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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA CENTRO DE POS-GRADUAC;;AO PSICOPEDAGOGIA: 0 ENFOQUE SISTEMICO NAS DISFUNCIONALIDADES DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM i:( "r!! A <;;;J- ,no . fGL r CURITIBA 2000

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA CENTRO DE POS …tcconline.utp.br/media/tcc/2015/12/PSICOPEDAGOGIA-O-ENFOQUE... · 22 CONCEITOS FUNDAMENTAlS DA TEORIA SISTEMICA ... vi 2.3 TERAPIA FAMILIAR

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA

CENTRO DE POS-GRADUAC;;AO

PSICOPEDAGOGIA: 0 ENFOQUE SISTEMICO NAS DISFUNCIONALIDADES

DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

i:("r!! A <;;;J-,no. fGL

r CURITIBA

2000

VERONICKA SEGMULLER FELIPPE

PSICOPEDAGOGIA: 0 ENFOQUE SISTEMICO NAS DISFUNCIONALIDADES

DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

Monografia apresentada como requisito paraobtengao do titulo de especialista emPsicopedagogia do Centro de P6s-GraduacAoda Unlversidade Tuiuti do Parana.

Orientadora: Psic6loga Maria da GI6ria Bozza

CURITIBA

2000

"Um fen6meno permanece inexplicavel enquanto 0 ambitode observagao nao for suficientemente amplo para inciuir 0contexte em que 0 fen6meno Qcorre. Quando nao seapercebe da complexibilidade das rela90es entre um eventoe a matriz em que ele acontece, entre urn organismo e seumaio, 0 observador ou depara-se com algo 'misterioso' ou einduzido a atribuir ao seu objeto de estudo outraspropriedades que 0 objeto nao possui."(Watzlawick, P. etall., 1981, p. 18)

Agradecimento

Agrade~oa todos aqueles que de uma maneira ou outracolaboraram na elabora9i\o do presente trabalho;sobremaneira a Deus, a familia e aDs professores e amigospar seu incentivD.

iii

SUM ARlO

RESUMO ...

ABSTRACT.

1.INTRODUCAo ...

2. DESENVOLVIMENTO ..

2.1 ATUA<;AO DA PSICOPEDAGOGIA ..

22 CONCEITOS FUNDAMENTAlS DA TEORIA SISTEMICA ..

. vi

2.3 TERAPIA FAMILIAR SISTEMICA: UM BREVE HISTORICO ..

2.4 0 REFERENTE FAMILIAR DA CRIAN<;A ..

2.5 AS DISFUN<;OES NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM ..

2.6 DISFUNCOES NO SISTEMA FAMILlAR. ..

2.6.1 Nivellnadequado de Intera9ao Familiar: Baixo Nivel de Coesao ou

seu oposto, Coesao Excessiva. ..

2.6.2 Distribui9iio e Desempenho de Papeis ..

2.6.3 Hierarquia Grupal. ..

2.7 A Interven9iio do Psicopedago .....

3. ESTUDO DE CASOS ...

iv

. vii

. 01

. 03

. 03

. 07

. 09

. 11

. 14

. 17

. 19

. 21

........ .22

. .23

. 26

3.1 CASOM ...

3.2 CASO I.B.N .

3.3 CASO L.N.C .

4. ANALISE E DISCUssAo DOS CASOS ...

CONCLUsAo .....

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS .

.... 26

... .29

. 30

. 32

. 35

. 37

v

RESUMO

Discussao sabre 0 tema "a importancia da participayao dos pais notratamento de interven980 psicopedag6gica" fundamentalmente a partir doparadigma sistemico. Faz-se consideray6es iniclais sabre 0 fen6meno do "naoaprender" em seus diferentes fatores intervenientes e esbo98-se conceitosfundamentais da teona sistemica. Segue, enfocando a familia como urn sistemaaberto em permanente intera~o com 0 meio externo e 0 interjogo entre 0

referente familiar do paciente e 0 sistema escolar. E. sob esta mesma perspectivateorica, faz uma analise das disfungoes no processo de aprendizagem, onde 0

nao-aprender assume urn valor relacional. Neste sentido e que sao discutidosbrevemente tres casas cHnicosem que as dificuldades manifestadas pela crian«;ana aprendizagem, e nomeadamente na comunicaC;8o- 0 naD saber/naa falar, ternsignificado comunicacional no contexte familiar, disfunt;ao que vai aos poucossendo superada para permitir novos comportamentos adaptativos. Par fim, 0

trabalho propoe um redimensionamento no papel do psicopedagogo !rente asdificuldades de aprendizagem. em que se faz necessario 0 estabelecimento deum contexte de colaborayao entre todos os parceiros educativas.

Palavras-chave: Interven9iio psicopedag6gica. processo de aprendizagem.disfunc;aona aprendizagem, sistema, sistema aberto, sistema familiar, parceiroseducativQs, ensinante, aluno-designado.

vi

ABSTRACT

This paper discusses the theme of family participation in thepsichopedagogic intervention fundamentally from the systemic paradigm,introducing the several different intervening factors of the "not-learning"phenomenon, and traces a few fundamental concepts of the systemic theory. Itproceeds on focusing the family as an open system in constant interaction with theexternal environment and the interplay between the student's family reference andthe school system. Under the same theoretical perspective, the text analyses themalfunctions of the learning process, in which the "not-learning" takes on anessentially relational value. A discussion of a clinic case follows, in which the childshows learning disabilities (not knowing/not speaking) that reveal themselves ascommunication problems. Such disabilities tend to be overcome little by little andgive way to new adaptive kinds of behavior. And finally the text presents newpossible ways for the psychologist to deal with learning disabilities by establishinga context of collaboration among all educational partners.

Key words: Psichopedagogic intervention, learning process, learningdisabilities, system, open system, family system, educational partners, teacher,assigned student.

vii

1.INTRODUc;:AO

o numera significativQde crian~s que enfrentam dificuldades no processo de

aprendizagem e que naD acompanham 0 fitmo das classes escolares comuns imp6e

esforl'Os na busca da supera9ao dessas dificuldades.

o trabalho de preven9ilo e tratamento dos problemas de aprendizagem e

fundamental para garantir a permanencia da crianc;a na escola, porem, pressup6e

uma determinada competEmciatecnica por parte do educador, que ainda nao faz

parte da sua forma9ilo basica, fato que torna necessaria a interven9ao da

psicopedagogia neste processo.

Por isso, 0 presente trabalho tem 0 intuito de fazer emergir em cada terapeuta

a necessidade de ampliar seu repert6rio de possibilidades de atua9ao a partir da

reflexao crftica sobre a sua propria pratica, trabalhando em conjunto com a

psicopedagogia principalmente quando 0 problema do aluno esta relacionado ao seu

ambiente familiar.

o objetivo geral do presente trabalho e 0 de contribuir para 0 avanyo

necessario na area das dificuldades de aprendizagem de uma maneira rna is ampla

quando a familia encontra dificuldades para cumprir 0 seu papel na solu9ilo do

problema da crianya envolvida.

Como objetivos especificos procurar-se-a demostrar as aspectos que

ajudarao 0 futuro psicopedagogo a capacitar-se para 0 desenvolvimento de sua

profissao, tais como a percepyao da interferencia dos processos educacionais no

02

contexto familiar; perceber-se como agents educacional; saber diferenciar as

inadequ8<;oes da escola, da familia au do grupo social no processo

psicopedag6gico; aprender a identificar as crian<;asque apresentam problemas de

aprendizagem; saber orientar as professores no encaminhamento de crian98s com

problemas de aprendizagem.

Para perseguir asses objetivos, 0 presents estudo centrou-se principalmente

nos aspectos que ajudam a psicopedagogo a capacitar-se para 0 desenvolvimento

de sua profissao, aqui vista como urn colaborador no processo ensina-

aprendizagem.

Utilizou-se fundamentalmente 0 metodo dedutivo-indutivo, onde a pesquisa

bibliogn3fica levou a elabora980 de uma conciusao critica, bern como 0 processo de

pesquisa com as familias atendidas, juntamente com as estudos ta6rieas de

bibliografia especifica, a fim de ampiiar as conhecimentos nesta area. Oesta forma, a

uniao entre teorica e pratico fez com que muttos dos questionamentos ou hip6teses

deste trabalho, fossem revistas e outras tantas confirmadas durante todo 0 processo.

