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Na fábula mitológica d’Os Lusíadas, Vénus é a deusa protetora da «gente Lusitana», à seme- lhança da função que desempenha na Eneida de Virgílio, modelo que, nesta matéria como noutras, Camões imitou. A proteção de Vénus a Roma, à gens Iulia e à «tão amada sua» gente romana enraíza-se originariamente no amor materno que a liga a Eneias e que estendeu aos descendentes do herói troiano (Aeneadum genetrix , nas pala- vras de Lucano). A sua afeição aos Portugueses não deriva de qualquer laço de parentesco — esta relação, como argumenta Marte no consílio dos deuses olímpicos, poderia, sim, obrigar Baco —, mas nasce do reconhecimento de que o povo luso possui qualidades iguais às do povo romano: idêntica coragem e semelhante fortuna, como demonstrou a fácil tomada de Tânger, cidade abandonada pelos temerosos Mouros após a con- quista de Arzila. A própria língua portuguesa lhe parece ser, com pouca diferença, a língua latina (relembre-se que, segundo diversos gramáticos do Humanismo, a qualidade e a elegância de uma língua se avaliam em função da sua proximidade relativamente ao Latim). Por outro lado, as Parcas, divindades que conheciam o destino de cada um, homem ou deus, e por isso prediziam o futuro, tinham dado a saber a Vénus que ela seria celebrada e honrada onde quer que chegasse «a gente belígera» que demandava o Oriente (I.34 e IX.38). Se Baco receia a humilhação de vir a ser desapossado dos seus títulos de glória e fama de conquistador da Índia, Vénus ambiciona receber as honras que os Portugueses lhe hão de consagrar. Na sua missão protetora dos navegantes por- tugueses, que se inicia no consílio dos deuses olímpicos e termina no episódio da Ilha dos Amores, Vénus age e move-se sempre no plano das entidades divinas — os deuses olímpicos, em especial Júpiter, as Nereides, Cupido —, ao con- trário de Baco, deus filho de uma mortal, que tanto actua no plano dos deuses como no plano dos homens. A intervenção protectora de Vénus e a inter- venção hostil de Baco são factores que contri- buem decisivamente para dramatizar a intriga mitológica e a intriga humana d’Os Lusíadas, mas em rigor não podem alterar a determinação tomada pelos «Fados grandes», anunciada por Júpiter aos deuses olímpicos e reconhecida, com ira e revolta, pelo próprio Baco, segundo a qual o «grande valor da forte gente / de Luso» fará com que os homens se esqueçam dos feitos de Assírios, Persas, Gregos e Romanos (I.24), isto é, dos quatro grandes impérios da Antiguidade. As determinações dos «Fados grandes», do «imóbil Fado», que «as gentes vãs» não podem entender, correspondem à «escondida providência» de Deus (X.29.1), à «providência de Deus pura» (X.38.8), não podendo por conseguinte ser altera- das. Aliás, como bem observou Luís de Oliveira e Silva (1999, p. 42), os eventos futuros profetiza- dos por Júpiter a Vénus (II.44-55) pertencem já, aquando da sua enunciação poemática, ao domí- nio das res actae: «[a] prolepse narrativa é ana- lepse histórica». A visão católico-providencialista ou estóico-determinista dos acontecimentos histó- ricos narrados torna inalterável a verdade subs- tantiva destes mesmos acontecimentos, mas não anula nem exclui a função poética, ficcionalmen- te verosímil, de Vénus e de Baco. BIBL.: CHASTEL, André, Marsile Ficin et l’art, Genève, Droz, 1996; CIORDIA, Martín José, A mar en el Renacimiento. Un estudio sobre Ficino y Abravanel, Madrid-Buenos Aires, Miño y Dávila editores, 2004; FICIN, Marsile, Commentaire sur le Banquet de Platon, Paris, Les Belles Lettres, 1956; HEBREU, Leão, Diálogos de A mor , Lisboa, Instituto Nacional de Investigação Científica, 1983, 2 vols; NASCIMENTO, Aires A., «Ainda Virgílio e Camões: Vénus e Baco, uma oposição de alcance cósmico», Românica, 10 (2001), pp. 191-206; PANOFSKY, Erwin, Estudios sobre iconología, Madrid, Alianza Editorial, 1972; id., Renacimiento y renacimientos en el arte occidental, Madrid, Alianza Editorial, 1975; PIVA, Luiz, Do Antigo e do Moderno na Épica Camoniana, Brasília, Clube de Poesia e Crítica, 1980; SILVA, Luís de Oliveira e, Ideologia, Retórica e Ironia n’Os Lusíadas, Lisboa, Edições Salamandra, 1999; TARUGI, Luisa Rotondi Secchi, «La ripresa del mito di Venere nel ‘400», id. (a cura di), Il mito nel Rinascimento, Milano, Nuovi Orizonti, 1993, pp. 409-427; WIND, Edgar, Pagan mysteries in the Renaissance , Oxford, Oxford University Press, 1980. Vítor Aguiar e Silva VIAGEM N’OS LUSÍADAS, NAS RIMAS E NAS CARTAS DE CAMÕES (A). As últimas décadas do século XX trouxeram para a crítica lite- rária internacional assuntos atinentes à viagem. No que respeita à viagem na poesia de Camões, o estudo incidiu sobre pólos relativamente opostos: ou a viagem material de Vasco da Gama ou a via- gem iniciático-simbólica, esta última, no início da VIAGEM N’OS LUSÍADAS, NAS RIMAS E NAS CARTAS DE CAMÕES 961

