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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ CAMPUS DE CAICÓ DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO CERES ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA ANANÍLIA MEIRE ESTEVÃO DA SILVA REPRESENTAÇÕES NEGRAS EM OITEIRO DE MADALENA ANTUNES CAICÓ 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ

CAMPUS DE CAICÓ – DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO CERES

ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA

ANANÍLIA MEIRE ESTEVÃO DA SILVA

REPRESENTAÇÕES NEGRAS EM OITEIRO DE MADALENA ANTUNES

CAICÓ

2016

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ANANÍLIA MEIRE ESTEVÃO DA SILVA

REPRESENTAÇÕES NEGRAS EM OITEIRO DE MADALENA ANTUNES

Trabalho de Conclusão de Curso, na

modalidade Artigo, apresentado ao Curso de

Especialização em História e Cultura Africana

e Afro-Brasileira, da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, Centro de Ensino

Superior do Seridó, Campus de Caicó,

Departamento de História, como requisito

parcial para obtenção do grau de Especialista,

sob orientação do Prof. Dr. Joel Carlos de

Souza Andrade.

CAICÓ

2016

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 05

2 OITEIRO: O ENGENHO DAS MEMÓRIAS.......................................................................08

3 DA “CASA GRANDE À SENZALA”: VOZES NEGRAS..................................................12

4 MADALENA VAI À ESCOLA: PROPOSTA DIDÁTICA..............................................22

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 24

FONTES ................................................................................................................................... 27

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 27

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REPRESENTAÇÕES NEGRAS EM OITEIRO DE MADALENA ANTUNES

Ananília Meire Estevão da Silva1

Joel Carlos de Souza Andrade – Orientador2

RESUMO

Este trabalho analisa a recepção do romance Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça (2003),

escrito por Madalena Antunes, no cenário literário potiguar da década de 50, bem como os

elementos narrativos e culturais utilizados pela escritora para representar os personagens

negros presentes no romance. Metodologicamente a pesquisa desenvolveu-se com base em

produções bibliográficas acerca da romancista, do negro e suas representações na literatura

potiguar. Considerando os respectivos contextos históricos e sociais, o percurso traçado

permite observar se o estigma de negatividade ou a invisibilidade negra, comum na literatura

brasileira, são refutados ou confirmados pela autora. Por fim, é proposta uma sequência

didática para leitura e discussão da obra em sala de aula.

PALAVRAS-CHAVE

Romance. Potiguar. Madalena Antunes. Sala de Aula.

1 Discente do Curso de Especialização em História e Cultura Africana e Afro-Brasileira – Universidade Federal

do Rio Grande do Norte (UFRN), Centro de Ensino Superior do Seridó (CERES), Campus de Caicó,

Departamento de História (DHC). Graduada em Letras pela UFRN, CERES, Campus de Currais Novos.

Professora da Rede Estadual de Ensino, na Escola Estadual Virgílio Furtado (Lajes Pintadas-RN) e na Escola

Estadual Desembargador Vicente Lemos (Senador Elói de Souza-RN), onde ministra as disciplinas de Língua

Portuguesa, Língua Espanhola, Língua Inglesa e Filosofia. E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Altos Estudos em História pela Universidade de Coimbra – Portugal. Professor do DHC, CERES,

UFRN. E-mail: [email protected].

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1 INTRODUÇÃO

É do presente que parte o chamado ao qual a

lembrança responde.

Ecléa Bosi

Em 2016, são comemorados dezesseis anos de homologação da Lei Federal 10.

639/03, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/ 1996),

obrigando a inclusão da temática “História e cultura afro-brasileira” no currículo oficial da

rede de ensino, em especial nas disciplinas de História, Língua Portuguesa e Artes.

A Lei 10.639/03 representa uma oportunidade para a escola reavaliar sua estrutura

curricular e cultural, refletindo a diversidade étnica, política e sociocultural presentes na

sociedade brasileira e entre os muros das instituições escolares.

Muitas pesquisas têm sido realizadas no intuito de ofertar aos docentes material

teórico-pedagógico para que as salas de aula se tornem espaços de valorização das relações

étnico-raciais, da diversidade, da equidade e da justiça social. No entanto, decorrido o período

de implementação da lei, é perceptível os desafios que ainda se colocam à formação de

professores para o exercício de uma prática pedagógica que aborde os aspectos afro-

brasileiros. Estes vão desde a escassa oferta de cursos de formação inicial e continuada que

abordem a temática, a resistência da comunidade escolar ou de seus gestores à ausência de

material didático e ações efetivas para a introdução de história e cultura africana e afro-

brasileira nos currículos escolares, pois o sistema educacional reproduz, por vezes, práticas

discriminatórias e racistas.

O curso de especialização em História e Cultura Africana e Afro-brasileira, oferecido

pela UFRN/CERES, constituiu um destes espaços de formação e reformulação de conceitos e

ideias acerca da cultura afro-brasileira, contribuindo para a pesquisa do tema, a realização de

experiências, a análise e a produção de material didático no ambiente escolar.

Partindo destes pressupostos e compreendendo que a ficção baseada na História pode

fornecer informações complementares ao discurso histórico, assim como a leitura é um dos

valores sociais importantes para a construção sócio educacional dos indivíduos, facilitando a

compreensão do universo no qual está inserido, este trabalho de pesquisa propõe a análise do

romance Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça (1958; 2003) da escritora potiguar Maria

Madalena Antunes Pereira.

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Pretendeu-se observar como ocorre a representação do negro na literatura

memorialista do Rio Grande do Norte e sugerir atividades didáticas que possam abordar o

gênero literário romance e a temática negra em sala de aula. Para tal, tornou-se imprescindível

refletir acerca da recepção do referido romance no cenário literário potiguar da década de 50,

período de seu lançamento, bem como os elementos e os recursos narrativos que são

empregados para dar visibilidade e representar o negro sem reafirmar seu espaço de reclusão

na literatura brasileira ou a criação do estigma de negatividade criado à sua volta.

Três fatores contribuíram para a idealização deste trabalho. O primeiro deles foi a

elaboração da narrativa na perspectiva memorialística, retratando a sociedade potiguar, a

partir da cidade de Ceará-Mirim, no período de transição entre os últimos anos da Monarquia

e a chegada da República. O segundo fator consiste na obra de Madalena Antunes ser uma

literatura de escrita feminina que se destaca em um período de ausências das mulheres no

campo literário. E, por último, a escritora dá visibilidade e voz aos personagens negros

presentes na obra através da oralidade, retomando os contadores de histórias tradicionais, os

griots.

Apoiada nas teorias que permeiam a História Oral e a História do Discurso, esta

pesquisa se desenvolveu a partir do levantamento bibliográfico acerca do negro e sua

representação na literatura brasileira objetivando perceber a frequência em que são citados,

bem como a imagem ou estigma que lhe é referenciado. Foram ainda analisadas como as

formas de oralidade, presentes na obra em estudo, atribuem lugar de destaque às personagens

Tonha e Patica. Em seguida, comparou-se os dados coletados com as análises da obra Oiteiro:

memórias de uma sinhá-moça(1958; 2003) no intuito de perceber como estes dialogam ou se

distanciam, considerando seus respectivos contextos históricos e sociais.

Na execução deste trabalho foram empregados os pressupostos teóricos da pesquisa

qualitativa sob uma abordagem descritiva e interpretativa dos aspectos estudados. Conforme

Oliveira (2007, p. 60),

a pesquisa qualitativa pode ser caracterizada como sendo um estudo detalhado de

um determinado fato, objeto, grupo de pessoas ou ator social e fenômenos da

realidade. [...] Visa buscar informações fidedignas para se explicar em

profundidade o significado e as características de cada contexto em que encontra o

objeto de pesquisa.

Neste sentido, a pesquisa qualitativa considera a relação existente entre o mundo real

e o sujeito, buscando interpretar a realidade a partir de uma visão globalizante, complexa.