Este trabalho monografico proporcionou, tambem, junto aos profissionais

psicopedagogos, a busca incansavel do saber cientifico para uma boa pratica

cllnica, uma vez que as Ciencias Humanas, assim como 0 proprio Homem estao em

constante evolu~o.

2.DESENVOLVIMENTO

2. 1 ATUA<;AODA PSICOPEDAGOGIA

Segundo POLITY et al (1998), a Psicopedagogia surgiu como uma

abordagem que se ocupa com 0 processo ensino-aprendizagem, tendo como

proposta encontrar meiDs que facilitem 0 desenvolvimento escolar dos individuos.

Um de seus enfoques visa trabalhar a dificuldade de aprendizagem por meio de

formas que ajudem 0 estudante a encontrar elementos de motiva~o para 0 resgate

de suas eficiencias.

Para todos aqueles que lrabalham com Psicopedagogia e Educa~o Especial

e bastante comum a vivencia de situa¢es em que e preciso estabelecer a

interven98.0 psicopedag6gica em fungao das necessidades especiais da criam;a, que

nao raro consistem em problemas de ordem familiar.

Tradicionalmente, este tema tern sido abordado como uma disfun980 familiar,

recaindo sobre 0 sujeito que apresenta 0 problema, a pecha de "portador de

perturba98o", sem se preocupar com as causas dessa perturbaqao. Psic61ogos

atribuem 0 problema a estrutura psiquica da crian9a; professores apontam a familia

como a grande responsavel pelos problemas apresentados pela crian9a. Assim, a

disfun980 nao e vista no seu todo mas apenas em parte. Nao ha uma investiga~o

04

das reais causas que interferem no processo de aprendizagem, 0 que aponta para

uma 56 causa, abordando-se apenas as aspectos parciais.

A intervenc;aopsicopedag6gica veio introduzir uma contribui<;ilo mais rica no

enfoque pedag6gico, 0 processo de aprendizagem da crian9a e compreendido

como um processo pluricausal, abrangente, implicando componentes de varios eixos

de estruturac;ao: afetivQs, cognitivos, motores, sociais, economicos, politicos etc. A

causa dos problemas no processo de aprendizagem, deixa de ser localizada

samente no aluno e no professor e passa a ser vista como um processo maior, que

precisa ser observada criteriosamente pelo psicopedagogo, em todos as seus

possiveis aspectos, a lim de diagnostica-Ia 0 que requer muito estudo, dada a sua

complexidade,

A complexidade da abordagem reside no fato de que 0 cerebro, no entanto,

nao e um sistema de fungOes fixas e imutaveis, mas urn sistema aberto, de grande

plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento sao moldados ao longo da

historia da especie e do desenvolvimento individual.

Assim sendo, dadas as imensas possibilidades de realiza<;ilo humana, essa

plasticidade e essencial: 0 cerebro pode servir a novas fun<;6es,criadas na hist6ria

do homem, sem que sejam necessckias transformac;6es no 6r98o fisico. 0 homem

transforma-s9 de biol6gico em socio-hist6rico, num processo em que a cultura eparte essencial da constituiyao da natureza humana.

Em se falando de natureza humana nao podemos deixar de lados os

aspectos pedag6gicos, pois eles nao podem ser pensados como um processo

abstrato, descontextualizado, universal: 0 funcionamento psicol6gico,

particularmente no que se refere as fun<;6es psicol6gicas superiores, tipicamente

05

humanas, esta baseado fortemente nos modos culturalmente construidos de ordenar

o real (KOHL, 1993: 24).

De acordo com MIERMONT e cols (1994), 0 fundamental e perceber a

crian~, capta-Ia em toda a sua especificidade, em urn programa direcionado a

atender as suas necessidades especiais. Eo a percePl'ao desta singularidade que vai

comandar 0 processo e nao um modele universal de desenvolvimento. Isto porque 0

usa do modele universalista camufla normalmente uma concep"ao preestabelecida

do processo de desenvolvimento do sujeito. Na interven9ao psicopedag6gica deve-

se evitar prognosticos que 0 professor langa a respeito do processo de

desenvolvimento de seu aluno sem levar em consideragao 0 seu desempenho.

o processo ensino-aprendizagem nao e linear e continuo que se encaminha

numa unica dire"ao. Eo multifacetado, apresentando paradas, saltos, transforma<;:6es

bruscas etc. 0 processo de ensino-aprendizagem inciui tambem a nao-

aprendizagem. Ou seja, a nao-aprendizagem nao e uma exce"ao dentro do

processo de ensino-aprendizagem, mas se encontra estreitamente vinculada a ele.

o aprendente pode se recusar a aprender em um determinado momento. 0

chamado fracasso escolar naD e urn processo excepcional que ocorre no sentido

contrario aD processo de ensino-aprendizagem. Constitui, sim, exatamente a outra

face da mesma moeda, 0 seu lado inverso. 0 saber e 0 na.o-saber estao

estreitamente vinculados. 0 nao-saber se tece continuamente com 0 saber. Com isto

queremos dizer que 0 processo de ensino-aprendizagem, do ponto de vista

pslcopedagogico, apresenta sempre uma face dupla: de um lade a aprendizagem e

do outro a nao-aprendizagem.

o desejo de saber faz um par dialetico com 0 desejo de na~-saber. 0 jogo do

saber-nao saber, conhecer-desconhecer e suas diferentes articula<;:6es, circula¢es

06

e mobilidades, pr6prias de todo ser humane ou seus particulares nos e travas

presentes no sintoma, e a que a psicopedagogo trata de decifrar no diagn6stico

(FERNANDEZ, 1991: 39).

No ensina, lida-se com resistencias. As resistencias tern sempre sua sede,

nos ensina a amilise, no eu. 0 que corresponde ao eu e a que par vezes comporta

todo saber, aquela bagagem que cada um carrega individualmente. Trata-se de

algo que inclui 0 que sabemos ou cremos saber - pois saber e sempre, par algum

lado, crer saber.

A Psicopedagogia propicia esla forma mais aprofundada de se trabalhar com

o aluno, pois leva em considera~o as necessidades especlficas de cada aluno,

privilegiando-se 0 que esta realmente acontecendo naquele momento, estendendo-

se aD ambito familiar. IS50 porque 0 sistema simb61icoe imaginario do aluno e unico,

nao se devendo lidar com ele a partir de esquemas generalizadores.

Assim, 0 psicopedagogo precisa colocar a aluno dentro da sua familia,

compartilhando com ela a desenvolvimento do seu trabalho. E pOisum sistema e par

issa, e preciso conhecer as conceitos fundamentais dessa tearia, vistas a seguir.

2.2 CONCEITOS FUNDAMENTAlS DA TEORIA SISTEMICA

De acordo com a Teona Geral dos Sistemas, que tem em Ludwig von

Bertalanffi um dos seus precursores, um sistema pode ser definido como uma

unidade au uma globalidade em que 0 conjunto de elementos mantem entfe si uma

interrelayiio e constituem uma organizagiio; os elementos sao, portanto,

interdependentes, e interagem dinamicamente. Desse modo, cada perte, pera a sua

07

existencia, necessita das demais. E par Dutro lado, pelas suas caracteristicas,

funyoes e relag6es que desenvolve, tambem S8 torna fundamental para a

sobrevivencia das outras. (BERTALANFFI, 1977)

Gada parte ou conjunto menor de elementos, au subsistema, esta para 0

todo, assim como a todo esta para cada uma das partes que a compoem; a sistema

existe e S8 realiza com e a partir dos seus subsistemas, que interagindo entre 51,S8

realimentam e S8 mantem a SImesmas e ao pr6prio sistema.

Os sistemas podem se caractenzados como fechados au aberlos. Gomo a

propria denominayao ja indica, um sistema fechado e aquele que existe em si

mesmo, que esta circunscrito pelos seus proprios limites e que, portanto, independe

de fatores externos.

Ja as sistemas aberlos, sao aqueles que estao permanentemente sujeitos a

serem influenciados por fatores externos e portanto, a mudanya. E par sua vez,

desde que mudam, muda tambem a qualidade das interay6es que vao desenvolver

com a exterior, de modo que tendem a provocar mudanyas para al9m do proprio

sistema ..

