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analise morfologica da língua guarani
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VARIAÇÕES LEXICAIS DA LINGUA GUARANI USADAS NO CONE SUL DO MS
DELFINO BORVÃO 1 Prof. Kaiowá – Aldeia Limão Verde/Amambai
Profª. MS. Veronice Lovato Rossato Orientadora – SED/MS
RESUMO
Este trabalho, apresentado para a conclusão do Curso de Licenciatura Indígena Teko Arandu/UFGD, em 2011, buscou levantar mudanças na língua Guarani, principalmente quanto ao processo de criação de neologismos e de empréstimos. Minhas fontes foram as palavras coletadas na aldeia Limão Verde, entre os alunos de 6º ao 9º anos da escola, caciques e lideranças, na cartilha “Luz para Todos”, bem como através da escuta informal. Existem palavras novas, criadas como “gírias”, no próprio idioma e estas precisam ser catalogadas. Há também palavras e conceitos do mundo atual que não existem em Guarani e que estão, simplesmente, sendo emprestadas do Espanhol ou do Português. É importante aumentar o corpus da língua, obedecendo ao que a política linguística do povo tem estabelecido, para que a língua da nação Guarani não desapareça. Para este trabalho foi necessário descobrir o significado de cada vocábulo ou expressão das outras línguas ou da própria língua, no campo semântico e morfológico.
Palavras-chave: Língua Guarani, variações lingüísticas, escola indígena.
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa teve como proposta catalogar palavras ou expressões novas que
estão sendo usadas ou criadas na aldeia Limão Verde, tanto neologismos como
empréstimos modificados, no contexto da língua guarani. Para neologismo, em língua
Guarani, temos a seguinte tradução: Ñe'ëpyahu - Ñe'ë+pyahu: Ñe'ë= palavra e pyahu =
novo.
A catalogação dos neologismos desta língua indígena servirá, no espaço
escolar, para traçar o esboço de uma escola de futuro. Mesmo que não sejam mudanças
1 Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura Intercultural- Teko Arandu, na terminalidade Linguagens e Educação Intercultural.
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radicais em curto espaço de tempo, este trabalho poderá servir para o fortalecimento de
valores culturais, da língua, da identidade, na perspectiva de dar um novo sentido ao
idioma nativo da nação Guarani, e a estrutura de viver desta sociedade, com suas
expressões próprias, literatura. Para que uma língua não se acabe, é necessário que ela
se renove e, nesse processo, a criação de neologismos é fundamental para isso. São
importantes para aumentar o “corpus” da língua, como uma ação das políticas
lingüísticas do povo guarani e kaiowá.
As comunidades guarani e kaiowá têm seus próprios conhecimentos e querem
perpetuá-los, através de seu modo próprio de ser e de viver, como o teko katu (“modo
de ser correto”), teko marangatu (“modo de ser espiritual”), teko marane’ỹ (“modo de
ser puro”). No entanto, esses modos de ser e de viver estão correndo risco. Por isso, a
sociedade passa por uma fase de reconstrução sociocultural, sendo a língua guarani um
dos seus esteios principais e, principalmente, o elemento principal do teko marangatu,
que é o modo de ser essencial desta cultura. Mas, a língua indígena está sendo
deslocada pelas línguas dominantes e pelo tekopyahu, enfraquecendo-a e, com ela,
enfraquece também a cultura tradicional. É preciso organizar estratégias para fortalecer
e valorizar a língua guarani, primeiro no âmbito escolar e, assim, estender para o
âmbito familiar e comunitário e, por fim, para o povo todo. É preciso que o povo
guarani e kaiowá seja o autor desse processo. Sendo assim, este trabalho se pressupõe a
ajudar a alcançar os objetivos propostos para a construção de uma escola indígena
específica e diferenciados e para que o idioma Guarani não acabe sendo guardado no
“baú” das memórias culturais do povo.
Sou professor indígena da etnia kaiowá, com experiência de 21 anos no sistema
da educação escolar. Minha formação do ensino médio foi magistério, superior na
UGFD (Universidade Federal Grande Dourados); estas e a vivência com o Ñanderu
Atanásio Teixeira me fizeram entender o mundo do teko marangatu e perceber tudo o
que meu povo estava perdendo. Assim, percebi a situação da nossa língua materna e
tudo o que ela significa para o nosso modo de ser e de viver. Entendi que seria
necessário fazer alguma coisa para fortalecer e reverter o processo de deslocamento
que a língua guarani está vivendo. Como “iniciado” no teko marangatu e na
universidade, esse processo é importante para mim, embora talvez não seja para outro.
