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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMINADADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO RAFAEL MALISANI MARTINS CONFLITO GERACIONAL E A IDENTIDADE DOS JOVENS ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA: NEGAÇÃO OU RECONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ADVENTISTA POR PARTE DOS JOVENS SÃO BERNARDO DO CAMPO 2012

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE HUMINADADES E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

RAFAEL MALISANI MARTINS

CONFLITO GERACIONAL E A IDENTIDADE DOS JOVENS

ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA: NEGAÇÃO OU

RECONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ADVENTISTA POR PARTE

DOS JOVENS

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2012

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Universidade Metodista de São Paulo

Faculdade de Humanidades e Direito

Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião

RAFAEL MALISANI MARTINS

CONFLITO GERACIONAL E A IDENTIDADE DOS

JOVENS ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA: NEGAÇÃO

OU RECONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ADVENTISTA

POR PARTE DOS JOVENS

Dissertação apresentada à Faculdade de Humanidades e Direito da Universidade Metodista de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do Título de MESTRE pelo Programa de Pós-Graduação em CIÊNCIAS DA RELIGIÃO. Área de concentração: Religião, Sociedade e Cultura Orientação: Prof. Dr. Jung Mo Sung.

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2012

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FICHA CATALOGRÁFICA

M366c

Martins, Rafael Malisani Conflito geracional e a identidade dos jovens adventistas do sétimo dia: negação ou reconstrução da identidade adventista por parte dos jovens. Rafael Malisani Martins /-- São Bernardo do Campo, 2012.

139fl.

Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo

Bibliografia

Orientação de: Jung Mo Sung

1. Missão integral da Igreja 2. Igreja e sociedade I. Título

CDD 286.732

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A dissertação de mestrado sob o título “Conflito Geracional e a identidade dos jovens

adventistas do sétimo dia: negação ou reconstrução da identidade adventista por parte

dos jovens”, elaborada por Rafael Malisani Martins foi apresentada e aprovada em 23 de

Março de 2012, perante banca examinadora composta por Jung Mo Sung

(Presidente/UMESP), Lauri Emílio Wirth (Titula/UMESP) e Adolfo Semo Suárez

(Titular/UNASP).

____________________________________________

Prof/a. Dr/a. Jung Mo Sung

Orientador/a e Presidente da Banca Examinadora

____________________________________________

Prof/a. Dr/a. Leonildo Silveira Campos

Coordenador/a do Programa de Pós-graduação

Programa: Ciências da Religião

Área de Concentração: Religião Sociedade e Cultura

Linha de Pesquisa: Religião e dinâmicas sócio-culturais

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Dedico este trabalho aos meus pais, meus

Irmãos e irmã e minha querida noiva.

Palavras não são o suficiente para expressar minha

gratidão por todo apoio e paciência.

Eu amo vocês!

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AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, pela sua dedicação e competência que me possibilitaram a conclusão deste trabalho, o meu muito obrigado.

Ao Pastor Erlo Braun e todos da Associação Paulista Leste da Igreja Adventista do Sétimo Dia pelo apoio, o meu muito obrigado.

Ao Professor e diretor Benedito de Carvalho Leite e todos os companheiros de trabalho do Colégio Adventista de São Miguel Paulista, pelas orações, força e

apoio, o meu muito obrigado.

À Deus que tem me guiado, instruído e protegido, meu muitíssimo obrigado.

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RESUMO

Este presente trabalho, tem por objetivo analisar o conflito geracional e a formação da identidade dos jovens adventistas, com o objetivo de verificar se o conflito geracional é uma demonstração que os jovens estão rompendo com a igreja ou, reconstruindo a identidade. O conflito geracional pode ser notado em diversas esferas da sociedade e inclusive dentro da Igreja Adventista. Todavia, o conflito geracional não é causado por rebeldia, mas sim, por diferentes maneiras de reagir e conviver com as características contemporâneas da sociedade. Sendo assim, os mais velhos não concordam com as novas propostas dos jovens e tão pouco, os mais novos desejam continuar convivendo com as coisas antigas. A Igreja Adventista tem vivido o conflito geracional em dois aspectos principais: o primeiro se evidencia na comunicação; o segundo na cosmovisão. A linguagem sofreu alterações na hora de se comunicar; no contexto atual, a imagem tomou a função das palavras. Por essa razão, uma comunicação pode não alcançar seu objetivo, principalmente aos mais novos, quando expressa somente através de palavras. O outro aspecto que tem causado conflito é a compreensão de mundo que os mais novos possuem. Para eles, o mundo não é sinônimo de pecado como algumas pessoas mais velhas entendem. Por conta desta diferença, certas questões não são aceitáveis dentro da igreja, por serem vinculadas ao mundo e o mundo ser entendido como pecado. Porém, a constatação que faço é que, embora o jovem não entenda o mundo em si como pecado, ele compreende que existem aspectos do mundo que sejam errados. Esses aspectos não são aceitáveis para eles e por isso, eles não desejam romper com a igreja. Mas estão em busca de mudanças significativas que se encaixam com sua visão de mundo. É possível evidenciar essa mesma linha de raciocínio em alguns líderes da igreja, mas os relatos dos jovens expressam que isso não alcançou a prática local. Uma vez que, concebo o pensamento de Hervieu-Leger de que a identidade não é transmitida intacta de pai para filho, mas construída individualmente. Entendo que os jovens estão formando sua própria identidade. Para que essa identidade seja formada de maneira sólida nos princípios adventistas, e aberta as mudanças necessárias da sociedade, se faz necessário, sob minha percepção, uma releitura de Ellen White baseada no pensamento liminar de Walter Mignolo, apresentado e explanado por Adolfo S. Suárez.

Palavras-chave: conflito geracional; juventude; igreja adventista do sétimo dia; identidade.

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ABSTRACT

This present study aims to examine the generational gap and identity formation of young Adventists, in order to verify if the generational gap is a demonstration that young people are breaking with the church or, reconstructing identity. The generational gap can be seen in various spheres of society and even within the Adventist Church. However, the generational gap is not caused by rebellion, but for different ways to react and cope with the characteristics of contemporary society. Thus, older people do not agree with the new proposals of young people and also not even the youngest wish to continue living with the old stuff. The Adventist Church has experienced the generational gap in two main aspects: The first is evident in the communication, the second in the worldview of the world. The language has changed in the time to communicate, in the present context, the image took the words function. Therefore, communication may not reach your goal, especially the younger ones, when expressed only through words. The other aspect that has caused the conflict is the world concept to the youngest. For them, the world is not synonymous with sin as some older people understand. Because of this difference, certain issues are not acceptable within the church, because they are linked to the world and the world is understood as sin. However, my conclusion is that though the young do not understand the world itself as a sin, they understand that there are aspects of the world that are wrong. These aspects are not acceptable to them and therefore they do not wish to break with the church. But they are looking for significant changes that fit with their worldview. It’s possible to show this same line of reasoning in some church leaders, but the reports of young people express that did not reach the local practice. Once I conceive the Hervieu-Leger’s thought that identity is not passed intact from father to son, but built individually, I understand that young people are forming their own identity. For this identity to be solidly formed on the Adventists principles and opened to the necessary changes in society, it does, in my perception, need to re-read Ellen White based on the thought of Walter Mignolo, presented and explained by Adolfo S. Suarez.

Keywords: generational gap; youth; seventh day adventist church; identidy.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 10 1 CAONFLITO GERACIONAL E A VISÃO DOS LÍDERES ADVENTISTAS ...................................................................................................................... 15 1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................... 15 1.2 CONFLITO GERACIONAL E A LIDERANÇA DA IASD ............................................ 21 1.2.1 Conflito Geracional ........................................................................................................ 21 1.2.2 Os pensamentos dos líderes da IASD ............................................................................. 28 1.3 UM CASO ILUSTRATIVO .............................................................................................. 42 1.4 CONCLUSÕES PARCIAIS .............................................................................................. 44 2 O JOVEM ADVENTISTA E SUA IGREJA ........................................................................ 46 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .......................................................................................... 46 2.2 O JOVEM E A IGREJA ADVENTISTA .......................................................................... 47 2.2.1 O jovem e as Redes Sociais ............................................................................................. 47 2.2.2 O jovem e o “ser” adventista .......................................................................................... 51 2.2.2.1 Grupos nas Redes Sociais ........................................................................................... 52 2.2.2.2 O jovem adventista nas Redes Sociais ........................................................................ 58 2.3 A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA ................................. 68 2.3.1 Transmissão de heranças religiosas e a formação da identidade ..................................... 68 2.3.2 O jovem e a igreja ............................................................................................................ 72 2.4 CONCLUSÕES PARCIAIS .............................................................................................. 79 3 MUDANÇAS, ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA ......................................................................................................................... 81 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .......................................................................................... 81 3.2 OS LÍDERES E A NECESSIDADE DE MUDANÇA ..................................................... 82 3.3 DICOTOMIA IGREJA X MUNDO .................................................................................. 92 3.4 ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA 106 3.4.1 Ellen White e o Pensamento Liminar ........................................................................... 107 3.4.2 O jovem adventista e a formação de sua identidade ...................................................... 110 3.5 CONCLUSÕES PARCIAIS ............................................................................................ 111 CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 113 BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................... 117 ANEXOS ............................................................................................................................... 122 Anexo 1 .................................................................................................................................. 123 Anexo 2 .................................................................................................................................. 123 Anexo 3 .................................................................................................................................. 124 Anexo 4 .................................................................................................................................. 114 Anexo 5 .................................................................................................................................. 125 Anexo 6 .................................................................................................................................. 125 Anexo 7 .................................................................................................................................. 126 Anexo 8 .................................................................................................................................. 126 Anexo 9 .................................................................................................................................. 127 Anexo 10 ............................................................................................................................... 128 Anexo 11 ................................................................................................................................ 129 Anexo 12 ................................................................................................................................ 130 Anexo 13 ................................................................................................................................ 131 Anexo 14 ................................................................................................................................ 132 Anexo 15 ................................................................................................................................ 133

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Anexo 16 ................................................................................................................................ 134 Anexo 17 ................................................................................................................................ 135 Anexo 18 ................................................................................................................................ 136 Anexo 19 ................................................................................................................................ 137 Anexo 20 ................................................................................................................................ 138 Anexo 21 ................................................................................................................................ 139

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INTRODUÇÃO

Era o dia 07 de janeiro de 2012, sábado pela manhã e eu estava assistindo ao culto na

Igreja Central de Peruíbe. Seria apenas mais um sábado típico das minhas férias, mas tudo

mudou quando meu irmão mais novo sentou-se ao meu lado, no meio de dois amigos dele, e

eu presenciei a cena, do começo até o final do culto. Os três com o celular na mão

conversando e pouco prestaram a atenção ao culto. Ele é apenas um pré-adolescente, 12 anos,

e seus amigos gêmeos com 16 anos.

Os três frequentam a Igreja Adventista desde pequenos, e eu me questiono: o que

aconteceu? Quando criança, minha mãe nunca me deixou levar um carrinho sequer para

brincar na igreja. Hoje, meu irmão encontrou os amigos e juntos mexeram no celular o culto

inteiro.

O que tem acontecido com os adolescentes e a juventude? Por que a mudança? Mudou

alguma coisa na igreja? Há mais de 20 anos, todas as férias vou à mesma igreja e nunca tinha

visto algo parecido, o que mudou?

Como pastor jovem e na atualidade capelão do Colégio de São Miguel, função que

estou desempenhado pelo terceiro ano consecutivo, tenho convivido todos os dias com

adolescentes e jovens e, a cada dia que passa, vejo o conflito geracional mais presente nos

relacionamentos.

Esse conflito se evidencia em todas as esferas de relacionamento: pais e filhos;

professores e alunos; líderes de igrejas e jovens. É normal escutar nos cultos, pedidos pelos

jovens, pois eles estão “fracos na fé”, estão “frios”, estão se afastando da igreja. O que tem

acontecido com os jovens? Deixaram de ser adventistas?

Em primeiro lugar, quero deixar claro que esta proposta de estudo só fará sentido ao

considerar os jovens adventistas que têm frequentado a igreja. É fato indiscutível que muitos

jovens se afastaram da igreja e deixaram de seguir os princípios ensinados por ela. Mas, não é

a proposta deste estudo analisar os motivos que fizeram esses jovens abandonar os princípios,

uma vez já seguidos por eles.

O objetivo principal deste estudo é analisar o conflito geracional e a formação da

identidade do jovem adventista. O conflito geracional é um assunto que está em voga nos

campos acadêmico e educacional. Encontram-se diversas revistas educacionais que falam

sobre a mudança da mentalidade nas novas gerações, focando principalmente a necessidade

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de interatividade, interdisciplinaridade, troca de experiências entre alunos e professores, lousa

digital, tablets e computadores para os alunos, novos métodos, abordagens diferentes.

Diversos teóricos discutem sobre as gerações e a maneira de pensar de cada uma delas. Porém,

no meio adventista pouco ou quase nada se trata deste assunto do conflito geracional e como

equilibrar as distintas partes visando um bem comum.

Encontramos artigos, nos quais os líderes expressam seus medos quanto às novas

tendências que tem surgido, exortando os jovens a permanecerem firmes nos princípios

aprendidos, mas pouco se discute sobre o conflito que existe entre as gerações. Pouco se fala

sobre a maneira de pensar de cada uma das gerações; quando se fala, o foco é a juventude e a

pós-modernidade. Não se encontra reflexões com o intuito de mostrar as diferenças, para

sanar os conflitos.

Ao mesmo tempo, não encontramos nenhuma literatura que expresse a opinião do

jovem sobre sua igreja ou, o que precisa ser feito para que a mensagem atinja aos jovens. Até

mesmo as revistas que são destinadas à juventude ou o “espaço jovem” contêm artigos que

seguem a mesma linha de raciocínio dos periódicos denominacionais destinados a toda Igreja

Adventista. O “espaço jovem” é uma coluna de artigos na Revista Adventista, reservada para

os jovens escreverem, ou para escreverem a eles.

Para exemplificar este último ponto mencionado, vejamos a essência do artigo “Luta

contínua: nossa batalha é permanecer em Cristo”, escrito por uma adolescente de 15 anos, no

“espaço jovem”. A síntese deste artigo está na experiência cristã diária com Cristo e uma

reflexão sobre conflito entre o bem e o mal e do chamado que Deus faz aos cristãos.

Carnassale diz: “Somos chamados a ser Suas testemunhas, a mostrar que Deus está certo e é

justo, e o diabo está errado. E assim como Cristo tornou claro o engano quando esteve neste

mundo, também nós, pelo poder e cheios do Espírito Santo, podemos viver de modo a refletir

o verdadeiro caráter de Deus e desmascarar o inimigo.”1

Este artigo apresentado é um clássico exemplo da temática destinada aos jovens. Sobre

essa questão, apenas destaco que esse tipo de reflexão é importante e significativa, tem sua

relevância e seu papel na formação da identidade dos jovens, mas não se deve limitar a

instrução aos jovens apenas a esses assuntos. Em geral os artigos destinados aos jovens,

tratam sobre assuntos “reflexivos-devocionais” e motivação.

1 CARNASALLE, Mariana. Luta contínua: nossa batalha é permanecer em Cristo. Revista Adventista. Tatuí, ano 107, nº 1245, p. 20, fev., 2012. Casa Publicadora Brasileira.

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Por não encontrarmos material reflexivo sobre o conflito geracional, este assunto

precisará ser analisado de maneira separada, ou seja, em um momento apresentarei o

pensamento dos líderes, e em outro o dos jovens.

Portanto, ao considerar o conflito geracional e a identidade do jovem adventista, tenho

por objetivo iniciar uma análise crítica desta questão. Com isto, desejo contribuir para que

outras reflexões sobre esse assunto possam ser realizadas, com o fim de que as gerações se

compreendam, se aceitem e se equacionem.

Para analisar o conflito geracional e a formação da identidade dos jovens, este trabalho

será dividido em três partes principais, que serão os três capítulos. O primeiro capítulo tem

por objetivo analisar a visão que os líderes da Igreja Adventista possuem sobre a juventude e

os pensamentos pós-modernos. Para tanto, em primeiro lugar apresentarei o conflito

geracional em diversas esferas da sociedade, com exceção da Igreja Adventista, isso será feito

para nos situar no conflito geracional. Tendo conhecimento desta realidade, então sim,

passaremos a ponderar os comentários que os líderes adventistas têm feito sobre a juventude.

Com isso, quero levantar as opiniões, medos, conselhos, alertas que os líderes estão fazendo

para os jovens.

Em resposta à visão dos líderes, o segundo capítulo tratará de responder a duas

questões: Os jovens se consideram adventistas ou querem romper com a Igreja? E, estão os

jovens satisfeitos com a igreja do jeito que ela está hoje? Para responder essas questões,

precisaremos pontuar um assunto importante: a formação da identidade. Sendo assim, os dois

primeiros capítulos mostram as visões dos líderes e dos jovens, tendo assim, uma visão

aproximada da realidade do conflito geracional na igreja.

Uma vez analisadas essas opiniões, o terceiro capítulo tem por objetivo apresentar

algumas reflexões visando superar, pelo menos em parte, a dificuldade de comunicação e

relacionamento entre essas gerações.

Os dizeres dos jovens e dos líderes que iremos analisar nesta pesquisa foram

encontrados em três fontes principais: livros, artigos das principais revistas adventistas e sites

de redes sociais. Nos artigos e livros, encontramos a maioria da opinião dos líderes; nas redes

sociais encontramos o pensamento da juventude. As redes sociais foram escolhidas, pois são

nelas onde os jovens expressam livremente suas opiniões sobre todos os assuntos.

Para análise dessas informações, selecionei alguns conceitos fundamentais, de acordo

com cada temática que iremos ponderar nos capítulos já mencionados. Apresento agora esses

pensamentos fundamentais que nortearão esta pesquisa.

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O conflito geracional acontece principalmente pela diferença de pensamento entre

distintas gerações. É verdade que muitos assuntos causam divergências, mas neste estudo

concentraremos nossa atenção na visão de mundo que as gerações possuem, a necessidade de

mudança nas gerações mais novas e a mudança na comunicação.

A visão de mundo que alguns líderes adventistas possuem se diferem da visão de alguns

jovens. Queiruga 2 mostra que o pensamento cristão da idade pré-moderna defendia um

afastamento de todo avanço científico, social ou filosófico. Esse pensamento resulta na

dicotomia igreja e mundo, de um lado a igreja detentora do que é sagrado, do outro, o

“mundo” sendo a origem do pecado.

Alguns líderes adventistas, principalmente os mais velhos, tendem a pensar desta

maneira, mas esse não é um pensamento defendido por todos. Hiebert3 diz que cada geração

possui sua cosmovisão de ver o mundo. Sendo assim, da mesma maneira que algumas pessoas

podem ver o mundo como fonte para os pecados, outras observam o mundo de maneira neutra,

podendo ou não ter elementos errados.

A necessidade se baseia no pensamento de Bauman ao dizer que “a modernidade é a

impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa estar em movimento. Não se

resolve necessariamente estar em movimento – como não se resolve ser moderno.”4 Segundo

Bauman, a mudança é natural e esperada no mundo moderno. Ele ainda afirma que a questão

da mudança se intensifica nas mentes pós-modernas.5

Neste contexto de fluidez, como dito por Bauman, a mudança na comunicação se

destaca por conta das frequentes melhorias no mundo tecnológico. Como Lyon 6 diz, a

comunicação no contexto pós-moderno está muito mais ligada a imagens, do que à

transmissão por palavras. Os jovens por estarem imergidos no mundo tecnológico, onde a

interatividade é constante, sofrem com uma linguagem basicamente discursiva como

usualmente utilizada nos cultos adventistas.

2 QUEIRUGA, Andrés Torres. Fim do cristianismo pré-moderno. Tradução: Afonso Maria Ligorio Soares. São Paulo: Paulus, 2003. 110 p. Apud: Walter Kasper, Introducción a la fe, Salamanca, 1976, p. 20. 3 HIEBERT, Paul G. O evangelho e a diversidade das culturas: um guia de antropologia missionária. Tradução: Maria Alexandra P. Contar Grosso. Brasil: Vida Nova, 2010. 45 p. 4 BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Tradução: Mauro Gama, Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 92. 5 Ibid., p. 22,23. 6 LYON, David. Pós-modernidade. Tradução: Euclides Luiz Calloni. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1998. 13-17 p.

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Através destes três pontos apresentados faremos a análise do conflito geracional. Porém,

este estudo não se limita a evidenciar o conflito geracional nas relações adventistas, mas

analisar a formação da identidade do jovem adventista. Este estudo tem por objetivo

evidenciar se o conflito geracional reflete uma negação de identidade ou reconstrução por

parte dos jovens adventistas. Para tanto, precisamos analisar a formação de identidade.

Dois pensadores serão utilizados para analisar a formação da identidade: Canclini e

Hervieu-Leger. De Canclini 7 extraio o pensamento que a identidade é formada na

contemplação de quem não se é. Ou seja, um jovem adventista se vê como jovem adventista

ao ser confrontado com um adventista mais velho. Se for possível escrever a formação de

identidade sobre esta perspectiva, seria algo como: “Sou adventista, mas não como ele.”

Complemento esta ideia com o pensamento de Hervieu-Leger8, o qual apresenta a

formação da identidade religiosa, não como uma transmissão de conteúdo entre gerações, mas

uma construção individual através das experiências sociorreligiosas.

Esses dois pensamentos mostram que a identidade do jovem adventista não pode ser

considerada a mesma dos “velhos” adventistas, não apenas isso, mas que o jovem está em

formação de identidade. E para orientar essa formação de identidade analiso Suárez9 que

apresenta Ellen White e o pensamento liminar de Walter Mignolo. Suárez acredita que Ellen

White possuía um pensamento diferenciado para sua época. Ao mesmo tempo que apoiava a

Igreja Adventista, conseguia criticar o pensamento dominante de maneira construtiva.

Baseado nestas ideias principais supracitadas e através da leitura de alguns líderes

mundiais, incluindo Ellen White, quero responder a opinião dos jovens e apresentar aos

líderes a cosmovisão de mundo e a formação da identidade dos jovens. Minha esperança é que

este trabalho possa ajudar a expandir os horizontes de cada cristão, para que ao entender a

visão do outro possam se unir em um único propósito: viver o reino de Deus.

1 CONFLITO GERACIONAL E A VISÃO DOS LÍDERES ADVENTISTAS

1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

7 CANCLINI, Néstor Garcia. Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução: Luiz Sérgio Henriques. 3. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009. 48 p. Apud Appadurai, 1996, p. 12-13. 8 HERVIEU-LEGER, Daniele. O peregrino e o convertido. Lisboa: Gradiva, 2005. 62 p. 9 SUÁREZ, ADOLFO S. Redenção, Liberdade e Serviço: Os fundamentos da pedagogia de Ellen G. White. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010.

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A sociedade contemporânea vive em um crescente relacionamento social, isso aflora

principalmente pela possibilidade de interconectividade entre as pessoas por meio da internet.

O que era impossível alguns anos atrás, onde os meios de comunicação se limitavam a cartas,

telegramas, telégrafos, hoje é possível se comunicar instantaneamente com pessoas em

qualquer lugar do mundo. Os requisitos para tal façanha se limitam em ter um computador

que esteja conectado à internet ou ter sinal no celular e, pronto, você está interligado ao

mundo inteiro.

Inseridos neste meio, onde os mais variados tipos de pessoas convivem e se relacionam

com todos, se faz necessário entender esses “tipos”, pois cada um possui suas características e

peculiaridades e entendê-las se tornou fundamental para um convívio harmônico e sadio.

As lideranças da nossa sociedade estão se conscientizando dessa necessidade, entender

as diferenças para que haja equilíbrio no convívio, melhor aproveitamento das habilidades e

qualidades de cada pessoa.

Um exemplo notório dessa conscientização foi a série produzida pelo Jornal da

Globo10que procurou mostrar as diferenças de pensamento, desejo, expectativa das diferentes

gerações nos ambientes de trabalho e na vida social. Nesta série de reportagens, a Globo

divide as gerações em: “baby boomers”, “geração x”, “geração y” e “geração z”. Os baby

boomers são os filhos dos soldados da segunda guerra mundial, meados dos anos 40, são

aqueles que disseram façam amor não façam guerra. Foram os jovens que lutaram contra a

ditadura, essa é a geração da bossa-nova, jovem guarda, uma ideia marcante nos “baby

boomers” era a de seguir carreira dentro de uma mesma empresa, “fidelidade à camisa”.

A geração subsequente aos “baby boomers” são os nascidos na década de 70, chamados

de Geração X. Essa geração é marcada pela entrada da tecnologia no círculo familiar.

Segundo apresentado nessa reportagem, as pessoas dessa geração são apegadas a títulos, ao

status, porque isso está vinculado ao esforço realizado. Outra característica marcante é que

tanto a inovação como mudança não são bem vistas por essa geração; são pessoas que 10 Os vídeos na íntegra estão disponíveis nos seguintes websites: <http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/17/jornal-da-globo-serie-geracoes/> <http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/18/jornal-da-globo-serie-geracoes-r2/> <http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/19/jornal-da-globo-–-serie-geracoes-r3/> <http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/19/jornal-da-globo-–-serie-geracoes-r4/> <http://www.youtube.com/watch?v=BKnohxj7r14>

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valorizam muito a carreira e ficam à vontade em trabalhar certo prazo para depois ter um

reconhecimento e subir um degrau natural.

Os nascidos no fim da década de 80, início da década de 90 são chamados de Geração

Y; esses querem uma evolução imediata, são impacientes com coisas iguais, estão dentro do

mundo da tecnologia; dentro da empresa buscam mesmo que em pequenos passos subir de

patamar e avançar rapidamente. São pessoas que facilmente fazem mais de uma coisa ao

mesmo tempo; enquanto estão trabalhando podem acessar redes sociais e ouvir música, sem

que isso venha atrapalhar o desempenho do que estão fazendo.

Essa série de reportagens termina falando da Geração Z, os nascidos no fim dos anos 90,

virada de século e milênio. São tidos como um “Y” turbinado. Assim chamados porque as

características da Geração Y se afloram de maneira muito forte. De maneira que se a geração

Y era impaciente, essa é muito mais; um dos motivos mais marcantes é por conta da

velocidade da internet e dos meios de comunicação. O mundo dos novos adolescentes e

jovens é visto sob o mesmo prisma do mundo da tecnologia; tudo muda muito rapidamente e

as coisas são instantâneas.

Em síntese, essas são as principais informações que encontramos nessa série de

reportagem.

Independente dos termos utilizados para classificar as gerações, se são ou não os termos

utilizados pelos grandes sociólogos, o fato é que as diferenças existem isso não se pode negar.

O ponto que quero destacar é a iniciativa de uma rede de televisão em mostrar a visão de

mundo que cada geração possui. Essa iniciativa é significativa para mostrar a necessidade de

termos pelo menos uma compreensão básica da visão do outro. Não se pode esquecer que o

objetivo central desta série é a interatividade no ambiente de trabalho. Ou seja, como as

diferentes gerações podem se unir, cada uma com suas qualidades, para que a empresa possa

crescer.

Embora este exemplo esteja focando as gerações no ambiente de trabalho, podemos

extrair o objetivo de se ter um conhecimento da visão do outro. De maneira que, independente

do meio ao qual convivesse e o fim das relações, pode-se ter uma integração melhor das

gerações, pois as características marcantes são mutuamente conhecidas.

Pelo fato de vivermos em uma sociedade com diversas gerações, torna-se natural o

convívio geracional e essa realidade está presente dentro do objeto de estudo deste trabalho, a

Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). Pode-se notar certa conscientização não apenas do

convívio geracional, mas, além disso, os líderes da IASD estão percebendo a necessidade de

incentivar as diferentes faixas etárias nas atividades da Igreja.

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Bill Knott11, editor da Adventist World, revista que atualiza os acontecimentos da IASD

nos países que possuem membros, tratando sobre a ação e o futuro da igreja diz: “Não

profetize para um jovem que um dia ele será famoso.” A forma categórica como ele se

posiciona pode oferecer ao menos duas informações básicas, ou ele está orientando as pessoas

para não agirem desta maneira, ou está alertando uma ação no presente.

Neste breve artigo ele fala da importância dos jovens estarem na liderança da igreja

juntamente com os mais experientes. Ele apresenta a dinâmica da igreja projetando a ação dos

jovens no futuro como sendo errada e equivocada; segundo ele, quando agimos dessa maneira

minamos a atuação dos jovens no presente. Sendo assim, o objetivo da declaração de Bill

Knott foi de alertar a igreja local desse possível erro que pode estar ocorrendo. Knott termina

o artigo fazendo menção aos jovens na assembleia da Associação Geral12, em 2010 dizendo:

“Ao você ler o que disseram os adultos jovens que tão habilmente representaram sua igreja na assembleia da Associação Geral, 2010, comprometa-se a incentivar os jovens e adultos jovens da sua igreja a serem os líderes de hoje. Ajude-os a participar dos cargos – mesmo que isso signifique abrir mão do seu – por meio dos quais, os dons que receberam do Espírito, aumentarão surpreendentemente o poder do nosso testemunho!”13

Embora não tenha nenhuma declaração explícita sobre a necessidade de conhecer as

diferenças das gerações e das peculiaridades de cada grupo, é notória a preocupação de unir as

diferentes pessoas na ação da igreja. Mais ainda, para ele o papel do jovem é de ser líder, estar

dirigindo e movendo as atividades da Igreja local.

A visão apresentada por Knott é muito significativa, pois ela segue a mesma linha de

pensar do Pr. Ted Wilson, presidente da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia,

entidade que administra a IASD mundial. Ted Wilson foi entrevistado por Bill Knott a

respeito da cultura de serviço por parte dos jovens adventistas e ele afirmou:

“A iniciativa do Reavivamento e Reforma mundial tem deixado claro que há milhares, na realidade milhões de jovens adventistas, aos quais Jesus entregou tremendos dons para ajudar Sua igreja a finalizar a obra. Gostaria que a Igreja Adventista do Sétimo Dia planejasse lançar mão dessa enorme

11 KNOTT, Bill. O Futuro é Agora. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 3, set., 2011. 12 Assembleia que reuni representantes de todos os continentes para se definir os líderes mundiais da igreja, assim como as principais diretrizes para a igreja mundial. 13 KNOTT, Bill. O Futuro é Agora. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 3, set., 2011.

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criatividade, energia, que Deus já colocou entre Seu povo, concedendo variados dons aos jovens fiéis.” 14

Os jovens em ação, liderando, fazendo parte do todo, têm sido a visão apresentada pela

liderança mundial da IASD, mas essa visão parece contradizer a realidade que encontramos

nas igrejas locais. Kimberly L. Maran15durante o período da assembleia da Associação geral

entrevistou jovens de diversos países com o objetivo de saber por parte destes quais as

dificuldades da igreja que frequentam, o que eles acharam de representar o país na assembleia

geral, quais pontos a igreja poderia melhorar e outras questões pertinentes a aos jovens e a

igreja local.

Quero pinçar algumas respostas dos jovens com o intuito de mostrar que a realidade da

igreja local não é a mesma apresentada por Bill Knott, o que, como vimos, apresenta a ideia

de que o jovem seja o presente da igreja. Notem a afirmação de Blessings Gonbwe,

representante de Malawi, país vizinho a Moçambique e Zambia: “Somos os líderes do futuro,

por isso temos que aprender das pessoas que têm mais experiência.”16 É nítido que a visão de

Knott não é a realidade nas atividades eclesiásticas apresentada por Gonbwe; de alguma

maneira os jovens estão sendo projetados para o futuro, fazendo com que eles aceitem essa

realidade e isso é refletido neste testemunho apresentado. Comprovando esta realidade

vejamos outros exemplos.

