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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE
CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
ELIZAMA CARNEIRO MACHADO BEZERRA
A GERAÇÃO ESPONTÂNEA NOS LIVROS DIDÁTICOS: ANÁLISE CRÍTICA NA PERSPECTIVA DA HISTÓRIA DA CIÊNCIA.
São Paulo 2012
1
ELIZAMA CARNEIRO MACHADO BEZERRA
A GERAÇÃO ESPONTÂNEA NOS LIVROS DIDÁTICOS: ANÁLISE CRÍTICA NA PERSPECTIVA DA HISTÓRIA DA CIÊNCIA.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para a obtenção de título de Graduação do Curso de Ciências Biológicas, Habilitação em Licenciatura da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Orientador: Profº. Dr. Waldir Stefano
São Paulo 2012
2
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus pela oportunidade de chegar até esta etapa
de minha vida, permitindo a realização de parte de um sonho. Em segundo lugar,
agradeço a minha família pela paciência e confiança que sempre depositaram em
mim, pelo apoio e pelas palavras de amor e carinho.
A todos os professores do curso de Ciências Biológicas da Universidade
Presbiteriana Mackenzie que realizam um trabalho árduo, com extrema dedicação,
primando a formação de profissionais qualificados e humanos. Agradeço ao vosso
zelo e comprometimento.
Ao meu orientador o Prof. Waldir Stefano, deixo minha gratidão pela paciência
e dedicação, pelo auxílio no desenvolvimento deste trabalho, além de fazer parte de
meu desenvolvimento no meio acadêmico, permitindo a realização de treinamento
científico que muito contribuiu no meu desenvolvimento como aluna de graduação,
me capacitando para ter maior autonomia e maturidade na realização de atividades
ligadas à pesquisa científica.
Aos meus amigos e colegas dedico meu carinho pelo incentivo nos momentos
difíceis e cooperação, sempre me auxiliando e participando de ocasiões especiais
em minha vida, no qual, compartilhamos alegrias e tristezas, em especial, minhas
amigas Bruna Pascarelli, Cícera Pimenta e Loredanna Aurora.
Muito obrigada a todos.
3
Se ensinares, ensina ao mesmo tempo a duvidar daquilo que estás a ensinar.
José Ortega y Gasset
4
RESUMO
A História da Ciência pode ser uma ferramenta importante no Ensino de Biologia,
visando um ensino contextualizado, crítico e que aborde a complexidade da
natureza do fazer científico. Nesse processo, o livro didático é de fundamental
importância no desenvolvimento de atividades dentro e fora da sala de aula,
servindo como fonte bibliográfica ou sendo utilizado sistematicamente. Desta forma,
o presente trabalho procurou identificar em obras didáticas do Ensino Médio da
disciplina de Biologia conteúdos relacionados à História da Ciência sobre o tema
Geração Espontânea, analisando essas passagens e apontando as principais
implicações de tais conteúdos para o Ensino de Biologia. Para atingir tal objetivo, foi
realizada uma revisão bibliográfica e análise documental, tendo como base a
seleção de frases das obras analisadas. O Resultado demonstrou que apenas uma
das sete obras retratava aspectos mais específicos da controvérsia entre Pasteur e
Pouchet e que a maioria dos livros apresentam aspectos errôneos como concepção
de gênios, consensualidade, equívocos quanto à importância e utilização do método
científico. Além disso, observa-se a falta de um contexto mais amplo de abordagens
que insiram aspectos históricos, políticos, cultural e até mesmo científico. Desta
forma, denota-se a necessidade de uma reflexão adequada de como estes
conteúdos são abordados nas obras didáticas, pois, podem interferir na concepção
de Ciência que o aluno desenvolverá, bem como adequações que visem à
concordância dos livros didáticos com os preceitos educacionais expostos em
documentos regulamentadores nacionais de ensino.
Palavras-chave: Geração Espontânea, Análise, Livro Didático, Controvérsias em
Ciência, Pasteur e Pouchet.
5
ABSTRACT
The History of Science can be an important and critical tool in Teaching Biology in
addressing the complexity of the nature of scientific work. The Textbook is also of
fundamental importance in the development of activities inside and outside the
classroom, serving as methodological support and a bibliographic source. In this
regard, this study seeks to identify high school biology textbooks that incorporate
historical and qualitative content on Spontaneous Generation. It then analyzes these
passages and points out the principal implications of such content for the Teaching of
Biology. To achieve this goal, we conducted a literature review and documentary
analysis based on phrase selection. Only one of seven analyzed works
demonstrated more specific aspects of the controversy between Pasteur and
Pouchet and the majority of work featured inaccurate conceptions of genius,
consensus and the employment of the scientific method. Moreover, it was observed
a lack of qualitative approaches that included historical, political, cultural and even
scientific methods. Thus, there is a need for adequate reflection on how these
subjects are analyzed in textbooks, since such methods can negatively impact the
vision of Science that a student will develop.
Keywords: Spontaneous Generation, Review, Textbook, Controversies in Science,
Pasteur and Pouchet.
6
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Abordagem da Geração Espontânea.....................................................38
Quadro 2 – Tecnologia e Ciência: Microscópio.........................................................40
Quadro 3 – Método Científico....................................................................................43
Quadro 4 – Controvérsia entre Pasteur e Pouchet....................................................44
Quadro 5 – Geração Espontânea: Contestação........................................................47
Quadro 6 – Pasteur como Herói................................................................................48
7
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8
2. REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................... 11
2.1 A História da Ciência e o Ensino ..................................................................... 11
2.2 Livro Didático: algumas considerações ........................................................... 16
2.3 Geração Espontânea: Controvérsia entre Louis Pasteur e Félix. A. Pouchet . 20
3. METODOLOGIA .................................................................................................... 32
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 36
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 53
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 54
8
1. INTRODUÇÃO
De acordo com vários autores a Ciência não é algo estático, mas sim em
constante movimento e mudança. O conhecimento científico está sujeito a vários
fatores, entre os quais, destacam-se o meio histórico, social, cultural e religioso (EL-
HANI, 2006, CARNEIRO; GASTAL, 2005, TRINDADE et al., 2010, MARTINS, 2006).
Desta maneira, durante o desenvolvimento científico houve e há controvérsias
de ideias e opiniões. De acordo com Martins (2006) a História da Ciência visa à
compreensão da natureza da pesquisa científica, envolvendo seus debates,
discussões e os mais variados fatores envolvidos no fazer científico. A História da
Ciência pode ser muito útil na elucidação e discussão de diversos acontecimentos
bem como os caminhos passados e futuros da Ciência.
Uma passagem importante que ilustra algumas peculiaridades da Ciência
está relacionada à Teoria da Geração Espontânea. Tal teoria é pautada em uma
problemática extremamente importante, a origem da vida, e é caracterizada na
opinião de que os organismos poderiam surgir sem um ancestral ou pai direto
(MARTISN, 2009). Tal ideia já era apontada por nomes da antiguidade, mas desde
essa época, tal percepção já tinha suas particularidades. Essa teoria, foi assunto de
diversas discussões no meio científico em diversas épocas, entre elas destaca-se a
Controvérsia entre Louis Pasteur (1822-1895) e Félix Archiméde Pouchet (1800-
1876). Acredita-se que nesse momento histórico a discussão foi incentivada através
de um avanço tecnológico, o “microscópio” que permitiu a visualização de um mundo
diminuto, levantando diversas questões, reacendendo a problemática da Geração
Espontânea.
Esse recorte histórico é cheio de entranhas e questões diversas que
interferiram no desfecho de tal controvérsia, entre elas estão questões religiosas,
visões políticas e científicas diversas, além de outros fatores.
Portanto, tal passagem demonstra justamente a dinamicidade do fazer
científico. Fator este que se acredita ser imprescindível no Ensino de Ciências e
Biologia.
A História da Ciência apresenta grande potencial para auxiliar o Ensino de
Biologia, mas para tal, é necessária sua adequada utilização no processo de ensino
e aprendizagem dos estudantes. Os conteúdos relacionados ao tema podem
9
possibilitar uma melhor aprendizagem de conceitos e procedimentos científicos,
além de auxiliar na compreensão da Ciência como algo humano, dinâmico e
influenciável.
A análise da História da Ciência em livros didáticos foi motivada pela
importância que este material representa para o desenvolvimento do trabalho de
muitos docentes. Por esta razão, os conteúdos presentes neste recurso devem estar
de acordo com um Ensino que busque o desenvolvimento da autonomia e
pensamento crítico por parte dos educandos. Deste modo, a análise do material
didático se torna necessária, almejando a reflexão de autores, docentes, avaliadores,
editores e interessados em geral, sobre a importância de se trabalhar com uma
visão de Ciência que realmente demonstre sua vivacidade e natureza mobilizadora
de transformação no desenvolvimento do conhecimento.
Nesse objetivo é que o presente trabalho realiza uma análise de alguns livros
didáticos listados em documentos governamentais.
Visando embasar teoricamente a análise, no referencial teórico, tem-se uma
discussão geral sobre alguns aspectos da Ciência e utilização da História da Ciência
no Ensino, dando enfoque nos pontos positivos dessa utilização. Posteriormente
uma breve discussão sobre a utilização, importância e elaboração dos livros
didáticos, foi levantada. Observa-se que esse importante recurso didático é
elaborado seguindo instruções presentes em guias governamentais, porém essas
instruções necessitam de uma análise profunda. Além disso, a preocupação mais
exposta a respeito dos livros didáticos esta relacionada à sua formatação, sendo seu
conteúdo de fato pouco questionado.
Por fim, um apanhado geral da Geração Espontânea foi realizado dando
enfoque na “Controvérsia entre Pasteur e Pouchet”.
Após essa retomada teórica foi abordada a metodologia que consiste em uma
análise documental no qual foram realizadas leituras dos livros didáticos disponíveis,
selecionando as frases que se relacionavam com as categorias desenvolvidas para
análise.
Os resultados foram organizados na forma de quadros, cada quadro é
seguido por uma discussão. Desta maneira, resultado e discussão foram
apresentados no mesmo tópico, objetivando melhor compreensão por parte do leitor.
Por fim, foram apontadas as considerações finais na qual estão presentes as
principais conclusões.
10
Após apresentar os aspectos principais do trabalho, este apresenta como
questão de estudo: Como os conteúdos de História da Ciência relacionados à
Geração Espontânea são abordados nos livros didáticos do Ensino Médio e suas
principais implicações para o Ensino de Biologia.
Tendo como objetivos:
- Identificar nos livros didáticos analisados, conteúdos (frases) relacionados à
História da Ciência sobre o tema Geração Espontânea.
- Analisar esses conteúdos de acordo com a visão da Ciência e História da
Ciência proposta no Referencial Teórico, apontando de forma geral, suas possíveis
implicações no Ensino de Biologia.
11
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 A História da Ciência e o Ensino
Dentre os aspectos curriculares que o Ensino Médio deve seguir de acordo
com a Lei de Diretrizes e Bases N. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, encontrasse
a “[...] compreensão do significado da ciência [...]” (BRASIL, 2010).
Porém como conhecer algo sem retomar sua história? No caso científico, a
História da Ciência é bem mais do que apenas passagens históricas que remontam
ao seu desenvolvimento. Segundo Alfonso-Goldfarb (2004), não é juntando História
mais Ciência que se terá História da Ciência, pois o resultado obtido é diferente de
seus precedentes. Segundo a autora, com o passar do tempo, a História da Ciência
foi ganhando vida própria com grande complexidade, aliando conhecimentos de
diversas áreas, entre elas a sociologia e antropologia.
Compartilhando ideias semelhantes aqui apresentadas, Trindade et al., (2010)
acrescenta que para se ter uma interação entre Ensino e História da Ciência que
possibilite uma reflexão e contextualização dos conteúdos pelos educandos não
basta somente juntar as duas áreas.
Martins (2006) entende a História da Ciência como a compreensão da
essência da pesquisa científica, enfatizando o desenvolvimento de teorias, do
trabalho dos cientistas e da relação do pensamento científico com outros
contemporâneos, incluindo como exemplo, a filosofia e religião.
Deste modo, para se conhecer a Ciência é necessário compreender o seu
significado em diferentes épocas e culturas, e para se desenvolver planos de Ensino
eficazes que retratem essas questões é necessária uma grande reflexão e
preocupação de como os conteúdos serão trabalhados com os alunos. Para tal,
conhecer as características da Ciência é importante, porém, o presente trabalho não
se deterá em uma discussão prolongada e profunda sobre o assunto, serão
apresentados apenas pontos relevantes que auxiliarão na compreensão do tema.
De acordo com El-Hani (2006), não há um consenso entre os pesquisadores
sobre as características da Ciência, mas atualmente alguns aspectos concordantes
podem ser listados, como segue abaixo:
I. O conhecimento científico, embora robusto, tem uma natureza conjectural.
12
II. O conhecimento científico depende fortemente, mas não inteiramente, da
observação, da evidência, de argumentos e do ceticismo.
III. Não há uma maneira única de fazer ciência, i.e., não há um método
científico universal, a ser seguido rigidamente.
IV. A ciência é uma tentativa de explicar fenômenos naturais.
V. Leis e teorias cumprem papéis distintos na ciência, e teorias não se tornam
leis, mesmo quando evidências adicionais se tornam disponíveis.
VI. Pessoas de todas as culturas contribuem para a ciência.
VII. Novos conhecimentos devem ser relatados aberta e claramente.
VIII. A construção do conhecimento científico requer registros de dados
acurados, crítica constante das evidências, das teorias, dos argumentos etc,
pelas comunidades de pesquisadores, e replicação dos estudos realizados.
IX. Observações são dependentes de teorias, de modo que não faz sentido
pensar-se em uma coleta de dados livres de influências e expectativas
teóricas.
X. Cientistas são criativos.
XI. A história da ciência apresenta um caráter tanto evolutivo quanto
revolucionário.
XII. A ciência é parte de tradições sociais e culturais.
XIII. A ciência e a tecnologia impactam uma à outra.
XIV. Idéias científicas são afetadas pelo meio social e histórico no qual são
construídas (EL-HANI, 2006, p. 6-7).