Mas vou apostar para que dê um resultado positivo no meio da minha comunidade,
começando pelo pequeno esforço da unidade escolar da aldeia Limão Verde.
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Pesquisei com as pessoas idosas, crianças e adolescentes, professores e
lideranças da comunidade Limão Verde, bem como com os Ñanderu Joechakary
Kuerávy, na pessoa do Ñumoendyja, na língua guarani, que, em Português, é Atanásio
Teixeira; outros ñanderu são Luiz Velário Borvão, da aldeia Jaguapire; Ailton de
Oliveira e Guilherme, ambos de Limão Verde. Com estes foram feitas oficinas e
entrevistas. Outras fontes vêm da minha própria observação entre as pessoas de minha
comunidade e da cartilha elaborada para o Programa Luz para Todos. As palavras
levantadas fazem parte do vocabulário usado na escola, no cotidiano das casas e no
relacionamento íntimo, bem como nos itens de consumo, novas tecnologias, trabalho,
entre outras.
A aldeia Limão Verde situa-se no extremo Sul do Estado, no município de
Amambai, a aproximadamente dois Km da periferia da cidade, na rodovia BR 167, que
passa pelo meio da aldeia. Seus habitantes pertencem às etnias Guarani e Kaiowá e
são falantes da língua étnica deste povo. A população é de, aproximadamente, 1300
pessoas. Possui escola criada e regularizada, com ensino de 1º ao 9º ano e EJA. A
estrutura física é de alvenaria, equipada com livros didáticos e biblioteca, recursos
didáticos convencionais, uma sala com computadores, uma quadra com cobertura, um
telefone público e uma gestão própria composta de diretor e coordenadores indígenas.
Atende aproximadamente 285 alunos. A aldeia também possui um postinho de saúde
que atende a comunidade, mas que precisa ser melhorado.
A economia se baseia principalmente no trabalho oriundo da cana de açúcar,
das aposentadorias e pensões, do serviço público municipal e federal. A liderança é
composta de duas pessoas, uma há 30 anos e outro há três anos. As famílias estão sem
rumo, não sabendo o que querem e como fazer para resolver seus problemas.
Dependem muito de programas sociais. As idéias de modernismo impulsionaram a
prática do individualismo e, como conseqüência, os conhecimentos dos sábios anciãos
foram desvalorizados. Com fácil acesso aos meios de comunicação e transportes, e
ação de evangélicos exploradores da renda do indígena guarani, e a escola que seguia o
modelo autoritário e individualista, desestruturou a organização social e familiar e,
com isso, foi desacreditada a cultura e, principalmente, a família, que não tem mais o
respeito, o domínio de ensinar a ser uma boa família estruturada. O problema mais
grave é que os adolescentes não têm perspectiva de viver a vida livre, mas de continuar
sendo oprimidos. A nova proposta de uma educação escolar indígena entra no cenário
para mostrar que não é por esse caminho que os indígenas alcançariam a autonomia.
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Segundo o Projeto Político Pedagógico, a Escola Municipal Pólo Indígena
Mbo´erenda Tupã´i Ñandeva, além das estruturas comuns das demais escolas do
Ensino Fundamental, consta com especificidades da comunidade Guarani Kaiowá para
balizar
um ensino intercultural e bilíngüe, visando a valorização da cultura, as reafirmações de sua diversidade, da sua identidade étnica, recuperação de suas memórias históricas, valorização de sua língua e ciências, além de possibilitar ao aluno o acesso às informações e conhecimentos valorizados pela sociedade nacional e universal, de forma a participarem ativamente como cidadãos plenos do País. A comunidade e principalmente as lideranças formais tem a plena participação na organização e estruturação da escola.