Quando Kimberly questionou sobre o maior desafio enfrentado pela igreja na sua parte

do mundo? Justin McNeilus representante dos Estados Unidos da América disse:

“Na América do Norte, é o envolvimento dos jovens. Muito poucos jovens se envolvem, lideram, e até mesmo estão felizes por ser adventistas. Parece haver uma cultura entre os pastores, líderes da igreja (não necessariamente os líderes jovens), de que você tem que ter cabelos grisalhos, ou algo nesse sentido. Antes que possa ser ancião, ou que possa assumir púlpito para pregar.”17

Justin ratifica sua posição dizendo: “Precisamos permitir que os jovens se envolvam. É

verdade que é arriscado, nós vamos cometer erros. Mas, se não nos envolvermos nesse

14 KNOTT, Bill. Um Ano para Mudar o Mundo. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 8-10, nov., 2011. 15 MARAN, L. Kimberly. Conheça o Futuro. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 16-20, set., 2011. 16 Ibid., 17. 17 Ibid., 17,18.

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ambiente, vamos acabar deixando a igreja.”18 A realidade que Justin apresenta nos Estados

Unidos parece ser a mesma apresentada por Gonbwe na África; os jovens não possuem poder

de ação no presente e a liderança mais velha dirige a ação da igreja local. Essas realidades

similares são significativas, pois mundos tão distintos como América do Norte e África, mas

ao mesmo tempo realidades tão próximas podem nos mostrar uma mesma maneira de pensar

por parte dos líderes das igrejas locais. O resultado apresentado por ele é que existe

insatisfação e desânimo por parte dos jovens, sendo então considerado por ele o maior desafio

da igreja nos Estados Unidos na localidade que frequenta.

A última citação que destacaremos foi feita por Samia Henriette, representante de

Sheychelles, arquipélago localizado a norte e nordeste de Madagáscar19. Samia afirma: “A

igreja deveria ajudar os jovens a se sentirem parte dela, parte dos problemas, das pressões, de

tudo. Tenho a sensação de que há um abismo entre a geração mais antiga e a jovem. Talvez as

duas gerações tenham problemas pessoais que poderiam resolver juntos, uma ajudando a

outra.”20

Os três relatos apresentados mostram que os jovens não possuem voz ativa dentro das

atividades da igreja, mostrando mais uma vez a diferença entre o ideal proposto e a realidade

local. Ao que parece o alerta de Bill Knott apresentado é uma realidade em alguns lugares em

diferentes localidades do mundo.

Embora não seja objetivo deste estudo mostrar como a personalidade e nem a

consciência de ação do jovem é formada, mas a impressão que passa nos relatos deste artigo

que estamos analisando é que as crianças crescem com a mentalidade de que quando

chegarem a uma certa idade poderão agir.

Esta questão que tende projetar a ação do jovem no futuro é percebida não somente nos

dizeres relatados aqui, mas se evidencia no título do artigo: “Conheça o Futuro”, artigo este

destinado a falar da ação dos jovens na Igreja. Questiono o intuito do artigo em falar de algo

que não acontecerá no presente. Teria por objetivo a autora apresentar os jovens que serão o

futuro da Igreja para que eles sejam apenas conhecidos?

É interessante ainda pensarmos que Kimberly Maran é editora assistente da revista

“Adventist World”, revista da qual Bill Knott é editor. Enquanto a visão do editor é que o

jovem tem papel como líder no presente, a editora assistente demonstra a visão oposta, a qual 18 Ibid., 18. 19 Fonte: <http://www.worldmapfinder.com/Pt/Africa/Seychelles/> 20 MARAN, L. Kimberly. Conheça o Futuro. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 18, set., 2011.

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o futuro da igreja está na juventude. Não é objetivo deste estudo fazer especulações, mas a

impressão é que a editora assistente, assim como alguns jovens, carrega a ideia de que a

liderança da igreja só pode ser composta por pessoas de “cabelos grisalhos” como dito por

Justin McNeilus.

Como vimos até aqui, independente da localidade, a realidade parece indicar a mesma

direção, os jovens estão deslocados das atividades e da liderança da igreja. Se por um lado

representantes mundiais dizem que a posição do jovem deve ser de ação e de liderança, por

outro encontramos uma liderança local que não tem se encaixado nesta visão de trabalho.

Faz-se necessário ainda destacar que os jovens ao analisarem a realidade local, além de

mostrarem que estão ausentes da ação, é perceptível uma diferença de pensamento entre as

gerações, isso se evidenciou nas palavras de Samia: “Tenho a sensação de que há um abismo

entre a geração mais antiga e a jovem.”, palavras já mencionadas e que mostram uma

realidade conflitante entre as gerações.

Diante deste quadro apresentado, passaremos a analisar o conflito geracional, assim

como a visão, preocupações e medos que os líderes possuem da juventude. Embora esse

esforço de conhecer melhor a juventude seja algo mundial, queremos destacar a realidade

brasileira.

1.2 CONFLITO GERACIONAL E A LIDERANÇA DA IASD

Tratar sobre o conflito geracional não é uma tarefa fácil, porque embora seja algo que

pode-se notar, não é um assunto que se aborda de maneira franca e direta dentro da IASD. Por

este motivo, analisarei a existência do conflito geracional dentro da sociedade, não

considerando a IASD. Em seguida pinçarei dizeres dos líderes da IASD sobre a juventude e a

sociedade contemporânea, para no próximo capítulo apresentar o pensamento dos jovens.

Com isso, temos as visões das gerações que formam a realidade da vivência religiosa dentro

da IASD.

1.2.1 Conflito geracional

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Mudança de geração é uma realidade em qualquer instituição, independente do fim que

possui. Isso acontece com times de futebol, empresas, bancos, escolas, igrejas, e todos os

outros grupos que possuem uma representação. O motivo é óbvio, nenhum ser humano é

eterno, logo um dia precisa ser substituído.

Cada geração é marcada por algumas peculiaridades que a tornam singular para aquele

momento e essas características podem perdurar, deixar de existir, ou podem ser esquecidas

por um tempo e reaparecer. Para exemplificar, basta lembrar que nos anos 70 em que a moda

ditava a calça com “boca de sino” como sendo o modelo. No presente momento, no ano de

2012, a moda traz a tendência com as calças com a barra apertada, completamente diferente.

É interessante pensar que no futuro, próximo ou distante, existe a possibilidade da tendência

dos anos 70 voltar, e depois ir embora.

Independente do que acontecerá, destacamos que em cada geração existe algo, podendo

ser novo ou não, que deixa sua marca. Mudanças são naturais, muitas vezes necessárias, e não

existe nada de errado na mudança em si. Mas muitas vezes estas causam choques, e estes

quebram uma rotina; tiram as pessoas da zona de conforto; confrontam velhos paradigmas

com novas ideias e tendências; desafiam líderes. Os choques são inevitáveis em toda mudança,

principalmente tratando de gerações distintas.

Vejamos um exemplo deste conflito de gerações nos dizeres de Renata Filippi Lindquist,

sócia-diretora da Mariaca21, entrevistada por Gama (2010, p. B23), tratando sobre a nova

geração denominada nesse artigo como “Geração Y”. Renata disse: “As empresas já

perceberam que têm de estar mais próximas desses jovens, que precisam fazer mais

avaliações de troca de expectativas, trazê-los para mais perto da estratégia.”

Somente o fato desse comentário de Renata iniciar com o verbo “perceber” significa

que no passado ou na geração anterior, não se atinava para isso. Tendo assim uma realidade

diferente, logo precisou uma mudança no agir da geração anterior para conseguir entender a

geração atual resultando em um melhor convívio e progresso dentro da empresa.

Gama apresenta uma mudança na hierarquia, do tradicional na vertical, algo como de

submissão, de cima para baixo, mandar e obedecer, para novos modelos na horizontal, uma

tendência de um relacionamento mais aberto e franco entre chefes e subordinados, troca de

experiências e valores. Nas palavras de Renata, na mesma entrevista já mencionada: “Não se

tem mais a hierarquia de maneira tão marcada como antes. Isso já começou a aparecer na

arquitetura dos escritórios.” 21 Uma empresa prestadora de serviços em: recrutamento de executivos; transição de carreira; consultoria em liderança. Mais informações no site <www.mariaca.com.br>

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Um exemplo citado neste artigo dessa nova tendência é a Tectoy Digital22 que no seu

espaço físico possui poucas paredes de separação entre os escritórios; todos entram e saem

pela mesma porta e bebem água no mesmo bebedouro, trazendo evidências dessa nova

maneira de dinamizar o relacionamento e mostrar uma certa igualdade entre chefes e

subordinados.

Cristiano Stefenoni23 mostra como evitar o conflito geracional dentro da realidade de

trabalho. Ele contextualiza seu artigo nas gerações que dividem as atividades empresariais.

Três gerações convivem juntas, de um lado os nascidos a partir de 1978, possuem entre 20 e

30 anos, são chamados de Geração Y, pois nasceram no mundo da tecnologia e na maioria das

vezes foram criados com mães que trabalham fora, são reconhecidos por serem talentosos. Do

outro lado, os profissionais mais experientes são chamados de Geração X (1964-1977) e

baby-boomer (1946-1964). Neste entre mundos de gerações, como evitar os conflitos entre os

jovens e os mais experientes?

Ele apresenta uma situação que vivenciou dentro do jornal em que trabalha. A redação

do jornal passou por uma reformulação geral, a partir daquele momento o material do jornal

impresso, do rádio e da internet seriam produzidos todos juntos, compartilhando o conteúdo

entre si. Os jovens lideram com essa situação de maneira muito natural, mas os mais velhos

tiveram dificuldade com o momento. A diferença básica que Stefenoni diz é que a Geração Y

lida muito fácil com a mudança, já os mais experientes são mais tradicionais e cautelosos com

a mudança.

Nessa dinâmica empresarial, para se evitar o conflito geracional Stefenoni enumera

cinco dicas para as duas gerações, são elas:

1. Para a geração Y: Respeite seu chefe. Ele pode não saber tanto de tecnologia quanto

você, mas sabe exatamente como demiti-lo se for preciso; para a geração X: Tenha paciência

com os mais novos na empresa. Quando você começou, alguém também teve que ensiná-lo,

lembra?

2. Para a geração Y: Procure respeitar também os funcionários mais antigos da empresa,

demonstrando interesse, afinal, se você quiser ser um gestor algum dia, precisará do trabalho

deles; para a geração X: A melhor forma de perder o medo de ser substituído é estar sempre 22 Um braço da empresa Tectoy, fundada em 1987, por Daniel Efraim Dazcal, com objetivo de desenvolver e produzir brinquedos de alta tecnologia. A Tectoy Digital é responsável pela produção de games (jogos eletrônicos) da Tectoy. Para mais informações veja <www.tectoy.com.br> e <www.tectoydigital.com> 23 STEFENONI, Cristiano. O “Y” da questão. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 6,7, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira.

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23

atualizado. Portanto, faça cursos de qualificação. Não é vergonhoso reconhecer que precisa

aprender algo novo. Aliás, essa atitude demonstra humildade e respeito com seu trabalho;

3. Para a geração Y: Use suas habilidades tecnológicas para ajudar a empresa e não para

se promover; para a geração X: Ensinar também é uma ótima forma de aprender. Portanto,

ensine;

4. Para a geração Y: Não seja autossuficiente. Peça orientação, pergunte, procure

aprender, seja humilde e participativo; para a geração X: Não se esqueça de que o jovem de

hoje pode ser seu chefe de amanhã. Por isso, nada de exclusão. Trate-o bem;

5. Para a geração Y: Não se esqueça de que ninguém é promovido se não tiver

experiência. Por isso, se a ideia é ter uma carreira de sucesso, amadureça primeiro antes de

querer trocar de empresa ou de cargo. Para a geração X: As mudanças são necessárias e

inevitáveis, você gostando ou não. Esteja preparado para elas.

Essas dicas apresentadas por Stefenoni, que é por profissão jornalista e consultor de

carreiras, são significativas na maneira que mostra os possíveis conflitos pelas características

das gerações. Ou seja, analisando essas dicas podemos saber as diferenças das gerações e, por

conseguinte os conflitos mais frequentes.

Destas questões apresentadas neste artigo quero destacar a facilidade de mudança que a

chamada Geração Y possui. Zygmunt Bauman24fala dessa tendência da sociedade moderna ao

denominá-la como líquida. A ideia de Bauman25 se torna interessante por mostrar que a

fluidez das pessoas modernas não impedem de ter formas, mas de permanecer nas formas. Ele

diz “a modernidade é a impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa estar em

movimento. Não se resolve necessariamente estar em movimento – como não se resolve ser

moderno.”26 A mudança não é um empecilho para as pessoas na sociedade moderna, elas

acontecem naturalmente. Diante das mudanças, de acordo com o movimento as pessoas se

moldam e se adaptam de acordo com a necessidade.

Por isso, conseguimos entender essa diferença que Stefenoni apresentou em seu

ambiente de trabalho. Os mais tradicionais tiveram dificuldades e alguns deles tiveram que

mudar de emprego. Em contrapartida, como mencionado, os mais novos se adequaram as

novas exigências sem grandes dificuldades.

24 ZYGMUNT, Bauman. Modernidad líquida. Tradução: Mirta Rosenberg. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2004. 25 Cf. Ibid., 13. 26 BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Tradução: Mauro Gama, Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 92.

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Mudando o foco do trabalho para a área educacional, a revista “Atividades e

Experiências”27, revista produzida pela Editora Positivo, tem tratado frequentemente sobre a

nova dinâmica no relacionamento e aprendizado das novas gerações. Somente nos mês de

Setembro de 2011, dedicou dois artigos para falar das características da nova geração e os

conflitos que podem surgir por conta dessas diferenças.

O primeiro artigo escrito por Fernanda Zattar28trata sobre o relacionamento entre pais e

filhos, principalmente na fase da adolescência. Sua afirmação é que em “Diferenças de

geração, gênero, cultura ou visão de mundo podem acarretar ruídos de comunicação e

conflitos.”, mas mesmo dentro de crises e conflitos é possível com diálogo e boa vontade

manter um bom relacionamento familiar.

Para que haja esse bom relacionamento, Zattar mostra que embora as famílias de hoje

sejam menos rígidas com os filhos, aparentemente um ponto negativo, quando comparado

com a educação anterior, o relacionamento é mais aberto e democrático, trazendo “poder” de

voz para toda a família e fortalecendo assim os laços familiares.

Zattar cita Betina von Staa 29 , colunista do site da Positivo e pesquisadora em

Tecnologia Educacional, que defende a ideia de que o mundo moderno com as invenções

tecnológicas têm aproximado mais os jovens dos seus pais ao invés de afastá-los. Embora seja

uma fase na qual os jovens descobrem tudo o que podem criticar sobre os pais, e isso pode

causar afastamento, os estudos têm mostrado que nunca na história houve um período em que

os pais estivessem tão próximos dos filhos.

Um dos motivos para que o relacionamento esteja se estreitando e perdurando é que os

filhos estão retardando a saída de casa, casando mais tarde, demorando em ter sua própria

casa e assumir assim uma vida independente.

27 FORMIGHIERI, Ruben. Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 8, 30, set., 2011, Positivo. 28 ZATTAR, Fernanda. Que Fase! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 30, 30, set., 2011, Positivo. 29 Para ter acesso a alguns textos na íntegra, consulte: <http://blog.educacional.com.br/articulistaBetina/o-que-ainda-podemos-ensinar-aos-nativos-digitais/> <http://blog.educacional.com.br/articulistaBetina/p95056/> <http://blog.educacional.com.br/articulistaBetina/p82336/>

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25

Quero destacar uma citação que Zattar faz de Betina sobre a dinâmica entre as relações,

ela diz que “É importante entender por que o outro pensa de determinada forma e tentar se

fazer entender aceitando as diferenças.”30

Destaco esse pensamento, pois em gerações distintas a possibilidade de conflitos é

grande e ter a visão do outro se torna muito significativo. Significativo pelo conceito que

Todorov31 apresenta sobre ser “civilizado” que está em reconhecer a plenitude da humanidade

do outro. Assim afirmar que um determinado pensamento é o certo e o outro errado, sem ao

menos buscar entender as razões do pensamento adverso, é simplesmente desconsiderar a

visão alheia. Isso é se considerar superior e por consequência desconsiderar a plenitude da

humanidade do outro como ser civilizado. Todorov diz que ser civilizado significa o ato de

“...reconhecer plenamente a humanidade dos outros. Portanto, para atribuir tal qualificativo, é necessário transpor duas etapas: no decorrer da primeira, descobre-se que os outros têm modos de vida diferentes dos nossos; e, durante a segunda etapa, aceita-se que eles sejam portadores de uma humanidade semelhante à nossa.”32

O oposto desta atitude é denominado barbárie, atitude esta que Todorov apresenta como

o sentido absoluto de bárbaro. Para ele “os bárbaros são aqueles que, em vez de reconhecerem

os outros como seres humanos semelhantes a eles, acabam por considerá-los como

assimiláveis aos animais, ao consumi-los ou ao julgá-los incapazes de refletir e, portanto, de

negociar (eles preferem a briga)...”33. Sendo assim, a barbárie segundo Todorov34 é o negar a

plena humanidade do outro, negar também as alegrias e aos bens que são objeto de desejo.

Aplicando a essência desse pensamento de Todorov aos conflitos geracionais que

estamos analisando, considerar uma geração detentora da verdade absoluta, deve ser

entendido como barbárie, já que desconsideramos uma outra visão sobre o mesmo assunto.

O que se torna significativo é que Todorov 35 ainda afirma que a barbárie é uma

característica natural do ser humano, sendo praticamente impossível extinguir a possibilidade

da barbárie na história humana, levando-nos a pensar que em um conflito de ideologias não é

impossível que um determinado lado queira ter a razão. 30 ZATTAR, Fernanda. Que Fase! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 30, set., 2011, Positivo. 31 TODOROV, Tzvetan. O medo dos bárbaros: para além do choque das civilizações. Tradução: Guilherme João de Freitas Teixeira. Petrópoles: Vozes, 2010. 32,33 p. 32 Ibid., p. 32,33. 33 Ibid., p. 26,27. 34 Ibid., 31,32. 35 Id.

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26

Por essa característica que o ser humano tende a sobrepujar a visão do outro como

apresentado por Todorov que podemos entender mais claramente a posição de Betina

apresentada por Zattar, ideia que mostra a importância de entender o que o outro pensa,

superando a diferença de pensamento.

O segundo artigo tem por título “Te orienta garoto!”, escrito por Max Haetinger36; ele é

professor, mestre em Educação, especialista em criatividade e em tecnologias aplicadas na

educação e psicopedagogo. Este artigo fala sobre a escolha de profissão e como isso pode

causar conflitos entre as gerações (pais e filhos). Max diz que os conflitos têm surgido por

conta da pressão que os adolescentes estão sofrendo para escolher uma profissão cada vez

mais cedo. Por um lado os filhos não sabem que profissão seguir, por outro os pais vivem a

angústia da indecisão dos filhos. Para completar essa situação as carreiras são transitórias, os

jovens mudam de curso frequentemente nos primeiros anos de faculdade e novas frentes de

trabalho que rompe com as atividades tradicionais tem surgido.

Com esse choque, o conselho de Max para os pais é que eles se atualizem, entrem no

mundo dos jovens para entendê-los e muita conversa. Ele termina o artigo dizendo: “Pais,

professores e comunidade: nessas horas tão difíceis para os jovens e suas famílias, o afeto é a

melhor ferramenta para ajudar nossos filhos a decidirem sua colocação social e para nos

colocarmos no lugar de parceiros e companheiros desses jovens.”37

Mais uma vez podemos ver a necessidade de compreender a visão de mundo da outra

pessoa. Essa necessidade se acentua quando falamos de gerações distintas, pois são mundos

diferentes. A infância, a educação, os costumes, a cultura, a sociedade, a condição

socioeconômica, a tecnologia, tudo isso mudou e tem mudado e por consequências a realidade

de duas pessoas que vivem na mesma casa ou na mesma rua podem ser tão diferentes.

Esses exemplos mencionados mostram como é real o conflito de gerações e a

necessidade de desenvolver o conhecimento das novas gerações que estão surgindo e

despontando. Na atualidade, diversos termos têm sido utilizados na tentativa de explicar a

geração do momento, termos como: Modernidade, Modernidade líquida, Pós-modernidade,

Pós-colonialismo, Geração Y, Geração Z, cada qual mencionando algumas características

socioculturais.

Independente do termo designado na tentativa de definir essa geração, o que não se

pode negar é que essa geração surge com várias características que se chocam com as 36 HAETINGER, Max G. Te orienta garoto! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº16, p. 8, set., 2001, Positivo. 37 Id.

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gerações anteriores, e esses choques passam a ser realidade em todas as esferas da sociedade e

dos relacionamentos.

Mediante isso, em qualquer lugar que nos depararmos com o conflito de gerações, em

menor ou maior grau, de uma maneira ou de outra, vamos nos deparar com ideais divergentes.

Assim sendo, nas empresas, nos relacionamentos familiares, na comunidade religiosa, e em

qualquer outra instituição que tem por base o relacionamento interpessoal essa divergência

acontecerá, de maneira que um mútuo conhecimento de como o outro é e pensa se torna

imprescindível.

Uma vez tendo visto que o conflito geracional acontece em lugares distintos da

sociedade como empresas, escolas, famílias, passarei a analisar o objeto de estudo, a IASD,

pois os mesmos conflitos podem ser presenciados.

1.2.2 Os pensamentos dos líderes da IASD

Minha leitura da IASD é que assim como outras instituições, ela tem passado por

conflitos referentes à diferença de pensamentos entre as gerações. São diferenças que se

notam no convívio com pessoas de diversas idades. Analisar essas questões gera um pouco de

dificuldade, pois estamos levantando preocupações a partir de pressupostos pessoais.

Embora parto de pressupostos pessoais, a manifestação desse conflito é visível e

podemos vê-lo ocorrendo em discussões entre representantes de distintas gerações sobre

ideias controversas, assim como a produção literária por parte de alguns líderes receosos com

alguns comportamentos da geração atual.

Os escritos que partem do líderes não abordam esse assunto de forma direta; ou seja,

dificilmente vamos encontrar um texto dizendo: “Os jovens estão fazendo...” ou “Eles não

podem fazer...”. Mas podemos ver a preocupação dos líderes pela maneira como eles falam e

a quantidade de material que tem sido produzido levantando alertas e considerando questões

que focam a juventude de forma geral.

Passarei a analisar a leitura que os líderes da Igreja Adventista têm feito sobre a

juventude e a sociedade contemporânea. Lessa38, editor da Revista Adventista, escreveu um

artigo em Dezembro de 2009 tratando sobre as influências da pós-modernidade em seis 38 LESSA, Rubens. S. Influências pós-modernas. Revista Adventista. Tatuí, ano 104, nº 1219, p. 8-10, dez., 2009. Casa Publicadora Brasileira.

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aspectos da vida cristã cotidiana: namoro, casamento, entretenimento, conversação, música,

crenças. Em todos os casos analisados, Lessa39 defende que a influência pode ser causada pela

perda de foco por parte das pessoas, isso por conta das novas ideologias propostas pela pós-

modernidade.

Outros líderes possuem essa mesma preocupação que vimos neste artigo citado. Em

entrevista para a Revista Conexão JA40, revista voltada ao público jovem, o Pastor Elias

Brenha é questionado sobre alguns pontos referentes à juventude da Igreja Adventista.

Quando questionado sobre o papel da instituição religiosa defronte a tendência dos jovens

pós-modernos buscarem a espiritualidade, mas não gostarem tanto assim de placas de Igreja,

Brenha então afirma que essa é uma tendência desse momento e ainda diz: “A igreja precisa

encontrar novos caminhos, sem ferir seus princípios. É necessário, com urgência, reavaliar

alguns conceitos e quebrar paradigmas, a fim de conduzir melhor os jovens pós-modernos,

que não têm culpa da cultura que herdaram e que exerce profunda influência sobre eles.”41

Nestes exemplos apresentados fica claro que o conflito entre gerações existe e é notório

a preocupação dos líderes. Chama-nos atenção que a cultura “pós-moderna” está sendo

apresentada como responsável pela divergência de pensamento, se possível for, podemos

concluir que as ideologias pós-modernas seriam a origem dos conflitos entre as gerações. Já

que essa “nova” maneira de pensar e viver tem gerado esses conflitos.

Nesta mesma edição da Revista Conexão JA42a matéria de capa traz por título: “Jesus

Sim, Igreja Sim”, tratando da questão da nova tendência que as pessoas possuem em buscar

espiritualidade, mas não desejam um comprometimento formal com uma igreja. Para Wendel

Lima “o homem do século 21 prefere dizer que é espiritual em vez de religioso; que crê no

sobrenatural em vez de professar alguma confissão ou se vincular a alguma denominação.”43

O fundamento para tal conceito são as ideias pós-modernas que predominam na sociedade.

Lima44 contextualiza a situação contemporânea apresentando as sociedades anteriores.

Na Idade Média a igreja era o centro da sociedade, a modernidade reagiu a essa paradigma e

instituiu a racionalidade e a ciência como os fornecedores de sentido a vida. Ele diz que neste

39 Ibid., p.10. 40 LIMA, Wendel. Autenticidade na Igreja. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 6,7, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 41 Ibid., p. 6. 42 LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 8-11, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 43 Ibid., p. 9. 44 Id.

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momento começou a secularização da sociedade, pois a vida religiosa e a fé que eram o centro

da vida foram colocadas de lado e passaram a representar aspectos da vida particular.

A pós-modernidade é a reação a essas duas fases anteriores: à religião institucional da

Idade Média e à racionalidade e ciência da Modernidade. Para Lima “A sociedade pós-

moderna valoriza e se vale do conhecimento científico, especialmente quando esse gera

tecnologia, conforto e progresso; no entanto, não acredita na utopia que vê na ciência a

solução para todos os problemas da humanidade, inclusive os éticos.”45

Concluindo este pensamento Lima46 diz que o mundo pós-moderno nega a ciência como

solução para os problemas porque carrega na história duas guerras mundiais, nas quais a

ciência mostrou que suas descobertas podem se virar contra o ser humano. Quanto a religião

tradicional, “por causa dos pecados históricos da Igreja Cristã e do testemunho de professos

cristãos, os pós-modernos associam a instituição religiosa à intolerância, arrogância,

prepotência e falsidade.”47

Diante desse quadro, Lima48 diz que o homem do século 21 “anseia encontrar sentido

para a vida e acredita que a espiritualidade pode lhe trazer respostas, função que a

racionalidade e a ciência já se mostraram ineficazes em cumprir, porém, pensa que uma igreja

tradicional é o último lugar em que poderá ter seu espírito satisfeito.” Embora essa verdade

seja mais comum nos Estados Unidos da América e na Europa, essa realidade também é

presente no Brasil. Lima49 apresenta o Censo de 2000 o qual mostra que 9,3% dos brasileiros

entre 15 a 24 anos se identificam como “sem-religião”, a maioria desse grupo não são ateus

ou agnósticos, mas pessoas que buscam espiritualidade sem formalizarem um compromisso

com uma entidade religiosa.

Quero pinçar dois últimos comentários que Lima faz em seu artigo, mas não sobre a

sociedade contemporânea e sim sobre a postura da Igreja Adventista diante desse quadro.

Primeiro ponto que destaco é que a “relevância da Igreja Adventista depende da fidelidade a

sua identidade e da ousadia de seus métodos. Traduzindo: conservar doutrinas e modernizar

as abordagens.”50 45 Id. 46 Id. 47 LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 9, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. Apud.: Entrevista do pastor Kleber Gonçalves para a Revista Ministério jan-fev 2010, pág. 5-7. 48 LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 9, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 49 Ibid., p. 9,10. 50 Ibid., p. 10.

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Para Lima a existência da Igreja se justifica em sua fidelidade a sua identidade. O risco

que ele apresenta é que a cultura pós-moderna pressiona os adventistas a se idealizarem como

mais uma religião entre muitas outras, cuja relevância está em cuidar dos pobres e aflitos,

oferecer fuga para a alma, mas deixar de pregar crenças impopulares. Ele diz que os

adventistas não podem se calar quanto à sua mensagem, mas devem pensar em variar a sua

abordagem:

“Quanto aos métodos evangelísticos, formato da adoração, e modelos administrativos, não podemos deixar que o tradicionalismo baseado no gosto pessoal ou no saudosismo de alguns, e não em princípios bíblicos, ‘engesse’ o avanço da igreja. Não é necessário pesquisar muito na Bíblia para perceber que Deus se revelou de diferentes formas em contextos distintos; que usou a linguagem de cada tempo para se fazer entender.”51

Segundo ponto que destaco é a ênfase que Lima52 dá à mudança que a Igreja Adventista

passou nos últimos 150 anos. De uma denominação rural, em 1862, com cerca de 3,5 mil

membros e 125 congregações, para uma igreja com 16,3 milhões de fiéis em 206 países. Com

o crescimento, vieram os desafios. Um dos principais desafios segundo a visão dele é alcançar

a mente urbana. Ao considerar essa questão ele diz:

“Historicamente, os adventistas têm associado a vida nas cidades ao pecado, e há razão para isso; no entanto, desde 2008, mais de metade da população mundial vive nas zonas urbanas. Entender as necessidades dos moradores dessas regiões é facilitar que a mensagem da salvação chegue a mais da metade das pessoas a que fomos chamados a salvar.”

Refletir sobre esses dois pontos considerados por Lima em seu artigo é muito

interessante, pois a impressão que temos é que ele flutua em dois contextos, ou ideologias, ao

mesmo tempo. Por um lado ele considera elementos de atualização, renovação e

contextualização de maneiras interessantes, por outro ele parece voltar no tempo e se fincar

em um paradigma pré-moderno.

Entre diversas características da pós-modernidade53, duas delas nos chamam atenção e

em poucos comentários queremos considerá-las. A primeira é a relatividade e o fim da meta-

narrativas. Esta filosofia tem por finalidade dizer que não existem verdades absolutas para 51 Ibid., p. 10,11. 52 Ibid., p. 11. 53 Vede por exemplo: LYON, David. Pós-modernidade. Tradução: Euclides Luiz Calloni. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1998. 13-17 p.

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todas as pessoas e todos os tempos, isso acontece porque uma das características marcantes é

a valorização do local ao invés do universal. Ao isso acontecer nos deparamos com conceitos

que se diziam universais, mas não dão conta no âmbito local, logo eles são desconsiderados.

Ao ver Lima abordando a necessidade de modernizar, contextualizar, “tirar o gesso”

quanto à forma, vejo uma demonstração do “local” superando o “universal”. Assim, tratar das

pessoas e das necessidades particulares se torna mais importante que conceitos pré-

estabelecidos. Por contra partida, é notório sua postura bem sólida ao manter a mensagem

(doutrinas) protegida de qualquer alteração.

Um segundo ponto que Lyon 54 menciona que está vinculado a contextualização

mencionada é a mudança na comunicação. Ele diz que existe uma mudança do livro impresso

para a tela da TV, a migração da palavra para a imagem, do discurso para a representação.

Essa realidade está cada vez mais intensificada com o avanço tecnológico e a exploração do

consumismo. Esse ponto está ligado diretamente ao que foi dito sobre a necessidade de

alcançar as pessoas onde elas estão focando o uso das tecnologias e da comunicação.