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Na fábula mitológica d’Os Lusíadas, Vénusé a deusa protetora da «gente Lusitana», à seme-lhança da função que desempenha na Eneida deVirgílio, modelo que, nesta matéria como noutras,Camões imitou. A proteção de Vénus a Roma, àgens Iulia e à «tão amada sua» gente romanaenraíza-se originariamente no amor materno quea liga a Eneias e que estendeu aos descendentesdo herói troiano (Aeneadum genetrix, nas pala-vras de Lucano). A sua afeição aos Portuguesesnão deriva de qualquer laço de parentesco — estarelação, como argumenta Marte no consílio dosdeuses olímpicos, poderia, sim, obrigar Baco —,mas nasce do reconhecimento de que o povo lusopossui qualidades iguais às do povo romano:idêntica coragem e semelhante fortuna, comodemonstrou a fácil tomada de Tânger, cidadeabandonada pelos temerosos Mouros após a con-quista de Arzila. A própria língua portuguesa lheparece ser, com pouca diferença, a língua latina(relembre-se que, segundo diversos gramáticosdo Humanismo, a qualidade e a elegância de umalíngua se avaliam em função da sua proximidaderelativamente ao Latim). Por outro lado, asParcas, divindades que conheciam o destino decada um, homem ou deus, e por isso prediziam ofuturo, tinham dado a saber a Vénus que ela seriacelebrada e honrada onde quer que chegasse «agente belígera» que demandava o Oriente (I.34 eIX.38). Se Baco receia a humilhação de vir a serdesapossado dos seus títulos de glória e fama deconquistador da Índia, Vénus ambiciona receber ashonras que os Portugueses lhe hão de consagrar.

Na sua missão protetora dos navegantes por-tugueses, que se inicia no consílio dos deusesolímpicos e termina no episódio da Ilha dosAmores, Vénus age e move-se sempre no planodas entidades divinas — os deuses olímpicos, emespecial Júpiter, as Nereides, Cupido —, ao con-trário de Baco, deus filho de uma mortal, quetanto actua no plano dos deuses como no planodos homens.

A intervenção protectora de Vénus e a inter-venção hostil de Baco são factores que contri-buem decisivamente para dramatizar a intrigamitológica e a intriga humana d’Os Lusíadas,mas em rigor não podem alterar a determinaçãotomada pelos «Fados grandes», anunciada porJúpiter aos deuses olímpicos e reconhecida, comira e revolta, pelo próprio Baco, segundo a qual o

«grande valor da forte gente / de Luso» fará comque os homens se esqueçam dos feitos deAssírios, Persas, Gregos e Romanos (I.24), isto é,dos quatro grandes impérios da Antiguidade. Asdeterminações dos «Fados grandes», do «imóbilFado», que «as gentes vãs» não podem entender,correspondem à «escondida providência» deDeus (X.29.1), à «providência de Deus pura»(X.38.8), não podendo por conseguinte ser altera-das. Aliás, como bem observou Luís de Oliveira eSilva (1999, p. 42), os eventos futuros profetiza-dos por Júpiter a Vénus (II.44-55) pertencem já,aquando da sua enunciação poemática, ao domí-nio das res actae: «[a] prolepse narrativa é ana-lepse histórica». A visão católico-providencialistaou estóico-determinista dos acontecimentos histó-ricos narrados torna inalterável a verdade subs-tantiva destes mesmos acontecimentos, mas nãoanula nem exclui a função poética, ficcionalmen-te verosímil, de Vénus e de Baco.

BIBL.: CHASTEL, André, Marsile Ficin et l’art, Genève,Droz, 1996; CIORDIA, Martín José, Amar en el Renacimiento.Un estudio sobre Ficino y Abravanel, Madrid-Buenos Aires,Miño y Dávila editores, 2004; FICIN, Marsile, Commentairesur le Banquet de Platon, Paris, Les Belles Lettres, 1956;HEBREU, Leão, Diálogos de Amor, Lisboa, Instituto Nacionalde Investigação Científica, 1983, 2 vols; NASCIMENTO, AiresA., «Ainda Virgílio e Camões: Vénus e Baco, uma oposiçãode alcance cósmico», Românica, 10 (2001), pp. 191-206;PANOFSKY, Erwin, Estudios sobre iconología, Madrid, AlianzaEditorial, 1972; id., Renacimiento y renacimientos en el arteoccidental, Madrid, Alianza Editorial, 1975; PIVA, Luiz, DoAntigo e do Moderno na Épica Camoniana, Brasília, Clube dePoesia e Crítica, 1980; SILVA, Luís de Oliveira e, Ideologia,Retórica e Ironia n’Os Lusíadas, Lisboa, Edições Salamandra,1999; TARUGI, Luisa Rotondi Secchi, «La ripresa del mito diVenere nel ‘400», id. (a cura di), Il mito nel Rinascimento,Milano, Nuovi Orizonti, 1993, pp. 409-427; WIND, Edgar,Pagan m y steries in the R enaissance, Oxford, OxfordUniversity Press, 1980.

Vítor Aguiar e Silva

VIAGEM N’OS LUSÍADAS, NAS RIMASE NAS CARTAS DE CAMÕES (A). As últimasdécadas do século XX trouxeram para a crítica lite-rária internacional assuntos atinentes à viagem.No que respeita à viagem na poesia de Camões, oestudo incidiu sobre pólos relativamente opostos:ou a viagem material de Vasco da Gama ou a via-gem iniciático-simbólica, esta última, no início da

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década de 80, nos ensaios de Helder Macedo —Yvette Centeno, Helder Godinho, Stephen Reckerte M. C. Almeida Lu cas sobre Os Lusíadas, e numensaio de Maria Antonieta Soares de Azevedosobre a Ilha do Amor.

