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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA MESTRADO EM PRODUÇÃO AMBIENTE E SAÚDE Autora MARIA DA CONCEIÇÃO LOPES BUARQUE Orientador Responsável Professora MARISA PALÁCIOS Significados e Impactos da Autonomia do Paciente: O olhar dos médicos residentes . Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA MESTRADO EM PRODUÇÃO AMBIENTE E SAÚDE Autora MARIA DA CONCEIÇÃO LOPES BUARQUE Orientador Responsável Professora MARISA PALÁCIOS

Significados e Impactos da Autonomia do Paciente: O olhar dos médicos residentes .

Rio de Janeiro 2007

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MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA

BUARQUE,Maria da Conceição Lopes. Significados e Impactos da Autonomia do Paciente: O olhar dos médicos residentes .

Maria da Conceição Lopes Buarque – Rio de Janeiro, 2007. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto de Estudos em Saúde Coletiva – IESC 2007 Orientadora: Profª. Drª Marisa Palácios

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MARIA DA CONCEIÇÃO LOPES BUARQUE

Significados e Impactos da Autonomia do Paciente:

O olhar dos médicos residentes .

Dissertação apresentada ao Programa de Pós

Graduação da Faculdade de Medicina da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, para a

obtenção do grau de Mestre de Saúde Coletiva. Área

de concentração: Produção, Ambiente e Saúde -

PAS.

Orientadora: Profª. Drª. Marisa Palácios

Rio de Janeiro – RJ

2007

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FOLHA DE APROVAÇÃO

MARIA DA CONCEIÇÃO LOPES BUARQUE

Significados e Impactos da Autonomia do Paciente: O olhar dos médicos residentes .

RIO DE JANEIRO, 11 DE JULHO DE 2007.

___________________________________________

Profª. Drª. Marisa Palácios – Instituto de Estudos de Saúde Coletiva (IESC) - UFRJ

__________________________________________________

Prof. Drª Lucia Abelha – Instituto de Estudos de Saúde Coletiva (IESC) - UFRJ

__________________________________________________

Prof. Dr. Sérgio Rego – Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP- FIOCRUZ).

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DEDICATÓRIA

À minha mãe pelo exemplo e fonte de

minha inspiração ....

Aos pacientes que através da convivência

permitiram-me emergir em

reflexões e indagações ...

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“O ser humano é parte do todo que

chamamos Universo; parte limitada no

tempo e no espaço. Nossa tarefa é de

alargar o círculo de nossa simpatia a

fim de incluir todas as criaturas vivas e

a natureza inteira em toda sua beleza”.

A. Einstein

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SUMÁRIO

Agradecimentos ------------------------------------------------------------- 8

Resumo ------------------------------------------------------------------------ 10

Abstract ------------------------------------------------------------------------ 11

Capítulo I Introdução --------------------------------------------------------------------- 12

Capítulo II Autonomia --------------------------------------------------------------------- 15

Capítulo III Bioética Clínica -------------------------------------------------------------- 20

Capítulo IV Objetivos -----------------------------------------------------------------------

26

Capítulo V Método -------------------------------------------------------------------------

27

Capítulo VI Resultados -------------------------------------------------------------------.

34

Capítulo VII Conclusão --------------------------------------------------------------------- 70

Capítulo VIII Referências Bibliográficas ------------------------------------------------- 73

Anexos ------------------------------------------------------------------------------------- 78

Termo de Consentimento ---------------------------------------------------------------------- 79

Questionário ------------------------------------------------------------------------------------- 81

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela oportunidade e perseverança...

À minha família, em especial a meu marido Josélio Buarque, por seu

companheirismo e cumplicidade.

Às minhas filhas, Bárbara pelo apoio e questionamentos constantes e Beatriz

pela compreensão e por ter partilhado através de leituras a construção do trabalho

junto ao meu neto Álvaro.

Às amigas Eliana Gesteira, Márcia Trotta, Claudia Fonseca e Daniel Costa

pelo incentivo a começar este desafio acompanhando todas as fases e acolhendo-

me nos momentos de angústia.

Aos amigos que trabalham comigo no Hospital Universitário e em especial a

Sheila Queiroz que através de sua amizade e dedicação acompanha meus passos,

incluindo avanços e recuos...

À Luciene Lacerda que como mais nova integrante do grupo demonstrou

apoio fundamental para minha dedicação em certa etapa do trabalho.

Aos professores e profissionais de saúde que colaboraram com a pesquisa,

disponibilizando tempo e interesse.

Aos médicos residentes que participaram da pesquisa e permitiram com isso

a realização do estudo.

Aos amigos do mestrado e especialmente Rachel Vitalino que através de

seus contatos diários não permitiram que eu desistisse.

À professora e amiga Marisa Palácios pela incansável atitude de mestra

conduzindo-me a profundas reflexões e a buscar o melhor de mim.

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Aos professores Tura e Sérgio Rego que com suas provocações incendiaram

minha mente fazendo com que eu compreendesse meu foco.

Aos funcionários e amigos do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva que de

modo ampliado colaboraram com minha trajetória.

A tantos outros que não foram citados, mas que com certeza fizeram

diferença em meu caminho, deixo a mensagem de Tao-Tse que “O agradecimento é

a memória do coração”.

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RESUMO BUARQUE, Maria. Significados e Impactos da Autonomia do Paciente:O olhar dos médicos residentes .Rio de Janeiro,2007. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) Instituto de Estudos de Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro. A pesquisa centrou-se na percepção dos médicos residentes (R1,R2,R3) de cirurgia geral e clínica médica acerca da autonomia dos pacientes. Qual o entendimento, como este influi em sua atividade laboral voltada para o relacionamento com o usuário dos serviços de saúde? Quando se pensa em respeito à autonomia dos pacientes, pensa-se nas informações recebidas e na oportunidade de opção em diversos momentos do tratamento? Procurou-se discutir a relação entre os agentes do processo de trabalho e o paciente que necessita de cuidado, relacionando o processo de formação profissional, sobretudo destacando a relação de cooperação que se estabelece tanto no cuidado quanto na formação. A restrição da autonomia é entendida pelas autoras como um fenômeno complexo cuja compreensão por parte do profissional e do paciente, usuário dos serviços, demanda ainda muitos estudos. Utilizou-se a abordagem qualitativa, trabalhando com entrevistas estruturadas, combinando perguntas fechadas e abertas. Foram adotadas três tipos de técnicas: pesquisa bibliográfica, saturação e análise de conteúdo. Foram consultados sites de pesquisa como: Scielo, Portal Médico, Capes, Google, Conselho Regional de Medicina. Pautados na Resolução 196/96 a pesquisa foi registrada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa garantindo a eticidade do estudo. A pesquisa permitiu uma aproximação em relação à percepção dos mesmos sobre autonomia dos pacientes e do profissional, concebendo-a de modo geral como direito de escolha, foi observado desconhecimento em relação ao código de ética médica e destacaram o entendimento ambíguo em relação a participação da família. Entendem como relevante à introdução de disciplinas e temas que possibilitem uma formação de excelência para além da técnica.

Palavras – chave: Autonomia, Direitos do Paciente, Educação Médica, Bioética.

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ABSTRACT

BUARQUE, Maria. The Meanings and the Impacts of Patients’ Autonomy: from the medicine students’ point of view. Rio de Janeiro,2007. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) Instituto de Estudos de Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

The research centered itself on the perception of medicine students (R1, R2, R3) of General Surgery and Medical Clinic about patients’ autonomy. How do they understand this theme ? How does it influence the working ability related to the relationship with the user of health services? When we think about patients’ autonomy we are thinking about information received and about the opportunity of option in different moments of the treatment? We have tried to discuss the relationship between the working agents and the patients that needed care, talking about the process of professional development, over all emphasizing above all the cooperation that is established in their caring and formation. Autonomy’s restriction is understanded by the authors as a complex phenomenon which professional and patient’s understanding still demands lots of studies. We used qualitative research and we also worked with structured interviews, matching closed and opened questions. In adition to this, we used three types of techniques: bibliographic research, saturation and content’s analysis. We consulted research sites: as Scielo, Portal Médico, Capes, Google, Conselho Regional de Medicina. Ruled by resolution number 196/96 and registering our research in Ethic’s Committee in Research, so that it can be valueted expect to guarantee the ethical behavior in our research. The research let us to understand better the perception about patients’ autonomy and professionals as if patient’s autonomy was a right to choose . It was observed the lack of knowledge in relation to the medical ethics code as well as the ambiguous understanding in relation to family participation. It is relevant the introduction of ethics discussions in graduation, strenghthening the technical and human formation. Key words – Autonomy, Patient’s Rights, Medical Education, Bioethics .

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CAPÍTULO I

INTRODUÇÃO

Observando o cenário no campo da saúde deparamo-nos com uma questão

aflitiva: a restrição da liberdade de decidir sobre a própria saúde. Em outras

palavras, a restrição da autonomia dos indivíduos.

Entendemos esta restrição da autonomia como um fenômeno complexo cuja

compreensão por parte do profissional e do paciente, usuário dos serviços, demanda

ainda muitos estudos. Nossa contribuição para essa discussão será de entender

qual a percepção do médico residente sobre a autonomia do paciente, como

entendem a autonomia e como agem.

Nossa compreensão é de que o movimento de democratização nas relações

que interagem no campo da saúde, passa pela construção do saber cada vez mais

interdisciplinar, em um olhar mesclado, resultando em uma

...“compreensão da saúde, física, psíquica e

ambiental de indivíduos e coletividades, pensados como objetos complexos

e interdisciplinares” (1999:103). Onde ...”pensar o indivíduo como afetando-

se somática e psiquicamente, em uma auto-implicação que inclui,

necessariamente o social, assim como seus pensamentos, sua visão de

mundo, seu estar no mundo, sua compreensão.” (MARTINS.A 1999:106).

Considerar o indivíduo, durante o tratamento, como um ser autônomo

pressupõe respeito e uma aproximação entre os interessados neste processo - no

caso, o médico e o usuário dos serviços.

Nosso estudo centrou-se na percepção de médicos residentes de cirurgia

geral e clínica médica acerca da autonomia dos pacientes. Qual o entendimento,

como este influi em sua atividade laboral voltada para o relacionamento com o

usuário dos serviços de saúde? Quando se pensa em respeito à autonomia dos

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pacientes, estamos pensando nas informações recebidas e na oportunidade de

opção em diversos momentos do tratamento?

Procuramos discutir a relação entre os agentes do processo de trabalho e o

paciente que necessita de cuidado, relacionando o processo de formação

profissional, sobretudo destacando a relação de cooperação que se estabelece

tanto no cuidado quanto na formação.

Não raro observamos que algumas doenças são o ponto de partida para

intensas reflexões e mudanças de posturas. Não posso deixar de mencionar minha

atuação profissional como presidente da Comissão de Direitos do Paciente desde

2001, colaborando na discussão de direitos e cidadania no Hospital Universitário.

A atuação da Comissão foi pautada na sistematização da Cartilha de Direitos

do Paciente, um conjunto de direitos extraídos da Constituição Federal e de

Conselhos Regionais, na qual estão congregados 30 artigos, mencionando questões

como: direito a ter atendimento digno e respeitoso, direito a privacidade, respeito ao

credo, direito de identificar quem o está atendendo, direito a consentir ou recusar

procedimentos e outros.

Inspirados no conteúdo da Cartilha de Direitos e a partir do modelo de

atendimento que entendem ser o mais próximo de suas demandas, estes usuários,

agora, constroem projetos e discutem com as equipes, sobretudo médicas, a

importância da participação interdisciplinar em seus atendimentos. Levam para o

círculo acadêmico novas demandas de usuários desejosos de romper com modelos

e com o medo que cerca a relação entre usuário e profissional de saúde. Sob este

olhar, situo o tema de meu estudo, a questão da Autonomia, como cerne de um

dilema apresentado à Academia, especialmente em relação à formação de

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profissionais de saúde comprometidos com os princípios éticos especialmente o

respeito ao indivíduo.

Também faz parte da reflexão o entendimento sobre vulnerabilidade em que

ambos, em determinado momento, estão submetidos tendo em vista as condições

de trabalho precárias das instituições de saúde pública.

Em nossa visão, a qualidade do serviço prestado na área da saúde passa

também pelo respeito à autonomia do indivíduo, ora usuário, ora profissional e

sempre pessoa humana.

O trabalho está dividido em sete capítulos. Apresentamos a introdução ao

tema da pesquisa e no segundo capítulo apresentamos o marco teórico sobre

autonomia, as principais abordagens e desafios. No terceiro capítulo apresentamos

a discussão sobre Bioética, aspectos históricos e relevância social e contribuição ao

tema. No quarto capítulo introduzimos os objetivos do estudo. A seguir abordamos o

método de análise utilizado e no sexto capítulo apresentamos os resultados da

pesquisa e a discussão do conteúdo analisado. Por fim, concluímos com uma

análise do material pesquisado e as demandas do cotidiano de uma unidade de

saúde, seus conflitos e desafios.

