51
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO NAYANNE MEDEIROS NÓBREGA JORNALISMO UM DISCURSO INTERTEXTUAL: Uma análise das estratégias enunciativas da revista Veja sobre o escândalo do Mensalão. João Pessoa 2012

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE … · saber: a Análise do Discurso e a Intertextualidade. No primeiro método, baseamo-nos em autores como Dominique Maingueneau, EniOrlandi

  • Upload
    vankhue

  • View
    213

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO

NAYANNE MEDEIROS NÓBREGA

JORNALISMO UM DISCURSO INTERTEXTUAL:

Uma análise das estratégias enunciativas da revista Veja sobre o escândalo do

Mensalão.

João Pessoa

2012

NAYANNE MEDEIROS NÓBREGA

JORNALISMO UM DISCURSO INTERTEXTUAL:

Uma análise das estratégias enunciativas da revista Veja sobre o escândalo do

Mensalão

Trabalho apresentado à Universidade Federal

da Paraíba, em cumprimento às exigências para

obtenção do título de Bacharel em

Comunicação Social, habilitação Jornalismo.

Orientador: Prof. Dr. Wilfredo Maldonado.

João Pessoa

2012

NAYANNE MEDEIROS NÓBREGA

JORNALISMO UM DISCURSO INTERTEXTUAL:

Uma análise das estratégias enunciativas da revista Veja sobre o escândalo do

Mensalão

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

banca examinadora do Curso de Comunicação

Social da Universidade Federal da Paraíba, em

cumprimento às exigências para obtenção do

título de Bacharel em Comunicação Social,

habilitação Jornalismo.

Banca Examinadora: Nota

_______________________________________________________ ______

Prof. Dr. WILFREDO JOSÉ DE JESUS MALDONADO DIAZ

_______________________________________________________ ______

Prof. Dr. EDONIO ALVES DO NASCIMENTO

_______________________________________________________ ______

Prof. Ms. CARLOS MAGNO PEREIRA FERNANDES

Média: ___________

Aprovado em: _______ de ________________ de 2012

Dedico este trabalho aos meus pais, Joabson Nóbrega e

Ramberlita, por todo o apoio, amor e carinho destinado a mim

durante toda esta longa trajetória, iniciada com minha vida

escolar.

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, que está presente em minha vida em todos os

momentos, guiando-me mesmo quando parece não haver caminho a ser tomado. No decorrer

desta monografia Ele deu-me forças e discernimento para vencer os obstáculos por mim

mesmo construídos e chegar até aonde estou, com orgulho e com a sensação de dever

cumprido.

Em segundo lugar, preciso agradecer a Ramberlita Morais, uma grande amiga e mãe

que sempre esteve ao meu lado. Agradeço também a Matheus Ávila, meu noivo, que me

apoiou no decorrer desse trabalho, entendendo minha ausência em prol da sua conclusão.

De igual forma, registro aqui todo meu agradecimento e carinho à Edvirgens Morais,

minha tia e professora, em quem me espelho em tamanha competência e dedicação por anos

à educação e principalmente por ter me ajudado com toda paciência com esse material.

Por fim, agradeço aos colegas de turma pelos desabafos desesperados de pré-

concluintes; aos professores Carlos Magno, Edonio Alves, Carmélio Reynaldo, Welligton

Pereira, Lívia Cirne, Luís Mousinho e SuellyMaux responsáveis por boas lembranças de

meu período acadêmico; ao meu orientador, Wilfredo Maldonado, pela paciência e

dedicação durante esses meses; e a todos os que contribuíram, de forma direta ou indireta,

para a realização de mais está conquista.

“A política no país é pura decepção,

Um escândalo abafa o outro e ninguém vai pra prisão

E a onda do momento é o maldito mensalão.

Estou vivendo estressado,

Quase louco alucinado,

Pego duro no batente e todo mês eu sou roubado"

Gabriel o Pensador

RESUMO

O objetivo principal desta monografia é analisar, através da Análise do Discurso, as

estratégias enunciativas utilizadas pela revista Veja em quatro capas, cujas matérias de

destaque dizem respeito à cobertura do escândalo do Mensalão. A Veja foi a primeira revista

a tratar sobre o assunto, em 2005, ano da descoberta das corrupções política envolvidas no

Mensalão. Então, é de fundamental importância entendermos de que forma seus discursos

são construídos e qual o sentido eles dão aos fatos. Neste processo, são trazidos à discussão

conceitos como Sensacionalismo, espetáculo, interesse público, interesse do público e

valores-notícia, os quais servem como suporte aos estudos aqui empreendidos.

Palavras-chave: Revista Veja. Mensalão. Análise do Discurso. Intertextualidade.

Sensacionalismo.

ABSTRACT

The main objective of this paper is to analyze, through discourse analysis, enunciative

strategies used by Veja magazine in four cases, whose outstanding matters relating to the

coverage of the scandal Mensalão. The Veja magazine was the first to treat on the subject in

2005, the year of discovery of the corruption involved in politics Mensalão. So, it is of

fundamental importance to understand how their discourses are constructed and what

meaning they give to the facts. In this process, are brought out concepts like Sensationalism,

spectacle, public interest, public interest and news values, which serve as support to the

studies undertaken here.

Keywords: Veja Magazine. Mensalão. Discourse Analysis. Intertextuality. Sensationalism.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Capa da Revista Veja – Edição 1908 ................................................................. 31

Figura 2 – Capa da Revista Veja – Edição 1911 ................................................................. 34

Figura 3 – Capa da Revista Veja – Edição 1920 ................................................................. 37

Figura 4 – Embalagem do Sabão Omo ................................................................................ 37

Figura 5 – Capa da Revista Veja – Edição 1923...................................................................40

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................................. 12

2.1. Histórico do Jornalismo de Revista .............................................................................. 12

2.2. O Surgimento das Revistas no Brasil ........................................................................... 13

2.3. A Revista Veja .............................................................................................................. 15

2.4. Interesse público x interesse do público ....................................................................... 16

2.5. Os valores-notícia na construção do discurso jornalístico............................................ 17

3 PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS ..................................................................... 18

3.1. Análise do discurso ....................................................................................................... 19

3.1.1. Características do discurso .........................................................................................22

3.2 Intertextualidade...............................................................................................................24

3.2.1. Surgimento da Intertextualidade...................................................................................25

3.2.2. Definição de Intertextualidade e Interdiscurso.............................................................26

4 O CONTEXTO DA PESQUEISA....................................................................................28

5 ANÁLISE DAS REVISTAS ...........................................................................................30

5.1. Edição 1908 ...................................................................................................................31

5.2. Edição 1911 ...................................................................................................................34

5.3. Edição 1920 ...................................................................................................................37

5.4. Edição 1923 ...................................................................................................................40

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................43

7 REFERÊNCIAS ..............................................................................................................47

.

10

1. INTRODUÇÃO

A mídia comercial lida diariamente com dois propósitos basilares: informar e vender.

Tendo em vista o grande número de publicações impressas no país, bem como os outros

meios de comunicação de massa, as empresas jornalísticas – e principalmente as revistas –

precisam utilizar estratégias que lhes deem credibilidade e, por consequência, públicos fiéis

que garantam a viabilidade financeira do veículo.

Nesse sentido, esta monografia tem por finalidade perceber de que forma a maior

revista semanal de informação do país, a Veja, constrói seu discurso na cobertura do

escândalo do Mensalão, através da análise das estratégias enunciativas presentes em quatro

capas: a edição 1908, de 8 de junho de 2005; a 1911, de 29 de junho de 2005; a 1920, de 31

de agosto de 2005; e a 1923, de 21 de setembro de 2005.

Escolhemos a temática política por se tratar de um assunto de grande impacto social

e que desperta grande interesse. Já a opção pela Veja deu-se por ela ter sido a primeira

revista a tratar de um dos maiores escândalo político da história do Brasil. Porém não o

maior, levando em consideração outros casos, como o da Ditadura Militar de 1964 e o do

impeachment de Collor, e ainda o “suicídio” de Getúlio Vargas.

Definidos, assim, o problema de pesquisa a ser estudado e o corpus, propusemo-nos

a entender qual o sentido que essas estratégias dão aos fatos, analisando através da Análise

do Discurso. Antes disso, porém, a fim de que a análise se fundamentasse em bases sólidas,

o primeiro capítulo traz um breve relato sobre a história do jornalismo em revista no mundo

e no Brasil e a biografia do artista em meio ao contexto social, mostrando suas

características, ferramentas e especialidades ao longo do tempo, até o nascimento da Veja,

que é o objeto empírico dessa pesquisa.

No segundo capítulo, descrevemos as metodologias utilizadas nesta pesquisa, a

saber: a Análise do Discurso e a Intertextualidade. No primeiro método, baseamo-nos em

autores como Dominique Maingueneau, EniOrlandi e Milton Pinto. No segundo, no

pensamento de Julia Kristeva, Mikhail Bakhtin, Koch, Bentes e Cavalcante, Umberto Eco,

Helena Brandão, Diana Luz Pessoa de Barros e José Luiz Fiorin.

Dessa forma, munindo-nos dos fundamentos teóricos necessários, reservamos o

terceiro capítulo para nossa análise, dividindo-o em quatro tópicos, onde trabalhamos

separadamente cada edição de nosso corpus.

Na última parte do trabalho, as Considerações Finais, relacionamos nossos resultados

analíticos com o resgate teórico trazido por nós durante a fundamentação.

11

É importante ressaltarmos, contudo, que, com este estudo, não buscamos encontrar

conclusões definitivas. Por outro lado, esperamos estar contribuindo com o campo da

comunicação ao trazer novas reflexões acadêmicas acerca desse tema, que movimenta tanto

o interesse público e que, portanto, carece de discussões e aprofundamentos contínuos.

12

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1. Histórico do Jornalismo de Revista

O Jornalismo tem suas raízes com a invenção da imprensa, através de Johannes

Gutenberg, em 1447. Apesar de ter sido disseminada rapidamente a partir da segunda

metade do século XV, a imprensa só inaugura o fazer jornalístico impresso periódico nos

primeiros anos do século XVII.

A primeira revista de que se tem notícia, de acordo com Marília Scalzo (2004, p. 19)

foi publicada em 1663, na Alemanha: trata-se da ErbaulicheMonaths-

Unterredungen(Edificantes Discussões Mensais). Segundo a autora, “tinha cara e jeito de

livro e só era considerada revista porque trazia vários artigos sobre um mesmo assunto –

teologia – e era voltada para um público específico.” (Idem).