Assim, as interayOes que acontecem entre urn sistema aberto e 0 seu supra-

sistema ou com 0 meio exterior em geral, nao sao do tipo unilateral, ja que ambos S8

retroalimentam e se influenciam mutuamente. A rela91lodo tipo causa e efeito, au de

que a efeito ''Y'' e resultante da causa "X", obrigatoriamente precisa ser revista e ate

abolida. A retroalimentavao implica que urn e Dutro constituem inleio e tim ao mesmo

tempo. Os sistemas aberlos se caracterizam, portanto, pela circulandade.

A parlir de tal concepyiio, pode-sa concluir que, num sistema aberto, as

condigaes iniciais nac iraa, necessariamente, determinar 0 tipo de resultado final.

Todas as oscilayoes e mudanyas que vao acontecendo ao longo do processo, em

08

fun9aO das intera96es desenvolvidas, vao definindo a dire9ao e os resultados.

Causas semelhantes, poderiio levar a resultados essencialmente distintos, assim

como causas radicalmente diferentes poderao resultar em desfechos semelhantes.

Mas urn sistema pode e deve ser, tambE'!m,considerado aberto e fechado,

dependendo da perspectiva pela qual 0 analisemos.

Segundo RICHTER (1990), os sistemas familiares sao formados por

subsistemas com uma fun9iio especifica dentro do grande sistema. Urn dos

sUbsistemas sao os individuos que a comp6em que, por sua vez, fazem parte de

outros susbsistemas, como 0 conjugal, parental, filial, fraternal, entre outros. Esses

subsistemas fazem parte de uma totalidade que interagem para constituir 0 sistema

maior.

Tendo em vista que todo sistema implica na interrela9iio, na interdependencia

ou na interinfiuencia entre os diferentes elementos, pode-se afirmar tambem que

toda intera9ao humana constitui urn sistema. Numa interaC;iio, sempre 0

comportamento de urn e pontuado pelo comportamento do(s) outro(s) parceiro(s); e,

por sua vez, pela pauta de conduta que exibe, tambem provoca, necessariamente,

algum tipo de rea9iio nas demais partes com as quais interage. Assim, as intera96es

humanas implicam numa circularidade comunicacional, que nao tern comevo nem

tim e que estao inevitavelmentea comunicar. Cabe aqui, a pertinemcia e a

objetividade das palavras deWATZLAVICK:

todo 0 comportamento, numa situayao interaCional, tern valor de mensagem, ista e, ecomunicayao; segue-se que, par muito que 0 indivfduo se esforce, e-Ihe impossivel naocomunicar. A atividade ou inatividade, palavra OU silencio, tudo passui urn valor demensagem; influenciam outros e estes Qutros, par sua vez, naD podem nao responder aessas cornunica¢es e, portanto, tambem estAo comunicando. (WALTZLAVICK et ai, 1967,p.p.44-45)

09

2.3 A FAMiLIA - UM SISTEMA EM PERMANENTE INTERJOGO COM 0

CONTEXTO SOCIO-CULTURAL

Como vista anteriormente, 0 sistema familiar e entendido de varias maneiras,

de acordo com as que se prop5em a estuda-Io. Cabe aqui, entender esse sistema

em todos as seus aspectos.

De acordo com RELVAS (1996), a familia constitui urn sistema, urn conjunto

de membros individuais, que funciona de acordo com regras e padrees de intera<;lio

que transcendem as caracteristicas particulares de cada membra. A familia e,

portanto, urn complexo maior do que a simples soma das suas partes. E reflete nao

apenas as modos individuais de ger, mas aeirna de tudo a maneira como as

diferentes membros e subsistemas interagem. Par Dutro lado, esse modo de

funcionamento global da familia infiuencia os padrees individuais de cada urn.

da Rutora

10

Alem disso, como sistema aberto que e, a familia esta em permanente

interagao com 0 seu exterior, que a inftuencia e e par ela influenciado. A cultura

tipica de uma sociedade, seus movimentos evolutivos e involutivos, fatalmente vao

interferif na vida familiar. Seria 0 caso, par examplo, da familia cujo pai perde 0

emprego nurn momento de recessao econ6mica da sociedade, aD passo que a mae

consegue manter-se trabalhando, e constitui-se a principal fonte provedora da casa.

E bastante provavel que essa situagaovenha a provocar uma alteragao importante

no funcionamentodo sistemafamiliar, modificandoas rela90esentre os subsistemas

e os seus padroes de comportamento em geral, e alterando 0 interjogo com 0

exterior, que, par sua vez, respondera de maneira nova e peculiar.

o propriodesenvolvimentodo cicio da vida familiar tende a implicarem novas

adaptag6es, as quais, par sua vez, levarao a reajustamentos tanto internos como

externos. Uma familia constituida apenas pelo subsistema conjugal, por exemplo,

tem interesses e necessidades particularmente distintas daquela em que 0

subsistema parental conta com filhos adolescentes. Tanto as intera90es

intrasistemicas como as intersistemicas tern caracterfsticas especiais numa e na

Qutra.

Portanto, como 0 sistema familiar esta em permanente interdirnbio com

outros sistemas e com a sociedade em geral, a conjunto de crengas, valores, regras

e padroes interacionais que regern a vida familiar influencia e e influenciado pelos

demais sistemas. Conforme ANDOLFI (1981), as rela90es interfamiliares sao

observadas numa relagao dialetica com 0 conjunto das rela9Cies sociais:

condicionam-nas e sao por sua vez condicionadas pelas normas e pelos valores da

sociedade, atraves de urn equilibria dinamico.

11

Par outro lado, inspirando-nos em VASCONCELLOS (1994), e buscando

examinar a famflia sob uma "dupla visao" poderemos concebe-Ia como urn sistema

aberto e fechado. Ainda que caracteristicamente intercambiante com a exterior, em

muitos momentos a famnia, par sua prOpria tendencia a auto-organiza<;8.o e a 8UtO-

prote98o, precisa desenvolver processos capazes de proteger 0 sistema contra

interferencias desorganizadoras e, portanto, realizando movimentos de fechamento.

2.4 0 REFERENTE FAMILIAR DA CRIAN<;AEM SITUA<;AOESCOLAR

Segundo SATIR (1993), um individuo e portador, sempre, de uma heran9a

biol6gica que, em certa medida, 0 caracteriza e diferencia dos demais. Mas ele etambem, ao mesmo tempo, um portador e um representante de toda uma historia

familiar que transcende os limites da sua pr6pria exisUmcia e ate masmo a da sua

familia nuclear.

Uma familia nao se perpetua apenas porque produz filhos biologicos, mas

especialmente pelo legado cultural que transmite aos filhos. Deliberadamente ou

nao, os pais va~ imprimindo, aD \ongo do cicio da vida familiar, uma organizayao e

um modo de funcionamento que vilo desempenhar papel primordial na definiQilo das

intera90es intra e interfamiliares e constituir, em grande parte, 0 paradigma das

rela<;oesque as filhos VaG desenvolver nos demais contextos e sistemas dos quais

venham a participar. Pelos ideais e valores que orientam a vida familiar, pelo

posicionamento politico dos seus membros como cidadaos, pelo partido politico que

apoiam enfim, pelas decis6es que tomam a respeito de aspectos da realidade

objetiva, tais como 0 que priorizar no dia-a-dia, onde e como gastar 0 dinheiro

12

ganho, etc. por e com tudo iSso, a organiza9aO familiar e os seus modos

interacionais VaG constituir urn sistema referendal que a crianc;a/adolescente

atualizara no sistema escolar. E e com esse referente que ela vai interagir com seus

colegas, tais como 0 seu grupo de companheiros ou 0 subsistema da classe, os

professores, os orientadores, 0 diretor, etc.