A língua guarani sofreu transformações e isso é detectado nas falas dos
intelectuais guarani, para quem essa influencia veio dos agentes externos. A partir da
década de 1970 houve mudanças radicais na fala e, com isso, os sábios guarani se
esconderam – oñeñomi - sentindo-se acuados e se omitiram de ensinar ou dar
informações sobre a tradição. Isso ocorreu pelo fato de que a escola reconhecia como
inferiores as culturas indígenas e seus agentes. Hoje, tanto os intelectuais, como as
lideranças e os rezadores ou sábios tradicionais estão empenhados em reverter esse
quadro de desprestígio da língua e da cultura guarani, podendo a escola ser um espaço
para isso.
CONCEITOS
Variação de linguagem
Conforme MAIA (2006), uma mesma língua pode apresentar variações de um
lugar para outro, de uma faixa etária para outro e, ainda mesmo que usada por um
mesmo falante, em mesmo lugar e época, de uma situação para outra”.
As variações de linguagem existem no Guarani de diferentes formas: temos
diferenças regionais, no som ou na ortografia. Uma fala do Kaiowá é diferente do
Mbya, do Guarani de Paraguai, do RS e de SP. Isso é denominado por Maia (2006)
como variação dialética étnica.
No interior da aldeia também há diferenças de linguagem, em diferentes
contextos, quais sejam: professores, familiares, autoridades, crianças, adolescentes e
jovens. Cada segmento que compõe um grupo de pessoas tem um conhecimento de
fala que é diferente de outros grupos. É interessantes notar que cada ator que faz parte
de uma mesma comunidade tem linguagem diferente na fala, mas todos se entendem.
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Empréstimo
Para o pesquisador BARBOSA (1996), “um termo só será considerado
empréstimo propriamente dito, quando numa fase ulterior à da adoção (...) pela
integração e generalização, tiver alcançado alta freqüência e distribuição regular entre
falantes, a ponto de não ser mais sentido como estrangeirismo.”
Os empréstimos surgem na comunidade guarani a partir do contato com outras
línguas: Português, Castelhano ou Espanhol e, por último, também algo do Inglês
exemplo (chorti). As influências vieram, primeiramente, do Paraguai, depois da
Missão Evangélica Caiuá e dos chefes de posto da FUNAI, e, recentemente, da escola
e meios de comunicação.
Aproximadamente 70% dos habitantes da aldeia Limão Verde sutentam a
língua materna, com objetivo de viver no seu territorio. No entanto, na fala do povo
guarani kaiowá, o Portugues se tornou Guarani, pois está usando muitos empréstimos
nesta língua. Mas é comum criar palavras novas a partir de um empréstimo
acrescentado por um particula ou expressão guarani. Ex: piolakue (piola =corda; kue=
passado - eram cordas; vakapipopo (vakapi = couro de vaca; popo = pula - bola).
Também há muitos empréstimos ressemantizados, quer dizer que, em Guarani,
aparecem com o significado original alterado (Ex: asuplika = explicar; apondera =
admirar), ou com o som da palavra modificado de acordo com o jeito guarani de falar
(Ex: fexão = feijão; kavara = cabra; vandizo= bandido; Zorazo = Dourados; vosa =
bolsa; fófro = fosforo; pendrai = pendrive; musikea = baile.).
Este é um grande problema para o Guarani e para as tentativas de reforçar a
língua: em vez de criar, o povo apenas “empresta”. Entre os Guarani, quem inventa
neologismo não é sempre pessoa escolarizada, geralmente são pessoas humildes, mais
tradicionais. Os empréstimos vêm de muito tempo e agora se intensificam. Por exemplo:
careca, quando, em Guarani, pode ser akã perõ (cabeça pelada); hoje se usa professora,
em Português, que antes era maetra (maestra), do castelhano; nomes de semana como
lune, marte, miercule, jueve, vierne, savazo, zomingo; año, hora, méziko (médico) ou
makumbéro (usado pelos evangélicos) para se referir ao ñanderu (rezador, curandeiro).
Neologismo
Neologismo é um fenómeno linguístico que consiste na criação de uma palavra ou expressão nova, ou na atribuição de um novo sentido a uma palavra já existente. Pode ser fruto de um comportamento espontâneo, próprio do ser humano e da linguagem, ou artificial, para fins pejorativos ou não. Chama-se de neologismo o processo de criação de novas palavras na
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língua. Você já reparou que, de tempos em tempos, novas palavras surgem - seja nos telejornais, descrevendo uma nova tecnologia, por exemplo, seja nas ruas, por meio de gírias. (Wikpédia, apud Hickler, Back e Ricardo, 2011).
