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1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA – GOIÁS. URGENTE – PEDIDO LIMINAR 'INAUDITA ALTERA PARS' O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio da Promotora de Justiça subscritora, titular na 1ª Promotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia/GO, no desempenho de suas atribuições constitucionais (Artigo 127, CF) e legais contidas no artigo 72, incisos I, da Lei Federal n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso) e do Código de Defesa do Consumidor, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com o natural e costumeiro respeito, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO JURÍDICO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO COM PRECEITO COMINATÓRIO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER, MEDIANTE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA em desfavor do BANCO CRUZEIRO DO SUL S/A, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob n.º 62.136.254/0001-99, com sede na Rua Funchal, n.º 418, 07º/09º andares, Edifício E-Tower, Vila Olímpica, São Paulo/SP, CEP 04551-060, telefone (11) 3848 – 1800, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor: __________________________________________________________________________________________________________ Av. Maranhão, esq, com Rua 10 – Setor Alto Alegre CEP 76590-000 - TEL/FAX: (62) 3364-1020

URGENTE – PEDIDO LIMINAR 'INAUDITA ALTERA PARS' · aÇÃo civil pÚblica declaratÓria de inexistÊncia de vÍnculo jurÍdico cumulada com repetiÇÃo de indÉbito com preceito

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1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE

SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA – GOIÁS.

URGENTE – PEDIDO LIMINAR 'INAUDITA ALTERA PARS'

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio da

Promotora de Justiça subscritora, titular na 1ª Promotoria de Justiça de São Miguel do

Araguaia/GO, no desempenho de suas atribuições constitucionais (Artigo 127, CF) e

legais contidas no artigo 72, incisos I, da Lei Federal n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso) e

do Código de Defesa do Consumidor, vem, respeitosamente, à presença de Vossa

Excelência, com o natural e costumeiro respeito, propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO JURÍDICO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO

COM PRECEITO COMINATÓRIO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER, MEDIANTE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA

em desfavor do BANCO CRUZEIRO DO SUL S/A, pessoa jurídica de

direito privado, inscrita no CNPJ sob n.º 62.136.254/0001-99, com sede na Rua Funchal,

n.º 418, 07º/09º andares, Edifício E-Tower, Vila Olímpica, São Paulo/SP, CEP 04551-060,

telefone (11) 3848 – 1800, pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:

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I – DO COMPÊNDIO FÁTICO

Os idosos EDSON FERREIRA GAMA que conta atualmente

com 77 (setenta e sete) anos e GENEROSA FERREIRA BATISTA de 62 (sessenta e

dois) anos de idade, noticiaram em janeiro do corrente ano, junto à Promotoria de Justiça

de São Miguel do Araguaia/GO, que foram vítimas de um golpe envolvendo sua conta-

benefício do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em virtude da ocorrência de

transação financeira, na modalidade de empréstimo consignado, realizados sem o

expresso consentimento dos supostos interessados.

Segundo narrado pelo idoso EDSON FERREIRA GAMA, na

data do dia 30.11.2011, esteve em sua residência um corretor de crédito da empresa A

Jato Crédito Pessoal, agente credenciado do Banco Cruzeiro do Sul S/A, chamado

Geder Vilela, ocasião em que ofereceu ao referido ancião empréstimos de valores, na

modalidade de empréstimo consignado. Todavia, o citado idoso não demonstrou interesse

em realizar a transação financeira.

Não obstante a isso, insatisfeito com a resposta negativa, dito

corretor de crédito aproveitando-se da inocência, simplicidade e ingenuidade de uma

pessoa com a idade avançada, sorrateiramente teve acesso aos documentos de EDSON FERREIRA GAMA que estavam sobre à mesa e, sem autorização, coletou seus dados

pessoais e de forma fraudulenta realizou uma transação financeira no valor de R$

4.930,66 (quatro mil, novecentos e trinta reais e sessenta e seis centavos), na modalidade

de empréstimo consignado, cujo valor encontra-se disponível em sua conta.

Irresignado, haja vista que não assinara nenhum tipo de

contrato junto à empresa credenciada ao Banco Cruzeiro do Sul S/A, o idoso procurou

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imediatamente a Promotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia procurando por auxílio,

pois mensalmente vem sendo descontado de seu benefício previdenciário prestações no

valor de R$ 160,00 (cento e sessenta reais), referentes à transação financeira.

