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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA CURSO DE GRADUAÇÃO EM TURISMO DEPARTAMENTO DE TURISMO KARINA SANTA ROSA DOS SANTOS O TURISMO COMO AGENTE IMPULSIONADOR DO PROCESSO DE GENTRIFICAÇÃO NA FAVELA DO VIDIGAL: A VISÃO DO SEU MORADOR NITERÓI 2014

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE …app.uff.br/riuff/bitstream/1/1055/1/338 - Karina Santa Rosa.pdf · Que o pobre tem seu lugar’ (Rap da Felicidade, 1994) ... Medeiros

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM TURISMO

DEPARTAMENTO DE TURISMO

KARINA SANTA ROSA DOS SANTOS

O TURISMO COMO AGENTE IMPULSIONADOR DO PROCESSO DE

GENTRIFICAÇÃO NA FAVELA DO VIDIGAL: A VISÃO DO SEU MORADOR

NITERÓI

2014

KARINA SANTA ROSA DOS SANTOS

O TURISMO COMO AGENTE IMPULSIONADOR DO PROCESSO DE

GENTRIFICAÇÃO NA FAVELA DO VIDIGAL: A VISÃO DO SEU MORADOR

Trabalho de conclusão de curso, apresentado ao

Departamento de Turismo da Universidade

Federal Fluminense, como requisito parcial para

obtenção do título de Bacharel em Turismo.

Orientador: Prof. Dr. Aguinaldo César Fratucci

Niterói

2014

S237 Santos, Karina Santa Rosa dos O turismo como agente impulsionador do processo de gentrificação na favela do Vidigal: A visão do seu morador / Karina Santa Rosa dos Santos – Niterói: UFF, 2014.

77 f.

Monografia (Graduação em Turismo)

Orientador: Aguinaldo César Fratucci ,D.Sc.

1. Turismo 2. Gentrificação 3. Turistificação 4. Comunidade do Vidigal 5. RJ 6. UPP 7. Agentes Turísticos

CDD. 338.4791

O TURISMO COMO AGENTE IMPULSIONADOR DO PROCESSO DE

GENTRIFICAÇÃO NA FAVELA DO VIDIGAL: A VISÃO DO SEU MORADOR

Por

Karina Santa Rosa dos Santos

Trabalho de conclusão de curso, apresentado

ao Departamento de Turismo da

Universidade Federal Fluminense, como

requisito parcial para obtenção do título de

Bacharel em Turismo.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________________

Prof Dr. Aguinaldo Cesar Fratucci – Orientador

_______________________________________________________________

Profª. Drª Helena Catão Henriques Ferreira - Convidada

_________________________________________________________________

Prof.ª M.Sc. Lúcia Oliveira da Silveira Santos

Niterói, 01 de Dezembro de 2014.

AGRADECIMENTOS

Antes de qualquer coisa, gostaria de agradecer a Deus, que iluminou o meu

caminho e me deu forças quando mais precisei. Esse trabalho não estaria completo

hoje, se não fosse pela generosidade do meu orientador Aguinaldo César Fratucci,

que durante essa caminhada me ofereceu seu conhecimento, além da paciência e

presença sempre que eu precisei. Agradeço a UFF como um todo, por toda a estrutura

que essa instituição me proporcionou durante esses anos, além de professores

incríveis que ajudaram a construir todo o conhecimento acadêmico que possuo hoje

e que me formaram uma profissional melhor e pronta para o mercado de trabalho. À

comunidade do Vidigal que me recebeu de braços abertos, onde os moradores foram

solícitos em responder o questionário, um muito obrigada especial. Ao diretor da

Associação de Moradores do Vidigal, André Gosi, agradeço por toda a atenção e

ajuda, com uma entrevista detalhada e rica em informações. Por fim agradeço a minha

amiga Raquel Fabro que me ajudou com a pesquisa de campo, a todos os meus

amigos, que tiveram a paciência de entender a minha ausência por estar me

dedicando a esse trabalho. Ao meu namorado e aos meus pais ofereço o mais

profundo dos agradecimentos, pois eles foram incansáveis em não permitir que eu

desistisse nem por um segundo e que me deram todo o suporte emocional possível

para que eu me sentisse amada e amparada sempre.

‘Eu só quero é ser feliz,

Andar tranquilamente na favela onde eu nasci,

E poder me orgulhar, e ter a consciência,

Que o pobre tem seu lugar’

(Rap da Felicidade, 1994)

RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de verificar se o turismo está ocorrendo e se impulsiona o processo de gentrificação que a comunidade do Vidigal está sofrendo, considerando a opinião da camada mais afetada pelo fenômeno que é a dos moradores. Para alcançar esse objetivo, o processo da turistificação da favela também foi estudado para que o ponto de surgimento da gentrificação pudesse ser analisado e principalmente, para ver se de fato estava atrelado ao turismo ou se foi fruto da instalação da UPP. A exposição do Vidigal na mídia e, consequentemente, a mudança da percepção da favela perante a sociedade, foram pontos abordados para que essa revalorização socioespacial pudesse ser explicada de uma forma coerente. O trabalho apresenta uma pesquisa desenvolvida em duas partes, a primeira foi através da aplicação de questionários com os moradores da comunidade e a segunda foi uma entrevista com o diretor da associação de moradores, que pôde apresentar uma visão mais macro do processo. O resultado das pesquisas identificou a gentrificação do Vidigal e o turismo como um dos principais impulsionadores, pois, mesmo com a existência da UPP, foi o turismo que fez a sociedade despertar e mudar a sua concepção da favela. A UPP foi uma iniciativa que ajudou a impulsionar o turismo, ela sozinha não teria força suficiente para desencadear um processo de gentrificação tão forte quanto o que o Vidigal está vivendo. A falta de cuidado por parte dos agentes turísticos envolvidos no processo faz com quem o morador seja esquecido, que ele não possua voz ativa ou participação, além de gerar um sentimento de medo dentro de cada um deles. Palavras-chave: Turismo; Gentrificação; Turistificação; Comunidade do Vidigal; RJ; UPP; Agentes Turísticos.

ABSTRACT

This work aims to verify if the tourism is occurring and if drives the gentrification process that the community of Vidigal is experiencing, considering the opinion of the layer most affected by the phenomenon that is the residents. To achieve this objective, the process of touristification the slum was also studied in order that the point of emergence of gentrification could be analyzed and foremost, to see if in fact has been linked to tourism or was the result of the installation of the UPP. The exposure of Vidigal in the media and consequently the change of perception of the favela by the society, were points addressed in order to this revaluation sociospatial could be explained in a consistent manner. The paper presents a research carried out in two parts, the first was through questionnaires with residents of the community and the second was an interview with the director of the residents' association, which could present a more macro view of the process. The result of the research identified the gentrification of Vidigal and tourism as one of the boosters, as even with the existence of the UPP, was tourism that made the society to wake up and change their conception of the slum. The UPP was an initiative that helped boost tourism, it alone would not be sufficient to trigger a process of gentrification as strong as the Vidigal is living. The lack of care by the tour agents involved in the process makes the resident be forgotten, it has no active participation or voice, and this generate a sense of fear within each of them. Keywords: Tourism; Gentrification; Touristification; Community of Vidigal; RJ; UPP; Travel Agents.

LISTA DE ILUTRAÇÕES

Figura 1 Evolução da Favela Carioca 28

Figura 2 Localização do Vidigal pelo mapa do estado do Rio de Janeiro

38

Figura 3 Localização do Vidigal pelo mapa da Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro

39

Figura 4 A favela do Vidigal vista do alto 41 Figura 5 Domicílios da favela do Vidigal 42 Figura 6 Quanto tempo mora no Vidigal (Apêndice A) 45 Figura 7 Renda Mensal (Apêndice A) 46

Figura 8 Percepção do turismo no dia a dia da comunidade (Apêndice A)

47

Figura 9 Relação do morador com o Turista/ Visitante (Apêndice A) 49

Figura 10 Mudança no perfil dos moradores locais por conta da chegada dos turistas (Apêndice A)

49

Figura 11 Tipos de mudanças (Apêndice A) 50

Figura 12 A chegada do turista provocou o aumento do custo de vida na comunidade (Apêndice A)

51

Figura 13 Está acontecendo uma maior divulgação da comunidade (Apêndice A)

52

Figura 14 Está ocorrendo sobrecarga na estrutura urbana (Apêndice A) 53

Figura 15 O poder público está mais presente na vida da comunidade (Apêndice A)

54

Figura 16 O número de cariocas de outros bairros aumentou nos eventos e festas locais (Apêndice A)

54

Figura 17 A chegada da UPP possibilitou o desenvolvimento e consequentemente o aumento do turismo no Vidigal (Apêndice A)

55

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AMVV Associação dos Moradores da Vila do Vidigal

BNH Banco Nacional de Habitação

BOPE Batalhão de Operações Especiais

CEDAE Companhia Estadual de Águas e Esgoto

EMBRATUR Instituto Brasileiro de Turismo

EUA Estados Unidos da América

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

OMT Organização Mundial de Turismo

UPP Unidade de Polícia Pacificadora

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 10

2 A EVOLUÇÃO DO TURISMO EM DIREÇÃO À FAVELA 14

2.1 URBANIZAÇÃO E TURISMO 15

2.2 SOBRE O FENÔMENO DA TURISTIFICAÇÃO 18

2.3 SOBRE O FENÔMENO DA GENTRIFICAÇÃO 23

2.4 A CONSTRUÇÃO DA FAVELA CARIOCA 26

2.5 TURISMO EM FAVELA 31

3 A TURISTIFICAÇÃO DO VIDIGAL 37

3.1 SOBRE A FAVELA DO VIDIGAL 38

3.2 A PESQUISA 44

3.2.1 A Turistificação do Vidigal sob a visão do morador 44

3.2.2 Entrevista com o diretor da associação de moradores do Vidigal 55

3.3 A REALIDADE ENCONTRADA 61

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 67

REFERÊNCIAS 69

APÊNDICES 71

10

1 INTRODUÇÃO

Os olhos da sociedade contemporânea estão voltados para a favela carioca.

Esses espaços, que tiveram sua história atrelada à exclusão e, muitas vezes, a

repudia, ganham cada vez mais espaço no cotidiano da cidade do Rio de Janeiro. A

favela se tornou um objeto de desejo por parte do turista e, consequentemente, uma

possível fonte de lucro para empreendedores e governo.

A comercialização da favela como um destino turístico vem aumentando

consideravelmente. A busca do turista por experiências novas em um contexto

totalmente inusitado acaba turistificando esses espaços e mudando a vida das

pessoas que residem nessas áreas. A visão turista está em constante mutação e, em

um espaço curto de tempo, ele deixou de se sentir tão atraído pelo luxo e pelo clássico

e passou a querer vivenciar o cotidiano da cidade em que está hospedado e, em

muitos casos, vivenciar até a pobreza que, de alguma maneira, atrai a sua atenção.

Desde o início de todo esse processo, que podemos dizer que se deve em

grande parte ao projeto Favela Tour, até hoje, quando os próprios turistas buscam

interagir com essas localidades, muita coisa vem sendo explorada pelas pessoas

diretamente ligadas a ele e que veem a favela como uma atração. Segundo Freire-

Medeiros (2006, p. 2) “o que é certo é que a indústria do turismo é responsável por

criar maneiras de transformar, circular e consumir localidades, criando uma cultura

material e uma economia de sensações que lhe é específica”.

A indústria do turismo percebeu o aumento da vontade do turista em busca

dessas “novas sensações” e passou a explorar isso. As favelas tiveram que ser

modificadas, mesmo que minimamente, para estarem aptas ao recebimento desse

turista e todas essas mudanças, impactaram diretamente na vida do morador. A

demanda do turista gera o aumento do número de empreendimentos e o aumento da

exposição dessas comunidades em relação ao mundo.

A sociedade começa a enxergar na favela um grande potencial econômico e

começa a investir em massa nesse local. Esse investimento acaba revalorizando os

espaços e inserindo a comunidade em um processo de gentrificação que consiste em

uma reestruturação espacial onde a classe média procura por áreas desvalorizadas

(que podem ser periféricas ou centrais) e essa movimentação acaba reconfigurando

todo o espaço onde ela se insere.

11

A favela do Vidigal, no Rio de Janeiro, virou uma referência de comunidade

perante a mídia. Sua localização juntamente com o fato de ser uma favela considerada

tranquila, além de ser reduto de artistas, colocou-a como objeto de desejo. Diante

dessa forte exposição na mídia, muitas pessoas começaram a buscar moradias ou

possíveis empreendimentos, na favela, deflagrando assim, um forte processo de

gentrificação naquela comunidade.

O presente trabalho visa investigar se o turismo pode ser considerado um dos

principais impulsionadores para o processo de gentrificação que está ocorrendo na

favela do Vidigal. O trabalho apresenta o processo através da visão do morador, que

é o mais afetado por ele. Sendo assim, o tema do presente trabalho é ‘O turismo como

impulsionador para a gentrificação da favela do Vidigal, pela visão de seu morador’.

Para que todos os pontos sejam devidamente analisados, esse trabalho de

conclusão de curso propôs responder a seguinte pergunta: O turismo dentro da favela

impulsiona o fenômeno da gentrificação? E se justifica pelo fato de que o turismo vem

cada vez mais se inserindo no ambiente das favelas causando impactos sociais no

cotidiano do morador.

Esse tema tem uma importante relevância social, pois todos deveriam

entender o processo do turismo nas favelas, e toda reflexão social que esse fenômeno

pode vir a gerar. Esse é um trabalho que visa fazer com que todos possam refletir

sobre o assunto e entender o processo de gentrificação como fenômeno em parte

atrelado ao turismo. Ao estudar profundamente esse assunto, cria-se uma conclusão

corroborada pelas opiniões de pessoas que estão ligadas ao processo.

O objetivo geral do presente trabalho é analisar os diversos aspectos

relacionados à expansão do turismo dentro da favela do Vidigal e uma eventual

gentrificação que essa expansão pode estar causando à comunidade, através da

opinião de um dos principais agentes relacionados diretamente ao processo, que é o

morador. Para alcançar esse objetivo, o trabalho apresenta pontos específicos que

são: entender o processo de turistificação das favelas; verificar se de fato está

ocorrendo uma gentrificação na favela; esclarecer se o processo de gentrificação pode

estar ligado à expansão do turismo; investigar a opinião do morador em relação a esse

processo; analisar os dados colhidos na pesquisa e elaborar uma conclusão

satisfatória que permita um entendimento pleno.

Qualquer trabalho que visa confirmar uma teoria precisa considerar uma

possível hipótese como ponto de partida para nortear a linha de raciocínio

12

estabelecida. Esse TCC considera a hipótese de que a expansão do turismo dentro

da favela contribui para o fenômeno da gentrificação, mas ao contrário do que a

sociedade pensa, todo esse processo é bem visto. Os moradores acreditam que a sua

comunidade está sendo valorizada e que isso gera um desenvolvimento satisfatório

para a favela.

Para a investigação do tema, esse trabalho conta com um processo

metodológico no qual foi efetuada uma análise qualitativa através da entrevista com o

diretor da associação de moradores do Vidigal, André Gosi e uma análise quantitativa

através da pesquisa de campo exploratória com os moradores da comunidade

realizada através de questionários estruturados.

Os resultados da pesquisa foram analisados em dois tipos: a quantitativa, que

foi aplicada nos questionários realizados com os moradores e a qualitativa, que foi

aplicada na entrevista com o diretor da associação. Esses resultados são

apresentados no segundo subcapítulo do capítulo três. Seguido por outro subcapítulo

que apresenta uma análise crítica de tudo o que foi vivenciado durante a aplicação

dos questionários, e onde os resultados da pesquisa são confrontados com a parte

teórica do trabalho a fim de estabelecer uma relação entre a teoria e a realidade.

Através dessa análise, foi possível chegar a uma conclusão sobre a hipótese e o tema

do trabalho.

Para contextualizar o tema de maneira teórica, o segundo capítulo do trabalho

apresenta uma construção histórica e detalhada sobre os pontos que o tema irá

caminhar. Este capítulo está dividido em cinco subcapítulos que dão a dimensão da

evolução do turismo em direção à favela.

O primeiro subcapítulo trata da urbanização, de como surgem as sociedades

para que depois de consolidadas, o turismo possa vir a se manifestar em seus

espaços. O segundo busca abordar e passar informações do fenômeno da

turistificação e o terceiro da gentrificação. O pleno entendimento desses dois

fenômenos possibilita estabelecer uma analogia da teoria com o objeto de estudo (no

caso, o Vidigal) para que a ocorrência de ambos seja verificada.