Como se pode constatar, a partir das características apresentadas, pode-se
compreender a Ciência como dinâmica e mutável. Um dos pontos de destaque vai
para a visão do método científico que atualmente não é considerado como algo
estabelecido.
Sobre o assunto Martins (2006) retrata a importância de se compreender a
Ciência não apenas como resultado de um método científico, isso ocorre devido à
existência de fatores que influenciam o trabalho dos cientistas, como ideias já
concebidas, curiosidade e criatividade o que faz com que não se siga uma
sequência restritamente pré-fixada para o desenvolvimento da Ciência o que está de
acordo com os itens III. “não há uma maneira única de fazer ciência, i.e., não há um
método científico universal, a ser seguido rigidamente” e X. “cientistas são criativos”,
expostos por El-Hani (2006).
El-Hani (2006) defende o pluralismo metodológico em detrimento ao
reducionismo experimentalista, ou seja, considerar apenas o experimento como
mecanismo de se comprovar a veracidade de uma teoria ou hipótese e uma visão
13
empírico-indutivista que desconsidera os fundamentos teóricos, contrariando o ideal
apresentado no item IX que explicita justamente a necessidade de uma base teórica
para a realização de experimentos e observações.
Segundo Martins (2006) o trabalho científico sofre diversas influências, pois
tratasse de uma atividade humana e como tal, está sujeita a divergências entre os
diferentes pontos de vista, disputas, debates e controvérsias. Deste modo, a noção
de consensualidade veiculada por muitos materiais didáticos, que divulgam apenas
as teorias tidas como corretas e com maior adesão no meio científico, podem
encobertar as discordâncias, ou as retratar como se fossem as visões corretas em
detrimento das erradas (CARNEIRO; GASTAL, 2005). Reforçando uma visão de
vilões e heróis, no qual, os últimos são vistos como os grandes cientistas que
livraram a humanidade de teorias equivocadas que atrasariam o desenvolvimento
científico e tecnológico.
Este equívoco da História da Ciência contraria o pensamento exposto no item
VIII. “A construção do conhecimento científico requer registros de dados acurados,
crítica constante das evidências, das teorias, dos argumentos etc, pelas
comunidades de pesquisadores, e replicação dos estudos realizados”. No qual, a
crítica constante do conhecimento científico produzido e sua replicação são
fundamentais para o desenvolvimento do mesmo dando abertura para a realização
de debates e discussões (EL-HANI, 2006).
Outro pensamento contrário ao exposto nas características citadas é o da
linearidade do desenvolvimento científico apresentado por Carneiro e Gastal (2005)
como se a Ciência atual fosse resultado de conhecimentos precursores, também
relaciona o consenso apresentado pela comunidade científica que considerava
vertentes científicas mais corretas ou adequadas que outras. Desta maneira, criam-
se categorias como as pseudo ou protociências para conhecimentos como a
alquimia e astrologia que segundo uma visão tradicional da Ciência, seriam
rebaixadas a estas categorias (com menor prestígio), por não estarem diretamente
ligadas à evolução da Ciência Moderna (TRINDADE et al., 2010).
Esse aspecto é contrario ao exposto nos itens VI que prevê que “pessoas de
todas as culturas contribuem para a ciência” e XII no qual, “a ciência é parte de
tradições sociais e culturais”. Enfatizando que diferentes culturas e civilizações
contribuem para a Ciência, e esta faz parte das tradições culturais e sociais (EL-
HANI, 2006), ou seja, para cada época e cultura a Ciência tem um significado e
14
apresentava respostas para explicar os fenômenos e dúvidas que surgiam, por isso,
faz parte do legado de um povo, inserida em sua história e trazendo à luz suas
características, preocupações e modos de organização.
Outros aspectos criticados quanto à abordagem da História da Ciência em
muitos materiais são as histórias anedóticas, ou seja, os episódios trabalhados são
centrados nas biografias dos cientistas, não se apresentando um contexto mais
amplo, acarretando entre outros aspectos, uma visão dos cientistas como gênios. A
utilização de biografias é interessante, porém é necessária uma reflexão mais
profunda para sua adequada utilização (CARNEIRO; GASTAL, 2005).
Segundo Martins (2006) a redução da História da Ciência a esse tipo de
abordagem, no qual, acaba se atendo a datas, nomes e breves narrativas, reforça a
ideia dos gênios e da linearidade do desenvolvimento científico, sendo que, tais
conteúdos muitas vezes são apresentados apenas como curiosidades nos materiais
didáticos (TRINDADE et al., 2010), podendo acarretar na omissão de uma amplitude
de acontecimentos e fatores que certamente influenciaram e influenciam o fazer
científico.
Essa omissão pode levar a uma visão do cientista como alguém
extremamente inteligente e capaz de realizar coisas incríveis o que acarreta,
segundo Martins (2006) a outro equívoco na utilização da História da Ciência que é
o argumento de autoridade, considerando que um conhecimento é tido como
verdadeiro levando-se em conta somente o seu precursor, no qual, os cientistas de
prestígio e influência acabam tendo maior credibilidade de seu trabalho, ou seja,
ocorre uma espécie de crença científica, pois se acredita em algo baseado somente
no prestígio e confiança de quem as formulou. As ideias implícitas em tal
conhecimento acabam não sendo questionadas.
Contrariando a concepção exposta no item XIV: “idéias científicas são
afetadas pelo meio social e histórico no qual são construídas” (EL-HANI, 2006, p.7),
demonstra que a Ciência é influenciada pelo meio histórico e cultural que a cerca
(EL-HANI, 2006). No caso da ausência do contexto histórico mais amplo, exposto
por Carneiro e Gastal (2005) como um aspecto negativo veiculado em muitos livros,
no qual, apenas as passagens históricas resumidas a datas e nomes isolados são
abordadas, sem a discussão dos fatores políticos, sociais e culturais que
influenciaram e influenciam na prática científica. Ou seja, a Ciência é vista como
pronta, acabada, distante da realidade que a cerca.
15
Após essa breve discussão sobre as características da Ciência compartilhada
por diversos pesquisadores e seus principais equívocos, torna-se possível a
exposição da relevância que uma adequada utilização destes conteúdos pode trazer
ao Ensino da mesma e para o desenvolvimento dos alunos.
Uma estratégia defendida por vários autores é a utilização de episódios de
História da Ciência no Ensino podendo ser destacada a seguinte passagem:
A História das Ciências não pode substituir o ensino comum de ciências,
mas pode complementá-la de várias formas. O estudo adequado de alguns
episódios históricos permite compreender as interrelações entre ciência,
tecnologia e sociedade, mostrando que a ciência não é uma coisa isolada e
faz parte de um desenvolvimento histórico, de uma cultura, de um mundo
humano, sofrendo influência e influenciando por sua vez muitos aspectos
da sociedade (MARTINS, 2006, p. XVII-XVIII).
Permitindo a compreensão da Ciência como produção humana, coletiva e
influenciável por diversos fatores: políticos, econômicos, pessoais, culturais,
religiosos entre outros. Esses episódios também auxiliariam aos alunos na
compreensão crítica do desenvolvimento do conhecimento científico e suas
particularidades como competição, controvérsias e debates (CARNEIRO; GASTAL,
2005, MARTINS, 2006; TRINDADE et al., 2010).
Segundo a nova visão do Ensino Médio que prevê um Ensino baseado em
competências e que para atingi-las deve-se desenvolver e trabalhar com habilidades
com os alunos, com relação ao Ensino de Biologia. Umas das competências
assinaladas no PCNEM (Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio),
Contextualização Sócio-Cultural está o desenvolvimento da habilidade de
“compreender o conhecimento científico e o tecnológico como resultados de uma
construção humana, inseridos em um processo histórico e social”, o que inclui uma
percepção dos alunos do conhecimento como algo dependente do contexto ao qual
foram desenvolvidos e análise das teorias e entendimento do desenvolvimento
destas últimas por diversos meios tais como, acumulação, mudança de paradigma
entre outros (BRASIL, 2010).
Evitando desta maneira, a disseminação que Martins (2006) denomina de
visão ingênua ou arrogante da Ciência, ou seja, esta é vista como dona da verdade,
desconsiderando outros conhecimentos, sendo realizada por gênios em detrimento
aos tidos como falsos cientistas que apenas cometem erros.
16
De acordo com El-Hani (2006) a utilização da História da Ciência no Ensino,
auxilia na aprendizagem dos conteúdos científicos, opinião esta compartilhada por
Martins (1998), que acrescenta na própria percepção dos alunos dos significados de
suas dúvidas, já que, algumas questões dos educandos também foram
problemáticas em outros contextos científicos, desta maneira, estas não podem ser
consideradas descabíveis e impertinentes.
Abordando o assunto, Martins (2006) ressalta que a utilização desses
conteúdos pode auxiliar o aluno a perceber sua própria reestruturação conceitual, já
que na História da Ciência há discussão entre hipóteses e muitas vezes
conhecimentos são substituídos por outros mais adequados, ocorrendo debates e
elaboração de alternativas. El-Hani (2006) aborda a necessidade do docente de
relacionar a mudança conceitual (ou reestruturação conceitual de Martins, 2006)
com o próprio processo histórico do desenvolvimento científico.
Desta maneira, ao se ligar estes processos é possível que haja muitas
semelhanças, sendo possível averiguar que o processo de aprendizagem dos
alunos muitas vezes remontam questões do desenvolvimento da Ciência, se
assemelhando em conceitos e formas de solucionar problemas. Perceber essas
semelhanças torna esse processo mais rico e menos frustrante, pois os alunos
podem visualizar que suas dificuldades e conceitos por muitas vezes estavam
presentes em outras épocas, sendo debatidas por outros cientistas e ainda mais,
perceber como o desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e Sociedade fez como
que esses conceitos fossem sendo substituídos por outros ou mesmo alterados ao
longo do tempo e que o mesmo acontece no processo de aprendizagem, no qual,
muitas ideias e concepções iniciais vão se transformando ao longo do estudo,
contato com novas informações e maneiras de análise.
2.2 Livro Didático: algumas considerações
Comtemplando alguns componentes importantes em educação, sem dúvida
os recursos didáticos são de grande relevância no processo de ensino e
aprendizagem. Dentre os mais variados recursos passíveis de análise, o presente
trabalho ressaltará o livro didático. Segundo Lajolo (1996), o livro didático é um
recurso que pode ser usado de forma sistêmica com a finalidade de promover a
17
aprendizagem de certo conhecimento, podendo ser utilizado em cursos e aulas,
sendo elaborado, editado e comercializado com esta finalidade.
Fracalanza e Neto (2003) apresentam pelo menos três formas distintas da
utilização do livro didático: a primeira está relacionada à elaboração das aulas,
prevendo a utilização de diversas coleções didáticas pelo professor para montar seu
material e organizar suas ações em sala. A segunda é a utilização sistêmica do livro
nas aulas, no qual, este pode influenciar na sequência do desenvolvimento dos
conteúdos e atividades realizadas em sala, no caso do profissional realizar as
atividades (experimentais ou não) propostas na coleção escolhida e por último, o
livro é utilizado como fonte bibliográfica em pesquisas realizadas pelos educandos.
Com relação a estas diversas maneiras de utilização dos livros didáticos,
torna-se necessária uma reflexão sobre a real intenção do uso desse material e sua
compatibilidade com seu público alvo – os alunos, ou seja, o livro didático é
elaborado para auxiliar o processo de ensino e aprendizagem de diversos
conhecimentos nas mais variadas áreas. Mas que tipo de concepção de Ensino
estes materiais contém em suas páginas? Pensando sobre esta questão como será
que os conteúdos de História da Ciência são apresentados nos livros didáticos do
Ensino Médio? Para Carneiro e Gastal (2005), um estudo sobre essa questão
demonstrou que muitos livros tratam a Ciência de forma a-histórica, no qual, esta é
vista de maneira descontextualizada dos fatores sociais, econômicos e políticos que
a influenciam.
Porém, ressaltando as ideias presentes no PCN (Parâmetros Curriculares
Nacionais) do Ensino Médio (2000), algumas das competências do Ensino desta
área se referem à compreensão de uma concepção adequada de Ciência e seu
caráter plural e influenciável como se pode verificar na seguinte passagem:
“Compreender o conhecimento científico e o tecnológico como resultados de uma
construção humana, inseridos em um processo histórico e social” (BRASIL, 2000).
Então, por que grande parte dos livros didáticos não segue os preceitos
presentes nos documentos educacionais que visem à divulgação de uma concepção
da Ciência adequada? Segundo Fracalanza e Neto (2003), este fator esta
relacionado à avaliação dos ivros didáticos. Os critérios de avaliação dos mesmos
inscritos no PNLEM/2007 (Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio)
presentes no Catálogo de livros didáticos de Biologia do PNLEM/2009 são de duas
naturezas. Uma eliminatória e outra de qualificação.
18
Os critérios eliminatórios são:
I. Correção e adequação conceituais e das informações básicas: este critério
avalia se a obra didática esta atualizada com os avanços científicos e conceituais da
área de estudo, se há erros conceituais ou de informações básicas e se a dinâmica
dos conceitos na obra leva o aluno a compreender de forma errônea um conceito ou
conhecimento (BRASIL, 2008).
II. Coerência e pertinência metodológicas: aqui se avalia a explicitação e
coerência das escolhas teórico-metodológicas presentes no livro, compatibilidade
entre o que o livro anuncia como escolha teórico-metodológicas e o que realmente
desenvolve, alerta dos riscos nas atividades propostas pela coleção, contribuição
para o desenvolvimento do pensamento crítico, estimulando atividades que
objetivem a compreensão, síntese, análise, planejamento, argumentação e
memorização por parte do educando e contextualização do Ensino (BRASIL, 2008).
III. Preceitos éticos: será eliminada a obra que não respeitar o estado laico de
Ensino, explicitar ideais preconceituosos com relação à cor, etnia, nível sócio-
econômico, opção sexual, gênero, entre outros e que desrespeitem o meio ambiente,
contrarie as legislações de proteção das crianças e adolescentes, estimulando o
consumo a drogas, álcool e outras ações de risco e faça propaganda de serviços e
entidades comerciais (BRASIL, 2008).
