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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL - ULBRA CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DIOVANA LACERDA O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM ADOLESCENTES EM SOFRIMENTO PSÍQUICO Canoas 2007

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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL - ULBRA

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

DIOVANA LACERDA

O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM ADOLESCENTES EM SOFRIMENTO PSÍQUICO

Canoas

2007

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DIOVANA LACERDA

O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM ADOLESCENTES EM SOFRIMENTO PSÍQUICO

Trabalho Conclusão de Curso de Serviço Social apresentada como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Serviço Social da Universidade Luterana do Brasil, Curso de Serviço Social.

Orientadora: Profª. Me. Maria da Graça Maurer Gomes Türck

Canoas

2007

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DIOVANA LACERDA

O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM ADOLESCENTES EM SOFRIMENTO PSÍQUICO

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do título de Bacharel em Serviço

Social na Universidade Luterana do Brasil no Curso de Serviço Social.

Porto Alegre, _____/_____/2007.

______________________________________________________

Profª. Me. Maria da Graça Maurer Gomes Türck

Orientadora

_______________________________________________________

Profª Ms. Maria Suzete Müller Lopes

Argüidora

_______________________________________________________

Profª Ms. Cláudia Giongo

Argüidora

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Viver Tudo

“ Já perdoei erros quase imperdoáveis, Tentei substituir pessoas insubstituíveis

E esquecer pessoas inesquecíveis. Já fiz coisas por impulso,

Já me decepcionei com pessoas, Quando nunca pensei me decepcionar,

Mas também decepcionei alguém. Já abracei para proteger.

Já dei risada quando não podia, Já fiz amigos eternos,

Já amei e fui amado, mas Também já fui rejeitado.

Já fui amado e não soube amar. Já gritei e pulei, de tanta felicidade,

Já vivi de amor e fiz juras eternas, mas ‘ quebrei a cara’ muitas vezes!

Já chorei ouvindo músicas e vendo fotos, Já liguei só pra escutar uma voz, Já me apaixonei por um sorriso,

Já pensei que fosse morrer de tanta saudade e... tive medo de perder alguém especial (e acabei perdendo)!

Mas, sobrevivi, E ainda vivo!

Não passo pela vida... E você também não deveria passar. Viva!!! Bom mesmo é ir à luta com determinação,

Abraçar a vida e viver com paixão, Perder com classe e vencer com ousadia,

Porque o mundo pertence a quem se atreve e A vida é muito para ser insignificante”.

CHARLES CHAPLIN

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por não ter deixado desistir dos meus sonhos, por estar sempre presente na minha vida, iluminando a minha trajetória. Porque sem sonhos não chegamos a lugar nenhum. Nós temos que ir atrás do que desejamos. A vida é maravilhosa, e as esperanças nunca devem acabar; assim como não deve acabar o amor que existe dentro de nós. Carrego comigo três verbos que, bem conjugados, são importantes luzes em minha vida: Aprender, Servir e Cooperar.

Quando nascemos, encontramos duas pessoas que acreditamos que ficam conosco até o fim de nossos dias: nossos pais. Hoje, eles não estão mais presentes, mas quero dedicar este momento especial a eles, que, apesar de pouco estudo, sempre incentivaram a continuar estudando, lutando por uma vida melhor. Agradeço “in memoriam” aos meus queridos pais Vani e Salomar, pelo amor, carinho, ensinamentos, valores e princípios. Enfim, por tudo que sou hoje.

Aos meus queridos irmãos e amigos que sempre acreditaram e me incentivaram a não desistir dos meus objetivos.

Aos meus colaboradores e colegas de trabalho da grande Família Renner, que de alguma forma, contribuíram para este momento, ensinando-me a filosofia de encantamento, incentivando-me na valorização das pessoas, na autonomia, na motivação, no alto astral, na alegria, colaborando para que minha bagagem de conhecimento tenha crescido e se tornado valiosa. Pois quem ENCANTA É ENCANTADO.

À minha querida e amada orientadora deste Trabalho de Conclusão, Maria da Graça Türck, que tenho maior orgulho e admiração de ser sua aluna, pelos ensinamentos e dedicação que faz questão de compartilhar com todos os que a rodeiam.

Muito obrigada!

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01: Hospital Psiquiátrico São Pedro.............................................................19 Figura 02: Diagrama do Processo de Intervenção...................................................49 Figura 03: Saudades............................................................................................... 53 Figura 04: Família....................................................................................................57 Figura 05: Amigos e músicas.................................................................................. 60

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................ 07 1 QUESTÃO SOCIAL, SOCIEDADE CAPITALISTA E SOFRIMENTO

PSÍQUICO....................................................................................................

101.1 SOFRIMENTO PSÍQUICO, QUESTÃO SOCIAL E DOENÇA MENTAL..... 161.2 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO SÃO PEDRO.................................................. 191.2.1 Serviço Social no Hospital Psiquiátrico São Pedro e no Centro Integral de

Atenção Psicossocial...................................................................................

261.3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS.......................................................................... 32 2 O SOFRIMENTO PSÍQUICO E O PROCESSO DE ADOLESCIMENTO.... 362.1 A FAMÍLIA COMO LÓCUS DE ADOLESCIMENTO E DE SUPERAÇÃO

DO SOFRIMENTO PSÍQUICO....................................................................

382.2 ADOLESCENTES USUÁRIOS DO SERVIÇO SOCIAL NO HOSPITAL

PSIQUIÁTRICO SÃO PEDRO.....................................................................

42 3 O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM

ADOLESCENTES INTERNADOS E EM SOFRIMENTO PSÍQUICO.........

433.1 O PROCESSO DE CONHECIMENTO E O DESVENDAMENTO DO

OBJETO.......................................................................................................

463.2 O PROCESSO DE INTERVENÇÃO: SUPERANDOO OBJETO

DESVENDADO............................................................................................

493.2.1 O Produto Final............................................................................................ 63 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 65 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS....................................................................... 67

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INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por objetivo apresentar a construção do saber desenvolvido

no decorrer da trajetória acadêmica. Com muita dedicação, esforço, superação e

comprometimento no estágio realizado no Hospital psiquiátrico São Pedro (HPSP),

fez-se realmente conhecer a profissão e saber se realmente se estava no caminho

certo, pois durante anos houve algumas dúvidas por não entender realmente como

se evidenciava a profissão na prática.

Durante, então o período de estágio, no ano de 2006, aos poucos foi sendo

feita a inserção no cotidiano organizacional com muito interesse em aprender,

analisar, a identificar as demandas, limites e dificuldades evidenciadas na instituição.

Essa inserção no campo é essencial no processo de estágio curricular, de poder se

fazer a leitura institucional, identificar a demanda – no caso, o sofrimento psíquico1/

doença mental – e, deste modo, poder intervir profissionalmente dentro da ética e de

acordo com os princípios institucionais. Através de cada atendimento se deparava

com demandas diferentes, pois este era um espaço novo em que se podia perceber

que o processo acadêmico se perpetuava através de teorias e fundamentos do

Serviço Social, sendo que cada intervenção se tornava um campo novo de

investigação. Estar, portanto, em contato com os adolescentes em sofrimento

psíquico/doença mental constituiu-se em experiências riquíssimas e certamente

fortaleceu a formação profissional.

Reconhecer o objeto do Serviço Social e suas expressões na vida cotidiana

dos sujeitos não é tarefa fácil. Quando se utiliza a vivência de cada um, obtém-se o

conhecimento dos fatores que perpassam a vida de todos com premissas na

1 É um conjunto de condições psicológicas que, apesar de não caracterizar uma doença, gera determinados sintomas e sinais que indicam o sofrimento (www.drasirleydecampos.com.br).

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Questão Social. Pois vive-se em uma sociedade em que as desigualdades sociais

são fruto das relações sociais, políticas e culturais, mostrando-se, dessa forma, que

não são apenas econômicas. Participar, então, significa que se está em plena

atividade social, seja na escola, seja em casa com a família ou em qualquer outro

lugar, e essas atividades ajudam a se ter um melhor pensamento sobre si mesmo e

sobre os outros.

Na área da saúde mental, as expressões da Questão Social surgem a partir

do sofrimento psíquico/doença mental e da exclusão de sujeitos acometidos desse

transtorno tanto do convívio familiar como na sociedade, pela falta de aceitação, pois

“louco” não tem validade social, fica excluído de tudo, tendo que viver preso em uma

instituição, porque não se o enxerga como sujeito de direitos.

O Serviço Social tem, então, na Questão Social o seu objeto de intervenção,

dando visibilidade às relações sociais que se constituem na sociedade capitalista e

que possibilitam a exploração e, conseqüentemente, a desfiliação social, que se

manifesta na vida dos sujeitos a partir de suas singularidades no enfrentamento

dessas expressões.

Dessa forma, o presente trabalho organiza, no capítulo inicial, a abordagem

das expressões que envolvem a Questão Social, seus conceitos e de que forma esta

se dá nos dias atuais. A sociedade capitalista e suas características, estas marcadas

pela desigualdade social, em que os trabalhadores se vêem pressionados pelo

crescimento da economia e pelos avanços tecnológicos, na diminuição da efetivação

de seus direitos. Logo após, traz-se a historiografia do Hospital Psiquiátrico São

Pedro, na qual proporcionou um contato com as expressões da Questão Social. E,

por final, a trajetória do Serviço Social, como foi instituído na Unidade CIAPS (Centro

Integral de Atenção Psicossocial), tendo como objetivo oferecer um espaço de

atendimento em saúde mental, através de equipe multidisciplinar, a crianças e

adolescentes com transtornos mentais e sofrimento psíquico severos e persistentes.

Por final, as políticas públicas existentes na instituição, que hoje sofrem

enfraquecimento devido às formas que administram-se as políticas sociais, devido

ao crescimento do desemprego e da precarização na área da saúde, que deveriam

ser o alicerce principal para garantia de direitos dos usuários/pacientes.

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No segundo capítulo, identifica-se o sofrimento psíquico e o processo de

adolescer, período este importante na vida do ser humano, que se caracteriza pela

busca de uma nova forma de visão de si e do mundo, um momento cheio de

angústias e medos, que forma identidade, período este em que se necessita de

muito apoio, carinho, amor, afeto junto à família, base fundamental para a superação

do sofrimento psíquico, responsável pela socialização do sujeito e pela construção

de sua subjetividade no plano geral.

No terceiro, apresenta-se o processo de trabalho realizado com os

adolescentes. Inicia-se com o processo de conhecimento para se identificar o que

emerge da vida dos adolescentes, usando-se a prática desenvolvida, suas

possibilidades, limitações, enfrentamentos e preposições frente à demanda

existente. Usa-se do grupo operativo como estratégia de resistência para superação

do sofrimento psíquico dos adolescentes, para amenizar, de alguma forma, os

problemas existentes na vida dos mesmos.

Por fim, as considerações finais e as referências bibliográficas.

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1 QUESTÃO SOCIAL, SOCIEDADE CAPITALISTA E SOFRIMENTO PSÍQUICO

A Questão Social surgiu na Europa Ocidental, em meio aos séculos XVI, XVII,

XVIII e XIX, a partir da relação entre capital e trabalho, que determinou a divisão da

sociedade em classes, estabelecendo um novo modo de relações sociais a partir

das relações de produção. A Revolução Industrial, acontecendo na Inglaterra entre

1760 a 1860, nesse ínterim, tornou-se um marco da sociedade capitalista ocidental.

E, segundo, Cerqueira Filho, Questão Social seria "o conjunto de problemas, sociais

e econômicos que o surgimento da classe operária impôs no curso da constituição

da sociedade capitalista" (1978, p.21).

Portanto, é uma categoria que expressa a contradição fundamental do modo

capitalista de produção. Contradição, esta, fundada na produção e apropriação da

riqueza gerada socialmente: os trabalhadores produzem a riqueza, os capitalistas se

apropriam dela, logo, o trabalhador não usufrui das riquezas por ele produzidas,

explicitando, assim, a mais-valia.2

A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e repressão (CARVALHO E IAMAMOTO, 1998, p.77).

Portanto, Questão Social é uma categoria marxista3 explicada pelo

desenvolvimento processual da humanidade entre momentos de transformação da

realidade social. A teoria marxista é, então, um método de análise da sociedade

capitalista, que reconhece as contradições existentes nas relações sociais,

determinadas pelo modo de produção. O processo de produção e reprodução da

vida através do trabalho é, para esta teoria, a atividade humana básica, a partir da

qual constitui-se a história dos homens. No entanto, é também através do trabalho, a

partir deste mesmo modo de produção, que a exploração do homem se instituiu.

Ao se utilizar, portanto, na análise da sociedade ocidental a categoria

Questão Social, está-se realizando uma análise na perspectiva da situação em que

se encontra a maioria da população – aquela que só tem na venda de sua força de 2 É a razão entre trabalho excedente e trabalho necessário, é a expressão do grau de exploração da força trabalho pelo capital (QUINTANEIRO, 2003, p.47). 3 Marxismo - teoria econômica, social e filosófica elaborada por Karl Marx e Friedrich Engels, utilizada ao mesmo tempo como método da análise dos fenômenos sociais e como princípios de prática revolucionária (MARTINELLI, 2002, p.48).

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trabalho os meios para garantir sua sobrevivência. Ressaltam-se, dessa forma, as

diferenças entre trabalhadores e os donos dos meios de produção no acesso a

direitos, nas condições de vida; é analisar as desigualdades e buscar formas de

superá-las. É entender as causas das mesmas e o que estas produzem na

sociedade e na subjetividade dos homens. “A Questão Social é o ângulo pelo qual

as sociedades podem ser descritas, lidas, problematizadas em sua história, seus

dilemas e suas perspectivas de futuro” (CASTEL, 1996, p.35).

A Questão Social vai, então, se inserindo na Inglaterra (1760-1860) pela

Revolução Industrial, no contexto do empobrecimento da classe trabalhadora com a

consolidação e expansão do capitalismo bem como com o quadro da luta e do

reconhecimento dos direitos sociais e das políticas públicas correspondentes, além

do espaço das organizações e movimentos por cidadania social. Portanto, se

traduzia pelas formas de desigualdades social e pelas de resistência oriundas da

sociedade capitalista de cunho periférico, como no caso da brasileira. Esta, então,

marcada pela escravidão, pelo coronelismo, pelo populismo, pelo autoritarismo, isto

é, uma sociedade historicamente hierarquizada4, submetida aos interesses

econômicos e políticos de uma classe dominante.

O capitalismo como se conhece hoje chegou ao Brasil por volta de 1920 a

1930. Vivia-se época de intensa exploração agrícola (exploração de café), e as

fábricas produziam o mínimo para o consumo dos brasileiros, importando-se quase

tudo da Europa e dos Estados Unidos da América.

No período de 1930, o capitalismo concorrencial5 dava, então, lugar ao

capitalismo monopolista6. O Presidente Getúlio Vargas começou, assim, a

4 Sf. 1. Ordem e subordinação dos poderes eclesiásticos, civis e militares. Série contínua de graus de escalões, em ordem crescente e decrescente (Dicionário de Língua Portuguesa, Aurélio, 2004, p. 520). 5 O capitalismo concorrencial é o período de muita filantropia e pouco Estado, sem políticas sociais, forma de enfrentamento, caso de polícia- Segurança Pública. Esse modo de produção capitalista concorrencial transformou-se para reagir à “lei da baixa tendencial da taxa de lucro”. As transformações foram profundas nas relações de produção e nas relações sociais de produção. (Conheça Marx. São Paulo: Proposta Editorial. s.a.). 6 Após a Revolução Industrial (1760 a 1830), as nações passaram a identificar o poderio de um país com seu desenvolvimento industrial, um processo que se fundiu pela Europa, Ásia e América. A tecnologia industrial avançou, a população cresceu, os movimentos imigratórios se intensificaram. No fim do século XIX, sobreveio a primeira Grande Depressão (1873- 1896), que fortaleceu as empresas pela centralização e concentração do capital. Iniciou-se, aí, nova fase do capitalismo, a fase monopolista ou financeira, que se desdobrou na exportação de capitais e no processo de colonização da África e da Ásia (ROBERTS: J.M. História do Século XX- 1919-1934. São Paulo: Abril Cultural, 1979).

