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PLANO DE SAÚDE E A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR HEALTH PLAN AND THE APPLICATION OF THE CONSUMER DEFENSE CODE Renata Rossi Pitas – Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins [email protected] Prof. Me. Danilo César Siviero Ripoli – UniSALESIANO Lins [email protected] ______________________________________________________________ _____ RESUMO O presente trabalho tem como objetivo demonstrar o direito à saúde suplementar e sua relação como o Código de Defesa do Consumidor. Para tanto, foi tratada da legislação específica dos planos e seguros privados de assistência à saúde (Lei nº 9.656/98) e sua compatibilidade com as disposições protetivas do Código de Defesa do Consumidor, ressaltando a aplicação desta lei nas situações conflitantes entre operadoras e usuários. Ao final, o trabalho procurou tratar de situações concretas e corriqueiras no cotidiano de aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos temas planos não regulamentados, reajustes anuais da mensalidade, reajustes por faixa etária, carências e coberturas temporárias, ressaltando nestes casos específicos o entendimento jurisprudencial prevalente. Palavras-chave: DIREITO À SAÚDE. SAÚDE SUPLEMENTAR. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ABSTRACT The present study aims to demonstrate the right to supplementary health and its relation as the Code of Consumer Protection. To this end, it was dealt with in the specific legislation of private health insurance plans and insurance (Law No. 9,656 / 98) and its compatibility with the protective provisions of the Consumer Protection Universitári@ - Revista Científica do Unisalesiano – Lins – SP, ano 7, n.15, jul- dez de 2016

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PLANO DE SAÚDE E A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

HEALTH PLAN AND THE APPLICATION OF THE CONSUMER DEFENSE CODE

Renata Rossi Pitas – Graduanda em Direito – UniSALESIANO [email protected]

Prof. Me. Danilo César Siviero Ripoli – UniSALESIANO Lins [email protected]

___________________________________________________________________

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo demonstrar o direito à saúde suplementar e sua relação como o Código de Defesa do Consumidor. Para tanto, foi tratada da legislação específica dos planos e seguros privados de assistência à saúde (Lei nº 9.656/98) e sua compatibilidade com as disposições protetivas do Código de Defesa do Consumidor, ressaltando a aplicação desta lei nas situações conflitantes entre operadoras e usuários. Ao final, o trabalho procurou tratar de situações concretas e corriqueiras no cotidiano de aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos temas planos não regulamentados, reajustes anuais da mensalidade, reajustes por faixa etária, carências e coberturas temporárias, ressaltando nestes casos específicos o entendimento jurisprudencial prevalente.

Palavras-chave: DIREITO À SAÚDE. SAÚDE SUPLEMENTAR. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

ABSTRACT

The present study aims to demonstrate the right to supplementary health and its relation as the Code of Consumer Protection. To this end, it was dealt with in the specific legislation of private health insurance plans and insurance (Law No. 9,656 / 98) and its compatibility with the protective provisions of the Consumer Protection Code, emphasizing the application of this law in situations of conflict between operators and users . In the end, the work sought to deal with concrete and mundane situations in the day-to-day application of the Consumer Protection Code to unregulated plans, annual readjustments of the monthly rate, readjustments by age group, shortages and temporary coverages, highlighting in these specific cases the jurisprudential understanding Prevalence.

Keyword: HEALTH LAW. SUPPLEMENTAL HEALTH. CONSUMER PROTECTION CODE

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INTRODUÇÃO

O surgimento das operadoras de planos de saúde no Brasil se deu em razão

da ineficiência estatal na gestão da saúde pública.

Com o aumento considerável da oferta de planos de saúde, iniciaram-se

conflitos entre consumidores e operadoras, razão pela qual surgiu a necessidade da

intervenção, ou seja, da regulação estatal.

A regulação genérica da relação entre operadoras e consumidores era

baseada no Código de Defesa do Consumidor, porém foi necessário um regramento

específico devido as confusões e inseguranças jurídicas que começaram a existir.

Foi em 1998 que o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 9.656, onde trouxe a

restrição da liberdade das operadoras e ampliação da cobertura mínima a ser

oferecida. Trata-se de uma lei bem extensa, sendo que o objetivo deste trabalho

será focar em alguns aspectos mais relevantes desta norma e os conflitos existentes

entre a mesma e o Código de Defesa do Consumidor. Apesar de atualmente as

operadoras possuírem uma lei especial que as regulamenta e as fiscaliza

rigorosamente, existe o conflito com o Código de Defesa do Consumidor onde

protegeria o consumidor somente na omissão desta Lei, mas que está atuando o

tempo todo em proteção ao consumidor.

