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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO ESCOLA POLITÉCNICA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENGENHARIA URBANA DIANE BIANCHI DA COSTA E SILVA TRANSPORTE SOLIDÁRIO: uma rede colaborativa para cidades mais sustentáveis Rio de Janeiro 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

ESCOLA POLITÉCNICA

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENGENHARIA URBANA

DIANE BIANCHI DA COSTA E SILVA

TRANSPORTE SOLIDÁRIO:

uma rede colaborativa para cidades mais sustentáveis

Rio de Janeiro

2015

DIANE BIANCHI DA COSTA E SILVA

TRANSPORTE SOLIDÁRIO:

uma rede colaborativa para cidades mais sustentáveis

Trabalho de Conclusão apresentado ao CURSO DE

ESPECIALIZAÇÃO EM ENGENHARIA URBANA, pós-

graduação lato sensu da Escola Politécnica da UFRJ, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do Certificado de

Especialista em Engenharia Urbana.

Rio de Janeiro

2015

Ficha Catalográfica

Universidade Federal do Rio de Janeiro. Escola Politécnica.

Curso de Especialização em Engenharia Urbana

Transporte Solidário: uma rede colaborativa para cidades mais sustentáveis.

Cidade do Rio de Janeiro

por Diane Bianchi da Costa e Silva – Rio de Janeiro, 2015.

62 p. Trabalho de Conclusão – 2015

1. Mobilidade Urbana 2. Transporte Solidário 3. Sustentabilidade

NOME DO ALUNO

DIANE BIANCHI DA COSTA E SILVA

Rio de Janeiro

2015

_____________________________________________________

Orientadora, Profa. Rosane Martins Alves, D. Sc. PEU/Poli//UFRJ

_______________________________________________________

Coordenadora, Profa. Rosane Martins Alves, D. Sc. PEU/Poli//UFRJ

Dedico este trabalho à minha estimada família

por toda a ajuda e carinho.

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Rosane Martins Alves, pela compreensão e contribuições para o

desenvolvimento deste trabalho.

À minha coorientadora Márcia Bandeira, pelo incentivo, disponibilidade e contribuições

durante todo este percurso.

Ao idealizador do projeto Minha Carona Guilherme Murad Pim, pela disponibilização dos

dados e atenção despendida ao longo do trabalho.

Aos professores do curso de especialização em Engenharia Urbana da UFRJ, pelos

ensinamentos e aulas construtivas.

A todos que contribuíram respondendo o questionário elaborado no presente trabalho.

Aos meus colegas de trabalho, pelo incentivo.

E, especialmente,

À minha querida irmã Iris e à minha avó Maurília. Aos meus pais Clara e Flávio, por todo o

incentivo e ajuda, fundamentais para a realização do curso.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 7

1.1. Considerações iniciais .............................................................................................. 7

1.2. Objetivos gerais e específicos .................................................................................. 8

1.3. Justificativa............................................................................................................... 8

1.4. Metodologia ............................................................................................................. 8

1.5. Estrutura do Trabalho ............................................................................................... 9

2. DISCUSSÃO CONCEITUAL ......................................................................................... 11

2.1. Mobilidade Urbana ................................................................................................. 11

2.2. Carona Solidária ..................................................................................................... 17

2.3. Projeto de Lei nº 8074/2014 ................................................................................... 20

3. OBJETOS DE ESTUDO .................................................................................................. 22

3.1. Projeto Carona Legal ESPM .................................................................................. 22

3.2. Projeto MOB – Carona solidária (Brasília, DF) ..................................................... 25

3.3. Site Caronetas ......................................................................................................... 27

3.4. Minha Carona ......................................................................................................... 29

4. ANÁLISES E PROPOSTAS ............................................................................................ 33

4.1. Análise comparativa: objetos de estudo ................................................................. 33

4.2. Questionário eletrônico: resultados e análises na UFRJ ........................................ 40

4.3. Propostas ................................................................................................................ 47

5. CONCLUSÃO .................................................................................................................. 49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 51

ANEXO I- Projeto de Lei Nº 8074/2014 .................................................................................. 53

APÊNDICE A - Entrevista Projeto Minha Carona .................................................................. 58

APÊNDICE B – Questionário Eletrônico UFRJ ...................................................................... 59

7

1. INTRODUÇÃO

1.1. Considerações iniciais

O debate sobre a mobilidade urbana tem apresentado grande visibilidade nos centros

urbanos. As condições em que são realizados os deslocamentos nas grandes cidades

brasileiras não atendem de forma satisfatória a população. A presença constante de trânsitos

intensos e a poluição por meio dos gases estufa liberados por transportes motorizados

prejudicam a qualidade de vida dos moradores urbanos.

Diante disso, questiona-se o modelo rodoviarista e a visão fragmentada adotados no

planejamento de muitas cidades brasileiras, e verifica-se a necessidade de mudanças de

valores e hábitos para se alcançar um modelo de mobilidade urbana mais sustentável.

Segundo Rogers (1997), “a cidade é a corporificação da sociedade, sua forma deve ser sempre

vista em relação a nossos objetivos sociais”. Nesse contexto, o transporte solidário,

mundialmente conhecido como Carpool, surge como uma ação que visa contribuir para a

redução de automóveis particulares nos espaços públicos dos centros urbanos, mas também

para a construção desses novos valores e objetivos sociais.

A carona compartilhada é comum em diversos países do exterior, e esse

reconhecimento e divulgação pelos meios de comunicação incentivou o desenvolvimento do

Projeto de Lei nº 8074/2014, que tem como um dos objetivos a regulamentação do transporte

solidário no país, e a criação de diversos sistemas de caronas nas cidades brasileiras nos

últimos anos através de redes sociais, sites, aplicativos e outros meios disponibilizados pela

internet.

Atualmente, observa-se que os brasileiros possuem uma resistência a esta prática

devido à insegurança e a questões culturais. No entanto, acredita-se que com uma política de

longo prazo e um planejamento eficiente haveria maior adesão da população e a criação de

verdadeiras redes colaborativas, e, com isso, menos automóveis particulares em trânsito nos

centros urbanos. Por fim, melhores condições de deslocamento, menos gases poluentes sendo

emitidos e diversos outros ganhos para a sociedade, o patrimônio cultural e os ecossistemas.

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1.2. Objetivos gerais e específicos

O presente trabalho tem como objetivos gerais realizar uma reflexão crítica sobre a

prática do transporte solidário e sua potencialidade como um meio alternativo de

deslocamento nos centros urbanos.

Como objetivos específicos, pode-se relacionar:

1) Refletir sobre o impacto do transporte solidário dentro do contexto da Mobilidade

Urbana.

2) Discutir o Projeto de Lei nº 8074/2014

3) Realizar a análise comparativa de projetos de carona solidária desenvolvidos no Brasil.

4) Auxiliar futuros projetos de carona solidária.

1.3. Justificativa

Tendo em vista as consequências do uso excessivo de carros nos centros urbanos na

qualidade de vida da população e o transporte solidário como um meio de reduzir estes

impactos, o tema proposto possui relevância para a cidade e pessoas que nela habitam.

Acredita-se que a presente pesquisa se justifica por uma possível contribuição ao

aprofundamento do estudo de sistemas de transportes solidários, recente no meio acadêmico,

e ao direcionamento de futuros projetos de carona solidária.

1.4. Metodologia

No capítulo de discussão conceitual, a metodologia consistiu no estudo da bibliografia

especializada referente aos temas de mobilidade urbana sustentável e de transporte solidário.

Buscou-se a perspectiva de diversos autores de diferentes áreas para auxiliar o

desenvolvimento das reflexões propostas.

No capítulo dos objetos de estudo, a metodologia baseou-se em pesquisas realizadas

nos sites dos projetos selecionados pela pesquisa e publicações em artigos na internet. Junto a

isso, foi elaborada uma entrevista exploratória para o idealizador do quarto projeto

9

apresentado, o Minha Carona, com a finalidade de se obter mais informações sobre o

programa.

No quarto capítulo, referente à análise e discussão de resultados, utilizou-se a técnica

da análise comparativa para estabelecer as principais diferenças e semelhanças entre os

projetos apresentados, bem como o recurso de diagramas para representar as reflexões

propostas. Paralelamente, foi elaborado um questionário eletrônico, divulgado em rede social

(Facebook) e grupos acadêmicos, com a finalidade de verificar o grau de aceitação de

moradores do Rio de Janeiro à prática do transporte solidário. O questionário, disponível no

Apêndice B, é constituído por três partes com os objetivos de traçar o perfil do entrevistado,

averiguar se estes utilizam o transporte solidário e verificar o potencial de adesão a projetos

de carona solidária. As perguntas da primeira parte foram realizadas com base em

questionários construídos por outros pesquisadores. Já as demais partes, foram elaboradas

pela própria autora. Trata-se de um questionário fechado com alternativas previamente

estabelecidas, porém ao final o entrevistado tem a possibilidade de responder textualmente e

de forma livre.

1.5. Estrutura do Trabalho

Capítulo 1 – No primeiro capítulo é introduzido o tema proposto e expostos os objetivos do

trabalho, delimitando o assunto que será tratado.

Capítulo 2 – Discussão conceitual

Este capítulo é dedicado a um breve estudo dos conceitos de mobilidade urbana e

sustentabilidade, e também, à reflexão do transporte solidário como um meio alternativo nos

centros urbanos e à apresentação do Projeto de Lei nº 8074/2014. Seus objetivos são delimitar

conceitualmente o tema proposto e realizar questionamentos que irão nortear o

desenvolvimento do presente trabalho.

Capítulo 3 – Objetos de estudo

Este capítulo tem como intuito apresentar quatro projetos de transporte solidário

implementados no Brasil: o Projeto Carona Legal ESPM, de 2010; o MOB-Carona Solidária,

de 2014; o site Caronetas, de 2013; e o aplicativo Minha Carona, de 2014. A descrição de

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cada projeto foi realizada considerando seus objetivos, sua localização e abrangência, a

dinâmica e funcionamento do sistema, a forma de publicidade e educação, e a adesão do

público alvo, para posterior análise comparativa elaborada no capítulo 4.