Estava por fazer o estudo aprofundado dasmetaforizações e alegorizações da viagem quemodulam o pensamento poético camoniano n’OsLusíadas e nas Rimas. Foi nossa tentativa fazê-lo(em A Viagem na Poesia de Camões, FundaçãoCalouste Gulbenkian-FCT, 2006), partindo daprocura dos eixos de leitura da poesia camoniana,sem enveredar por estudos exclusivamente erudi-tos, esquemáticos, sistemáticos, exaustivos, estru-turais ou redutores, nem com o objetivo deconstruir uma coerciva organicidade de argumen-tos. Os dois eixos de leitura da poesia camonianasão a Ilha do Amor e a visão da máquina doMundo cujas idiossincrasias poéticas atravessama épica, a bucólica e a lírica camoniana. Percor -rendo a máquina do Mundo como eixo de leiturada poesia camoniana, situamos, no centro, entreos Quatro Elementos, a viagem material de Vascoda Gama, a procura de verdade, o Outro, as via-gens do olhar do narrador e do sujeito lírico comoconstrutor de imagens plásticas e cinéticas, a via-gem de descida ou catábase, uma parte das viagensdos deuses — Mercúrio, Vénus —, a presença deMarte e de Saturno. No Firmamento, as constela-ções relacionam-se com a navegação, monstros emetamorfoses. No Empíreo, a divinização dosheróis e da poesia épica; a viagem para Deus«que ninguém entende», a circundar o globo decristal da miniatura da máquina do Mundo, nocume da «ínsula divina» ou Ilha do Amor. Na«ínsula divina», as viagens do amor e a visão domundo e do futuro, a anábase. Convém fazer umaformulação a um tempo recursiva e gradativa, dacatábase, à travessia, à anábase. Ao contrário dasviagens perfeitas da Divina Comédia de Dante edo Canzoniere de Petrarca, a viagem na poesiaépica e lírica de Camões, que consideramos umúnico texto, é imperfeita e questionante, atravésde inúmeras modulações do pensamento poéticocamoniano. Apesar de se tentar caminhar da catá-base para a anábase, o caminho é sinuoso, nacatábase, na travessia e na anábase.

A viagem de catábase ou de descida. Acatábase n’Os Lusíadas é assumida na sua imen-sa, multímoda e complexa relação com a ideia e

imagem de monstro e de metamorfose. A catába-se é marinha, pois o Oceano é o grande desconhe-cido a enfrentar, portador latente de futuro paraos nautas portugueses. A ideia de desconhecido ede limite a respeitar constitui um dos fulcros daideia de monstro, no plano dos deuses, doOceano, dos monstros e heróis. Baco é o deusmonstro, mo vido pela inveja e pela ira, desiludidocom os deu ses olímpicos que aprovam a viagemdos portugueses para o Oriente — onde o deusalcançara prestígio —, para tentar mover os deu-ses marinhos na sua oposição à mesma viagem.Na sua catábase marinha, Baco desce às profun-dezas do mar, sendo o mar conotado com a ideiade monstro, o desconhecido, marcado por limites,antimundo do céu e da terra, monstro porqueeventual portador de um mal latente; porque seesconde em cavernas e pode irromper repentina-mente (Os Lusíadas, VI.8; VI.5). Tritão que vaiconvocar o concílio dos deuses marinhos, a pedi-do de Baco junto de Neptuno, é também o mons-tro que pode ser conotado com os disfarces, quese esconde atrás das aderências do seu corpo,convidando o leitor a ir para além das aparências.Movidos pela ira como monstros, os deuses mari-nhos, provocados por Baco, desencadeiam a tem-pestade que ataca inesperadamente a armada deVasco da Gama. Esse mal é neutralizado pelasninfas, as quais, por ordem de Vénus — «a amo-

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Rafael, Alegoria — Visão de Um Cavaleiro (1504), Londres,National Gallery

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rosa Estrela» (Os Lusíadas, VI.85.1) — seduzemos ventos tempestuosos, acalmando as suas iras.No oceano, o monstro manifesta-se na trombamarítima e no fogo de santelmo, precedido pelaenigmática descrição da metamorfose das Ursasestelares — Ursa Maior e Ursa Menor — a ba -nha rem-se no oceano, respondendo com ironia aovazio deixado pela descrição ovidiana da meta-morfose da ninfa Calisto (Metamorfoses, II, 474 --531). O Adamastor é o monstro metamorfoseadomais complexo, autónomo e denso de significa-ções. Como o Ciclope na Odisseia e os ciclopesdas remotas culturas euro-asiáticas, o Adamastortem uma relação profunda com os ritos de passa-gem que têm a maior importância para a viagem;sem essa noção a própria viagem não se realiza-ria. Trata-se, em Os Lusíadas, da passagem deuma civilização a outra, da civilização europeiapara a asiática, de uma cultura para outra cultura,para uma cultura híbrida que é a cultura euro --asiática dos tempos modernos. O Adamastor é osinal de advertência do Outro, do medo do mons-truoso, do que é antimundo, do desconhecido eque pode destruir ou subverter tudo. Pode sertambém um modo de exprimir o desafio à reaçãoe finitude de Vasco da Gama e seus companhei-ros, perante o monstro como o Outro desconhecido.Toda a ideia e imagem de metamorfose incluía aideia de limite e de enigma. Na metamorfose deActéon em veado e a sua posterior dilaceração emorte, há a considerar a consciência dos limites,a perda da identidade e da unicidade. Na meta-morfose de Glauco — retomando a metamorfoseovidiana — que aparece, na catábase marinhad’Os Lusíadas, a chorar a perda da sua amadaCila, há a considerar que a metamorfose do pes-cador em deus-monstro marinho tornou-o imor-tal, mas ele teve de se sujeitar à metamorfose damente e do corpo, à perda de memória e da cons-ciência, à monstruosidade híbrida. Na Ilha doAmor tudo parece concertar-se, mas Camões,retomando Virgílio, não esquece a descrição daFama como monstro gigantesco. O monstro e ametamorfose unem-se na ideia de transformaçãodos heróis bélicos comparados a feras, no esforçoheroico em geral e no próprio auto-heroísmon’Os Lusíadas.