O quarto subcapítulo trata da construção da favela carioca, e apresenta uma

linha do tempo que tem o objetivo de contextualizar temporalmente todos os

processos pelos quais a favela carioca passou até se tornar o que é hoje. O quinto e

último subcapítulo busca relatar um pouco do surgimento do turismo na favela e com

isso fechar o raciocínio do segundo capítulo. Esse capítulo possui uma lógica na

13

construção da ordem de cada ponto, onde cada um completa o anterior e introduz o

seguinte.

O Capítulo seguinte (3) aborda sobre o processo de turistificação na favela do

Vidigal. Divido em três subcapítulos, essa parte do trabalho primeiramente

contextualiza o objeto de estudo em relação à sua história e ao turismo apresentando

fatos que corroboram para a afirmação de que a favela passa por ambos os processos

de turistificação e gentrificação. Depois da construção e contextualização histórica, o

segundo subcapítulo irá apresentar a pesquisa realizada com os moradores e com o

diretor da associação juntamente com os seus respectivos resultados.

O último capítulo do trabalho (4) é o das considerações finais, onde o trabalho

foi analisado como um todo e concluído.

14

2 A EVOLUÇÃO DO TURISMO EM DIREÇÃO À FAVELA

O processo de desenvolvimento turístico acaba por envolver diversos

impactos sociais, geográficos e econômicos nas localidades onde se insere. A

sociedade dos centros receptores precisa mudar suas configurações para que o

turismo possa se desenvolver de maneira plena sem causar muito dano à vida das

pessoas e ao ambiente.

Abordar um tema onde o objeto favela é associado ao turismo e ao fenômeno

da gentrificação implica na necessidade de uma contextualização teórica do que será

abordado para que o entendimento do assunto seja mais ampliado e diversificado.

Essa junção do social, geográfico e econômico, que é a base do estudo, é permeada

de relações complexas e detalhes singulares, tornando o processo frágil e delicado.

Não é possível falar do turismo sem mostrar a necessidade de modificação

dos espaços para que possam suportar a demanda gerada. Então, é preciso falar

sobre urbanização antes de falar sobre a turistificação e principalmente sobre a

gentrificação. Esses dois fenômenos envolvem impactos muito específicos na vida da

sociedade durante seu desenvolvimento e para que sejam compreendidos, é preciso

entender a configuração urbana do espaço.

O objeto favela apesar de ser bastante estudado na atualidade, ainda possui

um processo de formação muito complexo, onde cada comunidade tem uma

especificidade e um surgimento diferente. Para uma melhor compreensão, é preciso

abordar tanto a construção da favela, quanto a imersão dessa parte da sociedade no

processo turístico.

Toda essa construção teórica faz parte de uma linha de raciocínio, onde cada

processo é estudado separadamente para que possibilitem a construção de uma base

teórica e possam ser relacionados de uma maneira que nenhum deles perca sua

característica e nem deixe de complementar o outro.

A pesquisa envolve a aplicação do conhecimento de cada tópico com o

objetivo de explicar um fenômeno complexo que é o turismo como um possível

impulsionador para a revalorização do espaço favela, causado pela gentrificação.

15

2.1 URBANIZAÇÃO E TURISMO

Na atualidade, a urbanização vem sendo o começo da maioria das discussões

em relação ao processo turístico. Através da mudança da percepção das cidades em

relação a sua própria identidade e projeções para o futuro, o turismo se estabelece de

maneira ampla. De acordo com Fratucci (2000), o turismo apresenta imbricações

espaciais e territoriais diversificadas e passíveis de análises várias.

Todas essas variações espaciais nos levam a tentar delimitar as regiões e

estabelecer diferenças e fronteiras entre elas. Definições como espaço, lugar e

território começam a surgir dessas marcações, e dar sentido a cada uma delas.

Se pensarmos no espaço, no conceito mesmo, como uma abstração [...], vemos que ele só se realiza, só se torna concreto, através das práticas sociais que erguem as paisagens, estabelecem as relações de poder entre os territórios, os limites políticos, econômicos e naturais das regiões, e constroem a identidade vivida cotidianamente nos lugares” (LUCHIARI, 1998, p.15)

As sociedades são as responsáveis por essa criação, e para de fato existir,

os espaços precisam estar povoados de práticas sociais e inter-relações entre

pessoas e diversos setores.

Alguns autores propõem analisar o espaço a partir das categorias de local e

lugar. Soja (1993 apud FRATUCCI, 2000), estabelece que local é uma região limitada

que concentra a ação e reúne, na vida social, tanto o singular e particular quanto o

geral e nomotético. Por sua vez, Santos (1996 apud FRATUCCI, 2000) trata o lugar

com praticamente os mesmos princípios e estabelece o lugar como espaço irredutível,

banal por reunir logicamente o homem, as empresas, as instituições, as formas sociais

e jurídicas e as formas geográficas, que unidos formam o cotidiano imediato.

Ambos os autores tratam o espaço com a mesma linearidade em relação às

definições e o que fica claro é a reunião de fatores sociais que deixam esses espaços

caracterizados, com uma formação de identidade. Castells (1999 apud FRATUCCI,

2000) consegue se utilizar de uma definição única, onde o lugar é “um local cuja forma,

função e significado são independentes dentro das fronteiras da contiguidade física.”

Tuan (1985 apud FRATUCCI, 2000) entende que cada pausa ou parada nos

movimentos humanos termina definindo uma localização ou lugar.

16

A urbanização surge como importante fator para estabelecimento dos lugares,

pois é através desse processo que muitas das sociedades contemporâneas começam

a se formar, surgindo das relações existentes dentro dessas fronteiras geográficas

espaciais. Cada espaço se desenvolve considerando as necessidades e

características específicas de sua população, portanto o processo de urbanização irá

variar com o tipo, a velocidade, as prioridades e em muitos outros pontos de acordo

com cada lugar. A identidade daquele determinado espaço passa a ser construída e

consolidada de modo que possua uma definição e singularidade diante dos demais.

O fenômeno do turismo começa a aparecer normalmente após a construção

da identidade da sociedade urbana - industrial, onde os lugares passam a ocupar uma

posição e possuir um papel perante o mundo, despertando o interesse e curiosidade

de outros povos, tornando-se um importante agente na urbanização do espaço. Esse

fenômeno passa a ser o impulsionador do processo de urbanização turística, que

surge nesse contexto para dar sentido à junção do turismo com o espaço e a

sociedade onde, segundo Luchiari (1998, p.17) “é possível analisar o importante papel

desta atividade na conexão do lugar com o mundo”.

Pode-se inferir que a urbanização turística se apropria dos espaços e vai

modificando-os pouco a pouco para que as funções desse espaço estejam voltadas

para a atividade turística e a partir dessas modificações, as cidades possam se

reorganizar em função do turismo.

Este movimento entre o velho e o novo acelerado pela urbanização turística, gera novas paisagens, consome outras, traz à cena novos sujeitos sociais, elimina ou marginaliza outros e redesenha as formas de apropriação do espaço urbano, substituindo antigos usos e elegendo novas paisagens a serem valorizadas para o lazer (LUCHIARI, 1998, p.17)

A partir da chegada do turismo, os espaços apresentam uma nova dinâmica

e organização, pois possuem suas atividades voltadas para o processo turístico. Ainda

de acordo com Luchiari (1998) as cidades turísticas representam uma nova e

extraordinária forma de urbanização, porque elas são organizadas não para a

produção, como foram as cidades industriais, mas para o consumo de bens, serviços

e paisagens. A autora ainda argumenta que, inicialmente, as cidades eram

construídas para a produção e para as necessidades básicas, e que as cidades

turísticas erguem-se voltadas para o consumo e o lazer.

17

Considerando que após o processo descrito acima, que consiste na

urbanização dos espaços, seguido pelo surgimento do turismo, gerando um tipo de

urbanização específica que é a urbanização turística, esses lugares estão aptos a

receber todos os agentes e processos que a atividade turística engloba, exercendo

novas funções e tendo, no turismo, grande parte das suas atividades atreladas. Os

lugares, que podem ser definidos por cidades, estados, países ou qualquer tipo de

definição geográfica, apresentam a sua face turística e acabam por criar um tipo

específico de segmento para espaços, que são os lugares turísticos.

O lugar turístico reúne o espaço e o território. Enquanto prática sócio-espacial, o turismo vai se apropriando de determinados espaços, transformando-se e, a partir disso, produzindo territórios e territorialidades flexíveis e descontínuas. (SOUZA 1995, apud, FRATUCCI 2000, p.122).

O turismo funciona como uma espécie de rede, formada por polos emissores,

polos receptores, corredores de deslocamento e os agentes sociais que o produzem

(trade turístico, turista, poder público, trabalhadores, morador). Mesmo que os lugares

estejam geograficamente separados, essa rede funciona para interligá-los de modo

que, os lugares se organizem para estabelecer suas funções de acordo com o tipo de

turismo demandado. Todos os agentes envolvidos passam a ser causa e

consequência de um processo cíclico.

O lugar turístico é, precisamente, o lugar do encontro do anfitrião com o turista, lugar onde seres humanos diferentes podem manter uma relação face-a-face e estabelecer uma troca de conhecimentos, de sensações e de desejos. (FRATUCCI, 2000, p.130).

Tudo que gira em torno do processo turístico vai se modificando de acordo

com as necessidades e costumes do consumidor no geral. Luchiari (1998) define que

a identidade do lugar é constantemente recriada, produzindo um espaço social

híbrido, onde o velho e o novo fundem-se dando lugar a uma nova organização sócio-

espacial.

A mentalidade do visitante tem mudado conforme o passar dos anos. Com a

intensa globalização que a sociedade está vivenciando, os anseios, as expectativas e

a própria visão de mundo das pessoas, se modificam a cada momento. A

18

conectividade entre pessoas e lugares que esta ocorrendo na atualidade, permite uma

abrangência de informações cada vez maior, alcançando mais pontos distintos no

planeta.

Essa facilidade de acesso à informação, desperta a curiosidade das pessoas

em relação a novos lugares e acaba por transformá-las em turistas em potencial.

Lugares que antes eram totalmente inacessíveis passam a estar cada vez mais

próximos e com mais informações disponíveis para esse visitante. Com o aumento da

demanda e a necessidade de supri-la, cada vez mais lugares ao redor do mundo estão

tornando-se turísticos e passando a realizar as modificações necessárias para o

processo de urbanização turística. Os espaços precisam estar aptos a oferecer

opções para cada procura diferente e inusitada de cada um de seus visitantes.

2.2 SOBRE O PROCESSO DA TURISTIFICAÇÃO

Para um melhor entendimento do que é abordado no presente trabalho, é

necessário um conhecimento claro sobre os processos de turistificação e

gentrificação, pois estão cada vez mais presentes na vida da sociedade. Ambos os

processos são complexos e alguns autores tentam explicar o que cada um deles

envolve.

A turistificação, ou tornar um trecho do espaço turístico, ainda é um processo

largamente estudado, pois possui inúmeros impactos sociais, geográficos e

econômicos e para que o acompanhamento teórico do processo não seja permeado

de dúvidas, é preciso definir o termo em si. Merigue (2005 pg.1) define que: “A

turistificação pode ser entendida como o processo de implantação, implementação

e/ou suplementação da atividade turística em espaços turísticos ou com

potencialidade para o turismo”.

Entende-se que ao descobrir a potencialidade de um determinado local para

o turismo, diversas modificações precisam ser realizadas para que esse mesmo tenha

condições de receber o principal causador desse fenômeno, o turista. Nicolas (1989

apud Fratucci, 2007), afirma que o processo de turistificação dos espaços implica na

substituição da lógica da produção (esfera do trabalho) pela lógica do lazer (esfera do

lazer).

Qualquer lugar pode ser potencialmente turístico, isso varia de acordo com a

oferta de atrativos, paisagens, arquitetura, cultura e diversos outros tipos de atividades

19

que possam de alguma maneira, despertar o interesse de pessoas de outros lugares

a se deslocarem para conhecer cada um deles. Porém, por mais que a oferta de

atrativos seja significativa, o local precisa possuir acessibilidade e infraestrutura

turística básica para se adaptar as necessidades e anseios do viajante.

Merigue (2005) afirma que a metodologia do planejamento deve ser flexível o

bastante para absorver as exigências do mercado e se moldar na identidade do local

em questão. Em muitos casos quando surge a necessidade de modificar um

determinado espaço para suportar a demanda turística, esses espaços acabam

perdendo um pouco da sua identidade. O poder público e os empresários acabam

mudando tudo rapidamente para não perderem a demanda e com isso, o

desenvolvimento passa por cima de traços culturais importantes. “O produto turístico

deve ser consumido no momento em que é produzido, ou seja, está baseado no fator

tempo; é irrecuperável caso não seja usado; não é acumulável; é dinâmico e instável

[...], o que torna sua demanda elástica.” (BENI apud LEITE, 2008, p.43) e, por isso a

pressa em transformar o local de forma rápida e eficiente.

Todas essas interferências afetam sobremaneira o ordenamento dos espaços apropriados pelo turismo, podendo provocar consequências bastante negativas como o crescimento urbano caótico, a eliminação das paisagens naturais, a construção de paisagens artificiais afastadas dos valores, símbolos e mitos locais (FRATUCCI, 2007 p.1).

Muitos dos responsáveis por tornar o lugar turístico, enxergam a atividade

somente pelo lado econômico e, consequentemente, por todo o lucro que pode ser

gerado. O lado humano e cidadão que leva em consideração a população e o espaço

fica em segundo plano, deixando assim diversas decisões serem tomadas sem sequer

uma consulta a quem já ocupava o local anteriormente. Por conta dessas mudanças

no espaço, atualmente o fenômeno do turismo já considera o desenvolvimento

sustentável, onde busca preservar a comunidade em todas as suas características

durante a implementação da atividade turística.

Considerando que o processo de tornar um local turístico deve ser planejado,

os agentes turísticos surgem como organizadores do processo e trabalham para fazê-

lo acontecer. O turismo é uma das atividades mais complexas que existe, pois

movimenta diversos setores da economia. Além de toda a infraestrutura turística que

20

já é montada pensando no viajante, existe toda uma estrutura indireta que também é

utilizada pelo turismo. De acordo com Knafou (1996, p.62), o turismo:

oscila entre a sub e a superavaliação [...]. Por um lado, é muito comum subestimar-se o peso do turismo [...]; porque ela utiliza equipamentos cujo monopólio não lhe pertence (transportes, hospedagens, alimentação etc.) [...], por outro lado é igualmente comum superestimar-se o peso do turismo, [...]: porque avalia-se generosamente a utilização turística dos instrumentos comuns, tais como as estradas, trens, aviões, hotéis, restaurantes etc.”

Os agentes turísticos são os responsáveis por estruturar e desenvolver o

turismo, e podem ser divididos em algumas categorias.

O Turista: Não existe turismo sem turista; eles são os impulsionadores da

atividade e é o perfil de cada um deles que vai determinar o tipo de viagem que o

mesmo realizará. Fratucci (2007) divide os turistas entre alocêntricos (buscam por

experiências inusitadas, maior contato com a população local, não são tão

planejadores e procuram fugir dos locais de massa) e psicocêntricos (é o turista mais

inseguro e planejador, procura locais já conhecidos no mercado e dificilmente procura

contato com a comunidade local). Ele ainda afirma que entre esses dois perfis

psicográficos pode-se identificar uma gradação de variações no comportamento do

turista contemporâneo e o ponto de equilíbrio entre eles é o perfil que mais se

aproxima das características da grande maioria dos turistas atuais, que são

denominados de mesocêntricos. Algumas outras definições além dessas três já

surgiram para qualificar ainda mais alguns perfis, mas as citadas são as principais.

Por ser considerado o gerador da atividade turística, o turista muitas vezes é

mal recebido ou até discriminado nas comunidades receptoras e por isso, muitos

conflitos acabam surgindo. “O turista incomoda porque é em seu nome que se destrói

o meio ambiente” (KNAFOU, 1996 p.64), o turismo de massa é visto como o vilão da

atualidade e por onde passa, modifica toda a paisagem e estrutura, atrelando a

imagem do turista à um problema.

Trade Turístico: É toda a parte econômica do turismo. As empresas geram

serviços para serem consumidos pelos turistas. “O capital transformou o tempo livre

em tempo de consumo e, o lazer em mais um produto a ser consumido” (FRATUCCI,

2007 p. 6). As empresas que fazem parte do trade turístico são responsáveis pela

produção de uma rede de atividades que serão parte da experiência turística. Dentro

21

dessa categoria existem dois tipos de empresas: as que são ligadas diretamente as

necessidade do turismo e as que atendem indiretamente as necessidades do turista

(FRATUCCI, 2007). Para exemplificar pode-se definir o hotel como uma empresa que

atende diretamente ao turista e todas as empresas que dão suporte ao hotel

(fornecedores de alimentos e bebidas, lavanderia, comunicação), são as que atendem

ao turista indiretamente.

