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ECO-EPIDEMIOLOGIA DA DOENA DE CHAGAS AGUDA
EM REA AMAZNICA. MUNICPIO DE ABAETETUBA,
ESTADO DO PAR, BRASIL, 2008 - 2009
SORAYA OLIVEIRA DOS SANTOS
Ouro Preto Minas Gerais
2013
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO NUCLEO DE PESQUISA EM CINCIAS BIOLGIAS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS
BIOLGICAS
i
SORAYA OLIVEIRA DOS SANTOS
ECO-EPIDEMIOLOGIA DA DOENA DE CHAGAS AGUDA EM REA
AMAZNICA. MUNICPIO DE ABAETETUBA, ESTADO DO PAR, BRASIL,
2008-2009
Ouro Preto Minas Gerais
2013
Tese apresentada no Programa de Ps-
Graduao em Cincias Biolgicas da
Universidade Federal de Ouro Preto- MG como
requisito parcial para obteno do grau de Doutor
em Cincias Biolgicas
Orientador: Prof. Dr. George Luiz Lins
Machado Coelho
Catalogao: [email protected]
S237e Santos, Soraya Oliveira dos. Eco-epidemiologia da doena de Chagas aguda em rea amaznica.
Municpio de Abaetetuba, estado do Par, Brasil, 2008 2009. [manuscrito] / Soraya Oliveira dos Santos 2013.
158f.: il., color; graf.; tab.; mapas. Orientador: Prof. Dr. George Luiz Lins Machado Coelho. Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de
Cincias Exatas e Biolgicas. Ncleo de Pesquisas em Cincias Biolgicas. rea de concentrao: Bioqumica Metablica e Fisiolgica.
1. Chagas, Doena de - Teses. 2. Amaznia - Teses. 3. Epidemiologia - Teses. 4. Trypanosoma cruzi - Teses. 5. Abaetetuba(PA) - Teses. I. Coelho, George Luiz Lins Machado. II. Universidade Federal de Ouro Preto. III. Ttulo.
CDU: 616.937(811.5)
mailto:[email protected]iv
Dedico este trabalho
Aos meus pais Djalma dos Santos e Florinda Oliveira dos Santos, que apesar das dificuldades e preconceitos familiares que enfrentaram para ter acesso ao ensino, nunca se fragilizaram, ao contrrio, forneceram a fora motriz para me impulsionar sempre a no desistir dos meus sonhos
A minha amiga Elenild de Ges Costa, Gerente Estadual do Programa de Controle da Doena de Chagas do Estado do Par at 2012, que teve a coragem, a determinao e a persistncia de estabelecer e sistematizar, em apenas 8 anos, a vigilncia de uma doena negligenciada, com parcos recursos financeiros e humanos em uma regio na qual a doena de Chagas alm de no ser reconhecida como problema de sade pblica apresentava um padro de transmisso peculiar. Soube realizar parcerias intra e interinstitucionais, integrando pesquisa e servio importantes para pr em prtica um modelo de vigilncia, para a regio amaznica, que ainda estava no campo terico. Por ter acreditado e apoiado integralmente este estudo tornando-o possvel.
v
URUBUQUARA
Nessa ilha onde o vento sopra sobre a Baa
Vive gente vive bicho
Pra barco no trapiche
Mar sobe e desce, nessa dana a praia emerge
Assim a vida avana enquanto a pacincia obedece
A criana s aprende a ler quando no rio souber viver
O Homem lana a rede para o peixe enganar
A mulher trabalha a trouxa que ir no matapi o camaro alimentar
Aa na mata, Mata fome, Furo grande, Arari, Oner, Guajar e Mirim
Maraj assim
E ancorado no trapiche a gente acha graa e admira essa gente que batalha e
brinca nessa ilha onde o sol sorri e brilha
Autor: Soraya Oliveira dos Santos
Durante investigao de surto de doena de Chagas em Cachoeira do Arari-PA
vi
AGRADECIMENTOS
A minha famlia pelo apoio incondicional a mais este degrau da minha formao
intelectual;
Ao meu orientador e antes de tudo meu amigo George Luiz Lins Machodo Coelho
pela dedicao, confiana e apoio constante, mesmo quando esteve distante em seu ps
doutorado, por estar sempre ao meu lado, tanto nos momentos felizes, nas agradveis
atividades de campo, mas tambm nos momentos difceis, mas de aprendizado.
Aos membros da minha banca de qualificao Rivaldo Venncio, Marta de Lana e
Egler Chiari, pelas valiosas sugestes que contriburam para o enriquecimento desta tese;
Aos professores, estudantes e funcionrio da UFOP, companheiros nos 4 anos de
estudo;
Ao Sr. Secretrio de Sade do Par, Hlio Franco de Macedo Junior, pelo apoio
fundamental disponibilizado para realizao das etapas deste doutorado, seu respeito e
carinho foram relevantes para concretizao do trabalho;
Maridalva Pantoja, assessora do gabinete SESPA, minha eterna admirao, suas
contribuies sempre contundentes foram valiosas para a elaborao do Plano de
Intensificao das Aes de Controle da Doena de Chagas e toda a histria derivada dele;
Ao Departamento de Vigilncia Sanitria e aos Diretores do Departamento de
Endemias (Walter Amoras e Bernardo Cardoso) que compreenderam o papel e a importncia
da estruturao de um trabalho pioneiro de vigilncia de doena de Chagas na regio
amaznica;
Aos Diretores do LACEN/PA Luiz Augusto, Kleyffsson Miranda e Sebastio Licnio,
pela cooperao tcnica nos anos de realizao da tese;
Aos profissionais da Assessoria de Comunicao/SESPA Roberta Vilanova, Edna
Sidou, Fernanda Sobreira, Jos Pantoja, Mozart Lira, promotores e em algumas situaes co-
autores de nossas experincias na rea rural e urbana dos municpios paraenses. Sua
participao foi significativa na medida em que era necessria a divulgao dentro e fora do
estado de um trabalho singular e extremamente notvel do servio pblico;
vii
Meu reconhecimento especial Coordenao do Programa de Controle da Doena de
Chagas e seus integrantes diretos (Elenild Ges, Adriana Almeida, Allan Wylk, Aliandra S,
Adlia Miranda, Cledja Soares, Daniela Miranda, Ednei Amador, Eunice Feitosa, Fbio
Boulhosa, Gabriela Barros, Keila Silva, Lilian Reis, Miguel Cardoso, Rubens Einar, Vnia
Brilhante) e indiretos (Daniel Miranda, Arnaldo Fayal, Paoola Vieira, Gilberto Barbosa,
Francisco Eduardo, Alciana Arajo, Dorila Pantoja, Milton Gomes, Beatriz Bossato,
Patrcia Sampaio, Jaime Sales, Durval Bertram, Jeniel Rocha) pelo empenho, trabalho
incansvel e dedicao a uma atividade por vezes extremamente desgastante. Sem este grupo
de servidores o trabalho provavelmente no ocorreria;
Secretaria Municipal de Sade Abaetetuba e seus secretrios pela ateno,
disponibilidade, confiana e desprendimento necessrios para a realizao deste trabalho,
considerando que em inmeras vezes as atividades requereram muito mais que mo de obra,
mas sim a vontade de promover uma sade pblica de qualidade para a populao. Por isso,
meu profundo agradecimento aos servidores municipais que trabalharam arduamente para a
efetivao da tese, Rosinete Ferreira, Joo Paulo, Hildebrando Xavier, Nazar Ferreira,
Lenilson Lima, Rubens Clay, Raimundo Lobato, Edvaldo Cascaes, Maria Helena, Haroldo
Souza e Ivanil Cardoso;
Ao Corpo de Bombeiros de Abaetetuba pela gentileza de ceder bombeiros, motosserra
e carros para a realizao do trabalho da equipe de entomologia;
A Polcia Militar de Abaetetuba pela disponibilizao de policiais com carros e
motos, responsveis pela segurana das equipes de trabalho em reas problemticas;
Aos moradores das comunidades de Ajua, Genipaba, Panacuera, So Sebastio e
Francilndia pela participao nesta tese, receptividade, carinho e confiana;
Secretaria Municipal de Sade de Igarap-Mirim e aos secretrios que
disponibilizaram seus barcos e servidores nas nossas atividades nas ilhas de Abaetetuba, em
especial Mrcio Lucas, Toms Domingos e Maria Arlete, grandes parceiros nas dezenas de
dias e noites do trabalho de pesquisa de campo;
Secretaria Municipal de Sade de Barcarena e aos secretrios que liberaram seus
servidores para as atividades nas ilhas e bairros de Abaetetuba, com especial destaque para
Raimunda Martins e Renata Neves, pessoas inestimveis que se dispuseram ao enfrentamento
de uma jornada difcil;
viii
Ao 6 Centro Regional de Sade - CRS com sede em Barcarena e sua diretora Adlia
Amorim por concordar com a empreitada de reunir servidores pblicos em prol da pesquisa
em servio, necessria para o entendimento da problemtica da doena de Chagas. Aqui meu
reconhecimento a Manoel Brasil, Alueci Sales, Jurandir Pinheiro, Pamela Suelen, Raimundo
Cordeiro;
s servidoras do 6CRS Rosana Sosinho e Elza Campos, que se tornaram queridas
amigas, que acreditaram acima de tudo no projeto de trabalho, por muitas vezes ambicioso,
mas denunciante da situao da doena de Chagas na Amaznia. Sem suas habilidades e
sensibilidades especiais para gerenciar, organizar e perceber necessidades em campo,
dificilmente teria a qualidade alcanada;
A Luis Carlos Batista, tcnico do Museu Emlio Goeldi, responsvel pelo
levantamento botnico das reas de estudo. Seus relatrios foram valiosos para as concluses
da tese;
A Flvio Altieri do Sistema de Proteo da Amaznia SIPAM, que mesmo nos
momentos em que sua instituio no pde participar efetivamente do trabalho, no se eximiu
de contribuir com o estudo;
A Clber Galvo e Elias Lorosa, do Laboratrio de Referncia Nacional e
Internacional de Triatomneos da FIOCRUZ/RJ, pela colaborao nas anlises
entomolgicas;
Aos queridos amigos da UFPA, Herv Rogez e Dilma Souza, que compraram a
idia da tese e acreditaram que algum fora da Amaznia pudesse retratar sua realidade com
honestidade e justia. Suas participaes mais do que especiais engrandeceram este trabalho
e proporcionaram a aproximao entre academia e servio;
Ao meu amigo Carlos Botelho por ter apoiado integralmente o inqurito sorolgico
em papel filtro, minha gratido;
A amiga Mayira Milano, brilhante cooperadora nas horas interminveis de anlise da
tese, sempre pontual em suas contribuies preciosas, minha gratido especial, porque se no
foi minha orientadora por direito, o foi de fato;
A Joseane Padilha, estatstica da EMBRAPA/DF, que entrou em minha vida no
momento nico para proporcionar uma excelente anlise estatstica da tese, no medindo