Nas Rimas há a considerar, na viagem dedescida às profundezas do eu lírico, na complexi-dade dos seus problemas emocionais, sentimen-

tais e existenciais, a relevância dos mitos dePigmalião, de Narciso, de frustração eterna, osmonstros interiores e as transformações do sujeitolírico, a catábase de Orfeu. Ao inverso do mito dePigmalião, o sujeito lírico não consegue apagar adistância entre o objeto imaginado e a união físi-ca que satisfaz o desejo, através da arte, pois serefugia em visões metafísicas de uma mulher cujaestética e ética é também metafísica, a cujosolhos se submete totalmente. Esta frustração,radicada no mal de ausência, atravessa toda a líri-ca camoniana. O sujeito lírico apaixona-se pelasua própria ideação, pela estátua que fabrica, masVénus não existe — o que é dramático — e cons-titui, no pensamento camoniano, os limites daprópria criação humana, a consciência de que oshumanos não podem competir com os deuses. O que parece não existir no universo da líricacamoniana é o amor como força criadora ou, seexiste, pode ter o reverso da perversidade e dailusão. Um dos mais pesados males de ausência éa ausência de amor matricial, a perda da «coisaamada» de origem que nunca existiu, a ausênciade amor materno, raiz da mais profunda melanco-lia, como Vítor Aguiar e Silva tão bem defendeunos seus estudos sobre as Canções da melancolia— Canções IX e X (SILVA 1999, pp. 209-228). O desejo é também gerador da maior frustração,assumida nos mitos de frustração eterna, perpe-trada ao longa da vida e para além da morte,identificável com os mitos de frustração, noHades, de Ixião, Tântalo, Tício e Sísifo (Can çãoII), castigados por terem tido amores destrutivos.O sujeito lírico confessa a ausência de limitespara o desejo que o leva a procurar fora da terra aimagem ideal da mulher. Como Actéon, deixou --se atingir por uma deusa que o aprisionou e fezdele presa, devorado ou na eminência de serdevorado (Ode VI, Sonetos Pede o Desejo, Dama,que Vos Veja e Em Prisões Baixas Fui um tempoAldo). O sujeito lírico é continuamente transfor-mado pela tristeza causada pelo amor, o qual lhetira a alegria (Soneto Está o Lascivo e DocePassarinho), a ponto de os seus olhos se transfor-marem em fonte (Soneto A mor que o Geston’Alma Escreve); o seu canto de juventude vai-semudando em choro, ao envelhecer, em contrastecom a mudança cíclica e renovadora da natureza(Soneto Mudam-se os Tempos, Mudam -se asVontades). Preocupou-se com a sua própria meta-

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morfose, a sua própria identidade — nos referidosmitos de Actéon e de Glauco —, com a transfor-mação do seu pensamento pelo excesso de imagi-nação, de fabricação mental da imagem de umamulher. Preocupou-se com a procura da própriaimagem — no mito de Narciso. Como Narciso, asua própria imagem é ilusória, referindo até depassagem o risco de a imagem da sua amada semirar nas águas (Soneto Dizei, Se nhora, da bele-za Ideia). O narcisismo, na lírica, manifesta-se naconstante procura interior de si — além da frus-tração da perdição interior —, na constante via-gem do espírito, das ideias, do pensamento, nareflexão, na descida às profundezas ou catábaseinterior, na procura de pausas meditativas. Narci -sismo enraizado numa global melancolia que, noséculo XVI, tinha várias origens e componentes,globalmente ligadas a Saturno sob cujo signopassaram a viver artistas e intelectuais desde oRenascimento, segundo a teorização de MarsilioFicino. Camões preocupou-se com a procura datransformação pela arte, assumindo o mito deOrfeu: conseguir que o inferno e a sua amadaouçam o seu canto; conseguir que a sua artepossa acalmar as fúrias, fazer parar ou suspendera sua frustração, converter o sofrimento em des-canso (Ode III). É pela arte, pela sua poética demetamorfose, que procura remédio para o maiorsofrimento e a maior frustração. Como Orfeu, éfrustrado como amante e realiza-se como artista,embora nas suas queixas e confissões diga queespalha «palavras ao vento», por não se sentiramado nem compreendido. Tem consciência deque, como Orfeu, pela poesia, conseguiu libertar --se da lei da morte (Os Lusíadas, I.2.6). Paraalém da morte de Orfeu, da sua destruição trági-ca, a sua cabeça e a sua lira continuarão a flutuarsobre as águas, a sua poesia perdurará.

A Viagem e o Outro. Camões constrói textoscomo quadros quer n’Os Lusíadas quer nasRimas, sendo relevante a plasticidade das ima-gens na epopeia e na lírica, herdadas de Ovídio,da leitura de Petrarca, sintonizantes com o tratadoDa Pintura Antiga de Francisco de Holanda. Asviagens do olhar do narrador épico e do sujeitolírico da poesia camoniana abarcam o percursodo olhar para o Outro civilizacional da epopeia; oOutro desconhecido, aproximável de alguns mati-zes do monstro; o complexo Outro da lírica queabarca a beleza, a procura do inatingível, de

Deus, do desconhecido interior, o Uno, o misterio-so englobante.

Na visão do Outro civilizacional predominaa visão do conquistador, na descrição da naturezarelevam as imagens cinéticas (Os Lusíadas,V.18;20;22), nos contactos com o Outro de Áfricae Ásia é de notar o medo e a fuga de FernãoVeloso, a comunicação por gestos, a tentativa deinquirição sobre a Índia, atingindo, na Ilha deMoçambique, a inquirição mútua. De notar aimportância dos disfarces ardilosos de Baco, comofiguração mitológica do Outro, em Mombaça eMelinde. Na aproximação do Outro na Índia, osportugueses ouvem as informações de Monçaidesem terem feito perguntas nem reagirem, numaforma de acolhimento gradativo. Após a narrativade Monçaide sobre os costumes do Malabar,Vasco da Gama é imediatamente recebido peloCatual, indo ambos de liteira, conforme uso local,a caminho do palácio do Samorim que espera oGama. A primeira reação do Gama é de deslum-bramento perante o inesperado das esculturasreligiosas de um «sumptuoso templo» (OsLusíadas, VII.46-48) que é um modo de respeitara diferença, de respeitar o Outro. O deslumbra-mento do Gama continua ao percorrer com oolhar as esculturas dos portais do palácio doSamorim que representam acontecimentos passa-dos da História da Índia. O Outro da Índia acolheos portugueses mas não procura informar-sesobre a sua história, a não ser a partir do momen-to em que Vasco da Gama, no seu discurso aoSamorim, lhe propõe apenas relações de amizadee de comércio (Os Lusíadas, VII.62.1-4), com apromessa mútua de lucro para a Índia e de glóriapara Portugal (Os Lusíadas, VII.62.5-8).

