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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE HIDRÁULICA GESTÃO MUNICIPAL DE RECURSOS HÍDRICOS GESTÃO URBANA E GESTÃO DAS ÁGUAS NO BRASIL: EM BUSCA DA INTERSETORIALIDADE Curitiba 2005 1

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE … · Cidade e os Planos Diretores Municipais sob o enfoque da Lei 9433/97, que instituiu a Política Nacional de Proteção aos Recursos

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁDEPARTAMENTO DE HIDRÁULICA

GESTÃO MUNICIPAL DE RECURSOS HÍDRICOS

GESTÃO URBANA E GESTÃO DAS ÁGUAS NO BRASIL: EM BUSCA

DA INTERSETORIALIDADE

Curitiba2005

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MAGDA CRISTINA VILLANUEVA FRANCO

GESTÃO URBANA E GESTÃO DAS ÁGUAS NO BRASIL: EM BUSCA

DA INTERSETORIALIDADE

Trabalho a ser entregue a Universidade

Federal do Paraná, como requisito de

conclusão do Curso de Especialização em

Gerenciamento Municipal de Recursos

Hídricos, sob a orientação da Profa. Sylvia

Ramos Leitão.

Curitiba2005

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FOLHA DE APROVAÇÃO

_________________________________ Nota:________________

Profa. Sylvia Ramos Leitão

Orientadora

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1. INTRODUÇÃO

A gestão das águas no meio urbano implica em várias questões, mas

geralmente o primeiro impacto é o abastecimento público, cuja problemática está

centrada no aspecto da qualidade das águas, pois atualmente o adensamento

populacional tem gerado poluição de todas as ordens, e conseqüentemente a

degradação da qualidade das águas.

A poluição doméstica e também a industrial são fatores que têm se

agravado, pois propiciam condições ambientais inadequadas, causando o

desenvolvimento de doenças de veiculação hídrica, poluição do ar, contaminação

das águas entre outras. Esta realidade acentuou-se por volta da década de 60, e

demonstrou que o desenvolvimento urbano com ausência de um planejamento

resulta em significativos prejuízos ambientais para toda a sociedade.

Com relação à gestão das águas, o impacto causado pelas cidades é

ainda maior, tendo em vista que a qualidade destas águas está ligada diretamente à

forma de uso e ocupação do solo.

Deste modo, pode-se observar que os impactos da urbanização têm

causado significativos prejuízos, e por isso a nova ordem jurídico-institucional da

gestão dos recursos hídricos veio modificar inteiramente o aparato anteriormente

existente, tendo por base a crise da água que se estabelece sobre a sociedade

contemporânea.

A nova forma de gestão foi inaugurada no Brasil através da Lei

9433/1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos, e trouxe uma

proposta inovadora, ou seja, tornar a administração das águas descentralizada e

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participativa, e neste contexto está sendo implantada de forma gradativa em âmbito

nacional e estadual.

Ocorre que, segundo a Constituição Federal, as águas são de domínio da

União e Estados, então, indaga-se qual o papel do município na gestão? De que

forma o município poderá efetivar a gestão das águas no contexto do planejamento

urbano, visto que, este é o responsável pela adequada utilização do uso e ocupação

do solo? Estas são algumas das inúmeras questões que se tem acerca da interface

entre a gestão de recursos hídricos e a gestão urbana.

Recentemente o desenvolvimento urbano deu um salto inovador,

especificamente após a Constituição de 1988, a qual trouxe a noção de função

social da propriedade urbana, nos art. 182 e 183, que recentemente foram

regulamentados pela Lei 10.257/2001, o qual trouxe instrumentos de planejamento

para a gestão urbana.

Assim, como se pode perceber, o conceito de gestão urbana vem sendo

constantemente alterado, especialmente após a Constituição Federal de 1988 que

veio consolidar a relevância da questão ambiental de modo geral, bem como, a

proteção das águas.

E neste contexto, mesmo o município não sendo referido diretamente nas

legislações de proteção dos recursos hídricos é um dos atores fundamentais no

cenário de efetivação da política de proteção deste recurso.

Portanto é dentro desta temática que o presente estudo está inserido, ou

seja, num universo extremamente atual e desafiador, cujo objetivo consiste em

realizar uma análise entre a política de recursos hídricos em face dos aparatos

legais pertinentes ao município, tais como o Estatuto da Cidade e Plano Diretor, com

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intuito de apontar as incongruências e eventuais conflitos, bem como, apresentar os

prováveis benefícios da sua adequada integração e a busca pela intersetorialidade.

Pretende-se também, apresentar casos práticos para demonstrar a

integração da gestão urbana e a proteção das águas, com o objetivo de buscar

caminhos para o sucesso do planejamento jurídico-institucional integrado.

Para tanto, buscar-se-á inicialmente apresentar a realidade legislativa

existente acerca da gestão urbana, bem como o histórico da regulamentação, a

interface de políticas hídricas e urbanas, através da revisão bibliográfica.

Em segundo momento, serão analisadas as informações coletadas nas

discussões e resultados buscando encontrar caminhos que proporcionem a

adequada integração das políticas com vistas a promover a efetiva implantação da

gestão e conseqüentemente a proteção das águas.

E por derradeiro, apresentar-se-á jurisprudências, que constituem casos

práticos judiciais, com a finalidade de demonstrar a interdependência entre gestão

das águas e urbana, realizando as devidas considerações.

Com isso, espera-se contribuir para que os gestores hídricos e urbanos

possam usufruir do presente estudo no sentido de vislumbrar todas as dimensões

que envolvem a questão da interface das políticas, tanto do ponto de vista jurídico,

quanto administrativo e social, propiciando a compreensão da necessidade de

integração entre os diversos atores sociais para o sucesso da gestão, e assim,

efetivar a proteção das águas, bem como, a democratização das decisões,

contribuindo também para com a construção das cidades sustentáveis.

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SUMÁRIO

2. RESUMO

O presente estudo objetivou analisar a gestão das águas no âmbito da

gestão urbana, sob a ótica do novo cenário jurídico inovador que está sendo

implantado desde a Constituição Federal de 1988, com a criação do Estatuto da

Cidade e os Planos Diretores Municipais sob o enfoque da Lei 9433/97, que instituiu

a Política Nacional de Proteção aos Recursos Hídricos, enfatizando a importância de

relevância de um gerenciamento integrado aliado á participação da sociedade. A

presente pesquisa obteve conclusões após ampla investigação bibliográfica

conjugadas com análises da realidade local, tendo como objetivo principal

proporcionar aos gestores o conhecimento acerca das inúmeras questões que

envolvem a gestão hídrica e urbana a fim de contribuir para a construção das

cidades sustentáveis.

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3. ABSTRACT

The present study objectified to analyze the administration of the waters in

the ambit of the urban administration, under the optics of the new innovative juridical

scenery that is being implanted from the Federal Constitution of 1988, with the

creation of the Statute of the City and the Municipal Managing Plans under the focus

of the Law 9433/97, that it instituted the National Politics of Protection to the waters,

emphasizing the importance of relevance of a integrated management allied with

participation of the society. This present research obtained conclusions after wide

bibliographical investigation conjugated with analyses of the local reality, tends as

main objective to provide to the managers the knowledge concerning the countless

subjects that involve the hydric administration and urban in order to contribute for the

construction of the sustainable cities.

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4. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

4.1 Gestão ambiental urbana

4.1.1 Origem histórica das cidades

As primeiras povoações que foram denominadas de cidades surgiram por

volta de 5.000 A.C. nas Planícies Aluviais do Oriente Próximo. Primeiramente os

aglomerados iniciaram-se porque os produtores de alimento foram obrigados a

produzir um excedente a fim de manter uma população na urbe, que eram os

artesãos, mercadores, guerreiros e sacerdotes que controlavam o campo.

Mas em seguida nasceu a aldeia, que se formou a partir do momento em

que as indústrias e serviços não eram executados pelas pessoas que cultivavam a

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terra, e sim por outras que eram mantidas pelas primeiras com o excedente do

produto total (BENEVOLO in: ROCHA, 1999).

Assim, da aldeia evolui-se para a cidade, e transforma-se numa

velocidade elevadíssima, assinalando o começo de uma nova história civil,

provocando mudanças muito profundas da composição das atividades das classes

dominantes, que influenciaram toda a sociedade, dando-se inicio a aventura da

civilização. Primeiramente com a civilização feudal e civilização burguesa, que

prepararam a transição histórica seguinte, que ocorreu com o desenvolvimento da

produção e dos métodos científicos, que culminou com a civilização industrial, e

assim surge a cidade moderna tal qual se conhece até hoje.

4.1.2 Conceito de cidade

RATZEL (1999) conceitua a cidade como sendo: “uma reunião durável de

homens e habitações humanas que cobre uma grande superfície e encontra-se no

cruzamento de grandes vias comerciais”.(ROCHA, 1999)

Já para PIERRE GEORGE (1999), as cidades são formas de acumulação

humana e de atividades concentradas, próprias a cada sistema econômico e social,

reconhecidos a partir de fatos de massa e arquitetônicos. (ROCHA, 1999)

ROCHA (1999) define a cidade como um lugar geográfico onde há

manifestação de forma concentrada, das diversas realidades sociais, econômicas,

políticas e demográficas de um território, ou ainda, um espaço contínuo ocupado por

um aglomerado humano considerável, denso e permanente, cuja evolução e

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estrutura é determinado pelo meio físico, pelo desenvolvimento tecnológico e pelo

modo de produção do período histórico considerado.

Deste modo, pode-se observar que são variadas as definições para as

cidades, e fixar um conceito não é tarefa fácil, pois se pode tomar como base uma

diversidade de abordagens. Portanto, em resumo, a cidade não pode ser definida

com uma compreensão isolada. (ROCHA, 1999)

Mas considerando o enfoque do presente estudo, juridicamente, este

centro urbano somente assume categoria de cidade quando este território se

transforma num Município, pessoa jurídica de direito público interno, pertencente ao

Estado e à federação.

Assim, a palavra município surge pela primeira vez, por volta do séc. XVI,

cuja origem é do latim muncipium, que por sua vez deriva de municep, o qual quer

dizer “cidadão municipal”, ou seja, aquele que desempenha os ofícios municipais.

(ROCHA, 1999)

4.1.3 A lei e a cidade

As cidades brasileiras tiveram as suas formas de apropriação do espaço e

de construção das novas cidades, inspiradas num paradigma lusitano, que permitia

uma ocupação livre da terra, diferentemente do modelo espanhol, que desde o inicio

delimitaram precisamente as regras de construções de suas cidades.

Nesse sentido, observou-se que os portugueses disciplinavam muito as

questões de ordem judiciária e fiscal em detrimento das questões urbanísticas ou

políticas, já os espanhóis buscaram normatizar o traçado e definir as formas de

administração do cotidiano de suas cidades na América.

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A ocupação do solo urbano no país se deu sob o modelo das sesmarias,

de 1822, combinado com a concessão de terras pela municipalidade a partir do

chamado “rocio da vila”, sistema de datas, semelhante às sesmarias urbanas, lotes,

que eram porções de terras incultas que os reis de Portugal cediam para o cultivo

(ROCHA, 1999).

A partir da independência foi extinto o modelo das sesmarias, que durou

de 1822 a 1850, quando ocorreu a publicação da Lei de Terras, onde ficou

estabelecido que a aquisição legal de terras somente poderia ser feita através da

compra devidamente registrada da terra, implicando no direito de propriedade e a

monetarização da terra, como mercadoria e forma de investimento.

Nesse contexto o Poder Público, começa a sistematizar uma série de

legislações, como o Estado de São Paulo, que criou o Código de Ética e Posturas

Municipais, demarcando o espaço público e privado, e também se inicia uma

intervenção no território da classe trabalhadora, que se deu com a disciplinação dos

cortiços e casas de operários, tendo em vista a política higienista da época.

Deste modo, o Brasil, um país essencialmente rural, em 1930 passa por

um processo de urbanização e a população urbana supera a rural a partir da década

de 60. E isto se deu, por força da atração que as cidades exerciam em virtude da

industrialização, o que acarretou imediatamente o inchaço das cidades e

conseqüentemente a perda da qualidade de vida dos seus habitantes.

Como se observou, o direito de propriedade permeia todo o contexto

histórico de ocupação e regulamentação das cidades, e as constituições brasileiras

sempre garantiram a sua tutela. As Cartas de 1824, 1891, 1934, 1937, sempre

garantiram a proteção absoluta da propriedade. Somente a partir da Constituição de

1946, observou-se o condicionamento ao bem-estar social. Já as Cartas de 1967 e

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1969 estabeleceram pela primeira vez a noção de função social da propriedade. E

finalmente a atual Constituição Federal de 1988, ao reafirmar a função social, trouxe

uma preocupação maior com a gestão urbana e com a garantia da função social das

cidades (ROCHA, 1999).

Através dessa breve análise histórica observa-se que as cidades não

foram pensadas de maneira uniforme, na sua totalidade; isto significa que durante

muito tempo o sistema jurídico regulamentou timidamente a ordenação e o

planejamento urbano. E quando havia tal preocupação atendia-se uma camada de

privilegiados, ou seja, as classes médias e altas da sociedade, deixando-se sempre

de lado as camadas periféricas das cidades.

Atualmente, essa omissão histórica, tem causado uma série de

conseqüências para as cidades, tanto do ponto de vista social quanto ambiental,

advindas dessas desigualdades, o que motivou uma reflexão acerca da importância

de se elaborar uma atuação urbanística global e integrada.

4.1.4 O Direito Urbanístico e o Direito Ambiental

Sobre a emergência dos novos direitos, do direito ambiental, e a

insuficiência do ordenamento jurídico, Antonio Carlos Wolkemer e José Rubens

Morato Leite citado em COUTINHO (2004), assim afirmam:

A crise dos paradigmas de legitimação, as mudanças no modo de vida, a

entrada em cena dos novos sujeitos sociais e a ampliação das propriedades

materiais tendem a favorecer o aparecimento de novas formas “idealizadas” e

“práticas” de juridicidade. A nova juridicidade rompe e transpõe os cânones

clássicos da dogmática jurídica contemporânea, mitificada pelos princípios da

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neutralidade científica, da completude formal, do rigor técnico e da autonomia

absoluta (in: COUTINHO e ROCCO: 2004, 31)

O surgimento de um novo protagonista, denominado “sujeito coletivo”, ou

seja, as coletividades, onde seus membros procuram defender seus interesses e

expressar suas vontades, fez com que houvesse a necessidade de se reformular a

noção de Estado como única fonte de direito.

E assim, surge o novo ramo do direito, o direito ambiental, que na verdade

não significa uma ruptura com a vigente configuração do direito na sociedade

capitalista, mas uma tentativa de compatibilizar este direito com as novas questões

buscando solucioná-las (COUTINHO, 2004). Deste modo, observa-se que o direito

ambiental tem natureza difusa, à medida que pertence a todos de forma

indeterminada.

Observa-se também, que a norma ambiental depende da atuação do

Estado e da sociedade, uma vez que, a Constituição de 1988, no seu art. 225, impõe

à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente com vistas a

garantir o direito das presentes e futuras gerações.

Assim, sinteticamente, pode-se conceituar o direito ambiental como um

microssistema jurídico que visa proteger e defender o meio ambiente. E

considerando que o tema cidade adentra ao ordenamento jurídico repercutindo no

estabelecimento de normas ambientais, por conseguinte, está incluída também no

direito ambiental, como meio ambiente urbano.

Segundo FIORILLO (2001), a divisão do meio ambiente em aspectos que

o compõem facilita a identificação da atividade degradante e do bem agredido, e

considerando que o direito ambiental tem como objetivo maior a tutela da vida

saudável, é necessária uma classificação, cujo objetivo seja identificar quais valores

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foram violados. Desta forma, o referido autor classificou o meio ambiente em quatro

aspectos: meio ambiente natural, artificial, cultural e do trabalho.

Portanto, o meio ambiente urbano é entendido como o espaço urbano

construído, que ainda de acordo com FIORILLO (2001): “consiste no conjunto de

edificações (chamado espaço urbano fechado), e pelos equipamentos públicos

(espaço urbano aberto). ”Deste modo, tem-se que todo o espaço construído,

habitado pelo homem compõem o meio ambiente artificial (FIORILLO, 2001).

Entretanto, ressalte-se que esta divisão é meramente didática, cuja

finalidade é facilitar ao operador, o manejo da matéria, bem como, a utilização dos

instrumentos jurídicos pertinentes ao sistema.

Neste sentido, observa-se que o direito urbanístico tem como objeto direto

a ordenação e planejamento do espaço urbano, ou seja, disciplina a atuação do

Poder Público para a utilização adequada dos espaços, sendo suas normas

estabelecidas em função da propriedade urbana e do adensamento.

Partindo desta análise, vislumbra-se que assim como a questão

ambiental, a atividade urbanística é prerrogativa estatal, ou seja, o Poder Público é

quem deve estabelecer a ordenação do solo urbano de forma que beneficie toda a

coletividade. Isto significa que a titularidade do direito às funções sociais da cidade é

a pólis, caracterizando-se como direito essencialmente difuso, pois o sujeito de

direito é coletivo.

Mas, ainda que seja tarefa do Poder Público a execução das políticas

urbanísticas, é necessário ressaltar que é inegável a importância dos instrumentos

participativos, pois possibilitam aos cidadãos determinar as prioridades como ocorre,

por exemplo, no planejamento do orçamento participativo em determinadas

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administrações municipais brasileiras, atenuando o caráter estritamente estatal das

atividades urbanas.

Portanto, diante de tais considerações, observa-se que o tema cidade

ingressa com repercussão significativa no meio ambiente, e a correlação entre esses

sistemas, ambiental e urbano, evidencia-se no que se refere aos objetos tutelados,

quais sejam, a proteção e defesa da qualidade de vida e do bem estar dos

habitantes.

Com relação à defesa ambiental, a ordenação de espaços habitáveis

concretiza as funções sociais da cidade, que em resumo efetiva todos os objetivos

do art. 225, da Constituição Federal, que é a sadia qualidade de vida.

Decorre daí, a necessidade de que haja uma integração entre as políticas

com vistas a uma gestão ambientalmente adequada e socialmente justa.

4.1.5 O Desenvolvimento Urbano e o Meio Ambiente

A população urbana compunha cerca de 15% de toda a população

mundial no inicio do século, já no final deste, estima-se que 50% da população

mundial estarão nas cidades. Em paises desenvolvidos como os Estados Unidos a

urbanização já atinge 94% da população, sendo o fator responsável a conseqüência

natural do desenvolvimento econômico.

Nos paises em desenvolvimento também existe um acelerado processo

de urbanização, na América Latina e no Caribe, por exemplo, a população urbana

cresce a uma taxa de 3 a 5% ao ano. (FOSTER in: TUCCI, 2002)

Neste contexto, o Brasil também apresentou um elevado crescimento

urbano ao longo das últimas décadas, em especial após a década de 60, onde a

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taxa de urbanização elevou-se para 76%. Ressaltando-se alguns Estados como São

Paulo, onde 91% da população é urbana, equiparando às características dos paises

desenvolvidos, o que tem gerado cidades com infra-estruturas precárias.

Esse forte crescimento tem sido concentrado em certas regiões,

geralmente nas regiões sul e sudeste, em regiões metropolitanas, na capital dos

Estados e em pólos-regionais. E os efeitos desse processo têm se refletido sobre o

meio ambiente, em especial sobre os recursos hídricos: abastecimento de água,

transporte e tratamento de esgoto cloacal e pluvial.