Queiruga fala sobre a dialética modernidade/pós-modernidade, ao tratar da modernidade,

ele apresenta a realidade antes desse período, ou seja, a pré-modernidade. A primeira questão

que ele menciona é a “estreiteza dogmática” que caracterizou o confronto entre a

modernidade e o cristianismo. Comentando a modernidade e tratando da realidade pré-

moderna ele diz:

“A modernidade, ao menos em uma parte muito importante, caracterizou-se por uma insatisfação direta e global em face da herança cristã [...] Por sua inculturação nos velhos esquemas teóricos que agora eram questionados e, sobretudo, por sua posição de poder e predomínio na sociedade, o cristianismo aparecia como inimigo dos novos avanços e como negador da ilusão de futuro que se abria diante da cultura emergente. Infelizmente, essa impressão ia sendo renovada a cada passo pelos conflitos provocados, de maneira quase fatal, por todo avanço científico, social ou filosófico. Até o ponto de, há algumas décadas, Walter Kasper ter chegado a escrever que ‘Não há uma só descoberta científica importante e moderna que não tenha sido condenada ou olhada com desconfiança em alguma ocasião por esta ou aquela Igreja. ’55”

54 Ibid., p. 17. 55 QUEIRUGA, Andrés Torres. Fim do cristianismo pré-moderno. Tradução: Afonso Maria Ligorio Soares. São Paulo: Paulus, 2003. 110 p. Apud: Walter Kasper, Introducción a la fe, Salamanca, 1976, p. 20.

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Esta citação de Queiruga elucida bem a realidade do mundo pré-moderno, realidade esta,

centralizada nos dogmas eclesiásticos e nas diretrizes dos líderes religiosos. Fica evidente que

Lima, ao mencionar que historicamente a Igreja Adventista vincula o viver na cidade ao

pecado, carrega esse conceito consciente ou inconscientemente. Afinal de contas, essa era a

postura da Igreja (independente da placa) ao retratar qualquer coisa que colocava em perigo a

superioridade dela. Assim também a Igreja Adventista tendia em considerar a cidade,

questões desvinculadas da igreja, como algo pecaminoso.

O que me chama muita atenção é o fato de Lima tratar tanto das questões “pós-

modernas”, mas manter esse pensamento pré-moderno, pois após dizer a atitude da igreja em

considerar a vida na cidade como “pecaminosa”, afirma que existe razão para isso. Quero

deixar claro que não é intuito deste trabalho julgar a posição do articulista; não estou tratando

de conceitos para julgá-lo; tão pouco estou me posicionando a favor ou contra a ideia

apresentada, mas o intuito é buscar entender as preocupações dos líderes quanto às novas

ideias apresentada pela sociedade contemporânea. Com isso apenas queremos destacar o fato

dele abordar esses novos conceitos, impensáveis na sociedade pré-moderna e depois abordar

um conceito pré-moderno que pode ser insustentável em um pensamento e contexto pós-

moderno.

Este artigo analisado trata diretamente da importância da igreja se contextualizar,

permanecer fiel à sua mensagem e ao mesmo tempo mostra uma preocupação existente entre

a vida na cidade e o pecado. Os próximos artigos que mencionarei não tratam de forma tão

direta essas questões, mas levantam assuntos que tem preocupado os líderes. Sendo assim,

mencionarei essas informações de forma direta com intuito de mostrar essa realidade.

Alguns artigos foram dedicados para falar sobre a TV, internet, mídias e seus perigos,

destes artigos; vejamos algumas preocupações sobre algo tão real para a sociedade e

principalmente a juventude que nasceu com essa ferramenta nas mãos.

Ozeas Moura56, editor da apostila “Intimidade com Deus” destinada à reflexão diária

durante quarenta dias consecutivos, trata sobre “Permanência versus televisão e internet – I”

no sétimo dia dessa “jornada espiritual” como assim é chamada. Em suas considerações ele

fala o quanto a internet e televisão podem prejudicar a vida espiritual de uma pessoa. Alguns

pontos destaco em sua reflexão.

Primeiro ponto: “Satanás induz as pessoas ao pecado através das avenidas da alma.” Ao

tratar de avenidas da alma, está se referindo aos sentidos: o que vemos, ouvimos, sentimos, 56 MOURA, Ozeas Caldas. Intimidade com Deus: 4º Seminário de Enriquecimento Espiritual. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2011, 22,23 p.

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etc. Segundo ponto: “Ele (referência a Satanás) utiliza nossos sentidos, estimulando o apetite,

a visão e a cobiça.” Ponto três: “Com isso ele (referência a Satanás) consegue: a. Induzir-nos

a pensamentos vãos e corruptos; b. Paralisar os sentidos para não ouvir a voz de Deus; c.

Insensibilizar a mente pela complacência com o apetite; d. Produzir familiaridade com o

pecado.”

Ao tratar sobre Televisão, internet e mente ele afirma: “Uma das características da

sociedade pós-moderna é a frase: ‘Não tenho tempo. ’ Mas essa mesma sociedade se

transformou em um importante consumidor dos programas da televisão e da internet, os quais

absorvem o tempo destinado à família, ao desenvolvimento pessoal e, especialmente, à

comunhão com Deus.”57

Moura58 ainda diz que as estatísticas entre os jovens mostram que cada vez eles são

mais dependentes, chegando a passar seis horas diárias utilizando computador, televisão,

videogames. Ele menciona pelo menos quatro efeitos que essa dependência pode produzir.

São eles:

1. A atividade da Web está criando barreiras entre pais e filhos;

2. As crianças constroem centros multimídia em seus lares, com os quais acordam de

manhã e dormem à noite;

3. A internet é menos usada para fins proveitosos, como o estudo, e mais para se

sociabilizar;

4. As crianças estão multiconcentradas59.

Terminando sua reflexão, Moura60 apresenta dois estudos referentes às consequências

da utilização dos meios de comunicação. O primeiro diz que os meios de comunicação

exercem “influências nas crenças, atitudes e conduta dos grandes setores da população...

através de mensagens positivas ou negativas [...] modificam, em maior ou menor grau, o

modo de vida de muitas famílias e contribuem para mudar, para o bem ou para o mal, as

formas de comunicação na família, sem que os afetados descubram como e em que medida.”61

57 Ibid., p. 22. 58 Ibid., p. 22, 23. 59 Para mais informações acesse: <www.theguardianmedia.com> 60 MOURA, Ozeas Caldas. Intimidade com Deus: 4º Seminário de Enriquecimento Espiritual. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2011, 23 p. 61 Para mais informações deste estudo veja: <www.dyaweb.es>

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O segundo estudo62 mostra que as pessoas que permanecem por muitas horas na internet,

podem sofrer danos cerebrais. Este estudo foi realizado pelo neurocientista Gary Small, da

Universidade da Califórnia, e mostrou que a atividade cerebral dos chamados “nativos

digitais” duplica pela necessidade de tomar decisões e do raciocínio complexo, quando

comparado com pessoas que não tinham utilizado a web. Essa intensa atividade cerebral pode

causar estresse e até mesmo danos neurológicos. Por fim esses estudos apresentados

demonstram que as pessoas que usam a internet e a TV em excesso têm algo em comum:

dedicam tempo; são induzidas a ideias, pensamentos e sensações que podem modificar a

conduta; têm percepção diferente da realidade; têm dificuldade para se concentrar e analisar

temas profundos; a comunicação e os vínculos entre as pessoas são modificados; em ambos os

meios, as ferramentas são o apelo à visão, ao apetite e à sedução da luxúria desta vida.

Outro artigo tratando sobre a internet, de maneira específica fala sobre o site de

relacionamentos: Twitter. Tales Tomaz63 o escritor deste artigo é professor de Comunicação

Social do Unasp. Twitter como dito é um site de relacionamentos no qual cada participante

possui uma conta com o intuito de enviar mensagens de 140 caracteres para os leitores. Para

que alguém possa ler suas mensagens essa pessoa precisa ser seu seguidor, assim como para

que você leia as mensagens postadas por qualquer pessoa, você precisa se tornar seguidor

dessa determinada pessoa.

Esse site se torna muito interessante pelo fato de que rapidamente todos podem ter

acesso as informações publicadas, uma vez que as mensagens são curtas e diretas.

Com isso, em poucos instantes todos podem se informar dos tweets (nome que recebem

as mensagens postadas) postados. A questão que Tomaz levanta é sobre a dependência que a

interação pode causar, sobre isso ele diz: “O tempo cada vez maior gasto no Twitter mostra

muito bem outra faceta da cibercultura: as experiências in loco, ou seja, presenciais, são

tornadas simbolicamente insuficientes. É como se dissessem: ‘Se você não for interativo, está

por fora. Se não tiver uma conta no Twitter, vai ficar para trás’.”64

Então Tomaz fala de uma luta entre a vida espiritual e a virtual, que para ele:

“É por isso que a vivência do cristianismo passa a ser um duelo espiritual travado também no mundo virtual (conflito que de virtual não tem nada, é bem real). Como as pessoas tendem a

62 Para mais informações deste estudo veja: <http://www.adn.es/tecnlogia/20081027/nws-1739-efectos-uso-internet-actividad-cerebral.html> - Informação adicional em: <www.elesctador.com> 63 TOMAZ, Tales. O pássaro hiperativo. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 14, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 64 Id.

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priorizar as relações virtuais, a religião sente que precisa adentrar esse terreno para não perder espaço. É nesse sentido que a cibercultura transforma a vida presencial (até mesmo religiosa) em periferia, e as relações virtuais em centro.”65

As considerações finais de Tomaz são referentes à sua preocupação entre a prática

religiosa, o frequentar a Igreja e a dependência virtual. Ele diz:

“A internet não é neutra, como se diz por aí. Se para ir à igreja tenho que levar celular ou BlackBerry para ‘tuitar’ (enviar tweets) durante o culto ‘chato’, algo está errado. Quando a igreja precisa buscar seus membros no mundo virtual porque já não a ouvem dos bancos do templo, alguma coisa mudou. Os cliques interativos desqualificaram a experiência não tecnológica, a tornaram se graça. A época sugere que, para embelezar um pouco mais a vida, dar-lhe algum sentido é preciso ser interativo, acompanhar perfis do Twitter e ‘tuitar’ o máximo possível. Isso é um artifício, não acredite nele!”66

Tomaz não é claro, tão pouco deixa transparecer para quem ele está escrevendo ou até

mesmo quais pessoas têm tido esse tipo de experiência. Mas a frequência em diversas Igrejas

Adventistas podem me dar o direito de dizer que presenciei algumas vezes os jovens tendo

esse comportamento; pode ser que ele tenha visto o mesmo fato e esteja fazendo referência a

algum acontecimento desse gênero. Acreditando que Tomaz esteja fazendo uma referência

aos jovens tuitarem na Igreja é preciso responder o por quê. Por qual motivo os jovens estão

tendo este comportamento? Duas hipóteses são possíveis: A primeira é uma reação contra um

programa “chato”; a segunda é de aprovação. Se o tuitar for por conta do programa ser chato,

a maior parcela de culpa está no ouvinte ou no idealizador? Agora, o tuitar pode ser de

aprovação e, qual seria o erro disso?

Outro ponto que precisa ser ponderado é que temos um conflito de linguagem. Como

mencionado no texto de Lyon, a comunicação sofreu uma mudança em sua linguagem e

precisamos questionar se as pessoas que vivem nessa nova linguagem possuem alguma culpa

de serem imersos nesta outra realidade. Sendo assim, precisamos antes de mais nada

perguntar qual a linguagem que estou transmitindo e qual a linguagem dos participantes do

culto, caso haja algum tipo de divergência o resultado pode não ser o idealizado e tão pouco o

esperado.

65 Id. 66 Id.

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Adriana Teixeira e Fábio Braga67 escrevem sobre a nova geração e o convívio com a

internet. Importante destacar alguns questionamentos e ideias interessantes para esta

discussão. A primeira questão que destaco é sobre as influências da tecnologia e um ponto de

interrogação é: “Em meio ao excesso de informações, qual deve ser a postura do cristão que

busca adotar um estilo de vida condizente com as verdade bíblicas? É necessário abandonar

todas as conquistas da humanidade para viver à margem da sociedade em busca de

santificação?”

Essa questão levantada está ligada ao que vimos no artigo de Wendel Lima que

apresenta a visão de que viver na cidade está ligado a algo pecaminoso. Neste ponto levantado

o questionamento é se as conquistas humanas, em outras palavras o convívio e a vitória na

cidade, precisam ser deixados para viver a vontade de Deus.

Referente aos assuntos da mídia para Teixeira e Braga, é “indiscutível o fato de que a

maior parte dos valores divulgados pela mídia tem por objetivo denegrir a imagem de Deus.

Para aqueles que ainda têm dúvida disso, basta fazer uma reflexão acerca da maneira pela

quais questões como sexo, casamento, lealdade, fidelidade, religião, poder fama e dinheiro

têm sido tratadas pelos meios de comunicação.”68

Uma vez apresentado que a maioria do conteúdo na internet não é benéfico para uma

experiência religiosa, Teixeira e Braga apresentam o perigo da dependência assim como

vimos nas considerações feitas por Tomaz, eles dizem:

“Os atrativos tecnológicos que o mundo oferece hoje têm o poder de nos afastar do Criador, além de nos distanciar afetivamente das pessoas que amamos. É preciso desenvolver a consciência de que o mau uso dos recursos a que temos acesso pode se tornar um pecado vicioso. A partir do momento em que o tempo gasto compromete o relacionamento com Deus e com a família, divertimentos inocentes e despretensiosos podem nos leva a trilhar um caminho contrário ao de Cristo [...] Certos tipos de filmes, programas e sites da internet podem tornar o cristão escravo de algo que prejudica tanto sua comunhão com Deus quanto sua relação com o próximo.”69

É interessante ponderarmos que os artigos apresentados fazem referência direta ou

indiretamente aos jovens e adolescentes, isso fica claro desde o título dado para este último

67 TEIXEIRA, Adriana; BRAGA, Fábio Willian. Educados para navegar. Revista Adventista. Tatuí, ano 105, nº 1225, p. 8-11, jun., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 68 Ibid., p. 9. 69 Ibid., p. 10.

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artigo, embora não possamos ser categóricos se são eles os leitores do que escreveram a

respeito deles e para eles.

Tirando a internet e a mídia do foco principal, trago a tona outro assunto bastante

comentado e discutido por parte dos líderes que é o consumismo.

Fábio Bergamo70 é mestre em Marketing e Estratégia e escreve na coluna “espaço

jovem” sobre consumismo, Marketing e identidade. Destaco algumas ideias que ele menciona

de maneira bem direta aos jovens. A primeira referente ao Marketing ele diz:

“Há algum tempo, os profissionais e estudiosos do Marketing descobriram que é necessário ir além da simples venda e criar uma ligação emocional do consumidor com o produto ou marca. E a estratégia tem dado certo, tanto que Michael Solomon, um dos ‘papas’ do comportamento do consumidor, declara que, hoje, ‘as pessoas compram produto não pelo que esses fazem, e sim, pelo que significam’. 71 Em termos gerais, produtos são a tradução da personalidade e do estilo de vida daqueles que os consomem.”

Este comentário é muito significativo para os jovens, e ressalta uma preocupação

bastante especial uma vez que é nesse período da juventude onde eles mais querem estar em

alta com seus amigos de grupo. Bergamo ainda faz uma análise do consumo com a busca do

autoconceito do próprio “eu”. Ele diz que existem três tipos de “eu”. O primeiro é o “eu real”,

este é a própria vida real; o segundo é o “eu ideal”, aonde a publicidade explora, uma vez que

este “eu” é o desejo de ser alguém, idealizado; por fim o último é o “eu espelho”, que é a

imagem idealizada por mim que as pessoas terão se eu consumir um determinado produto.

A problemática desta questão de acordo com Bergamo é que:

“o ‘eu espelho’ tende a refletir o ‘eu ideal’ e não o ‘eu real’. E como é moldado esse ideal? Pelo bombardeio dos anúncios de apelo duvidoso. Assim, o risco é de que, aos poucos, muitos jovens cristãos troquem seus ideais pelo conceito consumista de sucesso e valor, fazendo com que seu ‘eu espelho’ comece a refletir um modelo deturpado, centrado em roupas, aparelhos eletrônicos e entretenimentos questionáveis.”72

70 BERGAMO, Fábio. Espelho, espelho meu. Revista Adventista. Tatuí, ano 105, nº 1225, p. 18, jun., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 71 BERGAMO, Fábio. Espelho, espelho meu. Revista Adventista. Tatuí, ano 105, nº 1225, p. 18, jun., 2010. Casa Publicadora Brasileira. Apud: SOLOMON, Michael. Comportamento do Consumido: Comprando, Possuindo e Sendo, 7ª. ed. Porto Alegre: Bookman, 2008, 34 p. 72 BERGAMO, Fábio. Espelho, espelho meu. Revista Adventista. Tatuí, ano 105, nº 1225, p. 18, jun., 2010. Casa Publicadora Brasileira.

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Esta problemática levantada por Bergamo é bastante interessante porque uma atitude

consumista desenfreada pode gerar consequências aqui apresentadas que afetam diretamente a

identidade da pessoa.

A respeito deste problema de identidade vinculado aquilo que eu tenho, Tadeu Inácio73,

apresenta que o meio que vivemos propicia uma vida ligada ao consumismo. Até o calendário,

com datas festivas para mães, pais, crianças, namorados, faz com que pensemos e vivamos

para suprir as necessidades do consumo e quem não se enquadra nesta rotina é deslocado e sai

da normalidade.

Somos tão bombardeados pela publicidade para consumirmos, que muitas pessoas

precisam passar por tratamento. Psicoterapia, medicamentos antidepressivos e Associações,

como por exemplo os “Devedores Anônimos” e “Vida sem Dívida” são alguns exemplos de

tratamento apresentados neste artigo.

Em uma coluna comentando sobre essa questão, o pastor Hugo Quiroga74 é enfático em

declarar que o consumismo “além de uma doença, é uma estratégia de Satanás para

sobrecarregar nossos corações e prejudicar nossa relação com Deus.” A razão que ele

apresenta é que ao sermos dominados pelo consumismo, o desequilíbrio financeiro pode ser

consequência, e se isso acontecer somos prejudicados não apenas financeiramente, mas de

maneira relacional também.

Fica evidente que o consumismo é outra preocupação que os líderes possuem. É bem

verdade que não se restringe aos jovens, abrange todas as pessoas, mas principalmente a eles,

uma vez que na juventude a identidade está se formando e o consumismo como vimos está

relacionado diretamente com essa questão.

O último artigo que destaco neste primeiro capítulo foi escrito por Alberto R. Timm75 e

aborda a família entre cinco revoluções que aconteceram nos últimos duzentos anos. As cinco

revoluções são: Industrial, Feminista, Sexual, Tecnológica e Cibernética, essas revoluções

mudaram a estrutura da sociedade e por consequência da família. Não farei uma análise

detalhada de cada revolução analisada por Timm, apenas destacarei alguns pontos

interessantes que mais se conectam com nosso assunto. 73 INÁCIO, Tadeu. Consumismo. Revista Mais Destaque. São Paulo, p. 28,29 jul-ago., 2009. Publicação Independente. 74 QUIROGA, Hugo. A doença do consumir. Revista Mais Destaque. São Paulo, p. 29 jul-ago., 2009. Publicação Independente. 75 TIMM, Alberto R. A família entre cinco revoluções. Revista Ministério: uma revista para pastores e líderes de Igreja. Tatuí, ano 81, nº 04, p. 26-29, jul-ago., 2010. Casa Publicadora Brasileira.

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Referente a Revolução Industrial, Timm76 mostra a mudança que aconteceu de uma

produção rural familiar para uma atividade em massa e de grande produção. Por consequência

dessa mudança a quantidade de horas de trabalho aumentou; por outro lado os bens de

consumo são mais facilmente adquiridos pela quantidade produzida e pela possibilidade de

compra dos trabalhadores. A problemática destacada está em que por conta dessa nova

dinâmica de compra e venda e busca pelos bens produzidos, pais e filhos se distanciaram do

convívio doméstico.

Iniciado no final do século 18 na França, passando na década de 30 e 40 pelos Estados

Unidos, a Revolução Feminista lutou contra discriminação e inferioridade, assim como

diferença salarial até chegar ao ponto de lutar contra a vida matrimonial, algumas mulheres

mais radicais chegaram a se declarar anti-homem, antifamília e pró-lesbianismo. Timm77

então conclui mostrando que se por um lado a Revolução Industrial afastou o pai do convívio

familiar por conta da carga horaria de trabalho, a revolução feminista afastou a mãe do lar.

Por consequência, os filhos foram confiados aos cuidados de babás, creches ou familiares.

Três fatores vitais desencadearam a Revolução Sexual no inicio do século 20 nos

Estados Unidos: primeiro, a mudança da zona rural para as cidades “libertou” as pessoas

moralizadas pelo processo de urbanização. O segundo ponto foi a possibilidade de novas

aventuras em lugares mais distantes por conta da melhoria nos transportes. Por fim, a

comunicação em massa que fez com que os sonhos sexuais se tornassem visíveis. A

Revolução Sexual trouxe algumas contribuições segundo Timm78: desmistificou o velho erro

teológico que ensina o sexo como pecado, mesmo dentro do casamento, se não for para fins

de procriação; mudou a consciência de que a mulher não é um objeto de prazer sexual do

homem; e também com ela surgiu a produção de contraceptivos a partir de 1960, ajudando a

controlar a quantidade de filhos.

Em contrapartida, Timm79 mostra alguns problemas sociais que essa revolução trouxe.

Em resposta à comunicação em massa expondo o sexo extraconjugal, sexto seguro, a

quantidade de mães solteiras aumentou. Pelo fato de muitas dessas novas mães não possuírem

uma estrutura básica para criar os filhos, muitas avós precisaram assumir a função de pais;

outros casos se tornaram mais delicados porque a mãe não possui uma família para amparar a

nova criança, a consequência foi deixar a criança aos cuidados de creches ou outras pessoas. 76 Ibid., p. 27. 77 Id. 78 Ibid., p. 27,28. 79 Ibid., p. 28.

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Essas consequências não afetaram apenas as famílias, mas também ao governo que precisou

injetar verba para esses fins.

Timm80 termina suas considerações sobre essa revolução falando que a consequência

ultima são os filhos nascerem em uma família desestruturada. “A busca desenfreada de

satisfação sexual, sem qualquer preocupação com valores morais e implicações sociais, tem

limitado a liberdade e o direito de escolha das novas gerações. Os adeptos da Revolução

Sexual optaram por buscar para si mesmo a liberdade de não se casarem, ignorando o direito

dos seus filhos de nascerem em uma família desestruturada.”

Um dos grandes avanços da revolução tecnológica para Timm81 é o desenvolvimento da

indústria de plástico. A produção de produtos para as casas passou a alcançar uma maior

quantidade de famílias, uma vez que os produtos plásticos são mais baratos. Em contrapartida,

esse material trouxe a ideologia das coisas transitórias e descartáveis virem à tona, uma vez

que os bens de consumo por se tornarem “descartáveis” ou com prazo de validade restrito, o

desejo de ter o novo faz com que o permanente perca seu valor, incluindo a família. Por isso

Timm diz que “As novas gerações têm-se tornado cada vez mais descomprometidas em seu

relacionamento com as coisas materiais e também com os seres humanos.”

A última revolução analisada por Timm82 é a Revolução Cibernética. Para ele, o avanço

dos meios de comunicação e de maneira especial a internet modificou os relacionamentos e a

família. O lado positivo é que as distancias foram encurtadas pelo telefone e a internet, mas ao

mesmo tempo pessoas podem estar perto fisicamente, mas ao mesmo tempo distantes em

relacionamento. O tempo utilizado em checar e-mails e visitar sites afeta diretamente a

quantidade de tempo, além do que muitos pais preferem deixar os filhos diante do

computador a dedicar tempo com eles.

Estes pontos que acabamos de ver mostram como a sociedade foi afetada com as

revoluções que foram acontecendo em nossa sociedade, principalmente nos últimos dois

séculos. O que quero destacar é que a grande preocupação do autor ao falar das dificuldades

da família está nas gerações futuras. Ele termina o artigo dizendo: “O mundo precisa hoje de

mais famílias bem estruturadas, que sirvam de modelos a ser imitados pelas novas

gerações.”83

80 Id. 81 Ibid., p. 28,29. 82 Ibid., p. 29. 83 Id.

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Uma vez que sua preocupação está nas gerações futuras, suas considerações fazem

referência a problemas enfrentados também por eles, principalmente as últimas duas

revoluções analisadas, tecnológica e cibernética, que são questões ligadas diretamente as

novas gerações.

Como apresentado no início desta seção, os artigos apresentados trataram de assuntos

que têm causado preocupação para os líderes e ao mesmo tempo são questões que nos

mostram pontos de conflito geracional. Antes de realizar as considerações finais deste

capítulo, quero apresentar dois casos de conflitos por conta de ideias diferentes entre as

gerações.

1.3 UM CASO ILUSTRATIVO

Este estudo de caso tem por objetivo mostrar como algumas das ideias dos líderes das

igrejas, tanto líderes representativos como locais, conflitam com as ideias dos jovens.

Normalmente essa experiência acontece nas igrejas locais, quando as atividades precisam

acontecer e as ideias precisam ser expostas, mas antes de apresentar este caso, quero

contextualizar a realidade da Igreja Adventista.

A IASD é organizada em ministérios 84 . Assim, todas as atividades da igreja são

realizadas através da ação dos ministérios. Para conhecimento do leitor alguns ministérios

são: Ministério Pessoal; Ministério da Criança e do Adolescente; Ministério da Música;

Ministério Jovem entre outros. Estes ministérios possuem um conselheiro que é um ancião da

Igreja local, os anciãos juntamente com o pastor representam a liderança maior da Igreja.

O calendário eclesiástico é dividido entre os ministérios, os quais ficam responsáveis

juntamente com os anciãos e o pastor da Igreja local em realizar as programações. Assim,

como todos os outros departamentos, os jovens possuem suas responsabilidades dentro do

cronograma da Igreja, mas antes que alguma atividade possa ser realizado, os líderes da Igreja

precisam aproveitar o programa planejado.

O mês de Julho tem sido utilizado pela IASD para se realizar uma semana especial de

oração, liderada e destinada de maneira especial aos jovens. No ano de 2011, na IASD de 84 Para mais informações sobre os ministérios acesse: <http://www.portaladventista.org/portal/> acesso em: 11 de janeiro de 2012

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Casa Verde, Zona Norte de São Paulo, os jovens se preparavam para realizar essa semana

especial que teria por tema: “Sonhos”. Como parte da preparação para essa semana, os jovens

arrumaram uma cama dentro da igreja na parte da frente. Na cabeceira da cama colocaram

cartazes contendo escritos alguns sonhos, como formatura, família, etc., ilustrando assim o

tema da semana que estava por começar.

Quando os líderes da Igreja (anciãos) chegaram e viram a cama com os cartazes,

reprovaram a atitude dos jovens afirmando que não poderiam colocar uma cama dentro da

Igreja, pois não era o ambiente adequado para isso. Começou então uma discussão entre os

líderes da igreja e os jovens por conta desta “decoração”, se era ou não permitido deixar a

cama na igreja. Por insistência dos líderes os jovens tiveram que ceder e tirar a decoração.

Ao analisarmos esse ocorrido, nos perguntamos o motivo dos jovens desejarem colocar

a cama e os líderes tirarem. Primeiramente precisamos lembrar o que já analisamos nos

artigos citados acima sobre a diferença no pensamento entre as gerações, para

compreendermos o desejo do jovem em colocar uma cama dentro da Igreja.

A resposta está na linguagem, como vimos o que Lyon 85 explica, com relação à

mudança na comunicação. A nova geração se comunica muito mais com uma imagem do que

com palavras, textos ou pregações. É possível que se os líderes tivessem permitido deixar a

cama dentro da Igreja, daqui a alguns meses ou anos os jovens viessem a se esquecer das

mensagens ditas, mas da ideia que seria transmitida pela cama não. Porque essa é a linguagem

deles.

Em segundo lugar precisamos entender a razão dos líderes pedirem para tirar a cama. A

razão está no que lemos em Queiruga86 sobre a Igreja como o poder e o centro da vida das

pessoas. Não quero dizer que isso é certo ou errado, o problema é que esse pensamento levava

as pessoas a considerarem tudo aquilo de fora da Igreja como profano ou pecaminoso. Logo,

permitir que qualquer coisa que remonte à realidade do cotidiano não pode entrar na Igreja,

pois essa atitude seria como uma profanação do ambiente sagrado. Sendo assim, os mais

velhos da Igreja por carregarem essa “bagagem” se chocaram quando os jovens quiseram

deixar uma cama dentro da Igreja e pediram para eles tirarem.

85 LYON, David. Pós-modernidade. Tradução: Euclides Luiz Calloni. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1998. 13-17 p. 86 QUEIRUGA, Andrés Torres. Fim do cristianismo pré-moderno. Tradução: Afonso Maria Ligorio Soares. São Paulo: Paulus, 2003. 110 p.

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1.4 CONCLUSÕES PARCIAIS

Neste capítulo vimos que o conflito geracional é realidade em diversas esferas da

sociedade. Esse conflito não se limita a experiência religiosa, mas transcende a maioria, para

não ser categórico e afirmar todo relacionamento interpessoal entre gerações diferentes. Em

nosso estudo mostramos essa realidade no âmbito profissional, educacional, familiar e

religioso.

Os líderes da IASD têm demonstrado bastante preocupação com a nova geração e aos

assuntos que a confronta diretamente. Em especial esses assuntos tratam da necessidade de

pertencer a sociedade através daquilo que se adquire, o consumismo, e dos elementos ligados

a internet e a mídia. A grande preocupação referente a mídia e a internet está no conteúdo

apresentado e ao vício pelo uso excessivo dos programas ligados a web. Essa preocupação se

tornou mais alarmante nas palavras de Talez Tomaz ao criticar a utilização desses programas

dentro da Igreja e no artigo de Timm que fala sobre as grandes transformações que afetaram

principalmente a família nas revoluções: Industrial, Feminista, Sexual, Tecnológica e

Cibernética.

Vimos também que o conflito geracional tem ocorrido principalmente pela mudança na

linguagem e a concepção de mundo como pecado por conta dos mais tradicionais e antigos.

Sobre esses dois pontos de confrontação trago alguns questionamentos sobre esse assunto:

Pelo fato dos jovens nascerem em um ambiente cuja linguagem é diferente, faz sua conduta e

acepções erradas a respeito disto? Existe uma linguagem correta para se vivenciar dentro da

Igreja?

Por conta destas questões levantadas, precisamos, antes de qualquer coisa, saber se o

conflito geracional demonstra que o jovem deseja romper com a Igreja, ou se esse conflito

está mostrando que a linguagem utilizada na Igreja não está atingindo o jovem. Para tanto, no

próximo capítulo vamos ao outro lado do conflito, assim veremos o que os jovens estão

escrevendo sobre o contexto atual e sobre o significado de ser um jovem adventista.

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2 O JOVEM ADVENTISTA E SUA IGREJA

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

No primeiro capítulo analisamos a leitura que os líderes da Igreja Adventista têm feito

da juventude e das ideologias contemporâneas. Apresentamos que a mudança na linguagem é

a maior causa de possíveis conflitos entre as gerações. Vimos ainda que os líderes possuem

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uma considerável preocupação com o consumismo e a dependência da tecnologia. Um

destaque especial aos avanços tecnológicos, porque são através deles que a linguagem foi e

está se transformando. Além do que, é através da mídia e web que são lançadas as novas

tendências, modas do momento e assim também o consumismo desenfreado é incentivado

através da propaganda e marketing.

Por parte dos líderes existe essa preocupação apresentada e, como a visão deles não se

encaixa com o contexto contemporâneo, os conflitos podem surgir. O que precisamos analisar

agora é a perspectiva jovem diante deste mesmo quadro. Ou seja, embora a juventude possa

ter um comportamento, uma postura “errada”, inadequada ou indesejada sob a perspectiva dos

mais antigos e tradicionais, é preciso ver o que eles pensam sobre essas mesmas questões.

Precisamos lembrar que estamos falando de pessoas que frequentam a mesma Igreja,

mas que não possuem a mesma visão de todas as coisas e se comunicam de formas diferentes.

O questionamento a ser respondido é se essa visão oposta do jovem confronta a Igreja e com

isso eles querem romper com ela, ou se a identidade adventista do jovem está passando por

uma transformação. Caso a juventude esteja em mudança, isso seria possível e aceitável?