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Endossaram esta pesquisa os estudos de Ayala (2003) e Cascudo (1978) acerca da

cultura e da tradição popular enquanto fazer dissociadas da vida. Quanto às orientações

teórico-metodológicas para abordagem do tema História e cultura africana e afro-brasileira em

sala de aula foram consultados os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Orientações

Curriculares Nacionais (1999a; 1999b) que regulamentam o sistema educacional de ensino

no país, bem como a Lei 10.639/03 que implementa a obrigatoriedade da temática negra nas

instituições escolares. Para reflexão acerca dos narradores, foi consultado Benjamin (1994).

Quanto ao espaço ocupado por Madalena Antunes e a recepção de Oiteiro (1958; 2003) na

literatura potiguar abordou-se Cunha e Duarte (2001), Gurgel (2001) e Gurgel et al (2003).

Embora este trabalho e seu embasamento teórico estejam voltados para as observações

realizadas na pesquisa bibliográfica e análise da obra, compreende-se e julga-se serem

necessárias, tendo em vista que o objetivo deste curso de formação é a aplicação do

conhecimento adquirido pelos docentes nas escolas, sugestões de atividades para que o

romance Oiteiro (1958; 2003) possa ser trabalhado em sala de aula, pois as dificuldades

enfrentadas quanto ao ensino de literatura e formação de leitores competentes são de grandes

proporções. Portanto, sobre a literatura e sua relação com o ensino nos mais variados níveis

(infantil, fundamental e médio), bem como a leitura e sua dimensão individual e coletiva,

foram consultados Todorov (2009) e Cosson (2011).

O presente artigo está distribuído em quatro tópicos. O primeiro, “Oiteiro: o engenho

das memórias” aborda a literatura de autoria feminina no Rio Grande do Norte, apresenta ao

leitor a escritora Madalena Antunes Pereira e a obra Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça

(2003), contextualizando-a em seu tempo e espaço.

O segundo tópico “Da ‘casa grande à senzala’: vozes negras”, apresenta a análise da

obra, enfatizando a notoriedade que é destinada aos personagens negros, em especial a Tonha

e Patica, negras da casa grande, mostrando como estas influenciaram na educação da menina

Madalena e como retomam os narradores de histórias tradicionais. Aborda-se a visibilidade

atribuída ao sentimento dos negros na senzala nos momentos que antecederam a abolição da

escravatura.

No terceiro tópico “Madalena vai à escola: proposta de sequência didática”, é

proposta uma atividade para trabalhar de forma interdisciplinar o romance estudado em sala

de aula. Em nossas considerações finais, refletimos sobre as formas de representação dos

personagens negros contidos na obra e sobre a importância do romance Oiteiro memórias de

uma sinhá-moça (1958; 2003) para a literatura potiguar.

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2 OITEIRO: O ENGENHO DAS MEMÓRIAS

O universo literário nacional é constituído por obras de autores consagrados – os

cânones – e de outros ainda pouco conhecidos, digamos periféricos, por não estarem no centro

das discussões referentes à literatura. Com base neste quadro, surge em 2003 a Coleção Letras

Potiguares3, com o intuito de divulgar o trabalho desenvolvido por autores da literatura

potiguar cujas obras em prosa constituem algumas das mais marcantes do estado - algumas

delas esgotadas no campo editorial há tempos - e que devido a esse fato ainda não alcançaram

o devido reconhecimento frente ao público leitor. O projeto, fruto da parceria entre a A.S.

Editores, o Governo do Estado e a Cosern, reuniu escritores que se destacaram nos mais

diversos gêneros literários (romance, pesquisa historiográfica, contos, entre outros). Dentre as

obras que compõem a referida coleção está o romance memorialístico Oiteiro: memórias de

uma sinhá-moça, da escritora Madalena Antunes.

Em Informação da Literatura Potiguar (2001), Gurgel pontua que a produção literária

potiguar tem sido modesta nos gêneros voltados à memorialística ou às biografias. São

destacados em seus estudos apenas os títulos Memórias de um retirante (1957) do martinense

Raimundo Nonato e Província submersa (1957) do macaibense Octacílio Alecrim, narrando

suas migrações para Mossoró e para o Rio de Janeiro, respectivamente. Gurgel (2001, p. 113)

destaca entre os poucos escritores de memórias Madalena Antunes Pereira como aquela que

se tornaria a mais importante memorialista potiguar, incluindo-se também a contribuição

masculina, pois seus registros literários transcendiam o “meramente biográfico, revelando-se

[...] atenta observadora do universo marcado pelo fausto da cultura canavieira, refletida no

poderio de alguns senhores de Engenho, na incomparável beleza do vale, no romantismo das

sinhazinhas”, registrando tudo o que tinha importância.

2.1 Madalena Antunes na literatura potiguar

O Rio Grande do Norte esteve subitamente envolvido na Segunda Guerra Mundial.

Por sua posição estratégica e proximidade com o continente africano o campo de pouso,

posteriormente conhecido como “Trampolim da Vitória”, construído ainda nos anos 30, na

cidade de Parnamirim, foi determinante à vinda das tropas aliadas americanas ao Estado.

Entre os anos de 1942 e 1945, Natal recebeu um expressivo número de soldados americanos

3 O box da referida coleção constam dez obras da literatura potiguar, a saber: A Botija – Clotilde Tavares;

Gizinha – Polycarpo Feitosa; Mamulengo: o teatro mais antigo do mundo – Franco Jasiello; Os mortos são

estrangeiros - Newton Navarro; Oiteiro – Madalena Antunes; Os de Macatuba – Tarcísio Gurgel; Estórias

gerais – Jaime Hipólito; O rio da noite verde – Eulício Farias de Lacerda; A medicina popular – Iaperi Araújo e

Pequenas catástrofes – Pablo Capistrano.

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cuja finalidade era impedir o avanço do exército alemão no continente africano. Com o fim da

guerra, a capital potiguar volta a se dedicar mais detidamente às atividades literárias que

estiveram reduzidas neste período.

Conforme Gurgel et al (2003), neste pós-guerra, a cidade presencia o

(re)aparecimento de jovens escritores e poetas talentosos que, atuando na imprensa local,

passam a publicar seus trabalhos em suplementos literários que circulavam como parte

integrante dos jornais dominicais. Entre eles, destacam-se Antonio Pinto de Medeiros, Celso

da Silveira, Berilo Wanderley, Sanderson Negreiros, Oswaldo Lamartine, José Bezerra

Gomes e Zila Mamede.

Embora, em 1912, já houvesse publicado textos diversos e cartas que simulavam a

correspondência entre duas amigas nos jornais de circulação local como “O Ceará-Mirim”, “O

sonho” e “Esperança”, editados e de circulação na cidade de Ceará-Mirim, sob os

pseudônimos de Corália Floresta, Hortênsia e Ildarisa Flores, é neste contexto literário pós-

guerra que se destaca a figura da escritora Madalena Antunes com o romance Oiteiro:

memórias de uma sinhá-moça (1958), obra que se tornaria a mais significativa do gênero no

estado.

Até meados do século XX, o papel da mulher na sociedade estava relegado à função

matriarcal e seus desejos sob o domínio masculino, ocasionando um “confinamento

doméstico e a repressão da mulher” (SCHOLZ, 1996, p. 16). Sobre esse aspecto nos diz

Gotlib (In: LINO e SILVA, 2004, p. 25):

Embora reconheça exceções, o quadro geral da condição da mulher no

século XVIII prolonga-se até o século XIX, que a crítica conhecia muito

bem, como boa leitora de Eça de Queirós e de Machado de Assis (...)

“Dessas doces donzelinhas, ariscas e sonsas, das ácidas donzelas que, não

encontrando marido, se agregavam a parentes, em suas casas vegetando

quase como aias, (...), dessas matriarcas decididas, não raro despóticas,

compunha-se a sociedade real, e a que povoava a ficção”.

