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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE ENFERMAGEM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM DISSERTAÇÃO CONTROLE DA TUBERCULOSE EM CONTATOS INTRADOMICILIARES: O PAPEL DOS SERVIÇOS DE SAÚDE DE PELOTAS, RS LÍLIAN MOURA DE LIMA PELOTAS, 2011

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE … · modelo de profissional e pessoa competente e afetuosa. Agradeço aos meus colegas de pós-graduação: Adrize, Cândida, Carla,

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE ENFERMAGEM

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENFERMAGEM

DISSERTAO

CONTROLE DA TUBERCULOSE EM CONTATOS INTRADOMICILIARES: O

PAPEL DOS SERVIOS DE SADE DE PELOTAS, RS

LLIAN MOURA DE LIMA

PELOTAS, 2011

LLIAN MOURA DE LIMA

CONTROLE DA TUBERCULOSE EM CONTATOS INTRADOMICILIARES: O

PAPEL DOS SERVIOS DE SADE DE PELOTAS, RS

Dissertao apresentada ao Programa de

Ps-Graduao em Enfermagem (rea de

concentrao: Prticas Sociais em

Enfermagem e Sade. Linha de pesquisa:

Prticas de Ateno em Enfermagem e

Sade) da Faculdade de Enfermagem da

Universidade Federal de Pelotas, como

requisito parcial obteno do ttulo de

Mestre em Enfermagem.

ORIENTADOR: Prof Dr Eda Schwartz

CO-ORIENTADOR: Prof Dr Roxana Isabel Cardozo Gonzales

Pelotas, 2011

FOLHA DE APROVAO

Llian Moura de Lima

Controle da tuberculose em contatos intradomiciliares: o papel dos servios de sade

de Pelotas, RS

Dissertao apresentada ao Programa de Ps-

Graduao em Enfermagem (rea de

concentrao: Prticas Sociais em Enfermagem

e Sade. Linha de pesquisa: Prticas de

Ateno em Enfermagem e Sade) da

Faculdade de Enfermagem da Universidade

Federal de Pelotas, como requisito parcial

obteno do ttulo de Mestre em Enfermagem.

Aprovado em: ____________________________

BANCA EXAMINADORA

__________________________________

__________________________________ _____________________________

Prof. Dr. Eda Schwartz

(Presidente)

Universidade Federal de Pelotas - UFPel

Prof. Dr. Raul Andres Mendoza Sassi

(Titular)

Universidade Federal do Rio Grande- FURG

Prof. Dr. Elaine Thum

(Titular)

Universidade Federal de Pelotas - UFPel

________________________

________________________________

Prof. Dr. Vanda Maria da Rosa Jardim

(Suplente)

Universidade Federal de Pelotas - UFPel

Prof. Dr. Claudia Eli Gazetta

(Suplente)

Faculdade de Medicina de So Jos do Rio Preto - FAMERP

Agradecimentos

Primeiramente agradeo a minha famlia. Aos meus pais Ideir e Joaninha,

a minha irm Camila e ao meu noivo Roger pelo incentivo a ingressar no curso de

mestrado e continuar minha qualificao profissional, obrigada tambm pela pacincia e

apoio nos momentos difceis. Amo muito vocs!

Agradeo a minha orientadora a Professora Eda Schwartz por ter me

acolhido como orientanda, e pela compreenso em adaptar-se ao objeto de estudo de

meu interesse. Obrigada professora pelas reunies em sua casa, pelo incentivo a

produo cientfica e pelo exemplo de profissional competente, tico, comprometido e

verstil que s.

Agradeo a minha co-orientadora a professora Roxana Isabel Cardozo

Gonzles por ter me recebido em seu projeto de pesquisa, aceitado participar deste

processo como minha co-orientadora. Obrigada professora, pelas inmeras vezes que a

senhora me socorreu nos momentos de dvida sobre o foco do estudo e o cumprimento

dos prazos, me acalmando sempre com muito carinho e pacincia. Obrigada pelas

vezes que me recebeu em sua casa, pelo estmulo produo cientfica e tambm pelo

modelo de profissional e pessoa competente e afetuosa.

Agradeo aos meus colegas de ps-graduao: Adrize, Cndida, Carla,

Caroline, Gabriela, Gabriele, Gimene, Fabiele, Francine, Josiane,

Jandro, Michele, Milena, Patrcia, Rita Fernanda, Renata e

Viviane, por terem compartilhado comigo este momento to importante de nossas

vidas. Obrigada a todos, sentirei muita falta do convvio com vocs!

Agradeo as minhas amigas Katiuscia, Sabrina e Janaina pelo apoio e

incentivo durante o processo seletivo. A Katiuscia tambm pelo apoio durante o

curso na construo de meu projeto. Obrigada meninas, adoro vocs!

Aos professores da ps-graduao agradeo pelo estimulo a

desenvolvermos um pensamento crtico sobre a produo cientfica e pelas valiosas

consideraes sobre o projeto.

Aos colegas dos grupos de pesquisa NUCCRIN e GEOTB/Pelotas pelas

discusses durante as reunies que contriburam na construo de minha proposta de

estudo.

Agradeo aos professores que compuseram a banca examinadora de minha

qualificao e defesa do mestrado, o Prof. Raul Andres Mendoza Sassi, a

Prof. Elaine Thum, a Prof. Vanda Jardim e a Prof. Claudia Eli

Gazetta. Muito obrigada pela disponibilidade e prontido em avaliar este trabalho,

pelas valiosas contribuies que enriqueceram o produto final de meu trabalho.

Obrigada ainda a equipe do PCT de Pelotas que abriu as portas do servio

me recebendo de forma acolhedora e permitindo que eu manuseasse seus arquivos e

fizesse questionamentos para a construo deste trabalho.

queles que por ventura possa ter esquecido de citar o nome, mas que

estiveram me acompanhando durante esta trajetria e de uma forma ou outra

contriburam para a minha formao como Mestre em Enfermagem, muito obrigada!

H um tempo em que preciso

abandonar as roupas usadas que j tm a

forma do nosso corpo e esquecer os

nossos caminhos que nos levam sempre

aos mesmos lugares... o tempo da

travessia e, se no ousarmos faz-la,

teremos ficado para sempre margem de

ns mesmos.

(Fernando Pessoa)

Resumo

LIMA, Llian Moura de. Controle da tuberculose em contatos intradomiciliares: o papel dos servios de sade de Pelotas, RS. 2011. 118f. Dissertao (Mestrado) Programa de Ps-Graduao em Enfermagem. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2011.

Os contatos intradomiciliares dos casos ndices de tuberculose tm risco aumentado de desenvolver a doena em virtude da proximidade e do tempo de exposio ao bacilo. Por este motivo a avaliao destes indivduos determinante para o controle da doena, j que o diagnstico precoce e o tratamento oportuno interrompem a cadeia de transmisso da doena repercutindo na reduo das taxas de incidncia. Para tanto existem protocolos e metas propostos pela Organizao Mundial da Sade, nos quais, os servios de sade devem basear-se na avaliao adequada dos contatos. O estudo objetivou investigar os servios de sade que fazem o diagnstico da tuberculose em Pelotas quanto ao atendimento oferecido aos contatos intradomiciliares do caso ndice. Constitui-se de um estudo descritivo, quantitativo de corte transversal, vinculado ao projeto multicntrico intitulado Retardo no diagnstico da tuberculose: anlise das causas nas diferentes regies do Brasil. A amostra do estudo foi composta por 85 casos ndices de tuberculose entrevistados no estudo de origem em Pelotas e seus 163 contatos intradomiciliares. A coleta destes dados deu-se entre julho e dezembro de 2009 no programa de controle da tuberculose de Pelotas e a etapa de coleta do pronturio em janeiro de 2011, neste mesmo servio. Utilizou-se o banco de dados da pesquisa do estudo multicntrico e com os dados do pronturio construiu-se um banco no software Excel. A anlise dos dados foi realizada por meio da estatstica descritiva. Os resultados evidenciam que a ateno a tuberculose em Pelotas necessita ser repensada no intuito de envolver a ateno primria na avaliao dos contatos intradomiciliares, visando facilitar o diagnstico precoce, a avaliao clnica adequada dos contatos e a interrupo da cadeia de transmisso da TB em tempo oportuno. Palavras-chave: Busca de comunicante, tuberculose, avaliao de servios de sade, ateno primria sade.

Abstract

LIMA, Lilian Moura de. Control of tuberculosis in household contacts: the role of health services in Pelotas, RS. 2011. 118p. Dissertation (Masters)- Post-Graduation Program in Nursing. Federal University of Pelotas, Pelotas, 2011.

Household contacts of index cases tuberculosis have an increased risk of developing the disease due to the closeness and the time duration of exposure to the bacillus. For this reason the evaluation of these individuals is decisive to controlling the disease, since the early diagnosis and timely treatment stop the transmission chain of the disease reflecting on the reduction of incidence rates. To this purpose there are protocols and targets proposed by the World Health Organization in which the health services should be based in the proper evaluation of the contacts. The study aimed investigate the health services that diagnosticate tuberculosis in Pelotas in relation to the service offered to household contacts of the index case. It consists of a descriptive, quantitative and transversal cut study linked to the multicentric project entitled "Delay in the diagnosis of tuberculosis: analysis of causes in different regions of Brazil". The study sample was composed of 85 index cases of tuberculosis interviewed in the origin study in Pelotas and their 163 household contacts. The collection of these data took place between July and December 2009 in the control of tuberculosis program in Pelotas and the collection of medical records has occurred in January 2011 in this same service. It was used the database research of the multicentric study and it was built a database in Excel software with the data from medical records. The analysis of data was performed using descriptive statistics. The results show that attention to tuberculosis in Pelotas need to be rethought with the of involving primary care in the evaluation of household contacts in order to facilitate early diagnosis, appropriate clinical evaluation of contacts and interruption of transmission chain of TB in appropriate time. Keywords: contact tracing, tuberculosis, health services evaluation, primary health care.

