46
1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA DIEGO DA COSTA CURTI A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO ATRAVÉS DOS JORNAIS UBERLÂNDIA 2019

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA DIEGO DA COSTA CURTI · 2019. 12. 20. · período da Revolução Constitucionalista de 1932. A pesquisa foi realizada a partir da imprensa escrita

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • 1

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

    DIEGO DA COSTA CURTI

    A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

    ATRAVÉS DOS JORNAIS

    UBERLÂNDIA

    2019

  • 2

    DIEGO DA COSTA CURTI

    A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

    ATRAVÉS DOS JORNAIS

    Monografia apresentada como requisito parcial à

    obtenção do título de graduado no Curso de

    História – Licenciatura/Bacharelado, da

    Universidade Federal de Uberlândia, sob a

    orientação do Prof. Dr. Marcelo Lapuente Mahl.

    UBERLÂNDIA

    2019

  • 3

    RESUMO

    O presente trabalho apresenta uma pesquisa feita através da imprensa escrita

    sobre a Revolução Constitucionalista na região de São José do Rio Preto, tomando

    como fonte principal os periódicos do jornal “A Notícia”. A partir das metodologias

    historiográficas que derivam da escola dos Annales, foi feito um levantamento

    prévio do contexto histórico nacional referente aos conflitos fundamentais, isto é, o

    início do movimento que depois se transformaria na Revolução Constitucionalista;

    além de uma pesquisa sobre o contexto regional, a qual nos possibilitou

    compreender questões locais e suas consequências. Posteriormente, através da

    análise das fontes, realizou-se uma investigação mais detalhada sobre importantes

    questões regionais envolvendo as mudanças sociais ocasionadas por uma guerra

    civil de grande escala. Por fim, os dados sobre as questões locais levaram-nos a

    conclusões a respeito do grau de influência de certas instituições regionais nesse

    momento histórico que mudou as políticas públicas brasileiras.

    Palavras chave: Revolução Constitucionalista. São José do Rio Preto. A Notícia.

    Jornal.

  • 4

    ABSTRACT

    The present work is about a research done through the written press regarding the

    Constitutionalist Revolution in the region of São José do Rio Preto, taking as source

    the main periodic from the newspaper “A Notícia”. Inspired by the historiographical

    methodologies, derived from the Annales school, a pre-survey of the national

    historical context was done regarding the necessary conflicts for the start of the

    movement that would later become the Constitutionalist Revolution, as well as a

    survey of the regional context that allowed us to understand specific local matters.

    Posteriorly, through the analysis of the sources it was possible to accomplish a more

    thorough investigation regarding local matters and the changes influenced by the

    large-scale civil war. Lastly, the data about the local matters brought us to the

    conclusion regarding the degree of influence that certain regional institutions had in

    this historical moment, which was responsible for the changes in the brazilian public

    policies.

    Keywords: Constitutionalist Revolution. São José do Rio Preto. A Notícia.

    Newspaper.

  • 5

    LISTA DE ILUSTRAÇÕES

    Figura 1 – Página do jornal A Notícia dedicada principalmente a assuntos do café.15

    Figura 2 – Texto publicado pelo novo redator-chefe Levinio de Souza, mostrando um

    posicionamento mais favorável ao golpe de 1930 .................................................... 17

    Figura 3 – Cartaz de 1932 exigindo o fim da ditadura Vargas .................................. 22

    Figura 4 – Cartaz de 1932 convocando para o alistamento de soldados ................. 22

    Figura 5 – Notícia sobre a solidariedade mostrada pela população ......................... 25

    Figura 6 – Notícia sobre o descaso federal com o interior paulista ................. ......... 27

    Figura 7 – Primeira página do jornal totalmente dedicada aos assuntos da guerra .. 31

    Figura 8 – Notícia sobre a guarda noturna ................................. .............................. 34

    Figura 9 – Comunicados da Prefeitura ...................................................................... 34

    Figura 10 – Regulamentação do consumo de gasolina ............................................ 36

    Figura 11 – Pedido de redução de gasto de gasolina .............................................. 36

    Figura 12 – Notícia sobre a Campanha de Ouro para o bem de São Paulo ............. 39

    Figura 13 – Relação das pessoas que doaram ouro ................................................. 41

    Figura 14 – Notícia sobre a doação de troféus do Rio Preto E.C. ........................ .... 42

  • 6

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 – Quantidade de comércio, indústria e profissões na cidade de São José do Rio

    Preto em 1932 .......................................................................................................... 13

  • 7

    SUMÁRIO

    1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 8

    2. A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO ATRAVÉS DOS JORNAIS ........... 9

    2.1 Contexto histórico nacional e regional ......................................................................................... 9

    2.2 Um olhar sobre a Revolução Constitucionalista a partir do jornal A Notícia em São José do

    Rio Preto ........................................................................................................................................ 24

    3. CONCLUSÃO ...................................................................................................................................... 42

    REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 43

    FONTES .................................................................................................................................................. 45

  • 8

    1. INTRODUÇÃO

    Recentemente, a partir de evoluções que vêm acontecendo através do

    trabalho ocupado pelos estudos historiográficos, o campo da história vem se

    ampliando cada vez mais, acrescentando objetos, locais e fontes possíveis de

    serem trabalhados. Nesse espaço, propaga-se o campo da historiografia local e

    regional. O presente trabalho nasce da influência dessa metodologia historiográfica,

    ocupando-se de uma localidade regional e fazendo uso de uma fonte jornalística.

    A partir da metodologia que permeia esta monografia, foi feita uma pesquisa

    das condições sociais, econômicas e políticas referentes ao período da Revolução

    Constitucionalista na cidade de São José do Rio Preto. Utilizaram-se, como fonte

    de pesquisa, edições do periódico “A Notícia” publicadas no período da Revolução,

    as quais proporcionaram conhecimentos sobre questões regionais. A região de São

    José do Rio Preto desenvolveu-se muito em decorrência da expansão da economia

    cafeeira no estado de São Paulo, carregando, dessa forma, fortes relações com o

    movimento Constitucionalista que nascia em 1932, pelo fato de uma das

    reinvindicações dessa revolução ser a de conservar os antigos investimentos

    federais na economia cafeeira, restabelecendo-a como protagonista econômica do

    Brasil.

    A partir dessas questões, apresenta-se, como objetivo deste trabalho, uma

    análise acerca das mudanças ocorridas na normalidade cotidiana vivenciada por

    instituições públicas e privadas, grupos sociais e população em geral, em virtude

    das consequências ocasionadas por uma guerra civil. Também, buscou-se

    investigar a participação de alguns grupos sociais da região em apoio ao

    Movimento Constitucionalista.

  • 9

    2. A REVOLUÇÃO CONSTITUCIONALISTA EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO ATRAVÉS DOS JORNAIS 2.1 Contexto histórico nacional e regional

    Há algum tempo, o campo da historiografia vem passando por

    transformações que levaram alguns historiadores a repensar a utilização dos

    diversos tipos de fontes históricas, metodologia de escrita, objeto de trabalho e

    recorte local e histórico. Essas transformações aconteceram pela necessidade que

    esses profissionais encontraram de modificar sua metodologia de escrita da

    história, e um dos grandes influenciadores desse movimento foi o historiador Marc

    Bloch, que, junto com Lucien Febvre, deu início à Escola dos Annales.

    Há muito tempo, com efeito, nossos grandes precursores, Michelet, Fustel de Coulanges, nos ensinaram a reconhecer: o objeto da história é, por natureza, o homem. Digamos melhor: os homens. Mais que o singular, favorável à abstração, o plural, que é o modo gramatical da relatividade, convém a uma ciência da diversidade. Por trás dos grandes vestígios sensíveis da paisagem, [os artefatos ou as máquinas] por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e as instituições aparentemente mais desligadas daqueles que as criaram, são os homens que a história quer capturar. Quem não conseguir isso será apenas, no máximo, um serviçal da erudição. Já o bom historiador se parece com o ogro da lenda. Onde fareja carne humana, sabe que ali está sua caça (Bloch, 2001, p. 54-55).