De igual maneira, a idosa GENEROSA FERREIRA BATISTA e

seu companheiro também foram procurados pelo mesmo corretor de créditos alhures

declinado, ocasião em que este ofereceu a mesma proposta ao casal de idosos, que

semelhantemente se negaram a efetuar a transação, pois poderia comprometer a renda

da família, diante do rotineiro uso de medicamentos.

Em virtude da resistência do casal, o corretor de créditos

continuou a insistir na execução do empréstimo. No entanto, vendo que seu trabalho seria

vão, este valendo-se de um 'modus operandi' um pouco distinto, mas visando o mesmo

propósito, ou seja, conseguir extrair os dados pessoais do casal de anciãos, se propôs a

realizar apenas uma espécie de cadastro prévio, para que caso após decidissem efetuar o

negócio, o cadastro já estaria pronto, facilitando, assim, na sua aprovação junto à

instituição financeira. Inocentes, a idosa aceitou a proposta, porém não assinou nenhum

contrato ou documento.

Passados os meses, GENEROSA FERREIRA BATISTA percebeu que seu benefício previdenciário começou a vir em valor inferior ao devido.

Preocupada, ao investigar o que estava acontecendo, descobriu para sua surpresa, que o

empréstimo outrora negado tinha sido creditado em sua conta no valor de R$ 1.972,26

(Mil novecentos e setenta e dois reais e vinte e seis centavos), motivo pelo qual levou à

idosa a procurar o Ministério Público.

Impende ressaltar, que os empréstimos creditados nas contas

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de EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA permanecem

incólume aguardando o momento mais oportuno para sua devolução à instituição

financeira responsável pela transação, tal seja o Banco Cruzeiro do Sul S/A.

Insta destacar, que referidos idosos nunca tomaram tais

empréstimos ou autorizaram que terceiros o fizessem, especialmente, qualquer tipo de

transação com bancos ou financeiras. Jamais tiveram seus documentos pessoais

extraviados ou cederam a terceiros, nem assinaram documentos ou constituíram

procurador para tanto. Os idosos somente descobriram que foram vítimas de fraude

quando notaram que seus benefícios previdenciários começaram a vir em valor inferior ao

devido.

Diante de tais fatos, foram requisitadas informações ao INSS, o

qual apresentou os dados referentes à operação financeira realizada. Constatou-se que o

possível estelionatário conseguiu realizar empréstimos incidentes sobre os benefícios

previdenciários dos idosos, junto ao Banco Cruzeiro do Sul S/A.

Após o recebimento de ofício enviado pelo Ministério Público

do Estado de Goiás ao Banco Cruzeiro do Sul S/A, foi requisitado a suspensão em 48

(quarenta e oito) horas dos descontos das prestações do empréstimo no benefício de

aposentadoria dos idosos, sendo que a instituição financeira até a presente data não

encaminhou nenhuma informação a este Órgão Ministerial sobre eventual suspensão dos

descontos.

Instados, a idosa GENEROSA FERREIRA BATISTA afirmou

que há aproximadamente três meses a instituição financeira deixou de descontar em seu

benefício as parcelas do empréstimo. No entanto, quanto ao empréstimo consignado

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vinculado ao benefício previdenciário do idoso EDSON FERREIRA GAMA até o presente

momento o Banco Cruzeiro do Sul S/A não promoveu a suspensão dos descontos.

Curial enfatizar, que o empréstimo realizado na conta dos

idosos não tiveram sua anuência, ficando a cargo do Banco Cruzeiro do Sul S/A o ônus

da prova em contrário. Ademais, o Banco não poderia ter realizado o empréstimo sem

consentimento expresso dos titulares.

Salienta-se ainda, que os contratos de empréstimos realizados

por bancos obedecem às orientações do Banco Central do Brasil que possui resolução

específica dispondo sobre o assunto.

Assim agindo, o Banco Cruzeiro do Sul S/A, que ora figura

como réu, através da empresa A Jato Crédito Pessoal, descumpriu frontalmente o Código

Civil, o Estatuto do Idoso (lei 10741/03) e o Código de Defesa do Consumidor (Lei

8.078/1990), não deixando alternativa ao Ministério Público, senão a de ajuizar a presente

ação civil pública.

Por fim, imprescindível frisar a urgência na tramitação dos

presentes autos, tendo em vista que recentemente o Banco Central do Brasil decretou a

liquidação extrajudicial do Banco Cruzeiro do Sul S/A, com fundamento no Decreto-Lei

n.º 2.321/1987, através do Ato Presi n.º 1217, de 04.06.2012, sendo certo que a

morosidade no andamento do feito poderá acarretar aos idosos ainda maiores prejuízo.