O tipo de serviço oferecido pelo trade é determinante para o aumento ou

diminuição do número de visitantes. Quanto melhor forem os serviços, maior vai ser a

demanda. É uma proporção direta onde quanto melhor, maior o fluxo e quanto pior,

menor o fluxo. Os serviços ofertados de um determinado lugar são a parte mais

importante para qualificar a experiência do visitante.

Poder Público: Para o turismo ocorrer de forma plena e sem grandes

problemas, é preciso que o poder público regulamente tudo o que for necessário para

garantir que todos os setores relacionados ao processo turístico, tenham direitos e

deveres. É preciso estabelecer regras e normas, de modo que defina a melhor forma

para o atendimento das necessidades das populações residentes sem esquecer ou

desprezar a lógica do capital e consequentemente das empresas envolvidas

(FRATUCCI, 2007).

O poder público deve intervir, através de projetos e leis, para melhorar o

sistema turístico e se necessário, até articular os interesses das partes; porém, muitas

vezes o Estado não se porta de maneira imparcial e acaba beneficiando partes

específicas, especialmente ao trade turístico. O maior problema dessa aproximação

entre estado e trade é que os próprios empresários pressionam o poder público para

o fornecimento de infraestrutura e até de financiamento dos investimentos de maneira

vantajosa (FRATUCCI, 2007).

A População Residente: Na maioria dos lugares onde o turismo se

estabelece, já existe uma população residente e com suas raízes fixadas no território.

Por conta da geração de empregos pelo turismo, parte dessa população passa a

prestar serviços direta ou indiretamente e a parte que não se enquadra nos

trabalhadores, apenas convive com a presença do turista.

Os trabalhadores diretos são os que estão dentro dos hotéis, restaurantes,

casas de show, agências de viagens, casas de câmbio etc. Eles lidam direto com o

turista e, é através do serviço prestado por eles que a experiência do viajante se

concretiza.

22

A movimentação e geração de empregos causada pela turistificação acabam

criando outro fenômeno também bastante discutido que é a migração dos

trabalhadores para as áreas receptoras de turismo. Sem preparo específico para atuar

nos serviços turísticos, e por conta disso, explorados pelo trade turístico que lhes

oferece salários baixos, os trabalhadores se instalam nas favelas e nas periferias para

ficarem mais próximos de seus locais de trabalho e consequentemente do turista

(FRATUCCI, 2007).

Os trabalhadores indiretos são os que oferecem serviços para a população,

para o trade e eventualmente para algum turista. “Segundo estudos da OMT feito à

pedido do Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR na década 1990, o turismo

impacta diretamente 53 setores da economia nacional, indo desde a agricultura e

pecuária à indústria de informática e ao setor de serviços, gerando um em cada dez

empregos existentes no país.” (FRATUCCI, 2007, p.10).

Excluindo os trabalhadores diretos e indiretos, temos apenas a população

residente em sua essência. A comunidade entende a presença do turista e através da

relação estabelecida entre morador e visitante a convivência pode se tornar pacífica

ou conturbada. Muitos locais não aceitam a presença do turista e não conseguem

conviver de forma amigável com eles. Quando uma comunidade é conhecida por tratar

bem o seu visitante, isso estimula mais ainda a demanda turística e o contrário

também é recíproco. Muitas vezes os residentes não são consultados sobre qualquer

tipo assunto em relação ao turismo. Suas opiniões e anseios não tomam grandes

proporções.

Como foi dito anteriormente, o desenvolvimento sustentável que vem sendo

considerado no processo de turistificação, mira principalmente as comunidades locais.

Em determinados lugares, o poder público insere a população na esfera do turismo

para que todos possam se sentir parte integrante e vejam aquele processo como um

benefício para todos os setores.

A turistificação movimenta vários setores da economia, gerando lucro para as

empresas, emprego para a população além de tornar o local conhecido e desejado ao

redor do mundo. O turismo é uma das principais indústrias do mundo e com a

globalização, os locais ficam bem mais acessíveis para qualquer pessoa de qualquer

local do planeta. Mais locais são procurados, maior a demanda e o processo de

turistificação reaparece, é uma cadeia de desenvolvimento cíclica.

23

2.3 SOBRE O PROCESSO DE GENTRIFICAÇÃO

Desde o início do processo da Revolução Industrial no século XVIII, as

cidades passaram a ser formadas em torno dos grandes centros industriais e

consequentemente, do desenvolvimento. A maior parte da população que até então

morava nas áreas rurais, se transferiu para as cidades em busca de empregos e

melhores condições de vida. De uma maneira desordenada, as cidades foram sendo

constituídas e desde aquela época, foi se estabelecendo uma segregação

socioespacial. A parte mais pobre, que consistia nos trabalhadores e suas famílias, se

estabeleceu em uma determinada área da cidade e a parte mais rica, que era formada

pelas altas camadas da sociedade como os donos de empreendimentos, ficou em

outra parte preferencialmente afastada dos trabalhadores.

A globalização surgiu como um importante fenômeno para acabar com essa

divisão espacial. “A globalização, [...], não só anula as especificidades locais, como

se entrelaça de modo dialéctico com essas especificidades, gerando constelações

sociais e espaciais heterogêneas.” (RODRIGUES, 1999, p.112). A globalização,

através de suas redes de comunicação, aproxima e por conta disso, reconfigura a

dimensão espacial das cidades.

O fenômeno da gentrificação surgiu dos processos de movimentação de

classes dentro do espaço urbano e envolve uma reestruturação social em

determinado espaço da sociedade.

As grandes metrópoles mundiais continuaram com a mesma estrutura de

séculos atrás e por isso, normalmente são formadas por espaços que na maioria das

vezes é definido pelo tipo de classe que os ocupa. Áreas nobres e áreas periféricas

são comuns em qualquer configuração de cidade, onde a população se divide pelo

poder aquisitivo e status. Grande parte das periferias surge pela necessidade das

classes menos favorecidas em morar perto de seus locais de trabalho e não ter

condições de morar nos bairros mais nobres que normalmente rodeiam os grandes

centros. Nessa conjuntura, surgem as favelas e moradias populares juntamente com

uma depreciação desses locais.

A gentrificação aparece justamente na contramão desse fenômeno de

popularização das áreas, onde existe a movimentação de classes menos favorecida

para as periferias e das classes com melhor poder aquisitivo para as áreas nobres. A

gentrificação consiste em uma reestruturação espacial onde a classe média procura

24

por áreas desvalorizadas (que podem ser periféricas ou centrais) e essa

movimentação acaba reconfigurando todo o espaço onde ela se insere.

Rodrigues (1999, p.119) afirma que:

a gentrificação processa-se através de enclaves residenciais embora mais extensos em densidade construtiva e volumes populacionais do que acontece necessariamente em zonas onde a possibilidade de oferta de habitação de qualidade se restringe à reabilitação, ou renovação, pontual de alguns edifícios.”

E dessa maneira consegue estabelecer a revalorização de determinadas

áreas. Para uma definição um pouco mais recente, Bataller (2012, p.10) defende que:

O fenômeno fundamentalmente urbano conhecido como gentrificação consiste uma série de melhorias físicas ou matérias e mudanças imateriais – econômicas, sociais e culturais – que ocorrem em alguns centros urbanos antigos, os quais experimentam uma apreciável elevação de seu status.

e Mendes (2011, p.482) diz que:

A gentrificação é sempre, por definição um processo de “filtragem social” da cidade. [...] indiciando um processo que opera no mercado de habitação, de forma mais vincada e concreta nas habitações em estado de degradação dos bairros tradicionalmente populares.

Em suma, o processo de gentrificação consiste em uma revalorização

espacial que acaba fazendo com que a classe média comece a enxergar em áreas

populares um potencial para habitação. Através dessa “substituição social” (MENDES,

2011) com a chegada de uma população com poder aquisitivo um pouco mais elevado

do que a que ocupava a área anteriormente, ocorre uma reterritorialização da

economia e da cultura (RODRIGUES, 1999).

Para que ocorra definitivamente a gentrificação, Savage e Warde (1993 apud

Mendes, 2011) indicam que quatro processos precisam ocorrer: 1) reorganização da

geografia social da cidade com substituição, de um grupo social por outro de estatuto

mais elevado; 2) reagrupamento espacial de pessoas com estilos de vida e culturas

similares; 3) transformação do ambiente construído e da paisagem urbana, com a

criação de novos serviços e requalificação residencial; 4) mudança de ordem

25

fundiária, que normalmente determina a elevação dos valores fundiários e aumento

da quota das habitações.

Para que todos os processos acima possam ocorrer, é preciso que já exista

previamente uma segregação socioespacial no local. A estrutura fragmentada

favorece, pois apenas a população que ocupa essas áreas irá ser modificada. Por isso

que normalmente a gentrificação ocorre em áreas de grandes metrópoles, onde as

diferenças sociais já existem e são externadas em forma territorial e habitacional.

“A população que abandona essas e outras zonas da cidade rumando às

periferias suburbanas é uma população com alguma capacidade de mobilidade e

recursos para o efeito (as “classes médias”)” (RODRIGUES, 1999, p.120).

Reinterando essa afirmação, Mendes (2011) afirma que a gentrificação tem

contribuído para a fragmentação social e residencial do espaço urbano

contemporâneo e é exatamente nesse ponto que esse processo passa a ser

questionado e criticado.

Um dos maiores questionamentos que existe em relação ao fenômeno da

gentrificação é que esse processo cria uma valorização de um espaço anteriormente

marginalizado e que com a chegada da classe média, e consequentemente o aumento

do custo de vida, as pessoas com poder aquisitivo menor acabam tendo que se retirar

dessas áreas. Essa substituição social acaba causando um processo de exclusão

dentro de áreas já excluídas aprofundando a divisão social do espaço urbano e

favorecendo primeiramente os promotores imobiliários, as empresas e as instituições

financeiras que acabam ganhando com a expulsão dos residentes e das empresas

mais débeis desses lugares requalificados. (MENDES, 2011).

A gentrificação está se tornando um fenômeno cada vez mais comum nas

sociedades contemporâneas, pois a movimentação econômica da população muda

cada dia que passa. A economia se altera constantemente e por isso, o poder

aquisitivo de uma determinada pessoa também permanece em constante mutação.

Muitas vezes as pessoas precisam mudar de acordo com as suas necessidades, e

áreas mais abastadas, tornam-se grandes polos de atração.

Para exemplificar, pode-se verificar esse fenômeno nas favelas cariocas,

onde a classe média do Rio de Janeiro começa a buscar nas favelas, principalmente

as da Zona Sul, uma solução para o alto custo de vida da cidade. Muitas favelas estão

se tornando bairros, se revalorizando e atraindo pessoas para as suas dependências.

Ou seja, um local que sempre foi marginalizado pela sociedade carioca, que sempre

26

foi associado à exclusão, passa a se tornar solução para aqueles que querem fugir do

alto custo de morar em um dos bairros mais clássicos. Artistas, jovens e novos

empreendedores buscam, e encontram na favela uma boa solução para essa fuga e

acabam reestruturando e modificando socialmente esse lugar.

2.4 A CONSTRUÇÃO DA FAVELA CARIOCA

No Rio de Janeiro, as favelas surgiram de processos geográficos e sociais

relacionados à cidade. A geografia típica da cidade do Rio, que é cercada por morros,

o desenvolvimento econômico do centro da cidade em meados do século XIX e a

guerra de Canudos, contribuíram para essas formações habitacionais.

Com a concentração da maioria das empresas na região do centro, os

trabalhadores que acompanhavam esse desenvolvimento sentiram a necessidade de

morar mais perto de seus locais de trabalho. Os cortiços foram as primeiras formas

de habitação desordenada que surgiram nessa época. Começaram a surgir

simultaneamente, habitações nos morros da cidade, principalmente os que cercavam

o centro, mas foi em consequência da proliferação de doenças nos cortiços e o

aumento acentuado da população que as favelas começaram a ganhar mais espaço

na cidade.

No Rio de Janeiro foram promulgadas leis para impedir a construção de novos cortiços [...]. No final do século XIX, uma verdadeira “guerra” foi desencadeada, levando à destruição do mais importante deles, o Cabeça de Porco. Mais tarde, Pereira Passos, prefeito do Rio entre 1902 e 1906,[...], foi o principal autor de uma grande reforma urbana, com o objetivo, entre outros, de sanear e civilizar a cidade erradicando um sem-número de habitações populares. (VALLADARES, 2008, p.24).

Os cortiços foram destruídos e a população que até então residia nesses

locais, encontrou nos morros uma alternativa para moradia, já que não possuíam

condição de arcar com os custos de morar nos bairros do centro do Rio de Janeiro. A

guerra de Canudos também possui grande significância na construção das favelas na

cidade, pois alguns soldados resolveram se instalar no Morro da Providência

27

rebatizando-o de Morro da Favella1 e dando início ao processo de favelização na

cidade do Rio.

É o Morro da Favella, já existente com o nome de Morro da Providência, que entra para a história através de sua ligação com a guerra de Canudos, cujos antigos combatentes ali se instalaram com a finalidade de pressionar o Ministério da Guerra a pagar seus soldos atrasados. (VALLADARES, 2008, p.26).

Mesmo o Morro da Providência sendo considerado o ponto inicial da

ocupação dos morros na cidade e consequentemente, o propulsor da favelização,

outros morros possuem datas de ocupação anteriores ao da Providência que é de

1897. A Quinta do Caju e a Mangueira são exemplos, a ocupação data de 1881.

(VALLADARES, 2008),

O desenvolvimento das comunidades nos morros foi algo bastante abordado

na época, principalmente no início do século XX onde a favela era tratada como lugar

de malandro, foco de doenças assim, como retrata Valladares (2008), acabar com as

favelas seria uma consequência “natural”, como foi com os cortiços. Alguns autores

da época chegavam a tratar a favela como “lepra da estética”.

1 Os comentaristas apresentam duas razões para a mudança de nome. 1) A planta favella, típica da região de Monte Santo no Estado da Bahia e também encontrada na encosta do Morro da Providência. 2) A resistência dos combatentes entrincheirados nesse morro baiano da Favella durante a guerra de Canudos ter retardado a vitória final do exército da república, e a tomada dessa posição representando uma virada decisiva da batalha. (VALLADARES, 2008 - adaptada)

28

Período Etapa

Anos 30 Início do processo de favelização do Rio de Janeiro e reconhecimento da existência da favela pelo código de obras de 1937

Anos 40 A primeira proposta de intervenção pública corresponde à criação dos parques proletários durante o período Vargas

Anos 50 e Início dos anos 60

Expansão descontrolada das favelas sob a égide do populismo

Meados dos anos 60 e Anos 70

Eliminação das favelas e sua remoção durante o regime autoritário

Anos 80 Urbanização das favelas pelo BNH e pelas agências de serviço público após o retorno à democracia

Anos 90 Urbanização das favelas pela política municipal da cidade do Rio de Janeiro, com o programa Favela-Bairro

FIGURA 1. Evolução da Favela Carioca Fonte adaptada: VALLADARES (2008)

O quadro acima é uma linha do tempo que ilustra o progresso da favelização

na cidade do Rio de Janeiro. Mostrando desde os anos 30 do século XX, onde

começaram as primeiras ocupações, até os anos 1990, onde a favela começou a ser

entendida como um processo irreversível e por isso recebe melhorias, as principais

etapas são relatadas para que o processo como um todo seja compreendido.

As favelas surgiram da exclusão social e por isso são cercadas até hoje por

estereótipos e percepções superficiais que não permitem uma análise completa de

toda a sua especificidade e complexidade. Esses espaços ainda são tratados como

homogêneos na maioria das abordagens. Falta reconhecimento de que cada favela e

consequentemente, cada comunidade possui suas próprias características e cultura.

A favela não é uma realidade compacta e homogênea – o favelado, como categoria analítica, não existe. Existem diversas categorias de favelados. Além das diferenciações internas, existem grandes variações entre uma favela e outra. Os parâmetros a serem adotados no julgamento da favela devem estar adaptados ao nível e modo de desenvolvimento do meio urbano em que a favela se insere. (MACHADO DA SILVA, 1960 apud LEITÃO, 2009 p.14).

A principal característica desses espaços é a relação direta entre o social e o

território em uma ordem de causa de consequência, onde o poder aquisitivo define a

configuração geográfica daquele espaço. As pessoas que de certa maneira são

29

excluídas da sociedade por não terem condições financeiras para morar nos bairros

que se localizam na parte baixa da cidade encontram na favela uma solução. A

população que ocupa esses bairros mais nobres, por sua vez, já interpreta as favelas

como um local de pessoas de baixa renda.

Cria-se uma relação denominada sócio-territorial, onde a população de baixa

renda estabelece suas moradias nos morros e a sociedade como um todo já atrela e

generaliza a imagem de marginalizados aos moradores das comunidades e passam

a tratar as favelas como um destino para essa parte específica da sociedade.