    Nesse trecho, fica evidente que, para Bloch, o objeto central do historiador

    não são apenas os grandes feitos históricos realizados por homem, mas toda e

    qualquer atividade que seja decorrente da ação humana. Esse conceito permitiu a

    ampliação do campo de investigação da pesquisa histórica.

    Para Bloch (2001, p. 79), “a diversidade dos testemunhos históricos é quase

    infinita. Tudo o que o homem diz ou escreve, tudo o que constrói, tudo o que toca,

    pode e deve fornecer informações sobre eles”. Nesse sentido, o autor apresenta

    outro conceito de extrema importância para o historiador, isto é, a definição do que

    seria uma fonte histórica. Bloch entende que todo resquício de ação humana deve

    ser investigado, pois pode trazer informações importantes, tanto sobre o contexto

    histórico, quanto sobre o autor ou um grupo social. Se bem analisada a fonte,

    podemos retirar informações de grande relevância para a construção de uma

    pesquisa.

  • 10

    Influenciada por essa escola historiográfica, nasce esta investigação, que

    tem como objetivo central realizar uma análise sobre questões locais referentes ao

    período da Revolução Constitucionalista de 1932. A pesquisa foi realizada a partir

    da imprensa escrita regional da cidade de São José do Rio Preto, localizada no

    noroeste paulista. A escolha do pequeno recorte local e temporal permite que seja

    feita uma análise mais profunda sobre o contexto e a região, além de uma

    valorização da historiografia regional e local, que vem sendo cada vez mais

    apreciada, em virtude de conceitos trazidos por escolas historiográficas, como a

    ampliação de objetos e fontes de pesquisas.

    Antes de adentrarmos o mundo das fontes da imprensa escrita, é importante

    levar em consideração a relevância desta na construção de um pensamento social

    comum. O jornal era, na década de 1930, um dos maiores meios de comunicação

    em massa, sendo utilizado por pessoas influentes na sociedade como uma forma

    de transmitir padronizações de conceitos morais vigentes na época.

    Ademais, o editor e/ou proprietário do jornal tinha o poder de construir a

    narrativa da notícia de forma que beneficiasse o seu posicionamento quanto ao

    assunto exposto. Mesmo que grande parte dos jornais se auto intitulem imparciais,

    isso deve ser contestado por diversos motivos; entre eles, o fato de as publicações

    serem escritas por seres humanos que, embora tentem negar sua natureza,

    carregam uma vivência que é responsável por criar, no subconsciente, certos tipos

    de convicções e simbolismos, os quais podem se manifestar na escolha do assunto

    abordado, na posição e espaço em que a publicação se encontra no jornal ou até

    mesmo na escolha de certas palavras que, pela sua linguística, já carregam um

    posicionamento.

    Além dessas características que vêm do subconsciente da mente humana, a

    própria estrutura de produção jornalística (exceto a de jornalistas independentes)

    coloca um obstáculo na tentativa de alcançar a imparcialidade. Isso porque toda

    publicação passa pela aprovação e filtros de seu editor-chefe ou superior e este,

    por questões já mencionadas acima, carrega consigo uma parcialidade que se

    refletirá também na escolha de sua equipe editorial, já que haverá a tendência de

    procurar pessoas que seguem uma linha semelhante de afinidades e pensamentos.

    Esta pesquisa foi realizada através da análise de jornais publicados em 1932

    na cidade de São José do Rio Preto. Na época, tratava-se de uma cidade ainda

    pequena. Em sua tese, Campos (2014, p. 310) trata da cidade de Ribeirão Preto,

  • 11

    que era chamada de “velho oeste” por, naquele período, já ser bastante

    desenvolvida pela indústria do café; São José do Rio Preto, por sua vez, era

    conhecida como “novo oeste”, em virtude de seu estágio de crescimento. Com o

    tempo, São José do Rio Preto passou por um desenvolvimento devido a grandes

    fazendeiros que investiram, principalmente, na indústria do café (motor principal da

    economia paulista) e, com menor intensidade, nas lavouras de algodão e milho e na

    criação de gado.

    Existe uma forte relação entre o período da Revolução Constitucionalista e a

    região de São José do Rio Preto devido à cultura do café. É impossível abordar a

    história dessa região sem citar a enorme influência que a economia cafeeira teve

    nela. A cidade nasceu em meados do século XIX como uma pequena vila de

    trabalhadores rurais. Mahl (2013, p. 50-52) explica, em seu artigo, que a cidade

    ganhou visibilidade no estado de São Paulo a partir do momento em que foi

    construída, em 1896, a Estrada de Ferro Araraquara, popularmente conhecida

    como Estrada Araraquarense. Essa estrada foi construída pela iniciativa privada de

    fazendeiros que desejavam escoar a sua produção cafeeira para outras regiões,

    inicialmente ligando Araraquara a Itaquerê (atual Bueno de Andrada) e,

    posteriormente, expandindo-se até chegar a São José do Rio Preto, em 1912.

    Mahl (2013, p. 52-53) afirma ainda que, durante esse período de expansão

    da Estrada Araraquarense, diversos fazendeiros começaram a investir grandes

    capitais em terras férteis no entorno da ferrovia, com objetivo de obter maiores

    lucros a partir da facilitação de escoamento de seus produtos que a ferrovia iria

    proporcionar. Iniciou-se, assim, um enorme desenvolvimento na região do Noroeste

    Paulista, dando origem a um grande movimento econômico regional que foi

    responsável por um amplo fluxo de migração e povoamento de zonas rurais ainda

    pouco exploradas e zonas urbanas pouco movimentadas.

    Porém, mesmo com o desenvolvimento econômico local provindo

    principalmente do café, Campos (2014, p. 312-313) mostra que, nos anos de 1930,

    a população pobre passava por grandes dificuldades, como altos níveis de

    analfabetismo, ausência de escolas gratuitas para todos e elevadas taxas de

    mortalidade infantil. Por outro lado, os mais ricos desfrutavam de uma vida urbana

    agitada, com a presença de diversos clubes, bares, cinemas, ensino e saúde

    privados, entre as diversas regalias que uma cidade em pleno desenvolvimento

    econômico e social poderia oferecer à população mais abastada. Para demonstrar

  • 12

    esse intenso movimento urbano, o quadro 1, abaixo, apresenta levantamentos não

    oficiais retirados do Álbum Ilustrado da Comarca de Rio Preto. Publicada em 1929,

    essa obra tinha o objetivo de dar visibilidade à região ao levar informações sobre os

    comércios, indústrias e profissões liberais locais, dando um indicativo de que a

    cidade, mesmo com uma economia predominantemente rural, desfrutava de um

    intenso desenvolvimento de sua área urbana.

    É importante salientar que, segundo dados do Annuario Estatístico de São

    Paulo (1935), no ano de 1929, São José do Rio Preto tinha uma população de

    aproximadamente 65.048 habitantes, e é possível que nem todos os profissionais

    estivessem presentes no Álbum por não desejarem pagar para aparecer ou por não

    terem ligações com seus produtores.