Com o intuito de responder essas questões levantadas, quero analisar o que a juventude

está dizendo sobre ser um jovem adventista. Através dessa análise, desejo perceber qual o

verdadeiro objetivo deles, isso é confrontar os princípios e a liderança ou formar sua

identidade. Para tanto, extrairei da internet essas informações87. Escolhi a internet por dois

principais motivos: o primeiro porque é nela que os jovens postam suas opiniões de forma

livre; o segundo, porque é onde os jovens passam mais tempo trocando ideias e discutindo

diversos temas.

Após considerarmos essa questão, se o jovem quer romper ou não com a Igreja,

analisarei o jovem e a formação da identidade, por fim levantarei as opiniões da juventude

sobre a Igreja no contexto contemporâneo. Com isso, temos as duas visões das distintas

gerações da Igreja Adventista.

2.2 O JOVEM E A IGREJA ADVENTISTA

87 Por motivos éticos e com o intuito de preservar a identidade dos jovens não mencionaremos os nomes deles. Mostrarei a referência de onde os dizeres foram tirados e colocando todos os textos na integra nos anexos.

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Como apresentado, através das redes sociais, blogs pessoais, quero extrair a opinião dos

jovens sobre o que significa ser adventista. Portanto, através do que eles estão dizendo,

mostrar se as preocupações levantadas pelos líderes fazem referência a uma negação da

identidade adventista ou formação dela.

Em primeiro lugar, quero ser enfático em afirmar que os jovens adventistas conversam

mais sobre religião, aspectos espirituais e atividades da Igreja do que se imagina. Uma rápida

olhada nos sites de relacionamentos e vamos encontrar centenas de grupos e discussões

diversas referentes a esses assuntos. Quero exemplificar isso com dois sites de

relacionamento: Orkut e Facebook.

Após considerar os temas e os objetivos das comunidades e grupos dessas redes sociais,

quero analisar as opiniões e dizeres dos jovens adventistas. Com isso formando o quadro

completo do conflito geracional dentro da Igreja Adventista.

2.2.1 O jovem e as redes sociais

Em uma breve pesquisa no Facebook encontramos dezenas de grupos criados com o

título de jovens adventistas88, muitos destes grupos possuindo centenas de participantes. É

interessante verificar que os assuntos tratados nestes grupos de relacionamentos fazem

referência à vida espiritual, programas da Igreja, até mesmo batismo, entre outros assuntos

ligados a Igreja.

Notem, um destes grupos,89 com 193 membros, tem como últimas postagens questões

especificamente vinculadas às Igreja. Um dos jovens, inclusive, fala sobre o estudo da lição

da Escola Sabatina90, outro tenta animar os jovens sobre o grupo jovem da igreja local e o

retiro espiritual de carnaval, outro ainda, posta uma mensagem de efeito falando sobre a

felicidade em Deus. Vejam a frase de descrição do grupo: “O melhor da vida, dizem por ai, é

ser e se sentir jovem, cheio de disposição, mas... O melhor mesmo é conhecer o doador desta

vida, o melhor é conhecer JESUS.

88Vede:<http://www.facebook.com/search/results.php?q=jovens%20adventistas&type=groups&init=quick&tas=0.40054174652323127> acesso em :19 jan. 2012 89 <http://www.facebook.com/groups/jovenseadventistas/> acesso em: 19 jan. 2012. 90 Para mais informações sobre a lição da escola sabatina acesse: <http://redeadventista.com.br/escolasabatina/> acesso em: 19 jan. 2012

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Ser Adventista do Sétimo Dia é viver a vida, e sempre jovem, aos pés do Mestre.”91

Se procurarmos por desbravadores92 no Facebook, clube que reúnem adolescentes e

jovens a partir dos 10 anos de idade, vamos encontrar resultados similares aos jovens. Vários

links de desbravadores e clubes são encontrados 93 . Faço menção a duas páginas com

resultados mais expressivos. A primeira página com o título desbravadores94, que possui mais

de mil e setecentos curtir.

No Facebook quando alguém gosta de determinada frase, foto, evento, ou página, ele

aprova isso com um curtir, que tem uma mão com um sinal de positivo como símbolo.

O segundo destaque que faço é para o grupo desbravadores paulista leste95. Esse grupo

foi formado pelos desbravadores que fazem parte de clubes pertencentes às Igrejas

Adventistas da região norte e leste de São Paulo96. Esse grupo possui no momento 613

membros.

É interessante notar os posts realizados pelos desbravadores, nos dois exemplos citados

acima encontramos versos bíblicos, lembretes sobre os eventos, frases lembrando eventos

acontecidos, fotos dos acampamentos, entre outros. Ou seja, o que vemos nestes grupos e

páginas até aqui apresentadas são demonstrações de que os jovens, pelo menos parte do

tempo que estão conectados a rede, estão conversando sobre Deus, sobre as atividades da

Igreja, sobre os assuntos interessantes a eles.

Quando passamos a pesquisar as comunidades no Orkut, os resultados são maiores e

muito mais expressivos. Embora seja importante ressaltar que o Orkut é um site de

relacionamentos mais antigo que o Facebook, tem por consequência mais participantes.

As pesquisas com o nome adventistas mostram centenas de resultados, os mais

expressivos são: “Adventistas do 7º Dia” com 86.801 membros; “Jovens Adventistas do 7º

Dia” com 73.576 membros; “Amo ser adventista!!!” com 57.063 membros; “Pra Sempre 91 Id. 92 Para mais informações sobre o clube de desbravadores vede: <http://desbravadores.org.br/> acesso em: 20 jan. 2012 93 Para consulta veja: <http://www.facebook.com/search/results.php?q=desbravadores&init=quick&tas=0.863546998007223> acesso em: 20 jan. 2012 Veja também: <http://www.facebook.com/search/results.php?q=desbravadores&type=groups&init=quick&tas=0.863546998007223> acesso em: 20 jan. 2012 94 <http://www.facebook.com/desbravadores> acesso em: 20 jan. 2012 95 <http://www.facebook.com/groups/270496649647644/> acesso em: 20 jan. 2012 96 A Associação Paulista Leste é uma das sedes administrativas da IASD em São Paulo. Para mais informações vede: <http://apl.org.br/> acesso em: 20 jan. 2012

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Adventista!!!” com 21.851 membros. Ainda encontramos outras comunidades de jovens

adventistas solteiros, como por exemplo: “Adventistas Solteiros” com 17.633 membros e

“Adventistas Solteiros Procuram” com 5.632 membros.97

A pesquisa por desbravadores no Orkut mostrou resultados parecidos aos apresentados

acima. A comunidade Desbravadores possui 39.783 membros, a comunidade “Amo meu

clube de Desbravadores” possui 12.820, e ainda centenas de outras comunidades ligado aos

clubes, atividades para os desbravadores, e até comunidades ligado a ex-desbravadores98.

Os assuntos discutidos nas comunidades também são pertinentes à vida espiritual e as

atividades da Igreja. Vejamos alguns exemplos, começando com a comunidade “Amo ser

adventista”99. Alguns exemplos de tópicos são: Por que você é adventista? Reavivamento e

Reforma. Uso de joias. Você é um cristão verdadeiro?

A comunidade “Sou Adventista do Sétimo Dia” 100 , que possui 16.032 membros,

também possui tópicos para debates vinculados a questões bíblicas. Alguns exemplos: Você

acredita que Cristo não tarda a voltar? Onde na Bíblia ordena o cristão guardar o sábado?

Dom de línguas. Já conversou com Jesus hoje?

Encontramos no fórum de discussão da comunidade “Jovens Adventistas do 7º Dia”101,

diversos assuntos relacionados a vida espiritual, assuntos como Criacionismo Científico. O

que você sabe? 22 de Outubro de 1844. Cuidado.. Adventistas têm perdido o foco.

Nestes dois sites de relacionamentos mencionados vemos a mesma realidade: os jovens

estão presentes, mas não podemos negar que muitas vezes o assunto discutido faz referência à

vida espiritual e a realidade da Igreja. O que me faz concluir que o tempo utilizado

conectados a web não pode ser considerado como mero desperdício, pelo contrário, pode ser

um tempo de crescimento espiritual ou ao menos convívio com outras pessoas da Igreja.

97 Para conhecimento de mais comunidades acessem: <http://www.orkut.com.br/Main#UniversalSearch?searchFor=C&q=Adventistas&pno=1> acesso em: 20 jan. 2012 <http://www.orkut.com.br/Main#UniversalSearch?pno=1&searchFor=C&q=Adventista> acesso em: 20 jan. 2012 98 Para conhecimento de outras comunidades vede: <http://www.orkut.com.br/Main#UniversalSearch?searchFor=C&q=desbravadores&pno=1> acesso em: 20 jan. 2012 99 <http://www.orkut.com.br/Main#CommTopics?cmm=2537946> acesso em: 20 jan. 2012 100 <http://www.orkut.com.br/Main#CommTopics?cmm=2298645&na=1&nst=1> acesso em: 20jan. 2012 101 <http://www.orkut.com.brMain#CommTopics?cmm=240063> acesso emacesso em: 20 jan. 2012

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Considerando que os sites de redes sociais estão repletas de comunidades, grupos e que

os jovens estão participando ativamente nesses sites, podemos supor que os jovens utilizam as

redes sociais para comentarem as programações da Igreja102. Se isso vier acontecer, em

qualquer momento que um jovem tiver acesso a internet ele pode postar comentários sobre

algo que assistiu ou que está assistindo.

Essa hipótese parece ser verdadeira. Com o intuito de provar menciono apenas dois

exemplos recentes. Sábado, 21 de janeiro de 2012, estive realizando uma palestra para os

jovens da IASD de Vila Ré sobre namoro. No mesmo dia às 21:06 na minha página pessoal

do facebook103, recebi a notificação que uma das jovens que estava assistindo a palestra

postou uma frase que eu mencionei horas atrás. Esse é apenas um de muitos casos que tenho

visto nas redes sociais.

O segundo exemplo baseia se na possibilidade do jovem possuir aparelhos celulares

com conexão à internet e durante algum programa postar mensagens sobre o mesmo. Caso

isso aconteça, não é por isso que ele está achando o programa chato ou ruim. Pelo contrário,

pode estar apreciando e repassando informações significativas para outras pessoas que não

podem estar naquele evento104.

O que vimos é que os jovens estão presentes e são ativos nas comunidades e grupos das

redes sociais. Também vimos que eles discutem muitas questões relacionadas a igreja e seus

ensinamentos. Outro ponto a destacarmos é que os jovens utilizam as redes sociais para

postarem comentários sobre os programas e atividades da Igreja, seja de maneira local ou

organizacional. Esses comentários podem ser feitos antes do programa, anunciando o que virá,

durante o programa, e após o programa. Não podemos ser categóricos em dizer a quantidade

de tempo que eles passam conectados a web, também não podemos afirmar se são viciados e

tão pouco podemos dizer que o acesso do jovem a internet seja de todo prejudicial e

comprometedor. Afinal de contas, muitos jovens estão utilizando a internet como meio de

comunicação para a própria Igreja.

Vejamos agora o que significa ser um “jovem adventista” de acordo com eles.

2.2.2 O jovem e o “ser” adventista 102 Vede anexo 2. Convite para uma programação jovem na Igreja Adventista de Vila Ré. 103 <http://www.facebook.com/profile.php?id=100000718627655> 104 Vede anexo 1. Comentário feito por uma professora de uma palestra para professores das Escolas e Colégios Adventistas da Associação Paulista Leste no dia 24 de janeiro de 2012. Importante, esse comentário foi feito enquanto a palestra estava acontecendo.

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Uma vez visto que o tempo do jovem nas redes sociais não pode ser taxado como inútil,

analisemos o que o jovem pensa sobre ser adventista. Com isso, quero deixar bem claro se

eles se consideram Adventistas do Sétimo Dia assim como ensinado pelo corpo doutrinário da

Igreja.

Quero evidenciar essa posição através dos comentários deles sobre o ser adventista sob

uma perspectiva geral. Fazendo assim, tenho por objetivo mostrar se o jovem adventista

deseja romper com a Igreja, ou os conflitos entre gerações evidenciam que o problema não

está na sua relação com a Igreja, ou com a sua identidade de ser adventista, mas sim na

linguagem e teologia usada pelos dirigentes mais velhos da Igreja, mas sim em uma

linguagem que não alcança o jovem.

Analisarei os dizeres dos jovens de duas maneiras, a primeira através das comunidades

e grupos nas redes sociais e a segunda com os dizeres propriamente ditos de maneira

individual. As comunidades possuem pensamentos e frases que descrevem a ideia principal

do grupo, se torna subentendido, que os participantes partilham da mesma opinião ali

expressa. Sendo assim, através destas descrições pode-se capitar o pensamento que permeia a

opinião dos jovens referentes a identidade do jovem adventista.

2.2.2.1 Grupos nas Redes Sociais

Para essa análise, selecionei quatro comunidades da rede de relacionamentos Orkut e

um grupo do site Facebook. Dentre os cinco grupos, dois levam a identificação “jovem” e os

outros dois são gerais, embora centenas e milhares de jovens participem das comunidades

gerais. A escolha foi baseada em dois critérios: a quantidade de participantes e a expressão da

definição da comunidade e grupo. Isso porque nem todas as comunidades e grupos possuem

uma definição direta sobre o ser adventista.

Citarei primeiramente as três comunidades identificadas para todos, após essas três

gerais, mencionarei as feitas especificamente para os jovens. A comunidade “Pra Sempre

Adventista” possui mais de vinte e um mil membros e é definida com as seguintes palavras:

“Nós podemos perceber o crescimento assustador de um mundo blasfemo ao nosso redor, cheio de corações fechados para Deus,

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dispostos a enganar. Cada vez mais a guerra contra Deus se intensifica, através do orgulho doentio e do amor às coisas deste mundo. Mas nós conhecemos o Deus criador, que salva e protege seus filhos. Reconhecemos seus ensinos bíblicos de forma integral, e por eles damos sentido às nossas vidas. Seguimos os preceitos de Deus, seguimos os passos de Cristo e, é claro, sonhamos em subir até Ele nas moradas celestiais. Por isso, cada um de nós pode dizer, em alto e bom som, que pertencerá eternamente ao Seu povo!”105

Essa citação é carregada de uma bagagem doutrinária adventista106.

Os ensinos adventistas vão surgindo no desenvolver do texto. Podemos ver o ensino

sobre o grande conflito na frase “a guerra contra Deus se intensifica, através do orgulho

doentio e do amor às coisas deste mundo.”

Vemos também a doutrina do homem como ser criado de Deus e o ensino da

experiência da salvação em “Mas nós conhecemos o Deus criador, que salva e protege seus

filhos.”

O ensinamento sobre a segunda vinda de Cristo é enfatizado na frase “sonhamos em

subir até Ele nas moradas celestiais.”

Por último, encontramos o ensino sobre a vida cristã nas palavras “Reconhecemos seus

ensinos bíblicos de forma integral, e por eles damos sentido às nossas vidas. Seguimos os

preceitos de Deus, seguimos os passos de Cristo”.

É notório como essa comunidade possui o objetivo de fortalecer e apoiar a Igreja

Adventista como um todo. E uma vez que alguém toma a decisão de participar desta

comunidade está de forma virtual incentivando e confessando os dizeres expostos e

comentados. Sendo assim, parece que todos os jovens, dentre esses mais de vinte mil

participantes, se enquadram nessa doutrina apresentada, ou pelo menos não se sentem

completamente desconfortáveis com ela.

É interessante ainda destacar que na página principal desta comunidade existem

algumas recomendações de links. Dos seis sites indicados um é oficial da IASD107; outro de

um dos redatores108 da Casa Publicadora Brasileira, editora da Igreja Adventista; o terceiro 105 <http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=2317472> acesso em: 20 jan. 2012 106 Para melhor conhecimento das doutrinas adventistas veja: Ministerial Association of the General Conference of Seventh-day Adventists. Nisto Cremos. Tradução: Hélio L. Grellmann. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2008. 107 Site promocional de uma atividade oficial da IASD <www.esperança.com.br> 108 Blog pessoal do Michelson Borges que possui grande ênfase em ciência e religião focando o criacionismo <www.michelsonborges.com>

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site destacado é sobre os livros digitalizados de Ellen White109, uma das fundadoras e a maior

escritora da Igreja Adventista; dos outros três sites recomendados, dois são sobre

criacionismo110 e um sobre a Bíblia111. Esses sites mais uma vez evidenciam a conectividade

da comunidade e de todos os participantes com a Igreja Adventista e seus ensinos.

A segunda comunidade que destaco tem por título “Adventistas Brasil (AdvBr)” e

possui mais de dez mil participantes. Sua descrição inicia dizendo que não apenas pertence,

mas se denomina representante da Igreja Adventista, é dito: “Seja bem-vindo à comunidade

da Igreja Adventista Sétimo Dia”.

Sua descrição faz menção a aprendizado e discussão sobre assuntos religiosos, a

formação de novas amizades e falar sobre Jesus Cristo. Após esses dizeres introdutórios a

frase que mais marca sua apresentação é: “Lembre-se de que você é um cristão e por isso é

um testemunho vivo de Jesus Cristo para outras pessoas não adventistas que TAMBÉM

PODERÃO participar desta comunidade, portanto aja como tal. O que deve imperar nesta

comunidade é a AMIZADE e o RESPEITO para com o próximo.” 112

Assim como na comunidade “Pra Sempre Adventista” os organizadores são enfáticos

em pedir o testemunho dos adventistas, reforçamos que isto é a expressão da doutrina sobre a

vida cristã. De forma mais específica, esse pedido faz menção ao ensino intitulado à conduta

cristã. É interessante que a comunidade incentiva a amizade e o bom convívio entre as

pessoas, reforçando o que foi dito.

A conclusão não pode ser outra a não ser que essa comunidade e todos os seus

participantes desejam o crescimento da Igreja Adventista. É claro que podem ter pessoas que

buscam a contenda e desunião, tentando criar intrigas nos fóruns de debates, mas é

interessante como os moderadores buscam controlar essas questões chegando ao ponto de

retirar essas pessoas da comunidade. Sendo assim, em sua maioria encontramos milhares de

jovens adventistas no Brasil que são a favor da Igreja.

A terceira e última comunidade destinado a todas as pessoas que mencionarei é “Amo

ser Adventista”. Uma comunidade muito expressiva com mais de cinquenta e sete mil

participantes, que possuí os dizeres de saudação muito interessante, praticamente descrevendo

algumas das mais significativas doutrinas da Igreja.

109 <www.ellenwhitebooks.com> 110 <www.universocriacionista.com.br> e <www.scb.org.br> 111 <www.bibliaonline.net> 112 <www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=825203> acesso em: 20 jan. 2012

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A frase introdutória é: “Porque não basta sermos adventistas, temos que amar, trabalhar

e unir nossas forças para que Jesus volte em breve!”113Apenas essa frase possui referência a

dois ensinos importantes da Igreja Adventista: Unidade no corpo de Cristo e a segunda vinda

de Cristo. Não bastasse isso, encontramos uma série de frases resumindo o que significa

“Amo ser adventista!”:

“Eu amo Jesus Cristo; Eu amo a Bíblia; Eu amo acordar cedo no santo Sábado, mesmo quando estou com sono ainda; Eu amo aguardar a volta de Cristo, com a certeza de que este dia está muitíssimo próximo; Eu amo não comer porcaria, não beber todas, nem fumar; Eu amo estudar a lição da Escola Sabatina; Eu amo ter acesso a música da melhor qualidade; Eu amo às vezes ter que ser interno no colégio, e fazer amigos e histórias inesquecíveis; Eu amo ir no J.A. (mesmo quando está vazio); Eu amo demais desbravador, acampar, viajar e curtir a natureza.”114

A conexão desta comunidade com os ensinos da Igreja e os departamentos é completa,

todas as frases mencionadas neta citação ou são alusão direta a uma doutrina ou faz referência

a alguma atividade da Igreja. Vejamos isso de maneira mais detalha:

“Eu amo Jesus Cristo”, referência a doutrina de Deus; “Eu amo a Bíblia”, menção a

doutrina a palavra de Deus; “Eu amo acordar cedo no santo Sábado, mesmo quando estou

com sono ainda”, baseado no ensino sobre o Sábado; “Eu amo aguardar a volta de Cristo, com

a certeza de que este dia está muitíssimo próximo”, doutrina sobre a segunda vinda de Cristo;

“Eu amo não comer porcaria, não beber todas, nem fumar”, referência direta a ensinos da

doutrina sobre conduta cristã; “Eu amo estudar a lição da Escola Sabatina”, menção à

atividade realizada todos os sábados em todas as Igrejas Adventistas, na qual se estuda um

assunto específico durante o período de três meses a cada Sábado; “Eu amo ter acesso à

música da melhor qualidade”, comentário sobre os músicos da Igreja Adventista; “Eu amo às

vezes ter que ser interno no colégio, e fazer amigos e histórias inesquecíveis”, referência a

experiência de milhares de jovens que frequentam as dezenas de internatos no Brasil e no

Mundo; “Eu amo ir no J.A. (mesmo quando está vazio)”, departamento jovem da Igreja

Adventista que significa “Jovens Adventistas”, assim um comentário sobre os programas que

normalmente acontecem semanalmente; “Eu amo demais desbravador, acampar, viajar e

curtir a natureza”, comentário sobre o departamento dos desbravadores destinado as crianças,

adolescentes e jovens.

113 < http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=2537946> acesso em: 31 jan. 2012 114 Id.

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Esta importante comunidade no Orkut se esforça em dizer que ama ser adventista. Com

isso, a conclusão é que os milhares de jovens que participam desta comunidade também

dividem o mesmo sentimento. É possível que nem todos partilhem do mesmo sentimento em

todas as questões apresentadas pelos líderes da comunidade, mas de forma geral não se pode

esperar que alguém participe de um grupo sem ter pelo menos uma aceitação mínima do que é

defendido por ele.

No facebook encontramos um grupo novo chamado “Jovens Adventistas”. Como dito

anteriormente, o facebook é uma rede social mais recente que o Orkut, mas tem crescido

grandemente. Os grupos neste site são mais recentes ainda, por isso esse grupo possui quase

duzentos participantes. Embora poucos jovens participando, sua descrição é significativa.

Esse grupo é descrito assim: “O melhor da vida, dizem por ai, é ser e se sentir jovem,

cheio de disposição, mas... O melhor mesmo é conhecer o doador desta vida, o melhor é

conhecer JESUS. Ser Adventista do Sétimo Dia é viver a vida, e sempre jovem, aos pés do

Mestre.”115

Em primeiro lugar, esse grupo se posiciona de forma interessante como a melhor fase da

vida: a juventude. Mas, de acordo com esses jovens, a juventude se torna plena ao conhecer

Jesus. No segundo momento, duas doutrinas surgem através dos dizeres: a primeira sobre a

criação ao afirmar “O melhor mesmo é conhecer o doador desta vida, o melhor é conhecer

JESUS.”116

O ensino sobre a conduta cristã é a segunda doutrina apresentada e se fundamenta na

afirmação de que “Ser Adventista do Sétimo Dia é viver a vida, e sempre jovem, aos pés do

Mestre.”. Essa expressão “aos pés do Mestre” acontece frequentemente na realidade da Igreja

Adventista, se referindo a uma vida de conformidade com os ensinos de Jesus Cristo, que está

ligado diretamente a doutrina mencionada. Note que esse grupo é especificamente de jovens e

para eles a realização do jovem é se encontrar com Jesus e seguir seu exemplo.

A última comunidade que mencionarei neste momento é “Jovens Adventistas do Brasil”,

esta comunidade está ligada à rede social Orkut e possui mais de onze mil membros. Essa

comunidade é expressiva na quantidade de membros e na sua descrição. Em primeiro lugar, a

juventude de forma geral é descrita como pertencentes a fase à idade da inquietude, das

115 <www.facebook.com/groups/jovensadventistas/> acesso em: 20 jan. 2012 116 A IASD defende que todos os membros da Divindade estavam envolvidos na criação, mas o agente criador foi Jesus Cristo. Vede: Ministerial Association of the General Conference of Seventh-day Adventists. Nisto Cremos. Tradução: Hélio L. Grellmann. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2008. 91. p.

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quedas e das distrações. Mas, dentre toda a juventude, existem aqueles que “se dedicam à

propaganda e à prática da bíblia”.117

Essa apresentação da juventude é muito significativa, pois estão abertamente falando de

uma tendência deles. Esse comentário feito por eles lembra a fluidez que Bauman fala em

modernidade líquida, já mencionada e em seu comentário sobre pós-modernidade que diz:

“Um número sempre crescente de homens e mulheres pós-modernos, ao mesmo tempo em que de modo algum imunes ao medo de se perderem, e sempre o tão frequentemente empolgados pelas repetidas ondas de “nostalgia”, acham a infixidez de sua situação suficientemente atrativa para prevalecer sobre a aflição da incerteza. Deleitam-se na busca de novas e ainda não apreciadas experiências, são de bom grado seduzidos pelas propostas de aventura e, de um modo geral, a qualquer fixação de compromisso, preferem ter opções abertas. Nessa mudança de disposição, são ajudados e favorecidos por um mercado inteiramente organizado em torno da procura do consumidor e vigorosamente interessado em manter essa procura permanentemente insatisfeita, prevenindo, assim, a ossificação de quaisquer hábitos adquiridos, e excitando o apetite dos consumidores para sensações cada vez mais intensas e sempre novas experiências.”118

Embora Bauman não esteja falando diretamente e apenas sobre jovens, a definição é

ampla e serve para todas as faixas etárias, a descrição sobre os pós-modernos se encaixa de

maneira precisa nas características que os jovens apresentaram sobre eles mesmos. Os jovens

destacaram que essa fase é a fase da “inquietude”, das “quedas” e “distrações”. Bauman fala

dessas características nos termos da “sedução pelas aventuras” e a “preferência pelas opções

abertas”, incentivado por um mercado que pelas diversas opções e concorrências quer levar a

insatisfação permanente para criar uma busca incessante pelo novo.

Essa leitura que os jovens fazem deles mesmos é significativa, pois revela que eles

também possuem preocupações por quem eles são. Em outras palavras, é uma demonstração

da luta que eles enfrentam, essa é a nossa fase, mas mesmo assim queremos dedicar nossa

vida a prática da Bíblia.

Dentro deste contexto de lutas a descrição continua falando aos jovens:

“Vós sois uma esperança para os mais velhos, e elementos de grande valor para os que trabalham em favor da Humanidade. Sereis a esperança do futuro. Sede constantes na tarefa iniciada,

117 <www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=474224> acesso em: 20 jan. 2012 118 BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Tradução: Mauro Gama, Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. p. 22,23.

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sede fortes, praticai as leis de Deus, sede bons discípulos, obedientes e respeitosos, se quereis ser bons mestres no futuro, sede agora bons discípulos, até que a Providência vos chame a desempenhar mais alta missão com o retorno de Cristo.”119

Mais uma vez nos deparamos com uma afirmação repleta de doutrinas adventistas. O

ensinamento sobre a vida cristã e o crescimento em Cristo está por detrás das palavras “Sede

constantes na tarefa iniciada, sede fortes, praticai as leis de Deus, sede bons discípulos,

obedientes e respeitosos, se quereis ser bons mestres no futuro, sede agora bons discípulos”.

Assim como a doutrina da segunda vinda de Cristo está clara na afirmação “até que a

Providência vos chame a desempenhar mais alta missão com o retorno de Cristo.”.

Essa análise destes grupos revelou que os ensinos adventistas estão presentes nas

descrições que os membros e de uma maneira especial os jovens têm feito deles mesmos.

Vimos ainda que a linguagem que eles utilizam é uma linguagem rotineira da Igreja,

mostrando que a juventude faz parte dessa realidade. Sendo assim, esses grupos vistos

revelam, pelo menos a primeira vista, que o intuito do jovem não está em romper com a Igreja,

mas fazer parte e como expresso nesta última comunidade ser “a esperança para os mais

velhos”.

Até aqui vimos o “pertencer” e o “ser” de forma coletiva, ou seja, os jovens pertencem

às comunidades que “vestem a camisa” da Igreja Adventista. Neste momento analisemos os

dizeres dos jovens de forma pessoal.

2.2.2.2 O jovem Adventista nas Redes Sociais

Encontramos comentários dos jovens nas redes sociais em fóruns de discussão e posts

pessoais. Sendo assim, dividirei esta parte do estudo primeiramente apresentando os

comentários que são feitos nas comunidades e depois as publicações pessoais120.

Na comunidade “amo ser adventista” encontramos uma discussão sugerida por uma

jovem com o título: “Por que você é adventista?” A justificativa para tal discussão é: “Muitos 119 <www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=474224> acesso em: 20 jan. 2012 120 Como mencionado anteriormente, estarei preservando a identidade dos jovens, não mencionando os nomes deles no trabalho. Colocarei as imagens que copiei da tela em anexo para que todos possam ter o texto na íntegra sem a necessidade de acessar os sites correspondentes.

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adventistas de berço perderam a sua identidade, frequentam a igreja por uma questão familiar,

são adventistas porque os seus pais também foram.”121 O questionamento principal para a

discussão é se existe firmeza em ser adventista. Ou seja, se os jovens sabem exatamente em

que creem os adventistas e se esse é o motivo para eles serem adventistas.

Os comentários são significativos e interessantes. A maioria dos comentários fazem

referências diretas ou menções às doutrinas que a Igreja Adventista ensina. Alguns são diretos

e afirmam que a Igreja Adventista é a Igreja Remanescente e a Igreja que corresponde a

profecia bíblica.122 O que torna essas reações relevantes é que em primeiro lugar foram

postadas por jovens, em segundo lugar é porque elas fazem menção ao ensinamento bíblico

adventista sobre o remanescente e sua missão.

Outros jovens fazem menção à relevância doutrinária fundamentada nas escrituras e por

isso se julgam convictos nos ensinos que aprenderam na IASD123.

A postura desses jovens em defender a identidade adventista deles ligada aos

ensinamentos apresentados pela IASD revela que existe compromisso com a fé e as crenças

que eles professam. Isso nos mostra que o frequentar a Igreja não é algo vago e superficial,

mas uma resposta convicta embasada em princípios bíblicos.

Outra discussão aconteceu na comunidade “Jovens Adventistas”. Uma jovem de vinte e

cinco anos abriu uma discussão sobre ser jovem, viver momentos difíceis, travar lutas e

guardar os princípios bíblicos na atualidade.124 Essa pergunta apresenta uma jovem que tem

lutado para viver o cristianismo prático, seguir os ensinos bíblicos, mas que tem encontrado

dificuldades e lutas e gostaria de compartilhar experiências.

Um jovem respondeu “É difícil, mas quando se propõe a tentar e ter comunhão com

Deus, as dificuldades ficam mais leves. O testemunho até melhora como

consequência.” 125 Outro jovem comentou essa discussão dizendo que é dificílimo essa

realidade. Menciona ainda, sobre a dificuldade de ter amigos que não professam a mesma fé,

pois estas influenciam a sua vida, razão pela qual o relacionamento se torna difícil.

Esse jovem também fala sobre a experiência do fracasso quando todas as coisas

parecem se encaminhar bem. Ele diz que se firma em um texto bíblico de Apocalipse 2:10:

“Não temas o que hás de padecer. Eis que o Diabo está para lançar alguns de vós na prisão, 121 <www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=253794&tid=5515592440288106001> acesso em: 31 jan. 2012 – vede anexo 3 122 Vede anexos 3, 4, 5, 6 123 Vede anexos 3, 4, 5, 6 124 Vede anexo 7. 125 Id.

