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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS FACULDADEE DE DIREITO DO RECIFE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃOEM DIREITO O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO COMO PROTAGONISTA NO CONTROLE E NA PREVENÇÃO À CORRUPÇÃO NA ADMINISTRÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA. JOSÉ DE RIBAMAR ARAÚJO BARBOSA RECIFE-PE, 2004

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

FACULDADEE DE DIREITO DO RECIFE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃOEM DIREITO

O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO COMO PROTAGONISTA NO CONTROLE E

NA PREVENÇÃO À CORRUPÇÃO NA ADMINISTRÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA.

JOSÉ DE RIBAMAR ARAÚJO BARBOSA

RECIFE-PE, 2004

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Dados Internacionais de Catalogação-na- Publicação(CIP)

(GPT/BC/UFB)

Barbosa José de Ribamar Araújo

M132 O tribunal de conta da união como protagonista no

controle e na prevenção a corrupção na administração pública

brasileira / José Ribamar Araújo Barbosa – Recife, 2004

132 f.

Tese (Mestrado) – Universidade Federal de

Pernambuco / UPIS-DF, 2004.

Bibliografia: f. 129

1. Recurso Administração Publica. 2. Controle e na

prevenção a corrupção / Universidade Federal de Pernambuco

/ UPIS-DF. I Título.

CDU: 34:556.18

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à "Mãe Dindinha", in memorian; Aos meus pais, Raimundo e Toinha. A esta principalmente por ter mandado-me à escola; Ao meu irmão Gilson e à minha cunhada Rosilda, a quem muito devo; À Neusinha, companheira do dia-a-dia; Aos meus filhos Pedro Paulo, Anna Flávia (Maninha), Flávia, e Rodrigo, com carinho de pai.

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AGRADECIMENTOS

Meu agradecimento especial ao Prof. Dr. João Maurício Adeodato, meu orientador, pela dedicação e pela paciência, sem as quais não seria possível esse trabalho; Aos professores Doutores Raimundo Juliano e Jairo Bisol, pela orientação complementar na oportunidade que precisei; A todos os professores do meu mestrado, pelo conhecimento que adquiri; À amiga Josi Leitão, da Pós-Graduação da UFPE, pelo amparo num momento difícil porque passei na minha vida; À amiga Deirilene, da UPIS/DF., por tanta paciência para comigo;

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RESUMO

Corrupção e improbidade administrativa no Brasil são matérias que constituem o

cerne da atuação do TCU, assim como de toda a sorte de Cortes ou Tribunais que

se destinam a combatê-las, seja criando formas instrumentais de prevenção, seja

aplicando cominações administrativas que reparem o dano causado tanto aos cofres

do Estado, o erário, como aos rendimentos do cidadão- Este trabalho trata primeiro

da importância, formação histórica e diversas formas de atuação das Cortes de

Contas de acordo com os países aqui sumariamente abordados. Em seguida,

explora como a corrupção e a improbidade administrativa acontecem, sempre com

vistas ao que a literatura especializada relata, sobretudo versando sobre o que se

cristalizou nesta mesma literatura sobre a Administração Pública. Neste diapasão,

exploram-se os conceitos de moralidade, de improbidade e a distinção entre eles; os

atos administrativos e suas ramificações no que tange ao efeito que causam no

âmbito da Administração Pública. Ulteriormente, explora-se a vasta gama de

princípios que norteia o universo epistemológico desta matéria: a corrupção na

Administração Pública e sua relação com o Poder. Por fim, volta-se ao principal

deste trabalho, que é a atuação do TCU frente à improbidade, à imoralidade e à

corrupção no seio da Administração Pública, frente a tudo o que até aí se colocou

extraído da literatura idônea, concluindo que, um dos obstáculos a um maior

sucesso na luta do TCU contra a corrupção é sopesada na forma de escolha de

seus ministros, nomeados por critérios eminentemente políticos, resultando na

castração da autonomia dos mesmos enquanto ministros motivada, principalmente,

pela necessidade de retribuir o favor da nomeação.

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ABSTRACT Corruption and administrative improbity in Brazil are subjects that constitute the

heant of the TCU (Federal Audit Office), as wellas all sorts of Conrts and Tribunals

That delicate Themselves to combat them, creating instrumental forms of prevention

or employing administrative comminations to repare the lamage caused to the public

surge or to tre citizens. This paper treats first the importance, the historic formation

and her forms of actuation of audit offices inaccordance with the countries heve

related. Secondary, explores how corruption and administrative improbity happen,

always sighting to what the specialized literature relates, abore all what has been

cristalized on this literature about Public Administration. The conception of morality

and improbity and the destination between them were explored; the administrative

acts and their ramification and the effects they cause in the splen of action of the

Public Administration were also explored. ulteriorly, were explored the extensive

range of principles that guide the epistemologic universe of this subject: e corruption

and the improbity in the Public Administration. Finally, we rethanc to the aim of this

paper that is the actuation of the TCU to face improbity, imorality and corruption in

the midst of Public Administration, to face everything that was so far extracted of the

idoneons literature, concluding that, to have a more respectuons tratament with the

Public resources, with the punishment of the dishonest, it is necessary to change the

organic haw of the TCU in some points suggested in the conclusion of this paper and

also that the mass media has the fundamental role to the awakening of the citizen to

the public purse.

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................10

CAPITULO I -TRIBUNAIS DE CONTAS: GÉNESE HISTÓRICA..............................12

CAPITULO II – CORTES DE CONTAS DE OUTROS PAÍSES E DO BRASIL .........16

2.1 Corte de Contas francesa.................................................................................16

2.2 Corte de Contas italiana ...................................................................................17

2.3 Corte de Contas belga......................................................................................18

2.4 Tribunal de Contas português ..........................................................................19

2.5 Tribunal de Contas Angolano ...........................................................................20

2.6 Tribunal de Contas Moçambicano....................................................................20

2.7 O Tribunal de Contas da União (Brasil)............................................................21

2.7.1 Antecedentes históricos ................................................................................21

2.7.2 O TCU na Constituição de 1988....................................................................28

2.7.3 Do controle como meio de fiscalização .........................................................29

2.7.3.1 Do controle interno .....................................................................................33

2.7.3.2 Do controle externo ....................................................................................36

CAPÍTULO III A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA: SUJEITOS, ATOS DE IMPROBIDADE E SANÇÕES ...............41

3.1 Introdução ........................................................................................................41

3.2 O conceito de improbidade administrativa........................................................45

3.3 A distinção entre improbidade e imoralidade administrativa.............................48

3.4 Sujeitos da improbidade administrativa ............................................................50

3.4.1 Sujeito ativo...................................................................................................50

3.4.2 Sujeito passivo ..............................................................................................55

3.5 Atos de improbidade.........................................................................................57

3.6 Sanções ...........................................................................................................79

CAPÍTULO IV – A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS PRINCÍPIOS

CONSTITUCIONAIS .................................................................................................83

4.1 Introdução ........................................................................................................83

4.2 Princípios constitucionais de acordo com a EC 19/98 .....................................84

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4.3 Princípios constitucionais explícitos .................................................................86

4.3.1 Princípio da impessoalidade .........................................................................88

4.3.2 Princípio da moralidade ................................................................................90

4.3.3 Princípio da publicidade ................................................................................93

4.3.4 Princípio da eficiência ...................................................................................97

4.4 Outros princípios explícitos ...........................................................................100

4.4.1 Princípio da licitação ...................................................................................100

4.4.2 Princípio da responsabilidade .....................................................................102

4.4.3 Princípio da participação.............................................................................104

4.4.4 Princípio da autonomia gerencial ................................................................104

4.5 Princípios constitucionais implícitos ...............................................................106

4.5.1 Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado ...................106

4.5.2 Princípio da finalidade.................................................................................108

4.5.3 Princípio da razoabilidade e da proporcionalidade .....................................109

CAPITULO V – A LÓGICA DO PODER..................................................................112

5.1 “AUCTORITAS:” Uma invenção romana: a separação romana entre poder

(potestas) e autoridade (auctoritas).........................................................................112

5.2 SOBERANIA E VALIDADE NORMATIVA: A construção do Poder no Estado de

Direito......................................................................................................................117

5.3 PODER, CORRUPÇÃO E PUBLICIDADE: o mito do anel de GIGES ..............120

CAPÍTULO VI – O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO COMO PROTAGONISTA

NO CONTROLE E NA PREVENÇÃO À CORRUPÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO

PÚBLICA BRASILEIRA...........................................................................................123

6.1 Instrumentos à disposição do TCU para controle e prevenção da corrupção no

Brasil .......................................................................................................................123

6.1.1 Função fiscalizadora....................................................................................123

6.1.2 Função judicante ........................................................................................124

6.1.3 Função sancionadora ..................................................................................125

CONCLUSÃO..........................................................................................................126

BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................129

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INTRODUÇÃO

A corrupção, definida como a apropriação ilegal de recursos públicos para

fins privados, é um problema imanente ao exercício do poder. O Brasil convive lado

a lado com esse problema desde o seu descobrimento. Ela se dá de várias

maneiras. A mais tradicional é na forma de celebração de contratos administrativos,

entre o Poder Público e a iniciativa privada para contratação de obras e serviços

públicos. Esses contratos são celebrados em duas fases: na primeira fase, o

contrato é discutido com base num “ganho comparativo” entre os concorrentes,

medido ainda na fase da concorrência pública, quando são definidas as

necessidades de bens e serviços pelos órgãos governamentais; a segunda fase está

associada às diferentes etapas da execução dos contratos, quando da “fabricação”

da necessidade de aditivar aqueles contratos para reajustar preços e serviços

contratados, é a chamada fase da “corrupção iterativa”.

As articulações feitas entre representantes governamentais e da iniciativa

privada para a tomada de decisões com o fim de elaborar critérios de licitação

pública, assim como a da decisão de aditivar os contratos para reajustá-los

monetariamente, não é uma ação de cunho público. As decisões são tomadas com o

envolvimento de poucas pessoas, num círculo informal de Poder paralelo ao do

Poder Público formal, como bem ilustra o professor Augustin Gordillo, “in” La

Administration paralela. ““la existência de una organización administrativa formal y

otra distinta Informal”1 ( a existência de uma organização administrativa formal e

outra distinta informal). As decisões não são tornadas públicas, de nada é dado

publicidade é o chamado “lado invisível das decisões da administração pública”

semelhante ao mito platônico do “anel de Giges”2 condenável por contrariar o

1 GORDILLO, Agustín A. La administración paralela, España: Civitas, 1995, pág. 37. 2 Era ele um pastor que servia em casa do que era então soberano da Lídia. Devido a uma grande tempestade e tremor de terra, rasgou-se o solo e abriu-se uma fenda no local onde ele apascentava o rebanho. Admirado ao ver tal coisa, desceu por lá e contemplou, entre outras maravilhas que para aí fantasiam, um cavalo de bronze, oco, com umas aberturas,espreitando através das quais viu lá dentro um cadáver, aparentemente maior do que um homem, e que não tinha mais nada senão um anel de outro na mão. Arrancou-lhe ed saiu. Ora, como os pastores se tivessem reunido, da maneira habitual, a fim de comunicarem ao rei, todos os meses, o que dizia respeito aos rebanhos, Giges foi lá também, com o seu anel. Estando ele, pois, sentado no meio dos outros, deu por acaso uma volta ao engaste do anel para dentro, em direção à parte interna da mão, e, ao fazer isso, tornou-se invisível para os que estavam ao lado, os quais falavam dele como se se estivesse ido embora. Admirado, passou de novo a mão pelo anel e virou para fora o engaste. Assim que o fez, tornou-se invisível. Tendo observado estes fatos, experimentou, a ver se o anel tinha aquele poder, e verificou que, se voltasse o engaste para dentro, se tornava invisível; se voltasse para fora, ficava visível. Assim senhor de si, logo fez com que fosse um dos delegados que iam junto do rei. Uma vez lá chegando, seduziu a mulher do soberano, e com o auxílio dela, atacou-o e matou-o, e assim se tomou o poder. (PLATÃO. A República (tradução de Pietro Nassetti), São Paulo: Editora Martin Claret, 2004.)

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princípio da publicidade, um dos pilares princípios da administração pública.

Em outro diapasão, para monitorar a lisura dessas relações são criados

os instrumentos de controle e fiscalização dos atos públicos, como os Tribunais de

Contas, mas nem sempre com resultados a evitar o desvio do dinheiro público, por

variados motivos, entre os quais o controle de quem decide nesses órgãos.

Esse controle se dá de várias formas, a mais notória é a da escolha

dessas pessoas para ocuparem os cargos de ministro do órgão fiscalizador. Feita

por indicação política, essa escolha recai, sobre pessoas de confiança daqueles que

vão ser fiscalizados, o que muito prejuízo tem trazido à luta pelo combate à

corrupção no País.

O presente trabalho pretende mostrar o papel do Tribunal de Contas da

União nesse contexto. O trabalho foi desenvolvido em seis capítulos: O primeiro, fala

sobre a gênese histórica dos Tribunais de Contas, como eles surgiram;

O segundo capítulo traz um pouco da história dos Tribunais de Contas em

outros países; incluindo o nosso Tribunal de Contas da União e seus antecedentes

históricos.

O terceiro capítulo aborda a Administração Pública e a Improbidade

Administrativa: seus sujeitos, atos e sanções;

O quarto capítulo fala da Administração Pública e seus princípios

constitucionais.

O quinto capítulo traz à baila uma discussão cobre a lógica do Poder,

destacando o papel de Roma neste sentido, procurando estudar a relação do Poder

com a Corrupção.

O sexto e último capítulo fala sobre aos instrumentos administrativos à

disposição do Tribunal de Contas da União para a luta contra a corrupção no País.

O trabalho baseia-se em pesquisa bibliográfica, sem, contudo, deixar de mostrar a

fragilidade com que atua o TCU, por força da maneira pela qual seus ministros são

escolhidos para aquela Corte de Contas.

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CAPITULO I

TRIBUNAIS DE CONTAS: GÊNESE HISTÓRICA

A necessidade de controle dos gastos públicos é antiga. Surgiu com a

evolução do próprio homem inserido numa comunidade, regrada por uma entidade

supra-humana, entidade esta entendida como Estado, embora a concepção de

Estado como a conhecemos hoje guarde mais semelhanças com o poder superior

advindo das Revoluções Francesa e Americana.

Enfim, dos primeiros grupos sociais evoluímos para comunidades

baseadas em relações de troca. Com o fim de regular essas relações surgiu o

mercado e a partir deste surgiram os governos, que passaram a funcionar como

mediadores das relações entre os diversos mercados, impondo-lhes critérios, regras

e limites preestabelecidos, como forma de garantir proteção ao próprio mercado e à

comunidade.

Posteriormente, com a maior intensidade da intervenção dos governos na

vida e nas finanças privadas, surgiu a necessidade do estabelecimento de formas de

fiscalização e controle dos atos dos governos e das despesas por ele efetuadas,

tendo sido tais mecanismos de controle adotados, em escalas e tempos diferentes

por diversos povos, dependendo do grau de relacionamento existente entre

governantes e governados, sem dúvida precedidos por muitas lutas e conflitos.

Dentro desta visão simplificada do processo evolutivo, importa-nos

vislumbrar o marco inicial da idéia de se construir organismos específicos, voltados

para o controle dos gastos públicos. A história universal registra que os povos, há

muitos séculos, custeiam as despesas públicas mediante lançamento e arrecadação

de impostos, cabendo, desde o princípio, ao auferidor das rendas públicas, a

obrigação de prestar contas do montante arrecadado e daquilo que foi gasto.

No intuito de divisar ao longo dos milênios o princípio dessa forma de

controle, é possível vislumbrar na antiguidade atividades dessa natureza. Por volta

de 3.200 a. C., o rei Menés, do Alto Egito, unificou as coroas dos dois reinos

existentes: o Reino do Sul, lugar do monarca, cuja capital era a cidade de

Hieracômpolis; e o Reino do Norte, com a capital na cidade de Buto.

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A partir dessa data, o Egito transformou-se num só império e passou a ter um

governo fortemente centralizado, em que todos os poderes locais se submetiam ao

poder central absoluto, exercido pelo imperador.

Em razão da força política que possuía, o imperador passou-se a chamar

Faraó Menés I do Egito, adotando uma dura política centrada na cobrança de

impostos, retirando dos camponeses- todos os excedentes agrícolas e submetendo-

os como escravos. Além desse imposto coletivo, esses homens deviam serviços ao

Faraó, trabalhando na abertura de canais de irrigação, na construção de represas,

templos, palácios e pirâmides, recebendo como pagamento apenas o alimento

diário.

Para fiscalizar o cumprimento dessas atividades, existia uma classe de

funcionários públicos, os escribas, pessoas muito cultas que supervisionavam toda a

administração pública, responsabilizando-se pela cobrança de impostos.

"Procurando o embrionário desta atividade, referências históricas

semelhantes do Faraó podem ser encontradas no Código Indiano de Manu, no

Eclesiastes do Rei Salomão, nos escritos romanos de Plínio e de Cícero”3.

Na lendária Grécia, em particular na cidade-Estado Atenas, berço da

democracia política há mais de dois mil anos, encontra-se vestígio do Tribunal de

Contas, quando os tesoureiros (hellenotamiai), eleitos pelo sistema de participação

de poder baseado na riqueza dos cidadãos (Eclésia), em torno de dez, reuniam-se

para prestar contas do dinheiro recebido.

Após a prestação de contas pelos hellenotamiai, as mesmas eram

gravadas em pedras para exame e aprovação dos cidadãos gregos reunidos em

assembléia.

Na Inglaterra, antes mesmo da Constituição de 1215, já se fazia presente

o Tribunal de Justiça Financeiro, conhecido por Exchenger e composto de senhores

feudais, que se encarregavam de separar as operações de contabilidade daquelas

referentes ao administrativo judiciário.

Mesmo antes do aparecimento do Exchenger, moderno para a época, já

havia sinais de controle de contas públicas, baseado em codificações mais antigas

como as institutas justinianas, as pandectas e a própria Carta Magna inglesa.

3 ARAÚJO, Marcos Valério de. O Tribunal de Contas da União e a República: uma análise histórica de causas e efeitos, Brasília: Editora do TCU, Brasília, 1990, p. 67.

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Posteriormente coube aos Reis, em substituição aos senhores feudais,

monopolizar o exercício do controle financeiro dos seus respectivos Estados e

Reinos.

A Câmara de Contas do Império Austríaco, por exemplo, foi criada em

1661, com atribuições ampliadas em 1781, pelo Imperador José II, para permitir a

fiscalização geral das contas do Estado.

O Rei Frederico I, da Prússia, criou a Câmara Superior de Contas em

1714, mas com competência, naquela época, limitada à revisão das contas dos

administradores. Em 1823 foi-lhe ampliado os poderes com a autonomia de

fiscalização geral das contas do Estado. Somente em 1874, foi-lhe concedido

poderes de Tribunal Judicante, passando a denominar-se Corte de Contas do

Império da Alemanha.

Com adaptação da legislação francesa, a Romênia criou sua Corte de

Contas em 1864.

Na França, no reinado de Luis IX, foi criada a Câmara de Contas, com o

nome de Chambre de Comptes, na época equivaleria aos atuais tribunais de contas.

O poder do Chambre de Comptes se estendia sobre todo o complexo

administrativo do Estado.

O Chambre de Comptes era tão rigoroso no controle do dinheiro público

que chegou a sentenciar à morte diversos fraudadores do Rei. As sentenças eram

executadas no próprio pátio do prédio onde funcionava o Chambre de comptes.

A conscientização crítica social teve grande importância na pressão pela

limitação do chamado “Direito Divino dos Reis.”

O surgimento e o fortalecimento dos parlamentos impulsionou a criação

de leis orçamentárias impondo aos Reis de cada País limites na arrecadação e nos

gastos dos recursos públicos como também rigor na fiscalização desses gastos pelo

legislativo.

Extinto o poder absolutista do Rei pela revolução francesa de 1789, este

importante e histórico fato político também suprimiu a existência da Câmara de

Contas daquele País, transferindo suas atribuições para a Assembléia Constituinte.

Só mais tarde veio a ser criado o atual Tribunal de Contas francês com atribuições

de controle jurídico das contas públicas.

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Para Bernardo Rocha Siqueira, “o princípio do surgimento dos

mencionados tribunais de contas, segundo a estrutura adotada em cada País, deve-

se, basicamente, a dois fatores: ao desenvolvimento da vida em sociedade e à

presença cada vez mais marcante do Estado, como elemento arrecadador e

distribuidor de recursos públicos, sob as formas de impostos ou de serviços

sociais”4.

Para ele,

“Concomitantemente àqueles dois fatos, houve

também a instituição de regimes democráticos

de direito, decorrentes de uma maior liberdade

e consciência social crítica, através das quais

os cidadãos pagadores de impostos desejavam

cada vez mais acompanhar e fiscalizar os atos

dos seus dirigentes, com o escopo de

certificarem a boa aplicação ou não do que era

arrecadado pelos seus respectivos chefes de

Estado.”5

4 SIQUEIRA, Bernardo Rocha. O Tribunal de Contas da União de ontem e de hoje, Brasília: Editora do TCU, 1998, p. 146 5 Idem, p. 146

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CAPITULO II

CORTES DE CONTAS DE OUTROS PAÍSES E DO BRASIL

SUMÁRIO: 2.1 CORTE DE CONTAS FRANCESA 2.2 CORTE DE CONTAS ITALIANA 2.3 CORTE DE CONTAS BELGA 2.4 TRIBUNAL DE CONTAS PORTUGUÊS 2.5 TRIBUNAL DE CONTAS ANGOLANO 2.6 TRIBUNAL DE CONTAS MOÇAMBICANO 2.7 TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (BRASIL) 2.7.1 ANTECEDENTES HISTÓRICOS 2.7.2 O TCU NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 2.7.3 DO CONTROLE COMO MEIO DE FISCALIZAÇÃO 2.7.3.1 DO CONTROLE INTERNO 2.7.3.2 DO CONTROLE EXTERNO

2.1 Corte de Contas francesa

Criada em 1807, a Cour des Comptes francesa, como é conhecida, tem

poderes jurisdicional e administrativo sobre os contadores e responsáveis pela

administração do dinheiro público.

As funções jurisdicional e administrativa da Corte são exercidas por suas

Câmaras, em número de sete, cabendo, de suas decisões, recurso ao Conselho de

Estado.

Em 1948, foi criado a Comissão de Verificação de Contas das Empresas

Públicas. É constituída de Magistrados indicados pelo Ministro da Economia e

Finanças

Jorge Ulisses, referindo-se à Corte de Contas francesa, averba: “logo, no

âmbito do sistema dual de jurisdição desse País, inequivocamente a Corte de

Contas tem função jurisdicional, com o exato sentido do termo: tem poder de dizer o

direito.

Na França, a fiscalização dos gastos é feita à “posteriori”. É citada, na

obra de Jorge Ulisses, como boa gestora dos recursos públicos.6

6 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência, Belo Horizonte: Editora Fórum, 2003, p. 149.

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É oportuno observar que as decisões finais da Corte de Contas francesa

são passíveis de revisão pelo Conselho de Estado, assim como o são as decisões

dos Tribunais Administrativos daquele País.

Se as decisões daquele Tribunal de Contas são passíveis de revisão por

uma instância superior, não há, então, que falar em autonomia em suas decisões.

2.2 Corte de Contas italiana

A exemplo da Corte de Contas francesa, a italiana é uma das mais

antigas Corte de Contas. Foi instituída por lei em 14 de agosto de 1862. Figura na

Constituição com jurisdição expressa no que tange à contabilidade pública.

Por disposição constitucional a Corte de Contas italiana funciona como

órgão auxiliar do Poder Executivo (Conselho de Ministros) da Itália.

A Corte de Contas italiana tem o poder de vetar a despesa antes que a

mesma seja realizada. Como forma de controle, o veto pode se dar tanto de forma

relativa como absoluta, suspendendo ou proibindo o ato submetido ao controle, no

entanto o veto pode ser cassado por recurso ao Poder Judiciário, com fulcro no

artigo III, da Carta Política.

Odete Medauar sustenta a existência de função jurisdicional na Itália,

exercida pelo Tribunal de Contas em caráter especial:

“Além do controle sucessivo geral, a Corte de

Contas exerce controle sucessivo especial

sobre atos dos agentes contábeis. Nessa

função a Corte de Contas tem natureza

jurisdicional, sendo estudada pela doutrina com

jurisdição administrativa especial. De acordo

com ALESSI, nessa matéria a jurisdição da

Corte de Contas é exclusiva, plena e

inquisitória (sindicatória); exclusiva, no sentido

de que lhe cabe apreciar todas as questões

nas matérias de sua competência, o que exclui

desse âmbito qualquer outra autoridade

jurisdicional, de modo particular à autoridade

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judiciária ordinária e o Conselho de Estado;

por orientação jurisprudencial conhecem, além

das questões principais expressamente

atribuídas, todas as questões prejudiciais ou

incidentais; é plena porque nas matérias de sua

competência conhece questões de direito e de

fato e porque pode pronunciar decisões

declaratórias, constitutivas e de condenação; é

inquisitorial (“sindicatória”) porque não vincula a

decisões administrativas, nem a argumentos

invocados pelas partes.”7

Na Itália, a fiscalização dos gastos públicos pela Corte de Contas é feita

“a priori”, antes que a despesa se realize e “a posteriori”, após sua realização.

