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0 Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Saúde Alexandre Cunha Vairo PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e desdobramentos para o Ensino de Biologia Rio de Janeiro 2012

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Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde

Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Saúde

Alexandre Cunha Vairo

PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e desdobramentos

para o Ensino de Biologia

Rio de Janeiro 2012

I

Alexandre Cunha Vairo

PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e desdobramentos

para o Ensino de Biologia

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Augusto Coimbra Rezende Filho

Rio de Janeiro 2012

II

FICHA CATALOGRÁFICA

Vairo, Alexandre Cunha. Perfil conceitual: produção acadêmica e desdobramentos para o

Ensino de Biologia / Alexandre Cunha Vairo.– Rio de Janeiro: Nutes, 2012.

86 f. : il. ; 31 cm. Orientador: Luiz Augusto Coimbra Rezende Filho.

Dissertação (mestrado) -- UFRJ, Nutes, Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Saúde, 2012.

Referências bibliográficas: f. 80-86. 1. EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE. 2. Educação. 3. Biologia.

4. Redação acadêmica. 5. Didática. 6. Tecnologia educacional em

saúde - Tese. I. Rezende Filho, Luiz Augusto Coimbra. II.

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Nutes, Programa de Pós-

graduação em Educação em Ciências e Saúde. III. Título.

III

Alexandre Cunha Vairo

PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e desdobramentos para o Ensino de Biologia

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Aprovado em __________________________________

______________________________________________________

Prof. Dr. Luiz Augusto Coimbra de Rezende Filho – UFRJ

______________________________________________________

Profa. Dra. Marcia Serra Ferreira – UFRJ

______________________________________________________

Profa. Dra. Rita Vilanova Prata – UFRJ

Rio de Janeiro

2012

IV

Dedico este trabalho aos meus amados pais, Luciano e Socorro, pelo amor e

apoio incondicionais.

V

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Luciano e Maria do Socorro por todo suporte, amizade e amor

incondicional que sempre me deram e continuam me dando.

Aos meus irmãos que são excelentes amigos e me proporcionam ótimos momentos de

descontração.

À Amanda, minha namorada, que me apoiou constantemente e acompanhou de perto

todo processo de elaboração da Dissertação.

Ao meu orientador Dr. Luiz Rezende, por compartilhar seus preciosos conhecimentos,

pela parceria e paciência na realização deste trabalho e principalmente por ter sido um grande

exemplo de professor e de orientador.

À Carol por ter me incentivado a entrar para o NUTES.

Aos companheiros de laboratório (LVE) que me receberam de braços abertos e sempre

foram muito agradáveis.

Além destes, quero agradecer a Deus e a todos que, de alguma forma, contribuíram

para que essa Dissertação pudesse ser concluída.

Para todos vocês, MUITO OBRIGADO.

VI

Na história da humanidade (e dos animais também) aqueles que aprenderam a colaborar e improvisar foram os que prevaleceram.

Charles Darwin O principal objetivo da educação é criar indivíduos capazes de fazer coisas novas e não simplesmente repetir o que as outras gerações fizeram.

Jean Piaget

VII

Resumo

VAIRO, Alexandre Cunha. PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e

desdobramentos para o Ensino de Biologia. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação (Mestrado

em Educação para Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

O estudo apresentado nesta dissertação consistiu em um levantamento sobre a forma

como as pesquisas têm utilizado a teoria e trabalhado metodologicamente a montagem de

perfis conceituais de conceitos da Biologia. Para isso foi desenvolvida uma pesquisa teórico-

bibliográfica dividida em algumas etapas. A primeira delas foi um levantamento das

dissertações e teses disponibilizadas na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações e no acervo

do Portal da CAPES, utilizando o termo “perfil conceitual”. Após selecionar os trabalhos que

utilizavam a noção de perfil conceitual para delimitar conceitos de Biologia, foram elaborados

resumos e desenvolvida a análise dos aportes teóricos e das ferramentas para coleta e análise

dos dados. Nessas pesquisas foi observado que os autores utilizam os referenciais teóricos e a

metodologia propostos no início da construção do modelo de mudança do perfil conceitual,

mas vão além, empregando referenciais complementares e o uso de análises estatísticas no

tratamento dos dados, aumentando o refinamento dos resultados. Assim, a abordagem didática

que leva em conta essa noção contribui para elaboração de práticas pedagógicas mais

eficientes, por terem como objetivo colaborar para os estudantes enriquecerem e tomarem

consciência do seu próprio perfil sobre determinado conceito, tornando o aprendizado mais

efetivo.

Palavras-chave: Perfil Conceitual; Educação; Produção Acadêmica.

VIII

Abstract

VAIRO, Alexandre Cunha. PERFIL CONCEITUAL: produção acadêmica e

desdobramentos para o Ensino de Biologia. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação (Mestrado

em Educação para Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

The present study conducted a survey on how research has used the theory and worked

methodologically the conceptual profiles assembly of concepts of Biology. For that were

developed a theoretical research in literature in two academic productions portals, using the

keyword "conceptual profile". After selecting the works that used the notion of conceptual

profile to define concepts of biology, an assessment was made of the theoretical framework

and tools for collecting and data analyze. In those studies it was observed that the authors use

the theoretical framework and the methodology proposed in the early construction of the

model of conceptual profile, but they go beyond, employing additional references and the use

of statistical analysis in data handling, increasing the refinement of the results. So the teaching

approach based on this notion contributes to development of more efficient teaching practices,

because they aim to collaborate with the students for them enrich and become aware of their

own profile about a particular concept, making the learning more effective.

Keywords: Conceptual profile; Education; Academic production.

IX

Lista de Figuras

Figura 1: Características das concepções alternativas (COLL et al. 1998, p. 41). ................... 22

Figura 2: O perfil epistemológico de Bachelard sobre o conceito de massa (BACHELARD, 1984, p. 25). .............................................................................................................................. 29

Figura 3: Frequência de ocorrência de dissertações por área de pesquisa. .............................. 44

Figura 4: Frequência de ocorrência de teses por área de pesquisa. .......................................... 45

Figura 5: Frequência de ocorrência de dissertações por instituição de ensino. ........................ 45

Figura 6: Frequência de ocorrência de teses por instituição de ensino. ................................... 46

Figura 7: Produção de dissertações e teses ao longo dos anos. ................................................ 46

X

Lista de Tabelas

Tabela 1: Título da dissertação, autor, ano, área da pesquisa e instituição de defesa do trabalho retornado pela busca, fonte do resultado e se foi selecionado ou não. ..................................... 41

Tabela 2: Título da tese, autor, ano, área da pesquisa e instituição de defesa do trabalho retornado pela busca, fonte do resultado e se foi selecionado ou não. ..................................... 43

XI

Lista de Quadros

Quadro 1: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Oliveira (2005) para o levantamento das concepções de “Biodiversidade”. .......................................... 49

Quadro 2: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Silva (2006) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Vida”. ................. 55

Quadro 3: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Silva (2008) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Manguezal”. ....... 58

Quadro 4: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Viggiano (2008) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Ensinar” e “Aprender”................................................................................................................................ 60

Quadro 5: Redução das categorias identificadas por Coutinho (2005). ................................... 63

Quadro 6: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Coutinho (2005) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Vida”. ..... 64

Quadro 7: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Nicolli (2009) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Morte”. ... 66

XII

SUMÁRIO

I. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 12

II. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................ 15

II.1. CONSTRUTIVISMO ........................................................................................................ 15

II.1.1. Mudança conceitual x Perfil conceitual ............................................................. 22

III. MATERIAIS E MÉTODOS: CAMINHOS DA PESQUISA .... ................................... 37

IV. RESULTADOS ................................................................................................................. 40

IV.1. RESUMOS DOS TRABALHOS ......................................................................................... 47

IV.1.1. Dissertações ......................................................................................................... 47

IV.1.2. Teses .................................................................................................................... 62

V. DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS TRABALHOS ............................................................. 67

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 77

VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................... ...................................................... 80

12

I. INTRODUÇÃO

Cada vez mais tem sido dado à educação um papel de destaque na formação de

indivíduos capacitados para contribuir com melhorias na sociedade. Assim, além de propostas

que apresentam como objetivo principal a garantia de educação para todos, se tem buscado

um constante aprimoramento de elementos que possam contribuir para o processo de

ensino/aprendizagem.

Talvez por isso, há bastante tempo vários pesquisadores e educadores tenham

direcionado esforços para identificar que perspectiva epistemológica é mais efetiva ou que

melhor contribui para o processo de ensino-aprendizagem dos conceitos científicos. Algumas

delas consideram o conhecimento escolar como algo pronto e estabelecido e que os alunos

podem ser vistos como “tábulas rasas”. Outras, por sua vez, partem do entendimento de que

todo conhecimento deve ser construído ativamente pelos estudantes ao longo do processo

educacional, e dão grande importância aos seus conhecimentos prévios, sendo essa

perspectiva epistemológica conhecida como Construtivismo.

Dentre algumas vertentes, podemos apontar duas formas influentes de construtivismos

que podem orientar ações didáticas no ensino-aprendizagem de ciências: Movimento da

Mudança Conceitual e o Modelo de Mudança do Perfil Conceitual. O Movimento de

Mudança Conceitual proposto por um grupo de pesquisadores da Universidade de Cornell

(Posner, Strike, Herwson & Gertzog) (POSNER et al., 1982) apud AGUIAR, 2001) surgiu de

uma analogia entre o desenvolvimento do conhecimento científico e a aprendizagem das

Ciências e apresenta características que se aproximam das do modelo de Revoluções

Científicas (proposto por Thomas Kuhn) no âmbito da História e Filosofia das Ciências.

Já no Modelo de Mudança do Perfil Conceitual, há o entendimento de que pode haver

uma diversidade de conceituações, dispostas em um espectro crescente de complexidade de

forma semelhante aos caminhos da construção do conhecimento ao longo da história,

seguindo assim o modelo de perfil epistemológico proposto por Bachelard (1990). De acordo

com o Modelo de Mudança do Perfil Conceitual, as concepções prévias dos aprendizes não

precisam ser abandonadas no processo de ensino/aprendizagem, admitindo-se a coexistência

das concepções prévias e dos conhecimentos científicos.

A construção desse modelo ofereceu uma forma diferente de entender o trabalho com

conteúdos científicos nos diversos ambientes de ensino, por entender que o aprendiz não tem

13

a necessidade de abandonar suas concepções ao longo processo de ensino-aprendizagem de

um conceito. Como consequência é possível observar o uso do modelo em um grande número

de publicações (artigos, dissertações e teses) sobre os mais variados conceitos ligados à

educação em Ciências e a outras áreas do conhecimento. Desses, alguns desenvolvem

investigações voltadas para a formação inicial ou continuada do professor ou ainda com o

enfoque na formação discente nos diversos níveis de ensino (Fundamental, Médio e Superior).

Dados essa grande produção, uma forma de colaborar para uma visão panorâmica e crítica do

conjunto de publicações a respeito desse tema é desenvolver uma pesquisa considerada de

caráter bibliográfico.

Essas pesquisas são denominadas normalmente de “estado da arte” ou “estado do

conhecimento” e o grande número de publicações têm impulsionado o crescimento desse tipo

de pesquisa nos últimos anos. Dessa maneira, elas vêm contribuindo para divulgação e

reflexão sobre diversos conhecimentos produzidos, além de permitir que um determinado

campo de conhecimento seja analisado dentro de um recorte de tempo, oferecendo assim a

possibilidade de um ordenamento do conjunto de resultados e informações já obtidos nas

pesquisas. Então, pode-se dizer que a principal contribuição nesse tipo de pesquisa é deixar

em evidência, de forma sintética, o conhecimento já produzido em determinada área,

apontando caminhos mais promissores para novos pesquisadores.

De acordo com Soares e Maciel (2000) em seu trabalho sobre o estado do

conhecimento sobre a alfabetização no Brasil:

As pesquisas de caráter bibliográfico, com o objetivo de inventariar e sistematizar a produção em determinada área do conhecimento [...] são recentes, no Brasil, e são, sem dúvida, de grande importância, pois pesquisas desse tipo é que podem conduzir à plena compreensão do estado atingido pelo conhecimento a respeito de determinado tema sua amplitude, tendências teóricas, vertentes metodológicas. Essa compreensão do estado do conhecimento sobre um tema, em determinado momento, é necessária no processo de evolução da ciência, a fim de que se ordene periodicamente o conjunto de informações e resultados já obtidos, ordenação que permita a indicação das possibilidades de integração de diferentes perspectivas, aparentemente autônomas, a identificação de duplicações ou contradições e a determinação de lacunas ou vieses (p. 9).

Assim as pesquisas de estado de conhecimento têm como desafio fazer um

mapeamento e discussão de uma determinada área do conhecimento (FERREIRA, 2002).

Todo esse trabalho tem como objetivo responder uma série de questões, que foram as mesmas

que serviram como motivadoras para a presente pesquisa, como por exemplo: Que

características um conceito deve ter para que se possa montar um perfil conceitual dele? De

14

que forma os autores têm desenvolvido esse trabalho? Portanto, é possível dizer que o tema da

presente pesquisa surgiu do interesse em compreender o estado de conhecimento sobre a

noção de perfil conceitual. Sendo assim o trabalho tem a proposta de fornecer uma visão do

uso dessa noção em temas relacionados com Educação e Biologia e assim servir como

ferramenta para construção de novos caminhos na pesquisa.

Além dessas, outras questões surgem sobre o tema como: Quais são os principais

centros de produção acadêmica? Quem produz mais, instituições públicas ou privadas? Qual a

distribuição geográfica destas produções? Como se dá sua distribuição ao longo do período

levantado? Como se dá sua distribuição ao longo dos anos? Qual a proporção entre teses e

dissertações no período? Qual é a distribuição de teses e dissertações por áreas do

conhecimento?

Por conta disso a proposta deste trabalho é realizar um levantamento bibliográfico em

bancos de teses e dissertações para identificar a profundidade do uso deste referencial e que

questões de pesquisa são encontradas nos trabalhos desenvolvidos na área, assim como

elaborar um panorama de como os pesquisadores têm utilizado a teoria e trabalhado

metodologicamente a noção de perfil conceitual. Por conta disso, a relevância do trabalho está

em poder contribuir como ponto de partida para novas pesquisas realizadas sobre o tema,

indicando caminhos teóricos e metodológicos para a identificação de características e para a

montagem de perfis conceituais.

A presente dissertação está organizada em seis seções. Na primeira, é apresentada uma

breve contextualização da pesquisa e sua relevância para a área de Educação em Ciências. Em

seguida é apresentada a fundamentação teórica de interesse para essa pesquisa, apresentando o

paradigma construtivista e os pressupostos do construtivismo piagetiano e a abordagem sócio-

interacionista de Vygotsky, o Modelo de Mudança Conceitual (POSNER et al., 1982), o

Modelo de Mudança de Perfil Conceitual (MORTIMER, 1994). Na terceira seção é

apresentada a metodologia de coleta dos dados que serão analisados ao longo da dissertação.

Na parte seguinte são apresentados os resultados obtidos com o levantamento bibliográfico e

uma descrição dos trabalhos selecionados. Na quinta seção são detalhadas as

correspondências entre os aportes teóricos e os procedimentos metodológicos entre os

trabalhos e os delineamentos iniciais propostos por Mortimer e também eventuais novas

contribuições desses trabalhos para a pesquisa em Educação e em Educação em Ciências.

Para finalizar, há uma parte que contém algumas considerações sobre a pesquisa e algumas

conclusões.

15

II. REFERENCIAL TEÓRICO

II.1. Construtivismo

A partir da década de 1970, houve um fortalecimento do chamado “paradigma

construtivista” devido às críticas aos modelos de ensino e aprendizagem centrados na

transmissão de conhecimentos pelo professor e aquisição conceitual pelos alunos. As

estratégias de ensino passaram a tomar com ponto de partida as noções que os aprendizes já

possuíam e tinham como objetivo oferecer possibilidades para os aprendizes construírem seus

próprios conhecimentos (FREIRE, 1996). Tal fato gerou grande quantidade de investigações

que buscavam identificar que noções os estudantes apresentavam sobre fenômenos e

processos naturais antes de passarem pelo ensino formal de um tema. Essas pesquisas

revelaram que tais noções poderiam diferir dos conceitos científicos que se pretende ensinar e

serem resistentes às alterações, podendo assim influenciar a aprendizagem (NARDI &

GATTI, 2004).

Diferentemente dos pressupostos positivistas, o construtivismo trabalha com a ideia

segundo a qual o aprendiz não se relaciona com a realidade de forma imediata e direta, mas

sim com a realidade que é possível captar (FOSNOT, 1998). Ele não adota uma postura

passiva, como simples receptor, diante da transmissão de conhecimento feito por um

professor, por mera aquisição conceitual.

Existe um princípio fundamental da teoria construtivista que certamente não causará controvérsias: o conhecimento não é recebido passivamente, mas é construído ativamente pelo sujeito. Ideias e pensamentos não podem ser comunicados como se o significado estivesse empacotado dentro das palavras e enviado a outra pessoa que os desembrulha. Sendo assim, nós não podemos colocar ideias dentro das cabeças das crianças, somente elas poderão e irão construir as suas próprias ideias. Nosso esforço de comunicação não resulta no transporte de significados, mas nossa expressão evoca significados em outras pessoas, significados diferentes para cada pessoa (WHEATLEY, 1991, p. 10).

Embora o construtivismo tenha surgido como uma teoria psicológica, rapidamente ele

se transformou em uma teoria de ensino-aprendizagem, e com a expansão do seu alcance

passou a ser uma “versão de uma grande teoria unificada para a educação” (MATHEWS,

2000). Atualmente ele é visto como uma grande influência (talvez a maior) no ensino de

ciências e também em outras áreas, uma vez que o objetivo do ensino deixou de ser centrado

na transmissão de conhecimento pelo professor e passou a ser o estímulo à ativa participação

16

do estudante em seu aprendizado. Além de ser teoria de aprendizagem e ensino, ele também é

considerado filosofia da educação e teoria da ciência. Com isso pode-se destacar a influência

que o construtivismo tem em diversas propostas curriculares e reformas educacionais

(MATHEWS, 2000).

O construtivismo apresenta três principais tradições de acordo com Mathews (2000):

O construtivismo educacional, o construtivismo filosófico e o construtivismo sociológico. O construtivismo educacional, por sua vez, divide-se em construtivismo pessoal e construtivismo sócio-cultural. O construtivismo pessoal tem suas origens em Piaget, e atualmente é mais claramente professado por Ernst von Glasersfeld. O construtivismo social tem suas origens em Lev Vygotsky e tem sido proclamado por pesquisadores tais como Rosalind Driver, no ensino de ciências, e Paul Ernst, no ensino de matemática (MATHEWS, 2000, p. 275).

Possivelmente o diferencial das orientações construtivistas para a educação esteja na

atenção aos processos de aprendizagem. Nos processos orientados pela transmissão de

conhecimentos, os métodos de ensino eram entendidos como técnicas capazes de ensinar com

eficiência, enquanto que no construtivismo “o olhar do educador dirige-se assim para as

potencialidades e as dificuldades dos estudantes em suas interações com os conteúdos

escolares” (AGUIAR, 1998).

Segundo Ogborn (1997), algumas posições adotadas pelo construtivismo educacional

são incorretas ou confusas, mas quatro são essenciais e não podem ser deixadas de lado, tendo

sido um acerto insistir nelas:

o construtivismo educacional insistiu corretamente em quatro pontos essenciais, sendo por esses reconhecido: 1. A importância do ativo envolvimento do aprendiz; 2. O respeito pelo aprendiz e por suas próprias ideias; 3. O entendimento de que ciência é uma criação humana; 4. A forma de ensinar deve priorizar o entendimento dos aprendizes, capitalizando e usando o que eles sabem e elaborando obstáculos a partir de sua visão de mundo (OGBORN, 1997 p. 131).

De acordo com von Glasersfeld (1998) e Castañon (2005), Jean Piaget foi aquele que

introduziu o termo “construtivismo” no século XX com o desenvolvimento de sua

Epistemologia Genética. Este trabalho foi uma tentativa de abordar cientificamente algumas

questões da teoria do conhecimento por meio da investigação da gênese das estruturas

cognitivas do sujeito, a fim de indicar o papel ativo do sujeito na construção de seu mundo.