II – DO DIREITO

a) Da Legitimidade do Ministério Público

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A Ação Civil Pública, prevista no art. 129, III, da Constituição

Federal e no art. 1º da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), é a via processual que

visa proteger, no campo dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais

indisponíveis ou homogêneos. Referente ao significado desses interesses, é importante

transcrever a lição que se depreende da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal

(STF):

Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de

pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles

pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis,

ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. A

indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a

determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. Direitos ou

interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81,

III, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em

subespécie de direitos coletivos. Quer se afirme interesses coletivos ou

particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão

cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente

dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas,

que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam

como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação

civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses

grupos, categorias ou classe de pessoas. [...]”. (Recurso Especial 163.231 ,

Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 29/06/01)

A Ação Civil Pública consagrou a instituição do Ministério

Público, valorizando seu papel de autor em prol dos interesses difusos e coletivos. O

Ministério Público saiu do exclusivismo das funções de autor no campo criminal e da

tarefa de fiscal da lei no terreno cível, para nesta esfera passar a exercer mister de

magnitude social.

Ainda, o Ministério Público deve estar presente como autor ou

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interveniente, em qualquer Ação Civil Pública quando o assunto versar sobre interesses

difusos ou coletivos de idosos ou de consumidores, a teor dos artigos 127, caput, e 129, II

e III da Constituição Federal de 1988, no inciso III do artigo 82 do Código de Processo

Civil, e no artigo 5º, §1º, da Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85).

De acordo com o Estatuto do Idoso o Ministério Público possui

legitimidade ativa para propor a Ação Civil Pública, quando o assunto versar sobre a

defesa do interesse do idoso.

De acordo com o artigo 81, da Lei 10.741/2003:

Art. 81. Para as ações cíveis fundadas em interesses difusos, coletivos,

individuais indisponíveis ou homogêneos, consideram-se legitimados,

concorrentemente:

I – o Ministério Público;

II – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

Já o artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor, reza:

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas

poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste

código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares

pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste

código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo,

categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por

uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os

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decorrentes de origem comum.

Tratando-se de direito difuso, coletivo ou individual homogêneo

é de se aplicar o artigo 82 do Código de Defesa do Consumidor, que confere ao Ministério

Público legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa desses tipos de direito.

Não bastasse só isso para legitimar a ação do Ministério

Público, dispõe o artigo 129, inciso II, da Carta Magna:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (...) II – zelar pelo

efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública

aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas

necessárias à sua garantia.

Deve-se ressaltar que, apesar de a Lei n. 8.078/90 se auto-

intitular Código de Defesa do Consumidor, sua parte processual refere-se à tutela dos

direitos metaindividuais amplamente considerados, não se restringindo aos direitos dos

consumidores. É que o artigo 21 da LACP, acrescentado pela Lei n. 8.078/90, determina

que seja aplicada a parte processual do Código de Defesa do Consumidor às ações

coletivas ajuizadas com base na Lei n. 7.347/85.

Em verdade, com o advento do Código de Defesa do

Consumidor, criou-se um verdadeiro sistema processual de defesa dos interesses

metaindividuais em juízo, formado pelas leis acima citadas.

Assim, a legitimidade do Ministério Público decorre tanto do já

referido art. 129 da Constituição Federal, como, em base infraconstitucional, do art. 5.º da

Lei da Ação Civil Pública, do Capítulo I da Lei Orgânica do Ministério Público, Código de

Defesa do Consumidor e Estatuto do Idoso, que prevêem as atribuições pertinentes à

proteção dos direitos difusos e coletivos já enunciados.

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b) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor às Instituições Bancárias

Recentemente, em Adin 2591-1, o Supremo Tribunal Federal decidiu que as instituições financeiras estão, todas elas, sujeitas a incidência das normas

veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor.

Conceitua-se como “Consumidor”, para efeitos do Código de

Defesa do Consumidor, toda pessoa física ou jurídica que utiliza como destinatário final de

serviço bancário, financeiro ou de crédito.

O objeto da relação de consumo, como já evidenciado, é a

prestação de serviços de natureza bancária. Vejamos a definição de serviço conferida

pelo Código de Defesa do Consumidor:

Art. 3o (...)

(...)

§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,

mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de

crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter

trabalhista.