O Ñanderu Atanasio (2010) diz que as falas dos antigos são diferentes desde a
época de 1980 para hoje, as crianças já não falam mais: “ Ymaguarëve ñe’ë ha’e
iñanbuevoi pe ko ayvérupi yjoysyha ha’e mitãngery ndokuaa porãvéima.”
(...) uma mesma língua pode apresentar variações de um lugar para outro, de uma faixa etária para outro, e, ainda mesmo que usada por um mesmo falantes, em mesmo lugar e época , de uma situação para outra. (MAIA,Marcus, 2006) Normalmente, a mídia traz perspectivas linguísticas diferenciadas dos vocábulos, principalmente na adição de sufixos e prefixos aos vocábulos, como em vietnização. (...) A neologia do português existe porque a língua é viva, ou seja, é passível de mudanças constantes que podem vir a ser determinantes. Neste último caso, o neologismo criado passa a ser incorporado no dicionário de determinado idioma. (Wikpedia, 2010 WWW.alunosonline.com.br/português/neologismo)
Segundo a enciclopédia Wikpedia (2010), existem três tipos de neologismo: o
semântico, o lexical e o sintático:
O semântico é quando a palavra já existe, mas ganha uma nova conotação, um novo significado: Estou a fim de Fulano. (estou interessado). Beltrano, não vai dar, deu zebra. (algo não deu certo). Vou fazer um bico. (trabalho temporário). O lexical é quando uma nova palavra e um novo conceito são criados: dibobis (tranquilo), furunfá (ter relação), catilanga (mulher feia), etc. O lexical ainda pode ser quando incorporamos letras a uma palavra que já existe: lambuzão (pessoa que se lambuza demais), abobado (aquele que é “bobo”, sonso), internetês (a língua da internet), fubazento (que provém de fubá, e quer dizer homem sem graça e feio), etc. Já o sintático, é quando a expressão ou frase tem um significado específico: De cabo a rabo (do começo ao fim), Fazer um furo (noticiar primeiro), Fazer cera (fingir que trabalha), Fogo no rabo (excitado),etc. (Wikpedia, 2010 - WWW.alunosonline.com.br/português/neologismo)
Conforme MAIA (2006), “o neologismo pode ser usado, desde que na fala,
porque é próprio dela. Portanto, é certo criar palavras, desde que a pessoa tenha bom
senso de saber onde e quando usar”.
Para o Ñanderu Biguá (2010), “quando falamos, de um jeito organizado, o
entendimento é coerente, por isso, há diferença de quem é falante guarani e kaiowá”:
Ja’eramo ñe’eropyta rehe ojoysy porãmba voiniko ohovo upevagui katutuete iñambue
mbue oiporuva te’ykuery oayvu.
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Por ser um fenomeno linguístico de um povo, os Guarani também criam suas
próprias palavras que não existiam ou incorporam um novo sentido às palavras já
existentes. É muito importante saber quais são os significados das palavras, de onde
surgiram, entender a morfologia, isto é, os morfemas que formam a palavra, que dão
um novo significado, formando uma palavra nova. Segundo o dicionário Wilipédia, “a
vivacidade de uma língua está ligada à capacidade de seus falantes de criar novas
palavras, ampliar o vocabulário, ou de emprestar dar às palavras que já existem novos
sentidos.” (Wikipédia,.org/wiki neologismo/origem:wikipédia, 2011)
Na década de 1980 a 1990, o choque cultural e linguistico foi maior, o que
levou os indígenas a se agarrar a novas palavras da outra língua, mesmo sem entender
seus significados, e muito diferentes daquelas que eram usadas ou criadas no tempo
antigo. Mas o processo de nomear as coisas na oralidade é o mesmo. A era da
educação escolar indigena diferenciada e específica, que começou em 1988 e vai até o
presente, valorizou e legitimou o uso das linguas indígenas na escola. Mas para adotar
essa nova mentalidade escolar e linguística, vai ainda uns dez a vinte anos.