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desenvolver a indústria brasileira. Com isso, reduziu as importações, acabou com o

domínio exclusivo da economia do café, tornou-se dependente dos países

desenvolvidos quanto à tecnologia industrial e confirmou os primeiros passos da

implantação do capitalismo e da presença do Brasil na economia global. Vargas

avançou no setor da indústria e criou as primeiras empresas estatais (Companhia

Siderúrgica Nacional, Petrobrás), controlando os movimentos de rebelião através de

políticas de proteção aos direitos dos trabalhadores. Direitos estes garantidos

através da Constituição de 1948.

Essa industrialização no Brasil criou condições para a acumulação capitalista,

evidenciada não só pela redefinição do papel estatal quanto à interferência na

economia (quando passou a criar as condições para a industrialização), mas

também pela implantação de indústrias voltadas para a produção de máquinas,

equipamentos, etc. A política econômica, estando em prática, não se voltava para a

criação, mas sim para o desenvolvimento dos setores de produção, o que

economizava mão-de-obra, resultando, para muitos trabalhadores, o desemprego.

Já na década de 1950, Juscelino Kubitschek, com o capitalismo monopolista,

adotou o modelo desenvolvimentista, ocorrendo uma grande aceleração e invasão

do capital estrangeiro para criar as bases do desenvolvimento (energia,...), além de

um espaço para se fabricar aqui o que antes se comprava no exterior.

Na década de 1960, no período de 1961 a 1964, houve a renúncia do

presidente Jânio Quadros e subida do seu vice João Goulart (Jango), ao poder. Com

base no projeto nacionalista e popular, buscava conter o avanço das

multinacionais limitando as remessas de lucro para fora do país e apoiando o

desenvolvimento das empresas nacionais. Nesse período, a Questão Social era,

então, enfrentada por medidas de extensão da educação, ampliação da previdência,

extensão da legislação trabalhista ao trabalhador do campo, com o Estatuto do

Trabalhador Rural, barateamento dos alimentos básicos, combate a doenças

endêmicas e programas da habitação popular.

Mas com o golpe militar de 1964, assumem o comando da República os

generais até o ano de 1985. O projeto desenvolvimentista dependente, através do

modelo modernizador e conservador proposto pela autocracia burguesa, apoiava

grandes lucros para as empresas multinacionais, com o Estado criando suas

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próprias empresas. O Estado passava a ser um empresário. Controlava as

reivindicações dos trabalhadores e mantinha os salários baixos, aumentando o lucro

das empresas (rapidamente). Para a modernização do setor industrial e integração

do país na economia, buscava empréstimos no exterior para a entrada das

telecomunicações, aumentando, assim, a dívida externa (de 3 bilhões em 1964 para

100 bilhões em 1984).

No entanto, não há como negar que, no século XX, o Brasil deu um grande

salto de crescimento. E em várias dimensões - política, econômica e social. Em

todas as regiões, nos estados, municípios, embora em ritmos e intensidades

desiguais. Beneficiando, de um ou outro modo, a toda população, mas em

proporções diversas, desiguais, aumentando, assim, a riqueza de alguns e a

pobreza de outros.

Devido a esse crescimento, com o esgotamento das proteções sociais e das

condições de trabalho, aumentaram, então, as pessoas em sofrimento psíquico.

Identifica-se, portanto, que se está diante do ressurgimento das contradições, das

tensões e dos conflitos existentes na sociedade capitalista.

Nos tempos atuais (2007), as conquistas sociais estão sendo extinguidas pelo

neoliberalismo7 e, a partir daí, identifica-se que o mercado passa a ser o único

princípio regulador e estruturador da sociedade e da política, no qual o indivíduo e a

sociedade devem se ajustar para suprir as exigências do capitalismo.

Hoje, no Brasil, com a reestruturação produtiva, a velha pobreza parece se

modificar, pois dá origem a novos excluídos dentro da sociedade. E, neste tipo de

sociedade, a pobreza é lamentável, mas essencial para o desenvolvimento

7 O neoliberalismo é uma prática econômica que rejeita a intervenção do Estado na economia e deixa o mercado se auto-regular com total liberdade. As privatizações e a livre concorrência são características deste tipo de pensamento. É o mercado que dita as regras e conduz a produção. Por exemplo: as empresas não produzem apenas pela necessidade e sim após uma consulta ao mercado, verificando a análise custo-benefício e atenta a possibilidades exteriores. Os defensores do neoliberalismo alegam que esta liberdade é saudável e que através dela os países encontrariam uma evolução natural, um caminho para se chegar a um bem-estar geral. Contudo, o conceito de um mercado intocável já trouxe problemas para muitas economias. O grande paradoxo é que, sendo o mercado tão poderoso, as nações com grandes mercados se fortalecem e as outras enfraquecem (PERRY ANDERSON, 1998, p.36).

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tecnológico e à globalização8. Sabe-se que, com isso, a situação do trabalhador é

cada vez mais difícil, pois a desigualdade social é a condição básica do capitalismo.

No entanto, a Questão Social também vai se expressar pelas formas de resistência

que a sociedade civil organizada busca para enfrentar essa desigualdade.

Na atualidade, a vulnerabilidade se expressa através da precarização do

trabalho, fazendo-se surgir novas formas de contratos e situações de trabalho e o

desemprego. Paralelamente, com os novos padrões de organização do processo

produtivo e os avanços tecnológicos, o mercado exige cada vez mais qualificação

dos trabalhadores, fazendo com que as pessoas habilitadas permaneçam mais

tempo em seus empregos, enquanto que as pessoas com falta de qualificação

profissional, que não tenham experiências anteriores, ou nível de escolaridade

suficiente, para as amplas habilidades cognitivas e comportamentais, como

iniciativa, autonomia, criatividade, entre outras, que as empresa desejam, acabam

transitando no desemprego e no mercado informal, trabalhando como vendedores

autônomos, camelôs, perdendo seus direitos trabalhistas.

Dessa forma, as garantias de direitos passam a ser privilégio de uma

pequena parcela da população que é vista como habilitada, enquanto que outra

grande parte se submete aos subempregos, os quais oferecem, quando muito,

condições mínimas de sobrevivência. Tudo isso faz com que se aumente a

incidência de sofrimento psíquico, pois, para permanecer no trabalho, o sujeito

precisa aumentar sua produtividade, trabalhar mais, fazer horas extras, ficando,

assim, com carga excessiva de trabalho, sentido-se pressionado, desenvolvendo

algum tipo de sofrimento, pois o patronato exige que o trabalho se dê nas 24 horas

8 A globalização é um termo utilizado há vários anos pelos economistas da moda para descrever um processo apresentado como recente, mas, de fato, existente desde o início do século e que foi descrito por Lenin em "Imperialismo, Estágio Supremo do Capitalismo": crescimento e primazia das exportações de capital, desenvolvimento da divisão internacional do trabalho, dos trustes multinacionais, interconexão das economias dos diferentes países, etc. Este nome surge pelo fato de que este processo tomou uma amplitude particular desde os anos 80, em que a desregulamentação generalizada acelera as condições da concorrência no plano mundial e o desenvolvimento dos meios de transporte e telecomunicações suprimiram um a um os obstáculos à deslocalização de centros de produção. Ao mesmo tempo, as crises financeiras, que no passado levavam meses ou anos para se propagar, agora tocam todas as praças financeiras em alguns instantes (PIERRE SIZE, 1997, p.55-60).

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do dia para suprir às demandas do lucro, consolidando-se, então, relações sociais

reificadas9.

Diante do reconhecimento da desigualdade social, o que se identifica é o

aumento do número de pessoas se marginalizando, roubando, furtando, usando

drogas. Acrescente-se a isso os problemas de ordem psicológica, a partir do

momento em que os sujeitos não conseguem mais trabalho e passam a ter

dificuldades financeiras para manter sua família, começa-se a sentir na pele a

exclusão, a vulnerabilidade, pois esse processo os torna cada vez mais incapazes

de ter uma vida digna. A classe trabalhadora sente-se, assim, pressionada e acaba

reproduzindo o sofrimento nos espaços da família. Em decorrência, acabam

ocorrendo uma série de conseqüências causadas pela falta de dinheiro: brigas entre

pais, discussões diárias, falta de estudo, ambiente familiar precário, educação

precária, más instalações, alimentação ruim, entre outros. Tudo isso fazendo, então,

com que se aumente o número de pessoas em sofrimento psíquico, constando-se,

ainda, para piorar, com um sistema de saúde precário e com dificuldades de dar

conta dessa demanda.

É sua marginalização: a fome; a pobreza; programas inadequados de assistência social, saúde, educação, formação profissional e emprego; acidentes na indústria, na agricultura ou nos transportes; a contaminação do meio ambiente; o uso imprudente de medicamentos; a baixa prioridade concedida, no contexto do desenvolvimento social e econômico, às atividades relativas à equiparação de oportunidades; o crescimento demográfico; a violência urbana e outros fatores indiretos (COHN, 2004, p.23).

O efeito combinado, portanto, de diferentes formas de opressão faz com que

a proporção dessas pessoas seja mais alta nos estratos mais pobres da sociedade

brasileira. É uma tendência que obstaculiza seriamente o processo de

desenvolvimento e pode gerar distorções na vida econômica e social e a supressão

do debate sobre os direitos dos cidadãos e das pessoas em sofrimento psíquico.

9 Reificação é o ato (ou resultado do ato) de transformação das propriedades, relações e ações humanas em propriedades, relações e ações de coisas produzidas pelo homem que se tornam independentes (e que são imaginadas como originalmente independestes) do homem e governam sua vida. Significa, igualmente a transformação dos seres humanos em seres semelhantes à coisas, que não se comportam de forma humana, mas de acordo com as leis do mundo das coisas. A reificação é um “caso” especial de alienação, sua forma mais radical e generalizada, característica moderna da sociedade capitalista (OUTHWAITE, 1996, p. 652).

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1.1 SOFRIMENTO PSÍQUICO, QUESTÃO SOCIAL E DOENÇA MENTAL

O sofrimento psíquico está presente em todos em intensidades diferentes. É

vivido pelo indivíduo como algo físico, experiência comum a todos os humanos, e

traz consigo inúmeros significados. Ainda que se apresentem os mesmos

sintomas10, para cada indivíduo estes terão um sentido particular. Para se ter essa

compreensão do sofrimento psíquico é necessário que se considere, portanto o

indivíduo em todo o seu contexto - político, social, econômico, cultural e biológico.

O termo sofrimento mental refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência intelectual congênita ou não, em suas capacidades físicas, sensoriais ou mentais (ONU, APUB RIBAS,1985, p.10).

O significado associado ao sofrimento psíquico é o de doença mental,

contudo, o termo “pessoas em sofrimento psíquico” segue a definição adotada

mundialmente pela Organização das Nações Unidas (ONU) em sua Declaração dos

Direitos das Pessoas em Sofrimento Psíquico, de 9 de dezembro de 1975, aprovada

em Assembléia Geral (CONH, 2004, p.28).

Ao longo da história da humanidade é associado a possessões divinas e

demoníacas, a doenças contagiosas ou à loucura. No decorrer do tempo, encontrou

diferentes formas de definição, diagnósticos e tratamentos.

Foucault, percorrendo a história da loucura, afirma que desde o século XIV ao século XVII, a exclusão de indivíduos é uma prática constante, isto é, a eliminação de pessoas indesejadas, pois valores éticos, morais e o modelo médico estão fortemente enraizados. Desta maneira foram excluídos do convívio social os indigentes, vagabundos e mendigos; prisioneiros; pessoas ordinárias (2002, p. 56).

Esse afastamento estigmatizou o doente mental e seus familiares, deixando

marcas que persistem até os dias de hoje. Em decorrência disso, muitos portadores

de transtornos mentais são vítimas do preconceito, e este faz com que a família

relute em aceitar, inclusive com a pessoa doente também apresentando essa

mesma dificuldade de aceitação para se admitir o diagnóstico e fazer o tratamento.

Doença mental pode ser entendida como uma variação mórbida do normal, variação esta capaz de produzir prejuízo na performance global da pessoa (social, ocupacional, familiar e pessoal) e/ou das pessoas com quem

10 Manifestação subjetiva da doença (Dicionário de Língua Portuguesa, Aurélio, 2004, p.664).

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convive, são consideradas doenças as alterações da saúde que têm uma causa determinada, com a ocorrência de alterações físicas detectáveis. Assim como fatores genéticos podem desencadear a doença mental. Entre as doenças mentais podemos destacar a esquizofrenia11, e o transtorno bipolar12 (ALVES, 1998, p.25).

Durante muito tempo, as pessoas com doença mental foram afastadas do

resto da sociedade, algumas vezes encarcerados em condições precárias, sem

direito a se manifestar na condução de suas vidas. Hoje em dia, as atitudes

negativas os afastam da sociedade de maneiras mais sutis, mas com a mesma

efetividade.

OMS, em 2005, disse que o estado de completo bem-estar físico, mental e social define o que é saúde, portanto, tal conceito implica num critério de valores (valorativo), já que lida com a idéia de bem-estar e mal-estar, provoca sintomas, tais como desconforto emocional, distúrbio de conduta e enfraquecimento da memória. Algumas vezes, doenças em outras partes do corpo afetam a mente; outras vezes, desconfortos, escondidos no fundo da mente, podem desencadear outras doenças do corpo ou produzir sintomas somáticos (p.38).

Já o termo transtorno mental, por outro lado,

é reservado para designar agrupamentos de sinais e sintomas associados a alterações de funcionamento sem origem conhecida, são alterações do funcionamento da mente que prejudicam o desempenho da pessoa no meio onde vivem, na compreensão de si e dos outros, na possibilidade de autocrítica, na tolerância aos problemas e na possibilidade de ter prazer na vida em geral. Isto significa que os transtornos mentais não deixam nenhum aspecto da condição humana intocado. Podemos, então, afirmar que os transtornos mentais não têm uma causa precisa, específica, mas que são formados por fatores biológicos, psicológicos e sócio-culturais (BALLONE, 2004, p.58).

Pessoas com transtornos mentais ou doença mental continuam a ser

prejudicados e discriminados em todas as áreas de suas vidas, desde encontrar um

lugar para viver até encontrar um trabalho. Não é surpreendente que muitas pessoas

com doença mental grave terminem pobres ou sem teto.

Conforme a literatura médica, Araújo

11A esquizofrenia tem como aspectos principais a fuga da realidade, as manias de perseguição, as alucinações, entre outros (http://www.psiqweb.med.br- acessado em 21/09/2007). 12 O transtorno afetivo bipolar tem por característica picos muito grandes de humor, em pouco espaço de tempo, para o lado da depressão e para o lado da mania. O doente sofre de mudanças de humor constantes, sendo perigoso e gastador em fases maníacas e retraído, podendo se suícidar no estado depressivo (ALVES,1998, p. 48).

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conclui que o sujeito que sofrer acidente com traumatismo craniano está propenso a apresentar doenças como depressão, mania13, psicose14, transtorno orgânico de personalidade e (raramente) demência15 (1994, p.68).

Também fatores sociais são indicados como causas de possíveis transtornos

mentais, segundo o relatório da Organização Mundial da Saúde de 2005,

confirmando-se, aí, uma complexa relação entre Questão Social e saúde mental.

Nessa perspectiva, em termos mais amplos, a pobreza surge não somente

como a falta de bens materiais, mas como estado em que não se dispõe dos meios

suficientes, podendo-se incluir nisso a falta de recursos sociais ou educacionais. A

pobreza e as condições associadas a ela, como é o caso do desemprego, do baixo

nível de instrução, da privação e do desabrigo, surgem como fatores de forte

influência na incidência de transtornos mentais e comportamentais, inclusive

transtornos do uso de substâncias psicoativas. Esta é uma situação que pode ser

seriamente agravada pela falta geral de serviços de saúde mental, combinada com

as barreiras sócio-econômico no acesso à atenção, contribuindo, assim, de

sobremaneira, para o aumento do sofrimento psíquico dos cidadãos mais carentes.