    Tabela 1 –Comércio, Indústria e Profissões da cidade de Rio Preto no ano de 1929 Açougues 12 Engenheiros 12 Advogados 30 Encanamentos e Artigos Sanitários 06 Agências de automóveis 06 Escolas Primárias 11 Agentes de negócios 03 Escultura e Estatuária 01 Agências bancárias 01 Estradas de Ferro 01 Agências de Revistas e Jornais 01 Farmácias e Drogarias 13 Agremiações religiosas 08 Ferragens, Tintas e Louças 06 Agremiações pias 03 Ferreiros 10 Alfaiatarias 25 Folheiros 03 Armarinhos e fazendas 39 Fotógrafos 01 Armazéns de cereais 12 Frutas 06 Armazéns de Secos e Molhados 87 Funileiros 01 Armeiros 02 Garages 01 Amoladores 02 Hospitais 01 Artigos para escritório 04 Hotéis 12 Associações 14 Joalherias 01 Automóveis e Acessórios 07 Lenha 02 Bancos 05 Liceus 01 Barbearias 28 Máquinas de costura 01 Bares 06 Máquinas de escrever 02 Bebidas e gelo 04 Madeiras 03 Bicicletas e Motocicletas 01 Manteigas (Fábrica) 01 Bilhares 01 Marcenarias 08 Botequins e Cafés 30 Máquinas de Benefício 14 Calçados e chapéus 05 Médicos 20 Camisarias 05 Móveis 03 Carpintarias 04 Oficinas mecânicas 09 Casas de Saúde 06 Padarias 07 Cemitérios 02 Pensões familiares 14 Cinematógrafos 04 Restaurantes 11 Colchoarias (Fábricas) 02 Sabão (Fábricas) 02 Compradores de Cereais 21 Sapatarias 13 Consulados 03 Selarias 07 Construtores 03 Serrarias 03 Corretores 01 Tabelionatos e Cartórios 04 Contadores Peritos 05 Telégrafos 01 Costuras 04 Telefones 01 Chalés 10 Tinturarias 06

  • 13

    Charutarias 01 Tipografias 06 Dentistas 13 Vitrolas, Pianos e Músicas 03

    Quadro 1 - Quantidade de comercio, indústria e profissões na cidade de São José do Rio Preto em

    1932 (Campos, 2014, p. 313)

    Conforme demonstram os dados relatados acima em relação à quantidade

    de empregos liberais existentes no meio urbano, podemos constatar que, em 1930,

    São José do Rio Preto era uma cidade em pleno desenvolvimento econômico e

    social. De acordo com o exposto anteriormente, o jornal tem um papel essencial na

    construção do pensamento do meio urbano, cumprindo a função de uma espécie de

    educador social por ser um dos principais meios de comunicação e uma das

    principais fontes de informação a que a população urbana teria acesso. Essa

    função social do jornal que rodeou diversas regiões do Brasil no começo do século

    XX não poderia ser diferente em uma cidade que passava por um constante

    desenvolvimento urbano, tendo como um dos principais aliados na configuração

    desse meio o jornal “A Notícia”. Este serviu de suporte principal como fonte de

    pesquisa para este trabalho, tendo o pesquisador tido acesso a essa fonte através

    de mídia digitalizada disponível no Arquivo Público de São José do Rio Preto.

    Analisaram-se todos os periódicos publicados no período de junho a outubro de

    1932 e alguns um pouco anteriores, referentes a dias de agitamento político mais

    acalorado. A escolha do jornal “A Notícia” como fonte se deu pelo fato de que,

    durante o período de guerra civil, o jornal modificou totalmente sua linha editorial,

    dedicando-se exclusivamente a publicar notícias sobre esse momento específico.

    De acordo com Losnak e Pádua (2017), o referido jornal nasceu em 1924,

    tendo como proprietário Nelson de Veiga e sendo dirigido pelo professor Dario de

    Jezus. Em 1928, o jornalista e advogado Manoel dos Reis Araújo comprou o jornal

    e tornou-se o redator-chefe, permanecendo na função até o ano de 1936. Araújo foi

    um importante personagem na construção da mentalidade regional, uma pessoa de

    grande influência, principalmente na imprensa local, e usava desse meio

    comunicativo para defender seus ideais. O conteúdo das publicações dos jornais

    cujo redator era Araújo revela que ele foi um grande defensor da economia cafeeira

    e das pautas paulistanas, tornando-se um dos grandes porta-vozes e defensores da

    Revolução Constitucionalista.

    Durante o período em que “A Notícia” foi comandado por Manoel dos Reis

    Araújo, o jornal recebeu diversos investimentos da rede econômica cafeeira. Em

  • 14

    suas publicações, que aconteciam de terça a domingo, é possível notar que a

    propaganda relacionada a produtos cafeeiros ocupava um espaço significativo e de

    destaque em suas páginas, além do fato de que, com certa frequência, uma parte

    do periódico era dedicada a informações e posicionamentos político-econômicos do

    editor-chefe ou de leitores influentes relacionados à categoria cafeeira, sempre com

    um posicionamento de defesa da classe.

  • 15

    Figura 1 – Página do jornal A Notícia dedicada principalmente a assuntos do café

    Fonte: Jornal A Notícia de 12/11/1931

    É verdade que o jornal teve diversos segmentos políticos no decorrer do

    tempo em que aconteciam alterações nos contextos políticos nacional e local e

  • 16

    mudanças de proprietário e editor-chefe, mas o periódico sempre seguiu um viés

    ideológico de defesa ao republicanismo. Em alguns momentos, A Notícia apoiou

    abertamente o Partido Republicano Paulista (PRP); em outros, mostrou apoio ao

    Partido Republicano Municipal (PRM); ainda, em outros, dizia-se apartidário, porém

    não deixava de clamar pela defesa dos paulistas e da economia cafeeira, mais

    especificamente no período que mais nos interessa, isto é, de 1928 a 1932. Entre

    1928 e 1930, por conta da integração de Manoel dos Reis, o jornal passou por um

    período em que afirmava ser apartidário, conforme se pode ver no excerto abaixo,

    retirado da edição de 16 de setembro de 1928:

    “Fica assim entendido que “A Notícia” não fará política e não seguirá políticos. O nosso jornal será todo dedicado aos interesses do povo e cogitará apenas do progresso material e social de São José do Rio Preto” (A Notícia, 16 set. 1928, p. 1).

    No entanto, um balanço feito por Losnak e Pádua (2017) reforça a

    inexistência do apartidarismo jornalístico:

    “O novo posicionamento do periódico lançou mão da divisão entre informação e opinião nos conteúdos veiculados, sobretudo no âmbito da cidade, que ganhavam espaço nas colunas Câmara Municipal e Prefeitura Municipal. O que se desvelou foi o apoio ao PRP e aos prefeitos do período, Victor Brito Bastos (1927-1928) e Cenobelino de Barros Serra (1928-1930). Os dois governantes, bem como suas administrações, apareceram em textos que privilegiavam a informação, deixando eventuais críticas para os artigos de fundo. Apesar da estratégia, a cumplicidade foi revelada por meio da presença constante da linguagem adjetivada e do tom elogioso.” (Lonask; Pádua, 2017, p. 51).

    Outro indicativo de que o posicionamento apartidário do jornal fazia parte de

    uma estratégia é uma publicação, pelo mesmo editor-chefe, em momento histórico

    diverso, demonstrando o discernimento dele quanto ao poder que o jornal tem de

    administrar certas questões sociais.

    “A imprensa do interior é e, se não é, pode ser, uma força gigantesca, perfeitamente capaz de construir ou demolir instituições, fazer ou desfazer administrações e estabelecer ou demover credos ou convenções políticas” (Campos, 2014, p. 315).

    Durante as eleições de 1930, o jornal se posicionou contrariamente à recém-

    formada Aliança Liberal. Após concretizado o golpe de 30 no dia 27 de outubro, o

    editor-chefe Manoel Araújo foi afastado do jornal, ocupando seu lugar o médico

  • 17

    Levinio de Souza e Silva. Essa substituição foi responsável por uma mudança

    momentânea de posicionamento do jornal. Já na primeira publicação, com o novo

    diretor, era informado com entusiasmo e elogios o golpe que acabava de se efetivar,

    ou seja, com a mudança de redator, o jornal passou a ter uma posição mais

    favorável ao governo provisório que acabava de ser instaurado.

    “Desde sexta-feira á noite, vibrava de enthusiasmo a população de Rio Preto que recebeu com alegria a notícia de que triumphára, na Capital da Republica o movimento revolucionário que deste o dia 3 vinha preocupando à alma brasileira” (A Notícia, 27 de out de 1932, p. 01).

