMF.........................................................................................

    84

    Figura 11 Grfico de percentuais resultantes do IAF para composio do

    grupo referncia sem DTM (n = 164).........................................

    86

    Figura 12 Termografias do voluntrio 3, sem DTM.................................. 88

    Quadro 7 Perfil do grupo de estudo.............................................................. 89

    Quadro 8 Resultado do IAF para o grupo de estudo, S = sim (valor 10), N

    = no (valor zero) e AV = s vezes (valor 5)..............................

    90

    Figura 13 Escala HAD para ansiedade (tratamento placebo e tratamento

    real)............................................................................................

    91

    Figura 14 Escala HAD para depresso (tratamento placebo e tratamento

    real)............................................................................................

    91

  • 15

    Figura 15 Termografias do paciente 5. Linha 1 (topo), antes do incio,

    linha 2 (meio), entre fases, e linha 3 (abaixo), aps o trmino.

    Os pontos Sp1, Sp2 e Sp3 correspondem a aferies de

    temperatura em regies homlogas...........................................

    96

    Figura 16 Termografia da paciente 4 com vrios pontos hiperradiantes

    devidos acne............................................................................

    98

    Figura 17 Termografias da paciente 11: A, sem pico hipertensivo e B, com

    pico hipertensivo.......................................................................

    99

  • 16

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Percentuais das principais causas da queixa de dor..................................... 82

    Tabela 2 Algometria de presso no grupo R, de acordo com o sexo......................... 86

    Tabela 3 EMGs no grupo R, de acordo com o sexo.................................................. 87

    Tabela 4 Diferena de temperatura entre regies homlogas no grupo referncia..... 88

    Tabela 5 Qualidade de vida (SF-36).......................................................................... 92

    Tabela 6 Escalas EVA e numrica no grupo de estudo.............................................. 93

    Tabela 7 Algometria de presso (grupo referncia x grupo de estudo)....................... 93

    Tabela 8 Algometria de presso no grupo de estudo.................................................. 94

    Tabela 9 Resultados da EMGs do grupo de referncia X grupo de estudo............. 95

    Tabela 10 Resultados da EMGs no grupo de estudo................................................ 95

    Tabela 11 Diferena de temperatura entre regies homlogas por paciente................ 97

  • 17

    SUMRIO

    1 INTRODUO..................................................................................... 19

    2 JUSTIFICATIVA................................................................................. 23

    3 OBJETIVOS.......................................................................................... 25

    3.1 OBJETIVO GERAL............................................................................... 26

    3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS................................................................. 26

    4 REVISO DA LITERATURA............................................................ 27

    4.1 DOR........................................................................................................ 28

    4.2 DOR MIOFASCIAL.............................................................................. 29

    4.2.1 Fisiopatologia........................................................................................ 32

    4.2.2 Diagnsticos diferenciais e comorbidades.......................................... 34

    4.2.3 Fatores predisponentes e perpetuadores............................................ 35

    4.2.4 Tratamento............................................................................................ 36

    4.3 DOR MIOFASCIAL E DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR.... 36

    4.4 ALGOMETRIA...................................................................................... 41

    4.5 ELETROMIOGRAFIA DE SUPERFCIE............................................. 42

    4.6 TERMOGRAFIA................................................................................... 45

    4.7 TERAPIA LASER DE BAIXA POTNCIA......................................... 48

    5 METODOLOGIA................................................................................. 60

    5.1 DESENHO DO ESTUDO ................................................................... 61

    5.2 SERVIO DE DOR HUPES .............................................................. 61

    5.3 ETAPA I LEVANTAMENTO DO PERFIL DE PACIENTES COM

    DOR........................................................................................................

    61

    5.3.1 Anlise dos pronturios mdicos dos pacientes atendidos no

    Servio de Dor (HUPES)/histrico mdico ........................................

    62

    5.4 ETAPA II ESTUDO DOS EFEITOS DA TLBP EM PACIENTES

    COM DMF CRNICA EM DTM ........................................................

    62

    5.4.1 Critrios de incluso ........................................................................... 62

    5.4.2 Critrios de excluso ........................................................................... 63

    5.4.3 Composio do grupo de estudo ....................................................... 64

    5.4.3.1 Aplicao do IAF em pacientes com diagnstico de DMF, com ou

    sem registro de DTM,e nos pacientes com diagnstico de DTM em

    pronturio ............................................................................................

    65

  • 18

    5.4.3.2 Triagem.................................................................................................. 66

    5.4.3.3 Exame clnico......................................................................................... 66

    5.4.3.4 Exames laboratoriais............................................................................... 66

    5.4.3.5 Aplicao do questionrio para pesquisas em disfuno

    temporomandibular RDC/TMD...........................................................

    67

    5.4.4 Formao de um grupo de referncia assintomtico para DTM

    (grupo R).............................................................................................

    68

    5.4.5 Protocolo experimental......................................................................... 68

    5.4.5.1 Grupos..................................................................................................... 68

    5.4.5.2 Esquema teraputico e avaliativo........................................................... 69

    5.4.5.3 Instrumentos empregados na avaliao do tratamento........................... 70

    5.4.5.4 Tratamento com laser placebo e TLBP.................................................. 75

    5.5 TRATAMENTO ESTATSTICO........................................................... 78

    6 RESULTADOS E DISCUSSO......................................................... 79

    6.1 PERFIL SCIO-DEMOGRFICO E PERFIL DA DOR..................... 80

    6.2 PREVALNCIA DE DTM EM PACIENTES DE CLNICA DE DOR

    COM DIAGNSTICO DE DMF..........................................................

    83

    6.3 TRIAGEM.............................................................................................. 84

    6.4 ESTUDO DOS EFEITOS DA TLBP EM PACIENTES COM DMF

    CRNICA EM DTM..............................................................................

    85

    6.4.1 Grupo de referncia sem DTM (grupo R).......................................... 85

    6.4.1.1 Constituio do grupo R......................................................................... 85

    6.4.1.2 Algometria de presso no grupo R......................................................... 86

    6.4.1.3 Eletromiografia de superfcie no grupo R............................................... 87

    6.4.1.4 Termografia no grupo R......................................................................... 87

    6.4.2 Grupo de estudo.................................................................................... 89

    6.4.2.1 Perfil do grupo de estudo........................................................................ 89

    6.4.2.2 Caracterizao do grupo de estudo quanto ao IAF................................. 89

    6.4.2.3 Escala de ansiedade e depresso (HAD) e questionrio qualidade de

    vida (SF-36) ........................................................................................

    90

    6.4.2.4 Algometia................................................................................................ 92

    6.4.2.5 Eletromiografia de superfcie.................................................................. 94

    6.4.2.6 Termografia............................................................................................ 96

  • 19

    6.4.2.7 Dirio da dor....................................................................................... 99

    6.4.2.8 Limitaes do estudo............................................................................. 99

    6.4.2.9 Perspectivas futuras............................................................................ 100

    7 CONCLUSO...................................................................................... 101

    REFERNCIAS.................................................................................... 103

    APNDICES......................................................................................... 114

    APNDICE A ....................................................................................... 115

    APNDICE B ........................................................................................... 117

    APNDICE C ....................................................................................... 118

    APNDICE D .......................................................................................... 119

    APNDICE E ....................................................................................... 120

    ANEXOS................................................................................................ 121

    ANEXO A ............................................................................................. 122

    ANEXO B ............................................................................................. 123

    ANEXO C ............................................................................... 124

    ANEXO D . 134

    ANEXO E.............................................................................................. 138

    ANEXO F ........................................................................................... 142

    ANEXO G ........................................................................................... 144

  • 20

    1 INTRODUO

  • 21

    A dor uma experincia individual, nos mbitos sensitivo e emocional, influenciada por

    aspectos sociais e sua percepo envolve, portanto, questes de ordem cultural, emocional,

    gentica e relativas experincia prvia, o que torna complexa sua avaliao. A mensurao

    da intensidade da dor feita, habitualmente, com o auxlio de diferentes tipos de escalas,

    apresentando limitaes especialmente em crianas, idosos e pessoas com dficit visual ou

    cognitivo (BOTTEGA; FONTANA, 2010). Outra forma de avaliao da dor, sem a

    subjetividade peculiar aos instrumentos supracitados, a algometria de presso, que se baseia

    na sensibilidade presso da regio avaliada e vincula a essa sensibilidade um registro de

    quantidade de presso aplicada (FISCHER, 1987), buscando traduzir, de forma objetiva, algo

    que, por definio, subjetivo.

