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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE Leonardo Cavalcanti Rosas O ENSINO EM ESCOLAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA EM AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO DE QUESTÕES SOCIOAMBIENTAIS NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS. RIO DE JANEIRO 2012

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE … Rosas.pdf · rural e com as questões agrárias, tive a oportunidade de direcionar o enfoque da minha formação para este campo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE

Leonardo Cavalcanti Rosas

O ENSINO EM ESCOLAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA EM

AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: UMA ANÁLISE DA

INSERÇÃO DE QUESTÕES SOCIOAMBIENTAIS NAS PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS.

RIO DE JANEIRO

2012

Leonardo Cavalcanti Rosas

O ENSINO EM ESCOLAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA EM

AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: UMA ANÁLISE DA

INSERÇÃO DE QUESTÕES SOCIOAMBIENTAIS NAS PRÁTICAS

PEDAGÓGICAS

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisitos parcial à obtenção do título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Orientador: Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca

RIO DE JANEIRO

2012

Rosas, Leonardo Cavalcanti O ensino em escolas de formação profissional técnica em agropecuária do Estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões socioambientais nas práticas pedagógicas. / Leonardo Cavalcanti Rosas –Rio de Janeiro: Nutes, 2012. 94 f. : il. v Dissertação (mestrado) -- UFRJ, Nutes, Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Saúde, 2012. Orientador: Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca Referências bibliográficas: f. 78-82 1. Educação em Ciências. 2. Educação Ambiental. 3. Metodologia

Pedagógica. 4. Ensino Técnico Profissionalizante. 5. Educação em Ciências

e Saúde - Tese. I. Fonseca, Alexandre Brasil Carvalho da. II. Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Nutes, Programa de Pós-graduação em

Educação em Ciências e Saúde. III. Título.

Leonardo Cavalcanti Rosas

O ensino em escolas de formação profissional técnica em agropecuária do

Estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões socioambientais nas práticas pedagógicas.

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisitos parcial à obtenção do título de Mestre em Educação em Ciências e Saúde.

Aprovada em, ,de, , de, .

__________________________________________ Alexandre Brasil C. da Fonseca, Doutor em Sociologia, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde/UFRJ

__________________________________________ Ana Maria Dantas Soares, Doutora em Ciências Sociais,

Programa de Pós-Graduação em Educação Agrícola – PPGEA/UFRRJ.

__________________________________ Rita Vilanova Prata, Doutora em Educação,

Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde/UFRJ

Dedico este trabalho a todos os estudantes do Ensino técnico profissionalizante em agropecuária.

E a toda a população rural de Agricultores Familiares, Pilares invisíveis de sustentação deste país.

AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar àqueles que estiveram ao meu lado nesses momentos,

família e amigos são bens de valor inigualável, que participam continuamente da

construção da minha personalidade, e que por isso, estarão sempre comigo. Meu

agradecimento especial a minha mãe, Rosele Rosas e irmã Lívia Rosas, que

compartilharam angústias e alegrias, tal como meu primo-irmão Marcus Vinícius,

quem muito contribuiu para o início desta caminhada.

Em particular, deixo aqui minha gratidão a querida Júlia B. Morelli Rosas, esposa e

companheira que participou ativamente da construção desta dissertação, sendo por

vezes revisora e por outras conselheira. Pelas noites mal dormidas, estresses e

ausências durante o processo de construção deste estudo, o meu muito obrigado.

Durante estes dois longos anos conheci muitas pessoas e fiz grandes amizades,

meus agradecimentos aos prezados companheiros de turma e a estimada colega

Ana Gabriela de Souza Fernandes, por me lembrar das datas e auxiliar nas várias

etapas deste processo.

Não poderia deixar de mencionar o meu orientador, Doutor Alexandre Brasil C. da

Fonseca, por ter acreditado neste trabalho e me incentivado a todo instante,

demonstrando ser mais do que um professor, um amigo que acredito ter conquistado

para além deste momento.

“Não basta saber ler que Eva viu a uva. É preciso compreender

qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para

produzir a uva e quem lucra com esse trabalho”.

Paulo Freire

RESUMO

Rosas, Leonardo Cavalcanti. O ensino em escolas de formação profissional técnica

em agropecuária do Estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões

socioambientais nas práticas pedagógicas. Dissertação (Mestrado em Educação em

Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

Este trabalho busca compreender de que forma o curso técnico profissionalizante

em agropecuária se relaciona com o desenvolvimento da ciência e a adoção de

tecnologias no campo. Entendemos que a utilização indiscriminada de implementos

agrícolas pode comprometer a saúde ambiental e do trabalhador rural. Sobre esta

perspectiva procuramos conhecer também a relação do ensino com a dimensão

social, assumindo que é a partir deste aspecto que aumentam as chances do

indivíduo alcançar sua emancipação. Todavia, com a intenção de enxergarmos esta

integração dos aspectos técnico-científicos ao sócio-ambientais de forma prática,

tentamos partir da realidade dos agricultores familiares no Estado do Rio de Janeiro,

relacionando o desenvolvimento local à prática educacional das escolas do entorno.

Para isso, utilizamos o estudo de caso como recurso metodológico. Realizamos uma

vivência de três meses numa escola profissionalizante em agropecuária no Estado

do Rio de Janeiro de onde pudemos analisar o ensino praticado e sua relação com o

contexto social. Notamos certo grau de comprometimento, tanto da escola como da

comunidade acadêmica, com a capacidade e os recursos materiais dos produtores.

Entretanto não podemos dizer que o ensino profissionalizante em agropecuária

esteja intervindo de fato para a reconfiguração da lógica de produção e na

diminuição na exploração do trabalho.

Palavras-Chave: AGRICULTURA FAMILIAR; AGROECOLOGIA; ENSINO TÉCNICO

PROFISSIONALIZANTE;

ABSTRACT

Rosas, Leonardo Cavalcanti. O ensino em escolas de formação profissional técnica

em agropecuária do Estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões

socioambientais nas práticas pedagógicas. Dissertação (Mestrado em Educação em

Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

This study seeks to understand the means by which a professional & technical

school in agriculture dialogues with science development and the adoption of rural

technologies. The author believes that the extensive utilization of pesticides can

harm the environment and the rural worker’s health. Under this perspective, he

intends to disclose the relation between teaching and the social dimension, assuming

that this relation increases the chances of a student to reach emancipation. Still,

seeking the practical integration of technical aspects and social-environment aspects,

the author tries to overview the everyday of familial rural workers of Rio de Janeiro

State and tries to connect this reality to teaching practice of nearby schools. In order

to fulfill this purpose, a case study was used for a methodological path. The author

experienced the routine of a professional & technical school in agriculture, in Rio de

Janeiro state, during three months, in which time he could analyze the process of

teaching and its relation with the social context. The study showed a certain

commitment from the school and academic community to the knowledge and

resources of rural workers. However, the study cannot affirm that the professional &

technical school in agriculture is truthfully influencing the renewal of rural

technologies and the decrease of worker’s exploitation.

Keywords: familial agriculture; agroecology; technical school in agriculture;

LISTA DE FIGURAS E ILUSTRAÇÕES

1. QUADRO1: LISTA DE CURSOS.......................................................................... 18

2. FIGURA 1: ESCOLAS PROFISSIONALIZANTES EM AGROPECUÁRIA.............19

3. FIGURA 2: MAPA DO ESTADO COM LOCALIZAÇÃO DAS ESCOLAS...............25

4. FIGURA 3: APRESENTAÇÃO DO ENSINO NAS ESCOLAS................................27

5. FIGURA 4: MATRÍCULA POR DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA.....................40

LISTA DE SIGLAS

CEA Colégio Estadual Agrícola

CEB Câmara de Educação Básica

CEFFA Centro Familiar de Formação por Alternância

CEIA Colégio Estadual Interescolar Agrícola

CEPE Conselho de Ética em Pesquisa

CIA Colégio Interescolar Agrícola

CNE Conselho Nacional de Educação

CTS Ciência, Tecnologia e Sociedade

CTSA Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente

EA Educação Ambiental

EJA Educação de Jovens e Adultos.

FEITA Faculdade de Educação de Itaboraí

IBELGA Instituto Bélgica Nova Friburgo

IESC Instituto de Estudos em Saúde Coletiva

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário

MEC Ministério da Educação

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

PDE Plano de Desenvolvimento da Educação

PPP Projeto Político Pedagógico

PRONERA Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Sumário

1. Introdução .................................................................................................................................... 13

2. Do campo teórico à percepção da realidade .......................................................................... 18

3. Concepções teórico-epistemológicas na prática da Educação do Campo ....................... 42

4. Ciências, Tecnologia, Agricultura e Sociedade: a intersetorialidade das questões

ambientais na prática educacional ........................................................................................... 65

5. Considerações Finais ................................................................................................................. 80

6. Referências Bibliográficas ......................................................................................................... 84

7. Apêndices .................................................................................................................................... 88

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1. Introdução

Há alguns anos conclui minha graduação em Medicina Veterinária, na Universidade

Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Por ser esta uma universidade com

características peculiares, que proporciona uma diversidade de diálogos com a área

rural e com as questões agrárias, tive a oportunidade de direcionar o enfoque da

minha formação para este campo. Com o objetivo de me integrar mais a esta área

do conhecimento, dentre outras atividades, participei de um estágio interdisciplinar

de vivência em um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem

Terra (MST) onde pude experimentar como as pessoas que viviam naquele lugar se

relacionavam com a terra. Foi quando comecei a entender um pouco melhor a

categoria denominada Agricultor Familiar e desde então tenho trabalhado com este

público, no Estado do Rio de Janeiro.

Ao escolher esta atuação profissional, mesmo já sabendo do que se tratava o

trabalho de extensão rural1, ainda acreditava que poderia usar alguns

conhecimentos teóricos de característica stricto senso da formação profissional.

Porém, não demorou muito para que eu descobrisse que a situação de abandono e

carência na qual vive a população do campo no Brasil, e neste caso específico no

Rio de Janeiro, é de tal forma que tive poucas oportunidades de colocar em prática

aquilo que o currículo formal do curso de medicina veterinária pôde oferecer. Na

realidade, o trabalho do extensionista ultrapassa as questões técnico-científicas e

exige uma sensibilidade sócio-ambiental. Para isso, o profissional deve ser capaz de

estabelecer relações de confiança com os trabalhadores rurais, conhecendo sua

realidade e interagindo com ela. Dentre as inúmeras dificuldades encontradas no

trabalho de campo, destaco o baixo grau de instrução ao qual estão submetidos os

agricultores. Muitos não sabem sequer ler e escrever, e uma boa parte consegue

apenas assinar seu próprio nome. Percebe-se, principalmente entre os jovens, uma

vontade de mudar esta realidade de descaso. Portanto, alguns deles buscam na

educação formal a chance de melhorar sua qualidade de vida.

1 Para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o principal objetivo dos serviços de assistência

técnica e extensão rural (Ater) é melhorar a renda e a qualidade de vida das famílias rurais, por meio do aperfeiçoamento dos sistemas de produção, de mecanismo de acesso a recursos, serviços e renda, de forma sustentável.

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Foi baseado neste contexto que se procurou saber como e onde se davam esses

espaços de formação. Devido à situação econômica na qual se encontram a maioria

destes agricultores há de se esperar que ao procurarem uma qualificação

profissional os mesmos busquem o ensino público e gratuito. Este fato contribuiu

para a tomada de decisão de estudar o ensino profissionalizante nas escolas

públicas do Estado do Rio de Janeiro. Após, procuramos saber quais destes cursos

de nível técnico mais se aproximavam da área agrícola, enxergando na qualificação

profissional técnica em agropecuária uma formação que tem bastante a contribuir

com o diálogo da capacitação dos agricultores familiares.

Entretanto, não se podia perder de vista outra especificidade deste público: por

serem já agricultores ou filhos de trabalhadores rurais, esses jovens possuem um

entendimento prático sobre o que é o trabalho na terra. Assim, ao oferecer uma

qualificação profissional e uma educação formal, a instituição de ensino deve a priori

se preocupar com a bagagem de conhecimento que a maioria deste público já

carrega consigo. Outro fato que motivou esta pesquisa se deve as incertezas sobre

a forma pela qual estes conteúdos e conceitos estão sendo passados para os

estudantes. Sabemos que os trabalhadores rurais vivem num contexto complexo e

particular, portanto, suas peculiaridades exigem políticas públicas específicas para

este meio. Desta mesma forma, a educação deve ser contextualizada, crítica e

voltada para atender as demandas desta população, conferindo os componentes de

equidade que devem estar presentes para que se garanta o direito do cidadão e o

dever do Estado de proporcionar educação a todos os indivíduos da sociedade. Por

isso, a tentativa de dialogar neste texto com as questões que envolvem a educação

do campo e o trabalho enquanto princípio educativo (FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.;

RAMOS M., 2005).

Sobre este aspecto, em nossa pesquisa, há uma preocupação quanto à forma de

construção e disseminação do conhecimento. Buscou-se entender aqui as relações

que se estabelecem entre educadores e educandos no cotidiano acadêmico, dentro

e fora de sala de aula, de maneira que possamos compreender algumas das

diversas dimensões do ensino. Procuramos nas práticas pedagógicas por medidas e

ações que de alguma forma possam sugerir um diálogo com as reivindicações dos

movimentos sociais do campo, que contribuem com esta questão na medida em que

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elaboram propostas de uma educação do campo diferenciada em todos os níveis de

formação.

É grande a responsabilidade de formar cidadãos conscientes e de forma

contextualizada com as questões agrárias, que envolve diferentes possibilidades de

abordagem, passando pela disputa da terra e pela formação histórica do campo

brasileiro até as relações sociais que se estabelecem hoje. Tal como é grande o

desafio de não se limitar as questões técnicas características de um curso de

formação profissionalizante em agropecuária. Entendemos que o profissional

formado nestas perspectivas será capaz de exercer a sua profissão de forma

coerente com a sua realidade. Espera-se, portanto, que os jovens provenientes do

meio rural e com a vivência da agricultura familiar, permaneçam neste campo de

atuação enquanto profissionais de extensão rural.

De qualquer forma, percebemos que este curso técnico, por suas características de

formação profissionalizante, se relaciona de alguma maneira com o desenvolvimento

da ciência e a adoção de tecnologias no campo. Contudo, buscamos neste estudo

conhecer também a relação do ensino com a dimensão social, assumindo que é a

partir deste aspecto que aumentam as chances do indivíduo alcançar sua

emancipação. Todavia, com a intenção de enxergarmos esta integração dos

aspectos técnico-científicos ao sócio-ambientais de forma prática, tentamos partir da

realidade do cotidiano dos agricultores familiares no Estado do Rio de Janeiro.

Nesta perspectiva, apesar de conhecer algumas diferenças e exceções, podemos

destacar muitas práticas e hábitos comuns. A grande maioria dos agricultores ainda

faz uso de venenos e adubos químicos, muitas vezes sem nenhum tipo de

capacitação e sem preocupação com o uso de equipamentos de proteção. Este fato

se relaciona à implantação de pacotes tecnológicos, em grande parte impostos sem

nenhum diálogo com a sociedade. A utilização destes implementos agrícolas, além

do potencial prejuízo à saúde dos trabalhadores, gera gastos que podem

comprometer economicamente a produção.

Acreditamos que pesquisadores, professores e profissionais do campo, devem ter

como atribuição, resgatar as formas tradicionais de produção, valorizando os

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saberes populares e a consciência ambiental. Retomando, com isso, as

características sustentáveis da agricultura. Neste sentido, as ações educacionais

críticas contribuem para a formação de um profissional comprometido com o

contexto social, político e econômico no qual estão inseridos. Embora saibamos que

estas ações também estão imersas num campo de idéias e de disputas onde as

correlações de força são ainda desfavoráveis à mudança da lógica de produção

atual.

Por este motivo, analisamos neste estudo o ensino nas escolas técnicas em

agropecuária no Estado do Rio de Janeiro, dando ênfase aos processos

pedagógicos, em suas possíveis interações entre a teoria e a prática de produção,

ser humano e meio ambiente, saberes populares e conhecimento científico. Com

esta finalidade, utilizamos como parâmetro os aspectos abordados em Ciência,

Tecnologia e Sociedade, aproximando-os dos conhecimentos da Educação

Ambiental e da Agroecologia, observando o quanto os profissionais que atuam

nestas escolas conhecem/utilizam estes conceitos. Entendemos que para uma

formação integral e contextualizada, onde o objetivo maior seja a emancipação do

indivíduo, devem ser trabalhados temas que abordem o conhecimento científico e as

inovações tecnológicas dentro de um contexto amplo e geral, no qual este indivíduo

se insere e é inserido.

Desta forma, o presente estudo encontra-se dividido em grandes áreas temáticas,

que se limitam num campo teórico, mas que dialogam entre si nas práticas

educacionais. Por este motivo, apesar de trabalharmos com alguns conceitos

bastante discutidos, ao propormos uma articulação entre eles corremos alguns

riscos. Entretanto, tentar evitá-los poderia significar deixar de lado aspectos que

consideramos fundamentais para a análise situacional que nos propusemos a fazer

aqui. Assim, no primeiro capítulo explicamos a metodologia utilizada, suas

vantagens e desvantagens, além de delimitarmos nosso campo de estudo. Também

fizemos uma breve contextualização sobre o processo histórico de formação do

campo brasileiro e sua relação com a educação. No segundo capítulo é inserida a

discussão sobre as contribuições do movimento de Educação do Campo para a

formação do trabalhador rural e para as políticas educacionais, explicitando também

as diferenças e particularidades do ensino médio integrado ao técnico e às práticas

17

do trabalho enquanto princípio educativo. Relacionando-se ainda as questões que

envolvem o desenvolvimento científico e tecnológico às dimensões sociais.

Seguindo o desenvolvimento e a estruturação deste documento, no terceiro capítulo

é discutida a inserção da Educação Ambiental e da Agroecologia enquanto

componentes de integração das práticas de responsabilidade social que devem ser

abordadas no contexto educacional em questão. A abordagem destes temas é

realizada numa perspectiva de formação e responsabilidade de atuação dos futuros

profissionais formados por estas instituições.

18

2. Do campo teórico à percepção da realidade Depois de tomar a decisão de estudar as escolas públicas do Estado do Rio de

Janeiro, procurei saber quais destes cursos de nível técnico mais se aproximavam

da área agrícola. De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, o ensino

médio profissional do Estado conta com dezoito cursos técnicos, sendo eles

ordenados de acordo com o quadro 01:

Quadro1. Lista de Cursos oferecidos pela Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro

Administração

Agropecuária

Turismo

Desenho de Arquitetura

Edificações

Eletrônica

Eletrotécnica

Contabilidade

Enfermagem

Informática

Mecânica

Meio Ambiente

Metrologia

Patologia Clínica

Prótese Dentária

Secretaria Escolar

Química

Secretariado

Dentre estes cursos, os que mais se relacionam com a área rural são o de Meio

Ambiente e o de Agropecuária. Entretanto, foi verificado que este último se encontra

mais próximo do sistema agrícola de produção. Por isso este estudo buscou

conhecer a realidade das práticas educacionais desta área técnica, acreditando que

as interações entre os aspectos agronômicos, sociais e econômicos devem ser

característica inerente desta profissão.

19

De início, os principais dados levantados foram: o número e a localização das

escolas profissionalizantes que oferecem o curso de agropecuária no Estado; o perfil

agrícola da região onde estas escolas se encontram; as funções desempenhadas

por este profissional. Os resultados desta busca permitem dizer que atualmente a

Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro oferece o curso

profissionalizante em agropecuária em oito escolas estaduais, conforme listadas na

figura 1.

Figura 1 - Escolas Estaduais com Curso Profissionalizante em Agropecuária no Estado do Rio de Janeiro

Escola Estadual Município

CEA de Cambuci Cambuci

CEIA Alm. Ernani do Amaral Peixoto Magé

CIA de Itaperuna Itaperuna

CIA José Francisco Lippi Teresópolis

José Soares Junior Itaboraí

Monsenhor Tomás Tejerina de Prado Valença

Rego Barros Conceição de Macabu

Rei Alberto I Nova Friburgo

Era esperado que, por se tratar de um curso técnico diretamente ligado as ciências

agrárias, os colégios agrícolas que oferecem esta modalidade educacional

estivessem localizados próximos às áreas rurais. De fato, pode-se constatar que

nenhuma destas instituições se localiza na região metropolitana do Rio de Janeiro, e

embora o Colégio Agrícola José Soares Junior esteja situado em uma região urbana,

todas as demais escolas encontram-se distribuídas pelas zonas rurais do Estado.

Foi por este motivo, inclusive, que inicialmente realizei um contato por telefone com

cada uma destas escolas, com a finalidade de obter algumas informações

preliminares. Após este contato, fiz um estudo exploratório, por intermédio de

20

pesquisa na internet, dos sítios eletrônicos produzidos por estas escolas e por seus

alunos, onde foi identificada a existência de cinco destas com material online

disponível. Portanto, foi a partir destas fontes de informações que foi dado

prosseguimento ao estudo.

Após esta primeira etapa da pesquisa, o trabalho foi direcionado para uma destas

escolas, a qual foi escolhida de modo a evitar-se destoar da realidade das demais.

Para isso, levei em consideração: a média do número de estudantes matriculados, a

localização da escola (que seguindo a maioria, esta situada em uma área rural), a

relação entre o ensino médio geral e o profissionalizante, bem como o diálogo com

as comunidades de seu entorno.

Escolhida a escola que seria mais detalhadamente estudada, foi realizado um

estudo de caso (André, 2005; Yin, 2010). A utilização deste recurso permitiu

ultrapassar as limitações da simples relação descritiva e superficial dos fatos. Dessa

forma, tentou-se extrair deste recurso o máximo de realidade possível, para isso,

foram levados em conta, além dos dados empíricos, o contexto no qual tais dados

foram obtidos, os significados destes dados para os sujeitos envolvidos na pesquisa,

bem como as qualidades e as limitações do pesquisador. Logo, se o objetivo foi

utilizar uma abordagem que se aproximasse ao máximo da realidade, entendi que

deveria lançar mão de técnicas que permitissem um maior conhecimento do objeto

de estudo. Com esta finalidade, foram empregadas como técnicas de coleta de

dados, a observação, a entrevista, e as análises de documentos, de gravações e de

anotações de campo.

Entretanto, por se tratar de um estudo “aberto”, que permitiu múltiplas possibilidades

e flexibilizações no tratamento do tema, é importante deixar claro que, por ter

estudado o ensino técnico profissionalizante em agropecuária nas escolas estaduais

do Rio de Janeiro, embora esta investigação tenha sido conduzida em uma

determinada escola, tentou-se a todo instante dialogar com uma realidade maior.

Portanto, as contribuições que este estudo poderia trazer para o entendimento

global do coletivo de escolas em questão foi uma preocupação constante.

21

Contudo, foi decidido enfrentar este e outros riscos inerentes ao recurso do estudo

de caso, devido às inúmeras vantagens que esta abordagem pôde proporcionar,

dentre estas, destacam-se: a possibilidade de se obter uma visão holística de um

processo complexo; a proximidade com a realidade natural dos fatos a partir de uma

pesquisa em particular; e a exposição de pistas para a continuidade da pesquisa em

estudos futuros (ANDRÉ, 2005).