LISTA DE FIGURAS

PROJETO ...................................................................................................................... 12

Figura 1 - Distribuio dos resultados das buscas nas bases de dados por combinaes

de descritores ................................................................................................................. 23

Figura 2 - Distribuio das referncias identificadas e relevantes por base de dados ... 23

Figura 3 - Artigos relevantes temtica do projeto ........................................................ 24

Figura 4 Variveis extradas do instrumento de coleta de dados diagnstico na

famlia e comunidade ..................................................................................................... 55

Figura 5 Variveis coletadas do pronturio do caso-ndice em tratamento no PCT de

Pelotas ........................................................................................................................... 56

Figura 6 Previso de gastos com materiais para a execuo do projeto. Pelotas, 2011

....................................................................................................................................... 56 RELATRIO .................................................................................................................. 70

Figura 1 Distribuio dos casos ndices de TB por local de diagnstico. Pelotas/RS,

2011 ............................................................................................................................... 71

ARTIGO ......................................................................................................................... 74

Figura 1 Fluxograma do atendimento ao contato intradomiciliar dos casos ndices de

TB no PCT de Pelotas/RS, 2011 .................................................................................... 81

Sumrio

I PROJETO DE PESQUISA ........................................................................................... 12

II RELATRIO DE CAMPO............................................................................................ 70

III ARTIGO...................................................................................................................... 74

IV APNDICES .............................................................................................................. 90

V ANEXOS ..................................................................................................................... 94

I PROJETO DE PESQUISA

LLIAN MOURA DE LIMA

CONTROLE DA TUBERCULOSE EM CONTATOS INTRADOMICILIARES: O PAPEL

DOS SERVIOS DE SADE DE PELOTAS, RS

Projeto de pesquisa apresentado ao

curso de Mestrado em Enfermagem da

Universidade Federal de Pelotas.

ORIENTADOR: Prof Dr Eda Schwartz

CO-ORIENTADOR: Prof Dr Roxana Isabel Cardozo Gonzales

Pelotas, 2011

LISTA DE SIGLAS

APS: Ateno Primria Sade

ATA: American Thoracic Society

BK: Bacilo de Koch

BSR: Busca de Sintomticos Respiratrios

BCG: Bacilo Calmette-Gurin

DOTS: Tratamento Diretamente Observado

FUNASA: Fundao Nacional de Sade

HIV: Human Immunodeficiency Vrus

ITBL: Infeco Tuberculosa Latente

MS: Ministrio da Sade

OMS: Organizao Mundial da Sade

PCT: Programa de Controle da Tuberculose

PNCT: Programa Nacional de Controle da Tuberculose

PPI: Programao Pactuada e Integrada

PT: Prova Tuberculnica

Rx: Raio X

SIDA: Sndrome da Imunodeficincia Adquirida

SINAN: Sistema de Informao de Agravos de Notificao

SR: Sintomtico Respiratrio

SVS: Secretaria de Vigilncia a Sade

SUS: Sistema nico de Sade

TB: Tuberculose

UBS: Unidade Bsica de Sade

UBAI: Unidade Bsica de Atendimento Imediato

USF: Unidade de Sade da Famlia

Sumrio

1 Introduo ............................................................................................................ 16

2 Justificativa ........................................................................................................... 19

3 Objetivos .............................................................................................................. 21

4 Hipteses ............................................................................................................. 22

5 Reviso bibliogrfica ............................................................................................ 23

6 Quadro terico ...................................................................................................... 34

6.1 Tuberculose e famlia: o controle da doena do sculo XIX ao XXI. ........................ 34

6.2 Servios de sade e o enfoque na famlia................................................................ 45

7 Metodologia .......................................................................................................... 52

7.1 Caracterizao do estudo ..................................................................................... 52

7.2 Caracterizao do local de estudo ....................................................................... 52

7.2.1 Informaes gerais do municpio ........................................................................... 52

7.2.2 Ateno Tuberculose em Pelotas ....................................................................... 53

7.3 Populao e amostra do estudo ........................................................................... 54

7.4 Critrios de elegibilidade ...................................................................................... 55

7.4.1 Critrios de incluso .............................................................................................. 55

7.4.2 Critrios de excluso ............................................................................................. 55

7.5 Instrumentos e variveis do estudo ...................................................................... 55

7.7 Coleta de dados ...................................................................................................... 58

7.8 Anlise dos dados .................................................................................................... 59

7.9 Aspectos ticos ........................................................................................................ 60

7.10 Divulgao dos resultados ..................................................................................... 61

8 Plano de despesas ............................................................................................... 62

9 Cronograma.......................................................................................................... 63

Referncias .................................................................................................................... 64

APNDICES ................................................................................................................... 91

ANEXOS ........................................................................................................................ 96

1 Introduo

A Organizao Mundial da Sade (OMS) publicou que a incidncia mundial de

tuberculose (TB) estimada para o ano de 2009 foi de 9,4 milhes de casos, sendo que a

mortalidade estimada para este mesmo ano foi de 1,7 milhes (WHO, 2010). A

ocorrncia de 81% dos casos de TB concentra-se entre 22 pases considerados como

prioritrios pela OMS, o Brasil ocupa o 19 lugar nesta lista. No ano de 2010, foram

notificados 71.000 casos novos da doena no pas, sendo a incidncia de 37,9 casos

por 100.000 habitantes (BRASIL, 2011a).

Para o estado do Rio Grande do Sul a incidncia da doena no ano de 2010, foi

de 44,8 casos por 100.000 habitantes, o que o coloca em 5 lugar no ranking nacional

dos estados no que diz respeito a incidncia da TB, ficando atrs do Rio de Janeiro

(69,2 por 100.000 habitantes), Amazonas (65,8 por 100.000 habitantes), Par (46 por

100.000 habitantes) e Pernambuco (46 por 100 000 habitantes)(BRASIL, 2011b).

A TB uma doena infecciosa causada pelo Mycobacterium tuberculosis, ou

bacilo de Koch (BK), que pode acometer diferentes rgos do corpo humano, sendo a

pulmonar a forma mais frequente, responsvel por 90% dos casos diagnosticados, dos

quais 60% so bacilferos. A transmisso ocorre, principalmente pelo ar, quando a

pessoa com TB pulmonar bacilfera, ou caso-ndice, libera o BK juntamente com

aerossis expelidos naturalmente durante a fala, o espirro e principalmente a tosse

(BRASIL, 2010a). Os indivduos hgidos que so infectados pelo BK, em sua maioria,

permanecem assintomticos, o que caracteriza a infeco latente por TB (MOREE et al,

2009).

17

Existem fatores que influenciam diretamente na transmisso do BK entre

humanos, dentre eles esto as caractersticas do caso-ndice, a suscetibilidade do

exposto e a intensidade de contato. Dentre as caractersticas do caso-ndice esto a

forma pulmonar da doena, a carga de bacilos no escarro e o estado geral do doente,

aqueles com melhores condies nutricionais apresentam maior vigor de tosse,

liberando mais bacilos no ambiente. J a intensidade de contato est relacionada ao

tempo de exposio e ao tipo de relao com o enfermo, a proximidade e o parentesco

guardam relao direta e estatisticamente significante com a infeco (MELO et al,

2005). Alm da proximidade ocasionada pelo convvio no mesmo domiclio, a famlia da

pessoa com TB compartilha as mesmas condies socioeconmicas e, muitas vezes,

os mesmos hbitos de vida que a torna vulnervel ao adoecimento.

Sendo assim, pertencer ao mesmo grupo familiar e conviver no mesmo

domiclio de casos de TB pulmonar bacilfera eleva o risco de infeco por TB, sendo a

investigao imediata e adequada destes sujeitos considerada como essencial para o

controle da doena. O rastreio de contatos de casos de TB um meio efetivo e de

baixo custo para detectar precocemente novos casos da doena, interrompendo a

cadeia de transmisso e evitando a propagao da resistncia microbiana s drogas de

primeira escolha para o tratamento. Alm disso, a deteco da infeco latente por

tuberculose (ILTB) uma importante ferramenta para o controle da propagao da TB

na comunidade (TORNEE et al, 2005; NGUYEN et al, 2009).

Aliados s questes biolgicas que envolvem o adoecimento por TB esto os

agravantes relacionados s razes sociais da enfermidade, os quais interferem

diretamente nas aes de controle. Entre eles esto a pobreza, a vida em condies

insalubres, a presena de co-morbidades (desnutrio e a co-infeco pelo vrus HIV) e

ainda o esteretipo social do tuberculoso, que muitas vezes contribui para o retardo na

procura pelo servio de sade, devido ao medo do preconceito e da discriminao

social da pessoa acometida e de seus familiares (RUFFINO-NETTO, 2004).

Destarte, entende-se que a pessoa com TB e seu grupo familiar tm

necessidades que vo alm do diagnstico clnico e da prescrio medicamentosa, as

quais sero contempladas apenas com o alcance da assistncia integral, considerando

a dimenso familiar e social que envolve o adoecimento. Para tanto, a investigao dos

18

familiares da pessoa diagnosticada com TB pulmonar bacilfera considerada essencial

na preveno do adoecimento e no diagnstico precoce da TB ativa na populao,

devendo ser realizada essencialmente pela ateno primria a sade, eleita como a

porta de entrada preferencial para a pessoa com TB (BRASIL, 2010a).

A estratgia de descentralizao da ateno TB para a rede bsica de sade

visa o alcance da integralidade da ateno, pois facilita o acesso dos indivduos a

servios qualificados prximos de seu domiclio. Esta medida contribui para transpor

barreiras como a distncia geogrfica, limitaes financeiras e relacionadas ao tempo

disponvel para buscar atendimento. Entretanto no basta apenas ampliar a rede

qualificada para atender a demanda da TB e sim promover o trabalho intra-setorial que

assegure o acesso finalizao do cuidado, tanto no local do diagnstico como no

percurso da rede de servios, por meio do sistema de referncia e contra-referncia

(CECLIO, 2001).

O Programa Nacional de Controle da TB (PNCT) reconhece que os nveis de

ateno terciria, secundria e primria representam papel de destaque no controle da

TB, sendo a porta de entrada varivel de acordo com a organizao regional da rede de

ateno TB. Desse modo, os servios devem se estruturar para que a vigilncia

epidemiolgica da TB, prtica de grande repercusso para o controle da doena, seja

realizada de forma eficiente em todos os nveis de ateno (BRASIL, 2010b).

A avaliao adequada dos contatos intradomiciliares da pessoa com TB

representa um desafio para os servios de sade, devido resistncia dos familiares

em comparecer ao servio e a pouca nfase dada pelos profissionais importncia

deste procedimento, seja por limitaes relacionadas carga de trabalho, falta de

recursos humanos ou ao modelo assistencial incorporado pela instituio (TORNEE et

al, 2005; GAZETTA et al, 2006).

Assim sendo, entende-se que, para alcanar melhores resultados na prtica de

investigao dos contatos, e consequente deteco precoce de casos de TB, preciso

que os servios de sade consolidem sua prtica para o enfoque holstico no indivduo,

considerando o contexto que o envolve e a abordagem famlia.