Embora Piaget não tenha pretendido ser pedagogo e nem realizar métodos pedagógicos, o

conhecimento de sua teoria de aprendizagem permite repensar a investigação pedagógica e

17

oferecer princípios estruturadores para a prática didática (KARAM, 2005). Também é

possível verificar que grande parte da produção, que é fundamentada no construtivismo,

refere-se à educação formal (SANCHIS & MAHFOUD, 2010).

O construtivismo piagetiano é considerado pessoal, uma vez que sua busca era voltada

para a análise do processo de evolução do conhecimento e da construção dos conceitos

realizada pelo indivíduo quando este interage com objetos do mundo, sem se preocupar

especificamente com o processo de ensino.

A especificidade do construtivismo de Piaget está no fato de que essa construção do conhecimento (ativa por parte do sujeito, mas possibilitada por sua inserção no mundo) é o que permite a construção de estruturas de compreensão (no sujeito) cada vez mais equilibradas, ao mesmo tempo em que uma estruturação (em termos de significado) cada vez mais abrangente do mundo. Um construtivismo em que gênese/estrutura e sujeito/objeto se relacionam permanentemente (SANCHIS & MAHFOUD, 2010:21).

Assim era de suma importância buscar entender como o aprendiz constrói seu conhecimento e

ele considerava que o desenvolvimento intelectual do sujeito se dava a partir da adaptação da

estrutura cognitiva aos novos conceitos, assim como se processa a adaptação dos seres vivos

ao ambiente. Essa adaptação ocorreria utilizando dois elementos: assimilação e acomodação

(PIAGET, 1996).

No caso da assimilação, o aprendiz busca adaptar as novas experiências (elemento

exterior) às estruturas cognitivas que já possui, apenas incorporando novas informações a ela.

O próprio Piaget define assimilação como:

uma integração à estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, isto é, sem serem destruídas (PIAGET, 1996, p. 13).

Já a acomodação ocorreria quando não fosse possível adaptar os novos dados à

estrutura existente, gerando uma modificação e uma nova organização nela. Piaget

considerava como:

acomodação (por analogia com o acomodatos biológico) toda modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores (meio) aos quais se aplicam (PIAGET, 1996, p. 13).

Os dois elementos estariam em equilíbrio e seriam intimamente relacionados. A

assimilação é feita a partir de esquemas já acomodados anteriormente e novas acomodações

18

ocorrem a partir de perturbações conflitantes com as estruturas já criadas, o que gera um

desequilíbrio e este dispara mecanismos de equilibração no indivíduo. Esses mecanismos

tendem a permitir construções compensatórias que buscam uma equilibração majorante

(melhor que a anterior), promovendo um progresso na construção dos conhecimentos.

Nas desequilibrações sucessivas, o conhecimento exógeno é complementado por reconstruções endógenas que são incorporadas ao sistema do sujeito. As estruturas cognitivas utilizáveis na abordagem de objetos e fatos são então desenvolvidas propiciando o progresso na construção do conhecimento (CARVALHO et al., 1992, p. 86).

No momento em que um fato novo provoca a perturbação, três tipos de

comportamentos compensatórios comparecem nos mecanismos de equilibração: alfa, beta e

gama. O comportamento chamado alfa, que é a primeira postura diante da perturbação,

corresponde à tentativa de neutralização, anulando-a ou desconsiderando-a, evitando assim

seu reconhecimento, tudo isso para preservar a teoria. Esta maneira de tentar retomar o

equilíbrio é parcialmente compensadora o que o torna instável (podendo ser facilmente

perturbado). O segundo comportamento, beta, tem início quando essa instabilidade não se

permite ignorar e estimula a complementação de explicações prévias ou a busca de teorias

específicas que substituam as anteriores e sejam suficientes para explicar a nova experiência.

Isso faz com que a estrutura prévia seja reorganizada até atingir um novo equilíbrio, mas

ainda tentando preservar o esquema de assimilação, “tenta-se um máximo ganho (integrar a

perturbação) com um mínimo custo (conservar o possível do esquema anterior do sujeito)”

(LABURÚ, 1992, p 25). Essa reorganização iniciada em beta é completada no

comportamento gama à medida que a nova teoria passa a ser utilizada para fazer previsões,

antecipar variações possíveis e interpretar novos fenômenos (CARVALHO et al., 1992).

Como já dito antes, todo o processo de construção do conhecimento que é visto na

teoria da reequilibração de Piaget analisa o que ocorre nas estruturas cognitivas do próprio

sujeito, mas sem levar, direta e explicitamente, em consideração a interação com outros

sujeitos. Daí, na complementação da perspectiva construtivista, a contribuição do

construtivismo sociocultural, cuja origem se encontra, segundo diversos autores, nos trabalhos

de Lev Vygotsky e permitiu acrescentar outros elementos à análise do processo de ensino ao

apontar para dimensão social como elemento chave na construção dos processos mentais do

indivíduo.

19

O foco de sua análise era a interação social e dava grande importância para a palavra

como mediadora da formação social da mente, sendo a linguagem “o mais importante sistema

de signos para o desenvolvimento cognitivo da criança porque a liberta de um contexto

concreto e possibilita a formação de conceitos” (FERREIRA et al., 2009, p. 4). Ela era

entendida como um sistema mediatizador nas atividades de transmissão intencional de

pensamentos ou experiências socioculturais, servindo como instrumento para o pensamento e

comunicação (BOLZAN, 2002).

Para Vygotsky, o desenvolvimento mental do indivíduo acontece no convívio social,

ou seja, no contato e na interação com outros indivíduos, “vinculando o desenvolvimento

intelectual, e consequentemente o emocional, às formas culturais de pensamento que os

homens internalizam na interação social ao longo de sua vida” (DALRI, 2010). Assim, esse

autor deu maior destaque à prática do trabalho em grupo ou de momentos que criem

oportunidades de troca de experiências e de conhecimentos entre aprendizes para a construção

de conceitos e sua posterior internalização (VYGOTSKY, 1991). São esses constructos sócio-

históricos e culturais que, por meio das interações sociais, provocam o desenvolvimento

cognitivo do indivíduo. De acordo com o autor, a construção dos conceitos passa por três

fases:

1 – agregação desorganizada ou amontoado (significado associado a uma imagem); 2 – pensamento por complexos (organização de objetos segundo a subjetividade, pseudoconceitos); 3 – conceitos potenciais (abstração que já existia antes não se perde e passa a ser um instrumento) (FERREIRA et al., 2009, p. 4).

Assim destacava-se a relevância da interação com o meio ao explicar a zona de

desenvolvimento proximal (“brotos” do desenvolvimento), que é a distância entre o nível de

desenvolvimento real do sujeito (se refere às etapas já alcançadas pelo indivíduo) e é

determinado pela capacidade de solução de problemas de forma independente (sem ajuda

externa), e o nível de desenvolvimento potencial, que pode ser alcançado a partir da

orientação de um companheiro mais capaz (VYGOTSKY, 1991). Assim, segundo o próprio

Vygotsky:

a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário. [...] O nível de desenvolvimento real caracteriza o desenvolvimento mental retrospectivamente, enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivamente (VYGOTSKY, 1991, p. 97).

20

Esse desenvolvimento contribui para a formação de esquemas mentais que permitem a

construção de conhecimentos e esses por sua vez são gerados e co-construídos nas interações

entre pessoas, seja em uma atividade coletiva ou sob orientação de pares mais capazes. São

essas interações as responsáveis por gerar conflitos cognitivos que mobilizam as estruturas

intelectuais do sujeito, reestruturando-as e contribuindo para o aumentado de suas

capacidades de desempenho e progresso intelectual. Dessa maneira, o processo de construção

do conhecimento se dá na interação do sujeito com o mundo e com determinadas condições

sócio-históricas nas quais o indivíduo está inserido. Este processo depende também de como o

sujeito internaliza essas produções culturais. Por essa razão o conceito de mediação é central

para a teoria de Vygotsky, “uma vez que o indivíduo não tem acesso direto aos objetos, mas

acesso mediado, através de recortes do real, operados pelos sistemas simbólicos de que

dispõe” (REGO, 1995).

De acordo com a “lei genética geral do desenvolvimento cultural”, proposta por

Vygotsky (1981),

qualquer função no desenvolvimento cultural da criança aparece duas vezes, ou em dois planos. Primeiro, ela aparece no plano social, e então no plano psicológico. Primeiro, ela aparece entre as pessoas como uma categoria interpsicológica, e então dentro da criança, como uma categoria intrapsicológica. Isso também é verdade no que diz respeito à atenção voluntária, à memória lógica, à formação de conceitos e ao desenvolvimento da vontade (...) [a] a internalização transforma o próprio processo e altera a sua estrutura e funcionamento. As relações sociais ou as relações entre pessoas estão geneticamente subjacentes a todas as funções superiores e às relações entre elas (VYGOTSKY, 1981, p. 163).

Por essa lei, as funções psicológicas que emergem e se consolidam primeiro no plano social,

depois se transformam para constituir o funcionamento interno, passando a existir no plano

individual (tornam-se internalizadas). De acordo com Mortimer & Carvalho (1996) a

categoria interpsicológica pode ocorrer, por exemplo, em uma situação de sala aula em que o

professor utiliza a ideia de um aluno e junto com outros alunos ela era trabalhada (criticada,

mudada), até que se chegava a um resultado proveniente de uma construção coletiva, que

pode ser (ou não) internalizado pelos sujeitos o que constituiria a categoria intrapsicológica.

Dois aspectos importantes podem ser destacados nas afirmações de Vygotsky sobre a

forma como os processos externos são modificados para formarem os processos internos e são

elas que diferenciam o processo de internalização e a “ideia de interiorização por via reflexiva

da teoria piagetiana” (MORTIMER & CARVALHO, 1996, p. 8):

21

O primeiro deles é que ele procurava deixar claro que os processos internos não são simples cópias dos processos que ocorrem no plano social. A internalização não constitui a transferência de processos externos, mas um processo de transformação genética e formação de um plano interno de consciência. O segundo deles é o de que a relação entre o funcionamento social e individual está baseada no fato de ambos os planos, intra- e interpsicológicos, usam as mesmas ferramentas, quais sejam, a linguagem e outros mecanismos semióticos construídos culturalmente. Portanto, a ponte que conecta os processos externos e internos é fornecida pela análise de tais mecanismos semióticos (SEPÚLVEDA, 2010, p. 24).

Dessa maneira, pode-se dizer que o desenvolvimento das funções mentais superiores tem

início com uma atividade de natureza social externa e termina como um processo individual

interno.

Traçando um paralelo entre os dois grandes teóricos do desenvolvimento humano,

enquanto Piaget apresenta uma tendência que realça o papel estruturante do sujeito e atribui à

maturação papel fundamental no desenvolvimento, Vygotsky enfatiza o aspecto

interacionista, pois considera que na troca entre as pessoas é que se originam as funções

mentais superiores, motivo pelo qual concentrou sua pesquisa na busca de explicar o

desenvolvimento humano como desenvolvimento social da criança por meio da aquisição dos

sistemas sociais de mediação‐representação (ALVES, 2004; CASTAÑON, 2009).

Enquanto no referencial do primeiro o conhecimento se dá a partir da ação do sujeito sobre a realidade (sendo considerado ativo), para o segundo, esse mesmo sujeito não é apenas ativo, mas interativo, porque constitui conhecimentos e se constitui a partir de relações intra e interpessoais (ALVES, 2004, p. 73).

Baseado no que foi explicitado anteriormente, este trabalho não considera o

conhecimento escolar como algo pronto e acabado, mas sim o produto de uma construção,

seguindo assim uma perspectiva epistemológica construtivista. Embora diferentes abordagens

e visões apareçam na literatura, duas características são comuns a todas elas (EL-HANI &

BIZZO, 2002): (1) o conhecimento é uma construção do sujeito, e não algo que ele possa

receber passivamente do meio; (2) o ato de conhecer é um processo de adaptação, que

organiza o mundo das experiências, mas não conduz à descoberta de uma realidade dada,

independente da mente que a conhece. Assim, partimos da noção segundo a qual a

aprendizagem se dá por meio de ideias prévias e do ativo envolvimento do aprendiz na

construção do conhecimento.

22

II.1.1. Mudança conceitual x Perfil conceitual

A partir do momento em que foi estabelecido o construtivismo como paradigma,

percebeu-se a importância do conhecimento que o aprendiz já possuía antes de ser introduzido

ao conteúdo escolar formal, uma vez que esse seria o ponto de partida para o trabalho com o

conhecimento cientificamente aceito. Essas ideias prévias foram denominadas concepções

espontâneas (ou concepções alternativas ou emergentes) e com o destaque que passaram a ter,

diversos trabalhos sobre concepções espontâneas no ensino-aprendizagem de ciências foram

realizados. A partir deles foram obtidos dados que levaram os pesquisadores a estudá-los para

que, além de permitir a aplicação em situações de ensino, fosse possível encontrar bases

empíricas para as constatações decorrentes das estruturas conceituais dos alunos.

Como consequência dessa busca, foram elaboradas algumas propostas construtivistas

que tinham como ponto de partida as “concepções espontâneas” e o objetivo a ser alcançado

seriam as “concepções cientificamente aceitas”. As concepções ditas “espontâneas” são

construídas pelos aprendizes como forma de entender o meio que os cerca, mesmo antes de

passarem pelo ensino formal, e assim lhes permitem fazer previsões. De forma geral, pode-se

dizer que essas concepções apresentam certo paralelismo com modelos históricos, possuem

uma natureza eminentemente pessoal e pouco consistente, apresentando esquemas dotados de

certa coerência e que podem perdurar mesmo após o ensino formal (SANTOS, 1991).

Como descrito por Hewson e colaboradores (1999), essas noções têm como

características principais o fato de diferirem de forma marcante da concepção científica,

serem bastante resistentes a mudanças e serem encontradas concepções semelhantes em

indivíduos de diferentes contextos sociais e culturais. A Figura 1 representa de forma

esquemática essas características.

Figura 1: Características das concepções alternativas (COLL et al. 1998, p. 41).

23

Sendo assim, são consideradas “ideias intuitivas relativamente estáveis, parcialmente

consistentes, úteis para a interpretação dos fenômenos cotidianos e que constituem o

‘conhecimento do senso comum’” (ARRUDA & VILLANI, 1994). A partir dessa perspectiva,

podemos apontar duas formas influentes de construtivismos que podem orientar ações

didáticas no ensino-aprendizagem de ciências: Movimento da Mudança Conceitual e o

Modelo de Mudança do Perfil Conceitual.

O Movimento de Mudança Conceitual, composto por “modelos de mudança

conceitual”, surge como uma tentativa de identificar as condições necessárias para que um

indivíduo abandonasse suas noções intuitivas e passasse a usar, em detrimento a elas, as

concepções cientificamente aceitas. Os modelos apresentavam em comum a necessidade de

partir dos conhecimentos prévios dos alunos, deveria haver a mudança conceitual e o aprendiz

deveria desempenhar um papel ativo na mudança, criando o caminho que levava da pré-

concepção ao conceito científico (SANTOS, 1991). Esses modelos também apresentavam

similaridade nas estratégias utilizadas para a obtenção da mudança conceitual, que poderiam

ser baseadas na laboração de conflitos cognitivos (e suas resoluções) ou no desenvolvimento

24

das noções dos estudantes em etapas sucessivas até atingir o ponto de vista cientificamente

aceito (ARRUDA & VILLANI, 1994).

O movimento teve como modelo inicial o PSHG proposto por um grupo de

pesquisadores da Universidade de Cornell (Posner, Strike, Hewson e Gertzog) (POSNER et

al., 1982 apud AGUIAR, 2001). Estes modelos surgem de uma analogia entre o

desenvolvimento do conhecimento científico e a aprendizagem das Ciências, embasados em

estudos de filósofos da ciência como Kuhn (1970), Lakatos (1970) e Toulmin (1972), sendo

assim, apresentando características que se aproximam das do modelo de Revoluções

Científicas (proposto por Kuhn) no âmbito da História e Filosofia das Ciências. A questão

básica diz respeito a como as concepções dos estudantes mudam sob o impacto das novas

ideias e evidências. Entende-se a aprendizagem como uma “atividade racional,

fundamentalmente voltada para a compreensão e aceitação de ideias que pareçam ser

inteligíveis e racionais” (GATTI, 2005). De acordo com a visão kuhniana, a revolução

científica se dá com a emergência de um novo paradigma que ocorre quando há uma crescente

insatisfação na comunidade científica com o paradigma dominante, por este não ser mais

capaz de responder uma série de questões, e assim ocorreria a aprendizagem (ARRUDA &

VILLANI, 1994).

Então, esses modelos de mudança conceitual procuravam responder como as

concepções espontâneas seriam transformadas em concepções científicas, a partir da

apresentação de novas ideias e evidências (NARDI & GATTI, 2004). De acordo com eles, a

aprendizagem ocorre quando o indivíduo se torna capaz de escolher entre conceitos

mutuamente inconsistentes ou de complementar conceitos prévios, conforme descrito por

Hewson & Thorley (1989, p. 543 apud EL-HANI & BIZZO, 2002):

O aspecto central da mudança conceitual reside na modificação simultânea do status das concepções alternativa e científica, é preciso diminuir o status da primeira, sobretudo sua plausibilidade e fertilidade, e, simultaneamente, aumentar o status da segunda.

Este modelo parte do entendimento de que há na mente do aprendiz pré-concepções ou

concepções espontâneas que são estáveis e (pelo menos) parcialmente consistentes ou úteis. A

aprendizagem consiste basicamente em compreender e aceitar novas ideias por elas serem

inteligíveis e mais eficientes que as anteriores, gerando então o abandono dessas.

Utilizando a mesma terminologia da teoria piagetiana, mas sem estabelecer

compromissos com a teoria dele, os criadores do modelo partiram da ideia segundo a qual

25

quando os estudantes analisavam um fenômeno utilizando conceitos que já possuíam eles

estariam utilizando o que foi chamado de assimilação. Mas quando as concepções prévias não

eram adequadas para permitir a compreensão satisfatória de um novo fenômeno o aprendiz

deveria substituir ou reorganizar seus conceitos, o que implicaria em uma forma mais radical

de mudança, que foi chamada, em termos piagetianos, conforme acima, de acomodação

(NARDI & GATTI, 2004). Fazendo um comparativo com a filosofia kuhniana, o termo

assimilação corresponderia à ciência normal, enquanto a acomodação corresponderia à

revolução científica (ARRUDA & VILLANI, 1994).

Por essa perspectiva, assim como observado por Kuhn na história da Ciência, o

indivíduo tende a manter suas concepções enquanto achar que pequenas alterações em suas

ideias centrais são suficientes para compreender conceitos. Sendo assim é necessário que o

aprendiz perceba os problemas presentes em seus conceitos a partir da dificuldade de usá-los

para a resolução de problemas, gerando um acúmulo de anomalias para então ocorrer à

acomodação. Por conta disso, quatro condições são necessárias para que ocorra a

acomodação:

Em primeiro lugar, [1-insatisfação] deve haver insatisfação com as concepções existentes, já que é improvável que cientistas e estudantes realizem uma mudança profunda em suas concepções sem que tenham perdido a fé em sua capacidade de resolução de problemas. Depois, [2-inteligibilidade] essa nova concepção deve ser inteligível, ou seja, deve ser compreensível em sua estrutura cognitiva. Num próximo passo, a [3-plausibilidade] nova concepção deve parecer inicialmente plausível. Qualquer nova concepção adotada deve ao menos parecer ter capacidade para resolver os problemas gerados por suas predecessoras, caso contrário não parecerá uma escolha plausível. E, finalmente, [4-fertilidade] a nova concepção deve sugerir a possibilidade de um frutífero programa de investigação, ou seja, deve ser útil, resolver problemas e abrir novas perspectivas (NARDI & GATTI, 2004, p. 154).

Portanto, se a concepção for inteligível, ou seja, fizer sentido para o aprendiz, ela deve

satisfazer a condição de ser plausível. Para isso ela precisa atender dois critérios básicos: ser

capaz de resolver as anomalias e ser consistente com outros conhecimentos do sujeito,

experiências anteriores e outras teorias. Atendidas as duas etapas anteriores e sendo fértil

(permitindo seu uso para novas descobertas, podendo ser empregada inclusive em novas

áreas) poder-se-á dizer que a acomodação realmente aconteceu.