O Observatório de Favelas considera que as favelas podem ser

caracterizadas por:

Insuficiência histórica de investimentos do Estado e do mercado formal, principalmente imobiliário, financeiro e de serviços; [...] apropriação social do território com uso predominante para fins de moradia; [...] indicadores educacionais, econômicos e ambientais abaixo da média do conjunto da cidade; níveis elevados de subemprego e informalidade nas relações de trabalho; [...] alta concentração de negros (pardos e pretos) e descendentes de indígenas, de acordo com a região brasileira. (Seminário o que é Favela afinal?, 2009 p.22 - 23)

Levando em conta todas as características abordadas acima, a favela já

possui uma definição legal:

Lei Complementar nº 16 de 04 de Junho de 1992, Subseção I – Do Programa de Urbanização e Regularização Fundiária das favelas. Art.147 – Para fins de aplicação no Plano Diretor Decenal, favela é a área predominantemente habitacional, caracterizada por ocupação da terra por população de baixa renda, precariedade da infra-estrutura urbana e de serviços públicos, vias estreitas e de alinhamento irregular, lotes de forma e tamanho irregular e construções não licenciadas, em desconformidade com os padrões legais. (Câmara Municipal do Rio de Janeiro, 1992)

As abordagens relacionadas à favela, em sua maioria, costumam focar nas

deficiências e em todas as carências que cercam esses espaços. Todo o movimento

social envolvendo a comunidade acaba passando despercebido por quem não

conhece.

Muitos processos envolvendo as favelas aconteceram com o passar dos anos.

O maior deles foi o tráfico e consequentemente, a violência que dominaram esses

30

espaços durante muitos anos. A guerra entre traficantes de morros2 diferentes e a

completa ausência do Estado, serviram apenas para afastar ainda mais a realidade

das favelas com a do “asfalto” 3 . As comunidades viveram anos de terror,

marginalizadas e nas mãos de bandidos. Esse quadro começou a mudar apenas nos

dois últimos mandatos de governo (anos: 2007 - 2014) onde as autoridades

resolveram investir em políticas públicas de segurança, e acabaram mudando o

cenário desses locais através das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

Na atualidade, as favelas não estão completamente livres da violência e do

tráfico, porém os moradores criaram uma identidade para as suas comunidades. Os

movimentos culturais passaram a levar esperança e consciência para a população, os

bandidos não dominam mais as comunidades, como dominavam antes.

As favelas passaram a sentir-se parte da cidade e da sociedade. O Rio de

Janeiro começou a ser entendido como uma cidade plural, marcada por diversos

territórios com disparidades econômicas, sociais e ambientais, mas que de uma

maneira constituem um todo onde cada espaço com as suas características

específicas é essencial para o conjunto urbano.

Como uma reposta a toda essa modificação que as favelas vêm sofrendo, a

classe média que em sua maior parte não consegue arcar com os altos custos de

morar do asfalto, começa a se mudar para esses territórios. De acordo com Leitão

(2009) muitas favelas possuem segmentos de classe B2, B1 e até A2 morando nas

comunidades. Essas classes passam a ocupar as melhores construções dentro das

comunidades e acabam por movimentar a economia e o comércio.

Após tantos processos e mudanças, algumas favelas, principalmente as da

zona sul, deixaram de ser um local apenas para moradia da população de baixa renda

e passam a ser um polo de atividades econômicas, culturais e sociais que já possuem

sua identidade específica e acabam integrando morro e asfalto cada vez mais. Para

Valladares (2008, p.12) é necessário “abandonar a visão simplista e idealizada que

2 “No Rio existe uma associação entre os termos “favela” e “morro” desde o início do século XX, época do surgimento das primeiras favelas. As duas denominações são portanto utilizadas como sinônimos há muito tempo.” (VALLADARES, 2008, p.33) 3 Essa denominação de ‘asfalto’ para diferenciar o que não é favela, é comum a toda a sociedade principalmente na forma falada. Os moradores tanto dos morros quanto dos outros bairros da cidade utilizam esses dois termos (morro x asfalto) comumente. Essa expressão refere-se simplesmente aos bairros que não estão localizados na parte alta (morros), a população e suas moradias se localizam na parte plana da cidade.

31

atribui às favelas uma função exclusivamente de moradia, para nos darmos conta de

que se tornaram importantíssimos mercados de bens e serviços”.

Muitos processos culturais permeiam as favelas tornando sua população mais

integrada com a comunidade e mais identificada com o ambiente onde vive. Projetos

como o Affroreggae4, que fica localizado na comunidade do Vigário Geral, reforçam a

identidade da favela, apresentam uma nova forma de encarar a vida para pessoas

que muitas vezes não tinham mais perspectiva alguma. Esse tipo de movimento

trabalha com o orgulho das comunidades e é uma característica necessária para

tornar as favelas um produto completo a ser comercializado. Um espaço que ao

mesmo tempo está à margem da sociedade exibe um sentimento intrínseco de

pertencimento e identificação em seu morador.

Esse sentimento de orgulho e de pertencimento entre o morador e a sua

comunidade é ponto crucial para o estabelecimento e desenvolvimento do turismo.

Quando a comunidade se sente parte do movimento, a chance de que o sucesso seja

alcançado é maior. Os moradores se dedicam mais a fazer todo o processo turístico

funcionar quando eles se sentem parte dele e não excluídos.

2.5 O TURISMO EM FAVELAS

Todas as modificações que as favelas vêm sofrendo ao longo dos anos,

acabaram tornando-a um produto extremamente interessante para ser

comercializado. Antes o que era um espaço marginalizado da sociedade, obsoleto e

excluído agora passa a chamar a atenção de pessoas que procuram experiências

mais realistas e é nesse cenário que o turismo passa a fazer parte do cotidiano desses

locais.

E eu quis conhecer o Morro. Mas quando os visita, se convence de que de mal só tem isso: a fama. Eu fui aos morros de dia e de noite e só cruzei com pessoas educadas que ao passar me saudaram amavelmente. (JOSÉ CASAIS, 1940 apud FREIRE MEDEIROS, 2007 p.10 – tradução livre). 5

4 A missão do Afroreggae é promover a justiça e a inclusão, através da arte, da cultura afro-brasileira

e da educação, unindo as diferenças para o estabelecimento da sustentabilidade e da cidadania. 5 “Y yo quise conocer el Morro. Hay cerros em la capital que gozan de mala fama, pero cuando uno los visita se convence de que de malo solo tienen esso: la fama... Yo fui a los morros de dia y noche y solo tuve que cruzarme com gentes educadas que al passar me saludaron amablemente.” (José Casais, 1940 pg.14)

32

Para um melhor entendimento de todo o processo de turistificação das

favelas, é preciso entender como e quando que as favelas cariocas começaram a

ocupar um importante espaço na mídia e, consequentemente, a ficar mundialmente

conhecidas.

Em junho de 1992, aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, a Eco-92 (Rio

Conference on Enviroment and Sustainable Developmet) e mesmo com todos os

esforços dos governantes em esconder as favelas, foi durante esse evento que um

grupo de estrangeiros que estavam na cidade por conta daquele evento quiseram

conhecer a Rocinha e acabaram realizando uma visita guiada à favela. De acordo com

Freire-Medeiros (2006), esse é o episódio considerado marco fundador da favela

como destino turístico.

Em 1996 quando o cantor Michael Jackson resolveu gravar um de seus clipes

no Morro Santa Marta, localizado no bairro de Botafogo (Zona sul do Rio). As pessoas

que assistiram as imagens referentes a musica They Don’t Care About Us, passaram

a sentir curiosidade por aquele espaço que ao mesmo tempo que retratava a pobreza

e a exclusão, mostrava toda a autenticidade da comunidade que se mantinha

preservada em meio a uma grande cidade.

Foi no ano de 2002, que as favelas cariocas chegaram ao seu ápice na mídia

através do filme Cidade de Deus (FREIRE-MEDEIROS, 2006) que fez sucesso no

mundo inteiro, recebendo diversos elogios da crítica internacional. O filme brasileiro

retrata a vida da comunidade dentro de uma das principais favelas do Rio de Janeiro,

a Cidade de Deus, mostrando a realidade dessa população de uma forma muito direta

e objetiva para o telespectador. Os olhos de muitas pessoas ao redor do mundo

passaram a enxergar a verdade desses locais e acabaram por despertar o interesse

de se conhecer ao vivo o que estava sendo retratado nas telas.

Os turistas, que viajaram para o Rio de Janeiro após essa exposição das

favelas na mídia, passaram a procurar passeios que fossem realizados dentro das

comunidades nos morros da cidade. Esses turistas queriam poder presenciar um

pouco daquilo que lhes foi passado e por isso, pode-se considerar essa modalidade

de turismo contemporânea como Turismo de Realidade.

O “turismo de realidade” fundamenta sua identidade distintiva no suposto caráter autêntico e interativo do encontro que promove. A possibilidade de vivenciar as emoções do outro – entidade

33

potencialmente tão diversa quanto os índios da América do Sul, as vítimas do holocausto nazista e os favelados cariocas. (FREIRE-MEDEIROS, 2006, p.6).

Locais que foram palco de grandes tragédias são reinventados como atrativo

turístico para alcançar esse novo segmento que busca por emoções autênticas,

experiências inusitadas e que de alguma maneira desperte nesse turista algum

sentimento diferente. Tragédias, miséria, morte e desastres naturais, são alguns tipos

de demanda que estão sendo geradas para suprir essa vontade do turista de estar

mais próximo da história, do exótico, do risco e principalmente, de poder sentir na pele

a atmosfera desses ambientes.

A principal diferença entre as favelas e, por exemplo, os campos radioativos

de Chernobyl, ou até mesmo os campos de concentração da Segunda Guerra Mundial

é que nas favelas, o visitante estabelece um contato direto com o morador. Nesse

caso, não só o ambiente em si é a atração, mas a vida das pessoas compõe o cenário

e se tornam a característica principal para esses turistas. Os favelados passam a ser

o ponto impulsionador para esse tipo de turismo.

Após o estabelecimento do objeto favela como produto, faltava ainda algo que

pudesse complementar e transformar esse produto em um pacote completo e que

pudesse gerar uma demanda real e compatível com a expectativa do mercado. O Rio

de Janeiro sempre foi uma cidade com o turismo girando em torno principalmente de

sua beleza cênica, que conta com atrativos naturais conhecidos no mundo inteiro. Foi

na junção desses dois pontos, que o turismo encontrou a fórmula ideal para o incentivo

direto nas favelas como produto.

A paisagem imponente de uma cidade de características naturais admiradas,

adicionada ao ambiente singular das favelas criou para o turista um ambiente perfeito

e interessante, onde ao mesmo tempo em que ele pode conhecer a realidade das

comunidades, a natureza está presente ao fundo para compor o cenário e oferecer

até um ar romântico para o visitante. Valladares (2008) compara o Rio de Janeiro com

Canudos em relação à posição estratégica do morro. Em ambos os lugares, o morro

se debruça sobre a cidade e, isolado, oculta quem observa de baixo aquilo que se

passa no alto. Todos aqueles que chegam à sua parte mais elevada, experimentam

uma sensação de medo misturada com uma espécie de fascinação. Quando o turista

alcança esse fascínio, o turismo se consagra.

34

Por mais que a comunidade que tenha ficado mais conhecida ao redor do

mundo tenha sido a Cidade de Deus (por conta do filme), o turismo não conseguiu se

estabelecer naquele ambiente principalmente devido a esse algo a mais que eles não

possuíam. A Cidade de Deus é uma favela plana, na zona oeste do Rio de Janeiro e

o turista não conseguiria apreciar nada mais do que a pobreza e o estilo de vida da

população local.

Foi nas favelas da Zona Sul onde algumas vistas são deslumbrantes, para o

mar e para os principais pontos turísticos da cidade, como o Cristo Redentor, a Praia

de Copacabana e o Pão de Açúcar, que o processo turístico de desenvolveu

amplamente. Favelas como a Rocinha, Dona Marta, Chapéu Mangueira, Cantagalo,

Vidigal e Morro da Babilônia podem oferecer ao turista um pacote completo que inclui

a interação com a população e com o ambiente, uma compreensão sobre as

complexidades que estão presentes no país, e uma vista da cidade de um ângulo

inusitado e único.

Os contrastes que rodeiam esses espaços ficam mais evidentes quando o

turista sobe uma das favelas de um ponto nobre da Zona Sul. Bairros como

Copacabana, Leblon e São Conrado (que abrigam as comunidades mais conhecidas

e mais procuradas) são conhecidos pelo alto padrão de vida com especulações

imobiliárias entre as mais altas do Rio, o valor do metro quadrado no bairro do Leblon

foi avaliado em R$ 21.963,00 (vinte e um mil, novecentos e sessenta e três reais) em

dezembro de 2013 (EXAME.COM, Janeiro 2014). Ao percorrer o trajeto até à entrada

do morro, esse visitante evidencia toda a riqueza desses bairros nobres do asfalto e

ao entrar na favela, ele se depara com uma realidade de pobreza e exclusão que é

totalmente oposta ao que ele acabara de ver.

[...] o fato é que a potencialização do turismo será opção exequível apenas para algumas favelas. [...] é difícil imaginar que conquistem algum valor no mercado turístico aquelas que estão longe da Zona Sul e que não têm “apelo estético” em consonância com os critérios pré-estabelecidos pelos promotores. (FREIRE-MEDEIROS, 2006 p. 24).

Além da parte visual que as favelas podem proporcionar aos visitantes como

atrativo turístico em si, existe uma parte sociológica que envolve assuntos e

discussões como política, saúde, arquitetura, educação, ética, cultura, direitos

humanos e mais uma série de outras abordagens que tornam o passeio um estudo de

35

caso profundo de uma sociedade imersa em diferenças sociais que é o caso da cidade

do Rio de Janeiro e que acaba refletindo uma realidade comum a todo o país.

As favelas estão ocupando um espaço tão significativo na sociedade que

estão sendo tratadas como trademark 6 e servindo de inspiração para diversos

empreendimentos ao redor do mundo. A busca pelo exótico por parte da população

acaba aflorando um fetiche e um desejo de conhecer o diferente, por isso que a ‘marca

favela’ têm sido largamente utilizada. Leu (2004) define que essa cultura de uma

favela mítica é utilizada em campanhas publicitárias de marcas e produtos os mais

variados; produtos brasileiros, por sua vez, quando comercializados

internacionalmente, também aderem à marca favela. As marcas se aproveitam da

força do nome para se lançarem no mercado como algo inovador, contemporâneo e

único, características normalmente associadas ao nome favela.

Para exemplificar esse trademark, pode-se utilizar o Favela Chic, clube que

está presente em cidades como Paris, Londres e Miami e apresenta ao frequentador

uma decoração tropical e comida típica brasileira, ou o restaurante Favela que fica em

Tóquio e segue a mesma lógica. A marca favela está com tanta força no mercado que

lugares como o Favela Restaurant que fica localizado em Sidney ou o Club Favela na

Alemanha, não possuem nenhum tipo de ligação com o Brasil que não seja o nome,

cada um deles possui suas próprias características que são de acordo com o lugar

onde estão.

“Favela tornou-se um prefixo tropical capaz de incrementar e tornar “exóticos”

lugares e produtos os mais variados” (PHILLIPS, 2003 apud FREIRE-MEDEIROS,

2007).

Com toda essa procura e fixação pelas favelas, o turismo se desenvolve cada

vez mais dentro desses espaços. Os ‘favela tour’7 e as visitas às lajes de moradores

das comunidades são passeios cada vez mais comuns na rotina dos morros. O

visitante estabelece um contato com algo totalmente novo para ele e através dessa

exploração turística e desse contato turista–favelado surgem diversas questões éticas

que giram em torno da comercialização da pobreza.

6 Uma característica distintiva pela qual uma pessoa ou coisa vem a ser conhecido 7 Passeio onde os turistas são levados para dentro da favela para vivenciar o cotidiano de um morador e ter uma experiência e contato local. Muitos desses passeios são realizados em carros abertos e por isso são criticados e comparados aos safáris. Uma das principais questões envolvendo o favela tour, é o repasse do dinheiro cobrado dos turistas para a comunidade.

36

Como foi dito anteriormente, essa turistificação tem ocorrido em diversas

favelas da Zona Sul carioca, mas é a favela do Vidigal especificamente que vem se

destacando nesse cenário. Além do processo turístico, está ocorrendo um forte

processo de gentrificação, onde a área da comunidade está se tornando

extremamente valorizada, e onde o turismo aparece como possível impulsionador

para esse fenômeno.

Além do surgimento de todas as questões éticas que já existiam em relação

ao turismo em favela, o processo de gentrificação acaba por segregar ainda mais um

espaço que já é historicamente segregado pela sociedade. Atrelar o turismo à essa

segregação, só demonstra a fraqueza e vulnerabilidade do processo.