19

2 Justificativa

O PNCT determinou 230 municpios brasileiros que so considerados

prioritrios para o controle da doena, pois contemplam os critrios de elevada

incidncia, mortalidade e co-infeco com HIV, alm de problemas operacionais como

altas taxas de abandono do tratamento. Dentre estes, 22 esto no estado do Rio

Grande do Sul, estando a cidade de Pelotas includa nesta lista desde sua primeira

edio no ano de 1996. A incidncia geral da TB em Pelotas no ano de 2008 foi de 46,6

casos por 100.000 habitantes, sendo de 23,9 por 100.000 habitantes para os casos

bacilferos (BRASIL, 2009).

A investigao de contatos intradomiciliares de pessoas com TB reconhecida

como uma importante estratgia na deteco precoce de casos novos, j que cada

caso-ndice com baciloscopia positiva tem a potencialidade de infectar at 35% de seus

contatos intradomiciliares (RIEDER, 2001). Esta estratgia de preveno est

preconizada no PNCT, entretanto, muitas vezes no realizada de forma efetiva. O que

pode ser percebido no relatrio de 2009 da OMS, no qual, os campos destinados a

incidncia de TB em contatos de pacientes bacilferos dos 22 pases priorizados esto

em branco, com exceo da China, a qual informou que 5% dos contatos avaliados

foram diagnosticados com TB (OMS, 2009).

Desse modo, a organizao da ateno aos contatos intradomiciliares de casos

ndices de TB est relacionada ao cumprimento de diretrizes contempladas no PNCT, e

a avaliao destes indicadores aponta a qualidade da ateno oferecida pelos servios

de sade no que tange a vigilncia epidemiolgica e preveno da doena (GAZETTA

et al, 2006).

Diante exposio feita sobre a situao epidemiolgica da TB no Brasil, no

estado do Rio Grande do Sul e na cidade de Pelotas, e considerando a importncia do

desenvolvimento de aes de controle da TB na famlia para a interrupo da cadeia de

transmisso da doena, e ainda a escassez de estudos sobre este tema, aponta-se a

relevncia da realizao deste trabalho. Acredita-se que os resultados desta pesquisa

possibilitaro a sensibilizao e a reflexo dos profissionais envolvidos na ateno TB

de todos os nveis de ateno.

20

Questo de pesquisa: Os servios de sade de Pelotas, que fazem o

diagnstico da TB, realizam aes de controle dos contatos intradomiciliares?

3 Objetivos

3.1 Objetivo Geral

Investigar a realizao de controle dos contatos intradomiciliares de caso

ndices de tuberculose nos servios de sade que fazem o diagnstico em Pelotas,

RS.

3.2 Objetivos especficos

Caracterizar os contatos intradomiciliares quanto aos dados

sociodemogrficos e ao grau de parentesco com o caso ndice (sexo; idade; grau de

parentesco; renda familiar);

Avaliar as aes de investigao dos contatos intradomiciliares dos casos

ndices de TB pelo programa de controle de TB de Pelotas/RS (registro de contatos

no pronturio; solicitao de baciloscopia, raio-x de trax e prova tuberculnica);

Descrever, na percepo do caso ndice, o processo de ateno do servio

de sade com foco no reconhecimento da TB nos contatos intradomiciliares

(investigao de sinais sugestivos de TB; realizao de visitas domiciliares;

realizao de exames diagnsticos; informao sobre TB; investigao do contexto

social);

4 Hipteses

Os contatos intradomiciliares sero predominantemente no sexo

feminino, na faixa etria acima dos 10 anos de idade e adultos, sendo o grau de

parentesco de maior ocorrncia o de filho (GAZETTA et al, 2006);

O PCT realizar parcialmente o protocolo de avaliao dos contatos

intradomiciliares proposto pelo Ministrio da Sade (Gazetta et al, 2006);

Estima-se que em torno de 60% dos contatos na faixa etria de

menores de 15 anos tero sido avaliados, para os maiores de 15 anos estima-se que

apenas 9% sejam avaliados (HARTWIG et al, 2008);

O exame mais solicitado para avaliao dos contatos ser o Raio-x de

trax, seguido pela baciloscopia e em menor quantidade a prova tuberculnica

(Gazetta et al, 2006); Entretanto, na faixa etria das crianas predominar o Raio-x

de trax e a prova tuberculnica (CALDEIRA et al, 2004; BRASIL, 2010b);

Entre os contatos intradomiciliares avaliados pelo PCT

aproximadamente 1,8% sero diagnosticados com TB ativa (GAZETTA et al, 2006);

Em torno de 70% dos profissionais de sade questionaro o caso ndice

a respeito de sintomas respiratrios sugestivos de TB em seus familiares, e 60% a

respeito das condies de vida dos familiares (CRUZ-OLIVIERA, 2009);

Os casos ndices no recebero visitao domiciliar de profissionais de

sade aps o diagnstico de TB;

5 Reviso bibliogrfica

A reviso bibliogrfica foi realizada com o objetivo de investigar a produo

cientfica dos ltimos dez anos acerca das aes de preveno e controle nos

contatos intradomiciliares da pessoa com TB.

Como estratgia de busca foi realizada a pesquisa bibliogrfica controlada

nas bases de dados eletrnicas Public Medical/Literatura internacional em cincias

da sade (PUBMED/MEDLINE) e Centro Latino-Americano e do Caribe de

Informaes em Cincias da Sade (LILACS). A busca foi realizada de forma

sistematizada, utilizando descritores cadastrados no MeshTerms para a

PUBMED/MEDLINE e no DECS para a LILACS.

Foram introduzidos limites para a realizao da busca, sendo includos na

reviso os artigos realizados entre os anos de 2000 e 2010, considerando estudos

realizados com seres humanos, nas lnguas portugus, ingls e espanhol, e que

possussem pelo menos o resumo disponvel para verificao do contedo.

Os descritores utilizados foram para a lngua inglesa: tuberculosis, family,

contact Tracing, /prevention and control; para a lngua espanhola: tuberculosis,

familia, Trazado de Contacto, /prevencin & control; e para a lngua portuguesa:

tuberculose, famlia, busca de comunicante, /preveno & controle. Todos os

resumos de artigos com ttulo contendo uma das palavras chave foram analisados.

24

Figura 1 Distribuio dos resultados das buscas nas bases de dados por

combinaes de Descritores.

Descritores Pubmed Lilacs

Tuberculosis AND family 127 100

Tuberculosis AND contact trancing 0 6

Tuberculosis AND family AND /prevention and

control

33 23

Total 160 129

Figura 2 Distribuio das referncias identificadas e relevantes por base de

dados.

FONTE N REFERNCIAS

IDENTIFICADAS

N REFERNCIAS

RELEVANTES

Pubmed 160 7

Lilacs 129 12

Total 289 19

Durante o processo de busca foram identificados 289 artigos com as

palavras chaves supracitadas, sendo separados para leitura 130 resumos que

tratavam do tema, foram excludos aqueles que tratavam de estudos clnicos, pois

no respondiam ao objetivo da busca. Ao final da etapa de leitura aps a eliminao

de duplicaes (10 artigos), 19 artigos foram considerados relevantes temtica do

projeto. Os resultados esto dispostos no quadro abaixo.

25

Figura 3 Artigos relevantes temtica do projeto

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Cavalcante, S.C. et al.

Community-randomized trial

of enhanced directly

observed treatment,

short-course for tuberculosis

control in Rio de Janeiro, Brazil. Int j tuberc lung

dis. 2010;14(2):203-

09

Rio de Janeiro/RJ

Comparar o impacto da

estratgia de tratamento diretamente

supervisionado (DOTS) com a

DOTS ampliada na incidncia da TB.

Estudo de ensaio

comunitrio randomizado

Sexo, idade, raa, nmero de pessoas residentes no

domiclio, nmero de quartos, escolaridade, renda

mensal da famlia, forma clnica da TB, reao prova tuberculnica, testagem para HIV, Raio X torcico, exame de escarro,vacinao BCG.

712 casos ndices de

TB e 2147

contatos

Os contatos de comunidades com DOTS ampliado, 26 (4%) tiveram diagnstico de TB ativa e foram tratados, 429 (61,3%) foram detectados com infeco latente e 258 (60,1%) destes iniciaram o tratamento preventivo. Houve diferena na incidncia de TB, com o aumento de 5% nas comunidades DOTS e a diminuio de 10% nas comunidades com DOTS ampliado.

SANCHEZ, A.L.; et al.

Evaluacin de una estrategia para el control

de la tuberculosis en

un distrito sanitario de Andaluca.

Rev Esp Salud Pblica 2010; 84:

71-78

Andalucia/Espanha

Avaliar a viabilidade e os resultados da

aplicao de um indicador sinttico de avaliao de

uma interveno.

Estudo epidemiolgico

descritivo.

Porcentagem de doentes de TB que finalizaram o

tratamento; Porcentagem de pacientes bacilferos dos quais foram avaliados os

contatos; casos novos de TB detectados nos contatos

avaliados; incidncia de TB em menores de 15 anos.

234

Dos 234 pacientes includos no estudo foi realizado o seguimento efetivo de 95%, sendo que 182 (78%) completaram o tratamento, 18 morreram, 10 mudaram-se de casa, e 12 continuavam ainda em tratamento. Dos 130 casos que apresentaram baciloscopia positiva, 112 (86%) tiveram seus contatos avaliados. Foram detectados 27 novos casos entre os contatos estudados, e a incidncia anual em menores de 15 anos foi de 6,65 por 100.000 habitantes. As perdas de seguimento foram reduzidas em 30% e as concluses do tratamento e os estudos de contatos melhoraram em 25% e 30%, quando comparados aos dados de toda Andalucia.

26

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Oliveira et al Servios de

sade no controle da

tuberculose: enfoque na

famlia e orientao para a comunidade. Rev Latino-Am Enfermagem. 2009; 17(3):

Avaliar, na percepo dos

doentes, o desempenho dos

Servios de Sade responsveis pelo controle da TB em

relao s dimenses

enfoque na famlia e orientao para a

comunidade.

Pesquisa avaliativa

transversal

Foram pesquisadas duas dimenses Enfoque na

famlia (com oito indicadores) e Orientaes para a

comunidade (com cinco indicadores).

108

Os resultados apontam que, na primeira dimenso, os profissionais de sade demonstram preocupao em relao aos sinais/sintomas dos pacientes e, em menor grau, sobre outros problemas de sade dos familiares, comprometendo a integralidade do cuidado. Na segunda dimenso, os profissionais da sade mostraram pouca preocupao quanto busca ativa dos casos, deficincia na capacitao de PS, baixa taxa de contatos examinados.