Já os critérios de qualificação requerem:
I. Um enfoque nos problemas sociais vigentes, discutindo as questões
referentes às diferenças entre os gêneros, etnias e níveis sócio-econômicos,
valorizando as minorias (BRASIL, 2008)
II. Contenha uma linguagem correta e acessível, em que desenhos, gráficos e
tabelas contenham legendas, créditos e escalas adequadas, possibilitando maior
compreensão do conteúdo exposto, que o texto seja impresso na cor preta e que
títulos e subtítulos sejam apresentados de maneira hierárquica entre outros aspectos
(BRASIL, 2008).
III. Outro critério esta relacionado ao livro do professor. Neste exemplar o (s)
autor (es) da coleção deve (m) orientar o docente quanto a utilização esperada da
obra, sugerir atividades como pesquisas, projetos e jogos, além de tratar sobre
avaliação e instrumentos para tal finalidade, informando os docentes sobre
conhecimentos atualizados que os auxiliem na realização dessas propostas
(BRASIL, 2008).
19
Para Fracalanza e Neto (2003), os critérios eliminatórios dos livros são
baseados no caráter técnico da coleção como ilustrações inadequadas, erros
conceituais ou formas de transmitir, mesmo de maneira indireta, preceitos que
reforcem estereótipos, entre outros aspectos, já os critérios classificatórios requerem
a contextualização dos temas trabalhados na obra, integração entre estes temas,
propostas de atividades práticas e em relação a estas, deve-se prever os possíveis
riscos que os alunos serão expostos e elaborar medidas que visem a redução
destes riscos.
Como se pode observar, estes critérios estão fundamentalmente ligados a
questões técnicas da elaboração e utilização da obra e pouco reflete a real
concepção de Ensino e Ciência proposta e veiculada nos livros. Deste modo,
autores e editores não sofrem um estímulo para refletirem e ajustarem suas obras
aos ideais educacionais presentes no PCN e outros documentos oficiais. De tal
modo que o próprio sistema educacional acaba se contrariando, investindo um
grande volume de recursos1 na compra de livros didáticos que não refletem o seu
ideal de educação (FRACALANZA; NETO, 2003).
Com relação aos conteúdos de História da Ciência os critérios para escolha
dos livros didáticos não explicitam a importância da utilização e apresentação
adequada de tais conteúdos. Este pode ser uma possível causa das questões
apresentadas anteriormente por Carneiro e Gastal (2005), que além desses fatores,
indicam que o problema dos livros didáticos é cíclico, pois os equívocos
apresentados pelos mesmos, com relação aos conteúdos de História da Ciência,
seriam um reflexo dos livros universitários que também apresentam a Ciência de
forma a-histórica, desta maneira os livros didáticos reforçariam a visão de Ciência
veiculada nos livros universitários, demonstrando como os últimos podem influenciar
na formação dos docentes e que de certa forma, poderá se refletir na formação de
atuais e futuros autores de materiais didáticos.
Mas, outras causas para os problemas dos conteúdos de História da Ciência
nos livros didáticos são discutidos por Martins (2006) que ressalta a importância da
elaboração do material didático em relação aos conteúdos de História da Ciência,
por pessoas qualificadas para tal atividade, ou seja, que o resultado (publicação)
1 Segundo dados apresentados pelo FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação o
gasto com o PNLEM/2009 foi de R$ 504.675.101,27 de reais destinados a aquisição, distribuição e controle de qualidade dos livros didáticos (BRASIL, 2011).
20
seja fruto de pesquisas na área, utilizando fontes primárias, porém como o autor
ressalta é de extrema importância que este conteúdo seja trabalhado e elaborado de
maneira a permitir clara e objetiva compreensão por parte dos consumidores
(alunos), sem perder a complexidade que a temática exige.
Além da utilização dos conteúdos de História da Ciência nos materiais
didáticos, estes devem ser elaborados por quem tem conhecimento do assunto, o
que faz pensar em uma construção interdisciplinar das coleções didáticas, visando
melhor abordagem destes conceitos e elaboração de uma dinâmica que traga
benefícios no processo de ensino e aprendizagem de Biologia, propondo atividades
relacionadas a esses conteúdos que permitam maior compreensão sobre a natureza
da Ciência e sua relação e seu impacto na sociedade, ambiente e economia.
Desta maneira, é importante identificar se esses episódios estão presentes
nos livros didáticos e caso estejam, como são apresentados e suas possíveis
consequências à aprendizagem dos alunos. Desta forma, segue uma abordagem
histórica sobre uma das controvérsias relacionadas à Geração Espontânea que teve
como principais atores Pouchet e Pasteur.
Segundo Ferreira (1999 p. 546) em sua terceira edição do Dicionário Aurélio
defini controvérsia como uma “discussão ou debate regular acerca de assunto
literário, artístico, científico, etc” e como “ contestação e polêmica”. O episódio
histórico a seguir reflete justamente este embate de ideias que gerou uma discussão
com duração de cerca de 5 (cinco) anos sobre a origem dos microrganismos
observados em infusões.
2.3 Geração Espontânea: Controvérsia entre Louis Pasteur e Félix. A. Pouchet
Sem dúvida, há vários episódios histórico-científicos possíveis de serem
trabalhados no Ensino de Biologia, ressaltando diversos acontecimentos que
retratam a complexidade do desenvolvimento científico. Entre esses episódios a
questão da Geração Espontânea e a controvérsia entre Félix A. Pouchet2 e Louis
Pasteur 3 podem ser utilizadas.
2 Pouchet, filho de industrial se formou em medicina em 1827 e logo depois se tornou diretor do
Museu de História Natural de Rouen, era membro de diversas sociedades científicas e grande divulgador da Ciência, um de seus livros com grande distribuição foi L’univers (Paris, 1865), além disso, escreveu o livro Histoire des sciences naturelles au moyen age (Paris, 1853) sobre história, em
21
Este episódio retrata uma das inúmeras tentativas da Ciência de elucidar uma
das questões mais importantes e instigantes para o ser humano, “a origem da vida”.
Grande foi o desenvolvimento ao longo do tempo do pensamento humano
relacionado a essa questão.
A crença na Geração Espontânea, ou seja, que os organismos poderiam
surgir sem um ancestral (pais) direto (MARTINS, 2009) é muito antiga, tendo como
alguns representantes da antiguidade Aristóteles (384-322 a.C), Plínio (23-79 d.C),
Avicena (980-1037) entre outros. Mesmo em tempos remotos não se aplicava esta
teoria a todos os organismos, esta só era utilizada para os quais o meio de
reprodução era desconhecido (MARTINS; MARTINS, 1989).
Com o passar do tempo tal teoria foi sendo inutilizada para animais de grande
porte, tal fato, deve-se em grande parte, ao aumento do conhecimento sobre a
reprodução destes, sendo gradativamente restrita a insetos, vermes entre outros.
Com o desenvolvimento e utilização do microscópio á partir da segunda metade do
século XVII e primeiro do século XVIII a discussão a respeito do tema tomou novo
fôlego, na perspectiva de tentar explicar a origem dos microrganismos presentes nas
infusões, pois na época não se conheciam os mecanismos de origem destes
organismos (MARTINS; MARTINS, 1989).
Levando em consideração a utilização do microscópio, Portocarrero (1991)
atenta que no século XIX há o surgimento do estudo da vida sob o ponto de vista
que considerava a vida como a capacidade de certos organismos realizarem
funções como nutrição e reprodução. Esse recurso tecnológico possibilitou a
aplicação prática dessa nova abordagem teórica, em que os seres vivos deixam de
que demonstrava em muitas partes da obra um pensamento independente. Pouchet também realizou estudos a respeito da ovulação humana e concluiu que esta ocorre em um período específico do ciclo menstrual. Apesar de sua grande contribuição científica, Pouchet geralmente é lembrado e veiculado ao debate relacionado à existência ou não da Geração Espontânea, ele escreveu uma obra que trouxe grande discussão no cenário científico à respeito do assunto, Traité de la génération spontanée basée sur l'expérience de nouvelles (Paris, 1859) (CRELLIN, 1981). 3 Pasteur, filho de um antigo soldado de Napoleão, nasceu na região da Jura, França, Em 1827
muda-se para a cidade de Arbois, já em 1839, parte de Arbois para estudar no Colégio Real de Besançon no qual obtém seu diploma de Letras em 1840. Pasteur ingressa em 1843 na École Normale Supérieure de Paris, sendo que em 1845 se forma em Licenciatura em Ciências, continuando seus estudos defende sua tese de doutorado em 1847, esta, era formada de duas partes, uma relativa à Química, tratando sobre a capacidade de saturação do ácido arsenioso e outra em Física, em que tratava de um estudo sobre fenômenos relacionado à polarização rotatória dos líquidos. Durante oito anos após sua tese, Pasteur realizou estudos sobre a dissimetria do ácido tartárico, sendo que estes estudos o levaram a questão da fermentação. Foi neste tema que Pasteur obteve resultados que contrastavam com a Teoria da Geração Espontânea, debatendo assim com Félix A. Pouchet a respeito do assunto. Pasteur morre em 1895 em Villeneuve-l’Etang (GOUVELA-MATOS, 1997).
22
ser o foco das pesquisas científicas, buscando compreender a problemática da vida
na Ciência.
Segundo Martins (2009), a Geração Espontânea envolvia dois tipos de
organismos no século XIX, os microrganismos e os vermes intestinais.
Durante o século XVIII a origem dos vermes intestinais era atribuída à
Geração Espontânea e não se tinha uma conclusão se os mesmos eram a causa ou
sintoma de doenças apresentadas por homens e animais (MARTINS et al., 1997).
Porém, no século XIX estudos de alguns cientistas sobre os vermes levaram a uma
compreensão diferente sobre a origem dos mesmos, sendo que durante o debate de
Pouchet e Pasteur estes já não consideravam a origem dos vermes intestinais como
algo espontâneo (MARTINS, 2009).
Segundo Martins e Martins (1989), outro fator que reacendeu a discussão
sobre o tema foram os resultados favoráveis à Geração Espontânea obtidos em
1745 através de experimentos realizados por Needham (1713-1781)4 que observou
o aparecimento de microrganismos no caldo de carneiro esquentado e colocado em
um frasco fechado com uma tampa de cortiça. Para a época os experimentos de
Neelham foram considerados adequados fortalecendo a Teoria da Geração
Espontânea.
Vinte anos mais tarde o naturalista italiano Spallanzani (1729-1799)5 realiza
ensaios que a princípio confirmam as concepções de Needham, porém, com o
desenvolvimento de seus estudos, este realiza alterações tais como: aumentar o
tempo de fervura para cerca de quarenta e cinco minutos e impedir a entrada de ar
novo. Estas alterações o levaram a obter novos resultados, não sendo mais
observado o surgimento de microrganismos nas infusões. Mesmo com esses
resultados a questão da Geração Espontânea continuou em aberto, pois, segundo
Needham, Spallanzani alterou a “força plástica ou vegetativa” 6 do ar através de
suas alterações experimentais (MARTINS; MARTINS, 1989).
4 John Tuberville Needham padre irlandês que apresentava grande habilidade em microscopia
(MARTINS; MARTINS, 1989). 5 Lazarro Spallanzani foi escolhido em 1780 para inaugurar a Cátedra de História Natural da
Universidade de Pávia, possuindo relações com autoridades austríacas, ao qual, este dedica seu agradecimento pela obtenção de coleções naturais para seu gabinete (PRESTES, 2007 b). Além disso, realizou diversos estudos, entre eles esta a regeneração de animais (minhocas) à partir de estudos anteriores de Charles Bonnet (PRESTES, 2007 a). 6 Needham acreditava que existia na matéria orgânica, ou pelo menos em alguns tipos de matéria
orgânica, uma força geradora de corpúsculos organizados. Segundo o naturalista, o ar possuía essa força, portanto, este acreditava que ao aquecer a solução, Spallanzani tenha alterado a força plástica
23
Discorrendo um pouco mais sobre Spallanzani, este compartilhava de uma
linha de pensamento chamada a “arte de observar” 7 (PRESTES, 2007 b). Em 1768,
após Charles Bonnet (1720-1793) 8 promover uma discussão no meio científico
referente à necessidade de se compreender as implicações dessa “arte de observar”,
sugere-se que o assunto se torne tema do concurso anual realizado pela Sociedade
Real Holandesa de Ciências que premiaria a melhor obra sobre o assunto. O
premiado foi Benjamim Samuel Georges Carrard (1740-1796), porém, outro
concorrente é alvo de atenção, Jean Senebier (1742-1809) que teve sua obra
publicada, pois utilizava exemplos vindos de Spallanzani e outros naturalistas que
considerava de extrema competência, no qual, os novatos em Ciência deveriam se
espelhar (PRESTES, 2006).
Algumas das premissas discutidas na obra de Senebier ressaltam as
qualidades de um bom observador, que, segundo este, necessita de alguns
conhecimentos prévios como Matemática, Química, Física, Artes e Metafísica, além
de possuir qualidades como paciência, perseverança, ceticismo entre outras. Outro
fator importante é a repetição de experimentos, tanto sob condições iguais como
com diferenças. Este mecanismo assume papel de recurso didático, possibilitando a
descoberta de novos resultados e eventuais erros metodológicos (PRESTES, 2006).