A desigualdade social pode, inclusive, minar a auto-imagem e as conexões

sociais dessas pessoas e deixá-las com uma sensação de falta de controle sobre a

maior parte dos aspectos básicos de suas vidas. Condições econômicas

estressantes podem causar a doença mental tanto quando os fatores ambientais,

tais como famílias com dificuldades de relacionamento entre os membros e a

incidência de traumas.

Para se tratar, então, as pessoas em sofrimento psíquico, necessita-se de

espaços especiais. O Hospital Psiquiátrico São Pedro, em Porto Alegre, é

especializado no tratamento do doente mental. Aqueles com sintomas graves ficam

internados por determinado período, já quadros leves a moderados são

acompanhados em ambulatórios. De acordo com a atual política de saúde, os

doentes mentais devem viver em sociedade para promover a sua reinserção social.

13 Síndrome mental caracterizada por excitação psíquica, insônia, muita atividade, agitação motora, gosto exagerado por algo, idéia fixa doentia (ALVES, 1998, p.38). 14 Caracteriza-se pela fuga da realidade (Dicionário de Língua Portuguesa, Aurélio, 2004). 15 Sf. Psiq. Designação genética de complicação mental (Dicionário de Língua Portuguesa, Aurélio, 2004, p.223).

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1.2 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO SÃO PEDRO

Figura 01: Hospital Psiquiátrico São Pedro.

Considerando-se que a doença mental não escolhe suas vítimas, pode-se

dizer que o Hospital Psiquiátrico São Pedro16 atende pessoas de diferentes raças,

etnias, idades, sexos, religiões, nível cultural e/ou social. Fundado em 29 de julho de

1884, com o nome Hospício São Pedro, em homenagem ao santo do dia e padroeiro

da província, foi o primeiro hospital psiquiátrico de Porto Alegre e da Província de

São Pedro.

A sua construção deu-se em virtude dos alienados17 serem alojados em uma

ala especial da Santa Casa. Como o número de alienados provenientes das mais 16 O Hospital Psiquiátrico São Pedro está situado na av. Bento Gonçalves, nº 2640, no bairro Partenon em Porto Alegre/RS, desde a sua inauguração. É uma instituição pública, sem fins lucrativos. Sua administração é composta pela direção geral e esta é descentralizada em quatro: assessoria, direção administrativa, direção técnica e direção de ensino e pesquisa. Fonte: material de divulgação da história do HPSP em comemoração aos 121 anos do hospital em 2005. 17 O termo alienação vem do latim “alienatione”, significando “ato ou efeito de alienar(-se)” (cf. FERREIRA, 1975, p.69). Processo que deriva de uma ligação essencial à ação, à sua consciência e à situação dos indivíduos, pelo qual se oculta ou se falsifica essa ligação de modo que o processo e os seus produtos apareçam como indiferentes, independentes ou superiores aos homens que são, na verdade, seus criadores. No momento em que a uma pessoa o mundo parece constituído de coisas – independentes umas das outras e não relacionadas – indiferentes à sua consciência, diz-se que esse indivíduo se encontra em estado de alienação. Condições de trabalho, em que as coisas produzidas são separadas do interesse e do alcance de quem as produziu, são consideradas alienantes. Em sentido amplo afirma-se que é alienado o indivíduo que não tem visão – política, econômica, social – da sociedade e do papel que nela desempenha (DICIONÁRIO DE SOCIOLOGIA, 2005, p. 220).

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diversas regiões da província crescia em proporções cada vez maiores, começou-se

a recolhê-los à Cadeia Civil, onde eram internados devido sua conduta, que era

classificada em tranqüila ou agitada. Embasado em uma circular imperial do século

XIX, onde eram definidas as casas de caridade e hospitais como órgãos

responsáveis pela administração da loucura, viu-se, então, necessária a criação de

um local para abrigar os alienados.

A criação do ‘asilo de doidos’, além de fazer parte do processo de saneamento social da cidade, que deslocava para o subúrbio as instituições que abrigassem não só as enfermidades e a morte, mas todos aqueles com desvio de conduta, também possibilitou o incremento local da construção do conhecimento alienista. O procedimento indolente era impróprio às exigências de produção da emergente sociedade capitalista 18 (REVISTA DE PSIQUIATRIA DO RS, 20/03/05, p. 12).

Em 1885, em passagem pela Província d E São Pedro, a Princesa Isabel19

fez uma visita ao Hospício São Pedro, tendo o livro de visitas sido assinado por ela,

se constituindo, assim, em um marco do Hospital.

É impossível afirmar sobre alguns acontecimentos ocorridos no hospital até

meados de 1926, pois a documentação do mesmo foi perdida em um incêndio em

1935, nos arquivos, e que acabou por destruir parte do acervo histórico. É fato que,

no período da I Guerra Mundial (8 anos), as atenções do governo voltaram-se à

mesma, e o hospital foi deixado de lado, acarretando uma grande crise econômica.

Isso afetava diretamente os pacientes, visto que sua alimentação, vestuário,

acomodações e o tratamento como um todo foram reduzidos. Com a restrição

orçamentária e o crescente número de pacientes oriundos do interior do estado, foi

fixada uma taxa de contribuição aos municípios, proporcional ao número de

pacientes encaminhados.

18 Fonte: material de divulgação da história do Hospital em comemoração aos 121 anos do hospital em 2005. 19 Uma das mulheres mais citadas na história do Brasil, Isabel Cristina Leopoldina de Bragança, a princesa Isabel, colocou um ponto final no dia 13 de maio de 1888 em uma das maiores manchas do país -a escravidão. Naquele domingo, princesa Isabel assinou a Lei 3.353, mais conhecida como "Lei Áurea", declarando extinta a escravidão no Brasil, mesmo enfrentando muitas resistências dos fazendeiros e da elite em geral. "A princesa imperial regente, em nome de sua majestade, o imperador Dom Pedro II, faz saber a todos os súditos do império, que a Assembléia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte: Artigo 1º - É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil; Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário", dizia o texto que libertou milhões de escravos, que por três séculos serviram de mão-de-obra para o crescimento do país (Material de divulgação da história do HPSP em comemoração aos 121 anos do hospital em 2005).

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A superlotação se agravou após 1937, quando começou a ser mais divulgado

e surgiram melhorias técnicas. Foi criado, também, o Posto Municipal de

Psicopatas20, que tinha como objetivo atender casos de urgência até a abertura de

vagas no hospital, tendo funcionado durante 10 anos.

Durante a 2ª Guerra Mundial, em 1944, foram reduzidos novamente os

recursos, não sendo feitas, então, as reformas físicas previstas. Nesse mesmo

período, foi modificada a forma de tratamento dos pacientes, tendo sido eliminado

gradualmente o conceito de que “o louco era um ‘simples’ processo de demônio”21.

À época, foi criado também o Serviço Médico-Jurídico22. Conforme os relatos23,

pode-se identificar como era o atendimento ao portador de sofrimento psíquico no

hospital antigamente, a falta de preparo dos atendentes e as más condições de

higiene e físicas do local. A instituição não se preocupava com o doente mental, este

era tratado simplesmente como uma pessoa que não tinha validade social, e os

atendentes sem nenhum tipo de preparo para lidar com o doente mental.

Em 1971, quando cheguei ao hospital, marcaram-me muito as condições em que viviam os pacientes dentro das unidades. A divisão Esquirol era um pátio grande, único, com mais de mil doentes, todos numa inércia tremenda, só caminhando de um lado para o outro, totalmente fora da realidade. Os pacientes eram muito delirantes, parecia que a loucura era diferente naquela época, não sei se pelo tipo de tratamento que era usado ou pela aglomeração dos pacientes (MULLER, 2002, p.26).

20 Os psicopatas são caracterizados pelo desprezo pelas obrigações sociais e por uma falta de consideração com os sentimentos dos outros. Eles exibem egocentrismo patológico, emoções superficiais, falta de auto-percepção, pobre controle da impulsividade (incluindo baixa tolerância para frustração e limiar baixo para descarga de agressão), irresponsabilidade, falta de empatia com outros seres humanos e ausência de remorso, ansiedade e sentimento de culpa em relação ao seu comportamento anti-social. Eles são geralmente cínicos, manipuladores, incapazes de manter uma relação e de amar. Eles mentem sem qualquer vergonha, roubam, abusam, trapaceiam, negligenciam suas famílias e parentes e colocam em risco suas vidas e a de outras pessoas (HARE,1995, p. 36). 21 Fonte: material acessado na biblioteca do Hospital, elaborado pelo chefe do Serviço de Recreação do Hospital, Rui Carlos Muller, denominado “Memórias de um velho hospício”, mas sem data e paginação. Conforme os profissionais do Hospital, este material é verídico e retrata um pouco da história do hospital. 22 Criou, então, uma Equipe Sócio-Jurídica no hospital, tendo como finalidade resguardar os direitos legais dos pacientes; fazendo de sua administração um ‘livro aberto’, o governador do Rio Grande do Sul deu início a um processo de legalização e garantia do direito dos pacientes, tornando o antigo hospício no atual Hospital Psiquiátrico (Material retirado na biblioteca do HPSP). 23 Durante muitos anos, o hospital “fechou as portas” para a imprensa e não existe nada que tenha sido registrado sobre a história, tendo-se somente relatos de antigos pacientes e funcionários do hospital (Material retirado na biblioteca do HPSP).

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Quando se depara com uma situação dessas, surgem questionamentos de

como se deixou isso acontecer - o doente mental sendo tratado como um objeto sem

valor. Onde estaria o poder público, os direitos humanos, o atendimento digno e de

qualidade que o doente mental necessita?

A Questão Social está, portanto, clara através da violência que estes usuários

sofrem. O indivíduo é maltratado, tornando-se uma mercadoria de reprodução de

violência e maus-tratos, não sendo dono da sua própria vida.

Familiares de pessoas com sofrimento psíquico esperam encontrar

profissionais capacitados para atender os seus. Jamais imaginam que os mesmos

serão tratados de qualquer forma. Eles também buscam apoio para enfrentar as

dificuldades que são constantes e, muitas vezes, parecem não ter saída.

Na administração do então governador Jair Soares (1983-1987)24, trouxeram-

se vários benefícios aos pacientes do Hospital Psiquiátrico São Pedro. Foram

24 Durante a administração do governador Jair Soares, que encontrou o hospital com mais de 5000 pacientes, foi constatada uma visível melhora na qualidade de vida e de atendimento dos pacientes, que viviam em condições desumanas, com prédios desabando, pouca alimentação, tratamento psiquiátrico ultrapassado e com apenas 1200 leitos, fazendo com que os pacientes se aglomerassem em pouquíssimo espaço. Neste contexto desumano, viviam os pacientes, como eles não tinham aceitação pela família, muitos eram abandonados sem vínculo nenhum com seus familiares, e ao mesmo tempo abandonados em condições precárias pelo governo, devido à falta de estrutura (leitos, remédios, alimentação, entre outros) e da preparação dos profissionais do hospital para atender a demanda existente na época. Logo após, foi criado um plano de setorialização dos pacientes, sendo estes divididos por localidade de procedência, sexo e condições econômicas, seguido de contratação de funcionários, reformas no hospital, criação de serviços técnicos e administrativos (Material retirado na biblioteca do Hospital).

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transformações substanciais com o avanço do movimento pela Reforma

Psiquiátrica25.

A seguir, apresenta-se, então, o quadro de análise que identifica a Lei

Antimanicomial, que está presente na instituição, em andamento no Brasil há anos,

para assegurar um melhor tratamento de saúde ao portador de doença

mental/sofrimento psíquico. Mas, infelizmente, ainda existem falhas nas resoluções

tomadas pelos Governos em relação à lei. Ainda existem muitos processo que

precisam ser melhorados para a garantia a esta população de um atendimento de

qualidade.

Lei Antimanicomonial - Lei Estadual Nº 9.716 – de 07 de agosto de 1992 - Rio

Grande do Sul.

25 A Reforma Psiquiátrica é norteada pelos princípios orientadores do SUS, que são: a saúde como direito, tendo o Estado que prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, por meio de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doença e outros agravos e ao estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde individual e coletiva. (Guia de serviços em saúde mental/RS, 2003:8), universalidade, garantia de atenção à saúde por parte do sistema a todo e qualquer cidadão; eqüidade, sendo considerada a igualdade na assistência a saúde; integralidade da atenção, reconhecendo que cada pessoa é um todo integrante da sociedade, as ações em saúde formam um todo indivisível e também não podem ser fragmentadas e, as unidades prestadoras de serviços, também formam um todo indivisível, capaz de prestar assistência integral; participação, sendo a democratização do conhecimento do processo saúde/doença e dos serviços. O Estado do Rio Grande do Sul foi o primeiro no Brasil a aprovar a Lei da Reforma Psiquiátrica, através do Projeto de Lei (PL) nº 9716 (ANEXO II) em 30 de junho de 1992. Este PL foi inspirado no Projeto de Lei nº3657, do Deputado Federal Paulo Delgado, e amplamente discutido no Fórum Gaúcho de Saúde Mental. A reforma psiquiátrica preconiza a transformação do modelo assistencial em saúde mental e a construção de um novo estatuto social para o doente mental, o de cidadão de direitos como os outros; não pretende acabar com o tratamento clínico da doença mental, mas sim eliminar a prática do internamento como forma de exclusão social dos indivíduos portadores de transtornos mentais. Para isso, propõe a substituição do modelo manicomial pela criação de uma rede de serviços de atenção psicossocial. Neste novo modelo de cuidado, os usuários contam com equipes multidisciplinares para o acompanhamento terapêutico, sendo os agentes no seu tratamento, conquistando assim o direito de se organizar em associações que podem se conveniar aos serviços comunitários, promovendo a inserção social de seus membros (Guia de serviços em SAÚDE MENTAL/RS, 2003, p.8).

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Quadro de Análise Operacional

Demanda Missão Finalidade Objeto Objetivos

Situação de pessoas com sofrimento psíquico e doenças mentais.

Atenção a todas as pessoas em situação de urgência e emergência em sofrimento psíquico e doença mental.

Garantir atendimento de qualidade, em urgência e emergência, para portadores de sofrimento psíquico e doença mental,

Situação de pessoas com sofrimento psíquico e doenças mentais.

-Utilização da tecnologia adequada, gerenciamento integrado;

-Assistência baseada na ética e no comprometimento democrático das informações;

-Gestão financeira participativa;

-Participação da comunidade;

-Motivação dos trabalhadores;

-Humanização no atendimento.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

Com a Reforma Psiquiátrica, propõe-se, então, a redução da hospitalização e

o aumento dos serviços na comunidade, busca-se cuidar do portador de transtornos

mentais sem se ocupar somente da doença. Deste modo, tem-se o objetivo de

atender as pessoas que necessitam de cuidados psíquicos em sua individualidade e

em sua relação com o meio social. Com isso, a rede básica de serviços substitutivos

ao manicômio, que foi criada pela reforma, inclui centros de atenção psicossocial,

clubes de convivência e de lazer assistidos, cooperativas de trabalho protegidas,

oficinas de geração de renda e residências terapêuticas. Sendo assim, não apenas

as discussões sobre o reconhecimento da cidadania do louco lograram aparição

pública, deixando-se de ser um tema de interesse circunscrito a profissionais da área

da saúde para envolver-se com os usuários, familiares dos serviços psiquiátricos e a

população em geral, a loucura que não fosse estigmatizante, cronificante e,

sobretudo, que não reafirmasse a exclusão social dos ditos loucos.

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Hoje, o Hospital Psiquiátrico São Pedro tem como demanda de seus

serviços26 a situação dos portadores de sofrimento psíquico e/ou dependência

química, encaminhados ao hospital pelo serviço de saúde do município de origem, e

internações compulsórias, aquelas realizadas sem o consentimento do paciente.