O olhar para a mulher como ser inferior, percebida pelo sexo masculino como

desprovida de desejos e vontades, por vezes de inteligência, ‘coisificada’, objeto de admiração

a ser exposto, influenciavam e produziam muitos dos preconceitos ao papel da mulher na

literatura e em outras atividades, destinadas quase exclusivamente ao homem.

De acordo com Silva (2006, p. 22), historicamente as mulheres não ousaram tanto

subverter a ordem estabelecida no campo da ficção, pois

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sempre estiveram submetidas a uma lógica de interpretação baseada no

poderio ou domínio masculino, sem referencial e força para poder inverter,

subverter ou desestabilizar a ordem em que eram interpretadas.

Assim, a literatura de autoria feminina conta, ao longo da história, com inúmeras

ausências. Conforme aponta Gotlib (LINO e SILVA, 2004, p. 24) são “mulheres que nunca

escreveram, que escreveram mas não mostraram ou não publicaram, que publicaram mas não

foram divulgadas ou não se consagraram”, por vezes atreladas aos preconceitos que ainda

permeiam a sua condição social. Desse modo, “a palavra da mulher na literatura, na medida

em que aprofunda o autoconhecimento e o conhecimento do outro, também tem sua

responsabilidade política” (CUNHA apud SILVA e RIBEIRO, 2004, p. 23).

Apenas após a segunda metade do século XX, iremos encontrar com maior frequência

valorosas obras de autoras como Adélia Prado, Lygia Fagundes Teles, Lya Luft, Hilda Hilst,

Lúcia Miguel Pereira entre outras. Entretanto, as obras de autoria feminina que estão

relegadas às fronteiras regionalistas, para quem o reconhecimento em âmbito nacional é ainda

distante, acabam não compondo este cânone. Nesse sentido, é no momento em que poucas

mulheres participavam da vida literária brasileira que Madalena Antunes lança seu romance

de memórias.

Madalena Antunes Pereira nasceu em 25 de maio de 1880, no Engenho Oiteiro, no

Vale do rio Ceará-Mirim, na cidade de Ceará-Mirim/ RN. Era filha do coronel José Antunes

de Oliveira e Joana Soares de Oliveira, importante família da região. Tinha por irmãos

Ezequiel Antunes de Oliveira e os poetas Etelvina Antunes de Lemos e Juvenal Antunes de

Oliveira. Para Luís Câmara Cascudo, era uma típica sinhá-moça brasileira, assim descrita:

“(...) mãe e avó, criada em engenho de açúcar, com mãe preta, educada em colégio do Recife

(...)” (In: ANTUNES, 2003: 19).

Por não demonstrar avanço nos estudos, foi obrigada pelo pai a ser aluna interna do

Colégio São José, no Recife. Em 06 de junho de 1891, aos onze anos de idade, ingressou para

o referido colégio. Estava na pré-adolescência e Oiteiro (1958) bem retrata essa viagem e sua

estada na instituição, onde tradicionalmente estudavam as moças ricas da região.

Casou-se com Olympio Varela Pereira, industrial da cana-de-açúcar, passando a

assinar Maria Madalena Antunes Pereira. O casal teve cinco filhos: Abel Antunes Pereira,

Ruy Antunes Pereira, Vicente Inácio Pereira, Maria Antonieta Pereira Varella e Joana D´Arc

Pereira do Couto. Anos mais tarde mudou-se com a família do Engenho Oiteiro para Natal,

instalando-se no bairro do Tirol.

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Conviveu com intelectuais como Luís da Câmara Cascudo, Manoel Rodrigues de

Melo, Esmeraldo Siqueira, Veríssimo de Melo, Nilo Pereira e outros. E deles, em especial,

Câmara Cascudo, Nilo Pereira e da amiga Palmira Wanderley recebeu incentivo para publicar

seus manuscritos. Com a publicação, em 1958, do seu livro Oiteiro: Memórias de Uma Sinhá-

Moça, ficou conhecida como a ‘Sinhá-Moça do Oiteiro’.

Durante algum tempo manteve em Ceará-Mirim um salão literário, onde ocorriam

animados saraus, frequentados pelos intelectuais da época. Madalena Antunes faleceu em 11

de junho de 1959, na casa onde veio residir em Natal.

2.2 O lançamento de Oiteiro

Aos 78 anos, Madalena Antunes lança seu único escrito que seria o primeiro romance

memorialista do nordeste (TAVARES, 2014). Sobre sua qualidade e importância literária,

assim como sua característica de reminiscência Cascudo (In.: ANTUNES, 2003, p. 19)

pontua:

difíceis de encontrar entre os homens, não conheço muitos volumes de

reminiscências escritos por mão feminina. Helena Morley creio ser uma

exceção ilustre, com a deliciosa Minha vida de menina. Nós, do Rio Grande

do Norte, teremos a honra de lavrar um tento, adiantando a Rainha do

tabuleiro de xadrez.

Oiteiro (2003) é, pois, considerado uma obra rara por serem poucas no Brasil as

escritas femininas sob a perspectiva memorialista e autobiográfica, especialmente, em um

momento cuja imprensa e o poderio literário ainda atravancavam a abertura para as mulheres

escritoras.

Pode-se perceber que imensa era a ansiedade dos intelectuais para o lançamento do

romance de memórias da sinhá-moça Madalena, acontecimento raro na sociedade da década

de 50. Por intermédio de Câmara Cascudo e Nilo Pereira, o rascunho chegou à Editora

Pongetti, no Rio de Janeiro, e o livro foi publicado com o apoio da Casa Euclides da Cunha,

pela Coleção Nísia Floresta, sendo reeditado quarenta e cinco anos depois, em 2003, como já

explicitado.

Na ocasião, Antunes recebeu a visita da senhora Maria Tereza, redatora-chefe da

Revista “Da mulher para mulher” (1958), vinda do Rio de Janeiro apenas para entrevistá-la.

Mas, apenas ao final dos anos 90 o romance a autora receberiam a devida atenção dos críticos

e estudiosos da literatura potiguar, quando Constância Lima Duarte e Diva Cunha inserem no

livro Literatura do Rio Grande do Norte: antologia (2001), no qual reúnem informações

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sobre produções da literatura norte-riograndense, trechos do romance Oiteiro (2003),

conferindo-lhe destaque no cenário da literatura potiguar.

2.3 Resumo da obra

Em Oiteiro (2003), Madalena Antunes narra suas lembranças desde o início de sua

vida escolar, aos 7 anos de idade, até sua saída do Colégio São José, no Recife e retorno a

Ceará-Mirim, ao seus 16 anos. Historicamente, este recorte temporal é marcado pela riqueza

açucareira nos séculos XIX e XX, abarcando o fim do período monárquico e início da

República no Brasil. Através de suas reminiscências tornam-se perceptíveis as transformações

no contexto histórico e social desde a Lei Áurea até a crise açucareira vivida no país no início

dos anos 30.

Suas páginas estão recheadas com as lembranças da menina Madalena, que viveu o

período dos engenhos de cana-de-açúcar, com suas moendas e escravos na região do Vale do

Ceará-Mirim. Ao longo de vinte e sete capítulos, Antunes (2003) evidencia aspectos sociais,

históricos e culturais no qual estava inserida. Seguindo uma linearidade temporal, entremeada

por flashbacks, a autora convida o leitor para um pacto narrativo e lhe relata as histórias e

lendas ouvidas das escravas Tonha e Patica, consideradas instigantes para sua imaginação.