O planejamento urbano embora envolva aspectos interdisciplinares, na

prática isto não ocorre, desenvolvendo-se em âmbito mais restrito, pois o

planejamento da ocupação dos espaços urbanos brasileiros não tem considerado

aspectos fundamentais e que têm acarretado grandes custos sociais e ambientais.

O desenvolvimento urbano tem provocado aumento significativo da

freqüência de inundações, produção de sedimentos e deterioração da qualidade da

água, e assim, à medida que a cidade cresce ocorrem os seguintes impactos de

ordem técnica:

Aumento das vazões máximas, devido à impermeabilização das superfícies;

Aumento da produção de sedimentos, devido à desproteção da superfície e a

produção de resíduos sólidos (lixo);

Deterioração da qualidade da água, ocasionada pela lavagem de ruas,

transporte de materiais sólidos, ligações de esgoto clandestinas.

Pontes e taludes - superfície inclinada do terreno, na base de um morro ou

encosta de vale, onde se encontra um depósito de detritos - de estradas que

obstruem o escoamento, redução da seção de escoamento de aterros,

deposição e obstrução de rios, canais e condutos de lixos e sedimentos;

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projeto de drenagem e obras inadequadas; todos esses fatores têm ocorrido

devido à forma desorganizada como a infra-estrutura urbana é implantada.

(TUCCI, 2002).

Esses impactos têm se intensificado, pois não estão sendo contidos e sim

ampliados, como se tem observado, à medida que se tem acompanhado em

noticiários cenas de enchente com danos materiais e humanos em diferentes

localidades do país.

Ocorre que nestes casos, as ações públicas têm sido pontuais, ou seja,

voltadas para medidas chamadas estruturais, isto é, na construção de canais, que

transferem a enchente de um lugar para outro da bacia, sem que sejam avaliados os

efeitos à jusante e os reais benefícios da obra.

Com esse tipo de medida, os prejuízos públicos são enormes, pois além

de não resolver o problema, os recursos são gastos de maneira equivocada, e isto

ocorre na maioria das cidades em virtude da falta de planejamento, ocupação de

áreas de risco e o gerenciamento inadequado de obras públicas e privadas em

relação ao ambiente.

4.1.5.1 Drenagem Urbana Sustentável

Como se observou anteriormente, a drenagem tem sido um tema bastante

recorrente, tanto sob a ótica da gestão de recursos hídricos quanto do planejamento

das cidades, podendo-se dizer que é um instrumento fundamental no controle de

cheias e também no sentido de indução de práticas de adequação do uso e

ocupação do solo.

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Neste sentido, o sistema de drenagem assume importante papel no

âmbito das políticas ambientais e no desenvolvimento urbano, pois com este

sistema busca-se alternativas sustentáveis que impliquem na minimização dos

impactos sociais, por isso é chamado de sistema de drenagem sustentável.

Este novo sistema busca drenar as águas pluviais através de práticas que

se assemelham ao processo natural, com o intuito de diminuir áreas de

impermeabilização, restringir a construção de grandes e dispendiosos sistemas

hidráulicos e minimizar os impactos ambientais.

Atualmente as técnicas de drenagem utilizadas deparam-se com

obstáculos como a ocupação irregular do solo, falta de técnicos capacitados nos

municípios e insuficiência de recursos para investimento nos projetos. Por isso,

geralmente o sistema de drenagem tem sido desenvolvido paralelamente às

políticas de saneamento, inexistindo um planejamento próprio. Portanto, é neste

contexto que a drenagem urbana sustentável está inserida, pois com esta nova

técnica os impactos são mínimos e em regra tem custo baixo.

Assim, vislumbra-se que o município é também, importante ator na

implementação desta política, pois cabe a este a responsabilidade pelo

planejamento integrado, bem como, a articulação entre os diversos segmentos da

sociedade, inclusive na convocação para a participação ativa da sociedade civil

organizada. (PARKINSON et al; 2003)

Diante desse breve relato, observa-se que o plano de drenagem urbana

sustentável consiste em uma questão estratégica para o município, pois orienta uma

adequada ocupação dos espaços, e ainda promove a qualidade de vida da

população.

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4.1.5.2 Saneamento Básico

Saneamento, geralmente é assunto vital para as políticas de saúde

pública, pois o abastecimento de água potável está atrelado ao fornecimento de

serviços de esgotamento sanitário. Assim, BRUNONI (2002) define o saneamento

básico como:

“conjunto de medidas higiênicas aplicadas especialmente na melhoria das

condições de saúde de uma determinada localidade, para o controle de doenças

transmissíveis ou não, sobretudo pelo fornecimento de rede de água potável e

esgotos sanitários.”

E assim por estar diretamente ligado às condições de higiene e saúde

constitui um direito inalienável do cidadão. A Constituição Federal em seu art. 196

dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, e neste mesmo enfoque a

Lei 8080/90, que disciplina as atribuições do SUS, Sistema Único de Saúde,

estabelece a sua participação na formulação de políticas de execução de ações de

saneamento básico. Por isso BRUNONI (2002) ressalta: “receber água limpa,

própria para o consumo, deveria ser considerado o primeiro e mais elementar direito

ambiental de uma família e de toda a comunidade.”

O sistema de esgoto sanitário é importante também para a preservação

dos recursos naturais, potencial produtivo das pessoas, diminuição dos custos de

tratamento de água e salubridade ambiental.

A salubridade ambiental diz respeito às condições favoráveis para a

promoção da saúde no interior de uma habitação, bem como no ambiente externo. A

saúde publica compreende a ciência e arte de promover, proteger e recuperar a

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saúde através de medidas de alcance coletivo e de motivação popular e o potencial

produtivo das pessoas que são as conseqüências provocadas pela interação entre a

população humana e o ambiente físico, tanto o natural quanto o artificial, e também

o ambiente social.

Os índices de salubridade ambiental e saúde pública, por exemplo,

fornecem a estimativa dos índices de salubridade ambiental, tais como os

indicadores de abastecimento de água, esgoto sanitário, resíduos sólidos, controle

de vetores, riscos de contaminação de recursos hídricos e indicador socioeconômico

(SANTOS, 2004).

Nesse sentido, os investimentos que forem efetuados com saneamento

básico reverterão em economia na área da saúde pública, que aliada à política de

municipalização do SUS, adotada pelo governo federal, intensifica a incumbência do

Poder Público local em reverter as distorções deste setor.

Assim, a Constituição Federal, no seu art. 30, I, conferiu ao município

autonomia de legislar em assunto de seu interesse, e o inciso V do mesmo artigo,

delega ao município a competência de organizar e prestar serviços públicos de

interesse peculiar, dentre os quais destaca-se o saneamento básico, pela afetação

imediata do agrupamento local, permitindo-lhe prestar tal serviço de forma direta ou

indireta. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988)

Assim dispõe a Constituição no seu art. 30, V: “compete aos municípios:

V. organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os

serviços públicos de interesse local, incluindo o de transporte coletivo, que tem

caráter essencial”. Isto significa que, no que se refere a interesse local, os demais

entes políticos não poderão prestá-los direta ou mesmo transferi-los a terceiros sem

anuência do município.

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Desta forma, o serviço de saneamento básico é questão de prioridade

máxima ao município devido à sua relevância social e também porque produz

reflexo em todas as esferas da gestão das águas e urbana, como bem ressalta

SUETÔNIO MOTA: “a cidade que conta com um adequado sistema de esgoto tem

os seus problemas de poluição das águas bastante reduzidos” (in: BRUNONI, 2002).

Portanto, como se pode observar, além de contornos de direito

fundamental, o saneamento básico é questão das mais relevantes para a gestão

urbana e inclusive está sendo objeto de um Projeto de Lei n. 5.296/05, que visa

instituir a Política Nacional de Saneamento Básico, que encontra-se em trâmite na

Casa de Leis.

4.1.5.3 Resíduos sólidos

Outro tema fundamental, na gestão urbana é a gestão dos resíduos

sólidos, porém antes de se adentrar ao tema faz-se necessário uma breve análise

de ordem conceitual.

A denominação de resíduo sólido engloba todas as formas de descartes,

ou seja, as descargas de materiais sólidos provenientes de operações industriais,

comerciais, agrícolas e da comunidade. Em sentido mais singelo, significa qualquer

lixo, refugo, lodo, lamas ou borras resultantes de atividades humanas de origem

doméstica, profissional, agrícola, industrial, nuclear ou de serviço.

Entendida a denominação, pode-se observar que este problema se

agrava constantemente em decorrência do processo intenso de urbanização, que

associado aos problemas econômicos e sociais, afeta as condições de vida e

acarreta a degradação do meio ambiente, trazendo implicações à saúde.

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Assim, é neste contexto que o lixo urbano está inserido, atingindo valores

relacionados com a saúde, habitação, lazer, segurança, direito ao trabalho,

agredindo além do meio ambiente urbano, também o ambiente natural, como solo,

água e ar.

Do ponto de vista jurídico, de acordo com as leis ambientais, o lixo possui

natureza jurídica de poluente, desde o momento em que é produzido, e por isso

deverá ser submetido a um processo de tratamento. Mas admite-se a existência de

resíduos sólidos com níveis aceitáveis de poluição e assim seu tratamento é

determinado de acordo com as normas estabelecidas.

O gerenciamento dos resíduos não se submete a um regime jurídico

único, pois varia de acordo com a localidade onde são gerados e seu conteúdo,

deste modo, conforme os tipos de resíduo têm-se os tipos de tratamento que vão

desde a deposição, aterragem, aterros sanitários, compostagem e

reaproveitamentos em geral (FIORILLO, 2001).

Como se constatou da análise, o lixo urbano constitui um enorme

problema para a gestão das cidades e tende a crescer cada vez mais, em virtude do

aumento populacional e do consumo, e por isso também cabe ao município através

de suas políticas públicas buscar um gerenciamento adequado, pois o tratamento

em geral é feito de acordo com a localidade, e também porque a gestão dos

resíduos deverá estar atrelada às demais políticas ambientais.

4.1.6 Proteção das águas no contexto urbano

Como se observou até o presente momento, a água no meio urbano

possui diversos aspectos, mas prioritariamente está ligada ao abastecimento

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público. Entretanto, vários fatores devem também ser levados em consideração, tais

como o crescimento populacional, a poluição doméstica e industrial, que criam

condições ambientais inadequadas e propiciam a proliferação de doenças de

veiculação hídrica, poluição do ar, sonora, aumento da temperatura, contaminação

da água subterrânea, deterioração de mananciais entre outros (TUCCI, 2002).

Deste modo, como se verificou anteriormente, a água é fator fundamental

na ocupação do solo e na fixação das cidades, pois constitui elemento fundamental

à sobrevivência humana, bem como, ao desenvolvimento das sociedades.

Neste contexto, o país já despertou para a falsa concepção de

abundância da água, embora detenha 8% das reservas de água doce do planeta,

ainda assim, tem sofrido com a degradação e poluição de todas as ordens, em

especial causadas pelas cidades que têm provocado grandes impactos

socioambientais.

Neste contexto, foi criada a Lei 9433/97, conhecida como lei das águas,

onde ficou superada a concepção privatista da água fluvial, emergindo uma nova

política que considera a água como um bem de domínio público, recurso natural

limitado e dotado de valor econômico.

Neste cenário, surge o município como ator principal para a efetivação

dos programas de desenvolvimento local em consonância com os usos múltiplos e

racionais dos recursos hídricos (BRUNONI, 2002). Vale dizer ainda, que é no

município onde tudo acontece e por isso, este depende sobremaneira de seus

mananciais, de forma que, torna-se imprescindível a implementação de ações de

combate a poluição e controle da qualidade da água. Portanto, é fundamental a

participação deste ator na execução e efetivação da nova gestão de recursos

hídricos.

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4.1.7 O direito urbanístico e a construção das cidades sustentáveis

O direito urbanístico é o ramo das ciências jurídicas cujo objetivo direto é

a ordenação e planejamento dos espaços urbanos, isto é, disciplina a atuação do

Poder Público na utilização dos espaços urbanos.

De acordo com a teoria jurídica, assume dupla ascepção, ou seja, pode

ser dividido em direito urbanístico positivo e direito urbanístico cientifico. Segundo

COSTA (2004), o primeiro aspecto refere-se à nova realidade do direito urbanístico

introduzido pela Constituição Federal de 1988, e que deu status constitucional a

esse ramo do direito público, podendo ser conceituado como conjunto de normas

que regem as intervenções materiais nas propriedades imobiliárias, publicas ou

privadas, localizadas em territórios urbanos.

Sob a ascepção de direito urbanístico, enquanto ciência, é definido como

um conjunto de normas jurídicas postas em um dado ordenamento, segundo

condições de tempo e de espaço.

Apesar de ser considerado um ramo das ciências jurídicas, o direito

urbanístico no Brasil possui uma legislação escassa, esparsa e pouco didática, por

isso a dificuldade na extração de princípios norteadores, que até o momento não se

têm mostrado firmemente delineados pela doutrina, pois em geral preocupa-se mais

com a autonomia desta disciplina. Mas para MUKAI (2004), os princípios nascem

com o próprio texto constitucional a partir do momento que permite depreender um

arcabouço principiológico decorrente do estabelecimento da função social da

propriedade.

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JOSÉ AFONSO DA SILVA citado em COSTA (2004), extraiu alguns

princípios a seguir: princípio da função social da propriedade, que se refere à

mitigação do direito de propriedade sob a fundamentação do interesse público;

princípio do urbanismo como exercício da função pública, significa que a ordenação

do meio urbano somente é possível por meio do Poder Público; princípio da afetação

das mais-valias ao custo da urbanização, quer dizer que os benefícios oferecidos

pelo Poder Público no desempenho das ações urbanísticas, podem ser cobrados

dos particulares, como, por exemplo, quando ocorre a valorização dos imóveis em

virtude do processo de urbanização.

E por fim, o princípio da justa distribuição de benefícios e ônus derivados

da atuação urbanística, no qual entende-s que está inserido uma das faces do

princípio da igualdade, ou seja, o Poder Público ao traçar uma política de

desenvolvimento deverá atender as peculiaridades dos variados grupos urbanos do

município, com vistas a atenuar as desigualdades sociais (COSTA, 2004).

MUKAI (2004) ainda destaca o princípio da função ambiental da

propriedade, que segundo este autor, está delineado no art. 170, VI, da Constituição

Federal, o qual elenca “a defesa do meio ambiente” como princípio da Ordem

Econômica e Financeira. E no art. 182, CF, quando ressalta que a política de

desenvolvimento urbano executada pelo Poder Público municipal tem por objetivo

ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade garantindo o bem

estar dos seus habitantes.

Assim, pode-se observar que a disciplina urbanística está em franca

expansão e atualmente reveste-se de importância vital, em face do processo de

urbanização, e tem exercido enorme influência na relação entre os cidadãos, as

cidades, o meio ambiente e suas prioridades.

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Das análises anteriores, observou-se também que o urbanismo não foi

tratado da mesma forma ao longo do tempo, havendo a necessidade de uma

reflexão a esse respeito a fim de que se possa dar um conteúdo atual e equânime a

esse ramo em prol da sociedade. Nesta linha, a moderna concepção de urbanismo

entende que este passa a ser concebido preocupado com valores espirituais e com

a melhoria das condições de vida do homem (MUKAI, 2004).

Assim, verifica-se que o direito urbano é um ramo extremamente

importante para a concretização do bem comum, da melhoria da qualidade de vida,

bem como, na manutenção do equilíbrio ambiental. Entretanto, vale destacar, que é

uma disciplina bastante recente, com princípios ainda em formação, com legislações

esparsa, mas que a partir da Constituição Federal de 1988, inaugura um novo

cenário jurídico.

Neste sentido, a regulamentação que constitui a maior inovação

concretizada nos últimos anos, em termos urbanísticos, é a Lei 10.257/2001 que

veio regulamentar o art. 182 e 183 da CF, e ficou conhecida como Estatuto da

Cidade, que após um difícil e vagaroso processo de tramitação, com duração de

mais de dez anos, veio instrumentalizar os municípios no seu papel constitucional de

executores da política de desenvolvimento urbano e conseqüentemente, iniciar os

primeiros passos na concretização das cidades sustentáveis.

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4.2 Gestão Urbana e o Novo Cenário Jurídico Ambiental

4.2.1 O Município e suas competências na Constituição Federal de 1988

O art. 18 da Constituição Federal (1988) apresenta a organização político-

administrativa do país, assegurando a autonomia dos entes federados nos seguintes

termos: “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil

compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos

autônomos nos termos desta Constituição.”

Em seguida, o art. 23 vem estabelecer a competência comum, dos quais

destacam-se aqui os incisos, III, VI, VII e XI, que tratam dos seguintes bens

respectivamente: a proteção bens de valor histórico e paisagens naturais de valores

notáveis; a proteção do meio ambiente e combate à poluição; preservação de

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florestas, fauna e flora e ainda a fiscalização de concessões de direitos de pesquisa

e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios.

Em seguida a Constituição Federal (1988), dedica capítulo especial – a

partir do art. 29 – para regulamentar a atuação do município, onde destaca-se o art.

30, que traça as competências dos municípios, ressaltando-se os incisos I, V e VIII,

afetos ao presente estudo, que assim dispõem:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local;

(...)

V – organizar, e prestar diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,

os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem

caráter essencial;

(...)

VII – prestar, com cooperação técnica e financeira da União e do Estado,

serviços de atendimento à saúde da população;

VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante

planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

(grifo nosso)

Como se pode observar através dos dispositivos apresentados, é notório

o fortalecimento conferido pela Constituição Federal de 1988 aos municípios,

elevando-os à condição de entes federativos autônomos.

Verifica-se também que a Constituição optou pela descentralização

política, manifestando o principio da subsidiariedade, que representa a regra

fundamental do federalismo, em virtude da divisão de competências conferindo

equilíbrio entre as diversas esferas governamentais (TORRES, 2001. In:

GUIMARÃES, 2004).

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Assim, sobre a competência municipal, GUIMARÃES (2004) sintetiza

brilhantemente:

“Dessa forma, na divisão de competências entre os entes políticos (União,

Estados-Membros e municípios) confere-se prioridade aos menores para a

satisfação dos interesses locais, aos intermediários para a realização dos

interesses regionais e, finalmente, ao central para cumprimento das demandas

que os demais não possam cumprir de forma satisfatória. Portanto, aquele

princípio reclama a atribuição das responsabilidades públicas às autoridades

mais próximas dos cidadãos, por estas estarem assim posicionadas e em

condições de executar, de forma mais eficiente, o interesse público.”

Desta forma, vislumbra-se que sem dúvida o município é o principal ator

na eficácia das políticas públicas de forma geral, pois é o centro de poder mais

próximo ao cidadão, constitui entidade natural, oriunda da imposição da natureza

social do homem, e anterior ao próprio Estado (GUIMARÃES, 2004). E por assim

ser, é naturalmente o nível de governo com maior aptidão para compreender as

necessidades dos cidadãos.

4.2.2 Competência municipal em matéria ambiental

Sobre a atuação municipal em matéria ambiental, a Constituição Federal,

atribui dois tipos de competência ambiental: a competência material ou

administrativa e formal ou legislativa, que juntamente com a competência urbanística

é imprescindível para efetivar uma gestão urbana voltada ao desenvolvimento

sustentável.