Para Spallanzani, a repetição também servia para solucionar conflitos de
ideias e concepções (PRESTES, 2006). Outros fatores que influenciavam o trabalho
de Spallanzani era a importância de um distanciamento de concepções prévias do
objeto de estudo, desta forma, o naturalista acreditava que obteria resultados mais
seguros ao utilizar os sentidos para analisar seu objeto. Spallanzani também
ou vegetativa presente no ar que seria responsável pelo surgimento dos organismos nas soluções pelo excesso de aquecimento (MARTINS; MARTINS, 1989). 7
Spallanzani compreendia a “arte de observar “como o método da observação e experiência, buscando relacionar as questões práticas e teóricas. Para essa corrente filosófica, o cientista deveria possuir algumas qualidades que o permitissem desenvolver seu trabalho de forma adequada, espelhados principalmente, nos estudos de cientistas considerados importantes para a época (PRESTES, 2006; PRESTES , 2007 b). 8 Bonnet, além de instigar a discussão sobre a “arte de obsevar”, também realizou diversos estudos, e
como citado anteriormente, teve influência sobre o trabalho de Spallanzani. Sobre a Teoria da preexistência (pré-formista), Bonnet era mais favorável a uma corrente chamada encaixamento, no qual, ele acreditava que os germes (últimas divisões da matéria organizada), estariam encaixados uns dentro dos outros (porém não infinitamente) e que em condições adequadas, estes se desenvolveriam. Tal corrente, Bonnet relacionou com a regeneração que alguns organismos apresentavam ao terem suas partes seccionadas. Para ele, os germes estariam distribuídos ao longo do corpo do organismo e este, quando cortado apresentaria as condições adequadas ao desenvolvimento dos germes, que seriam responsáveis pela sua regeneração. Porém tal opinião criou novos questionamentos a respeito das características desses germes e as especificidades das regenerações dos organismos, pois, nem toda parte seccionada era regenerada (PRESTES, 2007 a).
24
acreditava na liberdade de influências teóricas, ou seja, sem uma forte interferência
de bases teóricas que influenciassem seu olhar, apesar de não descartar
completamente a importância dos fundamentos teóricos (PRESTES, 2007 b).
Segundo Prestes (2007 b), a questão da influência das questões teóricas
entre os naturalistas do século XVIII, se tratava mais de uma maneira de comprovar
ou não se uma hipótese ou teoria estaria correta através de evidências
experimentais tidas como certas. Desta forma, os naturalistas acusavam-se
mutuamente de realizarem experimentos “contaminados” por suas concepções
teóricas prévias, tendo como conseqüência resultados favoráveis a esses ideais,
não obtendo, um retrato real do fenômeno estudado.
Como foi relatado anteriormente, Spallanzani refez os experimentos de
Needham e ao longo de seu trabalho foi modificando os fatores e obteve resultados
conflitantes, o que reforça sua ligação com a corrente “arte de observar”, pois para
tal visão, a repetição é valorizada. Além do mais, o resultado acabou levando a uma
acusação mútua de inadequações metodológicas ou tomada de partido teórico
prévio para a análise dos resultados de ambos os naturalistas.
Spallanzani também indicou uma concepção teórica prévia de Buffon (1707-
1788) 9 e de Needham sobre a geração dos seres que dava ênfase a Teoria
Epigenética10. Mas o próprio Spallanzani também apresentou alterações em suas
análises o que resultou em equívocos que acabaram colaborando para sua
predileção pela teoria contrária a de Needham, ou seja, a Teoria Preformista11 dos
seres (PRESTES, 2007 b).
Outro fato interessante da história é que por volta de 1771 e 1772 Bonnet
propõe a Spallanzani uma nova maneira de realizar seus experimentos, utilizando
garrafas com o pescoço afilado, retirando todo o ar contido nos frascos através da
fervura da infusão, após essa fervura, os mesmos deveriam ser fechados, sendo
abertos em altas montanhas, permitindo a entrada do ar, observando posteriormente
o que ocorreria, porém Spallanzani não realizou este experimento, o que acabaria
9 Georges-Louis Leclerc de Buffon. Foi criticado por Senebier sendo considerado por este, como um
“naturalista que parte para observação com teorias preconcebidas” (PRESTES, 2006, p. 20). 10
Segundo Wolpert et al. (2008) Aristóteles formulou duas hipóteses para explicar o desenvolvimento dos organismos, uma delas é a Teoria Epigenética, que considera que as estruturas novas vão surgindo durante o desenvolvimento do embrião. 11
Já a Teoria Preformista considera que as estruturas do embrião já estão formadas e apenas crescem com o desenvolvimento (WOLPERT et al., 2008).
25
ocorrendo posteriormente no curso da história, através de outro cientista (MARTINS;
MARTINS, 1989).
Vários cientistas realizaram trabalhos com resultados contra ou a favor da
Geração Espontânea, mas estes não eram conclusivos, pois dependiam do ponto de
vista em que eram analisados, sempre sendo questionados em relação à
contaminação ou não das infusões ou meios de cultura por partículas presentes no
próprio ambiente, nos instrumentos utilizados ou no ar.
No século XIX, mais especificamente em 1859, com a publicação do livro A
Origem das Espécies de Charles Darwin (1809-1872), há um aumento do debate
sobre o Evolucionismo no meio científico e a ideia da Geração Espontânea acaba
sendo vinculada ao Evolucionismo. Apesar dessa vinculação, nem Darwin apoiava a
Geração Espontânea, nem Pouchet era partidário do Evolucionismo, porém ambas
as teorias eram vistas fora do contexto religioso (criacionista) da origem da vida,
embora nenhum dos cientistas tenha declaradamente sido contra essa visão
(MARTINS, 2009).
Para Martins (2009) a partir de então, a Geração Espontânea foi tratada com
cautela pela comunidade científica, ainda mais depois da retomada do poder
Francês através de um golpe de estado aplicado por Louis Bonaparte12 (1808-1873)
que se tornou imperador apoiado pela Igreja Católica e devolve a esta a
responsabilidade da Educação Básica, empregando um governo autoritário e
conservador, no qual, a igreja tinha papel fundamental. Portanto, visões diferentes
da concepção da igreja eram vistas com cuidado, pois poderiam levar a revoluções
sociais que prejudicariam a manutenção da ordem política e social estabelecida.
É nesse contexto científico e político que Pouchet e Pasteur realizam seus
trabalhos a respeito da origem dos seres vivos. Pouchet era médico e diretor do
Museu de História Natural de Rouen (MARTINS, 2009; MARTINS; MARTINS, 1989;
CRELLIN, 1981), e realizou trabalhos sobre a reprodução de animais superiores e é
através deste tema que o cientista começou a estudar a Geração Espontânea
(MARTINS; MARTINS, 1989).
Segundo Martins e Martins (1989), Pouchet era adepto de uma corrente da
Geração Espontânea denominada por Burdach como Heterogenia. Diferente de
outra corrente da Geração Espontânea (abiogênese) que defendia o surgimento da
12
Louis Bonaparte era sobrinho de Napoleão Bonaparte e em 1851 retomou o poder Francês depois de acabar com a Assembleia Constituinte Francesa (MARTINS, 2009).
26
vida a partir da matéria inorgânica a heterogênese defendia que um ser vivo poderia
surgir de substâncias orgânicas, derivadas de outros organismos, originando-se do
resultado da decomposição de plantas e animais ou de infusões provenientes da
fervura de partes desses organismos (MARTINS, 2009; MARTINS; MARTINS, 1989;
GEISON, 1981).
Crellin (1981) acredita que para Pouchet havia a existência de três fatores
essenciais para a Geração Espontânea da vida: a putrefação da matéria orgânia, a
água e o ar que com o auxílio da eletricidade ou luz solar, por exemplo, poderiam
gerar espontaneamente a vida. Segundo o naturalista a luz vermelha geraria proto-
organismos animais e a luz verde proto-organismos vegetais. Sobre o assunto
Pouchet relatou experimentos de outros cientistas que apoiavam a Geração
Espontãnea e relizou experimentos com grande preocupação em relação a
contaminação , obtendo resultados positivos , pois observou o surgimento de
organismos no meio nutritivo, esta posição se deve também a visão de Pouchet a
respeito do ar.
Para Pouchet e outros heterogenistas o ar possuía uma “força plástica ou
vegetativa”13, ou seja, detinha algo (desconhecido) que era capaz de auxiliar na
formação espontânea de vida nas infusões (MARTINS; MARTINS, 1989), além disso,
o ar não era compreendido como meio potencial de contaminação, desta forma, para
ele o ar era livre de germes e esporos responsáveis pela proliferação de organismos
nas infusões (CRELLIN, 1981).
Com relação ao tema, Pouchet e outros pesquisadores realizaram
experimentos sobre a provável contaminação do ar e obtiveram resultados negativos.
Ao analisar uma camada de neve de cerca de cinco centímetros de espessura em
quatro metros quadrados não foi possível constatar uma quantidade considerável de
agentes de contaminação, pois, na lógica de Pouchet, ao cair, a neve traria consigo
os microrganismos presentes no ar, que ao se observar seria possível encontrar
uma elevada quantidade de substâncias e organismos causadores de contaminação,
além disso, se o ar fosse transportador de germes e esporos, acabaria se
enegrecendo (MARTINS; MARTINS, 1989).
13
Para Pouchet, a força plástica ou vegetativa era aquela capaz de permitir que a matéria orgânica
em decomposição se organizasse, formando os organismos observados em seus experimentos (MARTINS; MARTINS, 1989).
27
Diferente da posição exposta anteriormente o químico Pasteur, após realizar
estudos referentes à cristalografia de compostos orgânicos e fermentação, no qual,
acreditava que esta última era resultado da ação fisiológica de organismos
presentes nas soluções, começou a indagar sobre a origem desses organismos
responsáveis pela fermentação, o que o levou ao estudo da Geração Espontânea.
Mas ao longo de seus estudos, começou a discordar da utilização da Geração
Espontânea para explicar a origem dos microrganismos observados e começou a
acreditar que o ar seria o provável agente de contaminação, carregando consigo
organismos responsáveis pelas contaminações das infusões após estas entrarem
em contato com ele, visão esta, denominada Panspermia (MARTINS; MARTINS,
1989; PORTOCARERO, 1991; GEISON, 1981).
Portanto, o ponto fundamental de discordância entre Pasteur e Pouchet é
sobre o papel do ar no aparecimento de microrganismos nas infusões utilizadas em
seus experimentos.
Com estas diferentes interpretações para os resultados obtidos, tanto de
experimentos realizados pelos favoráveis a Geração Espontânea, como os
contrários, chega-se então a um impasse teórico-experimental, pois, se para os
heterogenistas com a presença de água, ar e matéria orgânica em decomposição
sempre se observava o surgimento espontâneo de microrganismos nas infusões,
para os panspermistas na presença do ar, as infusões também apresentariam
microrganismos, por causa da contaminação dos meios nutritivos com esporos e
germes provenientes do ar (MARTINS; MARTINS, 1989).
Segundo Martins e Martins (1989), para resolver este impasse foi
desenvolvida uma nova corrente dentro da Panspermia. A Panspermia Limitada,
explica que nem todo o ar é capaz de contaminar os meios nutritivos e infusões.
Depois de realizar alguns experimentos e observações, Pasteur concluiu que a
quantidade de microrganismos presentes no ar é inversamente proporcional à
altitude, portanto, quanto maior a altitude menos microrganismos seriam
encontrados, pois, o ar seria mais puro em grandes altitudes. Desta maneira,
supera-se um dos empecilhos para a conclusão da problemática da Geração
Espontânea, sendo que a partir de então, poderiam ser realizados estudos que
permitissem uma interpretação mais conclusiva e menos problemática do que vinha
sendo debatido ao longo dos tempos.
28
Seguindo com a história, em 1860 a Academia de Ciências de Paris cria o
Prêmio Alhumbert com valor de 2.500 francos para o vencedor. Uma das prováveis
motivações para elaboração de tal premiação é a grande repercussão dos trabalhos
de Pouchet favoráveis a Geração Espontânea e sua obra Hétérogénie ou Traité de
la Genération Spontanée (1859) que obteve grande repercussão no meio científico.
Nesta obra o naturalista retoma aspectos históricos da questão e descreve
experiências realizadas por ele e outros cientistas que obtiveram resultados
favoráveis a esta teoria (MARTINS; MARTINS, 1989; MARTINS, 2009; CRELLIN,
1981).
Pasteur, Pouchet e seus companheiros Joly e Musset se inscrevem no prêmio
da Academia de Ciências de Paris.
Pasteur realizou diversos experimentos para analisar a importância do ar na
alteração de infusões. Um de seus famosos experimentos consiste no “pescoço de
cisne”, no qual, Pasteur entortava frascos de vidro, formando sinuosidades, com os
frascos abertos, as infusões previamente fervidas permaneciam inalteradas,
indicando que de alguma forma os microrganismos ficavam presos na sinuosidade
do frasco e quando o pescoço era destacado e a solução entrava em contato com o
ar, esta apresentava corpúsculos em pouco tempo de exposição (GEISON, 1981).
De acordo com Geison (1981), Duclaux (1840-1904) 14 sugere que este
método do frasco “pescoço de cisne” teria sido proposto a Pasteur por Balard, e que
Chevreul já teria realizado experimentos semelhantes em aulas de Química, porém,
Pasteur teria aperfeiçoado a utilização da técnica.
Segundo Martins e Martins (1989), Pasteur também teria retomado os
estudos de Spallanzani e acabara realizando os experimentos propostos por Bonnet
à cerca de um século atrás, fazendo o seguinte procedimento:
Com o total de 73 balões contendo até sua terça parte de água de levedo de
cerveja filtrado, límpido e vazios de ar. Os balões foram abertos em diferentes
lugares, sendo 20 abertos ao pé do Monte Jura15 , outros 20 foram abertos em uma
das montanhas com cerca de 850 m de altitude e 20 foram abertos em Montanvert
com cerca de 2.000m de altitude, os frascos restantes não foram abertos. Como
14
E. Duclaux acompanhou os trabalhos de Pasteur e o sucedeu na administração do Instituto Pasteur (FERRAZ, 2008). 15
Monte Jura: um arco de montanhas de 400 km de comprimento e cerca de 80 km de largura entre os vales de Ródano e no Aar inferior, localizado na fronteira da França com a Suíça. Seu cume é de 1.718m (LAROUSSE CULTURAL, 1998 a, p. 3382).
29
resultado dos 20 frascos abertos aos pés do Monte Jura oito apresentaram
microrganismos, já dos 20 abertos em uma das montanhas apenas 5 apresentaram
organismos e dos 20 abertos em Montanvert apenas um se alterou. Tal resultado
colaborou com a concepção da Panspermia Limitada (MARTINS; MARTINS, 1989).
Como exposto anteriormente, essa concepção previa que com o aumento da
altitude se diminuiria a capacidade de contaminação das infusões devido à
diminuição dos microrganismos presentes no ar.