2.3 Corte de Contas belga

A Corte de Contas belga foi elevada a status constitucional em fevereiro

de 1883. Com atuação administrativa e jurisdicional, suas decisões somente são

revistas em casos extremos e pela Corte de Cassação.

Dentre as Cortes de Contas européia, a da Bélgica é a que goza de maior

autonomia em suas decisões, estas só podem ser cassadas em casos extremos e

pela Corte de Cassação daquele País.

O Modus operandi é o de exame prévio na forma de “visto” de todas as

despesas.

Caso o Tribunal desautorize o “visto” para empenhar a despesa, antes do

recurso à Corte de Cassação, cabe pedido de reapreciação do pedido de

autorização da despesa ao Conselho de Ministros daquela Corte de Contas.

Aceitando a despesa a Corte de Contas registra sua decisão “sob

reserva”.

7 MEDAUAR, Odete. Controle da administração pública pelo Tribunal de Contas. Revista de informação legislativa, Brasília, DF, ano 27, nº 108, p. 125-126, out/dez, 1990.

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19

Leciona Eduardo Lobo Botelho Gualazzi:

“no âmbito da Corte de Contas belga, é

prevista a aposição de visto com reserva,

mediante procedimento análogo àquele

previsto para a Corte de Contas da Itália;

porém, na há previsão de casos de recusa

absoluta de registro: a denúncia ao Parlamento

sobre os motivos de recusa advém

imediatamente, para subseqüente juízo político

sobre as operações contábeis do Governo”8.

Os responsáveis pelo manuseio dos recursos públicos na Bélgica são

chamados de “contadores públicos” e sobre os mesmos é exercido, pela Corte de

Contas belga, um forte controle.

2.4 Tribunal de Contas português

Em 1975, aconteceu em Portugal a revolução dos cravos. Movimento

político-militar comandado por jovens oficiais (tenentes) do exército Português.

Com a revolução, nova Constituição foi outorgada àquele País, trazendo

profundas mudanças na estrutura judiciária interna inclusive quanto ao Tribunal de

Contas, um dos mais antigos Tribunais dessa natureza da Europa.

A Constituição portuguesa de 1976 dotou o Tribunal de Contas de

Portugal de independência e superioridade em suas decisões, integrando-o ao

aparelho judiciário superior nacional.

A fiscalização dos gastos públicos de Portugal é feita à “priori” e à

“posteriori”.

A instância máxima da Justiça portuguesa é o Tribunal Constitucional, que

cuida do controle constitucional do País.

8 GUALAZZI, Eduardo Lobo Botelho. Regime Jurídico dos Tribunais de Contas, São Paulo: RT 1992, p. 124.

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20

Das decisões do Tribunal de Contas Português cabe recurso apenas para

aquela Suprema Corte.

O Tribunal de Contas Português tem poderes jurisdicionais. A Lei n°

98/97, de 26 de agosto, consagra o tribunal como instituição suprema de controle,

atuando de forma coordenada e integrado com os outros tribunais.

A nomeação dos ministros para o Tribunal de Contas português é feita da

seguinte forma: são abertas inscrições para um concurso de títulos, com critérios

previamente definidos, julgados por uma comissão que forma lista tríplice e

submetida a escolha ao poder executivo.

2.5 Tribunal de Contas angolano

Angola foi um dos países que mais atrasou na criação de um Tribunal de

Contas com caráter de Tribunal de Contas. Existia, antes, o Tribunal Administrativo,

Fiscal e de Contas, originário do período colonial, extinto logo após a declaração de

independência do País, em 11 de novembro de 1975.

Criado em 1996 pela Lei nº 5/96 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas),

dispõe de poder de fiscalização prévia, semelhante ao Tribunal de Contas

português.

O artigo 8º nº 6, da Lei Orgânica daquele Tribunal prescreve que nenhum

ato ou contrato sujeito à fiscalização preventiva pode produzir efeitos ou ser

executado sem que tenha sido vistado.

2.6 Tribunal de Contas moçambicano

A República de Moçambique, mesmo após sua independência de

Portugal, manteve o Tribunal Administrativo, Fiscal e de Contas, criado pelo Decreto

nº 12499-B, de 04.10.1926.

Embora com atividade mínima na área de contas, máxime, por carência

de magistrados e de contabilistas, aquele Tribunal tem jurisdição administrativa,

fiscal e aduaneira e financeira.

A fiscalização é prévia competindo àquele Tribunal apreciar, de acordo

com a lei, os atos e contratos da administração pública, cabendo recurso de suas

decisões apenas para o próprio Tribunal, embora em instâncias diversas.

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21

2.7 O Tribunal de Contas da União (Brasil)

2.7.1 Antecedentes históricos

Com a proclamação da República, em 1889, Rui Barbosa foi convidado

pelo presidente da república Marechal Deodoro da Fonseca para exercer a pasta da

Fazenda no Governo Provisório. Poucos dias após aquele importante fato político,

como forma de acelerar a organização constitucional do país, o chefe do governo

provisório baixou o Decreto n° 29, de 3 de dezembro de 1889, nomeando uma

comissão de cinco membros para elaborar o projeto de uma nova constituição.

No ano seguinte, 1890, muitas mudanças marcaram o governo do

Marechal Deodoro. Reformas de toda ordem se faziam necessárias em face da

mudança de regime por que passava o país. Considerando a responsabilidade do

momento que enfrentava o Governo Provisório, e em face da transformação

processada na organização política e administrativa do País, Rui Barbosa julgou

oportuno reacender as esperanças de dotar a nação de um Tribunal de Contas

independente.

Com o propósito de dotar o país desse novo órgão, Rui Barbosa abraçou

as idéias preexistentes da criação de um Tribunal de Contas como controlador da

gestão financeira do Governo e foi buscar inspiração no projeto de Manoel Alves

Branco, elaborado em 1845, para apresentar o seu próprio projeto, por entender

que, sem a colaboração de um Tribunal de Contas, seria inóqua a supervisão

parlamentar das contas públicas prevista na nova Constituição.

Artur Adolfo Cotias Silva, registra ter declarado Rui Barbosa, em

exposição de motivos:

“ ( . . ) corpo de magistratura intermediário à

administração e à legislatura, que, colocado em

posição autônoma, com atribuições de revisão

e julgamento, cercado de garantias contra

quaisquer ameaças, possa exercer as suas

funções vitais no organismo constitucional, sem

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22

risco de converter-se em instituição de

ornamento aparatoso e inútil.”9

Discorrendo sobre os tipos e fiscalização existentes nos diversos países

que haviam adotado o princípio de Tribunal de Contas, expôs Rui Barbosa sobre

possibilidade de nos mirarmos em dois modelos: o francês e o italiano, sendo o

primeiro de alcance mais restrito, posto que sua fiscalização se limitava a impedir

que as despesas fossem ordenadas, ou pagas, além do valor consignado no

orçamento. Defendeu a adoção do modelo italiano, cujo controle se revelava bem

mais rigoroso que o francês, antecipando-se ao abuso, atalhando em sua origem os

atos do Poder Executivo suscetível de gerar despesa ilegal.

Nos moldes acima descritos, Rui Barbosa abriu o caminho para a criação

do Tribunal de Contas, através do Decreto n° 966-A, de 07 de novembro de 1890,

com atribuições de revisão de julgamento das contas dos responsáveis. Esse feito

despontou na época como a obra maior dentro do processo de reorganização do

Ministério da Fazenda.

O objetivo maior da criação do Tribunal de Contas por Rui Barbosa não

era nem tanto o de fiscalizar a honorabilidade dos agentes públicos, mas o de

garantir a verdade orçamentária e o permanente equilíbrio financeiro, tanto é que,

uma das propostas era a de fiscalização das despesas pelo sistema de registro

prévio, segundo o qual, todas as operações relacionadas com a receita e a despesa

da União, para ser feita, deveria passar por esse registro para evitar déficit nas

contas do Governo.

Não era uma matéria pacífica. Entre aqueles que discutiam a criação do

Tribunal de Contas, Tristão Alencar de Araripe, então sucessor de Rui Barbosa no

Ministério da Fazenda, era o mais polêmico quanto a matéria.

Alfredo Buzaid registrou a polêmica:

“Cotejando o Decreto 966-A com o artigo 89 da

Constituição, discordara da fiscalização prévia,

9 BARBOSA, Rui, Apud, SILVA, Artur Adolfo Cotias e. O Tribunal de Contas da União na História do Brasil: evolução histórica, política e Administrativa (1890-1998), Brasília: Editora do TCU, 1998, p. 449.

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23

declarando que o legislador constituinte parecia

ter-se inclinado ao sistema francês

(fiscalização a posteriori), afastando-se da

escola que exige o exame prévio da

autorização ministerial, pois não se encontrava

tal exigência nos termos da disposição citada

na Constituição, mas sim a de serem as contas

julgadas antes de prestadas ao Congresso”10

A intenção do Ministro Rui Barbosa, ao defender a proposta de exame

prévio das despesas, era o de controlar os gastos públicos, já que havia descontrole

e abusos quanto aos mesmos.

Proposta mais radical defendera o então ministro da fazenda do segundo

Império em 1840, Manoel Alves Branco, ao defender, já naquela época, a criação de

uma Corte de Contas. Inspirado em modelo europeu, o Ministro Manoel Alves

defendia a idéia de que as contas deveriam ser julgadas anualmente e aquelas que

apresentassem abusos, seus responsáveis deveriam ser presos.

A proposta do Ministro Manoel Alves caiu no esquecimento na Câmara

dos Deputados do Império.

Coube a Serzedello Correia, nomeado Ministro da Fazenda em abril de

1892, referendar a regulamentação provisória do dispositivo constitucional que

criava, no Brasil, o Tribunal de Contas, no que foi feito pelo Decreto 1.166, de 17 de

dezembro daquele ano.

Com a escolha, pelo próprio Serzedello, dos membros que integrariam o

recém-criado órgão, este promoveu a instalação do Tribunal de Contas a 17 de

janeiro de 1893, às 11:00 horas da manhã, no Rio de Janeiro.

A primeira direção do Tribunal de Contas ficou assim constituída:

Presidente, o ex-senador paranaense do Império, bacharel em letras e direito,

Manoel Francisco Correa; Diretores: José da Cunha Valle, bacharel em direito;

Francisco Augusto de Lima e Silva, ex-conselheiro do Império; José Ignácio Ewerton

de Almeida, ex-diretor do Tesouro Nacional. Representando o Ministério Público

10 BUZAID, Alfredo. O Tribunal de Contas no Brasil, Revista da Faculdade de Direito, São Paulo, nº 62, pp 37-62, 1967.

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junto ao Tribunal de Contas, Dídimo Agapito da Veiga Júnior, ex-procurador-fiscal e

diretor do Tesouro Nacional.

A primeira participação ativa do Tribunal no controle dos gastos públicos

se deu na segunda sessão após a instalação daquele órgão. Naquela sessão foi

negado registro a dois pedidos de verba constantes do aviso expedido em 19 de

janeiro pelo Ministério da Guerra, um deles por falta de crédito e o outro por ser

superior à quantias legislativamente concedida para tal verba. O controle exercido

era a priori como queria Rui Barbosa, copiando o modelo italiano.

Por essas decisões o Tribunal sofreu fortes pressões por incomodar e dar

um freio nos atos do governo da época. Pela primeira vez havia um órgão fazendo

respeitar o orçamento, limitando as realizações das despesas. Para que os contratos

tivessem validade, os mesmos precisavam do visto do Tribunal.

O novo Tribunal começou a sofrer pressão a menos de três meses de sua

instalação, em abril de 1893, a partir de um episódio envolvendo o então vice-

presidente da República, Floriano Peixoto. Assim conta Artur Adolfo Cotias e Silva:

“O vice-presidente Floriano Peixoto determinou

a seu ministro da Viação, Limpo de Abreu, que

nomeasse um cidadão, Pedro Paulino da

Fonseca, irmão de seu antecessor, o marechal

Deodoro da Fonseca, pagando-lhe um conto de

réis por mês. Findo o primeiro mês, Limpo de

Abreu mandou que lhe pagassem o vencimento

e o Tribunal de Contas, reputando o ato como

ilegal, por ausência de dotação orçamentária,

negou-lhe o registro, devolvendo o aviso ao

ministro da Viação.

O acontecimento, chegando ao conhecimento

de Floriano Peixoto por despacho de Limpo de

Abreu, desagradou profundamente ao vice-

presidente, que comentou: “são coisas do meu

amigo ministro da Fazenda, que criou um

tribunal superior a mim. Precisamos reformá-

lo”.

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Dito isso, mandou chamar seu ministro da

Fazenda, Serzedello Corrêa, e o interpelou

sobre se já havia no país quem mandasse mais

do que ele, em alusão ao Tribunal. O ministro

da fazenda respondeu-lhe com tranquilidade:

“Não. Superior a V. Exª., não. Quando V. Exª.,

está dentro da lei e da Constituição, o Tribunal

cumpre suas ordens. Quando V. Exª., está fora

da lei e da Constituição, o Tribunal lhe é

superior. Reformá-lo não podemos. O meu

colega não podia criar lugar para dar a Pedro

Paulino. Só o Congresso poderia fazê-lo.

Portanto, o que realizou foi legal.”

Passados oito dias, Floriano, não satisfeito com

a atitude, elaborou e enviou ao ministro da

Fazenda, minuta de decretos reformando o

Tribunal, acompanhada de lacônico bilhete:

“Mande fazer e traga, que quero assinar

amanhã.”. A reforma pretendida modificava,

basicamente, o sistema de registro, impondo

ao Tribunal a figura do registro sob protesto.”11

Como se verifica, o Tribunal de Contas não foi criado para cuidar do

problema da corrupção no Brasil, que já existia naquela época, mas para manter um

controle sobre os gastos públicos do País.

A primeira reforma visando atingir o Tribunal de Contas foi promovida no

ano de 1896. Por ela, foi aprovado o novo regulamento do Tribunal, diminuindo para

quatro o número de membros, tornando o representante do Ministério Público

demissível ad nutum e retirando do mesmo o direito de voto.

Na mesma reforma foi conferida ao Tribunal atribuição para examinar os

atos atinentes à arrecadação de impostos e taxas, geradores de receita pública.

11 SILVA, Artur Adolfo Cotias e. O Tribunal de Contas da União na História do Brasil: Evolução histórica, política e administrativa (1890-1998), Brasília: Editora do TCU, 1998, p. 47

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26

Em 1911, estando presidindo o Tribunal a pessoa de Dídimo Agapito,

aquele órgão passou por nova regulamentação. Sob o pálio do Decreto nº 2.511, as

contas do governo, antes de serem enviadas ao Congresso para avaliação, teriam,

por força do Decreto 2.511, que sujeitar-se a um parecer prévio emitido pelo Tribunal

de Contas.

Em 1917, O Tribunal foi agraciado com o Decreto Legislativo nº 3.421.

Seus membros ganharam o status de ministro, medida que reforçava a autoridade

das decisões da Corte.

Em 1918, na chamada Reforma Venceslau Brás, pelo Decreto 3.454, de 6

de janeiro daquele ano, foram criadas duas Câmaras, uma voltada aos atos de

fiscalização financeira e outra às tomadas de contas.

Começava aí uma mudança de filosofia para a qual foi criado o Tribunal.

Se no início o mesmo tinha por função controlar previamente os gastos públicos do

governo, já agora alargava as atribuições do Tribunal para as funções de fiscalizar

as aplicações desses gastos.

As duas Câmaras não tiveram tanta duração. A Lei 4.632, de 6 de janeiro

de 1923, as extinguiu, passando, a Corte, a deliberar com a maioria de seus

membros.

Com a revolução de 1930, a chamada revolução getulista, a Constituição

de 1891, foi substituída por uma lei de organização do Governo Provisório. O

Tribunal de Contas não poderia ficar de fora daquelas mudanças. O novo governo

retirou competência da Corte. O objetivo era enfraquecer o Tribunal no que foi feito

com a supressão do controle e registro prévio das ordens de pagamento. Na época,

o Ministro Ewad Sizenando Pinheiro assim se manifestava:

“Tribunal de Contas e regime de arbítrio não se

ajustam ou conciliam, não podem conviver

juntos, dadas as naturais e incontornáveis

restrições impostas ao controle”12

12 SILVA, Artur Adolfo Cotias e. O Tribunal de Contas da União na História do Brasil: evolução histórica, política e administrativa (1890-1998), Brasília: Editora do TCU, 1998, p. 67.

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27

Com o restabelecimento da democracia, em 1934, a nova constituição

restabeleceu para o Tribunal de Contas a figura do controle no que era feito pelo

registro prévio de qualquer ato da administração pública de que resultasse obrigação

de pagamento.

Em 1937, o Tribunal sofre forte golpe com a instalação da ditadura Getúlio

Vargas. Aquela Corte perdeu força, juntamente com o Congresso Nacional, fechado

pelo governo do Estado Novo implantado por Getúlio.

A Carta constitucional criou um outro órgão de fiscalização financeira, que

seria organizado por lei ordinária. Aguardando a dita lei ordinária, o Tribunal

continuou a funcionar provisoriamente, até que o Decreto-lei nº 426/38 veio a dar

uma nova roupagem àquela Corte com a criação de delegacias do Tesouro Nacional

junto às repartições arrecadadoras e pagadoras do governo com delegados

escolhidos pelo Tribunal de Contas.

A Constituição de 1946 fez renascer o Tribunal com o seu fortalecimento

por meio do revigoramento em suas competências e ampliação de sua área de

atuação. Essa fase de renascimento do Tribunal viria a perdurar até o ano de 1964,

quando o País mergulhou em um novo golpe de Estado.

O projeto de Constituição que estava sendo elaborado sob a égide do

governo militar desfigurava inteiramente a instituição do controle das finanças

públicas, perdendo a competência de acompanhar, passo a passo, a execução

orçamentária como também de manter controle direto sobre as contas dos

responsáveis por dinheiros e outros bens públicos e as dos administradores das

entidades descentralizadas. O Poder Executivo passa, portanto, a exercer as

funções até então deferidas ao órgão fiscalizador.

A única situação de ganho para o Tribunal com a Carta Política de 1967,

foi quanto às inspeções. Pela nova norma o controle deixou de ser exercido em

caráter de exame meramente formal de documentos, passando a contar com

verificações in loco.

Com o fim do governo militar nova Carta Política foi dada ao País, e o

Tribunal de Contas da União teve a sua jurisdição e competência substancialmente

ampliadas. É o que se verá no próximo item.

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2.7.2 O TCU na Constituição de 1988

A Constituição de 1988 trouxe grandes modificações em relação à

definição das atribuições do Tribunal de Contas. De um lado, foi retirada a herança

autoritária, como o poder do Presidente da República em cancelar vetos do Tribunal,

ou a rejeição das representações do Tribunal junto ao Congresso Nacional mediante

o modelo de decisão por decurso de prazo. De acordo com a constituição de 1988,

as correções solicitadas pelo Tribunal de Contas, no decorrer de fiscalização

concomitante, não podem ser anuladas pelo Poder Executivo. Foram incluídas uma

série de atribuições referentes a penalização de irregularidades e também o

fortalecimento das atividades de investigação.

A recusa em adotar as orientações do Tribunal de Contas é igualmente

punida com pesadas multas. O Tribunal de Contas ganhou também atribuições

preventivas, como a possibilidade de afastar determinados administradores, ou de

seqüestrar os seus bens, até a definição da responsabilidade sobre irregularidades.

Aliou-se à competência de fiscal da legalidade dos gastos públicos a de

avaliador do desempenho operacional dos órgãos e entidades sob sua jurisdição.

Desse modo, a Corte de Contas passou a acompanhar a eficiência da gestão

governamental, além de ver reforçadas suas funções fiscalizadoras, judicante e

punitiva.

O relatório de atividades do Tribunal de Contas arrola 12 competências do

Tribunal derivadas de atribuições constitucionais, conforme segue.

Atribuições constitucionais do Tribunal de Contas da União – CF 1998

o Atribuição Fundamento Constitucional

1

Julgar as contas dos administradores e dos demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos.

Art 33, § 2° e art. 71,.II

2

Fiscalizar as aplicações de subvenções e a renúncia de receitas

Art. 70

3 Apreciar as contas

anuais do Presidente da República Art. 71, I

4

Apreciar a legalidade dos atos de admissão de pessoal e de concessão de aposentadorias,

Art. 71, III

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29

reformas e pensões.

5

Realizar inspeções e auditorias por iniciativa própria ou por solicitação do Congresso Nacional

Art. 71, IV

6

Fiscalizar as contas nacionais das empresas supranacionais

Art. 71, V

7

Fiscalizar a aplicação de recursos da União repassados a estados, ao Distrito Federal e a municípios.

Art. 71, V

8

Prestar informações ao Congresso Nacional sobre fiscalizações realizadas.

Art. 71, VII

9

Aplicar sanções e determinar a correção de ilegalidades e irregularidades em atos e contratos.

Art. 71, VIII e XI

0

Emitir pronunciamento conclusivo, por solicitação da Comissão Mista Permanente de Senadores e Deputados, sobre as despesas não-autorizadas

Art. 71, § 1º

1

Apurar denúncias apresentadas por qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato sobre irregularidades ou ilegalidade.

Art. 72, § 2º

2

Fixar os coeficientes dos fundos de participação dos estados, do Distrito Federal e dos municípios e fiscalizar a entrega dos recursos aos governos e as prefeituras.

Art. 161, parágrafo único.

Fonte: Tribunal de Contas da União. Relatório Anual de Atividades, 1999.

2.7.3 Do controle como meio de fiscalização:

“O poder político, por ser uno, é indivisível, mas

a cultura da humanidade, desde Aristóteles,

vislumbra na ação do Estado a presença de

várias funções, as quais devem ser limitadas

quanto ao seu alcance e conteúdo.”13

13 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Editora Saraiva, 1994, p. 38.

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Na teoria clássica da divisão dos poderes, na atualidade melhor

cognominada de separação das funções do Estado, elaborada por Montesquieu,

vislumbra-se o interesse em dividir as atividades do Poder e estabelecer sobre todas

elas controle.

Se inexiste dúvida quanto à necessidade do controle sobre as funções do

Estado e seus realizadores, o mesmo não se pode afirmar acerca dos meios de

torná-lo efetivo, operacional, isento e eficaz. Em breve pesquisa realizada,

encontramos mais de uma centena de proposições doutrinárias sobre a expressão

controle, na acepção voltada para o exame de atos da administração pública, em

obras nacionais, com dezenas de propostas de classificação.

A ação do controle deve evoluir, a partir da estruturação científica

inicialmente concebida por Montesquieu, para uma visão mais próxima da realidade

atual do Estado e da sociedade, aproveitando a experiência histórica acumulada,

suas deficiências e acertos.

A doutrina, de modo não uniforme, já sedimentou alguns parâmetros que

merecem destaque.

Em primeiro plano, insta asserir que qualquer estrutura de controle que

não vislumbra a possibilidade de ação individual do cidadão estará fadada a

transferir a iniciativa a grupos, corporações ou instituições, nos quais mais facilmente

se permearão ações ideológicas. É na possibilidade propulsora da iniciativa

individual do cidadão estará fadada a transferir a iniciativa a grupos, corporações ou

instituições, nos quais mais facilmente se permearão ações ideológicas. É na

possibilidade propulsora da iniciativa individual, que reside à força de um sistema de

controle.

A propósito, no ideário da Revolução Francesa, que mais pelo seu

simbolismo do que pela sua concretização, iluminou o mundo, fizeram os

revolucionários estabelecer, na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,

em 1789, que "a sociedade tem o direito de pedir conta a todo agente público de sua

administração".

Em segundo, que o controle deve ser reconhecido como uma atividade

acessória do Estado, mas não menos Importante.

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31

Esse enfoque coloca a função do controle na sua verdadeira dimensão

Institucional, por não ser um fim em si mesma, busca acrescentar algo às atividades

ditas principais e à própria sociedade.

Em terceiro, que o controle deve:

• ser atividade permanente, desenvolvida prévia, concomitante e

posteriormente à prática do ato, acompanhando toda sua extensão;

• ocupar a atenção de toda sociedade, para afastar a idéia de omissão e

impunidade;

• ser desenvolvida por todos os órgãos do aparelho do Estado e da

Iniciativa privada, quando exercente de função estatal, mesmo que em regime de

colaboração; e

• ser atribuída a um órgão específico, para a qual será atividade - fím.

Essa concepção, como facilmente se percebe, só pode permear num país

que adote um regime democrático.

O controle, como uma função do Estado, exige, como o regime

democrático, um grau de desenvolvimento da sociedade e dos agentes de

administração para alcançar seu escopo, evoluindo de moda permanente, como num

ciclo de realimentação permanente: democracia - controle - democracia.