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para que sejais provados; e tereis uma tribulação de dez dias. Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a

cora da vida.”126

A provedora da discussão responde positivamente aos dizeres desse jovem dizendo que

está de acordo e menciona o texto bíblico que se encontra em Tiago 1:12 “Bem-aventurado o

homem que suporta a tentação; porque, quando for provado, receberá a coroa da vida, a qual o

Senhor tem prometido aos que o amam.”127

A leitura que faço dessa troca de experiências é que os jovens se preocupam em ser fieis

aos princípios que professam. São honestos em dizer que possuem dificuldades em viver o

ideal que colocaram para suas vidas. Eles são humildes em reconhecer que caem e falham,

mas ao mesmo tempo buscam o crescimento e a vitória para o ideal. Essa posição evidencia o

desejo de permanecer na Igreja que frequentam.

Essas duas discussões apresentadas nessas comunidades diferentes nos mostram a

mesma realidade: viver o que dizem seguir é o ideal de vida almejado pelos que participaram

desses grupos.

Trago agora uma série de comentários de jovens publicados em um grupo do facebook

sobre o que significa ser um jovem adventista na opinião deles. Para analisar esses textos de

maneira mais clara possível estarei redigindo os posts tentando preservar a integridade do

texto original. O primeiro comentário foi feito por um jovem e ele diz:

“É uma batalha todos os dias, estamos propícios a cometer erros mais fácil devidos não darmos tanta importância para as coisas de Deus. Pensamos que os prazeres do mundo podem satisfazer nossos desejos passageiros, mas esquecemos que temos um Deus que é por nós. Envergonhados sempre tentamos seguir Seus passo, mesmo não sendo dignos de andar ao lado de um Deus tão misericordioso. Sendo diferentes tentamos mostrar para as outras pessoas quem somos, e porque somo assim. Muitas vezes não vivemos o que pregamos, mas todas as vezes nos sentimos despedaçados pela falta de fidelidade à um Deus tão bom assim.”128

Confesso que minha tendência é reescrever os comentários realizados no último post,

mas além da franqueza desse jovem quero destacar dois elementos que mostram vínculo com

a Igreja. O primeiro é a linguagem utilizada: o sentido que ele dá as palavras é muito real na

experiência da Igreja Adventista. Alguns exemplos: “coisas de Deus”, “desejos passageiros”,

“prazeres do mundo”, “somo diferentes”, essas expressões demonstram vínculo com a Igreja. 126 Vede anexo 8. 127 Id. 128 Vede anexo 9 – primeiro comentário.

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O segundo destaque é que o tempo todo ele expressa sua vida como a batalha do cristão,

batalha essa tão pregada e ensinada pelos pastores e líderes da Igreja Adventista.

Seguindo essa linha que mostra uma realidade difícil de ser vivida, outro jovem

comentou que estamos sendo incentivados a viver uma vida baseada em lucros e conquistas

aqui na terra. Ele chega a afirmar que as pessoas que deveriam dar o exemplo (deduzo eu que

para os mais novos) não o fazem e o exemplo a ser seguido fica por conta de pessoas que não

são comprometidas espiritualmente. Sua última contribuição é dizer que por conta dessa falta

de exemplo e apoio o resultado é que: “o prazer carnal e outras influências passaram a fazer

parte da nossa rotina.”129

Este jovem mencionado é outro exemplo de uma pessoa que possui sua raiz na Igreja

adventista, revelando isso na sua maneira “adventista de falar”. Frases como “conquistas aqui

na terra” e “prazeres carnais” são ouvidas frequentemente nos cultos e nas conversas entre

membros adventistas. Embora esse jovem chegue a dizer que o “prazer carnal, outras

influências passaram a fazer parte da rotina”, encontramos nestes elementos apresentados uma

amostra de afinidade e o desejo de viver de conformidade com os ensinos da Igreja.

Duas jovens concordam que para ser um jovem adventista hoje é preciso estar em

íntima comunhão com Deus.130Os comentários da duas se complementam após afirmarem que

precisam de uma verdadeira comunhão com Deus. Elas falam em vencer as tentações,

escolher os amigos corretos, tomar as decisões certas, frequentarem os lugares adequados,

saber dizer não as festas erradas, bebidas, mostrar o exemplo de Jesus para as pessoas que

ainda não o conhecem.

A primeira jovem ainda afirma que temos uma razão para estarmos aqui e essa é: “ser

um cristão correto, um desbravador fiel, e um adventista de fé [...] É ter um comportamento

de respeito dentro da casa de Deus, é dar o testemunho a partir de nossas vidas, é ajudar ao

próximo e amar a todos, principalmente a Deus.”131

Essa jovem se apresenta como desbravadora e seus comentários soam como uma

adaptação da lei dos desbravadores. A lei dos desbravadores 132 é o ideal para cada

desbravadores seguir e ela ensina: 1. Observar a devoção matinal; 2. Cumprir fielmente a

129 Vede anexo 9 – terceiro comentário. 130 Vede Anexo 9 – comentários 2 e 5. Você encontra a publicação completa do comentário 5 no anexo 10. 131 Vede Anexo 9 – comentário 2. 132 <http://desbravadores.org.br/sobre-nos/ideais-dos-desbravadores/> acesso em: 31 jan. 2012

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parte que me corresponde; 3. Cuidar do meu corpo; 3. Ser cortês e obediente; 4. Andar com

reverência na casa de Deus; 5. Ter sempre um cântico no coração; 6. Ir aonde Deus mandar.

Veja que existe conexão entre o que ela diz e a lei dos desbravadores, de maneira que

encontramos mais uma demonstração de conexão entre as atividades para os jovens, neste

caso os desbravadores, e a experiência pessoal dessa moça. Em suas palavras ela dá ênfase em

ser um testemunho, um exemplo a ser imitado tanto dentro da Igreja como fora, ajudar o

próximo e amar a todos e principalmente a Deus.

A segunda jovem citada acrescenta seus comentários dizendo:

“O mundo hoje só vive pelo sucesso, dinheiro fama... mas o que DEUS tem para nos oferecer é muito melhor do que qualquer bem aqui na Terra, por isso por mais que seja difícil, temos que persistir na missão que o Senhor nos confiou... Vamos levar a mensagem e preparar outras pessoas para o dia grande dia... Provações virão, mas DEUS está no controle de tudo, então devemos confiar no Senhor, e deixar que ele guie nossa vida neste mundo, estamos aqui de passagem, em breve veremos o nosso Senhor! Amém!”133

Estes dizeres dela também estão repletos de doutrinas, além de uma linguagem

essencialmente adventista.

Consideremos primeiramente as doutrinas que ela apresenta. A doutrina “O

Remanescente e sua Missão” é expressa nas frases “temos que persistir na missão que o

Senhor nos confiou... Vamos levar a mensagem e prepara outras pessoas para o dia grande

dia...”. Por detrás das palavras “Vamos levar a mensagem e preparar outras pessoas para o dia

grande dia...” e “estamos aqui de passagem, em breve veremos o nosso Senhor!” está a

mensagem adventista da “Segunda vinda de Cristo”.

Além desses ensinamentos doutrinários encontramos também a maneira adventista de se

expressar. Sempre são incentivados a viver uma vida que se afaste dos padrões da sociedade,

uma vida mundana e esse ensino encontraram na frase: “O mundo hoje só vive pelo sucesso,

dinheiro fama... mas o que DEUS tem para nos oferecer é muito melhor do que qualquer bem

aqui na Terra”. Outro dizer típico adventista é “estamos aqui de passagem, em breve veremos

o nosso Senhor!”

Seguindo esta tendência, temos este comentário publicado por outro jovem: “Ser

adventista pra mim é maravilhoso, por mais que vivemos em mundo pecaminoso,

bombardeados pra viver uma vida totalmente de sucesso, dinheiro, vitória, mas as vezes 133 Vede Anexo 10 – comentário 5.

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esquecemos que com Deus conseguimos isso e muito mais, enfim ser um jovem adventista

hoje em dia pra mim é FAZER A DIFERENÇA =).”134

É possível notar que as ideias desses jovens se cruzam, e aquilo que é mais pregado e

dito nas igrejas acabam transparecendo nestes dizeres. Para este jovem, assim como para

outros já mencionados, vivemos sob a influência de um mundo contaminado pelo pecado, que

oferece um sucesso substancialmente financeiro e ligado a status. Mas, segundo ele apresenta,

pode-se conquistar mais que o mundo oferece, é preciso estar ligado a Deus. Por fim ele

resume sua ideia mostrando mais uma vez a questão do testemunho, nas palavras: “Fazer a

Diferença”.

Todos os posts lançados pelos jovens e vistos até o presente momento trilham a mesma

linha de pensamento. Eles mostram que os jovens se preocupam com sua vida espiritual e o

seu testemunho. Além da maneira deles se expressarem e revelam uma bagagem doutrinária e

cultural dos Adventistas do Sétimo Dia.

Outro comentário bastante significativo sobre o ser adventista foi escrito por um jovem

que começa suas considerações dizendo que ser cristão é uma decisão que tomamos na

juventude, e essa escolha perdura por toda a vida. Para ele aqueles que decidem viver um

cristianismo de aparência não conseguem viver dentro da Igreja o que são fora dela, logo uma

vida de frustração por conta de um coração dividido. Em contrapartida, aqueles que decidem

viver um cristianismo autêntico mostram sua luz para as pessoas que o cercam, e são taxados

como fanáticos por não aproveitar o melhor que a vida pode oferecer.

Ele então diz que se eu busco ser por conta da opinião alheia, o resultado é uma vida

dúbia, mas se decido viver de acordo com o que Deus espera posso ter inimizades com as

pessoas, mas terei as melhores oportunidades para a vida.135

Esse jovem mostra um lado diferente de ser cristão, ele apresenta as chances que um

cristão tem e que aconteceu em sua vida. Ele diz:

“A igreja nos oferece através dos seus ensinamentos, tudo aquilo que um jovem que esta lá fora deseja ter para ser alguém diferenciado. Foi na igreja que tive a primeira noção do que é música clássica, tive a oportunidade de ver uma orquestra de sinos, o que lá fora é visto como uma qualidade apenas de pessoas de alta sociedade, foi na igreja que aprendi como falar em público, o que me rendeu ótimas notas em muitos seminários na faculdade, foi na igreja que aprendi a desenvolver a minha liderança levando outras pessoas aos pés de Jesus, o que me deu a oportunidade de subir os degraus da minha carreira e gerenciar

134 Vede Anexo 9 – comentário 4. 135 Vede anexo 11

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departamentos. Foi na igreja que aprendi a ter amor ao próximo, o que me rendeu ter boas e sinceras amizades. Foi através dos ensinos na igreja que eu aprendi a ser comedido nas minhas ideias, o que me faz ser para as pessoas um bom conselheiro.”136

Este comentário é interessante, uma vez que ele faz um agradecimento por tudo o que a

Igreja ofereceu e ainda oferece a ele. Todas as oportunidades e o crescimento mencionado

fazem entendermos que tanto o convívio, como os ensinos aprendidos na Igreja fizeram a

diferença na vida deste jovem. Ele termina suas considerações falando sobre qual a melhor

forma de viver a juventude:

“Para mim a melhor forma de viver a juventude de forma completa e real é sendo um jovem cristão, isso muda a minha personalidade, a minha história e a minha vida. Eu não preciso ir na balada a e encher a cara pra ficar feliz, basta me reunir com meus amigos, tocar o violão e cantar belas canções em nome do Senhor, eu não preciso fazer viagens de carnaval onde pessoas se entregam ao simples prazer do corpo, sendo que posso retirar-me espiritualmente para um lugar afastado desfrutando de horas intermináveis de comunhão com meus irmãos e amigos. E assim as pessoas que estão ao meu redor são atingidas por essa luz que não provém de outro lugar a não ser do trono de Deus. Sabemos que não somos perfeitos, mas sabemos que com Cristo podemos crescer e ao contrário do que acontece no mundo, nos tornamos pessoas melhores. Os jovens de Deus sempre estão um passo a frente dos jovens do mundo. Eu acredito!!!”137

A parte final destes dizeres revela sua ligação com as atividades da Igreja e com a

doutrina que professa. “Reunir os amigos”, “Retiro espiritual”, são momentos que acontecem

frequentemente no cotidiano da Igreja, como sociais de Sábado a noite, e os acampamentos

que as igrejas promovem na época do carnaval e durante o ano. Ele também fala sobre o não

viver como o mundo, saindo para festas e utilizando bebidas alcóolicas. Menciona o

testemunho que acontece ao vivermos de acordo com a vontade de Deus. Termina seu

comentário dizendo que em sua opinião, viver o cristianismo é garantia de mudança de vida

para melhor, e andar a frente dos outros jovens.

A última publicação nesta página do facebook é de um jovem que fala que ser

evangélico em nossos dias é moda, assim dizer ser evangélico não é nenhum problema. Em

sua opinião o difícil é “ser um jovem adventista verdadeiramente focado: ler a Bíblia, estudar

136 Id. 137 Id.

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a Lição, comparecer aos cultos de quarta, evangelizar... o difícil é nós mentalizarmos a nossa

missão e seguir o exemplo de Cristo!”

Neste último comentário encontramos a definição de ser um jovem adventistas no

envolvimento com as atividades da Igreja e a comunhão com Deus. “Cultos de quarta” e

“evangelizar”, são atividades que a Igreja promove semanalmente, e o “estudo da Bíblia” e da

“Lição” é uma referência a comunhão diária com Deus. O termo “Lição” é utilizado por toda

a igreja para se referir ao estudo da lição da escola sabatina, atividade normalmente realizada

aos Sábados pela manhã nas Igrejas Adventistas.

Até o presente momento analisamos dizeres dos jovens em comunidade e grupos. Todos

os dizeres vistos seguem uma mesma linha de pensamento, em geral os jovens se preocupam

com um momento a sós com Deus, para ler a Bíblia e estudar a lição da Escola Sabatina,

procuram enfatizar a importância do testemunho dentro das atividades da igreja e no cotidiano.

É notável uma preocupação com as coisas do “mundo”, por isso vez após vez, eles dizem que

somos diferentes do mundo, e vivemos de maneira diferente.

Continuando este estudo, quero apresentar mais alguns testemunhos de jovens falando

sobre o que significa ser adventista. A diferença desses para com os outros está apenas em

que os comentários citados anteriormente foram extraídos de discussões, os próximos que

veremos são posts feito no mural do facebook. O mural do facebook é o local utilizado para

deixar suas mensagens de forma que todos os seus amigos e aqueles que entrarem em sua

página possam ver.

Uma jovem postou um comentário dizendo que ser adventista significa mostrar para as

outras pessoas que somos diferentes, e para defender isso ela menciona que não saímos a

certas horas da noite, não comemos e bebemos coisas que não devem. Observe que ela está

fazendo referência aos princípios aprendidos na Igreja, quanto ao testemunho e ao cuidar do

corpo como templo do Espírito Santo. Ela então diz que o significado de ser adventista em

sua concepção pode ser definido como: “Eu sou temente a Deus, então isso me torna diferente

e sigo meus princípios sem precisar fazer o que normalmente os outros jovens que não são da

igreja fazem. Mas o que importa realmente é ser normal porém diferente.”138

Este comentário é expressivo, não apenas por mostrar que suas ideologias são fundadas

nas crenças adventistas, mas também por mostrar que o jovem deseja ser “normal”. Em outras

palavras, embora, ela enfatize que deve ser “diferente” por conta de seus princípios e atitudes,

ela não deseja estar alheia de tudo, ou ser considerada ou sentir-se anormal. 138 Vede anexo 13 – comentário 1

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Outra jovem disse de forma mais incisiva que ser adventista é ser diferente do mundo.

Ela afirma: “É Amar a Jesus acima de tudo, fazer sua vontade e não se importar com os que

outros possam falar, é não ter vergonha de levar o evangelho para aquele que necessitam de

um alimento espiritual, é estender a mão para o necessitado e dizer ao mundo que somos

caretas sim, mas somos feliz pois temos a salvação e a vida eterna!”139

Como dito e agora visto, essa jovem é mais enfática em dizer que os jovens adventistas

não devem temer em dizer ao mundo que são “caretas”. Essa maneira de se posicionar é uma

demonstração clara que ela está do lado da Igreja, não desejando romper com seus ensinos. É

fato que não podemos ser conclusivos, mas nota-se uma postura aparentemente mais

conservadora do que foi visto até agora. Embora nenhum comentário visto até agora

demonstre alguma negação dos ensinos adventistas.

Encontramos outro comentário interessante feito por uma jovem, ela inicia suas

considerações fazendo menção à um texto de Hebreus dizendo: “Somos uma geração eleita ao

sacerdócio real, nação santa... povo exclusivo de Deus.. para anunciarmos as suas grandezas

aquele que chamou das trevas para sua maravilhosa luz.”140 Notem como o ensinamento

adventista é presente nestas palavras, nossa missão ela diz é proclamar o conhecimento que

temos sobre Deus. Dentro desta mesma linha de pensamento um jovem comentou, ser

adventista do sétimo dia é um estilo de vida.141

Os últimos dois posts que mencionarei são de duas jovens que trazem informações

simples e profundas, mas que ainda não foram mencionadas. A primeira delas diz que ser um

jovem adventista é “andar na contramão do mundo trilhando os caminhos de Jesus, andando

como ele andou; amar como ele amou e viver como ele viveu [...] é viver sempre alegre, é

compartilhar a nossa alegria, é viver com intensidade, é ser um jovem abundante de Benção

divinas capazes de ajudar ao próximo e fazer com que os outros possam conhecer sobre o

amor de Deus através de Nós.”142

Este comentário apresentado agora caminha de uma maneira diferente dos que vimos

até agora. Pois, ao mesmo tempo em que essa jovem fala sobre seguir na contramão do

mundo e viver como Jesus viveu como os outros jovens vinham comentando, ela acrescenta a

questão da alegria. Ser um jovem adventista, sob sua perspectiva, está ligado a ter uma vida

intensa, uma vida contente e essa alegria chega até as outras pessoas no amor ao próximo. 139 Vede anexo 13 – comentário 2 140 Vede anexo 13 – comentário 4 141 Vede anexo 14 – comentário 3 142 Vede anexo 14 – comentário 2

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Esse comentário eu julgo interessante, pois demonstra que a jovem pensa em seguir os

ensinos adventistas, mas ao mesmo tempo não se vê preso a uma realidade enfadonha, porém

alegre e contagiante.

O último comentário levanta outra questão significativa para esta pesquisa, uma jovem

aborda o ser jovem como ser diferente do adulto e da criança. Ela diz:

“Ser um jovem adventista é na atualidade diferente de ser um adulto ou uma criança adventista, uma vez que os desafios são outros, assim como as tentações, o envolvimento e eu diria que também a disposição. Há jovens dentro da igreja que querem ser apenas telespectadores e há aqueles que aproveitam a oportunidade e fazem da igreja a sua cara, afinal os jovens são alegres, são falantes, diferentes dos de dentro de outras idades muitas vezes, mas necessariamente diferente dos de fora, a medida que não há compatibilidade nos pensamentos, atividades e desejos que o mundo aprova. Ser um jovem adventista é amar a Deus e não ao mundo, amar ao próximo e seguir o exemplo de Jesus.”143

Mais uma vez encontramos o ser adventista como ser diferente do mundo, nas atitudes e

no pensamento oposto, mas ao mesmo tempo alegre como proposto pela última jovem. Outro

ponto que destaco e sob minha perspectiva é fundamental, é entender que os jovens são

diferentes das crianças e dos adultos. Sua maneira de ser é diferente, seus desafios são outros,

suas tentações como colocado são outras também. Sob essa perspectiva apresentada por essa

jovem, surge uma questão, não se pode dizer que ser jovem adventista é a mesma coisa que

ser um adulto adventista? É notório que ela não diz “não sou adventista”, mas ela diz “sou

adventista diferente dele (a)”. Ou seja, ela não quer romper com a Igreja, assim como todos os

outros não desejam, mas ao mesmo tempo, não são iguais a todo mundo, possuem suas

peculiaridades.

Após apresentar todos esses comentários feitos pelos jovens sobre o que significa ser

adventista, minha leitura dessas informações é que eles estão estritamente vinculados aos

ensinos e ao estilo de vida proposto pela Igreja. São francos e humildes em dizer que muitas

vezes possuem dificuldades em seguir tudo o que desejam e alguns momentos falham.

Entendem que ser adventista é ser alegre e devem fazer a diferença em todos os lugares, quer

sejam nas atividades da Igreja ou fora dela.

143 Vede anexo 13 – comentário 3

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Como vimos, os jovens adventistas são e desejam continuar como adventistas, mas

surgiu uma questão referente a identidade do jovem adventista. E será esse o assunto que

estarei analisando.

2.3 A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA

Esta parte do trabalho será dividida em duas partes, na primeira analisarei a transmissão

de heranças religiosas e a formação da identidade, após isso, mostrarei as opiniões dos jovens

sobre mudanças na igreja em meio a uma sociedade diferente da qual a Igreja Adventista foi

fundada.

2.3.1 Transmissão de heranças religiosas e a formação da identidade

Muitas pessoas nos Estados Unidos da América pregavam e aguardavam a volta de

Jesus em 22 de outubro de 1844. Uma vez que Jesus não voltou na data prevista, esse grande

grupo se dividiu e uma das ramificações veio a se tornar o que hoje chamamos de Igreja

Adventista do Sétimo Dia.144

Dos primeiros encontros, quando não existia nenhum tipo de organização até o presente

momento em 2012, passaram mais de 160 anos. O que significa que durante todo esse tempo,

as crenças adquiridas iam passando de geração em geração.

É natural que uma Igreja após sua organização e a solidificação de suas doutrinas, passe

a transmitir o mesmo ensino, caso contrário torna-se outra igreja. Estamos falando de

transmissão de uma herança religiosa, assim com o passar dos anos, indiscutivelmente todas

as igrejas transferem suas heranças para os novos membros, sejam eles filhos dos mais

antigos ou convertidos.

144 Para mais informações sobre a história da Igreja Adventista veja: SCHWARZ, Richard; GREENLEAF, Floy. Portadores de Luz. 1. ed. Engenheiro Coelho: Unaspress, 2009.

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Ao tratar esse assunto, tendo o ponto de origem a sociedade, Daniele Hervieu-Leger145

diz que o receptor nunca é a imagem perfeita do transmissor. Ela afirma: “Se o ideal da

transmissão pretende que os filhos sejam a imagem perfeita dos pais, é claro que nenhuma

sociedade jamais o atingiu, simplesmente porque a mudança cultural não cessa de agir,

inclusive nas sociedades regidas pela tradição.”146 Uma vez que a sociedade não é estática por

conta da mudança cultural, ela diz que a continuidade não significa imutabilidade, pelo

contrário a continuidade é garantida pela mudança. A consequência é que as novas gerações

são colocadas em oposição as antigas por causa dessas mudanças.147

Por conta disto, o transmitir não se limita em passar conhecimento para outra pessoa.

Para Hervieu-Leger:

“a transmissão não consiste apenas na garantia da passagem de um determinado conteúdo de crenças de uma geração a outra, colocando os recém-chegados em conformidade com as normas e valores da comunidade. Na medida em que a transmissão se confunde com o processo de elaboração dessa ‘corrente da memória’ a partir da qual um grupo crente se realiza como grupo religioso, a transmissão é o próprio movimento pelo qual a religião se constitui como religião através do tempo: é a fundação continuada da própria instituição religiosa.”148

Sendo assim, a transmissão significa a transformação do conteúdo em uma realidade

pessoal e individual. A grande dificuldade dessa sociedade é que a sociedade está em

constante mudança, e a vivência do conteúdo transmitido será adaptado de acordo com cada

realidade.

Ao tratar sobre as mudanças, Hervieu-Leger diz que as mudanças na sociedade não se

limitaram apenas em uma adaptação por conta das inovações, mas são “verdadeiras rupturas

culturais que atingem profundamente a identidade social, a relação com o mundo e as

capacidades de comunicação dos indivíduos. Elas correspondem a um remanejamento global

das referências coletivas, a rupturas da memória, a uma reorganização dos valores que

questionam os próprios fundamentos sociais.”149 Considerando que existe essa ruptura nas

memórias, a consequência é que as religiões podem ser abaladas, pois elas se fundamentam

nos ensinos passados. 145 HERVIEU-LEGER, Daniele. O peregrino e o convertido. Lisboa: Gradiva, 2005. cap. 2, p. 57-80. 146 Ibid., p. 58. 147 Ibid., p. 57. 148 Ibid., p. 62. 149 Ibid., 58.

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A “crise da transmissão” é o nome que se dá ao problema da transmissão religiosa para

os jovens, isso porque as sociedades modernas não podem ser mais consideradas sociedades

da memória, pelo contrário o que está em voga hoje é a decisão do momento. Bauman fala

dessa realidade ao dizer: “No jogo da vida dos homens e mulheres pós-modernos, as regras do

jogo não param de mudar no curso da disputa.”150 Essa instabilidade, mobilidade, movimento

é exemplificado por Bauman como um turista, a vida turística preocupa-se em movimentar,

não em chegar. Eles se movimentam por conta da insatisfação com a realidade de casa, mas

essa realidade foi imposta sobre eles.151 Como todas as coisas estão em movimento, não se

fala em vanguarda, não se fala em pessoas defendendo ideias absolutas, mas vemos as pessoas

se movendo, porém os movimentos “parecem aleatórios, dispersos e destituídos de direção

bem delineada.”152

A consequência dessa mobilidade é descrito nas palavras de Hervieu-Leger: “Hoje,

levado ao limite, esse processo de libertação produziu a desestruturação e o aniquilamento da

memória coletiva, a ponto de as sociedades modernas aparecerem cada vez mais incapazes de

pensar sua própria continuidade e, assim consequentemente, de se representar seu porvir.”153

Por conta de uma sociedade móvel, onde as heranças nem sempre são consideradas,

Hervieu-Leger diz que as identidades religiosas não podem mais ser consideradas identidades

herdadas. Ela afirma:

“as identidades religiosas não podem mais ser consideradas identidades herdadas, mesmo se admitirmos que a herança é sempre remanejada. Os indivíduos constroem sua própria identidade sociorreligiosa a partir dos diversos recursos simbólicos colocados a sua disposição e/ou aos quais eles podem ter acesso em função das diferentes experiências em que estão implicados.”154

A identidade religiosa então deve ser analisada como ela denomina pela “trajetória de

identificação”. Essa trajetória não se limita a experiência religiosa e a transmissão da herança

religiosa que a pessoa tem durante sua vida, mas engloba todas as questões que estão ligadas

ao que se crê, dentre vários desses pontos ela cita: práticas pertençam anteriores, maneiras de

150 BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Tradução: Mauro Gama, Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. 113 p. 151 Ibid., p. 116,117. 152 Ibid., p. 121. 153 HERVIEU-LEGER, Daniele. O peregrino e o convertido. Lisboa: Gradiva, 2005. 62 p. 154 Ibid., p. 64.

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conceber o mundo e de inserir-se ativamente nas diferentes esferas de ação que compõe o

mundo, etc.155

Revendo os conceitos apresentados temos uma sociedade em constante mudança,

mudanças que não se limitam as consequências das novas invenções. Vimos também que a

sociedade moderna tende a ser imediatista e não se preocupar com as heranças. Por conta

destas questões existe uma crise na transmissão, isso é, o ensinamento da religião para as

novas gerações é comprometido pela negação da herança e das mudanças constantes. A

última questão que vimos foi que a identidade religiosa não pode ser considerada apenas

como a transmissão da herança e a experiência religiosa pessoal, mas a junção desses com as

práticas religiosas, sua vivência passada, sua visão de mundo, etc.

Diante deste quadro quero complementar a ideia de formação de identidade com o

conceito apresentado por Néstor Canclini156 extraido de Arjun Appadurai o qual analisa a

cultura não como um substantivo, um objeto definido, mas sim como um adjetivo. “O cultural

facilita a falar da cultura como uma dimensão que se refere a ‘diferenças, contrastes, e

comparações’ permite pensá-la ‘menos como uma propriedade dos indivíduos e dos grupos,

mais como um recurso heurístico que podemos usar para falar da diferença’.157

A partir deste pensamento podemos extrair o conceito de identidade que se forma

através das diferenças, dos contrastes. Eu sei o que sou quando vejo o que não sou. Assim, um

cristão comprova que é um cristão quando se depara com um mulçumano ou um budista. Da

mesma maneira, um adventista tem convicção de suas crenças quando é confrontado com

outra religião.

Por lógica, um jovem adventista sabe o que ele é quando confrontado com o que ele não

é. Por esta razão, conseguimos entender a declaração que vimos de uma jovem que disse, ser

jovem adventista é diferente de ser um adulto adventista ou uma criança adventista. Pois,

através dos opostos se forma a identidade.

Unindo os dois pensamentos que vimos sobre a formação de identidade, chegamos ao

ponto que ao eu me deparar com o meu oposto, ou com o diferente, juntando a isso a

experiência religiosa e a transmissão da herança religiosa que tenho durante minha vida, 155 Id. 156 CANCLINI, Néstor Garcia. Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução: Luiz Sérgio Henriques. 3. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009. p. 35-53. 157 CANCLINI, Néstor Garcia. Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da interculturalidade. Tradução: Luiz Sérgio Henriques. 3. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009. 48 p. Apud Appadurai, 1996, p. 12-13.

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minhas práticas, costumes anteriores, maneiras de conceber o mundo e de inserção no mesmo

em todas as esferas de atividades que o compõe, estou formando minha identidade.

Diante desta junção de fatores, minha leitura é que a identidades do jovem adventista

está em formação. Uma vez que a sociedade vive em mudanças, e os jovens acompanham

muitos dessas mudanças, sua identidade não será igual a dos adultos. Não é por essa razão que

eles deixarão de ser adventistas, mas, talvez não seja o que os mais velhos esperam que eles

sejam. O que acontece é que se os jovens estão em formação de uma identidade, e isso por

conta das mudanças que eles passam em todos os aspectos da vida, a lógica leva a concluir

que eles esperam que a Igreja passe por mudanças. Ou seja, que a “cara” da igreja seja

transformada de acordo com as necessidades.

Quero mais uma vez utilizar as redes sociais para ver a opinião do jovem sobre essa

questão de mudança. Esperam eles que isso aconteça? Ou a Igreja tem que ficar estagnada,

pois não é necessário fazer nenhum tipo de adaptação, contextualização.

2.3.2 O jovem e a igreja

Os comentários que apresentarei foram extraídos de algumas discussões na rede social

“Orkut” e de minha página pessoal do Facebook. No Orkut encontrei algumas postagens

relevantes para nosso tema e no Facebook lancei há alguns meses atrás uma pergunta na rede

e alguns jovens estiveram comentando a respeito da Igreja Adventista e a mudança. De vários

comentários, selecionei alguns e os apresento neste momento.

Começarei com os comentários realizados no Orkut. Na comunidade “Jovens

Adventistas do 7º dia” é realizada uma discussão sobre a cultura contemporânea, onde

encontramos um comentário de um jovem de maneira interessante. Ele diz que “Precisamos

entender que é possível apreciar as artes e a cultura sem se contaminar, porque foi Deus quem

deu ao homem o poder criativo e despertou nele a necessidade de apreciar o belo[...]”158

Seu comentário continua fazendo menção a um artigo publicado na Revista Conexão JA,

escrito pelo Pr. Allan Novaes que diz: “[Temos tido adventistas] cada vez mais exclusivistas,

alheios às necessidades, ideologias e necessidades dos não convertidos e [...] despreparados

158 Vede anexo 15 – comentário 1

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em conteúdo e linguagem para apresentar Jesus a uma geração cada vez mais

‘culturalizada’.”159

Vemos nestes comentários não uma manifestação direta de mudanças, mas a

necessidade de abrir os horizontes para a realidade da sociedade. Uma vez entendendo a

cultura, a necessidade então é de se adaptar para que a igreja fale a mesma língua das pessoas

presentes.