Capítulo 4 – Análise

Neste capítulo é realizada a análise comparativa dos quatro projetos apresentados com

o objetivo de verificar as semelhanças e diferenças entre cada programa para maior

compreensão do tema proposto. Em seguida são expostos e analisados os resultados de

questionário promovido com o intuito de identificar o nível de aceitação do transporte

solidário de moradores da cidade do Rio de Janeiro.

Capítulo 5 – No capítulo 5 são apresentadas as considerações finais aos aspectos discutidos

na pesquisa. E, por fim, realizadas sugestões baseadas nas conclusões das análises dos

projetos e dos resultados da pesquisa feita através de questionário eletrônico.

11

2. DISCUSSÃO CONCEITUAL

2.1. Mobilidade Urbana

A mobilidade urbana é definida pela Lei Nº 12.5871 como a condição em que são

realizados os deslocamentos de bens e pessoas no espaço urbano (BRASIL, 2012). Entende-se

que estas movimentações estão relacionadas a todos os modos, as características, à natureza

do serviço e também à infraestrutura, como as vias, hidrovias, ciclovias, terminais,

estacionamentos, sinalização viária e até mesmo instrumentos de fiscalização. O conceito de

mobilidade urbana é complexo e subjetivo, pois essas condições envolvem a cultura e os

valores, a educação, os aspectos geográficos, econômicos e políticos de cada localidade

(DOBBERT et al., 2012).

É comum a limitação do conceito de mobilidade urbana somente aos transportes,

principalmente aos motorizados, sem haver a devida atenção aos deslocamentos dos pedestres

(AZEVEDO FILHO, 2012). A visão fragmentada, que não integra os modais e o uso do solo,

promove, na maioria dos centros urbanos, problemas de locomoção, como a falta de

acessibilidade, equidade no uso do espaço público e eficiência na prestação dos serviços de

transportes e na circulação urbana. Dentro deste contexto, visando minimizar os impactos

negativos, nos âmbitos sociais e ambientais, surge o conceito da mobilidade urbana

sustentável, que tem como meta assegurar o acesso a bens e serviços de maneira eficiente para

todos os habitantes da área urbana, resguardar o meio ambiente, o patrimônio cultural e os

ecossistemas para a presente geração, porém, sem limitar as oportunidades das gerações

futuras (BLACK et al., 2002).

No Brasil, esses conceitos estão presentes no Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001) e na

Lei de Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana (BRASIL, 2012), já citada neste

capítulo. Logo, a legislação brasileira contém todas as diretrizes necessárias para se atingir

uma gestão efetiva, mas, observa-se nas grandes cidades brasileiras, como o Rio de Janeiro, o

uso excessivo do modo rodoviário, em especial do transporte individual e a falta de integração

entre os modais. Esta resistência à mudança está relacionada ao modelo que favorece os

interesses da especulação imobiliária e da indústria automobilística (AZEVEDO FILHO,

2012).

1 Lei Federal, de três de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana.

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O desejo de liberdade e status social, aliados à disponibilidade de crédito e ao

financiamento em longo prazo, fez com que as vendas de automóveis e comerciais leves

aumentassem de 1,2 milhão em 1999 para três milhões em 2009, o que corresponde a uma

expansão de 150% (cento e cinquenta por cento) no período (OLIVEIRA, 2013). Além disso,

o transporte individual motorizado é prático, pois as cidades não foram planejadas para

funcionar a partir de um sistema de transporte público de massa (ROGERS, 1997).

A ausência de pontualidade e de conforto, a lotação excessiva e a insegurança nos

transportes públicos desestimulam os cidadãos a utilizarem estes serviços. Os que possuem

veículo próprio e renda para arcar com os altos custos dos estacionamentos nos centros

urbanos acabam optando por utilizar o transporte individual. Nota-se, também, que grande

parte destes veículos são ocupados somente pelos motoristas. Na Região Metropolitana de

São Paulo um automóvel transporta, em média, 1,2 pessoas por viagem, tratando-se de uma

situação insustentável, energética e ambientalmente (OLIVEIRA, 2013).

As consequências da ausência de um planejamento integrado, de uma administração

pública ineficiente e do uso excessivo do transporte individual são facilmente identificáveis

nos centros urbanos. Observa-se o aumento nos índices de gases poluentes e ruídos, nos

tempos de viagem, de acidentes no trânsito, e ainda a intensificação da segregação social e

desqualificação do espaço público. Esta realidade compromete a qualidade de vida da

população que se desloca nos centros urbanos causando danos físicos e psicológicos.

Figura 1- Trânsito no Rio de Janeiro

Fonte: Disponível em: <http://oglobo.globo.com/economia/marcha-lenta-no-

transito-do-rio-14425613>. Acesso: 01/09/2015

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A enorme quantidade de poluentes liberados pelos veículos motorizados nas grandes

metrópoles agrava problemas respiratórios e prejudica a saúde dos habitantes, mas também

promove impactos globais, como as mudanças climáticas. Segundo o International Transport,

Fórum da OECD, em determinadas regiões do planeta o transporte possui a segunda ou

terceira participação nas emissões de gás carbônico, e ainda há a previsão de que os

lançamentos de poluentes provenientes das atividades de transporte irão dobrar nos próximos

30 anos em todo o mundo (BOARETO, 2008).

Entre os modais de transporte urbano o carro e a moto são os que apresentam maior

intensidade carbônica (Figura 2), medida pelo valor das emissões de CO₂ por passageiro por

quilômetro. O resultado da soma entre as intensidades do trem, metrô, BRT e ônibus comum

continua sendo inferior ao fator de emissão do carro e moto. Assim, verifica-se que, entre as

opções dos modais analisados no gráfico a seguir, o veículo próprio configura o mais

dispendioso energeticamente.

Figura 2- Intensidade carbônica dos modais de transporte urbano de passageiros no Brasil

Fonte: Disponível em: <http://www.caronetas.com.br/responsabilidade-socio-ambiental>. Acesso: 08/09/2015

Como já comentando anteriormente, este modelo de desenvolvimento urbano que

incentiva o uso do transporte individual em detrimento do público também promove a perda

da mobilidade, principalmente das populações mais carentes. O aumento do tempo de

deslocamento de viagens acarreta, além do desconforto e estresse, a diminuição da

produtividade, uma vez que o passageiro poderia aproveitar este tempo realizando alguma

atividade alternativa de produção, ou dedicando mais horas à família, à educação e ao lazer

(YOUNG et al, 2013).

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Figura 3- Tempo habitual de deslocamento para o trabalho nas Regiões Metropolitanas

Fonte: Elaboração própria, com base no Censo de Demográfico 2010- IBGE

O Rio de Janeiro e São Paulo estão entre as cidades que possuem maior tempo médio

de deslocamento para chegar ao trabalho no Brasil. Na Região Metropolitana do Rio de

Janeiro cerca de 62% (sessenta e dois por cento) da população demora de meia hora até mais

de duas horas para se deslocar até o serviço e 38% (trinta e oito por cento) leva de cinco

minutos a meia hora (IBGE, 2010). Os grupos mais afetados são aqueles que residem nas

periferias, onde os custos de moradias são menores, mas trabalham no centro econômico

devido às melhores oportunidades de emprego nas áreas centrais.

Segundo Young et al (2013), cria-se um ciclo vicioso, pois o cidadão de baixa

qualificação possui um rendimento menor e, por isso, reside longe das áreas centrais, o que o

faz levar mais tempo para se deslocar e, consequentemente, perder a possibilidade de utilizar

este tempo para educação ou qualificação, que poderiam proporcionar o aumento de sua

remuneração. Percebe-se, então, que a ineficiência nos serviços de transporte público

contribui para a exclusão social.

Essa segregação ocorre também a partir do momento em que as esquinas, as formas e

superfícies dos espaços públicos são planejadas em benefício do motorista (ROGERS, 1997).

Os carros ocupam uma grande parte do espaço público que poderia ser aproveitado pelas

comunidades de forma mais efetiva, através de ciclovias, calçadas mais largas, pocket parks e

até mesmo edificações de caráter institucional. O município do Rio de Janeiro no ano de 2013

possuía 2.073.989 milhões de automóveis registrados (ARMAZÉM DE DADOS, 2013),

então, considerando que uma vaga requer cerca de 20 m², contando as vias de entrada e

manobra, conclui-se que seria necessária uma área de estacionamento de 41,48 km²,

15

aproximadamente sete vezes o bairro do Centro da Cidade, para comportar todos estes

veículos.

Figura 4- Comparação do espaço ocupado por ônibus, bicicleta e carro

Fonte: Disponível em: <http://www.bikehub.co.uk/news/sustainability/iconic-waste-of-space-

photo-keeps-on-giving/>. Acesso: 15/09/2015

Na capital da Austrália, Camberra, foi realizada uma simulação em 2012 para

comparar o espaço ocupado por 69 voluntários utilizando diferentes tipos de transporte: o

ônibus, a bicicleta e o veículo próprio. O objetivo era mostrar como o carro colabora para

maiores congestionamentos e incentivar a utilização do transporte coletivo e de bicicletas para

os deslocamentos do cotidiano. Na imagem (figura 4) nota-se, mais uma vez, o desperdício do

espaço urbano quando utilizado o transporte individual de forma excessiva.

Estudos em São Francisco (ROGERS, 1997), com a finalidade de analisar os

resultados do tráfego na vida de uma comunidade, compararam vias localizadas em diferentes

bairros. Segundo Rogers (1997), “o nível de interação social entre vizinhos de uma

determinada rua, ou o senso de comunidade naquela rua, era inversamente proporcional à sua

quantidade de trânsito”. Logo, o tráfego também contribui para a alienação do morador

urbano. O senso de comunidade é essencial para o engajamento dos cidadãos e para a vida nas

ruas das grandes cidades.

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Figura 5- Relação entre interação social e intensidade de tráfego

Fonte: ROGERS, 1997

Dentro desse contexto, ressalta-se que a opção pelo transporte individual, na busca por

um maior conforto, acaba por agravar a situação atual da mobilidade urbana, prejudicando,

assim, o coletivo. Porém, muitas vezes, devido à falta de integração entre modais e carência

em algumas regiões mais afastadas do centro de transporte público, o carro torna-se uma

necessidade. Assim, os centros urbanos continuam apresentando uma conjuntura desfavorável

para se alcançar os princípios da mobilidade urbana sustentável: promover equidade e

eficiência no acesso a bens e serviços, resguardar o meio ambiente, o patrimônio cultural e os

ecossistemas.