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Competência material é o poder-dever atribuído a uma esfera

governamental, que lhe permite fiscalizar e sancionar condutas contrárias a uma

norma. Esta se subdivide em competência exclusiva, na qual a atuação é atribuída a

uma entidade com exclusão das demais; e comum, onde a atuação é feita em

condição de igualdade entre as entidades, ou seja, de forma cooperativa.

Já a competência legislativa refere-se à atividade de legislar sobre

determinadas matérias, que também pode ser subdividida em: competência

exclusiva, onde a atividade de legislar é própria de um ente, com exclusão dos

demais; privativa, é competência legal própria de uma entidade, mas que pode ser

delegada a outra; concorrente, há possibilidade de mais de uma entidade legislar

sobre a mesma matéria, porém prevalece a União na fixação de normas gerais, e

por fim, a competência suplementar, cuja finalidade é formular normas que

desdobrem o conteúdo de outras ou supram omissões (GUIMARÃES, 2004).

Assim, o texto constitucional prevê a competência material exclusiva do

município em alguns artigos, como exemplo, os artigos 30, VIII, 144, § 8° e 182, §

4°, onde são conferidos ao Poder Público municipal poderes para atuar nesta área.

Com relação a esta matéria existe grande discussão acerca do tema entre

juristas, pois BESSA ANTUNES (2003), entende que há diferença entre poder

administrativo e competência. Poder administrativo seria uma atividade executiva

para administrar e fazer cumprir as determinações, enquanto competência seria a

capacidade para tomar decisões políticas, neste caso, para a proteção do meio

ambiente.

Esse entendimento leva a concluir que as normas ambientais federais e

estaduais não poderiam ser impostas pelos órgãos ambientais municipais,

entretanto, com a Política Nacional de Meio Ambiente, através da Lei 6.938/81, a

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competência municipal ambiental no âmbito do SISNAMA – Sistema Nacional de

Meio Ambiente – adquire contornos definidos, que fica claramente demonstrado

quando a referida lei dispõe sobre o poder fiscalizador e controlador dos órgãos

locais sobre as atividades capazes de provocar danos ambientais. Portanto, fica

configurado que o município também possui o poder de polícia ambiental.

Para melhor compreender, poder de polícia, em sentido amplo, é

importante demonstrar que este significa um sistema total de regulamentação

interna, pelo qual o Estado busca não só preservar a ordem pública, senão também

estabelecer para a vida de relações dos cidadãos aquelas regras de boa conduta e

de boa vizinhança que se supõe necessárias para evitar conflitos de direitos e para

garantir a cada um o gozo ininterrupto de seu próprio direito até onde for

razoavelmente compatível com o direito dos demais (COOLEY. In: PACIORNIK,

2002).

Neste sentido, pode-se afirmar que a competência material dos

municípios também vale para as normas federais e estaduais (GUIMARÃES, 2004).

Mas há que se ressaltar ainda o parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal,

o qual estabelece a necessidade de se criar uma lei complementar para

regulamentar a cooperação entre todas as pessoas políticas, conforme destaca

GUIMARÃES (2004):

“... embora tal norma ainda não tenha sido criada, deve-se entender que como a

atuação nas questões relativas ao meio ambiente é de competência das três

esferas de governo, a cooperação entre eles deve ocorrer, independente de tal

norma.”

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E assim, o Ministério do Meio Ambiente tem trabalho nesta linha, pois tem

como prioridade acelerar a construção do pacto federativo nas questões ambientais,

e articular os governos municipais, distritais e estaduais, privilegiando a execução

local das políticas ambientais.

No que se refere à competência legislativa, tem-se por base o art. 30, I,

que traz a expressão “assuntos de interesse local”, que é considerada bastante

vaga, pois tem dado margem a diversas interpretações.

No âmbito dessa discussão, há autores que afirmam que tal expressão

restringe a competência municipal, pois assuntos de seu interesse local, são

também interessa a outros entes, e assim acabam não sendo regulados pelo

município, sob o fundamento de não ser interesse exclusivo.

Mas a grande maioria da doutrina é pacífica no sentido de entender que

interesse local não se caracteriza exclusividade, mas sim predominância, isto

significa que, o município é livre para organizar-se, considerando seus interesses

particulares, isto é, suas normas prevalecem sobre qualquer outra, confirmado pelo

art. 18 da Constituição Federal, que confere ampla autonomia ao município

(FREITAS. In: GUIMARÃES, 2004).

Neste enfoque, com bastante propriedade GUIMARÃES (2004) e

TORRES (2001) fazem a seguinte análise:

“Apesar de todas essas afirmações de imprescindível conhecimento, não há

como deixar de reconhecer que a expressão “interesse local” não garante um

núcleo determinado de competências em favor do ente local, dada a própria

indeterminação daquele conceito. Assim, conforme SILVIA TORRES (2001), ele

demanda que o legislativo ordinário paute pelo principio da subsidiariedade,

deixando de atribuir determinadas tarefas públicas aos Estados e União quando

o município puder eficazmente executá-las.”

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Já na opinião de PASSOS DE FREITAS (2000) sobre as competências

legislativas, as atribuições privativas do município na proteção ambiental não são

expressivas, pois na maioria das vezes a competência é concorrente.

No que se refere à competência suplementar, pode-se dizer que se

pressupõe que seja concorrente, ou seja, o município pode legislar em todas as

matérias de sua competência legislativa comum, incluídos o meio ambiente,

entretanto, cabe ressaltar que apesar de poder legislar não lhe foram conferidas

atribuições, art. 24, caput, VI e VII, da Constituição Federal, por isso, esta

competência está atrelada às normas estaduais e federais, isto é, não pode

contrariá-las, como bem apresenta JULIANA PITTA GUIMARÃES, com a seguinte

colocação:

“Os temas afetos ao Direito Urbanístico, proteção ao meio ambiente, defesa do

patrimônio histórico-cultural, controle da poluição etc. (matérias dispostas no art.

24, I, VI, VII) são de competência concorrente dos Estados e União. O município,

ao dispor sobre essas matérias em razão do seu interesse local, não pode ir

contra o que se estabeleceu em âmbito federal e estadual, mas seu interesse

não fica restrito ao que tais entes estabeleceram.”

Em síntese, é tarefa do município adequar as normas às realidades

locais, e regulamentar outras matérias que não foram objeto de normas federais ou

estaduais.

4.2.3 Competência constitucional urbanística

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Quanto às competências urbanísticas, até a promulgação da Constituição

de 1988, não havia um tratamento constitucional específico, somente com a nova

Carta Magna, foram extraídos diversos princípios de direito urbanístico e de políticas

urbanas, capazes de dar suporte ao desenvolvimento sustentável, com o ser

humano como centro das preocupações.

A repartição de competências em matéria urbanística seguiu a sistemática

traçada pela Constituição, ou seja, a União tem a competência de elaborar e

executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e desenvolvimento

econômico e social, e estabelecendo normas gerais de desenvolvimento urbano,

segundo os artigos. 21, IX, XX e XXI, e art. 24, I da CF.

Entretanto cabe ressaltar, a necessidade de lei federal, para a

regulamentação dos artigos 21, XX, referente a saneamento, que está em trâmite na

Casa de Leis, de transporte e desenvolvimento urbano, e o art. 24, normas de direito

urbanístico.

Aos Estados-membros cabe legislar concorrentemente sobre direito

urbanístico, dispondo acerca do território estadual, e suplementar com relação às

normas gerais estabelecidas pela União, art. 24, I, da CF, e ainda inexistindo lei

federal, estes poderão exercer a competência legislativa plena para atender suas

peculiaridades, art. 24, § 3°, da CF, (ROCHA, 1999).

Com relação ao município, cabe a este estabelecer a política de

desenvolvimento urbano local, com vistas a atender a função social da cidade,

segundo o art. 182, da CF, bem como, promover o adequado ordenamento do

território, mediante planejamento do uso, parcelamento e ocupação do solo, através

do Plano Diretor, art. 30, VIII, CF.

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Neste contexto, em síntese a competência municipal em matéria

urbanística e ambiental é basicamente suplementar às normas gerais – federal e

estadual. Entretanto, cabe ressaltar novamente, que a cidade é o cenário onde

acontecem os processos de construção das condições materiais de vida, daí a

importância e relevância do interesse local na efetivação da política urbana e

ambiental, bem como, na proteção das águas que a seguir será analisada.

4.2.4 Legislações infraconstitucionais referentes ao meio ambiente natural e

urbano

Dentre as normas de proteção ao meio ambiente e meio ambiente urbano

destacam-se em ordem cronológica:

Decreto 24.634/34, Código de Águas;

Decreto – lei n. 25/37 disciplina o patrimônio cultural;

Decreto – lei n. 3.365/41, que regula a desapropriação por utilidade pública;

Lei 4.591/64, dispõe sobre condomínio e edificações;

Lei 4.717/65, regula a Ação Popular;

Lei 4.4771/65 – o Código Florestal;

Lei n. 197/67, disciplina a proteção da fauna;

Lei n. 5.318/67, dispõe sobre a Política Nacional de Saneamento;

Lei n. 5.917/73, aprova plano nacional de viação;

Lei n. 6.189/74, trata das atividades nucleares;

Decreto – lei n. 1.413/75 e Lei n. 6.513/77, que dispõe sobre atividades industriais e

zoneamento industriais;

Lei 6.513/77, dispõe sobre áreas especiais e de interesse turístico;

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Lei n. 6.766/79, dispõe sobre parcelamento do solo urbano;

Lei n. 6.803/80, dispõe sobre zoneamento industrial;

Lei 6.902/81, trata das estações ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental;

Lei 6.938/81, estabelece a Política Nacional de Meio Ambiente;

Lei 7.347/85, disciplina a Ação Civil Pública, para a defesa do meio ambiente e

demais interesses difusos;

Lei 7.661/88, trata do gerenciamento costeiro;

Lei 7.802/89, disciplina atividades relacionadas a agrotóxicos;

Lei 8.080/90, regulamenta a Saúde;

Lei 8.629/93, trata da reforma agrária;

Lei 9.433/97, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos (ROCHA, 1999);

Lei 9.605/98, trata dos crimes ambientais;

Lei 9.795/99, dispõe sobre educação ambiental e;

Lei 10.257/2001, estabelece diretrizes para a política urbana (MEDAUAR, 2002)

Em síntese estas são as legislações ambientais e urbanas que norteiam a

proteção do meio ambiente urbano.

4.2.5 Política nacional de desenvolvimento urbano

O marco inicial da política urbana nacional foi durante o regime militar.

Mas somente em 1973 foram criadas as primeiras diretrizes para uma política

nacional de desenvolvimento urbano, neste período o planejamento urbano obteve

grande prestigio, porém com acentuada ineficácia, pois os planos diretores

formulados não garantiam rumos para um adequado crescimento das cidades.

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A década de 70 foi marcada pelo crescimento de construções que foram

feitas através do BNH, Sistema Nacional de Habitação. Neste período, de 1964 a

1984, foram construídas mais de 4 milhões de moradias e foram implantados os

primeiros sistemas de saneamento, através do PLANASA, Plano Nacional de

Saneamento Básico.

Nas décadas de 80 e 90, o país entra num compasso de baixo

crescimento, em virtude da reestruturação produtiva internacional, nas chamadas

décadas perdidas, que impactou fortemente o financiamento público e privado, e o

BNH, endividado é extinto. E desde então, as políticas não avançaram, mas os

movimentos de reivindicação de uma reforma urbana sempre estiveram presentes,

fortalecendo-se na década de 80, quando estes apresentaram propostas à

Assembléia Constituinte de 1988 para a inclusão de dois capítulos na Constituição

Federal, destinados á política urbana (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004).

Assim, após décadas de discussões sobre a necessidade de utilização de

instrumentos de controle do solo urbano, a Constituição Federal de 1988, inaugura

as primeiras normas com o intuito de tornar as cidades espaços mais democráticos.

Neste contexto, tornou-se necessário uma reforma urbana no país, para

atender aos preceitos constitucionais, assim com este objetivo, foi criado em 2003 o

Ministério das Cidades, cuja função é combater as desigualdades sociais, ampliar o

acesso à moradia, ao saneamento, transporte, consolidar a política nacional de

desenvolvimento urbano e as políticas setoriais tornando as cidades espaços

humanizados e ambientalmente sustentáveis.

Com esta missão, o Ministério viabilizou a criação do pacto para a

construção de um Plano de Desenvolvimento Urbano pautado pela ação

democrática, descentralização e participação popular, visando a integração de

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investimentos e ações. Para tanto, foi criado o Conselho das Cidades com a

participação de 71 representantes dos diversos segmentos da sociedade civil, cujo

intuito é formular as diretrizes para o desenvolvimento do Plano Nacional de

Desenvolvimento Urbano, para fins de efetivar os preceitos constitucionais.

Assim, considerando a realidade urbana vivenciada pela imensa maioria

da população no país, em especial quanto às precárias condições de habitação,

transporte, saneamento, educação e outros, o Plano Nacional de Desenvolvimento

Urbano vem no sentido de estruturar as políticas setoriais existentes, bem como a

integração destas, com vistas a implementar em síntese os seguintes programas:

1. Implementação dos instrumentos fundiários do Estatuto da Cidade, cujo objetivo é

observar a função social da propriedade e da sociedade;

2. Criação de um novo sistema nacional de habitação, através da integração de

políticas e pautados pelos preceitos constitucionais e do Estatuto da Cidade visando

em especial a inclusão social;

3. Promoção da mobilidade urbana sustentável e cidadania no trânsito, através da

criação de políticas públicas de transporte e trânsito, priorizando o modelo centrado

na mobilidade de pessoas sobre o modelo de mobilidade de veículos;

4. Um novo marco legal para o saneamento ambiental, que está sendo discutido

através do Projeto de Lei n° 5.296/05, que visa implantação de uma política nacional

de saneamento ambiental, pautado pelo conceito de salubridade ambiental, como

direito coletivo, cuja obrigatoriedade deverá ser compartilhada entre Estado e

operadores privados, criando uma visão multidisciplinar a fim de evitar ações

isoladas, incluindo nestas diretrizes o manejo das águas pluviais e dos resíduos

sólidos, a fim de consolidar e dinamizar estas políticas;

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5. Capacitar e informar as cidades, proposta cujo sentido é propiciar a capacitação

dos agentes públicos e sociais para as políticas públicas urbanas integradas, a fim

de impulsionar a formação de sujeitos sociais aptos a intervir no debate político, lidar

com as diversidades, com as críticas e a busca pela redução das desigualdades, a

ser feito através de programas de capacitação. (CADERNO M.CIDADES, 2004)

Enfim, estas propostas de estruturação de um plano, são frutos da

participação democrática através das Conferências das Cidades, que têm

acontecido pelo país, e que já estabeleceram os objetivos, diretrizes e princípios

para o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano.

4.2.6 Estatuto da Cidade e a nova ordem jurídico-institucional na gestão

urbana ambiental

No decorrer do processo de consolidação da Constituição Federal de

1988, um movimento multissetorial e de abrangência nacional lutou para incluir no

texto constitucional instrumentos que levassem à instauração da função social da

cidade e da propriedade no processo de construção das cidades.

As tentativas de construção de um marco regulatório federal para a

política urbana remontaram na proposta de uma lei de desenvolvimento urbano

elaborada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, nos anos 70,

resultando no Projeto de Lei n. 775/83.

O projeto em questão coloca como objetivo o desenvolvimento urbano e a

melhoria da qualidade de vida nas cidades, e dentre as diretrizes destacaram-se:

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1. funções clássicas do planejamento urbano, como a ordenação da expansão,

prevenção e correção de distorções do crescimento, contenção da concentração

urbana, controle do uso do solo;

2. ação do Poder Público municipal, que se refere à adequação de investimentos

públicos e da política fiscal e financeira aos objetivos do desenvolvimento urbano;

3. a observância da função social da propriedade;

4. a justa distribuição dos benefícios e ônus do processo de urbanização, tais como

oportunidade de acesso à moradia;

5. estímulo da participação individual e comunitária e iniciativa privada;

6. proteção ao meio ambiente, patrimônio histórico, artístico, arqueológico e

paisagístico.

Mas, com a lentidão dos debates na Câmara levou a diversas

modificações e propostas do Projeto de Lei 775/83. A proposta final elaborada pelos

movimentos sociais baseou-se nos seguintes princípios:

O Estado fica obrigado a assegurar os direitos urbanos a todos os cidadãos;

Submissão da propriedade à sua função social;

Direito à cidade e;

Gestão democrática da cidade.

E assim, foi sendo construída a LDU, Lei de Desenvolvimento Urbano

como ficou conhecida, que traz pela primeira vez a questão social, através da noção

de função social, invocando a ação do Poder Público municipal, a contenção das

especulações imobiliárias e propõe áreas especiais para a regularização fundiária ou

para contenção da ocupação (CARDOSO, 2003).

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E como resposta a essa luta, pela primeira vez na história, a Constituição

incluiu um capítulo específico para a política urbana, prevendo uma série de

instrumentos de garantia, contidos nos artigos 182 e 183, da CF/88.

Entretanto, o texto constitucional necessitava de uma legislação

específica de abrangência nacional para que os instrumentos e princípios fossem de

fato implementados, e por outro lado, para efetivar importantes instrumentos

previstos na Constituição, tais como, a edificação compulsória; IPTU – imposto

predial territorial urbano – progressivo no tempo e a desapropriação com pagamento

mediante títulos da dívida pública, que permaneciam sem aplicação devido a

ausência de uma regulamentação específica.

Deste modo, iniciou-se um período de mais de uma década de

negociações referente ao Projeto de Lei n. 5.788/90, que buscava regulamentar os

dispositivos constitucionais, e que finalmente foi aprovado em 2001, e ficou

conhecido como Estatuto da Cidade.

Hoje a Lei n. 10.257 de 2001 é considerada um dos maiores avanços

legislativos dos últimos anos, e finalmente regulamentou o capítulo da política

urbana da Constituição Federal, que a partir de então, combinada com o texto da

Medida Provisória n. 2.220/01 dão as diretrizes da política urbana nas três esferas –

federal, estadual e municipal.

A edição desta lei veio instrumentar os municípios no seu papel

constitucional de executores da política de desenvolvimento urbano, e também

constitui um primeiro passo para que os brasileiros tenham assegurado seu direito

às cidades sustentáveis, conceito entendido como sendo o direito à terra urbana, à

moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte, aos

serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.

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Em verdade, com o Estatuto da Cidade o legislativo criou um suporte

jurídico para a atuação das municipalidades na gestão urbana, e não a imposição de

modelos fechados, por isso é considerada um marco inicial, além do que todos os

instrumentos contemplados pelo Estatuto, demandarão regulamentação através de

leis municipais especificas (INSTITUTO PÓLIS e CÂMARA DOS DEPUTADOS,

2002).

Da análise do Estatuto da Cidade, observa-se que este insere claramente

a preocupação ambiental no âmbito da política urbana, pois dentre as diretrizes

gerais com vistas a ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da terra e

da cidade, aparece pela primeira vez, o conceito de sustentabilidade, fato este de

grande importância, pois as disposições desta lei se refletirão nas demais políticas

do município.

Entretanto, como o município atenderá a tais obrigatoriedades

ambientais? Certamente será através dos instrumentos jurídico-administrativos

contidos no Estatuto da Cidade, que deverão ser adequados conforme à realidade

local, através do Plano Diretor competente, que a seguir será apresentado.