    Conforme sua durao, a dor pode ser classificada como aguda ou crnica, sendo

    considerada como crnica quando perdura por mais que seis meses, ou quando o sintoma

    persiste alm do tempo habitual de cura da leso tissular (MERSKEY; BOGDUK, 1994) e,

    consequentemente, como aguda, quando se trata do oposto. Quadros dolorosos crnicos

    podem estar associados sensibilizao central, fato que est intimamente relacionado com a

    resistncia a tratamentos e a perpetuao da condio, alm de ser causa de absentesmo ao

    trabalho e implicar em elevados custos, o que se constitui num problema de sade pblica

    (ROCHA et al., 2007; S et al., 2009; WOOLF, 2011; BASI et al., 2012). As dores de origem

    musculoesqueltica constituem uma parcela significativa desses quadros e, dentre elas, a dor

    miofascial (DMF) uma disfuno muscular que causa difundida de dor e comumente

    ignorada pelos profissionais de sade (HASSELSTRM et al., 2002; SIMONS, D. G.;

    TRAVELL; SIMONS, L. S., 2005; CAKIT et al., 2010; SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012;

    GERWIN, 2014).

    O diagnstico da DMF eminentemente clnico, baseado no histrico e no exame fsico

    respaldado em critrios como identificao de bandas tensas, pontos-gatilho (PGs), dor

    referida ou reconhecimento da dor, mas outras formas diagnsticas complementares vm

    sendo sugeridas, tendo-se, como exemplos, a termografia infravermelha, o ultrassom e a

    eletromiografia. Sua etiologia multifatorial e inclui, como fatores implicados no seu

    desenvolvimento, traumas, hbitos parafuncionais orais (ROCHA et al., 2007; ROSSETTI et

    al., 2008), desequilbrios posturais, distrbios do sono, estresse psicossocial, alteraes

    nutricionais, dentre outros (FRICTON; DUBNER, 2003). H relatos frequentes de DMF em

    regio de cabea e pescoo em virtude de comprometimento no equilbrio dinmico entre

    msculos do crnio, da mandbula e do pescoo (SVENSSON et al., 2004; MICHELOTTI et

    al., 2010). O termo DMF tem sido empregado de forma equivocada no meio odontolgico;

  • 22

    em muitas situaes, sua definio deixada de lado e o termo empregado como sinnimo

    para disfunes temporomandibulares (DTMs) musculares em geral ou DTMs miognicas

    (OKESON, 2008; KOUTRIS et al., 2013; UEMOTO et al., 2013).

    As DTMs implicam um conjunto de problemas clnicos envolvendo os msculos e ou

    articulaes do sistema estomatogntico, em muitas situaes apresentando dor persistente e

    consideradas de alta prevalncia entre as dores crnicas orofaciais (CAMPOS, M. I. G;

    CAMPOS, P. S. F., LINE, 2006; OAKLEY; VIEIRA, 2008; BASI et al., 2012; SCHIFFMAN

    et al., 2014). Na extensa lista de DTMs encontra-se, tambm, a DMF ou DTM miofascial,

    uma vez que essa disfuno muscular tambm pode acometer os msculos mastigatrios.

    Os procedimentos teraputicos propostos tm como objetivo a reduo na intensidade

    da dor, inativao de PGs, reabilitao muscular e remoo preventiva de fatores

    perpetuadores. A literatura sobre tratamentos cita o uso de frmacos, aplicao de toxina

    botulnica, agulhamento seco e com injeo de anestsico, acupuntura, terapias manuais,

    ultrassom, estimulao eltrica nervosa transcutnea (TENS), estimulao magntica e terapia

    a laser (CRISCUOLO, 2001; DUNDAR et al., 2007; CHANDOLA; CHAKRABORTY,

    2009; KUAN, 2009; VZQUEZ-DELGADO; CASCOS-ROMERO; GAY-ESCODA, 2010;

    DESAI; SAINI, V.; SAINI, S., 2013).

    Entre as vrias terapias propostas para a DMF, a terapia laser de baixa potncia (TLBP),

    tambm conhecida por outras expresses, se apresenta como uma das formas de terapias

    alternativas consideradas no invasivas. Essa terapia se utiliza de um equipamento emissor de

    LASER, no sendo uma radiao ionizante na faixa empregada e, sim, um feixe de luz com

    caractersticas peculiares e parmetros limitados a valores que no produzem elevao

    significativa de temperatura nos tecidos irradiados (< 1C). A opo pela TLBP se deve

    atribuio para si de efeitos bioqumicos, bioeltricos e bioenergticos, efeitos esses que

    podem resultar em aumento na microcirculao local, analgesia e modulao do processo

    inflamatrio, podendo ser coadjuvante na reduo de edema e reparao tecidual

    (GENOVESE, 2007; GARCEZ; RIBEIRO; NUEZ, 2012). Em sntese, a TLBP atua na

    normalizao da funo celular, aspecto importante para o entendimento de algumas

    variaes nos resultados de experimentos mencionados na literatura disponvel, ressaltando-se

    que os efeitos biolgicos induzidos pela luz so tambm dependentes dos parmetros de

    irradiao (GAO; XING, 2009; HUANG et al., 2011; GARCEZ; RIBEIRO; NUEZ, 2012).

    Especial interesse manifesta o presente estudo no que concerne ao uso da TLBP para a

    DMF em DTM, uma vez que diversos estudos clnicos, randomizados e controlados, sobre a

    utilizao da TLBP em dor msculoesqueltica tiveram incio por volta de 1980 (GUR et al.,

  • 23

    2004) e, at ento, no h consenso sobre sua efetividade, ou no, no tratamento da DMF

    (AL-SHENQITI; OLDHAM, 2009; CARRASCO et al., 2009; UEMOTO et al., 2013).

    Esse contexto, to rico em adversidades, como a dificuldade de avaliao de um

    sintoma to subjetivo e complexo quanto a dor, principalmente a crnica, aliada a uma

    morbidade frequentemente subdiagnosticada e, consequentemente, subtratada, e com uma

    proposta teraputica alternativa como o laser, motivaram a realizao deste estudo que buscou

    investigar a prevalncia de DTM em pacientes de clnica de dor e os efeitos da TLBP no seu

    subgrupo diagnstico DMF.

  • 24

    2 JUSTIFICATIVA

  • 25

    A escolha deste tema foi motivada por dois aspectos, o primeiro, a percepo do vcio

    em se considerar as disfunes temporomandibulares (DTMs) como uma morbidade nica

    designada por disfuno temporomandibular (DTM), consequentemente subdiagnosticada,

    subtratada e carente de centros especializados para atendimento da populao. O segundo

    aspecto foi a grande inquietao gerada pela controvrsia em torno da efetividade da terapia

    laser de baixa potncia (TLBP). Diante do exposto, seguem-se as justificativas para a

    realizao deste estudo:

    1) A literatura cientfica registra que a prevalncia da dor miofascial

    (DMF), entre pacientes atendidos em clnica mdica geral e de especialidades,

    varia dentro de uma ampla faixa que vai dos 21% aos 93% (SE et al., 2007;

    SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012), e que a prevalncia de DTMs na populao em

    geral de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisa Dental e Craniofacial

    dos Estados Unidos da Amrica est em torno de 5% a 12%, entretanto so

    escassas as informaes sobre a prevalncia de DTMs nos pacientes com DMF.

    2) O diagnstico da dor miofascial de carter eminentemente clnico,

    entretanto, a investigao do sistema muscular por meio da algometria de presso,

    da eletromiografia de superfcie e da termografia pode trazer subsdios ao

    diagnstico e ao tratamento a ser proposto.

    3) Habitualmente, para o controle da dor miofascial, so prescritos

    frmacos e procedimentos fisioterpicos, como TENS, terapias manuais,

    agulhamento e acupuntura. Uma alternativa a ser considerada a terapia laser de

    baixa potncia no infravermelho.

    Em face desses registros, plenamente justificvel a implementao de projetos de

    pesquisa que investiguem a prevalncia de DTMs em pacientes com DMF, a consolidao do

    diagnstico e a possvel efetividade da TLBP no seu tratamento.

  • 26

    3 OBJETIVOS

  • 27

    Conhecer o perfil do paciente atendido no Servio de Dor do Ambulatrio Magalhes

    Neto no Hospital Universitrio Professor Edgar Santos (HUPES) fundamental para

    evidenciar necessidades dessa populao, bem como necessidades do prprio servio. Por

    outro lado, investigar possveis benefcios advindos de uma terapia no invasiva no

    tratamento de uma parcela dessa populao pode ser esclarecedor quanto sua indicao.

    Portanto, so objetivos do presente estudo:

    3.1 OBJETIVO GERAL

    Avaliar a prevalncia de DTMs em pacientes com dor atendidos no referido

    Servio de Dor e o efeito da TLBP no tratamento da DMF em DTM.

    3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS

    Mensurar o impacto da DMF em DTM na qualidade de vida e nos nveis de

    ansiedade e depresso, antes e aps a realizao da TLBP.

    Mensurar a intensidade da DMF em DTM, por meio da algometria de presso

    e das escalas visual analgica e numrica, confrontando-as, e correlacionar os

    dados obtidos aos efeitos da TLBP.

    Determinar, a partir da eletromiografia de superfcie, o funcionamento dos

    msculos masseter superficial e temporal anterior e correlacionar os resultados

    DMF e aos efeitos da TLBP.