esforos para entender a doena de Chagas e assim me auxiliar na interpretao dos dados;
ix
A Joo Luiz Carvalho pela amizade sincera, caronas de idas e vindas ao aeroporto e
companheirismo de todos os momentos, meu reconhecimento profundo;
A Roseli Cerqueira de Oliveira, minha chefia imediata no Ministrio da Sade nos
anos da tese, por confiar na pretenso de uma gerente de realizar um trabalho nos interiores
da Amaznia, sem garantias iniciais de sucesso ou at de viabilidade, mas que acreditava no
potencial do servio pblico. Seu apoio e credibilidade possibilitaram meu trnsito entre
Estado do Par e o Distrito Federal;
A Mardones Flores, tcnico em entomologia do MS, pelas colaboraes importantes
nas pesquisas entomolgicas;
Ao amigo Marcos Obara, profissional competente, atencioso e prestativo em todos os
momentos da tese;
A Suelene Mamede, companheira de trabalho, amiga sincera nos momentos difceis
do estudo, sua presena marcante, confiana e conhecimento tcnico foram preciosos para
elaborao desta tese;
A Erica Tatto, por ter estado ao meu lado nas duras batalhas do servio pblico, pelo
sacrifcio leonino profissional e pessoal, pela amizade, carinho, zelo e amor dispensados, meu
reconhecimento e registro de que este trabalho o espelho de sua excepcional percepo do
entendimento da doena de Chagas na Amaznia;
Aos amigos do corao, Patrcia Freire, Luiz Antnio, Simone Vivaldini, Aliete
Nunes e Ariadna Alvin, pela compreenso, ateno, cuidado e amor antes, durante e aps a
tese;
s diversas instituies de financiamento e fomento envolvidas nesta tese: Ministrio
da Sade, Secretaria de Estado de Sade do Par, Fundao Ezequiel Dias-MG, Instituto de
Pesquisa e diagnstico da APAE-MS, Universidade Federal do Par
x
In Memoriam
Ao Dr. Aluzio Prata, cone e desbravador da doena de Chagas no Brasil, sua
perseverana, conhecimento e ternura serviram de base para minha compreenso do quanto
somos peas nicas, preciosas e responsveis pela elucidao desta molstia to
originalmente nossa;
A Antnio Carlos Silveira, companheiro, incentivador, amigo pessoal e pioneiro em
descrever o cenrio amaznico e suas implicaes. Seus trabalhos e opinies tcnicas foram
significativas para minha vontade de entender a Amaznia no contexto da doena de Chagas;
xi
Sumrio
Pg
LISTA DE FIGURAS xiv
LISTA DE QUADROS xvi
Lista de abreviaturas, siglas ou smbolos xvii
RESUMO xix
1. Introduo 1
2. Reviso da literatura 5
2.1. Doenas emergentes - Consideraes preliminares 5
2.2. Histria da doena de Chagas 7
2.3. Distribuio da doena de Chagas 9
2.4. Vetores 10
2.5. Reservatrios 14
2.6. Agente etiolgico 15
2.7. Ciclo Evolutivo do T. cruzi 17
2.7.1. No vetor invertebrado 17
2.7.2. No hospedeiro vertebrado 17
2.8. Aspectos Clnicos 18
2.8.1. Fase aguda 18
2.8.2. Fase Crnica 19
2.9. Mecanismos de transmisso 19
2.10. Diagnstico 20
2.10.1. Diagnstico na fase aguda 20
2.10.2. Diagnstico na fase crnica 21
2.11. A Doena de Chagas na Amaznia Brasileira 22
2.12. A vigilncia da doena de Chagas 23
xii
2.13. A mudana de paradigma na vigilncia epidemiolgica da doena de Chagas 29
3. Justificativa 39
4. Objetivos 41
4.1. Objetivo Geral 41
4.2. Objetivos especficos 41
5. Metodologia 42
5.1. Desenho do estudo 42
5.2. Populao e rea de Estudo 43
5.2.1. Seleo das localidades e perodo do estudo 44
5.3. Fonte de dados epidemiolgicos 47
5.3.1.1. Casustica da doena de Chagas em Abaetetuba 47
5.3.2. Inqurito parasitolgico e sorolgico humano 47
5.3.3. Processamento das amostras 49
5.3.3.1. ELISA 49
5.3.3.2. Hemaglutinao Indireta (HAI) 50
5.3.3.3. Gota de sangue examinada a fresco 50
5.3.3.4. Mtodo de concentrao de parasitas creme leucocitrio 51
5.3.3.5. Imunofluorescncia indireta IFI IgM e IgG 51
5.3.4. Inqurito entomolgico 52
5.3.5. Diagnstico Ambiental 54
5.3.6. Processamento e Anlise de dados 55
6. Resultados 60
6.1. Casustica de DCA em Abaetetuba, perodo 2005 a 2012 60
6.1.1. Caractersticas clnicas e epidemiolgicas 60
6.1.2. Distribuio temporal-espacial e sazonalidade da DCA em Abaetetuba. 62
6.1.3. Anlise Univariada - Vigilncia 64
6.1.4. Anlise Multivariada Vigilncia 66
6.2. Positividade da infeco por T. cruzi em Abaetetuba 68
xiii
6.3. Inqurito entomolgico 72
6.3.1. Infestao em unidades domiciliares 72
6.3. Modelagem do risco ecoepidemiolgico da doena de Chagas 80
6.3.1. Anlise Univariada - Inqurito 80
6.3.2. Anlise Multivariada - Inqurito 82
7. Discusso 85
7.1. Dinmica local da DCA segundo o sistema de vigilncia 86
7.2. Componente econmico na epidemiologia local da DCA 88
7.3. Aspectos clnicos 90
7.4. Aspectos ecolgicos, climticos, ambientais e entomolgicos 92
7.5. Modelo ecoepidemiolgico de risco para a doena de Chagas 95
7.6. Limitaes do estudo 99
8. Concluses 100
9. Recomendaes 101
10. Bibliografia 104
11. Anexos 131
xiv
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1. SOROPREVALNCIA DA INFECO CHAGSICA. DISTRIBUIO POR ESTADO.
INQURITO SOROLGICO NACIONAL. BRASIL. 1975/1980. ............................................................ 25
FIGURA 2. MAPA DAS REAS DE RISCO DA DOENA DE CHAGAS. .................................................... 26
FIGURA 3: MAPA DA ESTRATIFICAO DE RISCO DAS REAS DE RISCO PARA TRANSMISSO
DE DC NO BRASIL. ................................................................................................................................... 29
FIGURA 4 . ESTRATIFICAO DAS REAS PARA A VIGILNCIA DA DOENA DE CHAGAS. ......... 36
FIGURA 5. FLUXOGRAMA DE ABORDAGEM SISTMICA DO PROGRAMA DE CONTROLE DA
DOENA DE CHAGAS .............................................................................................................................. 37
FIGURA 6. MAPA ABAETETUBA - PA ......................................................................................................... 44
FIGURA 7. LOCALIZAO DAS REAS DE ESTUDO. ABAETETUBA- PA ............................................ 45
FIGURA 8. DISTRIBUIO MENSAL DOS CASOS ACUMULADOS DE DCA NO MUNICIPIO
ABAETETUBA- PA, 2005-2012. ................................................................................................................ 63
FIGURA 9. GRFICO NORMAL DE PROBABILIDADE PARA O MODELO QUASIPOISSON.
ABAETETUBA-PA. 2005-2012 .................................................................................................................. 67
FIGURA 10. AMOSTRAS PARA SOROLOGIA POR FAIXA ETRIA E SEXO. ABAETETUBA-PA. 2008-
2009 .............................................................................................................................................................. 68
FIGURA 11. RESULTADOS DAS AMOSTRAS POR LABORATRIO E MTODOS DE DIAGNSTICO.
ABAETETUBA-PA. 2008-2009 .................................................................................................................. 70
FIGURA 12. DISTRIBUIO DAS ESPCIES DE TRIATOMNEOS QUANTO FONTE ALIMENTAR E
INFECTIVIDADE POR REA. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ............................................................. 75
FIGURA 13. CASOS HUMANOS E PALMEIRAS INFESTADAS NA ILHA DE AJUA. ABAETETUBA-
PA. 2008-2009 .............................................................................................................................................. 77
FIGURA 14. CASOS HUMANOS E PALMEIRAS INFESTADAS EM FRANCILNDIA. ABAETETUBA-
PA. 2008-2009 .............................................................................................................................................. 78
FIGURA 15. CASOS HUMANOS E PALMEIRAS INFESTADAS EM PANACAUERA. ABAETETUBA-
PA.2008-2009 ............................................................................................................................................... 79
FIGURA 16. PROBABILIDADE DE OCORRNCIA DA DCA PELO MODELO MULTIVARIADO
CONSIDERANDO VARIVEL A VELOCIDADE DO VENTO. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ........ 83
FIGURA 17. PROBABILIDADE PREDITA PELO MODELO DE REGRESSO LOGSTICA
MULTIVARIADO CONSIDERANDO A VELOCIDADE DO VENTO CONSTANTE NA MDIA
IGUAL A 2.71 M/S. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ................................................................................ 84
xv
LISTA DE TABELAS
TABELA 1. SRIE HISTRICA DOS SURTOS DO BRASIL. 1965 A 2007 .................................................. 30
TABELA 2. VARIVEIS DE RISCO E UNIDADES DE MEDIDA E CODIFICAO ................................. 56
TABELA 3. CARACTERSTICAS EPIDEMIOLGICAS E CLNICAS DOS CASOS DE DOENA DE
CHAGAS AGUDO EM ABAETETUBA PA, 2005-2012. ....................................................................... 61
TABELA 4. DISTRIBUIO DOS CASOS POR ANO SEGUNDO O MODELO QUASIPOISSON.
ABAETETUBA-PA, 2005-2012 .................................................................................................................. 62
TABELA 5. DISTRIBUIO DOS CASOS DE DCA POR REA DA INFECO POR SEMESTRE.
ABAETETUBA-PA. 2005-2012 .................................................................................................................. 63
TABELA 6. RAZO DE CHANCES E NVEL DE SIGNIFICNCIA (P-VALOR), BASEADAS NO
MODELO QUASIPOISSON UNIVARIADO PARA A DCA SEGUNDO O BANCO DE VIGILNCIA,
ABAETETUBA- PA. 2005-2012. ................................................................................................................ 64
TABELA 7. COMPARAO ENTRE NVEIS DAS VARIVEIS EXPLICATIVAS SEGUNDO O
MODELO QUASIPOISSON ....................................................................................................................... 65
TABELA 8. MODELO DE REGRESSO LOGSTICA MULTIVARIADA PARA DOENA DE CHAGAS.