Também temos nomes de determinadas expressões usadas nos diferentes
contextos e ambientes. Por exemplo: “aichïñaraingo”, como linguagem para mimar o
bebê. Temos também a linguagem escolar, usada no âmbito da escrita e da fala pelos
alunos. Temos palavras usadas no espaço de trabalho para designar diferentes
profissões: mbo’ehára (professor), kuerávy (médico e enfermeiro). Ao longo deste
tempo de 20 anos de desenvolvimento da educação escolar com formação de pessoas
intelectuais surgem na edição de livros ou para dar significado no registro da
formalidade da escrita na língua Guarani.
Temos palavras que são usadas no âmbito do espaço de trabalho e essas
expressões são usadas e ditas pelos intelectuais Guarani em diferentes profissões onde
a língua indígena ocupa uma função de trabalho na escola. Ao longo deste tempo de
20 anos de desenvolvimento da educação escolar com formação de pessoas, foram
editados alguns livros, que fazem o registro formal da escrita na língua Guarani, como
a cartilha Tynynýi Ñe’ë Ñemoasãi, da Campanha Luz para Todos (2008).
No contexto das relações entre os Guarani, isso acontece de forma natural, por
prazer e felicidade e é nesse momento de partilha e num ambiente de conversa
informal que surgem as criações das expressões para determinadas falas de humor ou
de alegria, que depois são apropriadas e usadas pela maioria da comunidade. Essas
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palavras são usadas geralmente no ambiente de trabalho, principalmente, onde é feito o
corte de cana-de-açúcar ou num aglomerado de pessoas em roda de tereré.
Giria
A “linguagem das ruas”, ou melhor, dos grupos sociais, já é caracterizada pelo surgimento de novos termos nunca vistos antes ou influenciados por outros, mas que por si sós possuem um significado, é o caso das gírias. WWW.alunosonline.com.br/português/neologismo) A gíria, é um fenômeno de linguagem especial usada por certos grupos sociais pertencentes à uma classe ou a uma profissão em que se usa uma palavra não convencional para designar outras palavras formais da língua com intuito de fazer segredo, humor ou distinguir o grupo dos demais criando uma linguagem própria (jargão). É empregada por jovens, crianças e adultos de diferentes países e classes sociais, e observa-se que seu uso cresce entre os meios de comunicação de massa. Trata-se de um fenómeno sociolinguístico cujo estudo pode ser feito sob duas perspectivas: gíria de grupo e gíria comum. Um exemplo prático, muito usado no Brasil, é o caso do termo "refri" onde se faz uso de um neologismo, uma vez que esta palavra é uma criação relativamente recente (Significa uma gíria para "refrigerante"). (WIKIPÉDIA. Apud Vilarinho) .
Os exemplos a seguir mostram algumas girias mais usadas no cotidiano: neperõ
= trabalhador da cana por trabalhar pelado; mbuse = homem que não liga para sexo ou
mulher, na volta trabalho, nome genérico de tratamento de pessoas que não tem
afinidade com a feminilidade); ndo’usei/nomokõsei/ = beberrão; ipura = exibido; pura
= quer ser observado, elegante; puto, ha’etevoi = homossexual; ojokytya = mulher
sapatão; ijapayayava= necessidade especial; porã, porãmba= feio; mitã guasu = homem
com quem a esposa trai o marido); mbuse = homem que não liga para sexo ou mulher
na volta trabalho nome genérico de tratamento de pessoas que não tem afinidade com a
feminidades).; ndo’usei/nomokõsei/ = beberrão; ipura = isibido; pura = quer ser
observado, elegante ; puto, ha’etevoi = homossexual; ojokytya = mulher sapatão;
ijapayayava= necessidade especial; porã, porãmba= feio ou prestigio de renome.
Adolfinho Nelson, liderança de Limão Verde, diz que este tipo de palavras são ñe’e rei
ojeporuve (palavrão).