Os próximos cinco comentários que faço se referem a outro fórum, na mesma

comunidade “Jovens Adventistas do 7º Dia” do Orkut, que falam sobre a Igreja da Nova

Semente160. Em síntese, a proposta da Nova Semente, como normalmente as pessoas chamam,

é alcançar pessoas pós-modernas.

Então, toda a programação, linguagem, abordagem, são dirigidas para esse fim. É uma

igreja que por conta da reestruturação completa no culto, o nome diferente, se tornou motivo

de discussão, mesmo entre aqueles que nunca a haviam visitado.

Os posts que trago são referentes a uma típica discussão sobre a Nova Semente, na qual

um jovem menciona que estava assistindo o Canal Novo Tempo161, um canal da IASD, e sua

avó disse “meu filho com tanta coisa boa na TV e você fica vendo musica mundana na TV”

ele então menciona a sua avó que era o canal da Igreja e ela disse que a Novo Tempo passava

de tudo. Ele termina dizendo “Se é que me entende...”162

Outros jovens então começam a comentar em resposta a esse post. O primeiro diz:

“Enquanto isso... a NS (abreviatura para Nova Semente) continua realizando a obra.”163 Em

seguida uma jovem apoia esse comentário e diz:

“Deus tem feito grandes maravilhas através da NS! Deus seja louvado!!! O tolerar? Sinceramente acho falta de visão!! O certo seria um aceitar o outro, baseado na realidade da nossa atualidade. A ordem não é pregar a todos? A NS tá cobrindo uma área, que a IASD tradicional ignorou por anos a fio. O certo é ambos se aceitarem, entenderem que cada qual é uma parte do corpo e realiza determinadas funções.. ou atingem determinados ‘públicos’.”164

159 Id. 160 Para mais informações sobre a Igreja da Nova Semente acesse: <http://www.novasemente.org/> acesso em: 02 fev. 2012 161 Para mais informações sobre a TV Novo tempo veja: <http://novotempo.com/tv/> acesso em: 02 fev. 2012 162 Vede anexo 16 – comentário 2 163 Vede anexo 16 – comentário 3 164 Vede anexo 16 – comentário 4

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Outra discussão dentro deste tópico foi levantada por conta do nome. Antes de me

referir aos comentários dos jovens, uma breve explicação referente a um costume que

encontramos nos nomes das Igrejas Adventistas.

As Igrejas Adventistas têm normalmente seguido uma forma na nomenclatura,

primeiramente o nome Igreja Adventista do Sétimo Dia e após vem a localidade a qual a

Igreja pertence. Por exemplo, cito a Igreja que eu vivi toda minha infância, chama-se, Igreja

Adventista do Sétimo Dia da Casa Verde, pois se localiza no bairro Casa Verde na Zona

Norte de São Paulo.

Voltando a discussão sobre o nome Nova Semente, a primeira jovem reagiu pelo fato do

nome não “seguir o padrão adventista”. Em resposta a outro comentário ela questiona e

afirma: “A Bíblia ou EGW (abreviação para Ellen Gold White, uma das fundadoras da IASD)

se ocupam em pregar nome, ou se ocupam em pregar a mensagem, o evangelho? Se alguém

está do lado da verdade, o nome é o que menos importa.”165

Apoiando esse comentário e a toda Igreja da Nova Semente um jovem diz:

“Parabéns à Administração da AP [abreviatura para Associação Paulistana, sede mantenedora da Igreja Nova Semente], por esta iniciativa. Tive a oportunidade de assistir algumas palestras do Pr. Kléber (Pastor da Nova Semente) e ouvi em suas mensagens, palavras de GRANDE conforto espiritual. Se alguns nutrem algum preconceito em relação à NS... Fiquem atentos para o verdadeiro sentido: Levar a Mensagem de Deus. E isto eles estão fazendo... Se não é da forma tradicional de nossas Igrejas, que diferença faz? A mensagem é a mesma, a luz é a mesma. O público é que se diferencia...”166

Para analisarmos esses comentários, partimos do pressuposto que a Igreja da Nova

Semente realizou várias mudanças tendo por base uma igreja tradicional, desde o nome até

sua estrutura de culto. E em sua maioria, o que vimos aqui nesta discussão foi os jovens,

apoiando uma forma diferente de “ser Igreja”, mas que possui a mesma mensagem. Ou seja,

os jovens não se apegam a uma estrutura padrão para culto, eles estão mais preocupados que a

mensagem alcance aos ouvintes do que certo “formalismo” religioso.

Passo agora a considerar os comentários em minha página pessoal do Facebook; a

pergunta que coloquei foi “Os tempos mudaram, hoje vivemos na época chamada ‘pós-

165 Vede anexo 17 – comentário 1 166 Vede anexo 17 – comentário 2

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moderna’, e quanto a igreja? Deve permanecer a mesma? Deve mudar? O que precisa ser

mudado?”167

A primeira reação foi: “mudar não, modernizar sim, mas sem perder os valores

principais que fizeram e fazem a igreja o que ela é, e que sempre foi considerada a igreja dos

mandamentos de Deus.”168

Em reação a esse comentário um jovem postou que entendia o que ele queria dizer, mas

contrapôs com uma citação de Ellen White: “necessitam-se homens que orem a Deus pedindo

sabedoria, e que, sob a guia de Deus, introduzam nova vida nos velhos métodos de trabalho e

possam imaginar novos planos e novos métodos para despertar o interesse dos membros da

igreja e alcançar os homens e mulheres do mundo.” Esse jovem termina seu comentário

dizendo “Isso é mudança!”.169

Esses dois comentários mostram dois pontos interessantes, a primeira jovem fala sobre a

necessidade de modernizar, já o segundo é mais claro em falar sobre mudança. O comentário

do segundo jovem é significativo, por ser embasado em Ellen White uma das fundadoras da

Igreja. Este jovem não fala em contextualização, mas em algumas mudanças mais profundas.

As mudanças são sobre planos e métodos, então ele cita Ellen White que fala ser necessário a

utilização de “novos planos e novos métodos”. Veja que são novos planos e novos métodos,

não são planos e métodos atualizados. Embora a modernização e a mudança geram alterações

na Igreja, a modernização se limita em fazer a mesma coisa de maneira atualizada, mas a

mudança com novos planos e novos métodos trazem modificações mais profundas na

estrutura da Igreja. Ressalto ainda, que o fato de alguns jovens fazerem menção a Ellen White

e outros líderes da Igreja mostram o desejo de terem força nos comentários. É como se eles

dissessem, não apenas eu desejo isso, mas os fundadores apoiam o que estou dizendo.

Outro comentário feito por um jovem foi:

“Vivemos em uma época de transição aonde a grande maioria dos jovens na igreja é pós-moderna, porem convivemos com gerações anteriores que são modernas e alguns com pensamento pré-moderno. Acredito que não podemos conter essas mudanças e sim nos adaptar a elas. A igreja deve sim mudar mas sem esquecer de suas bases. A mudança esta em como atingir as pessoas nesse mundo, se modernizar na forma de conversar e entender os jovens e não adaptar a igreja para ‘facilitar a entrada’ dos jovens na igreja.”170

167 Vede anexo 18 168 Vede anexo 18 – comentário 2 169 Vede anexo 18 – comentário 4 170 Vede anexo 19 – comentário 2

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Esse post demonstra um conhecimento no mínimo básico sobre as gerações, fazendo

alusão a diferenças de pensamento entre as novas gerações e as antigas, ele deixa claro a

existência de conflitos de ideias e a necessidade de mudanças para adequar a realidade da

Igreja. O que tem permeado os dizeres dos jovens é a essência em ser adventista. Isso ele

demonstra na frase “adaptar a igreja para ‘facilitar a entrada’ dos jovens na igreja.” Essa é

uma referência direta aos princípios e ensinamentos da Igreja. O “facilitar a entrada” é o

transformar uma Igreja com suas ideologias e normas, para uma Igreja sem nenhum padrão de

conduta.

Ao mesmo tempo em que ele fala em permanecer com “suas bases”, ele apresenta a

mudança como uma necessidade. “A mudança esta em como atingir as pessoas nesse mundo,

se modernizar na forma de conversar e entender os jovens”. Nesta frase encontramos uma

necessidade de contextualização, assim como vimos em Hervieu-Leger ao ela tratar do

assunto da transmissão de conhecimento.

Seguindo essa mesma linha de ideia, outros dois comentários foram feitos: “A igreja

deve se adaptar aos usos ou necessidades modernas;”171 o segundo comentário diz: “Se ainda

não mudou, está perdendo a oportunidade. Entenda que eu quero dizer, mudança de

comportamento e não de doutrinas.”172 Mais uma vez encontramos a mesma posição, a forma

precisa ser mudada, o comportamento precisa ser alterado, mas os ensinamentos devem

permanecer os mesmos.

Esse mesmo jovem continua suas considerações exemplificando a necessidade de

mudança, dizendo: “Um exemplo, são as novas formas de evangelizar que estão surgindo e

que vale principalmente para a geração ligada na internet/celulares.” 173 Note que a

preocupação está para com os mais novos, nova geração. Ele continua dizendo que:

“o mundo se tornou uma aldeia e uma informação pode ser recebida ou enviada em segundo. Como será o comportamento da geração Y em um ou mais anos? Talvez o culto da forma tradicional que vemos hoje tenha que passar por uma mutação, vendo que os jovens querem mais participação... ou mesmo um folheto que hoje é impresso venha aos poucos ser substituído por mídias eletrônicas (e-mails, SMS, facebook, twitter, etc...). Enquanto as doutrinas são as bases/colunas da igrejas as novas formas de evangelização devem ser as vitrines da igreja.”174

171 Vede anexo 19 – comentário 4 172 Vede anexo 20 – comentário 1 173 Id. 174 Id.

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Vemos a mesma ideia do comentário anterior, as bases/colunas permanecem, mas a

fachada da Igreja deve ser mudada. Em outras palavras, as formas devem ser contextualizadas,

atualizadas para as necessidades. Este jovem destaca a necessidade de atingirmos a geração

tecnológica, seja via e-mails, sms, redes sociais, isso porque como ele diz os jovens “querem

mais participação”. A realidade digital é completamente interativa, todos conversando com

todos ao mesmo tempo instantaneamente, o choque se torna muito grande quando se depara

com um culto aonde se tem um narrador e um monte de telespectadores. Para essa geração, o

culto se torna monótono.

Notem a reação de uma jovem para com o culto e a estrutura da igreja: “Deve-se mudar

a liturgia arcaica, as músicas de 1800, aceitarmos os incomuns, mulheres ocuparem postos

relevantes assim como acontece no mundo.”175

A mensagem dela é clara, estamos ultrapassados. Não podemos ficar na mesma

realidade, mas ela pondera dizendo que a mudança deve ser tomada com muito cuidado

porque a linha entre a mudança e o desastre total é muito tênue. Sua visão da Igreja é que,

existe a mudança, mas “só acompanha em reação à crise adaptando-se pontualmente.”176 O

problema dessa reação paulatina, às vezes tardia é que as gerações estão cada vez mais

imediatistas, muitas das vezes precisando de algo mais rápido.

Seu último comentário é significativo, na maneira como deve acontecer as mudanças:

“O problema está nessa reação não planejada. É necessário adaptar-se mas tem-se feito isso sem se quer saber o que realmente é uma sociedade pós-moderna, sem atentar-se aos conselhos para mostrar a direção em situações como essa. Esse movimento pós-moderno atual na teoria é excelente, o problema está naqueles que o praticam sem o devido cuidado e embasamento bíblico ou inspirado. Enfim, já falaram aqui... é necessário mudar tudo já! Mas não vamos forçar a barra...”177

Observe que ela defende uma mudança, em todos os sentidos, mas com cautela e estudo.

Sua preocupação é interessante, na medida que mudanças impensadas podem ser catastróficas.

Sua visão de Igreja é no mínimo exemplar, enquanto como jovem imergida neste conflito

geracional, onde vê a necessidade de mudança, sua postura é de respeito e tolerância, “não

vamos forçar a barra”.

175 Vede anexo 20 – comentário - 4 176 Id. 177 Id.

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Seguindo essa mesma linha de raciocínio, outra jovem entende que as mudanças

precisam acontecer, mas com as devidas precauções para não afetar as doutrinas. Sua opinião

é:

“Especificamente sobre os cristãos pós-modernos, acredito que tenham como intuito uma religião que lhe seja mais atrativa ou criativa, sem contudo se afastar dos princípios e doutrinas religiosas. Com isso pretendem também atrais os não cristãos com essa religião mais ‘atrativa’, já que no mundo atual, principalmente nos grandes centros urbanos, a religião é muitas vezes tida como antiquada e ‘passada’. Entendo como válida uma tentativa de evangelismo mais moderna, que congregue formas criativas de pregação, inclusive com uso da tecnologia. Meu receio no entanto, é que a igreja tente modernizar Jesus, como se Deus é que tivesse de se adaptar a nós e não nós a Ele. O foco jamais pode ser perdido, ou seja, a Palavra, as doutrinas. Outras questões ao meu ver podem ser revistas como hinos, liturgia e afins.”178

Embora suas preocupações são claras e relevantes, essa jovem entende que novas

questões podem ser trazidas para que o culto possa se tornar mais atrativo e dinâmico, para

tanto a estrutura do culto e os hinos precisam ser revistos, novas tecnologias podem ser

incluídas também.

2.4 CONCLUSÕES PARCIAIS

Neste capítulo ponderamos três questões principais: O jovem e o ser adventista; A

formação da identidade; O jovem e a Igreja.

Diante de tudo o que foi visto, minha conclusão neste momento é que o jovem

adventista não deseja romper com a Igreja ao que se refere as doutrinas, ensinamentos. Isso

ficou evidente em todos os comentários analisados, os quais estão repletos de doutrinas e

carregados de uma forma adventista de falar. Nas suas palavras não distinguisse apenas

ensinamentos, mas um zelo protetor pela Igreja.

Com referência à identidade, não se pode ser conclusivo em uma única sentença. Como

vimos, a formação da identidade é uma junção de fatores, e sua base está principalmente nas

práticas vivenciadas, no conteúdo recebido e na confrontação do outro. Vimos ainda, que 178 Vede anexo 21 – comentário 1

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nenhuma pessoa pode receber uma identidade idêntica a do seu transmissor, mas a sua

identidade deve ser construída de maneira individual. Sendo assim, a identidade do jovem

adventista, por definição, não pode ser igual à identidade do adulto adventista, porque ela está

em formação. Não apenas isto, mas também pela diferença geracional e mudanças culturais e

religiosas.

Pelo fato de vivermos em uma sociedade com frequentes mudanças, a identidade do

jovem tem acompanhado essas mudanças, principalmente no campo tecnológico. Por conta

dessas mudanças, se tornam normais a contextualização e adaptação das pessoas diante das

diversas circunstâncias.

Quando analisamos o jovem e a igreja, vimos que eles não desejam que as bases sejam

trocadas. Ou seja, de uma maneira geral, estão de acordo com os ensinos apresentados pela

Igreja Adventista, mas entendem que a Igreja está estagnada e precisa de mudanças. Alguns

sugerem a modernização de algumas questões, outros levantam questões mais profundas,

porém sem romper com a estrutura da Igreja.

Feitas essas considerações, e visto que o jovem está em formação de identidade, só cabe

responder se encontramos respaldo dentro dos ensinos da liderança da Igreja Adventista para

que isso aconteça.

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3 MUDANÇAS, ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

No primeiro capítulo vimos que o conflito geracional é uma realidade em diversas

esferas da sociedade. Ou seja, onde houver o relacionamento interpessoal, existe a

possibilidade desse conflito. Dentro da Igreja Adventista isto também é verdade. Este conflito

se apresenta de duas maneiras especiais: Conflito de linguagem; conflito na concepção de

mundo.

Como vimos, a linguagem na sociedade pós-moderna é transmitida em grande parte

através da imagem. Este ponto se intensifica mais com a juventude, uma vez que eles estão

ligados a uma realidade virtual, interativa. Por conta disto, uma linguagem diferente desta,

não lhes alcança. Não é uma questão de certo ou errado, mas sim uma questão de fato, a

sociedade vai se modificando e alterando sua maneira de comunicar.

O outro ponto que causa o conflito geracional é a dicotomia “Igreja” versus “Mundo”,

causada pelo entendimento de mundo.

Esse conflito acontece por conta que o substantivo mundo se tornou para Igreja um

termo para designar pecado. Se o mundo é pecado, a igreja não pode aceitá-lo, porque a igreja

precisa se afastar do pecado. Então, quando alguém leva seu aparelho celular para dentro da

Igreja e utiliza uma rede social, isso é entendido como algo errado. Isso porque é visto como

algo do “mundo” que está entrando na Igreja.

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No segundo capítulo analisamos o convívio dos jovens com as redes sociais. Vimos que

as comunidades e grupos falam mais sobre assuntos religiosos do qualquer outro assunto.

Uma vez que os jovens estão inseridos nesses grupos e comunidades ficam subentendidos que

eles aprovam ao menos parte do conteúdo ali apresentado e discutido.

Em seus comentários, os jovens demonstram vínculo com a Igreja e são poucas

menções de crítica ou discordância com os ensinamentos da IASD.

Embora os jovens não desejem romper com a Igreja, eles manifestam alguns

descontentamentos e desejos por mudanças. Alguns comentários que vimos mostram

exemplos de mudanças esperadas, mas não está totalmente claro todas as questões a serem

consideradas e revistas.

Diante deste quadro, onde os líderes da Igreja demonstram certas preocupações com

respeito aos jovens e aos assuntos que eles estão envolvidos e, por contrapartida os jovens

esperam uma Igreja que tenha uma visão e postura mais compreensiva com os conceitos

contemporâneos. Analisarei a visão dos líderes quanto à necessidade de mudanças, o conflito

dicotômico entre “Igreja” e “Mundo” e, por fim baseado em Ellen White apresentarei uma

sugestão de postura e visão da Igreja para a sociedade atual.

3.2 OS LÍDERES E A NECESSIDADE DE MUDANÇA

Em resposta aos comentários dos jovens mostrando a necessidade de mudança na Igreja

Adventista, apresentarei a opinião dos representantes da Igreja.

Desejo apenas esclarecer que não limitarei a comentários feitos pelos representantes do

Brasil, pelo contrário, uma vez que a Igreja Adventista é regida por uma sede mundial,

procurei levantar o pensamento dos líderes mundiais também.

No primeiro capítulo, ao abordarmos a visão dos líderes da Igreja, já encontramos

alguns indícios favoráveis às mudanças. Wendel Lima diz que a “relevância da Igreja

Adventista depende da fidelidade a sua identidade e da ousadia de seus métodos. Traduzindo:

conservar doutrinas e modernizar as abordagens.”179

179 LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 10, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira.

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Sua posição é de que se deve ser fiel aos ensinos da Igreja, mas não se deve engessar a

maneira de transmitir o conhecimento através de um único método, por mais que esse método

tenha dado resultado no passado. Ele ainda afirma:

“Quanto aos métodos evangelísticos, formato da adoração, e modelos administrativos, não pode deixar que o tradicionalismo baseado no gosto pessoal ou no saudosismo de alguns, e não em princípios bíblicos, ‘engesse’ o avanço da igreja. Não é necessário pesquisar muito na Bíblia para perceber que Deus se revelou de diferentes formas em contextos distintos; que usou a linguagem de cada tempo para se fazer entender.”180

Para endossar seu argumento Lima diz que Deus se revelou de maneiras diferentes e

utilizou a linguagem da época. Último ponto deste artigo que destaco é que Lima menciona

uma postura diferente em algumas Igrejas que já entenderam essa necessidade. Ele diz:

“De modo geral, as igrejas que têm entendido o momento que vivemos, têm optado por cultos mais informais, simples, inspiradores e sem jargões denominacionais; tem repensado a funcionalidade de sua estrutura e incentivado a descoberta de dons e o exercício de ministérios específicos; têm usado de modo estratégico a comunicação em vídeo e pela internet; têm realizado projetos sociais contínuos e bem focados na realidade da sociedade local.”181

De acordo com esta citação, a necessidade de mudança tem se tornado uma prática em

algumas igrejas. Porém, apenas em alguns lugares, isso porque nem todos entendem essa

contextualização como uma necessidade. O que indica que muitos líderes, ou estão

acomodados com a realidade atual, ou não se preocupam com a visão e a necessidade de

outras pessoas diferentes deles. Em especial, destaco a visão da juventude.

Outro artigo que apresenta a necessidade de contextualização foi escrito por Lucas de

Lemos182, revisor da Casa Publicadora Brasileira. Neste artigo intitulado “Cristãos pensantes”,

Lucas analisa a sociedade atual sendo livre na maneira de pensar.

Sob sua ótica, a “sociedade livre” como assim ele denomina é carente de sentido para a

vida e respostas para suas inquietações. Essa realidade alcança o cristianismo e por isso, os

cristãos são desafiados a possuir uma base sólida daquilo que eles creem.

180 Ibid., p. 11. 181 Id. 182 LEMOS, Lucas Diemer de. Cristão pensantes. Revista Adventista. Tatuí, ano 106, nº 1239, p. 18,19, ago., 2011. Casa Publicadora Brasileira.

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Ele apresenta o caso de Paulo registrado no texto bíblico em Atos 17. Neste relato, a

cultura helênica confrontou o cristianismo com perguntas e indagações semelhantes as quais

os cristãos precisam responder na atualidade. Não quero me deter na análise que ele faz do

comportamento de Paulo naquele momento, mas focar na aplicação do texto para a realidade

atual do cristianismo.

Lemos diz que “Paulo confirma a contextualização do cristianismo”.183

Para ele o Cristianismo está além de uma continuação histórica ou uma série de

obrigações teológicas, mas o cristianismo é inteligente e racional. Para o Cristianismo

continuar tendo essa característica é preciso ter respostas fundadas para as questões

levantadas pela sociedade. Ele diz:

“Como cristãos, de que modo devemos agir diante de desafios semelhantes? Como Paulo precisou entender o que está acontecendo ao redor para saber onde estamos inseridos. O que os filósofos contemporâneos nos dizem hoje? A exemplo de Paulo, cabe a nós, com base na verdade divina, expor nossa filosofia, conforme a Palavra de Deus, estando preparados para responder a todo aquele que nos pedir a razão de nossa esperança (1 Pe 3:15). Estamos preparados para apresentar um cristianismo pensante e social, em meio à mistura descuidada de fundamentos flutuantes? Estamos dispostos a levar a verdade ao mundo, com relevância, deixando de lado todo espectro de visão unilateral? Por revelação divina, conhecemos o que procede de Deus (1 Jo 4:1). Com base em nossa sólida convicção em Cristo, podemos ter uma certeza relevante e atrativa.”184

Pode-se notar diversos pensamentos significativos nesta citação. Em primeiro lugar, a

igreja não deve ficar ilhada em uma realidade alheia do “mundo”. Ao contrário disso, ele

menciona a necessidade de estar atentos aos pensamentos dominantes da sociedade, nesta

citação fazendo menção aos filósofos. Somente tendo ciência das ideias que são discutidas no

cotidiano, pode-se apresentar uma mensagem relevante para as pessoas.

Um segundo ponto a destacar vem da pergunta: “Estamos dispostos a levar a verdade

ao mundo, com relevância, deixando de lado todo espectro de visão unilateral?”. Note que

essa pergunta feita aos leitores é fundada em pelo menos dois pressupostos: o primeiro, em

uma necessidade de contextualização da mensagem.

O segundo, na preocupação de diversificar as abordagens. Assim, a mensagem precisa

ser contextualizada, caso contrário ela não alcançará os ouvintes com relevância. Por melhor 183 Ibid., p. 19. 184 Id.

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que seja apresentada, pode até possuir um princípio interessante e importante, mas fora de

contexto, que relevância terá? Ao mesmo tempo em que deve ser contextualizada, deve ser

diversificada, não se apoiando em uma visão unilateral.

Essa ideia parece orientar pessoas que são ativas, mas centralizadoras e desejam realizar

tudo sozinhas. Por mais que elas tenham êxito, poderá correr o risco de alcançar apenas um

“tipo” de pessoa, pois uma única visão dificilmente atingirá todas as pessoas.

Estes exemplos analisados expressam não apenas uma realidade nacional, mas

corrobora com a expectativa e a visão de outros líderes em caráter internacional. Passo a

analisar alguns artigos escritos por representantes mundiais da Igreja Adventista.

Bill Knott185, editor da revista “Adventist World” entrevistou Ted Wilson, pastor e

presidente da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia. Bill realizou a seguinte

pergunta a Will:

“Todo líder sonha com coisas que poderiam ajudar a realizar, enquanto estão servindo o povo de Deus. Tenho ouvido, várias vezes, o senhor falar de um sonho que soa um tanto ousado: a cultura do serviço entre os jovens da Igreja Adventista do Sétimo Dia. O que o senhor quer dizer com isso?”186

Esta pergunta está relacionada diretamente a ação do jovem dentro da Igreja Adventista.

Ted Wilson responde dizendo que o ensinamento do Novo Testamento é que todas as pessoas,

independente da faixa etária, ao aceitar a Jesus Cristo recebem por meio do Espírito Santo um

ou mais dons para utilizar em favor do restante da Igreja. Com respeito a atuação dos jovens

ele diz:

“A iniciativa do Reavivamento e Reforma mundial tem deixado claro que há milhares, na realidade, milhões de jovens adventistas, aos quais, Jesus entregou tremendos dons para ajudar Sua igreja a finalizar a obra. Gostaria que a Igreja Adventista do Sétimo Dia planejasse lançar mão dessa enorme criatividade e energia que Deus já colocou entre seu povo, concedendo variados dons aos jovens fiéis.”187

A frase que destaco de Wilson é: “Gostaria que a Igreja Adventista do Sétimo Dia

planejasse lançar mão dessa enorme criatividade e energia que Deus já colocou entre seu povo,

concedendo variados dons aos jovens fiéis.” 185 KNOTT, Bill. Um ano para mudar o mundo. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 11. Tatuí, p. 8-10, nov., 2011. 186 Ibid., p. 8. 187 Id.

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Através dessas palavras ele endossa a contextualização e as abordagens diferentes. A

necessidade de mudança é um tanto quanto lógica nessa frase, isso porque ninguém precisa de

criatividade para fazer a repetição de uma atividade. Utiliza-se a criatividade para inovar,

chamar a atenção. Não apenas isso, mas ao mesmo tempo em que Wilson fala sobre o uso da

criatividade para a contextualização, deixa nas entrelinhas a possibilidade de questões dentro

da Igreja que estão inapropriadas, por não alcançarem mais seu objetivo.

Essas abordagens que precisam ser revistas, não são erradas em si, o que acontece é que

por conta das mudanças da sociedade e na maneira de pensar das pessoas, em especial os

jovens, essas questões deixaram de cumprir seu propósito, por não transmitirem mais como

no passado.

Em outra entrevista, Bill Knott188 conversa com Ted Wilson sobre “reavivamento e

reforma” e a influência dessas duas questões na adoração.

Deste artigo intitulado “Redescobrindo o Culto Verdadeiro” quero destacar duas

respostas de Wilson que mostram a necessidade de contextualização e ao mesmo tempo

apresenta uma necessidade da Igreja se afastar das atividades do mundo.

Ao Knott questionar Wilson sobre os cristãos não se amoldarem ao padrão do mundo,

Wilson responde dizendo:

“Desde o início da igreja de Cristo, Seus seguidores eram conhecidos como ekklesia, ‘os chamados para fora.’ Pertencer a Jesus, segui-lo como Senhor e Mestre, requer abandonar alguma coisa - e isso é algo que pode ser cada vez mais identificado como as muitas maneiras em que somos tentados a imitar as práticas do mundo em nossa vida, e até em nossa adoração.”189

Esta primeira citação deixa claro que a visão do presidente da IASD tem sobre ser

cristão é abandonar algo, “sair de”. Para Wilson, os adventistas têm sido tentados a “imitar as

práticas do mundo”, assim evitar essas práticas deve ser o ideal de cada membro. Essas

práticas são apresentadas por ele como “essencialmente opostas à pureza e à verdade do

evangelho.”190 Baseado em reforma, que ele define como “renovação da mente”191 , seu

pensamento é deixar de lado as questões que ferem os princípios ensinados pela Igreja

Adventista.

188 KNOTT, Bill. Redescobrindo o culto verdadeiro. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 8. Tatuí, p. 8-10, ago., 2011. 189 Ibid., p. 9. 190 Id. 191 Id.

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Essa pregação que devemos sair do “mundo” é muito comum no meio adventista, mas a

má interpretação do significado de “mundo” pode criar uma dicotomia entre Igreja versus

Mundo, ou seja, a generalização de mundo como pecado faz com que o fiel deva se excluir do

mundo para não viver uma vida de pecado.

Outro ponto levantado neste artigo foi à cultura e adoração, isso é, existe um padrão de

culto que deve ser seguido por todas as pessoas, mesmo entre culturas diferentes? Sobre esse

assunto Wilson diz:

“Em uma família mundial de adventistas, naturalmente temos muitas diferenças e variadas expressões culturais, incluindo diferenças na linguagem, estilo musical e sequência de culto. Deus não quer, e Sua igreja não deve procurar obter, apenas uma expressão de culto numa família com cerca de vinte milhões de pessoas.”192

Segundo a opinião de Wilson, cada cultura deve ser respeitada. Sendo assim, não deve

existir um padrão cultural de culto, pelo contrário de acordo com as características locais o

culto deve ser estruturado.

É bem verdade que dentro de um mesmo país, as questões culturais se assemelham, mas

isso não deve se tornar um padrão inalterável, pois o próprio Wilson deixa claro que as

“diferenças na linguagem” devem ser respeitadas. Como visto no primeiro capítulo, gerações

diferentes possuem distintas linguagens de comunicação, o que resulta em uma diversidade

dentro de um mesmo ambiente. Consequentemente, adaptações são necessárias de acordo

com a realidade local.

Com o objetivo de mostrar a necessidade da diversidade em meio à unidade, a Dra.

Cheryl Doss escreveu um artigo denominado “O Mosaico de Deus: A maravilha da unidade

na diversidade.”193 Doss é a diretora do Instituto de Missões do Mundo da Associação Geral

dos Adventistas do Sétimo Dia e neste artigo analisa uma das doutrinas fundamentais da

IASD: “Unidade no Corpo de Cristo”.

Doss defende a ideia que a Igreja pode ser comparada com um mosaico, onde cada peça

é diferente uma da outra, mas as junções de todas formam uma figura. Desta maneira, a Igreja

assim como o mosaico é “abundantemente diverso, tremendamente criativo e

192 Ibid., p. 10. 193 DOSS, Cheryl. O Mosaico de Deus: A maravilha da unidade na diversidade. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 10. Tatuí, p. 14,15, Out., 2011.

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abençoadamente resistente”194 poderá ser diversificada, criativa e abençoadamente resistente

ao respeitar e valorizar as diferenças.

O problema destacado por Doss é que muitas vezes desejamos “encobrir nossas

diferenças, para negar a criatividade das pessoas, para esquecer a natureza da diversidade

humana.”195

Por conta disto nos alegramos na diversidade de Deus ao criar o ser humano, alto e

baixo, olhos pretos, castanhos, cabelos lisos e encaracolados, mas a variedade de culturas

desafia a igreja. Segundo ela, a diversidade humana divide as igrejas e nós mesmos. O

interessante diz Doss é que esse problema não é recente, Paulo já enfrentou dificuldades

semelhantes, ela apresenta o texto ao Gálatas 3:28 que diz: “não há judeu nem grego, escravo

nem livre, homem nem mulher.”

Ela diz que neste texto encontra-se o desafio da Igreja em romper com as barreiras

culturais, sejam elas de religião, sociedade, sexo, para que o resultado seja a unidade de Cristo.