    Identificar, por meio de imagens por infravermelho, possveis alteraes nos

    padres da temperatura de superfcie das regies estudadas.

  • 28

    4 REVISO DA LITERATURA

  • 29

    Uma reviso da literatura sobre os aspectos envolvidos no estudo de extrema

    relevncia para a elucidao e fundamentao em todas as suas etapas. Assim entendendo, so

    feitas consideraes sobre dor, dor miofascial, dor miofascial em disfuno

    temporomandibular, algometria, eletromiografia de superfcie, termografia e terapia laser de

    baixa potncia.

    4.1 DOR

    Entende-se por dor uma experincia sensitiva e emocional desagradvel associada a

    dano tecidual real ou potencial ou descrita tal como se o dano estivesse presente, segundo a

    Associao Internacional para o Estudo da Dor (International Association for the Study of

    Pain IASP). A dor pode ser classificada em trs grandes grupos: neuroptica (neurites,

    neuropatias e sndromes compressivas dos nervos); somtica (alteraes musculoesquelticas)

    e visceral (crescimento tumoral ou processos inflamatrios), sendo seu diagnstico baseado

    em critrios clnicos e confirmado com exames laboratoriais. Do ponto de vista da durao,

    define-se como crnica a dor que existe h, pelo menos, seis meses, ou quando o sintoma

    persiste alm do tempo habitual de cura da leso tissular (MERSKEY; BOGDUK, 1994).

    Piguet e Allaz (2009) salientaram que a durao mnima da dor de seis meses para defini-la

    como crnica mais aplicada em pesquisa, ao passo que, na clnica, o tempo considerado o

    de trs meses, limite de tempo no embasado em um marcador biolgico, psicolgico ou

    social, mas muito provavelmente como resultado de um consenso ligado experincia dos

    experts no assunto.

    A dor crnica est associada a mecanismos neurofisiolgicos complexos, tendo sido

    descritas vrias alteraes em nvel de sistema nervoso perifrico (SNP) e sistema nervoso

    central (SNC), e pode ser definida como um estado de constante facilitao da conduo

    nervosa, quando estmulos que outrora eram incuos podem ser interpretados como dor

    alodinia ou quando a resposta ao estmulo doloroso exacerbada, no proporcional

    intensidade da agresso hiperalgesia (KRAYCHETE; CALASANS; VALENTE, 2006;

    IASP). Em outras palavras, quadros dolorosos crnicos podem estar associados

    sensibilizao central, o que implica a ocorrncia de reduo do limiar de dor ou de aumento

    da resposta, descargas persistentes aps estmulos repetidos e ampliao dos campos

    receptivos, fato que pode estar intimamente relacionado com a resistncia a tratamentos e

    perpetuao do quadro (ROCHA et al., 2007; WOOLF, 2011).

  • 30

    Relatos de experincias profundamente desagradveis, como distrbios do sono, baixa

    autoestima, fadiga, comprometimento da libido, depresso e perda do apetite, so registrados

    pelos indivduos que sofrem de dor crnica. Essas condies interferem, sobremaneira, no

    convvio social e no desempenho no trabalho, repercutindo, negativamente, na qualidade de

    vida. Um nmero relevante de indivduos se enquadra nessa descrio, representando uma

    parcela expressiva de consumidores de medicamentos e, at mesmo, de sujeitos incapacitados

    para o trabalho (CAMPARIS; SIQUEIRA, 2006).

    A dor crnica considerada um problema grave e crescente no mundo e em nosso meio,

    tornando-se, inclusive, um problema de sade pblica. Esse entendimento confirmado em

    funo da frequncia cinco vezes maior com que pacientes com dor crnica recorrem aos

    servios de sade. Desse modo, a dor crnica compromete o bem estar fsico, psquico e

    social do indivduo, implicando incapacidade e absentesmo no trabalho (CHAPMAN;

    GARVIN, 1999).

    4.2 DOR MIOFASCIAL

    Dores de origem musculoesqueltica so responsveis por mais de 2/3 dos estados

    dolorosos atendidos em cuidados de sade primrios (HASSELSTRM et al., 2002),

    consistindo em um significativo problema de sade pblica em todo o mundo (BASI et al.,

    2012). A DMF uma disfuno muscular que se constitui numa causa difundida de dor em

    tecidos moles, comumente ignorada pelos profissionais de sade por falta de conscientizao

    e treinamento, mas de diagnstico relativamente simples obtido pelo histrico e exame fsico

    palpao (SIMONS, D. G.; TRAVELL, J. G.; SIMONS, L. S., 2005, CAKIT et al., 2010;

    SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012; GERWIN, 2014). A mialgia que tem durao igual ou

    superior a trs meses considerada crnica (GERWIN, 2005), e a DMF frequentemente est

    relacionada dor crnica, assim podendo envolver sensibilizao central (CRISCUOLO,

    2001; KUAN, 2009; SRBELY, 2010; WOOLF, 2011; GE; FERNNDEZ-DE-LAS-PEAS;

    YUE, 2011; SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012; DESAI; SAINI, V.; SAINI, S., 2013). Sua

    prevalncia entre os pacientes atendidos em clnica mdica geral e de especialidades varia de

    21% a 93%, sendo comumente encontrada na investigao diagnstica da cefaleia, da dor

    lombar, cervical e de ombro (SE et al., 2007; SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012).

    A sndrome da dor miofascial (SDM) est associada presena de PGs, reas com

    caractersticas prprias que do incio sensao dolorosa, encontrados em um ou mais

    http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Ge%20HY%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Fernndez-de-Las-Peas%20C%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Yue%20SW%22
  • 31

    grupos musculares, gerando padres variveis de dor. Critrios diagnsticos incluem presena

    de banda tensa palpvel no msculo, presena de ndulo hipersensvel palpvel na banda

    tensa PG, resposta de contrao local (RCL twitch) palpao na banda tensa (quando

    adequadamente estimulada), reproduo de padro tpico de dor referida (DR) em resposta

    compresso dos PGs, presena espontnea de padro tpico de DR e/ou reconhecimento dessa

    dor como familiar. A SDM pode estar relacionada com limitaes de movimentos, efeitos

    autonmicos (lacrimejamento e vermelhido nos olhos, corrimento nasal, atividade

    pilomotora e zumbido, entre outros), efeitos motores (co-contrao protetora) e efeitos

    sensitivos (DR, hiperalgesia secundria e alodinia). No h necessidade de que todos esses

    aspectos estejam presentes para o estabelecimento do diagnstico (SIMONS, D. G.;

    TRAVELL; SIMONS, L. S., 2005; GERWIN, 2014).

    A nica maneira de fazer-se o diagnstico definitivo de um PG pelo exame fsico. Os

    PGs podem estar ativos ou latentes: os ativos so aqueles relacionados queixa clnica de dor,

    ou seja, sempre dolorosos, j os PGs latentes, como a prpria designao sugere, esto

    quiescentes, silenciosos em relao dor espontnea, apresentando-se dolorosos somente

    quando palpados (SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S., 2005; SHAH et al., 2008;

    GERWIN, 2014). Critrios recomendados para identificao de PGs ativos e de PGs latentes

    encontram-se reproduzidos no Quadro 1.

    CRITRIOS ESSENCIAIS:

    1. Banda tensa palpvel (se o msculo for acessvel)

    2. Sensibilidade local intensa de um ndulo em uma banda tensa

    3. Reconhecimento por parte do paciente de queixa atual de dor por presso no

    ndulo sensvel (identificao de um PG ativo)

    4. Limite doloroso para a amplitude de movimento em alongamento pleno

    OBSERVAES CONFIRMATRIAS:

    5. Identificao visual ou ttil de RCL

    6. Imagens da RCL obtida por penetrao de agulha no ndulo sensvel

    7. Dor ou sensao alterada (na distribuio esperada de um PG naquele

    msculo) durante a compresso do ndulo sensvel

    8. Demonstrao eletromiogrfica de atividade eltrica espontnea caracterstica

    de locais ativos no ndulo sensvel de uma banda tensa

    Quadro 1 - Critrios para identificao de PG latente ou de PG ativo

    (Fonte: SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S., 2005)

  • 32

    Os PGs miofasciais podem tambm ser caracterizados como PG primrio (principal),

    aquele provavelmente ativado de forma direta por sobrecarga (independentemente da

    natureza) e no aquele ativado como resultado de atividade de PG em outro msculo

    satlite. Ou seja, clinicamente, o PG primrio pode ser identificado quando sua inativao

    tambm inativa PGs em outros msculos, ou caracterizado como PG satlite, aquele que se

    desenvolve em um msculo sinrgico sobrecarregado, ou em um antagonista, ou mesmo em

    um msculo aparentemente correlacionado apenas de forma neurognica. Como exemplos de

    PGs principal e satlite podem ser citados: a) PG principal em esternocleidomastideo

    ativando PGs satlites em temporal, masseter, pterigideo lateral, digstrico, orbicular do olho

    e/ou frontal; b) PG principal em trapzio superior ativando PGs satlites em temporal,

    masseter, esplnio, levantador da escpula, semiespinhal da cabea, romboide menor e/ou

    occiptofrontal (SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S., 2005).