A seguir, então, destaca-se o quadro de Análise Operacional de atendimento

no hospital. Após muitas leituras de textos sobre a instituição, entrevistas com

profissionais, articulação da teoria com a prática, foi realizado este quadro, que

deveria ser claro para todos os envolvidos na instituição para se assegurar o direito

à saúde ao portador de sofrimento psíquico:

26 O Hospital Psiquiátrico São Pedro presta atendimento no Serviço de referência e contra-referência, no qual participa das reuniões do Fórum de Saúde Mental representando o HPSP junto ao serviço da rede, servindo como mediador, quando solicitado, junto aos municípios entre outras necessidades da instituição; ambulatório Melane Klein, que atende pacientes egressos do HPSP, ou moradores dos bairros Partenon, Agronomia, Lomba do Pinheiro e de alguns municípios do interior do Estado; CIAPS atende crianças e adolescentes em sofrimento psíquico e/ou desintoxicação e, o serviço de admissão e triagem, que presta atendimento mensal aos pacientes, sendo a porta de entrada dos pacientes que estão internados. Tem um total de 101 leitos em suas cinco unidades de internação e atende nestas, usuários oriundos da 1ª, 2ª e 18ª Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS’s). O hospital conta também com onze unidades de moradia, onde estão os pacientes institucionalizados, em sua grande maioria idosos que perderam o contato com seus familiares. Conforme o Censo diário, realizado pelo serviço de Admissão do Hospital, em 13/04/06, o hospital que conta com 101 na internação e atende nestas, usuários oriundos da 1ª, 2ª e 18ª Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS’s). O hospital conta também com onze unidades de moradia, onde estão os pacientes institucionalizados, em sua grande maioria idosos que perderam o contato com seus familiares. Conforme o censo diário, realizado pelo serviço de admissão do hospital, em 13/04/06, o hospital que conta com 101 leitos na internação, estava com 98 pacientes internados e outros quatro na enfermaria masculina. O hospital tem como visão, ser padrão de qualidade na prestação de serviços em saúde mental no estado do Rio Grande do Sul e no Brasil, assim como local de referencia em relação à assistência, ensino e pesquisa; como valores a confiança nas pessoas e nas instituições, humildade para reconhecer erros, respeito às pessoas, diferenças e crenças; e verdade; como filosofia “O ser humano como mola mestra para o desenvolvimento. A gerência participativa como base de mudança e melhoria contínua. A eficiência como resposta às necessidades da comunidade. O prazer no trabalho como pressuposto para a qualidade” e como objetivos elevar a moral do funcionário, promover a satisfação e motivação NO e PARA o trabalho, elevar o nível de satisfação dos usuários, atender a demanda externa, promover o auto-conhecimento da função desempenhada por cada setor de trabalho e buscar a qualificação crescentes dos serviços prestados (Material retirado na biblioteca do Hospital).

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Hospital Psiquiátrico São Pedro:

Demanda Missão Finalidade Objeto Objetivos

Sofrimento psíquico e doença mental

Qualificar o atendimento dentro do modelo de atenção integral à saúde mental, reordenando a prestação dos serviços com providências técnico-administrativas mais dinâmicas e de cunho operacional, com parte integrante e adequada/engajada nos princípios e diretrizes do SUS e da Política Estadual de Saúde Mental.

Proporcionar um tratamento interdisciplinar psiquiátrico adequado de internação das pessoas em sofrimento psíquico e doença mental.

Sofrimento psíquico e doença mental

Cumprir a Lei Federal 8.080/90, Lei Orgânica de Saúde – que institui o SUS.

Cumprir a Lei Federal 10.216/01, que dispõe sobre a Reforma Psiquiátrica no Brasil.

Cumprir a legislação vigente – Lei Federal 9215/92 – que dispõe sobre a reforma psiquiátrica no RS.

Cumprir a Portaria 106/00 MS, e alterações da Portaria 175/01 MS, que cria os serviços residenciais terapêuticos.

Cumprir a portaria 336/02 MS, que estabelece a nova sistemática de

classificação dos Centros de Atenção Psicossocial.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

Portanto, o quadro demonstra o atendimento que deveria acontecer na

instituição. Sabe-se que existem muitas contradições nos papéis dos profissionais

que trabalham na mesma, no qual cabe, então, ao Serviço Social ocupar este

espaço de resistência na concretização do seu Projeto Ético-Político profissional,

que prevê a garantia intransigente dos direitos humanos na busca de uma sociedade

mais justa e igualitária.

1.2.1 Serviço Social no Hospital Psiquiátrico São Pedro e no Centro Integral de Atenção Psicossocial

O Serviço Social foi implantado no HPSP em 1938 pelos serviços prestados

por duas auxiliares sociais quando então foi criado o serviço de Profilaxia Mental,

chamado de Serviço Aberto. Em 1947, o cargo foi ocupado por estagiárias do

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Serviço Social da PUCRS27, mas logo foram contratadas duas profissionais

formadas pela referida universidade para atuarem no hospital. Nessa época, a

intervenção era bastante restrita, visto que os atendimentos eram realizados

somente pelo médico, e as profissionais só poderiam entrar nas enfermarias

acompanhadas por tal.

Em 1950, foi criado o Setor de Serviço Social28, conquistando-se um novo

espaço na intervenção terapêutica29 dos pacientes. Com a regulamentação da

profissão através da Lei 3.252/195730, o Serviço Social como um todo acompanhou

as discussões postas a nível da categoria, como as do Seminário Latino-Americano

em 1965, que foi considerado o marco inicial no movimento de reconceituação31,

trazendo-se à tona uma discussão em nível teórico-metodológico acerca de um novo

projeto pautado em um processo de ruptura com o conservadorismo do Serviço

Social estadunidense e com a proposição de se adequar o Serviço Social à

problemática dos países latino-americanos.

Na sua gênese imediata, a reconceituação foi comandada por uma questão elementar: qual a contribuição do Serviço Social na superação do subdesenvolvimento? (NETTO, 2005, p.09).

Essas discussões estabeleciam, então, nos espaços institucionais a

consolidação da profissão.

27 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul é uma instituição de inspiração católica sobre a quase bicentenária tradição educativa marista. Instituição de ensino superior iniciou suas atividades em 1931, e foi reconhecida como universidade em 1948 (JOAQUIM CLOTET - Reitor, 2007). 28O Serviço Social na atualidade também participa de reuniões da Rede da Cidade e Conselhos Municipais, como o da Assistência Social e Conselho Municipal da Criança e Adolescente; realiza triagem, avaliações e encaminhamentos. Os documentos redigidos auxiliam no processo de trabalho do Assistente Social, estes constituem-se nos Estudos Sociais, nos Pareceres Técnicos, nos Laudos e nos Relatórios (Material da biblioteca do hospital). 29 sf. Parte da medicina que estuda e põe em prática os meios adequados para aliviar ou curar os doentes; terapia (DICIONÁRIO AURÉLIO). 30Decreto nº 994, de 15 d).e maio de 1962. Regulamenta a Lei nº 3.252, de 27 de agosto de 1957, que dispõe sobre o exercício da profissão de Assistente Social. O Presidente do conselho de ministros, usando das atribuições que lhe confere o art. 18, item III, do Ato Adicional à Constituição Federal, e tendo em vista o disposto no art. 8º. decreta: Art. 1º Fica aprovado o Regulamento da Lei ,que dispõe sobre o exercício da profissão de Assistente Social e que a este acompanha, assinado pelo Ministro do Trabalho e Previdência Social. Art. 2º O presente Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário (Brasília, Distrito Federal, em 15 de maio de 1962; 141º da Independência e 74º da República). 31 Em 1967 e 1970, ocorreram os encontros de Araxá e Teresópolis, quando o Serviço Social passou a uma linha mais tecnicista, se preocupando com as técnicas e também com o planejamento como instrumentais da profissão.

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Já na segunda metade dos anos 1970, com o seminário de Sumaré (1978),

que assumiu uma nova vertente dentro desse movimento, a perspectiva

modernizadora, que ganhou opositores dentro da categoria, buscou uma nova saída

para a profissão. Os novos movimentos sociais e políticos do final da década de

1970 contribuíram significamente para a construção de conhecimento para o Serviço

Social. Esta se manifestou a partir dos meios acadêmicos, com ênfase ao chamado

método BH32, desenvolvido por profissionais mineiros, que orientava-se por novas

diretrizes teóricas e novos elementos para a intervenção na realidade.

Nos anos de 1980, com a democratização do país, contribuiu-se para a

elaboração de um novo currículo para o ensino em 1982, pautada nas diretrizes do

pensamento marxista, e, por outro lado, houve a proposta da ampliação da visão

Ético-Política da profissão, o que culminou no Código de Ética de 1986, revisto em

1993.

As inovações que ocorreram dentro da profissão, pela ruptura com o

conservadorismo e trazendo-se ao Serviço Social um Projeto Ético-Político

profissional, voltado para a defesa intransigente dos direitos humanos, a recusa do

arbítrio e autoritarismo, a luta pela ampliação da cidadania e o respeito aos

cidadãos, repercutiram no atendimento e, conseqüentemente, na apropriação da

Questão Social como objeto do Serviço Social.

Os assistentes sociais trabalham com a questão social nas suas mais variadas expressões quotidianas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública, etc. Questão social que sendo desigualdade é também rebeldia, por envolver sujeitos que vivenciam as desigualdades e a ela resistem, se opõem. É nesta tensão entre produção da desigualdade e produção da rebeldia e da resistência, que trabalham os assistentes sociais, situados nesse terreno movido por interesses sociais distintos, aos quais não é possível abstrair ou deles fugir porque tecem a vida em sociedade. [...] A questão social, cujas múltiplas expressões são o objeto do trabalho cotidiano do assistente social (IAMAMOTO, 1997, p.14).

32 O Método BH foi uma experiência vivida por um grupo de Assistentes Sociais de Belo Horizonte no período de 1972 a 1975, especialmente na Universidade Católica de Minas Gerais. O método na proposta era entendido como uma forma de exercício; caminho para obter algo. Os profissionais que discutiam a situação, proposta de reconceituação, negavam que as teorias embasavam a metodologia clássica (caso, grupo e comunidade). O grupo acabou por criar um método composto por etapas, fases, momentos de aproximação onde o produto final foi nada mais que uma moderna edição de estudo, diagnóstico e tratamento, que era proposto na metodologia advinda dos modelos norte-americanos (CAMINE, 2005, p.01).

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Portanto, essa nova perspectiva teórica trouxe definitivamente para o Serviço

Social no Hospital Psiquiátrico São Pedro o seu objeto de intervenção: a Questão

Social e suas expressões vividas pelos sujeitos, no trabalho, na família e na

sociedade. Nessa busca, portanto, pela garantia de direitos, é possível identificar os

vários “braços” da Questão Social: o desemprego, o analfabetismo, a fome, a

violência, a falta de leitos em hospitais, etc. É, assim, que ela se apresenta, nas suas

objetivações, em concretos que sintetizam as determinações prioritárias do capital

sobre o trabalho, onde o objetivo é acumular capital e não garantir condições de vida

para toda a população, principalmente na área da saúde.

O Hospital Psiquiátrico São Pedro conta ainda com um CIAPS33 – Centro

Integrado de Atenção Psicossocial – na instituição. Implantado desde julho de 2001,

conforme credenciamento do Ministério da Saúde, tem como objetivo oferecer um

espaço de atendimento em saúde mental, através de equipe multidisciplinar, a

crianças e adolescentes com transtornos mentais severos e persistentes,

funcionando como lugar de relações, de encontro e ambiente terapêutico,

propiciando uma base segura, respondendo pela acolhida, pelo acesso e pelo

vínculo, além de propiciar área de estágio, formação e aprimoramento profissional,

contribuindo no desenvolvimento de recursos humanos necessários à saúde mental.

33 Tem como objetivos específicos: atendimento a usuários de ambos os sexos, com idade entre 4 e 18 anos, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); desenvolver formas de avaliação e de atendimento da criança, do adolescente e da família, num trabalho de equipe interdisciplinar, visando a compreensão, diagnóstico e o atendimento de acordo com as necessidades específicas de cada usuário; procurar manter os vínculos do usuário com sua família e comunidade, limitando ao mínimo a indicação de internação; proporcionar áreas de estágio, formação e aprimoramento profissional, contribuindo no desenvolvimento de recursos humanos necessários à saúde mental; que a instituição torne-se um instrumento de enriquecimento de subjetividade individual e coletiva, que seja um lugar de relações de encontro, de ambiente terapêutico; que ofereça uma base segura de constância de disponibilidade, respondendo pela acolhida, acesso e vínculo. A unidade possui dois tipos de atendimento, sendo o intensivo para usuários provenientes de cidades pertencentes às 1ª, 2ª e 18ª CRS’s, tendo como indicação para internação usuários psicóticos com sintomatologia produtiva, com agitação psicomotora grave, com risco de auto e hetero agressão, com ideação e plano suicidas; atendimento semi-intensivo (ambulatorial), que atende as microrregiões 6 e 10, correspondentes aos bairros Partenon, Lomba do Pinheiro e Agronomia, tendo como formas de atendimento: hospital dia ou turno (crianças); grupos semanais com atividades terapêuticas durante um turno; grupos de pais;atendimentos individuais semanais; atendimento psiquiátrico-clínico, neurológico e pediátrico. O CIAPS possui 10 leitos para crianças e 10 para adolescentes na internação, 2 vagas para hospital dia/turno no infantil e atende 70 crianças e adolescentes em nível ambulatorial. Possui uma equipe multiprofissional assim composta: psiquiatras, neuropediatra, clínico, pediatra, foniatra, enfermeiros, psicólogos, terapeuta ocupacional, assistentes sociais, psicopedagogas e auxiliares de enfermagem, contando ainda com estagiários, residentes, médicos cursistas e voluntários (Material retirado da biblioteca do hospital).

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Sociedade esta tão desigual, que exclui a grande maioria da população, privando-a dos acessos aos direitos mínimos dos quais é merecedora. Situação que se agrava ainda mais em famílias de adolescentes que encontram-se com algum tipo de sofrimento mental. Tendo na Questão Social o objeto de intervenção do Serviço Social, torna-se necessário compreender suas expressões através de uma leitura coletiva que necessita ser apreendida e pensada a partir da totalidade e da permanente superação (TURCK, 2004. p.23 ).

Quadro de Análise Operacional do Serviço Social

Expressão que dá

visibilidade à

Questão Social para o Serviço

Social no espaço

institucional

Processos sociais

identificados a partir

da expressão

da Questão Social

posta para o Serviço

Social

Missão do Serviço Social

Finalidade do Serviço

Social

Objeto do Serviço Social

Objetivos do Serviço Social na instituição

Objeto do Serviço

Social, sua relação com os

processos sociais

imbricados na Questão

Social

Situação dos adolescentes dependentes de drogas em sofrimento psíquico e doença mental.

Drogadição, alcoolismo, isolamento social, abandono (com ruptura de presença), agressividade.

Desenvolver o processo de trabalho do Assistente Social na implementação do seu Projeto Ético-Político na garantia de direitos no enfrentamento da Questão Social dos adolescentes dependentes de drogas em sofrimento psíquico e doentes mentais.

Promover a reinserção social de adolescentes em sofrimento psíquico / doença mental, nos programas e projetos sociais articulados para a garantia de direitos, cumprindo o que preconiza o Código de Ética dos Assistentes Sociais e a Lei 8.069/90.

Relações sociais de agravamento do sofrimento psíquico e doença mental dos adolescentes em tratamento no CIAPS.

Criar redes sociais de apoio para dar sustentação aos direitos garantidos em lei; implementar o processo de trabalho do Assistente Social a partir dos fundamentos ético-político, teórico metodológico e técnico-operativos, para garantir a reinserção dos adolescentes em sofrimento psíquico e doentes mentais em programas e projetos sociais articulados na busca de garantia de direitos.

Drogadição, alcoolismo, isolamento social, abandono (com ruptura de presença), agressividade.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

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Para se conhecer, portanto, a realidade da instituição, foi feito uma análise

para se saber como os profissionais ocupavam seus espaços, a maneira como eles

atendiam os usuários, sua conjuntura no todo, e como o Serviço Social se

posicionava perante as relações de poder que existem na instituição. Também, a

postura profissional do Assistente Social, a clareza do seu papel dentro do processo

e a tomada de decisão para garantia de direitos, pois, muitas vezes, o instituído vai

tomando conta do local em que se deveria ser de atuação do profissional, tornando-

se o mesmo apenas um realizador de tarefas.

A seguir, o quadro de análise operacional do Serviço Social articulado com o

Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei nº 8.069/90.