Faz se importante um estudo onde as partes são avaliadas para que exista

um melhor entendimento do processo como um todo e que, dessa maneira uma

análise falsa e crítica não se sobreponha erroneamente à realidade.

37

3 A TURISTIFICAÇÃO DO VIDIGAL

A favela do Vidigal vem ocupando um espaço na mídia cada vez maior.

Novelas, programas de TV, reportagens jornalísticas e até documentários, encontram

nas vielas dessa favela um bom local para as suas ambientações. Exceto por sua

localização privilegiada diante de tantas outras favelas da cidade, não é possível

afirmar ao certo que outros aspectos o Vidigal possui de diferente. As atenções estão

voltadas para essa comunidade, o Vidigal vivencia uma exposição midiática que esta

contribuindo cada vez mais para a explosão demográfica que a favela vem sofrendo,

além da valorização imobiliária.

Na busca por um maior número de respostas sobre o que está acontecendo

com a mudança da percepção da favela pela sociedade, O Vidigal torna-se o mais

adequado objeto de estudo, pois está cada vez mais presente no imaginário tanto da

sociedade, quanto do turista. Estudar os processos que estão acontecendo na

comunidade ajuda a entender um pouco o que está mudando no imaginário da

população.

O turismo surge como um importante agente na revalorização da favela, pois

a curiosidade do turista para com esse tipo de ambiente continua aumentando e

fazendo com que mais pessoas subam o morro progressivamente. O turismo ajuda a

desfazer antigos preconceitos com lugares marginalizados e acaba despertando a

vontade de se estudar e procurar entender cada vez mais as singularidades desses

espaços.

A entrada do turista na favela desencadeia uma série de impactos na vida do

morador, porque por onde o turismo passa, uma série de mudanças vai o

acompanhando e consequentemente vai mudando o espaço gradativamente.

Muitas vezes os moradores são esquecidos durante esses processos de

mudança. Suas vozes não são ouvidas, pois na maioria dos casos, relatam problemas

e dificuldades que empreendedores e governo preferem não saber. Como um meio

de tentar absorver e entender essas modificações, através da pesquisa, o morador do

Vidigal recebeu voz e a oportunidade de ser ouvido, para que através de relatos por

quem sofre com isso diariamente, pudesse ser construída uma análise crítica e real.

3.1 SOBRE A FAVELA DO VIDIGAL

38

A história da Favela do Vidigal começa em 1820, quando o Major Miguel

Nunes Vidigal recebeu as terras que hoje carregam seu nome dos monges

Beneditinos, desde então modificações constantes veem ocorrendo nesse local ao

longo dos anos. A comunidade fica localizada na base do morro dois irmãos, entre os

bairros do Leblon e de São Conrado e virada para o mar (Figuras 2 e 3). Com uma

vista privilegiada, a favela do Vidigal está em um dos pontos mais nobres da cidade,

contrastando a realidade do morro com a da alta burguesia carioca.

FIGURA 2. Localização do Vidigal pelo mapa do estado do Rio de Janeiro Fonte: Google Maps, 2014

39

FIGURA 3. Localização do Vidigal pelo mapa da Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro Fonte: Google Maps, 2014

Historicamente as favelas sempre foram um problema para a cidade do Rio

de Janeiro. O caso do Vidigal torna-se cada vez mais curioso e intrigante pelo rumo

que a favela conseguiu tomar e mesmo com todas as características marcantes, a

comunidade conseguiu se desvencilhar da imagem de pobreza e violência. Como já

foi dito anteriormente,

a definição de favela tem fundação na prática social do uso da terra sem detenção de direitos reconhecidos a partir de registros sobre ela. Foram os pobres historicamente que sempre viveram sem título, e “se escondiam” em lugares do espaço intraurbano e periférico. (BUENO, 2009, p.37).

Exceto por sua localização, a favela do Vidigal sempre foi como todas as

outras e estava imersa em uma realidade de exclusão, violência, tráfico. Segundo

Garçoni (2013), a ocupação do morro começou em 1911 com a chegada do ginásio

Anglo-Brasileiro, e depois aumentou em 1922, com a abertura da Avenida Niemeyer.

Com o aumento do número de empreendimentos e consequentemente o

crescimento dos bairros Ipanema e Leblon, surgiu a necessidade de mão de obra

barata para trabalhar nos hotéis e restaurantes, que estavam aumentando de número

consideravelmente, e nas casas de família, afinal de contas os bairros da zona sul

40

sofreram uma grande especulação imobiliária. Esse êxodo de trabalhadores causou

uma explosão demográfica no Vidigal nos anos 1960, ainda segundo Garçoni (2013),

a favela sofreu diversas tentativas de remoção, mas os moradores resistiram e não

permitiram a destruição de suas casas.

A partir dos anos 2000, a favela do Vidigal e a favela da Rocinha, que são

praticamente vizinhas, possuíam duas facções criminosas que disputavam o controle

do tráfico entre elas. Garçoni (2013) afirma que hoje em dia, ao lembrar a disputa

sangrenta entre as duas facções criminosas de Vidigal e Rocinha, os moradores usam

a expressão ‘no tempo da guerra’ pois em 2006, 15 pessoas foram assassinadas.

Por conta do tráfico e da violência gerada por ele, o governo percebeu a

necessidade de realizar alguma ação para retirar as favelas do domínio do tráfico e

oferecer aos seus moradores, uma melhor condição de vida. Em 2008 surgiu no Rio

de Janeiro a primeira Unidade de Polícia Pacificadora implantada na favela Santa

Marta. As UPPs, como são conhecidas, tem por objetivo eliminar o tráfico e violência

das comunidades garantindo paz ao seu morador.

As ‘unidades pacificadoras’ têm como referência de origem a experiência de policiamento comunitário afirmado em experiências nos EUA [...] O primeiro passo é a ocupação da favela por forças do Batalhão de Operações Especiais – BOPE, que, em geral, não tem sofrido resistência dos grupos criminosos. Garantida a ocupação, é estabelecida uma unidade especial, com um número variável de policiais, de acordo com a população da comunidade. (SOUZA E SILVA, 2010, p.10).

A partir da primeira ocupação, o processo foi acelerado, diversas favelas

principalmente da Zona Sul começaram a receber as UPPs. A ocupação do Vidigal

ocorreu em 18 de Janeiro de 2012 com uma instalação sem resistência por parte dos

criminosos.

Em 2011, a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro passou a classificar a favela

do Vidigal como bairro, subdistrito da Lagoa, graças a uma avaliação com base na

existência de infraestrutura básica (esgoto, pavimentação, rede de água, rede de

iluminação, etc.). A soma dessa valorização para bairro mais a presença da polícia

(226 policiais) dentro da comunidade, só ajudou a impulsionar mais ainda a

valorização da área.

De acordo com Souza e Silva (2010, p.11):

41

A razão do sucesso é facilmente explicável: as UPPs representam a possibilidade de romper com a privatização da soberania, quer dizer, a capacidade de regular a ordem social da cidade, por grupos criminosos. [...] A UPP é a expressão da ordem do poder estatal, do poder policial, o sentimento de que a paz se faz presente, tendo em vista a eliminação da lógica do confronto que a própria polícia alimentava e da disputa territorial por grupos inimigos.

Muito antes da instalação da UPP e consequentemente, de todas as

transformações positivas impulsionadas pela presença da polícia na favela, o Vidigal

já chamava a atenção tanto dos turistas quanto da sociedade por seus atributos

geográficos e, além disso, de acordo com Garçoni (2013), a arquitetura típica das

favelas cariocas que outrora era abominada pela cidade, se valoriza no Vidigal (Figura

4).

FIGURA 4 – A favela do Vidigal vista do alto8

Fonte: Glamurama

Muitos moradores das classes C e até B começaram a enxergar no Vidigal

uma fuga para os altíssimos valores de aluguéis e condomínios dos bairros nobres da

zona sul. As pessoas que optam por essa mudança, conseguem permanecer na zona

sul e ainda vivenciar o clima de interior que paira sobre a comunidade do Vidigal. Já

sendo conhecida por “nova Santa Teresa”, a comunidade é assim comparada a um

8 A favela do Vidigal pode ser identificada à esquerda da foto.

42

bairro tradicional, de classe média, residência de diversos artistas e pessoas que

buscam uma vida tranquila em meio ao caos urbano.

A partir dessa movimentação de uma classe mais alta para dentro da favela,

começa a surgir o processo da gentrificação e a favela ganha moradores com um

poder aquisitivo mais alto e passa a chamar a atenção de investidores e

consequentemente do turismo.

Todos os caminhos da gentrificação levam ao Vidigal porque, além de ser dono de uma das mais belas paisagens da Zona Sul, é, por si só, um cartão-postal. Está na direção para a qual os espectadores do Arpoador olham ao aplaudir o pôr do sol. ‘mora’ ao lado do morro Dois Irmãos. Tem uma praia quase particular.” (GARÇONI, 2013 p. )

De acordo com o Censo 2010 do IBGE, voltado para aglomerados subnormais

(que é onde as comunidades se enquadram) a favela do Vidigal possui uma população

de 9.678 pessoas (Figura 5), entretanto o diretor da associação de moradores afirma

que a população da favela é praticamente o triplo do que contabiliza o IBGE, chegando

a quase 30 mil pessoas.

FIGURA 5. Domicílios da favela do Vidigal Fonte: IBGE – Censo 2010

43

Sobre a economia da comunidade, de acordo com o Instituto Pereira Passos

(IPP), o Vidigal tem a maior renda domiciliar dentre as favelas da cidade. De acordo

com uma pesquisa realizada em 2010, a renda era de R$ 1.744,00 por domicílio. A

especulação imobiliária também está em alta no Vidigal. No Arvrão9, segundo Garçoni

(2013), não se encontra uma casa de um quarto por menos de R$ 150.000,00 e o

valor médio do metro quadrado chega a custar R$ 6.400,00.

A comunidade do Vidigal já é conhecida por “zona sul das favelas” e a sua

veia artística foi consolidada de vez pelo surgimento do grupo Nós do Morro (1986)

que revela grandes talentos todos os anos. Mesmo muitos desses atores já estarem

com carreiras alavancadas e possuírem condições de sair da comunidade, por opção

eles continuam e assim incentivam mais ainda pessoas trocarem seus apartamentos

na zona sul por uma casa na favela com vista para o mar. Hoje diversas casas estão

vendidas para artistas plásticos, cantores, atores, donos de restaurantes, e até o

jogador de futebol mundialmente conhecido, David Beckham comprou uma casa

também. Todas essas pessoas possuem condições de morar no asfalto, mas

preferem o morro.

Segundo Garçoni (2013), no Vidigal ocorre uma gentrificação à brasileira,

porque a área é carente de infraestrutura, de serviços básicos e não está desocupada.

A população que residia no morro antes de toda essa visibilidade, muitas vezes se vê

obrigada a procurar outro lugar para morar, pois além de todas as modificações

econômicas ditas acima, o custo de vida fica inevitavelmente mais alto, e de

desacordo com a vida da população original.

A favela do Vidigal acabou por se transformar em um local perfeito para os

turistas que visitam a cidade, e buscam um maior contato com a população local, se

hospedar, ir à uma festa ou apenas subir para conhecer. Se o imaginário do turista já

é permeado pela curiosidade de conhecer uma favela, a comunidade do Vidigal possui

todos os elementos para tornar essa experiência única. Os moradores já estão

acostumados com a presença do turista, então eles serão sempre bem

recepcionados, a favela agrega a arquitetura típica das casas coladas uma na outra

(algumas feitas de tijolos e outras já mais modernizadas) com uma vista privilegiada

9 Topo da Favela, onde abriga uma espécie de praça. Tem vista para as praias do Leblon e de Ipanema e vista para a Lagoa. É um dos pontos mais nobres da comunidade e possui a vista mais cobiçada. Os empreendimentos estão se instalando nesse ponto da comunidade. Hotéis, albergues, restaurantes e bares estão concentrando a parte turística nesse local.

44

para o mar. Os empreendimentos estão aumentando consideravelmente e hotéis e

hostels estão se modernizando para atingir todos os públicos. Uma diária em um dos

hotéis localizados no Arvrão chega a custar R$ 300,00 e uma festa em uma das lajes

desses hotéis possui ingressos com valores até R$ 80,00 apenas pela entrada.

3.2 A PESQUISA

A pesquisa foi realizada diretamente como os moradores da favela do Vidigal

e sua estrutura foi composta por dois tipos de entrevistas. A análise dos resultados

contribui para corroborar com o entendimento a respeito do problema levantado no

presente trabalho.

Para investigar a opinião dos moradores, foi aplicado um formulário (Apêndice

A) que além de possuir perguntas que caracterizam o entrevistado, incluía perguntas

diretas a respeito do fenômeno do turismo e uma possível gentrificação gerada por

ele. O formulário foi aplicado nos dias 01, 07, 14 e 16 de outubro de 2014,

contemplando uma amostra aleatória heterogênea no total de 100 pessoas.

Para o trabalho não ficar restrito apenas a uma pesquisa quantitativa, foi

realizada uma entrevista com o diretor da Associação de Moradores do Vidigal, André

Gosi, que apresentou um ponto de vista mais amplo e abrangente sobre o que

realmente está ocorrendo na comunidade. A entrevista (Apêndice B) com esse diretor

foi realizada no dia 16 de outubro na sede da Associação e com a utilização de um

gravador. Algumas perguntas que foram realizadas com os moradores, também foram

feitas para ele, para que os pontos de vista pudessem ser confrontados, além de

perguntas mais específicas e detalhadas.

3.2.1 A Turistificação do Vidigal sob a Visão do Morador

A partir da aplicação das entrevistas com os moradores do Vidigal, foi possível

identificar uma série de pontos de vista diferentes, mas que convergem para uma

análise clara dos resultados.

Devido à aproximação do entrevistador com o entrevistado, todas as

entrevistas foram realizadas na forma de uma conversa com o morador, onde ele

esteve aberto a expressar sua opinião independente da estrutura já pré-definida da

pesquisa.

45

O roteiro da entrevista foi composto por onze perguntas mais um quadro de

afirmações, onde as cinco primeiras perguntas eram para caracterizar o entrevistado,

as 06 seguintes eram perguntas específicas sobre o turismo e as mudanças geradas

e o quadro de afirmações era para uma análise de 01 a 05 sobre as afirmações feitas.

A primeira pergunta era para saber quanto tempo o entrevistado mora no

Vidigal, e o resultado obtido (Figura 6) indicou: pessoas que nasceram na favela com

35% e pessoas que moram na favela há mais de 10 anos com 45%. As outras opções

tiveram pouca relevância onde: pessoas que moram há menos de 01 ano alcançaram

7%; pessoas que moram entre 01 e 05 anos com 4%; pessoas que moram entre 05 e

10 anos com 9%. Esse resultado demonstra que a maioria da amostra ainda é

composta por antigos moradores, mas indica que o número de pessoas que mora há

menos de um ano na comunidade, já é superior ao das pessoas intermediárias, que

se concentram na margem de 01 a 05 anos.

FIGURA 6. Quanto tempo mora no Vidigal Fonte: Elaboração própria 2014

A pergunta número 02 foi para investigar a faixa etária do entrevistado e as

respostas obtiveram um equilíbrio em três das cinco opções. A faixa de 15 a 25 anos

concentrou 23% dos entrevistados; de 26 a 40 anos obteve 32%; de 41 a 55 anos

ficou com 29% dos entrevistados. A faixa de 55 a 70 anos concentrou 14% das

respostas e a mais de 70 anos teve 2% apenas. Mesmo com o resultado equilibrado,

identifica-se a maioria das pessoas na faixa de 26 a 40 anos o que caracteriza uma

população relativamente jovem.

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

Nasci Aqui Menos de 01ano

01 a 05 anos 05 a 10 anos Mais de 10anos

46

A pergunta número 03 foi a que apresentou o maior equilíbrio dentre todas as

perguntas do formulário. O sexo dos entrevistados ficou dividido entre 49% para o

feminino e 51% para o masculino.

O nível de escolaridade dos entrevistados não apresentou nenhuma surpresa

se comparado com a realidade das favelas cariocas. Concentrando a maioria dos

entrevistados na faixa da educação básica que consiste em Ensino Fundamental e

Ensino Médio, uma faixa mínima de moradores possui Ensino Superior. Dos

entrevistados que se concentram na faixa do Ensino Fundamental, 26% possuem o

ensino incompleto e 21% completo. Na faixa do Ensino Médio, 34% dos entrevistados

completaram e 10% possuem o médio incompleto. Apenas 9% dos entrevistados

possuem Ensino Superior onde 6% o possuem completo e 3% incompleto.