Em seguida, surgem o francês JournaldesSavants, em1665, o italiano Giornali dei

Litterati, em 1668, e o inglês Mercurius ou FaithfullAccountofAll Books andPamphlets, em

1680, embora, à altura, nenhuma dessas publicações levasse o nome “revista”. Esse termo só

veio a designar o novo tipo de jornalismo ascendente pouco depois, em 1704, em referência

às lojas da época, conhecidas como magazines, que vendiam um pouco de tudo.

Com a missão de destinar-se a públicos específicos e aprofundar os assuntos mais

que os jornais e menos que os livros, as revistas expandiram-se para os Estados Unidos,

onde, ao final do século XVIII, já havia cerca de cem diferentes publicações.

Ao longo do século XIX, a revista ganhou espaço, virou e ditou moda. [...]

Com o aumento dos índices de escolarização, havia uma população

alfabetizada que queria ler e se instruir, mas não se interessava pela

profundidade dos livros, ainda vistos como instrumentos da elite e pouco

acessíveis. Com o avanço técnico das gráficas, as revistas tornaram-se o

meio ideal, reunindo vários assuntos num só lugar e trazendo belas

imagens para ilustrá-los. [...] A revista ocupou assim um espaço entre o

livro (objeto sacralizado) e o jornal (que só trazia o noticiário ligeiro).

(Scalzo, 2004, p. 20)

Com o tempo, as revistas passaram a segmentar seus públicos, copiando modelos de

sucesso, como o uso de ilustrações e o caráter multitemático. Assim, podia-se ver, já no

13

século XIX, publicações voltadas à mulher, à ciência, entre outros, as quais se utilizavam de

uma estética visual agradável e chamativa.

Porém, como afirma Scalzo (Ibid, p. 22), na história da imprensa, “talvez nada tenha

contribuído tanto para o progresso do gênero como o nascimento da primeira revista

semanal de notícias”. A revista norte-americana Time se predispunha a reunir informações

da semana, do país e do mundo em uma só edição, trazendo um texto conciso e sistemático,

de forma a objetivamente atender à demanda por notícias. É desse modelo que nasce a

revista Veja, nosso objeto empírico, sobre o qual falaremos mais adiante.

2.2. O Surgimento das Revistas no Brasil

No Brasil, as primeiras revistas datam do início do século XIX. Tal como no resto do

mundo, nem sempre elas tiveram o caráter jornalístico atual nem o compromisso noticioso

com os fatos, pois, em nosso caso, como a imprensa foi trazida pela Corte portuguesa, estava

subordinada direta e indiretamente aos interesses da família Real.

Conforme Patrícia Nascimento (2002), essas publicações foram, por muito tempo,

tidas como “ensaios” ou “folhetos”. Muitas relatavam viagens, material literário, erudições,

tal como a primeira delas, As Variedades ou Ensaios de Literatura, de 1812.

Quem chamaria aquilo de revista? Nem mesmo seu editor, o tipógrafo e

livreiro português Manoel António da Silva Serva: ao colocá-las à venda,

em Salvador, no mês de janeiro de 1812, Silva Serva apresentou As

Variedades ou Ensaios de Literatura como “folheto” – embora o termo

“revista” já existisse desde 1704, quando Daniel Defoe, autor de Robinson

Crusoe lançou em Londres A WeeklyReviewoftheAffairsof France. (Abril,

2000 apud Nascimento, 2002, p. 16).

Em 1827, surge a primeira revista segmentada do país: O Propagador das Ciências

Médicas, órgão da Academia de Medicina do Rio de Janeiro. Em seguida, aparecem outros

títulos especializados, porém são todas publicações de vida curta. A situação só se

transforma quando, a exemplo das magazineseuropéias, é lançada no Brasil a Museu

Universal. Linguagem acessível aos recém-alfabetizados, temas culturais e ilustrações foram

suficientes para arraigar leitores e conseguir manter-se. Scalzo (2004, p. 28) assinala que,

logo depois, a fórmula é copiada por Gabinete da Leitura, Ostensor Brasileiro, Museu

14

Pitoresco, Histórico e Literário, Ilustração Brasileira, entre outros nomes. Nova tendência

se torna o uso do humor e de textos mais leves, conforme inaugurou A Marmota na Corte,

de 1849, que, além disso, é também responsável por ser o protótipo nacional das revistas de

variedades.

O início do século XX é marcado por avanços tecnológicos que resultam em grandes

transformações no universo jornalístico. Com o avanço das gráficas, as páginas conseguem,

como nunca antes visto no país, apresentar design sofisticado que alia linguagem visual e

textual harmonicamente. Também nessa época, os jornais passam por um processo de

reformulação, a literatura foi sendo separada do universo noticioso. Vai acabando-se assim,

paulatinamente, a era dos romances de folhetim. Nesse momento, “as revistas começam a

ganhar definição e espaço diferenciado em relação aos jornais” (Nascimento, 2002, p. 16).

Outra revista de destaque foi A Revista da Semana, de 1900, pioneira na utilização

sistemática de fotos (Scalzo, 2004, p. 29), a Fon-fon, de 1907, a Careta, de 1908, e, pouco

mais à frente, a Klaxon, de 1922, a qual divulgava os ideais da Semana de Arte Moderna

realizada naquele mesmo ano. Porém a revista de maior sucesso foi à revista O Cruzeiro,

lançada em 1928, pelo jornalista e empresário paraibano Assis Chateaubriand. Esta é a

primeira publicação a dar especial atenção a grandes reportagens e ao fotojornalismo.

Considerada como pioneira na reportagem, a revista, que circulou até 1975,

consolidou-se no gênero com a dupla Jean Manzon e David Nasser, nos

anos 40: a dupla peregrinava por um Brasil desconhecido e retornava com

fotos e histórias sensacionais. (Abril, 2000 apud Nascimento, 2002, p. 17).

Com as mesmas intenções, aparece em 1952 a Manchete, que sobrevive até a década

de 1990. Em 1966, começa a circular a revista Realidade, da Editora Abril, considerada, até

hoje, um dos maiores sucessos editoriais brasileiros. Apesar disso, o sucesso da revista só

durou dez anos. Embora tenha reunido excelente equipe que levava meses apurando cada

informação, a fim de levar seus ideais de verdade ao país que vivia sob a ditadura militar.

Segundo Scalzo (2004, p. 17), como os gastos com impressão e pessoal passaram a crescer,

dada a dimensão que ela havia tomado, não havia como conter os prejuízos. Fechou em

1976, dando seu lugar de destaque àVeja, também da Abril, inspirada na revista americana

Time, criada em 1922 por Henry Luce.

15

2.3. A Revista Veja

A Veja é hoje a revista mais vendida e a mais lida do Brasil. Segundo Scalzo (2004),

é a única revista semanal de informação no mundo a desfrutar de tal situação. “Em outros

países, revistas semanais vendem bem, mas nenhuma é a mais vendida – esse posto

geralmente fica com as revistas de tevê” (p. 31). A vendagem supera um milhão de

exemplares a cada edição.

Segundo a Redação da Revista Veja (informação oral)1,

A missão da Veja é ser a maior e mais respeitada revista do Brasil. Ser a

principal publicação brasileira em todos os sentidos. Não apenas em

circulação, faturamento publicitário, assinantes, qualidade, competência

jornalística, mas também em sua insistência na necessidade de consertar,

reformular, repensar e reformar o Brasil. A Veja existe para que os leitores

entendam melhor o mundo em que vivemos.

Sua primeira edição foi às bancas no dia 11 de setembro de 1968, refletindo as

preocupações da época: “O grande duelo no mundo comunista” era a capa. Scalzo (2004, p.

31) afirma que “a Veja lutou com dificuldade, durante sete anos, contra os prejuízos e

contra a censura do governo militar, até acertar sua fórmula. As vendas começaram a

melhorar quando a revista passou a ser vendida por assinatura, em 1971”.

Entre os princípios elencados pela própria Veja, uma linha editorial a favor da

verdade e da informação qualificada ao leitor, com total independência,

liberdade, credibilidade e exatidão no que publica. Atualmente, ainda segundo a Redação, é

a terceira maior revista semanal de informação do mundo, sendo superada apenas pelas

americanas Time e Newsweek.

De acordo com informações disponíveis no site da Editora Abril2, a projeção do

número de leitores é de cerca de 8,8 milhões. Entre eles, 57% são mulheres e 43% são

homens. 78% estão na faixa etária dos 25 aos 44 anos de idade e acima dos 50. A

predominância é de pessoas das classes A (20%), B (53%) e C (24%), sendo a maioria da

região Sudeste do país (58%).

1 Informação obtida através de ligação, em resposta a questionamento realizado em 2 de outubro de 2012.

2 Disponível em: <http://www.publiabril.com.br/marcas/veja/revista/informacoes-gerais> Acesso em 2 de

outubro de 2012.

16

Traçado, assim, o perfil dos leitores, é visível que o público da Veja é escolarizado,

tem acesso a informações em diversos locais, haja vista a idade e classe social, portanto lê a

revista, um público capaz de analisá-la com um teor crítico, capaz de refletir a notícia e suas

imagens.

2.4. Interesse público x interesse do público

Pode-se dizer que hoje, dentro do universo jornalístico, a questão da imparcialidade é

um dos maiores desafios existentes. Sabe-se que as empresas jornalísticas, assim como

qualquer outra, têm também um caráter comercial, portanto é provável que haja interesses

alheios à simples transmissão de informações, uma vez que a conquista e manutenção de

públicos é essencial para a própria vida do veículo.

Kovach e Rosenstiel (2004, p. 9) afirmam que “a principal finalidade do jornalismo

é fornecer aos cidadãos a informação de que precisam para serem livres e se

autogovernarem”. Dizem ainda que “a sua primeira obrigação é com a verdade, e aqueles

que exercem a profissão devem ser livres de seguir a sua própria consciência”.

Seguindo essa ideia de jornalismo como serviço público, Anamaíra Souza (2009, p.

5) define o primeiro conceito a ser trabalhado neste tópico: o interesse público. “[o interesse

público] consiste no suprimento por parte, principalmente, do jornalismo, de informações

relevantes e indispensáveis ao contexto sócio-político-econômico que envolve o espectador.