    Figura 2 – Texto publicado pelo novo redator-chefe Levinio de Souza, mostrando um posicionamento mais favorável ao golpe de 1930

    Fonte: Jornal A Notícia de 27/10/1930

    Esse posicionamento, porém, dura apenas um mês, pois, com a volta de

    Manoel dos Reis como redator-chefe, as publicações relacionadas ao governo

  • 18

    provisório são de alerta e crítica à administração pública que se estabelecia no

    Brasil.

    A partir de 1932, quando as disputas políticas entre o governo federal e os

    paulistas começaram a ficar mais acirradas, o jornal passou a ter uma postura de

    defesa absoluta aos paulistas, sem esconder suas convicções e ideologias políticas.

    Essas questões serão abordadas mais detalhadamente no próximo subtópico.

    Contextualizando o período estudado, a obra de Fausto (1995) revela que a

    Revolução Constitucionalista foi um movimento iniciado a partir do momento em que

    aconteceu a Revolução de 1930. Esta ocorreu devido à insatisfação em relação a

    uma antiga forma de administração pública instaurada no Brasil, conhecida como

    “política do café-com-leite” (1898-1930), em que se dividia o governo federal e,

    consequentemente, os holofotes da administração pública, entre os estados de São

    Paulo e Minas Gerais. A Revolução de 1930 articulou-se quando, meses depois da

    derrota da Aliança Liberal de Getúlio Vargas nas eleições populares sobre o

    candidato paulista Júlio Prestes, ocorreu o assassinato de João Pessoa, candidato a

    vice-presidente de Getúlio nas eleições. Fausto (1995) explica, ainda, que tal crime

    aconteceu por causa de uma desavença política regional no estado da Paraíba;

    porém, os integrantes da Aliança Liberal acusam o governo federal pelo ocorrido, a

    fim de agitar o cenário político, convocando, assim, seus aliados a saírem as ruas

    com armas na mão, na tentativa de deposição do então presidente da república

    Washington Luís. Com a ajuda de uma grande concentração provinda da base

    militar, o golpe termina com uma vitória sem muito esforço da Aliança Liberal, dando

    início ao Governo Provisório comandado por Getúlio Vargas.

    Os motivos que deram início à Revolução Constitucionalista surgiram a partir

    do golpe que sucedeu a Revolução de 1930. Esta foi um movimento que tinha,

    dentre sua maioria de representantes, grupos ligados à economia cafeeira — a

    princípio, grande parte pertencente à elite. Por isso, o golpe de 1930 não foi um

    movimento político que agradou essa camada da sociedade, visto que ela era a

    principal favorecida pela antiga “política do café-com-leite”, através de diversas

    regalias fornecidas aos cafeicultores paulistas. A esta classe eram dadas, por

    exemplo, facilidades na concessão de empréstimos, o que lhe permitia desenvolver

    a economia cafeeira e manter baixo o valor da moeda nacional. Tal manobra fazia

    com que o valor do café exportado gerasse grandes lucros quando convertido para a

  • 19

    moeda brasileira, sem mencionar os muitos outros tipos de favorecimento pessoal

    de caráter legal e ilegal tidos como praxe no período.

    Além das mudanças em âmbito nacional que afetaram a economia cafeeira

    paulista, um fenômeno que acontecia na economia internacional acelerou a crise

    aqui dentro. Em outra obra, Fausto (1978) mostra que a crise de 1929 nos Estados

    Unidos foi um período de enorme recessão econômica que acabou por atingir, de

    forma indireta, o mundo inteiro e, de modo direto, o Brasil, que os tinha como os

    maiores aliados na exportação do café. Tal fato resultou em uma crise econômica

    nacional, pois o Brasil ficou impedido de exportar café nas mesmas quantidades de

    antes, ocasionando uma desvalorização no preço do produto internacionalmente.

    Na iminência da concretização do golpe, os paulistas lançaram duras críticas

    ao grupo político que acabava de nascer como oposição e que acabou por liderar a

    Revolução de 1930, a Aliança Liberal. Podemos compreender que havia certo

    discernimento por parte dos paulistas ao se oporem à aliança, pois, em debates

    anteriores às eleições populares, alguns políticos associados à Aliança Liberal

    discursavam que, caso o resultado não fosse favorável para Getúlio Vargas, haveria

    uma revolução. Os pró-paulistas, então, defenderam-se, acusando os políticos

    oposicionistas de estarem articulando uma investida contra o estado de São Paulo,

    de modo a sabotar todo o Brasil. Abaixo, segue a transcrição de um trecho do

    discurso do senador Cândido Nazianzeno Nogueira da Motta, exposto durante a

    tribuna do Senado do Congresso Legislativo do estado de São Paulo em 1929, o

    qual explicita o teor de tais debates. Nele, o senador denuncia e critica as ameaças

    de um possível golpe tramado pela Aliança Liberal.

    A guerra anunciada pela chamada Aliança Liberal não é contra o sr. Júlio Prestes, é contra nosso estado de São Paulo, e isso não é de hoje. A imperecível inveja contra o nosso deslumbrante progresso que deveria ser motivo de orgulho para todo o Brasil. Em vez de nos agradecerem e apertarem em fraternos amplexos, nos cobrem de injúrias e nos ameaçam com ponta de lanças e patas de cavalo! (HÉLIO, 1976, p. 133-134).

    A nova administração pública do Governo Provisório não agradou os

    paulistas. As críticas começaram a ficar mais ácidas quando Getúlio Vargas nomeou

    um antigo integrante da Coluna Prestes, o tenente João Alberto Lins de Barros, para

    o cargo de governador do estado de São Paulo. A atitude desagradou até mesmo

    antigos aliados paulistas da Aliança Liberal, como o Partido Democrático de São

  • 20

    Paulo, fazendo com que as desavenças entre o governo federal e o estado de São

    Paulo aumentassem.

    Fausto (1995) relata que, com a visível perda de espaço político dos paulistas

    e o rompimento da aliança entre o Partido Democrático com o governo federal,

    nasceu uma aliança entre o Partido Democrático e o Partido Republicano de São

    Paulo, formando-se a Frente Única Paulista (FUP) — um movimento cujas

    reinvindicações pautavam-se principalmente na autonomia política de São Paulo, na

    nomeação de um interventor paulista e na criação de uma nova Constituição.

    Getúlio, tentando evitar um conflito, atendeu algumas das reivindicações e nomeou

    um integrante da FUP, Pedro de Toledo, como interventor paulista. O presidente

    incluiu, ainda, na agenda para 1933, uma eleição nacional para a formação de uma

    Assembleia Constituinte. Essas medidas, porém, não foram suficientes para acabar

    com a revolta da FUP e, em 1932, os oposicionistas organizaram um protesto na

    frente da sede do Partido Popular Paulista (PPP), um grupo político que nasceu com

    o golpe de 1930 como aliado de Getúlio Vargas. Os manifestantes tentaram invadir a

    sede, gerando um conflito que resultou na morte de quatro integrantes, entre eles

    Mário Martins, Euclides Miragaia, Dráusio Marcondes e Antônio Camargo. Como

    forma de homenagear os mártires, formou-se o acrônimo M.M.D.C., precursor do

    movimento político conhecido como Revolução Constitucionalista.

    Com o acirramento das desavenças entre o estado de São Paulo e o governo

    federal, eclodiu, em 9 de julho de 1932, uma guerra civil que reivindicava uma nova

    Constituição. Os governos de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, que eram os

    maiores aliados políticos de São Paulo na luta pela revolução, decidiram não

    participar da guerra, fazendo com que aquele fosse um movimento,

    predominantemente, dos paulistas contra o governo federal em vigência.