Nguyen, T. H. et al

Risk of latent tuberculosis infection in

children living in households

with tuberculosis patients: a

cross sectional survey in remote

northern Lao People's

Democratic Republic

BMC Infectious Diseases 2009,

v.9, n. 96.

Repblica democrtica do

Laos

Avaliar o risco do desenvolvimento

de infeco tuberculosa latente em crianas que

vivem com doentes de TB na regio rural do noroeste

do Laos

Epidemiolgico de corte

transversal

Caractersticas scio-demogrficas; Dados do

estado clnico; Dados sobre a habitao; Caractersticas das crianas que vivem com

o caso ndice.

148

Nenhuma das 148 crianas contatos de caso com TB bacilfera receberam profilaxia, o risco para TB Latente foi de 31%. A conscincia do contgio da TB foi baixa entre os pacientes (31%) e de seus contatos (31%) e o comportamento de risco era comum, confirmando a importncia do rastreamento de contatos em ambientes remotos com alta prevalncia de TB.

27

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Maciel, E.L.N. et al

Comunicantes domiciliares

jovens de pacientes com TB pulmonar na

regio da grande Vitria

(ES): um estudo de

coorte J Bras Pneumol. 2009, v.35, n.4,

p.359-366

Vitria/ES

Comparar aspectos clnicos,

radiolgicos e laboratoriais de

contatos domiciliares,

menores de 15 anos, de pacientes

com cultura positiva para

Mycobacterium tuberculosis.

Estudo de coorte

Caractersticas demogrficas: sexo e idade.

Sintomatologia, raio x de trax, teste

tuberculnico.adoecimento de acordo com a baciloscopia

do caso ndice.

155

Dos 155 contatos avaliados, 87 (56,1%) eram do sexo feminino e 68 (43,9%) do masculino. Do total, 28 (18%) eram menores de 5 anos; 62 (40%), entre 5-9 anos; e 65 (42%), entre 10-15 anos. Houve sinais sugestivos de TB em 17 (17%) dos 100 contatos no grupo exposto e 9 (16%) dos 55 do grupo no-exposto (p = 0,86). O Raio-x de trax esteve alterado em 20 (21%) dos expostos e 2 (4%) dos contatos no-expostos (RR = 6,9; p = 0,004). Nos grupos exposto e no-exposto, respectivamente, 35 (38%) e 10 (18%) dos contatos apresentaram prova tuberculnica positiva (RR = 2,8; p = 0,01). No total, 5 contatos (5%) do grupo exposto foram diagnosticados com TB, ao passo que no houve diagnstico de TB no grupo no-exposto (p = 0,08).

Jordn et al. Evaluacin de la

deteccin de casos de

tuberculosis mediante um

indicador sinttico en los municipios de Ciudad de La

Habana. Rev Cubana Hig

Epidemiol. 2008;46(3)

Habana/Cuba

Avaliar a factibilidade e os

resultados da aplicao de um

indicador sinttico para verificar a

evoluo de uma interveno de educao em

sade.

Estudo de interveno

Proporo de sintomticos respiratrios (SR), proporo de primeiras investigaes, tempo entre os primeiros sintomas e a primeira consulta, tempo entre a confirmao do diagnstico e o estudo epidemiolgico dos contatos

Dois municpio

s

Foi aplicado o indicador sinttico de localizao de casos em duas cidades de Habana, logo aps foi realizada a interveno de educao em sade sobre a busca ativa de sintomticos respiratrios com os grupos de risco para o desenvolvimento de TB e com os profissionais de sade encarregados do PCT. Em seguida foi aplicado novamente o indicador, que apresentou-se coerente e consistente com a realidade sobre a qualidade da deteco de casos e mostrou uma melhora depois da interveno realizada.

28

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

GAZETTA, C.E. et al

Controle de comunicantes de tuberculose

no Brasil: Reviso de

literatura (1984- 2004)

Rev Latino-am Enfermagem

2008, v.16, n.2

Brasil

Identificar as medidas de controle de

comunicantes de TB

(TB) no Brasil, inseridos nos

planos de controle da TB

Artigo de Reviso

Definio de comunicantes, conduta para a busca de

comunicantes de TB -

Identificou-se lacuna na normatizao das medidas de controle durante a dcada de 1984 a 1994. Conclui-se que faltou aos profissionais de sade incorporar as aes de controle e preveno de TB na perspectivada vigilncia em sade e monitoramento sistemtico.

Hartwig, S.V. et al

Avaliao da vigilncia de contatos de

casos novos de tuberculose no Estado de Mato Grosso Brasil J Bras Pneumol. 2008.v.34, n.5,

p.298-303

Mato Grosso

Avaliar as aes de vigilncia de

contatos de casos novos de TB em Mato Grosso no

perodo de 1999 a 2004.

Estudo epidemiolgico

descritivo

Distribuio da populao, nmero de casos novos de

TB, nmero de contatos (estimados, examinados e no examinados) e taxa de

incidncia de TB, faixa etria, distribuio por ano

de diagnstico da faixa etria do contato examinado.

Em 2004, Mato Grosso apresentou 41,3 casos de TB por 100 mil habitantes. A mesorregio centro-sul apresentou a maior taxa de incidncia (57 casos/100 mil habitantes) e uma taxa de 15% de contatos examinados. Entre os menores de 15 anos, examinaram-se 63 contatos (60,5%), enquanto entre aqueles com 15 anos ou mais, examinaram-se 389 contatos (8,9%). Em 1999, a mdia de contatos examinados em Mato Grosso foi de 0,02 (0,5%), e, em 2004, ela alcanou 0,42 (10,5%). Embora o nmero de contatos avaliados tenha sido pequeno o percentual de contatos examinados foi 40% maior entre os contatos de casos bacilferos.

29

Autor/Ttulo/Ano Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Baker, M. et al. Tuberculosis

associated with household

crowding in a developed

country J Epidemiol Community

Health 2008;62:715721

Nova Zelndia

Identificar se aglomerao de

pessoas em residncias

contribui para a transmisso da TB na Nova Zelndia.

Estudo ecolgico

Proporo de domiclios lotados, com pelo menos um

morador nascido na Nova Zelndia, Proporo de imigrantes nascidos em

pases com alta incidncia de TB, Proporo da

populao por etnia, renda mdia, renda media da famlia, Proporo de

pessoas com TB com 40 anos ou mais nos ltimos 5

anos.

1898

A anlise incluiu 1.898 casos de TB notificados para o perodo 2000 a 2004. A anlise univariada mostrou a incidncia de TB associada com a aglomerao de pessoas na residncia, para a populao total e para todos os grupos tnicos e grupos etrios. Aps o ajuste para as variveis de renda familiar, carga de TB existentes, e a proporo de imigrantes de pases de alta incidncia de TB, a anlise multivariada mostrou associaes estatisticamente significantes entre a incidncia de TB e aglomerao domiciliar. A taxa de incidncia (RTI) foi de 1,05 (IC 95% 1,02-1,08) na populao total e 1,08 (IC 95% 1,04-1,12) para pessoas nascidas na Nova Zelndia.

Centro de pesquisas em tuberculose de Chennai, India

Additional risk of developing

TB for household members

with a TB case at home at

intake: a 15-year study. Int j

tuberc lung dis. 2007;11(3):282

288

Chennai/India

Avaliar o risco para os contatos

intradomiciliares de um caso infeccioso

de TB em uma comunidade rural do Sul da India.

Estudo de coorte por 15

anos, com reavaliaes a cada 2,5 anos.

Idade, sexo, tipo de exposio, risco de

desenvolver a doena. 253.261

A incidncia anual de TB com cultura positiva foi, respectivamente, de 526 e 271 por 100.000 contatos de pacientes com baciloscopia positiva e com baciloscopia negativa e de 198 por 100.000 nos no-contatos. O risco foi de 3,4 vezes para os contatos de pacientes com baciloscopia positiva e de 1,7 vezes para os contatos de pacientes com baciloscopia negativa em comparao aos no-contatos. Dos 3.942 casos incidentes, 337 (8,5%) tiveram contato domiciliar com um caso de TB.

30

Autor/Ttulo/Ano Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Gazetta, C. E. et al

O controle de comunicantes de tuberculose no programa de

controle da tuberculose em um municpio

de mdio porte da

Regio Sudeste do Brasil, em

2002 J Bras Pneumol. 2006. V.32, n.6,

p. 559-65

So Jose do Rio Preto/SP

Descrever as

aes de controle dos comunicantes de TB no PCT do Municpio de So Jos do Rio Preto

(SP), em 2002.

Estudo descritivo

Caractersticas demogrficas: sexo, idade, tipo de parentesco com o

caso ndice; e local que fez o diagnstico e encaminhou ao

PCT.

166

Dos 166 comunicantes intradomiciliares de TB inscritos em 2002, 82 eram do sexo masculino e 84 do feminino, com maior incidncia de casos na faixa etria de 15 e 59 anos (70%); 42 tinham entre 0 e 19 anos (26,4%), 73 entre 20 e 49 anos (45,9%), e 44 tinham 50 anos ou mais (27,7%). Quanto ao grau de parentesco, 41 eram filhos, 29 companheiros, 22 irmos e 15 mes do paciente ndice. Com relao aos exames solicitados, observou-se que: 12% realizaram baciloscopia e/ou cultura; 100% realizaram radiografia de trax, e destes, 2 apresentaram suspeita de TB pulmonar e 5 outras afeces; 7,2% realizaram prova tuberculnica, com 4,2% de no reatores e 1,2% com endurao igual a 8 mm. Dos comunicantes examinados, 3 tiveram a doena detectada (1,8%).

Becerra M.C.et al Expanding

Tuberculosis Case Detection by Screening Household Contacts

Public Health Reports. 2005. V.

120

Lima/Peru

Avaliar a viabilidade e

rendimento de uma estratgia de

busca ativa em uma populao de alta incidncia de TB na cidade de Lima, norte do

Peru.

Estudo de coorte

Sexo, idade, escolaridade, nmero de amostras de

escarro, prevalncia de TB nos contatos que relataram

tosse, prevalncia de TB nos contatos com amostra de

escarro.

1.094

O Risco de doena ativa entre contatos domiciliares de indivduos bacilferos nesta comunidade foi de 0,9% (10/1094), considerado pelos autores como muito elevado. Foram analisadas as duas estratgias de busca: ativa (8/1094) e passiva (2/1094). Verificaram que com a busca ativa identificou-se 4 vezes mais contatos domiciliares contaminados com TB. Os resultados sugerem que o rastreamento dos contatos pode ser um poderoso meio de melhorar as taxas de deteco de casos ativos da doena.