Em outras palavras, é o que eles devem saber”. O interesse público está garantido na

Constituição. “o Estado existe para servir aos indivíduos e não o indivíduo para servir ao

Estado” (Schneider, 1991 apud Schier, 2003).

Se, por um lado, parece fácil conceituarmos o interesse público e defendê-lo como

essencial à formação da sociedade, por outro, a mídia tem tido dificuldades em lidar com o

segundo conceito a ser trabalhado: o interesse do público. Souza (2009, p. 5) define-o como

“aquilo que desperta a atenção [do leitor] e supre sua curiosidade”. Fofocas sobre

famosos, escândalos, acusações sem provas e polêmicas são bons exemplos.

Diferente do interesse público, que é garantido constitucionalmente pelos princípios

do Estado Moderno, o interesse do público pode ferir os direitos fundamentais do cidadão, a

exemplo da privacidade, por isso é fundamental o entendimento de que “o que se deve levar

em consideração é o bem-estar da coletividade, e não a curiosidade popular”. (Basto,

2008).

17

Goulart (2006) polemiza ainda mais a questão, aproximando esta realidade aos

limites de nossa pesquisa:

Diferentemente do jornal, a revista funde informação, educação, serviço e

entretenimento. E aqui reside um grande conflito, porque a revista não

parte apenas do interesse público para decidir o que vai ser notícia, mas

parte do interesse do público. [...] A revista é mais conotativa, opinativa,

literária, sensacionalista; publica coisas que não seriam notícia em jornal;

isso porque a notícia, em revista, passa a ser também o que é de interesse

do público, seu foco é no leitor, no seu assinante sobretudo. E nesse sentido

o jornalista é pago para escrever sobre aquilo que o leitor deseja.

2.5. Os valores-notícia na construção do discurso jornalístico

Como afirmamos, as notícias de interesse público, bem como as de interesse do

público, não são arbitrariamente decididas por mero instinto jornalístico. Tendo em vista

que, assim como qualquer outro veículo midiático, a revista dispõe de um espaço limitado a

cada edição, informar o leitor com os acontecimentos mais relevantes dentro de um

determinado período de tempo é a função principal do jornalista, uma vez que é impossível

cobrir todos os fatos ocorridos.

A partir dessa necessidade de delimitação no processo de seleção de notícias, a fim

de hierarquizá-las por grau de importância/relevância, surgiram os critérios de

noticiabilidade, também conhecidos como valores-notícia. De forma peculiar, eles traçam

linhas de interesse e atributos baseadas em uma determinada cultura/sociedade para orientar

o trabalho jornalístico, definindo o que tem maior potencial noticioso.

Mauro Wolf (2003 apud Silva, 2005) define os valores-notícia como “critérios de

relevância difundidos ao longo de todo o processo de produção [que] estão presentes tanto

na seleção das notícias como também permeiam os procedimentos posteriores, porém com

importância diferente”. Isto quer dizer que esses critérios de noticiabilidade não são

esquecidos no momento em que se faz a triagem do que será veiculado em determinado

momento, mas continuam a ter sua essencialidade no decorrer do processo de transformação

do material bruto até o trabalho final, orientando o jornalista na organização desse conjunto

de informações, guiando-lhe, por exemplo, na escolha de qual matéria terá maior destaque.

18

Com fins didáticos, Silva (2004, p. 103) define os valores-notícia em sete macro

grupos: atualidade, importância, interesse, negativismo, imprevisibilidade, coletividade e

repercussão. Estes critérios vão ao encontro da razão de ser do jornalismo, isto é, dizem

respeito à informação atual, relevante e essencial para a população.

Depois desta primeira divisão, Silva (Idem) aponta alguns subgrupos: impacto,

proeminência, conflito, curiosidade, polêmica, conhecimento, raridade, proximidade,

tragédia/drama, Governo e Justiça.

É preciso ressaltar que esses critérios não estão isolados. Pelo contrário, um

acontecimento pode ter uma relevância tal, que reúna inúmeras dessas características. No

caso de nosso objeto de estudo, um escândalo político, ele possui altíssimo valor-notícia, já

que se trata de um tema que diz respeito à coletividade e de grande repercussão.

3. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS

Recursos visuais e/ou verbais compõem a capa de uma revista. Tais recursos servem

para dar sentido e sintetizar o conteúdo da edição, ao mesmo tempo em que têm o objetivo

de consolidar uma estratégia que garanta ao veículo despertar interesse em seu público

potencial.

No caso da Veja, cuja circulação semanal supera um milhão de exemplares, fato que

a coloca entre as três maiores revistas do mundo3, o trabalho de elaboração dos enunciados

têm grande poder interpretativo e é capaz de produzir diferentes possibilidades dentro do

campo comunicacional, tendo em vista que o processo de significação não é objetivo ou

absoluto. Como diz Umberto Eco, não existe verdade absoluta.

Com o intuito de nos aprofundarmos dentro do campo da significação e das nuances

que esses enunciados podem causar, utilizar-nos-emos de dois conceitos analíticos que

norteiam esta monografia: a Análise do Discurso e Intertextualidade. Os dois métodos,

entretanto, não entrarão em conflito. Pelo contrário, ambas as correntes serão aliadas no

processo de identificação do sentido produzido pelo veículo no tratamento da informação

relativa ao nosso objeto de estudo.

3 Informação disponível em: <http://www.publiabril.com.br/marcas/veja/revista/informacoes-gerais> Acesso

em 2 de outubro de 2012.

19

3.1. Análise do discurso

A Análise do Discurso (AD) refere-se a um conjunto de procedimentos analíticos

que envolvem diferentes saberes e práticas do conhecimento. Ela foi utilizada e discutida

com maior ênfase a partir da segunda metade dos anos 60. Utilizando a AD, buscamos a

dinâmica interna do pensamento e seus efeitos sociais de conhecimento e convencimento da

produção do discurso.

Nos anos 90, a AD centra a sua preocupação no “receptor”, naquele que recebe e

decodifica um signo, e para quem é organizada ou codificada uma mensagem. A Análise do

Discurso não propõe que exista apenas uma forma de leitura de um texto. E sim, decodificar,

desvendar, atribuir sentidos e valores cognitivos a um código. Segundo Milton José Pinto

(2002), a AD francesa substituiu a Semiologia no seu percurso intelectual. As teorias e

metodologias que sustentam a análise de discursos vêm sendo desenvolvidas no interior da

semiologia ou semiótica. Semiótica social ou semiologia dos discursos sociais.

Essa pesquisa é apoiada nas ideias da Análise do Discurso Francesa. Pinto, afirma

que toda AD tem o mesmo princípio fundamental: partir da textura- marcas formais da

superfície textual que são indícios da presença do social- do texto para a contextualização. É

na superfície dos textos que podem ser encontradas as pistas ou marcas deixadas pelos

processos sociais de produção de sentidos que o analista vai interpretar. O analista de

discursos é uma espécie de detetive sociocultural.

A análise discursos não se interessa tanto pelo que o texto diz ou mostra,

pois não é uma interpretação semântica de conteúdos, mas sim em como e

por que diz e mostra. Costumo dizer que ela interessa explicar os modos de

dizer. (Pinto, 2002, p.27).

A AD busca problematizar as maneiras de ler, levar o sujeito falante ou o leitor a se

colocarem questões sobre o que produzem e o que ouvem nas diferentes manifestações da

linguagem. Saber que não há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano

dos signos. Portanto, a AD nos coloca em estado de reflexão. Uma proposta de reflexão

sobre a linguagem, sobre a história e a ideologia. A Análise do Discurso define os discursos

como práticas sociais determinadas pelo contexto sócio-histórico. A função das ideologias

como constitutivas da produção/reprodução dos sentidos sociais tem papel fundamental na

AD.

20

A Análise do Discurso trata, portanto, do discurso. Para Orlandi (2010, p.15): O

discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso

observa-se o homem falando.

A Análise do Discurso, portanto, relaciona a linguagem à sua exterioridade,

trabalhando a relação língua-discurso-ideologia, com diz M. Pêcheux (1975, apud Orlandi,

2010, p.17): Não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia: o indivíduo é

interpelado em sujeito pela ideologia e é assim que a língua faz sentido.

A Análise do Discurso considera que a linguagem não é transparente, ela procura

extrair sentido dos textos. Assim como, também, ela considera que o discurso não é linear,

não segue um padrão. De acordo com Orlandi:

A linguagem serve para comunicar e para não comunicar. As relações de

linguagem são relações de sujeito e de sentidos, e seus efeitos são

múltiplos e variados. Daí a definição de discurso: o discurso é efeito de

sentidos entre locutores. (Orlandi, 2010, p.21).

A Análise do Discurso coloca a interpretação em questão, trabalhando seus

limites, seus mecanismos como parte dos processos de significação.

Os dizeres não são como dissemos, apenas mensagens a serem

decodificadas. São efeitos de sentidos que são produzidos em condições

determinadas e que estão de alguma forma presentes no modo como se diz.

(Orlandi, 2010, p.30).

Pinto, afirma que para a AD, todo texto é híbrido ou heterogêneo quanto à sua

enunciação, no sentido de que ele é sempre um tecido de “vozes” ou citações, cuja autoria

fica marcada ou não, vindas de outros textos preexistentes, contemporâneos ou do passado.

Pinto chama essa interação de plural de textos de heterogeneidade enunciativa, Mikhail

Bakhtin (2005) chama de polifonia, e outros autores preferem chamar de intertextualidade.

O entrelaçamento de citações vistos como discursos foi denominado de dialogismo por

Mikhail Bakhtin.

Já para Orlandi, a análise do discurso consiste em considerar tudo o que é dito e

entender o que está por trás do que foi dito, inclusive o que não foi dito. Ela diz que a

Análise do Discurso:

21

Consiste em considerar o que é dito em um discurso e o que é dito em

outro, o que é dito de um modo e o que é dito de outro, procurando escutar

o não-dito naquilo que é dito, como uma presença de uma ausência

necessária. (Orlandi, 2010, p.34)

Por isso, pode-se concluir, a partir da análise feita por Orlandi, dizendo que a

incompletude discursiva é a condição da linguagem, nem os sujeitos, nem os sentidos, logo,

nem o discurso estão prontos e acabados. Não existe discurso que não se relacione com

outros. Já Foucault (1970) caracteriza o discurso como:

O discurso nada mais é do que a reverberação de uma verdade nascendo

diante de seus próprios olho; e, quando tudo pode, enfim, tomar a forma do

discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser dito a propósito de

tudo, isso se dá porque todas as coisas, tendo manifestado e intercambiado

seu sentido, podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de si.”