ABAETETUBA-PA. 2005-2012 .................................................................................................................. 66
TABELA 9. POPULAO AMOSTRADA, POSITIVOS E PREVALNCIA SEGUNDO AS
LOCALIDADES. ABAETETUBA-PAR. 2008-2009 ............................................................................... 69
TABELA 10. POSITIVIDADE DAS AMOSTRAS DE SANGUE VENOSO EM PESSOAS QUE
DECLARARAM FEBRE OU CONTATO COM TRIATOMNEOS. ABAETETUBA-PA. 2008-2009. .. 69
TABELA 11. SOROLOGIA POR IDADE, SEXO, MTODO DE DIAGNSTICO POR LABORATRIO,
CONTATO COM TRIATOMNEO E FEBRE. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ...................................... 71
TABELA 12. TESTE DE CONCORDNCIA DE KAPPA. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ........................... 72
TABELA 13. NMERO DE CASAS PESQUISADAS POR REA POR ENCONTRO DE TRIATOMNEOS
POR ESTDIO. ABAETETUBA - PA. 2008/2009 ..................................................................................... 72
TABELA 14. ESPCIES DE TRIATOMNEOS CAPTURADAS, E INFECTADAS POR PALMEIRA POR
LOCALIDADE. ABAETETUBA-PA. 2008-2009 ...................................................................................... 73
TABELA 15. GRAU DE ANTROPIZAO POR REA. ABAETETUBA-PA 2008-2009 .......................... 76
TABELA 16. RAZO DE CHANCES E NVEL DE SIGNIFICNCIA, NO MODELO DE REGRESSO
LOGSTICA UNIVARIADO. ABAETETUBA-PA. 2008-2009. ................................................................ 80
TABELA 17. MODELO DE REGRESSO LOGSTICA MULTIVARIADA PARA DOENA DE CHAGAS.
ABAETETUBA-PA. 2008-2009. ................................................................................................................. 82
TABELA 18: EVOLUO DA REA DE CULTIVO, PRODUO, RENDIMENTO E PREO DO AA.
PAR. 1996-2009 ...................................................................................................................................... 157
TABELA 19: PREO DO AA NO ESTADO DO PAR. 2012 .................................................................... 157
xvi
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1. DISTRIBUIO DOS PARTICIPANTES COM POSITIVIDADE ISOLADA OU EM
CONJUNTO COM POSITIVIDADE MATERNA, SEGUNDO ESTADO, MUNICPIO DE
RESIDNCIA E A CATEGORIA DE POSITIVIDADE PARA DOENA DE CHAGAS NAS REGIES
NORTE E NORDESTE. ............................................................................................................................... 28
QUADRO 2. MODELO DE INVESTIGAO DE DCA .................................................................................. 33
QUADRO 3: VARIAO NO PREO DO AA ACUMULADO POR MS. PAR. 2009-2012 ............... 158
xvii
Lista de abreviaturas, siglas ou smbolos
AER - Avaliao Ecolgica Rpida
AIDS - Sndrome da Imunodeficincia Adquirida
AMCHA - Iniciativa Amaznica
0C Graus Celsius
CDC - Center Disease Control
CENSIPAM - Centro do Sistema de Proteo da Amaznia
CONAB Companhia Nacional de Abastecimento
DC Doena de Chagas
DCA Doena de Chagas Aguda
DIE - Doena Infecciosa Emergente
DIEESE Departamento Intersindical de Estatsitca e Estudos Scioeconmicos
DTUs - Discret Taxonomica Units
ELISA IgM - Enzyme-Linked Immunosorbent Assay com pesquisa de IgM
FIOCRUZ - Instituto Oswaldo Cruz
FUNED - Fundao Ezequiel Dias
GPS - Global Position System
HAI - Hemaglutinao Indireta
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IEC- Instituto Evandro Chagas
IFI-IgM - Imunofluorescncia Indireta com pesquisa de IgM
IgG Imunoglobulina G
IgM Imunoglobulina M
INCOSUR - Iniciativa do Cone Sur
INMET Instituto Nacional de Meteorologia
xviii
INSIC - Inqurito Nacional de Soroprevalncia da Infeco Chagsica
IPED/APAE - Instituto de Pesquisa e Diagnstico da Associao de Pais e Amigos dos
Excepcionais de Campo Grande-MS
LACEN-PA - Laboratrio Central do Estado do Par
Mm milmetros
MS Ministrio da Sade
m/s Metros por segundo
OMS Organizao Mundial da Sade
OPAS Organizao Pan-americana de Sade
OPS Organizacin Panamaericana de la Salud
PACS/PSF - Programa de Agentes Comunitrios de Sade/ program Sade da famlia
PCR - Polymerase Chain Reaction
PNCDCh - Programa Nacional de Controle de Doena de Chagas
POs - Pontos de Observao
SAGRI Secretaria de Agricultura
SESPA Secretaria de Estado de Sade Pblica do Par
SIG - Sistema de Informao Geogrfica
T. cruzi - Trypanosoma cruzi
UTM - Sistema Universal Transverso de Mercator
WB - Western Blot
WHO World Health Organization
ZCIT - Zona de Convergncia Intertropical
xix
RESUMO
ECO-EPIDEMIOLOGIA DA DOENA DE CHAGAS AGUDA EM REA
AMAZNICA. MUNICPIO DE ABAETETUBA, ESTADO DO PAR, BRASIL,
2008-2009
Na Amaznia Brasileira as descries sobre Doena de Chagas Aguda (DCA) tem se limitado a anlise de surtos orais e casos isolados. O Estado do Par, a partir da sistematizao da vigilncia da doena de Chagas, registrou entre 2005 e 2012 um nmero crescente de casos agudos, principalmente na regio nordeste do Estado. Para avaliar fatores associados ao risco de ocorrncia de DCA foram selecionadas reas urbanas, rurais e ilhas, no municpio de Abaetetuba onde foram feitos cortes epidemiolgicos entre os anos 2008 e 2009 confrontando-se as informaes da casustica registrada pelo Sistema Nacional de Notificao de Agravos (SINAN) no perodo 2005-2012 com os achados do trabalho de campo. Nos inquritos realizados foi aplicado um questionrio, coleta de amostras biolgicas para estudo sorolgico e parasitolgico, capturas entomolgicas em unidades domiciliares e ectopos naturais para determinar os nveis de infestao, infeco pelo Trypanosoma cruzi e estudo de fonte alimentar em triatomneos, georreferenciamento das residncias, palmeiras e casos humanos, anlise ambiental para estratificar o grau de antropizao e dados climatolgicos. De uma populao de 6213 residentes (4,3% da populao do municpio), foram analisadas 4699 amostras, dando uma soroprevalncia geral de 2,54 por mil hab. No foram encontrados triatomneos domiciliados e dos 250 espcimes capturados em palmeiras, 85,20% foi da espcie Rhodinus pictipes, com uma infectividade de 11,26% que se alimentaram principalmente com sangue de gamb e roedor. A anlise multivariada demostrou que a febre, contato com triatomneos, palmeiras infestadas e velocidade do vento so fatores altamente significativos e associados (RC= 28.7; 14.5; 10.3 e 4.36 respectivamente) ao risco de contrair a doena de Chagas, principalmente na ilha de Ajua, rea menos antropizada, que no momento da pesquisa apresentava um ciclo enzotico ativo e estabelecido; no banco de vigilncia observou-se associao significante entre a ocorrncia de DCA e apresentar edema, febre e alimentar-se com aa. Os resultados indicam uma epidemiologia da DCA diferenciada entre as reas de estudo onde a dinmica de produo do aa produzido nas ilhas tem relao com a ocorrncia dos casos agudos por transmisso oral na rea urbana. Estes achados devem ser considerados na formulao das polticas pblicas para o controle da doena na regio amaznica.
Palavras chave: Doena de Chagas Aguda, Amaznia, Epidemiologia
xx
ABSTRACT
ECO-EPIDEMIOLOY OF ACUTE CHAGAS DISEASE IN AMAZON AREA.
MUNICIPALITY ABAETETUBA, PAR STATE, BRAZIL, 2008-2009
In the Brazilian Amazon descriptions of Acute Chagas Disease (ACD) have been limited to oral outbreaks and isolated cases analysis. Between 2005 and 2012, the Par State, under systematic surveillance of Chagas disease, recorded an increasing number of acute cases, especially in the northwest region. To assess factors associated with the risk of ACD, cross-sectional surveys were developed in urban, rural and island areas in Abaetetuba municipality, between 2008 and 2009. Findings in the fieldwork were confronted to the information recorded by the National System of Notifiable Diseases (SINAN) between 2005-2012. Surveys techniques included: a questionnaire, collection of biological samples for serological and parasitological studies, entomological catches in households and natural ecotopes to determine infestation levels, infection by Trypanosoma cruzi and the food source in triatomines; georeferencing was made of households, palm trees and human cases; environmental analysis assessed the degree of anthropization; climate data was included. From a population of 6213 residents (4.3% of the municipality), 4699 samples were analyzed, giving an overall prevalence of 2.54 per thousand inhabitants. Not domiciled triatomines were found and out of 250 specimens captured in palms, 85.20% was Rhodnius pictipes, whose infectivity was 11.26% and fed mainly with possum and rodent blood. Multivariate analysis demonstrated that fever, contact with triatomines, infested palms and wind speed are factors strongly associated (OR = 28.7; 14.5; 10.3 and 4.36 respectively) to the risk of contracting ACD, primarily on the island of Ajua, less anthropized area, which at the time of the survey had an active and established enzootic cycle. The surveillance data showed significant association between the occurrence of ACD and the presence of edema, fever and having fed aai. We observed an epidemiology of ACD differentiated between the study sites, where the dynamics of aai produced in the islands has a relationship with the occurrence of acute cases by oral transmission in the urban area. These findings should be considered in the formulation of public policies for the control of Chagas disease in the Amazon region.
Keywords: Acute Chagas Disease, Amazon, Epidemiology
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1. Introduo
A doena de Chagas - DC existe h milhes de anos como uma enzootia em animais
silvestres, que passou a se transmitir ao homem acidentalmente quando este invadiu os
ectopos silvestres (COURA, 2007).
Atualmente se sabe que sua distribuio vai desde o sul dos Estados Unidos at o sul
da Argentina. Juntos a Argentina, Bolvia, Brasil, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai tem 11
milhes de pessoas infectadas (MONCAYO, 1999).
Apesar de apresentar ocorrncia antiga, a doena na sua forma aguda s foi descrita
em 1909. A descoberta de Carlos Chagas, ao detectar o parasito em uma criana de 02 anos,
em Minas Gerais, foi considerada um marco na histria da medicina pelo descobrimento
simultneo do vetor (inseto conhecido popularmente como barbeiro gnero Triatoma), do
agente etiolgico da doena (o protozorio Trypanosoma cruzi) e sua patologia (DIAS, 1934;
LEWINSOHN, 1981; DIAS et al., 2002). Depois desta divulgao, a ocorrncia de casos e
surtos de DCA, de 1965 at 2007, demonstra que 06 episdios (15,4%) ocorreram na rea
no Amaznica, 33 (84,6%) na Regio Amaznica e destes 22 (56,4%) no Estado do Par.
Na Amaznia o primeiro caso humano autctone foi registrado em 1969, na cidade de
Belm, Estado do Par por SHAW et al.. (1969); mas segundo BRICEO-LEN (2007)
desde o incio do sculo 20 tinha-se conhecimento da abundncia de hospedeiros mamferos
potenciais reservatrios e vetores triatomneos na Amaznia brasileira.
Entretanto, o conhecimento da doena Chagas na rea amaznica escasso,
observando-se que a regio era considerada indene para transmisso da doena at 2005
(VALENTE et al., 1999; OPAS, 2004; PINTO et al., 2008) e apesar da realizao de dois
grandes inquritos nacionais, a magnitude da doena no foi dimensionada, pois no tiveram
uma amostragem representativa para regio.