4.2.6.1 Instrumentos do Estatuto da Cidade em prol do meio ambiente

O Estatuto da Cidade incorporou boa parte dos princípios e

instrumentos discutidos ao longo dos últimos vinte anos. Primeiramente

recuperou a noção de direito urbano, quando trouxe a garantia do direito às

cidades sustentáveis – entendido como direito à terra urbana, à moradia, ao

saneamento, à infra-estrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos, ao

trabalho e ao lazer para as presentes e futuras gerações.

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E em seguida com a proposta de gestão democrática das cidades,

garante a participação da população e associações representativas na

formulação, execução e acompanhamento de planos e programas de

desenvolvimento urbano e demais instrumentos específicos (RIBEIRO e

CARDOSO, 2003)

Deste modo, o Estatuto da Cidade (2001) além de regulamentar os

artigos 182 e 183 da CF, traz instrumentos divididos nos seguintes grupos:

Grupo de instrumentos de indução ao desenvolvimento urbano: que é

constituído pelo parcelamento, edificação ou utilização compulsória; IPTU

progressivo no tempo; desapropriação, com pagamento feito em títulos da

dívida pública; consórcio imobiliário; outorga onerosa do direito de

construir; direito de superfície; transferência do direito de construir;

operações urbanas consorciadas e direito de preempção;

Grupo de instrumentos de financiamento da política urbana: constituído

pela regulação urbanística e financiamento do desenvolvimento urbano e,

critérios de avaliação da contrapartida e resultados econômicos de

operações urbanas;

Grupo de instrumentos de regularização fundiária, que são as zonas

especiais de interesse social, usucapião especial de imóvel urbano,

concessão de uso especial para fins de moradia e concessão de direito

real de uso, e por fim;

Grupo de instrumentos da democratização da gestão urbana, que são

compostos pelos conselhos, audiências públicas, conferências sobre

assuntos de interesse urbano, iniciativa popular, gestão orçamentária

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participativa, gestão participativa metropolitana, voto, plebiscito e

referendo (INSTITUTO PÓLIS e CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2002)

Todos os instrumentos apresentados são de extrema importância para

a consolidação da política de desenvolvimento urbano, e também são relevantes

para o direito ambiental.

4.2.6.2 Estatuto da Cidade e o direito ambiental

A primeira impressão que se tem, é que com o advento do Estatuto da

Cidade os ambientalistas não teriam nenhuma preocupação, pois verifica-se

expressamente no Estatuto vinte referências ao meio ambiente, tais como a

preocupação com o equilíbrio ambiental, necessidade de sustentabilidade

ambiental e a preocupação com os impactos e normas ambientais.

Ocorre que na visão de MATA (2004), este instrumento legal por si,

não cuida da proteção ambiental de forma satisfatória e sistemática, daí a

necessidade de sua conjugação com o arcabouço jurídico de tutela ao meio

ambiente.

Observando a lei, logo no art. 1°, parágrafo único, demonstra boa

intenção quanto à defesa do meio ambiente, pois faz referências ao bem coletivo

e bem-estar dos cidadãos, revelando preocupação como meio ambiente. Outro

ponto a ser destacado é a preocupação com o desenvolvimento sustentável, que

foi introduzido com a noção de cidades sustentáveis.

O art. 2° também traz referências ao meio ambiente das quais

destaca-se: a correção dos efeitos negativos sobre o meio ambiente; ordenação

e controle do uso do solo para evitar poluição e degradação ambiental; proteção,

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preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído; do patrimônio

natural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico; e audiência do Poder

Público e da população com respeito à implantação de atividades impactadoras.

Até o presente momento, não há o que reclamar quanto à proteção do

ambiente. Porém os problemas começam a surgir no tocante à regularização

urbanística e fundiária e a defesa do meio ambiente, em especial no art. 2°, XIV,

pois este dispositivo dispõe de forma frágil acerca da proteção ambiental, como

aponta MATA (2004): “... da interpretação conjugada dos dispositivos do Estatuto

da Cidade resulta claro que o legislador não teve em mente condicionar a

regularização urbana ou fundiária ao estrito cumprimento das normas de padrões

ambientais...”

Outro ponto salientado é com respeito ao enigmático inciso XV, do

mesmo artigo, que preconiza a simplificação da legislação de parcelamento, uso

e ocupação do solo e normas edilícias, com vistas a reduzir os custos e aumento

de lotes e unidades habitacionais. Este dispositivo não pode ser visto como

legitimador da qualidade de vida urbana e ambiental (MATA, 2004).

A outorga onerosa do direito de construir, também deve ser objeto de

preocupação quanto à compatibilização com o direito ambiental, pois poderá ter

uma finalidade meramente arrecadatória. Isto significa que poderá ser utilizada

tanto como indutora de condutas, em prol do planejamento e do meio ambiente,

quanto custosa à sociedade se utilizada apenas como instrumento financiador.

Já o art. 42, I, do estatuto dispõe que o plano diretor deverá conter

a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento,

edificação ou utilização compulsória, considerando a infra-estrutura e

demanda pela utilização, o que acaba por exigir um amplo diagnóstico para

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que sejam delimitadas todas as áreas do município passíveis de

aproveitamento compulsório.

Ocorre que, para MATA (2004), esta definição a ser feita pelo

Plano Diretor parece equivocada, pois caso seja alterada a infra-estrutura de

um bairro, ensejará hipótese de reformar o Plano Diretor, que deveria ser

mais estável. Entretanto, vale dizer que o Plano é baseado em projeções

futuras de adensamento, não sendo totalmente procedente tal afirmativa.

Com essas breves análises observa-se que o Estatuto da Cidade

traz instrumentos bastante inovadores que merecem ser discutidos e

interpretados cuidadosamente para serem bem aplicados, sem que acarretem

custos ambientais e sociais (MATA, 2004), como destaca Túlio Ascarelli,

através de singela frase, citada por MATA: “na atual crise de valores, o

mundo pede aos juristas idéias novas, mais que sutis interpretações”.

Entretanto, somente a prática constatará se o Estatuto da Cidade

conseguirá institucionalizar o planejamento nos municípios com a participação

popular, mas é certo que este propiciará uma ampla aprendizagem coletiva devido

aos inúmeros problemas que serão enfrentados como a violência, o desemprego, a

pobreza e outros que demandam urgência na tomada de decisões do Poder Público

e da sociedade.

4.2.7. Plano Diretor como instrumento da gestão urbana ambiental

A institucionalização de um planejamento urbano nas administrações

municipais brasileiras disseminou-se a partir da década de 70, com a explosão do

processo de urbanização.

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O planejamento urbano era idealizado através de um plano diretor de

desenvolvimento integrado, cujo ponto de partida era a definição de padrões

adequados de organização do espaço físico que se consubstanciava em

investimentos públicos e na legislação de uso e ocupação do solo, a ser

implementada pelo Poder Público municipal.

O instrumento preponderante para a prática do planejamento era o

zoneamento, que significa a divisão do conjunto do território em zonas diferenciadas,

baseado no modelo de cidade ideal, sem parâmetro de uso e ocupação específicos.

Neste período havia a adoção de padrões urbanísticos exigentes e de

difícil compreensão, e alta complexidade dos planos, que eram concebidos sob a

hegemonia de uma visão tecnocrática da legislação urbanística. A cidade era objeto

puramente técnico, sendo que a legislação tinha a função apenas de estabelecer os

padrões satisfatórios da qualidade de seu funcionamento, ignorando-se os demais

conflitos que influenciam no crescimento das cidades.

Após duas décadas de elaboração de planos diretores segundo um

receituário tecnocrático, verificou-se a incapacidade dos planejamentos urbanos em

produzir cidades equilibradas, surgindo assim, os questionamentos acerca desses

parâmetros, impulsionando o surgimento de movimentos sociais urbanos em busca

de uma reforma (INSTITUTO PÓLIS e CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2002).

Nesse contexto, a Constituição Federal de 1988, vem atender esses

anseios, que através do seu art. 182 contemplou o instituto do plano diretor como

instrumento básico da política de desenvolvimento urbano, a ser executada pelo

município, através de lei especial, com objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento

das funções sociais da cidade, como bem apresenta MUKAI (2004):

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“De fato, a ocupação e o desenvolvimento dos espaços habitáveis, sejam eles

no campo ou na cidade, não podem ocorrer de forma meramente acidental, sob

as forças dos interesses privados e da coletividade. Ao contrário, são

necessários profundos estudos acerca da natureza da ocupação, sua finalidade,

avaliação da geografia local, da capacidade de comportar essa utilização sem

danos para o meio ambiente, de forma a permitir boas condições de vida para as

pessoas, permitindo o desenvolvimento econômico-social, harmonizando os

interesses particulares e os da coletividade”.

Sob este aspecto pode-se compreender a necessidade de um

planejamento urbano, que segundo Celso Ferrari deve ser integral e abrangente,

envolvendo diversos aspectos da realidade local. Mas Hely Lopes Meirelles, citado

em MUKAI (2004), é quem melhor conceitua o plano de desenvolvimento urbano

integrado, em três diferentes linhas:

“1) O Plano Diretor ou Plano de Desenvolvimento Integrado, como

modernamente se diz, é o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para

o desenvolvimento global, constante do Município, sob os aspectos físico, social,

econômico e administrativo, desejado pela comunidade local.

2) É o instrumento técnico-legal definido dos objetivos de cada Municipalidade e

por isso mesmo com supremacia sobre os outros, para orientar toda a atividade

da Administração e dos Administrados nas realizações públicas e particulares

que interessem ou afetem a coletividade.

3) Na fixação dos objetivos e na orientação do desenvolvimento do Município é a

lei suprema e geral que estabelece as prioridades nas realizações do governo

local, conduz e ordena o crescimento da cidade, disciplina e controla as

atividades urbanísticas em benefício do bem-estar social.”

Dessa análise, pode-se ressaltar três aspectos jurídicos relevantes, a

saber: primeiramente, o plano diretor é obrigatório para o município, com mais de

vinte mil habitantes conforme o art. 182, § 1° da Constituição, concretizado pelo

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Estatuto da Cidade, nos artigos, 41, 52 e 54. Em segundo, verifica-se que podem

existir planos nacionais, estaduais, regionais e metropolitanos concomitantes.

E finalmente em terceiro, o município é obrigado a observar seu Plano

Diretor, e ocorrendo conflito de diretrizes e normas, ainda assim, prevalecem as

normas de interesse local, sobre os planos nacionais, estaduais ou metropolitanos.

Portanto em síntese, o plano diretor pode ser conceituado como um

complexo de normas legais, contendo diretrizes, objetivos, programas e metas, que

abrangem o desenvolvimento econômico, social, ambiental e o uso e ocupação do

solo, projetados todos para um determinado período de tempo (MUKAI, 2004).

Deste modo, o plano diretor deverá explicitar de forma clara qual o

objetivo da política urbana, partindo de um amplo processo de leitura da realidade

local, envolvendo os mais variados setores da sociedade. E somente a partir dessa

leitura poderá estabelecer o destino e as estratégias.

Como se pode observar, o desenvolvimento de um plano diretor é

bastante complexo, tendo em vista o envolvimento de diversos ramos do

conhecimento. Assim devido à sua abrangência e complexidade, pode ser divido em

três fases: 1. Fase de diagnóstico, coleta e interpretação de dados; 2. Fase de

pesquisa sobre as aspirações e realidade desejada pela comunidade e; 3. Fase de

fixação de diretrizes e objetivos.

Outro ponto a ser mencionado é que, em termos formais o plano diretor

deverá ser instituído por meio de lei, seguindo o processo legislativo pelas vias

normais, porém há que se ressaltar que tal matéria é de iniciativa do Prefeito

(MUKAI, 2004).

Já no que se refere à lei, depois de aprovada há a possibilidade de

inserções, que poderão ser feitas observando o quórum estabelecido na Lei

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Orgânica Municipal, a única restrição é no sentido de que a emenda não poderá

tratar de questões financeiras, pois é vedado o acréscimo de despesas além

daquelas previstas para a execução do plano.

4.2.7.1. Implementação e conteúdo do Plano Diretor

Como já mencionado anteriormente, o plano diretor deverá partir de um

amplo processo de leitura da realidade local, envolvendo a sociedade, para então se

estabelecer o destino para as diferentes regiões do município, baseado em objetivos

estratégicos.

Essas diretrizes serão alcançadas através de um macrozoneamento, ou

seja, a divisão do território em unidades que expressem o destino que o município

pretende para as diferentes áreas da cidade.

O macrozoneamento é uma espécie de referencial espacial para o uso e

ocupação do solo, de acordo com as estratégias de política urbana, onde

inicialmente são definidas as grandes áreas de ocupação, como área rural,

detectando as áreas de produção de alimento, minério, de madeira, e a área urbana,

quais sejam, a área de comércio, indústria, residencial, etc, delimitando-se assim o

perímetro urbano, o qual é objeto das regras da política urbana.

Com a definição dessas áreas, o macrozoneamento também auxiliará na

definição de grandes áreas de interesse de uso, ou seja, as zonas onde se pretende

incentivar ou coibir a ocupação, utilizando-se do principio da compatibilidade, que

significa a capacidade de infra-estrutura instalada, condições físicas, necessidades

de preservação ambiental e as características de uso e ocupação do solo existente.

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Assim, para se realizar um macrozoneamento é imprescindível o

conhecimento da realidade local, que somente será possível através de um sistema

de informações, cuja finalidade será a disponibilização de informações pertinentes à

ocupação de cada área, tais como:

dados geomorfológicos, que indicarão as áreas adequadas para ocupação de

acordo com o solo, índices de declividade, altura do lençol freático;

dados do ecossistema, indicam área de vegetação e fauna de interesse a ser

preservada; dados de atendimento pela infra-estrutura, referente ao sistema

viário, captação e tratamento de esgoto, iluminação, abastecimento de água;

dados relativos às características e padrões de uso e ocupação do solo

existentes e;

dados relativos ao preço da terra (INSTITUTO PÓLIS e CÂMARA DOS

DEPUTADOS, 2002).

Somente com este mapeamento poderão ser estabelecidos instrumentos

a fim de se definir os objetivos da cidade. Portanto, verifica-se que o

macrozoneamento constitui a base para definir o uso e ocupação do solo da cidade,

sendo fundamental que suas definições estejam inteiramente contidas no Plano

Diretor.

Ressalte-se ainda, que o Plano Diretor também deverá ser

complementado de tal forma que esteja de acordo com legislações específicas,

como a Lei de Zoneamento, do Parcelamento do Solo, Código de Edificações, Lei de

Proteção Ambiental e Paisagem Urbana, e outros planos específicos (MUKAI, 2004).

Quanto aos efeitos jurídicos, cabe salientar que não se pode confundir os

planos setoriais com o Plano Diretor, pois aqueles são atos concretos e autônomos

da administração, e mesmo que aprovados por lei, quando o correto seria por

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Decreto, são passiveis de impugnação judicial quando incidirem sobre a propriedade

particular ou interesse individual.

4.3 Interfaces entre a Gestão das Águas e a Gestão Urbana

4.3.1 Aspectos sócioambientais da gestão hídrica

Atualmente estima-se que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo não

disponham de água suficiente para seu consumo, e que em 25 anos, cerca de 5,5

bilhões estarão vivendo em locais de falta d’ água. A ONU estima que faltará água

potável para 40% da população mundial em 2050, enquanto especialistas com uma

visão pragmática antecipam esse prazo para 2025.

Neste contexto é importante lembrar que aproximadamente 97% da água

do planeta é salgada, portanto de dificílimo aproveitamento para o consumo

humano. E que dos 3% da água doce, cerca de 2% estão no estado de gelo nas

calotas polares, e somente os 1% restantes, em sua maior parte estão no subsolo.

Como se pode observar, ínfima é a quantidade de água existente,

cabendo ainda ressaltar, que a água doce aproveitável para o consumo está

distribuída de forma desigual na Terra (VIEGAS, 2005).

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Indissociáveis são água e vida, pois aquele elemento é indispensável à

manutenção do homem, dos animais e vegetais. E para que a vida se mantenha é

necessário que a água esteja em disponibilidade e quantidade suficiente à

satisfação das necessidades básicas dos seres vivos.

Nesta ótica, é necessário ressaltar que o direito à vida está enquadrado

no ordenamento pátrio, como direito fundamental, (art. 5°, caput, CF), ou de primeira

geração, como ensina André Ramos Tavares, citado por VIEGAS (2005):

“É o mais básico de todos os direitos, no sentido de que surge como verdadeiro

pré-requisito da exigência dos demais direitos consagrados constitucionalmente.

É por isto, o direito humano mais sagrado”.

“O conteúdo do direito à vida assume duas vertentes. Traduz-se, em primeiro

lugar, no direito de permanecer existente, e, em segundo lugar, no direito a um

adequado nível de vida”.

Assim, em primeiro lugar, cumpre assegurar a todos o direito de simplesmente

continuar vivo, permanecer existindo até a interrupção da vida por causas

naturais. Isso se faz com a segurança pública, com a proibição da justiça

privada, e com respeito, por parte do Estado, à vida e seus cidadãos.

Em segundo lugar, é preciso assegurar um nível mínimo de vida, compatível

com a dignidade humana. Isso inclui o direito à alimentação adequada, à

moradia (art. 5°, XXIII), ao vestuário, à saúde (art. 196), à educação (art. 205), à

cultura (art. 215) e ao lazer (art. 217).”

Dessa análise, extrai-se que para a continuidade da vida a população não

necessita apenas da disponibilidade de água doce, mas também que a água seja

potável e em quantidade compatíveis com a dignidade da pessoa humana, que

corresponde um dos fundamentos da República Brasileira, art. 1°, III, CF.

Portanto, é neste cenário que a gestão da água está inserida, então,

como enfrentar a chamada “crise da água”?

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Primeiramente é importante destacar que, ao lado da escassez natural e

histórica que é recorrente em determinadas regiões do mundo, existe também

aquela provocada pela ação humana, da qual se destaca a poluição ambiental, que

sem dúvida é um dos principais fatores da crise, visto que, ao longo da história do

desenvolvimento dos povos, especialmente a partir da Revolução Industrial, a

preocupação da humanidade centrou-se basicamente na produção, sem maiores

cuidados para com o meio ambiente.

E este fato é facilmente constatado quando se verifica que a maioria dos

rios que banham cidades importantes tem suas águas consideradas tecnicamente

poluídas, o que decorre da falta de saneamento básico, lançamento de resíduos

industriais entre outros.

Neste mesmo sentido, destaca-se o aquecimento global que repercute

diretamente sobre as fontes de água doce, pois este fenômeno provoca o recuo das

geleiras e o derretimento das calotas polares, e conseqüentemente o aumento do

nível do mar, provocando o desequilíbrio do clima, entre outros.

Outra importante modificação ambiental que repercute na crise da água é

a destruição da camada vegetal em todo o planeta que tem ensejado uma série de

prejuízos à humanidade, como o desequilíbrio ecológico. Ao lado da poluição

ambiental a escassez é provocada também, pelo aumento desordenado da

população mundial, visto que, à medida que a população cresce, aumenta a

demanda e também a poluição dos recursos hídricos, que aliada ao desperdício,

contribui consideravelmente para com a crise da água (VIEGAS, 2005).

Assim, o gerenciamento adequado dos recursos hídricos, em especial nos

centros urbanos, constitui um desafio para o Poder Público e a própria sociedade do

século XXI.

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4.3.2 Entendendo o contexto da regulamentação e gestão das águas

A Lei 9433/97, de 08/01/1997 instituiu a Política Nacional de Recursos

Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, e

regulamentou o art. 21, inciso, XIX, da Constituição Federal que assim dispõe: Art.

21. Compete à União: (...) XIX - instituir o sistema nacional de gerenciamento de

recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de uso.”