(Foucault, 1970, p.49)

Assim, permitindo que o receptor do discurso produza uma leitura específica,

envolvendo uma subjetividade. Orlandi diz que a subjetividade é o traço da relação da língua

com a exterioridade, a ideologia faz parte do sujeito.

A Análise do Discurso não procura o sentido “verdadeiro”, mas o real do sentido

em sua materialidade linguística e história. Não há discurso fechado em si mesmo, mas um

processo discursivo do qual se pode recortar e analisar estados diferentes. Porém, não

dizemos da análise que ela é objetiva, mas que ela deve ser o menos subjetiva possível.

Por fim, podemos dizer que a Análise do Discurso visa compreender como um

objeto simbólico produz sentidos. Quanto à natureza da linguagem, devemos dizer que a AD

interessa-se por práticas discursivas de diferentes naturezas: imagem, som, letra, etc. Ser

escrito ou oral não muda a definição do texto. Para Orlandi, o texto é texto porque significa.

Sendo assim, para a Análise do Discurso o que interessa não é a organização

linguística do texto, mas como o texto organiza a relação da língua com a história no

trabalho significante do sujeito em sua relação com o mundo.

A Análise de Discurso não procura o sentido “verdadeiro”, mas o real do

sentido em sua materialidade linguística e histórica. A ideologia não se

22

aprende, o inconsciente não se controla com o saber. A própria língua

funciona ideologicamente, tendo em sua materialidade esse jogo. Todo

enunciado [...] é linguisticamente descritível como uma série de pontos de

deriva possível oferecendo lugar à interpretação. Ele é sempre suscetível de

ser/tornar-se outro. Esse lugar do outro enunciado é o lugar da

interpretação, manifestação do inconsciente e da ideologia na produção dos

sentidos e na constituição dos sujeitos. (Orlandi, 1999, p. 59)

3.1.1. Características do discurso

Maingueneau (2004, p. 52), em sua obra Análise de Textos de Comunicação, define

algumas características do discurso. Ele define-o, primeiramente, como uma organização

situada para além da frase. Isso significa dizer que o discurso mobiliza estruturas de uma

outra ordem que as da frase, a exemplo de regras organizacionais vigentes em um grupo

social determinado.

Outra característica apontada por Maingueneau é que o discurso é orientado. Ele se

desenvolve linearmente no tempo, mesmo que, neste percurso, ele encontre desvios

ideológicos. Numa revista, por exemplo, é possível abarcar diversos assuntos, sem que seja

perdido o tema principal da publicação. O uso de operadores gramaticais e de sentido auxilia

na manutenção dessa cadeia ideológica essencial para a compreensão do público-leitor.

Um terceiro ponto acerca do discurso é que ele é direcionado a modificar uma

situação. Maingueneau afirma que esse caráter pragmático tem por objetivo produzir uma

modificação nos destinatários. Segundo ele, citando um exemplo,

a passagem de “Esta sala é um espaço reservado a não-fumantes” até a

interpretação “Não fume” [...] trata-se de procedimentos pragmáticos

porque exigem do destinatário uma análise do contexto e não somente uma

interpretação semântica, seu conhecimento da língua. Tanto em um caso

como no outro, o destinatário não é passivo: ele próprio deve definir o

contexto do qual vai tirar as informações necessárias para interpretar o

enunciado. (Maingueneau, 2004, p. 29)

A interação é outra característica levantada por Maingueneau. Ele afirma que “a

atividade verbal é [...] uma inter-atividade entre dois parceiros, cuja marca nos enunciados

23

encontra-se no binômio EU-VOCÊ da troca verbal” (Ibid, p. 53) . Em outras palavras, um

discurso sempre se mobiliza a falar com um coenunciador, mesmo que este coenunciador

não seja um alguém material ou presencial.

Toda enunciação, mesmo produzida sem a presença de um destinatário, é,

de fato, marcada por uma interatividade constitutiva (fala-se também de

dialogismo), é uma troca, explícita ou implícita, com outros enunciadores,

virtuais ou reais, e supõe sempre a presença de uma outra instância de

enunciação à qual se dirige o enunciador e com relação à qual constrói seu

próprio discurso. (Maingueneau, 2004, p. 54)

Prosseguindo, o pesquisador diz que todo discurso é assumido por um sujeito e é

contextualizado. “O ‘mesmo’ enunciado em dois lugares distintos corresponde a dois

discursos distintos” (Ibid, p. 54). Dessa forma, como dissemos anteriormente, a escolha da

estratégia discursiva em uma capa de uma determinada revista não é arbitrária, mas leva em

consideração o contexto social, o material disponível para veiculação, utilizando-se, a partir

daí, de uma linguagem direcionada a um determinado público. Esta linguagem estará de

acordo com a posição de fala deste eu, considerando também os demais interdiscursos que

compõem a vida em sociedade.

24

3.2.Intertextualidade

A intertextualidade está atrelada ao conjunto de textos e a vários contextos. Foi Julia

Kristeva, quem introduziu o conceito de intertextualidade na década de 60, ela aponta que

cada texto possui um intertexto, gerando uma corrente de textos já existentes e que ainda

existirão. Porém, esse conceito de intertextualidade já existia desde a década de 20, só que

Mikhail Bakhtin1 entendia por dialogismo.

O termo intertextualidade surgiu e foi reutilizado por Julia Kristeva em

1969 para explicar o que Mikhail Bakhtin, na década de 20, entendia por

dialogismo. Ou seja, são duas variações de termos para um mesmo

significado. Para Bakhtin, a noção de que um texto não subexiste sem o

outro, quer como uma forma de atração ou de rejeição,permite que ocorra

um diálogo entre duas ou mais vozes, entre dois ou mais discursos. (Zani,

2003, p.2.)

Podemos dizer então, que a intertextualidade se faz presente na maioria das

produções textuais e no nosso cotidiano, ela está presente no que falamos, escrevemos,

lemos ou pensamos. De acordo com Koch, Bentes e Cavalcante (2007), a intertextualidade

pode ser classificada em dois tipos: a de sentido amplo e a de sentido restrito, que se

subdividem em temática, estilística, implícita, entre outras.

Para Koch, em sentido amplo, é lícito afirmar que a intertextualidade se faz presente

em todo e qualquer texto.(1986, p.40). Ou seja, a intertextualidade está presente em tudo em

nossa volta. Todo e qualquer texto nunca é dito pela primeira vez, é sempre absorção do que

já foi dito anteriormente.

__________________________________________________________________________

1 Nota do autor: Teórico russo e um dos primeiros a abordar a questão do dialogismo, das relações

intertextuais entre obras e autores. Porém, estas relações dialógicas foram estudadas por ele somente

em literatura e linguística, em obras de François Rebelais e Dostoievski, abrindo o caminho para

outros teóricos, como Julia Kristeva, Diana da Luz, José L. Fiorin, Koch, IngedoreGrunfeld Villaça;

Cavalcanti, Mônica Magalhães; Bentes, Anna Christina, aplicassem tais relações em outras mídias.

25

Conforme Orlandi (1987),

um texto relaciona-se com outros textos dos quais nasce e para os quais

aponta seu futuro discursivo, o que caracteriza todo texto como

necessariamente incompleto. Incompletude justificada tanto pela interação

de um texto com outros textos, quanto pela sua ligação com a experiência

do leitor em relação a linguagem, seu conhecimento de mundo, à sua

ideologia, etc.

Já em sentido restrito, a intertextualidade se dá quando existe a relação de um texto

com outros textos previamente e efetivamente produzidos, ou seja, quando, em um texto,

está inserido outro texto (intertexto) anteriormente produzido. (Koch, 1997, p.108).

3.2.1. Surgimento da Intertextualidade

Para o desenvolvimento dessa pesquisa, usarei como base Koch, Bentes e Cavalcante

(2007) e Umberto Eco (2005) e outros teóricos que discorrem sobre o tema da

intertextualidade, da interpretação e superinterpretação. Além desses, utilizaremostambém

outros teóricos que discorrem sobre o tema da intertextualidade ligada à polifonia e ao

dialogismo, como Bakhtin (1986, apudKoch, Bentes e Cavalcante, 2007) e Julia Kristeva

(1969, apudKoch, Bentes e Cavalcante, 2007).

O termo intertextualidade surge oficialmente na década de 1960, com a crítica

literária Julia Kristeva que se baseou no conceito de dialogismo de Bakhtin para dizer que

cada texto se baseia em um outro texto para produzir uma sucessão de textos interligados.

Segundo Kristeva (1969, apud Koch, Bentes e Cavalcante, 2007, p.14): [...] qualquer texto

se constrói como um mosaico de citações e é absorção e transformação de um outro texto.

26

3.2.2. Definição de Intertextualidade e Interdiscurso

Bakhtin (1969 apud Koch, Bentes e Cavalcante, 2007, p.9) chega à conclusão de que

os textos estão interligados entre si, mantendo um diálogo. Para ele nenhum texto existe

isoladamente, mas dialoga com outro exercendo influência e se propagando. Koch, Bentes e

Cavalcante (2007) concordam com Bakhtin e, citando este autor, defendem que é em contato

com outros textos que o texto ganha vida, já que um texto não só ilumina outro, mas também

dialoga com ele. Helena BrandãoemBakhtin- dialogismo e construção do sentido diz que “o

discurso não se reduz a um dizer explícito, pois ele é permanentemente atravessado pelo seu

avesso que é a pontuação do inconsciente.” (Bakhtin- dialogismo e construção do sentido,

2005, p.269). Fundamentada nessas concepções observa-se a metadiscursividade, e a

heterogeneidade constitutiva de todo discurso.

Nesse quadro, instauram-se relações intersubjetivas em que o um e o outro, isto é,

falante-ouvinte, escritor-leitor, se constituem enquanto sujeitos do discurso. Onde cabe ao

leitor mobilizar seu universo de conhecimento para dar sentido. Segundo Eco, entre a

intenção do autor e o propósito do interprete existe a intenção do texto.

Koch, Bentes e Cavalcante, em seu livro Intertextualidade: diálogos possíveis, a

intertextualidade é dividida em dois tipos: a de sentido amplo (lato sensu), que é encontrada

em vários níveis de discurso e a de sentido restrito (stricto sensu), que é necessariamente

atestado por um intertexto. Na intertextualidade encontra-se o interdiscurso.