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CAPÍTULO II

AUTONOMIA

Optou-se por iniciar a reflexão sobre autonomia, resgatando dois pensadores

de extrema relevância para o tema, Immanuel Kant (1724 – 1804), e John Stuart Mill

(1806 – 1873). O primeiro introduz a discussão sobre autonomia, apresentando

grandes sistematizações, acreditava na auto-determinação de todos os indivíduos,

este aspecto fortalecia a igualdade entre os cidadãos. O sustentáculo nesta visão,

para uma vida virtuosa, seria a boa vontade, ultrapassando todas as inclinações e

reconhecendo a máxima universal, desta forma irá desenvolver seu pensamento no

sentido em que o dever contém em si o conceito de boa vontade, tornando a

autonomia o eixo central da ética kantiana. A ética, para Kant é a razão aplicada à

ação, onde a moralidade não se confunde com a legalidade, entendendo que a

vontade é pura moral,quando regida por imperativos categóricos.

“Age de tal modo que o motivo que te levou a agir possa tornar-se lei universal” (KANT:178)

Kant trabalha com a ética do dever, da reverência às leis morais, é uma

atitude plenamente racional e direcionada para os valores ampliados na

humanidade. Abre espaço na formação moral e no aspecto educacional, para a

coerção, obediência, trabalhando com apresentação de regras claras e não havendo

espaço para flexibilidade nesse discurso. Entendia que apenas pela educação o

homem saíria do estado de selvageria, incluindo a disciplina e a instrução no

processo de educação. Kant possibilita aproximação com o conceito de autonomia e

propõe que o processo de educação contemple o exercício de atingir os objetivos

próprios, sem contudo deixar de observar o outro . Privilegia o aprender a pensar

para que as futuras escolhas sejam respaldadas em máximas do comportamento

humano e não com medo de punições. Aconselhava o desprezo como tipo de

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sanção eficaz no processo educacional, porém condenava a vergonha, a exposição

da criança a humilhação pública. Nesta visão, o princípio de socialização apresenta-

se com foco na relação adulto-criança. A formação do caráter é aspecto relevante

em seus trabalhos.

Outra corrente de pensamento, a utilitarista, apresenta a liderança de John

Stuart Mill, no qual o trabalho de referência é o ensaio On Liberty (1869), que

apresenta reflexões acerca da autonomia vinculada à produção de utilidade sob a

forma de bem-estar, trabalha com a concepção de autonomia enquanto liberdade

dos condicionamentos externos. Dá destaque à vontade, que refere que todos nós

preferimos ser autores de nossas vidas.

Mill (1974), apresenta uma série de questões que ainda hoje provocam

profundas indagações, ainda sem respostas, como: o exercício da autonomia do

desejo, da vontade e o limite que políticas, regras e legislações sobrepõem a

vontade individual. Neste aspecto, podemos inserir a discussão sobre eutanásia e o

desejo de não viver mais. O desejo de ter uma vida com dignidade e de ter uma

finitude/morte, também com a mesma dignidade. Indaga-nos sobre como regular o

desejo a vontade individual e o controle social?

Questiona a influência dos valores individuais acerca de decisões individuais

e julgamentos. Conduz-nos à reflexão acerca da influência da religião na vida do

homem. No sentido em que ao homem foi dado o livre arbítrio, porém se ele opta por

determinados padrões de conduta, por medo do pecado ou do inferno, como pode

ser livre? Como pode ter autonomia para escolher?

Outro aspecto interessante é a abordagem sobre o mal que podemos fazer a

outrem, por ação ou omissão. A questão é que uma regra não é absoluta e não é

boa ou má para todas as pessoas simplesmente por que as vivências são

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individuais. Não concebe autonomia com nenhum tipo de restrição, dá início a

idéias, onde o indivíduo deve ter a liberdade de expressar livremente o que pensa e

de realizar plenamente o que considera bom para si e este aspecto é o mérito de

seu ensaio, e que, ainda hoje nos instiga a este dilema entre o desejo individual e as

políticas institucionais.

Buscando as origens do emprego da palavra autonomia, observamos que é

muito antigo e remonta à Antiguidade grega, na perspectiva de autogoverno das

pólis – cidades-estado, surgidas por volta do século VII a.C. Avançando na história,

nota-se que a noção de autonomia também esteve fortemente marcada pelo

cristianismo primitivo, em que os homens teriam sido criados como almas individuais

e seriam a imagem e semelhança de Deus, possuindo portanto, o livre-arbítrio.

Realizando revisão bibliográfica tomando como palavra – chave Autonomia,

revela que muitas foram as contribuições ao longo da história, e o conceito de

autonomia pode ser contemplado desde a filosofia até as pesquisas direcionadas

para bioética, saúde ocupacional, violência urbana, violência e saúde, geriatria e

saúde mental. Discutido por profissionais de variados segmentos, como: Médicos,

Enfermeiros, Sociólogos, Educadores, Assistentes Sociais, Psicólogos, Advogados,

entre outros. A questão da autonomia perpassa eixos desde os direitos humanos até

as relações e processos de trabalho, como mais recentemente discutida, a

autonomia do profissional médico e de outras profissões na área da saúde.

MARCHI & SZTAJN, definiram recentemente autonomia, como:

“Palavra originária do grego autos e nomos, significa a atividade e o poder de dar de si um regramento, definindo os próprios interesses e relações. Desta forma, este poder é exercido com absoluta independência pelo indivíduo. As regras que as pessoas escolhem para disciplinar seus interesses nas relações recíprocas, ou seja, o auto- regramento, é que consiste no que se denomina autonomia privada”. ( 2005:01)

.

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As autoras destacam que a vontade e a capacidade não são suficientes para

o pleno exercício da autonomia. A informação é um pressuposto indispensável para

que as pessoas possam realizar suas escolhas.

A autonomia está prevista na Constituição Federal, onde está expresso no

artigo 5° que, o homem tem direito à vida, à integridade física, às próprias partes do

corpo, à liberdade e a ação. Continua,com os direitos de personalidade, aqueles

relacionados ao respeito e à preservação moral da pessoa humana: direito à honra,

ao nome, à imagem, ao sigilo, à liberdade de consciência e de culto. (BRASIL,1988).

Se observarmos o conceito de autonomia, nas ciências jurídicas, de um modo

geral, teremos que, é autônoma a pessoa maior de idade capaz de decidir

livremente sobre questões de sua vida e suportar as decorrências de suas decisões.

PEGORARO (2002) apresenta a discussão de autonomia e seus limites,

onde esta, em seu entendimento não é uma qualidade moral absoluta uma vez que

vivendo em sociedade com outros seres humanos convivemos com outros seres

igualmente autônomos. Daí, a percepção de que a autonomia, assim como a

liberdade, precisa ser compartilhada, negociada em um processo de diálogo e

esclarecimento partilhado.

De acordo com BEAUCHAMPS & CHILDRESS (2002), a autonomia pessoal

está relacionada a regras que a pessoa estabelece para si mesma, isenta de

interferências controladas por terceiros e de limitações pessoais. Uma pessoa

autônoma age de acordo com a análise da informação que possui e com a livre

auto-escolha. Para isso, precisamos reconhecer o indivíduo, como um sujeito moral,

com seus próprios julgamentos e a compreensão do que é certo ou errado,

respeitando-se as diferentes culturas.

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É possível pensar a autonomia em várias situações, porém, para um

determinado segmento, este conceito ainda permanece velado, como os portadores

de doença mental. Apesar de toda a luta, a doença mental também é acompanhada

da perda da liberdade exterior, do direito de ir e vir, de ter opinião, de ser ouvido, de

ser tratado com respeito e dignidade. O portador desta patologia e de outras torna-

se invisível, sua fala, seus desejos, pouco ou nada contarão para o desenvolvimento

de um plano que vise seu restabelecimento.

DURAND,aborda a questão da autonomia, sob prisma do

conhecimento, da informação recebida,

“Nunca é demais enfatizar que uma das primeiras menções conteporâneas ao direito do paciente à autonomia é de 1954, no livro do teólogo protestante americano Joseph Fletcher, intitulado Morals and Medicine. Assim, Fletcher foi o primeiro a colocar o paciente e seus direitos no centro da ética médica. Ele defende, além disso, o direito do paciente à informação no que diz respeito a seu diagnóstico e ao tratamento ao qual será submetido.”(1999:35).

Destaca -se a abordagem feita por Zaluar, no sentido de que a questão da

educação ainda está voltada para a repetição de padrões e com pouca visão de

educação como formação para o exercício da cidadania e o reforço a autonomia do

indivíduo, onde o indivíduo pode decidir de maneira voluntária e racional como viver.

Concluindo, considera-se relevante a reflexão em nosso sistema educacional,

onde desde o ensino fundamental até as universidades, seria importante iniciar a

reflexão acerca da Educação Moral, no sentido de despertar o pensamento crítico e

o fortalecimento da autonomia, único caminho para a transformação lenta e contínua

da relação do homem consigo mesmo e com o Universo, entendendo-se como parte

do mesmo, portanto, tendo suas ações reflexos sobre a humanidade.

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CAPÍTULO III

BIOÉTICA CLÍNICA

A discussão acerca da autonomia do paciente ganha destaque na área da

saúde a partir do crescimento da Bioética e da necessidade de regulamentação de

normas em pesquisas em seres humanos, indicando a necessidade da preocupação

ética em relação à atuação do pesquisador e do profissional.

Com característica interdisciplinar, retoma o olhar global acerca das questões

que envolvem o ser humano e o ser vivo, ampliando o conceito para a

responsabilidade com o planeta. Com olhar retrospectivo notaremos que a

sociedade sempre esteve atenta e interessada em discutir e refletir acerca de

questões que envolvem o sofrimento, a morte, a saúde e a doença.

Segundo DURAND (1999), em 1947, com o processo de Nuremberg, o

mundo teve ciência das atrocidades cometidas nos campos de concentração

alemães durante a Segunda Guerra Mundial, especialmente, por experiências que

os médicos nazistas faziam com seres humanos. O Código de Nuremberg tornou-se,

então, a primeira manifestação de cunho mais sistemático e normativo sobre ética

em pesquisa, estabelecendo regras a serem observadas em relação à

experimentação em pesquisas em seres humanos. Destacam-se entre as normas: a

necessidade do termo de consentimento dos envolvidos como pesquisados no

estudo, definindo que o mesmo deve ser dado livremente de caráter voluntário e em

plena condição de entendimento do propósito da pesquisa, da natureza, duração,

objetivos, métodos, riscos, efeitos e inconvenientes. Aborda ainda que os

experimentos, quando absolutamente essenciais, devem ser precedidos em animais

a fim de reduzir ao mínimo os incômodos possivelmente provocados por

determinados estudos. A proteção ao ser humano foi outro aspecto abordado em

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que o pesquisador deve proteger o envolvido na pesquisa humana em cuidados

especiais, suspendendo imediatamente o estudo sob suspeita de risco grave. Amplia

o olhar sobre as pesquisas para além do rigor científico e da intenção do

pesquisador e traz para o cenário questões como cientificidade e eticidade.

A declaração de Helsinque (1964) representa um marco na tarefa de

regulamentar, do ponto de vista ético, a atividade mundial no que diz respeito à

pesquisa biomédica. Em 1975, a declaração recebe uma emenda onde é

incorporada a obrigatoriedade de aprovação prévia de qualquer projeto de pesquisa

em seres humanos por um comitê de ética independente. Esta declaração vem abrir

espaço para a reflexão de que nada justifica a exposição do ser humano a situações

que possam configurar crueldade, degradação, sendo o indivíduo o eixo do processo

e não devendo prevalecer além de seus interesses os interesses da ciência e da

sociedade, a preocupação passa a ser também a moralidade dos atos.

Em 1978, temos o marco na visão principialista da bioética com a

sistematização do Relatório Belmont. Esse apresenta três princípios éticos básicos:

respeito pelas pessoas (autonomia), a beneficiência e a justiça. Por pessoa

autônoma o Relatório entende o indivíduo capaz de deliberar sobre seus objetivos

pessoais e agir sob a orientação desta deliberação. Discute também aspectos

relacionados a pessoas com autonomia reduzida e dá ênfase na proteção destas. A

abrangência deste relatório traz para reflexão a maximização dos benefícios,

deslocando do indivíduo para a sociedade e o princípio da justiça com a discussão

da eqüidade, permanecendo como debate atual sobre o que é eqüidade em saúde.