Na viagem interior do sujeito lírico, na suaprocura do Outro interior, encontramos ecos dafilosofia de Plotino — do Uno e da conversão dainteligência —, da procura de conhecimentodireto, de herança gnóstica. Nas redondilhasSôbolos rios que vão é inevitável a tentativa deaceder à visão de Deus por conhecimento diretoque verifica ser inatingível, o sujeito não perse-vera nessa procura da via unitiva, tendo desujeitar -se à precariedade de sentir o precipícioquando tenta aproximar-se, com o socorro deCristo «Grão capitão», da visão de JerusalémCeleste. Na sua vida «pelo mundo em pedaçosrepartida» (Canção IX), com a consciência do

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exílio, a necessidade de encontrar a unidade inte-rior e de salvar o eu e a alma da dispersão, osujeito lírico exprime a sua luta soteriológica, asua procura de unidade interior sobretudo pelocontrário que são os estados contraditórios, umconstante sofrimento que não o redime, a sualuta contra o tempo, contra a própria existênciacrivada de «erros meus, má fortuna, amor arden-te». A contradição máxima, no plano existencial,é expressa na melancolia do envoi da sextina —«Morrendo estou em vida, e em morte vivo; // vejo sem olhos e sem língua falo; / e juntamen-te passo glória e pena.» Não procura união comoutros homens, pois grande é a inveja e a falta desolidariedade de que é alvo e que tão clara einesperadamente exprime nas suas Cartas. NaElegia I condensa a viagem do eu lírico para aÍndia, para concluir sobre a vacuidade de viajar àprocura do Outro. A beleza e a calma vêm deuma vida estabilizada como a dos pastores eagricultores; o exílio é provocado pela tendênciado eu lírico para a viagem para espaços muitolongínquos. Nas redondilhas Sôbolos rios, a epi-fania da Beleza é fugaz e reporta o sujeito para a«pátria divina». O Outro é a beleza que surge emfulgurações e lhe escapa sempre. Entrar emmeditação é procurar concentrar-se na beleza,exigindo que o eu lírico se aparte dos homens edo bulício da existência (Soneto 105). Entrevê-sea expressão da procura constante do Outro atra-vés da procura da perseverança de um estadomeditativo. O Outro concentra-se nas fulgura-ções da beleza feminina (Odes II e XIII). A pro-cura do Outro é também conducente à procura deverdade interior.

A viagem e a procura de verdade. Muitoembora a epopeia seja um poema de certezas, averdade não é totalmente abarcável nem redutora,há sempre dúvidas que não se podem dominar e,então, a verdade não é um conjunto de certezasmas um conjunto de buscas, de percursos, querno plano civilizacional, na epopeia, quer no planointerior do sujeito lírico, na procura da verdadedo discurso e da experiência, das «puras verda-des», na procura da fé. Embora afastado do pen-samento irenista de Erasmo, Camões dele seaproxima nessa procura e prática da verdade nãoredutora mas em via de globalidade, através deinúmeros percursos da razão, da fé, do distancia-mento crítico e da procura de discernimento.

A certeza fulcral da epopeia camoniana é ada exaltação da veracidade da História de Por -tugal e, no plano factual, a da viagem de Vasco daGama para a Índia. O narrador Vasco da Gamatenta conciliar a verdade dos factos que narrasobre a História de Portugal e a história da suaviagem, com a veridicção do seu próprio discur-so, revelando consciência de que a veridicção e averdade factual se situam num plano axiológico,vital, superior ao da mais perfeita literatura: «Averdade que eu conto, nua e pura, / vence todagrandíloca escritura!» (Os Lusíadas, V.89.7-8).Daí o primado da vida sobre a literatura. EmMelinde, « a gente verdadeira e mais humana»tem boas intenções — «verdadeiro ânimo e pure-za» — e pratica a verdade através de ofertas epalavras (Os Lusíadas, II.75). Na Índia são osportugueses que praticam a verdade perante oSamorim (Os Lusíadas, VIII.74;75), mas oSamorim — um alto representante da civilizaçãooriental avançada — resiste (Os L usíadas,VIII.66), por não querer deixar-se levar de ime-diato por um breve discurso que pretende ser con-vincente, mas que, na realidade, visa obtercontactos comerciais (Os Lusíadas, VIII.59).Todavia, no seu conjunto, o que importa, porparte do narrador de Os Lusíadas, é a verdade dodescobridor/conquistador, a verdade tambémequivalente à religião cristã. Os epifonemas oufinais de Canto de Os Lusíadas revelam, por partedo narrador, uma inabalável crítica, discernimen-to e prática de verdade (ver LANGROUVA 2006).No plano do conhecimento da natureza através daviagem, Camões assume o saber teórico dos filó-sofos e aceita o saber técnico dos marinheiros quelhes permite experimentar a natureza e nelaconhecerem o que consideram «certo» e «verda-deiro» (Os L usíadas, V.17). O discurso doAdamastor vem introduzir a noção de limite noconhecimento da natureza, avisando o homemportuguês e moderno de que a desmedida podeter consequências catastróficas. Simboliza tam-bém que a verdade pode estar fora, pode estarpara além da função judicativa, no plano episte-mológico.