    Alm do diagnstico clnico, baseado no histrico e exame fsico, soberano, outras

    formas diagnsticas, complementares, vm sendo sugeridas para PGs miofasciais, uma vez

    que no h anormalidades no diagnstico laboratorial especficas para a SDM, a saber:

    imagem por termografia infravermelha (SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S.,

    2005; BALBINOT, 2006; BRIOSCHI et al., 2007; HADDAD, 2011);

    imagem por ultrassom (US), observando-se que os novos aparelhos possuem alta

    resoluo de imagem, sendo capazes de permitir a visualizao de regio hipoecoica, focal,

    relacionada com o PG, no US bidimensional, e, como regio focal de reduzida amplitude

    de vibrao na sonoelastografia por vibrao, indicando um ndulo denso localizado

    (SIKDAR et al., 2009);

    imagem por ressonncia magntica de elastografia, que pode fazer a diferenciao de

    tecidos de densidades variadas;

    eletromiografia com agulha, que pode revelar sinal de baixa amplitude e alta frequncia na

    regio de PG conhecido como atividade eltrica espontnea e associado placa motora

    terminal;

    eletromiografia de superfcie, evidenciando resposta aumentada, relaxamento retardado e

    fadiga aumentada nos msculos com PGs (SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S.,

    2005; GERWIN, 2005; GE; FERNNDEZ-DE-LAS-PEAS; YUE, 2011; GERWIN,

    2014).

    Ainda existem lacunas quanto especificidade dos critrios para diagnstico da SDM

    (FLECKENSTEIN et al., 2010; SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012; DESAI; SAINI, V.; SAINI,

    http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Ge%20HY%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Fernndez-de-Las-Peas%20C%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Yue%20SW%22
  • 33

    S., 2013; GERWIN, 2014) e, portanto, seu estabelecimento baseia-se, exclusivamente, no

    histrico clnico e nos achados do exame fsico, devendo ser preciso, para no ser confundido

    com o de outras doenas que tambm cursam com a presena de PGs, a exemplo da

    fibromialgia (YENG; KAZIYAMA; TEIXEIRA, 2003; VZQUEZ-DELGADO; CASCOS-

    ROMERO; GAY-ESCODA, 2010; ALONSO-BLANCO et al., 2012; GERWIN, 2013).

    Gerwin (2014) props critrios diagnsticos na forma evidenciada no Quadro 2.

    1. Banda tensa no msculo

    2. Extrema sensibilidade em um ponto na banda tensa

    3. Reproduo da dor do paciente

    4. Resposta do pulo local (twitch)

    5. Dor referida

    6. Fraqueza

    7. Restrio na amplitude de movimento

    8. Sinais autonmicos

    Quadro 2 - Aspectos diagnsticos para SDM (os trs primeiros so essenciais

    e os cinco ltimos no so pr-requisitos (Fonte: GERWIN, 2014)

    4.2.1 Fisiopatologia

    Dentre as tentativas de explicao para o que ocorre na regio de PG j registradas, a

    hiptese atualmente aceita a integrada. Na hiptese integrada, as linhas de evidncias

    eletrofisiolgicas e histolgicas, quando combinadas, indicam que o PG essencialmente uma

    regio de muitas placas terminais disfuncionais, cada uma delas associada a uma fibra

    muscular contrada ao mximo. Como pode ser evidenciado em figura esquemtica (Figura 1)

    apresentada por Simons, D. G., Travell e Simons, L. S. (2005), uma produo e liberao

    acentuadas de acetilcolina pela regio terminal do nervo motor na fenda sinptica ativa seus

    receptores na membrana ps-juncional, produzindo nmeros muito aumentados de potenciais

    de placa. Tal contexto responsvel pela atividade eltrica espontnea da placa terminal e por

    uma despolarizao parcial sustentada da membrana ps-juncional da fibra muscular,

    implicando a liberao e absoro contnuas de ons clcio do retculo sarcoplasmtico local e

    produo de um encurtamento (contratura) sustentado dos sarcmeros, gerando um aumento

    na demanda de energia. A contrao sustentada comprime os vasos sanguneos locais,

    resultando na reduo dos suprimentos de nutrientes e oxignio, que satisfariam a demanda de

    energia, e acarretando uma crise de energia local com liberao de substncias neuroativas

  • 34

    que podem colaborar para um processo cclico autossustentado (SIMONS, D. G.; TRAVELL;

    SIMONS, L. S., 2005; SHAH et al., 2008; SIMONS, 2008; GE; FERNNDEZ-DE-LAS-

    PEAS; YUE, 2011).

    Estudo realizado por Shah e colaboradores (2008) comprovou a presena de substncias

    associadas com a dor e a inflamao nas proximidades de PG ativo, as quais incluram

    elevada concentrao de prtons, substncia P (SP), peptdeo relacionado ao gene da

    calcitonina (CGRP), bradicinina, fator de necrose tumoral- (TNF-), interleucina-1 (IL-1),

    IL-6, IL-8, serotonina e norepinefrina. Os autores tambm observaram que a alterao nos

    nveis dessas substncias no est restrita vizinhana do PG ativo nos indivduos com DMF,

    os quais a apresentaram em stios mais afastados em algum grau, quando comparados a

    pacientes sadios.

    Figura 1 - Regio da placa terminal disfuncional, hiptese integrada. RS =

    retculo sarcoplasmtico (Fonte: Simons, D. G., Travell e Simons, L. S., 2005)

    Segundo Gerwin (2014), a dor em PGs miofasciais se deve liberao de

    neuropeptdeos, citocinas, SP, CGRP, IL-1, bradicinina e prtons, que geram acidez local, e

    pacientes com PGs miofasciais, assim como outras fontes fsicas de dor crnica, referem dor

    em locais distantes e conduzem sensibilizao do SNC, a qual resulta em baixo limiar de

    dor, sensibilidade e expanso de reas dolorosas. A compresso da zona de gatilho por, no

    mnimo, cinco a dez segundos pode induzir DR ou dor distante do ponto de estimulao

    porque a DR tipifica ativao central ou sensibilizao central, o que requer a ativao de

    Fibra

    muscular

    http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Ge%20HY%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Fernndez-de-Las-Peas%20C%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Fernndez-de-Las-Peas%20C%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Yue%20SW%22
  • 35

    interneurnios, e a propagao do sinal demanda certo tempo (os referidos cinco a dez

    segundos). A desativao de um PG ativo resulta no desaparecimento da DR. Algumas

    bandas tensas, mesmo no se apresentando dolorosas palpao, podem implicar

    consequncias funcionais como a alterao da sequncia normal de ativao de um msculo

    (LUCAS et al., 2010; GE; FERNNDEZ-DE-LAS-PEAS; YUE, 2011; GERWIN, 2014). A

    resposta local de twitch, por sua vez, suscitada por estmulo mecnico na banda tensa,

    causando contrao local por uma descarga eltrica polifsica breve (25-250 ms) e de alta

    amplitude, caracterstica do PG miofascial e no observada em msculo sadio (GERWIN,

    2014).

    4.2.2 Diagnsticos diferenciais e comorbidades

    Simons, D. G., Travell e Simons, L. S. (2005) chamam ateno para uma extensa lista

    de diagnsticos com sintomas relatados que podem estar associados a PGs negligenciados de

    acordo com o(s) msculo(s) envolvido(s). A ttulo de exemplos, so citados: angina de peito

    atpica PG em peitoral maior; neuralgia facial atpica PG em masseter, temporal,

    diviso esternal do esternocleidomastideo, trapzio superior; ombro congelado PG em

    subescapular; radiculopatia/C6 PG em peitoral menor, escaleno; bursite subacromial

    PG em deltoide mdio; epicondilite PG em extensores do carpo, supinador, trceps

    braquial, etc. Portanto, as queixas na DMF podem levar a confundi-la, por exemplo, com

    radiculopatias ou dores viscerais e, no que se refere regio de cabea e pescoo, devem-se

    examinar os sinais e sintomas de desordens regionais como: caractersticas da cefaleia,

    presena de sinais neurolgicos, limitaes de movimentos (GERWIN, 2014). Cuidados

    semelhantes devem ser adotados em relao s demais reas. Outras condies a serem

    consideradas no diagnstico diferencial incluem: polimiosite, sndromes compressivas

    perifricas, neuropatias centrais e afeces metablicas, entre outras (SIQUEIRA;

    TEIXEIRA, 2012).