Ao comentar a primeira carta de Paulo aos Coríntios no capítulo doze que aborda sobre

a diversidade de dons na Igreja, Doss diz:

“...devemos valorizar as diferenças na igreja e usar todas as partes para o bem de todos. Precisamos de pessoas cuja visão e modo de pensar diferem do nosso. Precisamos de criatividade e diversidade na adoração e no testemunho. Precisamos de apóstolos e profetas, professores, médicos e toda a variedade de dons (ref. Aos versos 27-31).”196

Notem que em todos os momentos, Doss fala sobre a necessidade de diversidade e

apoio à criatividade dentro da Igreja. Esta maneira de pensar endossa a visão apresentada de

Wilson, visão esta que entende a necessidade de contextualização das igrejas utilizando todas

as pessoas de acordo com suas habilidades, independente da idade.

A visão de Doss e Wilson se complementam, encontramos mais um exemplo na

seguinte citação:

“A Igreja Adventista do Sétimo Dia reflete a criatividade permanente da diversidade do mundo. Em nossas congregações há pessoas de muitas línguas, culturas e etnias. Há pessoas com dons distintos, com diferentes tipos de criação e com diversas formas de pensamento. Assim como as pedras de um mosaico podem ser distinguidas separadamente, mas só vemos a figura quando todas as pedras do mosaico estão juntas, somente

194 Ibid., p. 14. 195 Ibid., p. 14,15 196 Ibid., p. 15.

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quando nos unimos em amor, aceitando os princípios que permanecem – de fato, a necessidade – de nossas diferenças, poderemos ser um em Cristo. Apenas quando utilizamos criativamente cada parte de nosso corpo e os mais diferentes dons que Deus deu à Sua igreja, podemos compartilhar as boas novas com ‘toda nação, tribo, língua e povo’ (Ap 14:6) e completar o mosaico do Seu reino.”197

De acordo com Doss as Igrejas locais precisam fazer uso de cada peça do mosaico, essa

é a mesma ideia defendida por Wilson que analisamos anteriormente. Utilizar os diversos

dons, a criatividade, contextualizar as mensagens e a linguagem utilizada se faz necessário

para a sociedade contemporânea. Pode-se entender essa necessidade ao analisar a leitura que

Gary Krause198 faz das grandes cidades e a Igreja.

Antes de qualquer coisa, ele apresenta os grandes desafios missionários para os

adventistas. Entre todas as cidades mencionadas, duas são brasileiras: São Paulo e Rio de

Janeiro.

Em segundo lugar Krause diz que as igrejas nos grandes centros como Sidney

competem com diversos atrativos, por exemplo: teatros, cinemas, restaurantes, salas de

concertos, clubes e vários outros locais de entretenimento, sem contar as ocupações diárias

das pessoas.

Diante desse conflito ele diz: “Para muitos, a igreja é uma peça de museu, uma relíquia

de outra época.”199 Levanto duas impressões das duas últimas citações, a primeira é que os

comentários transparecerem a noção que o membro ou visitante precisa abrir mão de diversas

atividades para dedicar um tempo para ir a igreja, ou seja, ele não vai a igreja por falta de

opções.

Por conta desta escolha, a impressão que fica é que o culto deve transmitir e alcançar

cada pessoa individualmente, caso contrário ele terá outros atrativos chamando sua atenção.

De maneira que, os líderes mundiais da Igreja Adventista têm entendido a necessidade de

diversificar as participações dentro da Igreja e de contextualizar a mensagem considerando as

diferenças das pessoas que participam da comunidade local.

Até o presente momento analisamos a postura dos líderes diante de uma sociedade

diferente da qual a Igreja Adventista foi fundada, vimos que tanto os líderes brasileiros, como 197 Id. 198 KRAUSE, Gary. Braços de Amor: Usando os métodos de Cristo para evangelizar as maiores cidades do mundo. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 10. Tatuí, p. 16-20, Out., 2011. 199 Ibid., p. 17.

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os líderes mundiais possuem a mesma opinião: A Igreja Adventista precisa utilizar todas as

frentes de trabalho, entender as mudanças da sociedade para contextualizar sua mensagem,

utilizar uma mensagem que alcance ao ouvinte, abrir espaço para a ação de todas as pessoas

da Igreja, criar um programa que seja tão atrativo quanto às atividades de consumo oferecidas

na sociedade.

Ressalto uma preocupação que David Bosch faz sobre relativismo e contextualização,

uma vez que temos visto esta questão sendo explorada pelos líderes da IASD. Ele diz:

“Não existe só o perigo do relativismo, em que cada contexto produz sua própria teologia, feita sob medida para aquele contexto específico, mas igualmente o perigo da absolutização do contextualismo. Foi isso, em verdade, o que aconteceu na atividade missionária ocidental, onde a teologia, contextualizada no Ocidente, foi, em essência, elevada ao status de evangelho e exportada para outros continentes como um ‘pacote’ ou acordo global. Contextualismo significa, pois, universalizar nossa própria posição teológica, tornando-a aplicável a todo mundo e exigindo que outras pessoas se submetam a ela.”200

Nas citações dos líderes da Igreja Adventista, temos visto a ideia da contextualização

sendo apresentada de diversas formas. Os líderes falam em criatividade, diversidade, dons

diversos, culturas diversas, linguagens diferentes, essas são expressões para se referir a

necessidade da Igreja possuir dinâmica e relevância em sua mensagem.

O comentário de Bosch levanta duas questões relevantes a respeito do relativismo e

contextualização do evangelho. Em primeiro lugar a Igreja corre o risco de se criar uma

teologia relativa a cada contexto, ou seja, cada lugar criar um ensino de acordo com o

entender das pessoas. Ao mesmo tempo, corre-se o perigo de padronizar o contextualismo, ou

seja, tornar uma realidade local padrão para todos os outros contextos e exportá-la como

sendo a verdade universal. Em outras palavras, a Igreja deve ser uniforme em sua teologia,

mas livre para adaptar sua transmissão de acordo com a necessidade local.

Em todas as citações deste estudo, a necessidade de manter uniforme o ensino

adventista tem transcorrido o pensamento de todos, tanto líderes como leigos, velhos e novos.

Ao mesmo tempo, boa parte da liderança e dos jovens tem demonstrado a necessidade de se

adaptar de acordo com a realidade local.

O risco é transformar uma realidade local em regra de fé para todos.

200 BOSCH, DAVID J. Missão transformadora: Mudanças de paradigma na teologia da missão. São Leopoldo: Sinodal, 2002, p. 512.

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Diante desta necessidade, o desafio de ser relevante continua sendo a meta a ser

alcançada para todos dentro da Igreja.

Na tentativa de alcançar esses desafios, alguns jovens de Limeira, SP, liderados por um

estudante de Teologia passaram a repensar a espiritualidade. As atividades desenvolvidas por

eles estão registradas no artigo “Plugados”201, escrito pela redação da Revista Adventista.

Antes de mencionar as atividades realizadas por estes jovens, é dito que a geração atual tem

se conscientizado que para pregar o evangelho no século 21 é preciso “traduzir as verdades

imutáveis da Bíblia numa linguagem que seja inteligível para uma sociedade cada vez mais

arredia à religião institucionalizada.”202

Encontramos nesta citação a necessidade de contextualização da mensagem, é

interessante que os jovens estão por trás desta iniciativa, mostrando certa insatisfação com os

métodos utilizados tradicionalmente.

Para alcançar a geração atual, os jovens começaram a agir em cinco frentes de ação, são

elas: 1. Espiritualidade; 2. Relacionamento; 3. Voluntariado; 4. Mídia; 5. Expansão. A agenda

deste grupo de jovens é bem definida, contando com cultos semanais, grupos de

relacionamento que visam ações práticas e intercessão, estudos bíblicos, divulgação dos

projetos pela internet e realização periódica de ações sociais. Com o intuito de manter o grupo

unido, os jovens se reúnem em encontros como “lual”, “sorvetadas”, “junta-panelas”, e

práticas esportivas que segundo eles é fundamental.

Entre as atividades desenvolvidas, uma tem chamado a atenção e dado grande resultado,

os jovens deram o nome de “Sorriso no Semáforo”.

O projeto funciona da seguinte maneira: os jovens saem para os principais semáforos da

cidade e com simpatia oferecem um cartão e um livro denominacional. Esta maneira diferente

de pregar o evangelho ganhou repercussão e tem se espalhado pelo Brasil e até no exterior.

Quando o artigo foi escrito já havia onze bases no Brasil e outro grupo em Portugal.

Este artigo ainda descreve outras iniciativas diferenciadas que os jovens têm realizados

para levar a mensagem de uma maneira diferente. Um desses projetos é realizado por alguns

coralistas do “Coral Jovem do Rio” e tem por nome “Pra Fazer uma Criança Feliz”. Os jovens

semanalmente têm ido à comunidade da Rocinha e formaram um coral para as crianças

carentes. O projeto já envolveu mais de 500 crianças da comunidade e hoje o coral tem 120 201 LESSA, Rubens. S. Plugados: Jovens tornam a mensagem adventista atrativa por meio de ações sociais, dramatizações e do uso da internet. Revista Adventista. Tatuí, ano 105, nº 1226, p. 28,29, jul., 2010. Casa Publicadora Brasileira. 202 Ibid., p. 28.

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crianças. O coral infantil já se apresentou em alguns lugares, inclusive no Theatro Municipal

do Rio de Janeiro.203

Outros dois projetos são mencionados, um grupo de drama da cidade de Pesqueira e um

congresso virtual idealizado pela liderança da Igreja Adventista para os jovens.

Seguindo a linha de usar a internet de maneira diferenciada menciono a iniciativa de

dois pastores jovens que realizam periodicamente um debate chamado “Biblecast”.

No momento, essa dupla já possui mais de setenta temas e tem encontrado bastante

aceitação e apoio por parte dos jovens.204

Nestas citações e exemplos citados acima, podemos ver que a necessidade de

contextualização demonstrada pelos jovens no segundo capítulo é vista também pela liderança

da Igreja. Vemos também que os jovens estão buscando espaço e agir de maneira diferente do

tradicional e isso tem surtido efeito principalmente para os jovens. Mas a necessidade de

contextualização dá conta de responder aos anseios de mudança que os jovens expressaram no

capítulo anterior? Para responder esta indagação passemos analisar a visão de mundo por

parte dos jovens adventistas.

3.3 DICOTOMIA IGREJA X MUNDO

A leitura que faço dos dizeres dos jovens apresentados no segundo capítulo é que eles

não desejam romper com a Igreja. Essa não é nem uma cogitação no pensamento deles, e sob

minha visão isso se evidencia ao tratarem sobre a realidade da Igreja.

Se o desejo deles fosse romper com a Igreja, não perderiam o tempo falando tanto sobre

a vida espiritual, as atividades e programações da Igreja, a necessidade de pregar a mensagem

a outras pessoas.

Frases como205:

“Para mim a melhor forma de viver a juventude de forma completa e real é sendo um

jovem cristão, isso muda a minha personalidade, a minha história e a minha vida.” “Eu sou

temente a Deus, então isso me torna diferente e sigo meus princípios sem precisar fazer o que

203 Id. 204 Para mais informações acesse: <www.confiçõespastorais.com.br> 205 Todas essas frases são citações do segundo capítulo.

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normalmente os outros jovens que não são da igreja fazem. Mas o que importa realmente é ser

normal, porém diferente.”

“É uma batalha todos os dias, estamos propícios a cometer erros mais fácil devido não

darmos tanta importância para as coisas de Deus. Pensamos que os prazeres do mundo podem

satisfazer nossos desejos passageiros, mas esquecemos que temos um Deus que é por nós.

Envergonhados sempre tentamos seguir Seus passo, mesmo não sendo dignos de andar ao

lado de um Deus tão misericordioso. Sendo diferentes tentamos mostrar para as outras

pessoas quem somos, e porque somo assim. Muitas vezes não vivemos o que pregamos, mas

todas as vezes nos sentimos despedaçados pela falta de fidelidade à um Deus tão bom assim.”

Revelam luta, transparência e o desejo de viver o ensinamento adventista. Definitivamente

eles não querem romper com a Igreja.

Ao mesmo tempo em que os jovens adventistas desejam continuar adventista, algumas

questões não fazem mais sentido para eles.

Essas questões foram vistas e expressas no segundo capítulo, citamos algumas para

retomar o assunto:

“A mudança esta em como atingir as pessoas nesse mundo, se modernizar na forma de

conversar e entender os jovens.”

Um jovem postou um comentário de Ellen White dizendo: “necessitam-se homens que

orem a Deus pedindo sabedoria, e que, sob a guia de Deus, introduzam nova vida nos velhos

métodos de trabalho e possam imaginar novos planos e novos métodos para despertar o

interesse dos membros da igreja e alcançar os homens e mulheres do mundo.” Esse jovem

termina seu comentário dizendo “Isso é mudança!”.

“Se ainda não mudou, está perdendo a oportunidade. Entenda que eu quero dizer,

mudança de comportamento e não de doutrinas.” “Enquanto as doutrinas são as bases/colunas

da igrejas as novas formas de evangelização devem ser as vitrines da igreja.” “Deve-se mudar

a liturgia arcaica, as músicas de 1800, aceitar os incomuns, mulheres ocuparem postos

relevantes assim como acontece no mundo.”

Essas citações expressam a necessidade de mudança que não se limitam na

contextualização da mensagem. Podemos ver que a maneira de pensar do jovem é diferente de

alguns líderes, pois possuem uma maneira diferente de ver o mundo. Enquanto vimos que

para os líderes existe a tendência de classificar o “mundo” como pecado, os jovens se

expressam pedindo mudanças que estão acontecendo dentro do mundo. Alguns se expressam

de maneira mais reservada falando apenas em mudanças, outros de forma mais clara dizem:

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“Deve-se mudar a liturgia arcaica, as músicas de 1800, aceitar os incomuns, mulheres

ocuparem postos relevantes assim como acontece no mundo.” (Ênfase minha)

Para muitos ter o “mundo” como exemplo para a Igreja é uma postura inadmissível,

seria trazer o profano para dentro do sagrado. Mas nem todos os jovens concordam com essa

linha de pensamento e esperam que a Igreja esteja mais aberta, como o mundo está se abrindo

para novas realidades. Entender essa maneira diferente de pensamento pode ser uma chave

para sanar conflitos e quebrar barreiras dentro do convívio da Igreja.

Paul Hiebert diz: “As pessoas percebem o mundo de maneiras diferentes porque

constroem pressupostos diferentes da realidade.”206 Ele exemplifica essa afirmação falando

dos ocidentais, dos orientais e de alguns povos tribais. A maioria dos ocidentais afirma que

existe um mundo real, além deles, feito de matéria inanimada. Já os habitantes do sul e do

sudeste da Ásia acreditam que esse mundo exterior não existe, mas é invenção da mente. Por

sua vez, alguns povos tribais ao redor do mundo veem a terra como um organismo vivo com o

qual devem relacionar-se.

Isso acontece porque cada povo e grupos possuem maneiras diferentes de enxergar o

mundo, isso é denominado cosmovisão. A maneira como se enxerga o mundo está ligado aos

pressupostos básicos das crenças e comportamentos culturais. As pessoas acreditam que o

mundo é exatamente aquilo que elas veem, raramente tem consciência que o fundamento do

que estão vendo é a cosmovisão.

Sendo assim, por trás da ideia de que o mundo é pecado, há sua maneira de enxergar o

mundo desta maneira. Por contra partida, aqueles que enxergam o mundo como não sendo

pecado em si, tem sua cosmovisão. Como vimos, no primeiro capítulo, a tendência de

qualificar o mundo como pecado é um pensamento da Idade Média, onde a Igreja Medieval

era contra qualquer tipo de avanço. Com o desenvolver das tecnologias e a mudança de

pensamento, nem todos possuem a visão que o mundo é pecado e isso precisa ser entendido

para que os paradigmas possam ser quebrados.

Consideremos a ideia que o mundo seja pecado, logo Deus não está no mundo. Se Deus

não está no mundo, a consequência é que Deus não tem o controle de todas as coisas e não

age na vida de todas as pessoas. A pergunta que surge é: Por qual motivo Deus interviria na

vida de uma pessoa? Seria uma pessoa merecedora da bondade de Deus?

206 HIEBERT, Paul G. O evangelho e a diversidade das culturas: um guia de antropologia missionária. Tradução: Maria Alexandra P. Contar Grosso. Brasil: Vida Nova, 2010. 45 p.

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Queiruga trata desta questão ao falar do “Fim do ‘Deus separado do mundo’”207. Ao

analisar esse assunto, ele diz:

“Em uma mentalidade mais ou menos mitológica a transcendência divina, embora imaginada como alta e distante do céu, era compensada pela total permeabilidade do mundo às contínuas influências ‘sobrenaturais’. Na nova mentalidade, um Deus separado leva necessariamente seja ao deísmo puro e duro do ‘deus arquiteto ou relojoeiro’, que se desentende com sua criação, seja a uma espécie de deísmo intervencionista. Neste caso, trata-se da imagem de um Deus que está no céu, onde não está totalmente passivo, já que intervém de vem em quando; mas do qual, por isso, já que tentar se aproximar mediante o rito, a estrutura radical é a de que a iniciativa e a preocupação contínua estão em nós, enquanto a Ele solicitamos que intervenha de vez em quando com sua ‘ajuda’.”208

O pensamento de Queiruga nos leva a entender que se Deus está ausente do mundo, Ele

se manifestaria apenas por meio de ritos, e a constância da ação dEle estaria comprometida as

ações humanas. O que significaria que Deus só age por meio de estímulos.

A impressão que tenho é que os líderes, ao colocarem que os adventistas devem se

afastar do mundo e ao classificar o mundo como pecado, não refletem sobre todas as

consequências do que estão propondo. Até porque uma das doutrinas fundamentais da Igreja

Adventista é que Deus é Criador e Salvador, o que é o oposto ao deísmo. Mas como vimos em

Queiruga, o pensamento dicotômico, ou seja, Deus ausente do mundo resulta no deísmo, no

melhor das hipóteses o deísmo intervencionista.

Os adventistas acreditam em um Deus atuante, como dito, Deus é Criador e Salvador.

Um Deus que cria e abandona vem a ser o deísmo, mas um Deus que cria, encarna e morre

pela humanidade, como ensinam os adventistas não pode ser considerado ausente e longe do

mundo. Queiruga corrobora com esse pensamento ao dizer:

“Deus não tem que vir ao mundo, porque já está desde sempre em sua raiz mais profunda e originária; não tem de intervir, pois é sua própria ação que está sustentando e promovendo tudo; não acode e intervém quando é chamado, porque é Ele quem, desde sempre está convocando e solicitando nossa colaboração.”209

207 QUEIRUGA, Andrés Torres. Fim do cristianismo pré-moderno. Tradução: Afonso Maria Ligorio Soares. São Paulo: Paulus, 2003. p. 29, 30. 208 Id. 209 Ibid., p. 30.

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George Knight, um dos principais filósofos e historiador do adventismo, escreveu um

livro intitulado: “Mitos na Educação Adventista”210. Neste livro destinou um capítulo para

tratar do mito do sagrado e do secular. Embora seu ponto de partida seja a educação, seus

conceitos são elucidativos para entender que essa visão dicotômica não é tão consistente.

Ao analisar a ideia que a educação está ligada aos valores do mundo aqui e agora, e a

religião faz referência ao interesse principal no mundo espiritual, ele diz: “Da perspectiva

bíblica, tais expressões dicotômicas são a linguagem de um mito difundido que tem tirado o

sentimento do viver diário cristão ao prover razões para as pessoas separarem suas atitudes e

comportamento ‘na igreja’ da maneira de pensarem e agirem pelo resto da semana no mundo

‘real’.”211

Segundo Knight, o pensamento dicotômico é fundado no pressuposto que o secular é

ligado ao mundo em oposição à igreja e aos aspectos religiosos.

O sagrado por sua vez, tem sua relação com o religioso ou a algo que pertence uma

deidade ou deus. Para ele esse pensamento cai por terra quando analisamos esta questão sob o

pressuposto que Deus é criador. Knight diz:

“A dicotomia do sagrado e do secular se desintegra, contudo, quando percebemos que ‘ao Senhor pertence a terra e tudo o que ela contém, o mundo e os que nele habita’ (Sl 24:1). Tudo tem uma relação fundamental com Deus, porque Ele e Criador e Mantenedor. De certo modo, todo arbusto é ardente e todo solo é sagrado [...] Ele é Senhor tanto da fábrica como da igreja. O cristianismo não é uma fé de compartimentos. Assim, a maneira pela qual um cristão faz seu trabalho é tão importante para Deus quanto sua adoração.”212

Sendo Deus Criador e Mantenedor como a Igreja Adventista defende, a ideia que

Knight apresenta mostra que o pensamento dicotômico é infundamentado, porque como ele

mesmo diz: “nada na Terra ou no universo está separado de Deus.”213 Após apresentar essa

maneira ampla de entender o mundo, Knight fala do desafio do cristianismo e do sistema

educacional. Para ele o desafio é:

“Desenvolver a mente de modo que os cristãos pensem de maneira cristã sobre tudo em suas vidas e sobre cada aspecto de sua existência. A mente cristã direcionada na perspectiva eterna

210 KNIGHT, George R. Mitos na Educação Adventista: Um estudo interpretativo da educação nos escritos de Elle G. White. Tradução: Curso de Tradutor e Intérprete do UNASP-EC. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010. cap. 10, p. 121-131. 211 Ibid., p. 121. 212 Ibid., p. 122,123. 213 Ibid., p. 123.

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e, portanto, tem uma estrutura referencial totalmente diferente da mente não cristã. O cristianismo e o mundo não cristão têm visões filosóficas diferentes sobre a natureza da verdade a realidade última, o destino do homem e sobre o que é o bom, bonito e valioso.”214

Ao analisarmos os pensamentos apresentados por Knight e Queiruga entendemos que o

pensamento dicotômico, isolando a igreja do mundo e qualificando o mundo como pecado

não possui fundamento.

Ao considerarmos o que os jovens escreveram sobre mudanças e a espiritualidade,

vemos que eles tendem a generalizar o mundo como pecado, assim como alguns líderes que

vimos enfatizam. Mas, encontramos nos seus comentários sobre mudança, indícios que

existem coisas relevantes no mundo que não chocam com seus princípios e que fazem sentido

para sua realidade cotidiana. Para eles, isso não é profano ou pecaminoso, sendo assim não

encontram problemas nenhum em lidar com estas questões.

Se considerarmos que os jovens adventistas carregam uma bagagem vinda dos líderes

da Igreja Adventista, entendemos que embora sua linguagem em alguns momentos possa ser

dicotômica, seu pensamento se assemelha ao apresentado por Knight.

Sendo assim, se isolar do mundo não faz sentido aos jovens por dois principais motivos:

o primeiro é que não faz parte da cultura atual ser isolado de tudo e de todos; e o segundo é

que o mundo não é em essência pecado.

Não podemos negar que o desejo de aceitação é uma influência a todos os jovens,

porque eles vivem em um contexto que ensina a necessidade de aceitação por parte da cultura

dominante. Por isso, entendo que eles neguem, ou ao menos lutam, para não agir

contrariamente aos princípios, mas não encontram problemas com atividades que não são

vinculadas a igreja, mas que não confrontam seus princípios.

Através dos dizeres dos jovens, ainda é possível ver que, se existem determinadas

questões que são relevantes à sociedade e podem causar o mesmo impacto dentro da Igreja,

para eles não existe problema nenhum em fazer uso disso. Por exemplo, em um dos

comentários, uma jovem colocou que a Igreja deveria “aceitar os incomuns e valorizar as

mulheres, assim como no mundo”. Em outras palavras, essa jovem está questionando, se a

sociedade tem aceitado os incomuns e valorizado as mulheres, por que a Igreja não poderia

fazer o mesmo? Outro comentário visto, de um dos jovens que menciona o uso da tecnologia

e diz que a Igreja deveria fazer uso de todos os meios para alcançar outras pessoas. Por trás de 214 Ibid., p. 130.

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sua questão, o questionamento é: se a publicidade usa, se a mídia explora essas questões, por

que a Igreja não pode utilizar os mesmos recursos para os fins eclesiásticos?

Ellen White, uma das fundadora e principal escritora da Igreja Adventista, apresenta

alguns indícios de que não devemos nos isolar do mundo. Ao comentar sobre o povo de Israel

e a obediência às leis, ela diz:

“A idolatria e todos os pecados que seguem sem seu cortejo, são aborrecíveis a Deus, e Ele ordenou a Seu povo que se não misturasse com outras nações, para fazerem ‘conforme às suas obras’ (Êxo 23:24), e se esquecerem de Deus. Proibiu-hes casamento com idólatras, para não acontecesse ser seu coração desviado dEle. Era perfeitamente tão necessário como naquele tempo, como o é hoje, que o povo de Deus fosse puro, incontaminado do mundo. Deviam conservar-se livres de seu espírito, porque é ele oposto à verdade e à justiça. Mas não era intuito de Deus que Seu povo, em seu exclusivismo de justiça própria, se subtraísse do mundo, de modo que nenhuma influência tivesse sobre ele.”215

White neste comentário é enfática que devemos nos afastar do mundo.

Na mesma proporção que é enfática, pode-se notar sua referência direta a expressão

“mundo” como sendo pecado, por se unir às nações vizinhas que possuíam costumes pagãos.

No contexto de relacionamento, entre o povo de Israel e às nações vizinhas, ela diz que os

israelitas não deveriam se misturar com outras nações para fazerem as mesmas coisas. Ao

dizer isso, ela faz um paralelo com a atualidade, dizendo aos leitores que devem ser puros e

incontaminados com o mundo. Em sua frase “perfeitamente tão necessário como naquele

tempo, como o é hoje” é possível entender que sua referência a mundo está em se unir à

pessoas que fazem as mesmas coisas que as nações vizinhas do povo de Israel faziam. Isso

não significa que o povo de Israel deveria se alienar do mundo e viver como uma ilha.

Pelo contrário, ela diz que “não era intuito de Deus que Seu povo, em seu exclusivismo

de justiça própria, se subtraísse do mundo, de modo que nenhuma influência tivesse sobre

ele.” Ellen White defende a ideia que devemos nos afastar do erro, nas palavras de Knight

“das filosofias não cristãs”, mas devemos pela nossa influência transformar a realidade do

mundo. Ela afirma:

“Como seu Mestre, os seguidores de Cristo deveriam em todo o tempo ser a luz do mundo. Disse o Salvador: ‘Não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte. Nem se acende

215 WHITE, Ellen G. Patriarcas e Profetas: O conflito entre o bem e o mal, ilustrado na vida de homens santos da antiguidade. Tradução: Flávio L. Monteiro. 16. ed. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2009. p. 369

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a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos os que estão na casa’ – isto é, o mundo. E acrescenta: ‘Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos Céus.’ Mat. 5:14-16. Isto foi precisamente o que Enoque, Noé, Abraão, José e Moisés fizeram. É precisamente o que era intuito de Deus que Seu povo Israel fizesse.”216

Destaco que esta citação é o parágrafo seguinte do outro texto lido de Ellen White.

Sendo assim, não podemos isolar parte do parágrafo anterior e considerar apenas parte dos

comentários, pois se assim o fizéssemos a análise não seria coerente com toda visão que ela

apresenta. Quero dizer com isso que seria possível isolar parte da primeira citação e dizer que

Ellen White estava dizendo que a Igreja Adventista deve se isolar do mundo, mas a primeira

visão que vimos sobre a necessidade de influenciar a realidade da sociedade, neste segundo

momento é ratificada. Sendo assim, é evidente que White ao falar que devemos nos afastar do

mundo está se referindo às ações erradas e não a sociedade e as pessoas.

Para explanar sua opinião, White faz menção a três versos do evangelho de Mateus,

versos esses que falam sobre a necessidade de iluminar uma casa e da impossibilidade de

esconder uma cidade. Se fôssemos analisar o texto mencionado pensando nos objetos atuais,

seria o mesmo que acender uma lâmpada e colocá-la embaixo da cama para iluminar toda a

casa. E quando a expressão casa é mencionada ela diz que significa o mundo. Em outras

palavras, ela está dizendo que os cristãos devem iluminar o mundo e estar presentes nele,

assim como uma lâmpada deve estar no meio do teto para clarear a casa. Confirmando essa

ideia, White menciona alguns personagens bíblicos que fizeram a diferença quando viveram e

diz: “É precisamente o que era intuito de Deus que Seu povo Israel fizesse.”

No parágrafo anterior que analisamos de Ellen White encontramos um paralelo entre o

povo de Israel e os cristãos da atualidade, sendo assim, se Deus desejava que o povo de Israel

se tornasse uma luz para as outras nações, da mesma maneira Deus deseja isso para os

cristãos.

Apenas um acréscimo pessoal: para que isso se torne realidade os cristãos precisam

estar dentro da sociedade, assim como a cidade em cima do monte, para que todos possam vê-

los.

Foi visto até aqui que os jovens adventistas em primeiro lugar não desejam romper com

a Igreja; em segundo lugar eles esperam mudanças maiores que simples contextualizações.

216 Ibid., p. 369,370.

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Um dos pontos que levantamos para ser reconsiderado é a dicotomia entre sagrado e profano,

que coloca a igreja oposta ao mundo.

Vimos que esse pensamento, embora seja muito presente no pensamento de alguns

líderes da Igreja Adventista e por consequência de alguns jovens, não é a posição mais

coerente e tão pouco defendida pela juventude.

Ao analisarmos Ellen White, principal escritora adventista, ela é enfática em dizer que

os cristãos devem se afastar do “mundo” enquanto pecado e influências negativas, mas clara

na necessidade de fazer a diferença dentro da sociedade.

O pensamento apresentado por Ellen White, é defendido por Knight ao diferenciar o

pensamento cristão e não cristão e, na necessidade da Igreja instruir os membros a pensarem

como cristãos em todos os momentos da vida. Se assim fosse, eles seriam influenciadores em

todos os momentos.

É interessante esse pensamento, pois tem sido defendido por outros líderes. Em especial

destaco dois líderes mundiais, e neste momento apresento alguns pensamentos apresentados

por eles.

Ted Wilson, atual presidente da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia

escreveu um artigo intitulado: “Grande Visão para as Grandes Cidades”, no qual fala sobre a

necessidade dos cristãos estarem presentes no cotidiano dos não cristãos, ele diz:

“Seguir a Jesus no mundo moderno significa aprender de Seu coração compassivo por aqueles que vivem nas metrópoles populosa de hoje, compreendendo suas necessidades, estudando seus hábitos e, sim, chorando por sua condição, se não tiverem uma relação salvadora com Ele. É muito fácil permanecer em nossa zona de conforto, em lugar de ir ao encontro das massas nos grandes centros urbanos do mundo.”217

Note que o presidente da Igreja Adventista enfatiza a necessidade de conhecermos as

necessidades e hábitos dos não cristãos e, isso só é possível tendo vivência com essas pessoas.

É possível até perceber “certa reprovação” aos que preferem ficar isolados das pessoas que

não conhecem a mensagem cristã.

Dentro deste artigo ele faz menção ao que Ellen White chamou de “centros de

influência”. Estas questões que ele levanta são interessantes, pois saem do tradicional e faz a

Igreja Adventista repensar suas atividades nas cidades. 217 WILSON, Ted N. C. Grande Visão para as Grandes Cidades: Cada membro envolvido em toas as formas possíveis de evangelismo. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 10. Tatuí, p. 8, out., 2011.

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Ele exemplifica esse trabalho pelas grandes cidades de maneira bem diversificada.

Esses centros de influências podem ser:

“igrejas, livrarias/salas de leitura, vários tipos de ministérios nas ruas, restaurantes vegetarianos, centros de serviço comunitário, centro de educação em saúde ou clínicas. Pode haver novos e criativos métodos de serviço na comunidade, ou estratégias de testemunho pela internet, direcionadas a comunidades especiais. A chave do sucesso é a sustentabilidade: como podemos continuar interagindo com a comunidade prestando um serviço cristão útil e evangelizando, em vez de voltar às atividades esporádicas?”218

Dentre esses vários métodos mencionados por Wilson, uma linha permeia a todos, a

necessidade de ser presente e influenciar as pessoas onde elas se encontram.