Quadro de Análise Operacional do Estatuto da Criança e do Adolescente

Demanda Missão Finalidade Objeto Objetivos

Situação de risco pessoal e social de crianças e adolescentes.

Assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização,

à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Garantir os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar seu desenvolvimento físico, mental, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade para que efetivamente possa exercer sua cidadania plena.

Situação de risco pessoal e social de crianças e adolescentes.

Promover a garantia de direitos e a proteção integral a crianças e adolescentes conforme a Lei 8.069/90.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

O trabalho do assistente social tem de ser, então, planejado e estruturado de

forma a fornecer condições de igualdade à demanda, proporcionando espaços onde

os mesmos sejam reconhecidos enquanto sujeitos de direitos, de valores. Trabalha-

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se, assim, numa perspectiva de redes sociais, buscando-se a articulação e o

fortalecimento destas no cotidiano do usuário.

1.3 AS POLÍTICAS PÚBLICAS

As políticas públicas são aqui compreendidas como as de responsabilidade

do Estado, quanto à sua implementação e manutenção a partir de um processo de

tomada de decisões que envolvem órgãos e, uma pequena parcela da sociedade

civil, que influenciam a vida de um conjunto de cidadãos. São os atos que o governo

faz ou deixa de fazer e os efeitos que tais ações ou a ausência destas provocam na

sociedade.

As políticas sociais entram no Brasil a partir de 1991 dentro da lógica do

Estado neoliberal, estando subordinadas à prática macroeconômica. São

dispensadas de acordo com a renda do usuário, ou seja, deixam de ser universais

para serem contributivas. A saúde e a previdência social passam a ter um caráter

mercantilista, isto é, estão disponíveis no mercado para quem puder comprá-las. Aos

totalmente assalariados cabe, então, a ação focal e residual do Estado na área

social e a ajuda da sociedade civil, como o carro-chefe da cidadania empresarial.

Trata-se de um campo que se define historicamente pela correlação de forças e não de um campo abstrato ou de um instrumento rígido. É no confronto, na luta, então, que surgem as alternativas possíveis de política social, num equilíbrio instável de compromisso entre as forças presentes e os interesses em jogo. Se há força suficiente para a realização de um interesse, este se impõe, devendo parcializar-se, recuar, ou anular-se diante de uma força contrária que quer realizar interesses contraditórios a esses (FALEIROS, 1993, p.82).

Nesse sentido, os portadores de sofrimento psíquico sofrem muitas

discriminações na sociedade, chegando até mesmo a serem tratados como pessoas

perigosas que não podem conviver em sociedade. Recebem, muitas vezes,

tratamentos desumanos. A doença mental deve ser encarada como qualquer outra

doença, o sujeito que sofre deve ser encaminhado para algum serviço de saúde,

onde o mesmo vai estar recebendo a atenção adequada ao seu tratamento.

Para esse tipo de atenção, então, as políticas públicas em saúde integram o

campo de ação social do Estado orientado para a melhoria das condições de saúde

da população e dos ambientes natural, social e do trabalho. Sua tarefa específica

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em relação às outras políticas públicas da área social consiste em organizar as

funções governamentais para a promoção, proteção e recuperação da saúde dos

indivíduos e da coletividade.

No Brasil, as políticas públicas de saúde orientam-se desde 1988 conforme a

Constituição Federal: pelos princípios de universalidade e eqüidade no acesso às

ações e serviços e pelas diretrizes de descentralização da gestão, de integralidade

do atendimento e de participação da comunidade, na organização de um sistema

único de saúde no território nacional. Dessa forma, ao adotar o modelo de

seguridade social para assegurar os direitos relativos à previdência, saúde e

assistência social, determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado.

As políticas públicas se materializam através da ação concreta de sujeitos

sociais e de atividades institucionais que as realizam em cada contexto e

condicionam seus resultados. Por isso, o acompanhamento dos processos pelos

quais são implementadas e a avaliação de seu impacto sobre a situação existente

devem ser permanentes.

Essas políticas públicas sociais se referem a ações que determinam o padrão

de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, à diminuição

das desigualdades sociais produzidas pelo desenvolvimento sócio-econômico.

É a partir dessas premissas que o HPSP atende única e exclusivamente o

SUS34 (Sistema Único de Saúde).

34 A luta gerada dos movimentos sociais e o empreendimento por milhares de representantes que fizeram-se presentes na VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, resultaram na nova Constituição Federal em 1988, legitimando este processo, que “dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências”. Destaca em seu artigo 1º que: o dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas públicas econômicas e sociais que visem à redução de riscos e assegurem o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação (COLETÂNEA DE LEIS, 2005, p.111).

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Quadro 1: Lei 8.080/90 – SUS ( Sistema Único de Saúde)

Quadro de Análise Operacional

Demanda Missão Finalidade Objeto Objetivos

Todos os cidadãos que necessitam de ações de serviços da saúde.

Prestar atendimento universal, igualitário e integral a todo cidadão brasileiro que dele precisa.

Garantir condições de promoção e recuperação da saúde a todos os cidadãos que necessitam deste serviço.

Todos os cidadãos que necessitam de ações de serviços da saúde.

-Identificar e divulgar os fatores condicionantes e determinantes da saúde;

-Formular a política de saúde, destinando a promoção nos campos econômico e social do art.2 desta lei;

-Assistir as pessoas por intermédio de ações da promoção, proteção e recuperação da saúde com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

A nova concepção do sistema de saúde - descentralizado e administrativo

democraticamente e com a participação da sociedade organizada - prevê mudanças

significativas nas relações de poder político e na distribuição de responsabilidades

entre Estado e sociedade, entre os níveis de governo municipal, estadual e nacional.

Deixando aos cuidados dos mesmos a saúde da população.

A partir do momento em que o atendimento é descentralizado e tem

acompanhamento e incentivo dos municípios, nos serviços de saúde mental - bem

como nas regionalizações das internações psiquiátricas - o Hospital Psiquiátrico São

Pedro passa a ser referência para a região metropolitana de Porto Alegre.

A compreensão de um ser humano que sofre por inteiro, que apresenta necessidades complexas, num cenário em permanente mudança, coloca ao gestor de saúde inúmeras questões a serem apreciadas e resolvidas. Este desafio propõe um caminho democrático em saúde: discussão com todos os segmentos da sociedade, compromisso com um modo de gestão em defesa da vida (RELATÓRIO AZUL, 2006, p.52).

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A partir do momento em que o hospital não consegue mais atender a

demanda, o mesmo esta reproduzindo no tratamento do doente mental a mesma

prática aplicada a tantos outros segmentos da sociedade, como a exclusão, a

segregação e o confinamento desses usuários.

O quadro a seguir demonstra a importância das políticas de saúde, conforme

a constituição de 1988, que procura garantir a saúde como um direito de todos e um

dever do Estado.

Quadro 2: Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre

Quadro de Análise Operacional

Demanda Missão Finalidade Objeto Objetivos

Necessidade de atendimento à saúde a toda população do município de Porto Alegre.

Afirmar a gestão municipal sobre os serviços públicos e privados da saúde de Porto Alegre, buscando padrões elevados de qualidade e produtividade na atenção aos usuários do SUS.

Promover ações de saúde, prevenção às doenças, assistência curativa e reabilitação, respondendo prioritariamente aos agravos de maior incidência e prevalência.

Necessidade de atendimento à saúde a toda população do município de Porto Alegre.

- Trabalhar no plano de municipalização de gestão pública;

- Estruturar o planejamento integrado ao Sistema de informações;

-Ampliar a participação da cidadania através do Marketing Social.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

Verificou-se, assim, que as políticas públicas são de extrema importância,

principalmente quando se trabalha em uma instituição destinada a atender a

população carente, o conceito de saúde, então, se amplia, estendendo-se para o

bem-estar físico, mental e social. Há uma existência de um contexto de forças e

influências sociais, culturais e emocionais que devem ser considerados por estarem

interligadas para solução dos problemas dos usuários/pacientes em sofrimento

psíquico.

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2 O SOFRIMENTO PSÍQUICO E O PROCESSO DE ADOLESCIMENTO

A adolescência é uma fase evolutiva na vida do ser humano em que se busca

uma nova forma de visão de si e do mundo; uma nova edição de todo

desenvolvimento infantil, visando a definir o comportamento, caráter social, sexual,

ideológico, vocacional e estilo de vida. Esse processo evolutivo ocorre dentro de um

tempo individual e de forma pessoal em que o adolescente se vê envolvido com as

manifestações de seus impulsos intuitivos, exteriorizados através de suas condutas

nem sempre aceitas como normais pela sociedade.

Durante o processo de adolescer, o jovem passa por desequilíbrios e

instabilidades externas, ocorrendo, então, um sofrimento psíquico devido a

processos em que configuram-se manifestações semipatológicas, de certa forma,

perturbadoras para o mundo adulto, mas importantes para o adolescente. E é nesse

caminhar que se vai estabelecer a sua identidade, sendo este um objetivo

fundamental desse momento da vida.

Na adolescência, podem ainda acontecer crises de agressividade ou mesmo

violência. Geralmente esses comportamentos ocorrem naqueles que têm muita

dificuldade de comunicação e possuem poucas habilidades desenvolvidas.

Isso faz com que eles se sintam incompreendidos, não tenham seu espaço pessoal e sintam-se constantemente frustrados. Quando o adolescente é submetido a um isolamento acentuado, com poucas oportunidades de vivência afetiva, sua reação pode tomar a forma de comportamentos difíceis, de um domínio do mundo da fantasia, com amigos imaginários que absorvem a maior parte de seu tempo (BLASCOVI & MONTEIRO, 1989, p.20).

Muitos dos comportamentos, então, que trazem dificuldades para a família

estão relacionados com a necessidade de atenção ao sofrimento psíquico que

enfrentam.

As mudanças corporais e psicológicas que se produzem durante a puberdade e a adolescência obrigam o indivíduo a abandonar a identidade e os papéis que caracterizam seu status de criança. Esta renúncia exige um doloroso e lento trabalho de luto, que inclui o corpo, a mente e as relações de objeto infantil (ABERASTURY, 1981, p.73).

A esta crise, provocada pela ampla e profunda desestruturação em todos os

níveis da personalidade, segue-se um processo de reestruturação, passando-se por

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diferentes ocasiões nas formas de se exprimir ao longo dos anos. O eixo central

desta é o processo de elaboração dos lutos gerados pelas três perdas fundamentais

desse período evolutivo (ABERASTURY E KNOBEL, 1981).

A perda do corpo infantil - o adolescente vive com muita ansiedade as

transformações corporais ocorridas a partir da puberdade, as quais exigem dele uma

reformulação de seus mundos interno e externo. Muitas vezes, as restrições

familiares e sociais para controlar esses impulsos ameaçam tanto o seu

desenvolvimento que chega a causar retardo em seu crescimento e no aparecimento

natural das funções sexuais próprias a fase.

Perda dos pais da infância - os mesmos, antes idealizados e

supervalorizados, passam a ser alvo de críticas e questionamentos. Dessa forma, o

adolescente busca figuras de identificação fora do âmbito familiar. Nesta fase, se

caracteriza a dependência/independência dos filhos em relação aos pais e vice-

versa; é o momento em que o adolescente busca substituir muitos aspectos da sua

identidade familiar por outra mais individual.

Perda da identidade e do papel sócio-familiar infantil isso acontece da relação

de dependência natural do convívio da criança com os pais, segue-se uma confusão

de papéis, pois o adolescente, não sendo mais criança e não sendo ainda um

adulto, tem dificuldades em se definir nas diversas situações de sua cultura.

No caminho para a sua independência, sentindo-se ora inseguro, ora

temeroso, busca, então, o apoio do grupo, que tem importante função, pois facilita o

distanciamento dos pais, permitindo novas identificações. Para atingir a fase adulta,

o adolescente deve fazer uma síntese de todas essas identificações desde a sua

infância.

O adolescente exterioriza ainda os seus conflitos e formas de elaboração de

acordo com as suas possibilidades e as do seu meio, com as suas experiências do

cotidiano. Para se compreender e lidar com adolescentes é fundamental que se

conheça essas aparentes características: busca de si mesmo e da identidade adulta,

tendência grupal, necessidade de intelectualizar e fantasiar, crises religiosas,

deslocação temporal, evolução sexual, atitudes sociais reivindicatórias, contradições

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sucessivas em todas as manifestações de conduta, separação progressiva dos pais

e constantes flutuações do humor e do estado de ânimo.

O sofrimento, a contradição, a confusão, os transtornos são deste modo inevitáveis; podem ser transitórios, podem ser elaboráveis, mas devemos perguntar-nos se grande parte da sua dor não poderia ser suavizada mudando estruturas familiares e sociais (ABERASTURY, 1981, p.17).

Quando o corpo começa a mudar, todas as antigas referências desabam. A

tarefa dos adolescentes parece árdua: abandonar o mundo conhecido da infância

para enfrentar o novo e tentar, algumas vezes desastradamente, definir seus

contornos. A descrição das dores da adolescência, quando os jovens vão dos

sofrimentos psíquicos aos comportamentos de risco.

Se a infância é a idade das alegrias e surpresas, caracterizadas pelos

movimentos, a adolescência é a idade das dúvidas e das contradições, que

caracterizam uma verdadeira revolução.

2.1 A FAMÍLIA COMO LÓCUS DE ADOLESCIMENTO E DE SUPERAÇÃO DO SOFRIMENTO PSÍQUICO.

Na sociedade atual, a família se estabelece a partir da decisão de algumas

pessoas conviverem assumindo o compromisso de uma ligação duradoura entre si,

incluindo uma relação de cuidados entre os adultos e deles para com as crianças

que aparecem nesse contexto.

A família, dessa forma, é o primeiro agente socializador35 da criança e do

adolescente. As suas características têm influência direta nas características do

adolescente (nível interno e relacionamento com o meio externo). Cada família tem

sua especificidade e esta deve ser considerada em todo trabalho envolvendo

famílias. O relacionamento estabelecido entre família e adolescente está na

dependência do posicionamento dos pais frente ao processo adolescente dos filhos.

35 Socialização: processo pelo qual ao longo da vida a pessoa humana aprende e interioriza os elementos sócio-culturais do seu meio, integrando-os na estrutura da sua personalidade sob a influência de experiências de agentes sociais significativos, adaptando-se assim ao ambiente social em que deve viver (ROCHER, 2003, p.53).

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O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece: "toda criança ou

adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e,

excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e

comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de

substâncias entorpecentes” (1990, Cap.III, Seção.I, art. 19).

De acordo com o ECA, a família é revestida de deveres e factível de ser

punida. Ao mesmo tempo, todas as medidas de proteção reforçam o vínculo familiar

como primeiro e fundamental no desenvolvimento da criança e do adolescente.

A introdução do homem na sociedade é realizada pela socialização, inicialmente a primária e, posteriormente a secundária. Na nossa sociedade, a socialização primária ocorre dentro da família, e os aspectos internalizados serão aqueles decorrentes da inserção da família numa classe social, através da percepção que seus pais possuem do mundo, e do próprio caráter institucional da família (LANE, 1984, p.7).

Os mecanismos de socialização são, então, estruturalmente engendrados e

definidos. O processo de socialização só pode ser tratado como um processo

evolutivo da condição social da criança considerando-se sua origem de classe.

Como a família é, portanto, a primeira instituição socializadora, é ela que

desempenha o papel de organizadora primária da sociabilidade e da sexualidade,

bem como dos laços de dependência emocional entre seus membros. Na

dependência das características da família é que vão surgir determinadas

características do adolescente, considerando-se estas não só no nível interno, mas

também no nível de seu relacionamento com o meio externo. E as características da

família estão em relação direta com sua situação de classe: os membros de

diferentes classes sociais têm diferentes condições de vida, percebendo o mundo

diferentemente, desenvolvendo diferentes concepções de realidade.

Sendo assim, as relações emocionais assumem aspectos diversos na

dependência da situação social e econômica na qual a família se insere. É nessa

lógica que se constitui enquanto unidade, formada por um conjunto de pessoas,

cada uma com sua dinâmica interna, configurando-se numa rede de relações, ou

seja, uma rede familiar. Há a dinâmica interna das pessoas e a dinâmica da família,

numa interdependência contínua. É, portanto, nesse lócus que se reproduzem as

relações de opressão e de resistência. No entanto, ao mesmo tempo em que se

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constitui em um espaço de violência, também se constitui um espaço afetivo de

pertencimento.