31

Autor/Ttulo/Ano Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

TORNEE, S. et al.

Factors associated with the household

contact Screening

adherence of tuberculosis

patients. Southeast Asian

J Trop Med Public Health.

v.36, n.2. 2005.

Bangkok/Tailndia

Investigar os fatores associados

adeso dos pacientes com TB

em levar seus contatos

domiciliares para avaliao

Estudo quantitativo e

qualitativo.

Caractersticas demogrficas: sexo, idade, escolaridade, ocupao,

grau de parentesco. Fatores associados a adeso ao

rastreio dos contatos: conhecimento sobre TB,

susceptibilidade percebida, severidade percebida, benefcios percebidos,

barreiras percebidas,satisfao com o

servio, suporte familiar, interao, inteno, distancia da residncia ao servio de

sade.

325

Dos 325 pacientes com TB, 169 (52%) trouxeram seus contatos domiciliares para o servio de sade. Fatores Psicossociais de ao foram analisados como indicadores da aderncia de triagem familiar dos pacientes com TB. Os resultados revelam que a adeso a triagem dos contatos estava significativamente associada a uma maior susceptibilidade percebida, menores barreiras percebidas, a maior inteno de levar os contactos para a clnica, e a curta distncia entre a casa e a clnica da TB.

LIMA, Joo AB, et al.

Caractersticas clnicas e

epidemiolgicas do adulto

contagiante da criana com tuberculose.

Jornal Brasileiro de Pneumologia.

2004; 30 (3): 243-52.

Porto Alegre/RS

Descrever o perfil do adulto

contagiante da criana com TB identificada na rede pblica de

sade.

Estudo de casos,

incluindo todas as crianas

(

32

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Lemos, A.C. et al Risk of

Tuberculosis Among

Household Contacts in

Salvador, Bahia The Brazilian

Journal of Infectious

Diseases 2004. V.8, n.6, p.424-

430

Salvador/BA

Determinar o risco de infeco entre

contatos domiciliares.

Estudo de Coorte

acompanhando contatos de

casos-ndice de TB, com PPD inicial negativo por 12 meses.

Caracterizao demogrfica (idade, sexo, etnia), cicatriz vacinal, prevalncia de TB

entre os contatos.

269

Foram acompanhados 269 contatos domiciliares de 69 casos-ndice de TB. A prevalncia da doena nesta populao foi de 3,7%. A prevalncia cumulativa de infeco aps 12 meses de acompanhamento foi de 63,9%. Os contatos domiciliares de casos-ndice de TB tm uma prevalncia de infeco elevada e um risco de infeco de 31%.

Barroso, E C, et al. Ocorrncia de tuberculose doena entre contatos de tuberculose sensvel e

multirresistente J Bras Pneumol 2004; 30(4)401-8

Maracana, Messejana e Fortaleza/CE

Determinar a ocorrncia de

casos de TB entre contatos intra-

domiciliares de TB multirresistente e

TB sensvel.

Estudo epidemiolgico, caso-controle

Contatos e controles, nmero de contatos tratados

por famlia, ocorrncia de contato tratado por antes e aps o caso ndice, nmero

de casos de TB multirresistente

1309

O nmero de contatos foi de 557 no grupo dos casos e 752 no grupo controle. Entre os casos, 4,49% dos contatos (25/557) fizeram tratamento para TB aps o caso ndice. Esse percentual foi de 5,45% (41/752) entre os controles (p=0,4468). Foi detectada em oito famlias micro-epidemia de TB multirresistente confirmada por teste de sensibilidade.

Barroso, E C, et al. Papel da tuberculose domiciliar no

surgimento da tuberculose

multirresistente J Bras Pneumol 2004; 30(1) 46-

52

Maracana, Messejana e Fortaleza/CE

Avaliar se o

contato com TB domiciliar fator de risco para TB multirresistente.

Estudo epidemiolgico caso-controle

Gnero e idade do caso ndice, TB curada no

domiclio, TB abandonada no domiclio, TBMR no domiclio

319

O grupo de casos e controle foi de 134 e 185, respectivamente. Pelo teste exato de Fisher no foi encontrada associao entre TB multirresistente e contato com TB na famlia (p=0,1190). Estudando os subgrupos, identificou-se que o contato com pacientes curados de TB estava associado com TB sensvel (p

33

Autor/Ttulo/Ano Local/Objetivo Delineamento Variveis N Principais resultados

Caldeira, Z. M.R. et al

Controle de crianas e

adolescentes comunicantes

de tuberculosos,

Rio de Janeiro, RJ

Revista de sade pblica. 2004.

V.38, n.3, p. 339-45

Rio de Janeiro/RJ

Detectar doena ou infeco

tuberculosa em comunicantes de pacientes com TB

pulmonar.

Estudo descritivo

transversal

Vacinao BCG, Resultado do teste tuberculnico por

faixa etria, relao entre o teste tuberculnico e a fonte

do contato. Caractersticas

demogrficas: faixa etria, gnero, fonte de infeco,

grau de parentesco, nmero de fontes no domiclio.

184

A casustica foi composta por 98 meninos e 86 meninas, com idades variando entre 0 e 15 anos. Segundo o critrio de Gomez, 26,9% das crianas eram desnutridas. Em relao fonte de infeco, 170 (92,4%) foram intradomiciliares, das quais 66,5% eram os pais. A vacinao BCG foi constatada em 98,4% crianas e 14,7% haviam sido revacinadas. O teste tuberculnico foi reator forte em 110/181 crianas. Consideraram-se infectadas pelo M. tuberculosis 76 (41,3%) crianas e detectaram-se 25 (13,6%) casos de TB pulmonar, dos quais sete (28%) estavam assintomticos. Houve maior adoecimento quando o comunicante convivia com mais de uma fonte de infeco (p=0,02).

ALSED, M.; GODOY, P. Estudio de

contactos de enfermos

tuberculosos em um rea semiurbana. Enferm Infecc Microbiol Clin.

v.21, n.6, p.281-6. 2003.

Lleida/Espanha

Analisar os

resultados do estudo de contatos de enfermos com TB (1991-1997) e sua associao

com a bacteriologia do caso ndice e o

nvel de exposio.

Estudo epidemiolgico.

Bacteriologia do caso ndice, grau de intimidade com o

caso ndice, idade do contato.

1773

A prevalncia de infeco tuberculosa entre os contatos foi de 44%. Se observou uma converso tuberculnica em 7,8% dos contatos e se detectaram 31 novos casos de TB (1,8%). A proporo de infeco tuberculosa, converso tuberculnica e deteco de novos casos de TB foi superior entre os contatos de pacientes com baciloscopia positiva e maior grau de exposio.

6 Quadro terico

6.1 Tuberculose e famlia: o controle da doena do sculo XIX ao XXI.

A significao e a relevncia da TB para a sociedade sofreu alteraes ao

longo do processo histrico, as quais podem ser percebidas pelas transformaes na

ateno famlia da pessoa com TB, que evoluram juntamente com o conhecimento

cientfico sobre a doena.

At o final do sculo XIX a TB era tida como uma molstia hereditria, os

mdicos da poca acreditavam que o indivduo j nascia com a doena ou com o

organismo pr-disposto ao adoecimento. Esta idia estava diretamente relacionada

ao fato de que quando havia um doente na famlia, ao mesmo tempo, outros

membros deste grupo tambm adoeciam. Inexistia o conhecimento sobre o contgio

da TB, e por esta razo no eram preconizados cuidados em relao interrupo

da cadeia de transmisso da doena (GONALVES, 2000; GILL, 2006).

Alm disso, existia uma associao entre s condies de vida e trabalho

precrios ao acometimento pela TB. Naquela poca no existia o conhecimento

microbiolgico a respeito do bacilo de Koch, no havia mtodos diagnsticos e

tampouco o tratamento antimicrobiano, por esta razo no se sabia como lidar com a

doena. Uma das primeiras iniciativas no sentido de control-la foi implementao

do uso de escarradeiras pelos doentes, visto que, acreditava-se que o escarro era

um fluido maligno que se lanado ao cho mantinha as propriedades da doena e

poderia dissemin-la (GONALVES, 2000; ANTUNES et al, 2000).

35

A idia de TB, nesta mesma poca, era dividida entre a imagem europia

que a ligava aos poetas e artistas como um sinnimo de refinamento; e a dos

mdicos higienistas de TB como um mal social, relacionado aos trabalhadores que

pelas poucas condies financeiras viviam mal alimentados e de forma insalubre nos

cortios, sendo considerados como vtimas do desenvolvimento (GONALVES,

2000, p.305; GILL, 2006).

A prtica mdica de meados do sculo XIX estava voltada para o social e

para a higiene, com prticas normativas e intervencionistas. Naquela poca, os

mdicos acreditavam que alterando os hbitos sociais, de onde e de como viver, do

que comer e beber alcanaria melhorias para toda a populao, no sendo

consideradas necessrias precaues para os contatos familiares, pois se

desconhecia a possibilidade de contgio pela doena (GONALVES, 2000).

Ao final do sculo XIX, o doente era tido como vtima das condies de vida,

entretanto com a descoberta de Robert Koch sobre a existncia do agente causador

da doena, a pessoa com TB passou a ser responsabilizada pelo adoecimento e

estabeleceu-se a averso social a estes sujeitos. A nova viso atribuiu aos doentes a

culpa do adoecimento, devido ao descumprimento das determinaes higienistas e

pela capacidade de transmitir a doena tambm queles que no compartilhavam da

mesma condio de vida. Foi a partir desta poca que o indivduo passou a ser

considerado como transmissor da doena e a medicina tomou a posio de controlar

os doentes de TB para o bem-estar geral da sociedade (GILL, 2006; SHAMPO e

ROSENOW, 2009).

Neste ponto da histria a pessoa com TB passou a ser considerada como

um risco sociedade e sua famlia, pois o doente era capaz de contagiar seus

familiares e outros indivduos que compartilhavam da mesma condio social, e at

mesmo de disseminar a doena entre os sadios de outras classes sociais quando

transitava em locais pblicos.

Os tratamentos utilizados na poca eram baseados nas terapias climticas e

no repouso absoluto, pois no existia medicamento para o tratamento da TB. Surgiu

nesta poca a idia de que os locais de habitao e de trabalho, os objetos, o ar e as

aglomeraes de pessoas vinculadas pobreza eram to infectantes quanto a

36

prpria doena. Assim sendo, a reestruturao urbana foi uma das solues que os

mdicos sanitaristas brasileiros propuseram para o combate e eliminao da TB

(GONALVES, 2000).