Os conceitos pré-existentes no indivíduo sobre os quais a mudança conceitual se

desenvolve são chamados ecologia conceitual. Estes conceitos seriam inter-relacionados e

influenciariam a seleção dos novos conceitos, assim qualquer mudança ocorrida em um deles

26

poderia influenciar os outros (existindo inclusive a possibilidade de competição entre eles)

determinando inclusive a direção da acomodação (determinando se as condições foram

satisfeitas ou não). Por conta disso, seguindo a filosofia kuhniana, a ecologia conceitual

desempenharia o papel do “paradigma” (que seria o conjunto de conhecimentos do sujeito no

início da aprendizagem). A ecologia influenciaria na inteligibilidade e na plausibilidade,

determinando a direção das acomodações. De acordo com o MMC (1982) alguns tipos de

conceitos presentes na ecologia conceitual são importantes para este direcionamento:

anomalias; analogias e metáforas; compromissos epistemológicos; crenças e conceitos

metafísicos e outros conhecimentos de outros campos ou teorias competidoras.

1. Anomalia: o caráter específico das falhas de uma dada ideia é uma importante parte da ecologia que faz com que se selecione uma nova ideia sucessora. 2. Analogias e Metáforas: servem para sugerir novas ideias e torná-las inteligíveis. 3. Compromissos Epistemológicos: a) Ideais Explanatórios: a maioria dos campos de estudo tem pontos de vista específicos do conteúdo que deve ser considerado como explicação e como padrão de julgamento no campo. b) Visão Geral sobre o Caráter do Conhecimento: alguns padrões que são levados em conta para que um assunto tenha sucesso – a elegância, a economia, a parcimônia, não ser ad hoc e parecer neutro. 4. Crenças e conceitos metafísicos: crenças a respeito de um ordenamento, simetria, não aleatoriedade do universo, podem resultar numa visão epistemológica e podem vir a selecionar ou rejeitar tipos particulares de explicações. Os conceitos científicos apresentam uma qualidade metafísica, isto é, podem fazer acreditar que eles representam a natureza última do universo e, por consequência, seriam imunes às refutações. 5. Outros conhecimentos: conhecimentos em outros campos podem influenciar a escolha de fenômeno para estudo ou, um conceito que compete com um outro, pode vir a ser selecionado em razão de ser mais promissor do que os seus competidores (POSNER et al., 1982, p. 214-215).

Sendo assim, no indivíduo comprometido com a redução das inconsistências em seu

pensamento, as anomalias produziriam insatisfação no aprendiz, influenciando na seleção de

novos conceitos. Isso se tornou sinônimo de “aprender ciências”.

O modelo que considerava que para ocorrer a aprendizagem “as ideias prévias devem

ser abandonadas e/ou subsumidas no processo de ensino” (MORTIMER, 1996, p. 26) foi

largamente utilizado na pesquisa em Educação Científica, possivelmente por sua simplicidade

e abrangência, adquirindo grande relevância nos trabalhos da área. “O modelo era simples de

ser entendido, bem razoável e plausível, aparentemente compatível com quase todos os dados

e quase todas as tentativas de produzir mudanças conceituais” (ARRUDA & VILLANI, 1994,

p. 91).

Entretanto algumas desvantagens e várias críticas foram feitas a este modelo e artigos

mais recentes questionam a expectativa do abandono das pré-concepções. As discussões

27

buscavam esclarecer se a renúncia às noções alternativas era realmente possível, e consideram

que o objetivo da aprendizagem não é gerar o abandono de concepções prévias. Esse objetivo

deve ser a busca do aumento da capacidade dos estudantes de distinguir entre as concepções

apropriadas para cada contexto.

De acordo com Mortimer e Carvalho (1996), as estratégias de ensino baseadas no

modelo de mudança conceitual costumam deixar de lado duas características da teoria

piagetiana: a primeira é que as lacunas são tão importantes quanto os conflitos, e a segunda é

que a aquisição de um novo conhecimento pode acontecer sem que o anterior seja modificado.

Assim, tanto o conhecimento prévio poderá ser reorganizado quanto o novo conhecimento

pode ser integrado à estrutura de conhecimentos previamente existentes, sem requerer a

mudança conceitual. Na verdade, surgiram evidências adicionais de que novos conhecimentos

podem coexistir no sistema de informações dos indivíduos sem a necessidade de desencadear

conflitos entre si (MORTIMER, 2000). Isso contribuiu para a percepção de que a aquisição de

um conceito científico não é necessariamente acompanhada da substituição ou eliminação de

antigas concepções (NARDI & GATTI, 2004).

Com o avanço das pesquisas, outros autores reconheceram a impossibilidade da

substituição das ideias iniciais dos aprendizes e alguns provaram que de fato seria possível a

coexistência de mais de um significado para um mesmo conceito, sendo cada um deles

acessados em contextos considerados mais apropriados (MORTIMER, 1995). Por entender

que para ocorrer aprendizagem não é necessário que o aluno rompa com suas concepções

prévias após passar pelo ensino formal, estes trabalhos introduzem elementos que,

posteriormente, compõem o Modelo de Mudança de Perfil Conceitual introduzido e

desenvolvido por Mortimer (1994; 1995; 2000).

O Modelo de Mudança de Perfil Conceitual foi então proposto como uma forma,

alternativa ao da mudança conceitual, de modelar a heterogeneidade de pensamentos nas aulas

de Ciências, sendo considerado uma forma individual de significar as experiências e

conceituar o mundo. Ele entende que a construção de um conceito é um processo emergente,

sempre produzido a partir de interações entre o indivíduo e experiências externas, que não

depende da acomodação de quadros conceituais prévios. A noção de perfil conceitual pode ser

definida como:

um sistema supra-individual de formas de pensamento que pode ser atribuído a qualquer indivíduo dentro de uma mesma cultura. Apesar de cada indivíduo possuir um perfil diferente, as categorias pelas quais ele é traçado são as mesmas para cada conceito. A noção de perfil conceitual é, portanto, dependente do contexto, uma vez

28

que é fortemente influenciado pelas experiências distintas de cada indivíduo; e dependente do conteúdo, já que para cada conceito em particular tem-se um perfil diferente (MORTIMER, 1995, p. 70).

Assim ele pode até ocorrer de forma independente desses quadros conceituais e é

fundamentado na ideia de que em cada indivíduo podem coexistir diferentes formas de pensar

um mesmo conceito (MORTIMER, 1995):

Assuming the existence of conceptual profiles as a manifestation of heterogeneity of thinking implies recognizing the coexistence of two or more meanings for the same word or concept, which are accessed and used by the individual in the appropriate contexts. Science itself is not a homogeneous form of knowing and speaking, and can provide multiple ways of seeing the world, which can exist together in the same individual, and be drawn upon in different contexts (MORTIMER et al., 2010). 1

Como o perfil conceitual é influenciado pelos meios culturais nos quais os sujeitos

estão envolvidos, eles podem apresentar diferentes maneiras de ver e representar o mundo.

Essas formas de representação podem ser vistas como modelos da heterogeneidade dos modos

de pensamentos disponíveis para serem utilizados em diferentes contextos aos quais essas

formas se aplicam (MORTIMER, 1995; 2000). De acordo com Mortimer (1997, p. 202), é

“como se olhássemos o mundo através de lentes que apresentam toda a realidade de uma

maneira específica”.

Sendo assim, é possível haver uma diversidade de conceituações constituídas por

zonas, em que “cada zona num perfil conceitual oferece uma forma de ver o mundo que é

única e diferente das outras zonas” (MORTIMER 1997, p. 202). E elas poderiam ser dispostas

em um espectro crescente de complexidade de forma semelhante aos caminhos da construção

do conhecimento ao longo da história da ciência, assim como foi proposto por Bachelard

(1990) com relação às concepções sobre a realidade. Dessa maneira, a noção bachelardiana de

perfil epistemológico, na qual as concepções sobre conceitos podem ser organizadas em zonas

de características epistemológicas diferentes que fundamentam formas distintas de se

compreender a realidade, baseia a proposta do Modelo de Mudança do Perfil Conceitual. Para

Bachelard, cada zona do perfil epistemológico de um conceito tem poder explanatório e nível

1 Assumir a existência de perfis conceituais como uma manifestação da heterogeneidade de pensamentos implica em reconhecer a coexistência de dois ou mais significados para a mesma palavra ou conceito, que são acessados e utilizados pelo indivíduo nos contextos apropriados. A própria ciência não é uma forma homogênea de conhecer e falar, e pode fornecer múltiplas formas de ver o mundo, que podem coexistir no mesmo indivíduo, e ser utilizada em diferentes contextos (Tradução do autor).

29

de abstração maior que a anterior e sua altura representa o grau de influência de cada zona do

perfil deste conceito (Figura 2) (AMARAL & MORTIMER, 2001).

Figura 2: O perfil epistemológico de Bachelard sobre o conceito de massa (BACHELARD, 1984, p. 25).

Em seu trabalho, Bachelard (1984) ilustrou a noção de perfil epistemológico do

conceito de massa. O primeiro nível do conceito seria o realismo ingênuo que corresponde às

noções mais intimamente ligadas ao senso comum, que no caso desse conceito seria atribuí-lo

a coisas grandes e pesadas, correspondendo “a uma apreciação quantitativa grosseira e como

que ávida da realidade. Aprecia-se uma massa nela vista” (BACHELARD, 1984, p. 13). O

nível seguinte é o do empirismo que está relacionado a uma determinação precisa a partir do

uso de escalas como forma de substituir a primeira experiência. No caso do conceito de massa

estaria relacionado ao uso da balança, utilizando-se assim da “objetividade instrumental”

(BACHELARD, 1984).

As outras zonas são consideradas racionalistas uma vez que deixam de lado a

“utilização simples e absoluta de uma noção” e passam a utilizar um corpo de noções. No

caso do racionalismo newtoniano (clássico da mecânica racional), a massa pode ser definida

como quociente da força pela aceleração, relacionando noções que os níveis anteriores não

permitiriam. No racionalismo completo, com o emprego da Relatividade, o conceito de

massa, que era tido como uma grandeza absoluta (no tempo e espaço), já não pode ser

dissociado da velocidade, podendo até mesmo ser considerado como relativo e assim um tipo

de energia. Já o racionalismo discursivo (ultra-racionalismo), que leva em conta a filosofia

dialética do “por que não?”, sugeriria algumas alterações nas teorias de base, buscando novos

30

conceitos sem raízes na realidade comum, e assim propondo o conceito de massa negativa,

que não pode ser obtido apenas aprofundando a noção newtoniana e/ou relativista

(BACHELARD, 1984). Assim, teríamos em síntese:

I) realismo ingênuo (animismo) – é o pensamento de senso comum; associado à realidade sensorial imediata; II) empirismo – está associado à utilização de instrumentos para esta medida; III) racionalismo clássico – neste, os conceitos se relacionam de uma forma mais racional, não estando mais tão vinculados a experiências sensoriais; IV) racionalismo completo – em que as relações entre grandezas se tornariam ainda mais complexas e V) racionalismo discursivo – trazendo os avanços mais recentes da ciência como estudos sobre sistemas não-lineares, fractais e caos (BACHELARD, 1990, p. 25).

O filósofo, mesmo tendo uma visão de Ciência como uma construção contínua, em

que diferentes filosofias podem coexistir, concede uma maior valorização às concepções de

caráter mais racionalista. O progresso epistemológico não implica em um completo abandono

das concepções de menor nível de abstração (realismo ingênuo - mais próximo do pensamento

do senso comum), mas sim em um desenvolvimento e/ou surgimento de novas zonas que

apresentem maior nível de complexidade. O perfil epistemológico tende a ser decorrente dos

contextos sociais nos quais o sujeito esteve inserido e “cada parte do perfil pode ser

relacionada, portanto, com uma forma de pensar e com um certo domínio ou contexto a que se

aplica” (MORTIMER, 1996, p. 30). As categorias dos conceitos já estão presentes e são

compartilhadas por grupos de contextos semelhantes, tendo assim uma característica supra-

individual que se sobrepõe à cognição individual. Tal situação corrobora o trabalho de

Vygotsky que propunha a importância da dimensão social para a construção das funções

mentais superiores, por considerar que estas são exteriores (sociais) antes de serem

internalizadas (pelo indivíduo) (MORTIMER, 1995).

Diferentemente da noção bachelardiana, o objetivo da proposta de Mortimer (1995)

era encontrar um modelo capaz de descrever as mudanças que ocorriam nos pensamentos dos

indivíduos a partir do processo de ensino. A proposta do Modelo de Mudança do Perfil

Conceitual apresenta algumas semelhanças com o perfil epistemológico, como a hierarquia

entre as zonas, em que cada uma apresenta poder explanatório maior que a anterior, mas lhe

adiciona pelo menos dois novos elementos. O primeiro seria a distinção entre os

compromissos epistemológicos e ontológicos de cada zona do conceito, uma vez que as

dificuldades de alterar as características ontológicas são intimamente relacionadas aos

problemas de aprendizagem em ciências. O outro elemento é que as zonas não-científicas não

31

são abarcadas pelas escolas filosóficas, sendo estas fortemente influenciadas pelo contexto

sociocultural.

Isso fez com que Mortimer (1995) definisse o perfil conceitual como um “sistema

super-individual de formas de pensamento” que geram “modos de falar” empregados na

enunciação de um conceito. Apesar de cada indivíduo apresentar seu próprio perfil conceitual,

esse pode ser acessado por qualquer pessoa dentro de um mesmo contexto cultural, tendo

assim uma aproximação com o construtivismo sociocultural, e um afastamento do paradigma

piagetiano de equilibração, que se tornara insuficiente para descrever a superação de

obstáculos epistemológicos e ontológicos (SEPÚLVEDA, 2010).

Na equilibração, a ultrapassagem desse tipo de obstáculo é vista como um processo contínuo, uma vez que a estrutura mais equilibrada sempre contém a estrutura menos equilibrada. Não fica claro qual o papel das rupturas nesse processo. A descontinuidade que detectamos na construção do atomismo pode ser entendida se buscarmos a origem do conceito na cultura, no professor e na sua voz de autoridade, e nos “amplificadores culturais” presentes na sala de aula. Essa é uma contribuição teórica importante da linha vygotskiana ao nosso trabalho, uma vez que ela reconcilia nossa noção de perfil conceitual, onde é possível e real a existência de rupturas, num sistema psicológico que admite a descontinuidade. O processo de superação dos obstáculos em sala de aula pode ser explicado dentro desse novo sistema como fruto das interações no plano intermental e não mais como uma acomodação de uma perturbação que preserva o esquema anterior (MORTIMER, 2000, p. 346).

Em seu trabalho, Vygotsky (1991) fornece subsídios para pensarmos essas formas

coletivas de pensamento a partir da perspectiva sociocultural sobre o desenvolvimento das

funções mentais superiores. Segundo ela, o pensamento individual é constituído a partir da

internalização de mediadores simbólicos construídos socioculturalmente, entre eles a

linguagem disponibilizada nas interações sociais. Dessa forma a abordagem de perfis

conceituais pretende, “modelar a heterogeneidade do pensamento e da linguagem” a partir dos

quais as pessoas elaboram suas conceitualizações sobre eventos, sendo que essas surgem a

partir da “interação socialmente situada entre um indivíduo e alguma experiência externa”

(MORTIMER et al., 2009, p. 3).

The fact that those collective constructions are imposed upon individual cognition follows from the development of individual thinking through the internalization of cultural tools made available by means of social interactions. As our social experience is diverse and multifaceted, we do not share only one series of concepts and categories that can be used to signify the world of our experiences. On the contrary, we have at our disposal a diversity of stabilized meanings in different social languages, the weight each of them in our personal way of thinking depending on the extent to which we had opportunities to fruitfully use them throughout our

32

development, to face challenges posed by our experiences (MORTIMER et al., 2010, p. 112).2

Embora apresente diferenças fundamentais entre o perfil epistemológico e o perfil

conceitual, o modelo de Mortimer entende a evolução das ideias dos estudantes como a

evolução de um perfil de concepções em que novas ideias adquiridas no processo de

aprendizagem passam a conviver com as anteriores (MORTIMER, 1996; AMARAL &

MORTIMER, 2004). Admite-se a convivência entre o senso comum, o saber escolar e o saber

científico, não sendo necessária a substituição das ideias prévias pelas científicas e a ausência

de mudanças radicais não deve ser interpretada como fracasso (MORTIMER, 1996). Por

conta disso, o pesquisador considera esse modelo o mais adequado para estudar a dinâmica da

aprendizagem em ciências devido aos seus compromissos didáticos (KARAM, 2005).

Mortimer (1996) propôs que, com algumas adaptações, a proposta bachelardiana

(1984) poderia ser estendida a conceitos de ciências (como os de química e física), e esses

também poderiam ser relacionados na forma de um perfil:

O realismo, que é basicamente o pensamento de senso comum; o empirismo, que ultrapassa a realidade imediata através do uso de instrumentos de medida, mas que ainda não dá conta das relações racionais; o racionalismo clássico, em que os conceitos passam a fazer parte de uma rede de relações racionais; o racionalismo moderno, em que as noções simples da ciência clássica se tornam complexas e partes de uma rede mais ampla de conceitos; e também um racionalismo contemporâneo, ainda em desenvolvimento, que englobaria os avanços mais recentes da ciência através de estudos sobre a forma, fractais e sistemas não-lineares, que permitem a incorporação, como objeto de estudo, de sistemas complexos e/ou caóticos, como reações distantes do equilíbrio, sistemas irreversíveis, etc (MORTIMER, 1996, p. 30,31).

E partindo do exposto, ele utilizou essa proposição para desenvolver seu trabalho sobre o

conceito de calor (AMARAL & MORTIMER, 2001), em que foi apresentada uma proposta

de perfil conceitual com cinco zonas para a noção de calor. Essa construção foi desenvolvida

seguindo uma linha histórica do conceito e das concepções dos alunos em sala de aula. A

partir desses dados foi realizada uma categorização e análise das principais ideias encontradas

com relação ao conceito de calor. O trabalho destaca ainda a importância da utilização do

2 O fato de que essas construções coletivas são sobrepostas à cognição individual decorre do desenvolvimento do pensamento individual, por meio da internalização das ferramentas culturais disponibilizados por meio das interações sociais. Como nossa experiência social é diversa e multifacetada, nós não compartilhamos apenas uma série de conceitos e categorias que podem ser usados para significar o mundo de nossas experiências. Pelo contrário, temos à nossa disposição uma diversidade de significados estabilizados em diferentes linguagens sociais, o peso de cada um deles na nossa maneira individual de pensamentos depende do grau em que tivemos a oportunidade de usá-los produtivamente ao longo do nosso desenvolvimento, para enfrentar os desafios colocados pelas nossas experiências (Tradução do autor).

33

perfil conceitual como instrumento para planejamento e análise do ensino de ciências visto

que ele permite a identificação dos obstáculos ao processo de aprendizagem. Posteriormente

também contribuiu para estender a noção de perfil conceitual para conteúdos de biologia,

como “vida” e “espécie” (COUTINHO, 2005, COUTINHO et al., 2007; SOARES et al.,

2007), assim como fizeram outros autores (SEPÚLVEDA, 2009; SEPÚLVEDA et al., 2007;

SILVA et al., 2007).

Por esse modelo, as zonas do perfil são agrupamentos de concepções semelhantes que

emergem dos indivíduos de acordo com suas bases epistemológicas e ontológicas sobre um

conceito, e cada uma delas teria um peso diferente na composição do perfil de acordo com as

possibilidades de aplicação de cada uma ao longo da formação dos indivíduos. “A própria

ciência não é uma forma homogênea de conhecer e falar, e pode fornecer múltiplas formas de

ver o mundo, que podem coexistir no mesmo indivíduo, e ser utilizada em diferentes

contextos” (MORTIMER et al., 2010, p. 115). Dessa maneira podemos perceber que elas não

correspondem a um produto acabado, mas sim ao resultado de uma construção histórica. De

acordo com Amaral (2004),

o perfil conceitual é constituído de diferentes zonas distribuídas segundo uma ordem genética, sendo que cada uma delas tem uma complexidade maior do que as anteriores. No perfil conceitual, a diferenciação entre as zonas é feita não somente pelos compromissos epistemológicos, mas também a partir de aspectos ontológicos do conceito, considerando as ideias que constituem cada zona do perfil como apropriadas para um contexto específico (AMARAL, 2004, p. 11).