O primeiro estudo no Brasil entre os anos de 1975 e 1980 sobre a infeco chagsica
com alcance nacional teve como objetivo estimar a prevalncia da infeco na populao
geral residente em rea rural (SILVEIRA et al., 2011). Foram analisadas 1.352.197 amostras
procedentes de 3.026 municpios de 24 estados excetuando-se So Paulo e Rio de Janeiro,
ficando a positividade mdia nacional em 4,22; observando-se uma positividade no esperada
para os estados amaznicos, sendo igual a 0,56 no estado do Par.
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O segundo inqurito nacional de soroprevalncia da infeco chagsica, foi realizado
entre 2001 e 2008, em menores de cinco anos. A prevalncia para o Estado do Par foi igual
a zero (OSTERMAYER et al., 2011).
Atualmente, dentre os Estados brasileiros com maior nmero de ocorrncias de casos
agudos de DC, o Estado do Par segue responsvel por mais de 70% da totalidade. Dos 934
casos de doena de Chagas aguda do Par, registrados no perodo de 2005 a 2012 pelo
Programa Estadual de Controle da DC, o municpio de Abaetetuba foi o responsvel por
aproximadamente 19,61% (n=184) dos casos.
A via de transmisso oral tem sido amplamente comprovada e vrios autores
(LAINSON et al., 1980; SHIKANAI-YASUDA et al., 1991; COURA, 1997;
CAMANDAROBA et al., 2002; VALENTE et al., 2002) tem demonstrado sua importncia,
frequncia e visibilidade na cadeia epidemiolgica da DC. No Par, tem merecido ateno
tanto pelos servios de sade quanto pelas instituies de pesquisa cientfica, uma vez que o
maior nmero de casos advm dos surtos por transmisso oral na forma de surtos restritos a
grupos de convivncia familiar, laboral e comunitria (microepidemias) (SHAW et al., 1969;
VALENTE et al., 1993, 1999, 2000, 2002, DIAS et al., 2002; BELTRO et al., 2009;
NBREGA et al., 2009).
Um dos gatilhos para todo o processo de ateno regio amaznica e, por
conseguinte ao Par, ocorreu aps o surto de transmisso oral por caldo de cana em Santa
Catarina (ANDRADE et al., 2006), que contribuiu para a mudana de estratgia poltica e o
fortalecimento da vigilncia na Amaznia, com enfoque primordial para a transmisso oral
da DC.
O conhecimento da cadeia de transmisso da doena de Chagas na regio amaznica
at hoje no est devidamente caracterizado e constitui um grande desafio para a
compreenso da magnitude da doena, particularmente no Par, tanto pela aparente extenso
da problemtica quanto pela falta de informao sistematizada que apoie a definio das
diretrizes e, portanto, a tomada de decises desde o Programa de Controle de Doena de
Chagas - PCDC.
Com a execuo do Plano de Intensificao, por meio de eixos de interveno de
Gesto, Vigilncia Epidemiolgica, Vigilncia Laboratorial, Ateno Bsica, Ateno de
Mdia e Alta Complexidade, Vigilncia Sanitria, Vigilncia Ambiental e Entomolgica e
Educao em Sade e Mobilizao Social (PAR, 2007), um novo cenrio para DC no Par
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veio tona e com estas interfaces mais delimitadas, foi possvel comear a delinear o perfil
epidemiolgico da doena, suas peculiaridades, e a possibilidade da emergncia e disperso
da doena de Chagas humana na Amaznia (DIAS et al.; 2001, 2002).
A partir desta constatao, o estado do Par e o Ministrio da Sade elaboraram o
Plano de Intensificao das Aes de Controle da Doena de Chagas no Par, validado pela
Resoluo n 91 (Dirio Oficial do Estado do Par (25/01/2008) e aprovado pela Comisso
de Intergestores Bipartite do Par CIB/PA. O objetivo foi a reduo da ocorrncia de casos
de DCA, realizao de diagnstico, tratamento oportuno e seguimento do paciente,
diminuio da exposio ao risco para transmisso vetorial, diminuio do risco de
transmisso oral por alimentos e reduo da letalidade. Nesse contexto, o estado considerou
86 municpios como prioritrios para o desenvolvimento do Plano, seja por pertencerem
rea de incentivo financeiro produo de aa e/ou pela ocorrncia de casos de DCA
(PAR, 2007).
Com base na informao de que Abaetetuba o segundo municpio com maior
nmero de casos de DCA no Estado e que aparentemente no rene um ciclo enzotico capaz
de gerar todos estes casos, foi considerada a necessidade de investigar a natureza da dinmica
epidemiolgica da DCA na rea, considerando a via oral como principal geradora de casos.
Este municpio tem sua atividade econmica baseada na agricultura de subsistncia e
o segundo maior fornecedor de aa para dentro e fora do Estado. Este fator econmico,
vinculado informao da ocorrncia de casos de DCA, desencadeou a elaborao de um
trabalho de campo para avaliar esta rea de risco de transmisso de T.cruzi e ampliar o olhar
sobre uma doena considerada negligenciada e vinculada pobreza (DIAS, 2007; COURA,
2007; WHO, 2008).
Nesse contexto, conhecer e analisar a doena de Chagas na Amaznia, especialmente
numa rea onde a vigilncia est sistematizada, significa fomentar o conhecimento da doena
aguda e fortalecer as aes para o seu controle. Com esta finalidade, procuramos respostas
para as seguintes hipteses:
a) Quais so as reas de risco e os fatores de risco para DC em Abaetetuba?
b) Qual a magnitude da doena medida como soro prevalncia da DC?
c) Quais elementos entomolgicos se encontram ao nvel local?
d) Qual a influncia da antropizao e de fatores climticos para a ocorrncia de DC?
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Como esse modelo terico de controle da DC, proposto pelo Consenso Brasileiro em
doena de Chagas nunca havia sido testado. E ainda, como os resultados positivos em casos
humanos e triatomneos sugerem autoctonia da DC em Abaetetuba, justifica-se uma anlise
epidemiolgica para ampliar o conhecimento sobre os fatores que podem determinar a
ocorrncia da doena e estabelecer critrios de risco e indicadores que possam subsidiar a
vigilncia.
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2. Reviso da literatura
2.1. Doenas emergentes - Consideraes preliminares
As atividades humanas tm ameaado e causado alterao do meio fsico, em boa
parte responsabilizada pelas mudanas climticas regionais e globais. Em que pesem os
esforos da Organizao Mundial da Sade (OMS) com seus programas de erradicao, as
populaes humanas veem-se ainda a braos com endemias infecciosas (FORATTINI, 2006).
Segundo relatrio da ONU, 1992, sobre os efeitos do aquecimento global e mudanas
climticas, entre outros agravos, ocorrero surtos epidmicos em pases ricos e pobres: No
plano da sade, as doenas tropicais vo se espalhar para alm das zonas quentes. Nos pases
desenvolvidos a mortalidade vai aumentar, devido ao calor, a umidade e a contaminao. O
aumento das doenas infecciosas que prosperam em climas quentes pode ser atribudo
mudana do clima, especialmente a malria, o dengue e o clera. De acordo com os cientistas,
este aumento j afetou sistemas fsicos e biolgicos em vrias partes do mundo, alterando o
comportamento de alguns animais (http://www.onu.org.br/rio20/1992-2012/).
O modelo da teoria dos focos naturais proposto pelo parasitologista russo Pavlovsky,
na dcada de 30, apesar de insuficiente para dar conta de explicaes atuais na epidemiologia
das doenas e da sua transformao pela ao do homem, representa uma possibilidade de
anlise mnima do espao enquanto categoria da epidemiologia (SILVA, 1997).
O processo de urbanizao de doenas transmitidas por vetores tem sido incrementado
pelo crescimento demogrfico, intensificao do processo migratrio, aparecimento de
grandes centros urbanos em reas onde no havia tais adensamentos populacionais (CDC,
1994), e pelas interaes comerciais entre cidades e pases, que tm sido intensificadas por
meios de transporte cada vez mais sofisticados e rpidos e ainda pelo contrabando de espcies
silvestres.
Atualmente no podemos prever. O que podemos entender melhor a relao entre a
interferncia humana no ambiente e as doenas, investigar antes o quanto as mudanas podem
interferir nessa relao, ao contrrio do que ocorreu quando da colonizao da Amaznia que
fez os casos de malria aumentarem de 100 000 para 1 milho em poucos anos. Oppenheimer
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escreveu: Temos hoje a dolorosa certeza, de que o poder de modificao, nem sempre
conduz ao bem, necessariamente (AMATO, 1997).
KRAUSE, 1992 afirma que uma nova epidemia pode estar sendo incubada agora
mesmo em uma mega cidade, sem saneamento e superpovoada, do mundo no desenvolvido
ou nas florestas remotas da frica, Amrica do Sul ou sia regies esparsamente povoadas
que recentemente tm sido alteradas pela civilizao moderna.
Os novos agentes etiolgicos tm, provavelmente, sua origem nas amplas
transformaes sociais observadas nos ltimos 25 anos, acompanhadas de alteraes
importantes em vrios ecossistemas (BARATA, 1997).
As transformaes na dinmica populacional decorrentes do processo de
envelhecimento, do seu crescimento em determinadas condies, da mobilidade e da
diferenciao e excluso de determinados grupos contribuem para o surgimento de novos
agentes etiolgicos com caractersticas insuspeitas de infectividade, patogenicidade e
virulncia (POSSAS, 1994), ou ainda de alteraes importantes nesses agentes, propiciando
troca de material gentico entre eles, capacidade de sobrevivncia em vrios ambientes,
ocupao de novos nichos ecolgicos, aumento da infectividade e maior capacidade de
colonizao.
Esses fatores tm alterado o quadro epidemiolgico das doenas antigas tornando-as
novas em ambientes onde no estavam presentes. Tal fato, de certa forma contradiz a ideia de
que estaramos em uma fase de transio epidemiolgica naturalmente fundamentada na
progresso etria da populao.
Estes fatos, portanto, caracterizam o atual perfil epidemiolgico brasileiro e regional,
marcado pela polarizao entre doenas ditas de primeiro mundo e doenas da pobreza. Ele
observado no s no Brasil, como tambm em vrios pases da Amrica Latina, somando-se
ao crescimento dos problemas ambientais e de eventos violentos, ameaando exceder os
limites do sistema de sade (FRENK, 1992; PRATA, 1992).
De acordo com AMATO (1997), doena emergente um conceito histrico e sua
dinmica est baseada na inter-relao entre variao microbiana, mudanas nas populaes
de vetores induzidas por condies econmicas e biolgicas e expanso e transformao da
populao humana. Segundo o autor, os americanos nativos sofreram infeces emergentes
quando do primeiro contato com os espanhis. Estima-se que 54 milhes de nativos foram
mortos pela introduo de doenas, ou seja, 90% da populao original.