A verdade como caminho processa-se, querno plano das aparências, quer da narrativa históri-ca e da narrativa da viagem, quer do Outro, querdos valores e comportamentos de grupos sociais,de Baco ou da Fama, do conhecimento da nature-

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za, até ao ascenso da própria inteligência, à visãodo Universo, acessível ao olhar de Tétis e doGama. Trata-se de um prémio para a inteligênciade Vasco da Gama e do Homem renascentista,deixando em aberto que as deusas da Ilha doAmor podem ser verdadeiras e que os «verdadei-ros divos» — santos e anjos das hierarquias cris-tãs celestes — se encontram numa esfera que nãoé a dos deuses pagãos, reservando-se a evidênciaoculta, que é o mistério, para Deus que está paraalém das esferas da máquina do Mundo e paraalém do entendimento humano.

É na viagem interior da lírica que a sua pro-cura e prática de verdade, através da experiênciavital e interior, não raro imbuída de espírito degnose, instaura percursos interiores, tomandoconsciência do que ganha, do que vai perdendo,num caminho de autoconsciência e de verdadepara consigo próprio, como sujeito lírico, dei-xando margem para dúvidas, paragens, hesi -tações, desesperos, vertigens, consciência do«desconcerto» do mundo e do «desconcerto»interior. O su jeito lírico sofre a desrazão do des-

concerto, a confusão de Babilónia, a convicçãopontual de que Deus, apenas nomeado, não quero desconcerto mas o «acerto» do mundo (SonetoV ós Outros, que Buscais Repouso Certo). Ver -dade e experiência acompanham-se mutuamentena lírica (Soneto Conversaçõ Doméstica A fei -çoa). As verdades são a pluralidade de experiên-cias vivenciais, a pluralidade de viagens do seudiscurso poético. São «verdades puras», quer porserem fruto da experiência quer por serem intei-ras, e não «defeitos» (Soneto Enquanto QuisFortuna que Tivesse). Verdade e experiência pas-sam pela vida do sujeito lírico e autor empírico,exilado não voluntário para longe da pátria, sol-dado e, tal como confessa nas suas Cartas, nãoraro incompreendido, solitário e desesperado. A sua própria intrepidez de dizer a sua verdade éum dos fulcros da lírica camoniana (Canção IX,Canção VIII). É complexa a aparente certeza deque a amada pode mudar toda a «verdade pura»até à maior crueldade, mas o sujeito persevera naprocura da verdade e, no commiato final, pede àcanção que viaje na direção da verdade — «Canção,se já não queres / ver tanta crueldade, / lá vásonde verás minha verdade» (Canção VIII, 3;commiato). O sujeito dedica toda a Canção X à«explicação» das «puras verdades» da experiên-cia, da sua autobiografia ou da própria vida, pre-ferindo que, em vez de tanto sofrimento, nãofossem verdades mas «fábulas sonhadas» — amelancolia de querer dizer o seu «mal» e não serouvido por Deus, nem pelos homens nem pelovento; a melancolia de nunca ter tido o amormaterno nem o amor de uma mulher. A melanco-lia é um fulcro da viagem catabática na lírica. Asimagens de felicidade são «fantásticas pinturas»,pertencem ao plano da fabula. N’Os Lusíadas, aviagem de procura de verdade tem vários percur-sos até ascender à cúpula, ao amor, ao futuro e aomistério, sonho imaginado e poético que é a Ilhado Amor. Na lírica, a viagem de procura e práticade verdade — filha do tempo, da razão e da reve-lação — abre-se para o caminho conducente, nasredondilhas Sôbolos rios, ao «profundo mistériona sua altura» do regresso à «pátria natural», àpátria do futuro, para além da morte e do tempo,permanecendo o tecido da dúvida, os enigmas dotempo, de Deus, dos próprios deuses pagãos, cujapresença vivifica os universos da épica e da líricacamonianas na sua polivalência singular.

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Autor anónimo, Veritas Filia Temporis, xilogravura AdriaenWillaert, Liber quinque missarum, Veneza, 1536.

Regensburgo, Bischöfliche Zentralbibliothek, ProskescheMusikabteilung

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A fabula das viagens dos deuses. Vimos quea fabula não mitológica, na lírica camoniana, estáligada à imaginação e à alegria. A fabula mitológi-ca envolve as viagens dos deuses. Todos os deusesda máquina do Mundo vêm dos sete céus, convo-cados por Mercúrio — cuja deslocação é apenasmencionada e não descrita —, para se reuniremem concílio, no início d’Os Lusíadas (I.20 -41).Júpiter é persuadido por Vénus que vem do tercei-ro orbe, e por Marte que vem do quinto orbe, pró-ximo de Júpiter. O deus da guerra é o único quetem expressão melancólica — «merencório» —,no concílio, porque sabe que a morte vem daguerra, está possuído pela ira e é portador demorte (Os Lusíadas, I.36); não viaja e sabe quenão vai triunfar sobre Vénus n’Os Lusíadas. Bacoviaja na sua catábase marinha para pedir aNeptuno a convocação dos deuses marinhos.Neptuno permanece no mistério do fundo do mar.Vénus viaja para o céu, desce à terra e ao mar deMombaça para proteger também a armada deVasco da Gama que, no poema, é guiada peladeusa do amor para a Ilha do Amor. Após a chega-da dos Portugueses à Índia, aparece sobre o mar amover a sua ilha, num ambiente de beleza e apo-teose, até a fixar no Oceano e a tornar imóvel,depois de já ter nela preparado, com as ninfas, orepouso e a recompensa para os navegantes portu-gueses (Os Lusíadas, IX.52.53). A presença dosdeuses pagãos da máquina do Mundo, na epopeiae na lírica, é a um tempo implícita e explícita,repetidamente recordada através dos valores dateologia pagã, veiculada pelo neoplatonismo,assumida por Camões e pelo Renascimento. Assuas viagens são não raro expressas, na lírica, pormetáforas da procura de coragem, de harmonia,de beleza e de luz, por vezes através dos seusopostos, tais como o «desconcerto», a ausência deluz ou de razão, num processo de movimento e detransformação, com energias desbravadoras domar, ou vindas do céu, numa harmonia de desci-das, travessias e anábases. De notar a presençaimplícita do mistério de Mercúrio na metáfora do«voo do pensamento», relacionada com a estrutu-ra da própria Canção, no envoi ou commiato daCanção. A presença dos deuses pagãos exprime arelação entre os céus e a terra, inscrevendo o lugardo homem na eternidade — Apolo, a eternidadeda arte e da música —, pela escrita que é a arte damemória, pela procura de sabedoria, de festa da