A primeira consequência jurídica do reconhecimento da relação

de consumo na atividade bancária é a responsabilidade objetiva do Banco pelos serviços

que oferece. Vejamos a redação do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos

consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como

por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o

consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as

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circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

Superada a questão da aplicabilidade do Código de Defesa do

Consumidor ao caso em tela, o artigo 6o do mesmo estatuto enumera os direitos básicos

do consumidor, que devem ser respeitados em todas as relações de consumo. Este

dispositivo impõe deveres aos fornecedores de produtos e serviços, para que, então, se

alcance a equidade e a transparência nas relações de consumo. Reza o Código:

Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

(...);

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e

serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas

contratações;

(...);

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos

comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas

abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços.

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais,

individuais, coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à

prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais,

coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e

técnica aos necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da

prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a

alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de

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experiências;

Reproduzimos, também, abaixo algumas práticas abusivas

impingidas pelo réu, exemplificadas no artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor.

Vejamos.

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras

práticas abusivas:

(...);

IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em

vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

(...);

VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais

competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação

Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo

Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial

(Conmetro);

Nota-se que as contratações de serviços devem obedecer,

primeiramente, à liberdade de escolha do consumidor.

A transparência nas relações contratuais é um dos importantes

princípios a serem adotados pelas instituições financeiras, preservando os clientes e o

público usuário de práticas não equitativas, mediante prévio e integral conhecimento das

cláusulas contratuais, evidenciando, inclusive, os dispositivos que imputem

responsabilidades e penalidades dos contratos a serem realizados.

A criação de uma obrigação vinculada à conta-benefício

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dos aposentados, sem a consulta do interesse deste, ou contra sua vontade expressa, é de toda forma uma ofensa ao Código de Defesa do Consumidor e, também, ao Estatuto do Idoso.

Na seção da proteção contratual, o Código de Defesa do

Consumidor enuncia:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo NÃO

OBRIGARÃO OS CONSUMIDORES, se não lhes for dada a oportunidade

de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos

instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu

sentido e alcance.

Percebe-se que apenas o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor resolveria toda a celeuma da ação em comento. A dívida contraída pelo

golpista em nome de EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA não

podem ser exigidas destes pelo Banco, ora requerido, pois não lhe foi dada a

oportunidade de tomar conhecimento prévio do conteúdo da contratação.

O artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, por sua vez,

prevê a restituição em dobro das cobranças indevidas a que o consumidor for submetido.

Vejamos:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será

exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento

ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em

excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de

engano justificável. (Grifos nossos).

Observa-se que a lei se refere a mera cobrança, não sendo

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necessário o recebimento da dívida. Basta que o consumidor seja compelido por valor

indevido para que surja, de imediato, o direito de receber em dobro o valor da cobrança.

Configuradas as figuras do fornecedor e dos consumidores do

serviço de natureza bancária, está completa a relação de consumo, obrigando ambas as

partes a cumprirem as regras do Código de Defesa do Consumidor.

c) Da Inversão do Ônus da Prova

Conforme consabido, existe uma interação e

complementaridade entre as normas do Código de Defesa do Consumidor, do Código de

Processo Civil e da Lei Federal nº. 7.347/85, com aplicação destas duas últimas levando-

se em consideração os preceitos principiológicos do Código de Defesa do Consumidor e

desde que não contrariem as disposições protecionistas deste estatuto.

Os dispositivos processuais do Código de Processo Civil que

se aplicam ao autor e a réu, notadamente os pontos que assegurem o cumprimento da

garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório, são aplicáveis na tutela jurídica

da relação de consumo.

JOÃO BATISA DE ALMEIDA enfoca o princípio da isonomia,

dentre os princípios específicos aplicáveis à tutela do consumidor, como pilar básico que

envolve essa problemática. Ele leciona que:

“Os consumidores devem ser tratados de forma desigual pelo CDC e pela

legislação em geral a fim de que consigam chegar à igualdade real. Nos

termos do art. 5º da Constituição Federal, todos são iguais perante a lei,

entendendo-se daí que devem os desiguais ser tratados desigualmente na

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exata medida de suas desigualdades” 1 .

É certo que, os dois pólos da relação de consumo

(consumidor/fornecedor) são compostos por partes desiguais em ordem técnica e

econômica, visto que o fornecedor possui, via de regra a técnica da produção que vai de

acordo com seus interesses e o poder econômico superior ao consumidor. A

vulnerabilidade do consumidor é patente e a sua proteção como uma garantia é uma

consequência da evolução jurídica pela qual passamos.