Segundo Eco, existem duas atitudes interpretativas básicas de um texto, isto é, duas

formas de decifrar, o texto como um mundo ou o mundo como um texto.

Ainda, falando de interpretação, Eco (2005, p.35) fala de uma “verdade”

interpretativa existente no texto: A verdade passa a identificar-se com o que não é dito ou

com o que é dito de forma obscura e deve se compreendido além ou sob a superfície de um

texto.

Embora Umberto Eco não se situe no quadro teórico Bakhtiniano, suas ideias a

respeito da leitura convergem com as do autor russo. Eco quando “fala” da interpretação e

da superinterpretação na verdade está “definindo” também o que é a intertextualidade e o

interdiscurso. A intertextualidade configura-se como o processo de incorporação de temas

e/ou figuras de um discurso em outro(Fiorin, 2003, p. 32).

Portanto, Fiorin explica que a interdiscursividade, como sinônimo de

intertextualidade numa perspectiva ampla e como fenômeno inerente à constituição do

discurso não significa que sejam a mesma coisa. Como explica Fiorin:

27

A interdiscursividade não implica a intertextualidade, embora o contrário

seja verdadeiro, pois, ao se referir a um texto, o enunciador se refere,

também ao discurso que ele manifesta. (Barros e Fiorin, 2003, p.35).

Sobre a intenção do autor e as possíveis interpretações de um texto Eco diz que:

Poder-se-ia dizer que um texto, depois de separado de seu autor (assim

como da intenção do autor) e das circunstâncias concretas de sua criação

(e, consequentemente, de seu referente intencionado), flutua (por assim

dizer) no vácuo de um leque potencialmente infinito de interpretações

possíveis. (Eco, 2005, p.48).

Eco, em O Papel do Leitor, enfatizou a diferença entre interpretar e usar um texto.

Segundo ele, O próprio ato da leitura é uma transação difícil entre a competência do leitor

(o conhecimento de mundo do leitor), e o tipo de competência que um dado texto postula a

fim de ser lido(Eco, 2005, p.80).

É nessa pluralidade entre discursos que se constrói uma consciência semiótica com

habilidades de leituras diferentes, onde acontece a intertextualidade. A intertextualidade é

nada mais que um diálogo entre os textos.

Tanto Koch, Bentes e Cavalcante quanto Eco tratam do diálogo entre textos e

mostram os efeitos dessa interação. A diferença entre as autoras e Eco, é que ele foca seu

estudo na interpretação e na superinterpretação e Koch, Bentes e Cavalcante discorrem

acerca dos diferentes gêneros textuais que se ligam através da intertextualidade.

28

4. O CONTEXTO DA PESQUISA

A primeira revista a divulgar o escândalo do mensalão, foi a revista Vejade edição

de número 1905 de 18 de maio de 2005. Está revista trouxe como reportagem de capa a

gravação de um vídeo no qual o ex-chefe do Departamento de Contrações e Administração

de Materiais da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (DECAM/ECT), Maurício

Marinho, solicitava e também recebia vantagem para ilicitamente beneficiar um falso

empresário. Porém, Maurício na verdade era o advogado curitibano Joel Santos Filho, o

denunciante da corrupção, que para colher prova material do crime, se passou por um

empresário interessado em negociar com os Correios.

Como visto a partir da reportagem de 18 de maio da Veja a negociação então estabelecida

com o falso empresário, Maurício Marinho expôs, com riqueza de detalhes, o esquema de

corrupção existente nos Correios. Com a capa "O vídeo da corrupção em Brasília", a revista

Veja tornou público o escândalo político, a partir da matéria da página 54, “O Homem

Chave do PTB”, referindo-se a Roberto Jefferson, o homem por trás do esquema naquela

estatal.

O Escândalo do Mensalão ou "Esquema de compra de votos de parlamentares" é o

nome dado a uma das maiores crises política da história do Brasil e que ocorreu durante o

governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2005/2006.

O vídeo públicado na revista fez com que o Procurador Geral da República na

época, Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, registrasse uma Denúncia Oficial e

encaminhasse o caso ao Supremo Tribunal Federal. O vídeo da edição de número 1905 da

Veja mostrava o ex-deputado Federal Roberto Jefferson, então Presidente do PTB,

negociando propina, em um primeiro momento com dirigentes dos Correios e suas relações

com o Governo. Nesse vídeo é possível observar com detalhes o esquema de corrupção de

parlamentares, esclarecendo que parlamentares que compunham a chamada "base aliada",

como assim foi chamada por Roberto Jefferson, recebiam, periodicamente, recursos do

Partido dos Trabalhadores (PT) em razão do seu apoio ao Governo Federal, constituindo o

que se denominou como "mensalão".

O neologismo mensalão, popularizado pelo então deputado federal Roberto

Jefferson, pois em por diversas vezes durante a “entrevista”ele usa a palavra “mensalidade”

referindo-se a uma suposta "mesada" paga a deputados para votarem a favor de projetos de

interesse do Poder Executivo. Ainda segundo o deputado, o termo já era comum nos

bastidores da política entre os parlamentares para designar essa prática ilegal.

29

A palavra "mensalão" foi então adotada pela mídia para se referir ao caso. A

primeira vez que a palavra foi grafada em um veículo de comunicação de grande reputação

nacional ocorreu no jornal Folha de S.Paulo, na matéria do dia 6 de junho de 2005.

Entre 22 a 27 de agosto de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF), o tribunal

máximo do Brasil, iniciou o julgamento dos quarenta nomes denunciados pelo Procurador

Geral da República, em 11 de abril de 2006. Porém, o caso só começou a ser julgado em

2012. No dia 14 de setembro de 2005, o mandato do deputado Roberto Jefferson, o delator

do esquema, foi cassado, perdendo seus direitos políticos por oito anos. Enquanto isso os

outros deputados acusados de participação no esquema conseguiram se reeleger nas eleições

de 1º de outubro de 2006.

Foi descoberto pela Polícia Federal, em julho de 2008, que o banqueiro Daniel

Dantas, do Banco Opportunity foi uma das principais fontes de recursos do mensalão.

Através do Banco Opportunity Daniel Dantas era o gestor da Brasil Telecom, controladora

da Telemig e da Amazonia Telecom. As investigações da polícia apontaram que essas

empresas de telefonia injetaram R$ 127 milhões nas contas da DNA Propaganda,

administrada por Marcos Valério, o que, segundo a PF, alimentava o “Valerioduto”,

esquema de pagamento ilegal a parlamentares. A Polícia Federal pôde chegar a essa

conclusão após a Justiça ter autorizado a quebra de sigilo do computador central do Banco

Opportunity.

Apesar das investigações, apenas em 2011 a Polícia Federal concluiu o relatório final

confirmando a existência do mensalão, este documento foi enviado ao Ministério Público.

O deputado federal Roberto Jefferson apontou, durante as investigações da PF, José

Dirceu como coordenador do esquema. Dirceu foi o Ministro-chefe da Casa Civil do

governo Lula. A partir do mensalão outros escândalos foram se tornando público, e de uma

forma ou de outra se relacionavam com o mensalão.

Devido ao escândalo vários deputados envolvidos foram julgados pelo Conselho de

Ética da Câmara Federal, com pedidos de cassação enviados para votação em plenário.

Apenas José Dirceu e Roberto Jefferson perderam seus mandatos e ficaram inelegíveis por

10 anos.

O escândalo do mensalão chama a atenção não só pela quantidade, de pessoas

envolvidas. Mas também pela variedade de pessoas, pois muitas empresas brasileiras

públicas e privadas também a princípio estiveram envolvidas no escândalo do mensalão. As

empresas envolvidas não se restrigem somente às brasileiras, mas também multinacionais e

estrangeiras.

30

5. ANÁLISE DAS REVISTAS

Neste capítulo, será feita a análise de quatro capas da revista Veja. A primeira é a

edição 1908, de 08 de junho de 2005, a qual trata do escândalo do Mensalão relacionando a

fita da “mesada” e a denuncia que petistas aceitavam propina de madeiras da floresta

amazônica; a segunda é a edição 1911, de 29 de junho de 2005, fazendo referência ao

escândalo do mensalão em relação aos saques realizados por Marcos Valério; a terceira é a

edição 1920, de 31 de agosto de 2005, sobre os grampos feitos pelo Ministério Público onde

denunciam Palocci; a última diz respeito à edição número 1923, de 21 de setembro de 2005,

que mostra o símbolo do Partido dos Trabalhadores (PT) se partindo fazendo relação com o

escândalo que se tornara público.

A opção pela temática “Mensalão” deu-se pela sua grande repercussão sendo o maior

escândalo político da história do Brasil. Já a escolha dessas edições se deu pela forma que a

editorial da revista tratou o escândalo, através de imagens que cabem ampla análise.

31

5.1.Edição 1908

Figura I – Capa da Revista Veja – Edição 1908

Fonte: http://veja.abril.com.br/acervodigital/

Conforme vemos na representação acima, está edição é significativamente marcada

pelo discurso não-verbal, mas contém discurso verbal. A imagem com as cores da bandeira

do Brasil, as árvores da Floresta Amazônica e em seguida a imagem mais marcante dessa

capa, a qual atingindo quase toda sua totalidade, é a imagem de um disco de motosserra

onde está escrito “Corrupção” em letras grandes. Os demais elementos estão sobrepostos à

fotografia principal. Além disso, na parte superior na diagonal da capa, está a chamada de

uma matéria sobre a fita da “mesada” paga aos políticos.

De acordo com Íria Baptista e Karen Abreu (2010, p. 4), a imagem midiatizada é

uma mensagem diretamente relacionada com uma fonte emissora, um canal de propagação e

um receptor. Esse canal possui particularidades que influenciam diretamente na construção

de sentido desse material – a posição política do veículo, a linha editorial, o público ao qual

se destina.

32

Nesse sentido,

[...] a mensagem contida na imagem de imprensa, diferentemente daquela

presente na fotografia comum, se interrelaciona com outras mensagens

com as quais ela divide o espaço paginal do veículo de comunicação de

massa no qual está impressa como: o texto, a legenda, o título, a

diagramação, etc.; elementos do fazer jornalístico que estão sempre

presentes na publicização de uma fotografia de imprensa. Tais elementos

compõem a produção de sentido da imagem de imprensa; esses saberes vão

interferir diretamente na compreensão da imagem fotográfica de imprensa

e podem retificar ou ratificar o que é mostrado na própria imagem.