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O Center for Disease Control (CDC) define doena emergente como aquela cuja
incidncia aumentou nas ltimas dcadas ou tende a aumentar no futuro, incluindo aqui a
emergncia de problemas novos. Exs.: AIDS, clera, doenas causadas por agentes
microbianos resistentes aos desinfetantes e medicamentos, as produzidas pela exposio a
animais como o hantavrus e doena de Lyme; e, ainda, as doenas tropicais: malria, dengue,
leishmanioses e doena de Chagas e as decorrentes de vigilncia epidemiolgica ineficiente
ou insuficiente (CDC, 1994).
As tentativas de controle das doenas infecciosas e parasitrias tm sido equivocadas,
resultado da falta de compreenso mais ampla de como se d a dinmica do processo
infeccioso, dos erros conceituais a respeito do que venha a serem controle e erradicao de
doenas transmissveis e da ausncia de informaes sistematizadas sobre o comportamento
destas doenas (WALDMAN et al., 1999).
A epidemiologia est primeiramente interessada na ocorrncia da doena por tempo,
lugar e pessoas. Ela tenta determinar se houve aumento ou decrscimo da doena ao longo
dos anos; se uma rea geogrfica tem frequncia da doena mais alta do que a outra e se a
caracterstica das pessoas com a doena distingue-se daquelas sem ela (LILIENFELD &
LILIENFELD, 1980).
CHERKASSKII 1988 acrescenta ainda os determinantes dos sistemas biolgico,
econmico e poltico. A compreenso do processo infeccioso se d pela observao contnua
dos diversos fenmenos que ocorrem de forma interdependente e inter-relacionada no mbito
dos sistemas e subsistemas envolvidos.
2.2. Histria da doena de Chagas
Depois de infectar, por milhes de anos, exclusivamente animais, o T. cruzi comeou a
infectar humanos e, conseqentemente, a doena de Chagas tornou-se uma doena infecciosa
emergente (DIE). Tal como acontece com muitas DIE, o evento chave na sua emergncia foi
uma alterao na relao vetor-hospedeiro-parasita resultante das interaes antropognicas
nos habitats da vida selvagem que permitiram ao vetor o contato com o ser humano e
subsequente transmisso do parasita zoontico aos seres humanos (WOLFE et al., 2007).
ROTHHAMMER em 1985 relata leses intestinais e cardacas compatveis com as da
doena de Chagas em corpos mumificados. Estudos histopatolgicos em mmias incas
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peruanas mostraram ninhos de formas de amastigotas de T. cruzi em fibras cardacas
(FORNACIARI et al., 1992), confirmando a teoria clssica da origem andina de infeco
humana pelo T. cruzi h cerca de 6.000 anos atrs, provavelmente quando a populao adotou
hbitos sedentrios (FERREIRA, 2011).
No Brasil, a teoria foi que a doena teria sido introduzida no perodo colonial
concomitante com a introduo do Triatoma infestans, que se adaptou s habitaes precrias
feitas de barro e pique, (DIAS et al., 2000). Porm dados obtidos com ferramentas
moleculares (AUFDERHEIDE et al., 2004; LIMA et al., 2008) mostraram que tanto no Brasil
como em outras partes do continente Americano a entrada de humanos no ciclo de
transmisso zoontica do T. cruzi provavelmente comeou logo que este chegou ao continente
americano (ARAJO et al., 2009).
O certo que a descoberta da doena coube a Carlos Chagas quando foi designado a
realizar trabalho clnico e profiltico de malria na estrada de ferro Central do Brasil em
Lassance Minas Gerais e observou pessoas com sintomas adversos queles da doena.
Conforme ilustrado na clebre frase de Oswaldo Cruz publicada neste mesmo ano, o
descobrimento desta molstia constitui o mais belo exemplo do poder da lgica a servio da
cincia. Nunca at agora, nos domnios das pesquisas biolgicas, se tinha feito um
descobrimento to complexo e brilhante e, o que mais, por um s pesquisador (MALAFAIA
& RODRIGUES, 2010).
Este descobrimento foi um marco na histria da medicina, uma vez que o cientista
mineiro descobriu no apenas o vetor (inseto conhecido popularmente como barbeiro
gnero Triatoma) e o agente etiolgico da doena (o protozorio T. cruzi), como ainda
descreveu sua patologia. A divulgao deste marco data de 22 de abril de 1909, quando na
ocasio uma nota prvia foi publicada na revista Brasil Mdico e anunciava nova espcie
mrbida do homem, produzida por um tripanossomo, o T. cruzi (CHAGAS, 1909), sendo
neste mesmo ano publicado um artigo completo no primeiro volume da revista de
Manguinhos, Memrias do Instituto Oswaldo Cruz, o qual tratou do estudo sobre o ciclo
evolutivo do T. cruzi (CHAGAS, 1909).
Chagas ressaltou, ainda, que se tratava de uma doena que afetava a populao rural
que morava em casas com condies satisfatrias para a colonizao do vetor e, portanto
passvel de controle, como disse em 1911 na II Conferncia da Academia Nacional de
Medicina: Cumpre salientar que o principal facto epidemiolgico da molstia constitudo
pr um insecto, companheiro constante do homem nos domiclios e, pr isso mesmo,
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facilmente attingvel s medidas de destruio, medidas sanitrias nesse sentido, visando,
sobretudo, modificar as condies de habitabilidade... importariam, sem dvida, em acto
administrativo do maior proveito (DIAS & SCHOFIELD, 1999).
Em 1934 Chagas descreveu sua distribuio assim: Primeiramente verificada no
Brasil em Minas Gerais, esta tripanosomase no exclusiva do nosso pas, foi observada em
outros pases da Amrica Central e Sul. Na Argentina, nas provncias de Tucumn e
Catamarca, muitos casos foram observados com verificao de parasitas no sangue perifrico,
tanto quanto no Peru, Venezuela, San Salvador e recentemente no Panam.
Carlos Chagas registrou os primeiros casos de infeco pelo T. cruzi na Amaznia
Brasileira em macacos Saimiri sciureus capturados no Estado do Par (CHAGAS, 1924). Em
1938, FERREIRA & DEANE identificaram um protozorio indistinguvel de T. cruzi em
diversos mamferos silvestres e triatomneos.
2.3. Distribuio da doena de Chagas
Hoje se sabe que a doena se estende desde o sul dos Estados Unidos at o sul da
Argentina, estima-se que ainda existam entre 12 e 14 milhes de infectados na Amrica
Latina, com mais de 60 milhes de pessoas sob risco de transmisso, em cerca de 18 pases
endmicos (WHO, 2002).
Por muitas dcadas a doena de Chagas foi estritamente rural, existindo apenas em
zonas marcadas pela pobreza e excluso. A doena foi simbolizada pela famlia de
camponeses e da cabana rural cheia de triatomneos. No entanto, mudanas nas reas rurais,
migraes para as cidades, o aumento da pobreza no meio urbano, transformou a doena em
fenmeno igualmente urbano. O smbolo no mais a cabana rural, mas os bancos de sangue,
os imigrantes e pacientes em hospitais que procuram ajuda e ateno (BRICEO-LEON &
GALVN, 2007). Em todos os pases as pessoas vivem mais nas cidades do que no campo,
alis, 70% da populao urbana (CELADE, 2004). Ao mesmo tempo, observa-se o
crescimento da pobreza nas cidades e, portanto o aumento da prevalncia da doena nesse
meio.
Em seu contexto geral e frente evoluo poltica e social do continente, a doena de
Chagas humana constitui-se um exemplo particular e caracterstico na Amrica Latina, pois
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reflete e sofre as consequncias da histria social e da questo da equidade na regio (DIAS,
2007).
Mudanas no comrcio, produo e finanas no mundo esto afetando a presena da
doena de Chagas. Pode-se observar claramente tal fato em dois processos que ocorrem em
locais completamente diferentes, por um lado, a presena da doena de Chagas, nos Estados
Unidos e Europa desde a chegada cada vez maior de imigrantes latino-americanos, e, do
outro, a crescente presena da doena de Chagas na Amaznia (BRICEO-LEON &
GALVN, 2007).
Na regio Amaznica, apesar de se encontrar uma grande quantidade de vetores e de
animais que so reservatrios do parasita, foi apenas recentemente que os casos autctones
foram encontrados e um aumento notvel deles pode ser observado (COURA et al., 2002,
JUNQUERA et al., 2005). Alguns fatores importantes, tais como o desmatamento, a
eliminao das fontes de alimento silvestres dos vetores, o processo de ocupao de novos
territrios, o aumento do sedentarismo da populao, a difuso de um novo tipo de casa e a
incorporao da presena de animais domsticos em casa (COIMBRA & SANTOS, 1994,
COIMBRA et al., 2004), produzem um habitat atraente que pode ser visitado e colonizado
pelos vetores da doena.
2.4. Vetores
H mais de cem anos atrs, mdicos entomologistas sugeriram uma conexo entre a
diversidade de espcies e a transmisso de doenas transmitidas por vetores a seres humanos
(SERVICE, 1991).
Sem dvida o fato mais consistente da tripanossomase nas Amricas est no registro
da presena dos vetores invertebrados, alis, fundamental na descoberta de Carlos Chagas
(SCHOFIELD, 1998; DIAS, 2000).
Frei Reginaldo de Lizarraga foi o primeiro a descrever os aspectos e hbitos de
triatomneos, provavelmente T. infestans em 1590, quando inspecionava conventos do Peru ao
Chile (VELAZCO & RIVAS, 2007).
O primeiro triatomneo foi formalmente descrito em 1773 por DE GEER como Cimex
rubrofasciatus, 60 anos mais tarde esta espcie foi classificada como do gnero Triatoma por
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LAPORTE (1832-1833). Em 1811 LATREILLE classificou duas espcies que chamou de
Reduvius dimidiatus e Reduvius geniculatus ambos do Equador. KLUG (1834) descreveu o
Reduvius infestans no sudeste da Amrica do Sul. BURMEISTER (1835) foi o primeiro
entomologista a chamar ateno para o hbito hematofgico do triatomneo, at ento
desconhecido, apesar de ter sido referido por vrios viajantes que faziam expedies
Amrica do Sul.
Estes insetos receberam numerosos nomes, muitos sugeridos por observao indgena
de seus aspectos morfolgicos e hbitos: barbeiro, chupo, chupana, finco, furo, bicudo,
percevejo, bicho de parede, bruxa, percevejo do serto, percevejo grande, procot, porocot,
barato, cafote, cascudo, piolho de piaava, rondo, vum-vum, vinchuca (ARGOLO, 2008).
Seus habitats primrios so tocas, buracos de animais, ninhos de aves e marsupiais,
edentados, roedores e carnvoros. So encontrados em rochas e muros de pedras, em buracos
de rvores, palmeiras e bromlias. No peri domiclio ocorre em currais, estbulos, em casa de
coelhos, porcos, galinhas e dentro das residncias (ARGOLO, 2008).
Nas habitaes humanas preferem lugares escuros como armrios, fendas nas paredes,
colches, quadros, etc. No voam muito, so atrados pela luz e assim adentram nos
domiclios.