Antunes (2003), conta, pelo fio da memória, não só as proezas de Tonha, sempre

presente em suas lembranças, mas também sua trajetória no colégio interno, feiras, hábitos,

modos de vida, dificuldades da época, personagens da sociedade cearamirinense, as férias no

Oiteiro, o sentimento dos negros nas senzalas diante da abolição a escravatura e os castigos

sofridos por estes antes dela, a falência dos senhores da cana-de-açúcar, a paisagem dos

engenhos, a educação destinada pelas famílias aos filhos, dentre outros fatores sociais,

econômicos e históricos. Enfim, à medida que a personagem-narradora conta suas memórias

surgem também os processos de mudança ocorridos na sociedade brasileira.

3 DA “CASA GRANDE À SENZALA”: VOZES NEGRAS

Conforme Duarte (2013), a presença do negro na literatura brasileira é escassa, seja

como personagem no repertório literário, seja como voz autoral. Ele atribui ao histórico

processo de escravização os preconceitos e a redução do escravizado a mera força braçal, a

sensualidade ou a disponibilidade para o sexo e aponta que

por outro lado, não se pode também ignorar a situação adversa existente a

partir do treze de maio, marcada pela ausência de direitos mínimos como

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escolarização e saúde, e pelo tratamento excludente que manteve boa parte

dos remanescentes do regime servil num estágio de dependência que,

durante décadas, redundou em efetivo sequestro de sua cidadania.

Acrescente-se a isto a postura elitista que desqualifica gêneros literários

tidos como “menores”, a exemplo da crônica e do memorialismo, bem como

os textos marcados por posicionamentos mais incisivos quanto a

desigualdades sociais, em especial no tocante às questões de raça e

etnicidade. (DUARTE, 2013, p. 146 – 147)

Mesmo com a assinatura da Lei Áurea o negro alforriado permaneceu cativo do seu

senhor como forma de garantir para si um meio de sobrevivência. Este é então relegado à

margem social e tem suas memórias deletadas dos arquivos da história, sem representação no

cenário literário brasileiro que lhe reserve alguma dignidade, pois cumprem sempre o papel de

contraventores, escravos, mendigos, profissionais do sexo. Sua imagem está sempre associada

ao estereótipo de negatividade. O negro passa a inexistir enquanto ser pensante, guardião de

uma memória tanto individual quanto familiar ou comunitária.

Embora críticas e denúncias quanto à situação de exclusão e discriminação dos negros

tenham sido realizadas por escritores como Machado de Assis, Lima Barreto e Maria Firmina

ao longo da história literária é apenas na contemporaneidade que eles ganham, enfaticamente,

outro perfil a partir dos escritos de Cuti, Cristiane Sobral, Conceição Evaristo, entre outros,

que tem na denúncia dos preconceitos um dos pontos constituintes de seus projetos literários.

Contrapondo o que seria habitual no campo literário brasileiro na década de 50, em

Oiteiro (2003) a escritora dá voz às escravas Tonha e Patica, conferindo-lhes poder por meio

da oralidade ao cantar canções de ninar ou ao contar histórias, retomando as formas

tradicionais de contação em que todos se sentam em volta do narrador, do Griot, pois ele é o

detentor de toda a experiência narrativa e guardião da palavra.

Narrado em primeira pessoa, Oitieiro (2003) se caracteriza como um romance

memorialista de cunho autobiográfico, pois faz uso da reminiscência para lembrar e conservar

certa nostalgia, pois “no outono da vida, recordar a infância é abrir pontos de luz na estrada

abandonada do passado” (ANTUNES, 2003, p. 29). Conforme Lejeune (apud SILVA, 2014,

p. 264), para que “haja autobiografia (e, numa perspectiva mais geral, literatura íntima), é

preciso que haja relação de identidade entre o autor, o narrador e o personagem”,

característica perceptível em toda a obra de Antunes.

Voltaremos dentro de um mês; são poucos dias, apenas; é só internar a

menina e toca pra casa. [...] Aquelas palavras apunhalavam-me. Todos

voltariam, menos eu! Que horror!

(ANTUNES, 2003, p. 46-47)

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O romance apresenta um narrador autodiegético, ou seja, que relata a história sendo

também seu protagonista. Assim como transcrito no trecho acima, é perceptível em toda a

obra o mesclar dos fatos históricos e as impressões pessoais da autora acerca de como estes

foram recebidos e influenciaram a vida no espaço social em que viveu.

A personagem-narradora já na primeira página convida o leitor a voltar no tempo até

1887, “estávamos no Oiteiro. A folhinha pregada à parede vasta da sala de jantar marcava 25

de maio de 1887, dia do meu aniversário. Eu fazia 7 anos” (TAVARES, 2003, p. 29), data em

que ganha de presente uma carta de ABC para iniciar a vida escolar e a partir daí começa a

narrar suas aventuras e angústias da vida no engenho.

Conforme cita Gurgel (2001), no decorrer da narrativa torna-se perceptível as diversas

relações sociais vivenciadas por Antunes (2003), incluindo-se muitos momentos com as

escravas Tonha e Patica, sua mãe-preta.

Como conheci a Patica? No alvorecer da minha primeira infância, guiando-

me os incertos passos com entranhada dedicação.

Penteava-me os cabelos, vestia-me com esmero, zelava pelo meu asseio

corporal, cuidava da higiene alimentar e foram sem contar as noites passadas

em claro, quando eu, doente, embalando-me o punho da rede, sonolenta,

cantarolava, maviosa:

‘Dorme, filhinha

Que eu tenho que fazer

Vou engomar, vou costurar

Camisinha pra você

Ah!... Ah!... Ah!... É... É... É...’ (ANTUNES, 2003, p. 75)

A rememoração de um tempo infantil será confirmada na primeira oração do livro

“recordar a infância é abrir pontos de luz na estrada abandonada do passado” (ANTUNES,

2003, p. 29), anunciando que a narradora autodiegética contará ações transcorridas em tempos

idos, empregando o recurso do flashback regressará à infância para revivê-la, entremeando

passado e presente.

A oralidade faz-se muito presente nas memórias de Madalena Antunes. A todo

instante, ao relembrar algo, o leitor é surpreendido com uma cantiga, um poema. Na narrativa,

a personagem Patica retoma o papel dos narradores tradicionais e os momentos de contação

de suas histórias são o grande evento nas noites do engenho Oiteiro.

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Nas noites calmas do Oiteiro, a Patica sentava-se no chão do alpendre

da nossa casa de campo, punha no colo o menor dos meus

irmãozinhos, os maiores em roda, e passava a contar histórias de

Trancoso, invariavelmente começadas: ‘Foi um dia...’ (ANTUNES,

2003, p. 78)

A expressão “foi um dia”, presente na voz de Patica é uma variante do “era uma vez”,

referenciando a infância e suas narrativas tradicionais. Os grilhões da escravidão não

prenderam a imaginação narrativa de Patica. Ela conserva o encanto e a simplicidade dos

narradores orais. Encanta as crianças por meio da palavra ao contar-lhes as histórias da

“Moura torta”, do “príncipe encantado”, da “Maria Borralheira”, a novela dos três cavalos

“Rompe Ferro, Rompe Nuvens e Corre-mais-que-vento” e a lenda de “Manoel e Maria”. É

perceptível a readaptação dos títulos dos contos “Maria Borralheira” e “Manoel e Maria”,

fazendo alusão a “Gata Borralheira” e “João e Maria”, respectivamente. Pertencentes à

oralidade, estas narrativas tradicionais são contos de ensinamento, pois têm a função de

repassar à criança conselhos e lições. Entre as histórias contadas por Patica, a menina

Madalena considera a do “Príncipe Diniz e de Rosinha” a mais bela. O capítulo sete, “As

lendas” é todo dedicado a sua transcrição, concomitante, a sua narração pela amada Patica,

ganhando estas destaque na obra, a narrativa e a voz da mulher negra.