Com rela91io a escola e 0 referente do professor, tem-se que os ciclos

comportamentais em cada familia sao govemados par urn sistema de crengas

compostos de uma combina9ao de atitudes, suposi9iies basicas, expectativas,

preconceitos, conviC9oes e cren9as trazidas para a familia nuclear por cada

progenitor de sua familia de origem. Estas cren98s individuais se interligam para

formar premissas diretrizes que governam a familia. Mais uma vez naD sao as

cren9as ou suposi90es individuais de cada genitor que 0 terapeuta considera

importantes e sim, como elas estao interligadas para formularem as regras

operadoras da famflia. (PAPP, 1992, p.27)

Assim como PAPP assinala no que se refere as familias, 0 sistema de

crenC;8stambem assume carater decisivo quando se trata da escola. Esta, organiz8-

se e funciona em torno de fun9iies que Ihe sao definidas pela cultura, bern como de

suposi9iies, cren98s, expectativas, etc., que resultam da articula91io dos diferentes

membros e subsistemas que a compoem. Vista sob este angulo, pareee evidente a

complexidade da questao. Cada administrador, cada tacnico em educa91io e cada

professor, sao portadores de um sistema de eren9as proprio, e resultante de suas

experiencias educacionais no nivel familiar, escolar e social. Na aseela, cada

sistema individual de eren98s passa por uma sarie de negocia9iies, de modo que

muitas delas sao compartilhadas entre a maioria. POfsm Qutras, permanecem

diferenciadas, e nao chegam a fazer parte de temas escolares. Ainda assim,

13

persistem e continuam interatuando, eu saja, masma que nao explicitadas, entram

no jogo das comunica\;Oese definem as caracteristicas e a dire\;iio das intera¢es.

Na verdade, e bastante remota na ciencia psicologica, a percep\;iio de que as

aprendizagens das criangas se realizam a partir de uma rela\;iio estreita com a figura

do professor e com 0 tipo de intera\;iio que se desenvolve entre ele e os seus

alunos. 0 pr6prio Sigmund Freud, 0 criador da Psicanalise, em seu escrito de 1914

"Algumas Reflexoes sobre a Psicologia Escolar" ja admitia essa importancia ao

afirmar:

E dificil dizer sa 0 que exerceu mais influencia sabre nos e teve importancia maior foi a nossapreocupayao pelas ciencias que nos eram ensinadas, au pela personalidade de nOSSQSmestres. E vemade, no minima, que esta segunda preocupayao constitufa uma correnteaculta e constante em tOOos nos e, para muttos, os caminhos das ciencias passavam apenasatraves de nossos professores. Alguns detiveram-se a meio caminho dessa estrada e parauns poucos - porque nao admitir Qutros tantos? - ela fOI por causa disso definitivamentebloqueada. (OBRAS COMPLETAS DE FREUD, Vol. XIII, p. 286)

Va-se, portento, que ja nos primordios da Psicologia cientifica, sugia a

tentativa de compreender todo 0 complexo internacional que marca as rela\;Oes de

aprendizagem; 0 conteudo escolar, como ja assinaiava Freud, nao parecia ser 0

aspecto mais importante.

Hoje, a Psicologia reune maiores condi¢es para ampliar urn pouco mais 0

modo de enfocar questao tao complexa como a das relagoes de aprendizagem. Sem

reduzir a importancia dos conteudos escoiares formais, os que dizem respeito aos

conceitos cientificos, poderiamos, isla sim, concebe-Ios sempre perpassados e

mediados pelas inleragoes entre 0 aprendiz e seu mestre. Desse modo, qualquer

aprendizagem parece ser definida, em principio, pela rela\;iio. E e ai que assume

papel relevante 0 referente do professor: suas vivencias familiares, suas crenyas e

valores, sua concep\;iio de mundo e de homem, sua postura frente ao saber

14

cientrfico, etc., tudo issa vai perpassar as suas intera<;6es com a crianc;aladolescente

e, de certa forma, interferir no processo de aprendizagem do aluno. Assim, por

exemplo, 0 valor que 0 professor val atribuir a cada conteudo; as suas expectativas

em relayao aD papel da crianC;8e que, par certa, estarao fundadas nas suas proprias

vivencias escolares remotas e naquilo que esperavam dele enquanto aprendiz; as

suas concep<;6es quanto as responsabilidades do psicopedagogo no que se refere

aD aprender ou naD aprender do paciente; tudo issa e Qutros tantos aspectos da

personalidade do terapeuta, VaG pontuar as intera¢es como as seus discfpulos.

Todo 0 seu comportamento val comunicar incessantemente a gama de crenr;8S e

valores que 0 caracterizam enquanto pessoa e profissional e, portanto, contribuir

para a dire<;iio a ser tra9ada no interjogo das rela<;6es escolares.

Contudo, hi! que se ter presente tambem que as referenciais do ensinante

constituern urn dos segmentos de urn subsistema do sistema comunicacional. Dutro

deles, e sem duvida, 0 subsistema do referente do aprendente, que implica, em si

mesma, tado urn sistema de crenc;as, mitos, conhecimentos peculiares ao sistema

socia-familiar. E e no inte~ogo entre ambos que vai se dar 0 processo ensina-

aprendizagem, e cnde 0 camportamento do "naa-aprender" vai se revelar com maior

intensidade.

2.5 VlsAo DO SINTOMA DA NAO-APRENDIZAGEM: PACIENTE IDENTIFICADO

Abandonar, do ponto de vista te6rico ou pratico, hip6teses que tragarn urn unico vinculocausal a rela~o pedag6gica (0 desejo do professor, 0 inconsciente do aluno, etc.) implicaurna desordern das rnentalidades e urna troca de etica. A populariza~o das ciemciashumanas provoca a designa~o de urn 'culpado' num contexto impreciso. A pratica sistemicaimpUcano surgimento de urn dispositivo de colabora9ao mais definido e mais Iimitado.8 (LEVI-BASSE E MICHARD, 1988).

15

As perspectivas pelas quais essa disfungao tem sido analisada,

tradicionalmente tem-na caracterizado como urn comportamento especffico do

sujeito "portador da perturbagao"e portanto, isolado do seu contexto. 0 professor

que registra a queixa de que "0 seu aluno nao aprende", assim como 0 psicologo

que investiga uma situagao de nao-aprendizagemfocalizando essencialmente a

estrutura pSlquica da crianC;8 ou ate mesma a organizaqao e 0 funcionamento

familiar, constituem exemplos tipicos de abordagens parciais ao problema.

Em geral, tais posturas isentam a escola e as rela<;6es que ali se

desenvolvem, de toda a problematica. Habitualmente, tomam 0 determinismo

ps(quico como pressuposto: a causa e 0 significado do nao-aprender sao externos e

antecedema relag80pedagogica;e se extemos e antecedentes,implica que devam

ser tratados de modo periferico a escola e aos parceiros escolares.

PAIN, tomanda como fundamentos teoricos as vertentes da PSicanalisee da

Psicologia Genetica, avanga sobremaneira na tentativa de compreensao do

fenomeno nao-aprender, quando propoe a analise multifatorial da questao,

abrangendo fatores organicos, especfficos, psic6genos e familiares do sujeito.

Segundo tal abordagem, par exemplo, a presenga de cartos prejuizos de carater

organico ou mesma urn transtorno especifico na area perceptivo-motora nao

justificaria, por si so, lodo um transtomo de aprendizagem,nao fossem os fatores

psic6genos e/ou ambientais tambem favoraveis ao desenvolvimento de tal

perturbagao.A autoraassimse expressa:

...uma crtanQacom urn antecedente de cianose no parto, leve imaturtdade perceptivo-matora,certa rigidez nos tra9Os, nao cria por i510 urn problema de aprendizagem, desde que suapersonalidade Ihe pennita assumir suas dificuldades, desde que os medos tenham seajustado as deficiencias para compensa-Ias, e desde que as exigencias do ambiente naotenham colocado enfase justamente no aspecto danificado (prestigiando a caligrafia, porexemplo). Mas se somarmos ao pequeno problema neuro16g1co, UmBmae que n~o tolera 0

16

crescimento do filho e uma escola que nao admite a dificuldade, cria-se um problema decoexisUmcia que parcialmente poderiam ter sido compensadas. (PAIN, 1986, p.28).

Portanto, percebe-se 0 problema a partir da visao do sintoma como um

estado particular de um sistema que, para equilibrar-se, precisou adotar este tipo de

comportamento que merecia um nome positivo, mas que caractelizamos como nao-

aprendizagem. Desde essa perspectiva, ficaria compreensivel a perturbagao na

aprendizagem da crian98 ou do adolescente em cujo desenvolvimento nao foi

assegurada a transformagao da sua posigilo em relagao aos pais, gerando

desequilibrios dificeis de serem compensados. Surgiria entao 0 sintoma, a servigo

de evitar as mobilizagiles que 0 grupo familiar nao pudera suportar.