A referida lei não é apenas um instrumento de disciplinação das águas,

mas é considerada um arcabouço jurídico inovador, quanto aos rumos da gestão da

água e da sociedade, como demonstra MILARÉ (2001):

“Engana-se quem se contenta em ver na Lei 9433, de 08.01.1997, apenas um

instrumento legal disciplinador do uso das águas sobe o aspecto juridicamente

formal. O estudioso ou o observador atento vislumbrará, de pronto, uma

formulação cabalmente inovadora, quer na Doutrina do Direito, quer nos rumos

da gestão.”(2001, 392)

Em linhas gerais, a Lei Federal traça os fundamentos, objetivos,

diretrizes, instrumentos para a implantação da Política e as Ações do Poder Público,

e ainda cria o Sistema Nacional de Recursos Hídricos.

Neste contexto, em síntese, são objetivos principais da política: assegurar

a disponibilidade das águas e a qualidade adequada às presentes e futuras

gerações; garantir o uso deste recurso de forma racional e, atuar na prevenção e

defesa contra eventos hidrológicos decorrentes do uso inadequado dos recursos

hídricos.

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Ainda segundo a Lei Federal, são fundamentos da Política Nacional de

Recursos Hídricos: I – água como bem de domínio público; II – a água é um

recurso limitado, dotado de valor econômico; III – em situações de escassez

deve-se levar em conta o uso prioritário dos recursos hídricos; IV – na gestão

deve-se levar em conta os usos múltiplos das águas; V – a adoção da bacia

hidrográfica como unidade territorial para a implementação da política de proteção

e, VI – a gestão deve ser participativa e descentralizada (BRASIL, Lei:

9433/1997).

Portanto, a gestão das águas deve levar em conta os usos múltiplos da

água, mas em caso de escassez, prevalecerão os usos prioritários dos recursos

hídricos, que são: o consumo humano e a dessedentação de animais conforme o

art.1°, III. Deste modo, cumpre ao órgão federal ou estadual, responsável pela

outorga, suspender parcial ou totalmente as outorgas que prejudiquem o consumo

essencial da água, evitando assim, privilégios de usos e a exclusividade.

A bacia hidrográfica – no âmbito da política – é considerada instrumento

de planejamento, unidade territorial básica para efetivação da política. E os

integrantes de uma determinada bacia, que podem incluir territórios, Estados ou

países, devem promover a gestão e o aproveitamento dos recursos hídricos de

forma integrada, sem prejuízo das unidades político-geográficas já existentes

(MACHADO, 1998).

Assim, surge a importância dos chamados Comitês de Bacias, que atuam

como uma espécie de parlamento das águas, onde reúnem-se usuários, o Poder

Público e organizações da sociedade civil em geral para a tomada de decisões.

Dentre os instrumentos destacam-se também, os planos de recursos

hídricos – conceituados como planos diretores – que visam fundamentar e orientar a

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implementação da política a longo prazo, e o enquadramento dos corpos de água

em classes, segundo os usos preponderantes, já previstos pela legislação

ambiental, através de Resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente -

CONAMA - que define a classificação de cada corpo de água numa determinada

classe, visando assegurar a qualidade e quantidade de água adequados, através de

instrumentos que irão proporcionar significativas transformações econômicas e

sociais para este novo milênio.

4.3.3 O Papel do município na integração de políticas

Em 2003 foram realizadas as Conferências das Cidades e do Meio

Ambiente, onde foram discutidas e consolidadas ações relativas à implantação da

Política Nacional de Recursos Hídricos, demonstrando que a tomada de consciência

é responsabilidade de todos para que se possa garantir água em quantidade e

qualidade adequadas para atender aos múltiplos usos desse recurso.

Neste sentido, a comunidade mundial, desde o final dos anos 90, vem

construindo processos, que estão expressos nas declarações de conferências,

recomendações e fóruns, tanto no âmbito das Nações Unidas como no Conselho

Mundial da Água e Saneamento, acerca dos problemas decorrentes da falta de água

potável e saneamento.

Nestas declarações e recomendações estão as metas estabelecidas na

Cúpula do Milênio das Nações Unidas, em 2000, e de Joanesburgo, 2002, cuja

finalidade é reduzir pela metade até o ano de 2015 o número de pessoas sem

acesso à água potável e saneamento. Estes são desafios que a comunidade

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mundial precisa enfrentar, embora possam ocorrer sérias divergências no processo

de tomada de decisões.

Esta é uma realidade a ser enfrentada, pois a problemática da escassez é

conseqüência da poluição dos cursos d’ água, por resíduos oriundos da derivação

de muitas décadas sem qualquer controle, e que não atinge apenas alguns países,

mas atinge a todo o planeta.

Nesta ótica, as cidades passam a ser consideradas fonte principal da

poluição, pois são espaços complexos e desordenados pela incapacidade

administrativa, falta de investimento, pela migração do homem do campo – causada

pela devastação ambiental no mundo rural – atividades agropecuárias insustentáveis

e falta de capacitação para compreender seu ambiente natural, submissão aos

ditames tecnocráticos desde a época da revolução industrial, agravada após a

Segunda Guerra Mundial (KLOSKE e FRANCO, 2004).

Conforme dados oficiais do Ministério das Cidades, 60 milhões de

brasileiros não têm coleta de esgoto e cerca de 15 milhões não têm acesso à água

encanada. E ROCCO (1997), na Conferência Rio + 5 em 1997, já alertava para a

responsabilidade governamental em relação à reforma agrária que continua a

aumentar os bolsões de pobreza ao redor das cidades, gerando assim, o aumento

da violência, ocupação de unidades de conservação e recursos naturais, poluição

por esgotos e lixos. Deste modo, observa-se que a pobreza provoca além da

degradação social, mas também ambiental, considerada uma das maiores barreiras

à sustentabilidade.

Porém este quadro de degradação já estava delineado desde a

Conferência de Estocolmo em 1972, que constituiu o marco inicial ao processo de

preocupação com o meio ambiente, sendo a pobreza tema principal que passou a

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integrar a Agenda 21, de 1992, que dez anos mais tarde, em Joanesburgo, foi

colocada em conexão com as metas para água e saneamento. Daí decorre a

importância da integração das políticas hídricas e urbanas.

E como já visto anteriormente, a Lei 9433/97 trouxe uma das maiores

novidades que foi o princípio da bacia hidrográfica como unidade territorial para a

implantação da política de recursos hídricos. Outra importante meta, contida no

artigo 3º da Lei, é o estabelecimento de diretrizes que relacionam a gestão dos

recursos hídricos à gestão do uso do solo, gestão ambiental, diversidade biológica,

aspectos demográficos, econômicos, sociais e culturais das diversas regiões do país

e ainda a necessária integração da gestão das bacias hidrográficas com outros

sistemas como as zonas costeiras.

Mas por outro lado, a Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional

de Meio Ambiente, definiu a água como recurso ambiental, e assim, sob este vértice

o Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA, dispõe sobre questões ligadas

aos recursos hídricos como, por exemplo, sobre o controle de qualidade da água,

que é regulamentada através da Resolução CONAMA 357/2005, e a necessidade de

licenciamento ambiental para os empreendimentos na área de recursos hídricos,

conforme Resolução CONAMA 237/97, sem prejuízo do atendimento das normas

especificas da Política Nacional de Recursos Hídricos.

Entretanto, a articulação do Sistema Nacional de Meio Ambiente com o

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos somente começa a ser

desenvolvida a partir das discussões resultantes da Conferência Nacional do Meio

Ambiente realizada em 2003.

Outro ponto de integração é a Agenda 21 - documento pragmático

desenvolvido na Rio-92 - que em seu capítulo 18, define como objetivo a “proteção

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da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos: aplicação de critérios

integrados no desenvolvimento, manejo e uso dos recursos hídricos” (LEME

FRANCO in: KLOSKE e FRANCO, 2004).

Como já se observou anteriormente, instituiu-se a gestão descentralizada

a partir da bacia hidrográfica, compartilhada entre o Poder Público, os usuários e as

comunidades, e neste sentido, surge o desafio da formação e funcionamento dos

Comitês de Bacia.

Estas dificuldades operacionais da gestão compartilhada aliadas às

questões nacionais – como a imposição do contingenciamento de recursos

financeiros – têm provocado uma verdadeira mobilização por parte do Sistema

Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, em especial no que se refere à

efetivação do instrumento da cobrança pelo uso das águas.

Mas além das dificuldades apresentadas, têm surgido embates e conflitos

entre Poder Público, usuários e sociedade civil, em virtude do desequilíbrio de

representação e pela confusão de atores, visto que por vezes, entes estatais podem

ser considerados usuários – como, por exemplo, as empresas de água e

saneamento; ou então, como integrantes da sociedade civil – como consórcios e

associações intermunicipais.

Decorre deste impasse a necessidade de incorporar à gestão da bacia

hidrográfica, a sua relação com o uso do solo, assentamentos humanos, diversidade

biológica, clima e florestas, na medida em que é a bacia a unidade de planejamento

territorial. E para que tal intuito seja alcançado, assumem papéis importantíssimos

os Comitês de Bacia, que ainda têm sua natureza jurídica pública ou privada

bastante discutida, como demonstram KLOSKE e FRANCO (2004): “Na realidade, é

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um ente que integra um sistema nacional de gestão compartilhada de um bem

público – recursos hídricos – e sujeitos às normas de direito público.”

Como já foi demonstrado, os municípios não têm dominialidade sobre

recursos hídricos, que está restrita à União e Estados-Membros, sendo que a atual

ordem Constitucional prevê apenas a possibilidade do uso comum da água,

enquanto bem público, de modo gratuito ou retribuído nos termos do art. 103 do

Código Civil de 2002, em conformidade com a Política Nacional de Recursos

Hídricos (KLOSKE e FRANCO, 2004).

Sob esta ótica, como o Município poderá desenvolver este papel de

articulador da gestão?

Na verdade, a participação dos municípios dá-se através dos

instrumentos da política de uso do solo, assumindo a posição de usuários dos

recursos hídricos, pois são titulares dos serviços de fornecimento de água potável e

saneamento básico, o que define a sua representatividade no Sistema Nacional de

Gerenciamento de Recursos Hídricos, nos Comitê de Bacias, nos Conselhos

Estaduais e no Conselho Nacional de Recursos Hídricos, na categoria de consórcios

ou associações de municípios como previsto na Lei das Águas e no Dec.

4.613/2003.

4.3.4 O Sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos - SINGREH

O SINGREH, em síntese, tem como objetivo coordenar a gestão integrada

das águas, arbitrar conflitos, implementar a Política de Recursos Hídricos, planejar,

regular e controlar o uso, preservar e recuperar os recursos hídricos, bem como,

promover a cobrança pelo uso das águas. É formado pelo Conselho Nacional de

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Recursos Hídricos, Agência Nacional de Águas, Conselhos de Recursos Hídricos

dos Estados, do Distrito Federal, pelos Comitês de Bacia Hidrográfica, pelos órgãos

dos poderes público federal, estaduais, do Distrito Federal e municipal e pelas

Agências de Água.

A Lei 9433/97 também destaca em seu art. 47, as organizações civis, que

são as associações e consórcios intermunicipais de bacias hidrográficas,

associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos hídricos,

organizações técnicas de ensino e pesquisa com interesse na área de recursos

hídricos, organizações não-governamentais com objetivos de defesa de interesses

difusos e coletivos da sociedade, apesar de serem entidades essencialmente

diversas por seus objetivos, finalidades e composição.

Cabe destacar ainda que, os comitês, consórcios e associações

intermunicipais de bacias hidrográficas assumem natureza de entidades regidas pelo

Direito Civil, apesar de seus objetivos e formação serem de entes públicos.

Quanto à Agência Nacional de Águas, é considerada uma autarquia com

autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente,

responsável pela implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e

outorga de direito de uso, entretanto, não se pode compará-la às agências

reguladoras, como usualmente tem ocorrido, pois esta trata da implementação da

gestão e não da regulação de serviços (KLOSKE e LEME FRANCO, 2004).

Já os Comitês de Bacias Hidrográficas, são instituídos por Decreto

Federal e estão vinculados ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos - CNRH.

Quanto aos Estados, estes estabelecem seus próprios Comitês em rios de seu

domínio. A Resolução do CNRH 05/2000 regulamenta as diretrizes para formação e

funcionamento do comitê no âmbito dos rios de domínio da União.

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Assim a área de atuação de um comitê poder ser a totalidade de uma

bacia hidrográfica, sub-bacia hidrográfica ou grupo de bacias hidrográficas

contíguas; e são compostos de acordo com a dominialidade, isto é, por

representantes da União, Estados e Distrito Federal, e dos Municípios situados no

todo ou em parte na área da bacia, bem como, dos usuários da água, entidades civis

de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.

Quanto aos comitês de rios transfronteiriços e fronteiriços, a gestão é

compartilhada pelos países da bacia, incluindo nestes casos a representação

obrigatória do Ministério das Relações Exteriores.

Ainda conforme a Lei 9433/97, está prevista a criação de Agências de

Bacias, com a função de secretaria do Comitê que atuará na mesma área deste,

entretanto, a sua criação deverá ser autorizada pelo Conselho Nacional de Recursos

Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais segundo a dominialidade das águas.

Desta forma uma Agência de Bacia ou de águas funcionarão em

diferentes situações, sendo uma Agência de Águas poderá atender uma ou mais

bacias hidrográficas, mas, como Agência de Bacia deverá atuar como secretaria

executiva de uma determinada bacia hidrográfica de acordo com o Projeto de Lei

1.116/99. Acerca desta questão existem propostas de alteração do texto, no sentido

que exista somente a denominação de Agências de Bacia, e não mais Agências de

Água.

Ainda nesta linha a recente Medida Provisória - MP 165/2004, dispõe

sobre contrato de gestão e a possibilidade de delegação das funções de Agências

de Bacia para as entidades previstas no art. 51 da Lei das Águas, que incluem

consórcios e associações intermunicipais.

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Na verdade esta é uma solução transitória, enquanto estes organismos

não estão devidamente constituídos. Assim cabe destacar, que as Agências de

Água, conforme a Lei, adotam forma jurídica distinta da Agência Nacional de Águas,

pois são constituídas na forma de associação, nos termos do Direito Civil, enquanto

a segunda é uma autarquia, pessoa de direito público, que integra a administração

federal.

Nesta mesma análise, é importante ressaltar que os consórcios

intermunicipais de bacias hidrográficas não assumem natureza jurídica de consórcio

do direito societário, o qual é desprovido de personalidade jurídica, ao contrário,

neste caso, são entidades dotadas de personalidade jurídica que reúnem diversos

municípios, pessoas jurídicas de direito público, para a realização de ações

conjuntas de interesse dos Municípios associados, que isoladamente não atingiriam

os mesmos resultados ou necessitariam de um maior volume de recursos.

Em geral, os consórcios intermunicipais assumem a forma de associação,

isto é, pessoa de direito privado, significando que, apresentam uma estrutura de

gestão autônoma e orçamento próprio, podendo inclusive, dispor de patrimônio

próprio para a realizar suas atividades. Quanto aos recursos para a manutenção

destas entidades, podem vir de receitas próprias, ou contribuições dos municípios

integrantes.

Deste modo, as Agências de Água ou de Bacia, os consórcios e as

associações intermunicipais são entidades enquadradas como da sociedade civil, e

que evidentemente, não está sendo considerada a natureza de suas atividades e

nem seus objetivos, de modo que, tais temas merecem ainda uma maior reflexão e

aprofundamento.

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De qualquer forma é importante destacar que, sob a ótica dos governos

municipais envolvidos, a criação de consórcios intermunicipais pode produzir

resultados positivos, como o aumento da capacidade de realização, eficiência no

uso dos recursos hídricos, aumento de realizações que antes eram inacessíveis às

Prefeituras de pequeno porte e ainda maior transparência nas decisões.

Ainda nesta questão, torna-se necessário destacar também que a relação

entre o Consórcio de Municípios e o Comitê nem sempre é positiva, pois na prática

têm ocorrido conflitos, como por exemplo, no Comitê para Integração da Bacia do

Rio Paraíba do Sul, que recentemente começou a adequar-se aos parâmetros da Lei

9433/97. Neste caso, para atuar como Agência de Águas foi constituída uma

associação civil sem fins lucrativos, com função equivalente a uma Agência de

Bacias por delegação do CNRH, e nos termos do contrato de gestão previsto na

Medida Provisória 165/2004. Mas de outro lado, existe uma corrente da

administração federal cujo entendimento é que a Agência deve assumir natureza

jurídica de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), e não

organização social (KLOSKE e FRANCO, 2004).

Ocorre que, com o advento da Medida Provisória 165/2004, foi autorizada

a delegação e o contrato de gestão junto aos consórcios e associações

intermunicipais, o que constitui um dos maiores passos em direção a implementação

do gerenciamento das águas, entretanto, a efetiva participação e a gestão

compartilhada dos recursos hídricos ainda encontra-se no discurso, significando que

há um longo caminho a ser percorrido para internalizar esses propósitos, que

constituem o cerne da Lei das Águas.

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5. DISCUSSÕES E RESULTADOS

5.1 Análises e conclusões do estudo

Como se constatou através da revisão bibliográfica, o direito urbano, é um

ramo das ciências jurídicas extremamente importante para a concretização do bem

comum, a melhoria da qualidade de vida, bem como na manutenção do equilíbrio

ambiental.

Entretanto, é também uma disciplina bastante recente, com princípios

ainda em formação, legislação extremamente esparsa e incompleta, mas que a

partir da Constituição Federal de 1988, adentrou um novo cenário jurídico, sendo a

sua regulamentação considerada a maior inovação concretizada nos últimos anos,

em termos urbanísticos, a qual materializou-se com o advento da Lei 10.257/2001,

que regulamentou o art. 182, da Constituição Federal, ficando conhecida como

Estatuto da Cidade.

Observou-se também que a aprovação da referida Lei, se deu após um

difícil e vagaroso processo de tramitação que durou mais de dez anos, mas que

felizmente veio instrumentalizar os municípios no seu papel constitucional de

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principal executor da política de desenvolvimento urbano e conseqüentemente

iniciou a caminhada para a concretização do direito às cidades sustentáveis.

A cidade é o cenário que repercute significativamente no meio ambiente,

sendo que a correlação entre esses sistemas, ambiental e urbano, efetiva-se com os

objetos tutelados, que em resumo são, a proteção e defesa da qualidade de vida e o

bem estar dos habitantes. Assim, a defesa ambiental se dá através da ordenação

dos espaços habitáveis, pautada pelo cumprimento da função social da cidade, que

em síntese, vem efetivar os objetivos o art. 225, da Constituição Federal, cujo intuito

central é assegurar a todos uma sadia qualidade de vida.

Deste modo, para que tal empreitada se dê, é necessário que haja uma

integração entre ambas as políticas, para uma gestão ambientalmente adequada, e

socialmente correta, considerando o município como o local onde os problemas de

fato ocorrem, o que o torna principal ator na eficácia das políticas públicas de forma

geral, considerando que é centro de poder mais próximo do cidadão, portanto,

naturalmente é o nível de governo com maior aptidão para compreender as

necessidades dos cidadãos.

Nesta ótica vislumbra-se que os municípios dependem sobremaneira de

seus mananciais, necessitando de ações de combate à poluição, do controle da

qualidade da água, participação, ou seja, inserir-se efetivamente na nova realidade

da gestão dos recursos hídricos.