Segundo Walter Benjamin, o narrador tradicional encarna a figura do conselheiro, este

é a transfiguração da experiência. “O grande narrador tem sempre suas raízes no povo,

principalmente nas camadas artesanais” (BENJAMIN, 1994, p. 214). Dessa forma, podemos

perceber que há uma retomada dessa função narrativa como o ato de aconselhar, de salvar

pela palavra na figura da mulher narradora seja ela Sherazade, salvando a própria vida noite

após noite; seja ela Penélope, tecendo os fios para desfazê-los ao escurecer; seja a negra

Patica, encantando as crianças nas noites enluaradas do Oiteiro, momento que a salvava da

realidade escrava e sua imaginação a tornava livre.

O poder da palavra geradora se manifesta através de uma voz que é feminina e negra.

Este poder também está presente nos mitos das Sibilas que “simbolizam o ser humano

elevado a uma condição transnatural, que lhe permite comunicar-se com o divino e transmitir

as suas mensagens: é o possuído, o profeta, o eco dos oráculos, o instrumento de revelação”

(CHEVALIER e GHEERBRANT, 1996, p. 832).

O encantamento dos momentos de contação exerce sobre a criança Madalena tamanho

poder de sedução que, mesmo já no colégio São José, Patica permanece na memória da

sinhazinha com suas histórias de Trancoso.

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Assistindo aquelas aulas, reportei-me muitas vezes ao Oiteiro, e a

Patica, minha mãe-preta, surgia à mente com todo o seu calendário de

histórias de Trancoso, contadas ao luar, sob o alpendre da nossa

pitoresca morada de engenho. (ANTUNES, 2003, p. 73)

Embora os contos citados na obra sejam de origem portuguesa, estes podem denunciar

a possível origem africana de Patica. Esta pode ser proveniente da África-subsaariana, região

composta por países africanos situados ao sul do deserto do Saara cujas sociedades mantêm

intensa relação com a oralidade para aquisição do conhecimento, transmitido às gerações por

meio das palavras proferidas cuidadosamente pelos guardiões da tradição oral – tecelões,

carpinteiros, caçadores, griots. A palavra tem um valor sagrado, pois apenas uma pode causar

a guerra ou proporcionar a paz. A África-subsaariana foi colonizada no século XIX por

franceses e portugueses, fato que explicaria a adaptação dos títulos dos contos acima

mencionados e indicaria a origem de Patica.

Mãe-preta e ama de leite de Madalena Antunes, Patica é assim descrita por esta:

Patica foi batizada por Francisca. Minha mãe chamava-a de Chica,

cabendo-me, no balbucio das primeiras palavras, crismá-la de Patica.

Era alta e corpulenta, pele de ébano, descendente de africanos. Os

cabelos negros e pixains, presos ao casco da cabeça, semelhavam um

maço de linha de crochê desmanchando. A fronte estreita sumia-se

dentro de rosquinhas miudinhas a brilharem após o banho, quando

pingos d’água ficavam presos àquela semelhantes a arame.

[...] De gênio bom e serviçal, conquistou cedo a estima e

complacência dos senhores. Vindo ao mundo a primeira filha destes,

destinaram-na para minha ‘mãe-preta’. (ANTUNES, 2003, p. 76 - 77)

Com estas características físicas, Patica é vista por membros da sociedade como

“Feíssima! Diziam todos” (ANTUNES, 2003, p. 77). Mas os olhos da menina do engenho via

nela toda a beleza de sua etnia, sua doçura e bondade: “Linda! Dizia eu... Cheirava a murta e a

manjericão” (ANTUNES, 2003, P. 77).

À época escravocrata, o negro escravizado era visto pela sociedade como um não

humano, um inerte. Essa ótica também se encontra descrita no romance quando a narradora-

personagem afirma ter lido em determinada ocasião o seguinte escrito:

‘Não vejo nada digno de admiração ou de entusiasmo na conduta

desses escravos fiéis pela inércia. [...] Nessa fidelidade não vejo nada

que seja realmente humano...’

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Quem escreveu estas linhas não conheceu, por certo, a dedicação de

uma serva como a Patica. (ANTUNES, 2003, p. 94)

Ao narrar nas linhas seguintes a forma dedicada, bondosa e amorosa com que os

negros e negras escravizados dedicavam-se durante toda a vida à criação e educação dos

filhos de seus senhores, Madalena foge a este estereótipo e humaniza esse negro serviu, tão

humano quanto qualquer outro cuja inércia citada se dava ao fato de ser visto como coisa, não

gente.

A oralidade, que permeia toda a obra, também se faz presente na transcrição das falas

dos personagens. A exemplo disso, vejamos a fala de uma velha escrava ao reclamar com

Tonha, enquanto esta colocava o dedo no nariz de Pai João em uma fotografia. Este era um

negro velho, portanto, merecedor de profundo respeito e sequer sua imagem podia ser

profanada.

-Este é o retrato de Pai João. A avó da negrinha, uma velha escrava,

dava-lhe um muchicão resmungando: - cala a boca, abiúda

intrometida, tu gostava que dissesse que era o teu fucinho?

(ANTUNES, 2003, p. 38)

Nesta fala se faz presente mais uma vez a cultura ancestral das comunidades

tradicionais, o respeito aos mais velhos por estes personificarem o conhecimento, a

experiência, necessários à perpetuação das gerações.

A negrinha Tonha é outra personagem da infância de Madalena Antunes que está

sempre presente em suas reminiscências, acompanhando-a em todos os momentos da

narrativa. Tonha representa toda a ingenuidade, imaginação, inocência e travessuras que

acompanham o universo infantil.

Tomava parte em nossos serões a negrinha Tonha, esparramada no

chão, coçando os pés e não perdendo uma só história de Patica.

Nos lances às vezes aterradores, de passagens de jiboias engolindo

incautas crianças, fantasmas de um olho só, no meio da testa, correndo

pelos desertos a fazer penitência, as crianças ficavam de olhos

esbugalhados e cabelos em pé.

Nessa altura, cutucava-me a Tonha: - Sinhá Lica, estou toda arrepiada!

Mas os seus grandes olhos de jabuticaba cresciam mais e

arredondavam-se, oscilando como pêndulo de relógio, de um lado a

outro, quando nas novelas aparecia um “lobisomem” e Patica,

encarando-a sisuda, dizia: “Era o homem que comia barro...

(ANTUNES, 2003, p. 81)

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Tonha é a menina espevitada, sincera e atrevida. Cascudo ( In: ANTUNES, 2003),

dado seu imaginário infantil e suas colocações inteligentes e bem humoradas a compara com

outra personagem da literatura, a boneca Emília, personagem do Sítio do Pica-pau Amarelo

de Monteiro Lobato. Uma boneca de carne com olhos de jabuticaba.

A negrinha Tonha tinha um sonho: viajar para a cidade de “Olindra”. Conhecia a

cidade apenas pelos frutos de sua imaginação e curiosidade infantil.

Uma vez me afirmou, em tom confessional, que ia à cidade de

“Olindra”. Decorridos dias, falara num lugar encantador chamado

“Olindra”, onde havia coisas fantásticas e fabulosas. Perguntava-lhe

admirada:

- Tonha, você conhece essa cidade?

- Ora, se eu não conhecesse não falava; e mesmo a gente só fala do

que conhece? Já vi perfeitamente a cidade de “Olindra”, em livros da

estante do Doutô Meira. Quando vou lá com Tetê, minha avó, levá

presente da Sinhazinha pra mulhê do douto, assim que tenho uma

escapula, rumexo nos livro!

[...] Sinhá Lica não sabe daquela moda que fala numa rua de briante só

pra meu bem passiá? Pois aquela rua é na Olindra...

E cantarolava:

‘Si esta rua fosse minha

Eu mandava ladriá

Com pedrinha de briante

Pra meu bem passiá...’ (ANTUNES, 2003, p. 82)

As fantasias de Tonha se expandiam apenas por meio das narrações de Patica.

“Olindra” representava o lugar onde elas poderiam se tornar reais e ultrapassar os limites do

engenho Oiteiro. Empenhada em realizar seu sonho, a negrinha trama sua viagem.