Triatomneos pertencem a ordem Hemiptera, famlia Reduviidae e subfamlia
Triatominae, tem porte grande, hematfagos restritos podem realizar canibalismo e coprofagia
podendo assim transmitir o T.cruzi de vetor a vetor. So ovparas, as fmeas tem um perodo
de 3 a 4 meses de oviposio e produz de 100 a 200 ovos por ano. Os ovos rompem-se de 10 a
20 dias aps a copulao, a ovoposio pode durar por vrios meses. O nmero de ovos varia
de acordo com a espcie e com os fatores externos como alimento, temperatura e umidade. H
cinco estdios ninfais e todos so hematfagos estritos. O ciclo de vida completo pode variar
de 90 dias at 2 anos (LENT, 1979). A maioria das espcies silvestre, possui hbitos
noturnos, tendem a voar pouco, e as fmeas so mais ativas do que os machos e apresentam
com maior capacidade de disperso e longevidade.
De acordo com NEIVA & LENT (1941) at 1941 haviam listado 89 espcies
distribudas em 63 pases. Em 1979 LENT & WYGODZINSKY estudaram e publicaram 110
espcies vlidas de Triatominae distribudas em tribos e gneros (LENT, 1999). Das 142
espcies conhecidas que esto divididas em 5 tribos e distribudas em 15 gneros
(SCHOFIELD & GALVO, 2009), 48 foram identificadas no pas, das quais 30 j foram
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capturadas no ambiente domiciliar e 34 na regio amaznica. Dentre todos os gneros, o
Triatoma, Panstrongylus e Rhodnius so epidemiologicamente os mais importantes.
Um amplo levantamento entomolgico realizado no Brasil entre 1975/1983
demonstrou que 17 (dezessete) espcies vivem no ambiente domiciliar com nveis variveis
de colonizao e infeco. As espcies Triatoma sordida, Triatoma infestans, Panstrongylus
megistus, Triatoma pseudomaculata e Triatoma brasiliensis, so consideradas de especial
importncia na transmisso da doena ao homem (SILVEIRA et al.. 1984). exceo do T.
infestans, as outras espcies so nativas: T. sordida encontrada onde h cerrado, P. megistus
em reas midas (costeira e ao longo dos rios), T. brasiliensis e T. pseudomaculata so
nativos da regio semirida, entretanto, com o programa de controle do T. infestans
implantado em 1983 houve uma drstica reduo destas espcies (MINISTRIO DA
SADE, 2005).
Outras espcies como o Triatoma rubrovaria no Rio Grande do Sul e Rhodnius
neglectus em Gois vem colonizando as habitaes humanas e tendem a assumir tambm um
papel na transmisso domiciliar. Deve-se fazer referncia ao Triatoma vitticeps pelas altas
taxas de infeco natural (Esprito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais), Rhodnius nasatus
pela frequncia com que capturado em reas localizadas (CE e RN), Rhodnius prolixus pelo
fato de ser a principal espcie em alguns pases (Colmbia e Venezuela) e por ter sido
identificado em focos naturais (macubeiras) no Estado de Tocantins (SILVEIRA et al., 1984).
Segundo JUNQUEIRA et al., (2005), na Amaznia Brasileira foram registradas 16
espcies (essencialmente silvestres) de triatomneos. Apesar de todas serem consideradas
potenciais vetores, somente algumas espcies oferecem risco para a populao como:
Rhodnius pictipes, Rhodnius robustus, Panstrongylus geniculatus, Panstrongylus herreri e
Triatoma maculata, conforme VALENTE (1999), TEIXEIRA et al., (2001), Consenso
Brasileiro em doena de Chagas (MS, 2005), AGUILAR et al., (2007) e PATTERSON et al.,
(2009).
Atualmente, as evidncias sugerem que s espcies do gnero Rhodnius apresentam
um papel importante na transmisso da DC na Amaznia e em outras regies Neotropicais. Os
ectopos preferenciais da maioria das espcies deste gnero incluem as palmeiras,
especialmente as do gnero Attalea (Aracoideae) que possuem anatomia favorvel para a
proliferao desses hempteros e representam um ecossistema nico albergando ampla gama
de reservatrios, tais como: marsupiais, quirpteros, roedores e bradipoddeos (LENT, 1979;
MILES et al., 1981; ROMAA et al., 1999; GAUNT &MILES, 2000; ABAD-FRANCH et
13
al., 2001; MONTEIRO et al., 2002; ZELEDN et al., 2006; ABAD-FRANCH &
MONTEIRO, 2007; DIAS et al., 2008; GURGEL-GONALVES, 2008).
Dentre as espcies do gnero Rhodnius, destaca-se R. pictipes que apresenta ampla
distribuio geogrfica (36 eco regies da Amaznia) e tem sido capturada com frequncia
invadindo as habitaes humanas, em diversas localidades da Regio Amaznica, geralmente
infectado e atrado pela luz (PVOA et al., 1984; SOUZA et al., 1988; AMUNRRIZ et al.,
1991; VALENTE et al., 1999; LUITGARDS-MOURA et al., 2005, ABAD--FRANCH et al.,
2009).
F et al., 1989 analisando ocorrncia de casos autctones da DC, na Regio do Alto
Solimes, Estado do Amazonas detectaram a presena de 22 exemplares de R. pictipes, sendo
12 no intradomiclio e 10 em palmeiras localizadas no peridomiclio. A investigao
entomolgica incriminou esta espcie como potencial vetor responsvel pela ocorrncia dos
casos.
Todas as espcies so vetoras em potencial, mas em poucos casos esto aptas a serem
efetivas na transmisso da doena em homens, pois dependem dos seguintes fatores: (LENT,
1979)
A. Adaptao da vida em habitaes humanas;
B. Alto grau de antropofilia;
C. Curto espao de tempo entre alimentao e defecao;
D. Ampla distribuio geogrfica.
Entretanto, importante destacar excetuarem-se os casos de acidentes como aqueles
provenientes de macerao do inseto no momento do preparo de alimentos culminando na
doena aguda de etiologia oral (MS, 2005).
A domiciliao dos triatomneos pode ser entendida como uma rota evolucionria do
predador pela fonte de alimentao onde o habitat domstico representa simplesmente um tipo
particular de ninho de vertebrado. um processo de especializao que envolve
simplificao gentica e caractersticas fenotpicas e por essa razo, irreversveis. Espcies
selvticas podem se especializar por habitats domsticos, porm perdem a capacidade de
readaptao nos ambientes silvestres (SCHOFIELD, 1998).
Entretanto importante destacar que na Amaznia, principalmente no Estado do Par,
a transmisso da doena de Chagas, tem sido relacionada principalmente as espcies R.
14
robustus, R. pictipes e P. geniculatus, que invadem as residncias sem coloniz-los, (COURA
et al., 1994; 2002). Esta invaso geralmente se d pelo inseto em busca de alimento, tendo em
vista que a alterao do ambiente silvestre impe restries de rea e alimento aos
reservatrios silvestres e em consequncia perda da fonte alimentar natural do triatomneo que
so ento atrados para o domiclio em busca de fonte alternativa de alimento, aumentando
assim o risco de transmisso da doena de Chagas. (NOIREAU et al., 1995; 2005; GALVO
et al., 2003).
A anlise de padro alimentar dos vetores oferece parmetros para o melhor
entendimento do comportamento de espcies em rea de transmisso de T. cruzi. Pode ser
considerado como indicador, em determinados ambientes, dos possveis hospedeiros naturais
que estejam participando na manuteno do ciclo enzotico, contribuindo para a identificao
do reservatrio (LOROSA et al., 2003; CARANHA et al., 2006).
2.5. Reservatrios
A primeira infeco natural em mamfero foi registrada em gato por CHAGAS em
1909, e seguida em crianas. CHAGAS (1924) tambm encontrou T.cruzi em macacos
Chrysothrix sciureus capturados no Par.
O Callitrix penicillata foi a primeira espcie de primata no humano utilizada como
modelo experimental para a doena de Chagas por Oswaldo Cruz e Carlos Chagas, em 1909.
Estes animais desenvolveram satisfatoriamente a infeco aguda, entre 20 a 30 dias aps o
contato com triatomneos infectados. O Callithrix tambm tem sido utilizado para testes de
imunizao, inferindo sobre a competncia imungena de alguns candidatos vacina humana.
http://www.fiocruz.br/chagas/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=101
Foram descritos mais de 200 espcies de mamferos com a presena de T.cruzi
(DEANE, 1961; SHERLOCK, 1997). Os registros de mamferos infectados englobam uma
diversidade de espcies: marsupiais (Didelphis sp, Philander sp, Marmosa sp) roedores
(Nectomys sp, Neotoma sp, Akodan sp, Rattus sp, Proechymis sp) carnvoros (Procyon sp,
Tayra sp, Urocyon sp) e primatas (Saimiri sp, Aotus sp, Leontocebus sp, Cebus sp) e o
homem (CIDEIM, 1994). Nem todos so importantes reservatrios, tendo em vista os que
coabitam ou esto prximos ao homem como o co, rato, gamb, tat tem uma maior
http://www.fiocruz.br/chagas/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=10115
importncia epidemiolgica. As aves e animais de sangue frio so refratrios infeco, mas
so de relevncia, uma vez que podem servir de fonte alimentar para o vetor (MS, 1998).
Na Amaznia brasileira, a transmisso enzotica de T. cruzi entre mamferos silvestres
tem sido reconhecida por muitas dcadas (DEANE, 1984; LAINSON et al., 1979), o
Didelphis marsupialis, Philander opossum, Dasypus novencinctus, Tamadua tetradactyla,
Saimiri sciureus, Chiropotes satanas (VALENTE et al., 1992) foram encontrados parasitados
com T. cruzi.
O estudo da interao do T. cruzi com marsupiais considerado o mais importante e
mais antigo reservatrio, tem contribudo com novos dados sobre a biologia e ecologia do
flagelado. DEANE et al., em 1984, descobre estgios tipicamente encontrados em
triatomneos, tambm no lmen das glndulas anais de D. marsupialis evidenciando que este
animal, alm de reservatrio pode ser um vetor (SOUSA, 1999). Alm de ocupar o ambiente
silvestre este, pode ser frequentemente encontrado prximo s residncias e considerado um
importante elo entre o ciclo de transmisso silvestre e o domstico (JANSEN et al., 1999).
Por envolver em seu ciclo uma multiplicidade de espcies de mamferos potenciais
reservatrios, o ciclo de transmisso da DC complexo. Algumas teorias a esse respeito
sugerem que o risco estaria vinculado a abundncia ou reduo da diversidade de mamferos e
seleo daqueles reservatrios mais susceptveis ao T.cruzi, (KEESING et al., 2006, ROQUE
et al., 2008) o que poderia aumentar a proximidade e risco da infeco ao homem.
2.6. Agente etiolgico
Antes da descoberta da Doena de Chagas e do conhecimento da importncia do
barbeiro, quando trabalhava na profilaxia da malria em Rio das Velhas, Carlos Chagas
observara uma doena que denominou de doena mrbida do homem. Aps isto descobriu o
T. cruzi em um triatomneo (CHAGAS, 1909), que lhe foi trazido com histrico de
hematofagia em humanos, e em sangue de gato (PRATA, 1999). Em contato com Oswaldo
Cruz publicou em alemo a descrio das espcies: Trypanosoma minasense n. sp. e T. cruzi
n.sp., nome dado em homenagem a Oswaldo Cruz (LENT, 1999).