Franco Montoro, em sua importante obra Estudos de Filosofia do Direito,

assinala que:

"não se trata, simplesmente, de receber

passivamente os benefícios do progresso, mas

de tomar parte nas decisões e no esforço para

a sua realização. Em lugar de ser tratado como

“objetivo” das atenções paternalistas dos

detentores do poder, o homem tem o direito de

ser considerado pessoa consciente e

responsável, capaz de ser "sujeito" e

"agente" no processo do

desenvolvimento.."14

14 MONTORO, André Franco. Estudos de Filosofia do Direito, 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 182

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Se é o povo que mantém o Estado e, por meio dos seus legítimos

representantes, define a aplicação dos recursos públicos, nada mais adequado do

que atribuir-lhe o controle externo da Administração Pública. Salienta Manoel

Gonçalves Ferreira Filho que:

"Por tradição que data do medievo, compete

autorizar a cobrança de tributos, consentir nos

gastos públicos, tomar conta dos que usam do

patrimônio geral. Na verdade, o poder

financeiro das câmaras é historicamente

anterior ao exercício, por elas, da função

legislativa"15.

Para desempenhar a função técnica do controle da Administração, o

Brasil, a exemplo de outros países, adota o modelo de Tribunal de Contas. Assim,

enquanto esses tratam exclusivamente do exame dos atos e da atividade

administrativa, o julgamento final da gestão do governo como um todo continua na

restrita competência do parlamento da respectiva esfera de governo.

Como ensina MELLO FILHO:

"não há negar-se que o encargo de controlar a

função administrativa do Estado, ante os

explícitos dizeres constitucionais, assiste ao

Poder Legislativo. Entretanto, também não há

negar que a este Poder acode sobretudo uma

função política, a de fazer as opções sobre as

regras fundamentais que irão ditar o destino do

País e reger os comportamentos dos

indivíduos. Já a missão de efetuar um apurado

controle sobre a legitimidade dos atos

administrativos conducentes à despesa pública

15 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional, 22ª edição, São Paulo: Saraiva, 1995, p. 19.

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33

é, obviamente, uma missão técnica - jurídica e,

portanto, dificilmente poderia ser

desempenhada a contento por um corpo

legislativo, sem que contasse com o auxílio de

um organismo especializado ao qual incumba

esta apreciação técnica, que irá iluminar a

posterior decisão política do Legislativo na

apreciação da gestão dos recursos públicos"16.

Jorge Ulisses, assevera que:

“O controlar, porém, precisa estabelecer-se em

regras. Não pode ser uma função sem

regramentos, sob pena de transformar o

controlador em poder. Assim, há que ter função

restrita e limitada a modelo previamente

estabelecido, para que possa avaliar a

regularidade da conduta que será controlada”17.

Há dois sistemas de controle: O controle interno e o externo, sobre os

quais passaremos a discorrer:

2.7.3.1 Do controle interno

O objetivo principal do controle interno é o de possuir ação preventiva

antes que ações ilícitas, incorretas ou impróprias possam atentar contra os princípios

da Constituição da República Federativa do Brasil, principalmente o art. 37, seus

incisos e parágrafos.

Um sistema de controle compreende a estrutura e o processo de controle.

A estrutura de controle deve ser desenhada em função das variáveis - chave que

16 MELLO FILHO, José Celso de Melo. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 1994, p. 16 17 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência, Belo Horizonte: Editora Fórum, 2003, p. 33.

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derivam do contexto social e da estratégia da organização, além de levar em

consideração as responsabilidades de cada administrador ou encarregado por

centros de competência. A estrutura contém, ainda, o sistema de indicadores de

Informações de incentivos.

O controle interno se funda em razões de ordem administrativa, jurídica e

mesmo política. Sem controle não há nem poderia haver, em termos realistas

responsabilidade pública. A responsabilidade pública depende de uma fiscalização

eficaz dos atos do Estado.

Neste contexto o controle Interno opera na organização compreendendo o

planejamento e a orçamentação dos meios, a execução das atividades planejadas e

a avaliação periódica da atuação.

O controle é Instrumento eficaz de gestão e não é novidade do

ordenamento jurídico brasileiro. Observemos o que a Constituição Federal brasileira,

como já utilizada neste trabalho, dispõe sobre o assunto:

"Art. 70: A fiscalização contábil, financeira,

orçamentária, operacional e patrimonial da

União e das entidades da administração direta,

indireta, quanto à legalidade, legitimidade,

economicidade, aplicação de subvenções e

renúncia de receitas, será exercida pelo

Congresso Nacional, mediante controle

externo, e pelo sistema de controle interno de

cada poder.

Art. 71: O controle externo, a cargo do

Congresso Nacional, será exercido com o

auxílio do Tribunal de Contas da União.

Art. 74: Os Poderes Legislativo, Executivo e

Judiciário manterão, de forma integrada,

sistema de controle interno [...]"

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35

Outro fundamento do controle interno na Administração Pública está no

art. 76 da Lei n° 4.320/64, o qual estabelece que o Poder Executivo exercerá os três

tipos de controle da execução orçamentária:

1) legalidade dos atos que resultem

arrecadação da receita ou a realização da

despesa, o nascimento ou a extinção de

direitos e obrigações;

2) a fidelidade funcional dos agentes da

administração responsáveis por bens e valores

públicos;

3) o cumprimento do programa de trabalho

expresso em termos monetários e em termos

de realização de obras e prestação de serviços.

A Lei n° 4.320/64 inovou ao consagrar os princípios de planejamento, do

orçamento e do controle, estabelecendo novas técnicas orçamentárias a eficácia dos

gastos públicos.

Com relação aos custos dos bens e serviços, tanto a Lei 4.320/64, art. 85,

quanto o Decreto-Lei 200/67, art. 25, IX e art. 79, estabeleceram que a contabilidade

deveria apurá-los, a fim de buscar uma prestação de serviços econômica e

evidenciar os resultados da gestão. Mais de 30 anos se passaram sem aplicação, e

a Lei complementar n° 101/2000, Lei de Responsabilidade Fiscal, volta a exigir a

apuração dos custos, como se nunca tivesse havido legislação anterior.

A aprovação da LRF deva incorporar aos costumes político-

administrativos a preocupação com os limites de gastos pelos administradores

públicos municipais, estaduais e federais. A lei veio regulamentar o artigo 163 da

Constituição Federal, introduzindo o conceito de gestão fiscal responsável. Nesse

contexto, poderá vir a produzir um forte impacto quanto ao controle global da

arrecadação e execução dos orçamentos públicos.

A idéia que deu origem a essa lei foi apresentada pelo Governo Federal

no auge da crise fiscal brasileira, em novembro de 1997.

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36

A partir da aprovação do projeto de lei, todos os orçamentos públicos deverão

apresentar superávit primário. Assim, espera-se que os ciclos históricos de déficits

nos orçamentos públicos sejam interrompidos, em razão deste novo sistema de

monitoramento e responsabilização.

Para MOTA:

“o impacto causado pela LRF, desde sua

proposição, encarece o princípio Jurídico da

eficiência quando focaliza a estrito liame que

deve existir entre a fixação e a execução de

metas fiscais, enfatizando o controle do

percurso para consecução de resultados. Torna

concreta e palpável o princípio da

economicidade, pela conceituação mais exata

de gestão orçamentária e fiscal. Reaviva a

noção de continuidade- administrativa, até

então pouca explorada pela ordenamento

legislativo e mesmo pela doutrina nacional. E

desenvolve, sobretudo, o princípio fundamental

da responsabilidade (“accountability”), correlato

a todos os demais, descritos no art. 37 da

Carta Magna”18.

2.7.3.2 Do controle externo

Jorge Ulisses conceitua controle externo como sendo:

“o conjunto de ações de controle

desenvolvidas por uma estrutura

organizacional, com procedimentos, atividades

e recursos próprios, não integrados na

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37

estrutura controlada, visando fiscalização,

verificação e correção de atos.”19

O controle externo da administração pública federal compete ao

Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União. É o que

assegura o artigo 71, da Constituição Federal brasileira de 1988.

O Ministro Homero Santos assim definiu o papel do Parlamento nesse

aspecto:

“Note-se que esse controle é uma das funções

primordiais dos Parlamentos. É verdade que,

por vezes, uma certa exaltação à função

legislativa ofuscou, no passado, a relevância do

controle como atividade parlamentar. Hoje,

contudo, tem-se clara a noção de que a

crescente importância dos atos legislativos,

principalmente na esfera do Executivo, ainda

que limitados pelo quadro legislativo existente,

estão a exigir ampla atenção do Parlamento. É

que tais atos são substancialmente de natureza

decisória e constituem atividades de grande

significação política. A crescente

responsabilidade do Governo no que se refere

ao andamento da vida econômica fez dele, ao

mesmo tempo, empresário, mediador de

conflitos e principalmente programador do

desenvolvimento da sociedade. E a forma de

participação do Legislativo nesse processo é

precisamente mediante ações de controle.

Caso o parlamento limitasse sua intervenção

18 MOTTA, Leda Pereira (Coord.). Curso de direito constitucional, 4ª Ed. São Paulo: J. Oliveira, 1999, p. 13. 19 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisprudência e competência, Belo Horizonte: Editora Fórum, 2003, p. 94.

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apenas à fase legislativa, deixaria de lado

importantíssima parcela do processo político”20.

O Poder Legislativo, como suscitado acima, além de exercer a sua

função típica, que é a de legislar, também exerce uma importante missão para a

sociedade, embora atípica, que é a de fiscalizar, externamente, com o auxílio do

Tribunal de Contas de União, a contabilidade financeira e orçamentária do poder

executivo.

O constituinte deu importante passo ao instituir que o controle interno tem

obrigação de apoiar o controle externo. Esse apoio se dá com a remessa de

documentos e informações aos tribunais, numa espécie de prévia de fiscalização.

Constatada irregularidade poderá surgir a necessidade de correção e orientação,

além de recomendação para apuração de responsabilidade.

Agindo de forma integrada, controle interno e externo, tende a valorizar

tanto este como aquele, sem que um se sobreponha ao outro. A desnecessidade da

ação do controle externo se dá a partir do momento em que o problema seja

equacionado pelo controle interno.

Jorge Ulisses leciona que:

“De certo modo, deve mesmo o controle

externo buscar preservar a autoridade interna,

quando essa entendeu que as medidas

adotadas foram as suficientes para impedir a

repetição da irregularidade, pois a estreita

convivência leva o administrador a conhecer

melhor os agentes envolvidos e, por regra,

aplicar com mais parcimônia as penalidades

cabíveis ou verificar a existência de atenuantes

que justifiquem o relevamento.”21

20 SANTOS, Homero. O controle da administração pública. Revista do Tribunal de Contas da União, Brasília. V. 28, n. 74, p. 19-20, out/dez, 1997. 21 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: jurisprudência e competência, Belo Horizonte: Editora

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A lição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho nos ensina que:

“o controle externo é aquele exercido por

Poder que não é o quem despende ou

administra recursos públicos”22

Quando o controle interno tem papel interna corporis em cada um de seus

órgãos, o controle externo atua como externa corporis, efetuado por poder diverso

do controlado, diretamente ou com o auxílio de órgão preposto, como é o caso em

relação ao Poder Legislativo brasileiro que atua em sintonia com o Tribunal de

Contas da União, quando se trata do mesmo exercer o controle externo.

José Afonso da Silva, em sua obra, Curso de Direito Constitucional

Positivo, leciona que o controle externo visa:

“verificar a probidade da administração, a

guarda e legal emprego do dinheiro público e o

cumprimento da lei orçamentária.”23.

Assim como o controle interno, o controle externo é obrigado a promover

investigação contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nos

aspectos atinentes à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das

subvenções e renúncia de receitas públicas.

A Carta Magna de 1988, apresentou notável evolução quando buscou

fortalecer e dignificar, jurídica e politicamente a atividade do controle externo

transpondo, para essas áreas de controle (interno e externo), os princípios de

legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, que norteiam a Administração

Pública.

Fórum, 2003, p. 91.

22 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988, 2ª ed. Atual. E ref. São Paulo: Saraiva, 1992, 87).

23 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional, São Paulo: RT, 1992, pp. 288-290.

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Eduardo Lobo Botelho Gualazzi, em sua obra Regime Jurídico dos

Tribunais de Contas leciona que:

“O controle externo é o controle dos controles,

inclusive porque lhe cabe controlar os próprios

órgãos que realizam as outras formas de

controle, não podendo ser por estes

controlado.”24.

24 GUALAZZI, Eduardo Lobo Botelho. Regime Jurídico dos Tribunais de Contas, São Paulo: RT, 1992, p. 119.

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CAPÍTULO III

A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:

SUJEITOS, ATOS DE IMPROBIDADE E SANÇÕES.

Sumário: 3.1 Introdução 3.2 O Conceito de

improbidade administrativa 3.3 A distinção

entre improbidade e imoralidade administrativa

3.4 Sujeitos da improbidade administrativa

3.4.1 Sujeito ativo 3.4.2 Sujeito passivo 3.5

Atos de improbidade 3.6 Sanções.

3.1 Introdução

A Administração Pública não exerce suas atividades e direitos com a

mesma autonomia e liberdade com que os particulares exercem os seus.

Enquanto a atuação dos particulares funda-se no princípio da autonomia

da vontade, a atuação do Poder Público é orientada por princípios como o da

legalidade, da supremacia do interesse público sobre o privado e da

indisponibilidade dos interesses públicos.

Desta forma, nota-se que ao agente público não é permitido atuar da

mesma maneira que é permitida ao particular, ou seja, de maneira pessoal, que não

prevista em lei, defendendo interesses que não os públicos.

Hely Lopes Meirelles leciona que:

"na Administração Pública não há liberdade

nem vontade pessoal. Enquanto na

Administração particular é lícito fazer tudo que

a lei não proíbe, na Administração Pública só é

permitido fazer o que a lei autoriza.

Isto porque a Administração Pública não dispõe

dos interesses públicos, por serem estes

inapropriáveis. A Administração Pública apenas

aplica a lei ao caso concreto, razão pela qual

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possui caráter meramente instrumental.

O interesse público consiste no interesse dos

indivíduos enquanto membros da sociedade,

não se confundindo com os interesses

peculiares de cada indivíduo. Por esse motivo,

o interesse público é considerado indisponível,

visto que não se encontra à mercê da vontade

do administrador. Ou seja, "sendo interesses

qualificados como próprios da coletividade

internos ao setor público, não se encontram à

livre disposição de quem quer que seja, por

inapropriáveis". Atribuído o dever ao agente

público, este não poderá deixar de exercê-lo,

sob pena de responder por omissão.

Neste diapasão, encontra-se o grande dilema

do regime jurídico-administrativo:“O binômio

prerrogativas da administração/direito dos

administrados".25

A fisionomia do Direito Administrativo será delineada pelo entrosamento

das prerrogativas da Administração com relação aos direitos dos administrados.

Não resta dúvida, portanto, a diferença da atuação do Poder Público em

relação aos particulares. Em decorrência disto, é inegável a existência de privilégios

dos órgãos públicos frente aos administrados em algumas situações, como por

exemplo, na presunção de legitimidade dos atos administrativos. Dessa maneira,

conclui-se que vigora a verticalidade e a unilateralidade nas relações entre a

Administração e os particulares, manifestando a vontade do Estado.

25 MEIRELLES, Hely Lopes. A administração pública e seus controles. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 114, p. 23-33, 1973.

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Concernente ao tema exposto, leciona Lúcia Valle Figueiredo:

"Ao investir a Administração de prerrogativas

especiais para tutela de determinados

interesses, que houve por bem entender

prevalecentes, a norma, em contrapartida,

qualificou-os de inalienáveis."26

Com efeito, a conseqüência da supremacia do interesse público é a

indisponibilidade. Decorre, daí, que, mesmo ao delegar o exercício de determinadas

funções públicas a outrem, a Administração delas não poderá dispor.

Em decorrência da indisponibilidade do interesse público até então

mencionada, advém o princípio da legalidade, segundo o qual o administrador, no

exercício de sua função, deve limitar-se às exigências previstas em lei. Os limites da

atuação administrativa serão estabelecidos por lei, de modo que o agente público

poderá somente fazer o que ela permitir-lhe.

Neste sentido, Romeu Felipe Bacellar Filho pontifica:

"A Administração Pública, antes de mais nada,

está presa ao princípio da legalidade. Este

princípio 'não é um pressuposto' como

assinala, com grande propriedade, Manoel de

Oliveira Franco Sobrinho, mas uma

determinante essencial”.27

O princípio da legalidade da Administração está expressamente referido

no caput do art. 37, da Constituição de 1988. Trata-se de princípio decorrente do

Estado de Direito, respeitadas as nuances da construção do significado deste

conceito em cada país.

26 FIGUEIREDO, Lúcia Vale. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 49. 27 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar, São Paulo: Max

Limonad, 1998, p. 81

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Expressa a idéia da lei como instrumento mais apropriado para definir o

regime de certas matérias (princípio da prioridade e prevalência da lei, princípio da

reserva da lei) e de 'instrumento normativo de vinculação jurídico-constitucional da

Administração'.

Em determinadas situações, ocorrerá a subsunção objetiva entre o caso

concreto e a hipótese prevista. Nesses casos, pode-se dizer que há vinculação, ou

seja, que a lei tipificou em termos objetivos, o único possível comportamento diante

de uma hipótese.

No entanto, diversas vezes o legislador não consegue prever a aplicação

da lei a todos os casos concretos; tendo em vista seu caráter genérico. "É que a lei,

inúmeras vezes, ao regular abstratamente as situações, o faz de maneira a irrogar

ao administrador o encargo de o eleger, perante o caso concreto, a solução que se

ajuste com perfeição às finalidades da norma, para o que terá de avaliar

conveniência e oportunidade caso a caso. Não havendo a subsunção da lei ao caso

concreto, terá o administrador que apreciar as situações discricionariamente para

alcançar a finalidade legal.

Por este motivo, nota-se que a simples legalidade é meio insuficiente para

controlar a Administração Pública. Isto ocorre porque, muitas vezes, o texto legal

não é dotado de clareza, dando margem a interpretações diversas. Estas

interpretações ocorrem por várias razões, dentre elas a falta de precisão da

linguagem utilizada, má elaboração do texto legal, o excesso de leis e a falta de uma

codificação no Direito Público.

É nesse contexto que se insere o tema do presente trabalho, ou seja, a

importância do estudo de princípios como o da moralidade administrativa e o da

improbidade administrativa, os quais visam limitar a atuação da Administração

Pública e fazer com que se atenda o espírito da lei.

Procurando dar concreção a esta idéia, foi editada a lei n.° 8.429, em 02

de junho de 1992, a qual dispõe sobre atos de improbidade administrativa.

Contudo, para melhor entendermos o fim almejado por esta lei, é de

extrema importância a distinção entre probidade administrativa e moralidade

administrativa, ambos conceitos jurídicos indeterminados, objeto de explanação do

item seguinte.

O presente trecho deste trabalho abordará os sujeitos passivos e ativos

do ato de improbidade, qualificados respectivamente nos artigos 1° e 2° da Lei n°

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8.429/92, demonstrando a necessidade de tipificação dos mesmos, bem como

estabelecendo conceitos oriundos do direito administrativo para identificá-los.

Serão ainda analisadas as espécies de atos de improbidade

administrativa, as quais importam em enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao

erário e atentam contra os princípios da Administração Pública, sob a luz dos artigos

9, 10, 11 da Lei n° 8.429/92, respectivamente.

Por último, serão demonstradas as sanções elencadas no artigo 12 da Lei

n° 8.429/92, cabíveis aos agentes ímprobos e a importância de se observar os

princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no momento de suas aplicações.

3.2 O conceito de improbidade administrativa

A improbidade é fenômeno que acompanha o Homem em sua trajetória

no tempo. O tema, portanto, é antiqüíssimo e ao mesmo tempo atual. Em toda parte

não existem soluções mágicas ou acabadas para o combate à corrupção.

O vocábulo improbidade é de origem latina - "improbitate" - e significa,

dentre outras coisas desonestidade, falsidade, desonra, corrupção. O vocábulo veio

a ser adotado para adjetivar a conduta do administrador desonesto.

Trata-se da conduta de um agente público que contraria as normas

morais, a lei e os costumes, indicando falta de honradez e atuação ilibada no que

tange aos procedimentos esperados da administração pública, seja ela direta,

indireta ou fundacional, não se limitando apenas ao Poder Executivo.

Nada mais é do que o exercício público de função - esta no seu sentido

mais amplo - sem a verificação dos princípios administrativos-constitucionais

básicos, restando descaracterizado o bom andamento e o respeito à coisa de todos -

a República.

Conforme Marino Pazzaglini Filho, entende-se por improbidade:

“Numa primeira aproximação, improbidade

administrativa é o designativo técnico para a

chamada corrupção administrativa, que, sob

diversas formas, promove o desvirtuamento da

Administração Pública e afronta os princípios

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nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito,

democrático e Republicano), revelando-se pela

obtenção de vantagens patrimoniais indevidas

às expensas do erário, pelo exercício nocivo

das funções e empregos públicos, pelo” "tráfico

de influência" nas esferas da Administração

Pública e pelo favorecimento de poucos em

detrimento dos interesses da sociedade,

mediante a concessão de obséquios e

privilégios ilícitos.”28.

Da mesma forma entende Léo da Silva Alves:

"Improbidade é desonestidade em seu sentido

mais amplo. Implica na falta de zelo com dois

elementos: o patrimônio público e o interesse

público. Relaciona-se com a conduta do

administrador e pode ser praticada não apenas

pelo agente público, lato sensu, senão também

por quem não é servidor e infringe a

moralidade pública."29.

O ato de imoralidade, na opinião da melhor doutrina, afronta à

honestidade, a boa fé, o respeito à igualdade, as normas de conduta humana e

outros postulados éticos e morais. Qualquer cidadão pode propor ação popular, com

objetivo de anular ato lesivo à moralidade administrativa. Não terá que arcar com as

custas judiciais nem está sujeito à sucumbência, a não ser que fique comprovada a

má-fé.

Trata-se, portanto, de condutas humanas positiva ou negativa, ilícita, que,

também, poderá acarretar umas sanções civis, administrativas e penais, em virtude

dos bens jurídicos atingidos pelo fato jurídico. Para estar configurada a improbidade

28 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada, São Paulo: Atlas, 2002, p. 118.

29 ALVES, Léo da Silva. As teses de Defesa na Sindicância e no Processo Disciplinar, 1ª edição, Brasília: Jurídica, 1999, p. 92.

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administrativa basta que haja afronta aos princípios esculpidos no caput do artigo 37

do Texto Maior, não sendo imperiosa a necessidade de que haja prejuízo financeiro

ao erário.

Marcelo Caetano demonstra que:

“No Direito Português, a probidade também é

um dever, pois “o funcionário deve servir a

Administração com honestidade, procedendo

no exercício das suas funções sempre no

intuito de realizar os interesses públicos, sem

aproveitar os poderes ou facilidades delas

decorrentes em proveito pessoal ou de outrem

a quem queira favorecer.”30.

Waldo Fazzio Júnior conceitua improbidade da seguinte forma:

"Improbidade é a palavra derivada do latim

improbitate, significando falta de probidade,

desonestidade e desonradez."31.

Não adianta palmilhar a busca de um conceito preciso nessa matéria.

Também não é oportuno importá-lo do regramento legal, porque este é

extremamente detalhado e, por isso, capaz de produzir sensíveis confusões

exegéticas. Nem adianta qualquer prospecção subjetiva, uma vez que,

juridicamente, o que interessa são os atos comissivos ou omissivos que desvelam a

improbidade e seus efeitos.

Marcelo Figueiredo, traz à baila, em obra coordenada por Cássio

Scarpinella Bueno e Pedro Paulo de Rezende Porto Filho, os exemplos mais

corriqueiros de violação ao princípio da probidade administrativa ocorridos em nosso

país:

30 CAETANO, Marcello. Manual de direito administrativo, Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 57. 31 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Corrupção no Poder Público, São Paulo: Atlas, 2002, p. 83).

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“Os grandes exemplos de improbidade no

Brasil são: aplicação irregular de verba pública,

desvio de verba pública, falta de prestação de

contas, frustração de concurso de processo

licitatório, superfaturamento de obra pública -

esses são os mais comuns atos de

improbidade administrativa praticados

diariamente por administradores públicos

brasileiros. Esses atos são classificados como

atos de improbidade administrativa.

Fato é que, "não temos na doutrina nacional

uma definição precisa - e nem poderíamos ter -

do que seja um ato de improbidade ou do que

seja a moralidade administrativa." O que temos

são determinadas condutas descritas na lei n°

8.429/92 como sendo violadoras do dever de

probidade administrativa, as quais serão

abordadas no próximo capítulo.”32.

3.3 A distinção entre improbidade e imoralidade administrativa

Bastante tormentosa é a questão relativa à diferença conceitual entre

improbidade e imoralidade administrativa. A lei maior utiliza ambos os termos, o que

evidencia a dessemelhança entre os dois institutos.

No tocante a diferenciação destes conceitos, vale mencionar os

ensinamentos de Marcelo Figueiredo:

"O princípio da moralidade administrativa é de

alcance maior, é conceito mais genérico, a

determinar, a todos os 'poderes' e funções do

32 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 31

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Estado, atuação conforme o padrão jurídico da

moral, da boa - fé, da lealdade, da honestidade.

