105
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE FÍSICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA MARCELO NUNES COELHO ESPECTROSCOPIA RAMAN NO MOLIBDATO DE MAGNÉSIO E MOLIBDATO DE LÍTIO SOB ALTAS PRESSÕES FORTALEZA 2014

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE CIÊNCIAS ... · Biblioteca do Curso de Física C678e Coelho, Marcelo Nunes ... Maczka, Prof. Dr. Cleânio da Luz-Lima, Prof. Dr. Gilberto

Embed Size (px)

Citation preview

  • 0

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR

    CENTRO DE CINCIAS

    DEPARTAMENTO DE FSICA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM FSICA

    MARCELO NUNES COELHO

    ESPECTROSCOPIA RAMAN NO MOLIBDATO DE MAGNSIO E MOLIBDATO

    DE LTIO SOB ALTAS PRESSES

    FORTALEZA

    2014

  • 1

    MARCELO NUNES COELHO

    ESPECTROSCOPIA RAMAN NO MOLIBDATO DE MAGNSIO E MOLIBDATO DE

    LTIO SOB ALTAS PRESSES

    Tese apresentada ao Programa de Ps-

    Graduao em Fsica do Departamento de

    Fsica da Universidade Federal do Cear, como

    parte dos requisitos para a obteno do Ttulo

    de Doutor em Fsica. rea de Concentrao:

    Fsica da Matria Condensada.

    Orientador: Prof. Dr. Paulo de Tarso

    Cavalcante Freire

    FORTALEZA

    2014

  • 2

    MARCELO NU

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    Universidade Federal do Cear

    Biblioteca do Curso de Fsica

    C678e Coelho, Marcelo Nunes Espectroscopia Raman no Molibdato de Magnsio e Molibdato de Ltio sob altas

    presses / Marcelo Nunes Coelho. Fortaleza, 2014. 105 f.: il. color. enc.; 30 cm. Tese (Doutorado em Fsica) Universidade Federal do Cear, Centro de Cincias,

    Departamento de Fsica, Programa de Ps-Graduao em Fsica, Fortaleza, 2014. Orientao: Prof. Dr. Paulo de Tarso Cavalcante Filho. rea de concentrao: Fsica da Matria Condensada. 1. Espectroscopia Raman. 2. Molibdatos. 3. Altas presses. 4. Transies de fase.

    5. Amorfizao. I. Cavalcante Filho, Paulo de Tarso. II. Ttulo.

    CDD 530

  • 3

    __________________________________________

    Prof. Dr.

    Orientador

    Aos meus Pais Evandro e Ceclia.

    minha esposa Simony.

    minha filha Fernanda.

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Paulo de Tarso Cavalcante Freire, pois sem o apoio e

    compreenso incomensurveis do mesmo este trabalho no teria sido possvel;

    Aos professores do mestrado e doutorado pela excelncia na transmisso de seus

    saberes e experincias;

    Aos colegas e amigos de disciplinas e, de uma forma especial, como no poderia

    deixar de ser, ao Agmael (Sakurai), ao Valdenir, ao Florncio e Slvia Helena;

    todos os servidores do Departamento de Fsica pela facilitao que propiciaram

    ao longo dessa etapa;

    Aos que contriburam para o aperfeioamento deste trabalho: Prof. Dr. Mirek

    Maczka, Prof. Dr. Clenio da Luz-Lima, Prof. Dr. Gilberto Dantas Saraiva, Prof. Dr. Waldecir

    Paraguassu, Prof. Dr. Antnio Gomes de Souza Filho e Prof. Dr. Paulo Srgio Pizani;

    Aos meus amigos eternos e companheiros incondicionais Mardnio Coelho e

    Auxiliadora (Lel), pela mais que valiosa e inestimvel ajuda para subir o primeiro degrau;

    Aos meus ex-professores e pra sempre amigos Carlos Braga e Miguel Petrarca pelo

    incentivo e confiana;

    Aos meus familiares, em especial, meu pai Evandro e minha me Ceclia, pela

    dedicao com que me educaram tornando possvel sonhar com essa realizao;

    minha filha Fernanda, por ser minha fonte de inspirao; e

    minha esposa Simony, por ser, alm de fonte de inspirao, a maior

    incentivadora, a companheira ideal e a pessoa mais leal que conheo.

    CAPES, pelo apoio financeiro.

  • 5

    melhor atirar-se luta em busca de dias

    melhores, mesmo correndo o risco de perder

    tudo, do que permanecer esttico, como os

    pobres de esprito, que no lutam, mas tambm

    no vencem, que no conhecem a dor da

    derrota, nem a glria de ressurgir dos

    escombros. Esses pobres de esprito, ao final de

    sua jornada na Terra no agradecem... por terem

    vivido, mas desculpam-se..., por terem apenas

    passado pela vida.

    Bob Marley

  • 6

    RESUMO

    Neste trabalho, foi realizada uma investigao, atravs de espectroscopia Raman, dos modos

    vibracionais do molibdato de magnsio MgMoO4 submetido a altas presses at o limite de 8,5

    GPa, e do molibdato de ltio Li2MoO4 em dois experimentos at os limites de 5,0 e 7,0 GPa,

    respectivamente. A anlise dos espectros obtidos revelou para o MgMoO4 uma mudana

    significativa no padro espectral do material em torno da presso de 1,4 GPa. Para o molibdato

    de ltio, no primeiro experimento, as mudanas ocorrem, entre 0,0 e 3,1 GPa e acima de 4,5

    GPa. No segundo experimento, mudanas semelhantes quelas (entre 0,0 e 3,1 GPa) do

    primeiro experimento, aparecem entre 1,1 e 3,8 GPa, alm de algumas alteraes acima de 5,0

    GPa. Todas as mudanas foram confirmadas pela anlise das curvas . Para o MgMoO4,

    essas alteraes nos espectros foram interpretadas como sendo devidas a uma transio de fase

    sofrida pelo material em 1,4 GPa. Foi possvel perceber tambm, que a transio irreversvel,

    tendo em vista que o espectro do material medido 16 horas aps a presso ter sido relaxada para

    1 atm resultou semelhante quele obtido acima de 1,4 GPa (presso da transio). feita uma

    discusso sobre a possvel fase de alta presso, onde se leva em conta algumas semelhanas

    entre o MgMoO4 e outros cristais de molibdatos e tungstatos. Entre algumas possibilidades

    sugere-se que a transio de fase seja do tipo C2/m P2/c (C2h4), o que descarta a

    eventualidade de uma transio de fase isoestrutural. Para o Li2MoO4, no primeiro experimento,

    as primeiras alteraes so interpretadas como sendo devidas a uma transio de fase. Esta

    transio de fase, no segundo experimento, parece acontecer entre 1,1 e 3,8 GPa. J as

    alteraes que acontecem em seguida em ambos os experimentos, foram explicadas como sendo

    oriundas ou de uma possvel amorfizao (primeiro experimento) ou de uma nova transio de

    fase (segundo experimento). feita uma discusso sobre o mecanismo da amorfizao no

    primeiro experimento, e o porqu do fenmeno no ter sido observado no segundo experimento.

    Para isso levou-se em conta as diferentes condies experimentais e a

    hidrostaticidade/quasehidrostaticidade do fluido compressor utilizado.

    Palavras-chave: Espectroscopia Raman, Molibdatos, Altas Presses, Transio de Fase,

    Amorfizao

  • 7

    ABSTRACT

    In this work it was carried out an investigation by Raman spectroscopy, of the vibrational modes

    of the magnesium molybdate MgMoO4 subjected to high pressures up to 8.5 GPa, and lithium

    molybdate Li2MoO4 - in two experiments up to the limits of 5.0 and 7.0 GPa, respectively.

    The analysis of the spectra obtained for MgMoO4 revealed a significant change in the spectral

    pattern of the material around the pressure of 1.4 GPa. For the lithium molybdate in first

    experiment, such changes occured between 0.0 and 3.1 GPa and above 4.5 GPa. In second

    experiment, changes similar to those observed (between 0.0 and 3.1 GPa) in the first

    experiment, appeared between 1.1 and 3.8 GPa, and additional changes occurred above 5.0

    GPa. All changes were confirmed by analysis of the curves. For MgMoO4, these changes

    in the spectra were interpreted as being due to a phase transition undergone by the material at

    1.4 GPa. It was also possible to see that the transition is irreversible, taking into consideration

    that the spectrum of the material measured 16 hours after the pressure releasing to 1 atm was

    similar to that obtained above 1.4 GPa (the pressure transition). It is made a discussion about

    of the possible nature of the high-pressure phase, which takes into account some similarities

    between MgMoO4 and other molybdates and tungstates crystals. Among some possibilities it

    is suggested that the phase transition is of type C2/m P2/c (C2h4), which discards the

    possibility of an isostructural phase transition. For Li2MoO4 in the first experiment, the first

    changes are interpreted as being due to a structural phase transition. This phase transition, in

    the second experiment, seems to happen between 1.1 and 3.8 GPa However the additional

    changes that happen in both experiments at the higher pressures, were explained as being

    derived either from a possible amorphization (first experiment) or from a new structural phase

    transition (second experiment). It is made a discussion of the amorphization mechanism in the

    first experiment, and why the phenomenon has not been observed in the second experiment.

    For this we took into consideration the different experimental conditions and the hydrostaticity

    / quasi-hydrostaticity of the compressing fluid used.