    Condies comumente encontradas como comorbidades, citadas por Gerwin (2014), na

    sndrome da DMF so: cefaleia do tipo migrnea, cefaleia tipo tensional, DTM, fibromialgia,

    sndromes de hipermobilidade, sndrome do intestino irritvel, sndrome da bexiga dolorosa,

    sndrome da dor plvica, vulvovaginite, prostatite, endometriose, dismenorreia,

    hipotireoidismo, deficincia de vitamina D, deficincia de vitamina B12, deficincia de ferro,

    infestaes parasitrias e doena celaca.

    http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Ge%20HY%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Fernndez-de-Las-Peas%20C%22http://pesquisa.bvsalud.org/portal/?lang=pt&q=au:%22Yue%20SW%22
  • 36

    Ateno especial deve-se dar fibromialgia, em especial no que diz respeito SDM ser

    a condio que, mais comumente, deve ser considerada como diagnstico diferencial, ao

    tempo em que tambm podem coexistir. A fibromialgia apresenta dois componentes maiores:

    dor crnica generalizada/difusa e um conjunto de sintomas somticos, ao passo que a SDM

    apresenta, de modo geral, aspecto mais localizado (GERWIN, 2013). Autores como Chandola

    e Chakraborty (2009) argumentaram sobre a possibilidade da SDM ser considerada um

    subtipo da fibromialgia, enquanto Cakit e colaboradores (2010) sugeriram que a SDM pode

    conduzir fibromialgia ou precipitar/piorar seus sintomas. Wolfe, Walitt e Huser (2014)

    referiram a dificuldade de estabelecer-se um diagnstico correto, salientando que a contagem

    dos pontos dolorosos raramente realizada nos cuidados de sade primrios, quando se

    estabelece a maioria dos diagnsticos de fibromialgia, pois muitos mdicos no sabem como

    realizar o exame para pontos dolorosos, e alguns simplesmente se recusam a faz-lo, o que

    pode favorecer a ocorrncia de diagnsticos equivocados, fato tambm salientado por Cakit e

    colaboradores (2010), para os quais tcnicas inadequadas de palpao no so capazes de

    perceber a presena de bandas tensas e DR. Muitos casos diagnosticados como fibromialgia

    so, em realidade, SDM. Por outro lado, a existncia da fibromialgia como comorbidade da

    SDM pode afetar o curso clnico dos pacientes com SDM e ser a causa de resistncia ao

    tratamento (CAKIT et al., 2010).

    4.2.3 Fatores predisponentes e perpetuadores

    A etiologia multifatorial da DMF inclui como fatores possivelmente implicados no seu

    desenvolvimento, traumas, hbitos parafuncionais orais (ROCHA et al., 2007; BRANCO et

    al., 2008; ROSSETTI et al., 2008; CARDOSO et al., 2011; RAPHAEL et al., 2013),

    desequilbrios posturais, distrbios do sono, estresse psicossocial, nutrientes inadequados,

    dentre outros (FRICTON; DUBNER, 2003; SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS, L. S.,

    2005). Foram elencados como fatores predisponentes ao seu aparecimento a presena de:

    deficincia de ferro, hipotireoidismo, deficincia de vitamina D, deficincia de vitamina B12,

    doena de Lyme, hipermobilidade, espondilose e infestaes parasitrias (GERWIN, 2014).

    A identificao de fatores perpetuadores de PGs pode ser o diferencial entre a terapia

    bem-sucedida e a malsucedida. Simons, D. G., Travell, e Simons, L. S. (2005) ressaltam

    situaes que podem constituir fatores perpetuadores, como, por exemplo: o estresse

    mecnico, inadequaes nutricionais, metablicas e/ou endcrinas (hipometabolismo) e

    infeco crnica (por causa viral, bacteriana ou parasitria), alm de fatores psicolgicos

  • 37

    (ansiedade, depresso). Muitos dos fatores citados fazem parte tambm dos fatores

    relacionados com o desenvolvimento da DMF ou com a sua predisposio.

    4.2.4 Tratamento

    Os procedimentos teraputicos propostos tm como objetivo a reduo na intensidade

    da dor, inativao do PG, reabilitao muscular e remoo preventiva de fatores

    perpetuadores. Simons, D G., Travell, e Simons, L. S. em 2005, j ressaltavam que, quando

    PGs ativos, em qualquer msculo, falharem em responder ao tratamento, com algumas

    excees, um ou mais fatores perpetuadores precisam ser identificados e resolvidos. Na

    literatura sobre tratamentos da DMF so citados tratamentos farmacolgicos, como o uso de

    agentes anti-inflamatrios, relaxantes musculares (tizanidina, ciclobenzaprina,

    tiocolchicosdeo), antidepressivos (amitriptilina, duloxetina) e anticonvulsivantes,

    procedimentos de aplicao de toxina botulnica, agulhamento seco e com injeo de

    anestsico, acupuntura, terapias manuais, ultrassom, estimulao eltrica nervosa transcutnea

    (TENS), estimulao magntica e terapia a laser (CRISCUOLO, 2001; DUNDAR et al.,

    2007; KUAN, 2009; CHANDOLA; CHAKRABORTY, 2009; VZQUEZ-DELGADO;

    CASCOS-ROMERO; GAY-ESCODA, 2010; DESAI; SAINI, V.; SAINI, S., 2013).

    A base lgica para o uso de relaxantes musculares na DMF foi fundamentada no

    conceito equivocado de dor causando espasmo e, consequentemente, mais dor no mesmo

    msculo. Frequentemente, a tenso muscular aumentada, identificada como espasmo,

    gerada pelas bandas tensas dos PGs, e os relaxantes musculares no tm efeito sobre as fibras

    musculares em contratura em razo das placas terminais disfuncionais, embora eles possam

    ser aplicados em outras situaes, o que traduz a importncia da identificao precisa da fonte

    de dor para que seja indicado o tratamento adequado (SIMONS, D. G.; TRAVELL; SIMONS,

    L. S., 2005).

    Segundo Gerwin (2014), um PG ativo pode ser inativado manualmente, com uso de

    laser, agulhamento seco ou injeo, e sua significncia clnica esclarecida aps a sua

    inativao.

    4.3 DOR MIOFASCIAL E DISFUNO TEMPOROMANDIBULAR

  • 38

    A DMF apresenta-se com frequncia em regio de cabea e pescoo (MICHELOTTI et

    al., 2010) em virtude de comprometimento no equilbrio dinmico entre msculos do crnio,

    da mandbula e do pescoo. Tal sistema de msculos se destina no s manuteno da

    estabilidade esttica, quanto em movimento, havendo, portanto, evidncias de uma interao

    ntima entre os sistemas neuromusculares craniofacial e cervical no ser humano (SVENSSON

    et al., 2004). O termo dor miofascial tem sido empregado de forma a gerar certa confuso no

    meio odontolgico (OKESON, 2008; KOUTRIS et al., 2013; UEMOTO et al., 2013). Em

    funo disso, aps terem sido abordados os conceitos referentes DMF de forma geral,

    discutir-se- a DMF em disfuno temporomandibular.

    As DTMs implicam um conjunto de problemas clnicos envolvendo msculos e/ou

    articulaes do sistema estomatogntico (Quadros 3 e 4) que, em muitas situaes, causam

    dor persistente, colocando-as como de alta prevalncia entre as dores crnicas orofaciais

    (CAMPOS, M. I. G; CAMPOS, P. S. F., LINE, 2006; OAKLEY; VIEIRA, 2008). Segundo

    dados do Instituto Nacional de Pesquisa Dental e Craniofacial dos Estados Unidos da

    Amrica (apud BASI et al., 2012; SCHIFFMAN et al., 2014), as DTMs so a segunda

    ocorrncia mais comum em termos de condies musculoesquelticas que resultam em dor e

    incapacidade, situando-se atrs apenas da lombalgia crnica, e afetam 5% a 12% da

    populao, com um custo anual estimado em quatro bilhes de dlares. A dor pode ocorrer

    espontaneamente ou associada funo ou carga. Sua percepo envolve questes culturais,

    emocionais, de experincia prvia, genticas, etc. As mulheres da faixa etria de 30 a 49 anos

    so mais propensas a essa sndrome dolorosa (SVENSSON et al., 2004). Foi observado que

    os polimorfismos em genes que codificam as enzimas envolvidas com o metabolismo dos

    estrgenos so considerados elementos coadjuvantes da DTM (OAKLEY; VIEIRA, 2008;

    RIBEIRO-DASILVA et al., 2009).

    Em Fricton e Dubner (2003, p.485), no captulo Tratamento Interdisciplinar da Dor

    Miofascial dos Msculos Mastigatrios, encontra-se a seguinte definio para DMF:

    desordem de dor muscular, caracterizada por: a) sensibilidade dentro dos feixes firmes de

    msculos esquelticos denominados PGs, b) DR local ou distante do PG e c) padres de dor

    compatveis com os de outros pacientes com localizaes semelhantes de PGs. Os autores

    consideram diferentes graus, desde a intensidade branda e tratamento mais simples, at sua

    verso de intensidade elevada, mltiplos sintomas associados, diagnsticos sobrepostos e

    maior complexidade no tratar.