vida e do Amor, de verdade, pela razão, pelo esfo-lamento — «a alma chagada… em carne viva»(implícito o mito de Apolo e Mársias). Se a guerraé a arte de esquecer — a razão por que Marte nãoviaja —, o amor triunfa sobre a guerra ao assumiros valores da Ilha do Amor.

Viagens do Amor e viagem do pensamento.O amor n’Os Lusíadas tem a ver com a complexavisão do mundo onde conflui o neoplatonismo eas antinomias e contradições da vida, comodemonstrou Aguiar e Silva (SILVA 1999, pp. 163 --178), tem a ver com a herança medieval — dosTrionfi e do Canzoniere de Petrarca, do tratamen-to da viagem do amor em A Divina Comédia, naVita Nuova e no Convivium de Dante —, com afilosofia do amor do Renas cimento, em particularos Diálogos de Amor de Leão Hebreu, obra queabarca o saber neoplatónico, o conhecimento daspaixões profundas dos seres humanos, o prazer deunião com a beleza amada, a procura da inteligi-bilidade do amor. A mais recente e inovadora teseinternacional sobre Leão Hebreu, da autoria deJoão J. Vila-Chã, é sobre a inteligibilidade doamor (VILA-CHÃ 2006). A filosofia de Hebreuestá ainda mais próxima do que a de MarsilioFicino da poesia de Camões (LANGROUVA 2006,pp. 233-267), nas modulações das viagens dosdeuses, dos planetas, do amor; na procura deconhecimento, de beleza e de prazer; na suaexpressão do desejo, da razão e da paixão; nomistério do «amor cego» (Sonetos Pois MeusOlhos não Cansam de Cho rar; Bem Sei, Amor,que é certo o que creio; Num Bosque que dasNinfas se Habitava). Hebreu está ainda próximode Camões no conteúdo da relação do amor coma divindade e a verdade; o caráter divino do seramado; a origem angélica do amor; a viagem doamor do céu para a terra que deveria conduzir osseres humanos para a paz e o prazer, mas que, narealidade, é limitada pela mágoa, pela ansiedadee pelo sofrimento. Todavia, a Ilha do Amor con-densa uma alegoria positiva sobre o futuro dahumanidade, com uma unidade desejada no uni-verso global da poesia camoniana, mas não atin-gida nos seus poemas líricos, integrando, emsimultâneo, as categorias ficinianas, vindas deSanto Anselmo, das modulações do amor —amore bestiale, amore umano e amore divino. Osecos da filosofia do amor de Leão Hebreu, napoesia épica e lírica camoniana encontram-se nos

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conteúdos do amor cósmico, em particular na via-gem de Vénus em direção a Júpiter, atraindo, como seu voo e a sua presença, os planetas, as estre-las, o próprio ar e o céu (Os Lusíadas, II.34); nasqualidades celestiais da amada, superiores aosdas deusas, algumas delas planetas — Diana,Vénus, Palas e Juno (Soneto Diversos DõesReparte o Céu Benino); no enamoramento do céupela terra («o Céu da fresca terra se namora»,Ode IX), na beleza apoteótica das ninfas comoexpressão de um universo global de utopia (Éclo-gas IV, V, VIII, apesar de nesta última se tecer ocomplexo mito da fuga de Galateia); no conteúdoe expressão do amor como pai do desejo (SonetoPede o Desejo, Dama que Vos Veja); na excelên-cia da intelectualização do amor e da viagem dopensamento (Soneto Quando da Bela Vista eDoce Riso), esta constituindo o mais profundofulcro do conjunto dos vários planos e metáforasda viagem na obra camoniana, alternando a aná-base do espírito com a descida ao plano das emo-ções até à perda da razão (Soneto Amor, que oGesto Humano n’Alma Escreve); na relação doprazer com o amor, do prazer com a razão, noamor, podendo o amor ser contrário à razão(Sonetos Tempo é já que Minha Confiança; EmPrisões Baixas Fui um Tempo A tado, CançõesII.1, 14 -16; VII). Na Ilha do Amor é clara a har-monia entre o amore bestiale, o amore umano e oamore divino. As viagens do amor na lírica to -mam diferentes direções deixando o caminhoaberto, exceto no plano da frustração profunda eda morte. A única viagem do amor que parece teruma direção definida, ainda que sujeita à inevitá-vel vertigem do abismo, em movimento ascen-dente, até ao limiar do paraíso, numa antevisão deJerusalém Celeste, é a viagem para o amor divi-no, a viagem para Deus, nas redondilhas Sôbolosrios. Essa mesma direção para o amor divinoencontramos na pintura de Rafael, Santa Cecília(1514).

O triunfo de Vénus sobre Marte e a viagemde subida ou anábase na Ilha do Amor. Dasduzentas e quinze estrofes que ocupam o episódioda Ilha do Amor, cerca de mais de um quarto épreenchido com a guerra na Índia e quase umquarto com guerra, o poder marítimo conquistadopela viagem e pela força bélica, em todo o orbeterrestre. A «dura guerra» constitui o fulcro daprofecia da Ninfa ao Gama: a guerra dos gover-

nadores da Índia que já tinha sido travada e erado conhecimento de Camões, uma guerra cons-tante, a que reis, comerciantes e o povo local ten-taram resistir, até à rendição dos habitantes, dosreis e do Samorim, até à morte das populaçõeslocais, à destruição de armadas. A Ninfa prometeo prolongamento do prémio — para os nautas e osconquistadores da Índia — os «bravos Martes»,não devidamente reconhecidos — que irão des-cansar na Ilha do Amor. A cumplicidade de Vénuse Marte é corroborada até ao fim do poema.