Ainda sobre a caracterização do entrevistado, a quinta pergunta foi sobre a

renda mensal (Figura 7), onde a pessoa poderia escolher a opção entre informar sua

renda individual e a renda familiar. Essa pergunta mostrou que a maior parte dos

entrevistados (50%) ganha de 01 a 03 salários mínimos de forma individual, ou seja,

essas pessoas recebem entre R$ 725,00 e R$ 2.172,00. O que caracteriza uma renda

relativamente boa já que corresponde a apenas 01 pessoa. As pessoas que ganham

essa mesma renda só que de forma familiar foram 7% dos entrevistados.

FIGURA 7. Renda Mensal Fonte: Elaboração própria 2014

O segundo maior resultado foi o de pessoas com renda inferior a um salário

mínimo, ou seja, menos de R$ 724,00. Essas pessoas somaram 25% dos

0

10

20

30

40

50

60

Até R$ 724,00 De R$ 725,00a R$ 2.172,00

De R$2.173,00 a R$

4.344,00

De R$4.345,00 a R$

5.792,00

Mais de R$5.793,00

Individual(%)

Familiar(%)

47

entrevistados que possuem essa renda como individual e 2% como renda familiar. É

preciso levar em consideração que essa faixa concentrou muitos aposentados,

estudantes e autônomos, por isso obteve essa grande expressão. A faixa de R$

2.173,00 até R$ 4.344,00 obteve 12% de pessoas com essa renda de forma individual

e 3% de forma familiar. É claro que o resultado desse segmento não foi tão expressivo

se comparado com os outros, mas se for levado em consideração que há alguns anos

era praticamente impossível encontrar pessoas com essa renda em uma favela, em

uma amostra de 100 pessoas, 12 declararem essa renda como individual, é um

demonstrativo de como a renda da comunidade está aumentando. A faixa de renda

entre R$ 4.345,00 e R$ 5.792,00 teve apenas 1% de resultado na faixa de individual.

Esse mesmo segmento para a faixa familiar e o segmento de mais de R$ 5.793,00

não apresentaram nenhuma resposta.

A pergunta 06 dá início às perguntas específicas e essa em especial, obteve

quase uma unanimidade nas respostas. 98% dos entrevistados afirmaram que

percebem a presença do turismo no dia a dia da comunidade e apenas 2% afirmaram

que não percebem (Figura 8). Ao realizar essa pergunta com os entrevistados,

praticamente todas as pessoas que responderam sim, colocaram um adjetivo de

intensidade depois como: Muito; Bastante; Demais.

FIGURA 8. Percepção do turismo no dia a dia da comunidade Fonte: Elaboração própria 2014

A pergunta 07 completava a 06 onde todas as pessoas que responderam ‘Sim’

na anterior respondiam ‘Como’ nessa. Os resultados apresentados não somam 100%

98%

2%

Sim

Não

48

pois o entrevistado poderia responder mais de uma opção. 98% dos entrevistados

responderam que percebem o turismo pela presença do turista na rua, 71%

responderam que essa percepção se dá através do surgimento de novos

estabelecimentos comerciais e 5% responderam outras opções, onde 3% notaram

que os estabelecimentos já possuem cardápios em inglês e 2% afirmaram que

possuem essa percepção ouvindo as pessoas falarem uma língua diferente.

Para investigar um pouco mais a relação do morador com o turismo, a

pergunta número 08 questionava como que o morador avaliaria a sua relação com o

turista e com os donos dos estabelecimentos turísticos. A pergunta oferecia 05 opções

de relação que são: estável; amigável; parceria; conturbada; não existe; não sei

avaliar.

Os resultados foram interessantes, pois na hora de escolher uma definição

para a relação do morador com os donos dos estabelecimentos turísticos, a opção

mais escolhida foi Estável concentrando 30% dos entrevistados. Essa opção como

maioria, demonstra que os moradores não possuem algum tipo de relação direta com

esses empreendedores, mas que um identifica a existência do outro e não existe atrito

entre eles. As opções, Amigável e Não existe ficaram com a mesma porcentagem,

27% cada, seguidas pela opção Não sei avaliar, com 8%. Também empatadas com

4% cada, as opções Parceria e Conturbada ficaram em último lugar, demonstrando

que não existe nenhuma relação direta nem para ajudar ou prejudicar o outro.

Sobre a relação do morador com o turista, a opção que concentrou o maior

número de entrevistados foi a Amigável, com 50%, demonstrando que o morador é

receptivo com o turista que frequenta a favela e que o turista também é simpático com

o morador. Em segundo lugar ficou a opção Estável com 29% e em terceiro a opção

Não existe com 13%. A opção Conturbada concentrou 4% dos entrevistados, seguida

pela opção Não sei avaliar, com 3%. Por último a relação de Parceria concentrou

apenas 1%.

49

FIGURA 9. Relação do morador com o Turista/ Visitante Fonte: Elaboração própria 2014

As perguntas número 09 e 10 foram as perguntas-chave para o presente

trabalho. Onde a número 09 pergunta ao entrevistado se ele acredita que o perfil do

morador da comunidade está mudando por conta da chegada do turista, e a número

10, completa perguntando que tipo de mudança que está ocorrendo.

A pergunta 09 apresentou o seguinte resultado: 87% dos entrevistados

responderam que acreditam sim que o perfil do morador está mudando e apenas 13%

responderam que não.

FIGURA 10. Mudanças no perfil dos moradores locais por conta da chegada dos turistas Fonte: Elaboração própria 2014

0

10

20

30

40

50

60

Turista (%)

83%

17%

Sim Não

50

A pergunta 10 (Figura 10), não soma 100% pois o entrevistado poderia

responder mais de uma alternativa. 81% dos entrevistados afirmaram que a mudança

está ocorrendo, pois turistas e visitantes estão se mudando para o Vidigal; 73%

afirmaram que novos moradores com renda mais alta estão se mudando para a

comunidade; Menos da metade dos entrevistados (44%) afirmaram que os moradores

mais antigos e com menos renda estão se mudando da comunidade.

FIGURA 11. Tipos de mudanças Fonte: Elaboração própria 2014

A última pergunta específica antes do quadro de afirmações foi a de número

11, onde o entrevistado foi questionado se acredita que o turismo ajuda no

desenvolvimento da comunidade. A maioria dos entrevistados (64%) concordou com

a pergunta e responderam que Sim, 25% responderam que Não e 11% não souberam

avaliar.

O quadro de afirmações era composto por 08 frases onde o entrevistado

poderia classificar cada uma delas em uma escala de concordância com 5 opções. O

entrevistado poderia: Concordar Totalmente; Concordar; Indiferente; Discordar;

Discordar Totalmente de cada afirmativa.

A primeira afirmação foi feita para investigar se a chegada do turista provocou

o aumento do custo de vida na comunidade e as respostas dos entrevistados

comprovam o início da gentrificação da favela, pois mais da metade dos entrevistados

concordaram com essa afirmativa. 58% dos entrevistados Concordaram totalmente e

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

Moradores mais antigose com menos renda

estão se mudando dacomunidade

Novos moradores comrenda maior estão se

mudando para acomunidade

Turistas e visitantesestão se mudando para

o Vidigal, apósconhecerem acomunidade

51

27% Concordaram. 3% dos entrevistados responderam Indiferente e 12%

Discordaram. Nenhum entrevistado discordou totalmente dessa afirmativa.

FIGURA 12. A chegada do turista provocou o aumento do custo de vida na comunidade. Fonte: Elaboração própria 2014

A segunda afirmação do quadro era para as pessoas avaliarem se o turismo

está gerando trabalho para os moradores locais. As respostas revelaram que a

maioria dos entrevistados, 45%, Concorda com a afirmação e 32% Discordam. Para

19% dos entrevistados, essa afirmação foi considerada Indiferente. 3% Discordaram

Totalmente e apenas 1% Concordou totalmente. Muitas das pessoas que

concordaram com essa afirmação, são pequenos empreendedores da favela, que

percebem o aumento do turismo como aumento do trabalho.

Para investigar se a comunidade está sendo mais divulgada, a terceira

afirmação buscou essa análise pelo ponto de vista do morador. A concordância com

a afirmação concentrou a maior parte dos entrevistados, onde 37% Concordaram

totalmente e 57% Concordaram. As outras opções foram praticamente inexpressivas,

pois para 3% dos entrevistados a afirmação foi Indiferente e outros 3% Discordaram.

Nenhuma pessoa Discordou totalmente da afirmação. Esse resultado demonstra

como que o morador percebe a evidência do Vidigal no mercado e nas mídias.

0

10

20

30

40

50

60

70

1. ConcordaTotalmente

2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.DiscordaTotalmente

52

FIGURA 13. Está acontecendo uma maior divulgação da comunidade Fonte: Elaboração própria 2014

A quarta afirmação do quadro buscou investigar, através da análise do

morador, se a estrutura urbana da comunidade está sobrecarregada. A maioria

concordou com a afirmação onde 22% Concordaram Totalmente e 44% Concordaram.

23% dos entrevistados Discordaram da afirmação, demonstrando que em alguns

pontos da comunidade, a estrutura urbana consegue suportar toda a demanda que

está sendo gerada. 10% foram Indiferentes e apenas 1% Discordou Totalmente da

afirmação. Muitos moradores afirmaram que a coleta de lixo está melhor, e que nunca

tiveram grandes problemas com esgoto e água. A luz está em um processo de

melhoria na comunidade, mas mesmo com a entrada da LIGHT10, a queda de energia

ainda é frequente principalmente no verão.

10 Companhia de Luz da cidade do Rio de Janeiro.

37%

57%

3% 3% 0%

1. Concorda Totalmente 2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.Discorda Totalmente

53

FIGURA 14. Está ocorrendo sobrecarga na estrutura urbana Fonte: Elaboração própria 2014

Para verificar os benefícios que o turismo, eventualmente está causando na

vida da comunidade, a quinta afirmação foi formulada para saber se a segurança

dentro da comunidade aumentou após a chegada do turismo. A maioria dos

entrevistados respondeu Indiferente e essa opção concentrou 39% das pessoas. Falar

de segurança dentro da favela ainda é um tabu e poucas são as pessoas que tem

coragem de se posicionar a respeito dessa questão, principalmente se for para

discordar. 31% dos entrevistados Concordaram e 25% Discordaram. Apenas 3%

Concordaram Totalmente e 2% Discordaram Totalmente. A presença da UPP passa

segurança para o turista, o morador não possui tanta confiança na polícia, pois na

concepção deles, o tráfico traz mais benefícios para a comunidade. Um dos principais

pontos levantados pelos moradores durante a aplicação foi o fato de que por conta do

turista, estão ocorrendo pequenos furtos na comunidade.

A sexta afirmação também seguiu a mesma linha de pensamento da quinta e

investigou se o poder público está mais presente na vida da comunidade. Os

resultados demonstraram que a favela ainda é um local esquecido pelo Estado e por

mais que algumas melhorias estejam sendo efetuadas, e elas de fato estão ocorrendo,

a maioria é em prol do turismo. Uma parte da população percebe a presença do

governo, mas percebem também que o turismo é o maior beneficiado pelos projetos.

42% dos entrevistados Discordaram da afirmação e 9% Discordaram Totalmente,

concentrando a maioria. 21% responderam Indiferente e 28% Concordaram.

Nenhuma pessoa Concordou Totalmente com essa afirmação.

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

1. ConcordaTotalmente

2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.DiscordaTotalmente

54

FIGURA 15. O poder público está mais presente na vida da comunidade. Fonte: Elaboração própria 2014

Para reafirmar que o carioca de outros bairros está cada vez mais interessado

pela favela, a sexta afirmação buscou confirmar essa afirmação através da opinião do

morador. 25% das pessoas Concordaram Totalmente e 55% Concordaram,

concentrando assim 80% dos entrevistados na faixa dos que perceberam esse

aumento. 16% responderam Indiferente, 4% Discordaram e nenhuma pessoa

entrevistada Discordou Totalmente da afirmação. A maior presença do carioca no

morro corrobora para afirmar o processo de gentrificação que esta acontecendo no

Vidigal.

FIGURA 16. O número de cariocas de outros bairros aumentou nos eventos e festas locais. Fonte: Elaboração própria 2014

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

1. ConcordaTotalmente

2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.DiscordaTotalmente

0

10

20

30

40

50

60

1. ConcordaTotalmente

2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.DiscordaTotalmente

55

A última afirmação do quadro foi feita para ligar a UPP como possível estimulador do

turismo, e investigar se os moradores concordavam que foi pós-UPP que o turismo se

desenvolveu e aumentou. Os resultados encontrados nessa afirmação comprovam

que o morador, em sua maioria, concorda com a afirmação e atrela a instalação da

UPP ao crescimento do turismo. 33% dos entrevistados Concordaram Totalmente

com a afirmação e 59% Concordaram. Apenas 6% responderam Indiferente e 2%

Discordaram. Nenhuma pessoa Discordou Totalmente da afirmação. Mesmo que a

UPP seja muito questionada, por parte do morador, não existe dúvida que a sua

instalação foi essencial para que o turista se sentisse seguro para entrar na favela.

FIGURA 17. A Chegada da UPP possibilitou o desenvolvimento e consequentemente o aumento do turismo no Vidigal. Fonte: Elaboração própria 2014

3.2.2 Entrevista com o Diretor da Associação de Moradores do Vidigal

A comunidade do Vidigal não é tão grande se comparada com outras favelas

cariocas, mas é bastante diversificada e complexa. Por conta disso, além do ponto de

vista de cada morador entrevistado, fez-se necessária uma entrevista com uma

pessoa que pudesse passar uma visão ampla e geral do que realmente está

acontecendo na favela.

Foi escolhido então, um representante da Associação de Moradores do

Vidigal, porque através da proximidade dessa pessoa com o morador e com os

problemas da favela, um olhar mais abrangente consegue sinalizar o que muitas

vezes o morador não consegue perceber no dia a dia.

Normalmente, a pessoa que mora na comunidade e que possui algum tipo de

problema recorre primeiramente à Associação para tentar resolvê-los. O

representante que trabalha para ouvir e ajudar esse morador possui o privilégio de

conhecer cada detalhe e cada história da comunidade, podendo responder às

0

20

40

60

80

1. ConcordaTotalmente

2. Concorda 3. Indiferente 4. Discorda 5.DiscordaTotalmente

56

perguntas da entrevista com maior clareza e conhecimento de causa, pois possui um

contato direto e diário com todas as dificuldades da favela.

A visão de uma pessoa que trabalha dentro da Associação normalmente é

livre de preconceitos, mais racional e política, onde as decisões que precisam ser

tomadas para benefício da comunidade se sobrepõe a vontades e opiniões dispersas

de moradores.

O representante escolhido para dar essa entrevista foi o Diretor Social e

Cultural da Associação de Moradores do Vidigal. Natural do Rio de Janeiro, senhor

André Gosi, é conhecido na comunidade por André Bacana. Ele tem 52 anos,

formação escolar de ensino médio completo e está à frente da Associação há dois

anos e meio, trabalhando em parceria com o presidente, Marcelo.

A entrevista foi realizada no dia 16 de outubro de 2014 às 14h30min na sede

da Associação dos Moradores da Vila do Vidigal (AMVV) que fica localizada dentro da

comunidade do Vidigal. Foi utilizado um gravador de áudio para colher as respostas e

o diretor autorizou a publicação de tudo que foi falado durante a entrevista (Apêndice

D), no presente trabalho. A entrevista foi composta por perguntas já pré-definidas que

foram feitas diretamente ao André (Apêndice B).

A favela do Vidigal está ocupando um espaço cada vez maior nas mídias e no

imaginário das pessoas. Ao ser perguntado se foi a visibilidade do Vidigal nas mídias

que contribuiu para o aumento do turismo ou se foi o turismo que contribuiu para o

aumento da visibilidade, André indicou que:

Esse interesse pela comunidade faz com que os turistas entrem, então é o turismo que está trazendo as pessoas aqui pra dentro. [...]. Um dos problemas número um do Rio de Janeiro é a violência, então quando você contém a violência você passa a viver melhor e essa questão foi fundamental para que as pessoas começassem a ter confiança e a sair. [...] o turismo entra porque as pessoas têm curiosidade.

A motivação do turista que frequenta a favela ainda é largamente estudada.

Diversas pesquisas são feitas regularmente para que os pesquisadores do fenômeno

do turismo consigam entender de onde surge essa curiosidade do visitante. Sobre

essa motivação, André explica que:

Aqui tem duas vertentes de turista que é o turista que vem conhecer a comunidade e fica aqui um tempo, aluga alguma casa e mora aqui.

57

Geralmente são estudantes que aproveitam e vem fazer uma pós, ou vão para a faculdade para terminar os seus estudos. O outro é o turismo ecológico onde movimenta muito o lado empreendedor da comunidade e o que foi fundamental para as pessoas que são empreendedoras aqui dentro, a qualidade de vida melhora.