Nao obstante, a compreensilo da problematica parece continuar ainda

relativamente periferica: 0 sintoma nao-aprender e enfocado essencialmente a partir

de uma atica que considera, no maximo, a perspactiva familiar. Ainda que amplie

significativamente 0 campo de analise, os parceiros escolares e toda a rede de

comunicagiles desenvolvidas no contexto da escola e de suas rela0es com a

familia, continuam sensivelmente relegados; nao teriam, portanto, participayao

importante na articulayao do sintoma.

Segundo a visao sistemica da relayao pedag6gica, as perturbagoes na

aprendizagem assumem canilter mais complexo e abrangente, onde a posigao do

sujeito que "nao-aprende" muda radicaimente. Aqui, 0 sintoma, apesar de implicar

sofrimento para a seu "portactor" e respectivos parceiros sistemicos, paradoxalmente

tem uma fungao importante, qual seja a de manter a integridade e a homeostase do

Sistema, a qualquer pre90. 0 "portador" constitui-se, conforme expressao de

EVEQUOZ (1988), num "refem do contexte escola('. 0 foco de questao desloca-se,

assim, da causalidade psiquica para 0 significado relacional do sintoma. Sob este

17

enfoque, sao coloeadas em xeque nao apenas as competencias do sujeito

identifieado, mas tambem as do sistema familiar e escolar, de modo que fieam

definitivamente desqualificadas as defesas que costumeiramente visam

responsabilizar a outro pelo fracasso.

A perspectiva sistemica propoe a refiexao sabre os modos de comunica9iio

tanto intra como extra-ascolares. Transcendendo as limites da estrutura individual,

familiar e masmo escolar, centra as aten,oes nas redes comunicacionais

intrafamiliares, intraescolaras e intersistemicas. Assim, como n§o privilegia au

responsabiliza nem um, nem outro, admitindo que ambos intervem para °estabelecimento e para a manutenc;ao do sintoma, eria espac;o tambem para a

coopera<;iio de todos os implicados, na eompreensao bem como na busea de

solU90esalternativas.

A investiga<;iio das disfun,oes do processo de aprendizagem passa pela

investiga<;iioda familia, enquanto sistema decisivo no ato de aprander.

2.6 DISFUNCOES NO SISTEMA FAMILIAR

Sagundo MINUCHIN (1982), as familias se desenvolvam atraves dos

chamados padroes de intera<;iio,que nada mais sao qua a pr6pria estrutura familiar,

ou saja, e a forma que as familias sa organizam funcionalmente a como os membros

destas se interagem ou se comunicam. Sa a naturez.a de uma estrutura familiar esta

na forma como os individuos sa relacionam, podendo estar pr6ximos au distantes,

isto fara com que a terapeuta de familia possa avaliar se a astrutura familiar

18

eneontra-S9 ou nao funcional, colaborando para a surgimanto de problemas

pedag6gicos para a crian~a na ascola.

Os enfoquas do terapeuta recaem entao na observa~o e interal'ao sabre as

lipos de comunica9ao existentes dentro do grupo familiar, bem como, sobre as

alian98s intra-grupos e sabre a hierarquia vigente no sistema familiar.

Segundo DESIDERIO, uma das disfun90es ocorridas na familia e proveniente

do choque cultural. A cultura do marido e uma e a da mulher e outra. Quando

namorados, se aceitam mutuamente, mas depois que formam a familia, cada um

procura impor seus valores, tomando-sa uma familia disfuncional. "Formam-se

alian~s intergeracionais estaveis e dlsfuncionais e a familia enrijece asses padr6es

de contenda ou luta armada criando partidas e faQ96es. Os lilhos recebem uma

estrutura psicol6gica conflitiva e incoerente em alguns aspectos. A dinamica criada

por esta estrutura pode gerar disturbias, disfun¢es e sintamas em um ou mais

membros da familia". (DESIDERIO, sid, p. 37). Nesse tipo de fam[lia a comunica~o

e falha e todo 0 seu funcionamenlo poden3causar problemas de aprendizagem.

Outro aspecta da disfuncionalidade de familia pode ser observado na

comunica~o. Costumeiramente, em familias disfuncionais a comunica~o etruncada, indireta e confusa. Segundo SATIR, um individuo que nilo aprendeu a sa

comunicar apropnadamente e disfuncional.

Em familias cuja comunica~a e falha, ha baixo nivel de coesao como podera

ser visto no capitulo a seguir.

19

2.6.1 Nivel Inadequado de Intera<;iio Familiar: Baixo Nivel de Coesao au seu

Oposto, Coesao Excessiva

Segundo RICHTER (1990), esta disfunyao e dividida de duas formas: baixo

nivel de caesao au excesso de coes8o. Isto significa, entender que as sistemas

familiares sao formados par subsistemas, e que cada subsistema tera uma fun<;iia

espacifica dentro do sistema. Os chamados subsistemas (que vem a ser a eslrutura

menor dentro do sistema maior, isto e, a familia como um sistema e formada por

subsistemas: os individuDS. Porem os individuos poderao constituir outros

subsistemas tais como: 0 subsistema conjugal, parental, filial, fraternal, entre outros)

que tambem devem ser vistos como uma totalidade, pois e a partir dai que se tem

condi¢es para compreender alguns dos chamados conflitos intergeraclonais. Cada

individua e um subsistema, e diades au grupos maiores que comp6em outros

subsistemas, determinados par gera980, genera au interesses comuns. Embora

alguns padroes sejam comuns, as possibilidades de subsistemas sao infinitas.

Quando houver baixa ou excesso de coesao familiar, tem-se que as fronteiras

enlre os subsistemas encontram-se disfuncionais, podendo 0 Sistema possuir

fronteiras rigidas au difusas. As fronteiras tem como objetivo proteger a

diferenciagao do sistema, tambem determinam as regras que presidem a

eSlabelecimento das rela¢es, alem de estabelecer intercambios com os sistemas

que as rodeiam. As fronteiras iraQ manter a discriminar;.ao entra os subsistemas

(individuo), os sistemas (familia) e 0 supra-sistema (comunidade). Conforms

MINUCHIN (1982) "A nilidez das fronteiras denlro de uma familia e um paramelro

ulil para a avalia<;iiodo funcionamento familiar. " (pag. 59) .

20

Uma eslrulura familiar "saudavel" necessita de fronteiras claras e permeeveis,

a fim de que possa trocar infarma¢es entre as subsistemas, bern como com a

macro-sistema. Esta permeabilidade ira farnecer as tipos de fronteiras existentes

denlro de uma estrutura familiar. Sao elas: Fronteiras Rigidas (au desligada);

Fronteiras Nilidas (limites normais); au Fronteiras Difusas (he um emaranhamento

ou fusae). As fronteiras rigidas silo extremamente restritivas e permitem pouco

cantata com as subsistemas externas, a que resulta em distanciamente. Os

individuos au subsistemas distanciados sao relativamente isalados e autonomos, par

urn lado permite que a subsistema (au a individuo) eres"" e se independa, mas

tambem limita a proximidade, 0 afeto e a prote9iio. Ja as subsistemas emaranhados

ou difusas apresentam-se superenvolvidos uns com as outros, num apoio mutua,

tornando a subsistema dependente e com serias dificuldades de relacionamento

com as pessoas de fora da familia. Frontalras obscuras (explicitamente rigidas au

emaranhadas) criam estruturas familiares disfuncionais.

RICHTER (1990) cita que quando numa familia onde existe um baixo nivel de

coesao, fica evidente a cisao do objeto na dinamica familiar, au seja, como jll fai dilo,

a familia elege de forma inconsciente, urn depositario de suas dificuldades, a que

chama-se na Terapia Familiar Sistemica de Paciente Identificado. Que oada mais edo que 0 pertador do sintoma. Ele se "sacrifica" para defender a que foi chamado de

homeostase familiar, ternando-o indispens':;vel ao Sistema. Ele e a unico membra da

familia que neste momenta tem a possibilidade e impossibilidade de gerar

mudan""s. Pode-se dizer que a Paciente Idenlificado e vista como um bode

expiat6rio, uma vitima sabre a qual os outros elementos da familia se concentram,

para evitar ter que lidar uns com as outros.