Por sua vez, o fornecedor (fabricante, produtor, comerciante,

ou prestador de serviços) não fica refém de um sistema protecionista, pois tem sua ampla

defesa assegurada, fazendo uso dos instrumentos processuais necessários para sua

defesa como os dos artigos 301 e incisos, 265, IV, a, e 267, IV, todos do Código de

Processo Civil, entre outros.

A inversão do ônus da prova como um direito básico do

consumidor, e as demais normas que o protege, não ofendem de maneira alguma a

isonomia das partes. Ao contrário, é um instrumento processual com vistas a impedir o

desequilíbrio da relação jurídica.

Com efeito, a inversão do ônus da prova é um direito conferido

ao consumidor para facilitar sua defesa no processo civil e somente neste. A aplicação

deste direito fica a critério do juiz quando for verossímil a alegação do consumidor, ou quando este for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (art. 6º , VIII,

do Código de Defesa do Consumidor).

A norma em exame estipula que fica à critério do juiz a

inversão quando estiver presente qualquer uma das duas alternativas, a verossimilhança

1 ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor, 2a ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

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“ou” a hipossuficiência. Essas são vistas como pressupostos de admissibilidade da

inversão do ônus da prova.

Critério, como bem observou Luiz Antônio Rizzatto, não tem

nada de subjetivo é aquilo que serve de comparação. A verossimilhança ou a

hiposuficiência servirão como base para que o juiz decida pela inversão. “... Presente

uma das duas, está o magistrado obrigado a inverter o ônus da prova”.2

O juiz vai conceder a inversão baseado no juízo de simples

verossimilhança a respeito da verdade das alegações feitas.

Para VOLTAIRE DE LIMA “Uma alegação torna-se

verossímil quando adquire foros de veracidade, quer porque se torna aceitável

diante da modalidade de relação de consumo posta em juízo, quer porque, de

antemão, em sede de cognição sumária, não enseja o convencimento de que possa

ser tida como descabida” 3.

O outro critério que deve ser analisado pelo juiz para que se

possa inverter o ônus da prova é o da hipossuficiência do consumidor o que se traduz em

razão da capacidade econômica e técnica do consumidor.

Rizzatto entende que o significado de hipossuficiência

insculpido no texto legal do Código de Defesa do Consumidor, não é econômico. É

técnico. O conceito de vulnerabilidade é que abrange a fragilidade econômica e técnica do

consumidor. A hipossuficiência para fins da possibilidade de inversão do ônus da prova:

“... tem sentido de desconhecimento técnico e informativo do produto

e do serviço, de suas propriedades, de seu funcionamento vital e/ou

2 RIZZATTO NUNES, Luiz Antônio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Direito Material (arts. 1a a 54), São Paulo: Saraiva, 2000.3 MORAIS, Voltaire de Lima. Anotações Sobre o Ônus da Prova no Código de Processo Civil e no Código de Defesa do Consumidor, Revista do Consumidor, 5o ano , vol. 31, São Paulo: RT, Revista dos Tribunais.

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intrínseco, dos modos especiais de controle, dos aspectos que podem ter

gerado o acidente de consumo e o dano, das características do vício etc”. 4

Vejamos a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Direito processual civil. Ação de indenização. Saques sucessivos em conta corrente.

Negativa de autoria do correntista. Inversão do ônus da prova. - É plenamente viável a

inversão do ônus da prova (art. 333, II do CPC) na ocorrência de saques indevidos de

contas-correntes, competindo ao banco (réu da ação de indenização) o ônus de provar

os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. - Incumbe ao

banco demonstrar, por meios idôneos, a inexistência ou impossibilidade de fraude,

tendo em vista a notoriedade do reconhecimento da possibilidade de violação do

sistema eletrônico de saque por meio de cartão bancário e/ou senha. Se foi o cliente

que retirou o dinheiro, compete ao banco estar munido de instrumentos tecnológicos

seguros para provar de forma inegável tal ocorrência. Recurso especial parcialmente

conhecido, mas não provido. (STJ, RECURSO ESPECIAL nº 2005/0031192-7, Terceira

Turma DJ nº 01.02.2006 p. 553 Ministra Nancy Andrighi).

d) Da Inexistência (ou Nulidade) do Negócio Jurídico segundo o Código Civil

O contrato de crédito, assim como qualquer outro contrato, é

uma espécie de negócio jurídico, de natureza bilateral (os contratos podem ser

multilateral), dependente para sua formação do encontro da vontade das partes.