A localização da favela do Vidigal é um dos pontos fundamentais para

expansão e desenvolvimento do turismo. De acordo com o diretor, o Vidigal:

Está espremido entre duas classes muito altas que são os bairros de São Conrado e do Leblon, e o interesse pela comunidade já é antigo porque aqui é bem posicionado. Ela está em uma área muito bonita onde você tem uma montanha e tem um mar de frente, e uma das avenidas mais bonitas do mundo.

As favelas sempre estiveram associadas à exclusão. Muitas críticas são feitas

em relação ao descaso do governo com essas áreas, pois os investimentos são muito

precários e limitados. O turismo ao mesmo tempo em que pode impactar

negativamente nos locais onde se insere, também pode ajudar atraindo investimentos

do governo. Esses locais que possuem uma infraestrutura muito precária, que é o

caso da favela, precisam receber melhorias do governo para que possam atender e

suportar a demanda turística. Por sua vez, é interesse do estado estimular o turismo

para alcançar todo o lucro gerado. André afirma que:

O que falta é o estado entrar mais, [...], você só tem a polícia, do restante você não tem nada. [...], a coleta de lixo está agora tirando regularmente porque a gente trabalha muito em cima disso, a conservação está colocando guarda corpo e a CEDAE também está aqui dentro conosco, então algumas coisas estão melhorando passo a passo.

A visibilidade do Vidigal aumenta a cada dia que passa e o turismo vai

aumentando proporcionalmente a essa visibilidade. A junção desses dois fatores pode

ser um possível estimulador para a gentrificação da comunidade, e por isso surge o

questionamento se é a visibilidade que atrai o turismo ou se é o turismo que aumenta

a visibilidade. André falou que:

58

O turismo chegando, ele acrescenta muito, talvez se o turismo não tivesse, não teria tanta visibilidade, [...] as pessoas vem, comentam do bairro, e isso vai multiplicando.

Por essa nova visibilidade da favela, onde o Vidigal já é conhecido por favela

chic, zonal sul das favelas, nova Santa Teresa, tanto a sociedade quanto o turista já

percebem esse mudança de percepção. É preciso entender se o morador também

percebe essa mudança no perfil da favela. André afirma que e o morador ainda não

percebe essa modificação, pois:

Tudo ainda está muito confuso e as mudanças foram muito rápidas na

cabeça do morador. Eles ainda não conseguiram criar uma identidade, uma maneira de absorver o turismo como benefício. [...]. A mudança está aqui, ela já aconteceu e a gente precisa se moldar para os novos rumos que essa mudança ainda vai gerar. Ainda está muito no início e ainda precisar ter uma modificação maior do perfil dos moradores, quando começar a ter moradores que tenham opinião própria, conhecimento de seus direitos e que comecem a mudar o perfil de moradia e passar experiências de outros bairros pra cá essa percepção vai mudar.

O processo de renovação está ocorrendo na favela. É preciso entender o que

está ocorrendo de fato e como o morador está recebendo essa revalorização. André

afirma que:

Existe uma remoção branca, ela é real. Já que você não pode locomover uma população de mais de 20 mil pessoas de uma vez só, o investidor detectou que comprando as casas é muito mais fácil. O perfil talvez comece a mudar nesse ponto. Na parte alta já é bem nítida a mudança, pois é lá que os investidores querem, pois é a parte mais valorizada, com um visual melhor.

Esse processo de revalorização precisa ser somado ao problema habitacional

que a cidade do Rio de Janeiro vive atualmente, onde a favela se tornou uma opção

de fuga, já que a cidade está com espaços limitados para acomodar todos os seus

habitantes. Como o Vidigal está localizado em um pequeno espaço horizontal, a favela

só pode crescer verticalmente, o que também tem um limite de construção. Muitas

pessoas estão vendo nessa falta de espaço, a oportunidade de investimento, e por

isso muitas estão alugando ou vendendo suas casas por valores fora da realidade da

favela. A lei da oferta e da procura que define esses valores. André afirma que:

59

Há dois anos, um aluguel custava uma média de R$ 200,00 e hoje custa de R$ 700,00 para cima.

O fenômeno da gentrificação implica na mudança do perfil do morador nessas

áreas menos favorecidas. No Vidigal esse processo se confirma justamente por essa

lei da oferta e da procura, onde um morador com uma renda mais baixa vende sua

casa por um valor bem mais alto do que foi gasto para construí-la e dá lugar para o

morador com um poder aquisitivo maior.

Um barraco em média custa um preço real de R$50.00,00, [...], você mora em um lugar com difícil acessibilidade, você mora espremido com outra casa colada na sua, você tem problema de infiltração, então tem uma série de coisas que não é uma casa para se vender por um valor desses. [...], as pessoas perceberam que vendendo suas casas por esse valor acabariam comprando outra muito longe, então os moradores começaram a vender suas casas por valores surreais, R$ 200.000,00 / R$ 300.000,00.

Muitas vezes, quem faz esse tipo de negócio é o nordestino, que veio para o

Rio de Janeiro para tentar a vida, e que acaba tendo a oportunidade de vender sua

casa por um desses valores e volta para sua cidade de origem com a oportunidade

de crescer e investir lá.

Os investidores, na necessidade de explorar o capital, percebem que os

moradores muitas vezes aceitam fazer negócio sem pensar muito nas consequências.

A maioria deles nunca viu uma quantidade de dinheiro elevada dessa maneira, então

aceitam no impulso acreditando que estão fazendo bom negócio. Muitos deles, depois

que saem da favela se arrependem e não conseguem mais voltar, pois cada dia que

passa o valor aumenta.

Como todo esse processo começou a surgir no período pós UPP, acaba

surgindo uma dúvida sobre o real início dessa mudança, onde o turismo e a UPP

aparecem como possíveis agentes impulsionadores. Ao ser perguntado se ele

acredita que foi o turismo que ajudou a impulsionar essa mudança ou se foi a UPP

que deu o pontapé inicial, André falou que a UPP foi parte dos investimentos que a

cidade precisou fazer para que pudesse sediar grandes eventos. O Rio de Janeiro era

bastante violento e precisava de alguma política pública que conseguisse controlar

principalmente a guerra do tráfico na cidade. Então, com a implantação da UPP, os

60

grandes eventos começaram a vir para a cidade juntamente com o turismo e a

mudança que foi gerada partiu de um conjunto onde a necessidade de conter a

violência, e ao mesmo tempo, estimular o turismo surgiu na ideia da UPP. Mesmo

concordando que foi pós UPP que esse processo tomou grandes proporções, onde

as pessoas passaram a sentir mais segurança nos locais, como impulsionador para o

processo da gentrificação de fato, André afirmou que:

O turismo é o número um, porque é dinâmico, é benéfico, traz renda, melhora a qualidade de vida das pessoas por um todo, então o turismo é realmente o número um.

A gentrificação inevitavelmente gera um trauma na vida de quem está

diretamente ligado ao processo e por isso muitas vezes os moradores dessas áreas

que estão sendo renovadas, vivem um sentimento de medo e desconfiança. Muitos

acreditam que a qualquer momento, serão expulsos de suas moradias. Com uma

visão privilegiada do fenômeno, pois está à frente da associação, André falou que:

Eu vejo uma mudança natural. O ser humano sempre se locomoveu, [...], então eu acho que a população está sempre em movimento, com a globalização, ela ficou mais agressiva, mas ela só se movimenta se você ceder para isso. [...] Para quem está tendo a oportunidade de vender suas casas, estão vendendo. Tem gente que quer vender e tem gente que não, ninguém é obrigado a vender a casa. O comprador expulsa em questão de dinheiro e de oferta, o que não deixa de ser uma expulsão e uma maldade. [...] mas você só vende sua casa se você quiser.

Em termos de remoção “obrigatória” está uma camada muito específica de

moradores da comunidade que são aqueles que moram de aluguel. Muitos deles

estão tendo os preços de seus aluguéis cada vez mais elevados pelos proprietários

dos imóveis, aonde muitas vezes, o preço do aluguel chega a custar quase a mesma

coisa que a pessoa recebe de salário. Essas pessoas estão se vendo obrigadas a sair

e ir em busca de novos lugares. André chama de “aluguel covarde” onde pessoas que

moram há anos na favela, precisam sair porque não tem condições de arcar com os

altos valores.

É perceptível que há um processo maior de pessoas chegando do que saindo

e, de acordo com André, os moradores que estão vendendo suas casas no Vidigal,

61

são aqueles que não possuem uma identidade com a comunidade, pois o morador

nascido e criado na favela, ainda não viu essa necessidade.

O processo que gerou a gentrificação do Vidigal é definido por um conjunto de

acontecimentos, que começa com o interesse em mudar o Rio e colocá-lo no mapa

para sediar grandes eventos (e atrair um público internacional para a cidade), e com

isso surge a necessidade de melhorar a segurança. A solução encontrada para essa

melhora foi a implantação da UPP dentro das favelas, o que controlou a violência e

inibiu o tráfico. Com a melhora da segurança o aumento do número de turista na

cidade foi inevitável, juntamente com a grande captação de eventos internacionais. O

turista seguia com a sua curiosidade pela favela e após essas melhorias ele se sentiu

seguro para vivenciar esse espaço, causando assim o aumento do turismo na favela.

O turismo desperta o interessa do próprio morador da cidade em conhecer a

favela. Quando o carioca do asfalto sobre o morro, ele se depara com uma realidade

que muitas vezes não é a que permeava o imaginário dele e nisso surge a ideia de

sair do seu apartamento com um aluguel elevado, e se mudar para uma favela com

características de interior, uma vista inigualável e um aluguel mais vantajoso. Então

essa pessoa se muda para a favela, provavelmente ocupa o lugar de alguém que

pagava um valor menor de aluguel e ainda leva todo um estilo de vida junto com ela,

causando uma mudança cada vez maior.

3.3 A REALIDADE ENCONTRADA

A entrada do turismo no ambiente da favela causa diversos impactos na vida

do morador. Durante a aplicação da pesquisa, muitos assuntos surgiram a partir das

conversas com os moradores e eles gostaram de ser ouvidos e falaram muito além

da relação da favela com o turismo. A aplicação das entrevistas considerou diferentes

pessoas dentro de um mesmo espaço e por isso, as opiniões são comuns em alguns

pontos e totalmente distintas em outros. O confronto da opinião do morador, que tem

uma visão mais reduzida e direta do processo, com a opinião do diretor da AMVV, que

tem uma visão mais macro, enriqueceu a pesquisa e tornou o estudo mais completo.

As favelas foram espaços que surgiram de um processo de exclusão em uma

sociedade conservadora e cercada por preconceitos. Eram tratadas como um

problema e sempre estiveram à margem da sociedade. Muitos anos se passaram,

mas ainda é possível evidenciar esse sentimento de abandono na fala do morador.

62

Mesmo que o objeto favela esteja crescendo em termos de importância para a cidade,

o morador ainda se sente excluído e ainda sente o preconceito.

O Vidigal é uma das comunidades que mais conseguiu estimular o aumento

dessa relação de reconhecimento do morador com o espaço onde mora. Já é possível

afirmar que a maior parte de moradores do Vidigal, possui uma identidade com a

favela, se sentindo parte importante dela. Durante a aplicação dos questionários, foi

comum ouvir dos moradores frases como: “O Vidigal é maravilhoso”, “O Vidigal é a

melhor comunidade para se morar na cidade”, “Eu não troco minha casa aqui por

nenhum outro lugar” e isso mostra como o morador se sente orgulhoso por fazer parte

daquilo. Mesmo com esse aumento do orgulho, conversar com o morador é entender

que aquele sentimento de pessoa marginal está intrínseco em sua história.

É possível perceber que esse sentimento de abandono vem muito em

consequência da posição do estado. Muitas pessoas ouvidas reclamaram que o

Estado é omisso e que quando surge algum projeto de melhoria, só tem investido na

parte “rica” da favela, onde estão localizados os principais estabelecimentos que

atendem ao turismo, e que a parte “pobre”, onde estão os moradores mais antigos e

com menor poder aquisitivo, continua esquecida da mesma maneira. O diretor da

AMVV também concordou que ainda falta uma presença maior das autoridades

públicas, mas que apesar de poucas, algumas melhorias já estão sendo feitas em prol

da comunidade.

Considerando que a realidade da favela sempre foi diferente da realidade do

asfalto, as mudanças que a turistificação dos espaços exige, acaba impactando

diretamente na vida do morador. O processo de tornar turístico envolve uma série de

mudanças estruturais onde muitas vezes as pessoas não conseguem se adaptar ao

diferente e passam a achar inclusive que todas as mudanças são ruins. Durante a

aplicação dos formulários, muitas pessoas reclamaram, por exemplo, do fato da luz

na favela agora ter que ser paga além da cobrança do IPTU.

É difícil analisar a postura da comunidade, pois existe um confronto, onde de

um lado está uma realidade que foi presente na vida dessas pessoas durante anos e,

do outro lado está o exercício da cidadania que é cabível a todo e qualquer cidadão.

O fato de não pagar luz ou não pagar o IPTU, era visto como uma vantagem pelo

morador e por conta dessa mudança, alguns veem o turismo como culpado e acabam

criando uma resistência.

63

Quando o turismo se insere em um determinado local, e não existe nenhum

tipo de projeto que envolva cidadania e inclusão do residente no processo turístico,

acaba ocorrendo essa resistência. As pessoas não se sentem parte do

desenvolvimento e começam a culpar o turismo por todas as mudanças que ocorrem.

Percebe-se que falta à comunidade do Vidigal alguma iniciativa de projeto que envolva

o morador com o turismo e que, dessa maneira, estimule uma maior parceria entre

eles.

Os agentes sociais da turistificação vão mudando o espaço de acordo com as

suas necessidades. Na maioria dos casos, pela procura do capital imediato, a

população residente é esquecida. O trade expõe a comunidade estimulando o turismo,

e nesse caso sem pensar na consequência, o Estado acaba por olhar apenas para o

lado dos empresários, que é de onde vem o lucro para eles, e o turista entra apenas

para consumir. A possibilidade do estímulo do capital faz com que pouco seja pensado

em relação ao morador ou até o empresário local. A maneira como a favela é exposta,

não viabiliza um desenvolvimento sustentável e gradativo, tudo acaba se

desenvolvendo da maneira mais rápida para gerar mais lucro. O morador fica

excluído, sem direito a ser ouvido, e isso cria dentro de cada um deles, o sentimento

de desconfiança.

Foi possível perceber, tanto pelas conversas com os moradores, quanto pelo

próprio resultado da pesquisa, que o Vidigal vive um processo de gentrificação

bastante intenso. Existe um consenso para a maioria das pessoas entrevistadas que

o custo de vida na favela aumentou muito e que, enquanto muitos moradores novos

estão chegando, alguns antigos estão saindo. A valorização imobiliária que a favela

vem sofrendo, também foi um assunto muito abordado pelo morador. Esses pontos

servem para corroborar com a afirmação de que o Vidigal vive sim um processo de

revalorização, onde a comunidade virou uma opção de fuga para quem não quer pagar

os altos valores dos bairros clássicos da cidade.

Durante a pesquisa, uma das palavras mais pronunciadas pelo morador foi

“medo”. Esse é o sentimento que eles estão carregando por não serem participados

ou informados de nada. É compreensível essa posição do morador, pois eles estão

em uma situação onde eles fazem apenas um papel de figurantes dentro do seu

próprio lugar de vida. Muitos deles veem sua vizinhança ser alterada com frequência,

suas compras no mercado ficam cada vez mais caras, a luz começa a faltar com mais

64

frequência, etc. As pessoas estão com medo de serem expulsas de suas casas, o

turismo e o turista ajudam a criar ainda mais essa sensação dentro da comunidade.

A agressividade que o capital impõe faz com que o empresário entre na favela,

escolha uma casa e ofereça ao dono da casa uma quantia que muitas vezes é três,

quatro vezes mais alta do que a que aquele espaço realmente vale. O empresário se

aproveita da inocência do morador da favela, que em sua maioria são pessoas

humildes não acostumadas com luxo e com uma quantidade de dinheiro como a

oferecida, porque sabe que ele irá aceitar a proposta imediatamente. São pessoas

com baixa escolaridade que não conseguem ponderar racionalmente se o negócio

vale a pena para ele.

Muitos moradores da favela estão sofrendo com o aumento brusco de seus

aluguéis. Muitos proprietários de casas na comunidade também estão enxergando,

no meio desse processo de gentrificação, uma oportunidade para subirem o padrão

de vida. Algumas pessoas entrevistadas falaram que estão saindo da comunidade,

pois recebem praticamente a mesma quantia que os proprietários de suas casas

resolveram cobrar pelo seu aluguel. É um processo pelo qual os próprios moradores

da favela tentam tirar vantagem do outro. O morador que possui uma condição um

pouco melhor constrói algumas casas e coloca para alugar por preços exorbitantes.