Após submeter este trabalho à Comissão de Ética em Pesquisa do Instituto de

Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro –

(CEPE/IESC/UFRJ), entrei em contato com a direção da escola, sendo prontamente

atendido e recebendo anuência institucional para iniciar a pesquisa. Foram

solicitados à coordenação pedagógica alguns materiais impressos que ajudaram a

evidenciar o projeto político-pedagógico desta escola. Os documentos analisados

foram: o currículo com a estruturação e a ementa das disciplinas, o plano de curso, o

projeto político-pedagógico e o programa de gestão da escola, onde pude obter

dados relevantes para a pesquisa.

Antes mesmo da primeira visita já havia uma expectativa boa sobre o estudo na

escola, pois durante os contatos por telefone a diretora se mostrou muito solícita e

receptiva. Esta impressão foi confirmada no primeiro momento. Ao chegar à escola

pude observar o grau de organização e limpeza no qual a mesma se encontrava.

Achei o espaço grande e bem aproveitado, logo na entrada pude ver vários canteiros

com flores ornamentais que enfeitavam a entrada dos pavimentos, mais tarde soube

que os canteiros eram cuidados pelos próprios estudantes. Fui convidado a entrar e

esperar o fim de uma reunião entre a direção e os professores, o funcionário me

deixou bem à vontade numa sala com água e café.

Após alguns minutos a reunião acabou e a diretora veio até a sala onde eu me

encontrava, acompanhada de uma professora que tinha um olhar sério e reparava

em cada movimento, como se estivesse me observando para iniciar um

interrogatório. A diretora falou de alguns projetos da escola e colocou a minha

disposição todo o material solicitado para a análise documental, após, me

apresentou a professora que a acompanhava e que parecia aguardar por este

momento para começar seu “inquérito”. Então, antes que eu pudesse perguntar algo

22

mais detalhado sobre os projetos mencionados pela diretora, ela começou as suas

perguntas. Tentei explicar um pouco do projeto e da linha de pesquisa, ela se

interessou e quis saber mais detalhes. Conversamos por algum tempo e ela então

me convidou para acompanhá-la em suas atividades. Foi quando comecei a

conhecer a sua competência e dedicação pelo seu trabalho. A partir daí, as visitas

para a pesquisa de campo não seriam as mesmas quando ela por acaso não

estivesse presente. Sempre solícita e preocupada em agradar a todos os visitantes,

conforme declaração da própria professora, fazia questão de me deixar bem a

vontade. O contato com a escola e toda a comunidade acadêmica foi algo

extremamente cativante e uma experiência enriquecedora.

Houve também uma grande identificação com os estudantes daquela escola. Tive a

oportunidade de conhecê-los bem, procurando me ambientar e trocar experiências

com eles, professores e funcionários. Foi neste ritmo que iniciei as primeiras

semanas da pesquisa. Participei de algumas aulas, da feira de ciências e de

algumas outras atividades da escola, anotando no diário de campo as experiências e

impressões. Freqüentei também o refeitório da escola, que estava sempre limpo e

arrumado, com uma cozinha ampla e alimentos muito bem temperados. Vale

ressaltar que as refeições eram dispostas de forma em que todos podiam se servir a

vontade e tinha sempre opções de saladas que eram provenientes da própria

escola, por meio de projetos como o da horta escolar e o da produção orgânica. Só

depois deste período, de aproximadamente dois meses, foi que comecei de fato as

entrevistas com os estudantes e professores do ensino profissionalizante.

Seguindo a pesquisa com o recurso metodológico escolhido, foi identificada a

percepção dos estudantes em relação ao ensino formal e ao seu conhecimento

prévio nas práticas de produção agropecuária, bem como sua participação no

contexto socioambiental. Estas e outras informações foram obtidas a partir de

entrevistas semi-estruturadas, gravadas em áudio e contando com a prévia

autorização do entrevistado, garantindo-se o seu anonimato. Ao todo foram

entrevistados vinte e dois estudantes, sendo dez do primeiro ano de formação e

doze do último ano, é importante destacar aqui que o conjunto de entrevistados foi

formado por todos os estudantes regularmente matriculados no ensino

profissionalizante da escola. Como são oferecidas anualmente trinta e cinco vagas

23

para este curso, entende-se que pode estar ocorrendo tanto uma baixa procura

como uma evasão escolar. Ressalto, porém, que este fato foi abordado no decorrer

das entrevistas e serão mais bem detalhados à frente. Além dos estudantes,

também foram entrevistados os três professores do ensino profissionalizante, neste

caso, apesar da escola ter conseguido mais um professor para o seu quadro

docente, este não foi entrevistado por ter ingressado somente no final do ano letivo.

Para a organização e discussão destas entrevistas, foi utilizado o recurso da análise

temática (MINAYO, 1999).

A estruturação da entrevista com os estudantes se deteve nos seguintes eixos2:

Incorporação de conteúdos científicos e tecnológicos e sua possível relação com o

contexto social do indivíduo; limitações e possibilidades referentes à prática

sustentável de produção agropecuária; relevância do conhecimento prévio e

intercâmbio com as novas informações; relação com a organização e o movimento

estudantil. Já os eixos que nortearam as entrevistas com os professores foram

direcionados considerando à prática pedagógica e às experiências anteriores, o grau

de formação, a relevância do intercâmbio de conteúdos com outras disciplinas e o

seu comprometimento com o desenvolvimento local.

Para a análise e coleta dos dados foram considerados os procedimentos de modelos

lógicos de Yin (2010, p. 178), em que os eventos são postos num padrão de

seqüencias de causa e efeito, no qual uma determinada atividade proporciona

resultados imediatos, que por sua vez provocam reações intermediárias,

responsáveis por gerar resultados definitivos.

Dando prosseguimento a organização dos dados da pesquisa, no que diz respeito à

função do profissional técnico em agropecuária, o Ministério da Educação, por meio

do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, atribui como orientações:

Planejar, executar, acompanhar e fiscalizar todas as fases dos projetos agropecuários. Administrar propriedades rurais. Elaborar, aplicar e monitorar programas preventivos de sanitização na produção animal, vegetal e agroindustrial. Fiscalizar produtos de origem vegetal, animal e agroindustrial. Realizar medição, demarcação e levantamentos topográficos rurais. Atuar em programas de assistência técnica, extensão rural e pesquisa. (MEC. Catálogo Nacional de Cursos Técnicos. Em:

2 O protocolo desta pesquisa, com maiores detalhes sobre as entrevistas, se encontra no apêndice.

24

<http://catalogonct.mec.gov.br/et_recursos_naturais/t_agropecuaria.php>. Acesso em: 07 de dezembro de 2010.)

No presente estudo foi possível verificar que, no que se refere à formação técnica,

estas orientações estão sendo seguidas pelas escolas, entretanto, este documento

sugere de maneira formal as possíveis áreas de atuação profissional, o que não

deixa de ser uma sustentação para a hipótese de que este curso está intimamente

ligado às ciências agrícolas e à área rural. Contudo, a inquietação que motivou esta

pesquisa foi fruto das incertezas sobre a forma pela qual estes conteúdos e

conceitos estão sendo passados para os estudantes. Devido a uma preocupação

quanto à forma de construção e disseminação do conhecimento, buscou-se

entender as relações que se estabelecem entre educadores e educandos no

cotidiano acadêmico, dentro e fora de sala de aula, de maneira que possamos

compreender algumas das diversas dimensões do ensino, dentre elas o diálogo com

a sociedade e o direcionamento final deste profissional.

Para verificar a existência de um diálogo com o desenvolvimento local, procurou-se

compreender os possíveis vínculos entre as práticas de ensino e as características

regionais de onde estas escolas se localizam. A figura 2 facilita uma melhor

visualização da distribuição regional destas escolas no Estado do Rio de Janeiro,

além de permitir observar o potencial agrícola destas regiões. Conforme veremos, a

correlação destes dados influencia a metodologia pedagógica praticada, já que a

ênfase do ensino nos sistemas de produção varia de acordo com as aptidões

agropecuárias de cada região.

25

Figura 2 – Mapa do Estado do Rio de Janeiro com localização das Escolas Estaduais com Curso Profissionalizante em Agropecuária

26

Conforme podemos notar, na região Noroeste do Estado encontram-se duas escolas

estaduais agrícolas, sendo uma em Cambuci e outra em Itaperuna. Esta região tem

como principais produções agropecuárias a bovinocultura de corte e de leite; a

fruticultura (banana, citros e goiaba); o eucalipto; o café; o arroz; o feijão e o milho;

Já a região Norte, produtora de cana de açúcar, aipim, fruticultura (maracujá, coco e

abacaxi) e bovinocultura de leite e de corte, conta apenas com uma escola agrícola,

o Colégio Rego Barros.

Outra região que possui apenas uma destas escolas é a do Médio Paraíba, na qual

existe somente o Colégio Iinterescolar Agrícola Monsenhor Tomás Tejerina de

Prado. Nesta região predominam a bovinocultura de corte e de leite, a piscicultura e

o café.

A figura 2 também nos permite assinalar a ausência de escolas técnicas estaduais

profissionalizantes em agropecuária em diversas regiões do Estado, contrastando

com uma concentração destas escolas na região Serrana. Esta centralização talvez

se justifique pela predominância na produção de olericulturas3, principal atividade da

Agricultura Familiar nesta região, que faz este cultivo estar entre as maiores taxas

produtivas do Estado, o que pode proporcionar um aumento da demanda por estas

escolas de formação profissional. Nesta região, a distância entre as escolas e os

centros urbanos também são as maiores do Rio de Janeiro. Embora o Colégio

Agrícola Almirante Ernani do Amaral Peixoto esteja na média de distância das

demais escolas, que se encontram entre quatro e dez quilômetros de uma área

urbana, o Colégio Agrícola José Francisco Lippi, está a vinte quilômetros de

distância e o Colégio Rei Alberto I, dentre as escolas pesquisadas, é o que se

encontra mais longe de um centro urbano, situando-se a quarenta quilômetros deste.

Contudo, como a proposta era analisar estas escolas dentro de um contexto amplo,

não só a localização e as características agrícolas das regiões destas escolas

interessam como também outras informações mais gerais. Desta forma, cabe

destacar o momento em que se encontrava a política educacional na ocasião da

3 A olericultura é a área da horticultura que abrange a exploração de hortaliças e que engloba culturas

folhosas, raízes, bulbos, tubérculos, frutos diversos e partes comestíveis de plantas.

27

fundação destas instituições. Assim, a partir dos elementos fornecidos na figura 3,

podemos observar que, com exceção do colégio agrícola José Francisco Lippi,

fundado em 1938, todas as demais escolas tiveram sua fundação entre a década de

1980 e o ano 2000, embora essa escola mais antiga só tenha começado a oferecer

a modalidade profissional também neste período.

Figura 3 – Apresentação da organização do ensino nas escolas Agrotécnicas do Estado do Rio de Janeiro

Escola

Estadual

Ano de

Fundação Modalidade e organização do Ensino

CEA de

Cambuci 1980

Médio geral e técnico profissionalizante em

agropecuária. Oferecidos de forma integralizada,

com conclusão em três anos.

CEIA Alm.

Ernani do

Amaral

Peixoto

2000

Médio geral e técnico profissionalizante em

agropecuária. Dividido em duas modalidades,

sendo uma integrada ao ensino médio geral, com

duração de três anos, e outra chamada de

subseqüente, apenas para a formação técnica, com

duração de dois anos, destinada aqueles que já

possuem o ensino médio.

CIA de

Itaperuna 1980

Médio geral, com formação técnica

profissionalizante em agropecuária de forma

subseqüente, com três anos de duração no total.

CIA José

Francisco Lippi 1938

Médio geral, na parte da manhã e técnico

profissionalizante em agropecuária, no turno da

tarde, de forma subseqüentes. Desta forma, o

indivíduo com o nível médio completo pode optar

apenas pela formação técnica.

José Soares

Junior 1988

Apenas Técnico profissionalizante, com duração de

dois anos.

Monsenhor 1983 Médio geral, com conclusão em três anos e técnico

28

Tomás

Tejerina de

Prado

profissionalizante em agropecuária, com dois anos

de duração.

Rego Barros 1981

Médio geral e técnico profissionalizante em

agropecuária, de forma dissociada, concomitante

ou subseqüente. com dois módulos de duração de

um ano cada, no qual são aceitos tanto estudantes

que ainda cursam o ensino médio como os que já o

concluíram.

Rei Alberto I 1994 Médio geral em concomitância com o técnico

profissionalizante em agropecuária.

Portanto, o ensino profissionalizante em agropecuária ganhou força no Rio de

Janeiro justamente num período polêmico e de grandes discussões em torno do

ensino médio profissionalizante e geral, principalmente no que diz respeito à

integração ou dissociação destas modalidades.

Sobre este aspecto, podemos observar as idas e vindas da política educacional

desta época. Na década de 1990, por exemplo, pelo Decreto nº. 2.208/97, que

estabelecia as diretrizes e bases da educação nacional, o Governo Federal insere

abertamente um distanciamento entre as modalidades de ensino médio geral e

profissional, permitindo uma flexibilidade na educação profissional que passa a ser

desenvolvida em articulação com o ensino regular ou em modalidades distintas que

contemplem as estratégias de educação continuada. Algum tempo depois (menos

de dez anos), o Decreto nº. 5.154/04 revoga o de nº 2.208/97, trazendo a

possibilidade de um currículo integralizado entre as duas modalidades de ensino, de

forma que não se separasse a educação geral da profissional. Estes são exemplos

concretos que nos ajudam a entender o período de turbulência política no qual estas

escolas, recém-fundadas, estavam se estabelecendo e se desenvolvendo no Estado

do Rio de Janeiro. Conforme podemos observar na Figura 3, encontramos hoje o

ensino organizado de diferentes maneiras, entretanto, a prevalência ainda se

encontra na divisão do ensino em duas modalidades distintas. A seguir veremos um

29

exemplo concreto destas modificações nos currículos em decorrência desta agitação

da política educacional:

No Colégio Interescolar Agrícola Monsenhor Tomás Tejerina de Prado,

popularmente conhecido como Pólo Agrícola, o curso de nível fundamental (sexto ao

nono ano) é administrado em horário integral e já é possível destacar neste

segmento oficinas ligadas ao setor agrícola, como: horta, jardinagem e meio

ambiente. Porém, o curso profissionalizante em agropecuária somente começou a

ser oferecido dois anos após a inauguração da escola, em 1985. Nesta época o

ensino técnico era integrado ao ensino médio, com conclusão em três anos,

entretanto, esta realidade mudou no ano de 2000, quando houve a dissociação do

ensino na escola.

Neste ponto, é importante entendermos que este afastamento não ocorre de modo

isolado, é preciso enxergar as políticas educacionais dentro de uma conjuntura

social, política e econômica. Portanto, para que possamos avançar nesta discussão,

se torna coerente uma contextualização histórica que nos remeta a conquista do

território nacional, nos auxiliando no entendimento de algumas relações postas entre

o ensino e o processo de formação do campo brasileiro, o que influenciou

fortemente na construção das relações sociais que se estabelecem hoje em nossa

sociedade. Desta forma, pode-se dizer que as atuais desigualdades econômicas e

sociais encontram no caráter normatizador da educação formal, um potente

mecanismo que pode ser usado para a manutenção da hegemonia de uma

determinada classe social sobre outra. Sob este ponto de vista é que foi proposto

estudar o ensino que vem sendo praticado no curso técnico de agropecuária. Neste

caso, devido à impossibilidade de destituir-me de meus valores e opiniões, que se

manifestam da escolha do tema ao referencial teórico, tentarei aqui deixá-los claros

para o leitor (ANDRÉ, 2005).

Stedile (2005) introduz a discussão da ocupação do território nacional sabendo que

as sociedades que habitavam nosso continente possuíam estilo de vida nômade,

dominando parcialmente a agricultura e que devido à fartura de alimentos que se

encontrava, foram domesticadas para o cultivo apenas algumas variedades de

plantas existentes na natureza. Além do consumo próprio, esta produção também

30

era negociada entre as tribos, através de um modelo de intercâmbio organizado

numa forma de “comunismo primitivo”, não havendo qualquer sentido de

propriedade dos bens da natureza. Com a invasão, a colonização e a imposição de

leis políticas portuguesas no território brasileiro, os povos que aqui viviam foram

dominados e submetidos ao modo de produção praticado pelos conquistadores.

Estes visavam uma economia de mercado baseada no crescente capitalismo

europeu, no qual era fundamental que houvesse apropriação da natureza, para o

acúmulo e o envio de mercadorias para o império, gerando lucro através da

exploração comercial. Foi neste contexto que nasceu no Brasil o modelo

agroexportador. Pela necessidade de enviar a metrópole portuguesa uma

quantidade cada vez maior de produtos agrícolas foi adotada uma organização da

produção em larga escala, que se caracteriza pela exploração da natureza e do

homem, baseada nos sistemas de monocultura, na mão de obra escrava, no

emprego de técnicas modernas de produção, nas quais se podem destacar os

adubos químicos, fertilizantes e agrotóxicos. (STEDILE, 2005).

A negação de uma co-evolução entre a sociedade e a natureza, que se deu pela

substituição das práticas indígenas pelo modelo agroexportador, gerou formas de

agricultura socialmente injustas e ambientalmente desastrosas. Este modelo de

produção está vinculado à necessidade de aprimoramento das técnicas de

exploração, que por sua vez se relaciona ao desenvolvimento da ciência e a

incorporação de tecnologia. Encontramos nas diversas manifestações dos

estudantes do ensino técnico alguma referência no estilo de vida urbana, mesmo

entre os que viviam num cotidiano predominantemente rural. É fácil entender o

fascínio destes jovens pelos aparentes atrativos que a cidade oferece, o que vem

contribuindo com uma situação de êxodo rural ao longo do tempo. Saviani (1994)

considera que com a modernização da sociedade capitalista, a lógica de

subordinação se inverte: o campo passa a se submeter à cidade e a agricultura

adquire formas industriais, se mecanizando e utilizando diversas tecnologias no

processo de produção de alimentos.

Com o desenvolvimento da sociedade capitalista e a industrialização do campo, não

só as relações predatórias sobre a natureza se agravaram, como também as

relações sociais. Assim, as desigualdades ficam mais evidentes, se configurando

31

uma clara divisão de classes. Onde de um lado se encontram os detentores de

riquezas, responsáveis pela exploração da terra e do homem, e do outro, a classe

dos trabalhadores. Neste sistema há uma necessidade de aperfeiçoar cada vez mais

as técnicas de exploração, e é neste contexto que Saviani (1994) introduz a

importância da educação e da escola para a manutenção do “crescimento

econômico”: “a sociedade contratual, baseada nas relações formais, centrada na

cidade e na indústria, vai trazer consigo a exigência de generalização da escola.”

(SAVIANI, 1994, p.155). Assim, a classe dominante, única privilegiada de uma

educação escolar, vê a necessidade de difundir esta forma de ensino entre os

trabalhadores. Entretanto, esta generalização não ocorre de forma nivelada, posto

que, conforme o próprio Saviani (2007) alerta, essa divisão de classes irá provocar

também uma divisão na educação, onde pode se constatar duas modalidades

distintas:

Uma para a classe proprietária, identificada como a educação dos homens livres, e outra para a classe não proprietária, identificada como a educação dos escravos e serviçais. A primeira, centrada nas atividades intelectuais, na arte da palavra e nos exercícios físicos de caráter lúdico ou militar. E a segunda, assimilada ao próprio processo de trabalho. (Saviani, 2007, p. 155).

O fortalecimento desta estrutura faz com que fique cada vez mais evidente a

diferença entre as classes dominantes, detentoras de terras e riquezas e a classe

proletariada, possuidora da força de trabalho. Esta contextualização, conforme

Frigotto (2007) adverte, é importante para que não cometamos o equívoco

recorrente de analisar a educação em si mesma, ou seja, deslocada de uma

sociedade cindida em classes sociais desiguais. E é exatamente por esta divisão

que notamos uma manifestação da separação entre escola e produção. Enquanto

de um lado tem-se a educação para o próprio processo de trabalho, voltada para

atividades relacionadas à produção em si, como as atividades manuais, do outro ela

se destina à educação para o trabalho intelectual, preparando as futuras lideranças

civis e militares (SAVIANI, 2007).

Tomando esta breve contextualização como ponto de partida para nossa análise, é

possível dizer que não se deve buscar uma divisão entre o ensino profissionalizante

e o ensino médio geral. Ao contrário, na tentativa de encontrar alternativas que

visem superar as dicotomias existentes entre trabalho e educação, se torna inerente

32

que busquemos meios de integrar estas modalidades de ensino. Nesta perspectiva,

na proposta do currículo integrado do ensino médio, o trabalho é pautado como

princípio educativo, permitindo uma interlocução com a questão econômica, social e

cultural. Favorecendo, dessa forma, o diálogo entre conhecimentos gerais e

específicos, inserindo-os numa metodologia que promova uma construção conjunta

e coerente destes conhecimentos e suas finalidades. Logo, não cabe nesta estrutura

delimitar quantitativamente o que cabe a formação geral e a específica, visto que

estas são indissociáveis, inviabilizando qualquer recorte quantitativo (FRIGOTTO,

G.; CIAVATTA, M.; RAMOS M., 2005). Portanto, se acreditarmos que estas

transformações são necessárias, é importante que pensemos em caminhos que nos

levem a superação desta situação de afastamento entre Educação / Ensino Médio

Geral X Trabalho / Técnico Profissionalizante.

Todavia, conforme já exposto, apesar do Decreto Nº 5.154/04 permitir avanços

consideráveis no sentido da integração curricular, Frigotto, Ciavata e Ramos (2005)

ainda criticam muitos de seus aspectos, os autores entendem que para uma efetiva

integração do ensino é necessária uma concepção pedagógica que ultrapasse

limites, como por exemplo, o previsto em seu Art. 4º, que pretende

Ampliar a carga horária total do curso, a fim de assegurar, simultaneamente, o cumprimento das finalidades estabelecidas para a formação geral e as condições de preparação para o exercício de profissões técnicas. (Art. 4

o,

§ 2o Decreto Nº 5.154 de 23 de julho de 2004, grifo nosso)

Segundo os autores, isto não está de acordo com o que se buscou ao se instituir

este Decreto, já que permite uma continuidade do processo de paralelismo, na

medida em que prevê uma simultaneidade ao longo do ensino médio, mantendo-se

assim um caráter de independência entre a educação geral e a profissionalizante.