Pouchet responde aos experimentos de Pasteur, realizando juntamente com
seus companheiros experimentos com balões contendo infusão de feno filtrado,
anteriormente fervido e destituído de ar. Os balões foram abertos nos Pirineus
Franceses16, depois no Rencluse e no Monte Maladetta17. Dos 12 frascos utilizados,
4 foram abertos em cada local, sendo que depois de alguns dias se apresentaram
repletos de seres microscópicos. Esse resultado reforçou a visão dos heterogenistas
(MARTINS; MARTINS, 1989).
Desta maneira, ambos os resultados são válidos para a época, não sendo
decisivos para a resolução da problemática. Os heterogenistas acabam sugerindo a
Academia que os experimentos fossem refeitos sobre a observação de uma
comissão. Pasteur e a Academia aceitam a proposta, porém, com o tempo a
instituição acaba não pedindo que Pasteur refaça seus experimentos, aceitando
como válidos os resultados obtidos no Monte Jura, além disso, os membros da
comissão eram declaradamente contra a Geração Espontânea. Com essas e outras
atitudes que beneficiavam Pasteur por parte da Academia os heterogenistas acabam
desistindo do prêmio, sendo este entregue a Pasteur em 1865 (MARTINS, 2009;
MARTINS; MARTINS, 1989).
Como se pode perceber este debate com duração de cerca de 5 anos não
pôs fim a polêmica sobre a Geração Espontânea. Depois desta longa controvérsia
entre Pasteur e Pouchet, o primeiro, anos mais tarde, ainda viria a ser foco de outra
controvérsia sobre o tema com Charlton Bastian (1837-1915)18 , sobre experimentos
utilizando urina e potassa líquida, nos quais, o tempo e temperatura de fervura da
mistura era o ponto de discussão entre os dois cientistas. Para Charlton, Pasteur
16
Pirineus: Ou Pireneus é uma cadeia de montanhas entre a França e a Espanha. Esse se estende mais de 500 km do Mediterrâneo ao Atlântico (LAROUSSE CULTURAL, 1998 c, p. 4626). 17
Monte Maladetta: faz parte dos Pirineus espanhóis, com limites entre os vales de Aragão e Aran. Pico de 3.404m (pico de Aneto) (LAROUSSE CULTURAL, 1998 b, p. 3748). 18
Charlton Bastian , médico escocês (MARTINS, 2009).
30
aquecera excessivamente a potassa a deixando imprópria para o desenvolvimento
das bactérias e para Pasteur, Charlton aquecera por tempo inadequado resultando
no desenvolvimento dos germes e microrganismos presentes nos frascos ou na
potassa (MARTINS, 2009).
Fato este, que indica que o heterogenismo não foi sucumbido pelos
experimentos de Pasteur. De acordo com Martins (2009), muitas pessoas da época
apoiaram Pouchet declarando que a Academia havia sido imparcial. Dentre os que
deram apoio aos heterogenistas, destaca-se o ministro Duruy que autorizou Pouchet
e seus companheiros a realizarem experimentos abertos ao público no anfiteatro da
Faculdade de Medicina, além dos jornalistas da época publicar matérias a favor dos
mesmos (MARTINS; MARTINS, 1989).
Para Gouvela-Matos (1997) a teoria da Geração Espontânea não era algo
fantasioso dos naturalistas de épocas passadas, mas seguia a mesma metodologia
rigorosa, embasada em experimentos e técnicas de pesquisa que permitiam a
manutenção dessa teoria para explicar alguns fenômenos observados ao longo do
tempo de acordo com as condições de conhecimento e tecnologia presentes em
cada época. Martins e Martins (1989) também defendem essa visão acrescentando
que ambos os lados procuravam afirmar suas ideias de acordo com o método
científico, trabalhando com fatos e argumentos.
É justamente o que se espera de uma controvérsia, ou seja, um debate ao
longo do tempo, mas, por estarem inseridos em um contexto científico, ambos os
envolvidos buscaram embasar suas concepções e crenças em resultados obtidos de
experimentos e estudos que fortalecessem seus pontos de vista.
Na época da controvérsia abordada um dos principais fatores para a
discordância entre os resultados obtidos pelos dois cientistas, deve-se aos materiais
utilizados por eles. Pouchet utilizava em seus trabalhos infusão de feno, fervendo-as
por mais de uma hora, porém atualmente sabe-se que mesmo com longos períodos
de fervura da infusão de feno, esta ainda permite o desenvolvimento de
microrganismos depois de resfriada, porém, na época acreditava-se que o
procedimento realizado por Pouchet era adequado para a eliminação dos
organismos, capaz de esterilizar a solução (MARTINS; MARTINS, 1989).
Se atualmente o feno utilizado pelos heterogenistas justifica os resultados
obtidos por estes. Mas o trabalho de Pasteur também é alvo de críticas por parte de
alguns pesquisadores que criticam o fato dele não ter considerado em sua obra a
31
importância da resolução da questão da origem dos vermes e estudos da divisão
celular como fatores que também contribuíram para o questionamento da relevância
da Teoria da Geração Espontânea (GEISON, 1981). Outro ponto discutido é o fato
de Pasteur não ter refeito os experimentos de Pouchet, Joly e Musset. Indicando que
Pasteur replicou apenas os experimentos favoráveis a sua visão. Uma das
explicações para tal atitude é sua pré-concepção favorável a Panspermia, além da
influência de fatores extra-científicos como a religião e seu apoio ao governo a
Napoleão III (MARTINS; MARTINS, 1989).
Apoio este que pode ser constatado no convite feito pelo imperador á Pasteur,
que após ganhar o prêmio da Academia de Ciências, foi chamado a estudar
doenças do vinho, desenvolvendo a técnica denominada pasteurização. A partir de
então, em 1865, a pedido do Ministério da Agricultura, ele realiza estudos sobre
doenças do bicho-da-seda. Após este estudo Pasteur se dedica a pesquisar
doenças de animais como septicemia, gangrena, antrax e cólera em aves, entre
outras Será através destes trabalhos que em 1879 ao retornar de uma viagem de
férias ele irá observar uma cultura atenuada, desenvolvendo posteriormente com
maiores estudos à vacinação de animais e humana (GOUVELA-MATOS, 1997).
Com este breve relato histórico é possível visualizar a riqueza de detalhes e
fatores que influenciam o desenvolvimento científico, demonstrando uma Ciência
dinâmica, influenciável, humana, e como tal, esta sujeita aos sentimentos e sentidos
que nós damos aos diversos fenômenos que nos cercam.
32
3. METODOLOGIA
O presente trabalho trata-se de uma análise documental. De acordo com
Lüdke e André (1986) este é um método eficaz de pesquisa qualitativa, pois,
apresenta baixo custo, necessitando do tempo e disposição do pesquisador na
busca e análise dos documentos de interesse e também é considerada uma técnica
exploratória, pois, permite a investigação de uma temática abrindo caminho para
pesquisas futuras e novos olhares a respeito do problema.
Justamente nesta perspectiva é que este trabalho visa buscar dados
relacionados à apresentação de conteúdos de História da Ciência sobre a temática
da Geração Espontânea em livros didáticos, procurando através da análise dos
mesmos, debater como o tema esta sendo abordado nestes materiais e instigar aos
demais pesquisadores a realizarem novos trabalhos sobre o assunto.
Além das vantagens citadas acima, a análise documental constitui uma fonte
rica e pouco variável de dados, pois em muitos destes materiais as informações
permanecem inalteradas por longos períodos de tempo, permitindo uma
contextualização dos mesmos, ressaltando que para os autores entende-se por
documentos uma ampla gama de materiais tais como leis, cartas, revistas, jornais,
diários, livros entre outros (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
O material analisado é de natureza técnica instrucional, ou seja, relativo ao
Ensino (LÜDKE; ANDRÉ, 1986). Deste modo, optou-se por analisar livros didáticos
do Ensino Médio referentes à disciplina de Biologia. A escolha dos mesmos foi
baseada na listagem apresentada pelo Programa Nacional do Livro Didático para o
Ensino Médio (PNLEM) através de uma busca do último PNLEM divulgado sobre
livros de Biologia na página eletrônica do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE). Obtendo-se como resultado o Catálogo do Programa Nacional do
Livro para o Ensino Médio, Biologia, PNLEM, 2009.
Essa escolha se deve a ampla utilização dos livros aprovados pelo PNLEM
em escolas da rede pública. Segundo dados estatísticos apresentados pelo FNDE o
PNLEM 2009 beneficiou cerca de 7.249.774 alunos da rede pública, indicando desta
forma, a grande veiculação desses materiais no território nacional (BRASIL, 2011).
Por isso, é de extrema importância a análise destes, já que, dependendo da
33
utilização dos mesmos podem ser gerados diferentes impactos na aprendizagem de
alunos da rede pública de nosso país.
Das nove obras apresentadas pelo catálogo, sete foram analisadas. Os dois
livros que não entraram na lista das obras utilizadas neste trabalho devem-se em
primeiro lugar, a discordância do ano listado no catálogo on-line de um dos livros
nas duas Bibliotecas Municipais visitadas, o que devido à falta de tempo não foi
possível ir a outras bibliotecas procurar o livro de Biologia de José Amabis e Gilberto.
R. Martho publicado em 2005 e no outro caso, o livro de Biologia de Oswaldo Frota-
Pessoa de 2005 não constava no catálogo das Bibliotecas Municipais.
A coleta do material foi realizada em duas Bibliotecas Públicas do Município
de São Paulo (Biblioteca Paulo Sérgio Duarte Miliet e Biblioteca Sérgio Buarque de
Holanda) e em uma Escola Estadual de São Paulo.
Os livros analisados foram:
ADOLFO, Augusto; CROZETTA, Marcos; LAGO, Samuel. A formação dos
primeiros seres vivos. In: ____. Biologia. São Paulo: Editora IBEP, V. Único,
2ª Ed. 2005. p. 8-9.
FAVARETTO, José. A; MERCADANTE, Clarinda. A origem da vida e das
células. In: ___. Biologia. São Paulo: Editora Moderna, V. Único, 1ª Ed. 2005.
p. 111-112.
GEWANDSZNAJDER, Fernando; LINHARES, Sérgio. A história dos seres
vivos. In: ___. Biologia. São Paulo: Editora Ática, V. Único, 1ª Ed. 2005. p.
455-456.
JÚNIOR, César. S; SASSON, Sezar. A evolução das moléculas e o
surgimento da vida. In: ___. Biologia. São Paulo: Editora Saraiva V. 1, 8ª Ed.
2005. p. 312-314.
LAURENCE, J. Origem da vida. In: ____. Biologia. São Paulo: Editora Nova
Geração, V. Único, 1ª Ed. 2005. p. 95-98.
LOPES, Sônia; ROSSO, Sérgio. Biologia: visão geral e origem da vida. In:
___. Biologia. São Paulo: Editora Saraiva V. Único, 1ª Ed. 2005. p.15-17.
34
PAULINO. Wilson R. Citologia e Histologia. In:____. Biologia. São Paulo:
Editora Ática, V. Único, 1ª Ed. 2005. p. 38-40.
Para escolha das passagens a serem examinadas, primeiramente os
capítulos dos livros que tratavam sobre a Geração Espontânea/ Origem da Vida
foram lidos e selecionados de acordo com uma unidade de análise formada por
frases (unidade de contexto), esta decisão visa uma melhor compreensão do
contexto em que o conteúdo é apresentado, possibilitando uma análise mais
detalhada com interpretações mais complexas sobre o tema em comparação com
uma unidade composta de palavras (unidade de registro), pois a categorização do
conteúdo por esta última, não permite uma apreciação geral do material, interferindo
em sua interpretação (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
As frases foram agrupadas nas seguintes categorias:
- Abordagem da Geração Espontânea. Nessa categoria, os trechos das obras
que definem Geração Espontânea são descritos, discutindo como os autores
abordam a teoria, sua origem e aplicação no decorrer do desenvolvimento científico.
- Tecnologia e Ciência: Microscópio. Tecnologia e Ciência estão em íntima
relação, sendo que, o desenvolvimento tecnológico pode influenciar o
desenvolvimento científico. Justamente nessa visão, é que neste tópico, foram
descritas as passagens que demonstram como esse recurso interferiu no cenário
científico da época.
- Método Científico. São abordadas frases referentes ao método científico,
que demonstrem a importância ou visão desse fator descrito nas obras.
- Controvérsia entre Pasteur e Pouchet. Aspectos mais específicos sobre a
Controvérsia entre Pasteur e Pouchet encontrados nas obras são descritos e
discutidos nessa categoria.
- Geração Espontânea: Contestação. Discuti-se aqui, como os autores
abordam a questão da contestação ou questionamento da teoria.
- Pasteur como Herói. Nesse tópico são apresentadas passagens que
demonstram a visão de Pasteur presentes nas obras que reforcem um estereótipo.
As frases das respectivas categorias foram organizadas em quadros, como
segue o exemplo contendo:
35
Quadro 5 – Método Científico.
* Numero: será utilizado durante a elaboração da discussão, evitando assim, a repetição da frase. *Passagem: descrição da frase selecionada do livro didático com sua respectiva citação.
A descrição dos resultados foi apresentada juntamente com a discussão dos
mesmos, buscando desta forma, um debate mais profundo sobre os aspectos
levantados, revelando as mensagens escondidas nas entrelinhas, contradições e
outros fatores que possibilitem uma análise complexa do assunto (LÜDKE; ANDRÉ,
1986) e sua implicação na educação de jovens do Ensino Médio, além de evitar a
repetição excessiva dos trechos selecionados.
Em relação ao referencial teórico foi realizada uma busca por
classificação/área de avaliação na base de dados WebQualis sobre artigos
relacionados ao tema e foram utilizados artigos científicos obtidos em revistas da
área de Ensino e História e Filosofia da Ciência, além de livros.
Numero Passagem
1 “Com certeza, Helmont fez esse experimento, faltou a ele conhecimento sobre método científico que o obrigaria a controlar melhor suas investigações, colocando uma camisa em um lugar aberto e outra dentro de uma caixa fechada. Seguramente os resultados teriam sido diferentes! [...]” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.111).