    Keyword: Raman Spectroscopy, Molybdates, High Pressure, Phase Transition, Amorphization

  • 8

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Estrutura Scheelita (a) e Wolframita (b), vistas ao longo dos eixos cristalogrficos, a, b e c da

    esquerda para a direita. .......................................................................................................................... 13

    Figura 2 Clula unitria da estrutura cristalina do molibdato de magnsio vista ao longo dos eixos

    cristalogrficos a, b e c respectivamente ............................................................................................... 17

    Figura 3 Clula unitria da estrutura cristalina do molibdato de ltio ao longo das direes

    cristalogrficas a, b e c respectivamente. .............................................................................................. 18

    Figura 4 Duas massas m1 e m2 presas por uma mola de constante k. Representao simplificada de

    uma molcula diatmica........................................................................................................................ 20

    Figura 5 Diagrama com a representao do modelo de transferncia de energia para os espalhamentos

    Raman Stokes, Raman anti-Stokes e Rayleigh. .................................................................................... 25

    Figura 6 Estrutura do molibdato de magnsio ao longo das direes cristalogrficas a, b e c,

    respectivamente. tomos de oxignio em vermelho, tomos de molibdnio no centro dos tetraedros

    em azul e tomos de magnsio no centro dos octaedros em verde. ...................................................... 35

    Figura 7 Estrutura do molibdato de ltio ao longo das direes cristalogrficas a, b e c,

    respectivamente. tomos de oxignio em vermelho, tomos de molibdnio no centro dos tetraedros

    em verde e tomos de ltio no centro dos tetraedros em lils. ............................................................... 39

    Figura 8 Esquema do sistema de espalhamento Raman utilizado para as medidas desse trabalho. ...... 41

    Figura 9 Espectrmetro Jobin-Yvon T64000 usado nas medidas de espalhamento Raman. ................ 42

    Figura 10 Representao esquemtica da clula de presso utilizada nos experimentos. ..................... 43

    Figura 11 Espectro Raman do MgMoO4 em presso ambiente. Regio espectral de 50 a 1200 cm-1. .. 46

    Figura 12 Evoluo com a presso at 8,5 GPa dos espectros Raman do MgMoO4 na regio espectral

    de 50 a 250 cm-1. .................................................................................................................................. 49

    Figura 13 Dependncia com a presso at 8,5 GPa das frequncias dos modos Raman do MgMoO4 na

    regio espectral de 50 a 250 cm-1. ......................................................................................................... 50

    Figura 14 Evoluo com a presso at 8,5 GPa dos espectros Raman do MgMoO4 na regio espectral

    de 250 a 600 cm-1. ................................................................................................................................. 51

    Figura 15 Dependncia com a presso at 8,5 GPa das frequncias dos modos Raman do MgMoO4 na

    regio espectral de 250 a 600 cm-1. ....................................................................................................... 52

    Figura 16 Evoluo com a presso at 8,5 GPa dos espectros Raman do MgMoO4 na regio espectral

    de 600 a 820 cm-1. ................................................................................................................................. 53

    Figura 17 Evoluo com a presso at 8,5 GPa dos espectros Raman do MgMoO4 na regio espectral

    de 820 a 1050 cm-1. ............................................................................................................................... 54

    Figura 18 Dependncia com a presso at 8,5 GPa das frequncias dos modos Raman do MgMoO4 na

    regio espectral de 600 a 1050 cm-1. ..................................................................................................... 56

    Figura 19 Comparao entre os espectros obtidos do MgMoO4 na fase de alta presso e o MgWO4 em

    presso ambiente, na regio espectral acima de 600 cm-1. .................................................................... 58

    Figura 20 Espectro Raman do Li2MoO4 em presso ambiente. Regio espectral entre 50 e 1200 cm-1.

    ............................................................................................................................................................... 59

    Figura 21 Evoluo dos espectros Raman do Li2MoO4 com presso at 5,0 GPa. Regio espectral entre

    50 e 700 cm-1. ........................................................................................................................................ 63

    Figura 22 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 50 a

    300 cm-1. ................................................................................................................................................ 64

    Figura 23 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 300 a

    700 cm-1. ................................................................................................................................................ 65

    Figura 24 Evoluo dos espectros Raman do Li2MoO4 com presso at 5,0 GPa. Regio espectral entre

    700 e 1000 cm-1. .................................................................................................................................... 67

  • 9

    Figura 25 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 700 a

    1000 cm-1. .............................................................................................................................................. 68

    Figura 26 Espectro Raman do Li2MoO4 em presso ambiente. Regio espectral entre 50 e 1200 cm-1.

    ............................................................................................................................................................... 71

    Figura 27 Evoluo dos espectros Raman do Li2MoO4 com presso at 7,0 GPa. Regio espectral entre

    50 e 700 cm-1. ........................................................................................................................................ 74

    Figura 28 Comparao entre os espectros do Li2MoO4 do primeiro (3,1 GPa) e segundo experimento

    (3,8 GPa), na regio de 50 a 700 cm-1. .................................................................................................. 75

    Figura 29 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 50 a

    300 cm-1. ................................................................................................................................................ 76

    Figura 30 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 300 a

    700 cm-1. ................................................................................................................................................ 77

    Figura 31 Evoluo dos espectros Raman do Li2MoO4 com presso at 7,0 GPa. Regio espectral entre

    700 e 1000 cm-1. .................................................................................................................................... 78

    Figura 32 Evoluo com a presso dos modos vibracionais do Li2MoO4 na regio espectral de 700 a

    1000 cm-1. .............................................................................................................................................. 79

  • 10

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Principais tipos de tcnicas espectroscpicas, com os comprimentos de onda e os tipos de

    transies qunticas envolvidas. ........................................................................................................... 23

    Tabela 2 Carta de caracteres do grupo pontual C2v. .............................................................................. 34

    Tabela 3 Carta de correlao do grupo de simetria do tetraedro MoO4 livre e do grupo fator C2h da

    clula unitria. ....................................................................................................................................... 37

    Tabela 4 Distribuio dos modos vibracionais do MgMoO4 em termos das representaes irredutveis

    do grupo fator da clula unitria. A diviso feita por modos internos e externos, e ativos no Raman e

    no IR. ..................................................................................................................................................... 38

    Tabela 5 Carta de correlao do grupo de simetria do tetraedro MoO4 livre e do grupo fator S6 da

    clula unitria ........................................................................................................................................ 40

    Tabela 6 Distribuio dos modos vibracionais do Li2MoO4 em termos das representaes irredutveis

    do grupo fator da clula unitria. A diviso feita por modos internos e externos, e ativos no Raman e

    no IR. ..................................................................................................................................................... 40

    Tabela 7 Nmero de onda experimental em presso atmosfrica [obs(cm-1)] e seus assinalamentos

    (para presso ambiente com coordenao tetraedral do on Mo), com ajuste linear do tipo =0 + P

    [0 (cm-1)] e [(cm-1/GPa)] para as fases de presso ambiente e de alta presso do molibdato de

    magnsio. .............................................................................................................................................. 47

    Tabela 8 Nmero de onda experimental em presso atmosfrica [obs (cm-1)] e seus assinalamentos,

    com ajuste linear do tipo = 0+P [0 (cm-1) ] e [ (cm-1/GPa)] para as fases de presso ambiente e

    de alta presso do Li2MoO4. .................................................................................................................. 59

    Tabela 9 Nmero de onda experimental em presso atmosfrica [obs (cm-1)] e seus assinalamentos,

    com ajuste linear do tipo = 0+P [0 (cm-1) ] e [ (cm-1/GPa)] para as fases de presso ambiente e

    de alta presso do Li2MoO4. .................................................................................................................. 72

    Tabela 10 Possveis transies de fases e exemplos dos sistemas onde elas ocorrem. ......................... 87

  • 11

    SUMRIO

    1 INTRODUO ................................................................................................................................ 12

    1.1 Molibdatos ................................................................................................................................. 12

    1.2 Estudos realizados anteriormente em molibdatos .................................................................. 14

    1.3 Molibdato de magnsio - MgMoO4 .......................................................................................... 16

    1.4 Molibdato de ltio Li2MoO4 ................................................................................................... 18

    2 ASPECTOS TERICOS ................................................................................................................. 20

    2.1 Vibraes moleculares .............................................................................................................. 20

    2.2 Teoria do efeito Raman............................................................................................................. 23

    2.2.1 Tratamento clssico do espalhamento Raman ................................................................... 26

    2.2.2 Tratamento parcialmente quntico ..................................................................................... 30

    2.3 Anlise de Teoria de Grupos para o MgMoO4 ....................................................................... 35

    2.4 Anlise de Teoria de Grupos para o Li2MoO4 ........................................................................ 39

    3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS ..................................................................................... 41

    3.1 Medidas de Espectroscopia Raman ......................................................................................... 41

    3.2 Medidas em altas presses ........................................................................................................ 42

    3.3 Procedimentos experimentais para as medidas sob presso hidrosttica ............................ 43

    3.4 Amostras .................................................................................................................................... 45

    3.4.1 Molibdato de magnsio ........................................................................................................... 45

    3.4.2 Molibdato de ltio ..................................................................................................................... 45

    4 RESULTADOS E DISCUSSES ................................................................................................... 46

    4.1 Espectro Raman do MgMoO4 presso ambiente ................................................................. 46

    4.2 Espectroscopia Raman do MgMoO4 em funo da presso .................................................. 48

    4.3 Espectroscopia Raman do Li2MoO4 presso ambiente primeiro experimento ............. 59

    4.4 Espectroscopia Raman do Li2MoO4 em funo da presso primeiro experimento ......... 62

    4.5 Espectroscopia Raman do Li2MoO4 em presso ambiente segundo experimento ........... 70

    4.6 Espectroscopia Raman do Li2MoO4 em funo da presso segundo experimento .......... 73

    5. CONCLUSES E PERSPECTIVAS ............................................................................................ 81

    REFERNCIAS .................................................................................................................................. 83

    APNDICE A Transies de Fase .................................................................................................. 87

    A.1. Teoria de Landau .................................................................................................................. 90

    A.2. Transies isossimtricas ..................................................................................................... 94

    APNDICE B Publicao ................................................................................................................ 99

  • 12

    1 INTRODUO

    O avano tecnolgico desejvel e inevitvel passa pela descoberta ou engenharia de

    materiais que se adequem s necessidades tecnolgicas. Conhecer, pois, as propriedades

    qumicas e fsicas desses materiais de fundamental importncia para que possamos

    compreender o comportamento dos mesmos quando em uso.

    Embora possuam estruturas bem diferentes, alguns materiais apresentam propriedades

    similares do ponto de vista para aplicao tecnolgica. Alguns molibdatos apresentam essa

    caracterstica e este o motivo pelo qual resolveu-se explorar as propriedades vibracionais de

    molibdatos sob altas presses. Este captulo apresenta uma reviso das principais caractersticas

    e estudos realizados com molibdatos, bem como a caracterizao do molibdato de magnsio e

    do molibdato de ltio, os objetos de estudo deste trabalho.

    1.1 Molibdatos

    Na busca por novos materiais com propriedades que so potenciais para aplicaes

    tecnolgicas, a cincia deparou-se com uma famlia de compostos promissores: os molibdatos.

    Materiais pertencentes a esta famlia, apresentam caractersticas fsicas e qumicas

    interessantssimas do ponto de vista de possveis aplicaes. So propriedades como cintilao

    [1-3], expanso trmica negativa [4-7], amorfizao induzida por presso [8-19] etc.

    As muitas propriedades desses materiais os tornam timos candidatos para aplicaes

    em equipamentos para deteco de radiao ionizante e cintiladores para uso em experimentos

    de fsicas de partculas [1-3], em tecnologias de baterias de hidrognio [20], lasers sintonizveis

    [21], dispositivos ptico-eletrnicos [22], etc. O molibdato de cdmio sabido apresentar

    propriedades de detectores por cintilao no intervalo de temperaturas de 8 a 295 K [1,3],

    tornando-o um material com potencial para aplicao em experimentos de fsica de partculas.

    Os minerais desta classe qumica distribuem-se em dois grupos isoestruturais principais:

    o grupo da volframita e o grupo da scheelita. O grupo da volframita consiste de compostos com

  • 13

    pequenos ctions bivalentes, como o ferro, mangans, magnsio, nquel e cobalto, em

    coordenao 6 com os ons molibdato. Nesse conjunto ocorre soluo slida completa entre o

    Fe++ e o Mn++ e a estrutura resultante monoclnica.