(Baptista; Abreu 2010, p. 5)

O discurso jornalístico nas revistas tem início com uma imagem de capa, que,

comercialmente, segundo Scalzo (2004), é a parte mais importante de toda a publicação.

Uma boa revista precisa de uma capa que a ajude a conquistar leitores e os

convença a levá-la para casa. ‘Capa’, como diz o jornalista Thomaz Souto

Corrêa, ‘é feita para vender revista’. Por isso, precisa ser o resumo

irresistível de cada edição, uma espécie de vitrine para o deleite e a

sedução do leitor. (Ibid, p. 65)

Neste caso, a Vejatrata do escândalo do mensalão ocorrido em 2005, tema pautado

até os dias de hoje pela revista.

Tendo em vista as dimensões de um dos maiores escândalo político do País, a Veja

constrói seu discurso baseando-se no conceito de Dominique Maingueneau. Segundo ele,

todo discurso é contextualizado, por isso o ‘mesmo’ enunciado em dois lugares distintos

corresponde a dois discursos distintos (Maingueneau, 2004, p. 54).

Assim sendo, como disse anteriormente está capa e as outras três capas que serão

analisadas aqui nesse projeto de pesquisa, cabem ampla interpretação. Até porque como diz

Umberto Eco não existe verdade absoluta, sendo assim é possível mais de uma interpretação

de uma mesma imagem.

Através da manchete, que aponta: “Corrupção – Amazônia à Venda” o subtítulo

desta edição é “Petistas presos aceitavam propina de madeireiras que devastavam a floresta”,

grande parte do potencial de atração da capa é proporcionado pelas imagens presentes.

33

Sobre a importância do aspecto gráfico, Scalzo (2004) diz que

quando alguém olha para uma página de revista, a primeira coisa que vê

são as fotografias. Antes de ler qualquer palavra, é a fotografia que vai

prendê-lo àquela página ou não. Fotos provocam reações emocionais,

convidam a mergulhar num assunto, a entrar numa matéria. Por isso, ter

fotos boas em mãos é fundamental. Elas devem excitar, entreter,

surpreender, informar, comunicar ideias ou ajudar o leitor a entender a

matéria. Numa época carregada de apelos visuais, o uso da fotografia

tornou-se ainda mais relevante. (p. 69)

É interessante observarmos também que a construção estética da capa nos leva a uma

imagem com tom poético/dramático, cuja intenção é atingir ao público leitor. O impacto

provocado pela imagem da Floresta Amazônica sendo comercializada, a sua devastação

aguça o desejo de compra. Toda a carga dramática é introduzida na capa através dessas

imagens.

Por outra perspectiva, vemos que a apropriação das cores é feita de uma forma tal,

que percebemos, mesmo que inconscientemente, o clima misterioso representado: a capa é

preenchida por cores relacionadas à bandeira do Brasil, sugerindo assim uma falta de

patriotismo dos nossos representantes políticos, que negociavam a floresta amazônica. Está

capa é curiosamente carregada de subjetividade.

Dessa forma, vemos que a Veja imprime a essas expressões presentes na capa uma

generalidade que tende a conduzir o leitor para dentro da revista, consolidando, assim, seu

objetivo comercial, que é vender.

Por fim, é interessante observarmos que a Veja não obedece a padrões gráficos. Até,

no que diz respeito ao posicionamento do logotipo da Editora Abril, geralmente é localizado

no canto inferior esquerdo da página, porém sua localização é variável dependendo da

escolha da editoria. Recurso que poderá ser observado na capa seguida a ser analisada nessa

pesquisa. Apesar disso a cor é invariável.

34

5.2.Edição 1911

Figura II – Capa da Revista Veja – Edição 1911

Fonte: http://veja.abril.com.br/acervodigital/

Esta edição da Veja trata bem de um assunto a que nos referimos anteriormente: a

questão da imagem como representação conotativa.

Como diz Orlandi o pesquisador deve munir-se de uma visão descritiva de seu

objeto, seguindo a essa etapa a relação com teorias que fundamentem sua análise, tendo o

texto como ponto de partida de estudo do discurso.

A análise do discurso não está interessada no texto em si como objeto final

de sua explicação, mas como unidade que lhe permite ter acesso ao

discurso. O trabalho do analista é percorrer a via pela qual a ordem do

discurso se materializa na estruturação do texto (e da língua na ideologia).

Isso corresponde a saber como o discurso se textualiza. (Orlandi, 1999, p.

72)

35

Ainda segundo Orlandi (1999), a Análise do Discurso tem por objetivo responder à

questão “como este texto significa?”.

Portanto, ao olharmos para a imagem principal, rapidamente identificamos o que ela

representa: o brasão do símbolo da República Federativa do Brasil e a Estrela do PT

representando o domínio do partido.

Assim sendo, conforme a análise defendida por Orlandi (1999), a capa desta edição

traz a frase “República Federativa do Brasil” a palavra “Brasil”, está trocada por “Zé”. Uma

leitura possível para o “Zé” é fazer uma alusão a José Dirceu, que era a pessoa de confiança

do então presidente Lula. Sendo controlado pela cúpula do esquema do mensalão.

Assim, de acordo com Freitas (1999, p. 7), através do que foi dito é sempre possível

se chegar ao não-dito, pois suas pressuposições e implicitações estão contidas de forma

velada ou camuflada em qualquer discurso.

Logo abaixo, e ainda no símbolo do brasão da república, percebesse a data 01 de

janeiro de 2003, substituindo a data da proclamação da república. Remetendo o leitor leitura

defendida acima e reafirmando o poder do Partido dos Trabalhadores na república, data na

qual o presidente Lula assumiu o governo do Brasil.

Com o título “O grande erro”, e o subtítulo “confundir o partido com o governo”, a

editoria da Veja fez um jogo de palavras. Sublinhando o título percebesse uma linha

vermelha que pode conotar uma situação de perigo ou ainda remeter o leitor a cor do

partido.

“O grande erro” para o leitor pode ser aqui entendida como a escolha errada do

presidente, ou ainda que o partido se perdeu ao assumir o poder geral. É possível essa leitura

já que na imagem a estrela do PT foi “colada” com durex. Assim passando uma ideia de

vulnerabilidade dessa escolha. É tanto que uma das pontas da estrela do PT “perdeu” o

durex, e por esse motivo está enrolada, remetendo o leitor a uma ideia que o partido, ou até

mesmo o presidente, pode ser retirado do poder diante do escândalo que se tornara público.

Assim como, a Estrela do PT não cobre totalmente o brasão da república.

Nota-se ainda o símbolo do PT sobrepondo a logomarca do nome da revista,

cortando o “V” da palavra Veja, outra forma que o enunciador escolheu para chamar atenção

do leitor. Neste caso, a editoria optou por essa ferramenta gráfica, de sobreposição da

fotografia ao logotipo da publicação, para reforçar o apelo comercial e captar o leitor.

36

Já no canto superior esquerdo encontra-se a logomarca da Abril, ocupando um

espaço que não é o de costume (canto inferior esquerdo), escolha talvez feita para afastar a

logomarca da frase “O grande erro”.

Ainda no canto superior esquerdo, na diagonal, com fundo azul para ser destaque

entre as outras cores utilizadas na capa. Nesse local encontra-se a chamada da reportagem

“’Mensalão’” e “amigão”, utilizando-se da rima e do grau aumentativo.

Retomamos, aqui, o caráter pragmático de Maingueneau (2004) presente nesse

discurso: que apesar de fazer o uso do sensacionalismo, a Vejaquer que seu leitor reflita

sobre seus posicionamentos políticos, instrua-se, pesquise sobre os candidatos, para que não

mais eleja políticos demagógicos que leve a população a decepção. Tais características, de

responsabilidades sociais, são defendidas como missão da Revista Veja, segundo a Redação

da mesma.

37

5.3. Edição 1920

Figura III – Capa da Revista Veja – Edição 1920

Fonte: http://veja.abril.com.br/acervodigital/

Figura IV- Sabão em Pó Omo

Fonte: www.gilton.com.br

38

A capa da edição de 31 de agosto de 2005, da revista Veja remete o leitor a à imagem

do sabão Omo, tido como um dos melhores no sentido de tirar manchas, clarear e

transparecer. Percebe-se que as características supracitadas sugerem um ambiente voltado

para higienização no quadro político brasileiro.

Pode-se perceber também o jogo de intertextualidade na escolha das cores que

correspondem às, da embalagem do sabão. Nota-se, ainda, uma particularidade do alto preço

do sabão Omo. Nesta edição houve uma predominância da linguagem não-verbal.

Podemos dizer então, que a intertextualidade se faz presente na maioria das

produções textuais e no nosso cotidiano, ela está presente no que falamos, escrevemos,

lemos ou pensamos. Segundo Bakhtin, “o discurso não se reduz a um dizer explícito, pois

ele é permanentemente atravessado pelo seu avesso que é a pontuação do inconsciente”.

Conforme Orlandi (1987),

um texto relaciona-se com outros textos dos quais nasce e para os quais

aponta seu futuro discursivo, o que caracteriza todo texto como

necessariamente incompleto. Incompletude justificada tanto pela interação

de um texto com outros textos, quanto pela sua ligação com a experiência

do leitor em relação a linguagem, seu conhecimento de mundo, à sua

ideologia, etc.

Com relação aos textos verbais, a Veja utiliza a seguinte manchete: “Político

artificial”. A ela, segue-se o lead: “O Brasil tem as campanhas eleitorais mais caras do

mundo. Isso torna a corrupção inevitável e ajuda a eleger nulidades”.

A manchete nos leva a leitura e a substituição da expressão “Branco Total” slogan

publicitário do sabão em pó Omo. Já no lead, a expressão “mais caras” reafirma a alusão ao

preço do sabão. O lead supracitado apresenta-se saindo da imagem de um megafone,

percebesse aí a intenção de chamar a atenção dos brasileiros.

Ainda, falando de interpretação e como já dito anteriormente, Eco (2005, p.35) fala

de uma “verdade” interpretativa existente no texto: A verdade passa a identificar-se com o

que não é dito ou com o que é dito de forma obscura e deve se compreendido além ou sob a

superfície de um texto.