Pode-se dizer que não há cidades sustentáveis, mas há uma busca por sua

sustentabilidade (MARTINELLI apud BOARETO, 2008). Dessa forma, tem-se um processo

progressivo para a efetivação dos ideais das cidades sustentáveis, sendo necessária a reflexão

dos valores atuais, a postura e a ação nas esferas públicas, privadas e individuais na

sociedade.

As cidades só podem refletir os valores, compromissos e resoluções da sociedade

que abrigam. Portanto, o sucesso de uma cidade depende de seus habitantes e do

poder público, da prioridade que ambos dão à criação e manutenção de um ambiente

urbano e humano. (ROGERS, 1997)

17

Logo, a sociedade tem um papel fundamental na busca por essa mobilidade urbana

sustentável, imprescindível para a melhoria na qualidade de vida nos centros urbanos. A

participação dos cidadãos deveria ocorrer através de reivindicações e engajamento político,

como a tentativa da população em manifestar-se contra o aumento das passagens de ônibus

em Junho de 2013, mas também, por meio da conscientização e reflexão de como os seus atos

refletem na vida comunitária, nas cidades e no planeta.

2.2. Carona Solidária

De acordo com Rose Guedes, presidente do IAB-MB, “Enquanto não conseguimos o

transporte coletivo que desejamos, vamos contribuir fazendo a nossa parte. Se mil famílias

fizerem isso, diariamente tiramos 3 mil carros das ruas” 2, referindo-se à carona familiar. Esta

consideração foi realizada na mesa de abertura da quinta edição do ciclo Seminários de

Política Urbana Quintandinha +50, que propõe a construção de um Compromisso Nacional e

Local pela universalização dos serviços públicos urbanos.

A reflexão da presidente do IAB-MG foi direcionada à carona entre familiares, porém

o transporte solidário estende-se ao uso compartilhado de um veículo particular entre colegas

de trabalho, amigos, alunos de uma mesma faculdade, vizinhos ou até mesmo desconhecidos.

É importante ressaltar que, conforme esclarecido pela Agência Nacional de Transportes

Terrestres (ANTT)3, a carona solidária sem o intuito de obter lucro não é uma prática ilegal e

deve ser incentivada. Porém, aplicativos que tornam a prática da carona um negócio para o

motorista representam uma ação ilegal, pois, nestes casos, é obrigatória a autorização do

órgão competente. Entende-se que dividir o preço dos gastos com a gasolina não compreende

em criar um mercado de caronas, afinal, o motorista não iria tornar desta prática uma fonte de

renda, já que este continua tendo, também, despesas com o combustível.

A carona compartilhada, conhecida mundialmente como Carpool ou Carpooling, é

comum em diversos países do exterior, como a Inglaterra e o Canadá. Esse reconhecimento e

divulgação pelos meios de comunicação incentivaram a criação de diversos sistemas de

2 IAB. Q+50, Seminários de Política Urbana Quintandinha+50. ARQUITETURA, Rio de Janeiro, IAB,

edição especial, nº 82, ano 52, 1º semestre de 2014. 3 Disponível em:

<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:rPnSoFGue0gJ:www.brasil.gov.br/infraestrutura/2014

/04/antt-presta-esclarecimentos-sobre-aplicativo-para-carona+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>.

18

Caronas nas cidades brasileiras nos últimos anos, tanto por parte de empreendedores,

desenvolvedores de aplicativos e do poder público. A prática de compartilhar o automóvel

tornou-se mais popular, principalmente entre jovens universitários, através de redes sociais.

No Facebook, há aproximadamente 15 grupos com a finalidade de combinar caronas para se

deslocar até a Cidade Universitária (UFRJ) ou retornar desta para casa, totalizando 6.514

membros (MEYER et al, 2014). Tendo em vista esta demanda, o Fundo Verde-UFRJ4 está

financiando o desenvolvimento de um projeto de transporte solidário, o Caronaê, idealizado

por graduandos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que visa integrar todos estes

grupos de caronas já existentes e estimular a adesão daqueles que não oferecem ou pegam

carona.

A prática do transporte solidário com uma ou mais pessoas, se aderida por grande

parte da população, poderia reduzir a quantidade de carros nos centros urbanos em cerca de

50% (cinquenta por cento), uma vez que a taxa de ocupação deste aumentaria de 1,2 pessoas

para 2,4. No entanto, essa redução ocorreria se houvesse o compartilhamento entre pessoas

que já utilizam o automóvel particular. Caso a taxa de ocupação nos veículos aumentem

somente com indivíduos, que antes, eram usuários do transporte público, a quantidade de

carros nas vias urbanas continuará a mesma.

Figura 6- Comparativo da área ocupada por ônibus, transporte individual e transporte solidário

Fonte: MEYER et al (2014)

4 O Fundo Verde de Desenvolvimento e Energia para a Cidade Universitária da Universidade Federal do Rio de

Janeiro foi criado pelo decreto estadual nº 43.903/2012 para investir em projetos relacionados à sustentabilidade

no campus da universidade.

19

Percebe-se através do iconográfico comparativo o potencial do transporte solidário

como uma forma de contribuir positivamente para a mobilidade urbana. Com a diminuição de

carros, há a redução de emissão de gases do efeito estufa, poluição do ar e de

congestionamentos de veículos. Consequentemente, os índices de acidentes no trânsito e

doenças respiratórias também diminuem. Além disso, considerando que o tempo despendido

para os deslocamentos torna-se menor, cria-se a oportunidade de maior produtividade. Logo,

os efeitos seriam não só no âmbito social e ambiental, mas também no contexto econômico.

Com menos veículos nos centros urbanos, o espaço necessário de estacionamento

diminui, o que possibilita a utilização de faixas de vias ou espaços urbanos vazios, antes

priorizados para os automóveis, para maiores calçadas, ciclovias e Pocket Parks5, como a

Pracinha Oscar Freire em São Paulo. Para uma recuperação urbana que permita a apropriação

das zonas centrais pelos seus transeuntes, deve-se contemplar a coordenação de diversas ações

e atores (ALOMÁ, 2013). Acredita-se que a adesão à prática do transporte solidário,

desassociada das demais medidas necessárias, não iria promover a renovação destes espaços,

mas, com certeza, contribui num cenário em que há o desenvolvimento integral.

Figura 7- Pracinha Oscar Freire em São Paulo

Fonte: Disponível em: <https://institutomobilidadeverde.wordpress.

com/pocket-park/>. Acesso: 26/09/2015

5 O conceito de Pocket Park foi criado por Thomas Hoving (1931-2009). Trata-se de pequenos parques inseridos

nos centros urbanos.

20

A carona solidária torna-se um meio para aproximar o cidadão de seus compromissos

sociais, visto que, através do ato de compartilhar o carro, cria-se maior convívio entre

moradores urbanos e menos estresse e insegurança (OLIVEIRA, 2013). Considera-se o trajeto

mais seguro pelo fato do motorista não estar sozinho, porém, a carona entre desconhecidos

pode gerar justamente o oposto, ou seja, a sensação de insegurança. Esta, aliada a questões

culturais, dificulta a aceitação da população brasileira à pratica do transporte compartilhado

em maior escala.

2.3. Projeto de Lei nº 8074/2014

Em 13/11/2014, foi aprovada pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara

dos Deputados o Projeto de Lei nº 8074/20146, que institui o “Sistema de Carona Legal” em

âmbito nacional, com a meta de incentivar e conscientizar a população quanto ao uso

compartilhado dos automóveis particulares, conforme sugerido pela Associação

Socioambiental Carona Legal.

O Projeto de Lei define a carona solidária como aquela realizada sem fins lucrativos,

tornando clara, caso seja aprovada pelo Plenário, a legalidade do transporte compartilhado em

veículos de pequeno porte ou de passeio, desde que não seja atribuída a esta prática um

caráter de negócio. Também, propõe a criação do SISCARLEG, Sistema de Carona Legal, a

ser controlado por meio da internet, onde seriam cadastrados todos os veículos, condutores e

passageiros usuários do programa. O site iria oferecer informações acerca dos destinos

contemplados pelo Sistema para os interessados e ao mesmo tempo prover a segurança dos

usuários. Segundo o Projeto de Lei, o SISCARLEG apoiaria eventos educativos, através de

palestras, seminários, encontros, congressos e campanhas publicitárias, para sua ampla

divulgação. A redação também cria o “Dia do Transporte Solidário” no dia 22 de setembro do

calendário comemorativo oficial do Governo Federal, mesma data do "Dia Mundial Sem

Carro", o que pode ser considerado contraditório, uma vez que o transporte solidário trata-se

da utilização do carro, mesmo que compartilhado.

Percebe-se que as transformações estão ocorrendo aos poucos e a pressão sob o poder

público de entidades de participação popular, como esta da Associação Socioambiental

6 O Projeto de Lei nº 8074/2014 encontra-se no Anexo I desta monografia.

21

Carona Legal, demonstra que é possível ter o retorno dos legisladores. No entanto, não

adiantará aprovar o Projeto de Lei se não houver, de fato, uma campanha educacional para

engajar os cidadãos, pois se considera que um dos obstáculos à implementação do programa é

uma resistência de ordem cultural. Como citado anteriormente, o carro possui um valor

simbólico de status e liberdade, qualidades valorizadas pela sociedade de consumo.

Tendo em vista o caráter individualista notado, principalmente, nos centros urbanos,

questiona-se: será que a sociedade irá participar efetivamente de um Sistema Nacional de

Carona? A população estará conscientizada a ponto de abster-se do conforto individual para

compartilhar seu veículo próprio com terceiros? O presente trabalho não tem a pretensão de

responder tais questionamentos, mas norteados por eles, irá apresentar e analisar

comparativamente alguns projetos de carona já implementados em cidades Brasileiras com a

finalidade de verificar, também, a adesão do público alvo a estes programas.