Desta forma, para que se institua uma nova concepção pedagógica é importante que

se entenda a integração de forma que não se desvincule o ensino geral do

profissionalizante, portanto, qualquer tentativa de adição ou sobreposição de

disciplinas pode prejudicar o seu sentido, que deve articular a essência do trabalho à

ciência de forma contextualizada com o desenvolvimento do indivíduo consciente de

sua realidade. (FRIGOTTO, CIAVATA E RAMOS 2005). Assim, os questionamentos

sugeridos por Santos (2007) se tornam pertinentes:

33

Será que a simples menção de processos físicos, químicos e biológicos do cotidiano torna o ensino dessas ciências mais relevante para o aluno? Será que o aluno aprenderá ciência mais facilmente com tal ensino? Muitas vezes, essa aparente contextualização é colocada apenas como um pano de fundo para encobrir a abstração excessiva de um ensino puramente conceitual, enciclopédico, de cultura de almanaque. (Santos, 2007, p.5)

Como este estudo buscou dialogar com a realidade encontrada, abordaremos

algumas questões práticas durante o desenvolvimento deste trabalho. Conforme o

exposto, dando continuidade a pesquisa, nota-se a falta de uma integração do

ensino profissionalizante em agropecuária ao ensino médio geral no Estado do Rio

de Janeiro, o que pode se justificar pelo direcionamento da formação para o trabalho

simples e “a não preocupação com as bases da ampliação da produção científica,

técnica e tecnológica e o direito de cidadania efetiva em nosso país.” (FRIGOTTO,

2007, p.1139). Entretanto, é possível observar, pela reprodução das falas de alguns

professores que a maioria concorda com uma integração, e embora isto ainda não

seja possível na conjuntura atual, acreditamos que caminhamos para a superação

desta condição.

O Professor “1” é aparentemente novo, usa uma linguagem bem coloquial e talvez

por isso esteja tão próximo dos estudantes, sendo inclusive convidado para Patrono

da turma que se forma neste ano de 2011. Em nossas conversas se mostrou

bastante entrosado também com a equipe de profissionais da escola. Recentemente

passou num concurso público para um estado fronteiriço com o Rio de Janeiro e

pediu transferência para uma escola mais próxima da divisa. Devido ao seu bom

relacionamento no trabalho, houve uma grande comoção com a sua partida, que se

daria no final do ano letivo. Pela reprodução de sua fala, parece que o que ele

entende sobre integração no ensino se aproxima de uma aparente contextualização,

conforme alerta Santos (2007).

Uso muita coisa, muita fisiologia vegetal. Não tem como falar de agricultura, falar de solo, falar de água, irrigação, se não falar de fisiologia. A planta se desenvolve, cresce. Falo muito também de biologia, matemática também é importantíssima, falo sobre cálculos. (...) Tem professores aqui na escola, eles abordam em cima de coisas da disciplina dele, ele conta a figura do atravessador, ele sempre coloca idéias pra os alunos, de história, de geografia, então, já começa a interligar uma coisa com a outra. (Professor “1” – Entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

34

Já a Professora “2” é um pouco mais exigente do que o Professor “1”, embora

também seja muito querida dos estudantes e da equipe, sendo escolhida para

Paraninfa da mesma turma. Esta professora abraçou o ensino técnico e esta escola

com muita garra. Parece estar bastante satisfeita com o seu trabalho, carregando

sempre um sorriso no rosto e bastante simpatia. Ela também dá aula para o ensino

fundamental e pude acompanhar bastante o seu trabalho com as crianças,

participando de oficinas de transplante de mudas e outras atividades desenvolvidas

por ela. O seu compromisso com a escola pode ser percebido na reprodução de sua

fala, onde expressa de forma mais apropriada o sentido de integração.

Pra minha concepção, esse colégio tinha que ser integrado. Integrado e integral. Ele tem que ser os dois em um. Esse colégio tem outra aptidão, ele tem outra estrutura e pra nossa realidade ia ser excelente. Por quê? Ele ia profissionalizar toda a garotada, toda clientela e automaticamente a gente ia mexer com o nível sócio-econômico da região. É automático. Tudo bem, a nossa educação ainda não é a melhor do mundo, não vai ser por um bom tempo, infelizmente. Enquanto a gente seguir a política do Banco Mundial, não tem jeito. Enquanto o governo brasileiro não adotar a educação e ter um plano educacional... Mas como não vai acontecer tão cedo... (...) agora, se o aluno ficasse na escola, porque a escola tem uma boa formação, independente de todos os programas educacionais que a gente tenha, a escola tem uma ótima estrutura física, tem um potencial pra formar excelentes pensadores (...). Não tem mais porque a gente está seguindo uma coisa engessada que o governo impôs. (...) Na agricultura você tem que falar de história, tem que falar de geografia, fala muito de química. A química é pesada, fala também de física, matemática, biologia. Não tem como fugir da base. Inclusive, uma coisa que é interessante, você já viu meu ritmo, não gosto muito de escrever nada, eu gosto de puxar pelo aluno do que ele sabe. Muitas coisas eu digo assim: vocês já viram no ensino médio, eles não conseguem trazer isso, mas por quê? Esse ensino dessa coisa que vem de Decartes, dessa coisa de: matemática, fecha a gaveta, geografia, fecha a gaveta. Isso é ruim, o aluno não consegue associar. Às vezes a gente tenta chamar ele, ai um outro aluno fala: "Ah! Realmente eu vi isso", "isso já foi falado", "em algum momento eu ouvi falar". Porque não é perdido. (Professora “2” – Entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

Sob uma perspectiva determinística poderíamos dizer que o ensino médio determina

e é determinado à luz do processo de trabalho. Ou seja, a forma de organização da

sociedade é condicionada pela forma de organização da escola e vice-versa. Nesta

lógica, a fragmentação do trabalho, sugere uma fragmentação do ensino, marcada

por um mercado onde os que pensam e controlam o processo de trabalho

“merecem” uma educação científico-intelectual, em contraposição aqueles que

executam o trabalho, que são destinados ao ensino profissional. Opondo-se a esta

visão é que Saviani (2003) introduz a noção de politecnia, a qual enxerga o processo

35

de trabalho como uma unidade “intelecto-manual” inseparável. Com base nesta

observação verificou-se a inserção do ensino profissionalizante em agropecuária

num contexto amplo, sem perder de vista a preocupação em observar as relações

que se estabelecem entre trabalho, educação, estrutura e realidade dos segmentos

sociais da escola e de seu entorno, buscando nessas relações indícios de

superação do modelo assistencialista e de aproximação com o processo

emancipatório do indivíduo nos diferentes contextos de desenvolvimento local.

Saviani (2007) atribui ao ensino médio o papel de recuperar a relação entre o

conhecimento e a prática do trabalho. Enquanto no ensino fundamental esta relação

é implícita e indireta, no ensino médio ela passa a ser evidente e direta. Assim

sendo, o objetivo ultrapassa a formação de técnicos por meio da reprodução do

processo produtivo no ensino, visando à formação de politécnicos. Segundo

definição do próprio autor: “Politecnia significa, especialização como domínio dos

fundamentos científicos das diferentes técnicas utilizadas na produção moderna.”

(SAVIANI, 2007, p.161). Enquanto o ensino médio técnico concentra as técnicas de

produção existentes, para a formação profissional específica numa determinada

área, provavelmente sem nenhuma conexão efetiva entre o contexto social,

econômico, histórico e cultural, a concepção politécnica busca não só a interlocução

com estes aspectos, como também sua articulação com o conjunto do processo

produtivo. Como sabemos este conceito ainda é pouco explorado no ensino médio,

embora o curso profissionalizante em agropecuária se concentre especificamente na

formação técnica, procuramos aqui por alguns aspectos que se aproximem da

concepção politécnica, como a articulação entre trabalho e educação e suas

dimensões, por exemplo.

É importante esclarecer que a politecnia, diferente do seu conceito literal, que

significa multiplicidade de técnicas, que podem inclusive estar isoladas entre si e

deslocadas do contexto social, econômico, político e cultural, visa integrar o

“domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas que caracterizam o

processo de trabalho produtivo moderno.” (SAVIANI, 2003, p. 140). Portanto,

entendemos que para se garantir um ensino profissionalizante adequado, onde

estas diferentes técnicas estejam conectadas e contextualizadas, a modalidade

profissional deve estar integrada ao ensino médio, de tal forma que se evite apenas

36

a adição de disciplinas especificamente profissionais ao currículo, em detrimento das

disciplinas de formação geral. A defesa da prioridade de um ensino profissional

integrado ao ensino médio é sustentada também por Frigotto (2007), que espera

com isso a superação da visão reducionista que trata a educação tecnológica como

“upgrade do ensino técnico”. (FRIGOTTO, 2007, p.1140). Apesar disso, mesmo

consciente de que as escolas estudadas possuem a modalidade profissional de

forma concomitante e subseqüente ao ensino médio, novamente foi necessário

voltar à atenção para o contexto no qual as disciplinas e as situações de ensino são

abordadas, já que o objetivo aqui se concentrou num estudo da realidade e o ensino

profissionalizante em agropecuária ministrado de forma integrada ao ensino médio

geral ainda não é prática comum nas escolas estaduais do Rio de Janeiro, conforme

podemos observar:

A escola José Soares Junior é a única situada em área urbana e oferece o curso

técnico profissionalizante em agropecuária completamente destacado do ensino

médio geral. A princípio administrava ambas as modalidades de ensino, entretanto,

a partir de 2006 foi transferida para o local que funciona atualmente, passando a

oferecer somente o ensino técnico. Pela peculiaridade de se tratar de um curso

técnico, destacado do ensino médio, as disciplinas estão diretamente relacionadas à

formação profissional, quais sejam:

Módulo I (com duração de um ano):

Administração de Propriedades Rurais; Agricultura; Construções e Instalações

Rurais; Desenho e Topografia; Planejamento e Projetos

Módulo II (com duração de um ano):

Agricultura; Irrigação e Drenagem; Planejamento e Projetos; Processamento

de Produtos Agropecuários; Zootecnia.

Outro colégio com peculiaridades bem distintas é o Colégio Rei Alberto I, que apesar

do caráter concomitante entre o ensino médio geral e técnico profissionalizante, está

em fase de transição para a integralização do ensino no currículo, o que também

pode ser considerado um grande avanço, já que ainda não existem escolas

profissionalizantes com esta característica no Rio de Janeiro.

37

Entretanto, apesar de todas as críticas as quais estão sujeitas as políticas

educacionais atuais, é de se notar um progresso nas questões ligadas à educação.

Exemplo disso é um reconhecimento do Ministério da Educação (2007) de que a

formação profissionalizante não se restringe à formação para o processo de

trabalho, devendo estar vinculada a dinâmica que envolve o processo produtivo em

todos os seus aspectos. Ainda segundo o MEC (2007), não basta fornecer os

conhecimentos específicos relacionados a cada curso técnico, já que estes

conteúdos são insuficientes para a formação ampla e geral do indivíduo. Assim,

encontramos nestas afirmações uma aproximação com a concepção politécnica

proposta por Saviani (2003), e foi baseado nestes avanços que se procurou

identificar no princípio educativo uma assimilação entre teoria e prática articuladas

ao trabalho intelectual e manual. Por acreditar que desta forma o estudante terá

condições de aplicar todo o conhecimento adquirido, durante várias etapas de sua

formação, de maneira capaz de solucionar diversos problemas em diferentes áreas

do conhecimento (SAVIANI, 2003)

Considera-se animador o fato de encontrarmos no Ministério da Educação propostas

de superação deste quadro de paralelismo explícito, focadas no papel central do

ensino médio, apontando não só o mercado de trabalho como foco, mas também a

formação do indivíduo em todas as suas dimensões (MEC, 2007). É importante

ressaltar que estes avanços em grande parte são frutos das lutas da sociedade

organizada que pauta estas questões em seus espaços de disputa. Sob este

aspecto, com o objetivo de integrar o ensino médio a prática profissional, o Ministério

da Educação, através do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), criou em

2007 o Programa Brasil Profissionalizado, que visa fortalecer as redes estaduais de

educação profissional e tecnológica, através de repasses específicos de recursos do

governo federal. Desta forma os estados podem investir em suas escolas técnicas,

viabilizando a modernização e a expansão das redes públicas de ensino médio

integradas à educação profissional. Atingindo assim as recomendações propostas

no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos que, entre outras, prevê a construção de

laboratórios de física, química, biologia, matemática e informática (MEC, 2007).

Como estes repasses já estão sendo realizados, procurou-se conhecer um pouco da

estrutura oferecida pelas escolas à comunidade acadêmica. Como era de se

38

esperar, foram encontradas algumas muito bem equipadas e estruturadas e outras

nem tanto.

No Centro Interescolar de Agropecuária José Francisco Lippi foi possível observar

uma boa estrutura de apoio aos estudantes, na qual vale a pena destacar a sala de

vídeo, a biblioteca, os laboratórios de química, física e biologia e o de informática,

todos muito bem equipados. É interessante ressaltar ainda que durante a pesquisa

percebeu-se uma preocupação em destacar a importância do processo ensino-

aprendizagem, para isso, o colégio deixa explícita a disponibilização de materiais

didáticos que considera auxiliar na facilitação deste encaminhamento. Dentre as

tecnologias e os recursos oferecidos, realçam-se os instrumentos musicais, os

equipamentos e as ferramentas para o desenvolvimento das atividades agrícolas,

coleções, periódicos e literatura em geral e os equipamentos e materiais para o

desenvolvimento do trabalho de pesquisa na área de química e física.

Já no Colégio José Soares Junior as dificuldades são maiores. As diversas

modificações em relação ao local de funcionamento e ao próprio nome da escola

podem ter influenciado significativamente a sua estrutura atual. Antes denominada

Colégio Estadual José Severiano Soares Júnior, tinha a pretensão de ser um modelo

de desenvolvimento para a região, no entanto, devido a alguns entraves, dentre eles

a precariedade de transporte urbano até o colégio e a carência de recursos materiais

e humanos, inclusive de docentes, parece que esta expectativa não foi alcançada. A

escola foi então transferida de endereço, fato que se repetiu por várias ocasiões, por

vezes funcionando em condições precárias, chegando-se a cogitar o fechamento da

instituição. Entretanto, segundo foi possível entender com a pesquisa, no ano de

1994 o Governo do Estado do Rio de Janeiro, pelo Decreto nº 19.654 de 24 de

fevereiro de 1994, criou e re-nomeou o colégio, que passou a chamar-se Escola

Agrotécnica José Soares Júnior, que a princípio foi instalada em espaço cedido na

Faculdade de Educação de Itaboraí (FEITA). Mesmo assim, as dificuldades relativas

ao local de funcionamento do colégio permaneceram até o ano de 2006, quando foi

promovida a sua transferência para um prédio antes ocupado por outra escola.

Neste mesmo ano sua denominação mudou novamente, passando a ser chamado

Colégio Estadual Agrícola José Soares Júnior, como é conhecido hoje.

39

Dando continuidade a pesquisa, conversei com a diretora do Colégio Rego Barros,

que declarou passar por dificuldades em decorrência da instalação da Indústria de

Petróleo em Macaé, cidade vizinha. Segundo ela, os jovens da região estão sendo

absorvidos por esse mercado de trabalho, o qual possibilita um rápido retorno

econômico. A diretora considerou ainda que os jovens, filhos de pequenos sitiantes,

não dão valor ao ensino agrícola e à agricultura. Para ela o trabalho é ainda

dificultado pela falta de respaldo político e social, o que contribui para uma baixa

exploração do espaço físico do colégio, que conta com uma área de 26 hectares

praticamente ociosa, devido à falta de profissionais, implementos e insumos

agrícolas.

Finaliza-se este bloco com o Colégio Rei Alberto I que, antes de ser estadual,

pertencia a uma Organização Não Governamental, o Instituto Bélgica Nova Friburgo

(IBELGA), que, embora continue parceiro, cedeu o segundo seguimento do ensino

fundamental à prefeitura municipal de Nova Friburgo e o ensino médio ao governo

do Estado do Rio de Janeiro. Neste contexto, outro diferencial encontrado, diz

respeito à metodologia pedagógica, que é administrada em regime de alternância

entre o tempo escola e o tempo comunidade, praticando-se o período de uma

semana em cada tempo, intercalando-os. Seu local de permanência é um complexo

conhecido como Centro Familiar de Formação por Alternância Rei Alberto I (CEFFA

Rei Alberto I), onde funciona, em parceria com o IBELGA, o Colégio Estadual

Agrícola Rei Alberto I, que oferece o curso de ensino médio e educação profissional

em agropecuária, mantido pelo governo do estado, e a Fazenda Escola Rei Alberto I

que oferece o ensino fundamental, mantida pela prefeitura municipal de Nova

Friburgo.

Em meio a tantas peculiaridades e apesar de reconhecer na política atual do

Ministério da Educação um sinal de progresso em relação ao ensino

profissionalizante, este órgão ainda considera ruim a qualidade do ensino público.

De alguma forma concordamos, em parte, com esta avaliação, entretanto, não

poderia deixar de fazer algumas ressalvas. Para entendermos melhor esta questão

utilizaremos a figura 4, baseada nos dados do censo escolar, com a intenção de

melhor compreender a forma de distribuição nacional do ensino médio e técnico

profissional entre as instituições públicas e privadas.

40

Figura 4 – Matrícula no ensino médio e na educação profissional técnica de nível médio no Brasil por dependência

administrativa.

Dependência

administrativa

Ensino

Médio

(Regular)

Ensino Médio (EJA)4

Ensino

Médio

(TOTAL)

Educação

Profissional

Técnica de

Nível

Médio

Presencial Semipresencial

BRASIL 8.906.820 1.345.165 405.497 10.657.482 744.690

FEDERAL 67.650 814 - 68.464 79.878

ESTADUAL 7.584.391 1.172.870 371.398 9.128.659 233.710

MUNICIPAL 186.045 45.754 15.558 247.357 23.074

PRIVADA 1.068.734 125.727 18.541 1.213.002 408.028

* Fonte: MEC/SETEC elaborado a partir de INEP/Censo Escolar 2006.

Conforme podemos observar, a oferta de cursos técnicos é muito baixa em

comparação ao ensino médio como um todo e embora haja uma concentração do

ensino médio na rede pública de ensino, não se pode dizer o mesmo quanto à

educação profissional técnica, que se agrupam no sistema privado (MEC, 2007).

Sobre este aspecto o Ministério da Educação (2007) critica o ensino

profissionalizante público comparando-o ao privado.

“Embora haja escolas públicas de excelente qualidade, essa não é a regra geral. Dessa forma, grande parte dessas escolas, nas quais estudam os filhos da classe trabalhadora, tentam reproduzir o academicismo das escolas privadas, mas não conseguem fazê-lo por falta de condições materiais concretas. Deste modo, em geral, a formação proporcionada nem confere uma contribuição efetiva para o ingresso digno no mundo de trabalho nem contribui de forma significativa para o prosseguimento dos estudos no nível superior.” (EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO - DOCUMENTO BASE, MEC, 2007, p. 26)

Neste caso, conforme destacado, em um nível nacional o documento aponta para

uma baixa qualidade do ensino público. Por outro lado, parecem corroborar com a

idéia de conferir ao academicismo das escolas privadas um sentido de qualidade do

ensino, atribuindo ainda a baixa qualidade das escolas públicas à falta de condições

materiais. Pode-se dizer que nas escolas estaduais do Rio de Janeiro encontram-se

4 EJA – Educação de Jovens e Adultos.

41

muitos estudantes com poucos recursos financeiros, e a qualidade do ensino

influencia diretamente a formação destes estudantes, direcionando-os de alguma

forma para o trabalho ou para a continuação dos estudos. Contudo não se pode

julgar a qualidade do ensino nestas escolas baseados na falta de condições

materiais e, tão pouco, imputa-se à reprodução do academicismo das escolas

privadas um caminho para se elevar a qualidade do ensino.

Todavia, por se tratar de um ensino profissionalizante, a estrutura curricular do curso

de agropecuária deve ser elaborada de forma em que se aborde numa concepção

ampla a relação com o mundo do trabalho, buscando dar qualidade ao ensino nas

questões específicas inerentes a este curso. Conforme observa Saviani (2003),

também é importante que não se perca de vista a concepção de politecnia, que

deriva exatamente da problemática do trabalho enquanto princípio educativo. Neste

sentido, a realidade humana deriva do trabalho, já que o ser humano, através do

processo de trabalho, adapta a natureza às suas necessidades para viabilizar sua

existência (SAVIANI, 2003). Porém, a relação entre o trabalho e a educação escolar

nem sempre é compreendida de forma ampla pelos professores, que muitas vezes

confundem ensino contextualizado com a simples abordagem de situações

cotidianas (SANTOS, 2007).

42

3. Concepções teórico-epistemológicas na prática da Educação do Campo Como vimos, o contexto educacional em grande parte, sofre influências das

questões ligadas a produção e ao mercado de trabalho. Este fato ganha posição de

destaque durante a Revolução Industrial que, dentre outras implicações, promove

uma mecanização da agricultura, forçando a necessidade de formar trabalhadores

capacitados para operar as novas tecnologias (SAVIANI, 2007). Com isso, se torna

crescente a importância de se educar a classe trabalhadora, a fim de capacitá-la

intelectualmente para organizar e qualificar o processo produtivo, gerando um

impasse na conjuntura educacional brasileira. Ao suprir esta necessidade, o

conhecimento passa a se incorporar ao processo de trabalho, se configurando assim

uma contradição da sociedade capitalista, como descrito por Saviani (2003), “se

essa sociedade é baseada na propriedade privada dos meios de produção e se a

ciência, como conhecimento, é um meio de produção, deveria ser propriedade

privada da classe dominante.” (SAVIANI, 2003, p. 137). Esta observação reforça a

idéia da proposta da substituição do preparo intelectual específico pelos cursos

profissionalizantes, organizados diretamente para suprir uma demanda de mercado.

O que gera uma bifurcação do ensino, a partir da escola primária, para uma

formação geral, destinada a burguesia e uma formação profissional, para a classe

proletariada. (SAVIANI, 1994)

Segundo Saviani (1994), este modelo de produção industrial vem acompanhado de

uma concepção de modernização que valoriza a vida nas cidades. O autor destaca

nesta análise o papel político da educação escolar na formação do cidadão, que tem

em sua própria epistemologia a prerrogativa da formação centrada na cidade. Logo,

é nesta conjuntura que se trabalha hoje a educação do campo, o que a torna

extremamente desafiante, pois ao evitar-se reproduzir os modelos educacionais

predominantes, assume-se uma lógica contra-hegemônica. Neste sentido, embora

haja concordância com Saviani e com a importância do conteúdo para a formação

do indivíduo, não poderia deixar de destacar a importância da metodologia

pedagógica utilizada no aprendizado. Portanto, ao se critica o modelo comumente

encontrado, no qual este conteúdo é narrado para pacientes, ouvintes. Este formato

em que se educa constitui ferramenta importante para a manutenção do status quo.

A reprodução, na prática educacional, de processos que geram exclusão, através da

43

repetição ou da narração, faz do educador, que se julga sábio, doador do saber,

podendo desta forma ser usado como uma ferramenta que se “funda numa das

manifestações instrumentais da ideologia da opressão” (FREIRE, 1970, p. 33).