É importante destacar que ele faz alusão a novos métodos, mas não deixa especificada

quais seriam essas novas abordagens. Parece se encaixar com a necessidade levantada pelos

jovens ao ansiarem desejo por espaço para mudanças, mesmo que rompam com paradigmas

tradicionais.

Wilson ainda faz questão de abrir as portas para o uso da tecnologia, ao contrário do

pensamento mostrado no primeiro capítulo que alguns líderes temem o uso do twitter ou do

vício nesses meios de comunicação, ele diz que:

“Vivemos na era da plataforma multimídia, e precisamos usar ao máximo, todos os meios disponíveis ao planejarmos o evangelismo urbano. Quando um morador da cidade ouve algo no rádio, vê a mensagem em diferentes sites da Internet ou Facebook, depois vê a mesma coisa impressa ou em outdoors, esse indivíduo estará muito mais receptivo ao contato pessoal.”219

Preciso dizer que particularmente me preocupo com os extremos e vícios em todos os

sentidos, inclusive e, de maneira especial com a internet. Pois esta é um meio extraordinário

de comunicação, mas ao mesmo tempo viciante, mesmo assim, não posso desenvolver um

pensamento negativo por conta que alguns fazem mal uso deste benefício.

O segundo líder é Jan Paulsen, ex-presidente da Igreja Adventista, escreve um artigo,

intrigante e significativo para nosso estudo que tem o seguinte título: “A Face do Adventismo

Está Mudando?”

218 Ibid., p. 9. 219 Ibid., p. 10.

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Neste artigo Paulsen defende a ideia que a Igreja Adventista não pode ficar estagnada

diante das mudanças que acontecem na sociedade.

Embora, ele diga que a mudança é perturbadora, pois as pessoas tendem a preferir o

conhecido, as mudanças são vistas em diversos lugares, ele diz:

“Encontro mudança inevitável quando olho no rosto dos meus filhos e netos, o quando abro o jornal ou acesso a internet. Ouço com clareza as mudanças nas palavras dos jovens profissionais adventistas que me falam sobre seus sonhos. Vejo a força da mudança na adoração das mulheres africanas ao se movimentarem enquanto cantam com alegria ao entrar na igreja.”220

Diante deste quadro de mudanças em todos os lugares, qual deve ser a postura da

Igreja? Ele responde dizendo:

“A ilusão de que nós como igreja, podemos permanecer estáticos enquanto o resto do mundo, ao nosso redor, está em constante movimento, é exatamente isso, apenas ilusão. Nossa igreja existe dentro dos parâmetros do tempo, geográficos e culturais, e assim também deve mudar. Somos atingidos pelas forças externas – política, economia, cultura e realidades tecnológicas – que estão absolutamente além do nosso controle.”221

Segundo o que vimos nesta citação, algumas mudanças são inevitáveis porque tendem a

acontecer de fora para dentro, influenciadas pela cultura, parâmetros de tempo e geográficos.

Esse pensamento é completamente oposto ao pensamento dicotômico que distancia a igreja do

mundo.

Antes, a igreja acompanha a realidade contemporânea e está aberta a algumas mudanças.

Diante da pergunta levantada no título do seu artigo, se a face do adventismo estaria mudando,

em sua opinião em alguns sentidos sim, mesmo assim não ele pensa que não deve ser resistido

e temido.

Ele considera a postura da Igreja pressionada e circundada de tantas mudanças. Para ele

fixar-se no passado caminhando para o futuro, é passar a ver todas as mudanças como

ameaças perturbadoras, que confrontam os paradigmas da igreja e quebra a herança espiritual

adventista, quase como uma apostasia. 220 PAULSEN, Jan. A face do Adventismo Está Mudando? Como praticar os valores eternos em nossas culturas mutantes. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 6, nº 3. Tatuí, p. 7, mar., 2010. 221 Ibid., p. 7.

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Outra alternativa é ter o passado como fonte de inspiração, identidade e valores, definir

o alvo que se deseja alcançar e caminhar com o passado rumo ao futuro.

Em sua opinião: “o adventista se congelou em determinado tempo ou cultura, perdeu-se

no caminho. Ele não mais responde criativamente aos desafios; perdeu a habilidade de adaptar

seu método, estrutura e o modo como usa seus recursos para levar adiante a missão para um

mundo em mudança.”222

Com o objetivo de endossar sua opinião, Paulsen faz alusão a um texto de Ellen White

no qual ela afirma que:

“Não podemos ser aceitos por Deus prestando o mesmo serviço, ou fazendo as mesmas obras que nossos pais. A fim de ser aceitos e abençoados por Deus como eles forma, cumpre-nos imitar sua fidelidade e seu zelo, aperfeiçoar nossa luz como eles fizeram à sua e fazer como eles teriam feito caso vivessem em nossos dias. Cumpre-nos viver segundo a luz que brilha sobre nós, do contrário, essa luz tornar-se-á em trevas”223

Comentando essa citação de Ellen White, ele diz que, para se andar na luz,

primeiramente não se deve temer mudanças; em segundo lugar é preciso ter capacidade de

discernir aquilo que se pode e não mudar. Paulsen destaca quatro questões que são

inegociáveis para os adventistas: Cristo; a Bíblia; o propósito de Deus para cada ser humano,

como indivíduos; e a história comum, como igreja.

Esses quatro pontos para ele se encaixam em qualquer cultura e são inegociáveis. O

significativo é que nenhuma destas questões mencionadas por Paulsen entram em conflito

com a cultura local e as necessidades pessoais. Pelo contrário são pontos fundamentais da

Igreja Adventista, mas se adaptam em qualquer local.

Paulsen analisa a igreja como navegando em um mundo em mudanças e, pontua alguns

pontos significativos. A respeito do papel na sociedade ele diz:

“O Adventismo também não pode ficar na montanha; deve ir às comunidades em que

vivemos e trabalhamos, com toda sua sujeira, desordem e mudança.”224

222 Ibid., p. 8. 223 WHITE, Ellen G. Testemunhos para Igreja vol. 1. Tradução: César Luís Pagani. 2. ed. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2009. p. 262. 224 PAULSEN, Jan. A face do Adventismo Está Mudando? Como praticar os valores eternos em nossas culturas mutantes. Adventist World: Órgão Internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 6, nº 3. Tatuí, p. 9, mar., 2010.

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Ainda sobre essa questão ele afirma: “A igreja tem que explorar o delicado equilíbrio

entre ser cidadãos da Terra obedientes e seres humanos equilibrados, sem se desviar dos

valores bíblicos. As coisas nunca foram fáceis, mas devem ser enfrentadas.”225

A opinião de Paulsen é de que a Igreja deve estar dentro da realidade social, se misturar

com as pessoas, ao mesmo tempo em que deve ser fiel com seus princípios.

As mudanças tecnológicas são consideradas por Paulsen como um grande meio de

alcançar as pessoas, principalmente os jovens que se tornam cada vez mais seletivos quanto a

fonte de informações. Ele acredita que a Igreja precisa se engajar e investir neste meio de

comunicação para alcançar outras pessoas.

Outros dois pontos são destacados por Paulsen e merece nossa análise, o primeiro faz

menção a forma de culto e o segundo sobre a maneira como abordamos a missão. Com

respeito a forma do culto, ele diz:

“Somos uma comunidade global e cada um de nós é filho de um tempo específico e de uma cultura. É natural que haja variações no formato do culto, no estilo da música ou no nível de formalidade ou espontaneidade. Nem todos necessariamente cantam acompanhados por um órgão! Tenho que ser muito cuidadoso para não rotular de pecaminoso tudo que não combina com minhas tradições, simplesmente porque é diferente. Do mesmo modo, quando encontro as pessoas, mesmo dentro da minha comunidade de fé, cuja aparência não combina com minhas expectativas, que eu não seja muito apressado em concluir que eles estão se afastando do Senhor. Sejamos gentis com as pessoas, pois no fundo, quando tudo é retirado deles, o que fica são as pessoas – não coisas, ideias ou expressões culturais – as quais Cristo irá salvar.”226

Esta citação de Paulsen é muito significativa, pois em primeiro lugar para ele estão as

pessoas, acima de ideias, planos, diferenças. Estas questões mudam com o tempo, mas as

pessoas permanecem. Sendo assim, mais importante que se apegar a fatos pontuais, está a

valorização da pessoa como ser humano.

Um segundo ponto que destaco é a visão de culturas e visões diferentes, ele mostra que

ninguém é igual a ninguém, inclusive na mesma comunidade.

O cuidado que se deve ter em rotular uma ideia pessoal como padrão de verdade é o

terceiro ponto que destaco. O descuido com isso resulta em classificar todas as ideias

contrárias a minha opinião como pecado. 225 Id. 226 Id.

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Como dito o último ponto que veremos deste artigo de Paulsen está relacionado a

missão, sobre isso ele diz:

“Deve haver flexibilidade, elasticidade, em nosso modo de pensar que nos permita responder efetivamente às mudanças ambientais nas quais nos encontramos. Assim, as iniciativas e os programas para a missão podem mudar de ano para ano. A maneira como usamos nossos recursos, nossas prioridades de gastos, vai mudar. Políticas e estruturas não devem ser servas da tradição, e não devem ser investidas com uma aura de santidade, simplesmente porque ‘esse era o modo como sempre fizemos’. Ao contrário, a política da igreja deve servir à unidade da igreja e sua missão, e a linguagem da política deve ser moldada pela simples pergunta: ‘O que temos que realizar? O que é bom para a igreja?’”227

A visão de Paulsen sobre cultura, igreja, missão é aberta a mudanças, mesmo que elas

mexam com tradições. Fica mais que evidente que para ele, o que foi feito no passado não é

norma de qualidade e garantia de acerto. Antes, sua visão é de que, se preciso for mudar todos

os anos, que isso aconteça se for para o bem da Igreja. Vemos em suas ideias que a identidade

adventista está se moldando de acordo com os novos paradigmas, não se esquecendo da

origem do adventismo, mas não limitando o adventismo ao passado e se esquecendo do

presente e do futuro.

Quando consideramos a visão dos jovens adventistas que não desejam romper com a

Igreja, mas que não se contentam com contextualização e esperam mudanças mais profundas

na forma de pensar e agir da Igreja; eles entendem que a Igreja não pode estar antagônica ao

mundo por conta de pressupostos passados, mas deve viver junto a ele para vivenciar sua

experiência religiosa. Eu encontro em alguns líderes esse pensamento mais crítico e aberto a

realidade contemporânea e a necessidade dos jovens; em especial nos comentários de Ted

Wilson e Jan Paulsen.

É interessante que ambos pensam em manter os princípios e realizar mudanças

significativas, ao mesmo tempo em que buscam em Ellen White fundamento para as ideias

apresentadas e defendidas para a realidade atual. Sendo assim, nesta última parte deste

capítulo analisarei alguns princípios para se ler Ellen White no século XXI, o pensamento

liminar em Ellen White e a postura da Igreja Adventista diante desse conceito, concluindo

com a identidade do jovem adventista.

227 Id.

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3.4 ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENSTISTA

Como mencionado, esta última parte do capítulo trata em analisar Ellen White como

fonte de direcionamento para a Igreja Adventista. Vimos durante todo este trabalho que todos

os adventistas buscam mencionar Ellen White para mostrar confiança em suas ideias

apresentadas. E de fato isto procede por tudo o que ela foi e seus escritos continuam sendo

para os adventistas.

Por isso, recorremos a Ellen White com o fim de analisar sua postura diante dos líderes

de sua época, para entender qual deve ser a postura da Igreja Adventista neste contexto de

mudanças.

3.4.1 Ellen White e o Pensamento Liminar

Entender o pensamento de Ellen White é essencial para formação da identidade

adventista em pelo menos dois pontos: o primeiro por ela ter feito parte da formação da Igreja

e ter tido um papel fundamental na origem e no amadurecimento dos ensinos adventistas; o

segundo por ela ser a mais importante escritora adventista, sendo seus escritos base para a

grande maioria das decisões e atividades dentro da Igreja Adventista.

Para entendermos a base do pensamento de Ellen White precisamos entender sua época

e sua reação ao contexto que vivia. Walter Mignolo diz que “O mundo moderno vem sendo

descrito e teorizado de dentro do sistema, enquanto a variedade das experiências históricas e

coloniais lhe vem sendo simplesmente anexada e contemplada a partir do interior do

sistema.228

Segundo Mignolo, as ideias dominantes surgem de dentro do sistema, os pensamentos

periféricos, ou seja, dos dominados ou colonizados, são meramente vistos e anexados pelos

que estão dentro do sistema.

228 MIGNOLO, Walter. Histórias Locais/Projetos Globais: Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Tradução: Solange Ribeiro de Oliveira. Belo Horizonte: UFMG, 2003. 9p.

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Ellen White foi uma autora que escreveu desde a periferia do sistema, uma pensadora

liminar na terminologia de Mignolo. Adolfo Suárez229 apresenta um estudo bem aprofundado

de algumas questões que marcaram a sua vida. Destacaremos os pontos principais, com o fim

de entender sua postura na sociedade e na Igreja Adventista.

Em primeiro lugar aos nove anos de idade, sofreu um acidente causado por uma pedrada

lançada por uma colega que a hostilizava depois do colégio. A pedra atingiu seu nariz que o

fraturou e desfigurou seu rosto. Não apenas isso, mas perdeu a consciência durante três

semanas, sua saúde ficou completamente comprometida e foi desenganada por algumas

pessoas.

Aos poucos entre a vida e a morte foi recobrando sua saúde, porém as sequelas

permaneceram, não apenas no seu exterior, mas na sua relação com as pessoas.

As pessoas que a visitavam tinham pena de sua situação, agravando sua vida, suas

amizades foram afetadas por conta de sua deformidade física e a rejeição passou a ser um

sentimento que a acompanhava.

Até mesmo seu pai não a reconheceu após o acidente. Por questões de negócios, seu pai

estava na Geórgia no momento em que recebeu a pedrada. Ao voltar desta viagem, seu pai

abraçou seu irmão e suas irmãs e questionou por ela, mesmo enquanto sua mãe apontava para

ela.

Adolfo então diz que os dois elementos se destacam em sua infância: “rejeição e não

reconhecimento.”230 Ao comentar esses dois elementos, ele diz que “Pessoas rejeitadas e

irreconhecíveis vivem à margem, ou, pessoas que vivem à margem costumam ser rejeitadas e

irreconhecíveis.”231 Sendo assim, Ellen White não viveu uma experiência de pertença, mas

viveu desde sua infância à margem do sistema.

Walter Mignolo apresenta um conceito interessante sobre as pessoas que vivem às

margens e desenvolvem seus conceitos afastados dos centros dominantes.

Ele entende que o pensamento liminar é uma consequência lógica da diferença colonial

e se torna incontrolável, oferecendo novas percepções críticas dos pensamentos

hegemônicos.232 Sendo assim, o pensamento liminar tem por objetivo criar alternativas para 229 SUÁREZ, ADOLFO S. Redenção, Liberdade e Serviço: Os fundamentos da pedagogia de Ellen G. White. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010. Cap. 1, p. 37-79. 230 Ibid., p. 57. 231 Id. 232 MIGNOLO, Walter. Histórias Locais/Projetos Globais: Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Tradução: Solange Ribeiro de Oliveira. Belo Horizonte: UFMG, 2003. p. 10, 11.

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aqueles que não se encaixam na estrutura dominante, por consequência passam a ter uma

visão crítica ao pensamento hegemônico.

Adolfo Suárez entende que o pensamento de Ellen White se enquadra neste conceito:

“Minha percepção é que Ellen G. White pode ser configurada como possuidora de ‘outro pensamento’, um ‘pensamento liminar’, capaz de contestar a rigidez das fronteiras epistêmicas e práticas de sua época, no contexto da sociedade norte-americana, em geral, e da comunidade da IASD, especificamente. De igual maneira, White parece viver na ‘fronteira’, não negando seu lugar de pertença, mas sempre procurando um ‘outro lugar’. Finalmente, percebo sua luta para não permitir tornar ausente, invisível, aquilo que acreditava ser necessário e verdadeiro.”233

Esse pensamento alternativo ao dominante, segundo Mignolo, não procede do centro

dominante, mas sim das margens, já que sua ideia parte do pressuposto de um poder

colonizador central e os marginalizados buscam a emancipação através de uma realidade

conflitante. São pessoas que vivem “entre-mundos”, vivem na fronteira vivenciando

experiências de dentro e fora do poder centralizador.234

Segundo Suárez, Ellen White deve ser entendida como uma pensadora liminar e

fronteiriça:

“liminar porque sua postura revela outro pensamento, que contraria a forte liderança masculina da IASD, não apenas rejeitando as formas de autoridade estabelecidas ao longo dos últimos vinte anos, mas especialmente considerando-as espúrias e falsas; fronteiriça porque ela parece transitar livremente na fronteira erguida entre os contendores, contestando as atitudes e práticas dogmáticas e legalistas de Smith e Butler, mas não aceitando incondicionalmente as ideias dos jovens reformadores.”235

Pelo que vimos, Ellen White não pertencia a gema da sociedade norte americana, por

ser em primeiro lugar mulher e por conta de seu acidente que a deixou com sequelas físicas e

233 SUÁREZ, ADOLFO S. Redenção, Liberdade e Serviço: Os fundamentos da pedagogia de Ellen G. White. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010. 41p. 234 MIGNOLO, Walter. Histórias Locais/Projetos Globais: Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Tradução: Solange Ribeiro de Oliveira. Belo Horizonte: UFMG, 2003. p. 26, 38, 34. 235 SUÁREZ, ADOLFO S. Redenção, Liberdade e Serviço: Os fundamentos da pedagogia de Ellen G. White. Engenheiro Coelho: UNASPRESS, 2010. 72p.

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emocionais. Ao mesmo tempo, dentro da comunidade adventista ela possuía um pensamento

de fronteira, o qual margeava dois mundos existentes dentro da Igreja.

Por um lado, ela não aceitava a posição hegemônica dos líderes, mas não apoiava

cegamente a crítica. Essa situação se evidenciou profundamente na Conferência Geral de

1888.236

O que me chama atenção nessas considerações sobre Ellen White é que sua maneira de

pensar não enrijecia e limitava o ser adventista em um único padrão global, mas permitia

reflexões de acordo com as circunstâncias, principalmente por ela viver a experiência “entre

mundos”, realidades diferentes.

Esse pensamento se faz necessário resgatar na Igreja Adventista para que, de acordo

com o contexto cultural, pessoas, necessidades, possa se atualizar a essência de ser adventista.

Para tanto, precisamos reler Ellen White sob essa perspectiva que ela possuía.

3.4.2 O jovem adventista e a formação de sua identidade

Como vimos no artigo de Jan Paulsen, a identidade adventista tem passado por uma

transformação. Isso se intensifica quando retomamos o pensamento de Hervieu-Leger que diz

que nenhuma identidade é transmitida intacta para a nova geração.

Sendo assim, os jovens estão formando sua identidade através da experiência que eles

estão passando. Porém, não podemos deixar de considerar que enquanto o jovem forma sua

identidade, ao mesmo tempo a Igreja Adventista tem passado por um momento de mudanças

como apresentado por Jan Paulsen.

Por conta das grandes mudanças que a sociedade tem passado, existe um conflito

“entre-mundos” que os jovens estão passando, por vivenciar experiências completamente

distintas dentro e fora da Igreja. Não apenas os jovens, mas muitos cristãos têm enfrentado

essa mesma realidade.

Sob essa perspectiva, esse conflito se intensifica com os jovens adventistas que muitas

vezes têm vivido a experiência de um mundo pré-moderno dentro da Igreja Adventista e um

mundo pós-moderno no cotidiano.

236 Adolfo faz uma análise detalhada deste evento e o comportamento de Ellen White, Ibid., p. 69-79

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Não quero limitar esse conflito apenas aos jovens, pois dentro da Igreja Adventista não

são apenas os jovens que estão vivendo no mundo pós-moderno, todos vivem, mas muitos se

escondem dessa realidade se excluindo do “mundo”, vivendo a vida a parte da realidade.

Aqueles que acompanham a realidade vivem os mesmos conflitos que vemos se

intensificando com os jovens.

Por encontrar essa realidade conflitante, penso que seja necessário uma releitura dos

costumes e tradições de ambos os mundos para que possa se chegar em um denominador

comum, onde nenhum dos grupos venha a se escandalizar, se revoltar ou se afastar, mas se

unir e fortalecer.

De maneira que, assim como Ellen White vivenciou dois mundos, e a partir das

margens construiu seu pensamento “crítico-positivo”, o jovem adventista deve vivenciar essa

mesma experiência.

No viver, a margem desse “entre-mundos” deve desenvolver sua identidade de pertença,

ou seja, não esquecer sua origem como adventista. Porém não vivendo “estagnado” como Jan

Paulsen disse, mas desenvolver uma identidade “crítica-positiva” para ser a diferença como

vimos em Ellen White.

3.5 CONCLUSÕES PARCIAIS

Ao findar este capítulo, podemos concluir que é praticamente unanimidade entre os

líderes adventistas o pensamento de que existe a necessidade de contextualização das

atividades na Igreja adventista.

Entretanto, a contextualização não responde a todas as indagações dos jovens. Isso

porque, por parte de alguns líderes existe um pensamento dicotômico entre a igreja versus o

mundo, e esse pensamento não é aceito pela maioria dos jovens.

Ao analisarmos o pensamento dicotômico, em primeiro lugar vimos que cada pessoa

possui uma maneira de enxergar o mundo da sua forma, chamamos isso de cosmo visão.

Sendo assim, da mesma maneira que os líderes possuem sua cosmovisão, os jovens também

possuem. Como analisado nos capítulos anteriores, não é o mais apropriado considerar minha

visão dos fatos como padrão. No segundo momento, vimos que, embora alguns líderes

sustentam a ideia que devemos nos afastar do mundo, encontramos outros líderes mundiais

incluindo Ellen White, que falam da necessidade de estarmos presente na vida das pessoas.

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Assim o conceito de mundo não cristão, analisado por George Knight, nos mostra que o

mundo não é pecado em sua essência, mas por escolha própria, as pessoas podem decidir

viver como não cristãos.

Uma vez visto que a igreja deve ser presente na vida das pessoas, vimos que assim

como os jovens demonstraram, alguns poucos líderes entendem que a igreja precisa passar por

mudanças profundas, tanto na sua abordagem, mas na sua maneira de ver e entender as

necessidades das pessoas onde elas estão.

Para que isto aconteça, indiscutivelmente necessita-se de envolvimento com o mundo

não cristão, quebrando o pensamento que devemos nos afastar do mundo.

Embora, seja necessário destacar que o conviver com o mundo não cristão não significa

viver as mesmas práticas que sejam contrárias aos princípios, em nosso caso de estudo,

princípios adventistas.

Finalizamos este capítulo analisando Ellen White e o pensamento liminar e a formação

da identidade do jovem adventista.

Analisamos essas razões porque entendemos que Ellen White tem papel fundamental na

formação da identidade dos adventistas. Sendo assim, é preciso em primeiro lugar saber ler

uma escritora do século passado; entender seu pensamento dentro da sociedade e da

comunidade adventista; e entender as implicações para a formação da identidade do jovem.

Como vimos, Ellen White foi uma pensadora “crítico-positiva”, crítica por não aceitar

todas as opiniões dos líderes da Igreja, mas positiva ao defender e orientar a Igreja como um

todo, no melhor caminho que deveria seguir.

Da mesma maneira, entendo que a formação da identidade do jovem adventista deve

seguir esta mesma linha de pensamento. Portanto, se faz necessário reler Ellen White

considerando esses princípios apresentados.

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CONCLUSÃO

O propósito geral deste estudo foi mostrar o conflito geracional na Igreja Adventista e a

formação da identidade dos jovens, visando entender se os jovens estão rompendo com a

Igreja Adventista e seus princípios ou, estão formando sua identidade no interior da tradição

adventista.

No primeiro capítulo foi proposto analisar o conflito geracional na sociedade e a visão

dos líderes adventistas sobre a juventude. Como vimos, o conflito geracional é uma realidade

em todas as esferas da sociedade e tem se intensificado cada vez mais.

O pensamento diferente dos mais novos tem causado preocupação para os mais

experientes e, tem feito com que eles busquem ajustes a partir da compreensão das

características da geração emergente. Vimos essa realidade, no âmbito educacional,

empresarial e, até a mídia tem explorado essas questões produzindo programas mostrando a

diferenças das gerações e como desenvolver um bom convívio. É interessante ainda

considerar que de forma geral, no meio social não religioso, os líderes têm tomado a iniciativa

para diminuir as diferenças entre as gerações.

Os líderes adventistas também têm reagido às novas tendências da sociedade, mas as

reações têm se limitado em conselhos, orientações, alertas, correções. Ao tratarem da

realidade pós-moderna e dos jovens, o grande enfoque dos líderes é para que os jovens não se

afastem dos princípios adventistas, mas se afastem do “mundo”. Esta ênfase no afastar-se do

“mundo” acontece por conta da compreensão que o mundo é pecado.

Vimos que a tendência de qualificar o mundo como pecado é uma característica

predominante no pensamento religiosos cristão pré-moderno. Por conta disso, fica

subentendido que os líderes, ao fazerem uso da palavra “mundo” com esse significado, estão

expressando a visão cristã pré-moderna deste termo, ou seja, a compreensão deste assunto

ficou fundamentada há séculos atrás.

Para que os jovens continuem firmes na igreja e se afastem do mundo, os líderes

buscam orientá-los focando dois pontos principais: O cuidado com o vício na internet e o

consumismo.

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Embora, seja do conhecimento de todos que a internet seja utilizada cada vez mais por

todas as pessoas, principalmente os mais jovens. Não encontramos na fala dos líderes o desejo

entender o porquê o jovem tem gasto tanto tempo na internet, tão pouco encontramos alguma

informação sobre o que os jovens têm feito na internet.

Mesmo sem demonstrar interesse em saber o “por quê”, e o “quê” eles fazem na internet,

os líderes dizem que a internet tem causado separação entre pais e filhos; cuidado com o

“pássaro”, referência a rede social twitter; entre outras observações já analisadas.

Após considerarmos a visão dos líderes, passamos a analisar a visão do jovem sobre a

Igreja Adventista. A principal conclusão desta análise é que os jovens que têm frequentado a

igreja, não desejam romper com ela. Essa constatação se evidencia pelo teor do conteúdo e a

linguagem característica adventista que eles possuem ao conversarem nos diversos grupos e

comunidades das redes sociais.

Como vimos, os jovens também estão preocupados com a espiritualidade e o

compromisso com a igreja. Embora a linguagem dos jovens se assemelhe a dos líderes, a

minha leitura é que a cosmovisão que eles possuem é diferente da maioria da liderança da

Igreja Adventista.

A linguagem dos jovens é igual a dos líderes no sentido de enfatizar que devem sair do

mundo. Diferente, pois os jovens não classificam o mundo como pecado, mas ao dizerem que

devem sair do mundo estão fazendo referência a se afastarem do que é errado e não se

alienarem do mundo como lugar de habitação e tudo que isso envolve.

Com isso, encontramos o desejo de mudança nos dizeres dos jovens. Esse desejo surge

por conta que a igreja esteve alienada da sociedade, e hoje algumas questões não fazem

sentido para os jovens. Em especial vimos o problema da linguagem e o medo de agregar

valores culturais ao serviço da igreja.

Estas duas questões chocam alguns líderes, porque vinculam a cultura ao mundo e o

mundo em sua visão é pecado. Por consequência, todas as questões que envolvem discussões

vinculadas a algo fora da igreja causam conflito. Como os mais novos não possuem a

cosmovisão como pecado, questões vinculadas à cultura e ao cotidiano que não causam

conflito com os princípios adventistas são tratados com naturalidade.

Por fim analisamos a visão de alguns líderes adventistas com referência as mudanças,

isso para responder ao anseio dos jovens. Vimos que alguns líderes entendem que a

contextualização é mais que mero gosto particular, mas uma necessidade de todas as igrejas,

seguindo as necessidades das respectivas culturas e costumes.

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Embora, a contextualização não resolveria todos os anseios dos jovens, pois eles

necessitam de mudanças mais profundas, a nível de cosmovisão. Analisamos quatro líderes

mundiais que possuem a visão bem próxima a dos jovens. Esses líderes são: George Knight,

Jan Paulsen, Ted Wilson e Ellen White; respectivamente filósofo e um dos principais

educadores da igreja adventista na atualidade, ex-presidente da Igreja Adventista, atual

presidente da Igreja Adventista e uma das fundadoras e principal escritora da Igreja

Adventista.

Ted Wilson, embora mais conservador em seus comentários, expressa a necessidade da

igreja se misturar com a sociedade para entender as reais necessidades das pessoas que

possuem uma mentalidade não cristã. Sob sua visão, a igreja deve abrir as portas para novos

métodos e não deve padronizar um estilo de culto, sendo assim flexível as características de

cada sociedade e cultura.

George Knight é enfático em mostrar que a dicotomia entre sagrado e profano é um

mito que muitos cristãos ainda carregam. Ele diz que se o pensamento dicotômico for

sustentado, os cristãos fazem distinção do viver na igreja, oposto a sua vida semanal. O que

não deve acontecer sob seu entendimento, contrário à visão dicotômica, pra ele o grande

desafio das igrejas é fazer com que o cristão tenha pensamento cristão em todos os momentos

da vida.

Jan Paulsen defende a ideia que a igreja estagnou e ficou descontextualizada. Para ele,

as mudanças devem acontecer naquilo que pode acontecer. As questões imutáveis para ele

são: Cristo; a Bíblia; o propósito de Deus para cada ser humano, como indivíduos; e a história

comum, como igreja. Todas as outras questões vinculadas a igreja, que não ferem esses

princípios, incluindo as características culturais de cada lugar devem ser mudanças de acordo

com a necessidade.

Paulsen acredita que a identidade adventista tem passado por uma transformação. Como

vimos em Hervieu-Leger a identidade é construída de maneira pessoal, não coletiva. Sendo

assim, a cada geração é entendível e até natural, que a identidade seja reconstruída. Por conta

desse tempo que a igreja se alienou as mudanças, talvez as mudanças que sejam necessárias

sejam chocantes demais para alguns.

Em Ellen White encontramos a necessidade da igreja ser a luz do mundo, para tanto a

igreja precisa estar presente no cotidiano das pessoas. Vimos que, o pensamento de Ellen

White era diferenciado da liderança. Seu pensamento denominado liminar por viver na

fronteira de duas realidades, fez com que ela tivesse uma postura crítico-positiva. Ao mesmo

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tempo que critica construtivamente a liderança, apoiava o avanço da igreja em todas as suas

áreas.

Por fim, analisamos que a juventude adventista tem construído sua identidade sem

querer romper com o adventismo. Para que essa identidade seja moldada de forma positiva, o

pensamento que permeia os escritos de Ellen White pode ser aplicado à realidade atual. Com

isso, a convivência entre a vida religiosa e a cotidiana faz com que ele viva “entre-mundos”. E

nessa experiência de fronteira, firme em seus princípios ele pode desenvolver uma identidade

“crítico-positiva”.

Sendo assim, minha conclusão é: O jovem não deseja romper com a igreja, mas

descontente com algumas questões está reconstruindo sua identidade. Encontro base nos

escritos de alguns líderes para isso, e acredito que o pensamento liminar que Ellen White

tinha e deixou registrado em seus escritos pode ser uma alternativa para a formação de uma

identidade sólida aos princípios e aberta às necessidades pessoais. REFERÊNCIAS

Livros

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ANEXOS

Os anexos foram preservados por conta da identidade das pessoas. Todos os anexos foram lidos e verificados pelos componentes da banca. Muito obrigado O autor