  • 39

    DESORDENS DOS MSCULOS

    MASTIGATRIOS:

    DESORDENS DA ARTICULAO

    TEMPOROMANDIBULAR (ATM):

    a) Co-contrao protetora a) Desarranjos do complexo cndilo-disco

    b) Sensibilidade dolorosa muscular local I - mau posicionamento do disco

    c) Mioespasmo II - deslocamento do disco com reduo

    d) Dor miofascial III - deslocamento do disco sem reduo

    e) Mialgia mediada centralmente b) Incompatibilidade estrutural das superfcies articulares

    f) Fibromialgia I - desvio na forma

    g) Desordens motoras mediadas centralmente II - aderncias e adeses

    HIPOMOBILIDADE MANDIBULAR: III - subluxao

    a) Anquilose IV - deslocamento espontneo

    b) Contratura muscular c) Desordens inflamatrias da ATM

    c) Bloqueio do processo coronoide I - sinovite e capsulite

    DESORDENS DE CRESCIMENTO: II - retrodiscite

    a) Desordens sseas congnitas e de

    desenvolvimento III - artrites

    b) Desordens musculares congnitas e de

    desenvolvimento IV - desordens inflamatrias das estruturas associadas

    Quadro 3 - Sistema de classificao para diagnstico das DTMs (Fonte: OKESON, 2008)

    DESORDENS DA ATM IV - Fraturas

    I - Dor articular: V - Desordens de desenvolvimento / congnitas:

    1. Artralgia 1. Aplasia

    2. Artrite 2. Hipoplasia

    II - Desordens articulares: 3. Hiperplasia

    1. Desordens do disco: DESORDENS DOS MSCULOS

    a) Deslocamento de disco com reduo I - Dor muscular: b) Deslocamento de disco com reduo e

    travamento intermitente.

    1. Mialgia:

    c) Deslocamento de disco sem reduo e com limitao de abertura.

    a) Mialgia local

    d) Deslocamento de disco sem reduo e sem limitao de abertura.

    b) Dor miofascial

    1. Desordens de hipomobilidade no relacionadas ao disco:

    c) Dor miofascial com referncia

    a) Aderncia 2. Tendinites b) Anquilose: Fibrosa ou ssea 3. Miosite

    2. Desordens de hipermobilidade: 4. Espasmo

    a) Deslocamentos: - Subluxao - Luxao

    II - Contratura

    III - Doenas da articulao: III - Hipertrofia

    1. Degenerativas: IV - Neoplasia

    a) Osteoartrose V - Desordens de movimento: b) Osteoartrite 1. Discinesia orofacial

    2. Artrites sistmicas

    2. Distonia Oromandibular

    3. Reabsoro condilar idioptica

    VI - Dor muscular mastigatria atribuda a desordens

    dolorosas sistmicas / centrais:

    4. Osteocondrite dissecante

    Fibromialgia / dor generalizada

    5. Osteonecrose

    CEFALEIA

    Cefaleia atribuda a DTM

    6. Neoplasia

    ESTRUTURAS ASSOCIADAS

    Hiperplasia coronoide

    7. Condromatose sinovial

    Quadro 4 - Classificao taxonmica das DTMs (Fonte: SCHIFFMAN et al., 2014)

  • 40

    Okeson (2008, p.247) define a DMF como uma condio de dor miognica regional

    caracterizada por reas locais de feixes rgidos e hipersensveis nos tecidos musculares,

    conhecidas como pontos de gatilho, contextualizando-a de forma semelhante indicada por

    Simons, D. G., Travell e Simons, L. S. (2005). Ressalta que, no entanto, a Odontologia vem

    se utilizando do termo para designar qualquer desordem muscular, empregando-o de forma

    inadequada.

    Em Siqueira e Teixeira (2012, p.564) l-se: O termo SDM refere-se ao conjunto de

    sinais e sintomas dos msculos e estruturas associadas decorrentes de pontos de sensibilidade,

    tambm conhecidos como PGs, os quais so focos de hiperirritabilidade muscular e

    amplamente modulados no SNC.

    Segundo o eixo I dos critrios diagnsticos para pesquisa de disfunes

    temporomandibulares (Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders

    RDC/TMD), internacionalmente aceito e validado (na sua verso traduzida para o portugus

    por Pereira et al., 2004), a DMF se apresenta como um de seus subgrupos, podendo gerar duas

    possibilidades diagnsticas: dor miofascial sem limitao de abertura da boca e dor miofascial

    com limitao de abertura (DWORKIN; LERESCHE, 1992; BRANCO et al., 2008).

    O RDC/TMD, na verso supracitada, traz questes que permitem determinar a presena

    de dor muscular na face ou tmporas, a mensurao da abertura de boca, para indicar a

    existncia de limitao ou no, e os nveis de dor presso nos seguintes grupos musculares:

    temporal, masseter, estilo-hiideo, digstrico, supra-hiideo e pterigideo medial. Com base

    nas informaes obtidas a partir desses itens, o questionrio pode resultar em diagnstico de

    dor miofascial, ou seja, DMF em DTM. Em nenhum momento investiga-se a presena de

    bandas tensas, PGs, twitch, dor referida compresso dos ndulos ou reconhecimento do

    padro da dor como familiar, aspectos que, de fato, caracterizam a DMF por definio.

    Koutris e colaboradores (2013) realizaram um estudo para avaliar o possvel papel do

    uso excessivo dos msculos da mastigao na patognese da dor muscular. Com a utilizao

    de um protocolo envolvendo contraes musculares concntricas e excntricas para provocar

    um estado de dor muscular de incio tardio (delayed-onset muscle soreness, DOMS),

    verificaram que, na aplicao do RDC/TMD, obtm-se o resultado diagnstico de dor

    miofascial. Nas suas concluses, os pesquisadores destacaram o fato de que a DMF em DTM

    diagnosticada pelo RDC/TMD (na verso supracitada) pode ser uma manifestao de DOMS.

    Ressaltando-se a importncia do tema, em Simons, D. G., Travell e Simons, L. S. (2005,

    p. 46) l-se: Todo autor que relata um estudo de PGs miofasciais deve identificar, na seo

  • 41

    dos mtodos, especificamente que exames de PG foram usados como critrios diagnsticos e

    deve descrever em detalhes exatamente como eles foram realizados.

    Estudos sobre a prevalncia de fatores etiolgicos em pacientes com DMF em regio

    orofacial foram produzidos por Rocha, Mendona e Alencar Jnior (2007), utilizando-se de

    critrios clnicos de localizao de PGs em grupos musculares mastigatrios e cervicais,

    ficando constatado que os hbitos parafuncionais foram os fatores mais relevantes (87%).

    Analisando-se uma amostra constituda de 23 pacientes com DTM, diagnosticados com

    DMF e artralgia do mesmo lado, coletou-se material (bipsia de masseter, lquido sinovial e

    sangue) para pesquisa de biomarcadores (fator de crescimento neural, bradicinina, leucotrieno

    B4, prostaglandina E2, isoprostano F2 e substncia P) que foi comparado com o material de 14

    pacientes com deslocamento de disco com reduo e sem dor e com o de 13 pacientes sem

    DTM e sem dor. Os diagnsticos foram estabelecidos por profissionais experientes na rea

    com base no histrico, em questionrios, exame clnico e exames de imagem. Os resultados

    obtidos sugeriram que o estresse oxidativo do msculo est envolvido na DMF e que o

    isoprostano F2 pode ser um biomarcador para DMF (BASI et al., 2012).

    Em pesquisa sobre a terapia laser e o agulhamento na desativao de PGs miofasciais

    em pacientes com DTM, Uemoto e colaboradores (2013) justificaram a no utilizao do

    RDC/TMD para a seleo de pacientes por sua impreciso para esse diagnstico. Os autores

    constataram que a falta de critrios padronizados prejudica a qualidade do trabalho,

    corroborando com Simons, D. G., Travell e Simons, L. S. que, em 2005, j afirmavam que um

    documento de consenso estabelecendo os critrios diagnsticos oficiais seria uma necessidade

    urgente. Dessa forma, mais estudos controlados tornam-se necessrios.

    Assim sendo, o diagnstico de DMF em regio orofacial com base exclusivamente no

    RDC/TMD, na sua primeira verso, que coloca a DMF como um de seus subgrupos

    diagnsticos, falho (REITER, 2012; KOUTRIS, 2013; UEMOTO et al., 2013). Buscou-se

    corrigir tal fato na verso remodelada atualmente proposta, na qual o algoritmo do eixo I do

    RDC revisado prope sensibilidade de 0,82 e especificidade de 0,99 para DMF, e

    sensibilidade de 0,93 e especificidade de 0,97 para DMF com limitao de abertura. No novo

    RDC, diagnsticos combinados com qualquer DMF apresentaram sensibilidade de 0,91 e

    especificidade de 1,00, sendo recomendado para o diagnstico da DMF por Schiffman e

    colaboradores (2010, 2014). Essa nova verso, at ento, ainda no estava apta utilizao no

    Brasil.