22

3. OBJETOS DE ESTUDO

Este capítulo tem como objetivo apresentar projetos de carona solidária desenvolvidos

e executados no Brasil. Atualmente, há diversos aplicativos e sistemas criados para combinar

caronas, porém foram selecionados apenas quatro projetos para o presente estudo: o Projeto

Carona Legal ESPM, de 2010; o MOB-Carona Solidária, de 2014; o site Caronetas, de 2013;

e o aplicativo Minha Carona, de 2014.

A seleção destes precedentes está relacionada com a acessibilidade à informação e

dados dos projetos, mas também com características intrínsecas de cada uma destas

iniciativas. Apesar de possuírem o mesmo fim, criar um sistema para combinar caronas, há

diferenças sutis nas propostas e nas motivações dos desenvolvedores. Desta forma, a

descrição de cada projeto foi realizada considerando seus objetivos, sua localização e

abrangência, a dinâmica e funcionamento do sistema, a forma de publicidade e educação, e

por último, a adesão do público alvo. Os projetos estão apresentados neste capítulo em uma

sequência lógica, na ordem de abrangência, de menor a maior escala.

3.1. Projeto Carona Legal ESPM

O Projeto Carona Legal foi desenvolvido pela Empresa Pública de Transporte e

Circulação (EPTC) em pareceria com a Escola Superior de Marketing de Porto Alegre

(ESPM-Sul) e lançado no dia 22 de setembro de 2010, Dia Mundial Sem Carro. A campanha

aconteceu nos cinco cursos de graduação da ESPM-Sul: Administração, Publicidade e

Propaganda, Design, Relações Internacionais e Jornalismo. Tratava-se de um projeto piloto no

qual o público alvo era os estudantes da ESPM de Porto Alegre. Caso houvesse adesão por

parte dos alunos e professores, a proposta seria ampliada e replicada para diversas instituições

de ensino e empresas.

Os principais objetivos deste projeto eram: estimular a conscientização ambiental, a

socialização e a melhoria do trânsito da cidade. Esperava-se conseguir reunir quatro alunos

que morassem próximos e utilizassem carro para ir à faculdade em apenas um veiculo. A

previsão, na época, era de que 1,5 mil alunos iriam participar do projeto Carona Legal.

Supondo que cada um destes estudantes representasse um carro, caso a meta fosse atingida,

seriam 1.125 veículos a menos no tráfego de Porto Alegre, já que seriam necessários apenas

23

de 375 veículos para transportar estes alunos. Na época, o diretor-presidente da EPTC,

Vanderlei Cappellari, comentou sobre o projeto: “A carona não só desafoga o trânsito, como

cria relações de amizade e ajuda o meio ambiente. Esperamos ampliar essa ideia para outras

entidades de ensino e empresas” 7.

O projeto contemplou a criação de um sistema na internet, direcionado à integração

dinâmica e instantânea entre seus usuários, e uma campanha publicitária voltada

principalmente para os alunos, buscando disseminar a conscientização necessária para que

aceitassem a ideia. Para definir os parâmetros do projeto, foram realizadas diversas reuniões

entre a EPTC, a área de Responsabilidade Socioambiental da EPSM-Sul, a empresa júnior

Comunicação e Design Jr. (co.de), as empresas de transporte público de Porto Alegre e a

Brigada Militar.

A empresa júnior co.de ficou encarregada de desenvolver o sistema de forma segura,

sem expor os caroneiros e motoristas. Para atingir esse objetivo, foi desenvolvido um site

integrado à página da universidade, em que o usuário se cadastra com o login e senha, já

existentes, utilizadas para acessar o ambiente do aluno no site da ESPM. Assim, as caronas só

poderiam ser combinadas entre pessoas que possuíssem matrícula na Escola Superior de

Propaganda e Marketing de Porto Alegre, o que, segundo os idealizadores do projeto

garantiria maior segurança para os estudantes. Além disso, os dados dos integrantes não

estariam disponíveis para os usuários do Carona Legal. Os alunos iriam selecionar se desejam

dar ou receber caronas, informando os dias da semana e seus horários de chegada e saída da

faculdade. O sistema iria compilar as informações e informar ao usuário as pessoas próximas,

seus nomes e respectivos e-mails, sem revelar seus endereços. Funcionaria da seguinte forma:

seriam indicados ao motorista locais públicos onde iriam apanhar o passageiro, e, para este

último, o sistema iria mostrar a rota e estes mesmos locais públicos onde deveria pegar a

carona. Os horários já estavam definidos pelas próprias informações que os usuários

preenchiam, mas era possível trocar e-mails para adiar ou adiantar a hora de encontro. As

caronas deveriam ser remarcadas semanalmente para a devida atualização de dados.

A campanha publicitária promoveu a reflexão sobre assunto, a fim de engajar os

alunos, pais e professores. O logotipo do projeto, uma mão em sinal de afirmação,

7 PORTOALEGRE. Ações educativas marcam o Dia Mundial Sem Carro. Disponível em:

<http://www2.portoalegre.rs.gov.br/portal_pmpa_cidade/default.php?p_noticia=132513>. Acesso em: 16 de

Maio. 2015.

24

representava o gesto de pedir carona, mas também tinha como mensagem subliminar a

aceitação deste aceno como um ato positivo (D’AMICO; SILVA, 2013, p.7). Foram

distribuídos cartazes que divulgavam o site de cadastro do projeto e adesivos. Havia também

os cartazes fixados nos murais da faculdade. Estes, explicavam o projeto e possuíam partes

que podiam ser destacadas para interagir com o público e convidá-lo para aderir ao projeto.

Para os pais, foram enviadas malas-diretas, peças publicitárias enviadas através de

correspondência, que continham informações sobre o programa, com a finalidade de

esclarecer às famílias a importância da ação e que esta oferece segurança aos alunos, para que

não houvesse receios quanto ao ato de oferecer ou pegar carona.

Figura 8 – Campanha publicitária do projeto.

Fonte: D’AMICO e SILVA (2013)

O projeto Carona Legal, que se prolongou por um ano na ESPM-Sul, não obteve a

adesão necessária para se criar uma rede de caronas que funcionasse efetivamente, pois

poucos alunos se cadastraram no site. Atualmente ainda é possível acessar o site, porém não

está disponível para o usuário realizar o login.

25

Figura 9 - Página de apresentação do projeto disponível na internet.

Fonte: Disponível em: < http://caronalegal.espm.br>. Acesso: 16/05/2015

3.2. Projeto MOB – Carona solidária (Brasília, DF)

A EcoCâmara, Comitê de Gestão Socioambiental criado em 2003 pela Câmara de

Deputados, desenvolveu programas para incentivar servidores e colaboradores desta Casa a

utilizarem alternativas de deslocamento que produzissem menos impacto à cidade e ao meio

ambiente. Para tanto, foram criados quatro os projetos na área de mobilidade urbana: o MOB-

Bicicletas, que consiste em oferecer a infraestrutura necessária ao ciclista; o MOB-

Economildo, frota de vans e ônibus com trajetos, horários e pontos de parada programados; o

MOB-Taxi Solidário, que incentiva a compartilhar taxis; e, por fim, o MOB-Carona Solidária.

O Projeto MOB-Carona Solidária tem como objetivo, além da redução de emissão de

gases poluentes, utilizar de forma mais eficiente as vagas para carros nas imediações da Casa

legislativa. A Câmara possui uma carência de 3.000 vagas, então diminuir a quantidade de

veículos que estacionam nos arredores torna-se imprescindível. O aplicativo foi desenvolvido

pelo Centro de Informática (Cenin), que é responsável pelas atividades normativas, de

planejamento e executivas pertinentes à Tecnologia da Informação e Comunicação. O

sistema, que funciona desde o dia 15/12/2014, é acessado pela intranet, rede de computadores

privada da instituição, sendo restrito aos servidores, secretários, terceirizados e cargos de

natureza especial. Estes podem pedir ou oferecer carona através do aplicativo. No entanto, são

26

indicadas para o usuário somente as pessoas que moram próximas a ele e que permitiram no

sistema que este entre em contato para combinar a carona.

Figura 10- Tela aplicativo ao buscar usuários próximos

Fonte: Disponível em: <http://globotv.globo.com/rede-globo/dftv-2a- edicao/v/camara-dos- deputados-estimula-

a-carona-solidaria-atraves de-aplicativo/3893449/>. Acessado: 02/06/2015

Para participar da ação, é necessário ter no mínimo três pessoas no carro, considerando

também o motorista. Os funcionários que aderem ao programa possuem a vantagem de

estacionar em vagas mais próximas da Câmara. A finalidade é estimular e atrair mais

servidores para o MOB-Carona Solidária. Além disso, é reforçada a ideia da economia através

deste modo de transporte, já que os gastos com combustível e peças para carro passam a

reduzir com a menor utilização do automóvel.

Figura 11- Vagas de prioridade para participantes do projeto

Fonte: Disponível em: <http://globotv.globo.com/rede-globo/dftv-2a-edicao/v/camara-dos- deputados-estimula-

a-carona-solidaria-atraves- de-aplicativo/3893449/>. Acessado: 02/06/2015

Em janeiro de 2015, havia 17 vagas exclusivas para os participantes do Carona

Solidária. O programa pretende, no futuro, aumentar o número de vagas para 250, totalizando

750 integrantes.

27

3.3. Site Caronetas

O site “Caronetas - Caronas Inteligentes” foi idealizado pelo engenheiro naval Marcio

Henrique Nigro e tem como principais objetivos a redução do trânsito na cidade e a

diminuição da emissão de gases de efeito estufa através do transporte solidário. O projeto tem

como desafio tonar a carona um hábito entre os brasileiros, ou seja, colaborar para uma

mudança cultural. Segundo a Equipe Caronetas8, para que essa transformação seja viável, o

projeto foca em três problemáticas: a segurança dos usuários, as possibilidades de trajetos e o

incentivo do contato.