O crescimento da discussão e da produção científica nos últimos vinte anos

tem sido significante e desde a sedimentação no meio científico em 1979 com a

publicação do livro The Principles of Bioethics, por Beauchamps e Childress,

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marcando a corrente “principialista”, várias outras correntes de pensamento dentro

da Bioética desenvolveram-se como: feminismo, contratualismo, naturalismo e o

contextualismo - esse defende a proposta de que cada caso deva ser analisado de

modo individual respeitando-se as especificidades do contexto sócio-econômico e

cultural do indivíduo. Esta visão questiona inclusive o princípio da autonomia na

medida em que em determinadas culturas este princípio inexiste, como na cultura

oriental e em alguns povos indígenas.

Interessa relacionar o avanço que este aspecto trouxe para as reflexões

acadêmicas na medida em que uma das condições necessárias para a eticidade é o

respeito à autonomia dos sujeito - objetos da pesquisa - trazendo termos como

benefícios e ônus que sejam repartidos, trabalhando pela proteção de populações

vulneráveis. A eticidade da pesquisa, envolve:

a) consentimento livre e esclarecido ( exercício de autonomia)

b) ponderação entre riscos e benefícios

c) garantia de que danos previsíveis serão evitados (não maleficiência)

d) relevância social

No Brasil, as pesquisas envolvendo seres humanos foram regulamentadas

pela Resolução 196/96, através da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa –

CONEP, que tem a função de elaborar e rever normas, funcionar como instância

final de recursos, aprovar protocolos, acompanhar aspectos éticos que envolvam

pesquisas com seres humanos.

Analisando comparativamente a declaração de Helsinque em sua versão

2004 e a resolução 196/96, notamos que a primeira aborda princípios como:

proteção à vida, vulnerabilidade de populações específicas (pessoas que não

apresentam condições legais de dar o próprio consentimento para realização da

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pesquisa) e autonomia. Apresenta os temas de modo bastante objetivo norteando o

documento pela obrigação primeira do pesquisador em proteger a vida, saúde,

privacidade e dignidade do envolvido na pesquisa. Pelo nosso entendimento, a

declaração não discute a possibilidade de riscos e danos aos envolvidos em

pesquisas, ela explicita que a pesquisa não deve, sob nenhuma hipótese, colocar

em risco o pesquisado. Em contrapartida a resolução 196/96 aborda de modo claro

que a pesquisa deve ter a ponderação entre riscos e benefícios, comprometendo-se

com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos. É uma questão a

pensar, pois o que será o máximo de benefício para um grupo de pesquisadores e

para análise de um comitê?

A Resolução 196/96 é mais detalhada em sua apresentação. Apresenta

bases conceituais, definições e posteriormente analisa aspectos éticos da pesquisa

envolvendo seres humanos, dá ênfase a autonomia, apontando para a necessidade

de defesa da vulnerabilidade. Esta questão sobre vulnerabilidade é instigante, pois

percebemos a necessidade sistemática de formação e reflexão de membros dos

CEP’s dada a responsabilidade de aprovar ou não determinados protocolos de

pesquisa.

A Resolução possibilita uma análise subjetiva sobre o que será benefício para

a população estudada enquanto que a declaração de Helsinque é conclusiva nesta

abordagem. Em relação aos benefícios da pesquisa deixa claro que, após a

realização dessa, todos os envolvidos devem ter acesso aos benefícios trazidos pela

pesquisa, o que não é conclusivo na 196/96, pois o termo está em assegurar os

benefícios, possibiltando uma margem de opção entre a modalidade de retorno aos

participantes da pesquisa.

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A Resolução avança quando, além de trabalhar a questão da pesquisa,

apresenta aspectos relacionados aos Cep’s e às medidas de controle sob as

pesquisas realizadas.

O avanço na discussão dos temas que envolvem a bioética tem sido

crescente. Apresentamos algumas reflexões especificamente sobre autonomia

através de conteúdo que envolve dilemas do cotidiano em saúde a fim de contribuir

para a reflexão de um assunto que não se esgota dada a sua complexidade.

Abordando eqüidade, JOHN HARRIS (1999:400) apresenta outros modos de

reflexão sobre a diferença entre matar e deixar morrer, trazendo questionamentos

acerca da falta de acesso a tratamentos que possibilitem a uma pessoa prover seu

tratamento. Outro dilema apresentado por HELGA KUHSE (1999:494) diz respeito

também a matar e deixar morrer, abordando temas complexos e atuais como

eutanásia, autonomia, e dever profissional. SCHWARTZ (1992:519) aborda que a

autonomia do paciente tem limites relacionados aos valores e interesses dos

profissionais de saúde, isto é, aos valores éticos e morais preconizados pelo Código

de Ética Profissional.

Alguns autores comentam que é antiético limitar a autonomia a valores e a

códigos de ética, interpretando tal conduta como antidemocrática.

Outro tema muito interessante é apresentado no artigo O Valor da Vida,

JOHN HARRIS (1999:400), onde apresenta dilemas sobre o desejo de viver, tendo

como base o indicador idade, conduzindo a reflexão sobre decisões e escolhas de

profissionais de saúde por idade. Onde quem decidirá sobre quem terá acesso a

condições de tratamento, paciente de 35 ou de 70 anos? Traz à tona discussões

como: sonhos, anseios, planos e, acima de tudo, vontade de viver. Comenta que a

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análise de indicadores como: tipos de patologias, idades e outros, só levam em

conta dados estatísticos e não são computados os interesses individuais.

Inicia-se uma discussão moral do valor da vida humana: como pode uma vida

valer mais que outra? Como é possível escolher entre um segmento ou outro para

definir quem terá condições ao tratamento adequado? Quem terá condições de

continuar lutando pela vida?

Outra questão que merece atenção está relacionada à imprevisibilidade da

medicina: como definir que, pela expectativa ou por estudos e protocolos definidos,

um terá chance e outro não. Ao que concluímos com KOTTOW (2002:43) que

discute a construção da autonomia do paciente a partir das possibilidades de falhas

e altos graus de indeterminação e incertezas da medicina, tornando essencial o

rompimento com verdades absolutas.

.

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CAPÍTULO IV

OBJETIVOS II.I Objetivo Geral:

• Analisar a percepção de médicos residentes de clínica médica e cirurgia

geral, sobre os significados e impactos da autonomia dos pacientes no

contexto da assistência em um Hospital Universitário.

II.II Objetivos Específicos:

• Identificar e analisar o que pensam médicos residentes de Clínica Médica e

Cirurgia Geral sobre a autonomia dos pacientes e profissional;

• Discutir como a questão da autonomia dos pacientes influi na atividade

laboral de médicos residentes de Clínica Médica e Cirurgia Geral em termos

de esclarecimento e oportunidade de opção em diversos momentos do

tratamento ;

• Analisar as respostas de médicos residentes de Clínica Médica e Cirurgia

Geral acerca de situações do cotidiano da prática médica;

• Identificar a percepção de vulnerabilidade e a possível relação entre

vulnerabilidade e a população atendida;

• Investigar as oportunidades de reflexão sobre o tema durante a formação e o

exercício profissional.

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CAPÍTULO V

MÉTODO

A abordagem escolhida para o desenvolvimento do estudo é qualitativa,

considerando que de acordo com MINAYO,

““pprreeooccuuppaammoo--nnooss mmeennooss ccoomm aa ggeenneerraalliizzaaççããoo ee mmaaiiss ccoomm oo aapprrooffuunnddaammeennttoo ee aabbrraannggêênncciiaa ddaa ccoommpprreeeennssããoo sseejjaa ddee uumm ggrruuppoo ssoocciiaall,, ddee uummaa oorrggaanniizzaaççããoo,, ddee uummaa iinnssttiittuuiiççããoo,, ddee uummaa ppoollííttiiccaa oouu ddee uummaa rreepprreesseennttaaççããoo.. SSeeuu ccrriittéérriioo ppoorrttaannttoo nnããoo éé nnuumméérriiccoo.. PPooddeemmooss ccoonnssiiddeerraarr qquuee uummaa aammoossttrraa iiddeeaall éé aaqquueellaa ccaappaazz ddee rreefflleettiirr aa ttoottaalliiddaaddee nnaass ssuuaass mmúúllttiippllaass ddiimmeennssõõeess””((11999922::110022))..

A população alvo do estudo foi composta por médicos residentes do primeiro,

segundo e terceiro ano da clínica médica e cirurgia geral de um Hospital de ensino

na cidade do Rio de Janeiro inseridos no programa de residência médica em 2006.

Inicialmente foram colhidas informações sobre o processo de organização da

residência médica na instituição pesquisada.No processo de coleta de dados foram

contactados a coordenação da residência médica e os chefes dos serviços

envolvidos a fim de conhecer e aproximar da rotina do médico residente e de sua

inserção no hospital, visando construir a melhor abordagem para o estudo. Estes

contatos iniciais também tiveram o objetivo de socializar nosso estudo, na medida

em que ao apresentar a pesquisa provocava-se uma reflexão sobre o tema.

Considerando o conteúdo dos contatos com os coordenadores e chefes

concluiu-se que o sistema de trabalho do médico residente é normatizado através do

Conselho Nacional de Residência Médica, caracterizado por jornada de trabalho de

sessenta horas semanais, de treinamento em serviço com supervisão. O primeiro

ano de residência é básico, isto é, para todos os médicos residentes,

independentemente das escolhas em relação à carreira que pretendem especializar-

se passam pelos mesmos processos de trabalho. Dividem sua carga horária entre a

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assistência ao paciente na unidade de internação e, no período da tarde, em

atendimentos ambulatoriais. As sessões clínicas também são obrigatórias. Este

primeiro ano é marcadamente intenso em plantões, principalmente finais de semana,

e em um desgaste muito grande, sendo significativa à responsabilidade destes

jovens médicos.

No segundo ano da residência, o processo de trabalho é menos desgastante

em relação a quantidade e qualidade das atividades, uma vez que já são

direcionadas à especialidade. Ao findar do segundo ano, o médico residente recebe

o diploma que findou a residência e se desejar cursar o terceiro ano fará uma nova

prova pública onde ocorre o afunilamento do número de vagas disponíveis, o que

torna o processo ainda mais seletivo. Este terceiro ano, apresenta marcadamente

um viés acadêmico e apresenta-se como uma intenção para o mestrado. Neste

período, o médico residente tem seu processo de trabalho direcionado para o

processo de formação onde supervisiona os R1 e R2 e 10% de sua carga horária é

destinada às sessões dos serviços, “rounds” nas enfermarias.

Cabe destacar que a atividade de plantonista fica sob sua responsabilidade

também (R1,R2,R3), bem como o atendimento em urgências nas enfermarias de

atendimento extra-SUS, sem contar com nenhuma forma de remuneração

diferenciada por isto.

Cientes do número total de médicos residentes em Cirurgia Geral (16) e em

Clínica Médica (53), passamos a buscar estratégias de aproximarmo-nos, o que foi

muito difícil, não só pelo ritmo intenso e acelerado de trabalho dos médicos

residentes, como pelo período de início de nossa pesquisa marcado pelo período da

greve nacional dos médicos residentes, estando os mesmos, antes da efetivação da

paralisação em novembro, inteiramente mobilizados para a discussão do

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planejamento da greve. Deste modo, iniciamos as entrevistas em dezembro de

2006.

Trabalhou-se com entrevistas estruturadas, combinando perguntas fechadas

e abertas, seguindo roteiro onde as perguntas foram conduzidas como um convite

ao entrevistado, possibilitando ao mesmo discorrer livremente sobre o tema. Neste

aspecto foi possível observar que, ao responder às perguntas propostas, o médico

residente refletia sobre sua prática, sobre as ações do cotidiano, sobre o que seria

certo fazer e sobre o que faz no dia-a-dia, segundo sua percepção.

Segundo GASKELL (2002) a pesquisa com entrevista é um processo social,

uma interação onde as palavras são um meio de troca, uma relação de cooperação.

O processo de apresentação do estudo foi feito via e-mail uma vez que

conseguiu-se, através da Coordenação de Atividades Educacionais do Hospital

estudado, a lista com todos os e-mails dos médicos residentes. Esta estratégia foi

utilizada na medida em que houve muita dificuldade de localizá-los coletivamente e

até pensou-se em utilizar parte do tempo das sessões clínicas e cirúrgicas

realizadas semanalmente, porém, devido ao período de movimento e preparação

para a greve, esta opção foi descartada.

Fora utilizado o correio eletrônico, apresentando e esclarecendo o objetivo do

estudo, onde foi disponibilizado telefone celular para contato e aguardava-se a

adesão voluntária dos interessados. Dos e-mails enviados apenas houve resposta

de uma pessoa da Clínica Médica e duas da Cirurgia Geral. Obteve-se contato para

agendamento de entrevista e não foi bem sucedida. Uma pessoa disse não ter

disponibilidade se a pesquisa exigisse presença e com as demais não conseguiu-se

efetivar o contato no celular disponibilizado. A decisão final foi de abordá-los nas

enfermarias sendo essa estratégia bem sucedida.