Enfocando-se, então, o processo adolescente no contexto familiar, há várias

especificidades. Para muitos pais, a percepção de que o filho está se tornando um

adolescente só acontece ao se darem conta das modificações corporais ocorridas

com o filho. O desenvolvimento psicossocial não é considerado. Há muitas queixas

associadas ao comportamento porque estes não são entendidos como

característicos da adolescência, mas sim percebidos como malcriação dos filhos

(comportamentos não aprovados). Muito freqüentes são as queixas quanto à

instabilidade de comportamento, indisciplina e rebeldia.

Em parte, o sofrimento psíquico dos adolescentes, está ligado ao seu comportamento de uma forma geral. Freqüentemente, esses adolescentes têm uma vida isolada, havendo poucas atividades em que têm oportunidade de interagir e grande parte do tempo é despendida em atividades solitárias corno assistir à televisão (KRYNSKI, 1983, p.87).

Embora os pais se preocupem com as relações que os filhos estabelecem

com os outros, a turma é indispensável para que um adolescente construa sua

personalidade e sua vida social. É um prazer e uma necessidade estar com pessoas

da mesma idade, falar a mesma linguagem, usar as mesmas roupas, comer a

mesma comida e ouvir a mesma música. Juntos, eles trocam idéias, desabafam,

exibem-se e divertem-se, longe das imposições familiares.

É importante se considerar as expectativas da família frente ao adolescente.

No processo de estabelecimento da identidade, paradoxalmente, pede-se a ele

independência em relação à família, ao mesmo tempo em que se espera dele

comportamento de obediência e submissão. No geral, a adolescência se caracteriza

por uma condição que não é mais a de criança, mas nem deve ser ainda a do

adulto. É uma condição selada pela provisoriedade. Os filhos lutam pela

independência de modo ambivalente (querendo e não querendo) e os pais também

se comportam de modo ambivalente, pois, ao exigirem a independência de seus

filhos com relação a eles mesmos, também o fazem de modo ambíguo,

comportando-se como bloqueadores da mesma.

Muitos pais atuam com rigidez intensa frente a seus filhos, gerando conflitos.

Outros atuam com permissividade extrema, deixando de orientar o filho num

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momento tão importante de estruturação de sua personalidade. Embora os pais se

considerem competentes e capazes de responder as suas necessidades, algumas

famílias são vulneráveis à experiência e ao estresse, podendo afirmar-se que esta

vulnerabilidade afeta a dinâmica e as interações familiares.

O adolescente quer independência, mas também precisa de limites. Só que

estes não devem ser excessivos, rígidos e difíceis de serem cumpridos, pois quando

os pais criam muitas regras, os filhos, por saturação, deixam de cumprir parte delas,

ignorando-as e burlando-as. Quando as regras são difíceis de serem cumpridas,

porque são muito rígidas, a chance de que sejam desrespeitadas aumenta e a

possibilidade de os pais permitirem seu descumprimento é grande. Por outro lado,

há muitos pais que compreendem a adolescência como um processo na vida do

filho, agindo como facilitadores da vivência do mesmo, ou seja, mantendo postura de

diálogo, de abertura para com o filho.

Acredita-se que, ao se reconhecer o poder inerente ao usuário/paciente e à

sua família, abre-se um espaço para que o fortalecimento e o pertencimento de

todos nas possibilidades de alternativas sejam aprendidas e desenvolvidas. Esse

modelo pode ser posto em prática mediante o apoio das redes sociais mais amplas,

como a escola, os amigos e o meio social. É importante que se identifique e se

valorize o papel das redes de suporte social que se possa exercer junto aos

adolescentes e suas famílias.

As famílias que convivem com o adolescente em sofrimento psíquico

precisam construir saberes e ações juntamente com os profissionais para poder

ajudar o usuário/paciente. Quanto mais preparadas para receberem esse membro

da família, pois a família tem que ser participativa e atuante, mais cresce a

possibilidade de melhora do portador de sofrimento psíquico.

É, portanto, nesse universo conturbado e incerto, produzido por uma

sociedade capitalista de cunho periférico, que os jovens buscam referências

tranqüilizadoras. Nesse sentido, a família pode representar o refúgio necessário em

uma sociedade na qual não conseguem se inserir facilmente.

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2.2 ADOLESCENTES USUÁRIOS DO SERVIÇO SOCIAL NO HOSPITAL PSIQUIÁTRICO SÃO PEDRO

Analisando-se o público alvo do Serviço Social no HPSP, constata-se que a

grande maioria dos adolescentes vinculadas ao CIAPS pertence a um contexto

social excludente, com dificuldades em relação ao sofrimento psíquico.

Muitas famílias encontram-se com capacidade mínima de inserção e

reinserção nos mercados formal e informal de trabalho, seja por formação e

qualificação insuficientes, frente as necessidades de um mercado cada vez mais

exigente, competitivo e restrito, ou pelo processo de extinção e semi-extinção de

muitas atividades produtivas que passaram a ser substituídas pela rapidez dos

avanços tecnológicos - imposição da competitividade no Brasil junto à comunidade

internacional. São famílias que, segundo seus próprios relatos, sobrevivem sem

acesso às condições mínimas de bem-estar.

A desigualdade social posta no país, tem sido uma das grandes causas –

senão “a” causa – do crescimento de crianças e adolescentes sem preparação para

a vida. Muitos deles não conseguem oportunidades e acabam se tornando

delinqüentes ou desocupados como resultado dos processos de exclusão social.

Outro fator, ainda, que agrava esse quadro é a falta de esclarecimento da família

sobre o sofrimento psíquico devido a todas dificuldades inerentes à situação de

pobreza já mencionadas.

É, portanto, nessa conjuntura que se faz premente a tomada de conhecimento

do indivíduo como um todo, nas suas múltiplas dimensões, considerando-se "a ética

da responsabilidade na apreensão das diversas formas de manifestações do

indivíduo na realidade social (...) e a noção de compromisso" (AZEVEDO, 1998,

p.30). Isso demanda aproximação do Serviço Social com o atendimento que esses

usuários/pacientes necessitam em um momento tão difícil para se poder dar conta

do sofrimento psíquico/doença mental existente em suas vidas. É, então, a partir

desse momento que começa o processo de trabalho do Assistente Social.

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3 O PROCESSO DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL COM ADOLESCENTES INTERNADOS E EM SOFRIMENTO PSÍQUICO

O processo de trabalho do Assistente Social se dá, então, a partir da

apreensão da Questão Social na vida dos sujeitos, constituída através da

desigualdade social e da resistência.

Importa deixar claro que a questão social não é aqui focada exclusivamente como desigualdade social entre pobres e ricos, muito menos como “situação social problema”, tal como historicamente foi encarada no Serviço Social, reduzida a dificuldades do indivíduo. O que se persegue é decifrar, em primeiro lugar, a gênese das desigualdades sociais, em um contexto em que acumulação de capital não rima com eqüidade. Desigualdades indissociáveis da concentração de renda, de propriedade e do poder, que são o verso da violência, da pauperização e das formas de discriminação ou exclusão social. Mas decifrar a questão social é também demonstrar as particularidades das formas de luta, de resistência material e simbólica acionadas pelos indivíduos sociais à questão social (IAMAMOTO, 1998, p.59).

No processo de trabalho do Assistente Social, exige-se que se compreenda o

sujeito no processo de produção e reprodução que ele estabelece no cotidiano,

articulado com os fenômenos sociais e como eles se apresentam em sua vida.

Quando, então, se fala em prática profissional, se está referindo ao conjunto

de atividades desempenhadas pelo Assistente Social, acionando-se técnicas e

estratégias, capacidade de leitura da realidade conjuntural e a habilidade no trato

das relações humanas - todo esse conhecimento adquirido no espaço acadêmico

mais a prática do estágio. Esta se consolidou pela apropriação da Teoria Marxista,

que analisa a sociedade capitalista e que dá sustentação aos fundamentos teórico-

metodológicos, ético-políticos e técnico-operativos do Serviço Social, articulados

através do processo de trabalho no desvendamento do objeto, para se poder, então,

partir para a metodologia de operacionalização do Método Dialético Materialista com

os quadros de Prática Relacional.

Essa metodologia foi construída para se viabilizar a apropriação da Questão

Social no concreto conforme representação do trinômio:

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Fonte: Assistente Social Profª. Maria da Graça Maurer Gomes Türck

O método dialético busca captar a ligação, unidade, o movimento que engendra os contraditórios, que os opõe, que faz com que se choquem, que os quebra ou os supera (LEFEBVRE, 1991, p.238).

É, portanto, a partir do Processo de Conhecimento que se faz o movimento

inicial para desvendar o objeto Questão Social na vida dos sujeitos, articulando-se a

teoria com a prática a partir do quadro a seguir:

Se

Relações Sociais

S o c i e d a d e

C a p i t a l i s t

Sujeito individual Subjetividade.

No comportamento do sujeito emerge a expressão que dá visibilidade à

Questão Social, portanto, “aquilo que é sentido por experiência” (Bueno, 1986,

p.467)

Eu

Países do Terceiro Mundo

Relações de produção

a

Acontecem na comunidade cálida na qual o sujeito pertence: família.

Nós

Processos Particulares

Processos Sociais

Acontecem na comunidade fria na qual o sujeito constrói sua vida: espaço social amplo e específico.

Sociedade internacional – sociedade brasileira, estado e município.

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Quadro de Prática Relacional: 1. Processo de Conhecimento

Processo de Trabalho

Fundamentos teórico-metodológicos: Leituras agregadas: Atendimentos: semanal quinzenal mensal

Expressão que dá

visibilidade a Questão Social

Estratégias metodológic

as / instrumentais operativos

Subjetividade do sujeito

Processos Particulares

Processos Sociais

Pontos nodais

elencados

Objeto Objetivos* Produto Final

Forma de manifestação da desigualdade social através do comportamento do sujeito.

Abordagens, técnicas e instrumentos necessários à execução do Processo de Conhecimento.

Identificação das formas de resistência do sujeito, contextualizada nas formas de enfrentamento utilizadas para responder, através do comportamento, aos processos de exclusão e desigualdade social cotidiana.

Contextualização dos processos relacionais no espaço afetivo do sujeito, e no contexto familiar, que produzem interações de violência agravando as desigualdades sociais.

Identificação das formas de resistência e das estruturas sociais e institucionais que “alimentam” as formas de exclusão e desigualdade social, que se expressam nas interações afetivas e sociais dos sujeitos.

Análise da situação com os pontos nodais de vulnerabilidade, que impedem a superação das formas de desigualdades sociais.

Desvendamento do objeto Questão Social na vida do sujeito, a ser superado.

Resultado do Processo de Conhecimento: documentação para circular no espaço público; encaminhamento, ou Processo de Intervenção.

Fonte: Profª. Assistente Social Maria da Graça Maurer Gomes Türck.

* Objetivos:

- Identificação dos objetivos a serem atingidos para o encaminhamento a outros espaços institucionais, ou a implementação do Processo de Intervenção.

Ao se desvendar o objeto, o segundo movimento de continuidade do processo

de trabalho se dá a partir da superação do mesmo, o que se vê a partir do quadro a

seguir:

Quadro de Prática Relacional: 2. Processo de Intervenção

Processo de Trabalho

Fundamentos Teórico-Metodológicos:

Leituras agregadas: Atendimentos: semanal quinzenal mensal

Objeto

Objetivos

Estratégias Metodológicas / Instrumentais

Operativos

Desenvolvimento do Processo de Intervenção na superação do objeto

Produto Final

Análise

Relação do objeto desvendado no Processo de Conhecimento a ser superado e, assim, sucessivamente.

Identificação dos objetivos anteriormente elencados a serem atingidos.

Definição das abordagens e técnicas operativas a serem utilizadas.

Definição dos pontos importantes que proporcionarão a visualização da articulação teórico-práticos e os nexos importantes na superação do objeto na continuidade do atendimento.

Superação do objeto trabalhado e dos pontos nodais elencados, assim sucessivamente, na garantia de direitos.

A análise dos objetivos alcançados.

Fonte: Assistente Social Profª. Maria da Graça Maurer Gomes Türck

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Dessa forma, o processo de trabalho no CIAPS junto aos adolescentes

internados em sofrimento psíquico implicou primeiramente no desvendamento do

objeto na vida de cada um deles através do Processo de Conhecimento.

3.1 O PROCESSO DE CONHECIMENTO E O DESVENDAMENTO DO OBJETO

O Processo de Conhecimento é o momento em que se vai conhecer para

propor. A partir do momento em que se vai tomando conta de quem é o sujeito, o

que emerge do mesmo, de sua história de vida, o que os levou a procurar ajuda,

como eles chegaram na instituição, o objeto vai aos poucos sendo desvendado, isto

é, vão se articulando suas fragilidades e também vai se apropriando das

modificações que aconteceram no seu dia-a-dia e que levaram estes adolescentes

ao internamento.

O que primeiro emerge do cotidiano profissional é a expressão que dá visibilidade à Questão Social na vida do sujeito, que vai ser desvendada a partir deste caminho metodológico, que vai permitir que parte do processo de trabalho do Assistente Social se concretize (Türck, 2006, p.12).

Na dos adolescentes no HPSP as expressões se caracterizavam pela

agressividade física e pela tentativa de suicídio.

Logo, esse processo foi construído com 9 adolescentes, dos quais sete eram

do sexo masculino e dois do sexo feminino, na faixa etária entre 12 e 17 anos. Sobre

a escolaridade, verificou-se que, do gênero masculino, um era analfabeto, quatro

tinham ensino fundamental incompleto - sendo que todos tinham abandonado a

escola - um com ensino fundamental completo e um com ensino médio em

andamento. Do gênero feminino, as duas estudavam no ensino médio, sendo que

uma tinha evadido a escola. Todos os adolescentes eram oriundos do interior do Rio

Grande do Sul.

Primeiramente, para iniciar este processo de trabalho foi necessário

conquistar um espaço de resistência no CIAPS. Se tinha em mãos os adolescentes,

no entanto, o processo de trabalho do Assistente Social se caracterizava apenas

pelo atendimento das famílias direcionado à coleta de dados para o preenchimento

dos prontuários. Este foi o desafio: como constituir um processo de trabalho que

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garantisse o Projeto Ético-Político em uma semana, tempo limite de internamento

desses adolescentes?

Mesmo que solitariamente era necessário romper o que contumazmente o

Serviço Social se depara nos espaços institucionais.

O Serviço Social situa-se no processo de reprodução das relações sociais como atividade auxiliar e subsidiária no exercício do controle social e de ideologia, isto é, na criação de bases políticas para a hegemonia das classes fundamentais favorecedoras da reprodução da força de trabalho (IAMAMOTO, 2006, p.171).

Portanto, o exercício de trabalho dos Assistentes Sociais no CIAPS tinha essa

característica. Logo, a conquista do espaço de resistência foi consolidada pela

interação com a equipe multiprofissional a partir da consolidação de um espaço

identitário que foi aos poucos sendo conquistando.

Os significados do “eu”, do “nós” e do “se”, imbricados no sujeito/indivíduo que passa a se constituir como rede interna, no momento em que este passa a delimitar seu lugar e sua identidade, cria laços, alianças e insere-se em um espaço de grupo, junto a outros sujeitos com mesmo interesse. Todos os sujeitos passam, então, a constituir-se em participantes ativos da rede e também em “fiadores” da garantia do espaço individual em um contexto de grupo (Türck, 2002, p.33).

Foi a partir desse momento que se oportunizou, então, o “Projeto Conexão

com o Adolescer”, oferecendo-se, assim, um espaço dentro do Hospital Psiquiátrico

São Pedro para os adolescentes internados na unidade CIAPS.

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Quadro de Prática Relacional: 1. Processo de Conhecimento

Processo de Trabalho

Fundamentos teórico-metodológicos:

Leituras agregadas:

Atendimentos: semanal quinzenal mensal

Expressão que dá

visibilidade à Questão Social

Estratégias metodológicas / instrumentais

operativos

Subjetividade do sujeito,

subjetivada / objetivada

Processos Particulares

Processos Sociais

Pontos nodais

elencados

Objeto coletivo

desvendado

Objetivos* Produto Final

Adolescentes com agressividade e com situação de tentativa de suicídio internados (9).