Os conflitos quando existentes são solucionados pelo poder judiciário, que

decide qual lei prevalecerá.

Para a elaboração do presente trabalho, a metodologia utilizada consistiu no

levantamento bibliográfico e jurisprudencial sobre o assunto.

1 A APLICABILIDADE DA LEI Nº 9.656/98 EM CONJUNTO COM O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Diante da ineficiência da saúde pública no Brasil, o ramo da saúde

suplementar passou a ter grande relevância no país, traduzindo num mercado muito

grande, que gera inúmeros conflitos entre as operadoras de saúde e o usuário.

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Em 1998 foi criada a Lei nº 9.656, que buscou garantir o atendimento aos

beneficiários de planos de saúde, com ênfase no compromisso com a qualidade dos

serviços prestados.

A aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas relações entre planos

de saúde e seus consumidores é fundamental para preencher as lacunas, regulando

relevantes questões que não foram cuidadas pela legislação específica, ou seja, Lei

nº 9.656/98.

O presente artigo irá trazer casos recorrentes nas relações entre operadora e

consumidor, onde a aplicação da Lei nº 9.656/98 é mitigada e em alguns casos não

observada, em decorrência das normas protetivas do Código de Defesa do

Consumidor.

Dezenas de casos específicos poderiam ser tratados, no entanto, para não se

tornar um trabalho extenso e exaustiva sua leitura, será tratado os principais, ou

seja, os que são diariamente debatidos na mídia e julgados pelos nossos tribunais.

1.1 Planos não regulamentados.

O artigo 35 da Lei nº 9.656/98, dispõe que sua aplicação abrange todos os

contratos celebrados a partir de sua vigência, assegurada aos consumidores com

contratos anteriores, bem como aqueles com contratos celebrados entre 2 de

setembro de 1998 e 1º de janeiro de 1999, a possibilidade de optar pela adaptação

ao sistema previsto na referida lei, que dispõe sobre planos e seguros privados de

assistência à saúde. Tal adaptação conforme discorrem os parágrafos do artigo 35

da Lei dos planos de saúde, deverá ser formalizada em termo próprio, assinado

pelos contratantes, de acordo com as normas a serem definidas pelas Agência

Nacional de Saúde Suplementar (ANS):

A partir de 01.01.1999 os contratos anteriores ficaram mantidos como foram pactuados, desde que o consumidor não atendesse ao comunicado de que a adaptação oferecida pela operadora tinha sido aceita, com o pagamento do novo valor da mensalidade, submetida à fiscalização posterior da ANS, segundo a disposição do § 2º do art. 35 da Lei 9.656. A ANS pode requisitar das operadoras as planilhas de custos incluindo os valores das modificações dos contratos novos, obedecendo aos novos padrões estabelecidos pela Lei 9.656 e com base nestas informações ordenar sua alteração quando o novo custo da mensalidade não estiver justificado. (BOTTESINI; MACHADO; 2015, p. 331).

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E para que os consumidores não sejam prejudicados em relação as

carências, o § 3º deixa explicito que a adaptação não implicará nova contagem dos

períodos de carência e dos prazos de aquisição dos benefícios previstos nos arts. 30

e 31 da mesma Lei.

Diante das informações acima, a adaptação não prejudicará o consumidor em

relação as suas carências já cumpridas. Nestes termos doutrinam Maury Angelo

Bottesini e Mauro Conti Machado:

A regulamentação da ANS para a adaptação dos contratos aos termos da Lei 9.656 de 1998, provocou o surgimento do que se convencionou chamar de “novos direitos”. São tantas as normas regulamentares que algumas se desprendem da legislação básica e acabam impondo às operadoras de planos e seguros privados de assistência à saúde algumas obrigações que ultrapassam os limites da legislação, tanto daquela que disciplina a atividade das operadoras como da que limita o poder regulatório da ANS. (BOTTESINI; MACHADO, 2015, p.334)

Após a Lei nº 9.656/98, tornou-se facultativo aos beneficiários a opção de

optar por um plano regulamentado, o qual alguns consumidores optaram por não

regulamentar seu plano, pelo fato do encarecimento de suas mensalidades, devido

as mudanças proporcionadas com o advento da Lei nº 9.656/98, já que com a

regulamentação houve aumento no rol de coberturas atendidas e

consequentemente, do preço dos serviços prestados, sob pena de ocorrer um

desequilíbrio financeiro que prejudicaria as prestadoras de saúde suplementar.