Vemos, por consequência, a relação pragmática do discurso, conforme definição de

Maingueneau (2004), que diz que os enunciados não são restritamente direcionados a

39

produzir uma mensagem do ponto de vista semântico, mas visam à modificação de uma

situação.

A Veja revela o objetivo a que se propôs nesta edição: mostrar-nos a importância de

uma postura reflexiva que nos possibilite uma rápida mudança de atitude, fazendo com que

cada um de nós tenha a consciência de que devemos lançar mão dos meios de que dispomos,

como o voto.

40

5.4. Edição 1923

Figura V – Capa da Revista Veja – Edição 1923

Fonte: http://veja.abril.com.br/acervodigital/

A última capa analisada é a da edição 1923, de 21 de setembro de 2005. Inicial e

inevitavelmente, percebemos que está edição traz consigo um artifício não utilizado em

nenhuma das outras três analisadas: o uso do fundo negro. O preto é uma cor que relaciona-

se à morte e significa basicamente o luto. Assim sendo, tendo em vista a repercussão do

escândalo político do mensalão, o uso desta ferramenta representa o luto, em sinal de

protesto, do povo brasileiro.

A revista em questão optou por destacar o quadro político vigente mesmo diante de

uma reportagem sobre o aquecimento global, cujo o assunto é de interesse mundial, já que

para a matéria em questão a editoria reservou um pequeno espaço na diagonal da capa, no

canto esquerdo, para fazer a chamada da reportagem.

41

Voltando ao destaque desta edição, a imagem da Estrela do Partido dos

Trabalhadores de vidro e quebrada ao meio, imagem essa que rouba toda a atenção do leitor.

Em seguida a chamada da capa é “...era de vidro e se quebrou”, remetendo o leitor a cantiga

de roda Ciranda Cirandinha. A editoria utilizou-se de um recurso linguístico, a

intertextualidade, quando se utiliza dos seguintes versos da canção:“O anel que tu me deste

era vidro e se quebrou / O amor que tu me tinhas era pouco e se acabou”.

Tais versos nos remetem a decepção do povo brasileiro com o PT. Utilizando da

intertextualidade a revista faz uma crítica à política e a confiança da sociedade ao escolher o

presidente Lula, que é do PT, para governar o país.

Bakhtin, apesar de ser não ser linguista e sim filósofo, antecipou as principais ideias

da linguística moderna, principalmente em relação à teoria sobre o texto.

Para ele a análise textual deveria ser feita em sua totalidade, não em partes,

considerando a sua organização, a interação verbal, o contexto e o intertexto. O princípio

norteador de seus estudos foi o dialogismo, que é “constitutivo da linguagem e a condição

de sentido do discurso” (Barros, 2003, p.2).

Segundo Bakhtin, nenhum texto ou discurso se constrói sozinho, mas sim se elabora

a partir de outro. A partir de suas ideias considerou-se o dialogismo sob dois pontos de vista:

o da interação verbal, entre enunciador e enunciatário; e o da intertextualidade, no interior

do discurso.

Portanto, podemos também reconhecer no jornalismo um discurso reportado,

O próprio locutor como tal é, em certo grau, um respondente, pois não é o

primeiro locutor, que rompe pela primeira vez o eterno silencio de um

mundo mudo, e pressupõe não só a existência do sistema da língua que

utiliza, mas também a existência dos enunciados anteriores- emanantes

dele mesmo ou do outro- aos quais seu próprio enunciado está vinculado

por algum tipo de relação pura e simplesmente ele já os supõe conhecidos

do ouvinte. Cada enunciado é um elo da cadeia muito complexa de outros

enunciados. (Bakhtin, 1997, p.291)

O autor define em outras palavras o conceito de intertextualidade, cada discurso entra

em diálogo com os discursos anteriores. Essa interação Bakhtin chama de “intuito

discursivo” ou “querer dizer” do locutor. Portanto, a expressividade aparece como uma

particularidade constitutiva do enunciado.

42

A visão de mundo, a tendência, o ponto de vista, a opinião têm sempre sua

expressão verbal”. É isso que constitui o discurso do outro (de uma forma

pessoal ou impessoal), e esse discurso não pode deixar de repercutir no

enunciado. ( Bakhtin, 1997, p.320.)

Por fim, novamente a intertextualidade está presente nesta edição, com o subtítulo

“A história de uma tragédia política”, a revista alude à decepção do povo brasileiro com a

decepção amorosa que a cantiga conta. Essa intertextualidade é estratégica, já que a cantiga

de roda é tão popular quanto à imagem do Partido dos Trabalhadores.

43

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Está pesquisa explorou o jornalismo em uma perspectiva da literatura, através de

correntes literárias, como o melodrama e o realismo, unindo essas características ao texto

noticioso, que aqui se apresentou como manchete, onde foram escolhidas quadro capas da

Revista Veja de 2005, sobre a temática do “Mensalão”.

Defino o jornalismo como forma de conhecimento. Nessa pesquisa, os leitores da

revista Vejanão foram encarados como passivos. Visto que o maior público da Veja é classe

A e B. Admite-se então um leitor com teor crítico sobre a notícia, com uma capacidade

reflexiva, a partir do contexto social. A pesquisa vigente tratou de um escândalo político,

onde se faz necessário um leitor atualizado e, sobretudo “um crítico” do sistema no qual está

sendo afetado.

Esta pesquisa analisou o discurso e não o texto, uma inversão, assim, da linguagem

para o social, do enunciado para a enunciação e as condições de produção e de recepção, em

outras palavras, trata-se do que Bakhtin classifica de dialogismo. Com essa visão da

comunicação como ritual, as notícias não foram encaradas apenas como informações, mas

também em muitas reportagens como um drama, onde a revista fez o uso do

Sensacionalismo.

Essa pesquisa foi feita baseada em uma análise linguística sobre as notícias,

associada a uma leitura crítica do discurso, diante desses questionamentos propus uma

relação dualística entre o discurso e a sociedade. A notícia impõe ao sujeito um “certo” olhar

e uma “certa” função na sociedade. Bakhtin diz que A língua penetra na vida através dos

enunciados concretos que a realizam, e é também através dos enunciados concretos que a

vida penetra na língua. (Bakhtin, 1997, p.282)

Ainda que Bakhtin faça pouca referência ao jornalismo, sua obra oferece a

caracterização de processos de produção, de circulação e de reprodução de discursos sociais.

Ele faz uma divisão entre gêneros, e os classificam em gêneros primários e secundários, e

defende que existe uma inter-relação entre eles a partir de uma “visão do mundo”.

A inter-relação entre gêneros primários e secundários de um lado, o

processo histórico de formação dos gêneros secundários do outro, eis o que

esclarece a natureza do enunciado (e acima de tudo, o difícil problema da

44

correlação entre língua, ideologias e visões do mundo) (Bakhtin, 1997,

p.282).

Bakhtin (1997) defende que A língua se deduz da necessidade do homem de

expressar-se e de exteriorizar-se.

Portanto, a enunciação como unidade básica de análise do discurso da comunicação,

alarga a linguagem ao seu contexto, em sentido situacional e cultural: de onde se fala e para

quem se fala, o que está para trás e o que está por detrás. É o que Bakhtin chama de estilo.

De acordo com ele, estilo depende do modo que o locutor (ou escritor) percebe e

compreende seu destinatário.

Pensar o jornalismo como gênero do discurso, próximo e ao mesmo tempo diferente

do literário. O realismo como corrente literária esta inserida no discurso jornalístico. O

jornalismo, emergente do século XIX, orientado para o relato dos fatos da atualidade vai

encontrar no realismo algumas das suas metáforas fundadoras. Segundo Stendhal, é o

“espelho da vida”.

A busca pela construção da realidade nas noticias, característica do o lead canônico

de informação, onde é obrigatório os elementos quem, o quê, onde e quando. É o que

Barthes (1968) chama de efeito do real. Como o realismo literário, o jornalismo sustenta-se

na sua capacidade de descrever. No texto de reportagem, onde a descrição é fundamental,

escreve Helen Hugles (1940, pag.86).

A revista Veja de edição número 1905, foi a primeira edição sobre o escândalo do Mensalão,

trazendo essa construção da realidade, e a busca pela transparência. O espírito de denúncia

da corrupção pública e de exigência de transparência, o muckraking, vai ter o seu apogeu

nos anos 70,o século XX. Watergate constitui-se como grande mito do poder do jornalismo

investigativo. Outra característica da literatura presente no jornalismo é o melodrama.

O melodrama presente nas notícias faz o leitor se prender a reportagem e querer

acompanhá-la. O que no jornalismo chamamos de suíte. O “suíte”, designa a reportagem que

explora os desdobramentos de um fato que foi notícia na edição anterior. Esse

acompanhamento da notícia mexe com os sentimentos do leitor, prática tão presente na

mídia e sobre tudo nas grandes reportagens da Tv, exploração do sensacionalismo de fatos

ou escândalo, algo que “choca” a sociedade. A mídia transforma a reportagem em “novela”.

O receptor, a grande massa, gosta e acompanha esse tipo de “cobertura” jornalística.

No caso da cobertura da Veja em 2005, sobre o escândalo do Mensalão, resultou em

24 revistas publicadas que trouxe essa temática na capa. O melodrama “vende”. E já que é

45

lucrativo é de interesse da revista. Se tratando de um caso político, como o Mensalão, é de

interesse da sociedade acompanhar a repercussão de um dos maiores escândalos de

corrupção política do Brasil. A revista Veja foi a primeira revista a denunciar o escândalo.

Fait- Divers e interesse humano são conceitos enraizados na cultura jornalística. Nessa

pesquisa, tentei mostrar a projeção da metáfora do jornal, aqui aplicado na Revista como

espelho do mundo, de inspiração realista. Diante disso criou-se um questionamento: Como

garantir que a seleção do que é noticiado decorra com o profissionalismo adequado à função

social do jornalismo?

A resposta por sua vez pode ser dada através da Teoria do Gatekeepers. Outra teoria

presente nessa pesquisa foi o Agenda-Setting e Gap Hypothesis, que é a teoria da

tematização, surgida nos Estados unidos, trabalhada por NiklasLuhmam. Essa teoria explica

a capacidade simbólica dos media estruturarem a opinião publica, e teorias construcionistas

sobre a notícia.

Ou seja, essa teoria explica consequência da ação mediadora dos meios de

comunicação de massa sobre os conhecimentos públicos partilhados por uma comunidade.