Já a probidade, que alhures denominamos

'moralidade administrativa qualificada, volta-se

o particular aspecto da moralidade

administrativa. Parece-nos que a probidade

está exclusivamente vinculada ao aspecto da

conduta (do ilícito) do administrador. Assim, em

termos gerais, diríamos que viola a probidade o

agente público que em suas ordinárias tarefas

e deveres (em seu agir) atrita os

denominados 'tipos' legais."33.

A probidade é, portanto, espécie do gênero "moralidade administrativa" a

qual é mencionada no artigo 37, caput e seu parágrafo 4°, da Constituição Federal.

Desta forma, os atos atentatórios à probidade também são considerados

atentatórios à moralidade administrativa, embora ambos não sejam conceitos

idênticos.

Desonestidade implica conduta dolosa, não se coadunando, pois, com o

conceito de improbidade a conduta meramente culposa.

José Afonso da Silva deixa claro que improbidade administrativa é uma

imoralidade administrativa qualificada ensinando que:

"A improbidade administrativa é uma

imoralidade qualificada pelo dano ao erário e

correspondente vantagem ao ímprobo ou a

outrem. A improbidade é tratada ainda com

mais rigor, porque entra no ordenamento

constitucional como causa de suspensão dos

direitos políticos do ímprobo."34.

33 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros: 2000, p. 42

34 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 202.

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Os autores supracitados, de maneira unânime, classificam a probidade

como sendo espécie do gênero moralidade administrativa.

A conduta desonesta é apontada como característica da improbidade, a

par de suas consequências, que são o dano ao erário e/ou a obtenção de vantagem

indevida ao ímprobo ou a outrem.

Conclui-se, diante do exposto que, a distinção entre imoralidade

administrativa e improbidade administrativa se dá em virtude da conduta do agente.

Vale lembrar que não é punível o agente público, ou equiparado, quando

o ato acoimado de improbidade é, na verdade, fruto de inabilidade, de gestão

imperfeita, ausente o elemento de "desonestidade" ou de improbidade propriamente

dita.

Se o agente, por incompetência, ou ainda, pelo mau exercício de sua

função, acarretar danos ao Poder Público, age em desconformidade com o princípio

da moralidade administrativa. Já o agente que atua com a intenção (dolo) de obter

vantagem às custas do Erário Público, fere o princípio da probidade administrativa.

Ou seja, nem tudo que é imoral configura improbidade. O agente imoral,

possivelmente, poderá sofrer as sanções contidas na referida lei, contanto que

fundamentadas em outro dispositivo legal. Sendo assim, não se aplica a Lei de

Improbidade Administrativa aos atos simplesmente imorais. Só se submeterá às

sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa o agente ímprobo.

A lei n° 8.429/92 explicita situações consideradas violadores da

"probidade". Tipifica as figuras do enriquecimento ilícito, do prejuízo ao erário e da

infringência aos princípios administrativos, como condutas tidas por atentatórias à

probidade. Posteriormente serão analisadas uma a uma.

3.4 Sujeitos da improbidade administrativa

3.4.1 Sujeito ativo

O sujeito ativo do ato de improbidade é o agente público, assim

qualificado nos termos do artigo 2° da Lei 8.429/92, sendo que, ao seu lado, poderão

figurar particulares colaboradores ou beneficiários dos atos de improbidade.

À luz da Lei n° 8.429/92, a expressão "agente público" deve ser

considerada o gênero do qual emanam as diversas espécies.

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51

Conforme seu artigo 2°, a Lei de Improbidade amplia o conceito de agente

público, englobando neste um número considerável de hipóteses. De acordo com o

referido dispositivo legal, "reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo

aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,

nomeação, designação, contratação ou qualquer forma de investidura ou vínculo,

mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior."

Num primeiro momento, o artigo 2° abrange aqueles que se relacionam

diretamente com a Administração, sendo eles os eleitos, os nomeados, os

designados, os contratados, os empregados.

Não obstante, o artigo 3° da Lei de Improbidade amplia o rol dos sujeitos

ativos passíveis de responsabilização, englobando também, no que couber, "àquele

que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de

improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma, direta ou indireta."

Obviamente, o terceiro, o particular, poderá apenas ser co-autor ou

participante da conduta ilícita, pois apenas o "agente público" é que disponibilizará

de meios eficazes para a realização da conduta lesiva.

Esta ampliação no universo de pessoas cujo procedimento pode ser

apontado como ímprobo, dá-se em virtude da possibilidade de pessoas estranhas à

Administração procurarem obter benefícios de maneira reprovável e ilegal.

Caso não fosse ampliado o rol dos possíveis legitimados, o concurso

realizado seria estranho à Administração, demandando então procedimentos

diversos, incompatível com o interesse público.

A lei, portanto, "pretende traçar seu raio de abrangência, para colher em

suas malhas toda e qualquer pessoa que com a administração se relacione, tomada

essa expressão em seu sentido mais amplo possível."

De maneira genérica, conceitua-se agente público como sendo pessoa

física, que toma as decisões ou executa medidas relativas ao serviço público, no

exercício de suas atribuições formais ou materiais.

Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves categorizam os agentes públicos da

seguinte forma:

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“Agentes políticos, agentes particulares

colaboradores, servidores públicos e agentes

meramente particulares”35

Quanto aos agentes políticos assim lecionam:

"Agentes Políticos são aqueles que, no âmbito

do respectivo poder desempenham as funções

políticas de direção previstas na Constituição,

normalmente de forma transitória, sendo a

investidura realizada por meio de eleição (no

Executivo, Presidente, Governadores,

Prefeitos; e, no Legislativo, Senadores,

Deputados Federais, Deputados Estaduais,

Deputados Distritais e Vereadores) ou

nomeação (Ministros e Secretários Estaduais e

Municipais)."36.

Em relação aos agentes particulares colaboradores, os referidos autores

esclarecem que:

"são os que executam determinadas funções

de natureza pública, por vezes de forma

transitória e sem remuneração (ex.: jurados,

mesários, escrutinadores, representantes da

sociedade civil em conselho), abrangendo, para

os fins da Lei da Improbidade, aqueles que

tenham sido contratados especificamente

para o exercício de determinada tarefa.”37.

35 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, 1ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 531.

36 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, 1ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 531.

37 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, 1ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 533.

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No tocante a categoria dos servidores públicos, oportuna à lição desses

dois autores:

“Servidores públicos são aqueles que, qualquer

que seja o regime jurídico a que estejam

submetidos, possuem um vínculo permanente

com os entes estatais da administração direta

ou indireta, desempenham funções próprias

destes, ou outras úteis à sua consecução, e

são remunerados por seus serviços, estando

aqui incluídos os membros do Ministério

Público, do Poder Judiciário e do Tribunal de

Contas.

Por derradeiro, agentes meramente

particulares são aqueles que não executam

nenhuma função de natureza pública e mantém

um vínculo com o ente recebedor de numerário

público. Exemplo: sócio-cotista de empresa

beneficiária de incentivos fiscais, empregado

desta, etc"38.

Por sua vez, Marino Pazzaglini Filho, também classifica os agentes

públicos em quatro categorias:

“Dos agentes políticos, dos agentes

autônomos, dos servidores públicos e dos

particulares em colaboração com o Poder

Público.

No que tange aos agentes políticos, apresenta

conceito semelhante ao anteriormente exposto,

acrescentando que estes "são os titulares dos

38 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, 1ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 540.

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cargos estruturais à organização política do

País, ou seja, ocupantes dos que integram o

arcabouço constitucional do Estado, o

esquema fundamental do Poder.

A segunda categoria, denominada pelo autor

agentes autônomos, incluem "os membros do

Poder Judiciário, dos Ministérios Públicos, dos

Tribunais de Contas e Chefes da Advocacia

Geral da União que, regidos por legislação

própria, exercem funções superiores e

essenciais, mas não participam diretamente de

decisões políticas."39.

Já os servidores públicos:

“São as pessoas físicas que prestam serviços

aos poderes do Estado e às entidades da

Administração Pública Indireta de natureza

profissional, com vínculo empregatício e

remuneração paga pelo Erário."40.

Como ensinam Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves:

“Nesta categoria não estão inseridos os

membros do Ministério Público, do Poder

Judiciário e do Tribunal de Contas, como

ensinam Emerson Garcia e Rogério Pacheco

Alves.”41.

39 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada, São Paulo: Atlas, 2002, p. 111. 40 Idem, p. 112. 41 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, 112.

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Partindo deste entendimento, pode-se concluir que, para a efetiva

identificação do sujeito ativo do ato ímprobo, há primeiramente que se verificar se tal

ato fora cometido por agente público. O status de agente público haverá de ser

aferido a partir da análise do vínculo existente entre o autor do ato e o sujeito

passivo imediato por ocasião de sua prática, ainda que por ocasião da deflagração

das medidas necessárias à persecução dos atos de improbidade outra seja a sua

situação jurídica, e ainda a verificação de que o mesmo o praticou em razão de sua

especial condição de agente público.

3.4.2 Sujeito passivo

O sujeito passivo ou vítima do agente ímprobo é as Administrações

Públicas direta, indiretas ou fundacional de qualquer dos poderes da União, dos

Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e as entidades particulares que tenham

participação de dinheiro público em seu patrimônio ou receita, conforme prescreve o

artigo 1° da Lei n° 8.429/92:

"Art. 1° Os atos de improbidade praticados por

qualquer agente público, servidor ou não,

contra as administrações diretas, indiretas ou

fundacional de qualquer dos Poderes da União,

dos Estados, do Distrito Federal, dos

Municípios, de Território, de empresa

incorporada ao patrimônio público ou de

entidade para cuja criação ou custeio o erário

haja concorrido ou concorra com mais de

cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita

anual, serão punidos na forma desta lei."

Bastante largo é, também, o conceito do sujeito passivo do ato de

improbidade administrativa, ampliando, ainda, o número de entidades cujo

patrimônio se acha protegido pelas disposições legais em referência. Para se ter

uma idéia da amplitude do alcance da lei, basta observar o disposto no parágrafo

único do artigo 1°:

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“Parágrafo único. Estão também sujeitos às

penalidades desta lei os atos de improbidade

praticados contra o patrimônio de entidade que

receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal

ou creditício, de órgão público bem como

daquelas para cuja criação ou custeio o erário

haja concorrido ou concorra com menos de

cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita

anual, limitando-se, nestes casos, a sanção

patrimonial à repercussão do ilícito sobre a

contribuição dos cofres públicos."

Esta ampliação no rol dos sujeitos passíveis de atos ímprobos ocorre pelo

fato de, atualmente, a atuação da Administração Pública ser uma atividade

extremamente complexa, face à criação de diversos órgãos, conseqüência da

descentralização do Poder Público.

Em observância à letra da lei, verifica-se que empresas que gozam de

incentivos fiscais, a exemplo de empresas favorecidas através da SUDENE, SUDAM

e outros organismos nacionais ou estaduais, encontram-se protegidas pela Lei de

Improbidade Administrativa, em relação a condutas irregulares, dolosas ou culposas,

em que pese sua condição de empresas privadas.

Fazzio Júnior, apresenta o conceito de sujeito passivo da seguinte forma:

“É sujeito passivo a pessoa jurídica de direito

público interno (União, Estado, Município,

Autarquia) ou a pessoa jurídica de direito

privado (Empresa Pública, Sociedade de

Economia Mista, empresa com envolvimento

de capitais públicos). Quer dizer, sujeito

passivo da improbidade administrativa é

qualquer entidade pública ou particular que

tenha participação de dinheiro público em seu

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patrimônio ou receita anual.

Alguns autores criticam a redação dada ao

artigo 1° da Lei 8.429/92, no que diz respeito

ao seu alcance subjetivo”42.

Neste sentido, também posiciona-se Francisco Otávio de Almeida Prado:

"O artigo 1°, ao enumerar as entidades cujo

patrimônio a lei visa a proteger, utilizou fórmula

pouco precisa, ao mencionar” (...) as

Administrações diretas, indiretas ou fundacional

de quaisquer dos poderes da União, dos

Estados, do Distrito Federal, dos

Municípios(...). Quaisquer dos Poderes"

contempla o Executivo, o Legislativo e o

Judiciário. E observam: 'Ora, dos três, apenas

o Poder Executivo se apresenta como

Administração direta, indireta e fundacional. O

Judiciário exerce a jurisdição, e só por exceção

administra, sem necessidade de órgãos

periféricos de administração. O legislativo por

excelência, legisla e só excepcionalmente

administra.”43.

Desta forma, entende esse autor que, quaisquer dos integrantes dos

Poderes pode praticar improbidade quando realize atos tipicamente administrativos.

3.5 Atos de improbidade

A lei de Improbidade Administrativa enumera nos artigos 9, 10 e 11, as

hipóteses de responsabilização administrativa, antecedentes lógicos ao

42 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Corrupção no Poder Público, São Paulo: Atlas, 2002, p. 49) 43 PRADO, Francisco Octávio de Almeida. Improbidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 119.

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sancionamento posterior dos agentes públicos ou a ele equiparados para efeito da

proteção à probidade. Estes dispositivos indicam, de forma exemplificativa, as

condutas que importam em enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e atentem

contra os princípios da administração pública.

Com efeito, o artigo 9°, da citada lei, dispõe que “constitui ato de

improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de

vantagem patrimonial·”, indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função,

emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei (...).

O enriquecimento ilícito administrativo sem justa causa caracteriza-se

pelo acréscimo de bens ao patrimônio do agente público, em detrimento do erário,

sem que para isso tenha havido motivo determinante justificável. Não é necessário,

para tanto, enriquecimento de grande porte econômico, bastando apenas à

ocorrência de acréscimos indevidos.

São três os requisitos essenciais para a configuração do enriquecimento

ilícito, quais sejam, a prática do ato por um agente público; a inexistência de

fundamento que justifique a apropriação alheia; a obtenção da vantagem por parte

do agente público em virtude da sua condição profissional.

Vale lembrar que não há a necessidade de resultado danoso à

Administração Pública para restar configurado o enriquecimento ilícito, bastando

apenas à expectativa de sua efetivação. Neste contexto, vale mencionar o exemplo

dado por Carlos Frederico Brito dos Santos:

"É o caso do professor de escola pública que,

afrontando a tradição de dignidade de uma das

categorias mais respeitáveis e nobres dos

servidores públicos do país, a dos professores,

resolve exigir do pai de um aluno já reprovado

na matéria, certa quantia em troca de sua

aprovação no exame de recuperação.

Percebida a quantia, não se pode dizer que

ouve prejuízo ao erário."44.

44 SANTOS, Carlos Frederico Brito dos. Improbidade administrativa: reflexão sobre a lei nº 8429/92, Rio de Janeiro: Forense,

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Outras observações importantes ainda podem ser feitas em relação aos

incisos do artigo 9º, da lei de improbidade administrativa.

“Art. 9º. l - receber, para si ou para outrem,

dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer

outra vantagem econômica, direta ou indireta, a

título de comissão, percentagem, gratificação

ou presente de quem tenha interesse, direto ou

indireto, que possa ser atingido ou amparado

por ação ou omissão decorrente das

atribuições do agente público."

O recebimento de vantagens econômicas a título de comissão,

percentagem, gratificação ou presente são exemplos de formas de como se podem

disfarçar o recebimento indevido as custas da função administrativa. Não se exige

que a vantagem seja conferida ao próprio agente, podendo ser essa concedida à

família, ou ainda terceiros, conhecido vulgarmente como laranjas. Logo, é possível a

responsabilização de agentes por força de enriquecimento de parentes ou terceiros,

que obtiveram vantagens que vedadas pelo ordenamento jurídico.

Os incisos II e III, do mesmo artigo estabelecem condutas relativas à

probidade nas licitações. Prescreve o inciso II:

"perceber vantagem econômica, direta ou

indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou

locação de bem móvel ou imóvel, ou a

contratação de serviços pelas entidades

referidas no art. 1° por preço superior ao valor

de mercado."

2002, p. 347.

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O dispositivo em comento proíbe o agente público de receber vantagens

de terceiros para facilitar a compra, a permuta, a locação de bens e serviços

públicos, inobservando total ou parcialmente o instituto da licitação pública.

Já o inciso III estabelece:

"III - perceber vantagem econômica, direta ou

indireta, para facilitar a alienação, permuta ou

locação de bem público ou o fornecimento de

serviço por ente estatal por preço inferior ao

valor de mercado."

Se naquele há superfaturamento do que a Administração adquire, neste

há um subfaturamento do que vende, troca ou fornece. Ou seja, na hipótese do

inciso III, o agente público visa beneficiar terceiros em detrimento da entidade, pela

alienação, permuta, locação de bem ou prestação de serviço, por valores inferiores

aos cobrados por outrem.

A principal razão destes incisos é "condenar quaisquer tipos de manobras

ou estratégias que desviem o condutor do processo executivo ou administrativo de

seu curso legal e ético."

O inciso IV traz como conduta ímproba:

"Utilizar, em obra ou serviço particular,

veículos, máquinas, equipamentos ou material

de qualquer natureza, de propriedade ou à

disposição de qualquer das entidades

mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o

trabalho de servidores públicos, empregados

ou terceiros contratados por essas entidades."

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61

A conduta prevista no inciso supra citado é prática comum na

Administração brasileira. Ela se concretiza com a utilização irregular de bens,

serviços e servidores da Administração Pública, ou que pelo Erário esteja sendo

custeado, em obra privada.

Com relação à possibilidade do uso de bens públicos por particulares,

Marcelo Figueiredo faz o seguinte comentário:

"É, no entanto, necessário ter presente que o

administrador público não pode dispor dos

bens ou valores públicos; deve zelar, conservar

e mantê-los, sob pena de responsabilidade.

Não devemos confundir a proibição acima com

a possível utilização de bens públicos por

particulares. Nesse caso são aplicáveis as

figuras do uso comum, uso normal, anormal,

privativo e outros instrumentos de outorga de

uso privativo de bens."45.

Não é difícil perceber que seria até interessante para a Administração,

locar ou ceder bens inutilizados, desde que houvesse previsão legal para tanto.

Afinal, são distintas as situações: uso de 'coisa pública' pelo povo e sua usurpação

por aqueles que deveriam ser seus zeladores.

O ato de improbidade contemplado no inciso V, da lei de improbidade

administrativa, traz como conduta ímproba:

"receber vantagem econômica de qualquer

natureza, direta ou indireta, para tolerar a

exploração ou a prática de jogos de azar, de

lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de

usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou

aceitar promessa de tal vantagem."

45 FIGUEIREDO, Marcello. Probidade administrativa. São Paulo: Malheiros, 2000, p.237.

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62

Intolerável, portanto, que aquele que possui o dever profissional de

reprimir práticas delituosas, se associe aos que se dedicam ao mundo do crime.

De acordo com o inciso VI, da referida lei, importa igualmente em

enriquecimento ilícito o ato ímprobo praticado pelo agente público que:

“Art. 9º. VI - receber vantagem econômica de

qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer

declaração falsa sobre medição ou avaliação

em obras públicas ou qualquer outro serviço,

ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade

ou característica de mercadorias ou bens

fornecidos a qualquer das entidades

mencionadas no art. 1° desta lei."

Como se sabe, os atos administrativos presumem-se legítimos, e como

tal, geram conseqüências fáticas independentemente de verificabilidade judicial.

Logo, as manifestações de vontade expedidas pelas autoridades competentes, se

estas agirem de maneira ímproba, podem, sem dúvida, causar dano ao Erário e

atentar contra o interesse público. Note-se que o dispositivo exige o emprego de

declaração, sendo este o ato que consuma a ação que frauda o direito e encobre a

realidade.

De acordo com o inciso VII, da lei supra citada, constitui ato de

improbidade:

"Adquirir, para si ou para outrem, no exercício

de mandato, cargo, emprego ou função pública,

bens de qualquer natureza cujo valor seja

desproporcional à evolução do patrimônio ou à

renda do agente público."

Trata-se da evolução patrimonial do agente público de forma incompatível

com a sua remuneração. Affonso Guizzo Neto analisa o inciso VII, do referido artigo,

da seguinte forma:

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"A ilicitude está situada em momento anterior à

aquisição dos bens, presumindo-se o

enriquecimento indevido, partindo-se do

pressuposto que a capacidade financeira do

agente público não comporta o patrimônio por

ele arrecadado. A opulência patrimonial do

agente público, mesmo que os bens estejam

em nome de terceiros, incompatível com a sua

condição profissional, serve de indício

(veemente) da ocorrência do ato de

improbidade administrativa."46.

Marcelo Figueiredo, ao comentar o inciso em questão, critica a formulação

feita pelo legislador, se não vejamos:

"A formulação não é feliz. O ato jurídico de

aquisição de bens em desproporção com a

renda do agente ou com sua evolução

patrimonial não pode ser considerada ato de

improbidade. É dizer, a simples aquisição

isoladamente, não configura improbidade. A

aquisição, a compra, a venda etc. são atos

lícitos e permitidos. Existe na lei uma

presunção de enriquecimento ilícito, situação

muito similar às hipóteses previstas na

legislação do imposto de renda, alusivas aos

'sinais exteriores de riqueza'. É preciso ter

cuidado ao aplicar o dispositivo. O intérprete

deve dar caminhos e meios para que o agente

possa justificar por todos os modos em Direito

admitidos a origem de suas rendas e proventos

46 GUIZZO NETO, Afonso. Responsabilização por atos de corrupção, Informativo INCUUR, Joinville, v. 3, n. 37, agosto 2002, 3-5, agosto 2002.

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e, assim, dar a oportunidade para que a

'verdade real' em contraposição à 'verdade

formal' das declarações de renda do agente

ímprobo venha à tona."47.

Fato é que caberá ao agente público justificar a origem do patrimônio

estranho, sendo a sua condenação possível somente após a observância do devido

processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

O inciso VIII, da lei de improbidade administrativa, traz à baila a conduta

ilegal do agente que:

"Aceitar emprego, comissão ou exercer

atividade de consultoria ou assessoramento

para pessoa física ou jurídica que tenha

interesse suscetível de ser atingido ou

amparado por ação ou omissão decorrente das

atribuições do agente público, durante a

atividade."

A norma em comento, pune o agente que dê consultoria ou preste

assessoramento a empresas privadas, sendo que nesta relação haja interesses

recíprocos vinculados à Administração.

Marcelo Figueiredo acredita que o maior fundamento deste inciso

encontra-se no princípio da impessoalidade, sendo vedada qualquer relação

hierárquica entre agentes públicos e particulares.

Alguns autores, como Marino Pazzaglini Filho, Márcio Rosa e Fazzio

Júnior, ensinam que a hipótese legal veda a cumulação das atividades em virtude do

regime de dedicação exclusiva, cabível a maioria dos serviços públicos.

Entretanto, há ainda o entendimento de que, em face das atribuições de

que o agente público é dotado, participa de procedimentos que muitas vezes não

são de domínio público e que podem muitas vezes fazer com que seja tentado por

47 47. FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 119.

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propostas de auxílio para encaminhamento de pedidos administrativos, por exemplo.

No tocante ao inciso IX, da citada lei de improbidade, age de maneira

ímproba importando enriquecimento ilícito o agente que:

"perceber vantagem econômica para

intermediar a liberação ou aplicação de verba

pública de qualquer natureza."

As verbas públicas originam-se de um orçamento legal, cuja finalidade

deve ser respeitada conforme sua previsão. Após a sua aprovação, muitas vezes as

verbas nele previstas não são liberadas imediatamente. A complexidade estatal faz

com que não raras vezes existam verdadeiras peregrinações de prefeitos,

secretários, governadores ou outros servidores para conseguir a liberação dessas

verbas. Nesse contexto, algumas empresas e pessoas, conhecidas como lobistas,

se especializam na cobrança de propina para a liberação dessas verbas.

No entanto, qualquer ato de intermediação de verbas públicas por parte

do agente ímprobo, estará, de alguma forma, favorecendo-o. Sendo assim,

ocorrendo à complacência dos agentes públicos com esse mecanismo ilícito, resta

violado o previsto no referido inciso.

Quanto ao disposto no inciso X, do artigo 9º, da lei de improbidade, cabe

ressaltar que constitui ato de improbidade administrativa:

"Receber vantagem econômica de qualquer

natureza, direta ou indiretamente, para omitir

ato de ofício, providência ou declaração a que

esteja obrigado."

Trata-se da omissão do agente público em relação a seus deveres,

deveres estes que incluem o cumprimento ao princípio da legalidade e ao ato de dar

execução à lei. Obviamente, como contrapartida, esta omissão origina o recebimento

de vantagens econômicas por parte do agente público.

O inciso XI denomina o agente ímprobo como sendo aquele que:

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"incorporar, por qualquer forma, ao seu

patrimônio bens, rendas, verbas ou valores

integrantes do acervo patrimonial das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei."

São três os requisitos para o enquadramento na tipificação normativa

prevista no inciso XI: que o autor seja agente público; que a coisa adquirida seja

pública; e que ocorra a efetiva apropriação desta por parte do agente ímprobo.