21

o mesmo autor cita que quando 0 grupo familiar apresenta caesao excessiva

ale nao favorece interayOes com as Qutros grupos. Neste casa, a criam;a que

pertence a um sistema familiar rigido e restritivo apresenta problemas afetivos e de

relacionamento com as outros colagas de escola: limita a proximidade, 0 afetD, e a

proteQao. A crianya nao consegue fazer amigos.

Tambam a distnbui9aOde papais pode !razer disfun90es a familia

2.6.2 Distribui91ioe Desempenho de Papais

GILLIERON (1986) explica que a papel e socialmente dado e tem a ver com 0

que a indivlduo tem arquivado. Ou seja. as comportamentos se desenvolvem atraves

de papel de pai, de mae, elc.

Todos as indivfduos da familia podem desempenhar varios papais e varias

fun9iies: ele poden' ser marido, pai, sobrinho, profissional.

Quando questiona-se quem e quem denlro de uma famflia isto implica que os

papeis estao indiscriminados, au saja, nao astao de acordo com as fun~es que

deveriam sar desempenhadas.

SOUZA (1983) apresenta algumas situagoes em que a disfun91ioe aparente:

a marido e induzido a assumir a papel de pai, para compensar uma relayao anterior

fruslrante da mulher com seu pai; a filha deve ser c6pia exata da mae, nao pode ter

sua individualidade; a filho mais velho devera alcanyar a ideal que seu nunca

conseguiu; um dos filhos e a depositano das doenyas da familia; a marido exige a

adesao da familia em todos as seus problemas (nenhum dos membros pode

discordar dele).

22

A fungao remete a finalidade especifica de manter 0 sistema funcionando; e

algo delegado ao sujeito, ou seja, podera ser exercido por outra pessoa que nao

possui 0 papel correspondente. Em uma situagao escolar, se a crianya pertence a

um grupo com papeis e funVOesindeterminados, podera revelar problemas em seu

desempenho escolar em virtude da disfungao no funcionamento da familia, sendo

agressivo e desrespeitoso com os colegas na escola.

2.6.3 Hierarquia Grupal

Segundo GILLIERON (1986), 0 terceiro e ultimo tipo de disfungao esta

relacionado il ordem e a hierarquia do Sistema. Para entender esta disfungilo,

primeiramente, dave-se fazer uma explana<;ao do que vern a sar as regras au as

ordens nurn sistema familiar. As regras sao as mensagens de comando

padronizadas na estrutura de uma familia. A padronizagao regular das interaVOes

estabiliza os relacionamentos. Estes padroes, ou regras, podem ser deduzidos de

redundancias observadas na interagao. Usa-se a expressao regras de familia como

uma descrit;ao da regularidade e nao como urn conceito causal au determinante.

Ninguem determina as regras, na verdacte, as famllias em garal naD tern consciemcia

delas. Elas serao as premissas bBsicas que governam a opera9ao dos sistemas

familiares.

As regras, au regularidades, da interaC;;80 familiar operam para preservar a

chamada homeostase familiar, isto e, um equilibrio comportamental aceitavel dentro

da familia. Os mecanismos homeostaticos trazem as familias de volta a um equilibrio

previo diante de qualquer rompimento, e assim servem para resistir a mudanyas.

23

A disfun,ao ligada a ordem apresenta-se de duas formas: a primeira equando, na familia, na~ existem normas, au seja, nada e proibido, a que leva 0

grupo familiar, como um todo, a disfuncionalidade, pais 0 subsistema decis6rio

destas fammas sao permissivQS demais, nao colocando limites em seus filhos.

No caSD de urna pertencer a um grupo familiar com normas inexistentes,

rigidas, au ausentes, podera apresentar urn comportamento excessivamente

agressivo, manifestando atitudes de ataque e varios Qutros comportamentos

inadequados.

2.7 - A Interven9aodo Psicopedagogo

Como vista aeima, as problemas de aprendizagem podem ter como causa as

rela96es familiares e, sendo assim, a fun,ao do psicopedagogo e a de intervir junto

a familia, permitindo ao paciente identificado, " .. sair de posi980 de porfador do

sin/oma do grupo e receber ajuda de todo a sistema familiar, a fim de construir uma

nova rela,ao com 0 saber" (POLITY, 1998, p. 70).

o primeiro passD para a tentativa de resolu92.o de problemas e a observayao

das rela96es que permitira uma percep~8o mais abrangente e proxima da realidade

familiar. Segundo SOUZA (1983, p. 175), ..."este e a primeiro momenta da operagao

terapeutica". A observa,ao e focalizada tanto sabre a entrelagamento funcional da

familia quanta sabre 0 papel atribuido par ela ao terapeuta. Para chegar ao

diagnostico a psicopedagogo dever" saber como e onde centrar sua interven,ao.

Como firma CAUL (1987, p. 27) "Ele dever,; ser um musico que toca na orquestra

mas que tambem a conduz". 0 diagn6stico resultante, devera ser capaz de perceber

24

as niveis de articu\agao familiar, a distribuiyao e 0 desempenho dos papais e a

hierarquia grupa\. 0 psicopedagogo, devera conhecer profundamente a teoria sobre

o assunto para entao, propor algum tipo de mudanga, deixando de focar

apenas 0 "portador do problema", quer dizer, 0 paciente identificado, focando toda a

familia.

A conversagao com a familia do paciente identificado permite nao 56 a

observagao dos padroes de relacionamento, mas tambem, " .. gera a possibilidade

da propria familia perceber reflexivamente estas rela90es e criar novas experiencias,

ampliando seu roteiro, escrevendo novas e melhoras hist6rias", afirma CRUZ (2000,

p. 2). Na terapia familiar a eomunicagao elaborada entre paeiente e terapeuta e uma

dimensao fundamental para a solugao de problemas.

Quando 0 problema e estrutural, quer dizer, mantidos pelas as intera<;6esno

sistema familiar, as abordagem devem ser breves, buscando criar mudangas que se

espalhem por todo os sistema e que resultem em reeorganizagao (PISZEZMAN,

1999). 0 easo de I.B.N. a frenle relatado, parece enquadrar-se neste tipo de

problema.

No aspecto da hierarquia grupal, a intervengao do psicopedagogo sera a de

se !I0sicionar para que a mae coloque limites nas atitudes do filho. Quando os pais

naoalkl~m nogoes de responsabilidade, autoridade e limites bem delineados para

que os membras da familia possam interagir adequadamente, este desequilibrio em

sua estrutura se estende ao macro sistema, nestecaso, a escola. Estando na

eseola 0 trabalho do psicopedagogo se estendera a ela, e ai, como afirma

GASPARIAM (1998), ao intervir, todo 0 cuidado e pouco, pois as categorias que a

escola se utiliza nem sempre sao as mesmas da psicopedagogia. Nesse caso, torna-

se necessario deseobrir a fase de evo/Uq8oque a eseo/a esta e se ela aceita ou nao

o trabalho do psicopedagogo. Nao se deve nunca porem, deixar de relacionar a

familia ao processo.

Entretanto, como cada casa tem suas caracteristicas proprias, a psicopedago,

em sua intervengao, naG ~ nunca deixar de procurar novas teorias que 0

aperfei90em e que se aproxime da realidade que esta par intervir.

No pr6ximo capitulo, apresentar-se-a alguns casos relacionados as

disfun0es antes mencionadas, mostrando ainda a posicionamentodo

psicopedagogo para ajudar na resolu980 dos problemas.

3. ESTUDO DE CASOS

3.1 eASOM.

Cita-s8, nesse ponto, 0 casa de M. N. S., menino de sete anos e 11 meses

(nascido em 24/09192), que apresenta uma dificuldade acentuada no que se refere a

aquisi!f8o da fala, com urn consequente reiardo nessa area, bastante significativo.

Seu vocabulario e muito reduzido, constando de aproximadamente vinte palavras. E

as frases que pronuncia sao constituidas de uma au duas palavras, acompanhadas

de linguagem anal6gica, principalmente express6es faciais, que, contudo, nem

sempre chegam a esclarecer completamente 0 significado do que pretende

comunic8c Seu desenvolvimento motor tambem evidencia uma certa defasagem,

tanto em termos de movimentos amplos como finos.