Afinal, a legislação deu o direito à opção para beneficiar a parte mais fraca

dessa relação, que é o consumidor, portanto para aqueles usuários que optaram a

permanecerem nos planos antigos, deverão ser aplicadas as disposições garantistas

do Código de Defesa do Consumidor para exigir seus direitos:

A desvantagem de ficar com o contrato antigo é que, em muitos casos, será necessário recorrer à justiça, o que pode ser custoso e demorado. Mas a possibilidade de vencer, em face de um abuso do plano de saúde, é grande. Para ilustrar a questão, imagine um consumidor que decide ficar com o seu plano antigo, que prevê exclusão de cobertura para cirurgia cardíaca. Se ele necessitar de uma cirurgia cardíaca, é certo que a empresa irá negar atendimento. Como ele não possui o contrato nos termos da nova lei, terá de recorrer à Justiça para fazer valer seu direito, baseando se no Código de Defesa do Consumidor. A batalha nos tribunais não é prazerosa, mas, pelo retrospecto da atuação da Justiça, há grande chance de o usuário ver seu direito reconhecido. (SALAZAR; RODRIGUES; SILVER; DOLCI, 2001, p. 14)

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Entretanto, quando há conflitos contratuais em relação a exposição da saúde

e vida de um consumidor, irá prevalecer o bem mais precioso que é a vida e saúde

do consumidor, até porque o objeto do contrato firmado entre as partes é garantir à

assistência à saúde. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos planos

não adaptados, autorizando a realização de procedimentos de saúde específicos

aos planos regulamentados tornou-se uníssona em nossos tribunais, conforme

ementa abaixo:

PLANO DE SAÚDE Exclusão de exame de mamotomia por estereotaxia - Descabimento - Se coberta a doença, estará coberto o tratamento -Incompatibilidade lógica na redação do contrato que se resolve a favor do consumidor Rol de atendimentos da ANS que é mera referência. DANO MORAL - Inocorrência - Negativa de cobertura contratual que, por si só, não dá causa àquela modalidade de vilipendio - Ausência de prova de ofensa anormal à personalidade da paciente -Dissenso contratual Precedentes. Recursos desprovidos. (TJ-SP - APL: 190160920098260362 SP 0019016-09.2009.8.26.0362, Relator: Roberto Solimene, Data de Julgamento: 17/03/2011, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/03/2011).

Ademais, por se tratar de contrato sucessivo ou de execução continuada, a

Lei nº 9.656/98, que é de ordem pública, aplica-se imediatamente à espécie,

juntamente como o Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula nº 100 do

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

Súmula 100: O contrato de plano/seguro saúde submete-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor e da Lei n. 9.656/98 ainda que a avença tenha sido celebrada antes da vigência desses diplomas legais.

1.2 Reajustes anuais

Nos contratos novos individuais/familiares, o reajuste anual deve ser

aprovado pela ANS e previsto no contrato. No caso dos contratos antigos, ou seja,

firmados até 31/12/1998, deve ser aplicado o mesmo índice de reajuste anual

autorizado pela ANS para os contratos novos. Todos os contratos devem

estabelecer de forma clara quais os critérios de reajustes e revisão da

contraprestação pecuniária, o qual é obrigatório que a operadora ofereça ao

consumidor pelo menos duas opções que levem ao reequilíbrio do plano. As opções

têm que ser aprovadas pela ANS antes de serem propostas ao consumidor e os

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ajustes propostos têm que ser oferecidos como opções ao consumidor, não como

obrigação.

Nos planos individuais ou familiares o reajuste sofrido anualmente sujeita-se a

autorização prévia da ANS, conforme afirma o autor José Luis Toro da Silva (2005,

p. 107), segundo o qual, o reajuste deveria ser arbitrado distintamente por

operadora, levando em consideração o perfil de cada uma, através dos dados em

que ANS possui devido as informações econômico-financeira que são enviadas

trimestralmente e obrigatoriamente.

Estes reajustes, que são estipulados anualmente pela agência reguladora de

saúde, continuam sendo uma das diversas reclamações dos consumidores.