Assim, Paulo Freire denomina de “educação bancária” esta visão distorcida de

transferência de conteúdo, fazendo uma analogia na qual a educação se torna um

ato de depositar, o educador, um depositante e o educando, um depositário. Desta

forma, quanto mais “enchidas” estejam as vasilhas, melhor o educador, ao passo

que quanto maior o receptáculo e a capacidade de armazenar passivamente as

informações, tanto melhor será o educando. Mantendo-se esta situação, nos

afastamos de uma educação problematizadora e contextualizada, abandonando o

objetivo de emancipação do indivíduo. Portanto, estas questões não foram deixadas

de lado ao estudar as escolas públicas localizadas em áreas rurais. Apesar de ter

consciência de que o modelo escolar não é a única forma de se educar na

sociedade, sabe-se que é este o modelo predominante de educação. Devido a isso,

este estudo se desenvolveu dentro dos muros da escola, verificando num modelo

formal de educação, elementos capazes de promover um diálogo com o contexto de

desenvolvimento local.

Conforme pudemos observar, este estudo trouxe como primeira hipótese a

existência de uma estreita relação entre o curso técnico em agropecuária e o meio

rural. Daí surgiu a suposição de ser de interesse da população do campo esta

formação profissionalizante, o que de fato se confirma no decorrer da pesquisa.

Dentre outras escolas de perfil semelhante, destaca-se mais detalhadamente nesta,

conforme veremos, que o corpo discente também é composto, em sua maioria por

filhos de produtores e trabalhadores rurais, residentes na localidade ou nas

comunidades adjacentes. Foi encontrada também uma preocupação em atender a

comunidade do entorno, neste sentido, a escola propõe o desenvolvimento de

projetos que estejam em consonância com a realidade local, visando oferecer novas

técnicas de plantio que irão beneficiar os produtores da região, tendo como objetivo:

Formar técnicos em agropecuária com uma visão holística e sustentável do “mundo agropecuário”, possibilitando novas abordagens com os produtores rurais e com a agricultura familiar. Esta dinâmica na formação dos técnicos é baseada na formação com foco na pesquisa e na reflexão, pois o colégio esta inserido em uma das maiores áreas de produção de vegetais do estado

44

do Rio de Janeiro. (informações obtidas a partir do sítio eletrônico da escola).

Foi com esta perspectiva que o Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola

escolhida para o estudo de caso foi analisada, onde se encontrou não só a

preocupação com a formação de técnicos como também com o desenvolvimento

local:

Está situada em área rural (...) cujas principais atividades econômicas desenvolvidas são a agricultura e os serviços de hotelaria. O curso técnico em agropecuária é uma alternativa para a inserção dos alunos e da comunidade local no mercado de trabalho, contribuindo para a diminuição do êxodo rural e valorizando o trabalho do homem do campo. É importante dizer que além da valorização existe a necessidade de uma profissionalização das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores rurais, que muitas vezes são submetidos a condições precárias de emprego. Contudo, em nossa região existe uma carência grande de mão-de-obra qualificada para trabalhar na produção agrícola. Portanto, existe a necessidade de se formar profissionais, em nível técnico para atuarem junto aos produtores, oferecendo novas tecnologias de cultivo e produção. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, pág. 4).

Este documento afirma ainda que, no ato de sua elaboração, 72,74% dos

estudantes eram filhos de agricultores e lavradores da região. Fato que pôde ser

confirmado ao abordar estes estudantes. Como notaremos pela reprodução de

algumas falas. Todavia há aqueles que por não terem nenhuma ligação com o

campo (embora este caso não seja o mais comum), preferem seguir seus estudos

em áreas diferentes das ciências agrárias. Ainda assim, consideraram válida a

experiência de se relacionar com estes conhecimentos. Quanto aos estudantes que

pertencem ao meio rural, alguns deles após concluírem o ensino profissionalizante

pretendem ingressar diretamente no campo, exercendo as atividades técnicas

agropecuárias em suas propriedades. Porém, também se encontram estudantes

que, embora pertençam ao ambiente rural, pretendem continuar seus estudos, se

interessando pela formação de nível superior, em cursos como veterinária,

agronomia e meio ambiente. De qualquer forma, continuariam exercendo as suas

atividades profissionais na área agrícola.

Esta foi a primeira entrevista realizada, de início gostei bastante do processo de

diálogo e da forma como a estudante “A2” se expressava. No entanto, ao

transcrever a gravação, não tive a mesma impressão inicial. Suas expectativas

divergiam daquelas que esperava encontrar e talvez por isso tenha ocorrido certa

45

frustração. Ela sempre morou na cidade, andava sempre muito bem arrumada e

maquiada, embora não fosse a única com este perfil, parecia destoar um pouco do

restante da turma. De todo jeito, ela se articulava muito bem, era entrosada com o

grupo e tinha seus objetivos firmes, queria fazer faculdade de comunicação social e

não escondia isso de ninguém.

Na verdade por eu morar na cidade eu não trabalho no campo, então a maioria das coisas fica dentro da escola. (...) eu nunca tinha posto a mão na terra, então é bem estranho. Ás vezes em casa, que a gente tem um espaçozinho aí agora eu estou plantando morango e uva. São as únicas coisas, assim, fora da escola que eu faço. (...) Eu gosto do curso, gosto muito da área agrícola, mas foi uma área mais para expandir o conhecimento, que eu nunca quis fazer nada relacionado a isso, eu nunca quis me especializar, então o curso técnico foi mais para abrir minha mente, pra mim ver se eu gosto, do que eu gosto. (...) Eu pretendo sair daqui e fazer faculdade. Não relacionada à agricultura, nada disso. Eu escolhi fazer este curso porque eu gosto dessa área, eu não fazia nada durante as tardes, então eu resolvi fazer um curso técnico. (Estudante “A2” - 2º ano, entrevista realizada em 20 de outubro de 2011)

Encontrei no estudante “B2” um grande interessado pelo curso técnico, facilitando

bastante o nosso diálogo, não só porque era produtor e vivia do campo desde o seu

nascimento, mas porque se expressava extremamente bem, sendo inclusive

representante de turma. Nunca faltava às aulas e sabia dar o devido valor ao espaço

acadêmico e a sua equipe. Mostrava ter total consciência de sua realidade e sabia

exatamente o que queria na escola e no curso profissionalizante. Apesar de parecer

muito sério não aparentava ter mais do que vinte e poucos anos de idade, mas isso

não fazia com que o vissem com maus olhos, ao contrário, era muito admirado pelos

professores e todos daquela comunidade acadêmica.

Moro em área rural. Trabalho, sou autônomo, eu produzo e o lucro é de acordo com o que eu produzo. Minha renda familiar, em cima da agricultura, por exemplo, quatro ou cinco mil, entendeu? Em cima da agricultura porque meu pai mesmo não trabalha com agricultura não, só eu e minha mãe mesmo e os rapazes que trabalham com a gente lá. (...) Olha, eu tenho muita esperança, porque eu vi a necessidade de aprender técnicas de produção, de adubação, de controle de produção. Então eu resolvi fazer este curso e isso está me ajudando muito na minha cultura em casa, já melhorou muito a minha produção, a qualidade da minha produção. Embora eu faça um consórcio de químico com o orgânico, então eu estou passando pro orgânico, mas não totalmente orgânico, estou diminuindo os meus gastos, mas eu tenho muita expectativa. Eu não estou focado em procurar nenhum emprego, nem em loja nem nada, estou focado em cuidar da nossa terra lá em casa, e eu vejo que me proporciona um bom provimento, que é

uma coisa mais demorada, mas já me ajudou muito. (Estudante “B2” - 2º

ano, entrevista realizada em 13 de novembro de 2011)

46

Pude perceber também que os estudantes que sempre viveram na área rural,

pretendem continuar neste meio. Entretanto, seus objetivos variam, há os que

pretendem exercer a sua atividade profissional, como é o caso do estudante “B2” e

os que querem continuar seus estudos, como a estudante “A1”. A grande diferença

que encontrei foi que a maioria dos que não querem dar prosseguimento a vida

acadêmica, pensam em exercer a profissão de técnico em agropecuária no próprio

sítio ou no de suas famílias, poucos falaram em concursos públicos ou outra forma

de atuação diretamente remunerada. Já aqueles que gostariam de continuar

estudando desejam trabalhar na área como profissionais assalariados, como é o

caso desta estudante.

Moro em área rural, (...) Desde quando eu nasci, meus pais são lavradores. (...) Eu pretendo ganhar conhecimento e depois fazer agronomia, eu pretendo me tornar uma agrônoma. Porque está muito envolvido no meu meio, por eu morar na área Rural, trabalha muito com essas coisas assim de olericultura, muita plantação. Aí minha intenção é focar mais na agronomia. (Estudante “A1” – 1º ano, entrevista realizada em 13 de novembro de 2011)

De fato, pude perceber que a maioria dos estudantes da escola é proveniente de

área rural, o que permite a este estudo dialogar com as questões ligadas ao campo

e ao movimento de educação do campo. Acreditando que o processo de construção

do conhecimento ocorra em diferentes níveis e dimensões. Entretanto, quando

tratamos de questões ligadas à educação, o que comumente fazemos é tratar de

questões ligadas diretamente à escola. Mesmo com a manutenção de outras formas

de educação, situadas à margem do ensino formal, como por exemplo, as

diretamente ligadas ao processo produtivo, estas continuam sendo subordinadas à

escola e passam a ser avaliadas sob uma ótica escolar (SAVIANI, 1994). Seria

interessante que entendêssemos a Educação do Campo enquanto parte de uma

política educacional reivindicada pelos movimentos sociais do campo, daí a

importância de encará-la como alternativa de aproximação do aspecto social ao

conteúdo programático e didático-pedagógico.

Portanto, se faz importante introduzir neste debate alguns conceitos, como por

exemplo, o da valorização da expressão “do campo”, que ocorre pelo entendimento

de não ser correto separar o território das dimensões territoriais, ou seja, educação,

47

cultura, produção, trabalho, infra-estrutura, organização política, mercado, não

podem estar dissociados do território. Se assim estivessem, se constituiriam

dicotomias, nas quais o território poderia ser visto como elemento secundário e,

neste caso, perderia sua importância. E é exatamente por dar ênfase ao campo

enquanto território camponês que é utilizado o termo “do” Campo, no lugar de “no”

campo (FERNANDES, 2006).

O esclarecimento deste conceito nos ajuda a perceber de forma mais ampla as

reivindicações da educação do campo, que tem como uma de suas medidas garantir

o acesso a educação pública, em todos os níveis, com um programa especial, onde

jovens e adultos possam ter direito à educação profissional de nível médio e à

educação superior sem comprometer a sua permanência no campo (MST, 2009).

Portanto, baseados por esta proposta, podemos analisar a viabilidade de

participação dos trabalhadores rurais nos espaços formais de educação. De fato,

nesta pesquisa, verifica-se além de uma grande evasão, uma baixa procura pelo

curso. Atribuí-se esta ocorrência a dificuldade de participação dos trabalhadores

rurais, bem como de suas famílias, neste espaço formal de educação. Embora este

assunto gere muita polêmica, havendo grandes divergências de opinião por parte

dos estudantes e de alguns professores, a realidade nos mostra que a freqüência

regular e obrigatória compromete a permanência no campo, o que atrapalha

algumas famílias e inviabiliza a participação de outras. Muitos acreditam que a

pouca procura pelo curso é decorrente da falta de divulgação, outros alegam ser

pelo baixo comprometimento das pessoas da região, e há os que concordam que a

carga horária se apresenta enquanto fator limitante à freqüência no curso. Conforme

podemos observar:

Na verdade, a oferta [de vagas] é maior do que a procura. Bem maior. Eu sempre falo com os alunos: Não entendo essa região, agricultura, região rural e o curso não é tão procurado. (...) Até pode influenciar o fato de ter que ter o ensino médio e pra isso, a pessoa teria que ficar aqui o dia todo pra fazer o técnico também e com isso ter que lagar o trabalho. Mas hoje em dia, não é tão difícil você concluir. O cara ganha passagem, não gasta dinheiro com nada, o cara ganha alimentação aqui, fica o dia inteiro aqui e se alimenta e volta pra dentro de casa. Acho que não teria tanto problema assim. Na verdade, até influenciaria um pouquinho. Porque o ideal é que o aluno ficasse internado aqui de dia, faria o médio durante a manhã, o técnico à tarde, (...) o que a gente observa: Os alunos que já trabalham na área, (...) eles vêm com uma vontade de obter conhecimento, de obter informação, muito grande, então, o tempo curto que tem aqui, eles aproveitam ao máximo. Muitos do [curso] técnico são da área rural mesmo,

48

mas não tem uma ligação direta com o campo, não trabalham no campo.” (Professor “1”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

Como havia posto, a Professora “2” parece mais contextualizada com o perfil sócio-

econômico da região. Talvez pela sua formação acadêmica ou até mesmo pela sua

condição econômica, que não é das mais favoráveis, ela se identifique de alguma

forma com as dificuldades apresentadas pelos estudantes e suas famílias. Acredito

que este fato ajude a enxergar uma realidade que nem sempre se mostra aos olhos

de quem não conhece esta situação.

A procura é muito baixa, é horrível. A gente faz divulgação, a gente pede os meninos pra irem nas salas, a gente botou a faixa aqui e lá embaixo. (...) Aqui influência. Por quê? A escola está mudando o perfil dela. Ainda não é muito expressivo, mas está. Tem muita criança da cidade estudando aqui. E os menino que são daqui da região, eles trabalham no contra-turno com a família. Então, isso também vai influenciar, é menos uma mão de obra. E muitas crianças aqui (...) fazem carga à noite, eles passam a madrugada empilhando os caixotes, que de dia, as pessoas levam pra lavoura, enchem de vegetal e deixam ali. Aí vem a equipe pegar e eles colocam num local. À noite, eles botam nos caminhões. (...) Isso é um tiro no pé, porque o menino fica na madrugada empilhando carga, ajeitando, pregado os caixotes. Ele de dia, às vezes vem “sonado”, e ainda ficar à tarde? É muito puxado. Isso pode influenciar o perfil de quem está freqüentando. (Professora “2” entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

A estudante “B2” cita a desistência como umas das causas do número de vagas

excedente. Neste caso, não podemos relacionar esta evasão ao simples

desinteresse por parte dos estudantes. Alguns podem ter outros motivos para não

conseguirem acompanhar o desenvolvimento da turma.

No caso, sobram [vagas]. A minha turma, um exemplo, tinham 20, saíram 10. Porque eu acho que as pessoas vêm como uma experiência: Ah! Se der

certo eu continuo, se não der certo eu não continuo. (Estudante “B1” – 1º

ano, entrevista realizada em 24 de outubro de 2011)

Novamente busquei nos dizeres do Estudante “B2” uma fala coerente com a sua

realidade e expectativas, por este motivo fiz questão de destacá-la aqui:

O que que acontece, eu estou fazendo um investimento em mim né?! Porque eu estou tirando do meu tempo de trabalho para estar estudando, só que se eu não estivesse estudando eu não estaria aprendendo como trabalhar, vamos dizer assim, na minha propriedade. Então eu estou perdendo, vamos dizer assim, entre aspas, dois anos da minha vida estudando, só que eu vou ter uma vida inteira para trabalhar o que eu

49

aprendi nesse curso, essas práticas, essas técnicas. (Estudante “B2” – 2º

ano, entrevista realizada em 10 de novembro de 2011).

Não obstante as críticas apresentadas, salvo algumas exceções, a situação que se

mantém é a da lógica vigente, onde o ensino formal predomina e de forma

dicotômica entre ensino geral e profissionalizante. Atendendo, segundo Soares

(2004), ao consenso do direcionamento político exercido pela classe dominante.

Porém, conforme citado por Angotti e Auth (2001), o descontentamento da classe

oprimida contribui para uma ordenação da sociedade civil, que Soares (2004)

acredita ser de onde surgirá um novo projeto democrático de sociedade. Desta

forma, uma educação integral e politécnica, onde o objetivo maior seja a

emancipação do indivíduo, ainda é contra-hegemônica na sociedade capitalista

atual. Ao pensarmos na realidade das áreas rurais do Brasil, as lutas por melhores

condições de vida estão diretamente relacionadas às mudanças no modelo

educacional do campo e na forma de exploração de sua produção. Mesmo

concordando com este posicionamento a situação atual nos mostra que ainda

estamos longe de atingir este horizonte, onde o papel da escola enquanto “aparelho

de hegemonia, constitua um campo de luta, capaz de criar uma contra ideologia,

possibilitadora de um maior conhecimento, uma maior conscientização.” (SOARES,

2004, p.133). Buscar na escola este instrumento significa esperar encontrar a

comunidade acadêmica consciente de seu papel, articulados com a sociedade local

e os movimentos sociais organizados e comprometidos com estas mudanças,

entretanto esta situação ainda não é condizente com o que se pode observar nas

escolas estaduais do Rio de Janeiro.

Contudo, não se pode deixar de concordar com a opinião de que a manutenção de

uma educação excludente, onde não se dê prioridade à integralização curricular e a

reflexão sobre valores e atitudes profundamente enraizados na sociedade atual,

tende a favorecer a manutenção da “lógica vigente” de exploração e domínio. Se por

um lado o processo de globalização e o crescimento do capital favorecem as

grandes fusões e o fortalecimento de empresas multinacionais, por outro, a

concentração de renda e o aumento das desigualdades econômicas e sociais,

deixam cada vez mais evidentes a exploração e a exclusão da classe trabalhadora.

O que, segundo Angotti e Auth (2001), faz crescer o

50

Descontentamento das populações exploradas que tendem a se mobilizar para mudar esse panorama de exclusão. Exemplos contemporâneos no Brasil são os movimentos organizados, locais, regionais e nacionais (com destaque para o Movimento dos Sem-Terra), agrupados por interesses comuns e até mesmo por faixas etárias, como os grupos da terceira idade e os aposentados. Dentre as reivindicações explícitas de todos esses grupos, a de uma educação mais atuante, forte, comprometida com resultados em favor das maiorias está sempre presente. (ANGOTTI E AUTH, 2001, p.18)

Partindo-se do pressuposto de que o ensino profissionalizante não deve formar

simplesmente para o trabalho, buscou-se no princípio educativo do ensino técnico

em agropecuária as dimensões questionadoras, visando o objetivo emancipador da

educação, que critica o aprendizado de forma mecânica ou rotineira, se baseando

na articulação da prática com a teoria na busca por soluções cotidianas, em todos os

momentos de formação. Contudo, ao se estudar instituições de ensino formal, é

importante que se procure por sinalizações que apontem algum progresso nesta

estrutura, que embora rígida e problemática, vem mostrando indícios de

transformações ao longo da história. Entendemos, portanto, que estes avanços são

resultados de conquistas da sociedade civil (SOARES, 2004) que não podem ser

pormenorizados. Na prática, podemos diagnosticar alguns destes pontos até mesmo

nas próprias leis que regem a educação nacional (LDB 9394/96).

Sendo assim, sobre o ensino profissionalizante cabe destacar que, embora

inicialmente criado com caráter discriminatório, tendo como público-alvo pessoas de

baixas condições sócio-econômicas, a partir do século XX o enfoque educacional

sofreu algumas alterações. De qualquer forma, seu público continuava sendo as

classes com escassos recursos financeiros. No entanto, dentro das medidas que

regulamentam o ensino, foram realizadas algumas modificações nas leis específicas

para a educação profissional. Podemos perceber estes avanços, por exemplo, na

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9394/96, onde artigo de nº 35

traz como finalidades para o ensino médio, a preparação para o trabalho e a

cidadania do educando, capacitando-os para novas condições de trabalho. Além do

aprimoramento da pessoa humana, com destaque para uma formação ética e para o

desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico. O artigo cita

também a importância do conteúdo das disciplinas e a relevância da compreensão

dos fundamentos científico-tecnológicos, chamando atenção para a necessidade de

51

se relacionar a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. Outro exemplo

que vale ser citado diz respeito ao artigo nº 39 desta lei, que apregoa que “A

educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à

ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a

vida produtiva”.

Entretanto, segundo Freire (1970), para que a educação cumpra seu papel de

“libertar”, o educando deve exercer um papel ativo, pois “fora da busca, fora da

práxis, os homens não podem ser”, o insistir na visão distorcida da educação faz

com que não haja criatividade, nem transformação e nem saber. Esta busca faz da

“educação libertadora” conciliadora, superando as contradições existentes, “de tal

maneira que se façam ambos, simultaneamente, educadores e educandos”

(FREIRE, 1970, p.34). De fato, são muitos os desafios para a educação do campo,

entretanto se esperamos que a educação formal supere alguns obstáculos para

atender aos anseios da comunidade rural, se torna coerente que a prática

pedagógica utilizada seja amplamente discutida, sendo fundamental que estejam

presentes neste debate a comunidade e os movimentos sociais do campo. Daí a

importância de abordar, durante este estudo, a elaboração democrática do Projeto

Político Pedagógico e a participação da comunidade local neste e em outros

espaços coletivos de formação e decisão.

Sobre este aspecto, não é possível dizer que seja prática comum das escolas

técnicas em agropecuária no Estado do Rio de Janeiro a participação efetiva da

comunidade. Muito embora haja algumas exceções, como por exemplo, o Colégio

Rei Alberto I que por sua finalidade tem como princípio:

Valorizar a participação da família e da comunidade no processo formativo. Devido a este objetivo, a escola utiliza o recurso pedagógico da Alternância, implantado pelo IBELGA, que também se responsabiliza pela capacitação dos professores e pela assessoria técnica, administrativa e pedagógica. Sendo o trabalho no ensino médio uma continuidade do que se inicia no ensino fundamental. (Informações obtidas a partir do sítio eletrônico da escola http://cereialberto.blogspot.com/)

Outro dado obtido nesta pesquisa diz respeito ao amparo legal da proposta da

escola, que deixa evidente a possibilidade de diálogo com a Educação do Campo,

52

realçando novamente os aspectos positivos da legislação que rege o ensino formal,

conforme se destaca a seguir:

Por ser uma Unidade de Ensino que se propõe a Educação do Campo e o desenvolvimento de um projeto educacional que se propõe a adaptar-se ao ritmo de vida do jovem rural, este projeto está amparado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.424, de 24 de dezembro de 1996.) e pela Resolução CNE/ CEB de Número 01, de 03 de abril de 2002 (Diretrizes Operacionais Para a Educação Básica nas Escolas do Campo) e pelo Parecer CNE/ CEB 1/2006, Homologado pelo Ministério da Educação em D. O. da União em 15/03/2006. (Informações obtidas a partir do sítio eletrônico da escola http://cereialberto.blogspot.com/)

Excetuando-se esta escola, não houve nenhuma outra com uma proposta

semelhante. No entanto percebeu-se uma tentativa de integração com a sociedade,

mesmo que ainda não efetivamente concretizada. Durante as entrevistas, muito se

falou em participação da comunidade local nos espaços escolares, o que pode ser

considerado essencial para um processo de democratização da educação,

entretanto, não se pode dizer que as diretrizes curriculares são conseqüência de

resposta aos anseios da população, já que existem poucos indícios de participação

da comunidade, e de grupos sociais organizados na elaboração do Projeto Político

Pedagógico da escola estudada:

Os princípios educativos assumidos pela escola são desenvolvidos de acordo com as diretrizes do Projeto Pedagógico que foi elaborado coletivamente por toda a comunidade escolar (gestores, professores, funcionários, representantes discentes e representante de pais). As diretrizes deste projeto foram elaboradas a partir da realidade na qual a escola esta inserida, considerando as especificidades da região e da comunidade do entorno (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.8)

É possível supor que a difusão e o conhecimento da função deste documento

poderiam colaborar com uma melhor conscientização da comunidade acadêmica,

promovendo uma articulação com a sociedade local e os movimentos sociais, os

quais muito têm a contribuir no processo de democratização da educação. Todavia,

pode-se concluir que este objetivo ainda encontra barreiras, dentre elas, destaca-se

a falta de atividades de extensão, que é uma realidade apresentada pelos

professores, e que muito poderia contribuir para integrar a escola na comunidade:

Pela conversa com o Professor “1” pude perceber que suas idéias de extensão

estavam um pouco confusas, em alguns momentos ele falou em atividades de

campo, mas só depois entendi que na proposta dele, o dia de campo seria dentro da

53

escola e a comunidade viria para assistir os experimentos dos estudantes. Não que

esta prática seja inválida, contudo, não podemos confundir esta atividade com o

trabalho de extensão, no qual a lógica é inversa. Embora acredite que este equívoco

não desmereça o professor, já que o mesmo se mostrou engajado e comprometido

com os avanços educacionais na escola.