Algumas palavras são criadas para decifrar códigos de segredo ou para
designação social, familiar e de tratamento. No contexto das relações íntimas também
surgem muitas palavras de prazer e felicidade. A gíria dos Guarani Kaiowá é usada em
diferentes ambientes como sendo uma das formas de proporcionar lazer, humor e
alegria, provocando risos e gargalhadas. Essas criações surgem em ambiente de roda de
tereré, doméstico familiar; chimarrão; no momento de demonstrar afeto, como quando
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as mulheres mexem no cabelo de outro para procurar piolho mesmo não tendo o piolho
na cabeça; em festas religiosas e brincadeiras tradicionais: guachiré, guahu, e jeroky,
que são lugares mais comuns onde são criadas as falas; no descanso e almoço no
trabalho de usina de cana-de-açúcar pelos neperõ (trabalhador da cana), e pelo estudo de
intelectuais guarani que são os professores guarani kaiowá. Exemplo: Che rova que é
igual a ironizar o outro; che igual dizer a ele ou a alguém; mostrar com o dedo sem
falar nada e o outro só balança a cabeça como resposta.
Como qualquer sociedade tem seus sistema de lazer, que proporcionam prazer e
alegria, o Guarani tem esse sistema para distrair o tempo e nesse momento surgem as
criações da fala guarani. A gíria em Guarani também está presente nos ñe'ẽnga, que tem
a finalidade de zoar do outro, debochar, desconsiderar e desrespeitar. Temos alguns
exemplos: piru (magro) usado ironicamente para pessoas gordas; porã (bonito), dito
para alguém feio; puto significa homossexual, e ojokytyva para mulher homossexual.
A gíria também reina até no momento religioso do ritual do jeroky, onde os
líderes religiosos são venerados como os mediadores entre o ser humano e os deuses.
Tudo tem a ver com o modo de viver do teko marangatu, que é o modo de ser religioso
dos Guarani e Kaiowá. Geralmente as falas deles vêm sendo reveladas para
determinadas pessoas que são dignas de saber e essas pessoas divulgam para que todos
usem. Exemplo: sapukái (grito) para referir-se aos evangélicos.
Pessoas que mexem com drogas também criam códigos para se comunicar
apenas entre eles. Por exemplo: Ecorreriape (para dizer que alguém está sendo
ameaçado).
LISTA DE NEOLOGISMOS E EMPRÉSTIMOS COLETADOS
O estudo da morfologia dessas palavras está apenas sendo iniciado. Por isso, a
tabela está incompleta.
Nº
Palavras
Origem Morfologia Significado em
Português
1. Akãmbagua akã = cabeça mba=coisa
martelo
2. Arakatu’éi ara= céu katu= verdadeiro, sensato
céu azul
3. Arapot ĩ ara = céu potï = limpido
céu azul
9
9
4. Ao’i ao = vestimenta i = pequeno
camisinha (preservativo)
5. Apilha Empréstimo de “pilhar”
Flagrar, descobrir
6. Apykahai
apyka=banco hái = grafia
carteira de escola
7. Apondera Empréstimo com significado modificado
Admirar
8. Apykaru apyka = assento ru = pai
Mesa
9. Asuplika Empréstimo com significado modificado
A= desinência de 1ª pessoa do singular
Explico
10. Chavulai Chavurro (empréstimo de vurro)
Chavu = baixo lai = lerdo
burro (animal)
11. Chity chi= barulho de pólvora ty= lugar
Fósforo
12. Ei Antes “eira” Mel 13. Embeze Empréstimo em vez de 14. Ekópilo ,
ekópito Empréstimo Helicóptero
15. Elara Empréstimo “helada”= gelada Geada 16. Epirito vai Empréstimo com
inclusão de uma palavra guarani
Epirito= espírito Vai =Marã= mal
diabo, demônio
17. Fechao Empréstimo feijão 18. Guachuatai
Ferro fundido facão
19. Gua’y
Nome genérico de facão facão
20. Ha’evy, ha’e= ela vy= costume
amante
21. Haihasa’y hai = escrever sa’y = cores
colorir
22. Harriero Empréstimo do castelhano
homem
23. Ikuña i = 3ª pessoa kuña = mulher (mulher dele)
amante
24. Ipura Empréstimo modificado
i = 3ª pessoa do singular pura = sínico, exibido (adjetivo)
elegante, ser mais que o outro, que se mostra superior, exibido
25. Jaryra Ja= colar Ryra = substância gelatinosa
silicone
26. Joapyha joapy = emenda ha= aquilo que
solda, cola
27. Kachita Empréstimo do português “calcinha”
calcinha
28. Kasõ’i empréstimo do castelhano + guarani
kasõ = calça i = pequeno
cueca
29. Kavajupiru kavaju = cavalo piru = magro
bicicleta
30. Ku’éta oku’e = movimentar-se bicicleta
10
10
ta = futuro 31. Kuretĩgue kure= porco
tĩ = nariz gue = kue = não é mais
tomada de energia
32. Ka’arovapy ka’a+rova+py ka’a = mato, erva rova = face py = raiz conjunto do mato
bioma
33. Kevranto Empréstimo quebranto 34. Kachivéo A palavra original é Pyryru chinelo 35. Kuchã ku= língua
chã= côncavo colher
36. Kupichu
ku=canto do galo pichu= do guarani “pichai”= cabelo enroldado, armado. Pichu para o galo, pois ele levanta as penas.