    Devido ao limitado poderio militar de São Paulo, a guerra armada durou cerca

    de 3 meses apenas, tendo fim no dia 1º de outubro de 1932. Apesar da curta

    duração, foi um movimento que mobilizou setores do estado de São Paulo. A

    imprensa escrita, por sua vez, desempenhou um papel essencial como o principal

    meio de propaganda dos revolucionários e de exortação da população para que

    auxiliasse a causa, fosse através de doações de dinheiro, materiais de guerra e

    alimentos, fosse por alistamento de voluntários para integrar o front de guerra ou até

    mesmo por emprestar automóveis para serem usados em determinados momentos

    do conflito. Nesse sentido, observa-se que a imprensa paulista, além de fazer apelo

  • 21

    em favor da causa revolucionária, defendeu arduamente o estado por meio de

    investimento maciço em propaganda.

    As propagandas constitucionalistas eram muito bem articuladas entre a

    escrita e a imagem daquilo que queriam transmitir para o povo. As chamadas

    imagens-propagandas estavam presentes em cartazes espalhados por toda a região

    de São Paulo, além de serem sempre divulgadas nos jornais aliados. Geralmente,

    tais imagens-propagandas eram acompanhadas de uma escrita chamativa, frases

    que designavam uma obrigação cívica e moral para com a causa. As imagens, por

    sua vez, traziam fortes simbolismos locais, como a grande carga comunicativa em

    torno da figura dos bandeirantes como aliados (por serem considerados heróis

    nacionais, principalmente nas regiões paulistas, eles tinham enorme relevância na

    construção de um imaginário herói regional). Para exemplificar melhor essas

    propagandas paulistas, abaixo são apresentados dois cartazes políticos da

    propaganda do movimento. No primeiro, está a figura do bandeirante, rendendo,

    com as mãos, Getúlio Vargas, representado por uma figura frágil e diminuta, ao

    passo que, no segundo, existe um apelo verbal muito grande, com a presença de

    um soldado e a bandeira paulista ao fundo, fazendo apelo imagético entre a escrita e

    a imagem.

  • 22

    Figura 3 – Cartaz de 1932 exigindo o fim da ditadura Vargas

    Figura 4 – Cartaz de 1932 convocando para o alistamento de soldados

    Fonte: FONZAR, jul. 2015.1 Fonte: FONZAR, jul. 2015.2

    Pensando um pouco sobre o termo historicamente chamado de “Revolução

    Constitucionalista”, vejo tal denominação como um equívoco, pois foi muito mais um

    movimento ou uma contrarrevolução (levando em consideração que o golpe de 1930

    foi chamado de Revolução de 1930) do que propriamente uma revolução. Isso

    porque o aspecto essencial da definição de “revolução” consiste no desejo

    manifestado de um ou mais grupos sociais por mudanças radicais, seja na estrutura

    política, social ou econômica. No entanto, o contexto histórico recente do movimento

    que estamos estudando foi inicialmente coordenado por grupos conservadores que

    tinham também como pauta e objetivo o retorno de velhas formas de administração

    pública. Portanto, analisando todo o processo e considerando um contexto histórico

    não muito distante, a única dúvida na questão linguística do termo empregado fica

    1 Disponível em: . Acesso em: 15 set. 2019. 2 Disponível em: . Acesso em: 15 set. 2019.

    https://universoretro.com.br/conheca-a-historia-do-9-de-julho-e-confira-9-cartazes-da-revolucao-de-32/https://universoretro.com.br/conheca-a-historia-do-9-de-julho-e-confira-9-cartazes-da-revolucao-de-32/

  • 23

    no critério de posicionamento de narrativas: alguém que se posicionava a favor da

    Revolução de 1930 certamente deveria considerar o momento histórico em questão

    como “contrarrevolução”, ao passo que alguém que se posicionava contra tal

    revolução empregaria o termo “movimento”.

  • 24

    2.2 Um olhar sobre a Revolução Constitucionalista a partir do jornal A Notícia

    em São José do Rio Preto

    Exposto o conhecimento sobre o contexto histórico local do nosso objeto de

    estudo, o presente subtópico se propõe a apresentar um estudo mais aprofundado

    acerca da conjuntura local do período da Revolução Constitucionalista na região de

    São José do Rio Preto, referenciando-se no jornal “A Notícia”.

    Pretende-se mostrar algumas participações de apoio regional, não apenas da

    elite local, mas do poder público e de grande parte dos habitantes em apoio à causa

    constitucionalista. Neste período, algumas instituições locais, em conjunto com uma

    parcela da população, dedicaram-se ao auxílio da causa com entusiasmo, fazendo

    doações de dinheiro ou de material de guerra, disponibilizando serviços profissionais

    (como o de costureiras, para a confecção de trajes de batalha), mobilizando

    voluntários para servir na guerra e modificando momentaneamente a administração

    pública, entre outras formas de assistências que estavam ao alcance dos

    apoiadores.

    Conforme mencionado anteriormente, o jornal “A Notícia” foi um informativo

    diário que sempre teve um posicionamento político alinhado à defesa dos interesses

    paulistas e dos produtores de café e, durante a Revolução Constitucionalista, não foi

    diferente, já que suas publicações foram articuladas com o intuito engrandecer o

    Movimento. No ano de 1932, quando as desavenças entre o estado de São Paulo e

    o governo federal começaram a ficar mais acaloradas, o jornal adotou uma postura

    mais radical, sem esconder suas filosofias políticas a favor dos revoltosos paulistas.

    A seguir, vê-se uma matéria do jornal “A Notícia” sobre a mobilização dos

    habitantes da região manifestando apoio ao protesto do dia 23 de maio (que deu

    origem ao movimento M.M.D.C.), insinuando que a população se mostrava animada

    em defender o movimento contra a ditadura Vargas.

  • 25

    Figura 5 – Notícia sobre a solidariedade mostrada pela população

    Fonte: Jornal A Notícia de 25/05/1932

  • 26

    O texto mostra que, desde o início, o movimento tinha, como líderes,

    importantes membros da elite regional — entre eles, políticos, médicos, advogados,

    jornalistas e engenheiros. Uma das figuras mais influentes, o político e advogado

    Theotonio Monteiro de Barros foi eleito deputado federal logo após a revolução,

    quando se fizeram novas eleições, em 1934, e, posteriormente, no governo João

    Goulart, em 1963, tornou-se ministro da Educação. Um dos indicativos de que essa

    foi uma manifestação também de cunho popular reside no horário escolhido

    estrategicamente para seu início: 17 horas, perto do fim do expediente da maioria

    dos trabalhadores (horário comercial), permitindo que eles participassem. Tal

    movimento incomum provocou uma anomalia na estrutura cotidiana da cidade, que

    costumava fechar o comércio às 18 horas, mas, naquele dia, devido à manifestação

    que ocorreria, os comerciantes baixaram as portas às 16 horas, ambientando um

    clima de que grande parte da população estava apoiando o movimento, como

    demonstra um dos trechos da publicação:

    A’ tarde, corriam pela cidade boletins de convite para a assemblèa popular e ao commercio para que cerrasse as suas portas. A’s 16 horas todo o commercio se fechava e ás 17, era já grande a multidão que se comprimia em frente á Cathedral. (A Notícia, 25 maio 1932, p. 01)

    Devido ao fato de as grandes manifestações contra o governo federal que

    tiveram visibilidade nacional — como a que deu origem ao movimento M.M.D.C. —

    terem acontecido na capital paulista, o problema do descaso da administração

    pública federal para com os paulistas parecia ser centralizado na metrópole. No

    entanto, uma publicação do jornal “A Notícia” do dia 23 de julho de 1932 criticando a

    discrepância entre a arrecadação feita pela tributação federal na região da Alta

    Araraquarense e o baixo retorno desses impostos para melhoria de serviços

    públicos que se encontravam precários mostra que isso também ocorria no interior

    do estado. A partir do levantamento de dados feito pelo jornal, como demonstrado

    na matéria abaixo, constata-se que, em 1931, a região entregou para o cofre federal

    cerca de 5.500:000$000 réis e que o retorno foi de apenas 700:000$000 réis para

    investimento na região, resultando na “somma liquida, limpinha, de quatro mil e

    oitocentos contos de reis (4:800:000$000)”. (A Notícia, 23 de junho de 1932, p. 1).