Por conta do exposto, Mortimer e colaboradores (2010) afirmam que a abordagem dos

perfis conceituais concebe a aprendizagem como o resultado da integração de dois processos.

O primeiro deles seria o enriquecimento dos perfis conceituais dos indivíduos (a partir das

interações discursivas), e nesse caso aulas de Ciências teriam papel fundamental de apresentar

o pensamento científico com que o aprendiz não tem contato por outros meios. O segundo é a

tomada de consciência da diversidade de concepções envolvidas em um perfil, assim como

apresentar de forma clara os contextos de aplicação de cada uma delas.

De acordo com Mortimer (1996), para a construção de um perfil conceitual é

importante delimitar os compromissos epistemológicos e ontológicos que estruturam cada

zona, para poder delimitá-las. Para isso, é preciso considerar uma grande diversidade de

significados associados a um conceito e uma variedade de contextos nos quais eles podem ser

34

inseridos. Daí se faz necessário investigar pelo menos três domínios responsáveis pela gênese

de um conceito: domínio sociocultural, domínio ontogenético e domínio microgenético.

O levantamento da evolução histórica das ideias ou de um conceito daria conta de um

dos três domínios genéticos que participariam da constituição dele: o domínio sociocultural.

Isso pode ser utilizado como um dos recursos para determinar tanto as zonas científicas

quanto as pré-científicas, assim como para revelar seus compromissos epistemológicos e

ontológicos.

Essa perspectiva apresenta grande proximidade com a epistemologia histórica de

Bachelard que destaca o progresso filosófico das ciências (físicas) como uma construção no

sentido de uma racionalidade cada vez mais complexa, rompendo assim com as concepções

inadequadas (LÔBO, 2007).

Nesta perspectiva, o conceito bachelardiano de ruptura epistemológica é fundamental para o ensino das matérias científicas, pois insere os conceitos científicos no contexto histórico em que eles foram produzidos, mostrando os obstáculos epistemológicos inerentes a seus próprios processos de produção (LÔBO, 2007, p. 92).

Esse tipo de abordagem ganha ainda mais importância uma vez que, de acordo com Amaral &

Mortimer (2001, p. 7), “os processos de mudança no conceito, na história e nas crianças,

apresentam similaridades, pois representam uma mudança através de categorias ontológicas”.

Assim esse domínio evidencia a forma como a consciência humana evolui na história de suas

relações sociais (com relações às funções mentais superiores) (RODRIGUES, 2009).

Outros dois recursos que podem ser utilizados para evidenciar outros compromissos

são os trabalhos que abordam as concepções alternativas dos estudantes e os dados coletados

por meio de questionários, entrevistas e gravações das interações discursivas nas situações de

construção de significados (sala de aula, por exemplo). Ambos permitem aprofundar as

investigações que são úteis para dar acesso ao domínio ontogenético e a última,

adicionalmente, ao domínio microgenético.

Esses são os outros dois domínios relacionados à gênese do perfil de um conceito

científico. O domínio ontogenético se refere às experiências pessoais do indivíduo, à sua

história de desenvolvimento cognitivo, “envolvendo a operação simultânea e inter-relacionada

de forças naturais e sociais de desenvolvimento das funções mentais” (SEPÚLVEDA, 2010,

p. 58). Já o domínio microgenético tenta identificar a formação de conceitos individuais que

ocorrem em escalas de tempo mais curtas como no próprio processo de ensino-aprendizagem,

35

“podendo referir-se a eventos de transição genética ou de desdobramento de um ato

perceptual e conceitual individual” (SEPÚLVEDA, 2010, p. 58).

Apesar de normalmente envolver este procedimento, a categorização do discurso

escrito ou falado não costuma ser suficiente para permitir a construção (delimitação) das

zonas de um perfil conceitual. Isso porque essas zonas são individualizadas por compromissos

epistemológicos e ontológicos que estruturam os diferentes modos de pensar e eles não estão

normalmente tão evidentes nas respostas e declarações. Assim as falas dos sujeitos devem ser

interpretadas à luz desses compromissos relacionados aos contextos sociais dos sujeitos. Isso

também ocorre porque a forma de coleta e a interpretação dos dados ocorrem como parte de

um processo dialógico estruturado pelas intenções e procedimentos do pesquisador.

Therefore, we never think of evidence used to build a profile as “raw data”, from which one could obtain categories and, subsequently, ontological and epistemological commitments by a mere inductive process. It is the active interpretation of the researcher, guided by hypotheses provided by the dialogue between her sources, that allows her to work out these commitments and individuate zones of a profile. Needless to say, it is crucial to introduce in this research approach several procedures to control the quality of the analysis, in such a manner that conceptual profiles can be built with sufficient rigor and coherence (MORTIMER et al., 2010). 3

Atualmente é possível perceber o uso de outros referenciais integrados à noção de

perfil conceitual, para compor um quadro teórico, em pesquisas que consideram o processo de

aprendizagem em Ciências como a aquisição de uma linguagem social da Ciência escolar por

meio de interações discursivas na sala de aula, a partir de uma perspectiva sociocultural.

In this framework, the following theories are integrated into a synthesis made coherent by several shared assumptions, characteristic of sociocultural approaches: the conceptual profile approach, as a tool for analyzing modes of thinking; the theory of language of the Bakhtin circle, as a basis for the analysis of ways of speaking; Vygotsky’s theory of the development of higher mental functions, as a basis for the investigation of learning; Mortimer and Scott’s framework for research into classroom communicative approaches; and, more recently, an analysis of the

3 Por isso, nunca pensamos nas evidências usadas para construir um perfil como "dados brutos", a partir dos quais é possível obter categorias e, posteriormente, compromissos ontológicos e epistemológicos por um mero processo indutivo. É a interpretação ativa do pesquisador, guiada por hipóteses fornecidas pelo diálogo entre suas fontes, que lhe permite trabalhar esses compromissos e individualizar as zonas de um perfil. Não é necessário dizer que, é crucial introduzir nesta abordagem de pesquisa diversos procedimentos para controlar a qualidade da análise, de maneira que os perfis conceituais possam ser construídos com rigor e coerência suficientes (Tradução do autor).

36

construction of school knowledge in terms of Bernstein’s sociology of education (MORTIMER et al., 2010).4

E nesse quadro teórico, a dinâmica de aprendizado pode ser compreendida como uma

mudança do perfil conceitual, que se daria de três maneiras, (I) a aquisição de uma nova zona

e/ou a transformação de uma previamente existente, (II) a consciência da existência das

diferentes zonas e (III) a consciência das relações entre as zonas (do próprio sujeito) e os

contextos de uso de cada uma delas (RODRIGUES & MATTOS, 2006). Essa

tomada de consciência, pelo estudante, de seu próprio perfil, desempenha um papel importante no processo de ensino-aprendizagem. Ao tomar consciência de seu perfil, o estudante teria mais chances de privilegiar determinados mediadores e linguagens sociais, como aqueles mais adequados a determinados contextos (MORTIMER, 1996, p.33).

Considerando o que foi explicitado até este ponto, a questão central desta pesquisa é:

Como as pesquisas têm utilizado a teoria e trabalhado metodologicamente a montagem de

perfis conceituais? E essa por sua vez pode permitir responder outras, por exemplo: Que

características um conceito deve ter para que se possa montar um perfil conceitual dele?

Como a noção de perfil conceitual vem sendo utilizada na pesquisa em temas relacionados à

Biologia e ao seu ensino?

4 Nesse quadro, as teorias seguintes são integrados em uma síntese coerente feita por vários pressupostos compartilhados, característica das abordagens socioculturais: a abordagem do perfil conceitual, como uma ferramenta para analisar os modos de pensamentos, a teoria da linguagem do círculo de Bakhtin, como base para a análise das formas de falar; a teoria de Vygotsky sobre o desenvolvimento das funções mentais superiores, como base para a investigação de aprendizagem; os trabalhos de Mortimer e Scott para a investigação sobre abordagens comunicativas em sala de aula e, mais recentemente, uma análise da construção do conhecimento escolar em termos de sociologia da educação de Bernstein (Tradução do autor).

37

III. MATERIAIS E MÉTODOS: Caminhos da pesquisa

A noção de perfil conceitual proposta por Mortimer (1994; 1995; 2000) teve início

como um modelo para descrever a evolução conceitual das ideias dos estudantes sobre

“matéria” e suas transformações, a partir de uma sequencia didática. Em seus trabalhos, o

pesquisador propôs que a noção fosse aplicada ao ensino e à aprendizagem de conceitos não

só relacionados à química, como também os relacionados à Física e à Biologia. Essa seria

uma forma de revelar “interessantes facetas da noção de perfil não detectadas através do

átomo” (MORTIMER, 2000, p. 358).

Desde então, o modelo tem sido aplicado a diferentes conceitos, em sua maioria, nos

campos da física e da química, como os conceitos de molécula (MORTIMER, 1997), de

periodicidade (GOBARA & GRÉA, 1997), de calor (AMARAL & MORTIMER, 2001), e de

espontaneidade e entropia (AMARAL, 2004). Mais recentemente, foram construídos perfis

para conceitos centrais em outros campos das ciências naturais, que mantêm relações com

outras áreas, como a medicina, a sociologia e antropologia, a exemplo do conceito de vida

(COUTINHO, 2005; COUTINHO et al. 2006; SILVA, 2006) e do conceito de morte

(NICOLLI, 2009; NICOLLI & MORTIMER, 2009).

Após o desenvolvimento do referencial teórico e de relevância da pesquisa para área

de Educação em Ciências e Saúde, apresentamos neste capítulo as etapas metodológicas da

pesquisa, a descrição do campo de pesquisa, os procedimentos metodológicos e as estratégias

adotadas para realizar a coleta e análise dos dados nas bases do Banco Digital de Teses e

Dissertações (BDTD) e no Portal de Periódicos Capes.

Para elaboração de um trabalho que busca apresentar o estado da arte de determinado

campo, é necessário delimitar com clareza o objeto a ser investigado permitindo assim a

identificação de tendências, bem como a pluralidade de abordagens e trazem:

em comum o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários (FERREIRA, 2002).

38

Entretanto, deve-se ter o cuidado para que as conclusões não sejam um retrato limitado

do que de fato foi/é produzido em determinada área de pesquisa, uma vez que há a

possibilidade do levantamento poder ser realizado em diversas fontes como trabalhos em

anais, periódicos, entre outros. Sendo assim, apesar da relevância das Dissertações e Teses

selecionadas, a presente pesquisa não se propõe a esgotar as possibilidades de investigação de

lacunas, tendências e usos da temática “perfil conceitual”.

O caminho percorrido para desenvolver o Estado do Conhecimento, apresentado com

detalhes neste capítulo, realizou-se, por meio de uma pesquisa teórico-bibliográfica. Para

tanto, foram desenvolvidas as etapas a seguir:

a) Levantamento documental;

b) Seleção dos trabalhos;

c) Leitura integral da produção que compõe a amostra;

d) Elaboração dos resumos das obras;

e) Análise dos aportes teóricos utilizados e das formas como os autores trabalharam

metodologicamente com a noção de perfil conceitual.

Na primeira etapa foi realizado o levantamento documental das dissertações de

mestrado e teses de doutorado disponibilizadas na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações.

Posteriormente a busca foi estendida ao acervo disponibilizado, na internet, no Banco de

Teses da CAPES, delimitando a buscas aos mesmos tipos de produção acadêmica. Dessa

maneira enfocamos em pesquisas defendidas nos Programas de Pós-Graduação credenciados

pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES/MEC).

Nas duas bases foi utilizado o termo “perfil conceitual” em qualquer parte do trabalho,

como um modo de identificar diferentes formas de uso para essa noção. Como já se sabe, com

base no referencial teórico apresentado nesta pesquisa, a construção do modelo de mudança

do perfil conceitual teve início em 1994 (MORTIMER, 1994), por isso não foi feita a

delimitação de um recorte temporal para busca, e a última verificação nos portais foi feita em

agosto de 2011. Com esses critérios buscou-se uma visão mais ampla da produção

bibliográfica sobre o assunto em diversas áreas do conhecimento e assim, seria possível ter

acesso a toda produção sobre o tema desde a sua origem até o momento presente.

Como a busca foi feita em todas as partes dos trabalhos, foi necessário realizar uma

análise prévia dos resultados, para que fosse possível diagnosticar em que área do

conhecimento o conceito estaria sendo utilizado. Após a classificação, foram excluídas das

análises as pesquisas que não tratavam de temas relacionados à Educação em Ciências ou

simplesmente à Educação. Nas análises buscou-se destacar a questão central de pesquisa do

39

trabalho e demonstrar de que forma o referencial foi utilizado (teórica e metodologicamente).

Entretanto, como a busca bibliográfica realizada teve como enfoque apenas dissertações e

teses, esse levantamento compõe um recorte restrito e por consequência pode limitar algumas

conclusões obtidas.

40

IV. RESULTADOS

Em acordo com os parâmetros descritos anteriormente, a busca realizada no Portal

Capes retornou 21 Dissertações e oito Teses, enquanto que a BDTD indicou oito Dissertações

e sete Teses. Como alguns dos trabalhos são comuns às duas bases, nesta primeira etapa

foram obtidas 24 dissertações e nove teses, conforme pode ser observado na Tabela 1 e na

Tabela 2 respectivamente.

Após uma leitura preliminar dos resumos das dissertações e teses encontradas, foram

excluídos das análises os trabalhos que não tratavam diretamente de temas relacionados à

Educação ou à Educação em Ciências (Ensino Fundamental, quando relacionado à Biologia)

ou Biologia. Assim o espaço amostral a ser analisado com maior aprofundamento passou a ser

de seis dissertações e duas teses (conforme indicado nas Tabelas 1 e 2).

A dissertação de Valéria Regina Salla de Oliveira (“ Impactos cumulativos na

avaliação de impactos ambientais: fundamentação, metodologia, legislação, análise de

experiências e formas de abordagem”) e a tese de Getúlio Targino Lima (“Propriedade: crise

e reconstrução de um perfil conceitual.”) apareceram como resultado da busca pelo termo

“perfil conceitual” nas duas bases pesquisadas. O primeiro é da área de Engenharia e a

palavra-chave é encontrada apenas no resumo. O segundo é de Direito e ela foi utilizado pelo

autor para expor um ponto de vista. Nos dois casos foi feito o uso sem que houvesse qualquer

ligação com a noção de perfil conceitual proposta por Mortimer (1995) e assim, sem relação

com a presente pesquisa. Por conta disso, embora esses trabalhos apareçam listados na Tabela

1 e na Tabela 2, respectivamente, eles não entrarão em nenhuma análise posterior.

41

Tabela 1: Título da dissertação, autor, ano, área da pesquisa e instituição de defesa do trabalho retornado pela busca, fonte do resultado e se foi selecionado ou não.

Título da Dissertação Autor Ano Área Instituição Fonte Selec.

A evolução de ideias de alunos de 1º Ano de Ensino Médio sobre

transformação química em um processo de

ensino construtivista

Maria Inês de Freitas P. dos Santos

Rosa

1996 Química Universidade Estadual de Campinas

BDTD

A aquisição do conceito de função: perfil das imagens produzidas

pelos alunos

Airton Carrião

Machado 1998 Matemática

Universidade Federal de

Minas Gerais Capes

Contribuições da experimentação para o processo da evolução

conceitual no ensino de química

Adjane da Costa

Tourinho e Silva

2000 Química Universidade

Federal de Sergipe

Capes

Concepções epistemológicas de

ciência entre estudantes universitários: um

estudo de caso.

Cláudio Eduardo Badaró

2001 Epistemologia

Universidade Est. Paulista

Júlio de Mesquita

Filho/Bauru

Capes

Perfil conceitual: trabalhando a

concepção de matéria e estados físicos dos

materiais com alunos e alunas do ensino médio

Maria Bernadete de Melo Cunha

2003 Física Universidade Federal Da

Bahia Capes

Modelagem e simulação computacional no

estudo de gases ideais e reais

Osvaldo Balen

2004 Física Universidade Luterana do

Brasil Capes

O perfil conceitual de biodiversidade: do

professor-formador ao professor de biologia em

serviço

Leonardo Basso de Oliveira

2005 Biologia Universidade de São Paulo

Capes X

Relatividade restrita no início do ensino médio: elaboração e análise de

uma proposta

Ricardo Avelar

Sotomaior Karam

2005 Física

Universidade Federal de

Santa Catarina

Capes

Atividades curtas multi-abordagem no ensino médio: a dependência sensível às condições

iniciais da teoria do caos determinístico

Soraya Noriko Uema

2005 Física Universidade de São Paulo

Capes

O conceito de força na física - evolução histórica e perfil

conceitual

Tane da Silva Radé

2005 Física Universidade Luterana do

Brasil Capes

42

O perfil conceitual de vida: ampliando as

ferramentas metodológicas para sua

investigação

Fabio Augusto

Rodrigues e Silva

2006 Biologia Universidade

Federal de Minas Gerais

Capes / BDTD

X

Os nutrientes e a produção de energia:

descrição e avaliação de uma proposta

investigativa de ensino

Fernanda de Souza Silva

2006 Bioquímica Universidade Federal do

Rio de Janeiro Capes

Concepções cotidianas e científicas sobre

competição na educação de jovens e adultos

Jeedir Rodrigues de Jesus Gomes

2006 Biologia Universidade Federal do

Pará

Capes / BDTD

X

A construção de conceitos relacionados

com os movimentos terra-lua-sol por alunos da E.J.A. à luz da teoria

histórico-cultural

José Alexandre da Silva Valente

2007 Ciências Universidade Federal do

Pará

Capes / BDTD

Física para uma discriminação auditiva

Patricia Weishaupt

Bastos 2007 Física

Universidade de São Paulo

Capes

Uma proposta de levantamento de perfis conceituais de ensinar e

aprender

Esdras Viggiano de

Souza 2008 Educação

Universidade de São Paulo

Capes / BDTD

X

Maré, mangue ou manguezal: uma análise

de concepções de estudantes no ensino

fundamental

Karla Maria Euzebio da

Silva 2008 Biologia

Universidade Federal Rural

de Pernambuco

Capes X

De pedaços a partes, de partes a relações, de relações a número: a

evolução conceitual do número fracionário

Semiramis Coleho da

Silva Guabiraba

2008 Matemática Universidade Luterana do

Brasil Capes

Impactos cumulativos na avaliação de

impactos ambientais: fundamentação,

metodologia, legislação, análise de experiências e formas de abordagem

Valéria Regina Salla de Oliveira

2008 Engenharia Universidade

Federal de São Carlos

Capes / BDTD

Energia no ensino fundamental: o livro

didático e as concepções alternativas

Vinicius Jacques

2008 Física

Universidade Federal de

Santa Catarina

Capes

O conceito de energia na física – evolução

histórica e perfil conceitual

Aline César Druzian

2009 Física Universidade Luterana do

Brasil Capes

43

Redimensionando a noção de aprendizagem nas relações entre perfil conceitual e abordagem sócio-cultural-histórica

Andre Machado Rodrigues

2009 Física Universidade de São Paulo

Capes

Ensino de ciências: uma proposta para adequar

o conhecimento ao cotidiano - enfoque

sobre a água

Catiane Medeiros Emerich

2010 Ciências (EF)

Universidade Federal do Rio Grande

do Sul

BDTD X

A noção de referencial: uma interação cognitiva

entre a mecânica newtoniana e a

relativística

Lisete Funari Dias

2010 Física

Universidade Federal do Rio Grande

do Sul

BDTD

Tabela 2: Título da tese, autor, ano, área da pesquisa e instituição de defesa do trabalho retornado pela busca, fonte do resultado e se foi selecionado ou não.

Título da Tese Autor Ano Área Instituição Fonte Selec.

Evolução do atomismo em sala de aula: mudança

de perfis conceituais.