"É o peculato consistente na apropriação

indevida de bem ou valor público, invertendo

ilegalmente a titularidade da posse."

Com relação a este inciso, Marcelo Figueiredo faz o seguinte comentário:

"Pode o texto parecer ingênuo, na medida em

que pressupõe que o administrador 'ímprobo'

seja pouco astuto a ponto de 'incorporar' ao

seu patrimônio bens, rendas ou verbas do

acervo patrimonial das entidades arroladas no

art. 1° da lei. É que, na verdade, existem várias

fórmulas e meios para tal objetivo.

Normalmente utiliza-se de terceiros como testa-

de-ferro, adquire por si ou terceiros áreas

que futuramente serão desapropriadas -

enfim, realiza verdadeiras manobras e

estratégias para que, depois de longo tempo,

possa finalmente incorporar ao seu patrimônio

os bens a que alude a lei. Eis a razão da

expressão “incorporar, por qualquer forma.”48.

Por fim, estabelece o inciso XII do artigo 9° da lei de improbidade

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administrativa, que é ato de improbidade originário do enriquecimento ilícito "usar,

em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo

patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei."

Nota-se que o legislador contenta-se com o uso do bem. Não se trata de

uma apropriação, mas apenas a utilização em proveito pessoal, sem que haja

intenção de acrescentar o bem, a renda, a verba ou valor ao seu patrimônio.

Assim, de um modo geral, o uso, as utilizações lícitas, legítimas,

amparadas pelo Direito, de bens públicos, como já averbamos em comentários a

incisos anteriores, é natural. A regra anotada preocupa-se com o favorecimento

pessoal, coisa diversa.

O artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa prescreve que:

"constitui ato de improbidade administrativa que

causa lesão ao erário qualquer ação ou

omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda

patrimonial, desvio, apropriação,

malbaratamento ou dilapidação dos bens ou

haveres das entidades referidas no art. 1°

desta lei, e notadamente:o agente público deve

ter em sua consciência o dever de fidelidade

para com a Administração Pública, agindo com

diligência e boa-fé, não podendo permitir que

terceiros dilapidem o patrimônio público, muito

menos poderá colaborar para que isto ocorra."

Neste diapasão, importante distinguir o conceito de Erário e de Patrimônio

Público. O conceito deste é mais abrangente, "pois compreende o complexo de bens

e direitos públicos de valor econômico, artísticos, estéticos, históricos e turísticos."

Já aquele, integra o patrimônio público, limitando-se aos bens e direitos de valor

econômico, ou seja, aos recursos financeiros do Estado.

Os incisos l, II e III, do referido artigo, dispõem sobre atos atinentes ao

48 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 123

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patrimônio público. De acordo com estes dispositivos, constitui ato de improbidade

administrativa:

“l - facilitar ou concorrer por qualquer forma

para a incorporação ao patrimônio particular,

de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas,

verbas ou valores integrantes do acervo

patrimonial das entidades mencionadas no art.

1° desta lei”;

II - permitir ou concorrer para que pessoa física

ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas

ou valores integrantes do acervo patrimonial

das entidades mencionadas no art. 1° desta lei,

sem a observância das formalidades legais

ou regulamentares aplicáveis à espécie;

Ill - doar à pessoa física ou jurídica bem como

ao ente despersonalizado, ainda que de fins

educativos ou assistenciais, bens, rendas,

verbas ou valores do patrimônio de quaisquer

das entidades mencionadas no art. 1° desta lei,

sem observância das formalidades legais

e regulamentares aplicáveis à espécie.”

Nota-se que para a configuração do inciso l, é necessária a incorporação

ao patrimônio particular de bens, rendas ou valores pertencentes à entidade pública,

a conduta do agente facilitando ou concorrendo para a incorporação ilícita e o nexo

entre a incorporação indevida e a atuação funcional dolosa ou culposa do agente

público.

Por sua vez, o inciso II, veda a utilização do patrimônio público sem a

observação das formalidades legais:

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69

"Aqui, o 'permitir' tem um significado mais

amplo que tolerar. O agente franqueia, dá

liberdade, verdadeira licença para o ilícito - a

utilização vedada."

A norma em foco no inciso III proíbe doações ilícitas a pessoas físicas,

jurídicas, "ente despersonalizado", ainda que de fins educativos ou assistenciais.

Já intuitivamente percebe-se a diferença entre a doação prevista no

Código Civil e a prevista no Direito Público, haja vista o regime jurídico peculiar a

que este pertencente.

Marcelo Figueiredo é enfático a abordar a possibilidade do instituto da

doação no direito público:

"Entendemos que a doação, enquanto instituto,

é perfeitamente possível no direito público em

geral, guardadas as peculiaridades do bem em

questão e o interesse público exaustivamente

justificado. Assim, desde que haja previsão

legal, autorização legislativa, a conveniência, a

expressa motivação do ato final, controles

efetivos do legislativo e do Tribunal de Contas -

enfim, transparência e legalidade no

procedimento -, é possível a aplicação do

instituto no direito público."49.

O inciso XIII, do artigo 10, apresenta praticamente a mesma redação do

artigo 9°, inciso IV, com a diferença de que, este cuida do uso de bens, mão-de-obra

e serviços ilícitos proporcionados por agentes públicos, enquanto aquele cuida de

seu emprego efetivo por terceiro. Assim dispõe:

49 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 55.

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70

"XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço

particulares, veículos, máquinas, equipamentos

ou material de qualquer natureza, de

propriedade ou à disposição de qualquer das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei,

bem como o trabalho de servidor público,

empregados ou terceiros contratados por essas

entidades."

Os incisos IV, V e VIII, dispõem sobre atos atinentes às licitações. De

acordo com estes dispositivos, constitui ato de improbidade administrativa:

"IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta

ou locação de bem integrante do patrimônio de

qualquer das entidades referidas no art. 1°

desta lei, ou ainda a prestação de serviço por

parte delas, por preço inferior ao de mercado.

V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou

locação de bem ou serviço por preço superior

ao de mercado.

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou

dispensá-lo indevidamente."

Os incisos IV e V, do referido artigo 10, são semelhantes. A diferença

reside em relação à posição da entidade pública e do particular no contrato ilícito.

Enquanto no inciso IV, a Administração mediante conduta dolosa ou culposa de

agente público vende, permuta ou aluga um bem público, ou ainda, presta serviço à

terceiro por preço inferior ao do mercado, no inciso V, a entidade compra, permuta

ou aluga bem ou contrata serviço particular por valor superior ao de mercado.

Em comento a estes incisos, indispensáveis o ensinamento de Marcelo

Figueiredo:

"Não há duvidas de que se o agente público

permite ou facilita a alienação de bens ou

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71

serviços em desacordo com preços do

mercado estará burlando o magno princípio da

isonomia, frustrando a competitividade objetiva

delineada pelo procedimento da licitação, que

visa a buscar a proposta mais vantajosa,

confortada nos princípios constitucionais, nas

leis e no instrumento convocatório."50.

Quanto à ausência de licitação, tem-se que esta não configura a conduta

ilícita do agente. Isto porque apesar do procedimento licitatório ser uma regra, sua

dispensa é uma exceção, inclusive prevista constitucionalmente.

Em virtude da complexidade dos processos licitatórios e da ausência,

muitas vezes, de estrutura administrativa, é comum a observação do disposto no

inciso supracitado. Entretanto, os meios de fiscalização estão cada vez mais

presentes, inclusive com entidades da sociedade civil participando efetivamente do

respectivo controle.

Os incisos VI, VII, IX e X, do artigo 10, da lei de improbidade, dispõem

sobre atos atinentes à Responsabilidade Fiscal e Tributária. De acordo com estes

dispositivos, constitui ato de improbidade administrativa:

“VI - realizar operação financeira sem

observância das normas legais e

regulamentares ou aceitar garantia insuficiente

ou inidônea”;

VIl - conceder benefício administrativo ou fiscal

sem a observância das formalidades legais ou

regulamentares aplicáveis à espécie;

IX - ordenar ou permitir a realização de

despesas não autorizadas em lei ou

regulamento;

50 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 57.

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72

X - agir negligentemente na arrecadação de

tributo ou renda, bem como no que diz respeito

à conservação do patrimônio público."

Quanto ao inciso VI, da referida lei, nota-se que a operação financeira tem

como escopo captar recursos e outros meios financeiros para custear projetos

administrativos ou desenvolver serviços públicos.

O agente público que realizar operações financeiras inobservando as

normas pertinentes, em especial a Lei de Responsabilidade Fiscal, incidirá na

conduta prevista no inciso VI, do artigo 10.

Verifica-se, de acordo com o inciso VII, do mesmo artigo acima, que é

vedado ao agente público conceder benefício administrativo ou fiscal sem observar o

disposto no Código Tributário Nacional e na Lei de Responsabilidade Fiscal. Isto

porque não é o agente público que concede benefícios a particulares ou terceiros,

mas sim a lei que os autoriza. Ao agente público, cabe somente analisar se

preenchidos foram os requisitos para a concessão desse ou daquele benefício. O

problema encontra-se na discricionariedade do agente ao efetuar a referida análise,

havendo assim a oportunidade de abusos, os quais a Lei de Improbidade

Administrativa pretende evitar.

Todas as despesas públicas submetem-se a controles constitucionais e

legais. Quanto aos dispositivos legais, o inciso IX, do artigo 10, obriga o agente

público à observância dos limites legais fixados previamente no Plano Plurianual, na

Lei de Diretrizes Orçamentárias, na Lei Orçamentária Anual e mais uma vez na lei

de Responsabilidade Fiscal.

Duas espécies de comportamento culposo do agente público são

contempladas no inciso X, do artigo ora em comento: a negligência na arrecadação

de tributos ou rendas públicas; e a negligência na conservação do patrimônio

público.

Vale lembrar que a lei refere-se apenas ao comportamento negligente

gravíssimo, sob pena de cometer injustiças.

Por fim, o inciso XII, do já citado artigo 10, dispõe sobre atos de

favorecimento de terceiros. De acordo com este dispositivo, constitui ato de

improbidade administrativa:

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73

"XII - permitir que se utilize, em obra ou serviço

particulares, veículos, máquinas, equipamentos

ou material de qualquer natureza, de

propriedade ou à disposição de qualquer das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei,

bem como o trabalho de servidor público,

empregados ou terceiros contratados por essas

entidades."

O tipo administrativo guarda vinculação direta com o artigo 9° desta

mesma lei. Nesta hipótese, o agente público pode permitir, facilitar ou concorrer para

o enriquecimento de terceiro.

No mesmo sentido, dispensando maiores comentários, oportuna a lição

de Marcelo Figueiredo:

"O dispositivo procura 'fechar o cerco' da

atividade ilícita, proibindo que o agente público

facilite, de qualquer forma o enriquecimento

ilícito de terceiros. Como é de curial

conhecimento, nenhum agente público ímprobo

permitirá ou concorrerá para que 'terceiro' se

enriqueça ilicitamente sem que haja

adredemente preparado um verdadeiro plano

de ação ilícita; o que se convencionou

denominar, na linguagem leiga e popular, de

'esquemas'. Assim, o dispositivo procura

assegurar e abranger também a ação do

agente que, por qualquer meio, em co-autoria

ou participação, elege terceiros para ele não

configurar ostensivamente como o autor do

ilícito.

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74

É óbvio que a lei sanciona o comportamento de

todos os envolvidos na prática da improbidade

administrativa que leva ao enriquecimento

ilícito e, conseqüentemente, à lesão ao erário

público."51.

Constituem os princípios um conjunto de proposições que alicerçam ou

embasam um sistema e lhe garantem a validade.

São normas gerais, abstraías, nem sempre positivadas expressamente,

porém às quais, todo o ordenamento jurídico que se construa com a finalidade de

ser um Estado Democrático de Direito, deve respeito.

Condicionam toda a interpretação do Direito, motivo pelo qual são

dotados de maiores proeminências.

O artigo 37 da Constituição Federal elencou de modo expresso cinco

princípios inerentes a Administração Pública: da legalidade, da impessoalidade, da

moralidade, da publicidade e da eficiência. No entanto, outros princípios encontram-

se inseridos na lei maior apesar de não mencionados em seu artigo 37. Outros,

ainda, são implicações evidentes do próprio Estado de Direito e, conseqüentemente,

do sistema constitucional como um todo.

É importante ressaltar a diferença entre regra e princípio jurídico, para que

se possa analisar eventual violação a estes.

Ambos são normas e a distinção entre eles é uma distinção entre

espécies normativas. Pode-se apontar cinco critérios diferenciadores entre estas

espécies normativas.

Quanto ao grau de abstração, pode-se dizer que os princípios seriam

normas com um grau de abstração bastante elevado; enquanto que as regras teriam

um grau de abstração mais reduzido.

De acordo com o grau de determinabilidade, os princípios seriam normas

que, devido ao caráter vago e indeterminado, necessitam de concretização;

enquanto que as regras possuiriam aplicação direta.

51 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 68

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75

O critério do caráter de fundamentalidade determina que os princípios são

normas mais importantes do que as regras, devido ao fato de possuírem um papel

fundamental na estrutura do ordenamento jurídico.

Conforme o critério da proximidade da idéia de direito, os princípios são

"standards" baseados no ideal de justiça ou na idéia de direito, enquanto as regras

têm um conteúdo funcional.

Por fim, o critério da natureza normogenética, os princípios são os

fundamentos das regras, ou seja, as regras derivam dos princípios.

Torna-se indispensável a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello no

tocante a violação dos princípios:

"Violar um princípio é muito mais grave que

transgredir uma norma qualquer. A desatenção

ao princípio implica ofensa não apenas a um

específico mandamento obrigatório, mas a todo

o sistema de comandos. É a mais grave forma

de ilegalidade ou inconstitucionalidade,

conforme o escalão do princípio atingido,

porque representa insurgência contra todo o

sistema, subversão de seus valores

fundamentais, contumélia irremissível e seu

arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura

mestra."52.

O artigo 11, da Lei de Improbidade, prescreve em seu caput:

"Constitui ato de improbidade

administrativa que atenta contra os

princípios da administração pública

qualquer ação ou omissão que viole os

deveres de honestidade, imparcialidade,

52 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo, 4ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 325.

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76

legalidade, e lealdade às instituições, e

notadamente:"

Surge neste momento, uma crítica por parte de alguns autores, dentre

eles o ilustre Marcelo Figueiredo. De acordo com a leitura do dispositivo legal,

possível extrair que é ato de improbidade praticar ações ou omissões que violem a

legalidade. Assim, tem-se que a improbidade nada mais é do que uma violação a

legalidade, o que não é verdadeiro. A problemática encontra-se nos resultados e nas

conseqüências da ação ímproba e da ação ilegal, tendo em vista que são

absolutamente diversas, conforme será demonstrado mais adiante.

Passa-se a examinar as sete espécies exemplificativas de improbidade

administrativa atentatórias contra os princípios da Administração Pública.

O inciso l, do referido artigo, traz como conduta ímproba "praticar ato

visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de

competência"

Trata-se da prática por agente público de ato administrativo com fim ilegal,

desvio de finalidade ou que extrapola as suas atribuições.

De acordo com Pazzaglini Filho:

"Afronta o administrador, na espécie, os

princípios constitucionais da legalidade,

moralidade e finalidade que informam sua

atuação funcional, agindo fora dos limites de

sua competência ou por motivos diversos ao

fim inerente a todas as normas (inobservância

do interesse público) e ao móvel específico que

anima a regra jurídica que esteja aplicando.

Excede suas faculdades administrativas ou

atua no âmbito de sua competência, mas com

desvio de finalidade."53.

53 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada, São Paulo: Atlas, 2002, p. 127

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77

Conforme exposto em capítulo introdutório, a Administração não é

senhora dos interesses públicos, devendo portanto agir de acordo com a finalidade

prevista em lei sem que haja desvio de poder.

O inciso II, do festejado artigo 11, da lei em comento, define como ato de

improbidade administrativa "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de

ofício."

É dever do agente público se portar conforme suas obrigações perante a

administração, não podendo por capricho, interesse pessoal ou mesmo ineficiência,

deixar de cumprir suas obrigações para com a administração. Assim procedendo,

estará tipificada a conduta do inciso II, do referido artigo.

Affonso Guizzo Neto assim comenta sobre o dispositivo supra (inciso II,

do artigo 11, da lei de improbidade):

"O agente público, intencional ou

culposamente, fica inerte, deixando de executar

suas atribuições funcionais. O agente público

deve estar investido de competência para a

prática do ato omitido, caso contrário, não será

sujeito ativo de improbidade.

A omissão deve ser indevida, sem motivo legal

que a justifique. Assim, não haverá ato de

improbidade administrativa se o agente público

se omitir ou retardar o ato por motivo plausível

e razoável."54.

Os incisos III e VII, do referido artigo 11, definem, respectivamente, como

ato de improbidade que viola o dever de sigilo:

"III - revelar fato ou circunstância de que tem

ciência em razão das atribuições e que deva

permanecer em segredo;

54 GUIZZO NETO, Affonso. Responsabilização por atos de corrupção, informativo INCCUR, Joinville, v. 3, n. 37, agosto 2002, agosto 2002.

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78

VII - revelar ou permitir que chegue ao

conhecimento de terceiro, antes da respectiva

divulgação oficial, teor de medida política ou

econômica capaz de afetar o preço de

mercadoria, bem ou serviço."

Muitos dos atos administrativos precisam ser realizados sem a

antecipação da publicidade para não frustrar seus objetivos. Logo, quando exigido

(através de lei), é vedado ao agente dar publicidade ou fornecer informações que

minem o interesse público.

É fácil perceber que determinadas informações, se vierem à público antes

do momento certo, poderão prejudicar ou mesmo impedir o cumprimento da

finalidade do ato administrativo.

O inciso IV define como ato ímprobo que viola o dever de publicidade

"negar publicidade aos atos oficiais".

O princípio da publicidade está previsto no artigo 37, caput, da

Constituição Federal, funcionando como uma garantia dos administrados.

Há de existir transparência na gestão da coisa pública, sendo obrigatória

a visibilidade social dos atos praticados.

O inciso V traz como ato de improbidade administrativa por ferir o

princípio da isonomia "frustrar a licitude de concurso público"

O princípio da isonomia garante o tratamento sem distinção de qualquer

natureza jurídica. Se assim é, quando a administração realiza concursos públicos

deve respeitar o aludido princípio. Não pode haver qualquer modalidade de

favorecimento, direto ou indireto.

Por fim, traz o inciso VI como conduta ímproba do agente administrativo

"deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo."

O agente público tem o dever de prestar contas de dinheiro, bens e outros

valores públicos que tenha utilizado em sua administração. Trata-se de exigência

constitucional prevista no artigo 70, parágrafo único, da Constituição Federal de

1988. Presume-se que o agente que deixa de prestar contas para com a

Administração, o faz por estarem irregulares.

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79

3.6 Sanções

A Constituição Federal dispõe em seu artigo 37, § 4° que:

"Os atos de improbidade administrativa

importarão a suspensão dos direitos

públicos, a perda da função pública, a

indisponibilidade dos bens e o

ressarcimento ao erário, na forma e

gradação previstas em lei, sem prejuízo

da ação penal cabível."

Com o intuito de regulamentar e completar o elenco do artigo acima citado

surge o artigo 12 da Lei n° 8.429/92:

“Art. 12. Independentemente das sanções

penais, civis e administrativas, previstas na

legislação específica, está o responsável pelo

ato de improbidade sujeito às seguintes

cominações:

l - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou

valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio,

ressarcimento integral do dano, quando houver,

perda da função pública, suspensão dos

direitos políticos de oito a dez anos, pagamento

de multa civil de até três vezes o valor do

acréscimo patrimonial e proibição de contratar

com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de

pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário,

pelo prazo de dez anos;

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento

integral do dano, perda dos bens ou valores

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80

acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se

concorrer esta circunstância, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de

cinco a oito anos, pagamento de multa civil de

até duas vezes o valor do dano e proibição de

contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,

direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja

sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento

integral do dano, se houver, perda da função

pública, suspensão dos direitos políticos de três

a cinco anos, pagamento de multa civil de até

cem vezes o valor da remuneração percebida

pelo agente e proibição de contratar com o

Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de

pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário,

pelo prazo de três anos.

Parágrafo único. Na fixação das penas

previstas nesta lei o juiz levará em conta a

extensão do dano causado, assim como o

proveito patrimonial obtido pelo agente.

O ressarcimento integral do dano causado à

Administração Pública atinge o direito de

propriedade do agente que praticou o ato de

improbidade. Ele será determinado por

sentença judicial, não havendo necessidade de

interposição de ação própria”.

Quanto a perda da função pública, vale mencionar que, importa na perda

definitiva da função que o agente público esteja exercendo ao tempo da

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81

condenação, pouco importando o cargo ocupado quando da prática do ato ímprobo.

A suspensão dos direitos políticos também é prevista no artigo 15 da

Constituição Federal. Ao graduar a suspensão deve-se observar os limites mínimos

e máximos previstos pela Lei de Improbidade (artigo 9º, 8 a 10 anos; artigo 10, 5 a

8 anos e artigo 11, 3 a 5 anos), sendo imprescindível a fundamentação da aplicação

do grau imposto.

A multa civil será fixada observadas a natureza e a gravidade do ato

ímprobo, levando-se em conta os danos causados ao erário, a capacidade

econômica do agente e sua conduta, entre outros.

A perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, por

sua vez, também atingirá o direito de propriedade do agente que causou prejuízo à

Administração Pública. Para tanto, é necessário comprovar o nexo de causalidade

entre a aquisição indevida do bem e o exercício da função pública.

A proibição de contratar com o Poder Público irá limitar a atividade

profissional do agente ímprobo. Esta penalidade, contudo, não poderá ser eterna,

deverá ter um tempo máximo de duração, sob pena de violação ao artigo 5°, incisos

XLVI, alínea “ e” e XLVII, alínea b, da Constituição Federal de 1988.

Ao analisar os incisos do artigo 12 da lei n° 8.429/92 percebe-se que as

penas encontram-se escalonadas de acordo com a gravidade de cada uma das

modalidades de ato ímprobo correspondente.

No entanto, notória é a polêmica em torno da aplicabilidade das penas

constantes no artigo em questão. A leitura do dispositivo leva a conclusão de que as

penas obrigatoriamente devem ser aplicadas de forma cumulativa.

Contudo, é necessário observar os princípios da proporcionalidade e da

razoabilidade na interpretação e na aplicação das penalidades previstas. Isto porque

esta aplicação dependerá da análise da conduta do agente caso a caso. A pena

deve ser prudente e adequadamente aplicada.

A este respeito, vale lembrar os ensinamentos de Marcelo Figueiredo:

“Ainda aqui, mostra-se adequado o estudo a

respeito do princípio da proporcionalidade, a

fim de verificarmos a relação de adequação

entre a conduta do agente e sua penalização. É

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82

dizer, ante a ausência de dispositivo expresso

que determine o abrandamento ou a escolha

das penas qualitativa e quantitativamente

aferidas, recorre-se ao princípio geral da

razoabilidade, ínsito à jurisdição (acesso à

Justiça e seus corolários). Deve o Judiciário,

chamado a aplicar a lei, analisar amplamente a

conduta do agente público em face da lei e

verificar qual das penas é mais adequado, em

face do caso concreto. Não se trata de escolha

arbitrária, porém legal.”55.

Ou seja, o agente ímprobo pode sofrer cominações nas esferas penal,

civil e administrativa. Sendo este punido com a perda do cargo na esfera

administrativa e tal decisão já se tomou definitiva, não se cogitará de aplicá-la no

processo judicial.

Desta forma, o judiciário poderá deixar de aplicar uma ou outra das

sanções previstas no artigo 12 da Lei de Improbidade, valendo-se assim da

discricionariedade.

55 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 219.

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83

CAPÍTULO IV

A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Sumário: 4.1 Introdução 4.2 Princípios

constitucionais de acordo com a EC 19/98 4.3

Princípios constitucionais explícitos 4.3.1

Princípio da impessoalidade 4.3.2 Princípio da

moralidade 4.3.3 Princípio da publicidade 4.3.4

Princípio da eficiência 4.4 Outros princípios

explícitos 4.4.1 Princípio da licitação 4.4.2

Princípio da responsabilidade 4.4.3 Princípio da

participação 4.4.4 Princípio da autonomia

gerencial 4.5 Princípios constitucionais

implícitos 4.5.1 Princípio da supremacia do

interesse público sobre o privado 4.5.2

Princípio da finalidade 4.5.3 Princípio da

razoabilidade e da proporcionalidade.

4.1 Introdução

A denominada função administrativa do Estado submete-se a um especial

regime jurídico. Trata-se do denominado regime de direito público ou regime jurídico-

administrativo. Sua característica essencial reside, de um lado, na admissibilidade

da idéia de que a execução da lei por agentes públicos exige o deferimento de

necessárias prerrogativas de autoridade, que façam com que o interesse público

juridicamente predomine sobre o interesse privado; e de outro, na formulação de que

o interesse público não pode ser livremente disposto por aqueles que, em nome da

coletividade, recebem o dever-poder de realizá-los. Consiste, na verdade, no regime

jurídico decorrente da conjugação de dois princípios básicos: o princípio da

supremacia dos interesses públicos e o da indisponibilidade dos interesses públicos.