    4.4 ALGOMETRIA

  • 42

    A dor crnica um sintoma difcil de ser avaliado, por ser uma experincia subjetiva

    que pode sofrer influncia de vrios fatores, entre eles os ambientais, emocionais,

    comportamentais e sociais, que interagem para formar a resposta dolorosa final (SANTOS;

    PEREIRA; RESENDE, 2006).

    A mensurao da intensidade da dor feita, habitualmente, com o auxlio de diferentes

    tipos de escalas, dentre as quais a escala visual analgica (EVA), a escala numrica, a escala

    de faces e a de descritores verbais, todas no mbito unidimensional, e, para avaliao

    multidimensional, o questionrio de dor McGill. O uso de escalas apresenta limitaes,

    especialmente em crianas, idosos e pessoas com dficit visual ou cognitivo. Alm disso,

    algumas pessoas adaptam-se dor desenvolvendo um elevado autocontrole, suprimindo, com

    isso, os sinais de sofrimento ou apenas permanecendo prostradas ou mais quietas que o

    habitual (BOTTEGA; FONTANA, 2010).

    Outra forma de avaliao da dor, sem a subjetividade peculiar s escalas mencionadas,

    a algometria de presso, tcnica que consiste na utilizao de um dispositivo que registra,

    analgica ou digitalmente, a presso que est sendo aplicada superfcie por meio de uma

    ponteira com rea circular padronizada de 1 cm2. A mensurao da dor por algometria de

    presso, especificamente pelo teste de limiar de dor presso (LDP), um parmetro til nos

    estudos de dor musculoesqueltica (PARK et al., 2011) e est relacionada com o nvel de

    presso suportada pelo indivduo at comear a sentir dor, ou seja, quanto mais presso o

    indivduo suporta em determinado local antes de comear a sentir dor, melhor a condio,

    sendo o inverso tambm verdadeiro, isto , quanto menor a presso necessria para causar

    dor, mais sensvel o local. Fischer, em 1987, j descrevia o teste, salientando que a

    confiabilidade do mtodo particularmente boa quando cada indivduo funciona como

    controle de si prprio, e apontando a existncia de diferenas nos nveis entre os sexos, com

    patamares em geral mais elevados no homem que na mulher.

    Silva e colaboradores (2007) realizaram estudo sobre a quantidade de presso e padro

    de dor referida nos msculos masseter, temporal, esternocleidomastideo e trapzio, em

    pacientes portadores de DMF, e concluram, de forma geral, sem relacionar com grupo

    muscular e sem informar o sexo dos indivduos da amostra, que o LDP nesses pacientes

    significativamente menor que nos pacientes assintomticos, tendo sido de 3,84 kg/cm2 o LDP

    obtido nestes ltimos.

  • 43

    Estudo que avaliou a influncia do ciclo menstrual no limiar de dor presso, em

    msculos mastigatrios de pacientes com DMF nos mesmos, concluiu que as diferentes fases

    do ciclo no tiveram influncia no LDP, ao passo que o uso de contraceptivo oral foi

    associado ao decrscimo nos nveis referidos de dor. Os autores argumentaram que, com as

    variaes hormonais durante o ciclo, ocorrem substanciais flutuaes no aspecto emocional, a

    exemplo de irritabilidade, tristeza e fadiga, alm de clica, dor e inchao, que poderiam

    contribuir para um aumento na EVA (VIGNOLO et al., 2008). Por outro lado, a relevncia do

    estresse no limiar de dor foi confirmada em pesquisa que determinou seu impacto e o da

    ansiedade no LDP de pacientes com DMF, a partir da avaliao de msculos mastigatrios

    (VEDOLIN et al., 2009).

    4.5 ELETROMIOGRAFIA DE SUPERFCIE

    A eletromiografia de superfcie (EMGs) um exame complementar que se destina ao

    estudo dos potenciais eltricos das fibras musculares. O registro da atividade eletromiogrfica

    realizado com o posicionamento de sensores na pele, sobre o tecido muscular esqueltico

    que se deseja estudar. Apresenta-se como um mtodo de fcil execuo e no invasivo. Essa

    ferramenta promove a identificao e a descrio do funcionamento das unidades motoras,

    com base em modelos de ativao muscular, da amplitude eltrica de ativao, assim como

    nas frequncias que constituem a atividade muscular. Em funo das caractersticas do sinal

    de EMGs e da dependncia da sua morfologia com a tarefa motora em estudo, o

    eletromiograma bruto precisa ser processado para permitir a quantificao de parmetros

    clnicos (FERREIRA; GUIMARES; SILVA, 2010).

    A anlise da funo muscular por meio da eletromiografia tem sido amplamente

    empregada no diagnstico clnico e em pesquisas de diversas reas da sade, tais como

    Odontologia, Medicina, Fisioterapia e Fonoaudiologia, dentre outras, reas que podem incluir

    a avaliao eletromiogrfica de superfcie como exame complementar visando definio de

    diagnsticos. Alm disso, o mtodo possibilita estabelecer prognsticos mais elaborados dos

    casos em estudo (RANCAN, 2008). O uso da EMGs nos msculos temporal, masseter e no

    grupo dos suprahiideos foi apontado como possibilidade para estimar e, at mesmo, validar

    os modelos mecnicos do sistema mastigatrio (GONZALEZ et al., 2011). Dentre os vrios

  • 44

    grupos musculares que podem ser avaliados pela eletromiografia, destacam-se os msculos

    mastigatrios em atividade, bem como no repouso da mandbula.

    Em 2008, Pies, Alves e Brzin analisaram a simetria da atividade eletromiogrfica dos

    msculos masseter, temporal e esternocleidomastideo em voluntrios distribudos nos grupos

    controle e de portadores de DTM. Registros de EMGs foram obtidos durante a posio de

    repouso mandibular, a posio de mxima intercuspidao e durante a mastigao. As

    atividades simtricas dos msculos temporais, masseter e esternocleidomastideo foram mais

    reduzidas no grupo de portadores de DTM, em comparao com o grupo controle. A ativao

    assimtrica dos msculos do pescoo e mandibular foi interpretada como uma estratgia

    compensatria para alcanar-se a estabilidade do sistema mandibular e cervical durante a

    funo mastigatria.

    O entendimento da hiperatividade muscular relacionada com as DTMs, por exemplo,

    indica que a EMGs tem grande relevncia na avaliao da fisiologia muscular, no diagnstico

    diferencial e no monitoramento dessas disfunes com relao s medidas empregadas no seu

    tratamento. A teoria de que msculos mastigatrios de pacientes disfuncionais apresentam

    hipertonia no repouso e fadigam facilmente sob a demanda de esforos largamente aceita

    (ARDIZONE et al., 2010). Em contrapartida, a atividade eletromiogrfica de superfcie de

    indivduos sem DTM, durante o apertamento dentrio, exibe ativao significativamente mais

    alta (MANFREDINI et al., 2011).

    Para investigar se o contato oclusal influenciaria o comportamento muscular orofacial,

    considerou-se a atividade eletromiogrfica dos msculos temporal e masseter na posio de

    repouso, em mxima intercuspidao e durante a mastigao. Os indivduos da amostra foram

    distribudos em dois grupos: 14 indivduos apresentando ocluso normal constituram o grupo

    controle, e o grupo experimental reuniu 10 voluntrios que apresentavam um elemento dental

    com restaurao alta. No grupo experimental, houve desequilbrio da atividade do msculo

    temporal durante o apertamento dentrio mximo e hiperatividade desse msculo durante a

    mastigao, podendo essa contrao muscular acentuada causar dor nos msculos do aparelho

    mastigatrio (ADHIKARI et al., 2011). Por fim, constatou-se que a reao dolorosa muscular

    regrediu aps a remoo do ponto de contato prematuro produzido pela restaurao dental,

    evidenciando-se a importncia de os dentistas estabelecerem o equilbrio oclusal na sua

    prtica diria.

    Vrios estudos demonstraram que o msculo dolorido caracterizado por uma reduo

    da atividade eletromiogrfica, a qual tem sido interpretada como um mecanismo inibitrio que

    reflete adaptao dor, fato comprovado, por exemplo, com a medio da atividade

  • 45

    eletromiogrfica, durante o apertamento dentrio, dos masseteres de indivduos sadios

    submetidos dor induzida por injeo de glutamato (CASTROFLORIO et al., 2012).

    A partir de reviso sistemtica sobre a EMGs na DTM (CELINSKI et al., 2013),

    salientou-se que a EMGs, por sua baixa sensibilidade e especificidade, no deve ser indicada

    como forma nica para o estabelecimento de diagnstico, no se recomendando seu uso

    clnico com finalidade diagnstica nas DTMs, ratificando-se o j apontado por Manfredini e

    colaboradores (2011). A EMGs pode ser empregada com o intuito de realizar o

    acompanhamento para avaliar-se a efetividade de uma terapia e como ferramenta de pesquisa.