Eduardo Fleury

Mortimer 1994 Química Universidade

de São Paulo Capes

O funcionamento de textos divergentes sobre energia com alunos de

física

Jose Luis Michinel Machado

2001 Física Universidade Estadual de Campinas

BDTD

A licenciatura em química da UFBA:

epistemologia, currículo e prática docente

Soraia Freaza Lôbo

2004 Química Universidade Federal da

Bahia

Capes / BDTD

Perfil conceitual para a segunda lei da

termodinâmica aplicada as transformações

químicas: a dinâmica discursiva em uma sala de aula de química do ensino

médio

Edenia Maria

Ribeiro do Amaral

2004 Física Universidade

Federal de Minas Gerais

Capes

Construção de um perfil conceitual de vida

Francisco Ângelo

Coutinho 2005 Biologia

Universidade Federal de

Minas Gerais

Capes / BDTD X

Propriedade: crise e reconstrução de um perfil

conceitual.

Getúlio Targino

Lima 2006 Direito

Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo

Capes / BDTD

44

Sobre harmonia: uma proposta de perfil

conceitual

Fabio Adour da Camara

2008 Música Universidade

Federal de Minas Gerais

Capes / BDTD

Aprendendo a ensinar matemática nas séries

iniciais do ensino fundamental

Tania Teresinha

Bruns Zimer

2008 Matemática Universidade de São Paulo

Capes / BDTD

Perfil conceitual de morte e a abordagem do ciclo da

vida, no ensino de ciências

Aline Andreia Nicolli

2009 Ciências

(EF)

Universidade Federal de

Minas Gerais

Capes / BDTD

X

No levantamento ficou evidente a superioridade numérica de dissertações e teses que

trabalham com a noção de perfil conceitual nas áreas das Ciências Físicas, Químicas e

Biológicas, representando mais de 70% dos trabalhos apresentados (Figura 3 e Figura 4).

Entre as dissertações, destaca-se o quantitativo de trabalhos na área de Física, que

corresponde a cerca de 40% dos trabalhos retornados pela busca nos bancos de dados

pesquisados.

Figura 3: Frequência de ocorrência de dissertações por área de pesquisa.

Física45%

Biologia18%

Ciências9%

Química9%

Matemática9%

Educação5%

Epistemologia5%

45

Figura 4: Frequência de ocorrência de teses por área de pesquisa.

Física25%

Química25%

Biologia25%

Matemática12%

Música13%

É notável a predominância dos trabalhos produzidos em instituições de Ensino

Superior da região sudeste do Brasil (Figura 5 e Figura 6). No caso das dissertações, a

predominância das produções é encontrada no estado de São Paulo (com quase 40%). Já entre

as teses, o destaque fica para a UFMG com metade das produções.

Figura 5: Frequência de ocorrência de dissertações por instituição de ensino.

USP27%

UNICAMP4%

UNESP4%

UFMG7%

UFRJ4%

ULBRA19%

UFRGS7%

UFSC8%

UFSE4%

UFBA4%

UFPA8%

UFRPE4%

46

Figura 6: Frequência de ocorrência de teses por instituição de ensino.

USP25%

UNICAMP12%

UFBA13%

UFMG50%

A partir dos resultados da busca pode-se perceber que, como era de se esperar,

Mortimer (1994) produziu a primeira tese sobre o assunto e outras só vieram a partir da

década seguinte. Além disso, como exposto na Figura 7, houve um importante incremento no

número de dissertações e teses que abordam a noção de perfil conceitual nos últimos anos.

Figura 7: Produção de dissertações e teses ao longo dos anos.

0

2

4

6

8

10

12

96-97-98 99-00-01 02-03-04 05-06-07 08-09-10

Núm

ero

de P

ublic

açõe

s

Triênio

47

IV.1. Resumos dos trabalhos

A partir da leitura dos trabalhos selecionados foram feitos resumos que permitissem ao

leitor, em linhas gerais, entender como os autores trabalharam o tema “Perfil Conceitual” em

suas obras com temas na área da Biologia. A análise começa pelas dissertações de mestrado,

seguindo para as teses de doutorado de acordo com o ano de publicação (em primeiro lugar as

mais antigas).

Nas análises serão priorizados os objetivos do estudo e a forma como a noção de perfil

conceitual foi utilizada nas pesquisas. Dessa maneira, buscando-se identificar como os autores

têm trabalhado teórica e metodologicamente com essa noção.

IV.1.1. Dissertações

Na dissertação de Leonardo Basso de Oliveira (OLIVEIRA, 2005), “As concepções de

biodiversidade: do professor-formador ao professor de Biologia em serviço”, o autor buscou

identificar os conceitos principais de biodiversidade dentro de uma perspectiva histórica e na

literatura científica (no contexto da Biologia). Outro objetivo era investigar o perfil conceitual

de biodiversidade que pesquisadores e professores (em formação, em serviço e formadores de

outros professores) tinham a respeito do tema.

Ele iniciou seu trabalho indicando a importância do estudo da biodiversidade e sua

relação com a educação, uma vez que seus diversos significados tornam-se mais presentes na

sociedade e o tema apresenta influência em aspectos econômicos, políticos, ecológicos e

éticos patrimoniais. O autor destacou alguns trabalhos que ilustram a preocupação

educacional associada ao tema e que ressaltam a importância desse conhecimento para o

público leigo como “forma de elevar o nível de educação ambiental e de consciência social

das gerações futuras” e para um desenvolvimento sustentável.

Segundo o autor, apesar do termo biodiversidade ter sido constituído dentro da

Biologia e dos professores considerarem o tema de grande valor social e científico, a

abordagem é feita de forma segmentada. Embora haja um esforço no currículo para

aprofundar o tema, o conteúdo é apenas apresentado à medida que os grandes grupos são

estudados, sem levar em consideração os processos evolutivos ou a relação com os ambientes

ou a sociedade.

A partir da demanda de gerar uma abordagem de ensino mais adequada, o trabalho

proposto buscou explicitar as noções de biodiversidade encontradas em diferentes contextos

48

(acadêmico, escolar e na sociedade). Para isso utilizou-se uma abordagem de pesquisa em

educação de caráter qualitativo, que teve início com uma revisão bibliográfica sobre

biodiversidade e entrevistas semiestruturadas com os sujeitos da pesquisa. A primeira etapa

tinha como objetivo identificar as concepções presentes na literatura e na segunda investigar

que conceitos estariam presentes nos professores de diferentes níveis de ensino.

A descrição das concepções e seus constituintes (contextos e referenciais) foi feita a

partir de quatro categorias de análise. A primeira delas tratava da forma como os sujeitos

definiam ou conceituavam biodiversidade dentro do contexto da Ciência, da academia e da

pesquisa. A outra se interessava por entender que outros referenciais, além do científico,

influenciaram a construção dos conceitos; a terceira buscava identificar a importância que a

biodiversidade tem para a sociedade; a última categoria tratava da forma como os professores

(formadores, em formação e em serviço) abordavam a biodiversidade no contexto do ensino

de Biologia, levando em consideração, dentre outras coisas, organização, conteúdos e

aspectos metodológicos.

A análise das respostas a essas categorias permitiu uma melhor compreensão

conceitual e serviu para identificar os diversos contextos em que a biodiversidade pode ser

abordada (pesquisa, ensino e social). Dentre outras coisas, o pesquisador identificou que a

abordagem integrada e contextualizada é mais comumente encontrada em situações de

pesquisa, enquanto que em situações de ensino isso não é tão frequente. Esse resultado

reforçou a ideia de que as concepções dos professores são influenciadas diretamente pelos

contextos e articuladas aos demais conceitos da Biologia.

Segundo o autor, apesar do trabalho realizado ter cumprido os objetivos propostos

inicialmente, ele não pode ser considerado finalizado, pois se trata de um tema polissêmico e

muito dependente do contexto em que o indivíduo está inserido. O mesmo sugere que a noção

de perfil conceitual (MORTIMER, 1995) pode ser uma boa ferramenta para auxiliar na

compreensão dessa diversidade de concepções em torno de um mesmo conceito. Ele indica

que esse seria um caminho de pesquisa com potencial de contribuir para a tomada de

consciência do tema por quem está estudando por conferir uma compreensão funcional dos

aspectos da biodiversidade. Apesar de destacar a importância e de conseguir levantar as

concepções dos sujeitos da pesquisa, o autor não conseguiu delimitar as zonas e nem

aprofundar sua pesquisa utilizando a noção de perfil conceitual.

49

Quadro 1: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Oliveira (2005) para o levantamento das concepções de “Biodiversidade”.

Coleta de dados

Pesquisa bibliográfica sobre Biodiversidade;

Análise de entrevistas realizadas por Oliveira (2001) com professores formadores na área de Ciências Biológicas;

Entrevistas com professores em formação inicial e em serviço na área de Ciências Biológicas.

Análise dos dados

Descritiva - buscando aspectos mais gerais dos significados dados à biodiversidade e seus contextos;

Crítica - Contrapondo as respostas obtidas com as concepções encontradas na literatura.

O objetivo era identificar as relações entre as concepções de biodiversidade dos professores participantes e as da literatura.

Resultados da Literatura

Três categorias principais de concepções encontradas na literatura explicam a Biodiversidade: diversidade genética, a diversidade de organismos e a diversidade de ecossistemas (que podem ser utilizadas em conjunto ou isoladamente);

Outras duas também podem ser encontradas: diversidade de caracteres e a diversidade químico-molecular.

Resultados dos sujeitos

As categorias utilizadas pelos sujeitos da pesquisa relacionadas à sua área de atuação ou seus contextos de formação;

As entrevistas teriam favorecido a tomada de consciência pelos sujeitos dos seus respectivos perfis.

A segunda dissertação que será analisada foi produzida por Jeedir Rodrigues de Jesus

Gomes (GOMES, 2006), sob o título: “Concepções cotidianas e científicas sobre competição

na educação de jovens e adultos”. O pesquisador tinha como objetivo principal compreender

como as interações em sala de aula influenciavam a construção do conceito de competição.

Para isso ele se propôs a caracterizar e comparar as concepções de competição dos alunos de

uma turma antes, durante e após as aulas sobre Interações Ecológicas. A partir daí ele analisou

como alguns alunos participaram da construção do conceito que ocorreu a partir das

interações presentes em uma dinâmica de ensino e selecionou quatro alunos para analisar com

maior aprofundamento como se deu a elaboração conceitual durante uma sequência didática.

O trabalho teve início com a apresentação dos conceitos científicos sobre relações

ecológicas dando ênfase ao conceito biológico principal do seu trabalho: competição. Em

seguida apresentou a própria concepção de ciência, de educação, do ensino e do

50

conhecimento. Posteriormente ele apresentou ideia da Teoria Sócio-Histórica de Vygotsky

que se mostra de grande relevância para o trabalho de pesquisa em sala de aula.

A pesquisa foi realizada com alunos de um curso noturno destinado a jovens e adultos

que cursavam a 5ª e a 6ª série. Dois pré-testes foram aplicados aos grupos com o objetivo de

identificar algumas características socioculturais da amostra e as ideias que os alunos tinham

sobre o conceito de competição. Como no pré-teste 01 ele obteve respostas que levavam em

consideração apenas as relações do cotidiano entre pessoas, o pesquisador foi levado a tentar

uma segunda abordagem. Nessa vez ele exibiu imagens de vídeo que mostravam eventos de

competição que envolviam animais e plantas e posteriormente aplicou o chamado pré-teste

02, com questões abertas, das quais quatro relacionadas ao vídeo e uma que buscava

identificar se os alunos percebiam relação entre as imagens exibidas.

Após os pré-testes tiveram início as aulas de interações ecológicas, que foram

organizadas em sete momentos. O primeiro deles consistia em apresentar aulas sobre

interações ecológicas; o segundo foi a exibição de um documentário sobre diversas relações

entre os seres vivos, que tinha por objetivo ajudar os alunos a relacionar o conteúdo curricular

com suas concepções do cotidiano; o terceiro consistiu em reunir grupos de alunos e

devolver-lhes seus respectivos pré-testes 02 e reexibir as imagens (que já haviam sido usadas

no pré-teste) para que essas questões fossem respondidas novamente, só que dessa vez em

grupo (quarto momento); no quinto momento, um componente de cada grupo apresentou as

respostas desses grupos recombinados; em seguida foi realizada uma aula sobre competição

(sexto momento) e por último foram aplicados os pós-testes (que eram baseados nos pré-testes

01 e 02), para serem respondidos individualmente. As respostas dos estudantes ao pré-teste 02

foram organizadas em categorias, as quais foram confrontadas posteriormente com aquelas

provenientes do pós-teste 02.

Como resultado da intervenção didática, o pesquisador percebeu que tanto a

participação do professor quanto a interação entre os estudantes foram importantíssimos para

a construção do conhecimento científico por parte dos alunos. Isso não se deu por uma mera

substituição das ideias alternativas por científicas e sim por uma extensão de suas concepções

cotidianas, ou seja, novas ideias mais consistentes foram incorporadas ao longo das

atividades. Como não era um dos objetivos de seu trabalho, o pesquisador utilizou a noção de

perfil conceitual de forma simples; ele identificou a presença das zonas com diferentes graus

de complexidade, mas não aprofundou a discussão sobre quais eram e em que contextos elas

seriam aplicadas.

51

Diferentemente da anterior, a dissertação de Fábio Augusto Rodrigues e Silva

(SILVA, 2006), “O perfil conceitual de vida: ampliando as ferramentas metodológicas para

sua investigação”, aprofundou bastante a pesquisa sobre perfil conceitual. O objetivo

principal do trabalho era refinar a metodologia de obtenção de dados que foi utilizada na tese

de Coutinho (2005) (que será abordado com mais aprofundamento no tópico relacionado às

teses). Esse refinamento poderia contribuir para outras pesquisas sobre perfis conceituais que

utilizam questionários. Mais que isso, essas definições poderiam contribuir para que os

biólogos de diversas áreas pudessem aprofundar as teorias que caracterizam seus objetos de

estudo relacionados à “vida”, além de contribuir para o processo de ensino-aprendizagem por

ser um dos temas transversais da Biologia.

O trabalho foi iniciado com a apresentação da noção de perfil conceitual, discutindo

sua fundamentação teórica e dando exemplos de pesquisas que também utilizaram esse

referencial. Esses trabalhos citados apresentavam diversos objetivos e perspectivas, mas Silva

(2006) deu ênfase às diferentes estratégias metodológicas que foram empregadas para a

delimitação de zonas e construção de perfis.

Em seguida ele destacou a importância do conceito de vida para a pesquisa e

ensino/aprendizagem de Biologia. Para isso foi feito o levantamento histórico do conceito e

foram citadas pesquisas que abordam as concepções alternativas sobre o conceito. E, por ter

servido de base para a sua pesquisa, o autor também fez uma descrição detalhada das

considerações teóricas e metodológicas da tese de Coutinho (2005) que propôs um perfil

conceitual do conceito de vida.

Como a investigação de Silva (2006) foi constituída a partir da proposta de refinar a

metodologia utilizada por Coutinho (2005), o questionário e os resultados desse último foram

utilizados como norteadores. Assim, tomando por base as características das zonas do perfil

de vida e das situações-problema do trabalho de base, foi construído para sua pesquisa um

questionário contendo 12 perguntas discursivas, das quais duas tinham o objetivo de

identificar a escolaridade dos pais e as fontes de informações sobre Biologia dos respondentes

e 10 abordavam a temática “vida” em diferentes contextos. Mas como algumas apresentavam

subitens, cada questionário respondido gerou 18 respostas. Segundo o autor, esse formato de

questionário diferenciava-se do utilizado em outras pesquisas, principalmente por possuir um

elevado número de questões e por todas elas serem discursivas, gerando grande quantidade de

dados para serem analisados. Isso permitiria a expressão de um número maior de significados

(e zonas) para a construção de um perfil conceitual de vida, pois teria uma melhor capacidade

de gerar uma mobilização cognitiva dos participantes.

52

Esse questionário foi aplicado a 132 alunos de graduação dos cursos de Ciências

Biológicas e 105 de Farmácia (de diferentes períodos nos dois casos), com o objetivo de

comparar os perfis dos dois grupos e assim identificar possíveis diferenças entre os alunos de

Biologia e os de outros cursos da área de saúde. As questões foram respondidas

individualmente, sem a permissão de consultar fontes bibliográficas e os respondentes

levaram de 50 a 90 minutos para responder o questionário.

A partir daí o autor seguiu para a descrição das amostras, das formas de categorização

das respostas e da justificativa dos testes estatísticos utilizados para análise dos perfis, o que é

outra inovação da sua pesquisa. A descrição da amostra apresentou a sua composição (sexo,

idade, grau de escolaridade dos pais). Para categorizar as respostas, buscou identificar nelas o

(s) trecho (s) que evidenciaria (m) um modo de expressão característico de uma ou mais zonas

do perfil do conceito de vida (Externalismo, Internalismo e Relacional) (COUTINHO, 2005).

A consolidação dos dados foi feita a partir da seguinte estratégia: a cada zona acessada,

mesmo que mais de uma vez, seria atribuído o valor (1) e às não acessadas o valor (0). Essa

consolidação evitaria a distorção de alguns resultados, como ocorreu no trabalho tomado

como base, em que foi contabilizada a frequência de ocorrência de fragmentos característicos

das categorias expandidas. Essa distorção ocorria porque enquanto a zona Relacional

apresenta apenas uma categoria expandida, as outras duas, Internalista e Externalista,

apresentam três cada.

A consolidação das respostas dos 237 questionários permitiu a produção de escores

brutos que representam o número de vezes que cada aluno acessou uma das zonas que

compõem o perfil conceitual. Com base nas informações sobre os perfis individuais dos

estudantes foram construídos grupos de perfis de acordo com as semelhanças entre os acessos

às diversas zonas do perfil e também permitiu a identificação e comparação da evolução do

uso das zonas do perfil entre os diferentes cursos e períodos. Como forma de validar o uso

desses escores, foi utilizado um programa baseado nos pressupostos da Teoria de Resposta ao

Item (TRI).

O autor então apresenta uma breve descrição do que se seria a TRI e porque ele

deveria usá-la:

Segundo os princípios da TRI, os escores brutos seriam apenas valores observáveis de uma variável manifesta e quando se estimam habilidades ou proficiências, o interesse deve se voltar para as variáveis latentes que são responsáveis por todas as relações entre as variáveis manifestas. As variáveis latentes, como por exemplo, a intensidade de expressão de uma zona do perfil, não podem ser medidas diretamente, exigindo modelos matemáticos que fornecem uma escala intervalar que

53

permite a estimação da habilidade pesquisada (MARTINS, 2005). Essa escala intervalar pode ser produzida com o emprego de softwares desenvolvidos para análises via TRI e assume valores - ∞ e + ∞ (SILVA, 2006, p. 62).

A escala intervalar foi definida a partir de “escores de intensidade de expressão de uma zona”

que foram obtidos com o software GGUM 2004 (ROBERTS, 2004 e ROBERTS & CUI, 2004

apud SILVA, 2006).

Os dois tipos de escores fizeram parte do trabalho porque os escores brutos foram

utilizados na análise de Coutinho (2005). Assim seria possível estabelecer comparações entre

as duas pesquisas. Por sua vez, o uso dos escores produzidos a partir da TRI se justifica por

poder “contribuir para a produção de métodos mais eficientes para estimar o acesso dos

sujeitos as zonas do perfil conceitual e para o potencial de cada questão em acessar essas

zonas” (SILVA, 2006, p. 67).

Ambos os escores foram submetidos à análise de Clusters, com o objetivo de

pesquisar os padrões ou grupos de perfis mais comuns na amostra e a frequência de cada um

deles. Mesmo o perfil sendo de caráter individual, o autor considera que os grupos de perfis

são formados por participantes de níveis semelhantes de acesso às zonas do perfil. Esse tipo

de comparação permitiria observar se há diferenças entre os cursos e/ou ao longo de um

mesmo curso. Posteriormente,

os escores brutos e/ou de intensidade de expressão também passaram por outros testes estatísticos como de análise de variância, ANOVA I e II para o estudo da evolução das zonas do perfil nos cursos pesquisados. A ANOVA I possibilitou verificar se existem diferenças estatisticamente significativas na evolução das categorias do perfil do conceito de vida ao longo dos períodos dos dois cursos. A ANOVA II foi o teste utilizado para a comparação da evolução das zonas do perfil entre os dois cursos, permitindo inferir se os fatores curso e período estabelecem ou não diferenças significativas.