Neste sentido, temos o ilustre posicionamento de CARDOZO:

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84

"Estes, são princípios gerais, necessariamente

não positivados de forma expressa pelas

normas constitucionais, mas que consistem nos

alicerces Jurídicos do exercício da função

administrativa dos Estados. Todo o

exercício da função administrativa, direta ou

indiretamente, será sempre por eles

influenciado e governado"56.

Tomando o conceito de Administração Pública em seu sentido orgânico,

isto é, no sentido de conjunto de órgãos e pessoas destinados ao exercício da

totalidade da ação executiva do Estado, a nossa Constituição Federal positivou os

princípios gerais norteadores da totalidade de suas funções, considerando todos os

entes que integram a Federação brasileira (União, Estados, Distrito Federal e

Municípios).

Destarte, os princípios inerentes à Administração Pública são aqueles

expostos no art. 37 de nossa vigente Constituição. Alguns, diga-se de pronto, foram

positivados de forma expressa. Outros, de forma implícita ou tácita.

Antes de procedermos à ànalise de cada um dos princípios que regem o

Direito Administrativo, cabe novamente acentuar que estes princípios se constituem

mutuamente e não se excluem, não são jamais eliminados do ordenamento jurídico.

Destacam-se ainda as suas funções programáticas, fornecendo as diretrizes

situadas no ápice do sistema, a serem seguidas por todos os aplicadores do direito.

4.2 Princípios constitucionais de acordo com a EC 19/98

Mais uma vez, cumpre distinguir o que é Administração Pública. Assim

MEIRELLES elabora o seu conceito:

"Em sentido formal, a Administração Publica é

o conjunto de órgãos instituídos para

56 CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios constitucionais da administração pública, São Paulo: Atlas, 1999, p. 113

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85

consecução dos objetivos do Governo; em

sentido material é o conjunto das funções

necessárias aos serviços públicos em geral; em

acepção operacional é os desempenhos

perenes e sistemáticos, legais e técnicos, dos

serviços do próprio Estado ou por ele

assumidos em benefício da coletividade. Numa

visão global, a Administração Pública é, pois,

todo o aparelhamento do Estado preordenado

à realização de seus serviços, visando à

satisfação das necessidades coletivas"57.

A Administração Pública, ainda, pode ser classificada como: direta e

indireta. A Direta é aquela exercida pela administração por meio dos seus órgãos

internos (presidência e ministros). A Indireta é a atividade estatal entregue a outra

pessoa jurídica (autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista,

fundações), que foram surgindo através do aumento da atuação do Estado.

A Constituição Federal, no art. 37, caput, trata dos princípios inerentes à

Administração Pública:

"Administração Pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados,

do Distrito Federai e dos Municípios obedecerá

aos princípios da legalidade,

impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência”

Trata-se, portanto, de princípios incidentes não apenas sobre os órgãos

que integram a estrutura central do Estado, incluindo-se aqui os pertencentes aos

três Poderes (Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário), mas também

de preceitos genéricos igualmente dirigidos aos entes que em nosso país integram a

57 MEIRELLES, Hely Lopes. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: RT 1996, P. 118.

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denominada Administração Indireta, ou seja, autarquias, as empresas públicas, as

sociedades de economia mista e as fundações governamentais ou estatais (4).

Destarte, os princípios explicitados no caput do art. 37 são, portanto, os

da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

Outros se extraem dos incisos e parágrafos do mesmo artigo, como o da licitação, o

da prescritibilidade dos ilícitos administrativos e o da responsabilidade das pessoas

jurídicas (inc. XXI e §§ 1.° a 6.°). Todavia, há ainda outros princípios que estão no

mesmo artigo só que de maneira implícita, como é o caso do princípio da

supremacia do interesse público sobre o privado, o da finalidade, o da razoabilidade

e proporcionalidade.

Vejamos, agora, o significado de cada um dos precitados princípios

constitucionais da Administração Pública.

4.3 Princípios constitucionais explícitos

Conforme mencionada anteriormente, os princípios constitucionais

explícitos são aqueles presentes no art. 37, da Constituição Federal, de maneira

expressa. Assim, são eles: o princípio da legalidade, o princípio da impessoalidade,

o princípio da moralidade, o princípio da publicidade e o princípio da eficiência.

Passemos, então, a estudá-los uniformemente.

Referido como um dos sustentáculos da concepção de Estado de Direito

e do próprio regime jurídico-administrativo, o princípio da legalidade vem definido no

inciso II do art. 5.° da Constituição Federal quando nele se faz declarar que:

"ninguém será obrigado a fazer ou deixar de

fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

Desses dizeres decorre a idéia de que apenas a lei, em regra, pode

introduzir inovações primárias, criando novos direitos e novos deveres na ordem

jurídica como um todo considerado.

No campo da administração Pública, como unanimemente reconhecem os

constitucionalistas e os administrativistas, afirma-se de modo radicalmente diferente

a incidência do princípio da legalidade. Aqui, na dimensão dada pela própria

indisponibilidade dos interesses públicos, diz-se que o administrador, em

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cumprimento “ao princípio da legalidade,” só pode atuar nos termos estabelecidos

pela lei. Não pode este por atos administrativos de qualquer espécie (decreto,

portaria, resolução, instrução, circular etc.) proibir ou impor comportamento a

terceiro, se o ato legislativo não fornecer, em boa dimensão jurídica, amparo a essa

pretensão. A lei é seu único e definitivo parâmetro.

Temos, pois, que, enquanto no mundo privado se coloca como apropriada

à afirmação de que o que não é proibido é permitido, no mundo público assume-se

como verdadeira a idéia de que a Administração só pode fazer o que a lei

antecipadamente autoriza.

Deste modo, a afirmação de que a Administração Pública deve atender à

legalidade em suas atividades implica a noção de que a atividade administrativa é a

desenvolvida em nível imediatamente infralegal, dando cumprimento às disposições

da lei. Em outras palavras, a função dos atos da Administração é a realização das

disposições legais, não lhe sendo possível, portanto, a inovação do ordenamento

jurídico, mas tão só a concretização de presságios genéricos e abstratos

anteriormente firmados pelo exercente da função legislativa.

Sobre o tema, vale trazer a ponto a seguinte preleção de MELLO:

“Para avaliar corretamente o princípio da

legalidade e captar-lhe o sentido profundo

cumpre atentar para o fato de que ele é a

tradução jurídica de um propósito político: o de

submeter os exercentes do poder em concreto

- administrativo.

- a um quadro normativo que embargue

favoritismos, perseguições ou desmandos.

Pretende-se através da norma geral, abstraía e

impessoal, a lei, editada pelo Poder Legislativo

- que é o colégio representativo de todas as

tendências (inclusive minoritárias) do corpo

social.

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- garantir que a atuação do Executivo nada

mais seja senão a concretização da vontade

geral"58.

De tudo isso podemos extrair uma Importante conclusão. Contrariamente

ao que ocorre em outros ordenamentos jurídicos, inexiste qualquer possibilidade de

ser juridicamente aceita, entre nós, a edição dos denominados decretos ou

regulamentos "autônomos ou independentes". Como se sabe, tais decretos ou

regulamentos não passam de atos administrativos gerais e normativos baixados pelo

chefe do Executivo, com o assumido objetivo de disciplinar situações anteriormente

não reguladas em lei. E, sendo assim, sua prática encontra óbice intransponível no

modus constitucional pelo qual se fez consagrar o princípio da legalidade em nossa

Lei Maior.

Regulamento, em nosso país, portanto, haverá de ser sempre o

regulamento de uma lei, ou de dispositivos legais objetivamente existentes. Qualquer

tentativa em contrário haverá de ser tida como manifestamente inconstitucional.

4.3.1 Princípio da impessoalidade

O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública pode

ser definido como aquele que determina que os atos realizados pela Administração

Pública, ou por ela delegados, devam ser sempre imputados ao ente ou órgão em

nome do qual se realiza, e ainda destinados genericamente à coletividade, sem

consideração, para fins de privilegiamento ou da imposição de situações restritivas,

das características pessoais daqueles a quem porventura se dirija. Em síntese, os

atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica

mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário.

A mera leitura dessa definição bem nos revela que esse princípio pode

ser decomposto em duas perspectivas diferentes: a impessoalidade do

administrador quando da prática do ato e a impessoalidade do próprio administrado

como destinatário desse mesmo ato.

58 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, Atlas, 2001, p. 347

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Com efeito, de um lado, o princípio da impessoalidade busca assegurar

que, diante dos administrados, as realizações administrativo-governamentais não

sejam propriamente do funcionário ou da autoridade, mas exclusivamente da

entidade pública que a efetiva. Custeada com dinheiro público, a atividade da

Administração Pública jamais poderá ser apropriada, para quaisquer fins, por aquele

que, em decorrência do exercício funcional, se viu na condição de executá - lá. É,

por excelência, impessoal, unicamente imputável à estrutura administrativa ou

governamental incumbida de sua prática, para todos os fins que se fizerem de

direito.

Assim, como exemplos de violação a esse princípio, dentro dessa

particular acepção examinada, podemos mencionar a realização de publicidade ou

propaganda pessoal do administrador com verbas públicas ou ainda, a edição de

atos normativos com o objetivo de conseguir benefícios pessoais.

No âmbito dessa particular dimensão do princípio da impessoalidade, é

que está o elemento diferenciador básico entre esse princípio e o da isonomia. Ao

vedar o tratamento desigual entre iguais, a regra isonômica não abarca, em seus

direitos termos, a idéia da imputabilidade dos atos da Administração ao ente ou

órgão que a realiza, vedando, como decorrência direta de seus próprios termos, e

em toda a sua extensão, a possibilidade de apropriação indevida desta por agentes

públicos. Nisso, reside à diferença jurídica entre ambos.

Já, por outro ângulo de visão, o princípio da impessoalidade deve ter sua

ênfase não mais colocada na pessoa do administrador, mas na própria pessoa do

administrado. Passa a afirmar-se como uma garantia de que este não pode e não

deve ser favorecido ou prejudicado, no exercício da atividade da Administração

Pública, por suas exclusivas condições e características.

Jamais poderá, por conseguinte, um ato do Poder Público, ao menos de

modo adequado a esse princípio, vir a beneficiar ou a impor sanção a alguém em

decorrência de favoritismos ou de perseguição pessoal. Todo e qualquer

administrado deve sempre relacionar-se de forma impessoal com a Administração,

ou com quem em seu nome atue, sem que suas características pessoais, sejam elas

quais forem, possam ensejar predileções ou discriminações de qualquer natureza.

Será, portanto, tida como manifestadamente violadora desse princípio,

nessa dimensão, por exemplo, o favorecimento de parentes e amigos (nepotismo), a

tomada de decisões administrativas voltadas à satisfação da agremiação partidária

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ou facção política a que se liga o administrador (partidarismo), ou ainda de atos

restritivos ou sancionadores que tenham por objetivo a vingança pessoal ou a

perseguição política pura e simples (desvio de poder).

Dessa perspectiva, o princípio da impessoalidade insere-se por inteiro no

âmbito do conteúdo jurídico do princípio da isonomia, bem como no do próprio

princípio da finalidade.

Perfilhando este entendimento, sustenta MELLO:

"No princípio da impessoalidade se traduz à

idéia de que a Administração tem que tratar a

todos os administrados sem discriminações,

benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo

nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou

animosidades pessoais, políticas ou

ideológicas não podem interferir na atuação

administrativa e muito menos interesses

sectários, de facções ou grupos de qualquer

espécie. O princípio em causa é senão o

próprio princípio da igualdade ou isonomia"59.

4.3.2 Princípio da moralidade

Já na Antiguidade se formulava a idéia de que as condições morais

devem ser tidas como uma exigência impostergável para o exercício das atividades

de governo. Segundo informam os estudiosos, seria de Sólon a afirmação de que

um "homem desmoralizado não poderá governar”.

Todavia, foi neste século, pelos escritos de Hauriou, que o princípio da

moralidade, de forma pioneira, se fez formular no campo da ciência jurídica, capaz

de fornecer, ao lado da noção de legalidade, o fundamento para a invalidação de

seu ato pelo vício denominado desvio de poder. Essa moralidade jurídica, a seu ver,

59 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 2001, P. 189.

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deveria ser entendida como um conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina

interior da própria Administração, uma vez que ao agente público caberia também

distinguir o honesto do desonesto, a exemplo do que faz entre o legal e o ilegal, o

justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno. Afinal,

pondera, como já proclamavam os romanos "nem tudo que é legal é honesto".

Hoje, por força da expressa inclusão do princípio da moralidade no caput

do art. 37, a ninguém será dado sustentar, em boa razão, sua não incidência

vinculante sobre todos os atos da Administração Pública. Ao administrador público

brasileiro, por conseguinte, não bastará cumprir os estritos termos da lei. Tem-se por

necessário que seus atos estejam verdadeiramente adequados à moralidade

administrativa, ou seja, a padrões éticos de conduta que orientem e balizem sua

realização. Se assim não for, inexoravelmente, haverão de ser considerados não

apenas como imorais, mas também como inválidos para todos os fins de direito.

Isto posto, CARDOZO fornece uma definição desse princípio, hoje

agasalhado na órbita jurídico-constitucional:

"Entende-se por princípio da moralidade a

nosso ver, aquele que determina que os atos

da Administração Pública devam estar

inteiramente conformados aos padrões éticos

dominantes na sociedade para a gestão dos

bens e interesses públicos, sob pena de

invalidade jurídica"60.

Admite o art. 5.°, LXXIII, da Constituição Federal que qualquer cidadão

possa ser considerado parte legítima para a propositura de ação popular que tenha

por objetivo anular atos entendidos como lesivos, entre outros, à própria moralidade

administrativa.

Por outra via, como forma de também fazer respeitar esse princípio, a

nossa Lei Maior trata também da improbidade administrativa.

60 CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios constitucionais da administração pública, São Paulo: Atlas, 1999, P. 117

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A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que

mereceu consideração especial pela Constituição, que pune o ímprobo com a

suspensão de direitos políticos (art. 37, §4.°).

Deste modo, conceitua CAETANO:

"A probidade administrativa consiste no dever

de “o funcionário servir à Administração

com honestidade, procedendo no exercício das

suas funções, sem aproveitar os poderes ou

facilidades delas decorrentes em proveito

pessoal ou de outrem a quem queira

favorecer"61.

A moralidade administrativa e assim também as probidades são tuteladas

pela ação popular, de modo a elevar a imoralidade à causa de invalidado do ato

administrativo. A improbidade é tratada ainda com mais rigor, porque entra no

ordenamento constitucional como causa de suspensão dos direitos políticos do

ímprobo (art. 15, V), conforme estatui o art. 37, § 4.°, in verbis: “Os atos de

improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da

função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e

gradação previstas em lei, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, podendo vir a

configurar a prática de crime de responsabilidade (art. 85, V)”.

Dessa forma, o desrespeito à moralidade, entre nós, não se limita apenas

a exigir a invalidação - por via administrativa ou judicial - do ato administrativo

violador, mas também a imposição de outras conseqüências sancionadoras

rigorosas ao agente público responsável por sua prática.

61 CAETANO, Marcello. Manual de direito administrativo, Rio de Janeiro: Forense 1990, P. 228.

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4.3.3 Princípio da publicidade

A publicidade sempre foi tida como um princípio administrativo, porque se

entende que o Poder Público, por seu público, deve agir com a maior transparência

possível, a fim de que os administrados tenham, a toda hora, conhecimento do que

os administradores estão fazendo.

Além do mais, seria absurdo que um Estado como o brasileiro, que, por

disposição expressa de sua Constituição, afirma que todo poder nele constituído

"emana do povo" (art. 1.°, parágrafo único, da CF), viesse a ocultar daqueles em

nome dos quais esse mesmo poder é exercido informações e atos relativos à gestão

da res publica e as próprias linhas de direcionamento governamental. É por isso que

se estabelece, como imposição jurídica para os agentes administrativos em geral, o

dever de publicidade para todos os seus atos.

Perfilhando esse entendimento, CARDOZO define este princípio:

"Entende-se princípio da publicidade, assim,

aquele que exige, nas formas admitidas em

Direito, e dentro dos limites constitucionalmente

estabelecidos, a obrigatória divulgação dos

atos da Administração Pública, com o objetivo

de permitir seu conhecimento e controle pelos

órgãos estatais competentes e por toda a

sociedade"62.

A publicidade, contudo, não é um requisito de forma do ato administrativo,

"não é elemento formativo do ato; é requisito de eficácia e moralidade. Por isso

mesmo os atos irregulares não se convalidam com a publicação, nem os regulares a

dispensam para sua exeqüibilidade, quando a lei ou o regulamento a exige".

No que tange à forma de se dar publicidade aos- atos da Administração,

tem-se afirmado que ela poderá dar-se tanto por meio da publicação do ato, como

62 CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios constitucinais da administração pública, São Paulo: Atlas, 1999, p. 179

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por sua simples comunicação a seus destinatários.

É relevante observar, todavia, que também a publicação como as

comunicações não implicam que o dever de publicidade apenas possa vir a ser

satisfeito pelo comprovado e efetivo conhecimento de fato do ato administrativo por

seus respectivos destinatários. Deveras, basta que os requisitos exigidos para a

publicidade se tenham dado, nos termos previstos na ordem jurídica; e para o

mundo do Direito não interessará se na realidade fática o conhecimento da

existência do ato e de seu conteúdo tenha ou não chegado à pessoa atingida por

seus efeitos. Feita a publicação ou a comunicação dentro das formalidades devidas,

haverá sempre uma presunção absoluta da ciência do destinatário, dando-se por

satisfeita a exigência de publicidade. Salvo, naturalmente, se as normas vigentes

assim não determinarem.

Assim, se a publicação feita no Diário Oficiai foi lida ou não, se a

comunicação protocolada na repartição competente chegou ou não às mãos de

quem de direito, se o telegrama regularmente - recebido na residência do

destinatário chegou faticamente a suas mãos ou se eventualmente foi extraviado por

algum familiar, isto pouco ou nada importa se as formalidades legais exigidas foram

inteiramente cumpridas no caso.

Nesse sentido, afirma MELLO:

"O conhecimento do ato é um plus em relação

à publicidade, sendo juridicamente

desnecessário para que este se repute como

existente (...). Quando prevista a publicação do

ato (em Diário Oficial), na porta das repartições

(por afixação no local de costume), pode

ocorrer que o destinatário não o lera, não o

veja ou, por qualquer razão, dele não tome

efetiva ciência. Não importa. Ter-se-á cumprido

o que de direito se exigia para a publicidade, ou

seja, para a revelação do ato"63.

63 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 348

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Caberá à lei indicar, pois, em cada caso, a forma adequada de se dar à

publicidade aos atos da Administração Pública. Normalmente, esse dever é satisfeito

por meio da publicação em órgão de imprensa oficial da Administração, entendendo-

se com isso não apenas os Diários ou Boletins Oficiais das entidades públicas, mas

também - para aquelas unidades da Federação que não possuírem tais periódicos -

os jornais particulares especificamente contratados para o desempenho dessa

função, ou outras excepcionais formas substitutivas, nos termos das normas legais e

administrativas locais.

Observe-se, porém, ser descabido, para fins do atendimento de tal dever

jurídico, como bem registrou Hely Lopes Meirelles, sua divulgação por meio de

outros órgãos de imprensa não escritos, como a televisão e o rádio, ainda que em

horário oficial, em decorrência da própria falta de segurança jurídica que tal forma de

divulgação propiciaria, seja em relação à existência, seja em relação ao próprio

conteúdo de tais atos.

Observe-se ainda que, inexistindo disposição normativa em sentido

oposto, tem-se entendido que os atos administrativos de efeitos internos à

Administração não necessitam ser publicado para que tenham por atendido seu

dever de publicidade. Nesses casos, seria admissível, em regra, a comunicação aos

destinatários. O dever de publicação recairá, assim, exclusivamente sobre os atos

administrativos que atingem a terceiros, ou seja, aos atos externos.

Temos, pois, que as formas pelas quais se pode dar publicidade aos atos

administrativos, nos termos do princípio constitucional em exame, serão

diferenciadas de acordo com o que reste expressamente estabelecido no Direito

Positivo, e em sendo omisso este, conforme os parâmetros estabelecidos na teoria

geral dos atos administrativos.

No que tange ao direito à publicidade dos atos administrativos, ou mais

especificamente, quanto ao direito de ter-se ciência da existência e do conteúdo

desses atos, é de todo importante observar-se que ele não se limita aos atos já

publicados, ou que estejam em fase de imediato aperfeiçoamento pela sua

publicação. Ele se estende, indistintamente, a todo o processo de formação do ato

administrativo, inclusive quanto a atos preparatórios de efeitos internos, como

despachos administrativos intermediários, manifestações e pareceres.

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É assim que se costuma dizer que constituem desdobramentos do

princípio da publicidade o direito de receber dos órgãos públicos informações de seu

interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral (art. 5.°, XXXIII, da CF), o

direito à obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e

esclarecimento de situações de interesse pessoal (art. 5.°, XXXIV, da CF), e.

naturalmente, o direito de acesso dos usuários a registros administrativos e atos de

governo (art. 37, § 3.°, II, da CF). Evidentemente, uma vez violados esses direitos

pelo poder público, poderão os prejudicados, desde que atendidos os pressupostos

constitucionais e legais exigidos para cada caso, valerem-se do hábeas data (art.

5.°, LXXII, da CF), do mandado de segurança (art. 5.°, LXX, da CF), ou mesmo das

vias ordinárias.

É de ponderar, contudo, que os pareceres só se tornam públicos após

sua aprovação final pela autoridade competente; enquanto em poder do parecerista

ainda é uma simples opinião que pode não se tornar definitiva. As certidões,

contudo, não são elementos da publicidade administrativa, porque se destinam a

interesse particular do requerente; por isso a Constituição só reconhece esse direito

quando são requeridas para defesa de direitos e esclarecimentos de situações de

interesse pessoal (art. 5.°, XXXIV, b).

É forçoso reconhecer, todavia, a existência de limites constitucionais ao

princípio da publicidade. De acordo com nossa Lei Maior, ele Jamais poderá vir a ser

compreendido de modo a que propicie a violação da intimidade, da vida privada, da

honra e da imagem das pessoas (art. 5.°, X, c/c. Art. 37, § 3.°, l, CF), do sigilo da

fonte quando necessário ao exercício profissional (art. 5.°, XIV, da CF), ou com

violação de sigilo tido como imprescindível à segurança da sociedade e do Estado

(art. 5.°, XXXIII, c/c. Art. 37, § 3.°, II, da CF).

Para finalizar, faz-se de extrema importância, perceber-se que o problema

da publicidade dos atos administrativos, nos termos do caput do art. 37 da

Constituição da República, em nada se confunde com o problema da divulgação ou

propaganda dos atos e atividades do Poder Público pelos meios de comunicação de

massa, também chamado - em má técnica — de “publicidade" pelo § 4.° desse

mesmo artigo. Uma coisa é a publicidade jurídica necessária para o aperfeiçoamento

dos atos, a se dar nos termos definidos anteriormente. Outra bem diferente é a

"publicidade" como propaganda dos atos de gestão administrativa e governamental.

A primeira, como visto, é um dever constitucional sem o qual, em regra, os atos não

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serão dotados de existência jurídica. A segunda é mera faculdade da Administração

Pública, a ser exercida apenas nos casos previstos na Constituição e dentro das

expressas limitações constitucionais existentes.

Assim, afirma o § 1.° do art. 37:

"a publicidade dos atos, programas, obras,

serviços a campanhas dos órgãos públicos

deverá ter caráter educativo, informativo ou de

orientação social, dela não podendo constar

nomes, símbolos ou imagens que caracterizem

promoção pessoal de autoridades ou

servidores públicos"

Com isso, pretende esse dispositivo restringir de maneira clara a ação da

Administração Pública, direta e indireta, quanto à divulgação de seus atos de gestão

pelos meios de comunicação de massa. Inexistindo, na propaganda governamental,

o caráter estritamente educativo, informativo ou de orientação social, ou vindo dela

constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção de agentes

públicos, sua veiculação se dará em manifesta ruptura com a ordem jurídica vigente,

dando ensejo à responsabilização daqueles que a propiciaram.

4.3.4 Princípio da eficiência

O princípio da eficiência, outrora implícito em nosso sistema

constitucional, tornou-se expresso no caput do art. 37, em virtude de alteração

introduzida pela Emenda Constitucional nº 19.

É evidente que um sistema- balizado pelos princípios da moralidade de

um lado, e da finalidade, de outro, não poderia admitir a ineficiência administrativa.

Bem por isso, a Emenda nº 19, no ponto, não trouxe alterações no regime

constitucional da Administração Pública, mas, como dito, só explicitou um comando

até então implícito.

Eficiência não é um conceito jurídico, mas econômico. Não qualifica

normas, qualifica atividades. Numa idéia muito geral, eficiência significa fazer

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acontecer com racionalidade, o que implica medir os custos que a satisfação das

necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado. Assim,

o princípio da eficiência, orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir

os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo.