Primeiramente denominou-o Schizotrypanum, mas logo corrigiu seu erro (CHAGAS
1913). A evoluo do parasita no Triatoma infestans e a possibilidade de outras espcies
atuarem como vetoras, por ex. o Triatoma infestans, foi reportada por CHAGAS em 1913.
16
O T. cruzi um protozorio flagelado da ordem Kinetoplastida, famlia
trypanosomatidade, caracterizado pela presena de um flagelo e uma nica mitocndria. No
sangue dos vertebrados ele se apresenta sob a forma de tripomastigota e nos tecidos como
amastigotas. Embora capaz de recombinao in vitro (GAUNT et al., 2003), o T. cruzi se
reproduz predominantemente por fisso binria. Consequentemente, o seu gentipo diplide
nuclear transmitida em bloco para sua prognie.
O T. cruzi tem uma grande variabilidade intraespecfica verificada pela morfobiologia,
o que possibilitou uma ampla distribuio geogrfica na Amrica Continental e diversidade de
hospedeiros (DEANE, 1961, SHERLOCK et al., 1997). Alguns autores acreditam que esta
diversidade aconteceu por recombinaes genticas (SOUZA, 1999, BOGLIOLO et al., 1996,
CARRASCO et al., 1996). Estudos de DNA que utilizaram uma variedade de tcnicas
demonstraram a variabilidade do parasita (MACEDO & PENA, 1998).
O estudo da eletroforese enzimtica define trs sub populaes (zymodemas) no
Brasil, associadas ao ciclo domstico (ZII) ou ciclo silvestre (ZI e ZII) (MILES et al., 1978).
Recentemente estudos moleculares o dividem em duas linhagens filogenticas distintas:
Linhagem I (ciclo domiciliar) e Linhagem II (silvestre). (FERNANDES et al., 1998).
JANSEN et al., 1999 sugerem, em suas observaes que a disperso do T. cruzi no ambiente
silvestre pode ocorrer atravs de ciclos de transmisso distintos e independentes devido a
fatores ainda desconhecidos. Esta versatilidade atinge tambm os tecidos como glndulas e
cartilagens (DEANE et al., 1984). Este aspecto aliado a grande variabilidade de hospedeiros o
classificam como o organismo com mais sucesso de adaptao vida parasitria.
BRISSE et al., (2000) propuseram a subdiviso em seis linhagens ou DTUs (Discret
Taxonomica Units) I, IIa, IIb, IIc, IId, IIe sendo o DTUI corresponde a linhagem T. cruzi I e o
DTU IIb linhagem II. As sublinhagens IIa, IIc-e incluem as cepas hbridas e aquelas
pertencentes ao zimodema 3.
Em 2006, FREITAS et al., propuseram a existncia de uma terceira linhagem
designada de T. cruzi III. Atualmente os isolados de T. cruzi so distribudos em seis
linhagens ou DTUs I-VI (ZINGALES et al., 2009)
Na Amaznia Brasileira marsupiais do gnero Didelphis so os espcimes que
apresentam as maiores prevalncias de infeco por T. cruzi associado linhagem TCI,
entretanto em Marsupiais do gnero Monodelphis o zimodema 3 (linhagem TCIIc = TcIII),
(PVOA et al.,1984; YEO et al., 2005).
17
Recentes especulaes situam a diferenciao entre os dois grupos primordiais de T.
cruzi caracterizados bioqumica e molecularmente. O grupo I est basicamente ligado a uma
evoluo primitiva em marsupiais e o grupo II, provavelmente posterior, aos primatas. O
T.cruzi I refere-se maioria dos isolados da selva amaznica e de transmisso domstica ao
norte da linha equatorial, estando originariamente vinculado ao gnero Didelphis, de larga
distribuio em toda a Amrica. O grupo II vincula-se maioria dos casos humanos da
Amrica Austral e est espalhado no Cone Sul atravs de populaes domsticas de Triatoma
infestans. Supe-se que T. cruzi II tenha sua origem no grupo I, foi transferido de marsupiais
para primatas e roedores que emergiram na Amrica do Sul 25 milhes de anos aps os
marsupiais (PRATA et al., 2011). Outra hiptese situa esta propagao a partir de edentados
que compartiam seus nichos terrestres com roedores e uma srie grande de triatomneos
rupestres (MILES et al., 2004; ZINGALES et al., 1999; MONTEIRO et al., 2010).
2.7. Ciclo Evolutivo do T. cruzi
2.7.1. No vetor invertebrado
Durante o repasto sobre mamferos infectados, os vetores ingerem formas
tripomastigotas do parasita. No estmago dos triatomneos, ocorre a transformao em
esferomastigotas e epimastigotas. Durante a vida do inseto h a tendncia de que uma
populao de epimastigotas permanea no intestino mdio do inseto, em multiplicao sendo
que alguns indivduos ficam aderidos a mucosa do tubo (DIAS & MACEDO, 2005).
A diferenciao em tripomastigotas ocorre nos tubos de Malpighi, que so eliminados
para o meio externo, na forma metacclica (forma infectante), durante as dejees em uma
mistura de fezes e urina. O ciclo completo dura de duas a quatro semanas. (BRENER, 1997).
2.7.2. No hospedeiro vertebrado
O parasita necessita obrigatoriamente invadir uma clula para completar seu ciclo.
Essa interiorizao feita por fagocitose mediada por receptores da membrana plasmtica da
clula hospedeira, com etapas de adeso e reconhecimento. Quando ocorre a penetrao, as
formas tripomastigostas transformam-se em amastigotas. A cada 12 horas ocorre um processo
18
de diviso podendo variar de 50 a 500 amastigotas por clula parasitada. As formas
amastigotas se diferenciam em tripomastigotas, sendo a forma vivel quando h o
rompimento da clula que caindo na corrente sangunea iro parasitar outras clulas.
A preferncia pela localizao em clulas cardacas, da musculatura lisa e do sistema
nervoso, apresenta implicaes no curso clnico da enfermidade, imediata ou tardiamente
(ANDRADE, 2000).
2.8. Aspectos Clnicos
2.8.1. Fase aguda
Aps cair na corrente sangunea e na corrente linftica, os tripomastigotas dispersam-
se por todo o organismo, em vrios tecidos e rgos preferencialmente o miocrdio. Ocorre
ento uma intensa parasitemia, que pode ser detectada por exames parasitolgicos diretos.
Nesta fase ocorre febre que pode persistir por at 12 semanas, mal estar geral, cefaleia, edema
de fase, membros inferiores ou generalizado hipertrofia dos linfonodos e
hepatoesplenomegalia leve ou moderada, ictercia e dor importante em epigastro ou
hipocndrio direito, podendo, ainda, ocorrer sangramento digestivo. Pode apresentar o sinal e
porta de entrada aparente (Sinal de Romaa 1 ). possvel detectar anticorpos IgM que
coincidem com a queda da parasitemia circulante, com aumento gradual de anticorpos IgG
(SESPA, 2009). Nesta fase os sinais e sintomas podem progredir para formas agudas graves
que podem levar a morte ou desaparecer espontaneamente evoluindo para fase crnica
(SESPA, 2009).
1 Sinal caracterstico da porta de entrada da infeco. Nome dado em homenagem ao
seu descobridor Ceclio Romaa, que em 1935 publicou suas observaes acerca da
conjuntivite esquizotripansica unilateral, resultando o valor patognomnico na fase
inicial da doena de Chagas humana. uma inflamao local causada pelo protozorio,
nem sempre est presente ou observada, as plpebras e as conjuntivas de um dos olhos
apresentam-se edemaciadas, com uma colorao rseo - violcea que aparece ao redor do
edema palpebral, elstico e pouco doloroso.
19
2.8.2. Fase Crnica
1. Forma Indeterminada: Paciente assintomtico. Baixa parasitemia e altos nveis de
anticorpos. Este quadro pode durar toda a vida da pessoa infectada ou pode evoluir para uma
fase crnica clinicamente definida ou subaguda (LOPES & CHAPADEIRO, 2004).
2. Forma cardaca: Evidncias de acometimento cardaco que evolui para miocardite
dilatada, insuficincia cardaca congestiva, insuficincia cardaca fulminante ou arritmias
graves e morte sbita. Seus sinais e sintomas so: palpitao, dispnia, edema, tosse,
tonturas, desmaios, acidentes emblicos, sopro sistlico, entre outros. Ocorre em 30% dos
casos crnicos e a maior responsvel pela mortalidade na DC (MS, 1998).
3. Forma Digestiva: Acometimento digestivo que evoluiu para megaclon ou
megaesfago, exatamente os seguimentos que trabalham contedos mais slidos,
envolvendo alteraes motoras, anatmicas, de absoro e de secreo Ocorre em 10% dos
casos (LOPES & CHAPADEIRO, 2004; ANDRADE, 2000).
4. Forma Associada: Ocorrncia concomitante compatvel com as formas cardaca e
digestiva. A caracterstica desta fase a presena constante de anticorpos IgG e raros
parasitas circulantes. Pode ser assintomtica e sem comprometimentos cardacos e do
aparelho digestivo.
5. Forma crnica nervosa: Apesar da infeco acometer o sistema nervoso no homem e
em animais de laboratrio, seu significado ainda no est muito bem esclarecido. H
comprometimento dos sistemas motor perifrico e central, este ltimo em alguns pacientes
agudos e imunodeprimidos (SIQUEIRA-BATISTA, 1996; ANDRADE, 2000).
2.9. Mecanismos de transmisso
Os mecanismos de transmisso conhecidos so:
1. Vetorial: ocorre por contato com excretas de triatomneos infectados atravs da pele
lesada ou de mucosas, durante ou logo aps o repasto sanguneo. Perodo de incubao de 4 a
15 dias, foi a fonte de infeco mais importante, no Brasil, antes da interrupo da
transmisso pelo T. infestans sendo responsvel por 70 a 90% dos casos.
2. Transfusional/transplantes: Passagem de parasitas por transfuso de hemoderivados ou
transplante de rgos de doadores infectados a receptores susceptveis. J foram descritos
20
casos em transplante renal, cardaco, pancretico e de medula. Perodo de incubao de 30 a
40 dias ou mais, e a fonte de infeco em 1 a 20% dos casos.
3. Vertical: Passagem de parasitas de mulheres chagsicas para seus bebes durante a
gestao ou parto. Perodo de incubao em qualquer perodo da gestao ou parto. 0,5 a 10
% dos casos.
4. Acidental: Contato da pele lesionada ou mucosa com material contaminado, durante o
manuseio- de material humano ou experimental contaminado com T. cruzi, principalmente em
laboratrio, especialmente sangue, fezes de triatomneos e formas de cultura. Perodo de
incubao de aproximadamente 20 dias. 0,2 a 0,5% dos casos.
5. Oral: As evidncias experimentais at o momento sugerem que a transmisso oral
pode ocorrer a partir de formas tripomastigotas, epimastigotas e provavelmente de
amastigotas e massas celulares originrias de mamferos ou vetores contaminados, ou ainda
de cultivos artificias do parasita. A ingesto de alimentos contaminados com protozorios
vivos provenientes de excretas de triatomneos ou pelo inseto (transmisso vetorial passiva ou
oral) tem sido observada com maior frequncia e responsvel por surtos em diversos locais.