    O grupo da scheelita contm compostos de ons bivalentes maiores, como o clcio e o

    chumbo, em coordenao oito com os ons molibdato. O tungstnio e o molibdnio podem

    substituir-se mutualmente, formando sries parciais entre a scheelita (CaWO4) e a powelita

    (CaMoO4), e entre a stolzita (PbWO4) e a wulffenita (PbMoO4). A substituio entre o Ca e Pb,

    forma sries parciais entre scheelita e a stolzita e entre a powellita e a wulffenita.

    Figura 1 Estrutura Scheelita (a) e Wolframita (b), vistas ao longo dos eixos cristalogrficos, a, b e c da esquerda

    para a direita.

  • 14

    As diversas propriedades que caracterizam estes materiais dependem de sua estrutura.

    Por exemplo, os molibdatos com estrutura AB(MoO)4 (A = metal alcalino; B = Bi, Fe, Sc, Al,

    Y, lantandeos) so objeto de considervel interesse desde que encontraram aplicao como

    radiador de Cherenkov para calormetros eletromagnticos, cintiladores e na operao de lasers

    de tunelamento e de pulso curto. O KFe(MoO4)2 exibe propriedades magnticas muito

    interessantes, ao passo que o RbFe(MoO4)2 descobriu-se recentemente ser o nico material

    multiferrico no qual o ordenamento ferroeltrico induzido por ordenamento magntico

    quiral. Os molibdatos do tipo B2(MoO4)3 tm sido investigados devido s suas propriedades

    pticas, de expanso trmica negativa, ferroelasticidade e ferroeletricidade. Expanso trmica

    negativa tambm foi reportada para os molibdatos Dy2Mo4O15 e Y2Mo4O15. Filmes de Bi2MoO6

    so tambm usados como sensores de umidade, mas eles tambm exibem propriedades

    fotoeletroqumicas [23].

    1.2 Estudos realizados anteriormente em molibdatos

    Os primeiros estudos de altas presses em molibdatos comearam nos anos 60 [24]. Nos

    anos 70 e 80, estudos de difrao de raios-X determinaram a existncia de fases de alta presso

    para molibdatos de metais alcalinos e lantandeos/trio. Esses estudos mostraram que

    molibdatos dos mais pesados lantandeos e potssio, csio e rubdio se transformam numa

    estrutura tipo -KY(WO4)2 (C2/c n. 15) na regio entre 2 e 8 GPa em temperaturas de 700 a

    1000 oC [25,26].

    Nos anos 90, Jayaraman e outros reportaram o espectro Raman, absoro ptica e

    estudos de difrao de raios-X para o KTb(MoO4)2 para presses to altas quanto 35,5 GPa

    [27]. Depois, Shieh et al. realizaram estudos de difrao de raios-X no mesmo cristal at 45

    GPa [28] e, neste estudo, uma transio de fase induzida por presso j foi observada em torno

    de 3 GPa. Transformaes de fase induzidas por presso tambm foram descobertas em

    KDy(MoO4)2 e KY(MoO4)2 em torno de 3 GPa [29]. Estes trs materiais (KTb(MoO4)2,

    KDy(MoO4)2 e KY(MoO4)2) so isoestruturais em suas fases de baixa e alta presso. As trs

    transies se mostraram reversveis. Uma transio de fase gradual foi reportada acima de 10

    GPa em NaLa(MoO4)2, sendo que o mesmo estudo mostrou que o material amorfizou com

    presso em torno de 27 GPa [8].

  • 15

    Molibdatos do tipo AB(MoO4)2 contendo Al, Bi, Sc e Fe passaram a ser estudados na

    ltima dcada, por meio de altas presses. Especificamente, estudos Raman mostraram que

    KSc(MoO4)2, NaAl(MoO4)2, CsBi(MoO4)2, KFe(MoO4)2 e RbFe(MoO4)2 exibem maior

    polimorfismo em altas presses que os molibdatos de lantandeos e metais alcalinos [30-35].

    Para molibdatos do tipo B2(MoO4)3, o primeiro estudo de altas presses realizado foi

    reportado em 1972. Brixner estudou a estrutura do Gd2(MoO4)3 at 6,0 GPa e descobriu

    amorfizao [36]. Ganguly et al. seguiram os estudos de alta presso do Gd2(MoO4)3. Ele

    submeteu o cristal a uma presso uniaxial na direo do eixo [100] em 140 oC e observou a

    dependncia com a presso do modo instvel A1 (TO) em torno de 50 cm-1 [37]. Outros estudos

    posteriores confirmaram a amorfizao do Gd2(MoO4)3 [11,12,17,19]. Com estes novos

    estudos, foi possvel verificar que a amorfizao desse composto acontece entre 3 e 9 GPa,

    dependendo das condies de hidrostaticidade. Posteriormente tambm descobriu-se

    amorfizao induzida por presso em Tb2(MoO4)3 [14], Eu2(MoO4)3 [11,38], Sm2(MoO4)3 [11]

    e Nd2(MoO4)3 [14]. Para esta famlia, em relao aos membros que vo do Pr2(MoO4)3 ao

    Ho2(MoO4)3, Jayaraman [9] reportou transies de uma fase 412 para 2 na qual eles

    exibem ferroeletricidade e ferroelasticidade. A temperatura Tc de transio fica entre 235 oC e

    121 oC indo do Pr ao Ho.

    Estudos em altas presses tm sido desenvolvidos com os molibdatos B2(MoO4)3 com

    B = Sc, Al e Ga [4,13,15,16,7,39,40]. E, de forma similar ao que foi observado para os

    molibdatos de lantandeo, em muitos dos compostos estudados, houve transio de fase

    cristalina antes da amorfizao induzida por presso [15,16,40].

    Transies de fases sob alta presso foram observadas em outros molibdatos,

    fornecendo importantes informaes sobre a estrutura das fases polimorfas. Primeiro,

    verificou-se que a instabilidade de um modo de baixa frequncia que se comportava como um

    modo macio, estava relacionada transio de fase em 4,5 GPa para o Bi2MoO6 [35]. A energia

    deste modo tendia para zero com a aproximao da presso de transio. Segundo, a

    amorfizao foi observada para Dy2Mo4O15 acima de 4,7 GPa precedida por uma transio de

    fase estrutural em 2,5 GPa [6].

    Em estudos com temperatura, o molibdato de trio Y2(MoO4)3 revelou expanso trmica

    negativa entre 403 e 1173 K, ao passo que o molibdato de alumnio Al2(MoO4)3 apresentou esta

    caracterstica somente acima de 473 K. De acordo com o autor, essa propriedade se deve ao

  • 16

    rearranjo dos tetraedros que giram e se aproximam uns dos outros, reduzindo assim o volume

    da clula com o aumento de temperatura [41]. Esse tipo de vibrao conhecido como RUM

    (Rigid Unit Mode) e um dos principais mecanismos que explicam a expanso trmica negativa

    de materiais. Tambm apresenta expanso trmica negativa, o molibdato de escndio

    Sc2(MoO4)3. [19].

    Estudos do calor especfico das fases cristalina e amorfa do Eu2(MoO4)3 em baixas

    temperaturas mostraram que o calor especfico da fase cristalina abaixo de 7,5 K descrito por

    uma funo cbica da temperatura, enquanto que o calor especfico da fase amorfa tem um forte

    carter no-Debye no intervalo de temperatura experimentado [42].

    Uma mudana de simetria em 190 K foi observada em estudos com o RbFe(MoO4)2.

    Estudos de difrao de raios-X mostraram que a evoluo da clula unitria deste material

    anisotrpica de 100 a 300 K com forte descontinuidade em 190 K [30].

    Estudos de raios-X feitos no NaBi(MoO4)2 reportam transio de fase ferroelstica

    associada com uma mudana de simetria, de tetragonal I41/a para monoclnica I2/a em 241 K.

    Observando a evoluo da clula unitria como funo da temperatura, verifica-se uma

    transio contnua. Estudo de difrao de raios-X com presso evidenciou a maior

    compressibilidade ao longo do eixo c, o que causa um encurtamento nas distncias entre as

    camadas MoO4. Por conta disso, os ctions no podem mais migrar atravs dos canais formados

    pelos tetraedros MoO4, o que inviabilizou qualquer outra transio de fase at 25 GPa [43].

    Ao estudar as propriedades trmicas do Cr3+:MgMoO4, verificou-se expanso trmica

    positiva, com forte dependncia direcional. O coeficiente de expanso ao longo da direo b

    3,3 vezes quele para a direo c [21]. O mesmo estudo mostra que este material tem potencial

    para aplicao em laser de pulso curto, devido ao pequeno tempo de vida da fluorescncia - 1

    s. Sabe-se ainda que o CdMoO4 sofre uma transio de fase schelita-volframita [44].

    1.3 Molibdato de magnsio - MgMoO4

    Molibdatos de frmula geral AMoO4 (A = Mg, Cd, Pb, Zn e Ca) atraem muita ateno

    devido suas importantes aplicaes em dispositivos optoeletrnicos [21]. Diversos estudos j

  • 17

    determinaram as estruturas do CoMoO4 (monoclnico C2/m com parmetros a = 9,666 , b =

    8,854 , c = 7,755 e = 113o49') [45,46], NiMoO4 (isomorfo com o CoMoO4 com

    parmetros a = 8,86 , b = 9,65 , c = 7,71 e = 113,4o) [46], MnMoO4 (monoclnico C2/m

    com parmetros a = 10,469 , b = 9,516 , c = 7,143 e = 106o17') [46], ZnMoO4 (triclnico

    C21 com parmetros a = 9,625 , b = 6,965 , c = 8,373 e = 96,30o) [46] e FeMoO4

    (tambm isomorfo com o CoMoO4 com parmetros a = 10,290 , b = 9,394 , c = 7,072 e

    = 106,31o) [39].

    Figura 2 Clula unitria da estrutura cristalina do molibdato de magnsio vista ao longo dos eixos

    cristalogrficos a, b e c respectivamente

    O molibdato de magnsio, um dos materiais estudados neste trabalho, pertence a famlia

    mencionada no pargrafo anterior e, em condies de presso e temperatura ambientes

    isomorfo ao -MnMoO4 [46] tem simetria monoclnica e grupo espacial C2/m (C32h) com oito

    molculas por clula unitria. Os parmetros da clula unitria so a = 10,273 , b = 9,288 ,

    c = 7,025 e = 106,96o [2,21,47]. Nesta estrutura, cada tomo Mo rodeado por quatro

    tomos de oxignio com coordenao aproximadamente tetradrica em stios de simetria C2 e

    Cs. Os ons Mg2+ ocupam stios com coordenao octadrica [2]. Esta estrutura isoestrutural

    s fases de alta temperatura -NiMoO4, -FeMoO4 e -CoMoO4. Diversos estudos tm sido

    feitos sobre este material com o intuito de estudar suas propriedades mecnicas (dopado com

    Cr3+), trmicas, espectrais [21], de luminescncia [2], dieltricas [48], vibracionais [49,50], etc.