    A referida contraindicao pode, tambm, ser observada em Santana-Mora e colaboradores

    (2014), que realizaram estudo em pacientes com DTM crnica, comparando-os com

    indivduos sem DTM, e concluram que a EMGs apresentou moderadas sensibilidade e

    especificidade para diferenciar os indivduos com DTM dos sem DTM, podendo o resultado

    ser atribudo variabilidade nos dados da EMGs ou DTM subclnica em alguns indivduos

    considerados sem DTM.

    Como exemplo de aplicabilidade da EMGs, pode ser citado o estudo que avaliou os

    msculos da mastigao de indivduos com DTM tratados com acupuntura e concluiu que ela

    foi capaz de reduzir a atividade eltrica dos msculos temporais na posio de repouso

    mandibular, proporcionando melhor equilbrio entre eles e os masseteres (BORIN et al.,

    2012).

    Especificamente com relao DMF, j foi relatado que a EMGs pode evidenciar

    resposta aumentada, relaxamento retardado e fadiga aumentada nos msculos com PGs. A

    resposta aumentada indicada pela amplitude anormalmente alta da atividade da EMG

    quando o msculo contrado e sobrecarregado de forma voluntria; o relaxamento retardado

    se evidencia pela perda de intervalos limpos com perda de coordenao muscular; e a fadiga

    aumentada pode ser atribuda ao aumento da amplitude e diminuio significativa da

    frequncia da potncia mdia, o que permite que se aceite a frequncia de potncia mdia

    como critrio vlido na avaliao de fadiga muscular (SIMONS, D. G.; TRAVELL;

    SIMONS, L. S., 2005; SIQUEIRA; TEIXEIRA, 2012).

    Avaliando-se a atividade eletromiogrfica de superfcie de PGs miofasciais com o

    objetivo de detectar alteraes da sua atividade neuromuscular em situaes de repouso e

    contrao isomtrica voluntria mxima (CIVM), concluiu-se que a melhor situao para se

    detectar a atividade muscular dessas regies a de repouso. Nessa situao, o sinal

    eletromiogrfico em PGs mostrou-se significativamente maior do que nas demais reas no

    afetadas de msculos nos indivduos com dor e nos indivduos do grupo controle. Por fim, os

  • 46

    PGs ativos exibiram maior intensidade do sinal do que os latentes, do mesmo modo que os

    que apresentaram fenmenos autonmicos (BIGONGIARI et al., 2008).

    Por outro lado, Manfredini e colaboradores (2013) estudaram os achados da EMGs em

    pacientes com DMF unilateral, em comparao com seu lado sem dor. O quadro de dor foi

    caracterizado como crnico, e o diagnstico de DMF dos pacientes baseou-se no RDC/TMD.

    Foi possvel concluir que, na EMGs realizada com os equipamentos disponveis

    comercialmente, no houve diferena detectvel entre o lado com dor e o sem dor de um

    mesmo indivduo, e sugeriu-se que mecanismos de mediao central da dor podem estar

    envolvidos na explicao desse achado.

    Determinando-se, por meio da EMGs, a atividade dos msculos mastigatrios durante o

    sono em pacientes com DTM miofascial, ficou evidenciado que a atividade eletromiogrfica

    elevada, em funo do bruxismo do sono nesses pacientes, se constitui num caminho para o

    melhor entendimento da causa e da perpetuao da DMF em DTM (RAPHAEL et al., 2013).

    A EMGs, portanto, representa um recurso relevante em virtude da possibilidade de

    serem obtidas valiosas informaes sobre a fisiologia muscular, in vivo, podendo contribuir

    para o diagnstico diferencial e o monitoramento de possveis disfunes, mas, sobretudo,

    para determinar a evoluo de tratamentos empregados.

    4.6 TERMOGRAFIA

    Conhecida popularmente como termografia, a imagem infravermelha (IV) obtida pela

    captao, sem contato, da radiao infravermelha emitida por todos os corpos acima do 0K,

    ou zero absoluto, que corresponde a -273C. O infravermelho uma faixa do espectro

    eletromagntico no visvel ao olho humano e est relacionado com o grau de agitao

    molecular. O exame por imagem IV um mtodo diagnstico que proporciona uma imagem

    da distribuio trmica da superfcie alvo, capaz de captar, nos termovisores mais modernos,

    diferenas de temperaturas por volta de 0,05C (BRIOSCH et al., 2007). Essa tecnologia j

    vastamente empregada na indstria e na manuteno de sistemas eltricos, entre outros, vem

    crescendo em aplicabilidade na rea biolgica como, por exemplo, em Medicina (avaliao

    em neuropatia diabtica, em cncer de mama), Veterinria, Odontologia.

    Os estudos sobre a aplicabilidade da termografia na rea mdica foram iniciados por

    volta de 1952, na avaliao de mama com cncer pelo Dr. Ray N. Lawson. At incio dos

  • 47

    anos 80, as imagens ainda possuam baixa resoluo espacial, e os sensores tinham baixa

    sensibilidade trmica, mas, a partir dessa dcada, a tecnologia para captao da imagem IV

    tem evoludo muito e os progressos na resoluo, sensibilidade, portabilidade e capacidade de

    leitura sem contato permitiram grandes avanos em pesquisas (HADDAD, 2011).

    O fator predominante no padro termogrfico de animais e seres humanos o sistema

    circulatrio, com alteraes no fluxo sanguneo influenciando na obteno de imagens hiper-

    radiantes, implicando temperaturas mais elevadas, ou, ao contrrio, imagens hiporradiantes.

    Trata-se de um mtodo diagnstico seguro, indolor, sem radiao ionizante, sem contato, sem

    contraste, que evidencia tanto a atividade circulatria cutnea, por sua perfuso, quanto a

    atividade do sistema neurovegetativo simptico. A imagem obtida est relacionada com a

    camada drmica ou profundidade de at 6 mm, contudo, podem ser avaliadas estruturas mais

    profundas em funo dos reflexos neurovegetativos somatossomticos ou vscerocutneos

    (BRIOSCH et al., 2007; DIAKIDES; BRONZINO; PETERSON, 2012).

    Cuidados especiais como evitar a exposio ao sol, o uso de cremes, bloqueadores

    solares e descongestionantes nasais, o consumo de bebidas alcolicas, entre outros, nas 48

    horas que antecedem o exame, alm de ambiente adequado, com temperatura, umidade e

    ventilao controladas, so essenciais para evitar artefatos de imagem. consenso que as

    regies homlogas do corpo so consideradas semelhantes em ambiente termoneutro, com

    uma margem para pequenas diferenas em torno de 0,3C. Podem ser empregadas

    diferentes paletas de cores para a imagem captada pelo termovisor, mas a mais utilizada na

    rea de sade a arco-ris, na qual branco/vermelho indicam temperaturas mais altas, e

    azul/preto, temperaturas mais baixas (BRIOSCH et al., 2007).

    H pouco mais de duas dcadas, estudos vm sendo realizados com o intuito de

    investigar a aplicabilidade da termografia na avaliao de PGs. Diakow (1992) investigou a

    diferena entre PGs ativos e latentes, concluindo que a termografia pode ser uma ferramenta

    til nessa distino. J Swerdlow e Dieter (1992) avaliaram a sensibilidade e a especificidade

    da termografia mdica na documentao de PGs miofasciais e, com base em seus resultados,

    sugeriram que os hot spots (pontos quentes), observados na parte superior das costas, no

    esto associados a PGs ativos. Por outro lado, diferenas trmicas maiores ou iguais a 0,5C

    entre o PG miofascial e seu ponto simtrico do lado oposto so consideradas de relevncia

    diagnstica (BRIOSCH et al., 2007).

    Em funo dos avanos na qualidade da imagem adquirida pelos termovisores, o

    exame por imagem IV vem sendo sugerido como diagnstico auxiliar de PGs miofasciais, por

    se ter constatado que os mesmos produzem imagens caractersticas frequentemente chamadas

  • 48

    de hot spots ou reas hiper-radiantes, constituindo uma rea discoide, isotrmica, podendo se

    apresentar de forma isolada, confluente ou multifocal (BALBINOT, 2006; BRIOSCH et al.,

    2007). Mas existem tambm relatos de obteno de cold spots (pontos frios) ou reas

    hiporradiantes associadas regio de PG (HADDAD, 2011; HADDAD; BRIOSCHI; ARITA,

    2012). O mecanismo fisiopatolgico envolvido nessas imagens ainda no foi totalmente

    elucidado, mas importante que se tenha em mente que hot spots podem ser visualizados

    tambm, a ttulo de exemplos, em funo de disfunes articulares ou inflamaes

    subcutneas localizadas, reiterando-se a relevncia do histrico e do exame clnico