Como foi analisado, constatou-se que em síntese a competência

municipal formal ou legislativa em matéria urbanística e ambiental é basicamente

suplementar às normas gerais – federal e estadual – cabendo a este legislar no que

se refere a interesse local, ou seja, é tarefa do município adequar as normas à

realidade local, bem como, regulamentar matéria que não seja objeto de normas

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federais ou estaduais. Quanto à competência material ou administrativa, o município

é responsável em propiciar acesso à água potável e saneamento básico, o que o faz

assumir responsabilidade considerável perante a gestão das águas.

Assim, concluiu-se que o município é o principal responsável pelas

Políticas Públicas, enquanto promotor da intersetorialidade, pois fica devidamente

caracterizada a sua responsabilidade para a efetiva implementação de ações, sendo

fundamental a sua participação no processo de tomada de decisões. Ressaltando

ainda, que deste também depende o sucesso da efetivação das políticas hídricas e

ambientais.

Como foi apresentado ao longo do estudo, as cidades foram objeto de

diversos projetos políticos de desenvolvimento urbano, sendo que alguns

alcançaram certo avanço, outros fracassaram, visto que, esta matéria fica

basicamente refém da vontade política. Somente após a Constituição de 1988 e

posteriormente do Estatuto da Cidade, este tema assume contornos mais definidos.

Atualmente está sendo implementado o Estatuto da Cidade em todo o

país, cujo intuito é efetivar a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano.

Inicialmente está sendo implementado através da obrigatoriedade, para cidades com

mais de vinte mil habitantes, ou mediante incentivos para os pequenos Municípios

apresentarem seus Planos Diretores, ou mesmo adequarem os já existentes

conforme os instrumentos contidos na nova ordem.

Ficou demonstrado também na revisão bibliográfica, que o Estatuto da

Cidade inseriu claramente a preocupação ambiental, pois dentre as suas diretrizes

gerais com vistas a ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da terra e

da cidade, aparece o conceito de sustentabilidade, que deverá ser observada em

todas as ações do Município.

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Já o Plano Diretor fornecerá as diretrizes, objetivos, programas e metas,

para o desenvolvimento econômico, social, ambiental e para o uso e ocupação do

solo, devendo ainda estar de acordo com legislações especificas, como a Lei de

Zoneamento, do Parcelamento do Solo, Lei de Proteção Ambiental e Paisagem

Urbana, e outros.

Neste sentido, observa-se que esta nova ordem tem o intuito de alcançar

as cidades sustentáveis através de medidas sociais e ambientais adequadas.

Enfim, dentro do contexto da gestão urbana que foi apresentado, o maior

questionamento do estudo foi de como o Município poderá atuar na defesa das

águas, ou participar ativamente da gestão?

Considerando que a poluição ambiental, o aumento da população, o

desperdício, a pobreza, entre outros, são fatores que contribuem para a degradação

das águas e conseqüentemente com a escassez, conclui-se que a atual política

urbana, com o intuito de alcançar a sustentabilidade, vem contribuir sobremaneira

para a proteção dos recursos hídricos.

E por isso, o gerenciamento adequado dos recursos hídricos, em especial

nos centros urbanos, é um desafio para o Poder Público e para a sociedade,

entretanto, é necessário destacar que, ainda não fica claro o papel do Município

nesta política, e isto se deve ao fato de que este não têm a dominialidade dos

recursos hídricos, que atualmente é restrita à União e Estados-Membros.

Assim, somente poderemos verificar a participação efetiva dos Municípios

nos instrumentos da política de uso e ocupação do solo ou assumindo a posição de

usuários dos recursos hídricos, tendo em vista, a sua titularidade nos serviços de

fornecimento de água potável e saneamento básico, fatores que definem a sua

representatividade no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos –

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SMGRH – nos Comitês de Bacias, nos Conselhos Estaduais e no Conselho

Nacional de Recursos Hídricos.

Para participação no SNGRH, os Municípios em regra, organizam-se na

categoria de consórcios ou associações como está previsto na Lei 9433/97, pois

esta forma de organização, que reúne diversos municípios, permite a realização de

ações conjuntas afetas a todos os associados que isoladamente não atingiriam os

mesmos resultados ou necessitariam de um grande volume de recursos.

A forma de associação, isto é, pessoa de direito privado, é considerada a

mais eficaz, porque apresenta uma estrutura de gestão autônoma e orçamento

próprio, podendo esta inclusive dispor de patrimônio próprio para realizar suas

atividades, e esses recursos de manutenção podem vir de receitas próprias, ou

contribuições dos Municípios integrantes.

Por isso, como já foi apresentado, as Agências de Água ou de Bacias, os

consórcios e as associações intermunicipais são entidades enquadradas como da

sociedade civil, entretanto, sem considerar a natureza de suas atividades e

objetivos, o que tem provocado uma série de dúvidas, pois não raro contribuem,

para a confusão de representatividade de participação no âmbito da gestão, gerando

a necessidade de maiores reflexões acerca do tema, ou a nosso ver, merece ser

regulamentado pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos.

Mas é importante, observar que diversos são os pontos positivos da

criação de consórcios intermunicipais, pois além do aumento da capacidade de

realização dos municípios, dá-se também a eficiência no uso dos recursos hídricos,

pois haverá aumento nas realizações, antes inacessíveis às Prefeituras de pequeno

porte, bem como, ensejará maior transparência nas decisões. Fatores que

contribuem demasiadamente para incentivar os pequenos, no sentido de reunirem-

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se em associações na busca de uma significativa participação e voz nos Conselhos

e Comitês.

Entretanto, a questão acerca da confusão de representatividade é ainda

um fato bastante polêmico porque as associações intermunicipais sendo

consideradas usuários da água provocam uma diminuição considerável na

representação dos usuários propriamente ditos, tornando o poder de voz destes no

âmbito dos Comitês, extremamente fragilizado, ficando a gestão dita compartilhada

e democrática a cargo basicamente do Poder Público, o que a torna novamente

refém da política, culminando com a tomada de decisões que muitas vezes não

levam em consideração o contexto ambiental, social e da própria justiça hídrica,

como por exemplo, está ocorrendo com a polêmica Transposição do Rio São

Francisco1, que têm gerado diversas e longas discussões em vários setores da

sociedade.

Outro ponto importante acerca das associações intermunicipais, é que

estas, apesar de estar prevista na legislação, não é recomendável que assumam a

categoria de Agência de Bacia, tendo em vista a ineficiência administrativa das

Prefeituras, por isso, o mais adequado é a constituição de Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público no âmbito da bacia para a execução das ações

e projetos da gestão local.

E por derradeiro, com respeito a busca da integração de políticas, ou seja,

a intersetorialidade, é necessário que esteja expressamente contemplado no Plano

Diretor as decisões do Comitê de Bacias, ou do Plano de Bacias que envolvam a

bacia que o Município está inserido, mas caso não seja possível, é importante que 1Transposição do Rio São Francisco é um projeto do governo federal, que visa a transferência das águas do Rio

São Francisco para regiões mais secas, com o intuito de propiciar o desenvolvimento, bem como, acabar com a

seca, entretanto, as ações não tem levado em consideração os custos ambientais, os reais impactos futuros,

(COUBET, 2004), e nem mesmo a decisão do Comitês de Bacia, que posicionou-se contra, foi ouvido.

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haja a possibilidade de serem incorporadas posteriormente, pois é imprescindível

que ambas as políticas estejam em conformidade, para que futuramente não se gere

incompatibilidade de ações.

5.2 Casos judiciais gerados pela incongruência da gestão urbana e gestão das

águas

Como se discorreu ao longo do estudo, ficou amplamente demonstrado a

necessidade da integração entre a gestão das águas e a política urbana, para que

se dê a proteção das águas de forma adequada, e também no sentido de efetivar a

construção de cidades sustentáveis.

Entretanto até o presente momento nunca se falou em integração, ou

trabalho compartilhado, ou mesmo intersetorialidade. Na verdade são expressões

que surgiram ao longo do tempo com a quebra de paradigmas que a problemática

ambiental e das águas tem inserido na sociedade contemporânea. E para que se

possa constatar a real relevância e necessidade dessa integração optou-se por

trazer alguns julgados acerca desta questão, que a seguir serão apresentados.

Então, para que se tenha a noção do inter-relacionamento da gestão

hídrica e urbana, na prática passamos agora a descrever alguns casos práticos que

foram objeto de ações judiciais e hoje fazem parte da jurisprudência nacional, que

foram descritos em COUBET (2004):

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A. POLUIÇÃO INDUSTRIAL E COMPROMETIMENTO DE BACIA HIDROGRÁFICA

EM TIMBÓ - SC

“Poluição hídrica causada por indústria em Timbó (SC):

Este caso foi julgado em 09.12.1998, e trata da poluição de um

riacho em decorrência do lançamento intencional de dejetos químicos e

resíduos tóxicos resultantes das atividades de uma indústria de

transformação de sebo e fábrica de sabão. Houveram irreparáveis danos

ecológicos, prejudicais à flora e à fauna das margens dos rios e aos

recursos hídricos de um modo geral, pois a poluição hídrica (carga tóxica)

não afeta somente o lugar originário; é transportada por um longo

caminho. Também houveram danos patrimoniais e à saúde causados aos

moradores ribeirinhos, morte de animais e comprometimento no

abastecimento de água para consumo próprio e para as lavouras. Este

conjunto de impactos é a verdadeira dimensão do dano ecológico

resultante do lançamento de resíduos químicos na água. Depois de

instaurado o inquérito policial, o Ministério Público da comarca de Timbó

(1ª Vara) ofertou denúncia contra os proprietários. Na instrução do

processo foi realizado laudo pericial pelo Instituto de Pesquisa

Tecnológica da FURB/SC que constatou elevados índices de toxicidade

das águas, resultantes da indústria de transformação de sebo e fábrica de

sabão. Estes índices são muito superiores aos tidos como desejáveis pela

Resolução 20/86 do CONAMA. A sentença condenou os proprietários à

pena de um ano e quatro meses de reclusão, em regimento aberto,

sendo-lhe concedido o sursis pelo prazo de dois anos e pagamento de

treze dias multa, no valo de um salário mínimo vigente à época dos fatos,

por infração ao art. 15, caput, § 1°, II, da Lei 6.938/81, ou seja, poluição

decorrente de atividade industrial que expôs a perigo a incolumidade

humana, animal e vegetal. (..)

Inconformado, o proprietário apelou da sentença de 1° grau para o

Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que, analisando o mérito

da questão, manteve a decisão recorrida por entender que a atividade é

gravosa ao meio ambiente, principalmente aos recursos hídricos. A

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poluição gerada não atinge somente as águas do Rio Benedito, mas

também a todos os seus afluentes, inclusive o rio Itajaí-Açu, considerado

uma das principais fontes de água para consumo humano no Estado,

além de afetar a flora e a fauna e de gerar danos patrimoniais para

vizinhos ribeirinhos.

A decisão do Tribunal fundamentou-se na Constituição Federal

Brasileira de 1988, art. 225, dispositivo que também vem explícito no art.

181 da Carta Estadual Catarinense e na Lei da Política Nacional de Meio

Ambiente (Lei 6.938/81) para aplicação da pena, bem como para trazer os

conceitos de poluição e degradação da qualidade ambiental”. (COUBET,

2004)

B. PARCELAMENTO INADEQUADO EM ÁREA DE MANANCIAL EM XANXERÊ –

SC

“Ameaça de poluição de rio provoca suspensão de construção e

loteamento em Xanxerê (SC)”:

“G. S. A. LTDA interpôs agravo de instrumento contra liminar

proferida nos autos da Ação Civil Pública 080.00.000983-0, intentada pelo

Ministério Público. Houve paralisação do “Loteamento Residencial Park

Bela Vista” situado no bairro São Romero, Xanxerê (SC). As obras para

implantação do loteamento danificaram o meio ambiente, mais

especificamente o Rio Ditinho (classe I), manancial que abastece de água

potável o Município de Xanxerê.

Sustenta a agravante, G. S. A. LTDA, que as preocupações

manifestadas pelo Ministério Público são improcedentes, pois o projeto

atende a todos os trâmites legais exigidos, tais como: incorporação de

gleba rural ao perímetro urbano do município de Xanxerê; consulta ao

INCRA a respeito da criação de um núcleo urbano naquela localidade;

licenças ambientais junto a FATMA (LAP 083/98 E 252/99); escritura de

compra e venda relativa à área do loteamento; aprovação da lei municipal

específica para o loteamento da área sob análise e termo de caução de

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imóveis junto à Prefeitura local. A agravante alega também ter investido

muito, principalmente em dispositivos de controle ambiental: esgoto

sanitário e drenagem pluvial. Assim sendo, entende não ser justa a

paralisação das obras, razão pela qual recorreu. O representante do

Ministério Público afirma que o projeto de loteamento apresenta diversas

irregularidades, algumas das quais são: 1) a aprovação do Projeto de Lei

2.340/97 que estendeu os limites do perímetro urbano até o referido

imóvel, desconsiderando que o mesmo se localiza dentro da bacia do Rio

Ditinho; 2) a concessão de licenciamento ambiental pela FATMA, sem

respeitar o parecer do Engenheiro S. M.; 3) o Engenheiro S. M. alega

ainda que a CASAN também deu parecer contrário à construção do

loteamento; 4) os documentos fornecidos pelo órgão ambiental são

inválidos por estarem em confronto com os mencionados pareceres e por

não ter sido realizado o “Relatório de Estudo de Impacto Ambiental –

Rima”, 5) a ausência de “autorização municipal para a instalação do

loteamento”, embora o agravante argumente ter concessão de todos os

órgãos competentes.

A Procuradoria-Geral de Justiça posicionou-se pela improcedência

do recurso. Não obstante, o órgão recursal entendeu que o recorrente

atendeu a todos os trâmites legais indispensáveis à concretização da

“implantação do loteamento” de acordo com a Lei 6.938/81 em seu art.

10. Na esfera administrativa, obteve licença da Prefeitura local, da FATMA

e do INCRA. Também alega a incompetência da CASAN e relata ainda

que a Licença Ambiental 252/99, dada pela FATMA, ao autorizar a

implantação do loteamento, está vinculada ao cumprimento de algumas

condições (construções de esgotos sanitários, sistemas de tratamento

constituídos de fossas sépticas, filtro anaeróbico, valas de transporte,

destino de resíduos sólidos e sistema de drenagem pluvial). Segundo os

técnicos da FATMA, cumpridos esses requisitos não haverá perigo de

contaminação das águas do Rio Ditinho. O Tribunal de Justiça do Estado

de Santa Catarina, em 26.06.2000 entendeu que não existem razões para

paralisar a obra do loteamento ‘Residencial Park Bela Vista’”(COUBET,

2004).

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Através das decisões jurisprudenciais apresentadas, fica demonstrado

que os tribunais dão amparo a pedidos que objetivam suprimir ou ressarcir danos

ambientais, que se dão tanto na esfera penal quanto na reparação civil.

Como se observou dos casos apresentados, todos se referem à gestão

das cidades com vistas à responsabilidade para com a qualidade das águas, e por

isso verifica-se a importância do Plano Diretor, pois no âmbito desta Lei todos os

fatores de desenvolvimento, no sentido de localização e alocação de recursos

devem estar traçados, e com a devida observância da legislação ambiental e das

águas.

Caso todas as metas já estivessem traçadas e planejadas, já se teria

delimitado as áreas com seus potenciais, seja de estabelecer empreendimentos

comerciais, industriais ou residenciais, que sem dúvida, é de responsabilidade do

Município, pois refere-se ao uso e ocupação do solo, com vistas a orientar, e assim,

problemas como os apresentados pela jurisprudência não mais ocorram no futuro.

Entretanto não se pode delegar toda a responsabilidade à administração

pública local: compete também ao interessado em empreendimento na região

inteirar-se do planejamento local, das legislações, nos licenciamentos, na

observância dos impactos entre outros, mas caso isso não seja observado,

certamente estará configurada a má-fé desse possível empreendedor.

De toda sorte, clara fica a importância de uma adequada gestão urbana

integrada com a gestão hídrica, bem como na defesa do meio ambiente, pois caso

não sejam devidamente organizadas pelos diversos setores envolvidos, daí a

importância da busca pela intersetorialidade, também deverão estar regulamentadas

no Plano Diretor da cidade.

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Porém não se pode olvidar do dever constitucional da sociedade na

preservação ambiental, bem como na proteção das águas, portanto desse

entendimento, cabe também o setor privado atuar na defesa dos recursos hídricos, e

ser responsabilizado por eventuais omissões.

Mas para que caos como os descritos acima não mais ocorram é

realmente imprescindível a integração dos setores envolvidos na questão, pois não

se pode mais relegar ao judiciário a tomada de decisões desta natureza, tendo em

vista que, costuma-se socorrer-se da justiça, não preventivamente, mas quando o

mal já esta feito. Assim, conclui-se que é necessário um planejamento efetivo e

multidisciplinar entre os sistemas, pois somente neste caminho será possível a

construção de verdadeiras cidades sustentáveis.

5.3 Plano Diretor Trasnfronteiriço: um estudo de caso

Em busca de demonstrar a amplitude de fatos envolvidos na gestão

urbana integrada, apresenta-se algumas informações práticas através e um breve

relato acerca do Plano Diretor do Municipal de Ponta Porã, cidade situada no Estado

de Mato Grosso do Sul, e fronteira com o Paraguay, que foram adquiridas mediante

entrevista realizada em 25 de outubro de 2005, com o técnico ambiental Roberto

Winters Steil, integrante da equipe de trabalho.

Este município está elaborando, pela primeira vez, seu Plano Diretor

através de uma equipe técnica local, com orientações de consultores experientes na

área.

Atualmente os trabalhos encontram-se na fase chamada de diagnóstico,

onde estão sendo feitas coletas de informações existentes sobre o município, e

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solicitando aquelas informações inexistentes ou não disponíveis, mediante pesquisa

de campo.

Concomitante a essas coletas de dados, também estão sendo feitas

reuniões populares em diferentes pontos estratégicos da cidade, que foram

escolhidos previamente. As reuniões estão sendo realizadas através de uma

dinâmica de grupo adaptada á realidade local. Com essa metodologia estão sendo

eficazmente detectadas as vulnerabilidades ambientais, bem como, os anseios da

população.

O maior problema com respeito á proteção dos recursos hídricos

constatado é a degradação de seis nascentes existentes no município, onde foram

detectados, comprometimento bactereológico; degradação em função da pressão de

ocupação, que gera a invasão irregular de áreas, o comprometimento da mata ciliar

e poluição de todas as ordens; e também em função do estabelecimento da

exploração de olarias e carvoarias nas regiões de mananciais.

Após o levantamento de todos os dados, será realizado o planejamento, e

as medidas a serem adotadas, para então iniciar propriamente construção da Lei do

Plano Diretor. Até o presente momento tudo esta transcorrendo normalmente,

entretanto há que se destacar que trata-se de uma cidade de fronteira seca, que faz

limite com a cidade de Pedro Juan Caballero no Paraguay, então são duas cidades

em uma.

Isto significa que, o planejamento de um lado reflete no outro ou a má

conduta de um lado reflete no outro, eis a dificuldade do planejamento, que neste

caso não pode ser apenas intersetorial, mas tem a necessidade de se construir um

plano transnacional ou trasnfronteiriço, pois cada cidade tem suas peculiaridades.

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Assim, considerando que no Estado de Mato Grosso do Sul, a Política

Estadual de Recursos Hídricos não está bem definida, cabe ao Município zelar pela

proteção e defesa de suas águas, como está de fato ocorrendo.