galo
37. Kuretï joguaha
kuretï = nariz de porco joguaha= parecido
tomada de energia
38. Kuampiro Empréstimo de português
Vampiro
39. Kuairu Kuã= dedo Iru= companheiro
anel
40. Kururuveve kururu= sapo veve= voa
helicóptero
41. Letrina Empréstimo Latrina banheiro 42. Lucumento = Empréstimo documento 43. Lovo Empréstimo
modificado de lobo lontra
44. Mba’epu apu’a
mba’e = coisa /objeto pu = som apu’a = redondo
CD
45. Mangulio = Empréstimo Armadilha tocaia 46. Me’ẽnga = me = Marido
namorado(a) , noivo(a).
47. Mba’epu mba’e = objeto/coisa pu = som
aparelho de som
48. Mbo’ehára mbo’e = ensinar ha= aquele
professor
49. 50. Mbo’épy Mbo’épy (Kaiowá)
Mbo’épe (guarani) mbo’e=ensinar pe= em
lição
51. Mbohovai mbo= mandar fazer hovai= estar diante, face
interpretar
52. Mbojereha mbo = que faz jere=girar ha = aquilo que
manivela, roda
53. Mbusia
Empréstimo Morsília morsilia
54. Mbyapeha mbyape=alisar ha= aquele que faz
massagista
55. Mbuse Mbu= é o ato de cair Se= querer
Homem que vem da usina que não liga para mulher, só quer saber de beber.
56. Mofroito Empréstimo Opção sexual como gay e hermafrodita
hermafrodita
57. Momba Mo= por dentro mba (pa) = fim
Orgasmo
58. Nambiguasu nambi= orelha orelhão de telefone
11
11
guasu = grande
59. Neperõ perõ = pelado gíria de ser trabalhador iniciante
Trabalhador de usina
60. Ñumbéu ñu = campo mbé = rembé = labio ‘u = lamber
gado
61. Ndoje’uséi não quer mais comer homem que não está interessado em sexo
62. Obasea Empréstimo modificado
basear-se imaginar
63. Opiropea o = 3ª pessoa do singular piropo = (em castelhano) ea = desinência em Port. que transforma um nome em verbo.
Debochar, zoar
64. Opurea Empréstimo modificado
o = 3ª pessoa do singular pura = sínico,isibido ea = desinência em Port. que transforma um nome em verbo.
exibir-se,gritar-se
65. Oñeapykano O = 3ª pessoa Plural ñe = se fazer apyka = acento nõ = forro= (esperma)
fecundar
66. Pyryru py = pé ryru= recipiente
Calçado
67. Pendrai Empréstimo Pendrive 68. Petỹvai petỹ= fumo
vai = maligno Droga
69. Pyguasu py = pé guasu = grande (pneu grande)
Trator
70. Pytu Originalmente é “sopro” Onda de rádio ou magnética.
71. Rova pitibu Empréstimo com inclusão de palavra guarani
rova = rosto pitibul = cão bravo
serio, bravo
72. Rupi’a Palavra antiga Ovo de galinha (originalmente)
óvulo, gravidez
73. Sakandu resa+kandu resa=olho kandu= canto (com olhos de lado)
Cavalo
74. Sapatu Empréstimo Calçado Sapato 75. Sapikua sapi= couro
kua= buraco Sacola
76. Sapituka Antigamente era saguyry
Olhos virados Olho de epiléptico
77. Taguatoresay taguato = aguia/gavião resa= olho y = fluído/ água/líquido (cachaça)
bebida alcoólica
78. Takéo Parede 79. Tapehũ tape = estrada
hũ = preto Asfalto
80. Tesajoapy tesa = olhos joapy = auxílio
Óculos
12
12
81. Tikarẽ tĩ = nariz karẽ= torto
Foice
82. Tysýi tysýi (originalmente, qualquer tipo de fila)
serie, seriado, ano escolar
83. Tynynyi Vem do Guarani “tyñy = týny
Tyny = choque Nýi = ñyvyi = espírito, energia que faz viver.