São, pois, dois os elementos componentes da noção de

contrato: o estrutural, que requer a convergência de duas ou mais vontades contrapostas;

e o funcional, que diz respeito à composição daqueles interesses contrapostos, contudo

harmonizáveis, com o fito de constituir, modificar ou extinguir relações jurídicas de

natureza patrimonial.4 RIZZATTO NUNES, Luiz Antônio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Direito Material (arts. 1a a 54), São Paulo: Saraiva, 2000.

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Por se constituir em um negócio jurídico, o contrato deve

atender, para sua validade, aos requisitos subjetivos, objetivos e formais contidos no art.

82 do Código Civil, que são: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa

em lei.

Os requisitos subjetivos são: a existência de duas ou mais

pessoas, posto ser o contrato um negócio jurídico bilateral; capacidade genérica das

partes contratantes para os atos da vida civil; aptidão específica para contratar; e

consentimento das partes contratantes.

São objetivos os seguintes requisitos, que dizem respeito ao

objeto do contrato: objeto lícito, ou seja, que não seja contrário à lei, à moral, aos

princípios da ordem pública e aos bons costumes; possibilidade física ou jurídica do

objeto; determinação do objeto, que deve ser certo ou, ao menos, determinável; e ser o

objeto susceptível de valoração econômica.

Os requisitos formais dizem respeito à forma do contrato,

sendo que atualmente a regra é a liberdade das formas, donde a simples declaração de

vontade tem o condão de originar uma relação obrigacional entre as partes, gerando

efeitos jurídicos independentemente da forma de que seja revestida. Nos casos onde a

forma é da essência do contrato, a lei assim o determinará. Não o fazendo, vigora o

princípio da liberdade das formas.

O acordo de vontades, indispensável para a formação da

relação contratual, se expressa de um lado pela oferta e de outro pela aceitação. São

esses os elementos indispensáveis para a formação dos contratos.

Aceitação é a manifestação de vontade por parte do oblato,

que, levada a efeito dentro de determinado prazo, em aderir à oferta feita pelo policitante,

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em todos os seus termos, através da qual se tem por concluído o contrato, caso chegue

oportunamente ao conhecimento deste último.

Salienta-se que para grande parte da doutrina e da

jurisprudência a ausência de vontade na formação dos negócios jurídicos não implica em

sua nulidade e sim na sua inexistência.

O negócio jurídico, para que seja válido e tornar-se efetivo,

necessita, como já demonstrado, de alguns elementos chamados de “essenciais”. Esses

elementos são a existência, a validade e a eficácia.

Ao sofrer a incidência de norma jurídica, a parte relevante do

suporte fático é levada para o mundo jurídico, ingressando no plano da existência. No

plano da existência não se cogita de invalidade.

Os requisitos de “existência” do negócio jurídico são os seus

elementos estruturais, entre eles, a declaração de vontade, a finalidade negocial e a

idoneidade do objeto. Se faltar um desses elementos, o negócio jurídico deixa de existir.

A vontade, para que o negócio jurídico exista, é pressuposto

básico e é imprescindível que se exteriorize. Esta manifestação da vontade pode ser

expressa (palavras faladas ou escritas, gestos, mímica, etc.) ou tácita (a que se infere na

conduta do agente). Exemplo de vontade tácita é a manifestação feita nos contratos,

quando a lei não exigir que seja expressa.

Sem o concurso da vontade, elemento psicológico tão discutido

na atualidade, o ato não se configura. Assim, exemplificativamente, no caso de coação

absoluta, quando a mão da vítima é conduzida a firmar determinado documento, a

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vontade é totalmente eliminada5.

A vontade, uma vez manifestada, obriga o contratante. Esse

princípio é o da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda) e significa que o

contrato não poderá ser modificado pelo Judiciário. Este contrato destina-se a dar

segurança aos negócios em geral.

De acordo com Gonçalves, “a finalidade negocial ou jurídica é

a intenção de criar, conservar, modificar ou extinguir direitos” 6. Se a vontade não é

manifestada com o fim de praticar uma dessas intenções, poderá desencadear outros

efeitos. Por isso a manifestação da vontade com finalidade negocial é importante para

que produza os efeitos mencionados.

Por todo exposto, observa-se que no caso relatado por EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA não houver manifestação de

vontade, nem expressa, nem tácita (mesmo porque na modalidade de contrato bancário

não é admissível esta forma de aceitação, vide a resolução n.º 2.878/2001, com as

alterações da resolução 2.892/2001, ambas do Banco Central do Brasil e o artigo 46 do

Código de Defesa do Consumidor), por parte do titular da conta benefício, para a

formalização dos contratos de empréstimos bancário. Todos estes contratos, celebrados

com o réu, são inexistentes ou nulos de pleno direito.