No Caronetas é possível combinar caronas entre usuários de comunidades corporativas

ou em redes sociais. Para participar das comunidades corporativas é necessário cadastrar a

empresa na qual você trabalha. O cadastramento ocorre da seguinte forma: o interessado

preenche os dados da empresa no formulário do site e a equipe do Caronetas, após ser

contatada, envia um e-mail para o responsável da empresa. Este deverá aprovar os termos e

condições de uso para que seja liberado o link de cadastro dos colaboradores. A autenticação

dos funcionários acontece através de seus respectivos e-mails corporativos, com a finalidade

de garantir que o usuário trabalha, de fato, numa determina empresa.

Os usuários das comunidades corporativas podem escolher entre participar de um

grupo exclusivo da empresa em que trabalha, ou de grupos fechados para determinadas

empresas, ou ainda, estar disponível para combinar caronas com qualquer outro usuário das

redes corporativas. Para estimular e esclarecer dúvidas dos colaboradores, o Caronetas se

dispõe a realizar a divulgação interna, que pode ocorrer por meio de redes sociais, eventos, e-

mail, entre outros.

Já para participar das comunidades de redes sociais, basta selecionar a opção

"Cadastre-se com Facebook" na página principal e aceitar os termos apresentados. Depois de

realizado o cadastro, é possível acessar o sistema e combinar as caronas, porém a equipe

Caronetas alerta os motoristas e caroneiros a serem mais cautelosos nestas comunidades, pois

não há como garantir a procedência das informações contidas nos perfis dos usuários.

8 CARONETAS. Responsabilidade Sócio-ambiental. Disponível em:

<http://www.caronetas.com.br/responsabilidade-socio-ambiental >. Acesso em: 21 de JUNHO. 2015.

28

Figura 12 – Gráfico explicativo da dinâmica do Caronetas

Fonte: Disponível em: <http://www.caronetas.com.br/site-de-caronas/corporativo>.

Acesso: 21/06/2015

Em ambas as comunidades, corporativas e de redes sociais, o sistema funciona da

seguinte forma: o usuário faz um cadastro dos trajetos e dos horários, podendo estes ser de

rotina ou eventuais. A plataforma informa aos motoristas os usuários que são compatíveis

com o trajeto e hora cadastrados. Após verificar as possibilidades, quem irá oferecer a carona

envia um convite para o passageiro e este poderá aceitar ou recusar a oferta.

As caronas podem ser solidárias ou compartilhadas. Neste último caso, o valor será

acordado entre as partes e creditado na conta do motorista. Para tal, foi criada uma moeda

virtual chamada “Caronetas”, que tem como finalidade recompensar e incentivar os

condutores. Ao compartilhar o carro, o usuário acumula os valores das caronas e, após

arrecadar o valor necessário, pode realizar trocas por produtos ou serviços através de

parceiros como o Walmart e o Ingresso Fácil9.

O site apresenta uma política de segurança e privacidade, que fornece orientações aos

motoristas e passageiros de como se portar para que a experiência de ambos seja mais segura

e agradável. Atualmente, no ano de 2015, há mil e seiscentas empresas cadastradas. Entre

elas, encontram-se a Secretaria do Meio Ambiente, a Medley, a SEBRAE e o Banco do Brasil

& Mapfre Seguros.

9 Nota-se que, embora o projeto tenha implantado um sistema de "moeda" própria, este não atribui ao projeto um

caráter de negócio.

29

3.4. Minha Carona

O Projeto Minha Carona foi idealizado e desenvolvido pelo engenheiro eletrônico

graduado na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Guilherme Murad Pim. A

motivação para a criação deste projeto surgiu da experiência pessoal do engenheiro, que

enfrentava dificuldades para chegar e voltar da Cidade Universitária de transporte público. O

desenvolvedor observou que muitos estudantes, para gastar menos tempo de viagem,

utilizavam o carro próprio, e que, muitas vezes, estes carros eram tripulados por apenas uma

pessoa: o motorista.

Apesar de o conceito ter sido originado dentro de uma vivência no ambiente

universitário, o Minha Carona não é restrito a um único nicho. O sistema tem como finalidade

criar uma rede de caronas entre pessoas de qualquer bairro, cidade, estado e até mesmo país.

Os objetivos do projeto consistiam em: criar uma solução que ajudasse cidadãos a encontrar

uma alternativa de transporte e promover uma melhoria no trânsito das cidades com a

diminuição de carros de passeio. O site que divulgava o projeto foi lançado no mês de

novembro de 2013, já o aplicativo, foi concluído em março de 2014.

O engenheiro avaliou sistemas já existentes como o Zasnu, o Uber, a rede social

Carona.com.vc, entre outros, para verificar o que deveria ser feito de diferente das demais

plataformas para possuir uma maior funcionalidade. O resultado foi a criação de um sistema

integrado ao Google Maps e a rede social Facebook, que reúne amigos e amigos de amigos,

cadastrados no Facebook, com trajetos similares. É importante ressaltar que o aplicativo

Minha Carona não possui fins lucrativos, tratando-se, verdadeiramente, do conceito de

transporte solidário.

O aplicativo funciona da seguinte maneira: os usuários se cadastram com o login do

Facebook e informam no sistema o horário e destino desejado, sem restrições de localização e

hora. Os motoristas criam grupos para reunir passageiros e em contrapartida, os caroneiros

buscam grupos para seus horários e enviam solicitações para participar dos grupos desejados.

Os motoristas que encontram passageiros também podem enviar convites. Os usuários

recebem notificações quando as informações são importantes para combinar a carona, como

por exemplo, quando o sistema identifica que há alguém próximo oferecendo/pedindo carona

no mesmo horário.

30

O aplicativo possui filtros para a busca de motorista ou passageiro considerando o

grau de amizade na rede social. O usuário pode se restringir aos seus “amigos” do Facebook,

ou aumentar a abrangência de “amigos” para “amigos de amigos”. Também é possível

determinar a tolerância de tempo para combinar os horários e a tolerância de distância. O

usuário define um limite de distância, desta forma, o motorista e o caroneiro são combinados

apenas quando o passageiro estiver no trajeto previsto por quem irá oferecer a carona.

Figura 13 – Interface do aplicativo Minha Carona

Fonte: Disponível em: <http://minhacarona.com/>. Acesso: 12/03/2015

Atualmente, há 5.789 usuários cadastrados no aplicativo, porém, como é possível

observar na tabela 1, o número de ocorrências de caronas é baixo, especialmente ao

considerar que o aplicativo abrange uma escala mundial. Apesar de ainda estar disponível

para download, o projeto Minha Carona não teve continuidade após sua criação em 2014. O

31

desenvolvedor do aplicativo, ao ser questionado sobre os desafios encontrados, comentou: “A

grande dificuldade deste projeto foi a criação de um produto muito complexo, de difícil

manutenção e expansão”10

. Hoje, Guilherme Murad acredita na organização das caronas

através de horários e rotinas, ao invés de organizá-las através de ofertas e buscas pontuais. As

buscas e ofertas instantâneas não funcionam para uma base de usuários pequena, pois as

chances de compatibilidade são pouco expressivas.

Tabela 1 – Resultados do projeto Minha Carona até Junho de 2015.

Mês Login Usuários Ofertas Caronas Mensagens

2014 Maio 1235 256 74 8 54

Junho 2407 428 89 13 43

Julho 2014 300 49 3 7

Agosto 1563 280 34 1 4

Setembr

o

1587 225 48 - 3

Outubro 1395 227 24 1 3

Novem

bro

2246 243 27 - 3

Dezemb

ro

936 236 9 - -

2015 Janeiro 961 251 21 - 1

Fevereir

o

1632 382 37 - 1

Março 1717 444 53 - -

Abril 2666 690 89 - 3

Maio 1380 368 60 1 16

Junho 1041 261 40 - 6

Julho 775 233 39 - -

Fonte: Dados fornecidos pelo idealizador do Minha Carona.

A terceira coluna da tabela (login) representa a quantidade total de acessos ao sistema

por mês, mesmo que realizados diversas vezes por uma mesma pessoa. Já a quarta coluna

(usuários) apresenta a quantidade de usuários que acessaram o sistema durante o mês. Neste

10

PIM, Guilherme Murad. Entrevista Projeto Minha Carona. [junho. 2015]. Entrevistadora: Diane Bianchi.

Rio de Janeiro, 2015. A entrevista na íntegra encontra-se transcrita no Apêndice A desta monografia.

32

caso, o quantitativo é menor, se comparado com a quantidade de logins, pois não são

contabilizados acessos repetidos por um mesmo usuário. Na quinta coluna, há a quantidade de

ofertas no mês, ou seja, o número de motoristas oferendo caronas. Também está registrada na

tabela a quantidade de caronas que o aplicativo entende como realizadas, uma vez que os

usuários, após identificarem a oferta, entram em contato com o interessado. Na última coluna

(mensagens), estão as quantidades de mensagens trocadas em grupos de caronas. Vale

ressaltar que os números de caronas registrados nos dois primeiros meses foram maiores

devido aos testes realizados pelo programador, com a finalidade de verificar a funcionalidade

do sistema.

33

4. ANÁLISES E PROPOSTAS

Neste capítulo é realizada a análise comparativa dos projetos apresentados, com a

finalidade de verificar as semelhanças e diferenças entre cada programa. No entanto, cabe

ressaltar que o objetivo deste estudo não é julgar qual projeto possui maior êxito, e sim propor

uma discussão acadêmica. A comparação foi desenvolvida através da observação das

seguintes características dos projetos: o objetivo, local e abrangência, as medidas de

segurança, o meio de interação, campanhas educativas e adesão.

Em seguida são expostos e analisados os resultados de questionário disponibilizado

em página da Internet. A pesquisa foi promovida com o intuito de identificar o nível de

aceitação do transporte solidário na cidade do Rio de Janeiro, porém esta acabou sendo

restringida a uma determinada parcela da população devido à forma de divulgação: redes

sociais e endereços eletrônicos de grupos acadêmicos. Logo, é importante esclarecer que os

respondentes não constituem uma amostra representativa da população do Rio de Janeiro, mas

compõe um grupo significativo para que seja possível uma discussão dos resultados. De

acordo com Goldenberg (2004), na pesquisa qualitativa a preocupação do pesquisador não é

com a representatividade numérica do objeto pesquisado, mas com o aprofundamento de sua

compreensão. No presente trabalho, não se objetivou projetar resultados numéricos para a

população, ou para um determinado espaço da cidade. Propôs-se construir uma trajetória

analítica capaz de colaborar para a compreensão do tema proposto.