    Estes estudos revelaram que o molibdato de magnsio dopado com Cr3+ um potencial

    meio de ganho para laser sintonizvel [21]. Dopado com Yb3+ foi reportado como um detector

    criognico de fton-cintilao [51]. Estudos de propriedades dieltricas mostraram que o

    MgMoO4, tem um significativo aumento na sua constante dieltrica K e perda dieltrica tan

    com o aumento do contedo de material [48]. Ao estudar as propriedades de luminescncia

    deste material, verificou-se que o espectro de emisso exibe um carter complexo e a cintica

    de decaimento da luminescncia depende de alguns poucos componentes [2].

  • 18

    Ao estudar as propriedades vibracionais e estruturais do MgMoO4 com temperatura, foi

    possvel observar uma transio de fase para uma fase desconhecida entre 640 e 690 K. O

    estudo mostrou que o material permanece com esta estrutura at por volta de 770 K, onde ocorre

    nova transio de fase, levando o material para uma fase hexagonal (P63/mmc) [49].

    1.4 Molibdato de ltio Li2MoO4

    A estrutura dos compostos da famlia A2MO4 (A = metal alcalino, M = Mo, W),

    altamente dependente da natureza do ction A. Para A = K, Na, Rb e Cs modificaes com

    estrutura hexagonal, ortorrmbica e monoclnica j foram reportadas [52]. Sabe-se ainda que o

    K2MoO4 sofre duas transies de fase com a temperatura: uma delas, da fase isoestrutural ao -

    K2SO4 (hexagonal 64 ) para uma fase incomensurda em 733 K, e outra da fase incomensurada

    para uma fase isoestrutural ao -K2SO4 (ortorrmbico 216) em 593 K [53].

    Figura 3 Clula unitria da estrutura cristalina do molibdato de ltio ao longo das direes cristalogrficas a, b

    e c respectivamente.

    Outros dois compostos, a saber, o K2WO4 e o Rb2WO4 passam pela mesma sequncia

    de transies de fase em 707 e 643 K para o primeiro e 753 e 681 K para o segundo [53]. Alm

    do mais, o Rb2WO4 sofre uma transio de fase para a estrutura C2/m (monoclnica) em 568 K

    [52]. Essa ltima fase foi estabelecida como sendo a de presso e temperatura ambientes [54].

    O molibdato de ltio cristaliza na estrutura rombodrica trigonal 3 (62). isomorfo

    com a fenacita (phenacite Be2SiO4) [55] e com o tungstato de ltio Li2WO4 [56]. Os

    parmetros de rede do Li2MoO4 so = 14,330(2), = 9,584(2) , sendo assim da mesma

  • 19

    ordem que aqueles do Li2WO4, = 14,361(3), = 9,602(2) [56], como esperado devido

    aos raios inicos similares do Mo6+ e do W6+.

    O arranjo de tomos na estrutura baseado em uma rede tridimensional com tetraedros

    LiO4 e MoO4 de vrtices compartilhados, contendo um canal aberto na direo do eixo ternrio.

    O dimetro do canal de aproximadamente 5 . Cada um dos quatro tomos de oxignio

    posiciona-se em um vrtice compartilhado por dois tetraedros LiO4 e um tetraedro MoO4. O

    mximo deslocamento dos tomos de oxignio se d ao longo da direo perpendicular s

    paredes do canal. As distncias mdias das ligaes so Li1 O, 1,965 e Li2 O, 1,967 .

    Os ngulos de ligao O Li O vo de 104,92 a 114,60o para Li1 e, de 106,43 a 117,48o para

    Li2, o que indica uma certa distoro nos tetraedros LiO4. O tetraedro MoO4

    consideravelmente menos distorcido, com ligaes Mo O indo de 1,7586 a 1,7690 e com

    ngulos O Mo O indo de 107,20 a 111,71o. A menor distncia O O entre poliedros

    diferentes 2,83 . Para o Li2WO4 este valor 2,85 [57]. Para a fenacita, encontramos a

    menor distncia correspondente j reportada, 2,75 [58].

    Nenhuma outro polimorfo de presso e temperatura ambiente foi reportado at o

    momento para o Li2MoO4, embora estudo com alta presso e alta temperatura tenha produzido

    uma estrutura tipo espinlio [59,60]. Em temperatura ambiente, no houve transio de fase at

    a presso de 2 GPa. Em presso ambiente, sob temperatura varivel, o Li2MoO4 no sofre

    transio de fase at 750 oC [59]. Estudos de difrao de raios-X em baixas temperaturas com

    o Li2MoO4 no reportaram qualquer transio de fase entre 293 e 103 K [57].

  • 20

    2 ASPECTOS TERICOS

    Neste captulo faremos a anlise de teoria de grupos para o molibdato de magnsio e

    para o molibdato de ltio a fim de verificar o nmero de modos vibracionais ativos no Raman.

    feita tambm uma discusso acerca do efeito Raman. Esta discusso levada a cabo atravs

    de um tratamento clssico e, em seguida, por meio de um tratamento parcialmente quntico.

    Tambm feita uma discusso da fsica das transies de fase com nfase para as transies de

    fase isossimtricas.

    2.1 Vibraes moleculares

    Podemos, de forma bastante simplificada, modelar vibraes moleculares, imaginando

    os tomos como bolas e as ligaes qumicas como molas sem massa conectando os tomos.

    Figura 4 Duas massas m1 e m2 presas por uma mola de constante k. Representao simplificada de uma

    molcula diatmica.

    A energia potencial desse sistema pode ser expandida em uma srie de Taylor da

    seguinte forma:

    () = (0) + ( 0)

    =0+

    (0)2

    2

    2

    2 =0+

    (0)3

    6

    3

    3 =0+ 2.101

    O primeiro termo da expanso a energia potencial de equilbrio, que pode ser escolhida

    como sendo igual a zero. O segundo termo a derivada primeira da energia potencial no ponto

    de equilbrio. Como este o ponto de equilbrio um ponto de fora zero, este termo

  • 21

    essencialmente zero. Restam ento apenas os termos de ordem maior ou igual a 2. Para

    vibraes pequenas, podemos desprezar os termos de ordem maior ou igual a 3, teremos:

    () =(0)

    2

    2

    2

    2 =0 2.102

    o que nos d, para a fora, neste movimento

    = ( 0) 2.103

    onde = (2

    2)

    =0 a constante de fora e mede quo forte a ligao entre os tomos. Nestas

    circunstncias, o oscilador dito ser harmnico. A frequncia de tal oscilador harmnico dada

    por

    0 = 1

    2

    2.104

    onde

    = 12

    1+2 2.105

    Em espectroscopia vibracional comum usar o nmero de onda ao invs da frequncia

    . O nmero de onda dado pela expresso abaixo:

    = 1

    =

    2.106

    onde o comprimento de onda e a velocidade da luz no vcuo.

    Note da equao 2.104 que a frequncia de uma vibrao depende to somente das

    massas dos tomos ligados e da fora da ligao.

    De acordo com a mecnica quntica, a energia de uma vibrao harmnica dada por

    = 0 ( +1

    2) =

    2

    ( +

    1

    2) 2.107

  • 22

    onde a constante de Planck e o nmero quntico do estado vibracional ( = 0 para o

    estado fundamental). Dessa forma, o oscilador harmnico quntico em seu estado vibracional

    fundamental, tem energia dada por =1

    2 0.

    Em molculas reais, os osciladores no so harmnicos, ou seja, os termos de ordem

    maior ou igual a 3 na expanso da energia, passam a contribuir. Dessa forma, a energia potencial

    do sistema pode ser escrita como

    () =(0)

    2

    2+

    (0)3

    3 2.108

    onde consideramos apenas a primeira contribuio anarmnica e chamada de constante de

    anarmonicidade do potencial. Nesse caso, a energia vibracional do oscilador quntico dada

    por

    = 0 [( +1

    2) ( +

    1

    2)

    2

    ] 2.109

    Uma consequncia da anarmonicidade da energia potencial que so permitidas

    transies para estados excitados mais altos ( = 2,3,4, ). Este tipo de transio chamado

    de sobretom. Como exemplo, veja que a transio entre o estado fundamental e o primeiro

    estado excitado, tem nmero de onda dado por

    (0 1) =0

    (1 2) 2.110

    ao passo que uma transio entre o estado fundamental e o segundo estado excitado ( = 2),

    tem nmero de onda dado por

    (0 2) = 20

    (1 3) 2.111

    possvel ver que a razo entre o nmero de onda do primeiro sobretom e da frequncia

    fundamental aproximadamente 2. Assim, em espectroscopia, possvel que encontremos

    picos correspondentes a modos no previstos pela teoria de grupos, mas que podem ser

    atribudos a sobretons.

  • 23

    2.2 Teoria do efeito Raman

    Espectroscopia o estudo do espectro de uma determinada radiao, aps sua interao

    com a matria. A Tabela 1 apresenta as principais tcnicas espectroscpicas em uso, os

    comprimentos de onda envolvidos e os tipos de transio que elas promovem. Dentre elas, uma

    das tcnicas usadas mais extensivamente a Espectroscopia Raman.

    O espalhamento de radiao sem a alterao do comprimento de onda (frequncia) j

    era conhecido h algum tempo antes da descoberta do efeito Raman. Tal fenmeno chama-se

    espalhamento Rayleigh. Em qualquer medida de espalhamento Raman, haver espalhamento

    Rayleigh, a no ser que sejam usados filtros seletivos. A presena do espalhamento Rayleigh

    nos experimentos de espalhamento Raman tem como vantagem o fato de ser usado como um

    referencial a partir do qual pode-se determinar as frequncias de transies (sejam elas

    rotacionais, vibracionais ou eletrnicas) do sistema em estudo.

    Tabela 1 Principais tipos de tcnicas espectroscpicas, com os comprimentos de onda e os tipos de transies

    qunticas envolvidas.

    Tipo de espectroscopia Faixa de comprimento de

    onda

    Tipo de transio quntica

    Emisso de raios gama 0,005 a 1,4 Nuclear

    Absoro, emisso e

    fluorescncia de raios-X

    0,1 a 100 Eltrons internos

    Absoro no ultravioleta de

    vcuo

    10 a 180 nm Eltrons de ligao

    Absoro, emisso e

    fluorescncia UV-vis

    180 a 780 nm Eltrons de ligao

    Absoro no IR e

    espalhamento Raman

    0,78 a 300 m Rotao/vibrao das

    molculas ou da rede

    Absoro de micro-ondas 0,75 a 3,75 m Rotao das molculas

    Ressonncia de spin

    eletrnico

    3 cm Spin de em um campo magntico

    Ressonncia magntica

    nuclear

    0,6 a 10 m Spin nuclear em um campo

    magntico

    O fenmeno de espalhamento foi previsto por Smekal em 1923 [61], usando a teoria

    quntica para este fim. Contudo, s foi verificado experimentalmente em 1928 por C. V. Raman

    [62]. Durante uma srie de experimentos realizados, Raman estudou a radiao espalhada por

    vrias amostras slidas transparentes, lquidas e gasosas. Para isso, Raman utilizou a radiao

    de uma lmpada de mercrio para excitar as amostras. Aps verificar a luz espalhada atravs

  • 24

    de um espectrgrafo, Raman observou que algumas linhas e bandas adicionais apareciam

    deslocadas em relao ao espetro original da lmpada e que essas novas linhas dependiam da

    substncia utilizada como centro espalhador. Observou tambm que a diferena de frequncia

    entre a frequncia da radiao incidente e da radiao espalhada, para vrias linhas do espectro

    da radiao espalhada, eram iguais as frequncias das bandas de absoro no infravermelho da

    prpria substncia. Com isso, C. V. Raman concluiu que os deslocamentos de frequncias

    observados nada mais eram que frequncias de oscilao dos tomos de uma molcula e que

    estas frequncias dependiam das ligaes qumicas e da geometria das molculas. Da este

    fenmeno ser conhecido como Efeito Raman.