Mesmo com a Lei nº 9.656/98, não resolveu o problema de reclamação de

reajuste, pois apenas obriga que sejam devidamente discriminados no contrato, e as

operadoras continuam justificando o aumento das mensalidades com base nos

custos médico-hospitalares, sendo somente esta justificativa vaga e por si só

abusiva, conforme alertam os doutrinadores Andrea Salazar, Karina Rodrigues, Lynn

Silver e Maria Inês R. Landini Dolci (2001, p. 29).

Além disso, o art. 41 do Código de Defesa do Consumidor é expresso que no

caso de fornecedores de produtos ou serviços sujeitos ao regime de controle ou de

tabelamento de preços, os fornecedores deverão respeitar os limites oficiais sob

pena de, não fazendo, responderem pela restituição de quantia recebida em

excesso, monetariamente atualizada, podendo o consumidor exigir, à sua escolha, o

desfazimento do negócio, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

A propósito, comentando o artigo 41 da legislação consumerista, lecionam

Claudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamim e Bruno Miragem:

A norma advém, sem dúvida, das anteriores experiências brasileiras com planos de estabilização econômica, congelamentos e a cobrança de ágio nas relações de consumo, com danos para o consumidor. A dificuldade prática da norma são os chamados “negócios de bagatela”, onde o consumidor lesado geralmente não reclama, mas, como o dano é coletivo, podemos pensar, nos sistema atual do CDC, que as entidades de defesa do consumidor ou o Ministério Público entrem com ações para evitar a prática comercial proibida da cobrança de ágio. (MARQUES; BENJAMIN; MIRAGEM, 2006. p. 587).

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O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 39, inciso X, assegura aos

consumidores a proibição de elevar sem justa causa o preço de produtos ou

serviços. A propósito, já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

PLANO DE SAÚDE COLETIVO. APLICAÇÃO DE REAJUSTES ANUAIS. ABUSIVIDADE VERIFICADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA PARA JULGAR PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO INICIAL. 1. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde coletivo. 2. Muito embora não haja, aprioristicamente, ilicitude na cláusula contratual que preveja reajuste anual das mensalidades dada a majoração da sinistralidade ou dos custos operacionais [reajuste técnico], não há prova suficiente que justifique o aumento da mensalidade no montante aplicado, nem a participação efetiva dos beneficiários individuais ou da pessoa jurídica estipulante no cômputo de tal reajustamento, o que o torna, in casu, abusivo. Julgamento de procedência em parte do pedido inicial, apenas para declarar a abusividade dos reajustes anuais aplicados nos exercícios de 2013 e 2014 nas mensalidades cobradas do autor. 3. Recurso de apelação do autor provido em parte. (TJ-SP - APL: 10261668220148260577 SP 1026166-82.2014.8.26.0577, Relator: Piva Rodrigues, Data de Julgamento: 15/03/2016, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/03/2016).

Considera-se, então, abusivo todo reajuste que não tenha prova suficiente

para sua aplicação, sendo direito do consumidor ter conhecimento destes reajustes

para que não sofra indevidamente tais aplicações.

1.3 Reajuste de preço por faixa etária.

O valor da contraprestação de um contrato de assistência à saúde varia em

função dos riscos assumidos pela operadora de plano de saúde. Nesta esteira,

ensina José Luiz Toro da Silva:

Obviamente os mais jovens estão sujeitos a riscos menores do que os mais velhos. Consequentemente, o preço cobrado dos mais jovens é manifestamente inferior aquele pago pelos mais velhos, que estarão muito mais sujeitos a utilizarem-se da cobertura oferecida pela operadora de planos de saúde. (SILVA, José, 2005, p. 96)

É devido ao entendimento acima que além da revisão anual do valor da

contraprestação nos planos de saúde, conforme já mencionado no subtítulo anterior,

os consumidores sofrem e se sujeitam periodicamente ao aumento do valor do preço

em decorrência de passagem de uma para outra faixa etária.

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O Conselho de Saúde Suplementar (CONSU), órgão colegiado deliberativo

criado com a finalidade de atuar na definição, regulamentação e controle das ações

relacionadas com a prestação de serviços de saúde suplementar, fixou os reajustes

em 7 (sete) faixas, dando à operadora o direito de efetuar o reajuste da

mensalidade, além do aumento anual, nas seguintes passagens de faixas etárias: a)

até 17 anos; b) de 18 a 29 anos; c) de 30 a 39 anos; d) de 40 a 49 anos; e) de 50 a

59 anos; f) de 60 a 69 anos e g) de 70 anos em diante.