4.1. Análise comparativa: objetos de estudo

A motivação para a criação dos quatro projetos apresentados está associada ao cenário

atual da mobilidade nos centros urbanos, já retratado anteriormente. Nota-se que ao propor a

redução do número de carros em trânsito através do transporte solidário, todos estarão

contribuindo para a melhoria das cidades no âmbito socioeconômico e ambiental. Entretanto,

alguns projetos possuem objetivos específicos e demais características que os tornam singular.

A maioria dos programas tem como foco a conscientização ambiental e a redução dos

congestionamentos nos centros urbanos, porém o projeto idealizado na Escola Superior de

Propaganda e Marketing objetivava maior interação social entre os alunos a fim de garantir

mais segurança nos deslocamentos. Já o Projeto MOB, demonstra preocupação com o espaço

34

público próximo à Câmara, uma vez que tem como meta reduzir o número de carros que

estacionam diariamente nos arredores do edifício. Dessa forma, observa-se que estes dois

programas possuem interesses particulares relacionados a um determinado grupo e local.

A área de abrangência do projeto da Escola Superior de Propaganda e Marketing de

Porto Alegre é limitada através dos trajetos realizados pelos alunos para chegar e sair da

faculdade. Considera-se, então, a instituição de ensino um polo gerador das demandas por

caronas. Este é um sistema centralizador, em que os fluxos irão convergir ou divergir para o

mesmo ponto nodal: a instituição de ensino. O Projeto MOB-Carona Solidária (Brasília, DF)

possui esta mesma configuração. Para determinar qual destes dois programas possui maior

alcance no espaço físico seria necessário realizar um estudo detalhado das características

destas cidades e instituições, como, por exemplo, verificar a quantidade e o perfil de alunos e

funcionários.

Figura 14 – Localização ESPM e Câmara dos Deputados

Fonte: Elaboração própria com base no Google Maps

O projeto da equipe Caronetas possui diferentes níveis de abrangência: os grupos

exclusivos, os grupos integrados e a grupos de redes sociais. Nas comunidades corporativas,

se o usuário participa somente do grupo exclusivo da empresa onde trabalha a configuração

também será centralizadora, similar ao projeto da ESPM e ao projeto da Câmara. No entanto,

o sistema não funciona apenas para uma determinada entidade. Neste podem ser cadastradas

firmas em qualquer região do Brasil, logo o alcance do projeto Caronetas é potencialmente

maior do que a dos dois primeiros projetos apresentados.

35

Há também, no Caronetas, a possibilidade de criar grupos integrados em que

funcionários de diferentes firmas podem combinar carona entre si, caso o trajeto seja

compatível. Assim, cria-se uma descentralização, uma vez que as demandas não serão

concentradas em uma única entidade. Nesse caso, percebe-se que o número de possibilidades

e conexões entre pessoas aumenta. Então, a abrangência da rede de carona solidária para o

integrante destes grupos torna-se maior se comparado com os grupos exclusivos.

A partir dos dados disponibilizados no site do projeto, é possível simular através dos

diagramas abaixo a conexão entre os grupos inicialmente exclusivos na cidade de São Paulo

evidenciando com isso o potencial de construção de rede policêntrica de carona solidaria mais

abrangente do ponto de vista territorial e de diversidade de usuários. Não são informados no

site todos os participantes, portanto, trata-se de uma abstração com fins analíticos.

Figura 15 – Simulação Caronetas em São Paulo

Fonte: Elaboração própria com base no Google Maps

Nos grupos de redes sociais do projeto Caronetas a abrangência também é nacional e

diferente dos dois primeiros grupos, o usuário se cadastra através de uma rede social sem a

restrição de estar vinculado a uma empresa, logo é possível combinar caronas de rotina, mas

também pontuais, como ir à praia ou ao shopping. Este grupo configura uma rede distribuída

no espaço, visto que o usuário pode se conectar com qualquer pessoa cadastrada em todos os

pontos da cidade. O projeto Minha Carona possui esta mesma conformação de redes

distribuídas, porém o universo é delimitado pelo grau de amizade no Facebook. Este

aplicativo tem, potencialmente, cobertura mundial, mas o público alvo são os brasileiros, já

que está disponível somente em língua portuguesa.

36

Em suma, é possível classificar três modelos distintos através da análise destes

projetos de carona solidária: o centralizador, que tem um único polo gerador de demandas; o

policêntrico, que tem diversos polos integrados; e o de redes distribuídas, que não há

centralidades pré-definidas e as possibilidades de destino podem ser infinitas.

Figura 16 – Esquemas comparativos dos fluxos

Fonte: Elaboração própria

Os que apresentam uma configuração centralizadora transmitem ao indivíduo maior

confiabilidade, pois este tem a certeza de que irá combinar a carona com alguém que partilha

de algo em comum: o trabalho ou a faculdade. No projeto Carona Legal o sistema foi

restringido aos alunos da faculdade através do login, só permitido para pessoas matriculadas

na Escola. Além desta medida, o site não fornecia dados dos usuários para terceiros e indicava

o ponto de encontro em locais públicos. Os sistemas da Câmara dos Deputados e dos grupos

exclusivos do Caronetas também possuem essa autenticação dos participantes. O primeiro

através da intranet da instituição e o segundo por meio do endereço eletrônico próprio da

empresa.

O modelo descentralizador dos grupos integrados do Caronetas é constituído por

funcionários de diversas empresas. Como há a confirmação da veracidade das informações

dos cadastros pela equipe Caronetas, os usuários têm a garantia de que seu companheiro de

viagem realmente trabalha naquele determinado local. No entanto, mesmo com esta medida

de segurança, o usuário pode se sentir menos confortável em utilizar esses grupos, por não

conhecer a pessoa com quem irá pegar ou oferecer carona.

37

Nos sistemas de redes distribuídas a sensação de insegurança pode tornar-se ainda

maior, por se tratar de um universo desconhecido, de forma que, a própria equipe do

Caronetas alerta para que os usuários sejam mais cautelosos nessas comunidades. O projeto

Minha Carona, buscando oferecer maior confiabilidade, limitou as conexões para que estas

ocorram somente entre amigos ou também com amigos de amigos no Facebook. As pessoas

podem configurar o filtro que será realizado pelo aplicativo.

Figura 17 - Comparativo: abrangência nas redes sociais

Fonte: Elaboração própria

Percebe-se que todos os programas demonstraram preocupação quanto à segurança

oferecida pelo sistema, cada um de sua maneira. Outra questão considerada pela maioria dos

projetos é a campanha educacional. O projeto da ESPM promoveu campanhas publicitárias

incluindo a criação de um logotipo do programa, distribuição de cartazes e correspondências

para os familiares. Na época, o tema “transporte solidário” foi presente no cotidiano dos

alunos para que houvesse a reflexão e conscientização.

Não há muitos dados sobre a forma que está ocorrendo a divulgação do projeto MOB

na Câmara dos Deputados, mas sabe-se que estão sendo oferecidas vagas mais próximas ao

edifício, e também, no site oficial da casa legislativa há diversas informações a respeito da

mobilização. O projeto Caronetas se dispõe a realizar a comunicação interna nas Empresas

cadastradas, por meio de eventos, redes sociais, e-mail, entre outros. O site possui orientações

aos motoristas e passageiros de como se portar na viagem, com o objetivo de educar os

participantes. Há, também, uma medida de compensação para aqueles que oferecem carona,

uma vez que estes acumulam moedas virtuais para trocar por presentes. Observa-se, então,

que ambos os projetos possuem um conceito de retribuição ao motorista, com a finalidade de

38

incentivar a participação dos cidadãos. O projeto Minha Carona não promoveu campanhas

educacionais. A divulgação limitou-se às redes sociais, ao envio de correspondências

eletrônicas e a página na web.

Não é possível afirmar neste trabalho se está havendo ou não adesão da população aos

projetos da equipe Caronetas e da Câmara dos Deputados, ainda em vigor, mas constata-se

que os projetos Carona Legal e Minha Carona não tiveram a aceitação necessária para seu

efetivo funcionamento.

A insegurança nos centros urbanos brasileiros é um dos fatores que contribui para a

rejeição da população à prática do transporte solidário, porém, o projeto da Escola Superior de

Propaganda e Marketing e o Minha Carona conscientes deste obstáculo criaram diversas

medidas de segurança a fim de garantir ao usuário a confiabilidade perante o sistema. Em

ambas as propostas as caronas seriam combinadas entre pessoas socialmente interconectadas.

Sendo assim, acredita-se que a insegurança em compartilhar o carro não foi um dos

principais motivos pelo qual estes dois programas não obtiveram êxito. Os valores e costumes

dos moradores urbanos também dificultam a implementação destes projetos. Segundo

KROEBER (apud LARAIA, 2009), “a cultura é um processo acumulativo, resultante de toda

a experiência histórica das gerações anteriores. Este processo limita ou estimula a ação

criativa do indivíduo”. Percebe-se que ao longo das últimas décadas tem-se construído valores

individualistas, através da mídia e do estimulo ao consumo, que coíbem atitudes em prol do

coletivo, como o caso do transporte solidário.

A Escola Superior de Propaganda e Marketing, tendo essa percepção, criou uma

campanha educacional buscando semear a ideia de que a carona é um gesto positivo. Apesar

da participação dos alunos na divulgação e discussão sobre o tema, na prática não houve o

retorno esperado. O Minha Carona foi desenvolvido de forma autônoma sem apoio ou

patrocínio, portanto, não possuiu uma campanha educacional consistente que, talvez, escolas,

universidades, empresas privadas e, principalmente, órgãos públicos teriam. Entretanto,

observa-se que mesmo havendo ação publicitária não é garantido o sucesso, pois para ocorrer

a adesão da sociedade é necessário realizar um projeto constante de educação. Uma mudança

de paradigma não será alcançada apenas com medidas pontuais, pois esses valores foram

construídos através de um processo acumulativo de anos das gerações anteriores.