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Pautados na Resolução 196/96 a pesquisa foi registrada para avaliação em

Comitê de Ética em Pesquisa buscando garantir uma avaliação independente acerca

da eticidade da pesquisa. O CEP aprovou a pesquisa e só então teve início o

trabalho de campo.

Houve especial atenção à elaboração e aplicação do termo de consentimento

livre e esclarecido (em anexo), respeitando, desta forma, a autonomia do médico-

residente em aceitar, ou não, participar do estudo, prestando-lhe as devidas

informações e garantindo o sigilo das mesmas. Evitar danos previsíveis – não

maleficiência, em nosso caso, foi representado pela garantia do sigilo, que, por sua

vez, garantiram a realização do estudo. Entende-se que o estudo poderá trazer

vantagens relevantes para a reflexão acerca do ensino, da relação de trabalho do

médico-residente e, principalmente, a percepção do mesmo em relação a autonomia

do paciente, constituindo sua relevância e o benefício para os sujeitos de pesquisa e

para o processo de formação como um todo.

Foram utilizadas três tipos de técnicas: pesquisa bibliográfica, saturação e

análise de conteúdo. A pesquisa bibliográfica teve por finalidade buscar uma

aproximação de abordagens e reflexões teóricas acerca da autonomia em saúde,

possibilitando um olhar mais ampliado sobre o tema. Foram consultados sites de

pesquisa como: Scielo, Portal Médico, Web of Science (periódicos Capes) e Google

acadêmico, Conselho Regional de Medicina. Realizamos o refinamento do material

encontrado. Cabe destacar que a produção brasileira sobre o tema ainda é pequena

e o tema autonomia é encontrado com maior freqüência em discussões mais

recentes sobre Ética em Pesquisa.

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Para chegar à totalidade da percepção dos médicos residentes em suas

múltiplas dimensões, fora adotada a técnica de saturação, onde o próprio

desenvolvimento da pesquisa indica o conteúdo adequado para a análise.

BAUER & AARTS (2002) apontam que a saturação é um critério de

finalização da pesquisa na medida em que a pesquisa qualitativa é um processo

cíclico que requer critérios para finalização, caso contrário a pesquisa não teria fim.

Desta forma, fora dedicada especial atenção para que o conteúdo colhido das

entrevistas com a população estudada pudesse aproximar da compreensão

detalhada em relação ao eixo do propósito da pesquisa, explorando o espectro de

opiniões e as diferentes percepções sobre o tema em questão.

A análise de conteúdo teve o objetivo de identificar através das falas a

percepção dos médicos residentes sobre a autonomia do paciente e extrair o

significado e impacto em sua visão, além de aprofundar a reflexão sobre as

semelhanças e diferenças no entendimento e no exercício profissional entre as

áreas estudadas, a saber: Clínica Médica e Cirurgia Geral.

Para realização da análise de conteúdo foram seguidas as seguintes fases:

pré-análise do material coletado e seleção das entrevistas nas quais fora adotado

uma análise mais profunda. Passou-se pela fase de transcrição das fitas das

entrevistas selecionadas, tendo o cuidado em observar as pausas e o registro de

expressões.

Optou-se por trabalhar com o número total de seis entrevistas, sendo três de

médicos residentes de Clínica Médica e três de Cirurgia Geral, selecionadas por

expressarem abordagens mais complexas e contribuições com exemplos do

cotidiano onde são expressos dilemas em relação ao respeito à autonomia,

primando pela transparência e fidedignidade dos dados. Encontrou-se justificativa

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em Bauer quando afirma “Uma amostra pequena selecionada, é muito melhor do que uma

grande amostra de materiais escolhidos ao acaso” (BAUER 2000:197).

Importante destacar que durante a análise não houve descuido do que era

raro ou ausente na fala, entendendo a contribuição que estes aspectos trazem para

o estudo. A análise de conteúdo permitiu verificar a racionalidade e a razoabilidade

dos argumentos utilizados na entrevista, categorizando-os e permitindo uma

aproximação mais profunda com sua fala e expressões.

Utilizou-se também o diário de campo, registrando todos os passos da

pesquisa, reações e ações.

Houve registro de alguns aspectos interessantes que foram observados no

decorrer da realização da pesquisa. O acolhimento ao pesquisador é um quesito

interessante a ser abordado. De início, seguiu-se o caminho já descrito

anteriormente, porém cabe destacar como reflexão inicial umcerto espanto que o

tema da pesquisa causava em nosso público alvo.

O interesse e disponibilidade dos médicos residentes da cirurgia geral em

participar do estudo deve ser registrada. Desde a primeira abordagem pessoal, eles

manifestaram interesse e, no decorrer das entrevistas, organizavam-se de modo que

ao terminar uma entrevista outro residente já estivesse disponível. Durante a

realização da entrevista, que teve duração média de trinta e cinco minutos, não

demonstraram ansiedade em relação ao tempo e manifestaram conduta de extremo

respeito ao pesquisador e ao tema. Em sua maioria citaram que as perguntas eram

difíceis e exigiam reflexão.

Em relação ao outro grupo foi muito difícil conseguir sensibilizar e ter

residentes voluntários a participar do estudo. Passamos por variadas situações:

agendamentos sem comparecimento, apresentar o tema e ser ignorada. Foi possível

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realizar um certo número de entrevistas, pois o posicionamento de alguns “staffs” de

enfermarias foram de “incentivar” seus residentes a participar, porém, com raras

exceções, esta entrevista não tinha pelo residente a calma necessária. Fato que

merece destaque foi que após a realização das primeiras entrevistas correu a notícia

de que tinha que se pensar para responder e não era “de marcar”, este fato

desestimulou-os a participar. No entanto, o desafio da realização da pesquisa e da

observação do que não era falado motivou-nos a persistir no estudo e consideramos

que, ao final, conseguimos atingir o objetivo almejado.

Em anexo, apresenta-se o roteiro utilizado. Para que fosse possível uma

aproximação sobre o que pensam os médicos residentes acerca do significado e

impactos da autonomia do paciente na sua prática profissional, além de perguntas

diretas - “como você define.”– foram apresentadas algumas situações específicas

relacionadas a autonomia do paciente, por exemplo, “o que e como você conversa

com o paciente?” em situações de cirurgia, prescrição médica, etc.

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CAPÍTULO VI

RESULTADOS

O somatório das entrevistas realizadas totalizou-se em 14 entrevistas, sendo 7

entrevistas com médicos residentes da Clínica Médica e 7 da Cirurgia Geral. No

universo pesquisado da Cirurgia Geral 5 profissionais eram do sexo masculino e 2

do sexo feminino. No universo pesquisado na Clínica Médica os entrevistados foram

4 profissionais do sexo masculino e 3 do sexo feminino.

Pautados na técnica de saturação considerou-se que o material colhido já era

representativo para análise,considerando-se que os médicos residentes em sua

maioria estudaram na mesma faculdade de medicina, tendo portanto o mesmo

conteúdo teórico.

Seguem abaixo os dados apurados na pesquisa extraídos através de análise de

conteúdo das seis entrevistas selecionadas, sendo selecionadas na medida em que

destacaram de modo abrangente aspectos que foram mencionados nas demais

entrevistas.

A entrevista tem início com pergunta aberta onde foram indagados sobre a

primeira palavra que vem à cabeça quando pensam em autonomia, a qual

responderam:

Liberdade (masculino, 28 anos e feminino, 26 anos);

A pessoa ter o poder de tomar decisões (masculino, 27

anos);

Direito de decidir o que é melhor para si (feminino, 25

anos);

Confiança (masculino, 27 anos)

Direito de Escolha (masculino, 28 anos);

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Após expressarem livremente o que pensavam sobre autonomia de modo

imediato, teceram comentários visando explicar suas respostas e a palavra

Liberdade surgiu como núcleo comum.

A seguir inicia-se com perguntas que estavam direcionadas a buscarmos uma

aproximação sobre o modo como os entrevistados definiam autonomia profissional,

autonomia do paciente e sobre a vivência de conflitos advindos do exercício da

autonomia pelo paciente.

Percepção sobre a autonomia profissional

“Liberdade de conduzir os casos, sendo respeitado pela

conduta escolhida” ( masculino, 27 anos);

“Conseguir realizar tudo que deseja com todos os meios

que necessita” (masculino, 28 anos);

“A gente tem autonomia quase plena em relação ao

paciente” (masculino, 27 anos);

“Seria a possibilidade de eu tomar as decisões

independente de ter um staff do meu lado me orientando”

(feminino, 26 anos);

“Ter autonomia de conduta, principalmente decisões”

(masculino, 28 anos);

“Capacidade do médico saber o que é melhor para seu

paciente” (feminino, 25 anos);

Algumas respostas indicam a supremacia do saber médico durante o processo

de tratamento esboçando a certeza da unilateralidade do plano de cuidado, por outro

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lado a vontade de poder tomar decisões isoladas do Staff nos chama atenção na

confusão estabelecida entre o processo de formação configurado no modelo de

residência médica.

REGO (2003) provoca reflexão acerca da formação do médico e de seus

dilemas incorporando na discussão a formação e o cuidado, sendo esta relação

caracterizada como múltipla, pois ao mesmo tempo o médico-residente está

interagindo com seus professores, com pacientes e profissionais de saúde.

Consideramos importante o questionamento sobre a autonomia quase plena em

relação ao paciente e, retomando a história, podemos pensar de que modo esta

construção contribui ainda hoje para as respostas dadas.

“Até a criação dos hospitais de ensino ou universitários em nosso país, o

ensino médico ocorria especialmente nas instituições de assistência médica

oferecida aos pobres. O pensamento dos médicos de então justificava a

utilização dos pobres atendidos nas instituições de caridade sob o argumento

de que por estarem oferecendo uma assistência supostamente de alta

qualidade, seria natural que aqueles fossem usados como objeto de estudo e

ensino. O que parecia ser um acordo era, de fato, uma decisão unilateral dos

profissionais, uma vez que estes se beneficiavam da vulnerabilidade extrema

desses pacientes (na maioria das vezes sem família e sem recursos

financeiros), sem que estes tivessem efetivamente a possibilidade de se

recusarem a participar.

Tal comportamento contribuiu para fortalecer o paternalismo e o autoritarismo

dos médicos em suas relações com os pacientes de hospitais de ensino.

Pode-se afirmar que, particularmente nos serviços públicos de saúde, parece

haver um entendimento tácito de que os pacientes possuem direitos

limitados.”( REGO,2003;34-35).

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Percepção sobre a autonomia do paciente

“Seria o direito de escolhas, às vezes pacientes com

doenças terminais, etc... Há momentos em que precisam

ser tomadas decisões que envolvem a vida do paciente e

sobre sua vida, ele é que precisa escolher. Concluindo,

acho que autonomia é você dar ao paciente o direito de

tomar certas decisões” (masculino, 28 anos).

“É a decisão do paciente sobre o que é melhor para ele.

direito de escolha” (feminino, 25 anos)

“A participação na escolha do melhor tratamento”

(masculino,27 anos);

“Ele poder viver sem a ajuda de terceiros” (masculino, 28

anos);

“Seria a liberdade do paciente de participar das decisões,

aceitando ou não os tipos de tratamento e intervenções”

(feminino,26 anos)

Destacamos um trecho de uma entrevista com o médico residente da cirurgia

geral em que expressa parte do pensamento da formação do profissional que

acredita saber o que é melhor para o paciente.

“Ele tem autonomia parcial, né. Tem certas coisas. Ele

tem que ter autonomia total nas escolhas dele, mas algumas

coisas a gente acaba é tentando mudar o ponto de vista do

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paciente, porque às vezes, ele acha que é melhor uma

determinada forma de tratamento e a gente tenta esclarecer

ao máximo. Mas se ao final ele não aceitar de tudo aquele tipo

de tratamento.... Eu falei autonomia parcial porque, como

residente, a gente tenta argumentar até o final, mas a gente

tem que respeitar o direito de escolha” (masculino,27 anos).

Em relação à autonomia do paciente, notamos que as respostas diferiram,

concentrando - se na percepção de que a autonomia do paciente está relacionada à

liberdade e participação em escolhas de tratamento e uma visão diferenciada se deu

ao relacionar autonomia do paciente com a independência de atividades da vida

diária.

SEGRE destaca que a idéia de autonomia é um conceito recente, apontando

essa como “o reconhecimento de o outro poder pensar e sentir à sua maneira”

(2002;37), delineado durante o período do Iluminismo. Neste sentido percebe-se que

as respostas dadas, em sua maioria, limitam-se à percepção de autonomia como

direito de escolha.