Como se pode ver também, há uma diversidade de questões no âmbito

da gestão urbana e hídrica, por isso, o estudo acerca desta temática é bastante

desafiador e ao mesmo tempo, satisfatório pois, com o desenvolvimento destes

trabalhos estamos inserindo a sociedade na discussão e conseqüentemente

contribuindo para a construção de uma nova mentalidade nos habitantes da cidade e

por sua vez, gerando uma sociedade comprometida com a igualdade e justiça.

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6. CONCLUSÃO

Ao longo da história referente à urbanização, observou-se que as cidades

não foram pensadas de maneira uniforme, e que durante muito tempo o sistema

jurídico regulamentou timidamente a ordenação e planejamento urbano, de modo

que, quando se manifestava tal preocupação, atendia-se a uma camada de

privilegiados, ou seja, as classes médias e altas da sociedade, deixando-se sempre

de lado as camadas periféricas das cidades.

Entretanto, esta omissão histórica, causou e vem causando uma série de

conseqüências para as cidades, tanto de ordem social quanto ambiental. Em virtude

dessas desigualdades, surgiu a necessidade de se refletir sobre a importância de se

elaborar uma atuação urbanística global e integrada.

Atualmente, o tema central de preocupação dos ambientalistas são os

problemas das megalópoles, que inclusive recentemente foi tema de discussões,

que reuniu governantes de todo o mundo, e ocorreu em São Francisco, na costa

oeste dos Estados Unidos.

Neste encontro salientou-se que em 1950, apenas uma cidade tinha mais

de 10 milhões de habitantes: Nova Iorque. Em 1975, eram cinco, incluindo São

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Paulo; hoje são pelo menos 19 megalópoles. Esse inchaço das cidades torna a

administração destas mais difícil. A distribuição da infra-estrutura fica precária, a

poluição e os congestionamentos de tráfego atingem níveis caóticos e, em geral, o

combate à violência é ineficiente.

E mesmo apesar de todos esses problemas, cidadãos em todo o mundo

são cada vez mais atraídos para as megalópoles, em busca de oportunidades. A

lista das cidades com mais de 10 milhões de habitantes cresce cada vez mais

rápido, estimando-se que em 2015, serão 23 e, em 2030, perto de 30, segundo

estudos da ONU (Gazeta do Povo, 03/06/2005).

Portanto, é neste contexto que se pode vislumbrar a magnitude que

assume o Direito Urbanístico aliado ao Direito Ambiental, pois ambos objetivam o

bem estar dos cidadãos, entendido como uma sadia qualidade de vida, e justiça

social.

Neste contexto, nossa Carta de 1988, vem ao encontro de todos esses

anseios quanto traz um capítulo especial disciplinando a política urbana no país, e

outro capítulo destinado à proteção do meio ambiente. Com essa nova ordem tais

disciplinas ganham status constitucional, inclusive seus princípios formadores

adquirem contornos de direito fundamental, pois visam de modo geral garantir a

dignidade da pessoa humana.

Outro ponto levantado no estudo, que vem consolidar a nova ordem

urbanística no Brasil, foi a regulamentação do capitulo da política urbana, com a

criação da Lei 10.257/2001, denominada Estatuto da Cidade. Esta lei vem de fato

ser um divisor de águas para a política urbana sob a ótica do direito ambiental, pois

regulamenta diversos instrumentos, importantes para a proteção ambiental, tais

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como o Plano Diretor, IPTU progressivo entre outros, que sem dúvida traz inserido

nos seus objetivos a busca pela sutentabilidade.

Assim, pode-se concluir, da análise dos capítulos que buscaram abordar

de forma genérica a gestão urbana sob a ótica ambiental e da gestão hídrica, é que

a Constituição Federal veio impor à sociedade a necessidade de se repensar o atual

modelo de desenvolvimento e organização, que foi reforçado pelo advento do

Estatuto da cidade, o qual colocou o Município como ator principal na integração das

políticas urbana e hídrica, e principalmente na efetivação destas em conjunto com a

sociedade, que também assume o dever de preservar e a responsabilidade de

participar do processo de planejamento e consolidação das cidades sustentáveis,

bem como, de efetivar a gestão hídrica, com vista à proteção da qualidade de

nossas águas.

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7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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INSTITUTO PÓLIS. Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios

e cidadãos: Lei 10.257. DOU, 10/01/2001, que estabelece as diretrizes gerais da

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BRASIL. Política nacional de desenvolvimento urbano. Caderno M. Cidades.

Disponível em http//www.mcc.gov.br, acesso em 20/04/2005, 24h.

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COUBET, Christian Guy. A água, a Lei, a Política.... E o meio ambiente? Curitiba:

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Passos de (coord.) Águas: aspectos jurídicos e ambientais. 2ª ed. Curitiba: Juruá,

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PARKINSON, Jonathan. Visão internacional do gerenciamento de drenagem urbana

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durante o Curso de Gerenciamento Municipal de Recursos Hídricos. Departamento

de Hidráulica, Curitiba: UFPR, 2004.

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ANEXOS

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ANEXO 01

DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS ACERCA DA GESTÃO DAS ÁGUAS E

GESTÃO AMBIENTAL

CAPÍTULO II

DA POLÍTICA URBANA

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público

municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o

pelnao desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de

seus habitantes.

§ 1° O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para as cidades

com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de

desenvomento e de expansão urbana.

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§ A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende ás exigências

fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

§ 3° As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com previa e justa

indenização em dinheiro.

§4° É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para a área

incluída no plano diretor, exigir nos termos da lei federal, do proprietário do solo

urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado

aproveitamento, sob pena, sucessivamente de:

I – parcelamento ou edificação compulsórios;

II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III – desepropriação com pagamento mediante títulos da divida pública de emissão

previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo para resgate de até dez

anos, em parcelas anuais, igausis e sucessivas, assegurados o valor real da

indenização e os juros legais.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta

metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a

para sua moradia ou de sua família adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja

proprietário de outro imóvel urbano rural.

§1° O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à

mulher, ou ambos, independentemente do estado civil.

§2° Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

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§3° Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

ANEXO 02

LEI No 10.257, DE 10 DE JULHO DE 2001.

Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e

eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DIRETRIZES GERAIS

Art. 1o Na execução da política urbana, de que tratam os arts. 182 e 183 da

Constituição Federal, será aplicado o previsto nesta Lei.

Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da

Cidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso

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da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos

cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.

Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das

funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes

gerais:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra

urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte

e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras

gerações;

II – gestão democrática por meio da participação da população e de

associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação,

execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento

urbano;

III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da

sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;

IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da

população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de

influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus

efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços

públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às

características locais;

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VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;

b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;

c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados

em relação à infra-estrutura urbana;

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como

pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;

e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização

ou não utilização;

f) a deterioração das áreas urbanizadas;

g) a poluição e a degradação ambiental;

VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais,

tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob

sua área de influência;

VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de

expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e

econômica do Município e do território sob sua área de influência;

IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de

urbanização;

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X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e

dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar

os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes

segmentos sociais;

XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a

valorização de imóveis urbanos;

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e

construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;

XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos

processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos

potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto

ou a segurança da população;

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população

de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização,

uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da

população e as normas ambientais;

XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e

das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da

oferta dos lotes e unidades habitacionais;

XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção

de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o

interesse social.

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Art. 3o Compete à União, entre outras atribuições de interesse da política

urbana:

I – legislar sobre normas gerais de direito urbanístico;

II – legislar sobre normas para a cooperação entre a União, os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios em relação à política urbana, tendo em vista o

equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional;

III – promover, por iniciativa própria e em conjunto com os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios, programas de construção de moradias e a melhoria das

condições habitacionais e de saneamento básico;

IV – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,

saneamento básico e transportes urbanos;

V – elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território

e de desenvolvimento econômico e social.

CAPÍTULO II

DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA URBANA

Seção I

Dos instrumentos em geral

Art. 4o Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:

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I – planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social;

II – planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões;

III – planejamento municipal, em especial:

a) plano diretor;

b) disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo;

c) zoneamento ambiental;

d) plano plurianual;

e) diretrizes orçamentárias e orçamento anual;

f) gestão orçamentária participativa;

g) planos, programas e projetos setoriais;

h) planos de desenvolvimento econômico e social;

IV – institutos tributários e financeiros:

a) imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU;

b) contribuição de melhoria;

c) incentivos e benefícios fiscais e financeiros;

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V – institutos jurídicos e políticos:

a) desapropriação;

b) servidão administrativa;

c) limitações administrativas;

d) tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano;

e) instituição de unidades de conservação;

f) instituição de zonas especiais de interesse social;

g) concessão de direito real de uso;

h) concessão de uso especial para fins de moradia;

i) parcelamento, edificação ou utilização compulsórios;

j) usucapião especial de imóvel urbano;

l) direito de superfície;

m) direito de preempção;

n) outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso;

o) transferência do direito de construir;

p) operações urbanas consorciadas;

q) regularização fundiária;

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r) assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais

menos favorecidos;

s) referendo popular e plebiscito;

VI – estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto de

vizinhança (EIV).

§ 1o Os instrumentos mencionados neste artigo regem-se pela legislação que

lhes é própria, observado o disposto nesta Lei.

§ 2o Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social,

desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública com atuação

específica nessa área, a concessão de direito real de uso de imóveis públicos

poderá ser contratada coletivamente.

§ 3o Os instrumentos previstos neste artigo que demandam dispêndio de

recursos por parte do Poder Público municipal devem ser objeto de controle social,

garantida a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade

civil.

Seção II

Do parcelamento, edificação ou utilização compulsórios

Art. 5o Lei municipal específica para área incluída no plano diretor poderá

determinar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano

não edificado, subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as condições e os prazos

para implementação da referida obrigação.

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§ 1o Considera-se subutilizado o imóvel:

I – cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em

legislação dele decorrente;

II – (VETADO)

§ 2o O proprietário será notificado pelo Poder Executivo municipal para o

cumprimento da obrigação, devendo a notificação ser averbada no cartório de

registro de imóveis.

§ 3o A notificação far-se-á:

I – por funcionário do órgão competente do Poder Público municipal, ao

proprietário do imóvel ou, no caso de este ser pessoa jurídica, a quem tenha

poderes de gerência geral ou administração;

II – por edital quando frustrada, por três vezes, a tentativa de notificação na

forma prevista pelo inciso I.

§ 4o Os prazos a que se refere o caput não poderão ser inferiores a:

I - um ano, a partir da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão

municipal competente;

II - dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do

empreendimento.

§ 5o Em empreendimentos de grande porte, em caráter excepcional, a lei

municipal específica a que se refere o caput poderá prever a conclusão em etapas,

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assegurando-se que o projeto aprovado compreenda o empreendimento como um

todo.

Art. 6o A transmissão do imóvel, por ato inter vivos ou causa mortis, posterior à

data da notificação, transfere as obrigações de parcelamento, edificação ou

utilização previstas no art. 5o desta Lei, sem interrupção de quaisquer prazos.

Seção III

Do IPTU progressivo no tempo

Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na

forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no §

5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a

propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a

majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.

§ 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a

que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor

referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.

§ 2o Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em

cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se

cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8o.

§ 3o É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação

progressiva de que trata este artigo.

Seção IV

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Da desapropriação com pagamento em títulos

Art. 8o Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que o

proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o

Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos

da dívida pública.

§ 1o Os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federal e

serão resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais e

sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de seis por

cento ao ano.

§ 2o O valor real da indenização:

I – refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante

incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público na área onde o

mesmo se localiza após a notificação de que trata o § 2o do art. 5o desta Lei;

II – não computará expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros

compensatórios.

§ 3o Os títulos de que trata este artigo não terão poder liberatório para

pagamento de tributos.

§ 4o O Município procederá ao adequado aproveitamento do imóvel no prazo

máximo de cinco anos, contado a partir da sua incorporação ao patrimônio público.

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§ 5o O aproveitamento do imóvel poderá ser efetivado diretamente pelo Poder

Público ou por meio de alienação ou concessão a terceiros, observando-se, nesses

casos, o devido procedimento licitatório.

§ 6o Ficam mantidas para o adquirente de imóvel nos termos do § 5o as

mesmas obrigações de parcelamento, edificação ou utilização previstas no art. 5o

desta Lei.

Seção V

Da usucapião especial de imóvel urbano

Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos

e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição,

utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que

não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos,

independentemente do estado civil.

§ 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo

possuidor mais de uma vez.

§ 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito,

a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura

da sucessão.

Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros

quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco

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anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos

ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente,

desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo,

acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

§ 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz,

mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de

imóveis.

§ 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor,

independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de

acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas.

§ 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de

extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos

condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do

condomínio.

§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão

tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os

demais, discordantes ou ausentes.

Art. 11. Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão

sobrestadas quaisquer outras ações, petitórias ou possessórias, que venham a ser

propostas relativamente ao imóvel usucapiendo.

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Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapião especial

urbana:

I – o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;

II – os possuidores, em estado de composse;

III – como substituto processual, a associação de moradores da comunidade,

regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamente

autorizada pelos representados.

§ 1o Na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção do

Ministério Público.

§ 2o O autor terá os benefícios da justiça e da assistência judiciária gratuita,

inclusive perante o cartório de registro de imóveis.

Art. 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como

matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para registro no

cartório de registro de imóveis.

Art. 14. Na ação judicial de usucapião especial de imóvel urbano, o rito

processual a ser observado é o sumário.

Seção VI

Da concessão de uso especial para fins de moradia

Art. 15. (VETADO)

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Art. 16. (VETADO)

Art. 17. (VETADO)

Art. 18. (VETADO)

Art. 19. (VETADO)

Art. 20. (VETADO)

Seção VII

Do direito de superfície

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície

do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública

registrada no cartório de registro de imóveis.

§ 1o O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o

espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo,

atendida a legislação urbanística.

§ 2o A concessão do direito de superfície poderá ser gratuita ou onerosa.

§ 3o O superficiário responderá integralmente pelos encargos e tributos que

incidirem sobre a propriedade superficiária, arcando, ainda, proporcionalmente à sua

parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre a área objeto da

concessão do direito de superfície, salvo disposição em contrário do contrato

respectivo.

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§ 4o O direito de superfície pode ser transferido a terceiros, obedecidos os

termos do contrato respectivo.

§ 5o Por morte do superficiário, os seus direitos transmitem-se a seus herdeiros.

Art. 22. Em caso de alienação do terreno, ou do direito de superfície, o

superficiário e o proprietário, respectivamente, terão direito de preferência, em

igualdade de condições à oferta de terceiros.

Art. 23. Extingue-se o direito de superfície:

I – pelo advento do termo;

II – pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo

superficiário.

Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário recuperará o pleno domínio

do terreno, bem como das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel,

independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o

contrário no respectivo contrato.

§ 1o Antes do termo final do contrato, extinguir-se-á o direito de superfície se o

superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a qual for concedida.

§ 2o A extinção do direito de superfície será averbada no cartório de registro de

imóveis.

Seção VIII

Do direito de preempção

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Art. 25. O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência

para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares.

§ 1o Lei municipal, baseada no plano diretor, delimitará as áreas em que incidirá

o direito de preempção e fixará prazo de vigência, não superior a cinco anos,

renovável a partir de um ano após o decurso do prazo inicial de vigência.

§ 2o O direito de preempção fica assegurado durante o prazo de vigência fixado

na forma do § 1o, independentemente do número de alienações referentes ao

mesmo imóvel.

Art. 26. O direito de preempção será exercido sempre que o Poder Público

necessitar de áreas para:

I – regularização fundiária;

II – execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;

III – constituição de reserva fundiária;

IV – ordenamento e direcionamento da expansão urbana;

V – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

VI – criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;

VII – criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de

interesse ambiental;

VIII – proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico;

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IX – (VETADO)

Parágrafo único. A lei municipal prevista no § 1o do art. 25 desta Lei deverá

enquadrar cada área em que incidirá o direito de preempção em uma ou mais das

finalidades enumeradas por este artigo.

Art. 27. O proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, para

que o Município, no prazo máximo de trinta dias, manifeste por escrito seu interesse

em comprá-lo.

§ 1o À notificação mencionada no caput será anexada proposta de compra

assinada por terceiro interessado na aquisição do imóvel, da qual constarão preço,

condições de pagamento e prazo de validade.

§ 2o O Município fará publicar, em órgão oficial e em pelo menos um jornal local

ou regional de grande circulação, edital de aviso da notificação recebida nos termos

do caput e da intenção de aquisição do imóvel nas condições da proposta

apresentada.

§ 3o Transcorrido o prazo mencionado no caput sem manifestação, fica o

proprietário autorizado a realizar a alienação para terceiros, nas condições da

proposta apresentada.

§ 4o Concretizada a venda a terceiro, o proprietário fica obrigado a apresentar

ao Município, no prazo de trinta dias, cópia do instrumento público de alienação do

imóvel.

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§ 5o A alienação processada em condições diversas da proposta apresentada é

nula de pleno direito.

§ 6o Ocorrida a hipótese prevista no § 5o o Município poderá adquirir o imóvel

pelo valor da base de cálculo do IPTU ou pelo valor indicado na proposta

apresentada, se este for inferior àquele.

Seção IX

Da outorga onerosa do direito de construir

Art. 28. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construir

poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado,

mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.

§ 1o Para os efeitos desta Lei, coeficiente de aproveitamento é a relação entre a

área edificável e a área do terreno.

§ 2o O plano diretor poderá fixar coeficiente de aproveitamento básico único

para toda a zona urbana ou diferenciado para áreas específicas dentro da zona

urbana.

§ 3o O plano diretor definirá os limites máximos a serem atingidos pelos

coeficientes de aproveitamento, considerando a proporcionalidade entre a infra-

estrutura existente e o aumento de densidade esperado em cada área.

Art. 29. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais poderá ser permitida

alteração de uso do solo, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.

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Art. 30. Lei municipal específica estabelecerá as condições a serem

observadas para a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso,

determinando:

I – a fórmula de cálculo para a cobrança;

II – os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga;

III – a contrapartida do beneficiário.

Art. 31. Os recursos auferidos com a adoção da outorga onerosa do direito de

construir e de alteração de uso serão aplicados com as finalidades previstas nos

incisos I a IX do art. 26 desta Lei.

Seção X

Das operações urbanas consorciadas

Art. 32. Lei municipal específica, baseada no plano diretor, poderá delimitar

área para aplicação de operações consorciadas.

§ 1o Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e

medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos

proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o

objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias

sociais e a valorização ambiental.

§ 2o Poderão ser previstas nas operações urbanas consorciadas, entre outras

medidas:

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I – a modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupação

do solo e subsolo, bem como alterações das normas edilícias, considerado o

impacto ambiental delas decorrente;

II – a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em

desacordo com a legislação vigente.

Art. 33. Da lei específica que aprovar a operação urbana consorciada constará

o plano de operação urbana consorciada, contendo, no mínimo:

I – definição da área a ser atingida;

II – programa básico de ocupação da área;

III – programa de atendimento econômico e social para a população

diretamente afetada pela operação;

IV – finalidades da operação;

V – estudo prévio de impacto de vizinhança;

VI – contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e

investidores privados em função da utilização dos benefícios previstos nos incisos I

e II do § 2o do art. 32 desta Lei;

VII – forma de controle da operação, obrigatoriamente compartilhado com

representação da sociedade civil.