39

Considera-se a retribuição ao motorista, por meio de vale presentes ou de vagas

exclusivas, um meio alternativo de estimular as pessoas a participarem da ação, tendo em

vista a dificuldade em se conseguir participantes somente pelo discurso socioambiental. O

primeiro, da equipe Caronetas, apresenta uma solução criativa de compensar o motorista sem

criar um mercado de caronas através de uma moeda virtual. Já a proposta da Câmara dos

Deputados de criar vagas mais próximas à entrada do edifício está intrinsicamente relacionada

com um dos objetivos principais do projeto: diminuir a carência de vagas da Casa Legislativa.

Como pode ser difícil encontrar vaga nas redondezas, compartilhar o carro torna-se uma

vantagem para não haver o estresse de procurar onde estacionar o veículo. O conceito da vaga

exclusiva tem potencial, pois reflete no espaço público e no cotidiano dos indivíduos.

Em relação à configuração adotada por cada projeto, acredita-se que um modelo de

redes distribuídas promoveria maior impacto na redução dos automóveis em uma cidade por

possibilitar, num cenário ideal, combinações ilimitadas, sendo mais flexível e abrangente.

Porém, para que ocorram essas conexões, necessita-se de uma grande base de usuários. No

caso dos grupos de redes sociais do Caronetas a insegurança gerada pelo desconhecido poderá

dificultar a ampliação da comunidade na rede. Assim, a probabilidade de compatibilidade

torna-se pequena, pois haverá poucas pessoas para as inúmeras possibilidades de destinos nos

centros urbanos. O aplicativo Minha Carona também se enquadra em uma situação similar, já

que foi limitado o número de ligações pelo o grau de amizade no Facebook. A implementação

de um sistema mais distribuído poderia ser pensada num estágio posterior, em que a sociedade

esteja mais conscientizada e bem resolvida em relação à prática do transporte solidário.

O modelo policêntrico dos grupos integrados de empresas, se comparado ao de redes

distribuídas, tem potencial para proporcionar maior adesão por existir uma relação mais

equilibrada entre o número de participantes e a quantidade de locais de destino, e ainda, maior

confiabilidade nos dados do sistema. Entretanto, pressupõe-se que a configuração

centralizadora, atualmente, seria a mais viável no âmbito social, já que a sensação de

segurança oferecida ao motorista e ao passageiro é maior e as rotinas cadastradas no sistema

possuem mais chances de serem compatíveis. Ao analisar esta configuração de forma

individual, percebe-se que a abrangência é menor, porém caso fossem adotados projetos de

carona solidária em diversas universidades, empresas privadas, órgãos públicos e escolas, a

redução de automóveis seria significativa nos centros urbanos.

40

4.2. Questionário eletrônico: resultados e análises na UFRJ

O questionário foi elaborado com a finalidade de verificar o grau de aceitação dos

moradores do Rio de Janeiro à prática do transporte solidário. Vale ressaltar que a presente

pesquisa não teve como objetivo projetar resultados numéricos para a população ou para a

cidade e sim promover uma discussão que contribua para o entendimento do assunto em

questão. O questionário, disponível no Apêndice B, é constituído por três partes. As perguntas

da primeira parte foram realizadas com base em questionários construídos por outros

pesquisadores. Já as demais partes, foram elaboradas pela própria autora. Trata-se de um

questionário fechado com alternativas previamente estabelecidas, porém ao final o

entrevistado tem a possibilidade de responder textualmente e de forma livre.

A primeira parte do questionário é composta por perguntas que têm como intuito

traçar o perfil do respondente, através da identificação do sexo, faixa etária, grau de

escolaridade e região onde reside. Após essa fase, iniciam-se as perguntas relacionadas ao

cotidiano dos entrevistados, objetivando-se verificar se estes utilizam o transporte solidário e

compreender os motivos principais daqueles que não têm como costume oferecer carona.

Depois, são criadas suposições para averiguar se estas pessoas participariam de sistemas de

carona em diferentes escalas: trabalho, universidade, bairro e cidade. A pesquisa finaliza

questionando ao cidadão se este acredita no potencial de adesão da população em uma política

de transporte solidário.

Primeiro, a divulgação do questionário eletrônico, criado no Google Forms, foi

realizada por meio de publicações em rede social (Facebook), sendo encaminhado para o

círculo de “amigos” da autora, para o grupo de alunos da Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e para o grupo de moradores do bairro

do Flamengo. Após verificar que não houve o retorno esperado pelo compartilhamento no

Facebook, o engenheiro eletrônico e idealizador do projeto Minha Carona colaborou com a

divulgação do questionário através do envio de correspondência eletrônica para o grupo que

reúne os estudantes dos cursos de engenharia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de

Janeiro). Então, os respondentes são “amigos” da autora no Facebook, participantes dos

grupos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e

dos moradores do bairro do Flamengo, mas, principalmente, alunos de engenharia da

41

Universidade Federal do Rio de Janeiro. Os dados foram obtidos no período de 15 de julho

até 13 de agosto de 2015, totalizando 270 entrevistados.

Figura 18 – Número de entrevistados por dias

Fonte: Gráfico obtido no sumário de respostas do Google Forms

O número de entrevistas cresceu substancialmente após a divulgação aos alunos da

escola politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Portanto, nota-se que a maior

parte dos integrantes desta amostra é constituída de jovens com ensino superior incompleto e

com até vinte e cinco anos. Observa-se também que não houve uma grande diferença entre a

quantidade de homens e mulheres entrevistados e as respostas foram de moradores de diversas

regiões da cidade, mas principalmente da zona sul e zona norte.

Figura 19 – Perfil dos entrevistados

Fonte: Elaboração própria

42

Verificou-se que 70,4% (setenta, vírgula quatro por cento) do total de respondentes

possuem carteira de habilitação. Para este grupo foram habilitadas perguntas adicionais com a

finalidade de descobrir a porcentagem de entrevistados que têm o hábito de oferecer carona a

seus colegas de trabalho ou faculdade. Dos 70,4% (setenta, vírgula quatro por cento) que

possuem carteira, 29% (vinte e nove por cento) utilizam carro para ir e voltar do trabalho,

como mostra o gráfico a seguir.

Figura 20 – Hábito de carona solidário no trabalho

Fonte: Elaboração própria

Observa-se que dos 29% (vinte e nove por cento) que utilizam o carro como meio de

deslocamento para o trabalho, somente 9% (nove por cento) nunca dão carona e 29% (vinte e

nove por cento) têm o hábito de compartilhar o carro com frequência. Dos entrevistados que

não têm o costume de dar carona, 57% (cinquenta e sete por cento) não compartilham o

automóvel próprio, pois nunca solicitaram carona a estas pessoas. Já 33% (trinta e três por

cento) consideram trabalhoso combinar carona.

Figura 21 - Principais motivos pelo qual não costumam dar carona (trabalho)

Fonte: Elaboração própria

43

Dos respondentes que possuem carteira de habilitação, 49% (quarenta e nove por

cento) utilizam carro para ir à faculdade, e deste valor, 47% (quarenta e sete por cento) dão

carona com frequência e somente 3% (três por cento) nunca oferecem carona. Percebe-se que

as opções de motivos pelo qual estes não costumam oferecer carona não contemplaram a

realidade destes estudantes, pois 60% (sessenta por cento) optaram por “outro” (motivo).

Figura 22 – Hábito carona solidária na faculdade

Fonte: Elaboração própria

Nas explicações escritas destes respondentes, foi verificada que a maior preocupação

em compartilhar o carro é a insegurança. De acordo com um dos entrevistados, “o grande

entrave para oferecer ou aceitar caronas é a questão da violência. Já peguei muita carona no

Fundão, porém só com conhecidos”. Além disso, alguns ficam receosos com a conduta que o

passageiro terá durante o trajeto, por desconhecer seus hábitos.

Figura 23 - Principais motivos pelo qual não costumam dar carona (trabalho)

Fonte: Elaboração própria

44

Os resultados desta segunda fase do questionário mostram que a maior parte dos

entrevistados que utilizam carro, tanto para ir à faculdade como para o trabalho, já deram

carona ou tem o costume de compartilhar o carro com seus colegas. Como uma grande

parcela dos entrevistados foram alunos da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro),

entende-se que a porcentagem de pessoas que utilizam o carro para ir à faculdade é alta, pois a

Cidade Universitária possui uma localização de difícil acesso através de transportes públicos,

uma vez que não há metrô nem transporte hidroviário e os serviços prestados pelas linhas de

ônibus não atendem bem as necessidades dos estudantes, professores e demais funcionários da

universidade. Pela mesma razão, o número de alunos que dão carona é maior, se comparado

com aqueles que não têm esse costume. Acredita-se que a dificuldade de sair e chegar da

faculdade, mas também a violência na cidade do Rio de Janeiro, cria entre colegas um maior

interesse em compartilhar o carro, pois o motorista não fica sozinho durante o trajeto e os

passageiros terão mais conforto.

A todos os entrevistados foi questionado se estes utilizam algum serviço de carona

solidária seja por sites na internet, redes sociais ou aplicativos, e 70% (setenta por cento)

responderam que não utilizam nenhum sistema para combinar carona. Este é um número alto

se comparado à porcentagem de pessoas que têm o costume de dar carona. Logo, nota-se que

maior parte das caronas combinadas por esses motoristas não ocorrem por meio da internet,

mas através do contato no cotidiano dessas pessoas.

A última fase do questionário consistiu em verificar o potencial de sistemas de

transporte solidário em diferentes escalas. Foram criados quatro cenários: a empresa em que o

entrevistado trabalha adere à política de carona solidária; a universidade em que este mesmo

Figura 24 – Utilizam algum sistema de carona solidária

Fonte: Elaboração própria

45

estuda cria um sistema para que os alunos possam combinar carona; a associação de

moradores do bairro em que o respondente reside desenvolve também um sistema de carona;

e um amigo do entrevistado apresenta a este um aplicativo para facilitar o transporte solidário

na cidade. Após a construção de cada uma dessas suposições, foi perguntado aos entrevistados

se eles participariam dessas ações.