BEAUCHAMPS e CHILDRESS (2002) consideram que ter autonomia não é

sinônimo de ser respeitado como indivíduo autônomo. Uma vez que esse respeito

pressupõe o reconhecimento em suas escolhas e a diferenças. O respeito à

autonomia está também relacionado a capacidade de relacionar-se com o indivíduo

capacitando-o para o exercício da autonomia. Para esses autores um indivíduo

autônomo age de acordo com seu plano escolhido e a atitude de respeito prevalece

ampliando a atitude para além do respeito as escolhas, colaborando na redução de

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temores, gerando maior informação, enfim fortalecendo o indivíduo para que

livremente possa escolher seu caminho.

Perguntados se já haviam vivenciado alguma situação conflituosa relacionada

ao exercício da autonomia do paciente, as respostas concentraram-se na relação

feita entre a presença de conflitos com falta de acesso à informação; na intervenção

dos familiares e na redução de autonomia de pacientes terminais. Outro aspecto

abordado fora em relação à dependência de alguns pacientes ao exercício de

atividades da vida diária. É interessante notarmos as falas, seguindo a sequência

citada.

“Não que eu me lembre. Procuro esclarecer bastante o

paciente em meus atendimentos, daí não ter vivenciado

dificuldades e conflitos” ( feminino, 26 anos)

“Sim. Mas consegui mudar, é o que eu abordei na pergunta

anterior, o paciente às vezes opta por determinado

procedimento ou conduta por falta de esclarecimento e aí,

quando você conversa e esclarece bem ele muda”

( masculino, 27 anos).

Outra percepção está relacionada à redução da autonomia do paciente e à

intervenção dos familiares.

“Já. Relacionada à diversidade de informações de familiares e

ao repasse destas informações para os profissionais,

ocasionando conflitos, até mesmo refletindo em momento da

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alta. Os conflitos que vivenciei foram relacionados à

intervenção dos familiares” ( masculino, 27 anos).

“Já, em episódio de intervenção da família sobre a autonomia

do paciente. Neste caso, o paciente não tinha condições de

decidir. Tive também um caso de paciente terminal, fim de

vida. (...) Houve com a família uma conversa sobre o que seria

melhor para ele. A família tinha uma intenção de ter uma

conduta e nós achávamos que deveria ser diferente, sobre o

que o paciente queria para ele, porém como o paciente

encontrava-se inconsciente, não poderia opinar sobre o que

seria melhor para ele. De princípio, não houve acordo, depois

dia após dia, conversando com a família, principalmente a

familiar que era mais próxima do paciente, a gente acabou

chegando a um acordo e mantendo a conduta da equipe”

(feminino, 25 anos).

“A gente vive aqui diariamente estas situações, principalmente

quando você tem um paciente que não tem condições de

exercer sua própria autonomia. A autonomia, então, é passada

para a família e você acaba tendo que - digamos assim -

acreditar que aquilo que a família pensa é o que o doente

escolheria se tivesse condições, então isso é uma coisa que

na prática, às vezes deixa a gente em conflito, não só neste

sentido como em outro, como assim: às vezes a família com

doença pulmonar com prognóstico péssimo e que está

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evoluindo para dispnéia progressiva e você tem que tomar a

decisão de entubar ou não este doente, às vezes você tem a

impressão de que o doente não escolheria isso, mas a família

acaba por decidir pela entubação.” (masculino,28 anos)

As respostas acima apontam dilemas cotidianamente enfrentados pelos

médicos residentes. Partilhamos com REGO alguns questionamentos e incitam

alguns questionamentos como os realizados por Rego.

“Quais são os dilemas ou as situações em que estudantes são incitados a

tomarem uma decisão moral e que argumentação ampara sua decisão?

Como a faculdade de medicina (docentes, médicos assistentes, equipe de

saúde) se manifesta em relação ao ensino com pacientes? Quais os

cuidados e precauções são adotados para a preservação da integridade

física e moral dos pacientes e para a promoção de um ambiente no qual o

respeito ao paciente seja preponderante? (2003;70)

Um enfoque diferenciado foi relacionar a autonomia à capacidade de realizar

as atividades de vida diária.

“Coisas pequenas e pontuais diversas vezes, de pacientes

terminais com câncer. Alguns tipos de doenças acabam por

restringir a autonomia do paciente,exemplo: parar de trabalhar,

restringir atividades, hábitos” (masculino,28 anos)

O Código de Ética Médica

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O roteiro da entrevista conduziu-nos a perguntas relacionadas à discussão

sobre autonomia no Código de Ética Médica, buscando identificar o que conheciam

sobre este aspecto legal do exercício da profissão.

Este tema fora abordado através de três blocos de perguntas: se existia no

Código de Ética Médica algum artigo sobre a autonomia do paciente; se o Código

falava alguma coisa sobre autonomia profissional; e se sabiam a posição de seus

colegas em relação ao tema.

Notamos através das falas certo desconhecimento em relação ao conteúdo

do Código de Ética, gerando embaraço nos entrevistados quando no momento de

responder as perguntas referentes a este tema. Um certo incômodo e expressões

corporais como movimentos repetidos na cadeira, mãos no rosto e na cabeça,

fortaleciam a percepção do pesquisador de que esta questão causava incômodo no

entrevistado.

Vejamos as falas referentes ao primeiro bloco de perguntas.

O Código de Ética Médica e a autonomia do paciente Os entrevistados foram perguntados se o Código de Ética Médica tem algum

artigo sobre a autonomia do paciente, observemos as respostas.

“Não lembro” (masculino, 27 anos).

“Tem, mas não sei o número do artigo” (feminino, 25 anos)

“Nunca parei para ler o código de ética médica, mas com

certeza deve ter” (feminino,26 anos)

“É...Acho que sim. Fala alguma coisa sobre decisão final

ser do paciente” ( masculino, 27 anos)

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“Desconheço” ( masculino, 28 anos).

“Tem. É um dos princípios da ética médica, a autonomia

(masculino,28 anos).

O Código de ética Médica e a autonomia profissional

Neste segundo momento foram perguntados se o Código de Ética Médica fala

alguma coisa sobre autonomia profissional.

“Fala que você não pode exercer a medicina em

determinadas ocasiões, por exemplo quando você tem

algum relacionamento com o paciente” (masculino,28

anos).

“Não sei. Acredito que deva falar mas não

sei”(masculino,27 anos).

“Não sei.” (feminino, 25 anos).

“Não sei” ( feminino,26 anos).

“Sim. Fala que o médico tem que respeitar a conduta do

outro. Não alterar prescrições sem discussão prévia, por

exemplo” (masculino,27 anos).

“Também mesma coisa. Prática de decisões, a gente

discutiu em perguntas anteriores”(masculino,28 anos).

Perguntados sobre a posição dos colegas sobre a autonomia dos pacientes,

responderam:

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“Pouco destoantes. Basicamente entre nós aqui, na mesma

Universidade, temos o mesmo direcionamento, mas coisas

pontuais alteram de colegas para colegas” (masculino, 28

anos);

“Não” ( masculino, 27 anos);

“Acho que a maioria pensa desta forma, liberdade de

decisão” ( feminino, 26 anos);

“Pelo menos os colegas que eu tenho contato tem a

mesma visão. É um princípio ético, o direito de escolha”

(feminino, 25 anos);

Todos pensam assim. A minoria pensa que deve abordar

mais a família” (masculino, 27 anos);

“A maioria das pessoas pensam da mesma forma, mas

nem todo mundo vive estes mesmos conflitos que eu estou

falando” ( masculino, 28 anos)

Para COHEN (2002) o tema ética é complexo na medida em que a ética é

construída ao longo de nosso desenvolvimento. Para este autor nós não nascemos

éticos, tornamos-nos éticos ou não, conforme explica:

“Nos tornamos éticos ou não, com a possibilidade do nosso desenvolvimento

psicossocial. Dito de outra maneira, é a construção do nosso

desenvolvimento humano que tem no seu interior a possibilidade de virmos a

ser éticos.

Já a moral nos antecede enquanto indivíduos, ela é uma opção da

sociedade, que é imposta ao indivíduo. A moral nos ensina que devemos

aceitar as funções sociais, com suas regras e suas instituições, sendo que

esses princípios deverão ser introjetados pelo indivíduo. Para proteger-se, a

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sociedade cria algumas instituições com a finalidade de cuidar das pessoas

que a ela não se adaptem, restringindo-lhe a liberdade.

O indivíduo ético é aquele que tem a percepção dos possíveis conflitos que

emergem, entre os sentimentos que afloram e os valores sociais

apreendidos, e que serão julgados pela nossa consciência. Ser ético é poder

percorrer o caminho entre a emoção e a razão, permitindo-nos que nos

posicionemos na parte desse percurso que consideremos mais adequada, e

que nem sempre será mais confortável. Esse trabalho intelectual tem como

finalidade a procura de uma condição integrada e própria, que nos transforma

em pessoas livres e competentes, portanto com autonomia. Como

contrapartida, adquirimos a responsabilidade social, isso quer dizer que nos

transformamos em socialmente responsáveis pelos nossos atos” (2002: 56)

Segundo REGO (2003), no passado era comum os médicos considerarem que

se fossem bons técnicos seriam éticos em sua prática. Ser ético para o médico era

algo inato. Rego questiona o que mudou?

O código de Ética Médica promulgado através da Resolução do Conselho

Federal de Medicina nº 1.246/88 destaca alguns aspectos relacionados às perguntas

feitas aos entrevistados.

Em relação à autonomia do médico:

“O médico deve exercer a profissão com ampla

autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços

profissionais a quem ele não deseje, salvo na ausência de

outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa

possa trazer danos irreversíveis ao paciente”

(CFM1988;Capítulo I ;artigo 7)).

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Em relação à autonomia do paciente no Capítulo IV – Direitos Humanos, é

vedado ao médico:

Artigo 46- “Efetuar qualquer procedimento médico sem o

esclarecimento e consentimento prévios do paciente ou de seu

responsável legal, salvo iminente perigo de vida”(CFM 1988)

Artigo 48 – “Exercer sua autoridade de maneira a limitar o

direito do paciente de decidir livremente sobre sua pessoa ou

seu bem-estar”(CFM 1988)

No Capítulo V – relação com Pacientes e Familiares, é vedado ao médico:

Artigo 56- “Desrespeitar o direito do paciente de decidir

livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou

terapêuticas, salvo em caso de perigo de vida” (CFM 1988)

Artigo 59 – “Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o

prognóstico, os riscos e objetivos do tratamento, salvo quando

a comunicação direta com o mesmo possa provocar-lhe dano,

devendo, nesse caso, a comunicação ser feita ao seu

responsável legal”. (CFM 1988)

No Capítulo VII - Relações entre Médicos,

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Artigo 81- É vedado ao médico: ”Alterar prescrição ou

tratamento de paciente, determinado por outro médico, mesmo

quando investido em função de chefia ou de auditoria, salvo

em situação de indiscutível conveniência para o paciente,

devendo comunicar imediatamente o fato ao médico

responsável”.

Conhecimento Técnico/ Opções de Tratamento e Informação Em uma das perguntas afirmamos: “O Paciente não tem conhecimento

técnico para decidir o que é melhor para ele” e solicitamos aos entrevistados que

nos respondessem indicando o grau de concordância ou discordância da

afirmativa. Com exceção de um entrevistado, os demais responderam que

concordavam parcialmente. Suas falas justificam a opção selecionada.

“Alguns pacientes têm mais contato com informações, internet

e já chegam na consulta com material. Em minha opinião esse

acesso à internet dificulta um pouco porque o paciente lê

artigos, relatos e daí levanta muitos questionamentos. É

complicado porque até os médicos têm dúvidas sobre alguns

artigos científicos, imagina um leigo. Por outro lado você tem

aquele paciente que não tem acesso a nada e se coloca para

você como que fazendo tudo que você quiser. Os dois lados

são complicados” ( masculino, 27 anos);

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“Porque se for um médico, tem conhecimento técnico. De

modo geral, o paciente confia na decisão do médico”

(feminino, 25 anos)

“No aspecto técnico o paciente não tem condições de saber o

que é melhor para ele. Porém no aspecto relacionado a

qualidade de vida e das opções do que ele acredita ser o

melhor para ele, ele tem” ( masculino, 27 anos);

“Dependendo do nível sócio-econômico, intelectual, às vezes

este paciente pode ser um médico e pode ter conhecimento

técnico” ( masculino, 28 anos).

Outro destaque foi para a resposta que discordava parcialmente da afirmativa,

respondendo:

“Nós vivemos num meio que é muito eclético. Paciente que

tem acesso à internet e paciente que não sabe ler. Então eu

acho que você tem que saber mexer um pouco na entrevista

com o paciente para ser ideal e ter uma decisão em conjunto.

Tem paciente que chega para você com dez artigos da

internet. .... Apesar dele chegar com vários artigos você tem

que só explicar mais um pouco sobre a doença, eu acho que

gera um maior interesse pela doença dele, mas a decisão

acaba sendo uma decisão em conjunto, eu acho que muda,

muda a relação médico-paciente, porque você tem que

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explicar mais e mais. Aumenta a demanda por informação”

(masculino, 28 anos).