Nas respostas do novo questionário foi possível perceber entre os alunos, além da

grande diversidade de concepções sobre o conceito de vida, muitas situações nas quais eles

perceberam a heterogeneidade, as limitações e as lacunas de suas próprias concepções à

medida que se deparavam com obstáculos causados pelas situações novas e problemáticas

abordadas nas questões. Esse conjunto de fatores contribuiu para a tomada de consciência de

seus perfis, uma vez que afirmaram que os critérios, construídos seguindo suas concepções,

que foram utilizados para responder determinadas questões não puderam ser os mesmos para

responder outras.

54

As concepções foram então distribuídas nas diferentes zonas do perfil propostas por

Coutinho (2005), que se mostrou um artifício bastante eficiente na categorização das

respostas, por dar conta da grande diversidade dos significados do conceito de vida. Além das

zonas já identificadas, também foi possível a emersão de duas outras categorias não

identificadas no trabalho de base, autonomia e sistema, que podem contemplar outros modos

de expressão.

O questionário propiciou que o pesquisador tivesse acesso ao domínio microgenético

do conceito, fato esse que foi evidenciado pelas respostas das questões e por diálogos

estabelecidos entre os participantes durante a aplicação do questionário. A partir das questões,

também foi feito um estudo do potencial de estímulo que cada uma delas poderia gerar e foi

avaliado como a relação, entre os respondentes e as perguntas, contribuiu para a elaboração de

diferentes contextos para aplicação das concepções presentes no perfil conceitual de vida.

Todo esse material permitiu que fossem evidenciados os diferentes tipos de perfis

conceituais encontrados entre os alunos de Biologia e os de Farmácia, como esses perfis

evoluem ao longo dos períodos dos cursos e que diferenças há entre os grupos. Esse tipo de

desenvolvimento permitiu revelar como se processa a formação do conceito de vida e

correlacioná-los com os dados do processo de ensino/aprendizagem que ocorreu ao longo dos

cursos. Isso devido ao uso dos escores de intensidade de expressão que propiciaram melhor

separação entre os alunos de acordo com a intensidade de expressão e com o número de zonas

acessadas.

A metodologia utilizada se mostrou adequada e permitiu revelar duas categorias novas

(Autonomia e Sistema), além das já identificadas por Coutinho (2005), o que permitiria uma

expansão da abrangência da proposta inicial dele. Os questionários evidenciaram que os

respondentes tomavam consciência do seu próprio perfil à medida que o respondiam. Ainda

assim o autor não considera que tenha encerrado todas as questões relativas à noção de perfil

conceitual de vida nem sobre a metodologia de pesquisa na área. Então faz sugestões que

poderiam ser aplicados para um refinamento ainda maior da pesquisa. Dentre eles um

aprofundamento na pesquisa sobre o contexto dos sujeitos da pesquisa (filosofia e proposta

pedagógica do curso, perfil sociocultural) e os métodos estatísticos podem receber especial

atenção para contribuir com a construção das questões e análise dos dados.

55

Quadro 2: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Silva (2006) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Vida”.

Coleta de dados

Pesquisa bibliográfica sobre Vida;

Utilizou como base a pesquisa de Coutinho (2005);

Quali-quantitativa - Uso de questionários com alunos da graduação de Biologia e Farmácia.

Análise dos dados

Teoria de Resposta ao Item e análises estatísticas (Clusters, ANOVA I e II);

Análise qualitativa das respostas.

Resultados da Literatura Utilizou as três zonas identificadas por Coutinho (2005): Internalismo, Externalismo e Relacional.

Resultados dos sujeitos

Os questionários contribuíram para os respondentes tomarem consciência de seus perfis.

Além das três zonas identificadas por Coutinho (2005), foi possível encontrar mais duas zonas: Autonomia e Sistema.

A dissertação de Karla Maria Euzebio da Silva (SILVA, 2008), “Maré, mangue ou

manguezal: um estudo de concepções de estudantes no ensino fundamental”, também

mostrou uma abordagem diferente ao buscar a identificação das concepções de crianças (entre

sete e 11 anos) sobre o ecossistema do manguezal por meio da observação de uma intervenção

didática, embora não se propusesse a construir um perfil conceitual. Seu principal objetivo foi

investigar as principais concepções sobre manguezal que estavam presentes em uma turma do

Ensino Fundamental I e quais dessas poderiam coexistir ao longo do processo de

ensino/aprendizagem do conceito realizado com esse grupo. Para isso seriam utilizadas como

aportes teóricos a noção de perfil conceitual e a teoria de Vygotsky sobre a formação de

conceitos científicos.

Seu trabalho teve início com a apresentação de uma revisão bibliográfica de três

aspectos que serviram de ponto de partida para sua pesquisa. O primeiro deles é relacionado à

apresentação de um panorama e a análise das características do Ensino de Ciências no Ensino

Fundamental, o segundo trata da importância do ecossistema manguezal nas questões

socioculturais do grupo de alunos pesquisados e sua presença na pesquisa em Ensino de

Ciências. Por último, a autora desenvolve uma discussão sobre a relação que há entre a

enculturação e a contextualização sociocultural no Ensino de Ciências para construção dos

56

diversos significados que as crianças podem desenvolver na escola (a partir da apresentação

de alguns trabalhos).

Em seguida a autora procurou descrever os elementos da formação de significados,

explorar a importância do estudo das concepções alternativas no processo de construção dos

conceitos científicos e de como essas devem ser abordadas na perspectiva da educação

científica. Para isso fez uma descrição dos elementos centrais dos dois aportes teóricos que ela

utilizou em sua pesquisa: (I) a noção de perfil conceitual e (II) questões de formação de

conceitos e aprendizagem pautados nas teorias de Vygotsky (inclusive do papel dos desenhos

infantis).

Também buscou fundamentar o manguezal como um conceito a partir das dimensões

históricas (contemporânea e na história e cultura brasileira) e epistemológicas. Dessa maneira

seria possível analisar o uso das concepções espontâneas sobre esse conceito, de acordo com

cada contexto no discurso de sala de aula.

Assim, estamos conscientes de que as crianças poderão expressar ideias nas quais foram identificadas nuances de uma ou de outra visão epistemológica que não são nitidamente separadas. Além disso, um resgate histórico de tais concepções orienta algumas possibilidades de identificação do compromisso epistemológico que pode estar implicado em algumas dessas concepções (SILVA, 2008 p. 71).

Mas não estava previsto como objetivo analisar as relações entre as visões históricas e as

atuais relativas ao manguezal. Buscava-se apenas identificar que compromissos

epistemológicos eram compartilhados por ambas e então estruturar as concepções sobre

manguezais.

Desse estudo, participaram os alunos de uma escola localizada próxima a uma região

de manguezal, na qual muitos deles moravam. Eles, embora estivessem na mesma série

escolar, apresentavam níveis diferentes de alfabetização. Como forma de obter dados

empíricos sobre o tema para sua pesquisa, a autora buscou um desenho metodológico de

caráter, prioritariamente, qualitativo com características de uma etnografia exploratória e de

observação participante. Dessa maneira, pode-se dizer que além da revisão da literatura

utilizada para criar uma estruturação de concepções sobre manguezais, a autora empregou

outros procedimentos para o desenvolvimento de sua pesquisa e obtenção dos dados. Dentre

eles é possível destacar a realização de um estudo piloto, a observação das atividades

realizadas na sala de aula e a construção e posterior desenvolvimento de uma sequência

didática com os sujeitos da pesquisa.

57

A realização do estudo piloto foi feita com estudantes de uma escola pública (diferente

da que participou do estudo definitivo), igualmente inserida no contexto sociocultural do

manguezal, mas com estudantes de faixa etária entre cinco e sete anos de idade, pertencentes

ao primeiro ano do primeiro segmento do Ensino Fundamental. Fizeram parte desse estudo a

realização de uma entrevista semi-estruturada com um grupo de crianças na sala de aula e a

solicitação de que fossem feitos desenhos relativos ao manguezal, com o objetivo de

investigar as concepções apresentadas pelas crianças. Esses resultados serviriam de base para

avaliar alguns aspectos teórico-metodológicos que possibilitassem a elaboração de uma

sequência didática que atendesse aos objetivos priorizados pela pesquisadora. Assim, fez-se

uma análise inicial das concepções dos alunos sobre o tema.

A partir desses dados e de conversas com pesquisadores e com professores, da área foi

construída uma sequência didática (dividida em quatro etapas). Ela apresentava como

objetivos principais identificar as concepções das crianças a respeito do manguezal e

contribuir para a construção de uma conceituação científica de manguezal (correspondente ao

nível de formação dos alunos), para que fosse possível analisar todo o processo de ensino-

aprendizagem e assim acompanhar eventuais mudanças ao longo desse processo.

Posteriormente a autora analisou as interações discursivas ocorridas na sala de aula,

que contou com algumas intervenções da pesquisadora ao longo das atividades. Todo

processo foi gravado para permitir uma posterior análise da dinâmica discursiva. Por

considerar que o discurso tem grande importância na construção do conceito na aula, a

construção das estruturas analíticas foi realizada com base na etnografia interacional, que

“procura compreender como a vida na sala de aula é construída discursivamente pelos

participantes por meio de suas interações verbais e não-verbais e, como nesse processo, são

construídas as oportunidades de aprendizagem para os diferentes estudantes” (SILVA, 2008,

p. 86). Já a análise dos enunciados identificados foi baseada na teoria da enunciação de

Bakhtin e nas ideias de Vygotsky sobre linguagem.

A pesquisadora pôde perceber que ao longo da sequência didática houve uma evolução

das concepções das crianças para uma linguagem mais científica, daí a importância de se

iniciar o trabalho com conceitos científicos desde os primeiros anos de escolarização e da

escola na construção e mediação entre os saberes científicos e culturais. Ela também

identificou que há aproximação em alguns aspectos entre o discurso utilizado pelas crianças e

a epistemologia dos conceitos de manguezal e ecossistema.

Mesmo que não fosse um dos objetivos da pesquisa construir uma proposta de perfil

conceitual, a autora identificou uma aproximação entre as concepções dos estudantes às zonas

58

de um perfil conceitual: os alunos utilizavam prioritariamente as zonas próximas do realismo

ingênuo e do empirismo. Segundo a autora, mesmo tendo realizado um levantamento

bibliográfico sobre a história do conceito e investigado aspectos da sala de aula e os

resultados indicarem convergências para possíveis zonas de perfil, os dados não foram

considerados suficientes para serem utilizados na constituição de um perfil de manguezal. Ela

sugere então que as concepções precisam “ser investigadas em diferentes níveis de ensino a

partir de um aprofundamento na epistemologia de ecossistemas e manguezais, a fim de

averiguar a possibilidade de enquadramento do manguezal como uma ontodefinição”

(SILVA, 2008, p. 139).

Quadro 3: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Silva (2008) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Manguezal”.

Coleta de dados

Pesquisa bibliográfica sobre Manguezal e sua relação com aspectos históricos e culturais;

Qualitativa de caráter etnográfico com observação participante: Realização de uma sequência didática com alunos do 2º ano do Ensino Fundamental (7 a 11 anos).

Análise dos dados Análise da interação discursiva utilizando o aporte teórico de Bakhtin e Vygotsky;

Resultados da Literatura e dos Sujeitos

Apesar de algumas convergências para possíveis zonas, não foi possível identificá-las.

Sugere que uma pesquisa mais aprofundada e a utilização de participantes de outros níveis de ensino para verificar a possibilidade de enquadrar manguezal como uma ontodefinição.

De forma diferente do trabalho de Silva (2008), que foi apresentado anteriormente,

Esdras Viggiano Souza (VIGGIANO, 2008) em sua dissertação, “Uma proposta de

Levantamento de perfis conceituais de ensinar e aprender”, apresentou como objetivo a

construção de um instrumento metodológico que permitisse levantar os perfis conceituais de

estudantes de um curso de Licenciatura em Física. Os perfis conceituais a serem investigados

fazem parte de conceitos diretamente ligados à Educação: o de ensinar e de aprender. O autor

destaca sua expectativa de que esse trabalho possa contribuir para a estruturação de cursos de

formação de professores e que o conhecimento dos perfis aumente a percepção de que a

59

prática docente vai além do conteúdo específico da disciplina e que é constituída por outros

saberes como psicologia, filosofia, entre outros.

O autor iniciou seu trabalho com uma descrição do referencial teórico sobre perfil

conceitual, por ser o tema central da pesquisa. O ponto de partida para apresentação do

referencial foi o modelo de mudança conceitual, passando para a noção de perfil conceitual

proposta por Mortimer (1995, 1996 e 2000) e apresentando outras formas como alguns

autores têm utilizado essa noção. Ao longo desse caminho o pesquisador destacou a

importância do contexto na elaboração dos significados e então buscou relacionar a noção de

perfil conceitual com o contexto. Para isso o autor propõe a interlocução entre a noção

proposta por Mortimer, a relação entre significado e contexto proposta por Bernstein (1996) e

as ideias da teoria da psicologia histórico-cultural de Vygotsky, dando origem ao que foi

denominado de “perfil conceitual complexo”. Essa noção parte do entendimento de que os

perfis conceituais são influenciados e são compostos por outros perfis em diferentes escalas

hierárquicas, sendo assim demandam maior refinamento dos métodos de medição dos perfis e

sua evolução.

Como forma de estabelecer uma primeira identificação e caracterização de categorias

que permitam a construção das zonas do perfil conceitual de ensinar e aprender e seus

contextos de utilização, o autor também fez um levantamento bibliográfico das concepções

dos estudantes sobre o tema. Esse procedimento permitiu a elaboração de um esquema que

serviu para a criação de questões delimitadoras de contexto. Além disso, foi possível

identificar duas zonas (autoritária, dialógica) e uma categoria (amalgamada) que pode indicar

uma outra zona que não pôde ser assumida como tal, possivelmente por conta de limitações

do recorte estabelecido na pesquisa.

Como o grupo que foi objeto de estudo era relativamente grande, o tempo usado para a

coleta dos dados de cada indivíduo deveria ser minimizado, mas o instrumento deveria ser

eficiente para expressar o perfil conceitual dos estudantes e seus respectivos contextos de

utilização. Para isso se fez a opção de utilizar um questionário auto-administrável (BABBIE,

2003 apud VIGGIANO, 2008) que permite o aprofundamento adequado, sem a necessidade

de entrevistas individuais; “o instrumento proposto deve ser capaz de delimitar alguns

contextos, e ao mesmo tempo, permitir que se revelem outros não considerados a priori”

(VIGGIANO, 2008, p. 79).

O questionário tinha 45 perguntas (23 sobre aprender e 22 sobre ensinar), e levava em

consideração diversas dimensões relacionadas ao contexto. As respostas foram analisadas a

partir de termos característicos de uma das três categorias estabelecidas. Segundo o autor

60

apenas duas delas poderiam ser consideradas zonas, pois a terceira engloba as respostas em

que não foi possível identificar elementos que a caracterizassem como uma zona ou que

correspondesse a mais de uma simultaneamente. Isso pode ter ocorrido por uma limitação dos

dados ou dos critérios estabelecidos, ou ainda indicar a existência de uma zona que não foi

observada pelo recorte de pesquisa realizado. As respostas foram contabilizadas e foi utilizada

estatística descritiva básica (e exploratória) para procurar relações entre as zonas de aprender

e ensinar.

O grupo pesquisado era composto por 40 alunos do curso de licenciatura em Física da

Universidade de São Paulo (e que no momento da participação na pesquisa cursavam uma

disciplina obrigatória do curso). Além de suas concepções, foram coletadas informações

pessoais como religião, sexo, turno em que cursa a faculdade, se já leciona (e há quanto

tempo).

A partir de suas investigações, pesquisador identificou:

a existência de um perfil conceitual de ensinar-aprender mais complexo que os perfis de ensinar e aprender. Além disso, a relação entre os perfis conceituais pode ser coerente, ou seja, zonas equivalentes são utilizadas em questões que levam a contextos similares. Ou pode ser incoerente, o contexto leva a utilização de zonas distintas em cada um dos perfis conceituais menos complexos (VIGGIANO, 2008, p. 188).

Além disso, foi possível perceber que o instrumento desenvolvido foi eficiente na

identificação das zonas utilizadas nos diversos contextos e que se fosse aplicado em outros

momentos do curso permitiria também observar a evolução dos perfis.

Quadro 4: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Viggiano (2008) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Ensinar” e “Aprender”.

Coleta de dados

Pesquisa bibliográfica sobre os conceitos de Ensinar e Aprender;

Uso de questionários (45 questões distribuídas em quatro modelos) com alunos da Licenciatura em Física.

Análise dos dados Análise qualitativa das respostas – estatística descritiva para comparar os perfis conceituais de Ensinar e Aprender;

Resultados da Literatura

Serviu para delineamento dos planos filogenéticos, ontogenéticos e sociogenéticos do conceito.

Duas zonas (autoritária, dialógica) e uma categoria identificadas (amalgamada).

61

Resultados dos sujeitos

As categorias apontadas pela literatura são úteis, mas não expõem toda complexidade do tema;

As zonas do perfil conceitual de ensinar têm reflexo no perfil de aprender;

Sujeitos acessam zonas diferentes para responder questões semelhantes, nas quais o contexto é alterado (ensinar ou aprender);

Perfil conceitual de ensinar-aprender – perfil conceitual de perfis conceituais menos complexos (de ensinar e de aprender), com hierarquia superior.

A última dissertação a ser analisada foi escrita por Catiane Medeiros Emerich

(EMERICH, 2010), com o título “Ensino de ciências: uma proposta para adequar o

conhecimento ao cotidiano – enfoque sobre a água” . Ela buscou investigar a relação entre as

concepções prévias e o conhecimento científico sobre conceitos associados à água (como

matéria, massa e energia), de alunos de duas turmas de 6º Ano do Ensino Fundamental.

Seu trabalho teve início com uma revisão bibliográfica sobre concepções prévias e sua

relação com aprendizagem e como estas são tratadas de acordo com o modelo de mudança

conceitual e com a noção de perfil conceitual. A autora também buscou ilustrar como se daria

um melhor entendimento de alguns conceitos científicos (como matéria, massa e energia) na

escola, a partir de alguns trabalhos. Adicionalmente, como parte do referencial teórico sobre

aprendizagem utilizado em sua dissertação, foi feita a apresentação do referencial piagetiano,

dando ênfase no período operacional-concreto, uma vez que os sujeitos que participaram do

estudo de caso tinham, em média, 10 anos de idade.

O estudo de caso desenvolvido na pesquisa teve a participação de duas turmas de 5ª

série do Ensino Fundamental, uma delas com 30 e a outra com 28 alunos. A primeira etapa da

atividade consistia em analisar as concepções prévias dos estudantes sobre conceitos

relacionados à água, utilizando-se um questionário composto por sete perguntas objetivas. Em

seguida foi iniciado o segundo momento da atividade no qual foram desenvolvidas atividades

experimentais e uma saída de campo (para uma estação de tratamento de água). Para finalizar

o estudo de caso, os alunos elaboraram um relatório sobre as atividades desenvolvidas ao

longo do processo, incluindo os experimentos e a saída de campo. Os dados foram analisados

a partir de uma perspectiva quali-quantitativa com base em uma análise de conteúdo, visando

uma interpretação apurada das construções dos estudantes.

62

A pesquisadora destaca que havia uma crença de que a utilização de experimentos

empíricos permitiria que os alunos substituíssem as concepções alternativas pelas científicas,

mas que ao longo do processo ela identificou que a mudança conceitual não ocorreu. De fato,

suas próprias concepções sobre a pesquisa foram reformuladas, mas ela destaca que apesar da

dinâmica adotada não contribuir para os alunos construírem novos conceitos científicos, a

mesma contribuiu para aproximar esses conceitos do cotidiano dos estudantes.

Segundo a autora, ficou mais evidente que com o uso dos diferentes instrumentos ela

pôde perceber a evolução do perfil conceitual dos estudantes com ideias mais complexas do

que no início da atividade. Apesar disso, não foi possível delimitar as zonas desse perfil e

como não houve um aprofundamento no perfil conceitual de água em sua pesquisa, a autora

relata o interesse de realizar investigações sobre perfis conceituais de conceitos relativos ao

Ensino de Ciências.