Com a aprovação da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do idoso) ficou proibido o

reajuste decorrente de faixa etária para as pessoas com mais de 60 anos de idade

nos planos de saúde, sendo que o artigo 15, parágrafo único da Lei nº 9.656/98

reforça expressamente a vedação da variação das contraprestações pecuniárias

para consumidores com mais de 60 (sessenta) anos de idade ou sucessores, há

mais de dez anos na mesma empresa. (BOTTESINI; MACHADO, 2015, p. 146).

Tal sistemática é adotada para não onerar excessivamente os planos para as

pessoas mais idosas, bem como não permite a incidência de reajuste decorrente de

mudança de faixa etária para as pessoas com mais de 60 anos, devido ao Estatuo

do Idoso.

Ocorre, que mesmo estes reajustes tendo aprovação pela ANS e em

conformidade com a legislação reguladora, intérpretes do Código de Defesa do

Consumidor e o judiciário enxergam abusivos tais reajustes, principalmente em sua

última faixa de 59 anos, devido a onerosidade excessiva no momento em que mais o

consumidor precisa de assistência médica, sendo certo que tal cláusula de reajuste

vem sendo considerada abusiva e tem como consequência sua nulidade, conforme

se demonstra da decisão judicial abaixo:

Plano de saúde. Incidência do Código de Defesa do Consumidor. Contrato firmado antes da entrada em vigor da Lei 9.656/98. Incidência da referida lei no contrato nos termos da Súmula nº 100 do TJSP. Reajuste. Aumento na mensalidade por mudança de faixa etária no percentual de 67% quando a autora completou 51 anos. Inadmissibilidade. Percentual exorbitante fixado unilateralmente pela ré. Impossibilidade de manutenção do critério de reajuste fixado, porquanto claramente abusivo. Pleito de devolução dos valores pagos a mais, provido. Juízo "a quo" analisou corretamente as questões suscitadas e o conjunto probatório. Incidência do artigo 252 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Desnecessária repetição dos adequados fundamentos expendidos pela r. sentença recorrida. Sentença mantida. Recurso improvido. (TJ-SP - APL: 10128559320148260554 SP 1012855-93.2014.8.26.0554, Relator: José

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Joaquim dos Santos, Data de Julgamento: 10/03/2015, 2ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/03/2015).

As operadoras de saúde defendem que o reajuste não pode ser considerado

abusivo, uma vez em que o Estatuto do Idoso é considerado a partir dos 60

(sessenta) anos e não 59 (cinquenta e nove) anos:

A questão em estudo, ou seja, da retroatividade do Estatuto do Idoso ainda não está pacificada, causando uma atmosfera de insegurança no mercado de saúde suplementar, tendo em vista o expressivo número de beneficiários idosos em tal condição. (SALLAI, 2016).

Devido a isso, Sallai (2016) defende a proteção ao consumidor,considerando

os reajustes por faixa etária como abusivos e que afrontariam o art. 15 do Estatuto,

independente da data da celebração do contrato, mesmo para os contratos

posteriores a Lei nº 9.656/98 como para os anteriores.

1.4 Período de carência e coberturas temporárias.

O art. 12 da Lei nº 9.656/98 menciona expressamente os limites mínimos e

verdadeiros pisos para as amplitudes de cobertura. Maury e Mauro (2015, p. 107)

ensinam que esses limites permite a diferença entre os planos, onde tem por

objetivo proporcionar concorrência nas operados e dar a liberdade para que os

consumidores possam fazer a melhor escolha. O autor José Luiz, faz o seguinte

conceito de carência:

Entende-se por carência, o período que a cobertura contratual ficará suspensa, ou seja, em que o consumidor não poderá usufruir determinado atendimento, que somente lhe será assegurado após o decurso do mencionado lapso temporal. Esse período serve de captação para a operadora, pois terá direito às contraprestações pecuniárias, sem que tenha que cobrir os atendimentos que se sujeitam ao período de carência. (SILVA, 2005, p. 92)

Os prazos máximos de carências são fixados pela Lei nº 9.656/98 em seu art.

12, V, aplicáveis tanto aos contratos de assistência médica ou odontológica, tanto

aos contratos individuais/familiares, como aos contratos coletivos, sendo 300 dias o

prazo máximo de carência para partos a termo, 180 dias para os demais casos e 24

horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência.