De modo geral todos reconheceram a mudança de perfil do paciente hoje,

reconhecendo-o como mais participante, embora em algumas falas fique clara a

idéia de que é o médico quem sabe o que é melhor. O sentido de discussão e

reflexão com o paciente sobre uma determinada conduta ou outra acaba ainda

sendo um exercício de convencimento, onde o médico tenta convencer o paciente a

realizar o procedimento que ele entende ser o melhor. O que irá diferir nesta questão

será o grau de autonomia que o paciente possui, para realmente ter condições de

optar pelo caminho que deseja.

REGO confirma que o paciente mudou, está com mais informação e

buscando ampliar os canais atualmente mais consolidados para apresentarem suas

queixas, buscando conceber o atendimento médico como uma prestação de

serviços. Ocorreram muitos avanços nos últimos anos, principalmente no tocante

aos direitos individuais e coletivos, destacando a década de 80 com o aumento da

atuação de ONG’s envolvidas nos mais variados temas e a 8ª Conferência Nacional

de Saúde, concebendo o conceito de saúde de modo ampliado e ainda o marco na

efetivação do controle social, através da sistematização da criação e atuação dos

conselhos de saúde espalhados por todo o país.

Na década de 90, no Brasil, na mesma linha de valorização do Controle

Social e no reconhecimento do papel de atores importantes como os usuários e os

trabalhadores de saúde surgem os movimentos de Humanização, visando resgatar a

participação e o estabelecimento de vínculos atuando no processo de gestão.

Observando a Política Nacional de Humanização destacamos os princípios

norteadores.

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• “Valorização da dimensão subjetiva e social em todas as práticas de

atenção e gestão do SUS, fortalecendo o compromisso com os direitos

do cidadão, destacando-se o respeito às questões de gênero, etnia,

raça, orientação sexual e às populações específicas (índios,

quilombolas, ribeirinhas, assentados, etc...);

• Fortalecimento de trabalho em equipe multiprofissional, fomentando a

transversalidade e a grupalidade;

• Apoio à construção de redes cooperativas, solidárias e comprometidas

com a produção de saúde e com a produção de sujeitos;

• Construção de autonomia e protagonismo dos sujeitos e coletivos

implicados na rede do SUS;

• Co-responsabilidade desses sujeitos nos processos de gestão e

atenção;

• Fortalecimento do controle social com caráter participativo em todas as

instâncias gestoras do SUS;

• Compromisso com a democratização das relações de trabalho e

valorização dos profissionais de saúde, estimulando processos de

educação permanente.” ( M.S. 2004)

Perguntados sobre o que levam em conta para tomar a decisão sobre o

tratamento, fornecemos três opções: A vontade do paciente; a gravidade da doença

e o benefício que você sabe que ele/a terá . A metodologia utilizada para esta

pergunta foi valorativa, no momento da resposta os entrevistados deveriam ponderar

os critérios utilizados de modo a totalizar 10. Responderam que tratava-se da

questão mais difícil de responder, foi então um exercício interessante, pois durante a

escolha, eles iam e vinham, alterando os números de acordo com a reflexão

realizada.

“Esta pergunta é difícil! O que você leva em conta para tomar

uma decisão? A gravidade da doença é 7. É difícil isso.

Porque muitas vezes você tem a vontade do paciente mas ele

é extremamente grave ou se é terminal e é a vontade do

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paciente em não investir. Agora se for um paciente jovem

muitas vezes você vai tomar uma decisão contra a vontade

dele, apoiada na família, tudo mais...” ( masculino, 28 anos)

Ficou claro o valor que os médicos-residentes da cirurgia geral dão para a

gravidade da doença e o benefício que o procedimento poderá trazer para o

paciente. Os médicos-residentes da clínica médica diferiram na abordagem dando

maior valor à vontade do paciente, seguido do benefício que o tratamento poderá

trazer para o paciente.

Em outra pergunta indagamos sobre os momentos em que os médicos

residentes detalhavam informações para os pacientes, solicitando que comentassem

o que conversavam com os pacientes. De modo geral em momentos como:

cirurgias, procedimentos invasivos e prognósticos, foram núcleos comuns nas

respostas. Um entrevistado destacou que o correto seria conversar sobre mudança

de prescrição para o paciente internado, porém esta prática não ocorria, na medida

em que eles alteravam sem esclarecer o paciente da conduta.

“Em cirurgias eu procuro esclarecer a proposta da cirurgia, as

possíveis complicações, os benefícios e a importância da

cirurgia. Nos procedimentos invasivos, explico o porquê e a

justificativa de passar por aquele exame” ( masculino, 27 anos)

“A prescrição sempre deu ênfase para ele fazer certo aquela

prescrição. Muitas vezes você faz uma explicação no papel e

você precisa explicar para ele a real necessidade dele tomar

aquele comprimido e na cirurgia geralmente eu explico o que a

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gente vai fazer dentro das possibilidades e dos meios para ele

viver bem. É difícil você falar da cirurgia e o paciente entender,

mas é preciso explicar do modo mais real possível para ele

entender o que vai acontecer”.(masculino, 28 anos)

“Em cirurgia converso sobre os riscos, benefícios da cirurgia,

possíveis complicações, tempo de duração estimado.

Basicamente isso.” ( feminino, 25 anos);

“Eu amplio para ele os riscos e os benefícios de cada

procedimento que ele venha a fazer, incluindo até

medicamentos que ele venha a tomar” (feminino, 26 anos);

“Bem, eu converso sobre o que será feito. Complicações, por

exemplo, se ele vai sair com dreno, com alguma ostomia, se

vai ser entubado, se vai para o CTI. Abordo detalhadamente o

que vai acontecer no pós-operatório para que ele se sinta

seguro e não fique assustado ao sair da cirurgia. Em exames

físicos abordo a razão do exame, para que serve. Em relação

ao prognóstico sempre falo que é difícil a gente saber

exatamente como vai ser a conclusão, a gente não tem bola

de cristal para saber, por exemplo, se vai ser curado, ainda

mais se for um doente oncológico, você passa pensamentos

positivos sempre, né. Mas a chance de recuperação, deixo

claro que sempre há chance de insucesso no tratamento”

(masculino, 27 anos);

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“Depende de cada caso. Procedimentos invasivos, comunico

como é o procedimento, o porquê de ser necessário, as

consequências, o que pode ocorrer, potenciais complicações e

o que o paciente mais pergunta, se vai sentir dor ou não. Aí

você fala que não, que tem anestesia, aí ele aceita.”

( masculino, 28 anos);

Na percepção dos entrevistados ainda existem outras situações que

consideram ser necessário esclarecer mais o paciente:

“Sobre como se cuidar, pois em cirurgia o pós é essencial.

Dependendo do procedimento se o paciente não seguir a risca

as orientações ele coloca todo o procedimento a perder”

(masculino, 27 anos).

“O paciente muito ansioso, temeroso do procedimento que irá

fazer” ( masculino, 28 anos).

“Diagnóstico” ( feminino, 25 anos e 26 anos);

Visando contextualizar algumas respostas que ilustram o comportamento dos

médicos-residentes e suas dúvidas e o que levam em conta na hora de decidir sobre

o tratamento do paciente, a aproximação com a história da estruturação da medicina

é relevante.

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A medicina ocidental se estrutura, com Hipócrates, a partir do século IV a.C.,

ao se libertar do puro empirismo. Segundo HOSSNE (2002;107), para os

pensadores gregos a natureza de todas as coisas poderia vir a ser identificada sob o

uso da observação e da razão. Hipócrates ao definir os fundamentos da técnica e

arte médica, marcou como aspecto relevante a relação médico-paciente, esta

relação para os gregos deveria estar embasada em forte sentimentos entre as

partes, esse sentimento profundo de amizade percorria a relação do médico para o

paciente e do paciente para o médico e era denominada filia. O processo de técnica

e arte, segundo os gregos poderiam ser apreendido e ensinado. Os médicos sendo

capazes de dominar a técnica e a arte, passam a ter poder ampliado, ditando

normas, regras sobre a vida de outra pessoa.

“O médico, competente por dominar a técnica e arte médica, imbuído pelo

sentimento de filia, respeitando os princípios da não-maleficiência e

procurando ser um homem justo, sabe o que é bom (beneficiência) para o

seu paciente. Assim, o médico deve mandar e o doente deve, como o

cidadão faz com seu governante, obedecer e ser submisso. Nesse

sentido,o médico deve ter poder absoluto, embora voltado para proteger

seu doente. Estabelece-se, assim, o sistema paternalístico na relação

médico-paciente (...) O médico dá as ordens e o paciente obedece, porque

o médico sabe o que é bom para seu doente e ele, por isso, teria a

competência para decidir” (HOSSNE, 2002:111)

Observamos que a construção Hipocrática previa que o médico devia cuidar

de seu paciente com filia e não deveria em tempo algum utilizar sua competência e

técnica para prejudicar o paciente, deveria sim, sobretudo buscar o bem de seu

paciente.

Historicamente segundo REGO (2003) a frase: “A medicina é um sacerdócio!”

Está associada a idéia de uma vida altruísta e dedicada 24h dia a servir ao próximo

necessitado. A postura profissional baseada na compreensão científica e técnica

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com concepção laica, surge no Ocidente a partir da Idade Moderna. Até o final da

Idade Média a ação dos médicos era fundamentada em salvar as almas e de modo

secundário atender aos enfermos. Os hospitais nesta época eram vinculados a

ordem religiosas e as pessoas despossuídas (sem famílias ) permaneciam ali para

uma morte digna. Apenas no século XVIII o hospital se define como espaço para

cura física dos enfermos. No Brasil em meados do século XIX surge as primeiras

Casas de Saúde e até a criação dos hospitais de ensino no país, o ensino médico

ocorria em instituições destinada aos pobres.

É importante destacar que atualmente a representação social do médico

como alguém preocupado com o bem estar do outro está fragilizada pois esta

imagem também está relacionada a falhas e erros, diminuindo a hegemonia de

pensamento do médico como alguém que dedicou a vida à salvação das pessoas.

Comunicação de Diagnóstico O modo como a família aparece nas respostas dos entrevistados é

contraditório se observarmos as respostas na questão sobre vivência de situação

conflituosa, relacionada ao exercício da autonomia do paciente, temos a família

como principal causadora de conflitos, em algumas falas a família aparece como

perturbadora do processo de autonomia do paciente. Na abordagem sobre

comunicação de diagnóstico e/ou esclarecimentos de procedimentos, no caso se

consultam a família antes de conversar com o paciente, essa aparece nas falas

como maior aliada no momento de comunicação de diagnóstico.

“Depende do diagnóstico, converso com a família os

diagnósticos mais impactantes, como câncer, HIV+. Entendo

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que, por conhecer mais o paciente, a família vai preparando o

caminho para o diagnóstico final. A família neste processo

funciona como um aliado”. (masculino, 27 anos);

“Normalmente em conjunto. É raro consultar só a família. É

óbvio que quando você tem um paciente com diagnóstico de

câncer você tem, dependendo do paciente e dependendo da

própria consulta, normalmente em conjunto primeiro o familiar

e pergunto se eles gostariam que o doente soubesse da

doença dele. No caso, os familiares conhecem o paciente mais

do que o próprio médico. Sempre fica uma questão em comum

acordo. Na verdade você faz a família como parceira. E muitas

vezes o paciente pergunta o diagnóstico diretamente, aí eu

respondo diretamente” (masculino, 28 anos);

“Depende do caso. Porque tem paciente que às vezes não tem

família nenhuma, então, vai ter que ser a pessoa ciente, às

vezes você sente que o paciente não quer ouvir o que precisa

ser dito, então você vai procurar a família. Isso é muito de

você sentir a pessoa, de como ela reage, coisa de percepção”

(feminino, 26 anos);

“A família convive com o paciente, tem mais conhecimento,

intimidade, é mais fácil conversar com a família e agir de

comum acordo com ela, principalmente quando o diagnóstico

e prognósticos são sombrios. Muitas vezes é mais fácil a

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família estar sabendo antes para orientar a gente tipo: é

melhor neste caso não falar tudo, neste caso pode falar, ou

deixa que a gente fala para o senhor. A família participa,

colabora. Muitas vezes a família participa mais que o paciente,

isto é, fazendo perguntas e acompanhando. Claro, quando o

paciente tem família” ( masculino, 27 anos);

“Em outra situação, talvez seja até a maioria dos casos, a

gente prefere primeiro conversar com a família. Para que ela

possa ajudar. Isso é relativo também. Porque, por exemplo,

um paciente HIV+ ; tenho um caso na enfermaria agora, então

esse caso não, você é obrigado a conversar com o paciente

primeiro até porque pode ser que ele não queira informar a

família, seria uma opção dele, ele tem lucidez suficiente para

entender a gravidade da doença. Já outras doenças por

exemplo um idoso que desenvolve neoplasia etc... tal, a gente

conversa com a família para ela abordar o paciente, no

fenômeno de confortá-lo, de dar esperança, então a gente fala

primeiro com a família” ( masculino, 28 anos);

Observamos através dos relatos que existe uma fragilidade do médico-

residente em comunicar diagnósticos, principalmente se o prognóstico não for

favorável, foram muito citados os exemplos de neoplasias. Ao mesmo tempo utilizam

a convivência familiar como argumento inconteste para saber o que é melhor para o

paciente ou para saber como abordá-lo.