Em decorrncia da descoberta de Koch e da elevao no nmero de casos

novos foram tomadas iniciativas direcionadas para o controle da doena, visando a

interrupo da cadeia de transmisso. Uma delas foi criao de instituies

filantrpicas para o controle da TB. Em 1900 com a fundao da Liga Brasileira

contra a TB, com o objetivo de promover a cura e a profilaxia, deu-se incio criao

dos dispensrios e sanatrios. O primeiro era responsvel pela realizao de

exames diagnsticos, encaminhamento a consultrios mdicos e a servios de

enfermagem, alm de oferecer assistncia social aos necessitados, orientaes

profilticas, escarradeiras e lenos. J os sanatrios eram locais para a internao e

o isolamento do doente da vida em sociedade, do trabalho e de seus familiares para

buscar a cura da doena e evitar que a disseminassem no perodo de

convalescncia. Estes locais eram construdos principalmente em reas

montanhosas, onde o ar era considerado mais puro e favoreceria a implementao

da prtica curativa climtica. Esta teraputica prevaleceu da dcada de 1920 at

meados de 1940, quando foi considerada insuficiente (ANTUNES et al, 2000;

GONALVES, 2000).

Nota-se que as aes de sade no intuito de controlar a doena eram

firmadas somente sobre a pessoa com os sintomas da TB, limitando-se ao

isolamento social em sanatrios, sem a observncia de atitudes diretamente

direcionadas aos familiares do doente no propsito de intervir na preveno do

contgio e na promoo da sade.

Somente no ano de 1907 foi lanado no Brasil o plano de combate TB,

entretanto, no foi efetivo devido falta de financiamento do governo, que negou

apoio por considerar que a doena no era uma ameaa estrutura econmica do

estado (GONALVES, 2000).

Na dcada de 1920, o governo finalmente envolveu-se no controle da TB,

instituindo o Departamento Nacional de Sade Pblica, e desenvolvendo aes

atravs da Inspetoria de Profilaxia da TB, a qual identificava os doentes e realizava

37

intervenes, notificao do caso, educao em sade sobre as formas de contgio,

o isolamento do doente e a assepsia do ambiente onde ele vivia. Em virtude da

elevada incidncia de TB, os sanatrios e dispensrios no deram conta de isolar e

acompanhar todos os doentes, surgindo como alternativa, a elevao do nmero de

atendimentos ambulatoriais e a utilizao das visitas domiciliares (GONALVES,

2000).

Com este propsito, nesta dcada, tambm foi criado no Rio de Janeiro o

Servio de Enfermeiras da Sade Pblica, o qual era responsvel em dar

continuidade ao atendimento oferecido nos dispensrios atravs da visitao a

domiclio. Na ocasio, era verificada a estrutura econmica, social e familiar, com o

objetivo de detectar precocemente os casos suspeitos para tratamento ou

isolamento, estimulando as prticas higinicas e profilticas preconizadas pela

autoridade sanitria (ANTUNES et al, 2000; SANTOS e KIRSCHBAUM, 2008).

Observa-se que a prtica de visitao domiciliar inicia-se no Brasil nesta

poca com o objetivo de controlar as doenas infecto-contagiosas. Esta ao em

sade caracteriza-se como a primeira atividade que se aproxima do controle da TB

com enfoque na famlia do enfermo. E devido incapacidade dos dispensrios e

sanatrios em atender a demanda da populao foram institudos os atendimentos

ambulatoriais, os quais fortaleceram a realizao do controle da doena no ambiente

familiar.

Na dcada de 1930 houve avanos nas tcnicas de diagnstico da TB, com

a descoberta do mdico brasileiro Manoel de Abreu que desenvolveu a abreugrafia,

exame de imagem dos pulmes. Comearam a serem questionadas as tcnicas

curativas existentes, havendo um crescimento das intervenes cirrgicas

(pneumotrax artificial, para o descanso do pulmo), sendo colocada em dvida a

eficcia da tcnica climtica no restabelecimento do doente (GONALVES, 2000).

Neste perodo a TB foi considerada como um problema pblico de sade e

se firmaram preocupaes no sentido de envolver e responsabilizar a famlia pela

ateno ao doente de TB, caracterizando assim, o olhar dos profissionais da sade

voltado para o enfermo, vendo a famlia apenas como auxlio para a promoo do

tratamento adequado e no como foco da ateno. A famlia com medo do

38

preconceito, da contaminao dos sadios e dos gastos envolvidos no tratamento do

enfermo, mantinha segredo sobre o adoecimento e reunia recursos para enviar o

doente a um ambiente propcio para a recuperao pulmonar, a regio serrana

(FILHO, 2001). No ano de 1941, foi institudo o Servio Nacional de Tuberculose, que

ficou responsvel por supervisionar os servios de assistncia mdica, e nesta

mesma poca, foram estabelecidos sanatrios e pavilhes especficos para o

atendimento de pacientes com TB nos hospitais gerais. Na cidade de Pelotas, a

criao da ala exclusiva para o atendimento a estes doentes foi anterior a iniciativa

nacional, datando de 1925 a inaugurao do pavilho Baronesa do Arroio Grande

(GONALVES, 2000; GILL, 2006).

Na dcada de 1940 houve progressos nas polticas pblicas de controle da

TB. Em 1946, foi criada a Campanha Nacional contra a Tuberculose com o objetivo

de formalizar e normatizar o controle da doena em todas as unidades federativas do

pas. Em 1947, foi instituda a obrigatoriedade de um exame de Raio-X torcico a

todos os trabalhadores que no comparecessem a atividade laboral por motivo de

doena, houve tambm o incio da obrigatoriedade da vacinao oral BCG (Bacilo de

Calmette e Gurin). Foi neste ano que se deu incio ao tratamento dispensarial de

medicamentos antituberculosos, sendo considerado o meio mais eficaz para o

controle da enfermidade. Nesta poca o nico medicamento disponvel era a

estreptomicina, datada de 1944, sendo introduzido em 1949 o cido

paraminossaliclico. E, em 1952, a isoniazida veio completar o tratamento e

solucionar, mesmo que temporariamente, o problema da resistncia antimicrobiana

(GONALVES, 2000; FILHO et al, 2009).

Na dcada de 1940 foram alcanados avanos no sentido da precauo

coletiva, com a introduo da vacinao aos recm-nascidos. Neste momento, o

olhar da instituio sanitria se voltou para a ateno preventiva entre os familiares

da pessoa com TB. Embora o tratamento quimioterpico ainda fosse direcionado

apenas para a cura da doena j instituda, ele veio a contribuir para a modificao

do status da doena de incurvel para tratvel. O seu uso como profilaxia entre os

familiares que se apresentavam como reatores a prova tuberculnica foi firmado em

1962, por recomendao da American Thoracic Society (ATA) (PINEDA, 2004).

39

Nas dcadas de 1950 e 1960 foi instituda definitivamente a modalidade de

tratamento para a TB como ambulatorial e os doentes poderiam conviver com suas

famlias em sociedade durante o transcorrer do tratamento. O doente em poder dos

medicamentos tratava-se em casa e da forma como julgasse apropriado, cabendo

aos mdicos o diagnstico e a indicao da teraputica. Este foi um avano

significativo para o alcance de melhorias nas condies de vida destes doentes, pois

no necessitavam ficar isolados em sanatrios, ou em alas especficas para TB.

Entretanto, sobreviveu uma bagagem das pocas antigas que foi o rtulo de

tuberculoso, permanecendo nos doentes o estigma. Tambm houve uma

modificao na viso sanitria sobre a doena, que antes estava vinculada ao meio

ambiente como fonte de contgio, e a partir da passou a ser tratada de forma mais

individualizada, baseada na teraputica medicamentosa e no mais na cura do meio

(GONALVES, 2000).

A transferncia dos cuidados do doente para o domiclio humanizou a

ateno TB, entretanto trouxe alguns transtornos para a famlia, tais como, o medo

do convvio com a doena e a necessidade da adoo de medidas de isolamento,

como a separao de utenslios e louas e a utilizao contnua de lenos pelo

doente como barreira liberao dos bacilos durante a fala e tosse.

Nos anos de 1960 e 1970 foi preconizada a realizao de abreugrafia na

admisso de funcionrios nas fbricas, como exame peridico de sade e at

mesmo no ingresso de crianas escola. Esta atitude teve como propsito buscar

ativamente os casos de TB, iniciar precocemente o tratamento e interromper a

transmisso da doena. No incio da dcada de 1980, a abreugrafia deu lugar

recomendao do Programa Nacional de Controle da Tuberculose a realizao de

exame de baciloscopia para os sintomticos respiratrios. Este fato se deu pelo

menor custo do exame no rastreio dos doentes de TB, pelos riscos da exposio a

repetidas doses de radiao e pela preciso no diagnstico. Esta determinao foi

seguida pelo Ministrio do Trabalho que em 1990, revogou as diretrizes quanto

obrigatoriedade do uso da abreugrafia para atestados de sade de trabalhadores

(ANTUNES et al, 2000).

40

No ano de 1971, foi criada a Central de Medicamentos, que distribua

gratuitamente o tratamento medicamentoso para a TB, e, em 1979 foi definida a

padronizao do tratamento com curta durao e auto-administrado. Somente em

1980 foi lanado o Programa Nacional de Controle da TB que veio em substituio

ao Servio Nacional de Tuberculose (GONALVES, 2000).

Em 1976 foi lanado pela ATA um guia especfico para o controle dos

contatos intradomiciliares da pessoa com TB, o qual relacionava a investigao,

diagnstico, acompanhamento e tratamento dos contatos intradomiciliares como

estratgia de preveno da disseminao da doena (CENTER FOR DIASES

CONTROL, 2005).

At meados da dcada de oitenta, os rgo internacionais acreditavam que a

situao da TB estava estabilizada, o que representava a situao dos pases

desenvolvidos, porque, no Brasil assim como nas demais naes consideradas como

subdesenvolvidas ou em desenvolvimento ela nunca deixou de ser um problema de

sade pblica (SILVA e BOCHAT, 2004; RUFFINO-NETTO, 2004).