Rege-se, pois, pela regra de consecução do maior benefício com o menor custo

possível.

Discorrendo sobre o tema, sumaria MEIRELLES:

"Dever de eficiência é o que se impõe a todo

agente público de realizar suas atribuições com

presteza, perfeição e rendimento funcional. É o

mais moderno princípio da função

administrativa, que Já não se contenta em ser

desempenhada apenas com legalidade,

exigindo resultados positivos para o serviço

público e satisfatório atendimento das

necessidades da comunidade e de seus

membros"64.

De início, parece de todo natural reconhecer que a idéia de eficiência

jamais poderá ser atendida, na busca do bem comum imposto por nossa Lei Maior,

se o poder Público não vier, em padrões de razoabilidade, a aproveitar da melhor

forma possível todos os recursos humanos, materiais, técnicos e financeiros

existentes e colocados a seu alcance, no exercício regular de suas competências.

Neste sentido, observa CARDOZO:

"Ser eficiente, portanto, exige primeiro da

Administração Pública o aproveitamento

máximo de tudo aquilo que a coletividade

64 MEIRELLES, Hely Lopes. Curso de Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: RT, 1996, p. 531

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possui, em todos os níveis, ao longo da

realização de suas atividades. Significa

racionalidade e aproveitamento máximo das

potencialidades existentes. Mas não só. Em

seu sentido jurídico, a expressão, que

consideramos correta, também deve abarcar a

idéia de eficácia da prestação, ou. de

resultados da atividade realizada. Uma atuação

estatal só será juridicamente eficiente quando

seu resultado quantitativo e qualitativo for

satisfatório, levando-se em conta o universo

possível de atendimento das necessidades

existentes e os meios disponíveis"65.

Tem-se, pois, que a idéia de eficiência administrativa não deve ser

apenas limitada ao razoável aproveitamento dos meios e recursos colocados à

disposição dos agentes públicos. Deve ser construída também pela adequação

lógica desses meios razoavelmente utilizados aos resultados efetivamente obtidos, e

pela relação apropriada desses resultados com as necessidades públicas existentes.

Estará, portanto, uma Administração buscando agir de modo eficiente

sempre que, exercendo as funções que lhe são próprias, vier a aproveitar da forma

mais adequada o que se encontra disponível (ação instrumental eficiente), visando

chegar ao melhor resultado possível em relação aos fins que almeja alcançar

(resultado final eficiente).

Desse teor, o escólio de CARDOZO:

"Desse modo, pode-se definir esse princípio

como sendo aquele que determina aos órgãos

e pessoas da Administração Direta e Indireta

que, na busca das finalidades estabelecidas

65 CARDOZO, José Eduardo Martins, Princípios Constitucionais da Administração Pública, São Paulo: Atlas, 1999, 191.

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pela ordem jurídica, tenham umas ações

instrumentais adequadas, constituídas pelo

aproveitamento maximizado e racional dos

recursos humanos, materiais, técnicos e

financeiros disponíveis, de modo que possa

alcançar o melhor resultado quantitativo e

qualitativo possível, em face das necessidades

públicas existentes"66.

Seguindo essa linha de orientação, temos que, como desdobramento do

princípio em estudo, a Constituição procurou igualmente reforçar o sentido valorativo

do princípio da economicidade, que, incorporado literalmente pelo art. 70, caput, da

Carta Federal, nada mais traduz do que o dever de eficiência do administrador na

gestão do dinheiro público.

4.4 Outros princípios explícitos

4.4.1 Princípio da licitação

Licitação é um procedimento administrativo destinado a provocar

propostas e a escolher proponentes de contratos de execução de obras, serviços,

compras ou de alienações do Poder Público.

A Administração Pública tem o dever de sempre buscar, entre os

interessados em com ela contratar, a melhor alternativa disponível no mercado para

satisfazer os interesses públicos, para que possa agir de forma honesta, ou

adequada ao próprio dever de atuar de acordo com padrões exigidos pela probidade

administrativa. De outro lado, tem o dever de assegurar verdadeira igualdade de

oportunidades, sem privilegiamentos ou desfavorecimentos injustificados, a todos os

administrados que tencionem com ela celebrar ajustes negociais.

É dessa conjugação de imposições que nasce o denominado princípio da

licitação. Consoante, CARDOZO define este princípio:

66 CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios Constitucionais da Administração Pública, 1999, p. 191.

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“De forma sintética, podemos defini-lo como

sendo aquele que determina como regra o

dever jurídico da Administração de celebrar

ajustes negociais ou certos atos unilaterais

mediante prévio procedimento administrativo

que, por meios de critérios preestabelecidos,

públicos e isonômicos, possibilite a escolha

objetiva da melhor alternativa existente entre as

propostas ofertadas pelos interessados.”67.

O art. 37, XXI, alberga o princípio nos termos seguintes:

"Ressalvados os casos especificados na

legislação, as obras, serviços, compras e

alienações serão contratados mediante

processo de licitação pública que assegure

igualdade de condições a todos os

concorrentes, com cláusulas que estabeleçam

obrigações de pagamento, mantidas as

condições efetivas da proposta, nos termos da

lei, o qual permitirá as exigências de

qualificação técnica e econômica

indispensáveis à garantia do cumprimento das

obrigações".

Temos, assim, o dever de licitar afirmado como um imperativo

constitucional imposto a todos os entes da Administração Pública, na conformidade

do que vier estabelecido em lei. A ressalva inicial possibilita à lei definir hipóteses

específicas de inexigibilidade e de dispensa de licitação.

Porém, cumpre ressaltar, finalmente, que a licitação é um procedimento

vinculado, ou seja, formalmente regulado em lei, cabendo à União legislar sobre

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normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para a

Administração Pública, direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e

mantidas pelo Poder Público, nas diversas esferas de governo, e empresas sob seu

controle (art. 22, XXVII). Portanto, aos Estados, Distrito Federal e Municípios

compete legislar suplementarmente sobre a matéria no que tange ao interesse

peculiar de suas administrações.

4.4.2 Princípio da responsabilidade

O princípio em estudo encontra amparo no art. 37, § 6.°, da Constituição

Federal, cuja compostura verifica-se que:

"As pessoas jurídicas de direito público e as de

direito privado prestadoras de serviços públicos

responderão pelos danos que seus agentes,

nessa qualidade, causarem a terceiros,

assegurado o direito de regresso contra o

responsável nos casos de dolo ou culpa”

Assim, de imediata leitura desse texto resulta claro que todo agente

público que vier a causar um dana a alguém trará para o Estado o dever Jurídico de

ressarcir esse dano. Não importará se tenha agido com culpa ou dolo. O dever de

indenizar se configurará pela mera demonstração do nexo causal existente entre o

fato ocorrido e o dano verificado.

Destarte, a obrigação de indenizar é a da pessoa Jurídica a que pertence

o agente. O prejudicado terá que mover a ação de indenização contra a Fazenda

Pública respectiva ou contra a pessoa Jurídica privada prestadora de serviço

público, não contra o agente causador do dano. O princípio da impessoalidade vale

aqui também.

Impede ressalvar, todavia, que nem sempre as pessoas que integram a

Administração Pública encontram-se a exercer propriamente função pública. Por

vezes, no âmbito do que admite nossa Constituição, será possível encontrarmos

67 CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios Constitucionais da Administração Pública, São Paulo: Atlas, 1999, p. 202.

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pessoas da Administração Indireta que não estejam exercendo tais tipos de

atividades, como é o caso, por exemplo, das empresas públicas e das sociedades

de economia mista para o exercício de atividade econômica (art. 173, da CF).

Nesses casos, naturalmente, eventuais danas- par essas empresas causados a

terceiros haverão de ser regrados pela responsabilidade subjetiva, nos termos

estabelecidos pela legislação civil. Exigirão, em princípio, a configuração da ação

dolosa ou culposa (negligente, imprudente ou imperita), para que tenha nascimento

o dever de indenizar.

O mesmo se poderá dizer, ainda, do agente que vier a causar dano

alguém fora do exercício da função pública. Nesse caso, por óbvio, não haverá de

ser configurada a responsabilidade objetiva predefinida no art. 37, § 6.°, de nossa

Lei Maior.

Entretanto, como pontifica MELLO:

“A responsabilidade objetiva só está

consagrada constitucionalmente para atos

comissivos do Estado, ou seja, para

comportamentos positivos- dele. Isto porque o

texto menciona “danos que seus agentes

causarem”; Assim, sendo condutas omissivas

só podem gerar responsabilidade ao Poder

Público quando demonstrada a culpa do

serviço”68.

No mais, é importante ressalvar que, embora a responsabilidade civil do

Estado para com os administradores seja objetiva, a responsabilidade dos agentes

públicos perante a Administração Pública é individuosamente subjetiva. Como

observa-se pelos próprios termos do citado art. 37, § °, o direito de regressa que

pode ser exercido contra aquele que causou o dano apenas se configurará "nos

casos de dolo ou culpa".

68 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 339.

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4.4.3 Princípio da participação

O princípio da participação do usuário na Administração Pública foi

introduzido pela EC-19/98, com o novo enunciado do § 3.° do art. 37, que será

apenas reproduzido devido à sua efetivação ser dependente de lei.

Diz o texto:

"Art. 37, § 3.° A lei disciplinará as formas de

participação do usuário na administração

publica direta e indireta, regulando

especialmente:

l. - as reclamações relativas à prestação dos

serviços públicos em geral, asseguradas a

manutenção de serviços de atendimento ao

usuário e a avaliação periódica, externa e

interna, da qualidade dos serviços;

II - o acesso dos usuários a registros

administrativos e a informações sobre atos de

governo, observando o disposto no art. 5.°, X

(respeito à privacidade) e XXXIII (direito de

receber dos órgãos públicos informações de

seu interesse ou de interesse coletivo em

geral);

III - a disciplina da representação contra o

exercício negligente ou abusivo de cargo,

emprego ou função na administração pública."

4.4.4 Princípio da autonomia gerencial

O princípio da autonomia gerencial é regido pelo § 8.° do art. 37, da

Constituição Federal, introduzido pela EC - 19/98. Assim estabelece este dispositivo:

Art. 37, §- &.°. A Autonomia gerencial orçamentária e financeira dos

órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante

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contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por

objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei

dispor sobre:

“I – o prazo de duração do contrato;

II - os controles e critérios de avaliação de

desempenho, direitos, obrigações e

responsabilidade dos dirigentes;

III – a remuneração do pessoal.”

Desta maneira, cria-se aqui uma forma de contrato administrativo

inusitado entre administradores de órgãos do poder público com o próprio poder

público. Quanto ao contrato das entidades não há maiores problemas porque

entidades são órgãos públicos ou para-públicos (paraestatais) com personalidade

Jurídica de modo que têm a possibilidade de celebrar contratos e outros ajustes com

o poder público, entendido poder da administração centralizada. Mas, os demais

órgãos não dispõem de personalidade jurídica para que seus administradores

possam, em seu nome, celebrar contrato com o poder público, no qual se inserem.

Consoante, SILVA discorre a respeito:

"Tudo isso vai ter que ser definido pela lei

referida no texto. A lei poderá outorgar

aos administradores de tais órgãos uma

competência especial que lhes permita celebrar

o contrato, que talvez não passe de uma

espécie de acordo programa. Veremos como o

legislador ordinário vai imaginar isso."69.

69 SILVA, José Afonso da Silva. Ação popular constitucional: doutrina e processo, São Paulo: RT, 1968, p. 137.

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4.5 Princípios constitucionais implícitos

Além dos quatro citados princípios explicitamente abrigados pelo texto

constitucional, existem outros implicitamente agregados ao regramento

constitucional da Administração Pública. Vejamos:

4.5.1 Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Privado

A Administração Pública na prática de seus atos deve sempre respeitar a

lei e zelar para que o interesse público seja alcançado. Natural, assim, que sempre

que constate que um ato administrativo foi expedido em desconformidade com a lei,

OU que se encontra em rota de colisão com os interesses públicos, tenham os

agentes públicos a prerrogativa administrativa de revê-los, como uma natural

decorrência do próprio princípio da legalidade.

Desta maneira, discorre ARAÚJO:

"O princípio da supremacia do interesse público

sobre o privado, coloca os interesses da

Administração Pública em sobreposição aos

interesses particulares que com os dela

venham eventualmente colidir. Com

fundamento nesse princípio é que estabelece,

por exemplo, a auto tutela administrativa, vale

dizer, o poder da administração de anular os

atos praticados em desrespeito à lei, bem como

a prerrogativa administrativa de revogação de

atos administrativos com base em juízo

discricionário de conveniência e

oportunidade"70.

70 ARAÚJO, Marcos Valério de. O Tribunal de Contas da União e a República: uma análise de causas e efeitos. Revista do Tribunal de Contas da União, v. 21, nº 46, out/dez, 1990, p. 77

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A respeito, deve ser lembrada a Súmula 473 do Supremo Tribunal

Federal, quando afirma que:

"a administração pode anular os seus próprios

atos, quando eivados de vícios que os tornem

ilegais, porque deles não se originam direitos,

ou revogá-los, por motivo de conveniência e

oportunidade; respeitados os direitos adquirido

e ressalvada, em todos os casos, a apreciação

judicial”.

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4.5.2 Princípio da finalidade

Foi visto no exame do princípio da legalidade que a Administração Pública

só pode agir de acordo e em consonância com aquilo que, expressa ou tacitamente,

se encontra estabelecido em lei. Inegável, portanto, que sempre tenha dever

decorrente e implícito dessa realidade jurídica o cumprimento das finalidades

legalmente estabelecidas para sua conduta.

Disto deduz-se o denominado princípio da finalidade. Como bem observa

MELLO:

"Esse princípio impõe que o administrador, ao

manejar as competências postas a seu

encargo, alue com rigorosa obediência à

finalidade de cada qual. Isto é, cumpre-lhe

cingir-se não apenas à finalidade própria de

todas as leis, que é o interesse público, mas

também à finalidade específica obrigada na lei

a que esteja dando execução"71.

Enfim, o princípio da finalidade é aquele que imprime à autoridade

administrativa o dever de praticar o ato administrativo com vistas à realização da

finalidade perseguida pela lei.

Evidentemente, nessa medida, que a prática de um ato administrativo in

concreto com finalidade desviada do interesse público, ou fora da finalidade

específica da categoria tipológica a que pertence, implica vício ensejador de sua

nulidade. A esse vício, como se sabe, denomina a doutrina: desvio de poder, ou

desvio de finalidade.

Concluindo, essas considerações querem apenas mostrar que o princípio

da finalidade não foi desconsiderado pelo legislador constituinte, que o teve como

manifestação do princípio da legalidade, sem que mereça censura por isso.

71 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 345

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4.5.3 Princípio da razoabilidade e da proporcionalidade

Na medida em que o administrador público deva estrita obediência à lei

(princípio da legalidade) e tem como dever absoluto a busca da satisfação dos

interesses públicos (princípio da finalidade), há que se pressupor que a prática de

atos administrativos discricionários se processe dentro de padrões estritos de

razoabilidade, ou seja, com base em parâmetros objetivamente racionais de atuação

e sensatez.

Deveras, ao regular o agir da Administração Pública, não se pode supor

que o desejo do legislador seria o de alcançar a satisfação do interesse público pela

imposição de condutas bizarras, descabidas, despropositadas ou incongruentes

dentro dos padrões dominantes na sociedade e no momento histórico em que a

atividade normativa se consuma. Ao revés, é de se supor que a lei tenha a coerência

e a racionalidade de condutas como instrumentos próprios para a obtenção de seus

objetivos maiores.

Dessa noção indiscutível, extrai-se o princípio da razoabilidade: em boa

definição, é o princípio que determina à Administração Pública, no exercício de

faculdades, o dever de atuar em plena conformidade com critérios racionais,

sensatos e coerentes, fundamentados nas concepções sociais dominantes.

Perfilhando este entendimento, sustenta MELLO:

"Enuncia-se com este princípio que a

administração, ao atuar no exercício de

discrição, terá de obedecer a critérios

aceitáveis do ponto de vista racional, em

sintonia com o senso normal de pessoas

equilibradas e respeitosas das finalidades que

presidam a outorga da competência

exercida”72.

72 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 347

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A nosso ver, dentro do campo desse princípio, deve ser colocada, de que

diante do exercício das atividades estatais, o "cidadão tem o direito à menor

desvantagem possível". Com efeito, havendo a possibilidade de ação discricionária

entre diferentes alternativas administrativas, a opção por aquela que venha a trazer

consequências mais onerosas aos administrados é algo inteiramente irrazoável e

descabido.

Como desdobramento dessa idéia, afirma-se também o princípio da

proporcionalidade, por alguns autores denominado princípio da vedação de

excessos. Assim, pondera MELLO:

"Trata-se da idéia de que as consequências

administrativas só podem ser validamente

exercidas na extensão e intensidades

proporcionais ao que realmente seja

demandado para cumprimento da finalidade de

interesse público a que estão atreladas"73.

Em outras palavras: os meios utilizados ao longo do exercício da atividade

administrativa devem ser logicamente adequados aos fins que se pretendem

alcançar, com base em padrões aceitos pela sociedade e no que determina o caso

concreto.

Segundo STUMM, esse princípio reclama a certificação dos seguintes

pressupostos:

a. Conformidade ou adequação dos meios, ou

seja, o ato administrativo deve ser adequado

aos fins que pretende realizar;

b. Necessidade, vale dizer, possuindo o agente

público mais de um meio para atingir a mesma

finalidade, deve optar pelo menos gravoso à

esfera individual;

73 MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 351

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c. Proporcionalidade estrita entre o resultado

obtido e a carga empregada para a consecução

desse resultado.74

Por conseguinte, o administrador público não pode utilizar instrumentos

que fiquem aquém ou se coloquem além do que seja estritamente necessário para o

fiel cumprimento da lei.

Assim sendo, sempre que um agente público assumir conduta

desproporcional ao que lhe é devido para o exercício regular de sua competência,

tendo em vista as finalidades legais que tem por incumbência cumprir, poderá

provocar situação ilícita passível de originar futura responsabilidade administrativa,

civil e, sendo o caso, até criminal.

74 STUMM, Raquel Denize. Princípio da proporcionalidade no direito constitucional brasileiro, Porto Alegre: Livraria do advogado, 1995, p. 213

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CAPÍTULO V

A LÓGICA DO PODER

SUMÁRIO: 5.1 “AUCTORITAS’’ : UMA

INVENÇÃO ROMANA: A SEPARAÇÃO

ROMANA ENTRE PODER (POTESTAS) E

AUTORIDADE (AUCTORITAS) 5.2

SOBERANIA E VALIDADE NORMATIVA: A

CONSTRUÇÃO DO PODER NO ESTADO DE

DIREITO 5.3 PODER, CORRUPÇÃO E

PUBLICIDADE.

5.1 “AUCTORITAS:” Uma invenção romana: a separação entre poder (potestas) e

autoridade (auctoritas)

Para que exista poder, necessário e faz a existência de lei, tendo como

fundamento o conceito de validade. Para Bisol, este conceito “é uma depuração

unilateral e juridicista da idéia de soberania, onde o fenômeno do poder político

deixa de ser reconhecido como fundamento do direito”75.

Pela Peithó, como arte da persuassão inventada pelos gregos, que tinha

como pressuposto a igualdade dos participantes nas decisões políticas da pólis, não

tinham muito claro a questão da autoridade. Não havia, na grécia clássica, distinção

clara entre poder e autoridade. Coube aos romanos fazerem essa separação

levando-os a romperem o pressuposto da igualdade no exercício da liberdade

política. Sem destruir o espaço público criado pelos gregos, os romanos

estabeleceram a hierarquia pressuposta pela autoridade com a cisão entre

governantes e governados.

A palavra e o conceito de autoridade são de origem romana. Os gregos

desconheciam não só o conceito de autoridade como também o tipo de governo que

ela implica.

75 BISOL, Jairo. Tese de Doutoramento: O vazio e o inacabado da lei: para uma teoria fragmentária do direito, Brasília: 2004, pág. 161.

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Platão e Aristóteles, mesmo de forma diversa, mas a partir das mesmas

experiências políticas buscaram um modelo de autoridade a partir da vida pública da

Polis grega.

Platão não demorou a descrer da persuassão como instrumento de guia

dos homens. Essa desilusão veio logo após a morte de Sócrates. Para ele era

preciso algo que buscasse a compelí-los, mesmo sem o uso de meios externos de

violência.

Para Hannat Arendt, “a despeito da grandeza da filosofia política grega,

pode-se duvidar que ela tivesse perdido seu inerente caráter utópico se os romanos,

em sua infatigável procura pela tradição e autoridade, não houvessem decidido

encampá-la e reconhecê-la como autoridade suprema em todas as matérias de

teoria e de pensamento”76

A autoridade teve origem na experiência dos mais velhos. “Aqueles que

eram dotados de autoridade eram os anciãos, o senado ou os patres, os quais

obtinham por descendência e transmissão (tradição) daqueles que haviam lançado

as fundações de todas as coisas futuras, os antepassados chamados pelos romanos

de maiores”77

A igreja católica romana teve papel determinante na separação entre

poder e autoridade, por constituir-se como termo crucial da teoria politica.

O conceito político de autoridade foi amalgamado pela igreja católica a

partir da incorporação da filosofia grega na estrutura de suas doutrinas e crenças

dogmáticas.

“A autoridade em contraposição ao poder (potestas) tinha suas raízes no

passado, mas esse passado não era menos presente na vida real da cidade que o

poder e a força dos vivos”78.

A separação ente autoridade e poder deu-se efetivamente, no século V,

quando a igreja caminhou para a carreira política reivindicando para si o papela de

autoridade. Essa autoridade não poderia se sustentar sem a tríade romana –

religião, autoridade e tradição – principalmente a tradição pelo seu papel em

preservar o passado. “Enquanto essa tradição fosse ininterrupta, a autoridade

76 ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro, 5ª Ed. São Paulo: Perspectiva, 2002, pp. 161-162 77 Idem, p. 164. 78 Idem, p. 164.

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estaria intata; e agir sem autoridade e tradição, sem padrões e modelos aceitos e

consagrados pelo tempo, sem o préstimo da sabedoria dos pais, fundadores, era

inconcebível.”79.

Cada peça dessa tríade tem seu papel. O da religião, por exemplo,

baseada na fé, domina o “ser” pelo dogma da redenção dos pecadores, promessa

do céu e livramento do inferno para os arrependidos dos pecados na terra. O mito do

invisível.

A versão platônica da doutrina da existência do céu foi incorporada pela

igreja católica como uma das suas crenças dogmáticas. Essa crença serviu para

submeter o “ser” a temer o pós morte. O mito platônico do céu, narrado em A

República, é o seguinte:

“Er, o armênio, panfílio de nascimento. Tendo

morrido em combate, andavam a recolher, ao

fim de dez dias, os mortos já putrefatos,

quando o retiraram em bom estado de saúde.

Levaram-no para casa para lhe dar sepultura e,

quando, ao décimo dia, jazia sobre a pira,

tornou à vida e narrou o que vira no além.

Contava ele que, depois que saíra do corpo, a

sua alma fizera caminho com muitas, e haviam

chegado a um lugar divino, no qual havia, na

terra, duas aberturas contíguas uma à outra, e

no céu, lá em cima, outras em frente a estas.

No espaço entre elas, estavam sentados juízes

que, depois de pronunciarem a sua sentença,

mandavam os justos avançar pelo caminho à

direita, que subia para o céu, depois de lhes

terem atado à frente a nota do seu julgamento;

ao passo que, aos injustos, prescreviam que

tomassem à esquerda, e para baixo, levando

79 ARENDT, Hannah. Entre o futuro e o passado, 5ª edição, São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, p. 166.

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também a nota de tudo quanto haviam feito.

Quando se aproximou, disseram-lhe que ele

devia ser o mensageiro, junto dos homens, das

coisas do além, e ordenaram-lhe que ouvisse e

observasse tudo o que havia naquele lugar.

Ora, ele viu que ali, por cada uma das

aberturas do céu e da terra, saíram as almas,

depois de terem sido submetidas ao

julgamento, ao passo que pelas restantes, por

uma subiam as almas que vinham da terra,

cheias de lixo e de pó, e por outras desciam as

almas do céu, em estado de pureza. E as

almas, à medida que chegavam, pareciam vir

de uma longa travessia e regozijavam-se por

irem para o prado acampar, como se fosse

uma panegíria; as que se conheciam,

cumprimentavam-se mutuamente, e as que

vinham da Terra faziam perguntas às outras

sobre o que se passava no além, e as que

vinham do céu, sobre o que sucediam na terra.

Umas, a gemer e a chorar, recordavam

quantos e quais sofrimentos haviam suportados

e visto na sua viagem por baixo da terra,

viagem essa que durava mil anos, ao passo

que outras, as que vinham do céu, contavam

suas deliciosas experiências e visões de uma

beleza indescritível80.