IV.1.2. Teses

Das sete teses identificadas no levantamento inicial sobre a noção de perfil conceitual

apenas duas relacionavam esse tema com temas ligados à Biologia. Não foi possível

identificar nenhuma relacionada diretamente com questões ligadas à Educação.

A primeira a ser apresentada foi desenvolvida por Francisco Ângelo Coutinho

(COUTINHO, 2005), sob o título “Construção de Um Perfil Conceitual de Vida”. Seu

objetivo com a pesquisa, como o próprio título já indica, era determinar as zonas que

compunham o perfil conceitual para o conceito de vida. Seu trabalho teve início com a

descrição da importância da noção de perfil conceitual para ensino/aprendizagem de temas

relacionados às Ciências. Isso foi exposto a partir de uma descrição histórica da busca pela

metodologia mais eficiente para o ensino de conceitos científicos, passando por pesquisas

desenvolvidas sobre concepções alternativas, mudança conceitual até chegar à noção proposta

por Mortimer.

Para a construção das zonas, o autor aplicou um questionário com quatro questões e

uma entrevista elaborada a partir de situações-problema. O primeiro instrumento foi utilizado

com estudantes de diferentes períodos do curso superior de Biologia e permitiria um

aprofundamento da análise do domínio ontogenético, uma vez que possibilita a observação

das mudanças no perfil conceitual ao longo do curso. Já as entrevistas foram realizadas com

estudantes de pós-graduação em ecologia e em genética, acreditando que elas poderiam

63

indicar o domínio microgenético, uma vez que trata de uma elaboração conceitual em um

período curto de tempo a partir de cursos que apresentam formas diferentes de lidar com seres

vivos. Sobre essas possíveis definições de vida, o autor desenvolve um capítulo que, com uma

vasta revisão histórica, procura ilustrar algumas discussões em torno dessa temática e a

dificuldade de se encontrar uma definição eficiente ao longo da história. Em seguida o autor

parte para a discussão da concepção de vida na literatura relacionada à Educação em Ciências.

Baseado nos resultados dos questionários e em noções identificadas anteriormente na

bibliografia sobre o conceito de vida o autor percebeu sete categorias que poderiam ser

consideradas categorias do perfil desse conceito. Com o aprofundamento da pesquisa, essas

categorias passaram e a ser consideradas zonas expandidas e posteriormente algumas delas

foram agrupadas em três zonas reduzidas, que seriam as utilizadas no trabalho: externalismo,

internalismo e relacional (Quadro 5). Tentando entender a evolução conceitual identificada na

pesquisa, o autor partiu também para a análise dos livros e de manuais de formação utilizados

no curso pesquisado.

Quadro 5: Redução das categorias identificadas por Coutinho (2005).

Os questionários permitiram a emergência dos perfis e a partir desses dados o autor

elaborou o perfil conceitual característico dos alunos de cada período. De fato os resultados

comprovaram a hipótese inicial e permitiram que se identificasse a evolução dos conceitos ao

longo do curso. Já as entrevistas ratificaram e permitiram maior aprofundamento da

investigação das zonas já identificadas, além de apontar a existência de mais duas categorias.

As entrevistas ofereceram aos participantes a possibilidade da tomada de consciência dos seus

64

respectivos perfis e assim a utilização de outras zonas. Aparentemente os questionários não

possibilitaram uma dispersão conceitual como a encontrada nas entrevistas porque os perfis

ficaram diretamente ligados aos contextos estabelecidos pelas questões. O conjunto de

resultados obtidos permite inferir que os questionários foram eficientes no levantamento das

concepções dos participantes, mas não suficientes por limitar os contextos de uso das zonas.

Sendo assim as entrevistas se mostraram um bom instrumento complementar ao fornecer

novos contextos e consequentemente a possibilidade da tomada de consciência e da emersão

de novas zonas.

Quadro 6: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Coutinho (2005) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Vida”.

Coleta de dados

Revisão bibiográfica sobre a história do conceito de Vida;

Uso de questionário com alunos de diferentes períodos do curso de Biologia;

Entrevistas com situações problema com a participação de alunos da pós-graduação em Ecologia e Genética.

Análise dos dados Jogo dialógico entre a literatura e os dados empíricos.

Resultados da Literatura e dos Sujeitos

Sete categorias identificadas e agrupadas em três zonas identificadas: Internalismo, Externalismo e Relacional.

Identificação dos perfis conceituais dos participantes da pesquisa;

As entrevistas contribuíram para os sujeitos tomarem consciência dos seus respectivos perfis.

A última tese a ser apresenta foi desenvolvida pela pesquisadora Aline Andréia Nicolli

(NICOLLI, 2009), sob o título “Perfil conceitual de morte e a abordagem pedagógica do

ciclo de vida, no ensino de ciências”. A pesquisa teve como objetivos principais a construção

de um perfil conceitual de morte e investigar como a abordagem pedagógica da temática

“Ciclo de Vida” interferia nas zonas desse perfil. Buscou-se então “compreender a influência

dessa abordagem para a construção ou tomada de consciência, pelos alunos, das diferentes

zonas de um Perfil Conceitual de Morte” (NICOLLI, 2009, p. 14).

Sua pesquisa apresentou um caráter primordialmente qualitativo e teve início com um

levantamento bibliográfico sobre a história do conceito de morte, desde a antiguidade até a

atualidade. Em seguida foram descritas algumas formas de conceituação dela em diferentes

áreas do conhecimento (Biologia, Medicina, Sociologia, Filosofia e Psicologia), assim como

65

em algumas culturas (indígena e africana) e sistemas religiosos (hinduísmo, budismo,

judaísmo, cristianismo, espiritismo e islamismo). Adicionalmente, foram utilizados aportes

teóricos de autores que apresentam conceituações de morte (e de Vida) e são comumente

abordados no meio acadêmico.

Para a coleta dos dados referentes aos perfis dos participantes da pesquisa foi

elaborado um questionário composto por seis questões abertas que expressavam situações-

problema. Elas foram elaboradas a partir da análise de dois dos trabalhos já apresentados

anteriormente, mas que buscavam identificar as diferentes zonas do perfil conceitual de vida:

Coutinho (2005) e Silva (2006). A primeira questão tinha o objetivo de permitir uma

expressão livre do sujeito sobre o tema e as outras criavam uma contextualização que

estimulasse os alunos a refletir sobre quadros específicos. Antes desse questionário definitivo

foi aplicado um “questionário piloto” composto por cinco questões que sofreram algumas

alterações. Essa modificação foi motivada pela percepção de que houve lacunas nos

resultados obtidos com o primeiro questionário, que comprometeriam o desenvolvimento da

pesquisa.

O questionário definitivo foi aplicado a alunos de duas turmas da sétima série do

Ensino Fundamental e a estudantes do Ensino Superior que cursavam Ciências Biológicas,

Ciências Sociais, Medicina e Pedagogia. A amostra foi composta por estudantes dos primeiro,

terceiro e quinto períodos nos dois primeiros cursos e, adicionalmente, nos dois últimos,

participaram também os do sétimo período. Essa abordagem gerou um grupo amostral de

mais de 360 respondentes.

As análises teóricas permitiram a identificação de três categorias, que foram

posteriormente consideradas zonas do perfil conceitual: Naturalista, Religiosa e Relacional.

Uma quarta categoria (Não respondeu/Não sabia) foi criada para agrupar as perguntas sem

respostas ou com indicativo de desconhecimento e uma quinta (Outras) para reunir as que não

se encaixavam em nenhuma das três zonas propostas.

Em seguida foi realizada uma sistematização bruta dos dados, que consistia em tabular

as respostas de cada sujeito para cada uma das questões. E “para a identificação das zonas do

Perfil Conceitual no estudo empírico, foi importante a identificação de ‘modos de falar’

característicos de cada zona, que correspondem as ‘formas de pensar’ que compõe o Perfil

Conceitual (MORTIMER, 2001)” (NICOLLI, 2009, p. 87). E como normalmente esses

modos de falar são expressos por meio das linguagens sociais, a distribuição das respostas

entre as categorias foi feita a partir da análise dos gêneros de discurso (BAKHTIN, 1986).

66

Com essa forma de análise foi possível perceber que quase todos os estudantes utilizavam

apenas uma zona para expressar suas concepções.

A autora não obteve evidências de evolução de uma zona para outra ao longo dos

períodos de um mesmo curso, confirmando suas expectativas iniciais de que não há uma

abordagem pedagógica do conceito de morte, satisfatória, tanto no contexto escolar quanto no

acadêmico. Tal fato gera uma tendência ao uso da zona relacional em todos os grupos

investigados.

Nas duas turmas do Ensino Fundamental foi aplicado um pré-teste e um pós-teste,

sendo desenvolvida entre os instrumentos uma abordagem pedagógica com o tema “Ciclo de

Vida” (que permitiria a discussão da temática Morte), que foi acompanhada pela pesquisadora

e filmada. Nos resultados de uma das turmas, pôde-se perceber que, quando comparado com o

pré-teste, o pós-teste teve um expressivo aumento de uso da zona Naturalista, com

proporcional diminuição da Religiosa (e leve diminuição da relacional), possivelmente em

decorrência da atividade desenvolvida durante as aulas. A outra turma, embora com

resultados menos expressivos, apresentou o mesmo padrão de alteração no uso das zonas que

na anterior. A autora justifica que essa diferença mais discreta na segunda turma pode ter

ocorrido por ter desenvolvido a atividade durante sete aulas (duas a menos que na primeira)

ou pelo uso excessivo do “discurso da Ciência”.

Quadro 7: Resumos das etapas metodológicas utilizadas e resultados obtidos por Nicolli (2009) para o levantamento das concepções e construção do perfil conceitual de “Morte”.

Coleta de dados

Revisão bibiográfica sobre a história do conceito de Morte e em diferentes áreas do conhecimento;

Uso de questionário com alunos de diferentes Cursos Superiores.

Análise dos dados Jogo dialógico entre a literatura e os dados empíricos;

Separação das respostas em categorias.

Resultados da Literatura e dos Sujeitos

Três zonas identificadas: Naturalista, Religiosa e Relacional.

Identificação dos perfis conceituais dos participantes da pesquisa.

67

V. DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS TRABALHOS

Com base no que foi apresentado nos resultados da presente pesquisa, é possível

perceber que há uma quantidade mais expressiva de trabalhos desenvolvidos nas áreas das

Ciências Físicas, Químicas e Biológicas. Nessas áreas o enfoque principal é entender como se

dá a construção de conceitos científicos pelos aprendizes e como eles usam suas concepções

em diferentes contextos. O número maior de pesquisas nessas áreas do conhecimento pode ser

justificado pela origem do modelo que foi proposto a partir da noção bachelardiana de perfil

epistemológico, que utilizava o conceito físico de massa no seu desenvolvimento. Além disso,

inicialmente a noção de perfil conceitual fora proposta como uma forma de investigar a

construção do conhecimento científico em sala de aula utilizando um conceito de química

(atomismo) (MORTIMER, 1994).

A concentração geográfica da produção se deve principalmente ao fato da presença de

programas de pós-graduação na área de Educação em Ciências em instituições de São Paulo e

Minas Gerais. Adicionalmente, esse resultado pode ser consequência do contexto da origem e

desenvolvimento da noção de perfil conceitual, que teve grande participação, como já dito, do

Professor Dr. Eduardo Fleury Mortimer. Em sua tese de doutorado na Universidade de São

Paulo, ele iniciou a pesquisa sobre o modelo de mudança de perfil conceitual (MORTIMER,

1994). Além disso, o autor trabalha desde 1995 na Universidade Federal de Minas Gerais,

onde orienta trabalhos e participa de grupos de pesquisa sobre o tema, o que dentre outros

fatores vem contribuindo para o aumento das pesquisas nessa área. Isso fica evidente quando

observamos que ele orientou a produção de metade das teses identificadas nesta pesquisa

(excluída a própria) e posteriormente alguns dos seus alunos orientaram outras produções

discentes.

Ao buscar a resposta para uma das questões que surgiram como desdobramento da

questão norteadora deste trabalho: “Como a noção de perfil conceitual vem sendo utilizada na

pesquisa em temas relacionados à Biologia e ao seu ensino?”, percebemos que apesar do

crescimento do uso da noção de perfil conceitual, nem todos os trabalhos selecionados por

apresentarem essa palavra-chave (“perfil conceitual”) em seu texto utilizaram o referencial

teórico de forma compatível com o objetivo da presente pesquisa. Dentre os trabalhos

selecionados para serem analisados com maior aprofundamento, todos citam o referencial,

reconhecem sua importância para a pesquisa em Educação em Ciências, mas nem todos

68

conseguem desenvolver uma proposta de perfil conceitual para o conceito de interesse, como

ocorreu com: biodiversidade (OLIVEIRA, 2005), competição (GOMES, 2006) e conceitos

relacionados à água (EMERICH, 2010). Dentre outros fatores, que serão discutidos

posteriormente, podemos destacar a complexidade em desenvolver uma pesquisa capaz de

identificar os compromissos ontológicos e epistemológicos, que estabilizam formas de pensar

um conceito, e de abordar de forma mais ampla todos os três domínios responsáveis pela

gênese do perfil de um conceito científico (sociocultural, ontogenético e microgenético)

(AMARAL & MORTIMER, 2006).

Como forma de responder a questão norteadora “Como as pesquisas têm utilizado a

teoria e trabalhado metodologicamente a montagem de perfis conceituais?”, podemos

destacar três interesses da presente pesquisa: o primeiro deles é o levantamento de teses e

dissertações e a apreciação sobre o “estado da arte” da literatura a respeito do uso da noção de

perfil conceitual; o segundo consiste em identificar como os autores se apropriavam da noção

proposta por Mortimer e a utilizavam no processo dialógico com outros autores; e por último,

como esses pesquisadores desenvolviam sua pesquisa para a construção de perfis para os

conceitos pelos quais estavam interessados.

Entre as seis dissertações de mestrado selecionadas para uma análise mais

aprofundada, apenas três conseguem identificar ou aprimorar o perfil conceitual de algum

conceito científico (SILVA, 2006; SILVA, 2008; VIGGIANO, 2008). Já entre as teses, das

duas selecionadas, ambas desenvolvem de forma bastante satisfatória o uso do referencial e

uma delas (COUTINHO, 2005) foi utilizada como ponto de partida para uma das dissertações

(SILVA, 2006) e ainda foi citada em dois outros trabalhos analisados (NICOLLI, 2009 e

VIGGIANO, 2008).

Na construção do modelo de mudança de perfil conceitual, que serviu de referencial

teórico para todas as dissertações e teses selecionadas para análise nesta pesquisa, Mortimer

utilizou como base teórica os trabalhos desenvolvidos por Bachelard sobre perfil

epistemológico e o construtivismo sociocultural, iniciado com as ideias de Vygotsky e

desenvolvido por outros autores (AUSUBEL et al.,1980). De forma complementar, além

desses aportes que serviram de base para a composição do modelo, fizeram parte dos

trabalhos selecionados ideias de outros autores, que já apresentam papéis de destaque nas

pesquisas sobre “perfil conceitual”, inclusive em parcerias com Mortimer, como: Amaral,

Bizzo, Driver, El-Hani, Scott. Em adição a esses aportes, é possível encontrar importantes

contribuições dos trabalhos de Bakhtin como a noção de gêneros de discurso e linguagem

social, pelo entendimento de que esses subsídios podem ajudar a relacionar as zonas do perfil

69

conceitual aos diferentes modos de falar dos sujeitos (COUTINHO, 2005; NICOLLI, 2009;

SILVA, 2006 e SILVA, 2008).

Mortimer e colaboradores (2010) ratificam esses resultados ao descrever o papel de

outros aportes que foram integrados a este quadro teórico que aborda a aprendizagem das

ciências como a aprendizagem de uma linguagem social da ciência escolar, por meio de

interações discursivas em sala de aula, sob uma perspectiva sociocultural. Pode-se destacar: 1)

a noção de perfil conceitual como uma ferramenta para analisar os “modos de pensar”; 2) a

teoria da linguagem do Bakhtin como uma base para a análise dos “modos de falar”; 3) a

teoria de Vygotsky do desenvolvimento das funções mentais superiores como base para a

investigação da aprendizagem; e 4) mais recentemente, é possível ver contribuições de

Bernstein, como pode ser observado na dissertação de Viggiano (2008), para a análise da

construção do conhecimento escolar e do discurso pedagógico, a partir da noção de contexto

(MORTIMER et al., p. 106).

Ainda respondendo a questão norteadora, é possível destacar alguns pontos sobre a

forma como os pesquisadores têm trabalhado metodologicamente na busca pela identificação

dos compromissos ontológicos e epistemológicos que estruturam as zonas dos perfis

conceituais. Em quase todos os trabalhos selecionados para análise, é possível perceber que os

autores iniciam suas pesquisas com uma revisão bibliográfica a respeito da construção do

conceito na literatura científica, como forma de contemplar o domínio sociocultural. Assim

esses trabalhos seguem a orientação encontrada no trabalho de Mortimer (1996), segundo a

qual um dos recursos para identificar as zonas de um perfil conceitual consiste em

desenvolver um levantamento da evolução das ideias científicas sobre um conceito ao longo

da história, para que se tenha acesso ao domínio sociocultural da sua gênese. Essa parte

preliminar do processo é de grande relevância para evidenciar os compromissos ontológicos e

epistemológicos de cada uma das zonas do perfil que se pretende investigar.

Viggiano (2008) foi o único autor que não cumpriu essa etapa, argumentando que não

desenvolveu uma revisão histórica dos conceitos por considerar que os principais modelos de

ensinar e aprender se referem aos modelos consolidados no Século XX. Isso porque ao longo

da formação desses conceitos há alguns autores que criticaram, propuseram a manutenção ou

alternativas a eles, mas poucos deixaram claras as influências psicológicas e filosóficas que

servem de base para suas significações. Então, segundo o autor, as concepções de ensinar e

aprender na história “são caracterizadas com base na argumentação a favor ou contra alguns

de seus procedimentos e métodos” e, assim, algumas “visões de ensinar e aprender, não são

necessariamente excludentes e podem ser até identificadas como complementares, sobretudo

70

quando há modificação das propostas educacionais ao longo do tempo” (VIGGIANO, 2008,

p. 84). O autor optou por apresentar as visões presentes na literatura do Ensino de Ciências e

que seriam utilizadas em seu trabalho.

A importância de se realizar uma revisão histórica do conceito fica bem clara na

pesquisa de Coutinho (2005) e na continuidade dela com Silva (2006). Ambos produziram um

capítulo de apresentação do conceito de vida ao longo da história da ciência, discutindo

algumas ideias aristotélicas (na Antiguidade), passando pela Idade Média, o período

Renascentista, a concepção Mecanicista (inclusive o Cartesiano) e a oposição de

pesquisadores da área de química, até chegar às definições encontradas nos séculos XX e

XXI. Caminho semelhante foi percorrido por Nicolli (2009), que fez uma descrição do

conceito de morte desde as primeiras descrições do que ela representava, passando pelas

formas como é concebida em diversas religiões. Esse tipo de desenvolvimento, além de

contemplar o domínio sociocultural, também busca investigar as ontodefinições para um

conceito considerado bastante amplo e que só pode ser estruturado a partir de um paradigma

científico.

Também podemos destacar o trabalho de Silva (2008), que além de buscar uma

delimitação para o conceito de manguezal, de modo preciso abordou os diversos aspectos

desse primeiro domínio, iniciando seu trabalho com um levantamento de dados sobre o

panorama das características do Ensino de Ciências correspondente ao nível de ensino do

grupo que fez parte se sua pesquisa (crianças entre sete e 11 anos), sobre a relevância do

manguezal para o grupo e como ele está inserido na pesquisa em ensino. Também

desenvolveu uma discussão sobre a relação que há entre enculturação e a contextualização

sociocultural para construção dos diversos significados que as crianças poderiam desenvolver

na escola.

De forma adicional, o segundo domínio que deve ser contemplado é o ontogenético.