    Figura 6 – Noticia sobre o descaso federal com o interior paulista

  • 27

    Fonte: Jornal A Notícia de 23/06/1932

    O desgaste público entre o governo federal e o paulista, em virtude dos

    fatores já mencionados, somado ao sucateamento da administração cafeeira,

    catalisando uma crise na economia do produto, e alinhado também ao descaso da

    União especificamente com a região local a que pertence São José do Rio Preto,

  • 28

    como demonstra a matéria acima, acabou por gerar revoltosos locais; entre estes,

    membros da elite e da população menos favorecida.

    Tal conjuntura foi responsável, na região, por uma intensificação no apoio

    aos revolucionários paulistas, a qual, quando se iniciou a luta armada em 9 de julho

    de 1932, resultou num período peculiar de mudanças na administração pública e

    privada que favoreceram o levante. Um grande exemplo desse tipo de mudança

    pode ser visto na estrutura jornalística do jornal “A Notícia”. Antes da Revolução

    Constitucionalista, o informativo dedicava somente algumas poucas seções de suas

    páginas em defesa do movimento que já se iniciava na capital, ao passo que as

    partes mais importantes das folhas eram preenchidas com notícias de diversas

    categorias nacionais e regionais (entre essas categorias, viam-se,

    costumeiramente, notícias sobre esporte, moda, política, economia, tecnologia,

    arte, religião, educação, anúncios e classificados). Porém, quando se iniciou o

    movimento armado, o jornal mudou completamente a composição de suas notícias,

    dedicando suas páginas quase inteiramente à divulgação de elementos

    relacionados à Revolução Constitucionalista. Tais elementos serão analisados com

    detalhes mais adiante.

    O jornal seguiu com sua programação normal em 10 de julho (um dia após o

    início do movimento armado), em consequência das incertezas sobre o que estava

    acontecendo na capital, levando em consideração que as informações na época

    eram veiculadas de forma mais lenta. Nessa data, o informativo reservou uma parte

    de suas folhas à matéria intitulada “O momento político, segundo as notícias e os

    boatos” (A Notícia, 10 julho 1932, p. 1), a qual trazia informações sobre as

    movimentações políticas ocorridas em São Paulo e no Rio de Janeiro no dia 9, mas

    ainda nenhuma informação sobre o movimento armado sucedido no mesmo dia. Ou

    seja, um dia após o início da luta armada, a própria imprensa jornalística aliada aos

    paulistas não tinha conhecimento do que estava por vir.

    As publicações do jornal aconteceram diariamente, mas, devido a uma falha

    na conservação de fontes da cidade, depois dessa data, temos acesso apenas às

    edições publicadas a partir do dia 14 de julho. Assim, a partir da análise dessa

    publicação, já é possível perceber que estruturas sociais locais privadas e públicas

    já haviam se mobilizado com rapidez e organização para auxiliar da maneira que

    fosse possível as tropas revolucionárias.

  • 29

    A fonte jornalística pode oferecer diversas informações sobre o contexto

    social de uma região. Quando as circunstâncias mudam drasticamente, o jornal

    acompanha esse ambiente, e não foi diferente com A Notícia. As estruturas

    cotidianas modificaram-se e as autoridades da região de São José do Rio Preto

    utilizaram os jornais como o maior aliado na divulgação de chamados, orientações,

    mobilização e na tentativa de obter auxílio da população para certas questões

    pertinentes à guerra.

    Devido a essa função social exercida pelo jornal em períodos de guerra,

    podemos extrair informações valiosas de um contexto regional e, fazendo uma

    análise no caso do noroeste paulista, vemos que, mesmo afastada da capital, a

    região teve um papel relevante no auxílio aos revolucionários paulistas. Para

    materializar essas palavras, apresenta-se, abaixo, a primeira página do jornal de 14

    de julho, que, poucos dias após o início da guerra declarada, já trazia informações

    de extrema importância sobre a organização estrutural da região, que se articulou

    de forma a auxiliar os revolucionários.

    Como já mencionado, a Estrada de Ferro Araraquara foi uma importante

    obra, inicialmente privada, realizada por cafeicultores com o objetivo de escoar sua

    produção. A estrada de ferro aumentou a visibilidade da cidade de São José do Rio

    Preto, não apenas pela função econômica de escoar produtos, mas também pelo

    fato de tornar a cidade um ponto de parada de passageiros que desejavam seguir

    viagem para outras regiões, como a de Araraquara, Taquaritinga ou Itaquerê. No

    período específico, ela foi importante para o transporte dos soldados que se iam ou

    voltavam do front de batalha, pois, além de ser culturalmente conhecida como um

    ponto de viajantes, teve a função de abrigá-los. Como consta na matéria da edição

    abaixo (A Notícia, 14 julho 1932, p. 1), intitulada “Chegou hontem a esta cidade a

    2.a Companhia do 7.o B. I. da Força Publica”, cento e sessenta homens, entre eles

    soldados e sargentos, chegaram de trem à cidade e foram acolhidos pela

    população, sendo alojados gratuitamente em dois hotéis pelos proprietários desses

    estabelecimentos, com o objetivo de ajudar o movimento.

    Figura 7 – Primeira página do jornal totalmente dedicada aos assuntos da guerra

  • 30

    Fonte: Jornal A Notícia de 14/07/1932

    Em apenas uma página do jornal, encontramos informações relevantes

    quanto à mobilização de uma parcela da população regional a favor do Movimento

    Constitucionalista, como podemos ver na última notícia da coluna central da página

    acima. Desde o início do movimento, as autoridades recrutavam voluntários para

    participarem de treinamentos militares, visando uma possível convocação para o

  • 31

    front de batalha. Nesse momento, os voluntários foram convocados para receberem

    instruções do Tenente Bento Casado, comandante da 2ª Companhia da Força

    Pública e recém-chegado a Campinas. Na mesma folha em questão, está presente

    outro comunicado, solicitando a presença de voluntários para o alistamento no Posto

    Policial da cidade. Tal comunicado é de autoria do Capitão Elpidio Silveira, que,

    futuramente, em 19 de julho daquele ano, comandaria a subunidade do batalhão

    “Francisco Glycerio” com destino ao front de São José do Rio Pardo. O texto traz

    informações quanto ao número de favoráveis ao movimento da região partindo

    naquele momento para a guerra. Uma notícia do mesmo jornal, em sua edição do

    dia 20 de julho, relata esse acontecimento, conforme segue:

    Sem arrefecer a conscripção de voluntários, destes partiram hontem os que são reservistas e alguns que não o são. Seguiram em numero de 100, sob o comando do capitão Elpidio Silveira. (A Notícia, 20 julho 1932, p. 01).

    Outra mudança de organização pública na cidade reside no fato de que, antes

    do início da guerra civil, certa quantidade da guarda e policiamento local era

    composta por pessoas pertencentes à reserva do exército. Quando se iniciou o

    movimento, esses reservistas foram convocados para integrarem os fronts de

    guerra, ocasionando uma carência na segurança pública. Com o objetivo de resolver

    o transtorno, organizou-se uma reunião para deliberar acerca dos procedimentos

    cabíveis à situação, conforme se pode ver no excerto a seguir:

    “Por intermédio de algumas pessoas de destaque social e de autoridades publicas, sob a inspecção provisória dos srs. Drs Juiz de Direto, Promotor Publico e Delegado Regional de Policia, vae organizar-se a Guarda Civil de Rio Preto, a qual ficará incumbida dos serviços de policiamento da cidade e de outros que a boa ordem e segurança local exijam.” (A Notícia, 21 julho 1932, p. 02).