Em 1984, foi lanado o manual do programa, o qual ofereceu os elementos

tcnicos e organizacionais para os servios de sade, firmando a centralizao do

tratamento da doena e a conduta em relao aos contatos da pessoa com TB. A

recomendao de acompanhamento dos contatos era para a realizao de exame de

escarro a todos os sintomticos respiratrios, a realizao da prova tuberculnica nos

no vacinados com BCG intradrmica e menores de cinco anos. Os exames de Raio

X (RX) eram recomendados a todos quando possvel, e a quimioprofilaxia reservava-

se aos menores de cinco anos, no vacinados com BCG, reatores a prova

tuberculnica, mesmo que com RX de trax normal e assintomticos desde que

convivessem com casos de TB bacilfera (GAZETTA et al, 2008).

Verifica-se que os exames diagnsticos passaram a ser amplamente

empregados no controle dos contatos intradomiciliares, havendo a conscincia da

relevncia destes sujeitos na cadeia de transmisso da doena.

No ano de 1985, os ndices de TB voltaram a crescer no mundo inteiro, esta

mudana na direo das curvas de prevalncia pode ser explicada pela existncia de

grandes desigualdades sociais, de pobreza, do envelhecimento da populao e da

41

elevao dos fluxos migratrios, associada existncia de reservatrios de TB nos

pases pobres da sia, frica, Amrica Central e Amrica do Sul. Muito embora, o

fator primordial para o agravamento deste panorama tenha sido a pandemia da

Sndrome da Imunodeficincia Adquirida (SIDA) (SILVA e BOCHAT, 2004). Em

contrapartida, as orientaes quanto a utilizao da quimioprofilaxia para as pessoas

soropositivas para HIV s foi recomendada a partir do ano de 1992 (GAZETTA et al,

2008).

Deste modo, a dcada de oitenta um marco histrico para as aes de

controle da TB, pois a doena passou a ocupar lugar de destaque na mdia mundial e

em 1993, a Organizao Mundial da Sade (OMS) declarou a TB como uma doena

emergente no mundo todo (SILVA e BOCHAT, 2004).

Devido s dimenses alcanadas pela difuso da TB no mundo, a OMS, deu

origem ao programa STOP TB, para auxili-la no controle da doena. Este

formado pela prpria OMS, pelo Banco Mundial (WB), pela Union International

Against Tuberculosis na Lung Disease (UICTB), pelo Center for Disease Control -

Atlanta (CDC), pela Royal Netherlands Tuberculosis Association (RNTA) e pela

American Thoracic Association (ATA) (RUFFINO-NETTO, 2004).

A partir da declarao da OMS sobre a TB ser uma emergncia sanitria

mundial, o Brasil passou a desenvolver estratgias com vistas a controlar o avano

da TB no pas. A primeira delas foi o Plano Emergencial para Controle da

Tuberculose, lanado em 1996 pelo Ministrio da Sade (MS), no qual foram eleitos

230 municpios considerados como prioritrios, pois apresentavam alm de ndices

elevados de incidncia, mortalidade e co-infeco com HIV, problemas operacionais

como altas taxas de abandono do tratamento. Cada um destes municpios

desenvolveu um plano de ao juntamente com a Fundao Nacional de Sade

(FUNASA), a qual estabeleceu metas e o repasse de recursos para o

desenvolvimento de aes, tais como, a busca de casos, tratamento e educao em

sade. Foram fixadas as metas de 90% de diagnsticos e o alcance de cura de 85%

destes casos (HIJJAR et al, 2007).

Neste plano as aes direcionadas para o controle da doena incluam a

busca de sintomticos respiratrios entre os familiares de pessoas com TB de todas

42

as formas clnicas, alm da adoo das medidas profilticas denominadas de

proteo aos sadios, as quais contemplavam a vacinao com BCG intradrmica

nas crianas entre 0 e 4 anos de idade e a revacinao na idade escolar. Alm do

uso da quimioprofilaxia com isoniazida em contatos intradomiciliares de caso

bacilfero menores de cinco anos de idade e naqueles com sorologia positiva para

HIV e outros imunodeprimidos (BRASIL, 1996 p.41).

Em 1999, o Ministrio da Sade (MS) lanou o Plano Nacional de Controle

da Tuberculose (PNCT), que manteve as diretrizes tcnicas do plano emergencial

associando a elas a idia de construo de centros de excelncia. Em 2000, o MS

apresentou o Plano Nacional de Mobilizao para Eliminao da Hansenase e

controle da TB em municpios prioritrios por meio da ateno bsica. Em 2001, foi

vez do Plano estratgico para implementao do Plano de controle da

Tuberculose no Brasil, no perodo de 2001-2005. Estes novos planos mantiveram as

metas de diagnstico e cura do plano emergencial associando a isto a

implementao de aes de controle da TB em 100% dos municpios prioritrios

(HIJJAR et al, 2007).

As normas para o controle dos contatos evoluram entre os manuais

publicados na dcada de noventa, chegando em 1997 a definies direcionadas

pontualmente s famlias. Estas determinavam que os contatos intradomiliares com

idade menor a quinze anos, com prova tuberculnica (PT) reatora, assintomticos e

vacinados com BCG deveriam apenas ser observados. Para aqueles no vacinados

a conduta era a realizao da PT, quando no reatores realizavam nova PT aps

dois meses do primeiro teste e mantendo o resultado no segundo teste era indicada

a vacinao, enquanto que aos reatores a conduta indicada era a quimioprofilaxia em

qualquer das etapas (GAZETTA et al, 2008).

No ano de 2003 com a criao da Secretaria de Vigilncia a Sade (SVS), as

aes de vigilncia e controle da TB passaram a ser de responsabilidade deste novo

rgo do governo. A SVS priorizou o fortalecimento dos sistemas de informao de

sade, para monitorao e tomada de decises apropriadas sobre a TB no Brasil

(HIJJAR et al, 2007).

43

No ano de 2007, foram notificados 72.194 casos novos no Brasil, o que

corresponde a uma incidncia de 38/100.000 hab. Destes casos novos 41.117

tiveram baciloscopia de escarro positiva. Estes valores posicionam o Brasil na 19

posio em relao ao nmero de casos e na 104 posio em relao incidncia.

O nmero de bitos anuais no Brasil, tendo a TB como causa de 4500 pessoas,

sendo a maioria deles nas regies metropolitanas e em unidades hospitalares.

Mesmo considerando que a TB uma doena evitvel e curvel, no Brasil no ano de

2008 foi a 4 causa de morte por doenas infecciosas e a 1 causa de morte dos

pacientes com AIDS (BRASIL, 2010b).

O MS definiu como prioridade aes contra a TB, colocando em prtica um

plano nacional que prioriza a qualificao dos recursos humanos, a mobilizao

social, a ampliao da rede de laboratrios, o monitoramento e a avaliao,

esperando que haja um fortalecimento das aes, reduzindo o nmero de casos de

TB na populao e nos grupos vulnerveis. Dentre estas aes esto a adoo da

estratgia DOTS, a capacitao dos recursos humanos envolvidos no PCT, e a

definio de metas de diagnstico para novos casos, para a porcentagem de cura e

para a de abandono do tratamento (BRASIL, PNCT-ONLINE).

As determinaes atuais para o controle da TB no Brasil esto dispostas no

Manual de Recomendaes para o Controle da Tuberculose no Brasil, lanado no

ano de 2010 pelo Ministrio da Sade, SVS e PNCT. Este manual contm um

captulo direcionado ao controle dos contatos e determina como deve ser o processo

de avaliao destes sujeitos, iniciando pela identificao dos mesmos assim que o

caso-ndice for diagnosticado pela realizao de entrevista minuciosa com a listagem

de todos os contatos, suas idades e o tipo de convvio com o caso-ndice. Est

recomendado sempre que possvel a realizao de visita domiciliar para

complementar a coleta de dados da entrevista e melhorar a caracterizao da

famlia.

O passo seguinte na investigao o convite para que todos os contatos

intradomiciliares identificados compaream ao servio de sade para serem

avaliados atravs de anamnese e exame fsico. Caso no compaream, se faz

necessria a busca ativa com visitao domiciliar. Todos os sintomticos

44

respiratrios, sendo crianas, adultos ou HIV positivo devero ser investigados

tambm por intermdio de exames, que incluem, o Raio X de trax, a baciloscopia de

escarro, a prova tuberculnica e o histopatolgico, de acordo com cada caso. J os

assintomticos adultos e crianas maiores de dez anos devem ser testados com

prova tuberculnica, caso o resultado seja reator e o Raio X de trax tenha excludo a

possibilidade de doena ativa, recomenda-se o tratamento para infeco tuberculosa

latente (ANEXO I). A conduta recomendada para menores de 10 anos de idade

assintomticos da realizao da PT e Raio X de trax j na primeira consulta, caso

a PT seja no reator realiz-la aps oito semanas (ANEXO II) (BRASIL, 2010b).

Os resultados da avaliao dos contatos intradomiciliares devem ser

registrados no pronturio, caso no seja identificada a TB e no seja necessrio

tratar para TB latente, os contatos devero ser orientados a retornar ao servio de

sade em caso de aparecimento de sintomas sugestivos de TB (BRASIL, 2010b).

Muitos avanos foram observados desde a implementao do PNCT, houve

reduo do nmero absoluto de casos novos de TB, queda na taxa de incidncia da

doena e de mortalidade entre a populao, expanso da cobertura da estratgia

DOTS, ampliao da testagem para HIV nos pacientes acometidos pela doena e a

introduo de nova abordagem teraputica com o acrscimo de mais um

medicamento para a TB (NETO, 2010).

Atualmente, com o tratamento disponvel e distribudo gratuitamente pelo

Ministrio da Sade, seria possvel curar praticamente todos os casos de TB,

entretanto, no Brasil, esta doena ainda apresenta alta incidncia e mortalidade. Este

fato pode estar explicado pelos ndices de pobreza, prevalncia de co-infeco TB-

HIV, pelo crescimento da populao e concentrao urbana desordenada, alm da

no execuo das aes previstas no PNCT (RUFINO-NETTO, 2002; DALCOMO et

al, 2007).

Outro fator relevante na manuteno das taxas de infeco da TB refere-se

multirresistncia aos antimicrobianos, ocasionada principalmente pelo abandono do

tratamento e pelo uso inadequado das medicaes. A interrupo do tratamento

favorece a mutao dos bacilos, possibilitando que eles adquiram resistncia aos

antimicrobianos de primeira escolha para a teraputica (BARROSO et al, 2004).

45

A resistncia aos frmacos classificada em trs tipos, natural, primria e

adquirida. A natural est relacionada ao processo de multiplicao do bacilo sem

interferncia externa; a primria aquela que se verifica em pacientes nunca

tratados anteriormente para TB, e sim que foram contaminados com bacilos

previamente resistentes; e a adquirida ocorre quando um bacilo inicialmente sensvel

se torna resistente aps a exposio aos medicamentos de forma inadequada ou

irregular. O bacilo considerado resistente se no responder pelo menos a

rifampicina (RFP) + isoniazida (INH) (BRASIL, 2010b).