Uma das formas de se fazer isso é realizar uma investigação das concepções de aprendizes

encontradas na literatura. Tal procedimento foi realizado em todos os trabalhos selecionados

que tinham como objetivo elaborar o perfil de algum conceito. Um exemplo pode ser

identificado no trabalho de Viggiano (2008) que, apesar de não ter realizado uma revisão

histórica dos conceitos de “ensinar” e “aprender”, fez um levantamento bibliográfico das

noções de estudantes sobre eles e seus contextos de uso, com o objetivo de estabelecer

relações entre as visões, como uma primeira aproximação do domínio ontogenético desses

conceitos. Esse levantamento histórico das concepções de indivíduos na literatura deve ser

realizado, quando possível, em paralelo com outra forma indicada para constituir esse

71

domínio que é conduzir uma coleta de dados empíricos sobre o conceito de interesse

diretamente com o público-alvo da pesquisa

Como instrumento para coleta dos dados empíricos podem ser utilizados

questionários, entrevistas ou ainda, observação de situações de interações didáticas (ou

etnografia interacional como no trabalho de Silva (2008)). O primeiro pode contribuir de

forma bastante relevante para o aparecimento de significados ou categorias não previstas no

levantamento bibliográfico, demonstrando concepções representativas dos processos

ontogenéticos presentes na cultura na qual o sujeito está inserido e que podem ser utilizados

para significar conceitos científicos.

Por sua vez, as entrevistas e as interações didáticas também apresentam importante

potencial de contribuição para a pesquisa, podendo ir além da função do questionário, dando

acesso ao domínio ontogenético e também ao microgenético, uma vez que auxiliam o sujeito

na tomada consciência de seu perfil e permitem a identificação da gênese de um determinado

conceito ao longo da interação (que se dá em um período curto). No trabalho de Silva (2008),

na descrição das sequências didáticas, é possível identificar uma série de exemplos de

emergência de significados e situações de conflito que antecedem o entendimento do conceito

de manguezal. Por sua vez, Coutinho (2005) relata que as entrevistas que realizou

contribuíram para a identificação de categorias não percebidas antes. Ainda sobre essas

ferramentas, o uso de pré-testes é bastante útil, visto que podem gerar dados, ou validá-los, de

modo que permitam ao pesquisador repensar sua abordagem, colaborando assim para a

produção de instrumentos mais eficientes.

Mais do que o método de coleta de dados em si, um ponto bastante relevante que deve

ser levado em consideração na elaboração dele é a capacidade que ele tem de fornecer

contextos para identificar as aplicações de concepções características de cada zona,

delimitando o uso de conceitos diante de uma situação vivenciada. Isso porque o perfil

conceitual é diretamente relacionado aos diferentes contextos, que são intimamente

influenciados pelas experiências individuais dos sujeitos (MORTIMER, 1995 e 2000). Daí a

importância dada pelos trabalhos selecionados em adequar suas pesquisas a essa premissa,

com destaque para Viggiano (2008), que buscou investigar, inclusive, se o uso de questões

seria realmente eficiente em delimitar contextos para emergência de modos de falar

característicos de cada zona de um perfil. Esse esforço gerou um resultado que comprovou,

dentre outras coisas, a eficiência desse tipo de instrumento na produção de um material com

mais qualidade, o que propicia uma análise mais aprofundada podendo gerar resultados mais

consistentes.

72

A análise desse material bruto, obtido com o auxílio dessas ferramentas, se dá de

forma ativa pelo pesquisador como resultado de suas hipóteses e fontes de pesquisa nas quais

se baseia. É nesse momento que é possível ver a aplicação de diferentes modos de se trabalhar

com os resultados da coleta dos dados empíricos. Silva (2008), que utilizou como ferramenta

para coleta de dados algumas interações discursivas, optou por realizar a análise das falas dos

alunos para identificação das suas concepções, para assim identificar que aproximações e

contrastes havia entre elas e as concepções históricas; buscava-se categorizar as respostas de

acordo com os resultados da literatura. Já Viggiano (2008), que empregou um questionário,

preferiu distribuir as respostas nas categorias previamente identificadas, para assim,

quantificar e identificar a forma de uso das zonas. Por sua vez, como pode ser observado nos

trabalhos de Coutinho (2005), Silva (2006) e Nicolli (2009), que também usaram

questionários em suas pesquisas, alguns métodos estatísticos foram empregados como forma

de dar maior refinamento à análise dos dados.

Silva (2006) utilizou ferramentas da Teoria Clássica de Testes e da Teoria de Resposta

ao Item (BORTOLOTTI, 2003), como uma forma de responder questões que ficaram

pendentes no de Coutinho (2005). Nesse último trabalho, além das análises quantitativas dos

resultados, o autor também buscou examinar os perfis conceituais revelados pelas questões.

Para isso ele contabilizou o número de vezes que os respondentes utilizaram as categorias das

zonas do perfil a partir de escores brutos (tanto no questionário como nas entrevistas). Mas

essa forma de análise gerou uma distorção por conta da quantidade de categorias presentes

(zona Relacional apresenta apenas uma categoria expandida, as outras duas, Internalista e

Externalista, apresentam três cada).

Para resolver esse problema, Silva (2006) utilizou, além dos escores brutos, que

permitiriam comparar seus resultados com os de Coutinho (2005), a TRI para consolidar os

dados e assim obter escores de expressão de zonas. Assim ele atribuiu o valor (0) caso o aluno

não utilizasse determinada zona e valor (1) às respostas que apresentavam “modos de

expressão” característicos de uma determinada zona, mesmo que o aluno utilizasse mais de

uma expressão relacionada àquela mesma zona (categorias expandidas diferentes de uma

mesma zona seriam contabilizadas apenas uma vez). Dessa maneira, aparentemente

respondeu satisfatoriamente às questões propostas em sua pesquisa.

Procedimento semelhante ao realizado por Coutinho (2005) foi utilizado por Nicolli

(2009) para produzir escores brutos para o conceito de morte. Esses escores indicavam a

frequência de acesso, nas respostas de cada um dos grupos pesquisados, às zonas propostas

pela autora. Adicionalmente foram comparadas essas frequências de acesso entre os períodos

73

de cada curso pesquisado como forma de demonstrar como o perfil evoluiria ao longo da

formação dos sujeitos.

Também como encontrado no trabalho de Silva (2006), uma boa forma de validar os

dados obtidos com os questionários e entrevistas está na aplicação de tratamentos estatísticos.

Em seu trabalho, os escores encontrados foram submetidos à análise de Clusters, o que

permitiu pesquisar padrões de perfis mais comuns e sua frequência dentro da amostra. Além

disso, foram aplicados os testes estatísticos ANOVA I e II. Assim foi possível realizar

comparações mais consistentes entre grupos de dados, como por exemplo, se havia diferenças

estatisticamente significantes na evolução das zonas entre os cursos (Biologia e Farmácia) e

entre os diferentes períodos de cada um deles.

O uso dos artifícios listados anteriormente se faz necessário para o delineamento mais

preciso das zonas do perfil conceitual, mas isso não torna a tarefa simples. Aparentemente não

há uma regra para ser seguida que garanta sucesso na construção, provavelmente por isso

alguns trabalhos identificam a validade da noção, mas não conseguem desenvolvê-la além de

descrever as concepções encontradas na literatura e nos sujeitos. Talvez pela dificuldade em

abordar as diversas dimensões de análise de um conceito ou ainda a falta de tempo ou de

experiência do pesquisador em conseguir delimitar as zonas a partir da literatura e/ou dos

dados empíricos, alguns dos trabalhos selecionados não obtiveram êxito na construção dos

perfis correspondentes aos seus respectivos temas.

Em seu trabalho, Oliveira (2005) tinha como um dos objetivos investigar o perfil

conceitual de biodiversidade, mas não conseguiu realizar a construção dele. Ele identificou

que apesar de haver uma definição geral para o termo, não há um consenso quanto à sua

definição devido aos diversos contextos em que pode ser empregado. Por conta disso, apesar

de ter seguido algumas etapas indicadas para delimitação das zonas (levantamento do

histórico do conceito na literatura e entrevistas) não foi capaz de descrever o perfil desse

conceito. Ele conseguiu identificar na literatura algumas categorias básicas nas quais as

concepções poderiam ser distribuídas (diversidade de organismos, genética e de

ecossistemas), e também valores associados ao tema (científico, moral, farmacológico, entre

outros), mas ainda assim não foi possível identificar a combinação de compromissos

epistemológicos e ontológicos que delimitariam cada zona.

Já no trabalho de Gomes (2006), o autor não chega a propor a construção de um perfil

conceitual e dá ênfase à Teoria Socio-histórica de Vygotsky, mas tinha como um dos

objetivos comparar as concepções de alunos e, em determinado momento, destaca o interesse

em, a partir de seus dados empíricos e após uma aula sobre interações ecológicas, “realizar

74

uma melhor avaliação sobre a evolução do perfil conceitual dos alunos” (GOMES, 2006 p.

78). Em seu trabalho, realizou uma investigação de contextos na literatura nos quais os

significados de “competição” poderiam ser utilizados (o que abarcaria o domínio

sociocultural), mas não utilizou essas informações de forma dialógica com os dados empíricos

para estabelecer os compromissos epistemológicos e ontológicos do conceito. Apesar de ter

exposto alguns contextos de uso do conceito, nos testes ele deu ênfase apenas à ecologia, e

utilizou os resultados dos testes aplicados aos estudantes para criar categorias que

comportassem as respostas desses. Assim ele conseguiu, até certo ponto, identificar o domínio

microgenético do conceito, mas ainda assim sem dar conta do ontogenético.

Como no trabalho anterior, Emerich (2010) também não lançou como objetivo a

produção de um perfil conceitual, mas pretendia que ao final da pesquisa houvesse dados

suficientes para “a constituição do perfil conceitual com relação aos conceitos relativos ao

Ensino de Ciências” (p. 75). Nesse trabalho isso não foi possível, apesar da autora identificar

que houve evolução no perfil e que ele incluía “não de forma exclusiva, novas ideias

científicas, compostas por um vocabulário adequado para este campo do conhecimento” (p.

74). Ela utilizou conceitos relacionados à “água” (como “matéria”, “massa”, “peso”), ou seja,

não tinha apenas um conceito para buscar seus domínios genéticos, devendo buscar essas

informações de cada um (o que geraria grande volume de dados) e assim não foi capaz e

identificar categorias de análise a partir da revisão bibliográfica.

A outra questão relevante para esta pesquisa, “Que características um conceito deve

ter para que se possa montar um perfil conceitual dele?”, pretendeu-se responder com base na

análise da descrição histórica realizada nos trabalhos selecionados. Eles não estabelecem com

clareza que características seriam essas, mas todos consideram que o perfil conceitual é uma

maneira de modelar a heterogeneidade de pensamentos dos aprendizes. O que se pode

perceber é que esses os conceitos devem ser amplos, possuir uma polissemia de significados e

valores atribuídos a ele de acordo com o contexto no qual está inserido e apresentar relevância

considerável numa determinada área de atuação. Isso faz com que seja possível encontrar

pesquisas nas mais diversas áreas, não só física, química e biologia, mas também matemática,

epistemologia, bioquímica e música, como foi evidenciado na busca na BDTD e no Portal

Capes.

Os conceitos trabalhados nas pesquisas atendem a todos os critérios citados acima.

Mas a questão da abrangência do conceito deve ser observada com bastante atenção. Os temas

abordados nas pesquisas apresentam relevância para a Biologia e para a Educação e podem

ser considerados bastante gerais, mas justamente por isso Oliveira (2005) teve dificuldade em

75

elaborar uma definição satisfatória para o conceito de “biodiversidade”. Esse problema

apareceu novamente nos conceitos de “vida” (COUTINHO, 2005; SILVA, 2006) e “morte”

(NICOLLI, 2009), mas foi resolvido buscando-se na descrição da história desses conceitos,

além do domínio sociocultural, ontodefinições que permitissem estruturá-los a partir de um

paradigma científico. Viggiano (2008) não realizou o levantamento da história dos conceitos

de “ensinar” e “aprender”, mesmo que eles fossem bastante amplos. Assim, ao invés de

buscar ontodefinições, ele fez a opção de utilizar definições presentes na literatura de Ensino

de Ciências.

Já para os conceitos de competição (GOMES, 2006) e manguezal (SILVA, 2008) não

foi possível construir um perfil. No primeiro caso, é possível que tenha sido pelo fato de a

construção do perfil não ter sido proposta como objetivo, mas no segundo caso a autora indica

a dificuldade que pode ter impedido essa construção. Ela destaca que identificou algumas

convergências para possíveis zonas, mas que deveria haver um aprofundamento em pesquisas

posteriores para verificar se é possível enquadrar “manguezal” como uma ontodefinição. Isso

porque provavelmente o conceito de “manguezal”, assim como o de “competição”, não seria

amplo o bastante, fazendo parte de conceitos mais gerais como “ecossistema” e “relações

ecológicas”, respectivamente.

Sendo assim, a investigação do perfil de “manguezal” e de outros perfis de mesmo

nível hierárquico, como “restinga”, “cerrado” e outros, poderiam produzir resultados

específicos demais para cada um deles e, consequentemente, não permitiriam que as zonas de

um perfil fossem consideradas em outros. Por isso, o ideal seria que no caso do “manguezal”,

ele, ou um dos outros conceitos de mesmo nível hierárquico, fosse o fio condutor para a

investigação do perfil de “ecossistema”. Assim como no caso de “competição”, esse conceito

ou um equivalente (como “predatismo” e “parasitismo”) serviria como elemento condutor

para a identificação do perfil de “relações ecológicas”. Outra opção para desenvolver a

pesquisa seria partir do conceito de maior amplitude (“ecossistema” ou “relações

ecológicas”), para em seguida, caso houvesse interesse, testar os resultados utilizando os

conceitos mais particulares, como forma de validar as zonas eventualmente identificadas.

No trabalho de Emerich (2010), não havia o objetivo de construir um perfil conceitual

e no título de seu trabalho constava “enfoque sobre água”. Apesar disso, o objetivo era utilizar

esse enfoque para trabalhar com diversos conceitos associados a ele, como massa e

densidade. Esses dois conceitos certamente são passíveis de terem as zonas que os compõem

analisadas. O mesmo não se pode afirmar para “água” e, portanto, deveria-se inicialmente

76

buscar se há uma definição própria para o conceito, ou se seria necessário utilizar

ontodefinições.

77

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho apresentou a proposta de desenvolver uma investigação sobre a forma

como as dissertações e teses produzidas no Brasil têm desenvolvido e aplicado a noção de

perfil conceitual, proposta por Eduardo Mortimer, nas áreas da Educação e da Biologia, dando

ênfase à maneira como essa noção tem sido trabalhada teórica e metodologicamente. Para

tanto, foi realizado um levantamento bibliográfico na Biblioteca Digital de Teses e

Dissertações e no Portal da CAPES. Após essa etapa, foram selecionados os trabalhos na área

de Biologia e de Educação que mais poderiam contribuir para a presente dissertação, por

terem dado maior importância ao uso da noção de perfil conceitual em suas pesquisas.

Os dados revelam que tem crescido o número de pesquisas que utilizam a noção de

perfil conceitual como referencial teórico para a compreensão de uma multiplicidade de

concepções, a partir da instrumentação que fornece para análise das formas de pensamento.

Adicionalmente, como toda essa construção está relacionada às interações sociais, as teorias

socioculturais de Vygotsky são utilizadas para investigações sobre o processo de

aprendizagem. Já para análise dos gêneros do discurso dos sujeitos das pesquisas, ao longo

das interações, podemos encontrar forte presença da teoria da enunciação de Bakhtin.

Essa delimitação nem sempre é tão simples. A primeira etapa a ser cumprida é

identificar se o conceito de fato é passível de ter seu perfil delimitado. Para isso ele deve

atender alguns requisitos como o ter relevância para uma determinada área curricular, possuir

uma diversidade de significados que dependam do contexto para ter sentidos específicos e ser

amplo. Mas deve-se ter atenção com relação à amplitude do conceito, pois existem conceitos

que, ao serem trabalhados, expressam de forma muito particular um conceito mais abrangente

que, juntamente com outros equivalentes, o comporta. Como foi o caso dos conceitos de

“competição” e de “manguezal”, que estariam contidos em “relações ecológicas” e

“ecossistemas”, respectivamente. Outros conceitos possuem diferentes definições de acordo

com o paradigma vigente em determinada época na história, então se deve buscar

ontodefinições para que sejam feitas suas estruturações, como foram os casos de “vida” e

“morte”.

Outra etapa importante a ser cumprida é a investigação dos três domínios responsáveis

pela gênese dos conceitos como forma de identificar os compromissos epistemológicos e

ontológicos responsáveis pela composição das zonas de um perfil. O primeiro domínio a ser

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trabalhado é o sociocultural, a partir da realização de estudos históricos sobre as ideias

científicas. O segundo é o domínio ontogenético, que aponta para um levantamento de dados

da literatura sobre concepções alternativas de alunos, quando possível, e para a realização de

estudos empíricos com o uso de questionários ou entrevistas, com o intuito de resgatar

concepções que são representativas dos processos ontogenéticos de construção do

conhecimento do grupo pesquisado sobre o conceito de interesse. Além disso, deve-se buscar

acessar o domínio microgenético por meio de métodos que permitam evidenciar a gênese de

um conceito em um curto período, como as entrevistas, e a partir da observação de atividades

didáticas. A análise das falas dos sujeitos da pesquisa deve ser realizada levando-se em

consideração os contextos sociais nos quais eles estão inseridos.

Os dados obtidos com a investigação desses domínios têm servido para elaboração das

zonas e posterior categorização dos modos de pensamento dos sujeitos. Mas os autores não

têm se contentado em apenas categorizar essas concepções. É possível ver o emprego de

análises estatísticas para estabelecer comparações refinadas entre sujeitos de diferentes níveis

de ensino ou em momentos anteriores e posteriores a intervenções didáticas.

Assim, na presente dissertação, buscou-se fornecer uma visão panorâmica do uso

dessa noção em temas relacionados com Educação e Biologia. Esse objetivo foi alcançado

com a apresentação dos aportes teóricos e os instrumentos metodológicos que foram

utilizados na produção das teses e dissertações selecionadas para análise. Elas ratificaram a

relevância dos referenciais teóricos que serviram de base para o modelo de mudança do perfil

conceitual e os procedimentos metodológicos propostos inicialmente, mas vão além,

sugerindo referenciais complementares e o uso de análises estatísticas no tratamento dos

dados.

Dessa maneira, além da presente dissertação contribuir para novas pesquisas

realizadas sobre o tema, indicando caminhos teóricos e metodológicos para a identificação de

características e para a montagem de perfis conceituais, reafirma-se que essa abordagem (o

perfil conceitual) se constitui como um importante referencial sobre a aprendizagem de

conceitos científicos. Isso porque os problemas de aprendizagem estão intimamente

relacionados à dificuldade de se alterar as características ontológicas de um conceito. Assim,

o uso desse referencial pode contribuir para uma prática pedagógica que apresente conceitos

científicos de forma mais eficiente.

De acordo com o modelo de mudança do perfil conceitual podemos entender que o

processo de ensino-aprendizagem deve ter dois objetivos, que são intimamente relacionados:

o primeiro é o enriquecimento do perfil conceitual dos indivíduos, o outro é a apresentação a

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eles da multiplicidade de modos de pensamentos que constituem um perfil, assim como os

contextos em que cada um pode ser aplicado. Isso porque, normalmente, os estudantes só

entram em contato com as suas primeiras concepções científicas a partir da interação com

seus professores e estes, por sua vez, devem indicar em que contextos cada modo de

pensamento deve ser aplicado.

Dessa maneira, não se faz necessário que os sujeitos abandonem suas pré-concepções

e permite-se que haja a tomada de consciência sobre o perfil de determinado conceito que se

possue, o que contribui para a aprendizagem dos conceitos científicos. Essa forma como o

modelo concebe a aprendizagem norteou os trabalhos selecionados e, em maior ou menor

grau, os autores desses trabalhos reconheceram essa evolução e a tomada de consciência que

os estudantes tiveram do seu perfil; mesmo nas pesquisas que não conseguiram delimitar as

zonas para o perfil do conceito com que trabalharam.

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VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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