Assim como o poder a autoridade não deixa de ser um instrumento de

dominação, ou mesmo de poder. É uma espécie de poder em que os dominados

prestam uma obediência incondicional. “Dentro dessa concepção, temos autoridade

80 Platão. A República, tradução de Pietro Nassetti, São Paulo: Martin Claret, 2004, pp 313-314

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quando o sujeito passivo da relação do poder adota como critério de comportamento

as ordens ou diretrizes do sujeito ativo sem avaliar propriamente o conteúdo das

mesmas”81.

A autoridade é uma relação de poder, durável, continuativo no tempo. Na

família, o poder dos pais sobre os filhos; na escola, o poder do mestre sobre os

alunos; na igreja, o poder do pároco sobre os fiéis, etc.

Em contraponto à autoridade está o poder. Poder do homem sobre o

homem, este, é não só o sujeito mas também o objeto do poder social.

Para Hobbes, “o poder de um homem (universalmente considerado)

consiste nos meios de que dispõe para alcançar, no futuro, algum bem evidente, que

pode ser tanto original (natural) como instrumental.82

Por poder natural Hobbes identifica, entre outras, a faculdade da força, da

prudência, da habilidade. Essas faculdades servem como meio para alcançar o

poder instrumental materializado pela reputação, riqueza, conquista de amigos, etc.

Para que haja poder é preciso que haja indivíduo ou grupo de pessoas

que se subordine a este. É uma relação entre pessoas. Uns, mandam; outros,

obedecem. Esta relação se dá de várias maneiras: pela coação ou pela persuassão.

Voltando a Hobbes, o mesmo afirma que “nobreza é poder, não em

qualquer lugar, mas sim nos Estados em que ela é privilegiada: nesses privilégios

reside o poder.”83

Para que serve o poder? Uns, utilizam-no a serviço do bem comum;

outros, em benefício próprio.

Nas palavras de Hobbes, o poder serve como meio de alcançar alguma

aparente vantagem futura. Esta definição dá margem à várias interpretações. Sendo

uma relação entre homens, o exercício do poder se dá de várias maneiras. Pode ser

exercido por meio de instrumentos ou de coisas. Os recursos são numerosos:

“riqueza, força, informação, conhecimento, prestígio, legitimidade, popularidade,

amizade, assim como ligações íntimas com pessoas que têm altas posições de

poder.”84.

81 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, Brasília: UNB, 1986, p. 88. 82 HOBBES, Thomas. Leviatã, ou, a matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil, São Paulo: Ícone, 2000, p. 70 83 Idem, p 71

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O fato de existir esse leque de opções à disposição de quem detém o

poder pode não ser o suficiente se o mandatário não souber manuseá-las. “depende

também da habilidade pessoal de converter em Poder os recursos à sua

disposição”85.

Para Bisol, “Todo poder encerra-se num feixe de competências jurídicas e

de procedimentos determinados pelo próprio Direito”86.

5.2 Soberania e validade normativa: a construção do Poder no Estado de Direito

Como fundamento da comunidade política e pivô sobre o qual se move o

Estado, a Soberania, como poder de mando é elemento coordenador do qual

dependem os Magistrados, as leis e ordenações.

Indicando poder de mando em última instância numa sociedade

politicamente organizada, a Soberania é elemento de racionalização jurídica do

Poder, estando, a mesma, visceralmente ligada ao poder político de Estado, embora

independente deste. Essa racionalização jurídica do Poder é dada na transformação

da força em Poder legítimo; do Poder de fato em Poder de direito.

Jairo Bisol, em sua tese de doutorado, assegura que “ela é fundamento

de validade” de todo e qualquer ato estatal (Legislativo, Judicial ou

Administrativo)”87.

O conceito de Soberania foi construído aos poucos, a partir do século XI.

Nasce da disputa pelo poder político envolvendo o Papa e o Imperador germânico.

Foi também um momento de afirmação dos Monarcas nacionais na esteira dos

conflitos entre aquelas duas autoridades.

Observa-se quanto às Monarquias nacionais que, “quando tinham de

responder às pretensões imperiais, utilizaram abundantemente as bulas papais que

afirmavam a equivalência entre a posição do Imperador e a dos Reis; e quando

precisavam contestar a interferência papal, recorriam aos textos dos civilistas, que

84 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, Brasília: UNB, 1986, p. 937. 85 Idem, p. 937. 86 BISOL, Jairo. Tese de Doutoramento: O vazio e o inacabado da lei: para uma teoria fragmentária do direito, Brasília: 2004, pág. 161. 87 Idem, pág. 161.

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forneciam vários argumentos contrários às intenções do Sumo Pontífice”88.

O imperador, no final do período medieval, representava muito mais uma

referência teórica do que uma força política propriamente relevante, resultado,

principalmente, da disputa de jurisdição entre aquele poder e as monarquias

nacionais.

Um fato bastante ilustrador dessa disputa ocorreu entre o imperador

Henrique VII, e o rei napolitano, Roberto I, pela supremacia política no reino da

Sicília: “O imperador exigia o reconhecimento de sua jurisdição sobre o reino

napolitano. Roberto I, apoiado pelos seus juristas, negou esse direito e resistiu às

forças imperiais. Acusado de traição, foi citado, mas não compareceu ao tribunal de

Pisa, sendo então condenado por crime de lesa-majestade. Como o reino da Sicília

era feudo do Papado, Roberto I levou o caso à corte papal. Em 1313, Clemente V,

na decretal Pastoralis cura, sustentou que o rei napolitano não reconhecia superior

em seu território e que, por isso, não podia ser citado ante o tribunal de outro rei ou

mesmo do imperador, cujo poder não era universal, restringindo-se aos territórios

reconhecidamente do Império.”89.

É na acumulação das funções de elaboração e aplicação do direito que

nasce a idéia de soberania associada ao perfil do legítimo governante, este,

amparado no poder de julgar e punir, ditando e impondo coativamente as normas

deste direito. “Os atos de governo confundiam-se com o exercício da jurisdição.”90.

Somente no final do século XVI, o conceito de Soberania aparece com

sua significação moderna, para indicar, em toda sua plenitude , o poder estatal,

sujeito único e exclusivo da política, quando trata “do conceito político-jurídico que

possibilita ao Estado moderno, mediante sua lógica absolutista interna, impor-se à

organização medieval do poder, baseada, por um lado, nas categorias e nos

Estados, e, por outro, nas duas grandes coordenadas universalistas representadas

pelo papado e pelo império.”91.

A soberania tem duas faces: a interna e a externa. “A nível externo o

soberano encontra nos outros soberanos seus iguais, achando-se

conseqüentemente numa posição de igualdade, enquanto a nível interno, o

88 BARROS, Alberto Ribeiro. A teoria da sabedoria de Jean Bodin, São Paulo: Unimarco, 2001, p. 189. 89 Idem, p. 189. 90 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política, Brasília: UNB, 1986, p. 1179. 91 Idem, p. 1179.

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soberano se encontra numa posição de absoluta supremacia, uma vez que tem

abaixo de si os súditos, obrigados à obediência”92.

Em se tratando da essência da soberania há uma discussão divergente

entre Jean Bodin, Thomas Hobbes e Rousseau.

Para o primeiro jurista a essência da soberania é identificada no “poder de

fazer e de anular as leis.”93.

Os outros poderes resumem-se a estes dois como força de coesão capaz

de manter unida toda a sociedade.

Thomas Hobbes,como cientista político, defendeu que a essência da

soberania não está no poder de fazer e de anular as leis, mas no momento de sua

execução, como meio adequado ao fim, o de fazer obedecer.

“A universalidade destas duas posições, se levada ao extremo, poderia

conduzir ou a um direito sem poder ou a um poder sem direito, quebrando assim

aquele delicado equilíbrio entre força e direito”94.

Já para Rousseau, “a essência da soberania está na indivisibilidade da

vontade geral do povo, formando um corpo só”95.

Para ele, “ou é a do corpo do povo, ou somente de uma parte. No primeiro

caso, essa vontade declarada é um ato de soberania e faz lei; no segundo, não

passa de uma vontade particular ou de um ato de magistratura, quando muito de um

decreto”96.

A soberania é dotada de algumas características: É absoluta, por não

estar submetida às limitações da leis. A condição de estar relacionada diretamente

ao poder, torna-a absoluta; por ser indisponível, é inalienável; por ser una, é

indivisível.

Quanto ao poder, na construção do Estado de Direito, ao contrário da

soberania, necessário se faz a existência de lei, tendo como fundamento o conceito

de validade. Para Bisol, este conceito “é uma depuração unilateral e juridicista da

idéia de soberania, onde o fenômeno do poder político deixa de ser reconhecido

92 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, Brasília: UNB, 1986, p. 1180. 93 Jean Bodin, apud, BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, Brasília: UNB, 1986, p. 1180. 94 Jean Bodin, apud, BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política, Brasília: UNB, 1986, p. 1180. 95 ROUSSEAU, Jean-Jaques. Do contrato social, tradução de Lourdes Santos, São Paulo: Editora, 1985, p. 44. 96 Idem, p. 44.

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120

como fundamento do direito.”97

5.3 PODER, CORRUPÇÃO E PUBLICIDADE: O MITO DO ANEL DE GIGES

Kimberly Ann Ellion, em sua obra “A corrupção e a economia” aponta a

fórmula da corrupção como sendo: Corrupção=Monopólio+poderes-Prestação de

Contas98.

Uma pesquisa do arqueólogo Ahmad Salen mostrou em agosto de 2002

que, durante o Reino Novo Egípcio (1570 a 1070 a. C.) um processo contra os

assaltantes de outro e jóias de uma tumba foi interrompido quando as investigações

chegaram a alto funcionários do governo. Segundo Saleh, apenas cidadãos comuns

foram punidos99.

Esse exemplo ilustra ser, a corrupção, um problema milenar revelando

também estar, a mesma, associada ao poder público. Onde há poder, há corrupção.

É na relação do setor público com o setor privado onde ela mais acontece.

Os representantes governamentais encarregados da privatização de bens

públicos podem se tornar magnatas instantâneos ao vendê-los aqueles bens a

baixos preços em troca de propina, a exemplo do que aconteceu com a recente

onde de privatizações no Brasil o que levou o Ministério Público Federal a conseguir

suspender, por via judicial, leilões para vendas de várias empresas públicas porque

as mesmas estavam avaliadas por preço muito abaixo do que verdadeiramente

valiam.

O elo entre dinheiro (corrupção) e política (poder) é profundo e recebe

tratamento diferenciado nas diversas esferas do poder público (Federal, Estadual,

Municipal)

No Brasil, nem a própria Corte de Contas (TCU) que, em tese, trabalha

para evitar a malversação do dinheiro público, escapou da ação dessa erva

maldita,que é a corrupção.

97 BISOL, Jairo. Tese de Doutoramento: O vazio e o inacabado da lei: para uma teoria fragmentária do direito, Brasília: 2004, pág. 161. 98 ELLIOTT, Kimberly Anny. A corrupção e a economia global, tradução de Marsel Nascimento Gonçalves, Brasília: Editora UNB, 2002, p. 263. 99 Revista “Aventuras na História”, edição de outubro de 2004, São Paulo: Editora Abril, p. 23.

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Resultado da mais recente investigação da Polícia Federal, em Brasília,

foi desbaratada uma quadrilha que agia dentro do próprio Tribunal de Contas para

beneficiar empresas prestadoras de serviços terceirizados de segurança e

conservação.

O trabalho era feito na manipulação de licitações envolvendo funcionários

de escalão superior daquela Corte, liderado pelo seu Diretor Geral.

Para Michael Johnston, “a corrupção suscita questões políticas importante

acerca das relações entre Estrado e sociedade e entre riqueza e o poder”100.

A ocorrência se dá entre grupos de interesses e é caracterizada por fortes

interesseis privados, por elites acessíveis e por competição política e econômica. A

riqueza é usada para obtenção de influência política, o que resulta em corrupção da

elite. A hegemonia da elite é caracterizada por elites arraigadas no poder, cuja

competição política limitada vende acesso político e enriquece a si própria e a seus

aliados políticos e comerciais.

“A corrupção não é algo que acontece em uma sociedade como um

desastre natural. Trata-se de atividade de pessoas e de grupos reais è medida que

traficam influências em um dado ambiente de oportunidades, de recursos e de

limitações101.

A corrupção se dá de várias formas, todas ligadas ao exercício do poder:

Nas licitações públicas, para fornecimento de bens e serviços ao governo, quando

são direcionadas para favorecer a determinados grupos econômicos ou mesmo a

empresas de parentes com representantes no governo; na destinação de verbas

públicas para entidades-fantasma,a título de doação; Na concessão de empréstimos

subsidiados, incentivos fiscais especiais e outros subsídios para empresas de

“amigos”; em decisões políticas para favorecimento de certos grupos econômicos.

Mas é no processo de licitação pública e nos contratos esse tipo de ação

contra a administração pública ocorre por vários motivos, entre os quais,. pelos

escassos controles das ações dos administradores públicos, pela deficiência da

visibilidade e pela certeza que os infratores têm da impunidade.

100 JOHNSTON, Michael. A Corrupção e a economia global, tradução de Marsel Nascimento Gonçalves de Souza, Brasília: Editora UNB, 2002, p. 103. Essa relação não se dá de forma transparente. É feita de forma mais sigilosa possível. 101 Idem, p. 103.

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“O administrador estabelece, nos editais, a possibilidade de participação

de empresas em licitações. Por meio da definição de condições especiais

(financeiras e pseudotécnicas), ele exclui a maioria das potenciais concorrentes e

“fecha” a possibilidade de participação de um subconjunto de empresas. Se

questionado quanto aos critérios que usa para isso, responde que são definidos em

função do “interesse público”102.

A debilidade de mecanismos de controle e auditoria resulta em

impunidade e conseqüente estímulo à perpetuação de práticas corruptas.

O invisível que encobre a definição dos critérios nas licitações, fatores

bastante subjetivos, é resultado da ineficiência da fiscalização dos Tribunais de

Contas, em particular o Tribunal de Contas da União quando se trata de licitação na

esfera federal.

Essa invisibilidade, controverso da publicidade, é um dos elementos

incrementador da prática de favorecimento de empresas nas licitações.

Nesses casos, a publicidade como princípio da administração pública, é

ignorada em prejuízo do Estado.

102 ABRAMO, Cláudio Weber. Caminhos da transparência, São Paulo: Editora Unicamp, 2002, pp 107-108.

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123

CAPITULO VI

O TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO COMO PROTAGONISTA NO CONTROLE E

NA PREVENÇÃO À CORRUPÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA

Sumário: 6.1 Instrumentos à disposição do

TCU para controle e prevenção da corrupção

no Brasil: 6.1.1 Função fiscalizadora 6.1.2

Função judicante 6.1.3 Função sancionadora

6.1 Instrumentos à disposição do TCU para controle e prevenção da corrupção no

Brasil

No esforço visando coibir a corrupção no País, embora suas diligências

não sejam imperativas, porque seu poder limita-se a aplicar multas que depende da

prestação jurisdicional para sua execução e de representar ao Poder competente as

irregularidades apuradas, para isso, o Tribunal desenvolve diversas atividades como

fiscalizar os atos de quem tem sob sua responsabilidade dinheiros, bens e valores

públicos da administração direta e indireta, incluindo as fundações e as sociedades

instituídas e mantidas pelo Poder Público Federal; julgar as contas daqueles que

derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao

erário; como também a função sancionadora manifestada na aplicação aos

responsáveis das sanções previstas na Lei Orgânica do Tribunal (Lei 8.443/92), em

caso de ilegalidade de despesa ou de irregularidade de contas.

Passa-se a discorrer sobre cada uma dessas atividades desenvolvidas

pelo Tribunal de Contas da União.

6.1.1 Função fiscalizadora

Esta função compreende a realização de auditorias e inspeções, e o

acompanhamento de programas governamentais em órgãos e entidades federais,

por iniciativa própria, por solicitação do Congresso Nacional ou para apuração de

denúncias.

A auditoria é o instrumento de fiscalização para examinar a legalidade e a

legitimidade dos atos de gestão, quanto ao aspecto contábil, financeiro,

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orçamentário e patrimonial bem como avaliar o desempenho dos órgãos, entidades,

programas e atividades governamentais, quanto aos aspectos de economicidade,

eficiência e eficácia.

A inspeção é o instrumento de fiscalização utilizado para suprir omissões

e lacunas de informações, esclarecer dúvidas ou apurar denúncias ou

representações quanto à legalidade, à legitimidade, e à economicidade de fatos da

administração e dos atos administrativos. Além das auditorias e das inspeções o

Regimento interno do TCU prevê três outros instrumentos de fiscalização:

levantamento, acompanhamento e monitoramento.

O levantamento tem por objetivo conhecer a organização, o

funcionamento e a forma de atuação dos órgãos da administração pública, assim

como dos sistemas, programas, projetos e atividades governamentais.

Por meio do acompanhamento, o Tribunal avalia o desempenho dos

órgãos e entidades jurisdicionados, assim como dos sistemas, programas, projetos e

atividades governamentais, quanto aos aspectos de economicidade, eficiência e

eficácia dos atos praticados.

O monitoramento é o instrumento de fiscalização utilizado para verificar o

cumprimento das deliberações e os resultados delas advindas.

6.1.2 Função judicante

Por determinação constitucional, o Tribunal de Contas da União, julga as

contas dos administradores públicos e demais responsáveis por dinheiros, bens e

valores públicos da administração direta e indireta, incluindo as fundações e as

sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público Federal, e as contas daqueles

que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao

erário.

Nos julgamentos dessas contas pelo TCU são proferidas as seguintes

decisões:

CONTAS REGULARES - quando expressarem

a exatidão dos demonstrativos contábeis, a

legalidade, a legitimidade e a economicidade

dos atos de gestão do responsável; neste caso,

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o Tribunal confere quitação plena;

CONTAS COM RESSALVA – quando as

contas evidenciarem impropriedade ou

qualquer outra falta de natureza formal de que

não resulte dano ao erário; nesta hipótese, o

Tribunal confere quitação ao responsável, com

determinação de correção das falhas;

CONTAS IRREGULARES – quando

comprovada alguma das seguintes ocorrências:

omissão no dever de prestar contas; prática de

ato de gestão ilegal, ilegítimo, antieconômico

ou com infração à norma legal ou

regulamentar; dano ao erário decorrente de ato

de gestão ilegitimo ou antieconômico e

desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou

valores públicos;

6.1.3 Função sancionadora

A função sancionadora manifesta-se na aplicação aos responsáveis das

sanções previstas na Lei Orgânica do Tribunal (Lei 8.443/92), em caso de

ilegalidade de despesa ou de irregularidade de contas.

Essa sanções podem compreender, isoladamente ou cumulativamente:

(1) aplicação, ao agente público, de multa proporcional ao valor do prejuízo causado

ao erário, constituindo o montante do dano o limite máximo da penalidade; (2) a

cominação de multa ao responsável por contas julgadas irregulares, por ato

irregular, ilegítimo ou antieconômico, por não-atendimento de diligência ou

determinação do Tribunal, por obstrução ao livre exercício de inspeções ou

auditorias e por sonegação de processo, documento ou informação; (3) declaração

de inabilitação, pelo período de cinco a oito anos, para exercício de cargo em

comissão ou função de confiança no âmbito da administração pública; (4) declaração

de inidoneidade do responsável, por fraude em licitação, para participar, por até

cinco anos, de certames licitatórios promovidos pela administração pública.

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CONCLUSÃO

O Tribunal de Contas da União, instituído pela Constituição Federal

republicana de 1891, com o nome de Tribunal de Contas, mantendo o sistema

aprovado pelo texto do Decreto nº 966-A, desde o início de seus trabalhos sofreu

fortes resistências à sua perfeita atuação, por parte de muitos poderosos que se

beneficiavam do caixa do Governo a ponto de seu criador, Rui Barbosa, em

conferência proferida na Bahia, no Teatro Politeano, no curso das discussões sobre

a necessidade de criação dessa Corte de Contas, sob o título “a corrupção política”,

Rui Barbosa assim se desabafou:

“Quando o Governo abole a concorrência,

entrega as suas obras a um só empreiteiro, e o

detentor desse monopólio admirável outorga o

privilégio de ser o único credor público

pontualmente embolsado, claro está, que há

furos na caixa. Logo, senhores, há ladrões”103.

O “Águia de Haia”, não desabafou à toa. Já naqueles idos, como

acontece “hoje”, a corrupção já campeava o Poder Público.

Para Rui Barbosa, a recém criada República precisava dar um basta nos

desmandos com os recursos públicos, no que pretendia fazer este jurisconsulto, com

a criação do Tribunal de Contas.

Embora na exposição de motivos assinada por Rui Barbosa para a

criação do Tribunal, figurasse, entre outras, como atribuições, julgar as contas dos

responsáveis, condenando-os ou expedindo quitação, conforme o caso, a

Constituição de 1891, não fez alusão ao julgamento das contas dos responsáveis, e

ainda, aqueles constituintes delegaram ao Presidente da República o poder de

nomear os Ministros para o Tribunal, ou seja, um sutil artifícil de controle dos

Ministros daquela Corte por parte do Poder Executivo.

103 BARBOSA, Rui, apud, GUIMARÃES, Fernando Augusto Mello. Rui: uma visão do controle do dinheiro público - uma análise contemporânea, Brasília: TCU, 2000, p. 114.

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A criação do Tribunal de Contas não evitou que a corrupção continuasse

campeando o poder público mesmo porque essa Corte de Contas não foi criado

para fiscalizar o emprego do dinheiro público com honestidade mas para fazer o

balanço das contas de receita e despesa e verificação da legalidade das mesmas.

A Constituição Federal de 1934, no seu artigo 99, ampliou as atribuições

daquela Corte de Contas, passando, a mesma, a julgar as contas dos responsáveis

por dinheiros ou bens públicos, mas sem estabelecer quaisquer sanções àqueles

que, por um ou outro motivo, causasse dano ao erário público. Seus ministros

continuaram a ser escolhidos pelo Presidente de República, numa clara

demonstração de controle sobre os mesmos, assim sucedendo nas constituições de

1937, 1946, 1967.

Nesta última Constituição, o parágrafo 4º, do artigo 73, prescreve que o

Tribunal representará ao Poder Executivo e ao Congresso nacional sobre

irregularidades e abusos por ele verificados, numa sinalização de que algum

administrador da coisa pública pudesse vir a ser punido em caso de constatação de

irregularidades ou abusos na administração dos bens públicos.

Foi uma sinalização irônica, porque seus ministros continuavam a ser

escolhidos pelo Presidente de República depois da escolha aprovada pelo Senado

Federal. Que liberdade teriam aqueles ministros para representar contra “altos”

figurões da República por acusações referentes à irregularidades praticadas por

estes?

A Constituição de 1969, não trouxe nenhuma alteração quanto ao tema

da independência de seus Ministros.

Com o advento da Carta Constitucional de 1988, denominada pelo então

Deputado Ulisses Guimarães de “Constituição Fiscalizadora”, o Tribunal de Contas

da União teve sua jurisdição e competência substancialmente ampliadas. Recebeu

poderes para, no auxílio ao Congresso nacional, exercer a fiscalização contábil,

financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da

administração pública direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade,

economicidade e a fiscalização da aplicação das subvenções e renúncia de receitas.

O parágrafo 2º, do inciso IV, do artigo 74, dessa Carta Constitucional

permite que qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato á parte

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legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o

Tribunal de Contas da União.

Não obstante a Carta Política de 1988, ter ampliado enormemente as

atribuições do Tribunal de Contas da União, a forma de escolha dos ministros

daquela Corte de Contas, feita por indicação política, continua sendo o principal dos

empecilhos na luta daquele Tribunal contra a corrupção.

A escolha daqueles ministros é feita da seguinte forma: do total de nove

ministros, dois terços são escolhidos pelo Congresso Nacional, recaindo, a escolha,

muitas vezes, sobre políticos que não tiveram seus mandatos políticos renovados

pelo eleitorado; um terço é escolhido pelo Presidente da República. É oportuno

fazer um esclarecimento neste ponto: dos três Ministros que são escolhidos pelo

Presidente da República, a escolha de dois deles recai dentre Auditores e membros

de Ministério Público junto ao Tribunal, indicados em lista tríplice por esta Corte de

Contas, segundo os critérios de antiguidade e merecimento. É neste critério, no de

merecimento, como forma de provimento para aqueles cargos, onde atua o controle

do Poder Executivo sobre as pessoas destes Ministros, o que compromete a

legitimidade e autoridade na fiscalização e controle da gestão financeira do Estado.

Portanto, pergunta-se: COMO PRINCIPAL PROTAGONISTA NO

CONTROLE E NA PREVENÇÃO À CORRUPÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

BRASILEIRA, atua, o Tribunal de Contas da União, com critérios insuspeitos em

suas decisões quando se trata de julgamento de contas irregulares? A confiança é

duvidosa.

Pouco se tem discutido sobre a validade dos critérios de escolha dos

ministros do Tribunal de Contas da União, como elemento indispensável a investir-

lhes de poderes suficientes para enfrentar os mafiosos que se locupletam no Poder

Político para assaltarem os cofres públicos.

O resultado é o que todos estão vendo: escândalos e mais escândalos

divulgados pela grande imprensa envolvendo os mais destacados líderes políticos

dessa Nação, nos mais variados tipos de corrupção.

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