    Em um experimento de espalhamento Raman, luz monocromtica intensa irradiada

    sobre uma amostra. A frequncia de tal radiao , geralmente, mais alta que as frequncias

    vibracionais (dessa forma, tambm mais alta que as frequncias rotacionais), porm, mais

    baixa que as frequncias eletrnicas. O espalhamento Rayleigh pode ser visto como uma coliso

    elstica entre os ftons incidentes e uma partcula da amostra. Visto que em um espalhamento

    desse tipo, as energias rotacional e vibracional da partcula no se alteram, tambm no se altera

    a energia do fton incidente. Portanto sua frequncia permanece a mesma. Assim o fton

    espalhado tem a mesma frequncia que o fton incidente. J o espalhamento Raman pode ser

    visto como uma coliso inelstica. Nesse caso, o fton alterar a energia da partcula,

    acrescendo-a ou diminuindo-a de uma quantidade . Para que a energia se conserve na

    coliso, a energia do fton espalhado, , deve ser diferente da energia do fton incidente, ,

    por um valor .

    Se o fton espalhado tem energia menor que o fton incidente, as linhas do espectro

    correspondente a estes ftons so chamadas de linhas Stokes. Caso contrrio, se o fton

    espalhado tiver maior energia que o fton incidente originam-se da as linhas anti-Stokes do

    espectro.

    A origem de ftons com frequncias diferentes daquela da radiao incidente pode ser

    explicada da seguinte maneira. Quando o sistema interage com radiao de frequncia ele

    pode sofrer uma transio de um nvel mais baixo de energia 1 para um nvel mais alto 2.

    Isto requer que o sistema subtraia da radiao incidente uma quantidade de energia , tal que

    = 2 1, onde = ( a frequncia da vibrao molecular que foi excitada

    pela radiao). Isso acontece porque o sistema aniquila um fton incidente de frequncia e,

  • 25

    simultaneamente, cria um fton de radiao o qual espalhado. Alternativamente, a

    radiao pode incitar o sistema a transicionar de um estado de energia mais alta 2 para um

    estado de energia mais baixa 1. Nesse caso, o sistema soma energia do fton incidente uma

    quantia . Assim sendo, h a aniquilao de um fton de frequncia e a criao simultnea

    de um fton com frequncia + .

    No caso do espalhamento Rayleigh, embora no haja mudana na frequncia da

    radiao, no se pode dizer que nada aconteceu. H tambm nesse caso, a aniquilao e criao

    de ftons. Isso pode ser verificado, estudando-se a polarizao das radiaes incidente e

    espalhada. Percebe-se que o espalhamento modifica esta propriedade da luz. A figura mostra

    os trs tipos de espalhamento atravs do modelo de transferncia de energia que utilizamos.

    Figura 5 Diagrama com a representao do modelo de transferncia de energia para os espalhamentos Raman

    Stokes, Raman anti-Stokes e Rayleigh.

  • 26

    A experincia mostra que as bandas anti-Stokes em uma medida Raman so bem menos

    intensas do que as correspondentes bandas Stokes. Isso ocorre porque espalhamento anti-Stokes

    envolve transies de estados de alta energia para estados de baixa energia. A populao desses

    estados excitados decresce exponencialmente com sua energia de acordo com a distribuio de

    Boltzman. Assim sendo, h bem menos populao nos estados mais excitados do que no estado

    fundamental.

    importante ressaltar a diferena entre o efeito Raman e a simples absoro ou emisso

    induzida. No caso de absoro (ou emisso induzida) basta que a luz incidente tenha frequncia

    correspondente diferena de energia entre os nveis inicial e final. Portanto, o efeito no cria

    novas frequncias e o que acontece apenas uma variao na intensidade da radiao incidente;

    por outro lado, no efeito Raman surgem novas frequncias como j explicado e a variao que

    isso causa na intensidade da radiao incidente quase que desprezvel (no fosse pela prpria

    ocorrncia do efeito).

    2.2.1 Tratamento clssico do espalhamento Raman

    Um tratamento completo do efeito Raman s ser possvel se considerarmos os aspectos

    qunticos tanto da radiao como da matria. No entanto, um modelo clssico para este

    fenmeno pode ser formulado. Tal modelo no nos permite extrair todas as informaes

    contidas num experimento de espalhamento Raman, porm possvel obter algumas previses

    satisfatrias. Neste modelo clssico, considera-se o carter corpuscular da matria e o aspecto

    ondulatrio da radiao.

    2.2.1.1 O dipolo eltrico induzido

    Quando a radiao interagir com a matria, seu campo eltrico afetar as distribuies

    de cargas positiva e negativa da molcula, deslocando-as. A molcula adquire, assim, um

  • 27

    momento de dipolo eltrico induzido, , causado pelo campo eltrico da radiao. O dipolo e o

    campo eltrico esto relacionados pela srie

    = 1 + 2 + 3 + 2.201

    onde

    1 = 2.202

    2 = : 2.203

    3 = 2.204

    Nas equaes acima, e so vetores, ao passo que , e so tensores. O tensor

    chamado polarizabilidade, o tensor hiperpolarizabilidade e o tensor segunda

    hiperpolarizabilidade. As polarizabilidades , e medem a facilidade com que eltrons se

    deslocam de suas posies de equilbrio para produzir dipolos sob a ao de campos eltricos.

    , e tm magnitude tpicas da ordem de 10-40 CV-1m2, 10-50 CV-2m3 e 10-61 CV-3m4,

    respectivamente. Dessa forma, para que a contribuio de 2 seja de pelo menos um por cento

    da contribuio de 1 necessrio um campo eltrico de intensidade em torno de 109 Vm-1; e

    um campo eltrico da ordem de 1010 Vm-1 para que a contribuio de 3 seja de um por cento

    da contribuio de 1.

    Visto que espalhamento Raman j prontamente observado para campos eltricos de

    intensidades muito menores, ns podemos afirmar que possvel explicar o fenmeno em

    termos da componente de dipolo induzido 1 somente.

    2.2.1.2 O tensor polarizabilidade

    A equao 2.202 implica que a magnitude das componentes de esto relacionadas s

    magnitudes das componentes de da seguinte maneira:

    = + + 2.205

  • 28

    = + + 2.206

    = + + 2.207

    Os nove elementos so chamadas de componentes do tensor polarizabilidade . Para

    sistemas nos quais podemos considerar o tensor polarizabilidade como real e simtrico, temos

    = , = e = . sabido o fato de que um determinado campo eltrico,

    agindo sobre um determinado sistema, ir produzir um dipolo eltrico nico. Suas

    componentes, porm, dependem do sistema de referncia escolhido. Deve haver portanto, um

    sistema que, ao ser escolhido, simplifique as equaes em termos das componentes do tensor.

    O conjunto de equaes 2.205, 2.206 e 2.207, podem ser escritos na forma matricial:

    [

    ] = [

    ] [

    ] 2.208

    Considerando o caso em que o tensor polarizabilidade simtrico, a matriz que o

    representa tambm ser. fcil ver das equaes 2.205, 2.206 e 2.207 que a direo do dipolo

    eltrico induzido ir, geralmente, ser diferente da direo do campo que o induziu. Um campo

    eltrico com uma nica componente ainda ir produzir trs componentes de dipolo induzido.

    Agora, consideremos a interao de um sistema molecular com uma radiao cujo

    campo eltrico oscila harmonicamente com frequncia 0. Consideremos que a molcula est

    fixa no espao, mas seus tomos esto livres para vibrar em torno de suas posies de equilbrio.

    Espera-se que a polarizabilidade seja funo das coordenadas nucleares. A variao da

    polarizabilidade com as vibraes da molcula pode ser expressa expandindo cada componente

    da polarizabilidade em uma srie de Taylor com respeito s coordenadas normais de

    vibrao, como segue:

    = ()0 + (

    )

    0 +

    1

    2 (

    2

    )

    0, + 2.209

    onde ()0 o valor de na configurao de equilbrio da molcula, , , so

    coordenadas normais de vibrao associadas s frequncias , , , e as somatrias so feitas

    sobre todas as coordenadas. Se considerarmos apenas pequenas vibraes da molcula, os

    termos que aparecem na somatria dupla em k e l so desprezveis. Assim sendo, consideramos

  • 29

    a expanso at termos de primeira ordem. Por hora, vamos nos ater a apenas um modo de

    vibrao k. Para este modo a componente do tensor polarizabilidade em questo fica:

    () = ()0 + ( ) 2.210

    onde

    ( ) = (

    )

    0 2.211

    A expresso acima vlida para qualquer componente do tensor. Assim sendo, ela

    vlida para todo o tensor. Podemos reescrev-la ento como:

    = 0 + 2.212

    Se assumirmos que a coordenada oscila harmonicamente, temos:

    = 0cos (2 + ) 2.213

    onde 0 a amplitude da k-sima coordenada normal e k um fator de fase. Inserindo 2.213

    em 2.212, temos:

    = 0 + 0cos (2 + ) 2.214

    Das equaes 2.202 e 2.214, temos

    1 = 0 +

    0cos (2 + ) 2.215

    Como j mencionado, o campo eltrico oscila harmonicamente com a forma

    = 0 cos(20) 2.216

    substituindo 2.216 em 2.215, temos

    1 = 00 cos(20) +

    0 cos(20) 0 cos(2 + ) 2.217

    Por meio de uma identidade trigonomtrica, a equao 2.217 pode ser reescrita como

  • 30

    1 = 00 cos(20) +

    00

    2{cos[2(0 + )] + cos[2(0 +

    + )]}

    2.218

    Dessa equao, possvel ver que o dipolo linear induzido pela k-sima vibrao da

    molcula varia temporalmente com trs componentes, que so 0, 0 e 0 + . Devido a

    isso, o dipolo emite radiao eletromagntica de frequncias 0, 0 e 0 + ,

    respectivamente. A primeira corresponde ao espalhamento Rayleigh e as duas ltimas aos

    espalhamentos Raman Stokes e anti-Stokes, respectivamente. Observe que a componente 0

    sempre estar presente no fenmeno de espalhamento, ao passo que as outras duas

    componentes, dependem do comportamento da derivada da polarizabilidade com as

    coordenadas normais. Assim, se for diferente de zero, presenciamos o espalhamento Raman.