    No dia seguinte a essa reunião, foi publicado no jornal como seria realizado o

    procedimento de segurança provisório da Guarda Civil, sendo organizada uma

    comissão de policiamento comandada por 6 grupos diferentes. Cada grupo tinha à

    disposição 30 guardas e ficaria encarregado de fazer o policiamento da cidade

    durante um período de 4 horas. Nessa mesma publicação, foi divulgada uma lista

    com os nomes dos guardas e uma enumeração que correspondia aos horários de

    atuação. O último trecho, transcrito a seguir, deixa evidente que o jornal era um

  • 32

    veículo de extrema importância na comunicação local, alcançando até mesmo o

    status de comunicador oficial de certos órgãos:

    Os números de cada guarda civil são os que constam da relação acima e não os que foram dados hontem pessoalmente a alguns guardas. (A Notícia, 21 de junho de 1932, p. 02).

    Além dessa organização provisória da Guarda Civil, a cidade contou com a

    contribuição dos jovens que faziam parte do tiro de guerra para a realização de

    rondas noturnas. Essa função ficou dividida em dois grupos que se revezaram

    diariamente, conforme mostra a publicação no jornal abaixo, ressaltando diversos

    elogios aos jovens patrulheiros que contribuíam para a segurança noturna da

    cidade:

    Os moços do tiro de Rio Preto, ao contrario, têm feito jús á gratidão dos riopretanos. Solertes e activos, percorrem pela noite afòra todos oo pontos da cidade, systematicamente, vigiando e olhando por tudo, garantindo o sossego da população, fazendo à maravilha o policiamento de que estão encarregados. (A Notícia, 22 de julho de 1932, p. 4)

  • 33

    Figura 8 – Notícia sobre a guarda noturna

    Figura 9 – Comunicados da Prefeitura

    Fonte: Jornal A Notícia 25/07/1932

    Fonte: Jornal A Notícia 22/07/1932

    A Prefeitura Municipal de São José do Rio Preto, em certos momentos

    durante a guerra civil, interveio diretamente com o objetivo de ajudar o movimento.

    Quase diariamente, a prefeitura lançava, no jornal, notas autenticadas pelo prefeito,

    pedindo certos favores aos cidadãos ou noticiando algumas exigências necessárias,

    devido ao momento político. Em 28 de julho, por exemplo, foi publicado um apelo

    aos cidadãos para que evitassem o uso de automóveis, utilizando-os apenas em

    casos de emergência (A Notícia, 28 de julho de 1932, p. 2), com o objetivo de

    diminuir o consumo de combustível, a fim de manter uma reserva no estoque de

    gasolina dos postos locais para uma possível eventualidade devido à guerra. Não

    obtendo uma resposta positiva da população, no dia 31 de julho, foi lançada uma

    nota da prefeitura municipal, exigindo que os comerciantes de postos de gasolina

    vendessem seu combustível apenas mediante a apresentação de um visto

    concedido pelo delegado técnico, que o concederia apenas a quem ele julgasse ser

  • 34

    necessário. Como punição, o comerciante que descumprisse essa exigência teria de

    pagar uma multa no valor de 500$000 a 5:000$000 contos de réis (A Notícia, 31 de

    julho de 1932, p. 5). Esse caso revela que nem todos estavam animados em apoiar

    o movimento, pois, ao mesmo tempo em que uma parcela da sociedade local se

    mostrava disposta em auxiliar o movimento, outra parte seguiu sua vida de forma

    natural.

    Em outra ocasião, no dia 21 de julho, a prefeitura solicitou aos donos de

    automóveis de carga e passageiros que registrassem seus veículos no órgão, a fim

    de disponibilizá-los às autoridades locais (A Notícia, 21 julho 1932, p. 1). O objetivo

    era que se usufruísse dos veículos em caso de necessidade de auxílio às tropas

    paulistas. Apenas quatro dias depois, em 25 de julho, uma nova nota emitida pela

    prefeitura pedia que os donos dos automóveis registrados comparecessem

    diariamente à prefeitura a fim de tomar conhecimento se seu veículo poderia ou não

    ser utilizado em favor das forças militares naquele momento (A Notícia, 25 de julho

    de 1932, p. 1).

    Figura 10 – Regulamentação do consumo de gasolina

    Fonte: Jornal A Notícia 31/07/1932

    Figura 11 – Pedido de redução de gasto de gasolina

  • 35

    Fonte: Jornal A Notícia 28/07/1932

    Verifica-se, acima, uma medida provisória de racionamento de combustível.

    Isso se deve também às consequências da guerra, que foi responsável por gerar

    uma crise geral no estado de São Paulo e, consequentemente, no Noroeste

    Paulista. A recessão afetou a disponibilidade não apenas de combustível, mas

    também de produtos essenciais, como alimentos, o que levou a Força Pública

    Paulista a considerar necessária a criação da Comissão do Pão de Guerra. Essa

    comissão ficou responsável por instituir a obrigatoriedade de mistura de farinha de

    trigo com fubá de milho e raspa de mandioca na massa do pão, além de ter a função

    de tabelar a porcentagem permitida de cada produto e o preço do pão (que

    constantemente era alterado), sendo a prefeitura municipal a responsável pela

    fiscalização do cumprimento da lei por parte dos estabelecimentos comerciais. As

    mudanças no tabelamento da quantidade de produto e o preço final eram publicados

    pelo jornal “A Notícia” com o visto do prefeito municipal.

    Uma guerra civil com as proporções da Revolução Constitucionalista tem

    como consequência uma profunda alteração na economia local, gerando uma crise

    que atinge diretamente os menos afortunados, sendo necessária, em alguns

    momentos, a intervenção de órgãos públicos na comercialização de produtos

    necessários, como foi estabelecido pela Comissão do Pão de Guerra.

  • 36

    Além do aspecto econômico, uma guerra dessa proporção suscita a

    necessidade de aclamar voluntários civis para integrar o front de batalha. Por serem

    homens, esses voluntários, em sua maioria, eram responsáveis pela maior parte da

    renda familiar, e sua convocação resultou em um momento de grandes dificuldades

    financeiras para as famílias. Preocupados com essa situação, inerente a uma guerra

    civil, diversos setores da população local de São José do Rio Preto articularam-se,

    com o objetivo de dar às famílias dos voluntários a assistência necessária — alguns,

    movidos por um sentimento de altruísmo; outros, com o intuito de ajudar diretamente

    a Revolução, tentando, dessa forma, convocar mais voluntários para integrar o front

    de batalha.

    Uma entidade que teve um importante papel na assistência às famílias de

    voluntários foi a Igreja Católica. Em resposta a uma convocação feita no dia anterior

    pelo jornal “A Notícia” para que se realizasse uma mobilização nesse sentido, o

    bispo Dom Lafayette Libânio enviou uma carta que foi replicada pelo jornal,

    informando sobre uma iniciativa, criada por ele e outros órgãos locais relacionados à

    Igreja Católica, de “organizar os serviços de amparo material e espiritual ás famílias

    dos nossos bravos soldados que estão partindo para a luccta”. (A Notícia, 20 de

    julho de 1932, p. 4).

    Outro momento de atuação política da Igreja foi o ocorrido durante a famosa

    Campanha de Ouro para o bem de São Paulo, que atingiu o estado inteiro, incluindo

    o Noroeste Paulista. Essa campanha tinha o objetivo de arrecadar ouro ou outras

    espécies de donativos afins para auxiliar financeiramente o Movimento

    Constitucionalista. A Igreja foi uma das responsáveis para que “constituíssem uma

    comissão de pessoas bem conceituadas de Rio Preto, a qual ficaria investida da

    autorização de receber aqui os donativos destinados á Campanha” (A Notícia, 16 de

    agosto 1932, p. 2).