Chegou o dia... Com ares misteriosos, avisou-me:

- É hoje! Guarde segredo não me descubra... Trago pra você, de lá, um

saquinho de briante. Tem muito pela rua.

Prometi. Jurei, até.

E emocionada, olhando-a confiante e esperançosa, na certeza de vê-la

partir: Vá, Tonha, não demore muito, venha logo, sim?, e não esqueça

os brilhantes. (ANTUNES, 2003, p. 83)

Naquela mesma noite, ao jantar, a avó de Tonha, a velha Tetê, dá por falta da neta e

todos se põem a procurá-la. Antunes narra o momento em que a negrinha é encontrada e

chega a fazenda.

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Acordei mais tarde com um ruído no quintal, a cancela batendo, tropel

de cavalos, e logo após gritos partidos da cozinha. Alarmada, chamei

Patica e horrorizada perguntei o que era aquilo. Havia distinguido

gritos de Tonha...

[...] – É a negrinha apanhando pancada para não ser cavilosa... Pois

não é que a pegaram já perto de Santa Cruz dos Gois?

Perguntei a medo:

- Ia à cidade de Olindra?

- Que invenção é essa de cidade de Olindra?, perguntou a cativa

admirada...

- Ela ia ver o saquinho de brilhantes para mim... [...]

[...] – Tudo astúcia daquela sirigaita... Foi só pra levar uma boa sova...

Nunca houve essa tal de Olindra... Ó! Negrinha terrível, já ia passando

do engenho das Imburanas. (ANTUNES, 2003, p. 86)

O trecho acima demonstra também a ingenuidade da menina Madalena que atribuía

veracidade tanto as histórias contadas por Patica quanto as nascidas do imaginário criador de

Tonha. A negrinha Tonha aparentava conhecer o caminho para “Olindra” e o seu poder

imaginativo a fazia acreditar que, depois do engenho, apenas ela existisse e todos os caminhos

a ela levariam. No entanto, sua viagem rendeu-lhe apenas um castigo e não os saquinhos de

brilhante com os quais sonhara.

Sinhá Lica, lá só se fala francês... Já me vou exercitando.

Pasma, perguntava-lhe: Tonha, e o que é francês? Respondia,

estalando a língua: coisa muito fácir: - Faca é garfo; caneta é lápis;

livro, pote onde a gente bebe água; vinho, água; farinha, arroz; e assim

por diante. É só trocá o nome das coisa. O Fabriqueiro lá da Igreja,

quando está contando história do tempo antigo aos meninos, diz que

na torre de Babé foi assim... De repente ficou tudo atrapalhado purquê

começaram com a ganância e Deus castigou, trocando os nome das

coisa. Aí, saiu o inguilês, o francês e o alamão. (ANTUNES, 2003, p.

83 – 84)

No trecho transcrito acima, observa-se marcas da beleza que caracteriza a inocência e

a sabedoria infantil, a idealização de Tonha quanto à cidade de Olinda e o elemento humor

também presente na obra, em especial, nas narrações das suas travessuras e colocações

espontâneas.

Alguns fatos históricos são abordados em Oiteiro (2003), entre eles está a questão

política que envolvia a atmosfera escravocrata, a exemplo da promulgação da Lei

Abolicionista do Ventre Livre, em 28 de setembro de 1871, que considerava libertos todos os

filhos de escravas nascidos a partir desta data. Este aspecto da história pode ser observado

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quando a sinhazinha aponta a negrinha Tonha, sua companheira permanente nas travessuras,

como nascida “já de ‘ventre livre’” (ANTUNES, 2003, p. 38).

Desde meados do século XIX, o Brasil vinha sofrendo fortes pressões da Inglaterra

para abolir a escravatura. Junto com a Lei dos Sexagenários, a Lei do Ventre Livre tinha por

objetivo possibilitar a transição gradual do sistema de escravidão para o de mão-de-obra livre.

Um dos pontos relevantes na obra de Madalena Antunes (2003) é a descrição dos momentos

históricos que antecederam essa transição e a força do movimento abolicionista.

É possível sentir nas páginas do romance a ansiedade daqueles dias, seja dos negros

pela libertação dos grilhões, seja dos senhores de engenhos que perderiam sua mão-de-obra

escrava. Na casa grande, “a Tonha vinha me contar: “Sinhá Lica”, os negos está dizendo na

cozinha que vai tudo se libertá. Cada quá vai pra onde quisé... A Emília dixe que vai pro

Pará... Minha avó Tetê já dançou na cozinha, dizendo que vai pro sertão e me carrega!”

(ANTUNES, 2003, p. 95).

Nas ruas, no mercado, nas conversas, na igreja “os rumores cresciam, avolumando-se,

como as águas de uma enchente. Dos recantos do país chegavam notícias assustadoras para os

escravocratas” (ANTUNES, 2003, p. 96).

Nas senzalas, os nomes dos abolicionistas já ressoavam ao som dos atabaques negros

em festa, felizes com o horizonte que se desenhava país afora.

Os negros mostravam-se nas senzalas vizinhas com semblantes

alegres, refletindo o que confusamente ouviam pelos cafés, no

mercado da cidade, nas “vendas” e espreitavam, à surdina, o interior

das casas dos senhores. Repetiam decorados trechos dos jornais e

panfletos espalhados pela cidade. Falavam de homens chamados José

do Patrocínio, Joaquim Nabuco e principalmente um poeta, Castro

Alves, todos falando e escrevendo a favor dos escravos!

Tonha chegava, esbaforida, da feira dos sábados, e desabafava:

- Sinhá Lica, é verdade, mesmo... Eu ouvi se dizê no mercado, que um

tá de Joaquim Quimbuco é o mais danado de todo a favô dos nego.

(ANTUNES, 2003, p. 96)

Tonha é livre para circular por todos os espaços, da casa grande à senzala, ouvindo as

histórias, os anseios dos negros. Através dela, de sua fala, a voz dos escravos ressoa e se faz

ouvir.

A cada romper da aurora a esperança abolicionista aumentava ainda mais nos corações

dos negros escravizados, seu espírito se preparava para a festa, o brilho no olhar resplandecia,

“o 13 de Maio aproximava-se veloz” e a “liberdade é como o sol, espalhando reflexos mesmo

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antes de aparecer no horizonte” (ANTUNES, 2003, p. 97). A chegada da abolição pelas mãos

da princesa Izabel foi assim descrita por Madalena Antunes: “os senhores atônitos abriram as

cancelas e por elas passaram para o campo da igualdade democrática todos os mártires da

desigualdade sinistra. As senzalas esvaziaram-se por encanto” (ANTUNES, 2003, p. 99).

Diante deste evento histórico, a sinhá-moça do Oiteiro reflete acerca de temas sociais

como a divisão de classes, o preconceito, o racismo, tão escravizantes quanto o trabalho

braçal dos negros agora libertos. Compara-se a eles e se questiona quem seria o escravo, o

verdadeiro cativo. A sinhá confronta sua posição social com a de Tonha, sua companheira de

infância, e percebe que Tonha era liberta das inúmeras convenções sociais, ao contrário dela

que jamais poderia vislumbrar a liberdade, permanecendo para sempre cativa.

Mas Tonha era livre! Bem liberta de preconceitos, de tudo! Sim, bem

ao contrário de mim, a eterna escrava das injunções sociais, do meio,

das épocas, obrigada ainda aos mistérios da minha consciência...

Como teria de invejar, mais tarde, a independência de Tonha!

(ANTUNES, 2003, p. 97)

Em meio a ebulição de sentimentos que via e vivenciava naqueles dias que cheiravam

a liberdade, a sinhazinha ouve a história da escrava Zefa Mulambo que, como tantos outros,

decidiram permanecer nos engenhos por não terem, por vezes para onde ir ou porque nascidos

e crescidos no regime escravista não soubessem fazer outra tarefa a não ser servir, tornando-se

aquela sua vida.