Não conseguimos fazer esse ano, foi o dia de campo, pegaria uma área de campo e chamaria a comunidade pra observar isso. E fazia uma troca, né?! Uma troca de conhecimento, do teórico, que é dado acadêmico, com o que se ensina na prática. (...) A escola tem uma credibilidade muito grande na comunidade (...). Agora o Estado faz uma prova, tem que passar na prova pra ser o diretor da escola. Mas antes não, a comunidade indicava o diretor da escola e a permanência dele. Acredito que vá diminuir a força da comunidade dentro da escola. Porque isso começou agora, esse ano que começou essa coisa, pra ter um balcão de diretores lá. (Professor “1”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

Como veremos no capítulo seguinte, quase ninguém conhece de fato o Projeto

Político Pedagógico da escola, que embora afirme a influência da comunidade na

escola, não se encontram indícios que respaldem esta colocação. Ao contrário, nota-

se muita falta de projetos de extensão e de ações articuladas com a comunidade.

Contudo, a professora “B2” coloca que estas atividades estavam previstas, porém o

ritmo não permitiu que se colocasse esta proposta em prática.

Um ou outro aluno (...), eles vão fazer por eles o estágio, mas o estágio não estaria enquadrado em extensão, não (...). Extensão seria tipo: “Olha, agora a gente vai repassar uma técnica, numa comunidade dessas.” Ainda não se tem notícia de ter sido feito isso não. Infelizmente. Mas eu tenho um projeto, que eu estava querendo fazer isso, jogar a garotada pra fazer atividades. Isso era um projeto pra ser feito esse ano, mas não deu, esse ano ficou muito apertado. (...) Esse é um outro calo da gente (...), quando eu entrei aqui [a direção] queria trazer mais agricultor pra dentro da escola. Tanto é que a gente introduziu a qualificação no curso de solos, a gente faz as análises pra eles. Era um encontro pra trazer o agricultor aqui pra dentro, que eu promovi os dois encontros. Eu ainda acho que a participação da comunidade é muito fraca. Infelizmente. Acho que a escola também... A gente podia fazer mais pela comunidade. (Professor “2”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011).

Por ter desenvolvido este estudo em escolas agrícolas, esperava encontrar alguma

forma de diálogo com a comunidade rural e com os movimentos de educação do

campo, de onde surgem importantes contribuições, tanto no sentido de formação do

campo brasileiro, na medida em que lutam pela redução das desigualdades e

avançam com conquistas importantes no âmbito da redistribuição de terras e das

54

políticas públicas para a área rural, como no sentido educacional, reivindicando,

inclusive, o direito a uma educação de qualidade. Desta forma, os movimentos

sociais organizados, vêm conquistando espaço e diminuindo a lógica do

“conformismo”. Os resultados destes embates podem ser considerados positivos,

como Fernandes (2006) exemplifica, a Educação do Campo surgiu a partir das

demandas dos movimentos sociais do campo, de onde surgiu também o Programa

Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA, que tem como objetivo

geral “fortalecer a educação nas áreas de Reforma Agrária (...), utilizando

metodologias voltadas para a especificidade do campo.” (PRONERA, Manual de

Operações, MDA/INCRA 2004, p.17). Portanto, para que fosse possível perceber se

este diálogo estava ocorrendo e em que condições ele porventura se dava, é

importante compreender melhor as reivindicações destes grupos.

Dentre os movimentos sociais do campo, talvez o mais conhecido seja o Movimento

dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST. Em sua proposta por uma reforma

agrária popular, este movimento traz como um de seus objetivos a construção de

uma sociedade ecologicamente sustentável, sugerindo, para tal fim, alterações na

atual estrutura de organização da produção e da relação do ser humano com a

natureza. Considerando fundamental para “emancipação humana, valorizar e

garantir trabalho a todas as pessoas e para a construção da dignidade e da

igualdade, restabelecer relações harmônicas do ser humano com a natureza” (MST,

2009). Com esta finalidade podemos encontrar neste documento afirmações que

sugerem algumas mudanças necessárias, dentre elas destacam-se as de um novo

modelo tecnológico, que deve ser orientado pelo enfoque ecológico e participativo,

devendo garantir a produção de alimentos saudáveis.

Foi com base nesta percepção que este estudo se realizou, procurando desenvolver

uma análise crítica do ensino técnico em agropecuária, onde se tentou verificar se

estava ocorrendo uma falta de conexão entre a formação profissional específica e o

contexto social, histórico, econômico, cultural e político. De fato, podemos notar

certo distanciamento entre estas questões dentro da escola. Entretanto, fazendo

uma análise da correlação de forças em nossa sociedade, é possível entender que

uma educação que busque a emancipação do indivíduo, se configura numa lógica

contra-hegemônica, já que parece não ser objetivo da classe dominante integrar à

55

educação a dimensão social e a “alfabetização científica e tecnológica” (SANTOS E

MORTIMER 2002, p.4), o que poderia ajudar o estudante a compreender e a agir de

forma coerente com a sua realidade. Contudo, segundo Santos e Mortimer (2002),

este é um dos objetivos do ensino com enfoque em Ciência, Tecnologia e Sociedade

(CTS). Porém, como a incorporação do aspecto social vai num sentido contrário ao

da lógica dominante, não se pode esperar que este conceito seja posto sem

resistência.

De acordo com Santos e Mortimer (2002), é necessária uma leitura crítica sobre as

inter-relações presentes nos currículos. Estes autores concordam que o ensino de

ciências, por exemplo, deve ultrapassar os limites dos conceitos científicos,

assumindo um caráter multidisciplinar, no qual deve ser dada especial atenção a sua

história e filosofia, elucidando o seu contexto social e político, onde a ciência se

apresenta submissa aos interesses do mercado e do capital. Da mesma forma,

propõem que a educação tecnológica ultrapasse as dimensões técnicas,

favorecendo ao indivíduo o direcionamento da superação dos problemas locais, com

bases na sustentabilidade, no desenvolvimento social e na consciência ambiental.

Neste sentido, procuram também integrar ao currículo o componente social,

propondo favorecer a visão de grupo, na qual a percepção de organização social

sugere melhorar a eficácia das reivindicações, além de fortalecer a formação política

do indivíduo, que expande sua consciência de inserção na sociedade, ampliando

suas condições de intervenção no contexto (SANTOS E MORTIMER 2002).

Observando as necessidades e as limitações do ensino formal, da produção

científica e da transferência de tecnologia, julga-se importante garantir que a

sociedade exerça seu papel de participação nos processos de decisão para que,

desta forma, se minimizem as barreiras impostas. Sob esta perspectiva Santos e

Mortimer (2002) descrevem a importância de um currículo com ênfase em Ciência,

Tecnologia e Sociedade (CTS), no qual suas inter-relações devem ser respeitadas.

Procurou-se observar aqui, como os estudantes se relacionam com o conhecimento

científico e o desenvolvimento tecnológico. Verificando se estes estão ao seu

alcance e integrados às suas experiências, de forma que possam contribuir para

solucionar os problemas do dia a dia. Procurou-se entender também se estas

questões estão sendo tratadas de forma articulada com o seu contexto histórico,

56

político, econômico, social e cultural. Acreditando que a “alfabetização científica e

tecnológica” (SANTOS E MORTIMER 2002, p.4) deva estar integrada a dimensão

social, permitindo ao estudante compreender e agir de forma coerente com a sua

realidade.

Durante esta investigação foi levado em consideração os diferentes

questionamentos e as múltiplas abordagens que se poderia utilizar, buscando como

são postas as inter-relações no ensino e como se dão as atitudes para as tomadas

de decisões diante das situações reais do cotidiano (SANTOS, 2007). Foi verificado

também a inserção de temas problematizadores, nos quais se observou os diálogos

e os questionamentos provenientes de situações concretas. Ainda, de maneira geral,

seguindo o proposto por Santos (2007), foi averiguado como se dava as discussões

sobre a necessidade, as possibilidades, a forma de aplicação de tecnologias, bem

como seus efeitos na exploração ambiental. Assim, mesmo que sem a total

incorporação do componente social à dimensão científica e tecnológica, ainda que

tenhamos um olhar crítico quanto à inserção da comunidade na escola, encontrei

algumas propostas colocadas em prática que tendem a aumentar o nível de

interação com o contexto de desenvolvimento local. Dentre estas, destaca-se no

plano de gestão escolar uma proposta curricular que:

É elaborada levando em consideração as características da região, da clientela, bem como as Diretrizes e Orientações Curriculares Nacionais e Estaduais. Os planos de curso são construídos coletivamente pelas áreas de conhecimento e atualizados anualmente, de acordo com as necessidades dos alunos e da comunidade. Além disso, o componente curricular (...) compreende o desenvolvimento de projetos na área agrícola e de preservação ambiental. (Plano de Gestão Escolar da escola estudada, p.12)

No que diz respeito a estes projetos, tive a oportunidade de observar na prática

como são desenvolvidos. Portanto, é importante realçar algumas de suas

características, as quais proporcionam uma boa articulação entre teoria e prática,

além de inserir os estudantes no contexto local, favorecendo o aprendizado por meio

da busca por soluções para os problemas cotidianos. O projeto “Produção de Mudas

de Plantas Olerícolas e Ornamentais”, por exemplo, além de viabilizar a utilização

destas folhagens para a ornamentação e para a alimentação escolar, contribui para

aperfeiçoar as técnicas de plantio dos estudantes, auxiliando-os a desenvolver

técnicas alternativas de produção. Identifica-se aqui uma associação deste

57

aprendizado com o conhecimento e a consciência da preservação ambiental,

incentivando a valorização da vida no campo e colaborando para a melhoria da

situação econômica do produtor.

Além deste, ressalto outros dois projetos, a título de exemplo, que de alguma forma

podem contribuir com uma interlocução entre a sociedade e o desenvolvimento

local, o que acredito poder favorecer a percepção das dimensões que se fazem

presentes no diálogo entre trabalho e educação. O primeiro deles é conhecido como

“Estação Agro-Climatológica”, onde estão instalados instrumentos que permitem

leituras metereológicas, capazes de auxiliar o planejamento da produção, permitindo

otimizar o gasto de água e de alguns insumos. Conforme consta no Plano de Curso:

A pesquisa na estação Agro-Climatológica envolve professores, alunos e comunidade local, propiciando organizar um campo de estudo que integra todos os componentes curriculares. (Plano de Curso da escola estudada, p.14)

O outro projeto que destaco é o de “avicultura” dirigido à formação prática dos

estudantes do curso profissionalizante. Este projeto, além de permitir a utilização de

carne e ovos na alimentação escolar, também de acordo com o Plano de Curso, visa

possibilitar:

Aos alunos e produtores da comunidade a aquisição de conhecimentos teóricos e práticos ligados à avicultura comercial e de subsistência. (...) Nossa proposta é tornar a escola em um pólo de pesquisa na área, construindo conhecimento fundamental para a comunidade local que irá, em longo prazo, contribuir para o desenvolvimento de uma nova sociedade em bases sustentáveis para a presente e futuras gerações. (Plano de Curso da escola estudada, p.14)

Diante do exposto, se procurou nas práticas curriculares e na metodologia de

ensino, como se davam as relações entre o conhecimento científico e a adoção de

tecnologias no campo. A preocupação era saber como ocorria o diálogo com a

comunidade, já que, apesar de constar nos projetos aqui exemplificados alguma

preocupação com o desenvolvimento local, as práticas de extensão rural se

mostraram ineficientes. Todavia para que se garanta uma educação adequada ao

trabalhador rural e a sociedade do campo, buscando atender as suas necessidades

específicas, o sistema educacional deve estar comprometido com um projeto político

pedagógico que proponha uma metodologia transformadora para o ambiente rural.

Sendo assim, para o cumprimento do dever do Estado, é importante que o sistema

58

público de ensino garanta o direito à educação. Entretanto, tão importante quanto se

educar é a forma como se educa, por isso foi realizado no ensino profissionalizante

a busca por elementos que assumissem a responsabilidade de integrar e

contextualizar a educação, partindo-se do pressuposto de que a formação

profissional deve estar articulada com a formação social, econômica e política, de

forma a promover a emancipação do indivíduo. Sobre este aspecto, foi encontrado,

ao abordarmos os professores, uma atenção às questões que dialogam com o

contexto social dos estudantes e da comunidade local, mostrando-se desenvolver

práticas de produção acessíveis e não prejudiciais ao meio ambiente:

Aqui a nossa meta é oportunizar o garoto com coisas que ele possa demonstrar pro agricultor, que o agricultor também possa fazer. A gente não fica elucubrando com equipamentos caros, porque a agriculta tem coisa cara, mas a nossa agricultura aqui não é de precisão não, é pra agricultor familiar. Na verdade, a gente forma o nosso técnico para a agricultura familiar, pra ele se apropriar daquele conteúdo e ele ser um técnico que atue com o agricultor familiar. Então, aqui tudo é técnica familiar, nada de

muita tecnologia, “pirotecnia”, nada disso. (Professor “2”, entrevista

realizada em 15 de dezembro de 2012).

Dos três professores entrevistados, o professor “3” foi o que se mostrou mais

distante das discussões. Percebi um desestímulo grande de sua parte, mas não

consegui identificar se pelo fato de ter realizado este estudo no final do ano letivo,

logo, num período comum de desgaste. Ou se o professor está desanimado e

desestimulado por algum outro motivo.

São práticas, que no caso, eu tento passar, que não são muito voltadas pra criadores de grande porte, que seriam os industriais. Que são coisas que pequeno produtor aplicaria. É o foco que nós temos aqui em volta, não

temos grandes produtores e sim pequenos. (Professor “3”, entrevista

realizada em 8 de dezembro de 2012).

Por outro lado, os estudantes parecem entender estas questões, mesmo sem

relacionar diretamente estas atividades a pratica da extensão rural, ao estudar estas

técnicas eles se preocupam com a sua aplicabilidade e acessibilidade pelos

produtores da região.

Os professores tentam passar coisas bem naturais, coisas orgânicas, então

acho que é bem acessível. (Estudante “I1” – 1º ano, entrevista realizada em

03 de novembro de 2011)

59

Facilita porque você aprende a cuidar mais da lavoura, você vai usar menos adubo, a gente está aprendendo muito sobre isso, (...) também, tem que tentar convencê-los, né? Porque os agricultores, eu vejo assim... Eles já vêm com uma coisa de antigos, então você tem que saber trabalhar pra botar uma técnica nova com eles. Acho que dá pra facilitar a vida de quem

está no campo, se ele quiser botar em prática. (Estudante “J2” - 2º ano,

entrevista realizada em 09 de novembro de 2011)

O movimento CTS, de acordo com Auller e Bazzo (2001), ao abordar os fatos

científicos com ênfase e relevância social, aumenta as chances de promover o

interesse dos estudantes. Estes autores alertam para o fato de que a maior parte

das pesquisas científicas ainda é feita visando o reconhecimento externo, o que

acaba por dificultar a introdução do componente social à ciência e à tecnologia.

Desta forma, podemos observar que este enfoque acaba por afastar destas

discussões as instituições sociais, econômicas e culturais brasileiras (AULLER e

BAZZO, 2001). Além disso, se procurou saber se a formação de professores se

configura enquanto limitação para a introdução do enfoque CTS nos currículos, pois

Auller e Bazzo (2001) questionam a compreensão das ciências pelos professores

em cada um destes aspectos.

Qual a compreensão dos professores de Ciências sobre as interações entre ciência, tecnologia e sociedade? Quais são suas crenças, suas concepções de progresso? Os professores associam linearmente progresso com inovações tecnológicas, supostamente neutras? O processo histórico vivenciado não teria contribuído para que parcela significativa dos professores endossem uma perspectiva tecnocrática, concepção que inviabiliza o movimento CTS? Essas são questões que, no nosso entender, carecem de um aprofundamento teórico e empírico para uma efetiva implementação do enfoque CTS no contexto brasileiro. (AULLER e BAZZO, 2001, p. 12)

Apontado para um direcionamento voltado para a formação de professores, o

Ministério da Educação em 2007 lançou um documento base sobre a educação

profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, no qual propõe que

sejam garantidos tempos e espaços de formação continuada para os professores,

além da realização de concursos públicos, plano de cargos e salários e melhoria das

estruturas das escolas. Com base neste argumento se buscou conhecer o grau de

formação dos professores do ensino técnico e as oportunidades oferecidas para que

estes freqüentem espaços de formação continuada, sem se esquecer de preocupar-

se também com a estrutura da escola e com o grau de satisfação e motivação

destes professores.

60

Contudo, ainda não se pode afirmar que estas iniciativas, por si só, sejam suficientes

para a integração do componente social às práticas científicas e ao desenvolvimento

tecnológico. Embora concorde que o direcionamento do ensino voltado para as

práticas ambientais saudáveis e para a população do campo faz parte de uma

educação contextualizada com o desenvolvimento local, aliado a isso o grau de

motivação da maioria dos professores e a sua satisfação com a estrutura que a

escola lhes proporciona também são pontos favoráveis. Entretanto, a introdução do

componente social neste conjunto exige muito mais do que isso. Enquanto a

comunidade e os movimentos sociais não participarem efetivamente do cotidiano

escolar, não podemos considerá-los parte integrante deste. Cabe ainda ressaltar

que não compete imputar a formação técnica dos professores desta escola à

carência deste enfoque, talvez possamos contestar a sua formação política e social,

mas como podemos perceber, o grau de instrução destes docentes é satisfatório

para sua atuação no ensino profissionalizante.

Sou licenciado em ciências agrícolas. Já dei aula na rede federal, na escola agrícola de Pinheiral, que hoje faz parte do IFRJ (...) e eu pretendo fazer minha pós, ano que vem, talvez. (Professor “1”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011)

Eu tenho mestrado, estou fazendo doutorado. Eu dou aula em projetos da prefeitura do Rio. Aqui eu estou há seis anos, eu dou aula há dezessete anos e meio. Graças a Deus que eu ainda dou aula de extensão de cursos livres pra adultos, na parte agrícola, o que também me deixa feliz. (Professor “2”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011)

Neste estudo, encontram-se ainda indicativos que demonstram a preocupação da

escola com a formação continuada de seus professores. Relacionado a isso,

seguindo as orientações do Ministério da Educação, observa-se no Projeto Político-

Pedagógico:

Dentro dessa perspectiva, acreditamos que é fundamental investir na capacitação dos professores. Por isso organizamos estratégias de trabalho que possibilitem o desenvolvimento de sua autocrítica constante. Criamos espaços para discussões relacionadas às turmas, aos alunos individualmente e à organização de suas aulas. Nossa intenção é desenvolver um espírito comunitário, que cultive nos professores o desejo de crescer sempre, não só quanto ao conhecimento que trabalha com os alunos, como também na sua prática pedagógica, cultura geral, moral e humana. Os professores devem ser cidadãos do mundo, abertos a tudo, interessados, engajados nos problemas da atualidade. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.10)

61

Outro dado relevante desta discussão diz respeito à característica pedagógica dos

professores. Por isso, ao abordar esta questão, o objetivo foi entender como se

davam as relações de troca de conhecimento em sala de aula. Sobre este aspecto,

educadores e educandos afirmaram que as aulas eram administradas de forma bem

participativa, se configurando um espaço de intercâmbio de conhecimentos. Embora,

muitas vezes o conflito de idéias fosse inevitável, neste caso, predominava a busca

pelo consenso, e tanto professores quanto estudantes tinham liberdade para expor

suas opiniões. Podemos considerar este, outro aspecto positivo para uma

abordagem metodológica contextualizada. Apesar disso, foi verificado que esta

prática dependia muito da iniciativa dos professores, posto que, ainda que com uma

visão holística e interdisciplinar que propõe superar a fragmentação do

conhecimento, o PPP aposta numa autoridade do professor e no pensamento

unificado, neste caso, guardadas as devidas proporções, pode estar, inclusive,

sugerindo a manutenção do pensamento hegemônico, por hora vigente.

A educação escolar pode ser compreendida como uma forma de reproduzir e/ou transformar o modo de ser e a concepção de mundo de pessoas, grupos e classes, através da troca de experiências e de conhecimentos mediados pela autoridade pedagógica do educador. Essa concepção de mundo inclui crenças, idéias, valores, ética, formas de trabalho e de organização social, cultural etc. Só agora começa a ser construído um novo paradigma que supere a fragmentação, mudando a compreensão da vida e do universo. Não se trata de nos tomarmos apenas mais interdisciplinares, ecumênicos e interculturais; é preciso nos tornar pessoas unificadas em um mundo progressivamente unificado. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.7. Grifo nosso)

Contudo, conforme exposto anteriormente, não é essa a prática predominante nas

salas de aula. Como podemos observar pela reprodução de algumas falas de

professores e estudantes:

Eu sou da linha natural, a nova professora que entrou também é da linha orgânica (...). Mas você vê, se tem três professores com a característica de campo pra orgânico às vezes a gente tem conflito de idéias com o próprio aluno. Porque o aluno, você quer dar uma outra solução e o aluno acha que não vai dar certo. Por que? Vem do campo com outro enfoque. Ai a gente às vezes fala pra ele: Testa e depois você volta pra dizer o resultado. (Professor “2”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011)

Alguns alunos, inclusive esses que já são produtores e tudo mais, tem um grau de comprometimento muito grande: Trazem pesquisa, perguntam, se tiverem um problema na vida deles, eles trazem pra gente ver, pra avaliar junto com eles. (...) Mas o contrário, também é verdade, o pai usa uma prática... O campo é muito dinâmico, o aluno traz uma prática nova lá de uma maneira mais fácil, (...), pra montar uma curva de nível de uma maneira

62

mais fácil que a nossa, que a gente explica aqui. Com um pedaço de pau ele faz uma curva de nível, pode acontecer. (Professor “1”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011)

Ao acompanhar as atividades desenvolvidas dentro e fora da sala de aula e

entrevistar docentes e discentes, pude perceber que os estudantes, por algumas

vezes compreendem e aceitam esta troca e por outras questionam e se impõem.