Dos cinco aos sete anos, M. frequentou uma aseela maternal que dispunha

de infraestrutura psicopedag6gica bastante precaria. Seus companheiros de geupo

tinham, em media, idade cronol6gica inferior a sua; assim tambem os interesses e

necessidades da turma eram marcadamente distintos, pois que tipicos de crianyas

mais jovens.

Ao iniciar 0 acompanhamento de M., logo que este ingressou na atual escola,

era evidente a preocupa<;ijo que tinha em rela<;ijo a ordem do ambiente. Sua'

professora mostrou-se logo bastante satisfeita, porque 0 menino passava grand€!

27

parte do tempo organizando a sala de atividades, guardando devidamente os

materiais que 0$ co\egas deixavam desorganizados.

A observayao do comportamento da crian98 interagindo com a mae quando

esta 0 levava au 0 buscava na escoia, ou mesma quando interagia com a

professora, permitia concluir que 0 manino ficava na expectativa de que os outros eque deveriam se esforyar par entender a sua linguagem primitiva; ele nao pareda

demandar maior esfor9Q para ser compreendido, embora S8 mostrasse chateado

quando isso nao S9 concretiz8v8.

A mae refere que em casa, a conduta de M. e semelhante a que demonstra

na escoia: em geral, fica dentro de casa, consigo, "arrumando coisas", 0 que a

agrada sobremaneira, porque assim M. "nao carre riscos de sa sujar e S8 machucar,

e tambem de que as outras crianyas judiem-no, pois ele e bobinho"

Uma amiga da mae, de longa data, conta que a epoca em que M. era menor,

chamava a atenyao 0 fato de que quando a familia frequentava festas nos finais de

semana, logo ap6s 0 almoyo, a mae S8 afastava do convivio de amigos bern como

do pai e outros familiares, levando M. consigo e se refugiando no autom6vel, como

se nao quisesse expor 0 filho em publico.

Meraee destaque 0 fata de que a mae possu! uma irma gemea univitelina, que

evidencia caracteristicas de deficiencia mental leve, bem como um irmao que

apresenta uma hipoacusia bastante profunda em decorrencia de lesao causada por

afecyao grave de que foi acometido na infancia. Esse irmao, ja adulto, e uma pessoa

bastante dependente da familia para a satisfayao das suas necessidades

quotidianas, de modo que a avo materna de M. se va constantemente envolvida nos

cuidados de urn filho que "nao cresce" E assim como a avo, a mae de M. cuida do

filho que nao cresce.

28

Percebe-se que, e5sa mae naG parecia querer a "cura" do filho, como S8

preeisasse expiar uma culpa, pagar uma divida a familia de origem, por ter fieado

com a sua parte mais "sadia". Alguns dados parecem refort;(af e5sa hipotese, como

V8remos. Urn deles trata-se de que, ao contatarmos pela primeira vez com a mae ha

urn ano e seis meses, ela referiu que M. S8 encontrava ha alguns meses em

atendimento com uma reeducadora, "amiga sua", a qual, conforme esclareceremos

mais adiante, nos pareceu incapaz de realizar uma abordagem adequada asdifieuldades de M. Aeresee-se a esse, 0 fato de que ha algum tempo atr,;s, M. fora

avaliado par uma fonoaudi6loga, "amiga da mae", que entendera naG estar 0 manioo

"pronto" para enfrentar atividades especificas de fonoaudiologia. E 0 eneaminhara,

entao, para pSicoterapia individual na qual, em nenhum momento, houve a

participa<;iiodo pai, e que foi interrompida porque, a certa altura, a psic6loga nao Ihe

dera "nenhuma esperan,a" de cura.

Assim, pareee que todas as tentativas feitas ate entao, estavam fadadas a

naD dar certa, pais que 0 sintoma tern urn valor claramente relacional nesta famma.

A medida que fomos acompanhando 0 caso ao longo de quase 2 anos, e

ampliando 0 espago para a participa<;iio prineipalmente da professora, esta deu-se

conta de que, enquanto M. se preocupava com a organiza980 da sala,

comportamento de grande valor social (assim como ocorria em casa), deixava de

partieipar das atividades com seu grupo de eompanheiros, dos quais ficava cada vez

mais distaneiado. E desde que a professora comegou a valonzar outros aspectos da

eonduta de M., este comegou a se expor mais: principalmente, passou a emitir

alguns gritos em tom de voz bastante elevado, e a tentar se fazer entender de

qualquer maneira. Algumas vezes, chegou a atirar brinquedos e outros objetos,

numa eonduta absolutamente oposta aque\a em que pretendia tudo bem controlado

29

e organizado. Concomitantemente, comeQJu a articular algumas novas palavras,

ainda que poucas e bastante prim arias, tais como "ba" e "meu". A reeducadora que 0

atendia ficou assustada com os novos comportamentos, principalmente aqueles em

que M. jogava objetos, as quais considerou muito agressivos. Algum tempo depois, a

mae veio a relatar que chegou mesmo a levar M. ao Centro Espirita para "tomar

passes", na tentativa de que 0 filho voltasse a ser "calmo e bem comportado".

Gradativamente, fomos conseguindo incluir tambem 0 pai no processo de

acompanhamento ao filho, ainda que a mae tenha tentado boicotar a sua

participa<;8.o,par diversas formas. Dizia, par exemplo, que 0 pai nao encarava com

seriedade 0 problema do filho, e que afirmava que com 0 tempo, ele superaria

naturalmente as dificuldades. Contudo, 0 pai nos pareceu bastante mobilizado, mas

nao estava disposto a gastar suas economias para buscar Qutros recursos

terapeuticos.

3.2 CASO L B. N.

I. B. N. tem 9 anos e 11 meses (nascida em 16/10/90).

A queixa no caso desta crian<;ae seu comportamento infantilizado, ou seia, euma criang8 que nao tern limites.

Na escola, sua desaten9ao e total.

Quando solicitou-se a presen"a dos pais na escola para soluy8o do problema,

a mae hesitou.

Contudo, 0 pal passou a comparecer a todos os encontros marcados com a

equipe interdisciplinar da escola, bem como aos eventos escolares, principalmente

30

as festas, em que sua filha pudesse vir a ter alguma apresentac;ao em publico,

sempre interessado em vii-Ia e fotografa-Ia. Chamou a alengao tambem um

comantario leito pelo pai referente a conduta da neuropediatra que atende I. he

algum tempo. Segundo ele, nao havena mais necessidade de expor sua filha ao

tratamento, de vez que, ata a momenta, nao foi comprovado nenhum dado

importante, a nivel organico, que justificasse segundo ele, uma carga de tratamento

tao acentuada. Portanto, 0 pai mostra-se uma figura menos perifarice do que fora

inic;almente caracter;zada pela mae, mas atrapalha a andamento do tratamento

cHnicoda filha.

E parece que, par ;550 mesmo, vem sendo excluido par aquala, para evitar

que, com sua participa«ao venha a provocar mudanvas no rumo do caso, quebrando

a sequencia de interagoes familiares e, portanto, ameagando a homeostase que tern

sido assegurada pelo sintoma de I.

3.3 CASO L N. C.

L N. C. tem 12 anos (nascida em 27/08/88) e tem dificuldade geral na

aprendizagem tendo em vista que a portadora de deficiencia mental e epilepsia.

E f;lha uniC8do casal, que colaboraram de todas as maneiras no tratamenta

cHnicoda filha.

Depois de um ana e sete meses de trabalho, h8 que sa assinalar que as

pequenas mudan9as que se fazem sen!ir na conduta de Luana parecem nos estar

revelando 0 seu desejo e a sua possibilidade de comunicac;ao verbal. Aos poucos,

comeva a expressar mais aspectos de si mesma, seja atraves de gestos, ainda que

31

um tanto desordenados, seja atraves do emprego de novas palavras, Deixa

"escapar' ou "libera" alga de si, que enlrega ao outro, pela via do ga5to, au da

palavrR Os selis movimenl05 que antes eram inibidos e controlados, comegam a ser

mais "soltos" e espontanecs; e mais liberados, chegam mesmo a ser agressivos, as

vezes. Tambem os gritos que emite, parecem nos dizer que agora pode se mostrar,

atraves da fala, liberando-se da culpabilidade que tern carregado, E sua professora

consegue, agora, entender e valorizar tais condutas, sob uma 6tica mals

abrangente, e desde um ponto de vista mais saudaveL No momenta, Luana comega,

inclusive, a participar, mesmo que timidamenle ainda, das "aulinhas de dange"

juntamente com sua turma. A qualidade da sua expressao grafica tambem vem

apresentando sensiveis mudan~s, com trayados mais firmes e formas mais

definidas, onde as diversas produ¢es ja revelam certa semelhan9a com a real.