    Caso contrrio, tal fenmeno no ser observado. Dessa forma, diz-se que um modo k s ativo

    no Raman se a polarizabilidade da molcula varia com a coordenada normal .

    2.2.2 Tratamento parcialmente quntico

    O tratamento fsico clssico do fenmeno de espalhamento prev resultados condizentes

    com a experincia. No entanto, esta abordagem no suficiente para explicar algumas

    caractersticas do fenmeno. Para entendermos mais a fundo a forma pela qual o espalhamento

    Raman acontece, reproduziremos aqui uma abordagem parcialmente quntica, onde o sistema

    espalhador tratado como quntico e a radiao como uma onda clssica.

    Durante o espalhamento Raman, o sistema transita entre estados qunticos vibracionais

    de energias diferentes (no caso do espalhamento Rayleigh o sistema permanece no mesmo

    estado quntico). Doravante nos referimos ao estado vibracional inicial do sistema como sendo

    aquele que ele possua antes da interao com a radiao e o representaremos por . De forma

    anloga, chamaremos de estado vibracional final aquele acessado pelo sistema ao absorver ou

    emitir energia imediatamente aps sua interao com a radiao. Representamos o estado final

    por . Dessa forma, possvel definir um momento de transio associado aos estados

    inicial e final do sistema por

  • 31

    = || 2.219

    onde o momento de dipolo induzido na sistema.

    Como j foi explicado no tratamento clssico, o momento de dipolo induzido pode ser

    representado por uma srie de termos dependentes do campo eltrico e dos tensores de

    polarizabilidade. E devido ao fato de j podermos observar espalhamento Raman mesmo para

    campos eltricos de intensidades relativamente baixas, pudemos considerar a aproximao

    linear do momento de dipolo induzido, a saber

    1 =

    Em termos qunticos, podemos escrever o momento de dipolo da transio como

    [1] = || 2.220

    onde pudemos retirar o campo eltrico da integral pelo fato de que o comprimento de onda da

    radiao geralmente muito maior que as dimenses do sistema espalhador. Motivo pelo qual,

    consideramos que o mesmo permanece sensivelmente constante sobre o sistema.

    2.2.2.1 Elementos de matriz das componentes da polarizabilidade

    Da mesma forma que para o tratamento clssico, aqui tambm podemos escrever as

    componentes do momento de dipolo induzido em termos das componentes do campo eltrico

    da radiao e da polarizabilidade da seguinte forma

    [1

    ] = [] + [] + [] 2.221

    [1

    ] = [] + [] + [] 2.222

    [1] = [] + [] + []

    2.223

    onde

  • 32

    [] = || 2.224

    so chamados de elementos matriciais dos componentes do tensor polarizabilidade para a

    transio .

    2.2.2.2 Transies vibracionais

    Vamos agora olhar mais detalhadamente para um elemento matricial tpico do tensor

    polarizabilidade. Analogamente ao que fizemos na equao 2.209, expandimos este elemento

    matricial numa srie em termos das coordenadas normais. Assim temos

    [] = ()0| + (

    )

    0|| 2.225

    Como sabemos, as funes vibracionais totais e podem ser escritas como produtos

    das funes vibracionais de cada modo normal.

    = () 2.226

    = () 2.227

    onde () e () so funes de onda associadas k-sima coordenada normal com

    nmeros qunticos vibracionais e

    nos estados inicial e final, respectivamente.

    Substituindo isso na equao 2.225, temos

    [] = ()0 () | () +

    + (

    )

    0 () || ()

    2.228

    Olhemos inicialmente para o primeiro termo da direita da equao acima. Devido a

    ortogonalidade das funes de onda do oscilador harmnico este termo ser zero a menos que

    os estados inicial e final sejam idnticos, ou seja, = . Se esta condio for satisfeita,

    devido a normalizao das funes do oscilador harmnico, a integral resulta na unidade.

    Assim, o termo reduz-se a simplesmente ()0. Visto que, ao menos um dos componentes do

  • 33

    tensor polarizabilidade no equilbrio diferente de zero, o primeiro termo resulta sempre

    diferente de zero, o que nos garante observarmos sempre o espalhamento Rayleigh. Este

    resultado foi o mesmo obtido no tratamento clssico.

    O segundo termo est relacionado ao espalhamento Raman. Das propriedades das

    funes do oscilador harmnico, podemos afirmar que a integral neste termo no nula desde

    que somente um nmero quntico vibracional varie pela unidade durante a transio, ou seja,

    = + 1. Esta condio, embora necessria, no suficiente para que o termo persista na

    expanso de []. Ao menos uma das componentes da derivada da polarizabilidade deve ser

    diferente de zero. Assim, verificamos que o tratamento quntico nos d duas condies que

    devem ser satisfeitas para que observemos espalhamento Raman: i) o tensor de polarizabilidade

    deve variar com as coordenadas normais (mesmo resultado obtido classicamente); ii) o sistema

    s pode transitar entre estados iniciais e finais para os quais apenas um nmero quntico difere

    da unidade (resultado obtido apenas por meio do tratamento parcialmente quntico).

    A intensidade Raman proporcional probabilidade de transio, sendo dada por

    |()|2

    , 2.229

    Outra forma de olhar para as regras de seleo fazendo uso da Teoria de Grupos. Antes,

    devemos lembrar que

    [] = || = 2.230

    Haver transio se a integral acima for no nula. Se ambos os estados inicial e final da

    transio so no-degenerados, o requisito para que a transio seja no-nula que a espcie de

    simetria da quantidade a ser integrada deve ser totalmente simtrico. Escrevemos isso da

    seguinte forma:

    () () () = 2.231

    onde representa a espcie de simetria de. Se um ou ambos os estados so degenerados, a

    equao 2.231 no suficiente, visto que o produto de uma espcie qualquer por uma espcie

    degenerada resulta em mais de uma espcie. Assim a equao modificada da seguinte forma:

    () () () 2.232

  • 34

    onde o smbolo significa contm a representao.

    Na aproximao de oscilador harmnico, os modos vibracionais que correspondem,

    na grande maioria das vezes (devido distribuio de Boltzman) ao estado fundamental do

    sistema, so representados por funes totalmente simtricas, ou seja, () = . Dessa forma,

    para que o produto seja igual a , necessrio que () () = , donde conclumos

    que () = (). Ou seja, a atividade de um modo Raman est intrinsicamente ligada

    componente do tensor de polarizabilidade relacionado a ele: a espcie de simetria do estado

    acessado aps a interao deve ser igual espcie de simetria da componente do tensor de

    polarizabilidade. No caso de degenerescncia, a regra de seleo () (). Ou seja,

    para que acontea a transio, a espcie de simetria do estado final da transio deve conter a

    espcie de simetria da componente do tensor de polarizabilidade.

    Em outras palavras, o modo vibracional adquirido pelo sistema devido sua interao

    com a radiao deve ter uma espcie de simetria igual a alguma componente do tensor de

    polarizabilidade (caso no degenerado) ou conter alguma componente do tensor de

    polarizabilidade (caso degenerado). A Tabela 2 uma reproduo da Tabela 7E [63].

    Tabela 2 Carta de caracteres do grupo pontual C2v.

    C2v E C2z v

    xz vyz Regras de seleo

    A1

    A2

    B1

    B2

    1 1 1 1

    1 1 -1 -1

    1 -1 1 -1

    1 -1 -1 1

    Tz

    Rz

    Tx; Ry

    Ty, Rx

    xxz, yy

    z, zzz

    xy

    xzx

    yzy

    T 3 -1 1 1

    Na tabela acima, a primeira coluna se refere s espcies de simetria do grupo C2v. So

    representaes irredutveis deste grupo. A segunda coluna apresenta os caracteres de cada

    representao irredutvel. Os caracteres so importantes porque so invariantes sob mudana

    de coordenadas. As terceira e quarta colunas apresentam as regras de seleo para IR e Raman.

    No quarto bloco, os smbolos correspondem componente do tensor de polarizabilidade a

    ser observada mediante o uso de polarizaes apropriadas do feixe incidente (i) e espalhado (j).

    Dessa forma, podemos prever quais modos so ativos no Raman ou no IR apenas observando

    quais componentes do tensor de polarizabilidade (Raman) ou do vetor translao (IR) se

    transformam de acordo com cada representao irredutvel desse grupo. No caso do grupo 2,

  • 35

    todos os modos vibracionais so ativos no Raman (observe que h pelo menos uma componente

    do tensor de polarizabilidade associada a qualquer espcie de simetria). Apenas os modos 1,

    1 e 2 so ativos no I.R. pois apenas estes se transformam da mesma forma que as

    componentes do vetor translao (lembre que as componentes do vetor translao se

    transformam da mesma forma que as componentes do vetor momento de dipolo eltrico

    induzido).

    2.3 Anlise de Teoria de Grupos para o MgMoO4

    Foi verificado por difrao de raios-X que o cristal de MgMoO4 investigado nessa tese,

    pertence fase -MgMoO4, em temperatura e presso ambientes. Como j mencionado, esta

    fase tem uma estrutura monoclnica, com grupo espacial C2/m (C32h). Com a anlise desses

    dados possvel verificar que o composto tem oito molculas por clula unitria convencional.

    A cristalinidade do material garante a disposio de seus tomos em posies especficas, o que

    define seus stios de simetria. Com isso, possvel, alm de obter o grupo espacial do material,

    identificar os stios de simetria de todos os tomos. Tendo isso em mos, podemos fazer a

    anlise de teoria de grupos desse material.

    Da referncia [63] (tabela 5A), vemos que os possveis stios Wyckoff para a estrutura

    C2/m (C32h) so:

    23 = [1(8)] + [(4)] + [( + )2(4) + ( + )(4) + ( + +

    + )2(2)]

    A equao acima nos diz que a multiplicidade dos stios Cs, C2 e Ci 4, a do stio C1

    8 e a do stio C2h 2. Consultando a ficha cristalogrfica do MgMoO4 e fazendo a correlao

    dos possveis stios com os elementos de simetria do MgMoO4, obtemos os stios abaixo para

    o molibdato de magnsio:

    23 = 3[1(8)] + 4[(4)] + ( + )2(4)

    Figura 6 Estrutura do molibdato de magnsio ao longo das direes cristalogrficas a, b e c, respectivamente.

    tomos de oxignio em vermelho, tomos de molibdnio no centro dos tetraedros em azul e tomos de magnsio

    no centro dos octaedros em verde.