Logo, não se pode dizer aqui que, como consta no PPP, os professores estejam

impondo a sua autoridade pedagógica. Além disso, inserir o contexto da agricultura

familiar nas práticas pedagógicas, se preocupando com a capacidade científica e

tecnológica peculiares desta categoria, contradiz a proposta do próprio PPP, que

aposta em pessoas unificadas num mundo progressivamente unificado. Pensando

de uma forma mais ampla, a discordância entre a teoria proposta e as ações

praticadas sugere boas expectativas.

Há essa troca, porque aprende e ensina. Porque assim, meu pai sendo lavrador, ele ensina bastante coisa em casa, aí na escola a gente aprende outras... Ai na escola a gente troca: Não, meu pai faz assim, assim, assim... Ai eles: Não, mas o correto é assim. Aí a gente vive naquela troca, a gente faz experimento de como ele faz lá, aí em casa eu faço como eles fazem aqui, pra gente ir fazendo e ver qual resultado é melhor. (...) Eles sempre dão oportunidade de fazer essa troca. Eles deixam uma área pra gente fazer isso também... Você separa uma área e faz ali naquele pedaço as experiências do que eu faço em casa. (Estudante “A1” – 1º ano, entrevista realizada em 24 de outubro de 2011)

No curso técnico tem muita troca entre professor e aluno, porque alguns professores não têm muita prática, sempre tem um agricultor que faz o curso técnico, o agricultor às vezes tem mais prática na agricultura do que um professor, sempre tem uma troca dentro de sala de aula. O professor recebe bem essa troca (Estudante “F2” – 2º ano, entrevista realizada em 03 de novembro de 2011).

A gente tem um colega aqui que tem a lavoura dele, ele aqui está aprendendo e o que ele está aprendendo ele coloca em prática e está trazendo a experiência dele pra gente, então, a gente aprende e ensina. Os professores recebem bem e tentam também ajudar se estiver falando alguma bobeira, né? Orientar, mas recebem bem. (Estudante “J2” 2º ano, entrevista realizada em 09 de novembro de 2011)

Aqui a gente não vem só pra aprender, aqui a gente vem pra troca de conhecimentos, porque os professores são formados, então eles têm muita teoria e os alunos, como eu assim, têm muita prática, então passam conhecimento, uma coisa que eu não sei, pergunto a eles, uma coisa que às vezes eles não sabem, eu tento responder a eles. (...) Eles aceitam e até falam: Pô, é uma boa. Já pediram a gente pra fazer trabalhos, assim... Pra passar essas coisas pra frente. (Estudante “K2” 2º ano, entrevista realizada em 09 de novembro de 2011).

63

A escola também possui outros projetos que possibilitam um diálogo com a adoção

de tecnologias para o campo e as condições econômicas e sociais da comunidade

local. Dentre os que pude conhecer, destaco o projeto de Hidroponia, que propõe a

“construção de estufas totalmente automatizadas”, indicando esta nova tecnologia

como uma “alternativa econômica e viável para os produtores.” Ainda no Plano de

Curso é possível de identificar o projeto Biodigestor, que visa produzir gás

combustível a baixo custo, que pode ser utilizado, por exemplo, para o acionamento

de motores, sistemas de aquecimento e iluminação. Este projeto prevê a

“transferência de tecnologia à comunidade agrícola” a qual deverá ser realizada

pelos estudantes da escola, objetivando a difusão da construção e uso do

biodigestor.

Embora tenha percebido, de alguma forma, uma leve aproximação do componente

social às questões de ciência e tecnologia, ao tentar extrapolar esta realidade para

outras escolas técnicas em agropecuária, encontrou-se situações diversas. Dentre

elas, podemos citar o Colégio José Soares Junior, que tem em sua missão uma

visão um tanto determinística em relação ao desenvolvimento de tecnologias e a sua

inevitável adoção imediata. O documento relaciona ainda o aumento e a qualidade

dos produtos à redução do tempo de produção e a criação de ferramentas eficazes

para controle do ambiente e da sociedade, submetendo ambos à lógica do mercado.

As mudanças de ordem tecnológica, econômica e social apontam transformações fundamentais na formação profissional. A transitoriedade no mundo do trabalho é uma realidade e o homem precisa estar preparado para enfrentar novas situações, num mundo onde a todo instante inovações são criadas, tecnologias são ultrapassadas, e a condição primordial vem sendo o aumento na produtividade e qualidade com redução no tempo de produção, se tornando inevitável uma reestruturação de processos, instituições e profissionais, para que não se tornem excluídos deste mundo em constante modernização que abrange todos os segmentos do mercado, criando ferramentas cada vez mais eficazes no controle do ambiente, dos organismos e até mesmo no controle da própria sociedade. Tendo em vista esta necessidade de formação de um profissional cada vez mais dinâmico, moderno e em constante atualização, conscientes dos problemas sociais e dos desafios de uma nova era onde a relação agropecuária e meio ambiente vem se reestruturando, o Colégio Estadual Agrícola José Soares Júnior visa através de um trabalho pedagógico centrado no aluno, propiciar condições para o rompimento com o pensar, o sentir e o agir estagnado, formando técnicos em agropecuária prontos para atuarem frente a diversidade social, econômica, cultural e ambiental

64

existente em nosso país. (informações obtidas a partir do sítio eletrônico da

escola http://www.ceagricolajsj.com.br/home.aspx)

De certo, também não cabe generalizar esta visão para as demais escolas

estudadas, já que não se encontra em nenhuma outra este tipo de enfoque sobre

ciência e tecnologia.

65

4. Ciências, Tecnologia, Agricultura e Sociedade: a intersetorialidade das questões ambientais na prática educacional

Neste estudo intencionou-se realizar uma análise da conjuntura educacional de nível

técnico-profissionalizante de forma contextualizada, sendo assim, foi considerada de

fundamental importância a inclusão neste debate das reivindicações dos

movimentos sociais na educação do campo. A necessidade de uma educação

diferenciada está na pauta destes movimentos, que propõem um ensino de

qualidade, onde o caráter emancipatório do indivíduo seja respeitado, assim como

as suas relações com o trabalho e com o ambiente de uma forma geral. Para que se

concretizem estas propostas, é preciso ter claro que estes movimentos exercem

pressão sobre o poder público, e a demanda por um ensino médio integrado à

prática profissional para a população do campo é uma necessidade coerente com a

sua realidade. Neste sentido, o Ministério da Educação, através da Secretaria de

Educação Profissional e Tecnológica, qualifica os movimentos sociais do campo

enquanto:

Sujeitos indispensáveis ao processo de planejamento e formação teórico-epistemológica sobre educação profissional integrada ao ensino médio, por gerarem, também, conhecimento em seus campos de atuação. Enfim, as concepções de currículo, a construção e a atualização de projetos pedagógicos, as condições e o tamanho da oferta dos cursos são aspectos para os quais muito têm a contribuir os movimentos sociais. (MEC, 2007, p.32, grifo nosso)

Foi neste sentido que, baseados pela lógica de inclusão de conteúdos alternativos e

valorização da construção coletiva do conhecimento, buscou-se a inserção da

agroecologia nas práticas pedagógicas, pois segundo Ottmann (2005), é devido ao

processo histórico e aos diversos processos civilizatórios, no Brasil e no mundo, que

este conhecimento se constrói tanto em bases científicas como sociais. Altieri (1999)

reforça esta idéia ao destacar que a agroecologia visa descentralizar os

conhecimentos científicos e desenvolver os locais, buscando o equilíbrio entre os

diversos organismos presentes na cadeia produtiva, incluindo as dimensões

ecológicas, sociais e culturais.

Todavia, é preciso deixar claro que reside nesta concepção um grande paradoxo,

pois na medida em que a agroecologia amplia seu campo conceitual, atribui algumas

características heterogenias e ainda não sedimentadas, tanto no campo científico

66

quanto no social. Portanto, ao se proporcionar um avanço nas discussões políticas e

sociais, contribuindo com a questão da agricultura familiar e suas diversas

particularidades microssociais, dificulta-se o debate sobre seus padrões tecnológicos

e científicos, que caminham num sentido mais amplo e geral. Em outras palavras, se

ao buscar um consenso disciplinar técnico-científico, a agroecologia se detiver aos

discursos ecológicos e aos conceitos biológicos, acaba de certa maneira limitando o

debate do desenvolvimento local, que se fundamenta nas especificidades e

complexidades de cada realidade (ALMEIDA, 2003). Portanto, por ser um campo

relativamente novo, a construção dos paradigmas agroecológicos ainda se encontra

em disputa, o que, segundo Almeida (2003), faz surgir uma lacuna neste campo.

Assim, mesmo não havendo uma incompatibilidade entre a preservação do meio e a

adoção de tecnologias de produção agrícola, esta relação não proporciona

resultados rápidos, nem que possam ser generalizados e extrapolados para outras

realidades e tampouco de fácil adoção. Desta forma, não se pode aguardar que

ocorra uma mudança radical nos rumos da produção agrícola, ao contrário, já

podemos perceber um desenvolvimento paralelo das chamadas agriculturas

“alternativas”. Em longo prazo, o que se pode esperar é um declínio no padrão por

hora predominante em consonância com uma lenta ascensão dos padrões

agroecológicos de produção (VEIGA, 1996).

Nesta perspectiva, com a idéia de uma educação contextualizada, onde são

expostas as limitações e as necessidades de superá-las, espera-se um maior

entendimento e possivelmente um maior compromisso social para avançarmos

sobre estas questões. Neste sentido, no que diz respeito à problemática ambiental,

Angotti e Auth (2001) sugerem que haja uma mudança nas usuais concepções de

educação relacionadas ao meio ambiente, que comumente costumam separar o

homem do meio, estudando formas ecológicas de funcionamento da natureza, ou

impondo propostas para a solução de problemas (ANGOTTI E AUTH 2001). A idéia

de se trabalhar sobre esta dinâmica remete a necessidade de se repensar o papel

da escola e da estrutura curricular, impostas de forma tradicional e aceitas de forma

passiva.

67

Em virtude da importância de uma educação diferenciada voltada para a população

do campo, onde os conhecimentos científicos e a utilização de tecnologias se

integrem as práticas cotidianas de produção, é que devem ser pensadas práticas de

utilização racional da natureza, aliadas ao custo de produção, ao desenvolvimento

econômico e a não exploração do trabalho. É nesse sentido que se insere a

agroecologia, que, segundo Ottmann (2005), devido ao processo histórico e aos

diversos processos civilizatórios, no Brasil e no mundo, possui um caráter “pluri-

epistemológico”, onde seu conhecimento se constrói tanto em bases científicas

como sociais. Neste ponto da dimensão Sócio-política, temos nos movimentos

sociais do campo relevantes formadores da “consciência agroecológica” e embora

esta ação social seja construída fora do pensamento científico, há neste sentido um

reconhecimento científico, introduzido pela Agroecologia como componente de

equidade (OTTMANN, 2005).

Apesar disso, a agroecologia “não constitui ainda o que se poderia chamar um

movimento social stricto sensu” (ALMEIDA, 2003, p.511). De qualquer forma,

enquanto campo de disputa, este conceito possui um forte potencial, capaz de

agregar a seu favor diversos segmentos sociais, já que seus argumentos dialogam

com o direcionamento político do desenvolvimento científico e tecnológico.

Entretanto, os desafios teórico-metodológicos da agroecologia parecem exigir

resultados imediatos, o que de certa forma se configura uma limitação, na medida

em que pela necessidade de proporcionar respostas rápidas, alguns agentes sociais

empregam este conceito de forma equivocada, uniformizando suas ações e

tendendo a facilitar ou descomplexificar a diversidade de cada ecossistema e suas

relações com o sistema produtivo (ALMEIDA, 2003).

Isso nos leva a crer que a transição para uma agricultura sustentável não deve ser

imediatista nem se limitar aos aspectos agronômicos, já que somente isto não seria

suficiente para corrigir os processos de exclusão social que vem ocorrendo ao longo

de séculos. Contudo, a urgência pelo conhecimento científico e pela adoção de

tecnologias no campo, faz com que as instituições de ensino, que estejam

comprometidas com estes avanços e com a redução das desigualdades sociais,

proporcionem aos seus estudantes uma formação voltada para substituição do

modelo agroquímico para estilos diferentes de agricultura (CAPORAL e

68

COSTABEBER, 2000). Neste sentido, a Agroecologia abarca conhecimentos

interdisciplinares de forma a fornecer suporte para várias questões do contexto

agrário. Tais conhecimentos buscam compreender desde o funcionamento dos

ciclos minerais, passando pela transformação da energia e os processos biológicos

até as relações sócio-econômicas como um todo. Dessa forma, ainda que haja uma

necessária dimensão técnica na Agroecologia, as variáveis sociais ocupam um

papel relevante, que permitem entender as várias formas de dependência política,

econômica, social e educacional presentes no meio rural e na sociedade em geral.

Logo, sugere-se necessário uma transição do modelo convencional para o

agroecológico, baseado num contexto que permita a inclusão de propostas coletivas

de mudança social (OTTMANN, 2005).

Então, segundo os conceitos agroecológicos, para que os alimentos sejam

produzidos de forma sustentável, a artificialização do meio pelo ser humano deve

ser mínima, de forma que se evite a degradação e o comprometimento da

subsistência. Nesta perspectiva, os agroecossistemas se configuram enquanto

construção social, considerados como resultado da co-evolução do homem com a

natureza. Assim a produção Agroecológica tende a respeitar os âmbitos da cadeia

produtiva sob vários aspectos. Em busca de uma sistematização mais detalhada,

Ottmann (2005) agrupa os sentidos centrais da Agroecologia sob três dimensões:

Ecológica e Técnico-agronômica; Sócio-econômica ou de Desenvolvimento Local;

Sócio-cultural e Política. Estas dimensões podem ser alcançadas através de uma

apropriação correta da natureza, onde se espera uma elevação da qualidade de vida

e o aumento da equidade, favorecendo a participação da população na formulação

de políticas públicas que levem em conta o processo histórico das desigualdades

geradas.

Dessa forma, a agroecologia pode ser considerada uma opção à agricultura

convencional, onde grande parte da produção está submetida à utilização de

recursos não renováveis, da exploração da força de trabalho, da lógica do mercado,

através da adoção de pacotes tecnológicos voltados para a exploração intensiva do

solo e do meio ambiente em geral, além de outras influências que comprometem a

sustentabilidade do ambiente e conseqüentemente a permanência no campo.

Opostamente a isto, Altieri (1999) enxerga que a agroecologia integra princípios

69

agronômicos e ecológicos, diminuindo os riscos ambientais e econômicos. Esta

integração visa descentralizar os conhecimentos científicos e desenvolver os locais,

buscando o equilíbrio entre os diversos organismos presentes na cadeia produtiva,

incluindo as dimensões ecológicas, sociais e culturais. Portanto, não se esperava

encontrar nesta pesquisa a agroecologia enquanto uma disciplina do conteúdo

curricular. Por seu caráter, este conceito deve estar posto de forma transversal ao

currículo, de modo que se possa dialogar com todas as áreas de formação do

profissional técnico em agropecuária.

Baseado nisso, este trabalho buscou compreender como são discutidas as questões

de interdisciplinaridade e de transversalidade no currículo escolar, entendendo que

estes conceitos devem estar claros para a comunidade acadêmica, de forma que o

conteúdo possa fluir naturalmente, devendo ser pertinentemente abordado no

transcorrer da formação acadêmica. No entanto, durante o processo de vivência na

escola, não pude perceber esta prática. Apesar de ser possível identificar no PPP

que a fundamentação do trabalho pedagógico da escola se configura a partir de uma

educação não disciplinar:

Que rompa com a fragmentação e compartimentalização dos saberes. Temos consciência que a disciplinaridade já não responde aos problemas concretos que estão presentes no cotidiano escolar. Sendo assim, assumimos uma proposta de organização do trabalho pedagógico que tem na noção de transversalidade o referencial teórico-metodológico para seu desenvolvimento. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.9)

Entretanto, de acordo com o documento, esta proposta vem sendo gradativamente

implantada na organização curricular da escola. Talvez por este motivo tal processo

tenha fugido à minha percepção, sendo a justificativa para a não implantação da

transversalidade em sua totalidade a desconstrução de barreiras ainda presentes no

processo educacional.

A transversalidade vem sendo gradativamente implantada na organização curricular da nossa escola. Isto porque, fazer rupturas na prática implica em também romper com estruturas conceituais, revolucionar o pensamento. A cada etapa avançamos na construção de conceitos e práticas que visam superar a compartimentalização curricular. Organizar o trabalho pedagógico a partir de uma proposta de transversalidade significa reconhecer a multiplicidade, a complexidade dos saberes, mas respeitando as diferenças, articulando-os sem artificialidade. (...) Sendo assim, acreditamos que o rompimento com tais estruturas de poder no campo das ciências e no

70

campo da educação deve-se dar gradativa e continuamente. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.10)

Neste mesmo raciocínio, a proposta da escola é que se construam novos espaços

que possibilitem a circulação de saberes, onde sejam priorizados tanto a

organização dos conteúdos curriculares, quanto à orientação metodológica.

Como vimos, a agroecologia busca a integração do homem com a natureza de

forma ecologicamente correta e socialmente justa. Assim, os componentes

necessários para uma educação integral, onde os conceitos científicos dialoguem

com as práticas sociais, ressaltam a importância do ensino das ciências naturais

aliado às ciências humanas e sociais. Desta forma, buscamos no conteúdo científico

da agroecologia, o atributo “ambiental”, entendendo que “este espaço

argumentativo, está longe de configurar um campo discursivo e ideológico

homogêneo. Ao contrário, tem sido palco de múltiplas interpretações que disputam

os sentidos do ‘ambiental’” (CARVALHO, 2002 p.3). Segundo Loureiro (2004), a

adjetivação “ambiental” se justifica por tratar de dimensões “esquecidas” pelo fazer

educativo, no que se refere ao entendimento da vida e da natureza. Portanto, é

importante que este tema seja tratado enquanto campo de articulação política da

sociedade civil, que afeta diretamente o interesse público, devendo ser abordada

com o intuito de integrar o ser humano à natureza, através de uma prática dialógica

e interativa.

Ao dar destaque à questão ambiental dentro da agroecologia e ao aproximar este

discurso à Educação Ambiental (EA), podemos notar fortes semelhanças entre eles.

De tal forma que os princípios da EA tangenciam as questões sociais, políticas e

culturais, em consonância com os preceitos agroecologicos. Assim, encontramos em

Loureiro (2004), uma aproximação dos conteúdos, na medida em que também se

busca na EA, articular os espaços formais e não-formais de educação, aproximando

a escola da comunidade. É com uma visão ampla e abrangente que, assim como se

pretende na agroecologia, Loureiro (2004) vislumbra uma Educação Ambiental

Transformadora, na qual se destaca uma relação dialética entre sociedade e

natureza, onde se estabelecem formas democráticas de interações, compatíveis

com a vida social e planetária.

71

A educação ambiental não se refere exclusivamente às relações vistas como naturais ou ecológicas como se as sociais fossem a negação direta destas, recaindo no dualismo, mas sim a todas as relações que nos situam no planeta e que se dão em sociedade – dimensão inerente à nossa condição como espécie. Assim, o educar “ambientalmente” se define pela unicidade dos processos que problematizam os atributos culturais relativos à vida – quando repensa os valores e comportamentos dos grupos sociais; com os que agem nas esferas política e econômica – quando propicia caminhos sustentáveis e sinaliza para novos padrões societários. (Loureiro, 2004, p.79)

Logo, devido à íntima relação entre a questão ambiental e o desenvolvimento

científico, tecnológico e social, consideramos que estes aspectos não devem ser

tratados separadamente, evitando que se deixe de lado das discussões em CTS o

componente ambiental. Portanto, se buscou neste estudo uma perspectiva curricular

crítica, onde a problematização de temas sociais fosse abordada de forma a dar

suporte à superação da dominação de valores e atitudes que comprometam o

ambiente natural. Acredita-se que este enfoque ajude a despertar no educando o

seu compromisso de responsabilidade social, que perpassa a preservação ambiental

e a diminuição das desigualdades sociais. Assim, o movimento CTSA, ao resgatar o

papel da Educação Ambiental, se aproxima do que originalmente propunha o

movimento CTS (SANTOS, 2007). Angotti e Auth (2001) reforçam a necessidade de

mudança nas usuais concepções de educação relacionadas ao meio ambiente.

Integrando desta forma aos aspectos Científicos e Tecnológicos às questões Sociais

e Ambientais. Neste sentido, é proposto que se forneça ao estudante elementos que

facilite a sua conscientização enquanto ser biológico, político e social, capaz de

promover sua sustentabilidade e a modificação do meio em que vive, bem como

suas relações de trabalho.

Esta relação da ciência e da tecnologia com o ambiente deve, entretanto, ser

encarada com cautela. Angotti e Auth (2001) nos alertam para o fato de que,

questões ambientais, aliadas ao interesse econômico, podem ter caráter ambíguo, já

que num mundo globalizado, onde as relações capitalistas sobrepõem questões

sociais, o discurso econômico-ambientalista pode ser usado muito mais para manter

a lógica do sistema do que para alterá-la. Como exemplo desta prática, os autores

citam o caráter polissêmico do termo “desenvolvimento sustentável”, que por ser

utilizado em diferentes contextos pode, inclusive, contribuir para a manutenção

irresponsável da exploração ambiental. Nesta lógica, se faz interessante saber, por

72

exemplo, em que se fundamenta e quais os princípios do compromisso assumido

pelo CIA Monsenhor Tomás Tejerina de Prado, que dedica a preparação de técnicos

para o mercado de trabalho, objetivando a formação de profissionais “capazes de

ajudar a promover o desenvolvimento do setor agropecuário no município e região,

dando ao produtor rural suporte técnico indispensável ao seu desenvolvimento

sustentável.” (Informações obtidas a partir do sítio eletrônico da escola

http://poloagricola.blogspot.com). Neste caso, após o colégio se comprometer a

formar técnicos para o mercado, direciona as ações deste profissional para um

desenvolvimento sustentável, o que pode sugerir diferentes interpretações.

Da mesma forma que a agroecologia, a educação ambiental deve ser tratada

enquanto elemento de transformação social, conferindo aos sujeitos condições de

superar os domínios da relação capitalista. Ao assumir um caráter emancipatório, a

EA favorece uma percepção holística e sistêmica da complexidade do mundo e do

ser humano, como ser biológico, social e histórico que vive e interage neste mundo

(Loureiro, 2004). Foi nesta perspectiva que se verificou os currículos praticados

nestas escolas, buscando na metodologia de ensino por componentes relativos à

agroecologia que, segundo Altieri (1999), integra princípios agronômicos e

ecológicos, diminuindo os riscos ambientais e econômicos, por entender que esta

questão, enquanto tema problematizador, é capaz de levantar múltiplas abordagens

referentes ao contexto científico, tecnológico, social, ambiental, político, econômico e

cultural. Logo, não era esperado encontrar este tema concentrado em um formato de

disciplina que compõe uma estrutura curricular. Conforme definido por Ottmann

(2005), por se tratar de uma abordagem “pluri-epistemológica”, sugere-se que a

Agroecologia seja inter e trans-disciplinar.