  • 37

    Figura 12 - Noticia sobre a Campanha de Ouro para o bem de São Paulo

    Fonte: Jornal A Notícia de 16/08/1932

    Como forma de demonstrar gratidão às pessoas que doaram materiais

    necessários para o financiamento da guerra — tecidos, alimentos, ouro, armas e

    dinheiro —, o jornal publicava diariamente o nome dos contribuintes e o insumo

    doado, bem como sua quantidade, com uma nota de agradecimento. A partir desse

    costume, é possível ver que a iniciativa das doações partiu de diversos setores

    sociais. Com base nas publicações da relação de doadores para a Campanha de

    Ouro para o bem de São Paulo, nota-se uma considerável quantidade de pessoas

    que doavam joias, como alianças, colares, pulseiras, anéis e relógios, entre outros

  • 38

    objetos que normalmente eram produtos passados de uma geração a outra,

    mostrando assim o engajamento da população de baixa renda.

    A Campanha de Ouro para o bem de São Paulo teve a ajuda não somente da

    população, mas de diversos setores regionais. Entre essas ajudas financeiras,

    chama a atenção a do Rio Preto Esporte Clube, o único clube de futebol da cidade

    naquela época. Percebe-se, através desse auxílio, o quanto o clube estava engajado

    no momento político, já que a contribuição não foi feita em dinheiro, mas com a

    entrega de suas taças para a campanha, além do fornecimento incondicional do seu

    campo de futebol para o treinamento militar dos voluntários. Podemos ver, no trecho

    abaixo, a notícia da entrega das taças e a participação em conjunto da Igreja

    Católica local. No total, foram doadas 56 taças e dois troféus de bronze — objetos

    que rememoravam todas as conquistas do clube até então.

    “Conforme estava marcado relizou-se hontem ás 17,20 na sede da agencia local do Banco do Commercio e Industria de São Paulo a entrega, á Commissão do Ouro para a Victoria, dos troféus conquistados pelo Rio Preto Esporte Clube em toda a sua existência. A’ hora marcada, naquele local se encontraram o revmo. Monsenhor Joaquim Manuel Gonçalves…” (A Notícia, de 28 agosto 1932, p.04).

  • 39

    Figura 13 – Relação das pessoas que doaram ouro

    Fonte: Jornal A Notícia de 17/08/1932

    Figura 14 – Notícia sobre a doação de troféus do Rio Preto E.C.

  • 40

    Fonte: Jornal A Notícia de 28/08/1932

    A partir desses levantamentos sobre a participação da região de São José do

    Rio Preto na Revolução Constitucionalista, foi possível vislumbrar uma efetiva

    contribuição de certas esferas da sociedade, como a pública, a privada e a popular.

    Embora nem todos estivessem apoiando o Movimento ao ponto de até mesmo

    sabotar certas exigências do Poder Público, como no caso da diminuição do

    consumo de combustível, alguns contribuíram com tudo o que podiam,

    abandonando suas famílias para fazer parte de uma guerra; outros, auxiliaram

    financeira ou materialmente para ajudar as famílias dos soldados que partiram para

    a guerra.

    A análise dos fatos permitiu concluir que esse momento histórico foi um

    período de extrema ruptura com a normalidade cotidiana de várias categorias que

    envolviam o funcionamento de uma cidade, como a economia, administração

    pública, segurança, comércio e na imprensa, além das relações interpessoais.

    Portanto, levando em consideração todas essas nuances que favoreceram a

    ocorrência de tão significativa anomalia cotidiana regional, pode-se concluir que,

  • 41

    mesmo tendo o Movimento Constitucionalista durado poucos meses, o Noroeste

    Paulista, mais especificamente o município de São José do Rio Preto, contou com

    significativos auxílios de diversos setores da sociedade.

  • 42

    3. CONCLUSÃO

    Concluímos que, a partir das informações adquiridas através das fontes

    analisadas, podemos inferir a existência de uma anomalia cotidiana na configuração

    da administração pública e privada, em virtude da significativa participação de

    alguns setores da sociedade rio-pretense em apoio aos revoltosos paulistas durante

    o período da Revolução Constitucionalista.

  • 43

    REFERÊNCIAS Annuario Estatistico de São Paulo (1929). São Paulo: Imprensa Official do Estado, 1935. BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. p. 54-55. Tradução: André Telles CAMPOS, Raquel Discini de. Mulheres e crianças na imprensa paulista (1920-1940): representação e história. 2007. 216 f. Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, 2007. CAMPOS, Raquel Discini de. Imprensa e educação feminina em zona pioneira: o caso do Noroeste Paulista (1920-1940). Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 34, n. 67, p. 309-322, 2014. FAUSTO, Boris. A crie dos anos vinte e a Revolução de 1930. HGCB, tomo III, v. 2. São Paulo:Difel, 1978. FAUSTO, Boris (org.). O Brasil Republicano: economia e cultura (1930-1964). tomo 3, vol.4. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 1995. (Col. História da Civilização Brasileira) LOSNAK, CÉLIO JOSÉ; PÁDUA, ALINE FERREIRA. A Notícia, 1924-1930: jornalismo no interior e política local. Revista Brasileira de História da Mídia, v. 6, p. 42 - 56, 2017 MAHL, M. L. Natureza e progresso econômico no Noroeste Paulista (1910-1920). Revista História (São Paulo), v. 32, n. 2, p. 49-63, jul./dez. 2013. MAHL, M. L. ; CAMPOS, R. D. (Org.) ; CARVALHO JUNIOR, C. (Org.) . Terra (in)cógnita: novos estudos sobre São José do Rio Preto. 1. Ed. Campinas: Pontes, 2011. MARTINS,Ana Luiza;DE LUCA, Tania Regina. História da Imprensa no Brasil. São Paulo: Contexto, 2008. RODRIGUES, João Paulo. Levante Paulista de 1932: entre os domínios da memória e os (des)caminhos da história. Projeto História (Online). v.41, p. 125-153, 2011.

  • 44

    SILVA, Helio. 1932: a guerra paulista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1976.

  • 45

    FONTES Nova phase. A Notícia. São José do Rio Preto, 16 set. 1928, p. 01. Rio Preto recebeu a noticia da victoria da Revolução. A Notícia. São José do Rio Preto, 27 out. 1930, p. 01. A NOTÍCIA. São José do Rio Preto, 12 nov. 1931, p. 01. O povo de Rio Preto manifestou, hontem, num comício enthusiastico, os sentimentos de plena solidariedade com a causa de São Paulo, A Notícia. São José do Rio Preto, 25 mai. 1932, p. 01. A Alta Araraquarense concorreu em 1931, para o orçamento do Estado com 5.500:000$000!. A Notícia. São José do Rio Preto, 23 jun. 1932, p. 01. O momento político, segundo as noticias e os boatos. A Notícia. São José do Rio Preto. 10 jul. 1932, p. 01. A NOTÍCIA, São José do Rio Preto, 14 jul. 1932, p. 01. Bandeira de Alistamento Militar. A Notícia. São José do Rio Preto. 20 jul. 1932, p. 01. Prefeitura Municipal. A Notícia. São José do Rio Preto, 21 jul. 1932, p. 01. Serviços dignos de Honrosa Menção. A Notícia. São José do Rio Preto, 22 jul. 1932, p. 04. Reduzam o gasto de gasolina. A Notícia. São José do Rio Preto, 28 jul. 1932, p. 01. Regulamentação do Consumo de gasolina. A Notícia. São José do Rio Preto, 31 jul. 1932, p. 05. Campanha do ouro para o bem de São Paulo. A Notícia. São José do Rio Preto, 16 ago. 1932, p. 01. Ouro para o bem de São Paulo. A Notícia. São José do Rio Preto, 17 ago. 1932, p. 02.

  • 46

    Os tropheus do “Rio Preto E.C.” foram entregues hontem á commissão do “Ouro para a victoria”. A Notícia. São José do Rio Preto, 28 ago. 1932, p. 04.