Análise do conteúdo dos prontuários, observação, escuta sensível, abordagem individual entrevista individual, reflexiva, contato com a equipe multiprofissional.

Tristeza, medos, incertezas, revolta, vínculos afetivos fragilizados, angústias, não pertencimento.

Fragilidade dos laços afetivos com a família de origem.

Abandono sem ruptura de presença, sofrimento psíquico, isolamento social.

Fragilização dos vínculos parentais, sofrimento psíquico.

Situação de sofrimento psíquico pela desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos vínculos parentais.

Continuidade do atendimento a partir do Processo de Intervenção, através da abordagem coletiva.

Fonte: Assistente Social Profª. Maria da Graça Maurer Gomes Türck

* Objetivos:

- Criar condições de conexão destes adolescentes com seu processo de adolescer para que possam vincular-se com experiências de vida saudável para evitar seu retorno ao internamento.

- Criar condições de conexão com histórias de vida familiar para superar e reconstruir suas histórias de vida, fortalecendo os vínculos familiares.

- Criar condições de apropriação do sofrimento psíquico para aprender a viver e lidar com ele, sem torná-los pacientes psiquiátricos.

Após o desvendamento do objeto coletivo, o próximo movimento foi garantir

um espaço no CIAPS para a continuidade do trabalho, já que a equipe

multiprofissional havia se inserido na necessidade de se implementar o projeto

elaborado pela estagiária.

Aos poucos, então, o Projeto Ético-Político foi sendo consolidado a partir da

garantia de um espaço para a execução do processo de trabalho na garantia

intransigente de direitos na “prática miúda” do Assistente Social.

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3.2 O PROCESSO DE INTERVENÇÃO: SUPERANDO O OBJETO DESVENDADO

Passou-se, então, a constituir um movimento de superação a partir da

estratégia metodológica de abordagem coletiva no uso do grupo operativo como

principal instrumento de intervenção.

Um grupo operativo centrado na tarefa tem por finalidade aprender a pensar em termos das dificuldades criadas e manifestadas no campo grupal e não em cada um de seus integrantes, o que seria uma psicanálise individual em grupo. No entanto, não está centrado exclusivamente no grupo com as concepções guestálticas36, senão em cada aqui agora, comigo na tarefa se opera em duas dimensões, constituindo em certa medida uma síntese de todas as correntes. (...) Nisto reside a diferença da técnica operativa com as outras técnicas grupais já que as interpretações se fazem em dois tempos e em duas direções distintas (PICHON-RIVIÈRE, 2000, p.128).

Logo, o processo de intervenção se deu a partir do seguinte diagrama:

GRUPO

A

GRUPO

B

GRUPO

C

Situação de sofrimento psíquico

pela desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos

vínculos parentais

Figura 02: Diagrama do Processo de Intervenção

As intervenções foram realizadas dividindo-se em três grupos os

adolescentes, sendo que cada grupo foi trabalhado em quatro momentos, a partir do

objeto coletivo desvendado em que os mesmos reconstruíram páginas de suas

vidas. Para tanto, agregaram-se ao grupo operativo outros instrumentais importantes

na articulação da teoria com a prática, como, por exemplo, a dinâmica de grupos.

36 Técnicas, terapia de conduta, para tratamento de psicoses (DICIONÁRIO DE SOCIOLOGIA, 2006).

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Esta foi utilizada no

que se refere ao desenvolvimento dos valores individuais e coletivos dentro de um determinado segmento social. A busca do auto-conhecimento, da responsabilidade, da confiança mútua, da interação grupal, da cooperação, da polidez, da benevolência, da capacidade de liderança, de decisão e de iniciativa (MIRANDA, 2001, p.13).

A conexão foi, então, sendo realizada utilizando-se colagens, recortes de

revistas e figuras. A partir disso, se trabalhava o processo de adolescer, a

importância da família, os pais, irmãos e amigos.

Este processo de atendimento sustentava-se em quatro conceitos: Questão

Social, a teoria do processo de adolescer, no vínculo e no grupo operativo.

Elementos estes que deram sustentação ao processo de trabalho que foi constituído

com os nove adolescentes em sofrimento psíquico internados no CIAPS.

O Processo de Intervenção foi realizado semanalmente no espaço físico do

CIAPS, de terça à sexta-feira na parte da manhã, com a duração de 45 minutos,

num período de dois meses, de outubro a novembro de 2006.

Os grupos passaram a transcorrer semanalmente, em cada qual se procurava

intervir da forma planejada, ou seja, propiciando-se um espaço de conhecimento e

interação entre os participantes. Dessa forma, permitiu-se que eles explicitassem,

por exemplo, a ausência dos pais, o não pertencimento, a desunião familiar, a

fragilização do afeto.

O tempo disponível para a internação era de uma semana, iniciando-se,

então, no primeiro dia, com a conexão com o processo de adolescer. Segundo dia,

conexão com a família e com os pais. No terceiro, com o sofrimento psíquico, e no

quarto dia, com a constituição de um projeto de vida – o que cada um gostaria de

realizar após a alta hospitalar.

Trazia-se, nesses momentos, a importância de se proporcionar um espaço de

escuta, de respeito, de acolhida para os adolescentes, para que estes se sentissem

seguros, tranqüilos durante os trabalhos nos grupos operativos.

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Era importante passar a instituir que ali seria proporcionado um espaço que

tinha por intuito o seu crescimento enquanto sujeitos, enquanto família. Seriam ali

trabalhadas questões importantíssimas, que serviriam de aprendizagem para

repensarem suas vidas, reconstruindo aos poucos as páginas de suas vidas. Seria,

portanto, um espaço onde cada um poderia expor suas angústias, seus medos, suas

inseguranças, assim como a possibilidade de trazer experiências positivas,

propiciando um momento de acolhida para os adolescentes, para que estes

tivessem um local de apoio, de trocas e descobertas, para que se sentissem

pertencentes ao grupo, que auxiliassem os demais em seus cotidianos.

Quadro de Prática Relacional:

2. Processo de Intervenção.

Grupo A:

Objeto coletivo desvendado: Situação de sofrimento psíquico pela

desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos vínculos

parentais.

Estratégias Metodológicas: abordagem coletiva.

Instrumentais operativos: observação37, acolhimento38, escuta sensível39,

37Observação é uma das primeiras habilidades que o Assistente Social tem que desenvolver, necessita estar atento à linguagem que emana do silêncio, através da compreensão de que as relações vão se constituindo no espaço afetivo (TURCK, 2003, p.7). 38O sentido semântico da palavra acolhimento, segundo o Dicionário Aurélio, traz para a sua apropriação “a consideração, a atenção, recepção”. Logo, significa que o acolhimento é, antes de tudo, um ato de urbanidade, isto é, “cortesia”. Portanto, o acolhimento vai acontecer em um espaço relacional construído pelo diálogo, onde a escuta sensível sempre estará presente. Implica, portanto, que dois ou mais sujeitos irão compor este espaço através de um objetivo comum, de um interesse. E, neste contato, é importante que a empatia também possa estar presente como uma estratégia que oportunizará “penetrar na experiência de outra pessoa em um espaço democrático (...) para compartilhar experiências” (WWW.GRATURCK.COM.BR, acessado dia 18/11/2007). 39 Escuta Sensível supõe uma invasão da atenção. Antes de situar uma pessoa em seu “lugar”, é preciso reconhecê-la em seu ser, em sua qualidade de pessoa complexa, dotada de liberdade e de imaginação criadora. (...). O “outro-que-escuta” não tem de dizer “a verdade” nem tem de proclamar “é preciso”. Deve, simplesmente, escutar e responder adequadamente à demanda, muitas vezes implícita, do sujeito. É uma decodificação difícil, pois o conhecimento teórico e, até a experiência não bastam para sentir o que se deve fazer. Apenas a escuta sensível que integra mas ultrapassa tanto a experiência anterior quanto o saber psicológico, permite chegar a uma atitude justa e a um comportamento pertinente (BARBIER, 1993, p. 209-216).

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grupo operativo, dinâmicas de grupo, técnicas lúdicas40, como o uso de colagens,

revistas, e diálogo dialético41.

Os adolescentes foram convidados para se reunirem na sala de reuniões, um

local mais tranqüilo, para que se pudesse iniciar o processo. Foi explicado para os

mesmos a importância de estarem realizando este grupo operativo para eles

estarem se conhecendo.

O grupo, então, era composto por dois adolescentes do gênero masculino e

um do feminino. Nos primeiros encontros, eles estavam sob forte medicação e

sonolentos devido ao tratamento. Inicialmente, só ficaram presentes na sala. Um

deles, inclusive, olhava para a parede sem reação nenhuma, os demais olhavam

para as revistas sem nenhum tipo de comunicação.

As primeiras experiências em nossa vida não são vazias de estados de tensão, daí a importância de criarmos um ambiente de suavidade e bem-estar nos instantes iniciais de vida de um grupo novo (MIRANDA, 2001, p.21).

Depois de um determinado período, quase no final do horário, os

adolescentes começaram a recortar algumas figuras, observaram as revistas,

principalmente o colorido das mesmas.

Essa sensação de inclusão que se pretende proporcionar neste momento é condição si ne qua nom para o efeito desejado (MIRANDA, 2001, p.21).

A tranqüilidade do ambiente e o respeito aos limites levaram os adolescentes

a iniciarem as colagens. No entanto, o ambiente esteve o tempo todo em silêncio,

mantiveram-se quietos, observando as revistas, todos tranqüilos e serenos. Leve-se

em conta que, quando iniciaram o grupo, encontravam-se dispersivos e alienados do

contexto em que estavam inseridos em razão da medicação. O uso da técnica de

colagens, a partir das revistas, serviu para oportunizar o sentir através do tato, com

objetos concretos, e através das figuras fazê-los se conectarem consigo e com seus

afetos, pelo sentido da visão. Logo, o tato e a visão foram utilizados como dinâmica

40 Lúdica qualidade daquilo que estimula através da fantasias, do divertimento ao da brincadeira. Trata-se de um conceito bastante utilizado na educação, principalmente a partir da criação de idéias (MENEZES, 2002, p. 45). 41 Entendido como um movimento de ação, reflexão e proposição (GRATURCK, 2002, p.46).

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de grupo para que eles pudessem se conectar, primeiro, com, o contexto em que

estavam inseridos e, em segundo lugar, consigo e com suas histórias de vida.

Entre eles o diálogo não acontecia, no entanto passaram a se comunicar.

As relações só se aprofundam quando nos revelamos, quando rompemos nossa própria fortaleza. Pensamos que estamos protegidos por trás das muralhas que construímos. Ledo engano! A verdade é um espelho cristalino: basta olharmos ao redor para contemplar a mais absurda solidão (MIRANDA, 2001, p.23).

Ao romper seu próprio silêncio, um dos adolescentes expressou seu

sentimento, se conectando com sua mãe.

Figura 03: Saudades.

“ Mãe te amo muito”.

Diante dessa figura, surgia intensamente a necessidade da família.

Família esta que nasceu com a função de proteger a propriedade privada. Ao

longo de sua trajetória histórica, vem se constituindo em um lócus de reprodução

das relações de opressão postas na sociedade capitalista. E a família

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contemporânea, contextualiza nesta contradição, ao mesmo tempo em que reproduz

a violência, se constitui em um lócus de afetividade.

Foi neste momento, então, que emergiu nesse adolescente a sua

subjetividade. Ele passou a demonstrar que afeto, carinho, comunicação e o diálogo

não aconteciam em seu espaço familiar, sentia que não era compreendido pelos

pais. Tanto ele como os outros adolescentes passaram, então, a isolar-se e a criar

um mundo só deles.

Nossa experiência primeira com um grupo é, notadamente, a família. Regida por valores próprios, essa instituição é a que impinge os modelos iniciais de relacionamentos no indivíduo (MIRANDA, 2001, p.12).

Nos três últimos encontros em que se foi gradativamente articulando as

categorias centrais do Processo de Intervenção, houve maior interação entre os

adolescentes através do compartilhamento de informações e de suas dores.

Minha mãe morreu. Dr. Alex me contou no sábado, meu pai não gosta de mim (Fragmentos de Falas, 2006).

A partir dessa fala, surgiu um momento especial em que os demais

adolescentes olharam para o mesmo e manifestaram vontade de abraçá-lo. O que

foi feito por todos, inclusive a estagiária.

O sentimento de solidariedade nasce a partir do sujeito, que sente necessidade individual de compartilhar afeto, conhecimento, alimento, dor e alegria. Esse sentimento só nasce quando o sujeito ensaia colocar-se no lugar do outro. Nesse movimento, processa-se o espaço fundamental para que a Rede Interna passe a se constituir (Türck, 2001, p.30).

Após tal fato, os integrantes do grupo começaram a dialogar. Identificou-se,

então, brilho nos olhares dos demais adolescentes. Estes passaram a procurar suas

famílias e amigos da escola nas revistas, mesmo sabendo que as figuras não eram

de suas famílias.

A comunidade circundante é nosso segundo habitat de convivência grupal e, também, nossa primeira experiência de conflitos intergrupais, opondo-se valores familiares e extrafamiliares (MIRANDA, 2001, p.12).

O grupo ficou coeso, quando um falava, os demais escutavam. A Rede

Interna funcionou como alicerce para superação do objeto sustentado pela

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fragilização, pelos vínculos, pelo não pertencimento à família e pela falta de

comunicação entre pais e filhos.

Por séculos e séculos temos que o homem não sobrevive sozinho. Nos constituímos na medida em que mantemos nossas relações. Somos seres sociais, precisamos do outro para construírmo-nos como sujeito e, desta forma, acreditamos que o ser humano individualizado e a sua existência se dão na medida em que seu eu é fortalecido no reconhecimento do outro, no significado de suas redes sociais de relações (FALEIROS, 2000, p.65).

O Processo de Intervenção com o Grupo A, teve, então, inicialmente, a

comunicação se constituindo pelo campo visual, depois pelo tato, que proporcionou

a concretude das relações, oportunizando compartilhar afeto e experiências de vida.

Em uma alegoria de José Saramago, que guardo de memória, um grupo são dez ou doze pessoas assustadas sentadas ao redor de um saco de medos: o medo da solidão, do passado, do presente, do futuro, gerador das angústias de todo o dia. Aquelas dez ou doze pessoas de Saramago transformaram-se em grupo a partir do momento em que cada uma delas passa conforme dizem os autores citados (op.cit.), a afetar-se por cada um dos outros indivíduos do grupo. Ou seja, quando se manifesta o fenômeno da interação (MIRANDA, 2001, p.12 -13).

Quadro de Prática Relacional:

2. Processo de Intervenção

Grupo B.

Objeto coletivo desvendado: Situação de sofrimento psíquico pela

desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos vínculos

parentais.

Estratégia Metodológica: abordagem coletiva.

Instrumentais operativos: observação, acolhimento, escuta sensível, grupo

operativo, dinâmicas de grupo, técnicas lúdicas, como o uso de colagens, revistas, e

diálogo dialético.

Esse grupo era composto por três adolescentes do gênero masculino. Nos

primeiros encontros os adolescentes estavam muito sonolentos e medicados. Mas

um deles conseguiu recortar e colar algumas figuras, mas não falou nada. Na

continuidade dos encontros, já se encontravam serenos e tranqüilos. Conseguiam

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conversar entre si e contar o que cada um gostava de fazer, no que os pais

trabalhavam e a importância da família para cada um.

Estou com saudades da minha mãe e da minha irmã, tenho medo que ela esteja apanhando. No abrigo eles batem na gente. Meu pai eu não conheço, mas a minha mãe mora com o meu padrasto, e ele bate em mim (Fragmentos de Falas, 2006).

Adoro minha mãe e o meu pai. Minha mãe é dona de casa, e o meu pai é pedreiro, mas acho que eles não gostam de mim (Fragmentos de falas, 2006).

A partir desses relatos, então, começaram a interagir, ficando mais próximos.