  • 36

    Faremos a anlise, considerando que a molcula consiste de duas partes, a saber: um

    tomo de Mg (que ocupa stios 2 ) e uma unidade MoO4 (que ocupa stios 2 ). Por

    meio da tabela 5B [63] (que d o nmero de modos translacionais e as espcies de simetria de

    cada um deles para cada stio dentro do grupo C2h), obtemos os modos translacionais T:

    (1) + + 2 + 2

    (2) 2 + + + 2

    (1) 2 + + + 2

    (2) + + 2 + 2

    Da tabela 5C [63] (que d o nmero de modos libracionais e as espcies de simetria de cada um

    deles para cada stio dentro do grupo C2h), podemos contar os modos libracionais (R) dos

    tetraedros. Temos ento:

    (1) + 2 + 2 +

    (2) + + 2 + 2

    o que d um total de modos externos expresso por

    = 8 + 7 + 10 + 11

    Os modos acsticos so e 2. Dessa forma, os modos ticos externos so:

    = 8 + 6 + 10 + 9

    Os modos internos so obtidos por meio da correlao das representaes irredutveis

    do tetraedro livre () com as representaes irredutveis do grupo fator (2). O processo se

    baseia no fato de que o grupo MoO4 (livre) tem simetria cujas representaes irredutveis

  • 37

    so 1, 2, , 1 2. No cristal, estes grupos ocupam stios de simetria 2 e , cujas

    representaes irredutveis so e (2), e e (). Procuramos saber como as

    representaes irredutveis da molcula livre se transformam nas representaes irredutveis

    associadas aos stios ocupados por estas no cristal, e como estas se transformam nas

    representaes irredutveis do grupo fator da clula unitria 2, que so, , , . A

    Tabela 3 apresenta a carta de correlao para o grupo MoO4 na estrutura 2.

    A primeira coluna ( = . ) representa o nmero de graus de liberdade de cada

    stio por conjunto de tomos equivalentes; a degenerescncia de cada espcie do grupo

    fator; e o nmero de graus de liberdade obtidos pela distribuio de em termos das

    componentes do grupo fator. Por exemplo: o grupo s tem uma vibrao 1 que

    unidimensional (1). Como temos quatro molculas na clula primitiva (duas no stio e duas

    no stio 2), temos um total de 4 graus de liberdade. No caso da vibrao 2 (tambm uma para

    cada grupo tetradrico), temos 8 graus de liberdade associados, tendo em vista que cada uma

    delas bidimensional. A correlao feita de modo a obtermos, no fim, o mesmo nmero de

    graus de liberdade que tnhamos no incio para cada vibrao. Os smbolos na segunda coluna

    correspondem aos modos internos: 1 (estiramento simtrico), 2 (bending simtrico), 3

    (estiramento antissimtrico) e 4 (bending antissimtrico).

    Tabela 3 Carta de correlao do grupo de simetria do tetraedro MoO4 livre e do grupo fator C2h da clula unitria.

    Simetria

    molecular

    Stio de

    Simetria

    2

    Grupo

    fator

    2

    2

    4

    12

    1 2

    3, 4

    1 2 E

    (1,2,3,4) (3,4) (3,4)

    1

    1

    10

    8

    1

    1

    1

    1

    5

    5

    4

    4

    Simetria molecular

    Stio de

    Simetria

    Grupo fator

    2

    2

    4

    12

    1 2

    3, 4

    1 2 2

    (1,2,3,4)

    (2,3,4)

    1

    1

    12

    6

    1

    1

    2

    2

    6

    3

    3

    6

    fcil ver que o modo 1 no degenerado, 2 duplamente degenerado e, 3 e 4 so

    triplamente degenerados. Neste caso, a representao irredutvel 1 da simetria se

    transforma como a representao irredutvel da simetria 2 e como da simetria .

  • 38

    Ademais, com no stio 2, se transforma como + , e 2 se transforma como + 2;

    com no stio , se transforma como + e 2 se transforma como 2

    + . Esses

    dados foram obtidos com o auxlio das Tabelas 5D e 31D [63]. Assim, vemos que as vibraes

    internas do cristal podem ser decompostas em termos das representaes irredutveis da clula

    unitria como:

    = 11(21 + 32 + 33 + 34) + 8(1 + 32 + 23 + 24)

    + 7(2 + 33 + 34) + 10(1 + 2 + 43 + 44)

    Finalmente como:

    = + ento:

    = 19 + 15 + 17 + 21

    Onde 1 + 2 so acsticos, como j comentado.

    Destes modos, somente aqueles de simetria so ativos no Raman, os demais, ou

    seja, so ativos no infravermelho.

    A Tabela 4 sintetiza os resultados da anlise de teoria de grupos.

    Tabela 4 Distribuio dos modos vibracionais do MgMoO4 em termos das representaes irredutveis do grupo

    fator da clula unitria. A diviso feita por modos internos e externos, e ativos no Raman e no IR.

    Vibraes internas do tetraedro

    Modo Stio C2 Stio Cs

    Raman I.R. Raman I.R.

    1 Ag Au Ag Bu

    2 2Ag 2Au Ag, Bg Au, Bu

    3 Ag, 2Bg Au, 2Bu 2Ag, Bg Au, 2Bu

    4 Ag, 2Bg Au, 2Bu 2Ag, Bg Au, 2Bu

    Modos externos da rede

    Raman I.R.

    8Ag, 10Bg 6Au, 9bu

    Total de modos ativos

    Raman I.R.

    19Ag, 17Bg 14Au, 19Bu

  • 39

    2.4 Anlise de Teoria de Grupos para o Li2MoO4

    O Li2MoO4 pertence ao grupo espacial 3 (62), rombodrico, com Z = 18. A clula

    primitiva, onde feita a contagem do nmero de modos, tem ZP = 6. Dos dados de difrao de

    raios-X possvel inferir que todos os tomos do molibitado de ltio ocupam stios de Wyckoff

    18f (ou 6f no caso da clula primitiva). Da tabela 17A [63], temos

    62(3) = [1(6)] + ( + )(3) + [3(2)] + ( + )6(1)

    donde podemos ver que somente stios 1 possuem multiplicidade 6. Assim, afirmamos que

    todos os tomos do Li2MoO4 ocupam stios de simetria 1. Nossa anlise ser feita supondo

    que a unidade Li2MoO4 composta de trs partes, a saber: dois tomos de ltios, cada um em

    um stio 1 e um grupo MoO4 tambm em stio 1.

    Figura 7 Estrutura do molibdato de ltio ao longo das direes cristalogrficas a, b e c, respectivamente. tomos

    de oxignio em vermelho, tomos de molibdnio no centro dos tetraedros em verde e tomos de ltio no centro dos

    tetraedros em lils.

    A contagem dos modos translacionais (T) pode ser feita, consultando a tabela 17B [63].

    Dessa forma teremos

    (1) 3 + 3 + 3 + 3

    (2) 3 + 3 + 3 + 3

    (4) 3 + 3 + 3 + 3

    Os modos libracionais (R) do tetraedro MoO4 so obtidos por meio da tabela 17C [63]:

    (4) 3 + 3 + 3 + 3

    Isso d um total de modos externos expresso por

  • 40

    = 12 + 12 + 12 + 12

    A Tabela 5 mostra a carta de correlao para o grupo MoO4 na estrutura 6.

    Tabela 5 Carta de correlao do grupo de simetria do tetraedro MoO4 livre e do grupo fator S6 da clula

    unitria

    Simetria

    molecular

    Stio de

    Simetria

    1

    Grupo

    fator

    6

    6

    12

    36

    1 2

    3, 4

    1 2

    (1,2,3,4) 1

    54

    1

    1

    2

    2

    9

    9

    18

    18

    Assim, vemos que as vibraes internas do cristal podem ser decompostas em termos

    das representaes irredutveis da clula unitria como:

    = 9(1 + 22 + 33 + 34) + 9(1 + 22 + 33 + 34)

    + 9(1 + 22 + 33 + 34) + 9(1 + 22 + 33 + 34)

    Do total de modos, somente aqueles de simetria so ativos no Raman. A Tabela

    6 sintetiza os resultados da anlise de teoria de grupos.

    Tabela 6 Distribuio dos modos vibracionais do Li2MoO4 em termos das representaes irredutveis do grupo

    fator da clula unitria. A diviso feita por modos internos e externos, e ativos no Raman e no IR.

    Vibraes internas do tetraedro

    Modo Stio C1

    Raman I.R.

    1 Ag, Eg Au, Eu

    2 2Ag, 2Eg 2Au, 2Eu

    3 3Ag, 3Eg 3Au, 3Eu

    4 3Ag, 3Eg 3Au, 3Eu

    Modos externos da rede

    Raman I.R.

    12Ag, 12Eg 11Au, 11Eu

    Total de modos ativos

    Raman I.R.

    21Ag, 21Eg 21Au, 21Eu

  • 41

    3 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS

    3.1 Medidas de Espectroscopia Raman

    Na Figura 8 mostramos o diagrama de um equipamento utilizado para a obteno de um

    espectro Raman. O sistema constitudo de uma fonte de radiao monocromtica (de energia

    maior que a energia de vibrao molecular da amostra, porm, menor que a energia de excitao

    eletrnica), um dispositivo para suporte da amostra, um espectrmetro para disperso da

    radiao espalhada, e um dispositivo de deteco da luz que pode ser de natureza fotogrfica,

    de natureza fotoeltrica ou de natureza de cargas acopladas (CCD).

    Figura 8 Esquema do sistema de espalhamento Raman utilizado para as medidas desse trabalho.

    As medidas de espalhamento Raman apresentadas nesse trabalho foram realizadas no

    Laboratrio de Espectroscopia Raman da UFSCar, usando um sistema micro-Raman preparado

  • 42

    para a geometria de retro-espalhamento num espectrmetro Jobin Yvon T64000 equipado com

    uma CCD (Charge Coupled Device) resfriado com nitrognio lquido. Na Figura 9 apresenta-

    se uma fotografia do espectrmetro usado para a obteno dos espectros Raman desse estudo.

    Para a excitao da amostra, usamos um laser de argnio operando em 514,5 nm e as fendas

    foram ajustadas para uma resoluo de 2 cm-1. O feixe foi focalizado utilizando-se um

    microscpio OLYMPUS BH-2 equipado com uma lente de distncia focal f = 20 mm.

    Figura 9 Espectrmetro Jobin-Yvon T64000 usado nas medidas de espalhamento Raman.

    3.2 Medidas em altas presses

    Na realizao das medidas em altas presses utilizou-se uma clula de presso com

    extremos de diamantes no padro NBS (National Bureau of Standards) conhecida na literatura

    como DAC (Diamond Anvil Cell). O modelo usado foi produzido pela EasyLab, projetado para

    trabalhar em temperatura ambiente com um limite superior terico de presso de 30 GPa. Tal

    clula ideal para se trabalhar a altas presses conjuntamente com medidas pticas devido ao

    fato de possuir duas janelas pticas, que so os extremos de diamantes de altssima pureza.

    Existem dois mtodos de aplicao de presso, sendo um uniaxial e outro hidrosttico.

    No mtodo de presso uniaxial existe a possibilidade de se atingir presses que ultrapassem a

  • 43

    resistncia mecnica do material, levando destruio da amostra em estudo. Na tcnica de

    presso hidrosttica, usamos um lquido compressor o qual exerce uma presso igual em todos

    os pontos da amostra.