Zefa Mulambo era uma negra de 60 anos que na juventude havia matado o fruto de seu

ventre para que seu herdeiro não viesse ao mundo como escravo e, assim, ter a mesma sorte

que a sua. Esta havia sido a única forma que encontrou para salvá-lo do destino cruel que o

esperava. O aborto realizado por Zefa Mulambo pode ser interpretado como uma das várias

formas de resistência à escravidão, pois não trazia ao mundo mais um negro servil. Agora

liberta, quando convidada a ir embora, deixar a senzala e vingar a morte de seu filho, Zefa

Mulambo responde: “- Vamo-nos embora, Zefa! – Ainda insisti na derradeira solicitação... -

Não! Eu fico aqui mesmo, já me acostumei...” (ANTUNES, 2003, p. 97)

Anos mais tarde, ao chegar no Recife, Antunes rememora alguns fatos marcantes deste

período pós-abolicionista, em especial, recorda de Tonha, “onde estaria ela àquela hora? A

avó levara-a para Angicos, logo após a libertação dos escravos e nunca mais tive notícias da

minha companheirinha de primeira infância” (ANTUNES, 2003, p. 54). No colégio São José

tudo lhe traz recordações do Oiteiro e suas Tonha e Patica. Lembra-se das pedrinhas de

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brilhantes que Tonha dizia ter na “Olindra” de seu imaginário: “só faltava a Tonha! Ah! Se

ela visse tudo aquilo! Mas, Tonha tinha horror a soldado. Lembrei-me também da descrição

que ela fazia da cidade de “Olindra”!... Como já iam longe as pedrinhas de brilhantes...

Encontrá-las-ia, eu, um dia?” (ANTUNES, 2003, p. 58).

Ao descrever momentos vividos no Oiteiro de sua infância, Madalena Antunes

ultrapassa a mera descrição dos fatos históricos referenciados. A narrativa se mistura aos seus

sentimentos de menina diante dos acontecimentos, ressignificando suas memórias, pois elas

saem do individual para abarcar a memória coletiva. Desta forma, a memória aviva a infância

e ela volta a verdejar mesmo quando todos se foram.

4 MADALENA VAI À ESCOLA: PROPOSTA DIDÁTICA

Considerando a importância da obra de Madalena Antunes para o cenário literário

potiguar, bem como o fato de evidenciar os personagens negros presentes em Oiteiro (2003),

este tópico propõe duas sugestões de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula como

recurso a abordar não apenas a temática negra, mas a literatura potiguar, ainda distante das

salas de aula de modo geral.

Três fatores colaboram para esta realidade. O primeiro, os cursos de formação, em

sua grande maioria, não dedicam disciplina específica à Literatura produzida no estado. A

ausência da literatura potiguar nos cursos de formação afeta não só seu aproveitamento no

ensino de literatura, mas no campo das pesquisas acadêmicas, considerando que são poucos os

professores do ensino superior que desenvolvem pesquisas voltadas à literatura do Rio Grande

do Norte (RN). O segundo ponto é o próprio interesse do leitor pela literatura produzida no

RN. Tendo em vista a escassez da procura também há uma redução na oferta e pouco se

observam espaços destinados aos autores potiguares nas livrarias e bibliotecas do estado. O

terceiro e último fator diz respeito as pesquisas sobre a literatura local e ao ensino de literatura

restringirem-se aos muros universitários.

No tocante a obra em estudo, vários são os temas que podem ser trabalhos a partir da

obra de Madalena Antunes em sala de aula, considerando que cada capítulo da obra pode ser

lido separadamente sem que haja prejuízo quanto a sua compreensão. Oiteiro (2003)

redesenha em suas páginas um tempo aristocrático, de senhores de engenho, escravos e

religiosidade fervorosa. Suas descrições detalhadas permitem recriar as condições de vida da

época, a exemplo de uma viagem à Natal ou ao Recife que durava dias, envolvendo vários

meios de transportes, como podemos observar na passagem a seguir:

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Em poucos minutos estávamos a caminho, em direção a Natal. A liteira em

que íamos balançava com o trote ritmado dos cavalos, um na frente, outro

atrás, fazendo adormecer minha irmãzinha no regaço de minha mãe.

[...] A travessia para a cidade era desagradável. As embarcações já

abarrotadas, ainda recebiam animais, malas, e trouxas de roupas.

(ANTUNES, 2003, p. 47 – 55)

Muitos são os temas que podem ser abordados numa perspectiva transdisciplinar,

possibilitando articulações entre as áreas de história, sociologia, filosofia, artes, língua

portuguesa e biologia. No entanto, deve-se atentar que o texto não deverá ser usado como

pretexto à atividade, mas como instrumento auxiliar na compreensão das relações que forem

estabelecidas em sala de aula. Abaixo sugerimos uma atividade que pode ser desenvolvida no

ambiente escolar. Vale ressaltar que esta serve apenas como exemplificação, cabe aos

docentes analisarem a melhor forma de abordagem, considerando seu público discente.

Proposta de atividade

Conteúdo: Racismo e desmistificação da imagem negativa do negro na sociedade, a

partir do cabelo.

Objetivos: Compreender o processo histórico que define os estereótipos de beleza;

Observar e refletir sobre a letra de algumas canções e propagandas veiculadas pela mídia que

abordam como tema o cabelo;

Perceber as formas diferenciadas de tratamento verbal aos cabelos que se aproximam do

estereótipo midiático e europeu e dos que seguem a estética negra;

Pensar os penteados afro como meio de afirmação identitária e cultural;

Pesquisar as denominações mais frequentes empregadas aos cabelos que apresentam

características afro;

Reconhecer a desvalorização social da estética negra e aprender sobre multiculturalidade, as

características inerentes às culturas e a valorizá-las em sua essência.

Recursos: Canções, Contos “Pixaim” e “Garoto de plástico”, ambos de Cristiane

Sobral; Capítulo de Oiteiro (2003)

Disciplinas: Filosofia, Artes, Sociologia, História e Língua portuguesa

Metodologia: 1- Expor aos alunos algumas imagens que apontem o cabelo como tema

principal, observar suas reações à medida que estas lhes são expostas e realizar alguns

questionamentos, como “o que as ilustrações os levaram a sentir?”; 2 - dividir a turma em

pequenos grupos e pedir para que anotem os apelidos mais frequentes direcionados àqueles

que apresentam penteados afro ou que possuem cabelo crespo. Em seguida, suscitar um

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debate com a turma sobre o porquê de tais denominações; 3 – analisar algumas propagandas

voltadas aos cabelos dos negros; 4- analisar as letras das canções “Meu Cabelo Duro é assim” de

Chiclete Com Banana e “Nega do Cabelo Duro” de Luis Caldas; 5 – já sob a perspectiva de

valorização da imagem do negro, ler os contos de Cristiane Sobral e analisá-los; 6 – Ler o

capítulo de Oiteiro (2003) em que Madalena Antunes descreve o modo como Patica era vista

como ser inferior pelos outros e como ela, em contraponto, desconstrói o estigma negativo,

pois só via a beleza de Patica, sempre virtuosa, que mesmo com toda candura “arrastava a

tristeza do banzo africano”, comparando-a ao poema Fiel, de Guerra Junqueiro (ANTUNES,

2003, p. 77); 7 – ouvir canções que entoam a diversidade cultural, como “Cabelo duro” de

Itamar Assunção, interpretada por Zélia Duncan.

Avaliação: Além da participação dos discentes durante os debates que serão

suscitados, poderão ser apresentados trabalhos orais ou escritos tomando por fundamento as

aulas e os textos.