No Brasil, 96% dos casos de resistncia dos bacilos so do tipo adquirida,

estando 50% dos pacientes infectados, em seu terceiro ou mais tratamento para TB,

apresentando cavitaes pulmonares bilaterais em 65% dos casos, e co-infeco

pelo HIV em 7%. Para o tratamento desses casos, necessrio o uso de

medicamentos injetveis e de frmacos de reserva, com durao de 18 a 24 meses,

cuja efetividade de aproximadamente 60% (BRASIL, 2007).

A multirresistncia no se apresenta de forma acentuada, na realidade

brasileira, entretanto indispensvel que se controle a propagao destas cepas.

Para tanto, deve-se acompanhar o tratamento das pessoas com TB e avaliar

adequadamente os seus contatos, para garantir que eles possam ter acesso a

teraputica e a profilaxia apropriadas, sem interrupo do tratamento at a cura

(BRASIL, 2010b).

6.2 Os servios de sade e o enfoque na famlia

O Sistema nico de Sade (SUS) prev a hierarquizao da ateno

sade, distribuindo as competncias entre as trs esferas do governo. Estas so

representadas no nvel federal pelo MS, no estadual pela Secretaria Estadual de

Sade (SES) e no municipal pela Secretaria Municipal de Sade (SMS) (BRASIL,

2000).

Na ateno TB esta distribuio de responsabilidades d-se da seguinte

forma: o MS tem como atribuies estabelecer normas tcnicas e operacionais,

adquirir os medicamentos para o tratamento da TB, oferecer subsdio tcnico e

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financeiro, estabelecer estratgias de descentralizao das aes de controle da TB

na ateno bsica e promover campanhas de informao sociedade sobre

promoo da sade, com informaes sobre preveno da doena e tratamento.

Alm disso, cabe ao MS coordenar o sistema de registro de informaes e pactuar

com as outras esferas de governo o cumprimento de metas para eliminao da

doena. Ao MS cabe o incentivo ao desenvolvimento de pesquisas sobre o tema,

visando avaliar a execuo das aes de controle da TB (BRASIL, 2010b).

A Secretaria Estadual de Sade cabe a responsabilidade de gerenciar as

medidas de controle no estado, monitorando os indicadores epidemiolgicos, o

cumprimento das metas pactuadas e divulgando boletins para fins de planejamento,

monitoramento e avaliao. Realiza ainda, o armazenamento e controle dos

medicamentos e insumos para todo o estado. Promove a capacitao de recursos

humanos na rea da TB, assessora as coordenadorias regionais na implantao dos

PCTs nos municpios, mantendo intercmbio permanente com as instituies de

ensino e pesquisa, PNCT, laboratrios de referncia e setores relacionados ao

controle de outras doenas de notificao compulsria, principalmente a Aids.

Responsabiliza-se tambm em divulgar boletins sobre a situao epidemiolgica

estadual e estimular a participao da populao no controle social da TB (BRASIL,

2010b).

Os municpios, representados pelas Secretarias Municipais de Sade em

conjunto com o PCT so responsveis por monitorar os indicadores epidemiolgicos,

coordenar a busca ativa de sintomticos respiratrios, bem como supervisionar e,

inclusive, participar da investigao e do controle dos contatos intradomiciliares de

pacientes bacilferos. Notificar ao SINAN os casos de TB, bem como acompanh-los

durante todo o tratamento mensalmente. Consolidar e analisar os dados gerados

pelo sistema de informao oferecendo subsdios para fins de planejamento,

monitoramento e avaliao. Assegurar a realizao de exames diagnsticos

conforme preconizado nas normas. Providenciar os medicamentos junto ao rgo

regional ou estadual e distribu-los s unidades de sade, alm de zelar pela

vacinao BCG entre os recm-nascidos. Tem o papel de articular-se com as

equipes da ESF ou agentes comunitrios de sade visando aperfeioar as aes de

47

controle da TB em todas as suas faces. E por ltimo identificar e organizar a rede de

laboratrios locais e suas referencias municipais, estaduais e federais (BRASIL,

2010b).

Neste panorama operacional, visualiza-se ainda a ateno TB no contexto

da assistncia sade, verifica-se que tambm h distribuio de papis entre os

diferentes nveis de ateno. De acordo com o MS, os trs nveis de ateno

(primrio, secundrio e tercirio) tm papel fundamental a desempenhar no controle

da TB no Brasil (BRASIL, 2010b).

A ateno primria sade (APS) se constitui pelo modelo tradicional de

unidades bsicas de sade (UBS), e pelo modelo com enfoque na famlia realizado

pela estratgia de sade da famlia (ESF). Este nvel de ateno deve constituir a

principal porta de entrada do SUS, e a referncia para o atendimento e a criao de

vnculo entre os profissionais de sade e a pessoa com TB, oferecendo ateno ao

grupo familiar. Estas caractersticas do servio esto entre as oito dimenses da

ateno primria sade definidas por Starfield (2004).

No que diz respeito TB, a APS tem a competncia de: realizar a busca

ativa dos sintomticos respiratrios; coletar exames de escarro para o diagnstico e

realizar o encaminhamento, se necessrio, do usurio para a realizao de prova

tuberculnica ou Raio X de trax em servio de referncia; indicar o tratamento

bsico para TB; acompanhar o tratamento atravs da estratgia DOTS; oferecer o

teste anti-HIV a todas as pessoas com TB; realizar o controle dirio dos faltosos;

realizar investigao, controle e orientao dos contatos; realizar vacinao BCG;

encaminhar para o servio de referncia os casos de difcil diagnstico; alm de

responsabilizar-se pelo andamento do tratamento de todos os casos de sua regio

de cobertura, oferecendo apoio ao doente e a sua famlia em relao orientaes

sobre a doena e as condies psicossociais (BRASIL, 2010b).

A partir das aes de descentralizao do controle da TB para a ateno

primria, e a adoo da estratgia DOTS, no ano de 2004, o PNCT brasileiro

reconheceu a importncia de ampliar o combate TB em todos os servios de sade

do SUS (FIGUEIREDO et al, 2009).

48

O nvel secundrio de ateno TB no Brasil constitudo pelos

ambulatrios de referncia, que devem ser determinados pela Pactuao

Programada e Integrada (PPI) entre os municpios. Este acordo visa identificar as

unidades de referncia pela magnitude dos casos, considerando as distncias

geogrficas e a facilidade de acesso. Este servio deve contar com profissionais

capacitados para a conduo dos casos de maior complexidade, incluindo, se

possvel, profissionais da rea de sade mental e do servio social, para oferecer

auxlio pessoa com TB e a sua famlia. O local para a instalao das unidades de

referncia podem ser as policlnicas, os centros de referncias ou os hospitais,

conforme a convenincia para os municpios. Lembrando que, o servio de

referncia deve manter comunicao direta com a APS. Para tanto, devem existir

estmulos e estratgias articuladas pelas coordenaes estaduais, regionais e

municipais, que facilitem este intercmbio, incluindo periodicamente discusso de

casos em reunies clnicas (BRASIL, 2010b).

Nas ltimas dcadas, devido consolidao do tratamento medicamentoso

para a TB, que passou a ser recomendado para nvel ambulatorial, o hospital perdeu

o papel central desempenhado outrora, para o tratamento e isolamento da pessoa

com TB da vida em famlia e sociedade. Sendo assim, ocorreu o direcionamento das

aes prioritrias de controle da TB para a APS e para as unidades ambulatoriais de

referncia, entretanto, o hospital ainda um importante componente da rede de

assistncia TB no Brasil. Mesmo a porta de entrada de eleio sendo a APS,

reconhece-se que nos mdios e grandes centros urbanos o diagnstico , muitas

vezes, realizado nos servios de urgncia e emergncia (Pronto socorro e Hospital

geral) (BRASIL, 2010b).

A relevncia do papel deste servio pode ser vinculada ao fato de atenderem

pacientes com co-morbidades (em particular HIV/AIDS), ou por problemas

organizacionais do sistema de sade, como, entraves no acesso ao diagnstico na

ateno primria a sade, tais como, a demora na realizao dos exames

diagnsticos. Atualmente, a proporo de casos de TB notificados e tratados em

hospitais muito maior do que o esperado em vrias regies do pas (BRASIL,

2010b).

49

Ao olhar para a organizao dos servios de sade na ateno a TB no

Brasil, conclui-se que, independente da existncia de uma porta de entrada de

preferncia para o atendimento TB, todos os nveis de ateno devem estar

preparados para a identificao precoce dos sintomticos respiratrios, para a

adequada conduo dos casos e para a vigilncia epidemiolgica da doena. Esta

inclui aes voltadas para a interrupo da cadeia de transmisso da doena, em

especial no ncleo familiar, j que, trata-se de uma patologia de transmisso

respiratria, a qual favorecida pelo contato prolongado e ntimo com o enfermo

(BRASIL, 2010a).

Alm disso, em estudo realizado na Colmbia por Hurtado et al (2007), foi

revelado que o fato da pessoa com TB ser parte de um grupo familiar no nucleado

considerado como fator de risco para o insucesso do tratamento, o que confirma que

o apoio familiar um aspecto fundamental para a adeso ao tratamento da TB,

assim como, favorece o cumprimento e concluso do mesmo. Logo, a incluso do

familiar no tratamento ao extremamente importante e deve ser estimulada em

todos os casos (OLIVEIRA et al, 2009).

Considerando que a abordagem famlia, na ateno TB, parte da

interveno inicial realizada com a pessoa doente considera-se o modelo

Famlia/indivduo proposto por Ribeiro (2004), o qual caracteriza a famlia, a partir

da percepo da pessoa doente, que o foco real de ateno. A famlia tida como

interventora, apresentando necessidades de orientao e treinamento, j que, tem

deveres e responsabilidades para com a pessoa com TB e possui o poder de

interferir positiva ou negativamente no processo de sade/doena do indivduo. No

caso da TB, o grupo familiar constitudo por potenciais casos novos da patologia,

devido ao elevado risco de adquirirem a doena pelo contato direto e prolongado

com o enfermo. Destarte, necessitam receber ateno direcionada para a deteco

precoce e preveno da doena. Alm de aes educativas que esclaream sobre as

formas de contgio e tratamento, favorecendo a reduo do medo e do estigma do

doente.

Partindo desta viso de famlia, verifica-se a necessidade crescente de

alterar a forma de p