Entende-se por coesão grupal o sentimento de pertencermos ao grupo. Essa sensação de promover confraternização, elementos absolutamente desejável ao grupo (MIRANDA, 2001, p.13).

E, coletivamente, também, começaram a procurar sua família, mesmo

sabendo que os recortes não eram das mesmas. Os sentimentos afloravam -

saudade, amor, afeto e pertencimento. Estavam de alguma forma visualizando seus

afetos, conectados, pensando neles naquele momento, se dando conta de como a

família era importante para cada um, como eles gostavam dos pais e queriam que os

mesmos estivessem sempre próximos.

Logo, o grupo começou a interagir, os mesmos começaram a contar suas

histórias de vida, gostavam de jogar futebol, jogavam com os amigos num campo

próximo a suas casas, falavam de suas famílias, amigos da escola e músicas

preferidas. Gostavam de viajar, de ir ao shopping comprar roupas e passear com os

amigos. A partir desse momento, a interação do grupo foi muito grande,

reconheceram-se como sujeitos. A criação dos vínculos foi fundamental para o

processo de trocas e conhecimento.

Convivemos em grupos comunitários, como associação de moradores, grupos artísticos, culturais, partidos políticos, igreja, etc... Reunimo-nos para brincar, estudar, para praticar esportes, para guerrear, para fazer preces, para trabalhar, para cometer delitos e, também para discutir os problemas trazidos por esses agrupamentos. E em cada um desses deixamos nossa marca e levamos também as suas (MIRANDA, 2001, p.12).

A figura a seguir pode servir para demonstrar a importância da família, do

vínculo para a superação do sofrimento psíquico na vida desses adolescentes:

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Figura 04: Família.

Os adolescentes precisam de acompanhamento dos pais e da convivência

com amigos para que o processo de adolescer não demore e nem se acelere. É

necessário se vivenciar uma liberdade adequada para o processo, pois a liberdade

sem limites é o mesmo que abandono. É a vivência do abandono sem ruptura de

presença. É viver na incerteza de ser amado ou não, cuja essência se expressa pelo

não pertencimento. Ao contrário, dar liberdade com limites impõe cuidados, cautela,

observação, contato com os filhos e a presença efetiva dos pais em suas vidas.

O Processo de Intervenção com o Grupo B, então, aconteceu a partir da

disponibilidade dos adolescentes em interagir e os mesmos trouxeram para o

contexto do grupo a necessidade de compartilhar experiências fora do âmbito

familiar, agregando o pertencimento a outros grupos, contextualizando um processo

de adolescimento saudável.

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Quadro de Prática Relacional:

Processo de Intervenção.

GRUPO C:

Objeto coletivo desvendado: Situação de sofrimento psíquico pela

desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos vínculos

parentais.

Estratégia Metodológica: abordagem coletiva.

Instrumentais operativos: observação, acolhimento, escuta sensível, grupo

operativo, dinâmicas de grupo, técnicas lúdicas, como o uso de colagens, revistas e

diálogo dialético.

Esse grupo era constituído por dois adolescentes do gênero masculino e um

do gênero feminino. Nos primeiros encontros, também, encontravam-se sob forte

medicação, não conseguindo interagir. Inclusive, ficavam olhando para as revistas e

não conseguiam recorta-las. Depois de muito tempo, folhavam algumas páginas. Um

dos adolescentes ficou olhando muito tempo para uma página em que encontravam-

se figuras de uma família. Mas não falou nada. Ficou por muito tempo olhando. Foi

perguntado se ele queria recortar. O mesmo olhou e sacudiu a cabeça dizendo que

não. Após esse momento, os demais começaram a recortar, mas a comunicação

entre eles foi somente visual. Repetindo-se, assim, a mesma “cena”.

No decorrer do Processo de Intervenção, os adolescentes entravam na sala

conversando. Foi-lhes questionado, então, como estavam se sentindo:

Estou me sentindo muito bem, agora tenho amigos aqui no hospital (Fragmentos de Falas, 2006).

A dinâmica de grupos proporcionou aprendizagens diversas aos membros do grupo, tanto no sentido da vivência pessoal (auto-conhecimento), como na interpessoal (percepção do outro) (MIRANDA, 2001, p.13).

Os demais sorriam e se comunicavam pelo olhar, aquele olhar de amigos,

que se compreendiam. Aos poucos foram recortando, fazendo as colagens e

interagindo entre eles. Estavam bastante comunicativos, recortavam as figuras e

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colavam. Ao mesmo tempo iam conversando, contando sobre o que representavam

as colagens. Riam muito de figuras que encontravam nas revistas, pareciam que já

eram amigos de longo tempo.

Estou muito feliz. Minha mãe vai vir me visitar hoje, estou com muita saudade dela (Fragmentos de Falas, 2006).

O grupo ficou muito coeso. Eles conversavam e davam risadas, falavam muito

de seus amigos da escola e que sentiam saudades. Queriam retornar para a escola,

local onde todos se sentiam bem. Gostavam muito de seus professores e amigos.

Gostavam muito de músicas e tinham preferência de estilos. Gostavam do pop, rock,

entre outras. Inclusive, um dos adolescentes cantou um pedaço de uma música para

os outros, e os mesmos ficaram muito alegres naquele momento. Foi, assim, um

processo de trocas e enfrentamento da realidade de cada um.

Segundo Pichon-Rivière, vínculo é a relação estabelecida entre as pessoas para realizarem a tarefa, ou trabalho, que é realizado por meio da comunicação. As pessoas se vinculam centrado na tarefa e se tornam importantes umas para as outras. Muitas vezes, nasce o vínculo nos grupos através das experiências vivenciadas, e, também, quando se constitui em compromissos conjuntos de determinada tarefa (2000, p.24).

Constatou-se, portanto, que durante os encontros os adolescentes

conseguiam trabalhar vínculos, a rede interna, a capacidade de comunicação entre

os mesmos. Houve muita interação nos grupos, proporcionando a inclusão dos

mesmos no espaço relacional.

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Figura 05: Amigos e músicas.

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A figura demonstra a importância da convivência com os amigos, a

comunicação entre os adolescentes como canal de construção para seu processo

de formação, de sua identidade. A interação é um processo de trocas e de

reconhecimento, de pertencimento ao seu próprio processo de adolescer.

Nesse sentido, o Processo de Intervenção, na superação do objeto

desvendado, buscou, na prática, “uma ruptura com a visão clínica e tecnocrática da

intervenção profissional” (FALEIROS, 2001, p.108), visando à aproximação, o

vínculo dos adolescentes, valorizando categorias como a autonomia, a cidadania e a

identidade. O objetivo foi proporcionar um espaço de escuta, de acolhida,

recuperando-se a trajetória dos usuários, tão fragilizados em razão das expressões

da Questão Social explicitadas no cotidiano. Assim como da dificuldade em

estabelecerem relacionamentos considerados apropriados com os demais

adolescentes e com suas famílias.

A seguir, o Quadro de Prática Relacional: 2. Processo de Intervenção

apresenta-se como produto das intervenções realizadas com os três grupos de

adolescentes em sofrimento psíquico, na superação do objeto coletivo desvendado.

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Quadro de Prática Relacional: 2 .Processo de Intervenção

Processo de Trabalho

Fundamentos Teórico-Metodológicos: Método Dialético Materialista

Leituras agregadas: Adolescência Normal e Patológica, autores: Arminda Aberastury e Maurício Knobel; Rede Interna e Rede Social, autora: Maria da Graça Türck; Serviço Social na Contemporaneidade: Marilda Vilela Iamamoto; dentre outros.

Objeto coletivo

Desvendado

Objetivos Estratégias metodológicas/ instrumentais

operativos

Desenvolvimento do processo de intervenção para a superação do objeto coletivo

Produto Final Análise do desenvolvimento do Processo de Intervenção na superação do objeto coletivo desvendado

Situação de sofrimento psíquico pela desconexão com seu processo adolescer e pela fragilização dos vínculos parentais.

Criar condições de conexão destes adolescentes com seu processo de adolescer para que possam vincular-se com experiências de vida saudável para evitar seu retorno ao internamento.

Criar condições de conexão com histórias de vida familiar para superar e reconstruir suas histórias de vida, fortalecendo os vínculos familiares.

Criar condições de apropriação do sofrimento psíquico para aprender a viver e lidar com ele, sem torná-lo um paciente psiquiátrico.

Processo de Conhecimento,

abordagem coletiva, observação, escuta sensível, acolhimento, vínculo, grupo operativo, dinâmica de grupo, diálogo dialético, instrumentos lúdicos como revistas e colagens.

Comunicação entre os membros do grupo como canal de construção de interação;

Uso da empatia, momento em que cada adolescente colocou-se no lugar do outro;

Consolidação da identidade dos grupos;

Compreensão das dificuldades comuns entre os integrantes dos grupos;

Conectividade, ligação entre os adolescentes no grupo, com sua família de origem e ampliação do universo de relação grupal;

Rede Interna articulada pelos elos relacionais, capazes de organizar os adolescentes de forma igualitária e democrática em torno de um mesmo objetivo.

A partir do objeto coletivo desvendado, foram construídos caminhos de reconstrução de processos afetivos que possibilitaram a auto-valorização dos adolescentes a partir de seu próprio reconhecimento como sujeitos. Foram criados espaços de liberdade de expressão, de diálogo com os pais, para exporem sentimentos. Foi evidenciado que os adolescentes podiam criar uma interação no grupo, logo, capazes de criar vínculos.

Subjetividade dos adolescentes: capacidade de lidarem com as experiências vividas pelo processo de desigualdade social;

Nos processos particulares: foi consolidada a família como espaço afetivo, a importância dos laços familiares para o seu retorno ao grupo familiar;

Nos processos sociais: fortalecidos e dispostos para enfrentarem as expressões da Questão Social em seu cotidiano;

Grupo com sentimento de pertencimento e autonomia – vivência de coletivo;

Vontade de retornar para casa para verem e conviverem com os pais e com a escola.

Fonte: Profª Maria da Graça Maurer Gomes Türck

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3.2.1 O Produto Final

O grupo operativo constituiu-se como o instrumento principal na

operacionalização do Processo de Intervenção. Constituiu numa técnica de trabalho

cujo objetivo foi a promoção de um processo de aprendizagem entre os

participantes. Com os adolescentes, propiciou a reflexão referente aos seus

sentimentos individuais, superando dificuldades existentes na família e nos seus

sentimentos, que os angustiavam para superação do sofrimento psíquico.

Vivemos em grupo, necessitamos do grupo para nos desenvolver, nos constituir enquanto indivíduos. Mesmo quando estamos sozinhos, a referência de nossos devaneios são os outros, pois pensamos em nossos amigos, na nossa próxima atividade, pensamos no nosso namoro, em nossa família (LANE, 2000, p.56).

O Processo de Intervenção possibilitou, então, que os adolescentes criassem

uma interação no grupo, que foi fundamental para a criação de vínculos, essencial

para o crescimento destes como sujeitos e para a superação do objeto coletivo dos

grupos. E trabalhar com o esse objeto desvendado - situação de sofrimento psíquico

pela desconexão com seu processo de adolescer e pela fragilização dos vínculos

parentais – nada mais é do que identificar na vida de cada um os processos

particulares e os processos sociais que interpenetram em suas subjetividades

produzindo o sofrimento psíquico. E nesses processos particulares vividos pelos

adolescentes, foi identificado que os pais não conseguiam impor limites, estabelecer

regras, não conseguiam ter um diálogo com os mesmos e, quando castigados, lhes

era retirado o carinho, o afeto. Essa relação fez com que se entrasse em sofrimento

psíquico através da valorização de sua agressividade. Pois, sem diálogo, a

comunicação não teria como acontecer.

Geralmente, os pais conseguem mostrar os limites das situações

conversando com o adolescente, corrigindo verbalmente determinadas atitudes e

estabelecendo a diferença entre comportamento público e privado, o que faz parte

da intimidade e as diferenças nas relações entre as pessoas, como, por exemplo,

amizade, namoro, casamento. A criança precisa ter alguma capacidade de

compreensão para perceber essas diferenças, e isso ela adquire durante seu

desenvolvimento.

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No contato direto com os adolescentes, assim como com os familiares,

evidenciou-se a necessidade de um trabalho de fortalecimento e pertencimento dos

sujeitos junto a estes responsáveis. Muitos demonstravam carências de

informações, assim como conhecimento inadequado de convívio com os filhos em

sofrimento psíquico.

Mesmo assim, o que ficou de mais evidente em toda essa experiência é que

as relações entre pais e filhos são fundamentais no processo de adolescer,

constituindo-se em um contexto relacional importante para o desenvolvimento da

identidade, autonomia e cidadania do adolescente.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Trabalhar com o sofrimento psíquico/doença mental foi uma oportunidade

maravilhosa de se estar avançando no conhecimento construído ao longo do

período acadêmico. O saber/ser profissional, a partir dos saberes juntos à Questão

Social, base fundamental do processo de trabalho do Assistente Social, foi se

materializando à medida que se articulava a teoria aprendia com a prática no campo

de estágio no Hospital Psiquiátrico São Pedro em Porto Alegre.

Este tema do sofrimento psíquico/doença mental comumente associa-se à

loucura, surgindo, dessa forma, o preconceito relacionado a uma sociedade em que

o doente mental não tem validade, aceitação. Nesse contexto a Questão Social é

traduzida pelas formas de desigualdade social e pelas contradições existentes no

atendimento nas necessidades desses sujeitos e de suas familias.

O esgotamento das políticas de proteção social, as precárias condições de

trabalho, seguindo os padrões estabelecidos nas características do capitalismo,

apenas servem para agravar e aumentar o quadro de pessoas em sofrimento

psíquico. Há, portanto, um grande vácuo no que tange à administração de recursos

para esta área da saúde pública. Há necessidade urgente da efetivação das

legislações e políticas públicas já existentes, mas que estão longe de ser prioridades

na agenda de governos que seguem a lógica da exclusão, do lucro.

Essa situação contemporânea demonstra o recrudescimento da Questão

Social, justificada pelas diferentes situações de globalização, seja ela econômica,

social ou política. Esta situação faz com que o sujeito não consiga acompanhar os

avanços existentes em sociedades capitalistas de cunho periférico – como o Brasil -

, fazendo com que aumente situações de sofrimento, com o trabalho exigindo que o

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trabalhador trabalhe mais do que a legislação permite para se aumentar o capital da

organização. Devido a esse fato, a presença parental diminui-se em casa e, com

isso, os filhos sentem-se excluídos do convívio familiar.

Durante o período de estágio no HPSP local que deveria buscar a efetivação

dos direitos do usuário/paciente, se evidenciou que a demanda existente era muito

grande. Muitos portadores de sofrimento psíquico encontravam–se excluídos da

rede hospitalar devido à falta de leitos e de investimentos governamentais na área

da saúde. Além do mais, verificou-se a existência de profissionais

descomprometidos, que não estavam articulados na garantia de direitos.

É necessário, portanto, para o enfrentamento dessa situação nos espaços

institucionais, que o Assistente Social se aproprie dos fundamentos do Serviço

Social para constituir espaços de resistência na garantia de direitos. Esse

profissional precisa construir sua identidade para poder concretizar o seu Projeto

Ético-Político, desenvolvendo competências que possam intervir de maneira

propositiva e comprometida com o usuário/paciente.

Finaliza-se, então, o presente trabalho com a certeza de que a formação

profissional é um processo de constantes desafios, e que o ensinar e o aprender são

construídos no cotidiano de cada um, exigindo-se de seus protagonistas ações

concretas e comprometidas para com a garantia de direitos.

Para tanto, propõe-se em relação aos adolescentes internados no CIAPS, no

Hospital Psiquiátrico São Pedro, um Processo de Intervenção profissional que

garanta a realização de trabalhos de grupos com os familiares, em paralelo com o

trabalho realizado com os adolescentes, propiciando-se, assim, discussões entre os

pais, orientando-os sobre o processo de adolescer, o sofrimento psíquico/doença

mental e suas implicações nesse período da vida.

No entanto, registre-se aqui a impossibilidade de se realizar este tipo de

trabalho no período de estágio, no ano de 2006, devido à falta de apoio dos demais

profissionais da instituição.

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