Gradativamente, Luana vai rompendo as barreiras da comunicayao, com 0

auxilio e atenyao constante dos pais, Deixando de cumprir a regra familiar de se

constituir num bebe/doente que precisa ser perpetuamente cuidado/controlado,

Luana camege a ccupar novas espagos na familia e na escola

Os pais estao salisfeitos com as progressos da menina,

4. ANALISE E DISCUSSAO DOS CASOS

Pelo exposto, percebe-se que a participa9iio dos diferentes parceiros

sistemicos aD nrval da familia nuclear, da familia de origem, bern como dos parceiros

da rela9ao pedag6gica, tem side decisiva, tanto no que diz respeito a manuten9iio

do sistema interacional, como no que se refere a possibilidade de mudan9a que ora

vimos observando.

Inicialmente, a sintoma de M., de "manter as coisas guardadas e organizadas"

valorizado pela professora e par toda a ciasse, servia a todo 0 Sistema, e tinha

masmo urn valor intersistemico, pois essa era a fungeo de M. para a sua familia de

origem.

Apcs um atendimento psicopedag6gico adequado e segundo a visao

sistemica, M. vai deixando de ser a crian98 idealizada pelos pais que cumpria

fielmente 0 seu papel de nao saber/nao falar.

Com a inc\usao de Qutros parceiros educativDS, tais como 0 pai e a professora

vem sendo passlvel uma redefiniy80 das seqOencias interativas 9,

consequentemente, a substituigao das regras comunicacionais, que faziam parte do

sistema familiar de M.

Uma vez que enfoquemos a comportamento do aprendente na escola desde

urn ponto de vista sistemico, valorizando as comunicag6es interacionais,

necessariamente precisa ser revista a postura e a a9iio do psicopedagogo frente a

problemas como 0 acima especificado. Entretanto, nao e s6 do psicopedagogo que

33

depende esse trabalho. Par ser sistamico, e preciso juntar as atitudes da familia e

do professor a interven9iio pSicoterapeutica. Quando 0 professor estranhou 0 fato de

M comeear a jogar objetos, ele deveria ter dividido isso com 0 psicoterapeuta pais

assim, chegaria a conciusiio de que esse fato foi favon3vel ao paciente, e nao 0

contrario, uma vez que essa atitude demonstrou naG 56 uma passlvel comunicag8o

como ate fez com que ele pronunciasse algumas palavras.

Assim, no enfoque sistamico e preciso esclarecer todos os envolvidos no

problema para juntos, encontrar as solucoes.

No case de I.B.N., para uma solu9iio seria necessario primeiro, um trabalho

sobre a intera9iio familiar, pois 0 diagn6stico aponta para isso. Segundo CRUZ

(2000, p. 1), a terapia familiar aponta para uma "organizacao de contextos de

conversacoes que promovam saidas (a<iies eficazes) para 0 sistema consultante,

que se encontra paralisado em algum momento do seu desenvolvimento" . Essa

paralisia pode ser notada no momenta em que 0 pai acha que a filha nao mais

precisa ir ao neuropediatra e com a mae nao querendo expo-Ia em publico. Sem

organizar esses contexlos sera dificil para 0 psicopedagogo ajudar a solucionar 0

problema.

Ja terceiro caso, a queslilo e mais especifica, pOis se Irata de uma deficiencia

mental. Entretanto, esse e um caso que comprova a necessidade da familia no

desenvolvimento do trabalho do psicopedagogo. A familia de LN.C., colabora com 0

que for preciso e zela pelo desenvolvimento da filha. Apesar do problema, a familia

esta em interacao com ela, tendo-a como um membra alivo do processo familiar.

1550 conduz ao encorajamento do psicopadagogo em sa raunir com a familia,

procurar as solu<iies a fazer os devidos encaminhamentos.

34

Sendo assim, ao inves de dirigir suas aten<;6esna busca da identificac;iio de

causas geradoras do problema, ingressando no registro da patologia, dentro da

visao sistemica 0 psicopedagogo se voltan' para a decodificagao das mensagens

veiculadas; passara da condic;iio de medico curador da doenga para a condigao de

comunic610go. Isto nao quer dizer que a psicopedagogo deva adotar uma postura

ingenua, negando a possibilidade de que existam patologias individuais. Significa,

isto sim, que deve evitar centrar a seu trabalho voltado aos problemas de

aprendizagem pontuando, em primeira mao, a existencia au nao de "trac;os

patol6gicos"

Esta concepc;iio tem norteado a compreensao do que se passa com as

familias, nos tres casas estudados, conforme descrito anteriormente. Dassa forma,

nao esta descartada totalmente a possibilidade de que 0 "paciente identificado"

venha a reeeber atendimento especifico em outras areas profissionais. Porem,

considerou-se de importancia fundamental que primeiramente fosse rompida a

sequencia interacional intra e intersistemica, de modo a enfraquecer 0 valor do

sintoma e penmitirao paciente identificado, existir por si mesmo, por ja nao estar tao

implicado num perpetuo conflito de lealdade familiar e/ou escolar.

CONCLUSAO

Dado 0 exposto, sob uma perspectiva sistemica, 0 fundamental na

intervenyaOdo psicopedagogo nao e a busca da "causalidade psiquica do sintoma"

e sim 0 entendimento do seu significado relacional, seja no interior dos sistemas

familiar e escolar, seja nas relayoes intersistemicas. E uma vez que 0 problema de

aprendizagem se manifesta prioritariamente na escola, e se prolonga no contexto

familiar, ele se constitui, antes de tudo, numa questao de cunho psicopedag6gico.

Nada mais pertinente, entiio, do que buscar aborda-Io junto as pessoas implicadas,

tais como professores, orientadores, diretores, pais, etc., de tal modo que atraves da

colaborayao de cada um, se maximize a competencia de todos.

Outro aspecto a considerar e que 0 psicopedagogo precisa ficar atento para 0

verdadeiro significado do padido da ajuda, bem como por quem e feito este pedido,

quando e em que circunstancias. Porque, conforme REY (1988), quando um

professor pede ajuda para um aluno que esta com dificuldades, e provavel que ele,

professor, e que esteja com dificuldades a respeito de como se relacionar com

aquele aluno. E 0 que tradicionalmente tem acontecido e que 0 psicopedagogo,

centrando as suas atenyoes no "aluno-designado", desvirtua 0 foco da demanda.

Mas se por outro lado, 0 seu interesse passar a rela~o entre aquele que traz a

queixa e 0 "aluno-designado", esta deixa de ser 0 daenta e toma-se passivel nao 56

a melhoria da qualidade do encontro entre 0 aprendente e 0 ensinante e entre 0

psicopedagogo e aquele que solicita ajuda, como tambem a amjJisefuncional dos

36

sistemas implicados no sintoma do paciente identificado. Possibilita ainda, a

formulayao de hip6teses a respeito dos pontos focais das transagoes que estejam

interferindo na problematica, para entao decidir como articular a intervenyao.

A partir dai, fica ampliada a analise da relayao psicodag6gica, e se estabelece

um contexto de colaborayao entre os parceiros educativos e a familia. Se 0 sintoma

do nao-aprender tern, necessariamente, urn significado relacional, nao ha como

promover mudanya e liberar 0 seu portador aliviando 0 seu sofrimento, sem abalar a

homeostase a serviqa da qual 0 sintoma vem existindo. Um problema relacional

tende a ser melhor abordado com uma metodologia pautada na relayao,

especialmente a familiar.

Sendo assim, pode-se concluir que quando a disfuncionalidade de

aprendizagem e analisada dentro da visao sistsmica, e de fundamental importilncia

que 0 psicopedagogo analise todos as sistemas e sub-sistemas em que 0 paciente

identificado esteja inserido, possibilitando-Ihe ir al6m do simples aparente e

penetrando 0 problema em toda a sua extensao.

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