    3.3 Procedimentos experimentais para as medidas sob presso hidrosttica

    Em todos os experimentos, as altas presses foram obtidas com a amostra carregada em

    uma clula bigorna de diamante da EasyLab com diamantes de 0,5 mm. Gaxetas de ao

    inoxidvel com espessura de 200 m foram pr-indentadas at 45 m. Um buraco com 120 m

    de dimetro foi perfurado no centro da indentao usando uma mquina de descarga eltrica da

    EasyLab. A Figura 10 apresenta o esquema da clula de presso usada para a aplicao de altas

    presses hidrostticas. O equipamento constituindo dos seguintes componentes:

    Figura 10 Representao esquemtica da clula de presso utilizada nos experimentos.

    1. Um parafuso principal que o responsvel direto pelo controle da presso durante o

    experimento. A regulagem da presso deve ser feita muito cuidadosamente, pois ao contrrio

  • 44

    do que se possa pensar, a presso no aumenta linearmente com o nmero de voltas do parafuso.

    Existe um processo de acomodao das molas prato que faz com que giros por ngulos iguais

    no parafuso produza incrementos de presso;

    2. Uma alavanca com as molas prato e mais alguns perifricos que so responsveis pela

    transmisso de presso aos diamantes;

    3 e 4. Diamantes superior e inferior. So as peas de maior valor e podem sofrer danos

    irreparveis com o manuseio errado do equipamento. So so responsveis diretos pela

    transmisso de presso ao fluido compressor;

    5. A gaxeta uma pea metlica de ao inoxidvel no interior da qual ficar o fluido

    compressor, a amostra a ser medida e uma amostra de rubi;

    6. No que diz respeito ao fluido transmissor de presso, o mais utilizado uma mistura de

    metanol e etanol numa proporo de 4:1. Utiliza-se tambm o nujol (leo mineral);

    7. Rubi. colocado no interior da gaxeta, junto com a amostra a ser medida e o fluido

    compressor. A calibrao da presso no interior da clula foi feita atravs da tcnica de

    luminescncia do rubi. Sabe-se que as duas linhas de luminescncia do rubi (Al2O3:Cr3+), R1 e

    R2, deslocam-se linearmente em funo da presso at o limite de 30 GPa.

    No experimento com molibdato de magnsio, no entanto, devido regio de

    hidrostaticidade da mistura metanol:etanol ir at aproximadamente 10 GPa [70], o experimento

    foi conduzido a at 8,5 GPa somente. J no caso do molibdato de ltio, embora a hidrostaticidade

    do nujol seja garantida at 4,0 GPa [71], ele ainda quase-hidrosttico at aproximadamente

    10 GPa. Por isso, as medidas foram feitas at 7,0 GPa A presso no interior da clula pode ser

    determinada usando a expresso:

    () =

    0

    7,535 3.301

    onde o nmero de onda de qualquer uma das linhas do rubi (em unidades de cm-1) presso

    P e 0 o nmero de onda da respectiva linha presso ambiente.

  • 45

    3.4 Amostras

    3.4.1 Molibdato de magnsio

    As amostras de molibdato de magnsio em forma de p foram obtidas diretamente da

    Sigma Aldrich e foram usadas sem qualquer purificao. As medidas de raios-X confirmaram

    que a fase de presso e temperatura ambiente realmente a fase -MgMoO4 (2/).

    3.4.2 Molibdato de ltio

    As amostras de molibdato de ltio foram preparadas em temperatura ambiente de uma

    soluo aquosa usando etanol como agente precipitante. O molibdato de amnio hidratado

    ((NH4)6Mo7O244H2O) e hidrxido de ltio hidratado (LiOHH2O) foram pesadas em diferentes

    razes e ento dissolvidos em gua destilada. A soluo aquosa assim preparada foi aquecida

    at em torno de 100 oC onde o amnio evaporou por completo. As solues contendo ltio (Li)

    e molibdato (MoO4) foram misturadas em etanol e agitadas com um agitador magntico. O

    precipitado assim obtido foi filtrado, lavado com etanol e ento seco em um forno a 80 oC. O

    p resultante foi caracterizado por difrao de raios-X e verificou-se ser a fase rombodrica do

    molibdato de ltio (3).

    Com o intuito de se obter p de Li2MoO4 em uma nica fase cristalina, diferentes

    condies e valores para razo de Li/Mo na soluo inicial, pH da soluo, tipo de precipitador

    orgnico, concentrao da soluo aquosa e mtodo de agitao, foram usados.

  • 46

    0 200 400 600 800 1000 1200

    Numero de onda

    inte

    nsid

    ade

    (cm-1)

    4 RESULTADOS E DISCUSSES

    Neste captulo faremos a anlise dos espectros medidos para o MgMoO4 (at 8,5 GPa)

    e para o Li2MoO4 (at 5,0 GPa em um primeiro experimento e 7,0 GPa em um segundo

    experimento). A anlise ser complementada pela observao dos grficos . Baseados

    nestas observaes, faremos algumas suposies acerca do comportamento destes materiais

    induzido pela presso.

    4.1 Espectro Raman do MgMoO4 presso ambiente

    Figura 11 Espectro Raman do MgMoO4 em presso ambiente. Regio espectral de 50 a 1200 cm-1.

    A Figura 11 mostra o espectro Raman do molibdato de magnsio em presso ambiente

    na regio espectral que vai de 50 a 1200 cm-1. A Teoria de Grupos prev, para este material,

    um total de 36 modos ativos no Raman (Tabela 7). No entanto, possvel observarmos 26

    picos neste espectro. A atribuio destes picos foi feita de acordo com a referncia [50].

    De acordo com a mesma referncia, 18 dos modos previstos pela teoria de grupos so

    internos e o mesmo nmero de modos conta para vibraes externas. H um forte acoplamento

    entre os modos de bending do tetraedro MoO42- e os modos externos, o que dificulta a

    diferenciao entre eles. Isso se deve forte ligao entre o on Mg2+ e o tetraedro MoO42-. Isso

    torna os modos de bending altamente influenciados pelos modos de estiramento das ligaes

    Mg-O. Podemos, portanto, por economia, nos referirmos aos modos vibracionais simplesmente

  • 47

    como internos ou externos (estes ltimos incluem os modos deveras externos e alguns modos

    acoplados a bendings).

    Tabela 7 Nmero de onda experimental em presso atmosfrica [obs(cm-1)] e seus assinalamentos (para presso

    ambiente com coordenao tetraedral do on Mo), com ajuste linear do tipo =0 + P [0 (cm-1)] e [(cm-

    1/GPa)] para as fases de presso ambiente e de alta presso do molibdato de magnsio.

    0,0 1,4 GPa 1,4 8,5 GPa

    = 0 + = 0 +

    (1) 0(

    1) (1/) 0(1) (1/) Atribuio

    69 69,0 1,06 70,6 0,01 rede

    74 74,0 0,64 75,0 -0,07 rede

    81 81,7 0,72 81,8 0,07 rede

    89 88,9 0,59 89,9 0,11 rede

    93,2 0,09 rede

    97 97,4 1,00 98,3 0,05 rede

    105 105,4 0,39 106,0 0,05 rede

    116,2 0,12 rede

    121 120,7 -0,77 121,4 0,15 rede

    144,3 -0,94 rede

    149,3 -0,79 rede

    143,9 0,55 rede

    150,0 0,40 rede

    155 155,1 1,19 152,0 1,11 rede

    178 177,9 0,21 169,6 2,20 rede

    204 203,7 0,84 204,6 0,19 rede

    208,5 0,60 rede

    234,9 1,62

    275 276,7 0,16 274,3 0,33 bend./rede

    295,2 4,60

    302,2 4,76

    324 325,4 5,36 bend./rede

    335 335,7 0,60

    351 348,6 5,10 315,5 4,74 bend./rede

    357,0 -0,04

  • 48

    0,0 1,4 Gpa 1,4 8,5 GPa

    = 0 + = 0 +

    (1) 0(

    1) (1/) 0(1) (1/) Atribuio

    371 372,0 2,81 bend./rede

    385 385,9 4,96 380,8 2,73 bend./rede

    401 401,8 9,70 405,8 3,92 bend./rede

    414,9 2,90

    427 426,8 7,47 432,2 4,54 bend./rede

    500,8 2,84

    649,6 5,55

    666,4 5,12

    756 758,2 1,38 743,5 5,09 est. antissim.

    773 771,8 6,06 757,9 4,93 est. antissim.

    856 855,2 6,29 est. antissim.

    874 876,0 5,09 877,9 6,05 est. antissim.

    906 906,5 4,41 est. antissim.

    912 912,8 6,82 919,9 5,74 est. antissim.

    959 958,7 6,47 958,3 6,19 est. sim.

    971 971,2 6,29 974,0 5,85 est. sim.

    4.2 Espectroscopia Raman do MgMoO4 em funo da presso

    Para facilitar a nossa anlise, o espectro foi dividido em quatros regies, uma entre 50 a

    250 cm-1, de 250 a 550 cm-1, de 600 a 820 cm-1 e uma ltima, de 820 a 1050 cm-1. A Figura 12

    mostra a evoluo do espectro do MgMoO4 em funo da presso de 0,0 a 8,5 GPa, na regio

    espectral de 50 a 250 cm-1. A anlise desta regio importante, pois mudanas significativas

    aqui podem indicar uma transio de fase na amostra. Isto porque esta regio intrinsicamente

    ligada com a estabilidade estrutural da amostra, uma vez que os modos translacionais a se

    encontram.

  • 49

    Nmero de onda (cm-1

    )

    Figura 12 Evoluo com a presso at 8,5 GPa dos espectros Raman do MgMoO4 na regio espectral de 50 a

    250 cm-1.

    claramente verificado que o espectro registrado a 1,4 GPa bastante diferente daquele

    medido em presso ambiente. As principais mudanas observadas foram: i) o aparecimento de

    quatro novas bandas em torno de 143, 150, 172 e 237 cm-1; ii) a diviso (splitting) de algumas

    bandas; e iii) mudana no nmero de onda de vrios modos vibracionais. Todas estas alteraes

    podem ser melhor visualizadas analisando o grfico mostrado na Figura 13. Todos os

    picos foram muito bem ajustados por meio da funo linear = 0 + . Os nmeros de

    onda experimental , o ajustado 0 e os coeficientes de presso , so todos mostrados na

    Tabela 3.

    O que se verifica nessa figura um forte indicativo de que o material sofre uma transio

    de fase estrutural prximo a 1,4 GPa. As nicas modificaes observveis que ocorrem no

    espectro entre 1,4 e 8,5 GPa so a reduo da intensidade de todos os picos e o surgimento de

    um pico muito pouco intenso em 98 cm-1 (2,7 GPa) e outro em 146 cm-1 (5,6 GPa). Estas poucas

    e sensveis mudanas, sugerem que a fase a mesma entre 1,4 e 8,5 GPa.

  • 50

    Figura 13 Dependncia com a presso at 8,5 GPa das frequncias dos modos Raman do MgMoO4 na regio

    espectral de 50 a 250 cm-1.

    Ap