Na hipótese de haver um sistema na empresa em que trabalham, 71% (setenta e um

por cento) responderam que participariam do programa e combinariam carona com qualquer

funcionário. Já 22% (vinte e dois por cento) combinariam carona apenas com conhecidos do

trabalho e apenas 3% (três por cento) não iriam aderir ao projeto. Os resultados para a escala

da universidade também são positivos, porém a porcentagem de pessoas que compartilhariam

o carro apenas com alunos e professores que conhecem, aumenta. Como a maioria dos

estudantes que responderam este questionário são alunos da UFRJ (Universidade Federal do

Rio de Janeiro), entende-se que este dado está relacionado com a extensão do espaço físico e

quantidades de cursos e alunos presentes na Cidade Universitária. Talvez, em universidades

de menor porte, a quantidade de pessoas que combinariam carona com qualquer aluno ou

professor seria maior.

Figura 25 – Aceitação carona solidária em diversas escalas

Fonte: Elaboração própria

46

Na hipótese de criar um sistema para o bairro a porcentagem de aceitação diminui para

53% (cinquenta e três por cento) e na escala da cidade para 29% (vinte e nove por cento).

Nota-se que a proporção dos entrevistados adeptos à prática da carona diminui conforme a

abrangência aumenta, corroborando para a convicção apresentada na análise comparativa de

que sistemas centralizadores de carona possuem maior potencial de adesão.

Figura 26 – Abrangência x confiabilidade

Fonte: Elaboração própria

Por fim, os entrevistados responderam se acreditam no potencial de uma política de

transporte solidário. 76% (setenta e seis por cento) creem que sim e 16% (dezesseis por cento)

acreditam que não há potencial. Entre os que responderam positivamente, grande parte

informou que seria possível somente se o sistema fosse confiável.

Acredito que precisa haver alguma espécie de relação entre as pessoas que pegam a

carona. Eu administro um grupo de caronas entre a UFRJ e São Gonçalo. Há uma

sensação de segurança por parte dos membros do grupo pelo fato de só estarem

incluídos alunos da UFRJ ali. (Entrevistado)

No entanto, há aqueles que acreditam no sucesso da carona solidária em uma maior

escala. Segundo outro entrevistado, “com certeza haverá um grupo de pessoas interessadas

que não tem medo em pegar carona com pessoas estranhas. Tudo depende do cadastro (com

foto, pontuações...) para todos terem um pouco de confiança”.

Já os que retornaram com feedback negativo, escreveram que o maior obstáculo é a

insegurança, mas também o individualismo, como afirmado por um destes respondentes: “as

47

pessoas em geral são muito individualistas. Ainda tem os atrasos durante a rotina que

complicam a implementação”.

Nota-se que este grupo de entrevistados, no geral, se mostrou aberto a aceitação da

prática do transporte solidário, porém vale ressaltar que a maioria dos respondentes são jovens

de até 25 anos e a segunda maior parcela são de pessoas de 25 a 35 anos. Segundo a EPTC,

citado por D'AMICO et al (2013), “os jovens de até 30 anos e adultos com mais de 50 anos

são os mais receptivos para mudarem seus conceitos”. Logo, acredita-se que estes são

resultados otimistas e que se fossem realizadas entrevistas abrangendo toda a população do

Rio de Janeiro a porcentagem de aceitação de uma política de carona solidária seria menor.

4.3. Propostas

Através das reflexões realizadas, propõe-se a elaboração de um planejamento em

longo prazo de uma política de transporte solidário a ser desenvolvida em diversas etapas

(figura 28). Num primeiro estágio, considerando a dificuldade de adesão, iniciar com modelos

centralizadores. Poderiam ser criados sistemas individuais, porém com o mesmo

mecanismo11

, em universidades, órgãos públicos, empresas privadas e demais entidades. Caso

haja a aceitação, o próximo estágio seria conectar polos de uma mesma tipologia, como por

exemplo, constituir micro redes de grupos de universidades e de empresas, evoluindo para

uma configuração policêntrica. Posteriormente, a rede seria expandida através da conexão

entre estas micro redes, e assim por diante, até se chegar a uma configuração de redes

11

Os mecanismos, em relação à programação destes sistemas, devem ser compatíveis para que no futuro seja

possível integra-los com um esforço atingível.

Figura 27 – Acreditam no potencial do transporte solidário

Fonte: Elaboração própria

48

distribuídas. Estas redes seriam projetadas com a finalidade de possibilitar um crescimento

orgânico de acordo com o progresso da aceitabilidade da população a este sistema de

transporte solidário.

Figura 28 – Evolução das redes de carona solidária

Fonte: Elaboração própria

49

5. CONCLUSÃO

O uso excessivo de automóveis particulares contribui para o cenário de cidades com

altos índices de gases do efeito estufa, de poluição sonora, de acidentes de trânsito, de

congestionamentos, e centros urbanos com maior exclusão social e desqualificação do espaço

público. As condições em que são realizados os deslocamentos de bens e pessoas nos centros

urbanos não atendem as diretrizes estabelecidas por lei12

: acessibilidade, equidade no acesso

ao transporte coletivo, segurança e eficiência. Logo, percebe-se a necessidade de ações que

colaborem para o desenvolvimento de cidades mais justas através de intervenções

sustentáveis.

Com a finalidade de empenhar-se para a busca de uma mobilidade urbana mais

sustentável, entende-se que essas intervenções devem possuir como meta garantir a todos os

habitantes da área urbana o acesso aos serviços de transporte urbano de forma eficiente, mas,

simultaneamente, preservar o meio ambiente, ecossistemas e o patrimônio cultural. Para que

tais transformações sejam possíveis, acredita-se que será fundamental a mudança dos valores

atuais individuais na sociedade, como nas esferas públicas e privadas.

Nesse contexto, o transporte solidário surge como uma alternativa para diminuir o

número de veículos em trânsito, e assim, auxiliar as ações que visam uma mobilidade urbana

mais sustentável. Compreende-se a carona solidária como um meio para aproximar o cidadão

de seus compromissos sociais, visto que, através do ato de compartilhar o carro, cria-se maior

convívio entre moradores urbanos. Percebe-se o reconhecimento desta prática pelo poder

público, uma vez que houve a criação do Projeto de Lei nº 8074/2014 que propõe a criação do

SISCARLEG, Sistema de Carona Legal em âmbito nacional, a ser controlado por meio da

internet. No entanto, questionou-se no presente trabalho se um sistema deste porte teria a

adesão da população brasileira, levando em consideração os obstáculos de ordem cultural.

A partir da análise comparativa dos quatro projetos de transporte solidário dos objetos

de estudo apresentados, o Carona Legal, o MOB-Carona Solidária, o Caronetas e o Minha

Carona, foram classificadas três configurações de sistemas: o centralizador, que tem um único

polo gerador de demandas; o policêntrico, que tem diversos polos integrados; e o de redes

12

Lei Federal, de três de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana.

50

distribuídas, onde não há centralidades pré-definidas e as possibilidades de destino podem ser

infinitas.

A análise desses precedentes aliada aos resultados do questionário eletrônico, levam a

crer que a implementação de um sistema de redes distribuídas não teria adesão necessária para

o funcionamento efetivo da rede de caronas. Atualmente, pressupõe-se que a configuração

centralizadora seria a mais viável no âmbito social, já que a sensação de segurança oferecida

ao motorista e ao passageiro é maior e as rotinas cadastradas no sistema possuem mais

chances de serem compatíveis. No entanto, a criação de um sistema seguro parece não

garantir o êxito do programa devido aos valores e costumes da sociedade. Sendo assim,

considera-se fundamental realizar um projeto constante de educação e pensar em meios

alternativos de estimular os motoristas a participarem destas ações, como a criação de vagas

preferenciais para àqueles que participam do programa, como feito da Câmara dos Deputados.

Também se torna importante para o reconhecimento desta prática a criação de uma Lei que

regulamente a carona solidária, como sugerido pelo Projeto de Lei nº 8074/2014, para não

haver dúvidas quanto à legalidade deste meio de transporte.

Dessa forma, acredita-se que uma política de longo prazo a ser desenvolvida em

diversas etapas, do modelo centralizador à configuração de redes distribuídas, seria mais

efetiva, pois iria promover uma campanha educativa continua e permitir um crescimento

orgânico das redes colaborativas de acordo com o progresso da aceitabilidade da população à

prática do transporte solidário.

Considera-se, apesar da proposta apresentada, que a discussão não se encerra por aqui

e torna-se impossível esgotar o presente tema nesta monografia. À vista disso, a discussão

realizada surge como uma contribuição ao aprofundamento do estudo de sistemas de

transportes solidários, a partir de uma abordagem que busca incentivar uma mudança de

paradigmas e a priorização do coletivo em detrimento do individual.

51

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ANEXO I- Projeto de Lei Nº 8074/2014

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APÊNDICE A - Entrevista Projeto Minha Carona

1- Qual foi a motivação para a criação de um site/aplicativo de transporte solidário?

A maior motivação para a criação do aplicativo foi tentar fazer um sistema que se destacasse

tecnicamente e que ajudasse as pessoas a combinar caronas com amigos de uma maneira mais

fácil e automática.

2- Quais foram as dificuldades encontradas para a implementação do projeto?

A grande dificuldade deste projeto foi criação de um produto muito complexo, de difícil

manutenção e expansão.

3- Como foi realizada a divulgação do aplicativo?

Toda a divulgação do aplicativo foi feita online, através de e-mails, de grupos do Facebook,

da nossa página no Facebook e da nossa página na web.

4- O que poderia ter sido feito de diferente no projeto para uma maior adesão?

Acredito fortemente na organização das caronas através de horários e rotinas, ao invés de

organizá-las através de ofertas e buscas pontuais. As buscas e ofertas instantâneas não

funcionam para uma base de usuários pequena, pois as chances de compatibilidade são pouco

expressivas. Quando os usuários precisam entrar apenas uma vez para cadastrar todas suas

demandas referentes a um longo período de tempo, é mais fácil encontrar combinações. Além

disso, a sociedade já se organiza através de horários e agendas semanais e já está acostumada

a pensar dessa forma. Outra mudança que ajudaria bastante na adesão ao projeto seria o foco

em comunidades específicas de usuários, como em faculdades e condomínios. Isso representa

uma zona de conforto e confiabilidade para as pessoas.

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APÊNDICE B – Questionário Eletrônico UFRJ

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