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Já a cobertura parcial temporária na doutrina de Maury Ângelo Bottesini e

Mauro Conti Machado possui o seguinte conceito:

A cobertura parcial temporária é a exclusão do tratamento integral de doenças preexistentes enquanto o usuário do plano cumpre a carência, seja em razão da adaptação de contrato anterior, sem cobertura para determinadas doenças e tratamentos, seja em razão de contrato novo, assinado a partir de 01/01/1999, seja ainda, em razão da migração para outro segmento utilizando a portabilidade. (BOTTESINI; MACHADO, 2015, p.108).

As condições e prazos para estas coberturas estão definidas na resolução da

ANS nº 162/07, em art. 2º.

Para fins desta resolução, consideram-se doenças ou lesões preexistentes,

aquelas que o beneficiário ou seu representante legal saiba ser portador ou sofredor,

no momento da contratação ou adesão ao plano privado de assistência à saúde e a

cobertura parcial temporária, aquela que admite, por um período ininterrupto de até

24 meses, a partir da data da contratação ou adesão ao plano privado de assistência

à saúde, a suspensão da cobertura de procedimentos de alta complexidade, leitos

de alta tecnologia e procedimentos cirúrgicos, desde que relacionados

exclusivamente às doenças ou lesões preexistentes declaradas pelo beneficiário ou

seu representante legal.

Na jurisprudência abaixo e prevalente, é necessária a prova de que o

segurado agiu de má fé na ocasião da celebração do contrato, caso contrário se o

segurado provar de que desconhecia a doença, a operadora não poderá negar com

o motivo de preexistência. É necessário documento assinado pelo segurado ou

exames que comprovam a doença antes da celebração contratual. Neste sentido:

PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. SEGURO DE VIDA. DOENÇA PREEXISTENTE. COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ DO FALECIDO POR OCASIÃO DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO. 1. A não realização de exames prévios de admissibilidade do contratante ao plano de seguro implica a assunção de risco pela seguradora e, consequentemente, sua responsabilização por eventual sinistro, salvo no caso de má-fé do segurado ou quando este tenha plena ciência da doença preexistente e omite tal informação. Precedentes. 2. No caso, tendo concluído a instância de origem pela efetiva comprovação da má-fé do contratante do seguro de vida, rever tal entendimento importa a necessidade de revolvimento de matéria fático-probatória, insindicável ao STJ na estreita via do recurso especial, ante o óbice erigido pela súmula 07 do STJ. 3. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1172420 SP 2009/0249644-7, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 24/04/2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/04/2014).

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Sendo assim, caso a operadora não comprova que houve má fé e o

consumidor comprovar que desconhecia tal patologia, não será considerada

preexistência.

CONCLUSÃO

A importância deste artigo foi demonstrar que o conflito entre o consumidor e

a operadora existe e sempre existirá, pois de um lado temos o consumidor que

possui seu direito assegurado no art. 196 da Constituição Brasileira e de outro lado,

temos a operadora, que possui sua lei própria para garantir a segurança em manter

seu equilíbrio econômico com o objetivo de continuar garantindo seus serviços

oferecidos.

Diante da implantação da Lei nº 9.656/98, o Código de Defesa do Consumidor

teve papel fundamental para preencher as lacunas referentes as questões

relevantes que não são cuidadas pela legislação específica, ou seja, onde a Lei nº

9.656/98 foi omissa.

Contudo, na realidade, o judiciário não interpreta desta forma, conforme

jurisprudências apresentadas, onde ficou claro que possuindo situações de conflitos

entre o consumidor e a operadora, prevalece o Código de Defesa do Consumidor,

pois sendo o objeto a prestação de um serviço de acesso e garantia a saúde de

forma privada, prevalecerá o bem maior, ou seja, a vida independentemente das

disposições contratuais preestabelecidas.

Conclui-se, portanto, que os conflitos aqui postos terão na maioria das vezes

decisões favoráveis ao consumidor, em razão de ser considerada a parte mais fraca

e vulnerável na relação contratual, sendo inquestionável a aplicação da legislação

protetiva do Código de Defesa do Consumidor nas questões que foram examinadas.

Não é demais repetir, que o trabalho procurou tratar de pontos específicos e

mais recorrentes no trato sucessivo entre os consumidores e operadoras, que

causam inúmeros conflitos que são levados a solução pelo judiciário, sendo certo

que o artigo se mostra de grande relevância para que o consumidor tome

conhecimento de seus direitos perante as operadores e assim possam se orientar.

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