Podemos evidenciar tais características na cobertura jornalística do Mensalão na Revista

Veja. Assim, como em todos os outros meios de comunicação, tema que até hoje é pautado

em reportagens. Sobretudo esse ano, por causa do julgamento dos envolvidos no esquema do

Mensalão.

Os efeitos na recepção não se limitam apenas ao que pensar, mas também

quando pensar, pensar com o quê, o que pensar sobre, o que não pensar,

como pensar e com quem pensar (Kartz, 1999, sublinhados do autor).

O leitor dessa revista possui uma análise crítica, no sentido de uma orientação que

deveria questionar dispositivos de poder e de estrutura. Em Teorias das Notícias: o Estudo

do Jornalismo, Nelson Traquina (2001), apresenta as tendências teóricas do século XX, e

entre as sete principais que ele identifica esta a teoria da acção política.

Os media noticiosos são vistos de forma instrumental, isto é, servindo

objetivamente certos interesses políticos: na versão de esquerda, são

instrumentos que ajudam a manter o sistema capitalista; na versão de

direita, são instrumentos que põem em causa esse sistema. De esquerda ou

de direita, estas teorias defendem também as noticias como distorção

sistemática, servindo interesses políticos de agentes sociais específicos.

(Traquina, 2001, pág. 47).

46

Já Molotch e Lester distinguem quatro tipos de acontecimentos comuns da rotina

jornalística: acontecimentos de rotina, acidentes, escândalos e acontecimentos talentosos.

Devido ao tema dessa pesquisa, se faz necessário explicar segundo Molotch e Lester, o que é

escândalo.

Os escândalos são construídos pela atividade intencional de indivíduos que

não partilham as estratégias de produção das ocorrências que lhe estão

subjacentes. Há assim dissonância entre aqueles que dão a ver algo de uma

ocorrência (os informantes) e aqueles que, com responsabilidades nessa

ocorrência, deseja que esse algo permaneça na zona do não-dito. O

escândalo revela trancos normalmente ocultos da vida privada ou dos

processos institucionais.(Molotch e Lester apud Ponte, 2005, p. 187).

Assim, foi possível perceber tais características nas publicações da Veja, sobre o

escândalo do mensalão. No caso de um escândalo político, o que é de interesse nacional, um

dos fatores determinantes no processo de noticiabilidade, valores-noticias, assim como

podemos observar a amplitude da notícia associada ao interesse comum da sociedade, visto a

partir da clareza das notícias. Uma nítida Hard News.

Para Mauro Wolf (1985. p.178-182), a significância constitui a base de critérios

substantivos em torno da importância e do interesse da notícia.

Perceba como a configuração deste binômio entre importante e interessante relega

para nenhuma das partes o tratamentode problemáticas sociais merecedoras da atenção de

um jornalismo de investigação, orientado pelo interesse público, como referia Quesada.

Segundo Wolf (1985), a transformação de um acontecimento em notícia será o

resultado de uma ponderação entre avaliações relativas a elementos de diferentes pesos,

relevos e rigidez quanto aos processos produtivos.

Tendo respondido às questões a que nos propusemos neste trabalho monográfico, é

importante ressaltarmos que não esperamos, assim, termos atingido uma conclusão fechada

em si mesma. Pelo contrário, buscamos que esta seja apenas mais uma ferramenta para que

entendamos de que forma trabalha a mídia e como ela constrói seu discurso, haja vista que

não podemos aceitar passivamente o que chega até nós. Relacionar essas estratégias com a

ética profissional jornalística é também de grande importância e esperamos fazê-lo em

trabalhos futuros, afinal, as portas do conhecimento devem estar sempre abertas a novas

intervenções e inquietude.

47

7. REFERÊNCIAS

AZEVEDO, José. Metodologias qualitativas:análise do discurso. Porto: Universidade do

Porto, 2009. Disponível em:

<http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/8902/2/4264.pdf> Acesso em 3 de setembro

de 2012.

BARRETO, Débora Regina. O princípio da supremacia do interesse público sobre o

particular. Do que se trata? Novos Direitos, 2007. Disponível em:

<http://novosdireitos.wordpress.com/2007/06/01/o-principio-da-supremacia-do-interesse-

publico-sobre-o-particular-do-que-se-trata/> Acesso em 15 de setembro de 2012.

BASTO, Elisângela. Interesse público ou interesse do público? Observatório da Imprensa.

21 de outubro de 2008. Disponível em:

<http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=508CID004> Acesso em 19

de agosto de 2012.

BATTISTELLA, Natalie; COLOMBO, Joana Ribeiro; ABREU, Karen Cristina Kraemer. A

Importância da Cor nas Embalagens como Fator Influenciador no Momento da

Compra. Artigo. 2010. Disponível em <http://www.bocc.ubi.pt/pag/bocc-kraemer-

embalagens.pdf> Acesso em 23 de junho de 2012.

CAMARGO, Isaac Antonio. Aconstrução do objeto noticioso na edição da mídia

impressa: fotografia, legenda e texto. Porto Alegre: PUCRS, 2000. Disponível em:

<http://www.compos.org.br/data/biblioteca_1385.pdf> Acesso em 3 de setembro de 2012.

DONDIS, Donis A. A sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

EDITORA ABRIL. Informações Gerais. Publiabril. Disponível em:

<http://www.publiabril.com.br/marcas/veja/revista/informacoes-gerais> Acesso em 2 de

outubro de 2012.

FREITAS, Antônio Francisco de. Análise do discurso jornalístico:um estudo de caso.

Maceió: Universidade Federal de Alagoas, 1999. Artigo. Disponível em:

<http://www.bocc.ubi.pt/tag/freitas-antonio-discurso-jornalistico.pdf> Acesso em 8 de junho

de 2012.

GOULART, Alexandre. Uma lupa sobre o jornalismo de revista. Observatório da

Imprensa. 2006. Disponível em:

<http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=388DAC001> Acesso em 15

de agosto de 2012.

KOVACH, Bill; ROSENSTIEL, Tom. Os elementos do Jornalismo:o que os profissionais

do jornalismo devem saber e o público deve exigir. Porto: Porto Editora, 2004.

MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. 3. ed. São Paulo:

Cortez, 2004.

NASCIMENTO, Patrícia. Jornalismo em Revista no Brasil:Um estudo das construções

discursivas em Veja e Manchete. São Paulo: Annablume, 2002. Disponível em:

48

<http://books.google.com.br/books?id=dYjfwY9GjF8C&printsec=frontcover#v=onepage&q

&f=false> Acesso em 15 de julho de 2012.

ORLANDI, Eni. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999.

SCHIER, Paulo Ricardo. Ensaio sobre a supremacia do interesse público sobre o

privado e o regime jurídico dos direitos fundamentais. 2003. Disponível em: <

http://jus.uol.com.br/revista/texto/4531/ensaio-sobre-a-supremacia-do-interesse-publico-

sobre-o-privado-e-o-regime-juridico-dos-direitos-fundamentais> Acesso em 12 de junho de

2012.

SILVA, Gislene. Para pensar critérios de noticiabilidade. Florianópolis, Estudos em

Jornalismo e Mídia, 2005. v. 2, nº 1. p. 95-107.

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Mauad,

1999. Disponível em:

<http://books.google.com.br/books?id=GmRTJgaQ1WkC&printsec=frontcover#v=onepage

&q&f=false> Acesso em 15 de julho de 2012.

VASCONCELLOS, Mércia. Política e mídia: as fotografias dizem tudo! Marília, SP:

Universidade de Marília. 2004. Disponível em:

<http://encipecom.metodista.br/mediawiki/images/d/d8/GT5_-_13_-_Politica_e_Midia-

_Mercia.pdf> Acesso em 12 de abril de 2012.

VIZEU, Alfredo. A produção de sentidos no jornalismo: da teoria da enunciação a

enunciação jornalística. 2003. Disponível em:

<www.ufrgs.br/gtjornalismocompos/doc2003/vizeu2003.doc> Acesso em 21 de maio de

2012.

BARROS, Diana Luz Pessoa de; FIORIN, José Luiz (organizadores). Dialogismo, Polifonia,

Intertextualidade. lª edição, São Paulo, Edusp, 1994.

BRANDÃO, H. H. N. Introdução à Análise do Discurso. 2. ed. rev. Campinas: Editora da

Unicamp, 2004.

PAULINO, Graça; WALTY, Ivete; CURY, Maria Zilda. Intertextualidades:

Teoria e Prática, 1ª edição, Belo Horizonte-MG, Editora Lê, 1995.

DÄLLENBACH, L. Intertexto e autotexto. Poétique, n. 27. Coimbra: Almedina, 1979.

PERRONE-MOISÉS, L. Crítica e intertextualidade. In: ___. Texto, crítica, escritura. São

Paulo: Ática, 1978.

____. Da influência ao intertexto. In: Anais do 2º Congresso da ABRALIC, 1990. Minas

Gerais, vol. III.

____. A intertextualidade crítica. Poétique n. 27. Coimbra: Almedina, 1979.

FÁVERO, L. L.; KOCH, I. G. V. Linguística textual: introdução. São Paulo: Cortez, 1983.

49

LAGE, N.; ROUCHOU, J. Teoria e técnica do texto jornalístico. Rio de Janeiro: Elsevier,

2005.

MAINGUENEAU, D. Novas Tendências em Análise do Discurso.3. ed. Campinas: Pontes,

1997.

BAKTHIN, M. Dialogismo e construção de sentido. Organização: Beth Brait. B179- 2.ed.

ver.- Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2005.

BAKTHIN, M. Estética da Criação Verbal. 2. Ed. São Paulo: Martins fontes, 1997.

FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. 21. Edição. Edições Loyola, SP.

ECO, Humberto. Interpretação e superinterpretação. Tradução MF.; revisão da tradução

e texto final Monica Stahel. – 2.ed.- São Paulo: Martins Fontes, 2005.

FERNANDES, Cleudemar. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. Goiânia: Trilhas

Urbanas: 2005.

PENA, F. Teoria do Jornalismo. São Paulo, Contexto. 2005.

WOLF, M. Teorias da Comunicação. Lisboa, Presença. 1988

Ponte, Cristina. Para entender as notícias- Linhas de análise do discurso jornalístico.

Florianópolis, Insular. 2005.

Pinto, Milton José. Comunicação e Discurso. 2 ed. – São Paulo: Hacker Editores, 2002.

Hall, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 1.ed.- Rio de Janeiro, 2011.