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§ 1o Os recursos obtidos pelo Poder Público municipal na forma do inciso VI

deste artigo serão aplicados exclusivamente na própria operação urbana

consorciada.

§ 2o A partir da aprovação da lei específica de que trata o caput, são nulas as

licenças e autorizações a cargo do Poder Público municipal expedidas em

desacordo com o plano de operação urbana consorciada.

Art. 34. A lei específica que aprovar a operação urbana consorciada poderá

prever a emissão pelo Município de quantidade determinada de certificados de

potencial adicional de construção, que serão alienados em leilão ou utilizados

diretamente no pagamento das obras necessárias à própria operação.

§ 1o Os certificados de potencial adicional de construção serão livremente

negociados, mas conversíveis em direito de construir unicamente na área objeto da

operação.

§ 2o Apresentado pedido de licença para construir, o certificado de potencial

adicional será utilizado no pagamento da área de construção que supere os padrões

estabelecidos pela legislação de uso e ocupação do solo, até o limite fixado pela lei

específica que aprovar a operação urbana consorciada.

Seção XI

Da transferência do direito de construir

Art. 35. Lei municipal, baseada no plano diretor, poderá autorizar o proprietário

de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, ou alienar, mediante

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escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação

urbanística dele decorrente, quando o referido imóvel for considerado necessário

para fins de:

I – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;

II – preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico,

ambiental, paisagístico, social ou cultural;

III – servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas

ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.

§ 1o A mesma faculdade poderá ser concedida ao proprietário que doar ao

Poder Público seu imóvel, ou parte dele, para os fins previstos nos incisos I a III do

caput.

§ 2o A lei municipal referida no caput estabelecerá as condições relativas à

aplicação da transferência do direito de construir.

Seção XII

Do estudo de impacto de vizinhança

Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou

públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de

impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção,

ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.

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Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e

negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população

residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das

seguintes questões:

I – adensamento populacional;

II – equipamentos urbanos e comunitários;

III – uso e ocupação do solo;

IV – valorização imobiliária;

V – geração de tráfego e demanda por transporte público;

VI – ventilação e iluminação;

VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.

Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que

ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal,

por qualquer interessado.

Art. 38. A elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação de

estudo prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação

ambiental.

CAPÍTULO III

DO PLANO DIRETOR

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Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor,

assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de

vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas

as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.

Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da

política de desenvolvimento e expansão urbana.

§ 1o O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal,

devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual

incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.

§ 2o O plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo.

§ 3o A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez

anos.

§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua

implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:

I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da

população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;

II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;

III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações

produzidos.

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§ 5o (VETADO)

Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:

I – com mais de vinte mil habitantes;

II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;

III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos

no § 4 o do art. 182 da Constituição Federal;

IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;

V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com

significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.

§ 1o No caso da realização de empreendimentos ou atividades enquadrados no

inciso V do caput, os recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano

diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas.

§ 2o No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá ser

elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano diretor

ou nele inserido.

Art. 42. O plano diretor deverá conter no mínimo:

I – a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento,

edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e

de demanda para utilização, na forma do art. 5o desta Lei;

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II – disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 e 35 desta Lei;

III – sistema de acompanhamento e controle.

CAPÍTULO IV

DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE

Art. 43. Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados,

entre outros, os seguintes instrumentos:

I – órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual e

municipal;

II – debates, audiências e consultas públicas;

III – conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional,

estadual e municipal;

IV – iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de

desenvolvimento urbano;

V – (VETADO)

Art. 44. No âmbito municipal, a gestão orçamentária participativa de que trata a

alínea f do inciso III do art. 4o desta Lei incluirá a realização de debates, audiências e

consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes

orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação

pela Câmara Municipal.

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Art. 45. Os organismos gestores das regiões metropolitanas e aglomerações

urbanas incluirão obrigatória e significativa participação da população e de

associações representativas dos vários segmentos da comunidade, de modo a

garantir o controle direto de suas atividades e o pleno exercício da cidadania.

CAPÍTULO V

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 46. O Poder Público municipal poderá facultar ao proprietário de área

atingida pela obrigação de que trata o caput do art. 5o desta Lei, a requerimento

deste, o estabelecimento de consórcio imobiliário como forma de viabilização

financeira do aproveitamento do imóvel.

§ 1o Considera-se consórcio imobiliário a forma de viabilização de planos de

urbanização ou edificação por meio da qual o proprietário transfere ao Poder Público

municipal seu imóvel e, após a realização das obras, recebe, como pagamento,

unidades imobiliárias devidamente urbanizadas ou edificadas.

§ 2o O valor das unidades imobiliárias a serem entregues ao proprietário será

correspondente ao valor do imóvel antes da execução das obras, observado o

disposto no § 2o do art. 8o desta Lei.

Art. 47. Os tributos sobre imóveis urbanos, assim como as tarifas relativas a

serviços públicos urbanos, serão diferenciados em função do interesse social.

Art. 48. Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social,

desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública com atuação

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específica nessa área, os contratos de concessão de direito real de uso de imóveis

públicos:

I – terão, para todos os fins de direito, caráter de escritura pública, não se

aplicando o disposto no inciso II do art. 134 do Código Civil;

II – constituirão título de aceitação obrigatória em garantia de contratos de

financiamentos habitacionais.

Art. 49. Os Estados e Municípios terão o prazo de noventa dias, a partir da

entrada em vigor desta Lei, para fixar prazos, por lei, para a expedição de diretrizes

de empreendimentos urbanísticos, aprovação de projetos de parcelamento e de

edificação, realização de vistorias e expedição de termo de verificação e conclusão

de obras.

Parágrafo único. Não sendo cumprida a determinação do caput, fica

estabelecido o prazo de sessenta dias para a realização de cada um dos referidos

atos administrativos, que valerá até que os Estados e Municípios disponham em lei

de forma diversa.

Art. 50. Os Municípios que estejam enquadrados na obrigação prevista nos

incisos I e II do art. 41 desta Lei que não tenham plano diretor aprovado na data de

entrada em vigor desta Lei, deverão aprová-lo no prazo de cinco anos.

Art. 51. Para os efeitos desta Lei, aplicam-se ao Distrito Federal e ao

Governador do Distrito Federal as disposições relativas, respectivamente, a

Município e a Prefeito.

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Art. 52. Sem prejuízo da punição de outros agentes públicos envolvidos e da

aplicação de outras sanções cabíveis, o Prefeito incorre em improbidade

administrativa, nos termos da Lei n o 8.429, de 2 de junho de 1992, quando:

I – (VETADO)

II – deixar de proceder, no prazo de cinco anos, o adequado aproveitamento do

imóvel incorporado ao patrimônio público, conforme o disposto no § 4o do art. 8o

desta Lei;

III – utilizar áreas obtidas por meio do direito de preempção em desacordo com

o disposto no art. 26 desta Lei;

IV – aplicar os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito de construir

e de alteração de uso em desacordo com o previsto no art. 31 desta Lei;

V – aplicar os recursos auferidos com operações consorciadas em desacordo

com o previsto no § 1o do art. 33 desta Lei;

VI – impedir ou deixar de garantir os requisitos contidos nos incisos I a III do §

4o do art. 40 desta Lei;

VII – deixar de tomar as providências necessárias para garantir a observância

do disposto no § 3o do art. 40 e no art. 50 desta Lei;

VIII – adquirir imóvel objeto de direito de preempção, nos termos dos arts. 25 a

27 desta Lei, pelo valor da proposta apresentada, se este for, comprovadamente,

superior ao de mercado.

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Art. 53. O art. 1o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, passa a vigorar

acrescido de novo inciso III, renumerando o atual inciso III e os subseqüentes: .(Vide

Medida Provisória nº 2.180-35, de 24.8.2001)

"Art. 1o .......................................................

...................................................................

III – à ordem urbanística;

.........................................................." (NR)

Art. 54. O art. 4o da Lei no 7.347, de 1985, passa a vigorar com a seguinte

redação:

"Art. 4 o Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins desta Lei, objetivando,

inclusive, evitar o dano ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística ou

aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico

(VETADO)." (NR)

Art. 55. O art. 167, inciso I, item 28, da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de

1973, alterado pela Lei no 6.216, de 30 de junho de 1975, passa a vigorar com a

seguinte redação:

"Art. 167. ...................................................

I - ..............................................................

..................................................................

120

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28) das sentenças declaratórias de usucapião, independente da regularidade do

parcelamento do solo ou da edificação;

........................................................." (NR)

Art. 56. O art. 167, inciso I, da Lei no 6.015, de 1973, passa a vigorar acrescido

dos seguintes itens 37, 38 e 39:

"Art. 167. ....................................................

I – ..............................................................

37) dos termos administrativos ou das sentenças declaratórias da concessão de uso

especial para fins de moradia, independente da regularidade do parcelamento do

solo ou da edificação;

38) (VETADO)

39) da constituição do direito de superfície de imóvel urbano;" (NR)

Art. 57. O art. 167, inciso II, da Lei no 6.015, de 1973, passa a vigorar acrescido

dos seguintes itens 18, 19 e 20:

"Art. 167. ....................................................

II – ..............................................................

18) da notificação para parcelamento, edificação ou utilização compulsórios de

imóvel urbano;

19) da extinção da concessão de uso especial para fins de moradia;

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20) da extinção do direito de superfície do imóvel urbano." (NR)

Art. 58. Esta Lei entra em vigor após decorridos noventa dias de sua

publicação.

Brasília, 10 de julho de 2001; 180o da Independência e 113o da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

122

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ANEXO 03

DA POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS

CAPÍTULO I

DOS FUNDAMENTOS

Art. 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes

fundamentos:

I - a água é um bem de domínio público;

II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;

III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo

humano e a dessedentação de animais;

IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das

águas;

V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política

Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de

Recursos Hídricos;

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VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a

participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

CAPÍTULO II

DOS OBJETIVOS

Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos:

I - assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em

padrões de qualidade adequados aos respectivos usos;

II - a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte

aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável;

III - a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou

decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais.

(...)

SEÇÃO I

DOS PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS

Art. 6º Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a

fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos

e o gerenciamento dos recursos hídricos.

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Art. 7º Os Planos de Recursos Hídricos são planos de longo prazo, com horizonte de

planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e

projetos e terão o seguinte conteúdo mínimo:

I - diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos;

II - análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades

produtivas e de modificações dos padrões de ocupação do solo;

III - balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em

quantidade e qualidade, com identificação de conflitos potenciais;

IV - metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da

qualidade dos recursos hídricos disponíveis;

V - medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem

implantados, para o atendimento das metas previstas;

VI - (VETADO)

VII - (VETADO)

VIII - prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos;

IX - diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos;

X - propostas para a criação de áreas sujeitas a restrição de uso, com vistas à

proteção dos recursos hídricos.

125

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Art. 8º Os Planos de Recursos Hídricos serão elaborados por bacia hidrográfica, por

Estado e para o País.

(...)

TÍTULO II

DO SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS

CAPÍTULO I

DOS OBJETIVOS E DA COMPOSIÇÃO

Art. 32. Fica criado o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,

com os seguintes objetivos:

I - coordenar a gestão integrada das águas;

II - arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos;

III - implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos;

IV - planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos recursos

hídricos;

V - promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos.

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Art. 33. Integram o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos:"

(Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

"I – o Conselho Nacional de Recursos Hídricos;" (Redação dada pela Lei 9.984, de

17.7.2000)

"I-A. – a Agência Nacional de Águas;" (AC) (Incluído pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

"II – os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal;"

(Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

"III – os Comitês de Bacia Hidrográfica;" (Redação dada pela Lei 9.984, de

17.7.2000)

"IV – os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e

municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos;"

(NR) (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

"V – as Agências de Água." (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

CAPÍTULO II

DO CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS

Art. 34. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é composto por:

I - representantes dos Ministérios e Secretarias da Presidência da República com

atuação no gerenciamento ou no uso de recursos hídricos;

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II - representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos;

III - representantes dos usuários dos recursos hídricos;

IV - representantes das organizações civis de recursos hídricos.

Parágrafo único. O número de representantes do Poder Executivo Federal não

poderá exceder à metade mais um do total dos membros do Conselho Nacional de

Recursos Hídricos.

Art. 35. Compete ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos:

I - promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os

planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores usuários;

II - arbitrar, em última instância administrativa, os conflitos existentes entre

Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos;

III - deliberar sobre os projetos de aproveitamento de recursos hídricos cujas

repercussões extrapolem o âmbito dos Estados em que serão implantados;

IV - deliberar sobre as questões que lhe tenham sido encaminhadas pelos

Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos ou pelos Comitês de Bacia Hidrográfica;

V - analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos hídricos e à

Política Nacional de Recursos Hídricos;

VI - estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política Nacional

de Recursos Hídricos, aplicação de seus instrumentos e atuação do Sistema

Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

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VII - aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica e

estabelecer critérios gerais para a elaboração de seus regimentos;

VIII - (VETADO)

IX – acompanhar a execução e aprovar o Plano Nacional de Recursos Hídricos e

determinar as providências necessárias ao cumprimento de suas metas; " (NR)

(Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

X - estabelecer critérios gerais para a outorga de direitos de uso de recursos hídricos

e para a cobrança por seu uso.

Art. 36. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos será gerido por:

I - um Presidente, que será o Ministro titular do Ministério do Meio Ambiente, dos

Recursos Hídricos e da Amazônia Legal;

II - um Secretário Executivo, que será o titular do órgão integrante da estrutura do

Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal,

responsável pela gestão dos recursos hídricos.

CAPÍTULO III

DOS COMITÊS DE BACIA HIDROGRÁFICA

Art. 37. Os Comitês de Bacia Hidrográfica terão como área de atuação:

I - a totalidade de uma bacia hidrográfica;

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II - sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da bacia, ou de

tributário desse tributário; ou

III - grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas.

Parágrafo único. A instituição de Comitês de Bacia Hidrográfica em rios de domínio

da União será efetivada por ato do Presidente da República.

Art. 38. Compete aos Comitês de Bacia Hidrográfica, no âmbito de sua área de

atuação:

I - promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a

atuação das entidades intervenientes;

II - arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos

recursos hídricos;

III - aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia;

IV - acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e sugerir as

providências necessárias ao cumprimento de suas metas;

V - propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos

as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para

efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direitos de uso de recursos

hídricos, de acordo com os domínios destes;

VI - estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir

os valores a serem cobrados;

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VII - (VETADO)

VIII - (VETADO)

IX - estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de

interesse comum ou coletivo.

Parágrafo único. Das decisões dos Comitês de Bacia Hidrográfica caberá recurso ao

Conselho Nacional ou aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo

com sua esfera de competência.

Art. 39. Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por representantes:

I - da União;

II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que

parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação;

III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação;

IV - dos usuários das águas de sua área de atuação;

V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.

§ 1º O número de representantes de cada setor mencionado neste artigo, bem como

os critérios para sua indicação, serão estabelecidos nos regimentos dos comitês,

limitada a representação dos poderes executivos da União, Estados, Distrito Federal

e Municípios à metade do total de membros.

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§ 2º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias de rios fronteiriços e

transfronteiriços de gestão compartilhada, a representação da União deverá incluir

um representante do Ministério das Relações Exteriores.

§ 3º Nos Comitês de Bacia Hidrográfica de bacias cujos territórios abranjam terras

indígenas devem ser incluídos representantes:

I - da Fundação Nacional do Índio - FUNAI, como parte da representação da União;

II - das comunidades indígenas ali residentes ou com interesses na bacia.

§ 4º A participação da União nos Comitês de Bacia Hidrográfica com área de

atuação restrita a bacias de rios sob domínio estadual, dar-se-á na forma

estabelecida nos respectivos regimentos.

Art. 40. Os Comitês de Bacia Hidrográfica serão dirigidos por um Presidente e um

Secretário, eleitos dentre seus membros.

CAPÍTULO IV

DAS AGÊNCIAS DE ÁGUA

Art. 41. As Agências de Água exercerão a função de secretaria executiva do

respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica.

Art. 42. As Agências de Água terão a mesma área de atuação de um ou mais

Comitês de Bacia Hidrográfica.

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Parágrafo único. A criação das Agências de Água será autorizada pelo Conselho

Nacional de Recursos Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos

mediante solicitação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica.

Art. 43. A criação de uma Agência de Água é condicionada ao atendimento dos

seguintes requisitos:

I - prévia existência do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica;

II - viabilidade financeira assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em

sua área de atuação.

Art. 44. Compete às Agências de Água, no âmbito de sua área de atuação:

I - manter balanço atualizado da disponibilidade de recursos hídricos em sua área de

atuação;

II - manter o cadastro de usuários de recursos hídricos;

III - efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos

hídricos;

IV - analisar e emitir pareceres sobre os projetos e obras a serem financiados com

recursos gerados pela cobrança pelo uso de Recursos Hídricos e encaminhá-los à

instituição financeira responsável pela administração desses recursos;

V - acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com a

cobrança pelo uso de recursos hídricos em sua área de atuação;

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VI - gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos em sua área de

atuação;

VII - celebrar convênios e contratar financiamentos e serviços para a execução de

suas competências;

VIII - elaborar a sua proposta orçamentária e submetê-la à apreciação do respectivo

ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica;

IX - promover os estudos necessários para a gestão dos recursos hídricos em sua

área de atuação;

X - elaborar o Plano de Recursos Hídricos para apreciação do respectivo Comitê de

Bacia Hidrográfica;

XI - propor ao respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica:

a) o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso, para encaminhamento

ao respectivo Conselho Nacional ou Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, de

acordo com o domínio destes;

b) os valores a serem cobrados pelo uso de recursos hídricos;

c) o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de

recursos hídricos;

d) o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo.

CAPÍTULO V

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DA SECRETARIA EXECUTIVA DO CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS

HÍDRICOS

Art. 45. A Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos Hídricos será

exercida pelo órgão integrante da estrutura do Ministério do Meio Ambiente, dos

Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, responsável pela gestão dos recursos

hídricos.

Art. 46. Compete à Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Recursos

Hídricos:" (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

I – prestar apoio administrativo, técnico e financeiro ao Conselho Nacional de

Recursos Hídricos;" (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

II – revogado;" (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

III – instruir os expedientes provenientes dos Conselhos Estaduais de Recursos

Hídricos e dos Comitês de Bacia Hidrográfica;" (Redação dada pela Lei 9.984, de

17.7.2000)

IV – revogado;" (Redação dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

V – elaborar seu programa de trabalho e respectiva proposta orçamentária anual e

submetê-los à aprovação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos." (Redação

dada pela Lei 9.984, de 17.7.2000)

CAPÍTULO VI

DAS ORGANIZAÇÕES CIVIS DE RECURSOS HÍDRICOS

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Art. 47. São consideradas, para os efeitos desta Lei, organizações civis de recursos

hídricos:

I - consórcios e associações intermunicipais de bacias hidrográficas;

II - associações regionais, locais ou setoriais de usuários de recursos hídricos;

III - organizações técnicas e de ensino e pesquisa com interesse na área de

recursos hídricos;

IV - organizações não-governamentais com objetivos de defesa de interesses

difusos e coletivos da sociedade;

V - outras organizações reconhecidas pelo Conselho Nacional ou pelos Conselhos

Estaduais de Recursos Hídricos.

Art. 48. Para integrar o Sistema Nacional de Recursos Hídricos, as organizações

civis de recursos hídricos devem ser legalmente constituídas.

136