Cabe ao réu fazer a prova de que o titular da conta-benefício

realmente exprimiu sua vontade na contratação dos serviços bancários. Esta prova só é

possível através do contrato escrito e formalizado entre a instituição bancária e o

contratante.

5 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1968. v. 1, p. 186.6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil: parte geral. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. v.1, p. 95.

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e) Da Antecipação de Tutela

O Estado, ao vedar a chamada “justiça pelas próprias mãos” ou

autotutela, assumiu o monopólio da jurisdição e, assim, obrigou-se a solucionar os

conflitos de interesses que inevitavelmente nascem da convivência humana. Cabe ao

Estado, e mais especificamente, ao Poder Judiciário, o monopólio da jurisdição.

A garantia constitucional de acesso à justiça insere-se no rol

dos direitos fundamentais do cidadão. A busca da efetividade do processo advém do

direito constitucional, da garantia constitucional de acesso à adequada tutela jurisdicional.

A efetividade processual como direito fundamental passa, inevitavelmente, pela busca da

tutela jurisdicional adequada.

A efetivação almejada pela parte decorre tanto do direito

constitucional de ação, como do devido processo legal; cabendo ao Poder Judiciário

apreciar o pedido de prestação jurisdicional requerido pela parte de forma regular e

concreta.

Buscando dar efetividade a garantia constitucional do acesso à

justiça, foi criado o instituto da tutela antecipada. O artigo 273 Código de Processo Civil

esclarece:

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou

parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,

existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito

protelatório do réu.

§ 1o Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e

preciso, as razões do seu convencimento.

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§ 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de

irreversibilidade do provimento antecipado.

§ 3o A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme

sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4o e 5o, e 461-A.

§ 4o A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer

tempo, em decisão fundamentada.

§ 5o Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até

final julgamento. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)

§ 6o A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais

dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.

§ 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de

natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos

pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo

ajuizado.

O § 4º do art. 461 do Código de Processo Civil autoriza a concessão

de tutela antecipada nas obrigações de fazer e não fazer, nos seguintes termos:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de

fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se

procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado

prático equivalente ao do adimplemento.

(...);

§ 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado

receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida

liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão

fundamentada.

§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença,

impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for

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suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o

cumprimento do preceito.

Há, como se vê, apenas dois requisitos para a concessão da

tutela antecipada na obrigação de fazer e não fazer: a) que o fundamento da demanda seja relevante; b) que haja justificado receio de ineficácia do provimento final. O

artigo 273 do CPC ainda prevê que juiz poderá antecipar, de forma genérica, os efeitos da

tutela pedida na inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da

verossimilhança da alegação e haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil

reparação à parte.

Também o artigo 12 da Lei nº 7.347/85 (Lei de Ação Civil

Pública) permite, nas ações civis públicas, a concessão de mandado liminar pelo juiz, com

ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. No mesmo sentido, o artigo 84, §

3o, do Código de Defesa do Consumidor, estabelece:

Art. 84. (...)

(...)

§ 3o. Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado

receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela

liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

O Estatuto do Idoso arremata.

Art. 83. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer

ou não-fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou

determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao

adimplemento.

§ 1o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo

justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz

conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, na forma

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do art. 273 do Código de Processo Civil.

O Ministério Público entende que a relevância da demanda já

está suficiente demonstrada; que existe risco de ineficácia do provimento final, em virtude

da idade dos titulares das contas-benefício e da alta probabilidade de mais idosos serem

vítimas do golpe sofrido por EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA

BATISTA; que existe prova inequívoca das alegações formuladas nesta exordial; e que a

continuidade da negligência e da indiferença do réu para com os idosos certamente

provocará dano irreparável.

A concessão de medida liminar, inaudita altera pars, é

imprescindível no caso em análise.

O fumus boni juris advém das provas produzidas em cede de

procedimento administrativo, em anexo, e nos dispositivos do Código Civil, do Código de

Defesa do Consumidor, da Resolução do Banco Central do Brasil e do Estatuto do Idoso

citados na presente demanda.