Por se tratar de uma abordagem que trata de contextos políticos, sociais e

econômicos, capazes de contribuir com a realidade do campo, além de qualificar a

produção em áreas rurais, é interessante que estas questões estejam vinculadas a

prática curricular. Esta é uma antiga reivindicação dos movimentos sociais do campo

(LIMA & NOMA, 2010). Desta forma, a busca por este assunto num roteiro de

entrevistas semi-estruturadas, no projeto político-pedagógico, ou até mesmo no

currículo, poderia se tornar empírica. Por este motivo, esta abordagem foi

73

contextualizada numa perspectiva de aproximação com o que propõe o movimento

CTS e a Educação Ambiental.

Sobre este ponto, percebe-se no contexto educacional da escola estudada, uma

aproximação da comunidade acadêmica à questão ambiental, embora ainda se

encontrem algumas resistências, por parte de alguns funcionários que duvidam da

eficácia das práticas agroecológicas e dos modelos mais ecologicamente indicados.

Em sua maioria estes funcionários são também agricultores da região e, por isso,

condicionados a lógica convencional, onde o abuso de venenos e suplementos são

práticas corriqueiras em suas atividades cotidianas.

Destaco aqui uma funcionária em especial, muito querida e respeitada por toda a

comunidade acadêmica. Não deixa dúvidas quanto ao seu compromisso e intenção

de formar bons profissionais, por sua posição de destaque ela estava responsável

por supervisionar os estagiários do curso, sempre crítica e exigente. Percebi ainda

que o trabalho educacional em curso está aos poucos, quebrando estas barreiras, e

o que antes era inadmissível para ela, hoje já é tolerável, e embora possa não

concordar com as práticas de redução de químicos, já aceita e auxilia o processo de

trabalho na escola. Dentre eles destaco os trabalhos e experimentos com agricultura

orgânica que demonstram bons resultados e fornecem fortes argumentos favoráveis,

confrontando as opiniões de quem antes não acreditava em outras maneiras de se

obter resultados desejáveis e mais saudáveis.

Foi verificado por meio das observações e entrevistas que, embora ainda não

completamente direcionados ao modelo agroecológico de produção, este espaço de

formação se encontra comprometido com algumas mudanças na prática agrícola, o

que contribui com o rompimento de antigos paradigmas e caminha no sentido de

superação da lógica atual. Por acreditar que o sistema educacional deva estar

comprometido com um projeto político pedagógico que proponha uma metodologia

transformadora para a comunidade local e como a escola está inserida em um

ambiente rural, buscou-se no presente estudo refletir sobre o que a literatura propõe

para a Educação Ambiental e a metodologia educacional proposta pela escola para

esta temática. Sobre este aspecto, pode se encontrar no referencial teórico-

metodológico o trabalho pedagógico:

74

Organizado a partir do Projeto Político-Pedagógico, cujo tema central é Educação Ambiental. A escolha desse tema está relacionada ao perfil do Colégio, como também à importância dessa questão no atual momento histórico-social. Os problemas ecológicos se constituem num novo território de saber, onde os vários campos de saberes estão articulados. Queremos, então, formar nossos alunos no sentido de "pensar globalmente para agir localmente". No sentido de ampliar o desenvolvimento do tema gerador, buscamos (...) fortalecer a proposta de trabalho interdisciplinar, norteada pela temática da Educação Ambiental. Assim, estamos novamente nos propondo ao desafio de produzir as mudanças necessárias para transformar a escola em um ambiente saudável em todas as dimensões. A médio ou a longo prazo poderemos, através da formação de nossos estudantes, produzir mudanças nos demais espaços que estes vivem provocando mudanças de atitudes nas relações com o meio ambiente. (Projeto Político Pedagógico da escola estudada, p.11)

Sobre este aspecto, Fagundes (2009) indica que o enfoque CTS/CTSA deve ser

aplicado de forma crítica ao currículo escolar. Isto permite a compreensão dos

fenômenos em suas múltiplas dimensões. Atribuindo, com isso, um papel

fundamental à interdisciplinaridade, que segundo o MEC (2007), deve ser encarada

como “princípio organizador” do currículo, relacionando os conteúdos de diversas

disciplinas a questões cotidianas concretas. Neste sentido, é a partir de situações

contemporâneas e inquietantes que se deve desenvolver o conhecimento científico,

ao mesmo tempo em que conhecimentos de fundamento geral permitem uma maior

compreensão dos fenômenos específicos. Por outro lado, os professores não devem

se limitar aos conteúdos específicos de sua disciplina, visando somente uma

formação técnica. Ao contrário, devem pensar na totalidade do indivíduo, levando

em consideração a perspectiva de sua formação profissional (MEC, 2007).

Nesse trabalho foi possível identificar que a maioria dos professores e estudantes

estão comprometidos com estas mudanças na forma de produção, além de uma

preocupação geral com o uso intensivo de venenos e outras químicas. Entretanto,

não se pode afirmar que esteja havendo um engajamento político-social de

professores e alunos, apesar de ter encontrado na pesquisa estas práticas

curriculares e até uma certa contextualização do ensino. Por mais positivos que

possam parecer, não podemos considerar apenas estes pontos como suficientes

para a formação político-social dos estudantes.

Como percebemos pela fala do Professor “1”, a questão ambiental é realmente

abordada na prática pedagógica, entretanto, pude notar durante a pesquisa que há

75

um forte distanciamento entre o que realmente propõe a Educação Ambiental e a

Agroecologia e as práticas de sala de aula. Estas últimas se concentram e se

limitam nos conceitos naturais, biológicos e ecológicos, não são abordadas nas

aulas, por exemplo, questões sociais, históricas, econômicas ou políticas, o que de

fato poderia contribuir para uma contextualização do ensino de forma a conferir mais

elementos que pudessem favorecer a emancipação do indivíduo, conforme proposto

pela EA e a Agroecologia.

A gente demonstra, já vimos isso através de vários vídeos também, que o veneno em excesso prejudica não só o trabalhador, mas mais ainda o meio ambiente, que está recebendo tudo isso. (...) essas coisas a gente busca abordar, porque essa região aqui..., infelizmente é uma região veneneira, pessoal aqui “soca” veneno. Então a gente mostra que se continuar assim (...) daqui ha um tempo, a gente vai sofrer alguns danos, porque isso acaba se revertendo para o ser humano, não tem jeito. (...) Outra coisa que a gente aborda aqui é a questão de preservação de nascentes, mananciais através do uso da matas ciliares. Esse projeto (...) está ainda em fase de implantação, mas tem o projeto, todo mundo já viu. Então eles fizeram o plantio das mudas de mata atlântica, eles acompanharam a forma de espaçamento, a importância disso. Então sempre que a gente pode a gente fala de meio ambiente, até porque o meio que a gente usa é o meio ambiente e a agricultura infelizmente é a grande vilã do meio ambiente, com desgaste de água, com contaminações. E se a gente não mudar isso a agricultura fica meio que desacreditada. (Professor “1”, entrevista realizada em 15 de dezembro de 2011)

Devido a essa abordagem, é possível encontrar a reprodução dos conceitos

simplificados da Educação Ambiental na fala dos estudantes desta escola, que da

mesma forma que os professores, se limitam aos conceitos ecológicos para explicar

o que entendem de Agroecologia ou de EA.

A gente passa a perceber mais coisas e deixa de fazer certas coisas, no caso, prejudicar. (...) Impactos no solo, no ambiente em si. Vai depender se o impacto é bom ou mal, da forma como a pessoal fala: Convencional vai ser mau, vai prejudicar as pessoas, a família, o solo, o ambiente. Aqui a gente aprende a usar os dois, mas mais orgânica. As convencionais prejudicam mais o ser humano e a orgânica, está querendo fazer o

contrário, trazer o benefício e não o mal.(Estudante “B1” – 1º ano, entrevista

realizada em 24 de outubro de 2011)

Acho que o efeito ambiental pode ser feito por um lado de melhoramento do meio ambiente, (...) a gente vai ter um consórcio entre convencional e orgânico. E onde a gente pode produzir, onde a gente tem que preservar, de onde a gente pode tirar... (...) Mudou [o jeito de pensar], porque quando eu entrei, eu era totalmente para o lado convencional, eu achava que agricultura tinha que aplicar veneno mesmo, adubo químico... E a gente vai vendo que não é bem assim, que fazendo isso a gente sacrifica muito o solo e a gente acaba tendo uma terra pouco fértil, a gente vai aprendendo a ter um consórcio. (Estudante “F2” – 2º ano, entrevista realizada em 03 de novembro de 2011).

76

Nesse sentido, encontram-se falas semelhantes para o significado da agroecologia,

que apresentam posições coerentes com a fase de transição para um modelo

ecologicamente viável e socialmente mais justo, embora longe de abordar todos os

sentidos desta temática. Contudo, também se percebem definições equivocadas,

que na maioria das vezes costuma conceituar a agroecologia enquanto modelo de

agricultura. Tais equívocos são comuns e se apresentam de forma prejudicial, na

medida em que afasta este tema do campo científico, imprimindo um reducionismo a

esta temática que pode trazer como conseqüência uma limitação na construção de

um estilo de vida mais sustentável (CAPORAL E COSTABEBER, 2004).

Encontrar a Educação Ambiental norteando o PPP, e de forma transversal ao

currículo, foi sem dúvida uma grande surpresa. Portanto, não caberia criticar esta

iniciativa, que pode ser considerada um grande avanço no contexto educacional.

Entretanto, devido à importância da presença desta temática, deveria se investir

mais no estudo deste conceito. Talvez seja necessário também um investimento na

formação política dos professores ou em alguma outra forma de aprofundamento

desta questão. O fato é que hoje, por mais que a discussão da questão ambiental

esteja disseminada na escola, os discursos são colocados de forma acrítica, técnica

e simplificada.

Angotti e Auth (2001) apontam para o baixo entendimento de grande parte destes

professores, frente à complexidade da problemática ambiental, que por se tratar de

resultados da atividade humana, deve ser confrontada com mudanças de

comportamentos e valores. Os autores admitem que enquanto o desenvolvimento da

Ciência e da Tecnologia é determinado pelas relações sociais, estas são, ao mesmo

tempo, diretamente atingidas por este desenvolvimento. O que justifica uma

educação que integralize o conhecimento científico-tecnológico aliado ao

comportamento social e político. A partir deste enfoque, procura-se superar estas

limitações fornecendo ao educando propostas educacionais que o auxiliem no

entendimento das relações que se estabelecem entre os homens e destes com a

natureza. Para isso, é preciso pensar num processo pedagógico capaz de superar o

antropocentrismo, dando ênfase ao conjunto homem-ambiente e suas relações co-

responsáveis e inseparáveis (ANGOTTI E AUTH, 2001).

77

Portanto, a educação em CTS/CTSA se constitui uma alternativa que visa fortalecer

a formação do indivíduo consciente e atuante, na medida em que propõe a utilização

de práticas pedagógicas de forma contextualizada, capaz de tratar o

desenvolvimento científico e tecnológico juntamente com os aspectos históricos,

políticos e socioeconômicos deste desenvolvimento, com ênfase na realidade local e

nos problemas cotidianos (SANTOS, 2007). “Nesse sentido, consideramos que os

temas que abordem um envolvimento social, tecnológico e ambiental, constituem-se

como elementos essenciais e enriquecedores para serem analisados e discutidos

nas aulas de ciências.” (FAGUNDES, 2009, p.3).

Apesar desta discussão de transversalidade e a presença da educação ambiental no

currículo, ainda que não de forma integral, não se pode dizer que a inserção desta

temática na escola tenha ocorrido em resposta aos anseios da população rural ou

dos movimentos sociais, já que existem poucos indícios de participação da

comunidade, e de grupos organizados na escola e na elaboração do PPP. Também

não foi identificado nenhum estudante que tenha participado da elaboração, tomado

conhecimento ou sequer lido o Projeto Político-Pedagógico da Escola. Portanto,

embora o objetivo possa parecer estar sendo parcialmente alcançado, devido a sua

importância, acreditamos que a leitura e a apropriação deste documento devam ser

praticadas nos variados momentos de formação, porém, não foi encontrada

nenhuma familiaridade com o assunto.

Conforme exposto, a inserção destas questões numa estrutura curricular não é

suficiente para que os princípios da Educação Ambiental e da Agroecologia sejam

compreendidos pelos estudantes. A falta de uma metodologia educacional

instigadora, onde a compreensão técnico-científica desta temática seja priorizada

contribui para uma baixa qualificação técnica nesta área do conhecimento, o que faz

com que, muitas vezes o indivíduo se limite a repetição de argumentos sem

embasamento teórico, comprometendo a atuação do profissional técnico em

agropecuária.

Sob esta ótica Soares (2010), ao analisar também o curso de agropecuária,

questiona a sua formação modular e especializada, criticando a reforma da

educação profissional dos anos 1990, que ao ordenar esta conformação prejudica a

78

compreensão sobre as demandas da área rural e conseqüentemente a possibilidade

de obter um ensino dialógico, teórico-prático, integrado e integral. Para a autora, o

modelo desenvolvimentista ao qual o país adotou, contribuiu para a crise do sistema

agrário atual, que se encontra vulnerável, gerando força de trabalho excedente e

favorecendo o êxodo rural. Como proposta para superar este atraso é necessário

que se mude o enfoque do profissional técnico em agropecuária e do extensionista

em geral, que deve estar preparado para atuar na realidade socioambiental,

orientando-se pelas demandas sócio-culturais da população do campo, de forma a

garantir a sustentabilidade do meio (CAPORAL e COSTABEBER, 2000).

Nesta perspectiva, encontrou-se nas escolas técnicas em agropecuária estudadas

um compromisso de atuar no contexto local, da agricultura familiar e dentro dos

padrões sustentáveis da produção. Como exemplo, cito a seguir os objetivos do

Colégio Rego Barros, que tem como principal finalidade “resgatar a cultura agrícola

desta localidade e educar os jovens para a vida na sociedade atual, capacitando-os

para o trabalho.” (Informações obtidas a partir do sítio eletrônico da escola

http://cearegobarros.blogspot.com).

Sob esta lógica, Caporal e Costabeber (2000) propõem novas concepções para o

profissional extensionista, que deve estar consciente de seu papel enquanto

observador para atuar de forma contextualizada com o ambiente e com as pessoas

assistidas por ele, devendo superar a visão ultrapassada que enxergava neste

profissional um difusor de tecnologias. Sendo assim, estes autores defendem

enquanto missão de sustentabilidade deste profissional, ter como público exclusivo

os agricultores familiares, como metodologia de intervenção democrática os

métodos educativos e participativos e a Agroecologia enquanto base científica

(CAPORAL e COSTABEBER, 2000). Nesta perspectiva, os profissionais da

extensão rural devem privilegiar o potencial da comunidade e de seu espaço,

fazendo um diálogo com o conhecimento dos agricultores familiares e estimulando

sempre o desenvolvimento local, de forma verdadeiramente sustentável,

contrapondo-se aos pacotes tecnológicos desenvolvidos para a disseminação das

monoculturas (SOARES, 2010). Tal como os ideais centrais pensados para a

agroecologia. Assim, a difusão dos conhecimentos de agroecologia entre todos os

atores responsáveis pela elaboração teórica e prática de suas ações, aparece

79

enquanto proposta indispensável na conjuntura social e agrária do país, exigindo,

com isso, a participação efetiva do Estado (CAPORAL e COSTABEBER, 2000).

Logo, cabe reforçar aqui o papel central da educação e da formação profissional

técnica em agropecuária, que deve estar comprometida com o desenvolvimento

social, ambiental e agrário, necessários para que se construa uma proposta de

sustentabilidade concreta e possível.

80

5. Considerações Finais

Este estudo abordou múltiplas questões e diversos conceitos, dentre estes merece

especial atenção as valiosas contribuições que os movimentos sociais podem trazer

para o debate da educação e da profissionalização. Sob este aspecto, apesar de

Fernandes (2006) classificar a Educação do Campo como incipiente, ao mesmo

tempo a considera multidimensional, abarcando tanto a formação técnica para os

processos produtivos quanto os diversos níveis educacionais gerais, voltados para a

prática da contextualização do indivíduo enquanto ser biológico, político e

psicossocial. O que coloca a educação numa esfera da política social de importante

caráter econômico. Por suas características peculiares e pela forma de lidar com as

diversidades, bem como pela tentativa de valorizar as suas reivindicações, é

importante que se veja a população do campo enquanto protagonistas de políticas e

não como beneficiários destas. Sob esta ótica, se faz necessário reconhecer no

trabalhador rural um agente que luta ativamente pelos direitos humanos, e nos

movimentos sociais do campo uma organização que mobiliza estes trabalhadores,

pela conquista de sua emancipação. Desta forma, se torna estratégica a dimensão

educativa desses movimentos, pois na medida em que trazem desafios para a

construção de políticas públicas de educação, “reeducam o pensamento educacional

brasileiro e a teoria pedagógica” (ARROYO, 2003, p.30).

Entretanto, o que se observou foi um baixo grau de participação, destes movimentos

sociais e da sociedade civil, por vezes nulo na maioria das escolas. Apesar de não

ser possível afirmar os motivos deste distanciamento, podemos supor que uma

maior integração entre a população e a escola depende em grande parte da

socialização das demandas de ambas as partes. Para isso, é interessante fortalecer

o entendimento de que a escola se constitui também em um campo de disputas,

representando uma arena de conflito de interesses. Fato que se mostrou

imperceptível neste estudo, onde foi possível verificar tanto o pouco interesse do

acesso pelos movimentos sociais como a falta de um maior comprometimento

destas escolas.

81

De toda forma, durante este período de estudo, também pude observar muitos

outros aspectos positivos no que diz respeito à construção do conhecimento, ao

ensino contextualizado, a proximidade com a educação ambiental, dentre outros.

Contudo, pode-se dizer que as práticas encontradas nas escolas estão muito aquém

dos conceitos norteadores da agroecologia e da Educação Ambiental. A proposta de

uma educação diferenciada para a população do campo, onde a integração dos

conhecimentos técnico-científicos às questões socioambientais seja respeitada,

assim como os debates sobre o direcionamento político do desenvolvimento

tecnológico, não foram observados neste espaço de educação formal. Ainda que

algumas escolas realizem alguns trabalhos e experimentos que visem à redução do

uso de componentes químicos, e apesar de ter encontrado a maioria dos

professores e estudantes comprometidos com algumas mudanças na forma

convencional de produção, a formação político-social dos estudantes pode ser

considerada insuficiente. Posto que, por mais que a questão ambiental esteja

disseminada na escola estudada, os conceitos são colocados de forma acrítica,

técnica e simplificada, limitando este debate ao discurso ecológico, o que,

consequentemente facilita um afastamento da ideia de se enxergar no estudante um

elemento de transformação social.

No entanto, não obstante ao esforço das escolas para manter a qualidade do ensino,

talvez o ponto mais crítico que pretendo destacar seja a falta de integração entre o

ensino médio geral e o técnico profissionalizante. Como vimos, o ensino profissional

não deve formar o estudante simplesmente para o trabalho. Ao contrário, deve estar

comprometido com o contexto social, histórico, político, cultural e econômico.

Portanto, mesmo reconhecendo que existem fatores que minimizem a carência

dessa formação mais ampla e geral, a supressão de uma educação integral é fator

limitante para o processo de emancipação do indivíduo. Entretanto, mesmo

reconhecendo a falta de condições ideais, necessárias à implantação do ensino

médio integrado, o que acreditamos ser essencial para a qualidade do ensino, o

MEC (2007) entende a relevância e a urgência de se iniciar este projeto, encarando

a própria conquista destas condições como uma “tarefa coletiva”, a ser alcançada a

partir da participação da comunidade na construção da proposta político-

pedagógica. Portanto, para que esta proposta seja agregadora é importante que

seus objetivos tenham afinidade com os interesses da comunidade, de forma que

82

esta possa se identificar e se reconhecer nela. Assim, é interessante que o ensino

médio integrado não seja visto como uma política do Estado, ao contrário, deve ser

interpretado e ocorrer como a concretização de uma demanda popular (MEC, 2007).

Todavia, apesar de concordar com estas colocações, observar que o ensino

profissionalizante integrado ao ensino médio não é uma realidade no Estado do Rio

de Janeiro, faz com que não o enxerguemos como uma política do Estado e muito

menos como concretização de demandas populares.

Como vimos, salvo algumas exceções, a situação que se mantém é a da lógica

vigente, onde o ensino formal predomina e de forma dicotômica entre ensino geral e

profissionalizante. Atendendo, segundo Soares (2004), ao consenso do

direcionamento político exercido pela classe dominante. Porém, conforme citado por

Angotti e Auth (2001), o descontentamento da classe oprimida contribui para uma

ordenação da sociedade civil, que Soares (2004), guiada pelos pensamentos de

Gramsci, acredita ser de onde surgirá um novo projeto democrático de sociedade.

Desta forma, uma educação integral e politécnica, onde o objetivo maior seja a

emancipação do indivíduo, ainda é contra-hegemônica na sociedade capitalista

atual. Ao pensarmos na realidade das áreas rurais do Brasil, as lutas por melhores

condições de vida estão diretamente relacionadas às mudanças no modelo

educacional do campo e na forma de exploração de sua produção. Com isso,

imagina-se que o papel da escola enquanto “aparelho de hegemonia, constitui- se

num campo de luta, capaz de criar uma contra ideologia, possibilitadora de um maior

conhecimento, uma maior conscientização.” (SOARES, 2004, p.133)

Neste estudo verificamos também que, apesar da pouca oferta de ensino médio

profissionalizante público, não podemos concluir a partir daí que o ingresso da

classe trabalhadora a esta modalidade de ensino se elevará proporcionalmente a

ampliação do número de vagas, é preciso além de tudo conferir qualidade ao curso.

Conforme pudemos observar, embora tenhamos encontrado um grande percentual

de estudantes com fortes relações com o campo, ainda há vagas excedentes.

Portanto, não se pode afirmar que as expectativas quanto ao público que frequenta

estas escolas estejam sendo alcançadas. Ampliar a oportunidade de acesso

significa também dar condições para o estudante se manter na escola e, neste caso

83

especificamente, minimizar a dificuldade de participação dos produtores rurais neste

espaço. Para isso, é importante que sejam pensadas formas alternativas à

frequência regular e obrigatória, o que parece implicar numa baixa procura pelo

curso e no aumento da evasão escolar.

Para o cumprimento deste objetivo, é sugerido também, que se repense a proposta

pedagógica, que deve dialogar com a realidade e as necessidades da população, a

fim de que se desperte o interesse em acessar o ensino formal. Para que as

modificações sejam feitas com o objetivo de melhorar a qualidade dos cursos, é

interessante que se democratizem os espaços de decisão, valorizando a construção

coletiva do projeto político-pedagógico e às discussões sobre currículo nestas

escolas, o que poderia contribuir para garantir a participação da comunidade,

inclusive em questões sobre carga horária, dedicação dos professores e espaços

coletivos de formação, com foco na integração do técnico profissionalizante ao

ensino médio geral.

84

6. Referências Bibliográficas

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YIN, R. K. Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. 4 ed. Porto Alegre: Bookman, 2010.

88

7. Apêndices

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE

Protocolo de Pesquisa

O ENSINO EM ESCOLAS DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA EM

AGROPECUÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO: UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO DE

QUESTÕES SOCIOAMBIENTAIS NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS.