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Recortamos a única fala que aborda diretamente o paciente e incide em um

método diferenciado para envolver a família no processo se necessário.

“Se o paciente estiver lúcido, sempre ele vem primeiro, se ele

não puder eu identifico a pessoa da família mais próxima no

processo, uma só, para dividir a questão” (feminino, 25 anos);

Como os médicos residentes percebem a reação do paciente em relação

à recusa nas orientações, críticas ao atendimento e ao não atendimento as

determinações.

Os entrevistados demostraram através de suas respostas que interpretam a

recusa do paciente como falta de entendimento acerca dos esclarecimentos feitos

pelo médico em que prevalece a opinião do médico acerca da conduta traçada. O

entrevistados da cirurgia geral destacaram que esse comportamento de recusar

indicações é muito comum, como exemplo citaram o pós-operatório, onde eles

explicam uma série de condutas necessárias visando garantir um pós – operatório

tranquilo e os pacientes burlam esta conduta, como consequência acarretam

dificuldades no tratamento. Consideraram de modo geral que a chave é o

esclarecimento. Vejamos a resposta quando perguntados se alguma vez algum

paciente já disse a você que recusava fazer alguma das coisas que você indicou

para ele? O que aconteceu?

“Sim. Eu consegui mostrar para ele a importância do

tratamento. Isso acontece com frequência e na maioria das

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vezes, eu consigo contornar, mas no final das contas quem

decide é ele”. ( masculino, 27 anos)

“Já. O paciente recusava usar medicamentos, tirando a

questão do preço, busquei tentar discutir com ele e eu estava

tentando entender as razões pelas quais ele estava tomando

aquela decisão. Se ele conhecia as consequências daquela

decisão. Uma vez que ele manteve a conduta, continuava a

atender mas respeitava o que ele escolhia” ( feminino, 25

anos);

“Já. Ih!! Em cirurgia isso também é comum. A gente orienta

mas o paciente arrisca. Tipo cirurgia de vesícula e aí a gente

fala para evitar gordura etc... e ele não faz nada disso, aí

chega passando mal. Acho que a chave é o esclarecimento,

fortalecendo os benefícios para ele, a qualidade de vida. A

maioria acaba por acatar depois, outros não” ( masculino, 27

anos);

“Sempre tem. O baque inicial, a cirurgia é minha área eu acho

que sempre se nega um pouco e você vai contornando de

acordo com aquilo que é melhor para ele e é a solução para

ele e ele sempre entende” (masculino, 28 anos);

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“Recusava!!!! Não lembro. Tive algumas vezes mas nada

taxativo. Depois que você conversa a pessoa volta atrás”

(feminino, 26 anos);

A questão da crítica e participação do paciente no processo instigou-nos a

conhecer a percepção acerca do tema. Perguntados sobre como reagem à

participação e crítica do paciente em relação ao atendimento, concentraram o olhar

na relação médico-paciente e no desconhecimento. Apenas uma resposta foi dada

com enfoque relacionado a prestação de serviço sendo, portanto, passível de

avaliação.

“Dou abertura. É uma prestação de serviço e o paciente tem o

direito de expressar-se” ( feminino, 25 anos);

“Bem... reajo com paciência. Às vezes é desconhecimento”

(masculino, 27 anos);

“Bem se for uma crítica construtiva eu aceito”. (masculino, 27

anos)

“É... tem que saber engolir seco, né!! Muitas vezes a gente

engole seco, muitas vezes o paciente não entende que você

está virado de plantão, dando 15h tendo que atender cinco

pacientes ao mesmo tempo e ...é uma questão ética muito

difícil de lidar, né....Você que manter o mesmo humor

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independente da quantidade de plantões, de trabalho, de

cansaço mesmo” (masculino, 28 anos);

“Nunca tive problemas. Nunca aconteceu. Na verdade como

eu acho que eu acabo explicando até mais do que a pessoa

até entenderia ou seja necessário. Eu nunca tive problemas de

ninguém reclamar” (feminino, 26 anos);

“É... eu tenho por hábito ouvir críticas, comentários, mas

assim, nunca ouvi críticas pesadas que se fosse o caso

também ouviria mas acho que aí você estabelece uma relação

conflituosa entre médico e paciente, talvez seria o caso até de

recomendar que se tratasse com outro médico, passar para

um colega, porque tudo fica mais difícil quando você não tem

boa relação médico-paciente. Uma coisa difícil mas nunca tive

este tipo de coisa, não” (masculino, 28 anos);

Merece destaque a questão da escuta no fazer do médico quando procuram

dar orientações que consideram relevantes para o tratamento e não percebem os

questionamentos e anseios apresentados pelos pacientes sob diversas e variadas

formas e ousamos recorrer a pedagogia desenvolvida por Paulo Freire com

destaque ao processo de escuta.

“Escutar é obviamente algo que vai mais além da postura auditiva de cada

um. Escutar, no sentido aqui discutido, significa a disponibilidade

permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro,

ao gesto do outro, às diferenças do outro. Isto não quer dizer,

evidentemente, que escutar exija de quem relamente escuta sua redução

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ao que o outro fala. Isto não seria escuta, mas auto-anulação. A verdadeira

escuta não diminui em mim, em nada, a capacidade de exercer o direito de

discordar, de me opor, de me posicionar. (...) Aceitar e respeitar a diferença

é uma dessas virtudes sem o que a escuta não pode se dar” (FREIRE

P.1996:135)

Em relação ao não cumprimento de suas orientações as respostas evidenciaram

o princípio da medicina de fazer o bem; espaço para punição quando ao

comportamento de não cumprimento as orientações; percepção ampliada acerca

das condições de vida do paciente.

“Procuro evidenciar que o tratamento não será atingido sem a

participação dele. O tratamento exige co-responsabilidade”

(masculino, 27 anos)

“Bem, eu insisto, insisto e atendo” ( feminino, 25 anos)

“É... eu procuro reiterar a importância do tratamento, faço isso

na primeira, na segunda vez e na terceira eu vou conversar

com ele sobre a mudança de profissional para atendê-lo

porque se isto ocorre e persiste, o tratamento não será eficaz,

quebra a relação” ( masculino, 27 anos);

“Eu explico mais uma vez e você fica um pouco desmotivado

de conseguir fazer um tratamento melhor, principalmente se

este tratamento depende da vontade do paciente, em tomar as

medicações e fazer qualquer outra coisa. Você investe, de

certa parte você briga com o paciente, mas para sempre

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melhorar o paciente, porque a gente está lutando por ele”

(masculino, 28 anos);

“Eu começo explicando para ele a necessidade e importância

daquilo, se mesmo assim ele insiste em não fazer eu tenho

que acabar respeitando. Por exemplo, nos ambulatório, ele

não quis fazer ele acaba recebendo alta” (feminino, 26 anos);

“A gente vive todo dia no ambulatório. O que eu faço é explicar

detalhadamente, toda vez que o paciente chega no

ambulatório. Se não conseguir e perceber ser necessário,

encaminho para Saúde Mental, Serviço Social, pois às vezes

ele não cumpre por questões financeiras também..”

(masculino, 28 anos)

Explica HOSSNE (2002) que todos nós temos competências e limitações, a

dificuldade é aguçada quando um indivíduo utiliza sua área competente para negar

suas limitações ou dificuldades. Na sequência de questões que abordaram temas

como: comunicação de diagnóstico, recusa a orientações, críticas e não atender as

orientações do médico,vislumbramos na elaboração teórica de HOSSNE sobre as

competências do médico uma série de dilemas, como: Quem dá as ordens?, Deve o

médico obedecer às ordens de seu paciente? Deve o paciente obedecer à decisão

do médico? E procuramos partilhar reflexões do autor que colaboram na

aproximação do entendimento das respostas dadas.

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“ Quando doente, o ser humano se fragiliza e aí é importante o médico ter

clara compreensão que se está iniciando um relacionamento com alguém

que já está fragilizado.

Como, habitualmente, o médico tem tendência a negar suas limitações,

usando para isso mecanismos de onipotência, ele acaba ocupando, nessa

relação, um espaço indevido.

O que o médico tem a fazer é reconhecer a fragilização, a limitação

aumentada, e não negá-la onipotentemente, chegando até a estimular o

paciente para que ele assuma também o papel de onipotente.

Com esse mecanismo, o médico tanto pode assumir a postura paternalista

como a postura de não-envolvimento.

Dito de outra forma, a autonomia está sempre acompanhada da fragilidade.

Não há pessoa sem fragilidade; basta lembrar que o ser humano já nasce

sabendo que vai morrer.’

Cabe ao médico, com a sua competência, mobilizar os recursos

competentes do paciente para superar as fragilidades.

O médico deveria ter competência para avaliar o nível de competência do

paciente naquele dado momento de sua vida. Pode o paciente estar

vivendo um momento em que ele não tem competência npara decidir; mas,

mudando ou evoluindo a situação, elaborando o problema, ele pode passar

a ter condições para mobilizar recursos internos.

A competência do médico deve estar presente ao lado do paciente,

acompanhando-o, auxiliando a elaborar a questão e mobilizando seus

recursos e competência.”( 2002;114)

Existe limite para Autonomia? As respostas foram unânimes em relação à existência de um limite para

autonomia, basicamente concentraram-se em dois aspectos, risco de morte,

assegurado pelo código de ética médica, e no risco social, conforme abordado por

entrevistado da Clínica Médica.

“Quando a autonomia individual interfere na social, exemplo:

Um paciente HIV+ do sexo masculino atendido no ambulatório,

orientado quanto ao uso do preservativo, chega na consulta e

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diz não usar que isso é problema das mulheres, é casado e

tem outras mulheres. Um dia a mulher dele chega em meu

consultório e diz que quer saber o que o marido tem, tem

medo de estar em risco, aí eu acho que deverei buscar ajuda,

mas creio que não devo respeitar a autonomia dele neste

momento, pelo risco social” (masculino, 28 anos);

Apenas um entrevistado da Clinica Médica apresentou outro tipo de limite,

vejamos:

“Sim, o nível de conhecimento. A partir do momento que eu

não conheço preciso perder esta liberdade e pegar alguém

que saiba para me ajudar”. (feminino, 26 anos);

A questão do limite para a autonomia ainda é um tema em debate pois

interfere diretamente no livre arbítrio e a relação da autonomia em referência aos

demais inidivíduos na sociedade, dinamizam a discussão entre alguns autores.

Destaco PEGORARO (2002) que apresenta discussão sobre os limites da

autonomia, entendendo que esta não é uma qualidade moral absoluta uma vez que

vivendo em sociedade com outros seres humanos convivemos com outros seres

igualmente autônomos. Daí, a percepção de que a autonomia, assim como a

liberdade, precisa ser compartilhada, negociada em um processo de diálogo e

esclarecimento partilhado.

Significado da palavra vulnerável

Em relação ao tempo de reflexão para responder esta pergunta podemos

assegurar que responderam de modo mais rápido do que a primeira pergunta acerca

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da primeira palavra que vem à cabeça ao pensar Autonomia. De um modo geral as

respostas tiveram o mesmo sentido, vejamos:

Frágil ( masculino, 27 anos e feminino, 26 anos)

Risco de ter problema ( masculino, 27 anos);

Todos somos. É algo que todo mundo é. (masculino, 28

anos);

Fácil convencimento ( masculino, 28 anos);

Indefeso (feminino, 25 anos);

Relação entre vulnerabilidade da população atendida e autonomia

A maioria respondeu que considera a população atendida vulnerável, alguns

responderam que toda pessoa é vulnerável, outro que a maior parte da população

atendida é vulnerável. Observamos que o pensamento dos entrevistados pela

Clínica Médica foram mais focados em considerar que a condição social dos

pacientes os tornam vulneráveis, como ilustra esta fala.

“Pelo fácil convencimento. Você pressupõe que se você

convence a pessoa fácil, a autonomia também é frágil, o poder

de decisão, o conhecimento apropriado que esta população

não tem “ ( masculino, 28 anos);

“O nível educacional torna as pessoas mais autônomas ou não

e eu relaciono o nível de autonomia a vulnerabilidade pois as

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pessoas de menor conhecimento estão mais vulneráveis e

portanto, não agem com autonomia” ( masculino, 27 anos)

“Em minha visão para ter autonomia tenho que ter educação

com letra maiúscula” ( feminino, 25 anos);

Já os entrevistados da Cirurgia Geral consideraram que muitas vezes a

autonomia conduz a decisões equivocadas no tratamento.