2 “Os casos de geração espontânea descritos no texto ao lado, como o aparecimento de “vermes” no lixo orgânico, representavam conclusões baseadas em observações diretas e na suposição da possibilidade de ocorrência desses fenômenos; não eram conclusões testadas cientificamente por experimentos controlados. Se assim fossem, sabe-se hoje, tais conclusões teriam sido completamente diferentes” (PAULINO, 2005, p. 38).
36
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Alguns aspectos apresentados por documentos educacionais brasileiros
reforçam a importância de um Ensino adequado da compreensão da natureza da
Ciência, como a Lei de Diretrizes e Bases N. 9.394 (BRASIL, 2010).
De acordo com o PCN e PCNEM essa compreensão deve abarcar uma visão
de Ciência como uma construção do conhecimento humano, que está inserida em
um contexto Histórico e Cultural (BRASIL, 2000; BRASIL, 2010). Portanto, é
necessário entender que a Ciência como produção humana é influenciada por uma
série de fatores, como a tecnologia, sociedade, cultura, religião entre outros
(CARNEIRO; GASTAL, 2005; MARTINS, 2006; TRINDADE et al., 2010).
Desta forma, como os livros didáticos apresentam grande importância no
Ensino, deve-se analisar e refletir de forma mais adequada, como esses recursos
abordam, mesmo de maneira indireta sobre a natureza e características da Ciência.
O livro didático pode ser utilizado para uma grande gama de ações
relacionadas ao Ensino. Fracalanza e Neto (2003) discutem algumas das formas
como os docentes utilizam esse material, enfatizando que este pode ser utilizado
para elaboração de aulas e palestras, ou utilizado de forma sistemática durante as
aulas, no qual, os alunos realizam leituras e atividades propostas na obra e por
último, esse recurso pode ser utilizado como fonte bibliográfica em pesquisas
realizadas pelos estudantes. Portanto, esse importante recurso pode influenciar a
prática educacional, sendo necessária uma adequada análise e reflexão sobre como
as obras abordam os diferentes conteúdos.
A presente análise de material didático visa averiguar como conteúdos
relacionados à História da Ciência no recorte da Geração Espontânea estão sendo
abordados nesses materiais. Segundo Martins (2006), a utilização da História da
Ciência pode facilitar a compreensão dos educandos da interação entre a Ciência,
tecnologia e sociedade.
Para Martins (2006), Carneiro e Gastal (2005) e Trindade et al. (2010) a
religião, questões culturais e históricas influenciam e influenciaram os trabalhos dos
cientistas das mais variadas épocas e culturas. Além disso, El-Hani (2006) cita a
importância da tecnologia, pois avanços científicos permitem o desenvolvimento da
37
tecnologia, do mesmo modo que, avanços tecnológicos, permitem um novo olhar e
abertura para novas questões a serem feitas e pesquisadas pela Ciência.
Outros pontos positivos que a utilização adequada desses conteúdos pode
trazer é a identificação dos alunos com a Biologia, pois, analisando as passagens
históricas, os alunos podem identificar suas dúvidas e conceitos presentes nos
trabalhos e entendimento de cientistas das mais variadas épocas, portanto, podem
auxiliar na compreensão de conteúdos conceituais, atitudinais e procedimentais da
Ciência (El-HANI, 2006; MARTINS, 1998).
Propiciando a percepção dos alunos de sua própria reestruturação conceitual
ou mudança conceitual, pois, ao conhecer o caráter dinâmico da Ciência, a
importância da elaboração de hipóteses para explicar um fenômeno e meios de criar
dados e argumentos à favor de sua hipótese, pode-se incentivar a reflexão dos
estudantes pelos conteúdos, análise crítica, importância de fundamentar suas
opiniões e não ficarem apenas no “achismo”. Incentivando um Ensino que vise uma
compreensão da Ciência não como algo estático e inquestionável (EL-HANI, 2006;
MARTINS 2006).
Deste modo, a correta utilização de passagens da História da Ciência pode
ter um papel benéfico no Ensino. Por isso, serão abordadas a seguir, as passagens
selecionadas dos livros didáticos analisados, visando uma compreensão de como
esses conteúdos são abordados nesses materiais e suas principais implicações no
Ensino de Biologia.
Desta forma, a discussão será iniciada com a análise de como a Teoria da
Geração Espontânea é abordada e discutida nos livros selecionados. Martins (2009)
descreve que tal teoria é baseada na hipótese do surgimento de organismos sem a
necessidade de um pai (ancestral) direto. Desde a antiguidade, nomes como
Aristóteles, Plínio entre outros já compreendiam que tal hipótese não se aplicava a
geração de todos os organismos, sendo que essa explicação só era aplicada
quando não se conhecia o meio de reprodução (MARTINS; MARTINS, 1989).
Portanto, há muito tempo, essa teoria não se aplicava a origem de todos os
organismos. Ao analisarmos a passagem número 6 do quadro a seguir (Quadro1),
Notamos que a obra relata o quanto tal teoria é antiga, descrevendo que “Na Grécia
antiga, há mais de 2000 anos, o filósofo grego Aristóteles acreditava que os seres
vivos poderiam surgir a partir de matérias inanimadas e de forma espontânea [...]”,
porém, ao falar sobre Aristóteles, essa não relata que, mesmo na época de tal
38
filósofo, já se sabia que a Geração Espontânea não se aplicava ao surgimento de
todos os organismos. Dentro dessa questão apenas a passagem número 7 (Quadro
1) apresenta a questão da falta de conhecimento dos meios de reprodução como
aspecto favorável a crença da Geração Espontânea “[...] o fato de aparecerem
larvas de insetos sobre o lixo, idéia de que as larvas teriam “brotado” do lixo (não se
conhecia, na época, os detalhes da reprodução dos insetos) [...]”. De acordo com
Martins e Martins (1989) inicialmente a Geração espontânea abarcava o surgimento
de vermes, insetos e alguns animais como peixes e salamandras, porém com o
tempo, tal teoria se restringiu a origem de insetos e vermes. Porém, muitas das
obras que retratam a teoria da Geração Espontânea para explicar a origem de
animais como ratos, cobras e crocodilos como representados nas passagens
número: 2,3,5 e 6 (Quadro1) não discutem como tal teoria teve sua utilização
alterada ao longo dos tempos.
Outro ponto com grande adesão entre obras é a ideia que a Geração
Espontânea significa a origem da vida através de matéria bruta, inanimada, como
demonstra as passagens número, 2, 3, 4,6 e 7 (Quadro1).
A Teoria da Geração Espontânea apresenta duas correntes: a primeira é a
Abiogênese, no qual, acreditava no surgimento dos organismos por meio de matéria
bruta e outra, a Heterogênese que acreditava no surgimento dos organismos através
da decomposição de plantas e animais e utilização de infusões de partes de
organismos, ou seja, defendia que certos organismos só se originariam através de
substâncias orgânicas (MARTINS, 2009; MARTINS; MARTINS, 1989; GEISON,
1981). Desta maneira, as obras não retratam tal peculiaridade da teoria, sendo a
Abiogênese a corrente amplamente disseminada nas obras.
Quadro 1 – Abordagem da Geração Espontânea.
Número Passagem
1 “Outro fato interessante e que também foi interpretado erradamente por muito tempo é o de que sapos, serpentes e outros animais poderiam surgir do lodo deixado nas margens dos rios, quando estes voltavam ao leito normal após as enchentes. Acreditava-se que o lodo se transformava nesses animais!” (LAURENCE, 2005, p. 96).
2
“Uma das primeiras hipóteses acerca da origem da vida foi a geração espontânea ou abiogênese (a= sem, bio = vida, gênese = origem), segundo a
39
qual a vida poderia surgir da matéria sem vida. Essa hipótese era supostamente comprovada pelo surgimento de moscas na carne em decomposição, de ratos em trapos sujos, etc” (GEWANDSZNAJDER; LINHARES, 2005, p. 455).
3 “Até meados do século XIX os cientistas acreditavam que os seres vivos eram gerados espontaneamente a partir da matéria bruta. Acreditavam que vermes surgiam espontaneamente do corpo de cadáveres em decomposição, que rãs, cobras e crocodilos eram gerados a partir do lodo dos rios” (LOPES; ROSSO, 2005, p. 15).
4 “[...] Até o século XIX, imaginava-se que os seres vivos poderiam surgir não só do cruzamento entre si, mas também a partir da matéria bruta ou inanimada, de uma forma espontânea. Essa idéia, proposta há mais de 2000 anos por Aristóteles (figura 9.1), era conhecida por geração espontânea ou abiogênese [...]” (PAULINO, 2005, p. 38).
5 “Hoje certas afirmações podem parecer estranhas, contudo, até “receitas” para a produção de animais foram propostas. Jean Baptiste Van Helmont (figura 1 a), biólogo, que realizou importantes pesquisas de fisiologia vegetal, ensinava a produzir camundongos com uma camisa suja, guardada com grãos de trigo em um local tranqüilo, para que pudesse sofrer a ação do princípio ativo ( que segundo ele, estaria no suor humano)” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p. 111).
6 “Na Grécia antiga, há mais de 2000 anos, o filósofo grego Aristóteles acreditava que os seres vivos poderiam surgir a partir de matérias inanimadas e de forma espontânea. Essa hipótese ficou conhecida como geração espontânea [...]”. “Segundo Van Helmont, bastava colocar em um canto sombrio e escuro camisas suadas, espalhando sobre elas grãos de trigo e no final de 21 dias surgiriam ratos” (ADOLFO; CROZETA; LAGO, 2005, p. 8-9).
7 “Também conhecida como abiogênese, essa teoria existe pelo menos desde Aristóteles. De acordo com ela, a vida poderia surgir espontaneamente e continuamente da matéria bruta. Algumas observações feitas por pessoas comuns no dia-a-dia pareciam reforçar essa idéias: o fato de aparecerem larvas de insetos sobre o lixo, idéia de que as larvas teriam “brotado” do lixo (não se conhecia, na época, os detalhes da reprodução dos insetos). A circunstância de girinos surgirem na água de uma poça, de um dia para o outro, parecia ser a prova de que tinham se originado diretamente da lama da poça [...]” (JÚNIOR; SASSON, 2005, p. 312).
A passagem número 3 (Quadro 1) retrata um dos fatores que influenciaram o
questionamento da Geração Espontânea “[...]acreditavam que vermes surgiam
espontaneamente do corpo de cadáveres em decomposição [...]”. A resolução da
origem dos vermes intestinais. Durante o século XVII atribuía-se a origem dos
40
mesmos a algo espontâneo, porém, pesquisas científicas realizadas no início do
século XIX demonstraram os mecanismos responsáveis pela origem de tais
organismos, servindo como reforço ao questionamento da Geração Espontânea
(MARTINS et al., 1997). Outros estudos importantes que também ajudaram nesse
aspecto foi o aumento do conhecimento sobre a divisão celular (GEISON, 1981).
Conhecer melhor a divisão celular, possivelmente auxiliou na compreensão
da origem de muitos organismos. Apesar de tal avanço não ser conciso o suficiente
para afastar a crença na Geração Espontânea de uma ampla gama de seres.
Com o desenvolvimento e ampliação da utilização do microscópio, ao
observar uma amplitude de microrganismos até então desconhecidos, os cientistas
se questionaram sobre a origem de tais seres, reascendendo a discussão sobre a
Geração Espontânea e sua possível utilização para explicar a origem de tais
organismos (MARTINS; MARTINS, 1989). Nesse enfoque é que passagens
relacionadas a importância do microscópio na questão da Geração Espontânea
foram reunidas no Quadro 2 a seguir.
Quadro 2 – Tecnologia e Ciência: Microscópio.
Número Passagem
1 “[...] o naturalista holandês Anton Leeuwenhoek (1632-1723) aperfeiçoou o microscópio e descobriu um novo mundo: o mundo dos microrganismos. Nessa época, ninguém supunha que formas relativamente tão simples de vida tivessem seus próprios métodos de reprodução [...]” (PAULINO, 2005, p. 39).
2 “Quando os microrganismos foram descobertos, depois da construção do microscópio, representaram mais um argumento a favor da geração espontânea: não se podia imaginar que seres tão simples pudessem possuir qualquer método de reprodução” (JÚNIOR; SASSON, 2005, p.312).
3 “Os experimentos de Redi conseguiram reforçar a hipótese da biogênese até a descoberta dos seres microscópicos, quando uma parte dos cientistas passou novamente a considerar a hipótese da abiogênese para explicar a origem desses seres [...]” (LOPES; ROSSO, 2005, p.16).
4 “Às vezes, avanços tecnológicos reforçam idéias falsas. Isso ocorreu com a invenção do microscópio: quando os pesquisadores viram, em uma gota de água, grande quantidade de seres minúsculos, acharam-nos muito insignificante para que pudessem se reproduzir. Julgaram que só poderiam aumentar em número por abiogênese!” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p. 111).
41
De acordo com El-Hani (2006) a Ciência e a Tecnologia apresentam uma
íntima relação, tendo impacto mútuo. Desta forma, avanços tecnológicos podem
abrir novos caminhos à Ciência. Tal característica é discutida por Portocarrero (1991)
que relata a importância do desenvolvimento e utilização do microscópio para a
Ciência do século XIX. Segundo a autora, o foco das pesquisas realizadas
anteriormente ao recurso, eram os seres vivos, sendo que com a observação dos
microrganismos por intermédio do microscópio incentivou e possibilitou uma
abordagem prática de uma nova questão: “a vida”. Tal tema passa a ser o centro
das atenções, no qual, muitos estudiosos passaram a se perguntar como tais
organismos se originavam.
Para compreender sobre a vida, os cientistas buscaram conhecer melhor
fatores relacionados à questão como os meios de nutrição e reprodução dos seres,
fatores estes que na época eram considerados como cruciais para diferenciação dos
seres vivos dos seres inanimados (PORTOCARRERO, 1991). Porém, como os
microrganismos (seres tão diminutos) poderiam apresentar mecanismos de
reprodução? Essa dúvida gerou várias discuções e para alguns cientistas, a
Geração Espontânea seria uma teoria que serviria para explicar a origem desses
seres (MARTINS; MARTINS, 1989).