Acima apenas sugerimos formas de trabalho com o texto literário de Madalena

Antunes associado a outros gêneros textuais. A intenção é que estas sirvam apenas de mote

para as infindas possibilidades de atividades que poderão ser realizadas com Oiteiro;

memórias de uma sinhá-moça (2003) em sala de aula. Como afirma Todorov (2009) qualquer

método para o ensino da literatura é bom, desde que eles sejam apenas meios e não a

finalidade principal.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça (2003) apresenta-se como uma ‘tela de

reminiscências’ em que a escritora busca nas suas memórias as inspirações para o ato de

escrever. Sobre sua obra nos diz Antunes (2003, p. 330) “de lembranças, como sua única

substância, alimentou-se todo ele. Para escrevê-lo, não procurei louçania de estilo. Busquei,

apenas, nas imagens e fatos do passado, as pedras verdes das reminiscências.”

A memória, ao evocar o passado, permite a união deste com o presente. Na obra que

acabamos de analisar, torna-se perceptível a ousadia de Madalena Antunes ao produzir um

romance memorialista de cunho autobiográfico, registrando não somente sua vida de menina

moça no Oiteiro, mas projetando os modos de ser e de viver de uma dada época a partir dos

espaços onde viveu, registrando acontecimentos históricos e sociais, a exemplo do processo

de mudança pelo qual passou a história brasileira – abolição da escravatura, ansiedade dos

escravos nas senzalas e a decadência dos engenhos de cana-de-açúcar. Fatores históricos que

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podem ser uma abertura para a leitura do romance, a partir de uma perspectiva

interdisciplinar, em sala de aula.

Em seu romance, Madalena Antunes propõe a partir dos personagens femininos, um

rompimento dos padrões convencionais relacionados à mulher e ao negro na literatura

brasileira.

De acordo com Dalcastagné (2005, p. 36) “as personagens femininas tendem a ocupar

menos tanto a posição de protagonistas quanto de narradoras. (...) Além de serem minoritárias

nos romances, as “mulheres” têm menos acesso à “voz” (...) e ocupam menos as posições de

maior importância”. Quebrando com o ‘padrão’ tradicional da literatura brasileira teremos em

Oitieiro (2003) a personagem-narradora Madalena Antunes e as escravas Tonha e Patica que

também assumem o papel de narradoras dentro da obra.

Outra quebra dá-se por ser a escrita feminina de um romance de memórias, gênero

ainda pouco produzido em nosso cenário literário, realizada em um período de pouca

produção feminina na literatura. Fato ocorrido pelo acesso à educação da menina Madalena,

proporcionada por sua família em fins do século XIX, período em que as mulheres ainda não

tinham acesso a ela. Sua ida ao colégio São José seria decisiva para a elaboração, anos mais

tarde, da literatura que foi analisada. A saudade foi o mote primeiro de seus escritos. Uma

terceira ruptura está relacionada ao espaço destinado aos personagens negros, fazendo-se

ouvir a voz e o sentimento dos negros na senzala, quando da abolição da escravatura e na casa

grande, através de Tonha e Patica. Dessa forma, a presença negra em Antunes (2003) se

distancia do estereótipo de negatividade e lugar de silenciamento destinado ao negro na

literatura brasileira. Apesar de não fugir à realidade social da época e narrar as condições de

vida a que eram submetidos os escravos, confere-lhes visibilidade e não apenas lugar

figurativo, quando destaca por meio das contações a influência da cultura negra na formação

da identidade cultural brasileira, na criação dos filhos desta pátria, da saudade que sentiam de

sua terra e o desejo por liberdade.

É notável também a presença constante da oralidade nas cantigas, benditos, poemas e

nas vozes de Tonha e Patica enquanto contadoras de histórias, retomando os narradores

tradicionais que, por meio da experiência e da imaginação repassem lições de vida aos seus

ouvintes. Madalena Antunes seja de forma direta durante a contação das narrativas ou de

modo indireto, ao retratar o sentimento dos negros na senzala do engenho quando da

assinatura da Lei Áurea atribui voz aos personagens negros presentes no romance.

Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça (2003) oferece ao cenário literário potiguar

valiosa contribuição sociocultural ao apresentar um registro histórico da sociedade potiguar, a

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partir da cidade de Ceará-Mirim do final do século XIX e início do século XX. As memórias

nele presentes enriquecem a obra por revelar detalhes de uma memória coletiva. Daí a

ressignificação das lembranças da sinhazinha Madalena Antunes que, ao evocar aos

momentos históricos, transcende os limites da memória individual, expandindo-se à coletiva

Ao retomar aspectos sociais, Antunes (2003) evidencia a importância historiográfica,

sociológica e etnográfica de sua obra. Neste sentido, ainda são alheios as pesquisas e o

conhecimento do público leitor sobre Madalena Antunes e seu romance. Torna-se

imprescindível que ambos sejam trazidos ao conhecimento de todos e um começo pode ser

desenhado nas salas de aula.

BLACK REPRESENTATIONS IN OITEIRO OF MADALENA ANTUNES

ABSTRACT

This work analyzes the reception of the novel Oiteiro: memórias de uma sinhá-moça (2003),

written by Madalena Antunes, in Potiguar literary scenery of the 50s, as well as the narrative

and cultural elements used by the writer to represent black characters present in the novel.

Methodologically research was developed based on bibliographical productions about the

novelist, black and their representations in Potiguar literature. Considering their historical and

social contexts, the traced route allows us to observe if the stigma of negativity or black

invisibility, common in Brazilian literature, they are refuted or confirmed by the author.

Finally, it proposes a didactic sequence for reading and discussion of the oeuvre in the

classroom.

KEY WORDS

Novel. Potiguar. Madalena Antunes. Classroom.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por permitir a conclusão deste trabalho e conceder toda força e coragem das

quais necessitei para estar aqui. A Ele rendo todas as glórias e louvores, sempre.

Ao meu orientador, Joel Carlos de Souza Andrade, pela paciência e compreensão

quando estas se fizeram necessárias.

Aos companheiros e amigos que encontrei nesta especialização, pela incrível

convivência e por compartilharmos todos os sabores e saberes deste instante.

À coordenação e a todos os professores do Curso de Especialização em História e

Cultura Africana e Afro-Brasileira – CERES/ UFRN, pelo cuidado e compromisso em

partilhar conhecimentos e experiências, com os quais pude (re)aprender conceitos e valores

que influenciarão meu trabalho docente e acadêmico.

Por fim, a todos que nos acompanharam durante o caminho. Que o Deus do Amor e

da Sabedoria abençoe a todos. Que os santos e os orixás nos guiem sempre. Axé!

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ANEXOS

Imagem 1 – Madalena Antunes Pereira aos 40 anos – Arquivo pessoal de Lúcia Helena Pereira.

Disponível em: http://letrasinversoreverso.blogspot.com.br/2008/07/maria-madalena-antunes.html.

Acesso em: 10 de março de 2016.

Imagem 2 - Imagem do arquivo pessoal de Lúcia Helena Pereira, fotografada por Gibson Machado.

Disponível em: <http://tempodamemoria.blogspot.com.br/2013/09/fotos-antigas-dos-engenhos-de-

ceara.html>

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Imagem 3 - Tela pintada pela artista plástica Goreth Medeiros e fotografada por Fernando Chiriboga

para a capa da 2ª edição da obra. Disponível

em:<http://valeverdecm.blogspot.com.br/2011/08/madalena-antunes-pereira-minha-avo-e.html>

Imagem 4 - 1ª Edição – 1958. Lançada pela Editora Irmãos Pongetti/ com o apoio da Casa Euclides da

Cunha/ Coleção Nísia Floresta. Disponível em:

<http://101livrosdorn.blogspot.com.br/2012_04_29_archive.html>

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Imagem 5 - 2ª Edição – 2003 – Lançada pela A.S. Editores/ Coleção Letras Potiguares. Disponível

em: <http://gibsonmachadocm.blogspot.com.br/2010_03_01_archive.html>