Presente, ainda, o periculum in mora, consubstanciado no

risco de ineficácia do provimento final, em virtude da idade avançada dos titulares das

contas-benefício, da constante e continua violação dos direitos dos consumidores e dos

idosos e da certeza de que novos golpes serão perpetrados contra outros idosos.

Ademais, o perigo da demora encontra respaldo ainda, pois o Banco Cruzeiro do Sul S/A, conforme amplamente divulgado, bem como demonstrado nos autos, encontra-se em Regime Especial de Administração Temporária (RAET), decretado através do Ato Presi n.º 1217 de 04.06.2012, que determinou a liquidação extrajudicial da instituição financeira, ora ré.

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A liminar deverá ser concedida, logicamente, sem justificação

prévia do réu (inaudita altera pars), pois não há tempo necessário para a citação, a

designação de audiência e a efetiva justificação, antes da realização de novos ilícitos por

parte do Banco ou de novos golpes contra outros idosos.

O que se busca impedir é a continuidade no desrespeito das

normas constitucionais e infra-constitucionais. Se o Poder Judiciário, não tem o poder de

impedir a lesão ou ameaça ao direito, quem o tem? Por se tratar de Estado Democrático

de Direito, vigora em nosso ordenamento o princípio da inafastabilidade da tutela

jurisdicional: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a

direito” (inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal).

Ao Poder Judiciário foi confiada a tarefa de zelar pela estrita

obediência dos preceitos contidos na Constituição da República e na legislação

infraconstitucional; quer advenham de norma expressa; quer sejam conseqüência da

densificação dos princípios exarados pelo sistema. Em razão disto, é defeso ao legislador

infraconstitucional excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a

direito (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal).

Indispensável, pois, é a imposição de multa diária ao réu em

caso de não cumprimento da medida judicial. Pede-se, neste caso, a cominação de multa

diária no valor mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais) no caso do descumprimento da

medida liminar, mais a cominação de crime de desobediência pela não observância da

ordem judicial.

III – DOS PEDIDOS

a) seja assegurada a prioridade na tramitação do processo, na forma do artigo 71, da

Lei 10741/03;

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b) a concessão da TUTELA ANTECIPADA, nos moldes do artigo 273 do CPC,

determinando-se ao réu que:

1.1) SUSPENDAM os descontos das parcelas oriundas dos

empréstimos (fraudulentos) contraídos em nome dos idosos

EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA,

sob pena de incidência de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por

cada mês em que persistir o desconto, sem prejuízo da autuação

por crime de desobediência;

1.2) não autorizem e nem celebrem quaisquer contratos de

empréstimos ou de renovação de empréstimos nas contas-benefício

dos idosos EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA sem autorização judicial, sob pena de incidência de multa

cominatória diária a ser fixada pelo ilustre Juízo;

1.3) Com o intuito de garantir a eficácia das medidas supracitadas,

seja requisitado ao INSS que providencie o necessário para o

cumprimento da decisão antecipatória descrita no item 1.1 acima

mencionado, também sob pena de desobediência;

c) a citação do réu, pela via postal, na pessoa de seus representantes legais, para,

querendo, contestarem a ação no prazo legal, sob pena de confissão quanto à matéria de

fato;

d) a PROCEDÊNCIA do pedido para:

1.1) declarar a NULIDADE de todos os contratos de empréstimos

feitos em nome de EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA, entabulados junto ao Banco Cruzeiro do Sul

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S/A, determinando-se ao réu que realize o ressarcimento ao idoso

pelos valores recebidos indevidamente em dobro, nos moldes

previstos no art. 42 do CDC, sob pena de pagamento de multa diária

a ser fixada por este douto Juízo;

1.2) condenar os réus na obrigação de não fazer consistente em não

autorizarem e não celebrarem quaisquer contratos de empréstimos

ou de renovação de empréstimos nas contas-benefício dos idosos

EDSON FERREIRA GAMA e GENEROSA FERREIRA BATISTA sem autorização judicial, sob pena de incidência de multa

cominatória diária a ser fixada pelo ilustre Juízo;

e) a inversão do ônus da prova, na forma do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa

do Consumidor;

f) a condenação do réu ao pagamento das custas e despesas processuais e demais

consectários decorrentes da sucumbência.

Protesta provar o alegado por todo meio de prova em direito

admitido, especialmente mediante prova documental, testemunhal e pericial.

Nos termos do Código de Processo Civil, artigo 258, dá-se à

causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Nesses termos,

Pede deferimento.

São Miguel do Araguaia/GO, 18 de setembro de 2012.

Cristina Emília França MaltaPromotora de Justiça

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