Ao analisarmos as passagens, pode-se observar de maneira geral que com
relação à importância desse recurso tecnológico na temática da Geração
Espontânea as passagens 1 a 3 (Quadro 2) discutem de forma mais adequada,
porém, com ressalvas. A passagem 1 em conjunto com a 2 abordam a questão de
modo um descontextualizado, pois os cientistas apesar de não conhecerem
profundamente os mecanismos de origem e reprodução de tais organismos, estes
obtinham bases teóricas que pudessem auxiliar na compreensão dessas novas
observações , tal como a Geração Espontânea entre outras. Fato esse que é
abordado na passagem 3, que demonstra justamente que com o advento de novos
recursos e possibilidades de observações de novos fenômenos, as interpretações
são influenciadas pelas teorias vigentes.
Com relação a esse aspecto, El-Hani (2006) discute que as observações não
são independentes de expectativas teóricas, de modo que, ao observar esses
organismos, a teoria da Geração Espontânea pode ter feito sentido para explicar a
origem dos mesmos para alguns cientistas.
42
Justamente pelas ideias expostas é que a passagem 4 (Quadro 2)
apresentam uma inadequação, ao citar que “as vezes, avanços tecnológicos
reforçam idéias falsas [...]” a obra desconsidera o fato que na época a teoria da
Geração Espontânea apresentava maior importância no cenário científico do que
atualmente, portanto, não é correto citar que tal acontecimento reforçava uma visão
teórica inadequada.
Além disso, a passagem também revela uma visão de ciência pronta e
acabada, ao citar que os cientistas “julgaram que só poderiam aumentar em número
por abiogênese [...]”, a obra reforça uma visão de consensualidade no meio científico,
fator esse criticado por Martins (2006) e Carneiro e Gastal (2005) no qual, as autoras
discutem a interação existente no meio científico, no qual, ocorrem debates,
controvérsias, discordâncias e outras relações que influenciam pesquisas em
diversas áreas. Tais autoras criticam uma abordagem em materiais didáticos que
reforcem a consensualidade, pois tal visão equivocada incentiva a estereotipagem
na Ciência, no qual visões ou correntes teóricas seriam mais adequadas do que
outras. Já que como citado anteriormente, a interpretação dos dados influencia e é
influenciada por aspectos teóricos e no meio científico não há uma unanimidade
quanto a preferências teóricas e fatores como política, religião, cultura entre outros
podem influenciar o fazer científico, (CARNEIRO; GASTAL, 2005, MARTINS, 2006,
TRINDADE et al., 2010; EL-HANI, 2006).Dificilmente se terá uma opinião unânime
entre todos os participantes da comunidade científica em relação a um tema.
Um dos pontos de grande impasse entre os cientistas e seus pontos de vista
é em relação a metodologia empregada por cada um e como as questões teóricas
influenciam tal fator. Sobre o tema, reunimos no Quadro 3, passagens relacionadas
ao método científico.
El-Hani (2006) defende o pluralismo metodológico, enfatizando a importância
de não se ver o método científico com uma visão empírico-indutivista,
desconsiderando as bases teóricas, pois, apesar da Ciência requerer registro de
dados, evidências, replicação de experimentos, estes não são independentes dos
fundamentos teóricos. O autor também salienta o cuidado com o reducionismo
experimentalista, é fato que as experiências são importantes, porém deve-se tomar
cuidado ao considerar apenas o experimento como forma de refutar uma teoria ou
hipótese.
43
Como é defendido por Martins (2006) e El-Hani (2006) não há um método fixo,
com sequências a serem realizadas. Deste modo, ao analisar as passagens (Quadro
3) a seguir, pode-se averiguar que:
Quadro 3 – Método Científico.
Numero Passagem
1 “Com certeza, Helmont fez esse experimento, faltou a ele conhecimento sobre método científico que o obrigaria a controlar melhor suas investigações, colocando uma camisa em um lugar aberto e outra dentro de uma caixa fechada. Seguramente os resultados teriam sido diferentes! [...]” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.111).
2 “Os casos de geração espontânea descritos no texto ao lado, como o aparecimento de “vermes” no lixo orgânico, representavam conclusões baseadas em observações diretas e na suposição da possibilidade de ocorrência desses fenômenos; não eram conclusões testadas cientificamente por experimentos controlados. Se assim fossem, sabe-se hoje, tais conclusões teriam sido completamente diferentes” (PAULINO, 2005, p. 38).
Na passagem número 1 (Quadro 3), ao citar que faltou a Helmont
conhecimento sobre método científico, para controlar melhor suas investigações,
indica que tal cientista deveria realizar seus experimentos com duas variáveis (local
aberto e fechado). Talvez em tais condições realmente Helmont pudesse ter
observado um resultado diferente do que este relatou, porém como indicado por El-
Hani (2006) apesar de o conhecimento científico ser significativamente dependente
da observação, da evidência, também está sujeito a outros fatores.
A passagem número 2 (Quadro 3) também evidencia a importância dos
experimentos no fazer científico. Tal aspecto é importante, afinal, os resultados de
experimentos podem reforçar ou não uma hipótese. Porém Martins (2006) defende a
importância de se compreender a Ciência não apenas como o resultado de um
método pré-estabelecido.
Há fatores como a curiosidade, tecnologia, cultura entre outros que estão
envolvidos na atividade dos cientistas (MARTINS, 2006; EL-HANI, 2006).
Porém ambas as passagens defendem que se os cientistas tivessem
realizado seus experimentos utilizando mais variáveis ou observando alguns
preceitos metodológicos, seus resultados certamente seriam diferenciados, porém,
tal fato depende da interpretação que se da ao resultado. Como aconteceu com a
44
questão da Geração Espontânea, para os heterogenistas existia uma força vital no
ar responsável pelo surgimento de microrganismos nas infusões (CRELLIN, 1981),
Já para panspermistas o ar continha germes responsáveis pela contaminação das
infusões e consequentemente o surgimento de organismos em tais soluções
(MARTINS; MARTINS, 1989).
Como é possível observar, a interpretação que ambas as correntes davam ao
papel do ar no desenvolvimento de microrganismos diferenciava a interpretação de
seus resultados, portanto, não é possível garantir que na época esses cientistas
abordados nas obras didáticas, mesmo obtendo resultados diferentes não
interpretariam seus resultados de acordo com suas visões teóricas, influenciados por
fatores sociais, culturais entre outros.
Fato esse que também interfere na questão a seguir. O Quadro 4, ilustra as
passagens encontradas em livros didáticos à respeito da controvérsia entre Pasteur
e Pouchet à respeito da Geração Espontânea.
Quadro 4 – Controvérsia entre Pasteur e Pouchet.
Número Passagem
1 “[...] Todavia, para o pensamento dominante na época, a geração espontânea era algo tão evidente que não tinha de ser testado. Isso ilustra uma questão relacionada aos trabalhos científicos: os preconceitos e suposições dos cientistas a respeito do assunto sobre o qual estão investigando, podem influenciar o método de execução dos experimentos e sua interpretação” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p. 111). “Mudanças em conceitos antigos são lentas. A contestação apresentada por Needham foi suficiente para derrubar os resultados convincentes (pelo menos pra nós, atualmente) dos trabalhos de Spallanzani” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.112). “Em 1859, o cientista francês Félix Pouchet publicou uma extensa obra, reunindo os argumentos que lhe pareciam mais conclusivos em defesa da hipótese da abiogênese. A questão tornava-se tão intrincada, irritante e passional que, em 1860, a Academia de Ciências de Paris instituiu um prêmio para o pesquisador que realizasse experimentos esclarecedores sobre a questão” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.112).
Como se pode observar apenas o livro de Favaretto e Mercadante, 2005
descreve algo mais específico sobre a controvérsia entre os cientistas. Porém, logo
de início ao analisarmos as frases selecionadas da obra, pode-se perceber que ao
relatar que a Teoria da Geração Espontânea era tão evidente que não tinha como
ser testada, se constata um aspecto errôneo. Como já foi apresentada, a teoria só
45
era aplicada para explicar a origem de organismos ao quais os mecanismos de
reprodução eram desconhecidos.
Já ao citar que Nedham derrubou os argumentos expostos por Spallanzani, é
sabido que a história não foi exatamente desta maneira. Inicialmente Spallanzani
refez os experimentos de Nedham, porém, com o tempo foi alterando as variáveis,
pois, esse cientista fazia parte de uma corrente teórica chamada à “arte de observar”
que valorizava a repetição dos experimentos, até como uma forma de averiguar sua
veracidade e eventualmente achar algum erro metodológico (PRESTES, 2006).
Spallanzani obteve resultados diferentes dos de Nedham e este contestou
alegando que Spallanzani alterou a força vital do ar em seu experimento, por isso,
os microrganismos não foram observados. Prestes (2007 b) relata que na época a
predisposição teórica era um argumento que muitos cientistas utilizavam para
contestar experimentos com resultados contrários, alegando que as predileções
teóricas contaminavam o experimento.
Certamente a concepção da Geração Espontânea durou muito tempo, mas ao
longo desse tempo sua utilidade e preceitos foram sendo alterados.
Como é expresso na passagem 1 ao dizer que Pouchet publicou uma extensa
obra que apresentava argumentos a favor da Geração Espontânea, reflete a
verdade. De acordo com Martins (2009) Crellin (1981) e Martins e Martins (1989) o
livro Hétérogénie ou Traité de la Genération Spontanée (1859) teve grande impacto
na época, reforçando a Geração Espontânea. Acredita-se que foi por causa dessa
repercussão que a Academia de Ciências de Paris tenha criado o Prêmio Alhumbert
para premiar o cientista que conseguisse resolver a questão da origem dos
microrganismos em infusões.
Na época da criação do prêmio, o governo francês estava sobre a
responsabilidade de Louis Bonaparte, que retomou o poder através de um Golpe de
Estado, com esse fato, o novo governo tem características conservadoras e
autoritárias, dando maior ênfase ao papel da Igreja Católica na educação, desta
forma, visões tidas como anti criacionistas eram discutidas e vistas com cautela, pois,
poderiam incentivar revoluções sociais (MARTINS, 2009).
A Geração Espontânea foi associada à Teoria da Evolução de Charles Darwin,
porém ambos os cientistas não eram declaradamente anti criacionistas e nem
apresentavam uma relação entre eles. Por esse motivo, a Geração era vista com
cautela durante o século XIX (MARTINS, 2009).
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Pasteur realizou experimentos sobre a fermentação, concluindo que esta era
resultado da atividade fisiológica dos microrganismos presentes na solução. Esse
fato acabou levando de forma natural a Pasteur estudar sobre a Geração
Espontânea (PORTOCARRERO, 1991; GEISON, 1981) e acabou se convencendo
sobre o papel do ar na contaminação das infusões, tomando partido da Panspermia
limitada (MARTINS; MARTINS, 1989).
Desta maneira, Pasteur, Pouchet e seus companheiros se inscreveram no
prêmio, porém durante suas atividades e experimentos, observou-se uma tendência
da Academia em apoiar Pasteur, os participantes da comissão, não quiseram refazer
os experimentos e consideraram válidos os resultados de Pasteur em seus
experimentos no Monte Jura e em Montanvert. Pouchet e seus companheiros
realizaram seus experimentos nos Pirineus Franceses, Rencluse e Monte Maladetta.
Os resultados de ambos foram favoráveis as suas expectativas teóricas, portanto,
não eram conclusivos, porém o prêmio foi entregue a Pasteur em 1885 (MARTINS,
2009; MARTINS; MARTINS, 1989).
Como pode-se observar tal recorte histórico é influenciado por diversos
fatores e é muito complexo, desta forma, ao descrever que “a questão tornava-se
tão intrincada, irritante e passional que, em 1860, a Academia de Ciências de Paris
instituiu um prêmio para o pesquisador que realizasse experimentos esclarecedores
sobre a questão” (Quadro 4). Tal passagem da a entender que Pouchet estava
defendendo uma hipótese errada que deveria ser substituída por uma visão correta.
Percebe-se também a questão dos “vilões e mocinhos” da história.
Martins (2006) entende por gênios pessoas com grande inteligência capazes
de realizar coisas incríveis, ou seja, que deixam seus sentimentos, emoções, para
dar espaço a pura racionalidade e lógica. Portanto ao descrever Pouchet como
alguém passional parece que tal cientista não tem o perfil de um gênio, que passa
por cima de sua natureza humana para dar lugar a uma verdadeira super máquina
de raciocínios e formulação de idéias livres de quaisquer outros fatores.
Porém, como defende Gouvela Matos (1997) e Martins e Martins (1989) tanto
Pasteur como Pouchet seguiam uma metodologia científica, utilizando técnicas e
experimentos que reforçavam seus pontos de vista. Trabalhavam com fatos e
argumentos. Portanto, não é adequado dizer que a atitude e trabalhos de Pouchet e
seus companheiros eram baseadas em suas passionalidades, como se estes
tivessem uma idéia fixa e teimavam em defender uma teoria errada.
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Não foi a premiação de Pasteur que colocou um ponto final na Geração
Espontânea. As passagens a seguir (Quadro 5) reúnem as frases selecionadas que
demonstram como os livros didáticos apresentam os resultados de Pasteur e sua
repercussão na comunidade científica.
Quadro 5 – Geração Espontânea: Contestação
Número Passagem
1 “[...] Tal hipótese – conhecida por abiogênese ou geração espontânea – só foi definitivamente abandonada no século XIX“ (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p. 111). “Pasteur foi contemplado com o prêmio da Academia de Ciências. A partir de então, os critérios da biogênese calaram-se” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p. 112).
2 “[...] A partir dos experimentos de Pasteur, a teoria da abiogênese foi praticamente eliminada e, nos dias atuais, está excluída dos meios científicos” (PAULINO, 2005. p. 40).
3 “Realmente, a partir daí, a abiogênese caiu em descrédito completo, triunfando definitivamente a idéia da biogênese” (ADOLFO; CROZETA; LAGO, 2005, p. 9).