Se eventualmente alguma de suas casas já estava alugada para algum outro morador,

ele eleva o preço do aluguel e caso essa pessoa não possa pagar, ela se retira e

acaba dando lugar para alguém que possa, pois a procura é cada vez maior.

O que se evidencia no Vidigal é um processo de gentrificação estimulado por

diversos agentes. O turismo entra como um dos principais, senão o mais forte, pois é

através dele que toda essa cadeia se move. Os empresários do ramo do turismo e o

próprio turista que entraram na favela acabaram estimulando no morador, a ambição

por essa possível melhoria de vida. Essa elevação dos preços condenada pelos

moradores, também é praticada pelos mesmos em pequenas ações do dia a dia como

o moto taxi, por exemplo, que custa R$2,50 para subir, mas quando é turista eles

cobram R$10,00. Como quase todas as coisas aumentam de preço para o turista, os

prestadores de serviços locais acabam aumentando o preço no geral, ai vem o

aumento do custo de vida, a revalorização, a saída de moradores antigos e a chegada

de novos.

É preciso levar em consideração que apesar do Vidigal sempre ter sido uma

favela visada, foi no período pós UPP que todo esse processo tomou maiores

65

proporções. Quando o governo resolveu investir em segurança e criou a UPP como

solução, a sociedade começou a sentir mais segurança para entrar na favela, então o

turismo conseguiu alcançar o seu ápice e pode ser estimulado de maneira mais

aberta. Para o lado dos empresários, do governo e do turista, essa junção foi ótima,

mas para o lado do morador, as coisas não foram aceitas de maneira tão simples.

O morador do Vidigal mostrou naturalmente uma resistência contra a UPP.

Apesar de alguns afirmarem que a UPP melhorou a favela no quesito de não ter mais

pessoas armadas nas ruas, muitos falaram que a segurança continua a mesma coisa

ou até pior. Nesse caso, como eles já possuem essa desconfiança com a polícia, e o

turismo embasa o seu desenvolvimento na presença da mesma, a comunidade acaba

ficando resistente ao turismo também.

A turistificação da favela só conseguiu se desenvolver efetivamente depois

que a UPP entrou nas comunidades. A sensação de segurança que a polícia passa

para quem está de fora que estimula as pessoas a subirem o morro. Mesmo que os

moradores não vejam essa melhoria, os dados da pesquisa confirmam que o turismo

aumentou consideravelmente após a instalação da UPP.

O processo de gentrificação também pode ser atrelado ao período pós UPP,

mas, não foi só isso que fez com que cariocas e turistas encontrassem no Vidigal um

possível local para moradia. O turismo aparece, senão como o principal, mas como

um dos principais impulsionadores do processo, pois é na curiosidade e fetiche do

turista com a favela, que toda a atenção da sociedade voltada para o morro cresceu.

Quanto mais o turista subiu o morro, seja por qual motivo for, mais ele gostou

do que viu ali e estimulou uma vontade de eventualmente morar naquele espaço. A

população do Rio de Janeiro começou a perceber esse movimento do turista em

direção à favela e começou a ser instigada a ver qual era motivo de toda essa atração.

É claro que o fato do Vidigal sempre ter sido residência de muitos artistas também

precisa ser levado em consideração. Porém, até certo momento não foi suficiente para

deslocar toda uma população a ir conhecer essa realidade de perto.

O turismo teve o papel de estimular a gentrificação e hoje a favela do Vidigal

possui toda essa proporção, devido ao turismo. Muita coisa ainda precisa ser feita e

trabalhada em relação ao morador, pois o processo de turistificação da favela está se

desenvolvendo cada vez mais rápido. O Vidigal caminha para se tornar um bairro de

classe média daqui a alguns anos. O tabu da favela está sendo desconstruído na

66

cidade do Rio de Janeiro e as novas gerações já não possuem mais a visão restrita e

preconceituosa que as gerações mais antigas possuíam em relação à esses espaços.

A tendência é que o Vidigal seja considerado mais um bairro da cidade e que

o fato de ser favela não faça mais diferença. O Rio está criando uma identidade única

com esse espaço e futuramente, provavelmente, não haverá mais esse abismo social

entre eles.

67

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cidade do Rio de Janeiro já incorpora a favela como parte de seu território,

parte de sua identidade. Os preconceitos que rondaram a sociedade durante décadas

começaram a ser derrubados. O presente trabalho, baseado no exemplo da favela do

Vidigal, que é a mais procurada da cidade, investigou como o turismo tem tido um

papel fundamental nessa desconstrução da imagem de criminalidade, tráfico e

miséria, que sempre estiveram associadas ao morro.

A pesquisa presente no trabalho foi fundamental para que uma conclusão

pudesse ser construída, levando em consideração as pessoas mais afetadas pelo

fenômeno da gentrificação, que são os moradores das comunidades. De acordo com

o resultado encontrado, falta ao governo a sensibilidade de criar projetos de cidadania

para que o crescimento do turismo nessas áreas pudesse ser de maneira sustentável

e, assim, não causasse tantos impactos na vida do morador, como a pesquisa

demonstrou que tem sido causado.

Diversos assuntos foram levantados durante a pesquisa, mas o medo que

essas mudanças estão gerando no interior de cada morador é o principal ponto que

ainda deve ser bastante estudado. Os moradores sentem-se acuados diante de tanta

mudança e por mais que o turismo seja até encarado com bons olhos pela maioria da

comunidade, o sentimento de impotência não consegue desaparecer da vida dessas

pessoas. Durante a aplicação dos questionários, os moradores gostaram de ser

ouvidos. Muitos encontraram nessa pesquisa, a oportunidade de poder falar o que

eles estavam sentindo de verdade, apresentando críticas e elogios não só ao

processo de turistificação quanto a pontos específicos do cotidiano da favela.

A sensação de capital imediato que o turismo causa faz com que ações sejam

tomadas rapidamente e que poucos estudos de impactos sejam realizados. A entrada

do turismo na favela provoca a falta de luz, maior necessidade de água, excesso de

lixo, aumento dos preços de quase todos os serviços e muitas outras coisas. É preciso

lembrar que a favela é previamente um espaço de infraestrutura precária, onde muitos

esforços ainda precisam ser feitos para garantir o acesso da comunidade aos serviços

urbanos básicos de qualquer população. Inserir o turismo nesses espaços, sem as

melhorias necessárias, só faz com que o número de pessoas aumente e que toda a

estrutura fique sobrecarregada.

68

Notou-se que a Associação de Moradores possui um papel fundamental de

orientação aos moradores da comunidade, mas ainda é pouco acionada por eles. De

alguma maneira, os responsáveis da Associação tentam orientar a população para

que os efeitos da turistificação e da gentrificação sejam minimizados. Falta o

desenvolvimento e a implantação de algum projeto que busque melhorar a qualidade

de vida dos moradores e que principalmente esclareça para essas pessoas um pouco

sobre as mudanças que a favela está passando. Dessa forma, a comunidade se insere

e participa do fenômeno e consegue entender e perceber o processo de outra forma.

O presente trabalho de conclusão de curso objetivou demonstrar que o

turismo pode ser o impulsionador de um dos processos mais traumáticos e

contraditórios da sociedade contemporânea, que é a gentrificação. Se por um lado o

fato da cidade começar a se interessar pela favela e passar a criar uma identidade

com ela pode ser considerado positivo, por outro lado tem toda uma população que

ainda é socialmente carente e que está sofrendo os impactos dessas mudanças mais

do que qualquer um: a comunidade local.

O Vidigal ocupa um espaço na mídia que nenhuma outra favela possui. O

turismo já faz parte da realidade dessa comunidade e o processo de gentrificação

parece ser irreversível. Nesse contexto, entendemos que seja preciso que os

moradores antigos da comunidade sejam ouvidos, pois muitos deles não estão tendo

essa opção. Se de fato a remoção que está acontecendo no Vidigal é “branca”, essas

pessoas que estão saindo precisam ter a opção de querer ou não, ou, no mínimo,

terem um esclarecimento do que está ocorrendo para que o sentimento de medo que

paira sobre a comunidade possa se dissipar.

Toda a construção do trabalho foi baseada na discussão social sobre o que o

turismo acarreta nos locais onde é inserido, sem planejamento. O Vidigal é mais um

local, vítima do processo, que enfrenta um dos maiores impactos. Os moradores estão

sendo trocados, a favela está passando por um momento de renovação e

revalorização. O estudo faz-se necessário para que, de alguma forma, se comprove

que esses impactos devam ser reduzidos e que a comunidade seja preservada ao

máximo possível.

69

REFERÊNCIAS

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70

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APÊNDICES APÊNDICE A – Entrevista com os moradores

71

1. QUANTO TEMPO MORA NO VIDIGAL

( )Nasci Aqui ( )Menos de 01 ano ( )01 a 05 anos ( )05 a 10 anos ( ) Mais de 10 anos 2. FAIXA ETÁRIA ( )15 a 25 anos ( )26 a 40 anos ( )41 a 55 anos ( ) 55 a 70 anos ( )Mais de 70 anos 3. SEXO ( )Feminino ( )Masculino 4. NÍVEL DE ESCOLARIDADE ( )Ensino Fundamental ( ) Completo ( )Ensino Médio( ) Incompleto ( )Ensino Superior 5. RENDA MENSAL

RENDA MENSAL INDV. FAMIL.

Até R$ 724,00

De R$ 725,00 a R$ 2.172,00

De R$ 2.173,00 a R$ 4.344,00

De R$ 4.345,00 a R$ 5.792,00

Mais de R$ 5.793,00

6. VOCÊ PERCEBE A PRESENÇA DO TURISMO NO DIA A DIA DA COMUNIDADE ( )Sim ( )Não 7. SE SIM, COMO? ( )Presença de turistas pelas ruas da comunidade ( )Surgimento de novos estabelecimentos comerciais (Hotéis, hostel, restaurantes, etc.) ( ) Outros. Quais? 8. COMO VOCÊ AVALIA A RELAÇÃO DO MORADOR COM OS DONOS DOS NOVOS ESTABELECIMENTOS

TURÍSTICOS &COM O TURISTA/ VISITANTE

RELAÇÃO ESTABEL. TURISTA

Estável

Amigável

Parceria

Conturbada

Não Existe

Não sei Avaliar

9. NA SUA OPINIÃO, ESTÃO ACONTECENDO MUDANÇAS NO PERFIL DOS MORADORES LOCAIS POR CONTA

DA CHEGADA DOS TURISTAS?

72

( )Sim ( )Não 10. SE SIM, QUE TIPO DE MUDANÇAS? ( ) Moradores mais antigos e com menos renda estão se mudando da comunidade ( ) Novos moradores com renda maior estão se mudando para a comunidade ( ) Turistas e visitantes estão se mudando para o Vidigal, após conhecerem a comunidade ( ) Outros. Qual? 11. ACREDITA QUE O TURISMO AJUDA NO DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE ( )Sim ( )Não ( ) Não sei avaliar

12. AFIRMAÇÕES 1 2 3 4 5

A chegada do turista provocou o aumento do custo de vida na comunidade

O turismo está gerando trabalho para os moradores locais

Está acontecendo uma maior divulgação da comunidade

Está ocorrendo sobrecarga na estrutura urbana (água, luz, esgoto, coleta de lixo)

A segurança dentro da comunidade aumentou, depois da chegada do turismo

O poder público está mais presente na vida da comunidade

O número de cariocas de outros bairros aumentou nos eventos e festas locais

A chegada da UPP possibilitou o desenvolvimento e consequentemente o aumento do turismo no Vidigal

Legenda: 1) Concordo Totalmente; 2) Concordo; 3) Indiferente; 4) Discordo; 5) Discordo Totalmente

73

APÊNDICE B – Roteiro da entrevista com o diretor da associação de moradores do Vidigal

Nome: Idade: Origem:

Escolaridade:

1. Há quantos anos o senhor está à frente a associação?

2. O Vidigal ocupa cada vez mais espaço na mídia. O senhor acredita que toda essa visibilidade contribuiu para o aumento do turismo na favela? Ou foi o turismo que contribuiu para o aumento da visibilidade?

3. O turismo exige uma série de mudanças na infraestrutura urbana nos locais onde se

insere. Essas mudanças, mesmo que minimamente, estão acontecendo aqui?

4. Se sim, quais foram as mudanças significativas?

5. O Vidigal agora é conhecido por favela chic, zona sul das favelas, nova Santa Teresa. O senhor consegue perceber no dia a dia da comunidade essa mudança do morador e do visitante na percepção da favela?

6. O Senhor percebe uma presença maior do poder público na rotina da comunidade após essa mudança de percepção?

7. Com o passar dos anos, está ocorrendo no Vidigal um processo de renovação, onde

moradores com poder aquisitivo mais baixo estão dando lugar a moradores com renda mais elevada. O senhor percebe essa mudança?

8. O senhor acredita que o turismo ajuda a impulsionar (desenvolver) essa mudança ou

foi a instalação da UPP que gerou isso tudo?

9. A comunidade está sobrecarregada com o aumento do turismo?

10. A comunidade está aceitando toda essa mudança de forma natural, ou está sendo traumática?Os moradores que estão saindo da comunidade, estão inconformados com o rumo que a favela tomou?

74

APÊNDICE C – Tabulação dos resultados dos formulários aplicados com os moradores. Valores absolutos iguais aos valores relativos, pois a amostra coletada foi de 100 pessoas.

1. QUANTO TEMPO MORA NO VIDIGAL

%

Nasci Aqui 35

Menos de 01 ano 7

01 a 05 anos 4

05 a 10 anos 9

Mais de 10 anos 45

TOTAL 100

2. FAIXA ETÁRIA %

15 a 25 anos 23

26 a 40 anos 32

41 a 55 anos 29

55 a 70 anos 14

Mais de 70 anos 2

TOTAL 100

3. SEXO %

Feminino 49

Masculino 51

TOTAL 100

4. NÍVEL DE ESCOLARIDADE %

Ensino Fundamental Completo 21

Ensino Fundamental Incompleto 26

Ensino Médio Completo 34

Ensino Médio Incompleto 10

Ensino Superior Completo 6

Ensino Superior Incompleto 3

TOTAL 100

5. RENDA MENSAL Individual (%) Familiar (%)

Até R$ 724,00 25 2

De R$ 725,00 a R$ 2.172,00 50 7

De R$ 2.173,00 a R$ 4.344,00 12 3

De R$ 4.345,00 a R$ 5.792,00 1 0

Mais de R$ 5.793,00 0 0

TOTAL 100 100

75

6. VOCÊ PERCEBE A PRESENÇA DO TURISMO NO DIA A DIA DA COMUNIDADE?

%

Sim 98

Não 2

TOTAL 100

7. SE SIM, COMO? %

Presença de turistas pelas ruas da comunidade 98

Surgimento de novos estabelecimentos comercias 71

Outros: Estabelecimentos com cardápios em inglês 3

Outros: Percepção da língua falada 2

8. RELAÇÃO DO MORADOR COM OS DONOS DOS NOVOS ESTABELECIMENTOS TURÍSTICOS E COM O TURISTA/VISITANTE

Estabelecimento (%) Turista (%)

Estável 30 29

Amigável 27 50

Parceria 4 1

Conturbada 4 4

Não Existe 27 13

Não sei Avaliar 8 3

TOTAL 100 100

9. NA SUA OPINIÃO, ESTÃO ACONTECENDO MUDANÇAS NO PERFIL DOS MORADORES LOCAIS POR CONTA DA CHEGADA DOS TURISTAS?

%

Sim 83

Não 17

TOTAL 100

10. SE SIM, QUE TIPO DE MUDANÇAS? %

Moradores mais antigos e com menos renda estão se mudando da comunidade 44

Novos moradores com renda maior estão se mudando para a comunidade 73

Turistas e visitantes estão se mudando para o Vidigal, após conhecerem a comunidade 81

Outros 0

11. ACREDITA QUE O TURISMO AJUDA NO DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE?

%

Sim 64

Não 25

Não sei avaliar 11

TOTAL 100

76

12. AFIRMAÇÕES 1 (%)

2 (%)

3 (%)

4 (%)

5 (%)

TOTAL (%)

A chegada do turista provocou o aumento do custo de vida na comunidade?

58 27 3 12 0 100

O turismo está gerando trabalho para os moradores locais? 1 45 19 32 3 100

Está acontecendo uma maior divulgação da comunidade? 37 57 3 3 0 100

Está ocorrendo sobrecarga na estrutura urbana (água, luz, esgoto, coleta de lixo)?

22 44 10 23 1 100

A segurança dentro da comunidade aumentou, depois da chegada do turismo?

3 31 39 25 2 100

O poder público está mais presente na vida da comunidade? 0 28 21 42 9 100

O número de cariocas de outros bairros aumentou nos eventos e festas locais?

25 55 16 4 0 100

A chegada da UPP possibilitou o desenvolvimento e consequentemente o aumento do turismo no Vidigal?

33 59 6 2 0 100