Pesquisador responsável Prof. Dr. Alexandre Brasil Fonseca

Observatório da Educação - CAPES Laboratório de Estudos da Ciência

89

Setembro 2011

1 Introdução

O hábito de utilização de venenos e adubos químicos por grande parte dos agricultores,

muitas vezes sem nenhum tipo de capacitação e sem preocupação com o uso de

equipamentos de proteção, aliado à implantação de pacotes tecnológicos, em grande

parte impostos sem nenhum diálogo com a sociedade, pode ocasionar um potencial

prejuízo à saúde dos trabalhadores, gerando gastos que podem, inclusive, comprometer

economicamente a produção. Além disso, o baixo grau de instrução ao qual estão

submetidos muitos agricultores parece ser um fator que contribui para o agravamento

destas condições.

Em contrapartida, alguns jovens agricultores encontram no ensino formal uma

possibilidade de mudar sua condição, buscando um ensino técnico profissional que

dialogue com a sua realidade. Dentre alguns cursos que se aproximam do trabalho no

campo, o ensino técnico em agropecuária tem forte influência, assumindo uma estrutura

que, segundo o MEC, torna o estudante capaz de planejar, executar, acompanhar e

fiscalizar todas as fases dos projetos agropecuários; administrar propriedades rurais;

elaborar, aplicar e monitorar programas preventivos de sanitização na produção animal,

vegetal e agroindustrial; dentre outras atribuições. O que buscamos saber então é se os

estudantes matriculados nas escolas técnicas em agropecuária estão envolvidos

diretamente com a produção de alimentos e em que nível se dá este envolvimento. Nesta

perspectiva procuramos saber também se há um diálogo entre o ensino formal e a

realidade destes estudantes.

Para esta pesquisa empregaremos como parâmetro os aspectos abordados em Ciência,

Tecnologia e Sociedade, utilizando como base autores como José A. P. Angotti, Milton A.

Auth, Décio Auler, Walter Antonio Bazzo, Wildson Luiz P. dos Santos, dentre outros.

Aproximamos estes conceitos aos conhecimentos da Educação Ambiental e da

Agroecologia, abordando também as interfaces presentes no processo pedagógico e

algumas de suas múltiplas possibilidades. Para isso, contamos ainda com o suporte de

Miguel Altieri, Miguel G. Arroyo, Paulo Freire, Gaudêncio Frigotto, Graciela Ottman,

Demerval Saviani, dentre outros. Os capítulos se estruturam de forma a abordar as

questões em grandes blocos, denominados: Educação, Trabalho e Agricultura; Estudo de

Caso da Escola de Formação Técnica em Agropecuária; Ensino Médio Técnico e

Politécnico; CTSA e a Agroecologia na perspectiva de professores e estudantes.

2 Objetivo geral:

Analisar o ensino nas escolas técnicas em agropecuária no Estado do Rio de Janeiro, dando ênfase aos processos pedagógicos, em suas possíveis interações entre a teoria e a

90

prática de produção, ser humano e meio ambiente, saberes populares e conhecimento científico. 3 Procedimentos metodológicos

a) Organização das visitas:

Aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa;

Seleção da escola a ser investigada:

o Critérios: Estar localizada em perímetro rural; possuir um número significativo

de profissionais já formados (analisar o ano de fundação e o número de vagas

oferecidas por ano);

Autorização da Direção da Escola na qual se realizará o estudo.

Carta de apresentação:

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE

Setembro de 2011

Esta carta tem o objetivo de apresentar o mestrando Leonardo Cavalcanti Rosas, Médico

Veterinário formado no ano de dois mil e sete pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Após a conclusão de sua graduação iniciou um trabalho de Assistência Técnica e Extensão Rural

aos assentamentos da Reforma Agrária, onde se identificou com os trabalhadores rurais e em

especial com a Agricultura Familiar. Desde então vem trabalhando com este público e ingressou

no mestrado a fim de aprofundar algumas questões relativas à construção do conhecimento dos

produtores agrícolas.

A presente pesquisa tem a intenção de identificar e documentar, por meio desta abordagem de

Estudo de Caso, os processos pedagógicos adotados pela escola, dando ênfase as suas possíveis

interações entre a teoria e a prática de produção, ser humano e meio ambiente, saberes

populares e conhecimento científico.

Esta carta é dirigida aos estudantes, professores e equipe administrativa da escola. Solicitamos,

portanto, que disponibilizem um pouco de sua atenção e paciência para responder algumas

questões durante um breve diálogo com o entrevistador. Gostaríamos que soubesse que sua

cooperação é essencial para o estudo.

Em nome do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde – NUTES / UFRJ, expresso nossa

gratidão por sua assistência. Caso queira acompanhar os resultados da pesquisa, teremos o

enorme prazer em disponibilizá-los, para isso basta informar seus contatos para que o

entrevistador possa contatá-lo (a).

Grato novamente,

Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca

...

91

Primeiros contatos por telefone ou e-mail das pessoas-chave a serem entrevistadas

(Diretor(a) e Coordenador(a) Pedagógico);

Orçamento: R$1.080,00, totalizando 6 visitas (Hospedagem R$ 60,00, passagem

R$80,00 e alimentação R$40,00 / visita)

b) Entrevistas

Pessoas-chave:

o Direção da Escola;

o Coordenação Pedagógica;

o Professores do Ensino de Ciências;

o Estudantes matriculados no primeiro e no último ano do curso;

*Agendar a entrevista antes de ir para campo.

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido:

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Você está sendo convidado(a) para participar da pesquisa: O ensino em escolas de formação profissional técnica em agropecuária do estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões socioambientais nas práticas pedagógicas. Você foi selecionado(a) por estar matriculado(a) no primeiro ou no último período de formação técnica em agropecuária e sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição. O objetivo deste estudo é analisar o quanto as questões sociais e ambientais estão inseridas no cotidiano escolar. Sua participação nesta pesquisa consistirá em dialogar sobre, no seu ponto de vista, como essas questões estão sendo ou deveriam ser abordadas. As informações obtidas através dessa pesquisa serão confidenciais e asseguramos o sigilo sobre sua participação. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação, para isto lhe atribuiremos um nome fictício. Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço institucional do pesquisador principal e do CEP, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.

______________________________________ Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca

Centro de Ciências da Saúde, Bloco A, Sala 32 Ilha do Fundão - Rio de Janeiro - RJ - CEP 21949-902 Tel/Fax: (0XX21) 2562-6345 — [email protected]

Comitê de Ética em Pesquisa:

Instituto de Estudos em Saúde Coletiva Praça Jorge Machado Moreira, Cidade Universitária – Ilha do

Fundão/Rio de Janeiro – RJ Tels: (21) 2598-9293 - www.iesc.ufrj.br

[email protected]

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar.

_________________________________________ Sujeito da pesquisa

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Você está sendo convidado(a) para participar da pesquisa: O ensino em escolas de formação profissional técnica em agropecuária do estado do Rio de Janeiro: uma análise da inserção de questões socioambientais nas práticas pedagógicas. Você foi selecionado(a) por ser professor(a) da área de ciências de uma escola de formação técnica em agropecuária e sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição. O objetivo deste estudo é analisar o quanto as questões sociais e ambientais estão inseridas no cotidiano escolar. Sua participação nesta pesquisa consistirá em dialogar sobre, no seu ponto de vista, como essas questões estão sendo ou deveriam ser abordadas. As informações obtidas através dessa pesquisa serão confidenciais e asseguramos o sigilo sobre sua participação. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação, para isto lhe atribuiremos um nome fictício. Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço institucional do pesquisador principal e do CEP, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.

______________________________________ Alexandre Brasil Carvalho da Fonseca

Centro de Ciências da Saúde, Bloco A, Sala 32 Ilha do Fundão - Rio de Janeiro - RJ - CEP 21949-902 Tel/Fax: (0XX21) 2562-6345 — [email protected]

Comitê de Ética em Pesquisa:

Instituto de Estudos em Saúde Coletiva Praça Jorge Machado Moreira, Cidade Universitária – Ilha do

Fundão/Rio de Janeiro – RJ Tels: (21) 2598-9293 - www.iesc.ufrj.br

[email protected]

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar.

_________________________________________ Sujeito da pesquisa

92

Roteiro das entrevistas:

I. Questões de Nível – 2:

1) Diante das necessidades dos estudantes/trabalhadores, para que se torne viável

a participação deste público no processo educacional, seria interessante que se

utilizassem metodologias que possibilitassem a freqüência dos educandos nas

aulas, sem que fosse comprometida radicalmente a sua permanência no campo.

Não necessariamente a classe que acessa esta escola é a dominante, acredito,

inclusive, que sãos os menos favorecidos que a freqüente, entretanto, caso a

população rural deixe de ser atendida, uma possível causa pode se dever ao fato

do trabalho na terra exigir tempo integral, com este modelo de ensino, ou bem se

estuda ou bem se come.

Qual a importância da educação e da escola para a manutenção do “crescimento

econômico”?

2) A falta de uma conexão entre a formação profissional específica e o contexto

social, histórico, econômico, cultural e político, contribui para a formação de um

trabalhador condicionado a se submeter à exploração da lógica vigente. Por esta

característica, podemos supor que uma educação que busque a emancipação do

indivíduo, se configura numa lógica contra-hegemônica, já que parece não ser

objetivo da classe dominante integrar à educação a dimensão social e a

alfabetização científica e tecnológica, o que poderia ajudar o estudante a

compreender e a agir de forma coerente com a sua realidade.

Qual seria uma saída possível para superar este impasse?

Como promover esta integração sem comprometer o trabalho no campo?

3) Saviani atribui ao ensino médio o papel de recuperar a relação entre o

conhecimento e a prática do trabalho. Enquanto o ensino médio técnico

concentra as técnicas de produção existentes, para a formação profissional

específica numa determinada área, provavelmente sem nenhuma conexão

efetiva entre o contexto social, econômico, histórico e cultural, a concepção

politécnica busca não só a interlocução com estes aspectos, como também sua

articulação com o conjunto do processo produtivo.

Entendemos que para se garantir um ensino profissionalizante adequado, onde

estas diferentes técnicas estejam conectadas e contextualizadas, a modalidade

profissional deve estar integralizada ao ensino médio, de tal forma que se evite

93

apenas a adição de disciplinas especificamente profissionais ao currículo, em

detrimento das disciplinas de formação geral.

Uma alternativa que vise superar a dicotomia existente entre educação geral e

profissional pode ser descrita pelo currículo integrado do ensino médio, no qual o

trabalho é pautado como princípio educativo, permitindo uma interlocução com

a questão econômica, social e cultural.

Como está estruturada esta escola?

Esta questão é abordada? De que forma?

4) Para que se institua uma nova concepção pedagógica é importante que se

entenda a integralização de forma que não se desvincule o ensino geral do

profissionalizante, portanto, qualquer tentativa de adição ou sobreposição de

disciplinas pode prejudicar o sentido da integração, que deve articular a essência

do trabalho à ciência de forma contextualizada com o desenvolvimento do

indivíduo consciente de sua realidade.

A estrutura curricular contempla a integralização?

Caso não contemple, a comunidade acadêmica prevê esta situação?

Qual o grau de importância que é dado a esta questão?

5) Supomos que para aumentar as chances de ingresso da classe trabalhadora ao

ensino médio profissionalizante, seria necessário, além de elevar o padrão de

qualidade, ampliar consideravelmente o número de vagas nestas instituições.

Esta idéia é contemplada?

Como se encontra a oferta e a procura por estas escolas?

6) Para que algumas modificações necessárias ocorram de forma democrática, é

interessante valorizar a construção coletiva do projeto político-pedagógico e as

discussões sobre currículo nestas escolas, de forma a garantir a participação da

comunidade inclusive em questões sobre carga horária, dedicação dos

professores e espaços coletivos de formação.

Portanto, para que esta proposta seja agregadora parece ser importante que seus

objetivos tenham afinidade com os interesses da comunidade, de forma que esta

possa se identificar e se reconhecer nela.

Qual o grau de participação da comunidade nos processos de decisão da escola?

94

7) Conforme retratado por Saviani (1994), o modelo escolar é o que domina a

educação da sociedade, de maneira que este formato de ensino é hoje

confundido com a educação em seu sentido pleno. Embora, para o autor, este

processo de construção continue incompleto, quando tratamos de questões

ligadas à educação, o que comumente fazemos é tratar de questões ligadas

diretamente à escola. Mesmo com a manutenção de outras formas de educação,

situadas à margem do ensino formal, como por exemplo, as diretamente ligadas

ao processo produtivo, estas continuam sendo subordinadas à escola e passam a

ser avaliadas sob uma ótica escolar.

Como se dá a relação entre o conhecimento prévio do indivíduo (saber popular) e

o conhecimento técnico aprendido na escola (saber científico)?

8) A alfabetização científica e tecnológica deve estar integrada a dimensão social,

permitindo ao estudante compreender e agir de forma coerente com a sua

realidade.

Qual o grau de intervenção dos estudantes na sua formação?

Qual a compreensão dos professores de Ciências sobre as interações entre

ciência, tecnologia e sociedade?

Quais são suas crenças, suas concepções de progresso?

Os professores associam linearmente progresso com inovações tecnológicas,

supostamente neutras?

O processo histórico vivenciado não teria contribuído para que parcela

significativa dos professores endosse uma perspectiva tecnocrática, concepção

que inviabiliza o movimento CTS?

9) Espera-se despertar no educando o seu compromisso de responsabilidade social,

que perpassa a preservação ambiental e a diminuição das desigualdades sociais.

Como a escola influencia na vida e nas atitudes do estudante?

10) No que diz respeito à problemática ambiental, sugerimos que haja uma mudança

nas usuais concepções de educação relacionadas ao meio ambiente. A idéia de se

trabalhar sobre a dinâmica de imposição de propostas para a solução de

problemas remete a necessidade de se repensar o papel da escola e da estrutura

curricular, impostas de forma tradicional e aceitas de forma passiva.

Pretende-se averiguar se é discutida a necessidade, as possibilidades, a forma de

aplicação de tecnologias, bem como seus efeitos na exploração ambiental, e se

essas colocações são propostas com a tentativa de solucionar as questões

95

relacionadas à qualidade de vida da população, levando-se em conta os valores

pessoais.

11) A Agroecologia abarca conhecimentos interdisciplinares de forma a fornecer

suporte para várias questões do contexto agrário. Tais conhecimentos buscam

compreender desde o funcionamento dos ciclos minerais, passando pela

transformação da energia e os processos biológicos até as relações sócio-

econômicas como um todo. Dessa forma, ainda que haja uma necessária

dimensão técnica na Agroecologia, as variáveis sociais ocupam um papel

relevante, que permitem entender as várias formas de dependência política,

econômica, social e educacional presentes no meio rural e na sociedade em geral.

É possível de se imaginar que a Agroecologia não seja tratada apenas como uma

disciplina que compõe uma estrutura curricular, por se tratar de uma abordagem

“pluri-epistemológica”, sugere-se que este tema seja inter e trans-disciplinar.

A questão da Agroecologia é abordada em algum momento?

Alguém traz esta discussão para o cotidiano escolar?

Existe o entendimento de algum ponto de convergência entre a agroecologia e a

dimensão social?

12) O Programa Brasil Profissionalizado, que visa fortalecer as redes estaduais de

educação profissional e tecnológica, através de repasses específicos de recursos

do governo federal. Desta forma os estados podem investir em suas escolas

técnicas, viabilizando a modernização e a expansão das redes públicas de ensino

médio integradas à educação profissional. Atingindo assim as recomendações

propostas no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos que, entre outras, prevê a

construção de laboratórios de física, química, biologia, matemática e informática.

Qual a estrutura física da escola?

Como se dá, ou não, a participação da comunidade na estrutura física da escola?

13) A relação entre o trabalho e a educação escolar nem sempre é compreendida de

forma ampla pelos professores, que muitas vezes confundem ensino

contextualizado com a simples abordagem de situações cotidianas. Esta

preocupação incita a investigação mais aprofundada de como as dimensões

sociais são inseridas no contexto científico das salas de aula. Neste ponto, alguns

questionamentos devem ser levados em consideração para uma abordagem

metodológica eficaz. Assim:

96

Será que a simples menção de processos físicos, químicos e biológicos do

cotidiano torna o ensino dessas ciências mais relevante para o aluno?

Será que o aluno aprenderá ciência mais facilmente com tal ensino?

14) Imagina-se que o papel da escola enquanto “aparelho de hegemonia, constitui-se

num campo de luta, capaz de criar uma contra ideologia, possibilitadora de um

maior conhecimento, uma maior conscientização.”

Integrar ao currículo o componente social, propondo favorecer a visão de grupo,

na qual a percepção de organização social sugere melhorar a eficácia das

reivindicações, além de fortalecer a formação política do indivíduo, que expande

sua consciência de inserção na sociedade, amplia suas condições de intervenção

no contexto.

Existe algum tipo de organização social da comunidade acadêmica?

II. Questões de Nível – 1

i. Estudantes:

Local de moradia;

Atividades extra-classe;

Exerce atividade remunerada;

Renda familiar;

Expectativas em relação ao curso técnico em agropecuária.

Relacionar o conteúdo aprendido no curso técnico com as disciplinas da

área humana e social;

Como as técnicas aprendidas podem facilitar a vida no campo?

A carga horária das aulas limita a atividade cotidiana do campo?

Apontar alguma relação dos problemas cotidianos (relacionados ou não a

atividade agropecuária) que a escola ajudou a solucionar.

Os problemas que aparecem no cotidiano dependem de explicações

científicas para a sua resolução?

A escola pode ser encarada como uma via de mão-dupla, onde tanto se

aprende quanto se ensina?

Aprende-se mais ou se ensina mais?

Considera que as atividades do ensino médio geral influenciam no curso

profissionalizante e vice-versa?

97

Acha importante esta integração?

De forma geral, como considera a qualidade do curso?

O número de vagas oferecido é suficiente para atender a demanda por

este curso?

Já ouviu falar em Projeto Político Pedagógico?

Sabe se a sua escola tem um?

Caso tenha, sabe quem foi o responsável pela sua elaboração?

Tem participação nos processos de decisão da escola? Gostaria de poder

contribuir mais nesses processos?

Quando procurou o curso, já tinha alguma experiência com a produção

agropecuária?

Os conhecimentos que trazia contribuem para a sua formação?

Como os professores receberam estas informações?

Como é encarada a possibilidade de freqüentar um ensino público?

O que acha que a sociedade espera de você, após a sua formação?

Depois de freqüentar esta escola, acha que alguma coisa mudou em

relação as suas atitudes com os outros? E com o meio ambiente?

Considera o aprendizado de novas tecnologias compatível com a sua

realidade?

Quais os efeitos ambientais que as técnicas agropecuárias ensinadas na

escola podem gerar?

Sobre estas técnicas aprendidas, considera que contribuíram para o seu

entendimento sobre a interação do homem com a natureza?

Mudou alguma coisa em relação ao que você já pensava?

Você já ouviu falar em Agroecologia? Antes ou depois da escola?

Definir o que é Agroecologia;

Algum professor ensina Agroecologia?

A Agroecologia poderia contribuir com as relações humanas?

Está satisfeito com a estrutura física da escola?

Se pudesse mudar alguma coisa, o que seria?

Acha que suas considerações seriam levadas em conta?

98

Os conteúdos abordados em sala de aula levam em consideração as

demandas da sociedade?

Qual a relação entre a incorporação de novas técnicas, adubos,

agrotóxicos e a sua possível abrangência e área de atuação profissional?

Existe algum grupo de estudantes organizados?

Qual o papel deste grupo?

Você participa ou participaria de algum grupo deste tipo?

ii. Professores:

Perfil Sócio-econômico dos alunos;

A metodologia pode influenciar o perfil de alunos matriculados?

Grau de comprometimento dos alunos com o aprendizado;

Relevância do intercâmbio de conteúdos com outras disciplinas;

São utilizados conteúdos de outras disciplinas, da área humana ou social,

para responder questões práticas do cotidiano?

Há alguma relação entre os conhecimentos humanos e sociais para a

formação técnica do indivíduo?

Como estão distribuídas as disciplinas no currículo?

Existe a necessidade de pensar num currículo integrado entre o ensino

médio geral e profissional?

Quais seriam as vantagens e as limitações desta integralização?

Aparecem soluções práticas do cotidiano dos alunos que poderiam ser

abordadas em sala de aula?

Como são tratadas as dúvidas provenientes do trabalho no campo que

porventura apareçam na sala de aula?

Os problemas apresentados pelos alunos são levados em conta na hora de

estruturar as aulas?

O número de vagas oferecido é suficiente para atender a demanda por

este curso?

Acredita que se tivessem oportunidade e tempo mais alunos do ensino

médio geral freqüentariam o ensino técnico?

Do que depende a qualidade do curso?

Conhece o projeto político pedagógico da escola?

Sabe quem foi o responsável pela sua elaboração?

99

Como acha que a comunidade agiria caso fossem convidados para opinar

sobre o Projeto Político Pedagógico?

Acha importante que a comunidade participe deste processo?

Como é a participação dos alunos na sala de aula?

Porque acha que eles procuraram este curso técnico

Como são tratadas as dúvidas dos alunos?

De que forma se dá a construção do conhecimento nas aulas?

Qual o seu grau de formação?

Já teve outras experiências de sala de aula?

Participa de cursos, seminários ou dá continuidade à sua formação

profissional de alguma forma?

Os alunos deveriam freqüentar outros espaços de formação? Ou a este

curso dá conta do que eles precisam?

De que forma o desenvolvimento científico e tecnológico pode ajudar na

vida dos estudantes?

São desenvolvidas atividades lúdicas em sala de aula?

Os alunos são incentivados a participar de alguma atividade de extensão?

As tecnologias aprendidas em sala de aula são facilmente aplicáveis no

campo?

Como definiria um aluno bem sucedido?

De que forma as técnicas agropecuárias ensinadas se relacionam com o

meio ambiente?

É abordada em algum momento a relação entre o homem e a natureza?

Como ocorre esta interação?

Conhece os conceitos da Agroecologia?

Ensina algum destes conceitos para os alunos?

Como as práticas Agroecológicas se relacionam com o Desenvolvimento

Social?

Está satisfeito com a estrutura física da escola?

Se pudesse mudar alguma coisa, o que seria?

Papel da escola na comunidade e vice-versa?.

A comunidade conhece a estrutura física da escola?

Acha que a comunidade pode influenciar a decisão de mudar alguma coisa

dentro da escola?

100

Existe alguma relação entre o cotidiano de trabalho e a dinâmica de

ensino na sala de aula

Existe algum tipo de organização dos estudantes?

Uma organização deste tipo ajudaria ou atrapalharia a formação do

indivíduo?

c) Observação

o Diário de campo;

o Fotografias: Espaços Coletivos (Horta Escolar, Laboratórios etc)

d) Documentos

Projeto Político-pedagógico;

Identidade (missão e objetivos educacionais)

Currículo;

Recursos didáticos.

e) Cronograma:

OUTUBRO 05 06 13 14 19 20 26 27

NOVEMBRO 03 09 10 16 17 23 24 30

DEZEMBRO 01 07 08 14 15