4 “A hipótese da biogênese passou, a partir de então, a ser aceita universalmente pelos cientistas” (LOPES; ROSSO, 2005. Pg. 17).
5 “Com esse experimento Pasteur ganhou adeptos para a teoria da biogênese, negando a idéia de geração espontânea” (LAURENCE, 2005, p.98).
6 “... Estava definitivamente derrubada a teoria da geração espontânea...” (GEWANDSZNAJDER; LINHARES, 2005, p. 455).
Nas passagens descritas no quadro acima se podem averiguar a presença de
palavras e expressões como “derrubada, negando, descrédito completo, excluída
dos meios científicos, definitivamente abandonada” (Quadro 5) ao se referirem a
Teoria da Geração Espontânea, dessa forma, reforça-se a opinião de os resultados
obtidos por Pasteur definitivamente teriam extinguido a Geração Espontânea.
Segundo Martins e Martins (1989) e Martins (2009) na época da controvérsia
entre Pasteur e Pouchet, parte da população apoiou Pouchet, questionando a
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imparcialidade da Academia, fato este em que a imprensa da época também focou.
Portanto, a Geração Espontânea não foi aniquilada, vários cientistas continuaram a
aplicá-la e Pouchet e seus companheiros receberam apoio do Ministro Duruy para
realizarem seus experimentos em público, possibilitando a disseminação de seus
pontos de vista, já que ambos os experimentos, tanto os de Pasteur como os de
Pouchet apresentaram resultados positivos.
Outro fator importante é que anos mais tarde, Pasteur se envolveu em uma
nova controvérsia sobre o tema, mas dessa vez foi com o médico escocês Charlton
Bastian, em seus experimentos, eles utilizavam urina e potassa líquida, sendo o
tempo de aquecimento da solução era o ponto de discordância entre os cientistas.
De acordo com Charlton, Pasteur aquecia demasiadamente a solução, impedindo o
desenvolvimento das bactérias na solução, já para Pasteur, Charlton não aquecia
em tempo adequado, possibilitando o desenvolvimento das bactérias na solução
(Martins, 2009).
Apesar da imparcialidade da Academia de Ciências e implicações políticas,
culturais entre outras, a comunidade científica não aboliu a Teoria da Geração
Espontânea.
Desta forma, levando em consideração a importância e repercussão dos
trabalhos de Pasteur, alguns autores apresentam críticas a sua atuação. O primeiro
ponto, é que Pasteur não replicou os experimentos de Pouchet e seus companheiros,
além disso, aponta que Pasteur apenas refazia os experimentos que eram
favoráveis a sua teoria (MARTINS; MARTINS, 1989).
Deste modo, não seria adequado apresentar Pasteur como um gênio nas
obras didáticas, porém, não é isso que se observa. No Quadro 6 abaixo, segue as
passagens selecionadas que valorizam demasiadamente o trabalho desse cientista,
deixando de expor os muitos fatores envolvidos em sua história.
Quadro 6 – Pasteur como herói.
Número Passagem
1 “[...] Isso aconteceu graças aos trabalhos de um cientista francês, Louis Pasteur, que conseguiu negar a abiogênese e provar a hipótese da biogênese [...]” (LAURENCE, 2005, p. 97).
2 “[...] Foi o francês Louis Pasteur quem conseguiu derrubar essa teoria, de forma
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definitiva, por meio de alguns experimentos simples” (JÚNIOR; SASSON, 2005, p. 313).
3 “[...] Louis Pasteur conseguiu derrubar a teoria da abiogênese, com um experimento para o qual usou balões de vidro e caldo de carne esterilizado.” “Segundo Pasteur: A doutrina da geração espontânea jamais se reerguerá do golpe mortal que acaba de receber com esta simples experiência” (ADOLFO; CROZETA; LAGO, 2005, p. 9).
4 “A abiogênese perdurou então até o século XIX, quando Louis Pasteur elaborou, de forma extraordinária experimentos conclusivos a respeito da inviabilidade da geração espontânea” (PAULINO, 2005, p. 40).
5 “Em 1862, Pasteur elaborou um engenhoso experimento [...]’’ (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.112). “Simples e completo, o experimento não permitiu contra-argumentação [...]” (FAVARETTO; MERCADANTE, 2005, p.112).
6 “Somente por volta de 1860, com os experimentos realizados por Louis Pasteur (1822-1895), conseguiu-se comprovar definitivamente que os microorganismos surgem a partir de outros preexistentes” (LOPES; ROSSO, 2005, p. 17).
Retratando alguns aspectos sobre os experimentos realizados por Pasteur,
pode-se averiguar que esse cientista é amplamente conhecido pelo experimento
“pescoço de cisne,” no qual, fracos de vidros eram entortados formando
sinuosidades. Este permanecia aberto, e dentro havia infusões previamente fervidas.
Com o pescoço aberto, porém intacto, percebia-se que a infusão permanecia
inalterada (sem o desenvolvimento de microrganismos), porém, quando este era
destacado, os microrganismos colonizavam a infusão. Para Pasteur o ar era o
veículo de contaminação da infusão, e no frasco com pescoço de cisne, mesmo
aberto, os microrganismos presentes no ar, de certa forma, permaneciam presos nas
sinuosidades do frasco, de forma a não conseguirem ter contato com a infusão e se
desenvolverem nesta. Porém, esse experimento foi proposto a Pasteur por Balard e
acredita-se que Chevreul já teria utilizado experimentos parecidos em suas aulas de
química. Desta maneira, não foi Pasteur quem formulou essa metodologia, muito
provavelmente ele a tenha aperfeiçoado (GEISON, 1981).
Ao citar que “Louis Pasteur elaborou, de forma extraordinária experimentos
conclusivos a respeito da inviabilidade da Geração Espontânea”, na passagem 4 e
também na passagem 5, “em 1862, Pasteur elaborou um engenhoso experimento
50
[...]’’ do Quadro 6,. Reforça-se a ideia de uma Ciência realizada por gênios, de
maneira isolada, como se outros cientistas não influenciassem mutuamente seus
trabalhos e como se as atividades realizadas por um cientista não pudessem ser
empregadas por outros, porém visando esclarecer dúvidas e questões diferentes.
Como cientista Pasteur leu o trabalho de outros cientistas de sua época bem
como de épocas passadas. Tal aspecto pode ser evidenciado, pelo fato de os
experimentos realizados nas montanhas, serem fruto da leitura de Pasteur dos
trabalhos de Spallanzani. No qual, Pasteur acabou realizando os experimentos que
Bonnet propôs a Spallanzani a cerca de um século atrás (MARTINS; MARTINS,
1989).
Como defende El-Hani (2006) a Ciência tem caráter coletivo. Portanto não foi
apenas Pasteur que contribuiu para o questionamento da Geração Espontânea para
explicar a origem dos microrganismos. Há vários cientistas em diversas épocas que
realizaram trabalhos importantes sobre o assunto, dentre eles está Spallanzani.
Ao observarmos a passagem 5 (Quadro 6), “simples e completo, o
experimento não permitiu contra-argumentação [...]”. Observamos que a obra não
considera o fato já apresentado de que anos mais tarde, Pasteur de envolveria em
outra controvérsia sobre o tema com Charlton. Aqui se observa justamente o
reducionismo experimentalista que El-Hani (2006) critica, no qual, considera-se o
experimento como meio de se comprovar e reforçar uma teoria ou hipóteses.
As passagens 1, “[...] Louis Pasteur, que conseguiu negar a abiogênese [...]”,
2 “[...]Louis Pasteur quem conseguiu derrubar essa teoria [...]”, 3 “[...]Pasteur
elaborou, de forma extraordinária experimentos conclusivos [...]” e 5 “[...] Pasteur
elaborou um engenhoso experimento [...]’’ do Quadro 6, remontam a visão de
Pasteur como um gênio, superior, capaz de realizar coisas incríveis. De acordo com
Martins (2006) essa visão do trabalho de Pasteur exposta nessas obras dissemina
um equívoco da utilização da História da Ciência, o argumento da autoridade, como
as obras supervalorizam o resultados e trabalhos de Pasteur em detrimento de uma
visão mais complexa e humana de suas atividades, enfatiza-se que a Geração
Espontânea só foi desconsiderada por causa de Pasteur, dessa maneira, este
cientista que realmente em sua época apresentava grande prestígio e influência, é
tido como a autoridade no assunto, portanto os resultados dele são considerados
corretos e verdadeiros. Esse equívoco reforça a imagem dos gênios e cria uma
espécie de crença científica, no qual, apenas considerando quem formulou ou
51
realizou um trabalho, julga-se se este é bom ou ruim. Isso acaba desestimulando
uma análise crítica dos conteúdos presentes nos materiais didáticos.
Após análise das passagens selecionadas, pode-se inferir que das obras
selecionadas apenas o livro de Favaretto e Mercadante (2005) retrata a controvérsia
de Pasteur e Pouchet, porém, de forma adenótica, ou seja, enfatiza nomes, datas e
breves narrativas, porém não apresenta a complexidade de fatores relacionados ao
fazer científico Eventualmente o docente trabalhar biografias dos cientistas pode ser
interessante, porém, sem um contexto social, histórico e científico do trabalho dos
mesmos, pode-se incentivar a visão da autoridade (crença científica) e
conhecimento certos contra os errôneos (consensualidade) (MARTINS, 2006;
CARNEIRO; GASTAL, 2005).
Diversos autores apresentam motivos pelos quais, as obras didáticas ou não
podem apresentar e trabalhar de forma inadequada os conteúdos relacionados à
História da Ciência. Para Carneiro e Gastal (2005) o problema é cíclico, já que os
livros universitários, em sua maioria também apresentam a Ciência de uma forma
inadequada, portanto, os equívocos presentes nos livros didáticos seriam um reflexo
de tal realidade. Os livros universitários influenciam na formação de docentes e
profissionais envolvidos na elaboração das obras didáticas, dessa forma, por terem
se formado com uma visão inadequada da Ciência, esta pode ser refletida em seu
trabalho e consequentemente pode influenciar
o processo de ensino e aprendizagem dos alunos.
Então, como uma medida de remediar tal situação, Martins (2006) apresenta
a necessidade da elaboração das obras, didáticas ou não, relacionadas a conteúdos
de História da Ciência por pessoas qualificadas, pois, acredita-se que com essa
medida a obra de torne mais clara e objetiva, valorizando a complexidade de que
tais conteúdos exigem. Talvez a elaboração interdisciplinar dos livros didáticos,
utilizando profissionais qualificados das mais variadas especialidades da Educação
possa contribuir com o desenvolvimento de um material mais adequado.
Fracalanza e Neto (2003) discutem a importância de uma reflexão sobre os
critérios de escolha dos livros didáticos a serem comprados e distribuídos ao
Sistema de Educação Pública. Tais critérios são embasados nas características
técnicas das obras, tais como: adequação conceitual, coerência metodológicas,
cuidados com aspectos éticos evitando o preconceito, valorização das
características adequação da linguagem, apresentação de gráficos e figuras,
52
orientar o docente da forma como este deve proceder com a utilização do material e
atividades propostas por este (BRASIL, 2008).
Há critérios interessantes como contextualização do Ensino, desenvolvimento
do pensamento crítico, argumentação, memorização, compreensão e análise por
parte das obras (BRASIL, 2008). Tais critérios estão de acordo com os preceitos
educacionais de um Ensino que visa uma compreensão da Ciência como algo
dinâmico e alterável. Porém, não há critérios mais específicos em relação aos
conteúdos de História da Ciência e de sua importância para uma compreensão
adequada da natureza do fazer científico. De tal modo que editores e escritores de
livros didáticos não são pressionados a uma alteração da visão da Ciência veiculada
em suas obras, por mais que os documentos educacionais visem uma mudança no
Ensino de Biologia (FRACALANZA; NETO, 2003).
Muitas das passagens presentes em livros didáticos apresentaram
inadequações e dependo da utilização do livro e da maneira como o docente irá
trabalhar com este material e a própria visão de Ciência dos professores, podem
auxiliar na disseminação de uma visão ingênua da Ciência como algo imutável,
como dona da verdade, feita por seres incríveis, capazes de realizarem verdadeiras
“descobertas”, em que existem cientistas e teorias corretas contra cientistas e teorias
erradas que atrasam o desenvolvimento da humanidade (MARTINS, 2006;
CARNEIRO; GASTAL, 2005; TRINDADE et al., 2010).
53
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há a necessidade de uma reflexão e análise dos conteúdos relacionados à
História da Ciência nos livros didáticos de Biologia. Esses materiais apresentam
grande importância no processo de ensino e aprendizagem dos alunos, podendo em
muitos casos, disseminar uma visão inadequada da Ciência, desestimulando uma
análise crítica por parte dos alunos sobre a importância e influência da Ciência e
seus produtos em suas vidas, tornando-os vulneráveis a manipulação dos mais
variados agentes sociais (governo, empresas entre outros), diminuindo a autonomia
dos educandos, influenciando o desenvolvimento de diversas habilidades e
compreensão dos mais variados conhecimentos: procedimentais, atitudinais e
conceituais.
Há a necessidade de uma revisão por parte do Governo sobre os critérios de
seleção dos livros didáticos, visando à veiculação da Ciência como produto humano,
desta forma, influenciado por diversos fatores, bem como adequada utilização de
conteúdos relacionados à História da Ciência, contribuindo com a compreensão por
parte dos educandos sobre as características e implicações presentes no fazer
científico.
Para atingir tal objetivo, novas pesquisas sobre como estes conteúdos são
abordados nos livros didáticos e elaboração de materiais por pessoas qualificadas
podem auxiliar na elaboração de materiais adequados. Além disso, é necessário que
tal processo não abarque somente os livros de Biologia do Ensino Médio, mas que
se estenda para outras áreas e níveis educacionais.
Portanto, há um grande campo de pesquisas na área que podem contribuir
para a identificação das inadequações relacionadas à utilização e veiculação de
conteúdos da História da Ciência, além da elaboração e desenvolvimento de
medidas que visem reverter esse quadro, tendo em mente o desenvolvimento de
um Ensino de qualidade que possa desenvolver a autonomia e senso crítico dos
alunos.
54
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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