Perodo de incubao de 3 a 22 dias (OPAS, 2009; SESPA, 2009; DIAS & MACEDO, 2005).
Atualmente a fonte de infeco mais importante sendo responsvel por 70 a 80% dos casos,
principalmente nos estados amaznicos.
2.10. Diagnstico
O diagnstico da doena de Chagas deve ser apoiado pela epidemiologia, clnica e
confirmado pelo diagnstico laboratorial realizado com tcnicas apropriadas, reagentes
adequados e seguindo as boas prticas de laboratrio (LUQUETTI & RASSI, 2000).
2.10.1. Diagnstico na fase aguda
Diagnstico parasitolgico: Os exames parasitolgicos so aqueles em que o parasita
observado diretamente pelo laboratorista e, so definidores do quadro de infeco por T. cruzi
em processo de investigao. definido pela presena de parasitas circulantes demonstrveis
no exame direto do sangue perifrico:
21
Pesquisa a fresco de tripanosomatdeos: Exame de primeira escolha. Ideal que
o paciente esteja febril no ato da coleta ou em coleta 12 a 24 horas aps a primeira caso esta
seja negativa;
Mtodos de concentrao: Apresentam maior sensibilidade e utilizado quando
o teste a fresco for negativo. Recomenda-se o mtodo de concentrao que so: Strout,
microhematcrito e creme leucocitrio.
Lmina corada de gota espessa ou esfregao: Mtodo de menor sensibilidade
que os anteriores, porm utilizado em larga escala na regio Amaznica em aes de
diagnstico de malria, sendo uma importante fonte de deteco de casos de DCA.
Diagnstico Sorolgico: A presena de anticorpos anti T. cruzi da classe IgM
indicativa da fase aguda quando associada a alteraes clnicas e epidemiolgicas. A
confirmao de casos por pesquisas de IgG demanda duas coletas que possibilitem comparar a
soroconverso ou a variao de trs ttulos sorolgicos, (imunofluorescncia) com intervalo
de 21 dias entre as coletas.
Diagnstico Molecular: O diagnstico por meio de reao em cadeia da polimerase
PCR (Polymerase Chain Reaction) de uso restrito e usado pelos centros de pesquisa em
carter experimental.
O diagnstico diferencial na fase aguda deve ser feito em relao a febre tifide,
leishmaniose visceral, esquistossomose mansnica, mononuclease infecciosa, toxoplasmose,
malria e outras doenas febris.
2.10.2. Diagnstico na fase crnica
Diagnstico Parasitolgico: Os mtodos parasitolgicos so de baixa sensibilidade
para infeces a mais de 180 dias devido a parasitemia subpatente nesta fase.
Diagnstico Sorolgico: O indivduo que apresentar anticorpos anti T.cruzi por
meio de dois testes sorolgicos de princpios distintos ou com diferentes preparaes
antignicas, com quadro indicativo da doena ou vnculo epidemiolgico, considerado
infectado. recomendado o uso de metodologias de maior complexidade a partir de testes de
IFI-IgM (Imunofluorescncia Indireta com pesquisa de IgM), Western Blot (WB) e,
eventualmente ELISA IgM (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay com pesquisa de IgM),
alm dos testes convencionais j utilizados: IFIIgG, hemaglutinao indireta (HAI) e ELISA.
22
Outras metodologias ainda podem ser utilizadas, tais como: xenodiagnstico, hemocultivo,
bipsia ou PCR (MS, 2005; OPAS, 2009; SESPA, 2009).
2.11. A Doena de Chagas na Amaznia Brasileira
A entrada do homem no ambiente silvestre e seu contato com ciclos j estabelecidos
entre animais silvestres e seus parasitas, muitas vezes capazes de infectar e causar doena
humana, no ocorre somente para a doena de Chagas. Esse tipo de situao tem despertado a
ateno de pesquisadores e profissionais de sade pela sua estreita relao com a emergncia
e/ou re-emergncia de vrias doenas infecciosas (SUTHERST et al., 2001; KRUSE et al.,
2004).
A perda da biodiversidade uma consequncia imediata do constante crescimento das
cidades e da expanso da atividade agropastoril. Essas consequncias criam uma srie de
situaes que favorecem a emergncia ou re-emergncia das tripanosomases: (a) diminuio
e fragmentao da cobertura vegetal original, resultando em um maior contato entre os
animais silvestres e os animais domsticos/homem, e em modificao na ecologia do vetor, do
parasita e de seu hospedeiro; e (b) uma situao ambiental das reas peri-urbanas semelhante
ao meio rural, consequncia da condio social da populao que ocupa a periferia das
cidades. Um aspecto importante a ser considerado diz respeito s espcies de mamferos
silvestres sinantrpicos e seu contato com animais domsticos e peri-domiciliares. Este
intercmbio pode resultar em novas reas endmicas. Adicionalmente novos casos humanos
podem surgir a partir da expanso de um foco zoontico residual (ASHFORD, 1996).
No final dos anos 70, a rea que apresentava risco de transmisso vetorial da doena
de Chagas (rea endmica) compreendia 18 estados brasileiros, nos quais se comprovou a
presena de triatomneos domiciliados. A regio Amaznica estava excluda desta rea de
risco (MS, 2005; OPS, 2004).
O primeiro caso humano autctone na regio Amaznica foi registrado em 1969, na
cidade de Belm, no Estado do Par por SHAW et al., (1969). Mas segundo BRICEO-
LEN (2007) desde o incio do sculo XX tinha-se conhecimento da abundncia de
hospedeiros mamferos potenciais reservatrios e vetores triatomneos na Amaznia
brasileira. Desde ento, casos autctones foram relatados em nmero crescente.
23
Os recentes surtos de doena de Chagas por via oral vm demonstrando o quanto so
complexos os ciclos de transmisso do T. cruzi, evidenciando que as caractersticas
epidemiolgicas dessas parasitoses vm adquirindo um novo perfil (VALENTE et al., 1999;
COURA et al., 2002; NBREGA et al., 2009; PEREIRA et al., 2009; TATTO et al., 2007).
Este novo recorte vem mostrando o quanto so simplistas a adoo de medidas de controle da
doena de Chagas baseada apenas no controle de vetores domiciliados.
Portanto, estudos da doena de Chagas na Amaznia devem considerar as diferentes
caractersticas epidemiolgicas e o padro da infeco, os quais se modificam de uma regio
para outra em funo: (a) dos padres ecolgicos das reas de ocorrncia, incluindo variaes
na vegetao, clima, diversidade; (b) de fatores demogrficos como emigrao de pessoas e
animais domsticos oriundos de regies endmicas; (c) da favelizao de reas peri-urbanas;
(d) das atividades agrcolas; (e) da condio socioeconmica e cultural da populao; (f) de
diferentes subpopulaes de parasitas e espcies de vetores; (g) da presena ou ausncia de
hospedeiros reservatrios, domsticos e/ou silvestres; e h) da alterao do habitat original com
consequente domiciliao e antropofilizao dos hbitos alimentares dos vetores hematfagos
(DESJEUX, 2001; GUERIN et al., 2002; WERNECK et al., 2002; 2003).
2.12. A vigilncia da doena de Chagas
A Doena de Chagas uma enzootia, portanto natural no ambiente silvestre, h
milhares de anos, em uma relao sustentada entre os parasitas, vetores e reservatrios
(ABAD-FRANCH et al., 2007). Sua importncia cientfica ocorreu quando o homem passou a
ser um componente no ciclo da doena. Tal fato deve-se provavelmente ao processo de
sedentarismo das populaes pela apropriao do meio ambiente diante da necessidade de
terras para cultivo de alimentos ou explorao dos recursos naturais. Para que haja a
transmisso ao ser humano se requer um conjunto de condies ambientais e sociais que
permitam o encontro entre ele, o vetor e o parasita em um mesmo momento e em determinado
espao (BRICEO-LEN, 2009).
O ato de apropriao do meio ambiente e nele criar condies para sobrevivncia,
como construo de moradias e currais para seus animais domsticos favorece esse encontro.
As precrias condies de moradias, de saneamento e a falta de higiene propiciam o
estabelecimento de colnias de triatomneos no intra e peridomiclio que a procura de abrigo e
24
alimentos acabam por domiciliarem-se (DIAS & SCHOFIELD, 1998). Portanto a partir desse
processo consideram-se dois ciclos diferentes: o ciclo silvestre, o ciclo domstico (intra e
peridomiclio) (FORATTINI, 1980; ARGOLO et al., 2008). O prprio Carlos Chagas, em
seus estudos sobre a doena na floresta Amaznica em 1924 encontrou smios infectados que
comprovaram a existncia desse ciclo silvestre (CHAGAS, 1924).
O fenmeno de domiciliao de triatomneos culminou no desenvolvimento de zonas
endmicas da DC, representadas por 21 pases. Na dcada de 40 DIAS & PELEGRINO
(1948) iniciaram experimentos com inseticidas, baseados no xito do controle da malria com
uso de inseticidas residuais. Na dcada de 60 na Venezuela (GABALDN, 1965) e Argentina
(SOSA-ESTANI & SEGURA, 2007) se criaram programas de controle, uma vez que a
malria havia sido controlada e os recursos destinados a este poderiam se alocadas ao controle
da DC.
No Brasil, o programa se iniciou em 1975, mas somente entre 1983 e 1986 que foi
possvel alcanar uma cobertura da rea endmica Apesar dos progressos alcanados com o
Programa, as atividades de controle no foram contnuas, sofrendo interrupes,
principalmente o advento da dengue e em vista da prioridade que foi dada a este problema de
sade pblica, que acabou por receber para o seu controle os recursos antes destinados
conteno da DC (DIAS, 1987).
Ainda que houvesse dados sobre a prevalncia da doena no pas, a informao era
fragmentada, produto de diversos estudos em diferentes reas, com mtodos e tcnicas de
colheita e processamento laboratorial no padronizado, no permitindo a comparao dos
resultados. Assim entre os anos de 1975 e 1980 o Brasil realizou o primeiro estudo sobre a
infeco chagsica com alcance nacional com o propsito de estimar a prevalncia da
infeco chagsica na populao geral residente em rea rural. As amostras foram coletadas
em papel de filtro especialmente desenvolvido para o inqurito, e os procedimentos foram
padronizados evitando-se qualquer distoro nos resultados (SILVEIRA et al., 2011).
Foram analisadas 1 352 197 amostras procedentes de 3 026 municpios de 24 estados
excetuando-se So Paulo e Rio de Janeiro. A mdia Nacional foi de 4,22. Nos Estados da
Amaznia, os resultados surpreenderam, pois alguns municpios tiveram elevadas taxas de
prevalncia (Barcelos, Novo Airo e Japur), uma vez que no havia relato de domiciliao
de triatomneos nem da presena do Triatoma infestans (principal transmissor da doena no
pas) e qualquer indcio de transmisso ativa (SILVEIRA et al., 2011).
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A hiptese de transmisso extradomiciliar por Rhodnius brethesi, associada extrao
de piaaba, no municpio de Barcelos, Amazonas, foi confirmada em trabalhos posteriores
(SILVEIRA & PASSO