Eletricidade
84. Vacia empréstimo Bacia 85. Vakapipopo vakapi = couro curtido
opopo = pula pula Bola
86. Vakaypi vaka = gado ypi = couro seco
gado que não engorda
87. Varrero Empréstimo do castelhano
barreiro, lamaçal
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As palavras catalogadas servirão, no espaço escolar, para traçar o esboço de uma
escola de futuro, mesmo que não haja mudança em curto espaço de tempo, mas também
para a apropriação de valores da língua, identidade e cultura. A língua não acaba, e
nesse processo de transformação, ela adquire características que se moldam ao tempo
atual.
A escola tem o papel de repassar os conhecimentos e de construir novos, e pode
ajudar a criar neologismos e divulgá-los, para perpetuar corpus e o sistema lingüístico
guarani. A comunidade guarani e kaiowá tem seus próprios conhecimentos e quer
perpetuá-los, através de seu modo próprio de ser e de viver, como o Tekokatu (“modo
de ser correto”), Teko Marangatu(“modo de ser espiritual”), Teko marane’ỹ (“modo de
ser puro”). No entanto, esses modos de ser e de viver estão correndo risco. Por isso, a
sociedade passa por uma fase de reconstrução sociocultural, sendo a língua Guarani um
dos seus esteios principais e, principalmente, a base do Teko Marangatu, que é o modo
de ser essencial desta cultura. Mas, a língua étnica está sendo deslocada pelas línguas
dominantes e pelo Tekopyahu, enfraquecendo-a e com ela, enfraquece também a cultura
tradicional.
É importante ressaltar que o que está descrito aqui contém pouco volume de
catalogação como sendo início de um trabalho que pretendo aprofundar em outro espaço
de pesquisa. Me foram cobradas as referências de pesquisas já realizadas anteriormente,
como o Montoya, por exemplo. Mas isso eu não consegui fazer, porém, mesmo de
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forma superficial, já é um elemento muito importante como início de uma longa
caminhada de revitalizar o que sobrou ao longo dos cinco séculos.
A estratégia é fortalecer e valorizar a língua guarani, primeiro no âmbito escolar
e, assim, estender para o âmbito familiar e comunitário e, por fim, para o povo todo. É
preciso que o povo guarani e kaiowá ponha em prática este processo. O processo de
restauração da língua guarani na aldeia passa por três atitudes básicas: conscientizar
sobre os direitos lingüísticos; ter um projeto social de qualidade, formação tradicional e
acadêmica; e assumir de vez a identidade sócio-cultural guarani e kaiowá. Sendo assim,
a vitalidade deste trabalho se propõe a ajudar a alcançar os objetivos das políticas
lingüísticas e afirmação de identidade e cultura do povo, através da pesquisa iniciada
aqui.
A escrita, no contexto do povo guarani e kaiowá, quando assumida e firmada, é
um instrumento muito valoroso pelo fato de estarem garantindo um espaço onde
podemos repensar a educação, e o processo educativo escolar ser parceiro para realizar
o trabalho de equipe. Espero que meus netos, os netos do meus descendentes cheguem
um dia a dizer: “a língua guarani é a minha raiz que eu tenho orgulho de falar”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA ,M A. Léxicos ,produção e criatividade .São Paulo:Plêiade,1996. MAIA, Marcus. Manual de linguística: subsidio para formação de professores
indígenas na área de linguagem nº 04. Brasilia: novembro 2006. TYNYNÝI ÑE’Ë ÑEMOASÃI. Guarani kaiowa, mbo’ehára kuéra. Campanha Luz
para todos. Dourados, 2008. VOCABULARIO GUARANI/KAIOWÁ, AGF/SED. Disciplina de língua e
linguística. Aluno Analisa, Edna, Eliana, Elizeu, Gerald, Huto; Dourados: 2001.