“Eu vejo como uma questão intercalada, quer dizer quanto

maior a autonomia maior a vulnerabilidade em você escolher

coisas erradas. Em cirurgia acho que funciona assim. Às

vezes o paciente escolhe um caminho por sua autonomia que

pode levá-lo a reduzir sua vida ou sua qualidade de vida

enquanto que se escolhesse outro poderia ter maior chance de

qualidade de vida.” (masculino, 27 anos);

“Muitas vezes o paciente tem autonomia de decisão e aí vai

ficar vulnerável a qualquer outra coisa por ter tomado uma

decisão errada, por ser mal explicada ou qualquer coisa, então

a autonomia pode tornar o paciente mais vulnerável a

agressões à saúde dele, coisas médicas...” (masculino, 28

anos);

De modo geral as respostas sobre o que pensam em relação a palavra

vulnerável e a relação entre vulnerabilidade e a população atendida está em

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consonância com HOSSNE & VIEIRA (2002) . Os autores entendem que pessoas

vulneráveis são aquelas que não tem condições de proteger seus próprios

interesses. Para esses autores são especialmente vulneráveis os que não

compreendem, os que estão sob algum tipo de dependência, os que estão à morte e

os doentes.

“Incluem-se na categoria dos que não compreendem os deficientes

mentais, os senis, os de baixa escolaridade e as crianças. Estão em

situação de dependência todos os institucionalizados, como prisioneiros,

velhos asilados, menores recolhidos em orfanatos e outros tipos de

instituição. Também se encontram em situação de dependência os

pacientes de enfermaria, os empregados, os alunos. As pessoas com

doenças crônicas, refratárias à terapia conhecida, são vulneráveis porque

podem estar procurando ajuda desesperadamente. Também são

vulneráveis as pessoas com doenças que têm tratamento conhecido, mas

que necessitam de intervenção especializada para se recuperar.”

Como situam a discussão sobre a temática do estudo no curso de graduação. Com exceção de um entrevistado, todos relataram que a discussão propiciada

pela pesquisa foi ausente na graduação. A temática discutida na graduação esteve

focada na relação médico-paciente e nos direitos do paciente, apresentados na

disciplina de psicologia médica, mas que, na época, não davam a devida

importância e que agora, no cotidiano da residência, observam que ainda sentem

dificuldades para aprofundar estas questões e muitas vezes transferem a discussão.

Apenas um entrevistado relatou que discutiu relação médico-paciente também na

disciplina de ética. Um aluno destacou que discutiu o tema da pesquisa em

disciplinas como: Filosofia, Sociologia, Psicologia Médica I e II, este aluno fez o

curso de Medicina em uma Universidade privada.

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Os médicos – residentes em sua maioria destacaram que carecem de

discussões relacionadas ao tema de nossa pesquisa, pois o conteúdo discutido em

disciplinas como: psicologia médica, são oferecidos em um momento em que,

segundo eles, ainda não estão amadurecidos e com vivência para entenderem a

relevância da discussão e portanto da disciplina.

Citaram que o momento da entrevista foi importante para propiciar uma

reflexão sobre as questões que hoje fazem parte do seu cotidiano como médico-

residente e que sua formação precisará ultrapassar o técnico para aproximá-los das

demandas trazidas pelos pacientes e seus familiares em seus mais diversos setores.

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CAPÍTULO VII

CONCLUSÃO

O desafio de realizar o estudo proposto foi alimentado pelo prazer que a

discussão desse tema nos traz. Devemos destacar que muitas surpresas

aconteceram nesse caminho, porém a atenção dos médicos-residentes que

aceitaram participar do estudo e o ambiente de privacidade onde ocorreram as

entrevistas possibilitaram a confiança na relação entre o pesquisador e o

participante da pesquisa de modo que foi muito interessante vivenciar o que os

autores citam acerca do processo da entrevista, no sentido de que esse processo

permite ao entrevistado discorrer e, por vezes, refletir sobre a temática em voga.

A realização da pesquisa propiciou o exercício da reflexão sobre eixos que eles

próprios destacaram como relevantes e que até o momento permanecem sendo

uma demanda de reflexão.

Observamos que um dos problemas centrais da relação médico-paciente que

envolve a autonomia profissional refere-se ao processo de sua formação onde o

médico é preparado para arte de curar e responsável por vezes, legalmente,pela

tomada de decisão que repercutirá na qualidade de vida do assistido, o paciente. De

outro, temos o indivíduo, tratado, dono de seu próprio corpo, sendo, portanto, o

maior interessado na escolha do que deverá ser melhor para si.

Percebemos certo sofrimento do médico residente em identificar o que seria

autonomia do paciente na medida em que a formação profissional voltada para o

exercício do bem cerceia o médico–residente em entender que a dor, o sofrimento,

as aflições e dúvidas são do indivíduo que está tratando, isto é, da própria pessoa,

sendo necessário para respeitar a autonomia do paciente aceitar seu ponto de vista

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e entendê-lo como indivíduo pleno que tem o direito de fazer suas opções segundo

seus valores e crenças.

O que nos inquieta é observar que a questão ética ainda está longe de ser

reconhecida no cotidiano profissional e tema de reflexão durante a formação. Nem

mesmo a tradicional disciplina de ética médica parece ter propiciado reflexão acerca

da ética na prática médica na medida em que alunos recém – formados deixaram

transparecer, com constrangimento, no momento da entrevista que teria sido

interessante ler e pensar sobre o código de ética, uma vez que muitas das situações

relatadas encontram eixos de discussão no código de ética médica, aguçando

dilemas no cotidiano, como exemplo: até que ponto o paciente é informado para

optar sobre este ou aquele procedimento?

Constatamos através dos relatos que ainda há um certo constrangimento do

médico-residente em comunicar diagnósticos, principalmente se o prognóstico não

for favorável - foram muito citados os exemplos de neoplasias. O que pode estar

relacionado à pouca oportunidade de reflexão e discussão sobre o tema. Ao mesmo

tempo, utilizam a convivência com a família do paciente como argumento para saber

o que é melhor para o paciente ou para saber como abordá-lo.

Questionamo-nos se nossos achados estão relacionados à pouca atenção

que a relação médico-paciente tem obtido associada a uma certa insensibilidade

cotidiana que o ensino focado no avanço tecnológico tem levado a substituir as

relações pessoais com conseqüências nefastas, principalmente em uma profissão

onde os dilemas morais são cotidianos.

Este estudo inicial, exploratório, aponta-nos a necessidade de reflexão sobre

o modelo de ensino onde a discussão acerca de tais temas ainda estão reduzidos na

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graduação a uma pequena pauta como em uma ou duas disciplinas - segundo todos

os pesquisados de universidade pública.

Outra questão é que o curso de medicina, além de enfoques técnicos,

precisaria investir em desenvolver a competência ética e moral de seus alunos, uma

vez que são questões que fazem parte do cotidiano da profissão.

Consideramos que o estudo cumpriu seus objetivos de apresentar, ainda que

de maneira exploratória, o que pensam os médicos-residentes acerca da autonomia

e como essa se expressa em algumas atividades e situações cotidianas

apresentadas.

Estamos certas de que esta questão carece de estudos mais profundos,

considerando a necessidade de trabalharmos com um modelo de formação mais

próximo do humano e de questões que emergem no processo de tratamento e de

luta pela saúde.

Finalizando, esperamos que outros trabalhos venham a aprofundar esta

temática e trilhemos pela construção de um saber na saúde menos fragmentado,

mais humano e que atenda à integralidade do homem.

.

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CAPÍTULO VIII REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Http://www.ufrgs.br/bioetica/belmont/htm ((aacceessssaaddoo eemm 2244//1111//0066))

CCoonnsseellhhoo FFeeddeerraall ddee MMeeddiicciinnaa .. RReessoolluuççããoo 11..115544,, ddee 1133 ddee aabbrriill ddee 11998888..

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ANEXOS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE ESTUDOS EM SAÜDE COLETIVA

CURSO DE MESTRADO EM SAÜDE COLETIVA

ORIENTADORA: Professora Marisa Palácios

MESTRANDA: Maria da Conceição Lopes Buarque

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

O Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de

Janeiro está realizando um estudo intitulado “Significados e impactos da autonomia

do paciente: o olhar dos médicos residentes”, desenvolvido pela aluna do curso de

mestrado Assistente Social Maria da Conceição Lopes Buarque.

O principal objetivo deste estudo é Identificar a percepção dos médicos

residentes, especificamente de clínica médica e cirurgia geral, sobre autonomia dos

pacientes.

A participação nesta pesquisa é voluntária e utilizaremos como metodologia

para a realização do estudo, entrevistas e observação participante. Solicito sua

autorização para gravar a entrevista garantindo que uma vez gravada será transcrita

e a fita será apagada. Na transcrição não haverá referência ao autor da entrevista.

Todas as informações obtidas serão confidenciais e não causarão danos à

integridade moral e/ou social, podendo inclusive, interromper sua participação no

estudo a qualquer momento, inclusive depois de ter dado a entrevista.

Os resultados, serão publicados em literatura científica especializada e os

participantes terão acesso ao material produzido em apresentação formal, a ser

realizada no HUCFF/UFRJ, a ser acordada na época de conclusão do estudo.

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Atenciosamente,

Maria da Conceição Lopes Buarque/ Assistente Social, discente do curso de

mestrado em Saúde Coletiva do NESC/UFRJ.

Contatos: tel celular 81810561; [email protected]

Marisa Palácios/ Orientadora da Pesquisa

Professora do IESC/UFRJ

Contatos tel celular 99975677

Comitê de Ëtica em Pesquisa / NESC/UFRJ – 2598-9328

Eu, __________________________________________, RG n° ____________,

certifico que tendo lido as informações acima, concordo com o que foi exposto e

autorizo a minha participação nesta pesquisa.

Rio de Janeiro, ______ de ____________________________ de 2006

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PESQUISA

SIGNIFICADOS E IMPACTOS DA AUTONOMIA DO PACIENTE: O OLHAR DOS

MËDICOS RESIDENTES.

1- IDENTIFICAÇÃO

1.1- Sexo: M ( ) F ( )

1.2- Idade ______________

1.3- Área de Residência _____________________

2 - Roteiro para entrevista semi-estruturada.

1- Qual a primeira palavra que vem à cabeça quando pensa em AUTONOMIA?

2 - Como você define autonomia profissional?

3 - E a autonomia do paciente?

4- Já vivenciou alguma situação conflituosa, relacionada com o exercício da

autonomia pelo paciente?

5 – O código de ética médica tem algum artigo sobre a autonomia do

paciente? O que diz?

6 - O Código de Ética de Médica fala alguma coisa sobre autonomia profissional?

O que?

7– Você sabe qual é a posição dos seus colegas sobre autonomia dos

pacientes?

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8 – Sobre a afirmativa de que o paciente não tem conhecimento técnico para

decidir o que é melhor para ele. Você:

( ) concorda totalmente ( ) Concorda parcialmente ( ) Discorda Parcialmente

( ) Discorda Totalmente ( ) Não tem opinião formada sobre o assunto

9- De modo geral o que você leva em conta para tomar decisão em relação ao

tratamento? Pondere as questões abaixo de forma a soma totalizar 10.

A vontade do paciente ( )

A gravidade da doença ( )

O benefício que você sabe que ele/a terá ( )

10 - Assinale as situações abaixo listadas em que você conversa com o

paciente, detalhando informações para efetivação do atendimento.

Cirurgias ( )

Procedimentos Invasivos ( )

Prescrições Médicas ( )

Prognósticos ( )

Exames Físicos ( )

Outros Exames ( ) Quais?

11- A partir da resposta anterior, esclareça o quê e como você conversa com o paciente?

12- Em relação a comunicação do diagnóstico e/ou esclarecimento de

procedimentos em geral, você consulta a família antes de conversar com o

paciente? Porquê?

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13 – Existem outras situações que você acha que é preciso esclarecer mais

detalhadamente o paciente? Quais?

14 – Alguma vez algum paciente já disse a você que recusava fazer alguma das

coisas que você indicou para ele? O que aconteceu?

15- Como você reage à participação e crítica do paciente em relação ao

atendimento oferecido por você?

16– Como você reage ao não cumprimento por parte do paciente em relação as

suas orientações ou determinações?

17 - Você acha que existe algum limite para o respeito a autonomia?

18 - O que significa para você a palavra vulnerável?

19- Você considera a população que você atende vulnerável? Comente.

20 - Você vê relação entre autonomia e a vulnerabilidade da população

atendida?

21 - Seu curso de graduação propiciou discussão sobre o tema de nossa

pesquisa? Em que disciplina? Existiram outros momentos e espaços para tal

discussão, descreva.