O narrador de Os Lusíadas descreve comgrande beleza o movimento da partida de Vénuspara a Ilha do Amor. Ao tentar inclinar-se sobreos «montes Idálios de Chipre», permanece empausa meditativa, sentada no seu carro suspensopelos cisnes, no ar, olhando e meditando sobre oque o seu olhar divino pode atingir: vê Cupidorodeado de Cupidos a prepararem-se para umaexpedição de amor «contra o mundo revelde»; vêActéon metamorfoseado em veado; vê a «filáu-cia», o egoísmo dos governantes; a corrupção doclero que procura «mandos e riqueza»; a comple-ta ausência de amor, pois «ninguém ama o quedeve». Antes de lançarem setas nos «duros cora-ções da plebe ruda», para os ferirem de amor, osCupidos completam a metáfora da expediçãocomo luta armada contra as classes sociais, paraserem atingidas pelo amor; enquanto preparam asarmas, cantam o amor. Vénus desce do seu carro

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Diana e Actéon, maiólica policroma (1540-1550). Arezzo,Museo Statale d’Arte Medievale e Moderna

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para se entender com o filho Cupido sobre a Ilhado Amor. Deseja que a Ilha seja um exemplo deamor para o mundo que lhe é contrário e seencontra minado pela hipocrisia. Cupido concor-da, entra para o carro de Vénus e sugere que énecessária a presença do monstro da Fama —para mudar os deuses que tinham sido incitadospor Baco contra os nautas portugueses, conse-guindo que sejam premiados na Ilha. Camõessugere, em simultâneo, que, na esperança para ofuturo da humanidade, impregnada em beleza,amor e festa, metáforas da vida humanizada,haverá sempre a presença do monstro, na suapolivalência complexa. Na sequência desta via-gem metafórica, assim como Cupido lançarasetas de amor para a humanidade endurecida,assim as lançará, com a ponta dourada, para asninfas que são feridas pelo amor, quase morremde amor (Os Lusíadas, IX.48), sendo as suas feri-das curadas por Vénus que lhes «traz a medicina»ao cimo da água (Os Lusíadas, IX.49). A Ilha doAmor, eixo e cúpula da poesia épica e líricacamoniana, é um espaço alegórico-utópico defesta e de cor (Os Lusíadas, IX.52;53), de harmo-nia, beleza e força genesíaca da Natureza, deabundância de água cristalina e de fontes (OsLusíadas, IX.54), de suavidade dos vales (OsLusíadas, IX.55), do parar do sofrimento decor-rente da metamorfose — Actéon já não se espantacom a sua forma animal (Os Lusíadas, IX.63).Reina a abundância de árvores de fruto, a forçagenesíaca do reino de Pomona, a metáfora dabeleza e sensualidade dos inúmeros, coloridosfrutos, conferindo à Ilha um ambiente de recon-forto para a humanidade futura (Os Lusíadas,IX.56; 59). A música acompanha as ninfas nobanquete oferecido aos nautas e enquanto elascaminham na floresta para a eles se entregarem.Leonardo liberta-se da frustração amorosa, conse-guindo que a ninfa fugidia se converta ao «puroamor».

Na Ilha do Amor, Vénus triunfa sobre Marte.O prémio começa por ser dado aos nautas. Osgovernadores da Índia serão premiados numapausa de adormecimento de Marte. Esta ideia doprémio do amor e do adormecimento de Marteesta relacionada com a filosofia da pintura deBotticelli, no quadro Venus e Marte. Neste qua-dro é surpreendente a imagem do deus da guerraadormecido, a manter, com a ponta de um dos

dedos da mão esquerda, o equilíbrio de um pe -queno bastão metálico, numa linha quase vertical.Será a expressão de um poder divino, traduzidona capacidade de manter o equilíbrio precário efrágil entre a paz e a guerra; a guerra depende dapaz e a paz depende da guerra, no âmbito da his-tória construída por mão humana. Os pequenossátiros vêm minar toda a força dos instrumentosbélicos, anulando a própria guerra. Vénus, apoiadano braço direito, sobre uma almofada, na direçãooposta a Marte, tem todo o seu corpo suavementeestendido e repousado, apoiado pelo braço e oflanco direito, olha profunda e serenamente parao rosto de Marte adormecido, numa atitude detriunfo, de firmeza quase enigmática, nummomento de pausa, fora do tempo, exprimindotambém a meditação sobre a ambivalência da paze da guerra, do amor e da guerra, num plano quese situa fora do tempo.

Na anábase final da subida de Vasco daGama, guiado pela ninfa Tétis, ao cimo do monteda Ilha do Amor, para além do simbolismo domonte, da transparência e luminosidade do chãoque se pisa e da transparência da bola de cristalonde se vê, à distância, a máquina do Mundo, umglobo penetrado pelo «lume claríssimo» (OsLusíadas, X.77), é evidente que esta é a visão quea sabedoria e não a ciência permite, porque é umavisão distanciada no espaço, de cima para baixo,como no sonho de Cipião (CÍCERO, pp. 15-16), avisão do humanista cívico, merecendo o prémiopara a inteligência que Cipião obteve em sonho(Os Lusíadas, X.76). Esta visão coloca-se no pla -no do sonho literário do narrador d’Os Lusíadas eveicula de certo modo o sonho de Cipião, adota-do pelo Renascimento.

O quadro de Rafael intitulado A legoria —Visão de Um Cavaleiro (cerca de 1504) tem sidointerpretado como a representação do sonho deCipião.

Rafael concebeu o sonho de um cavaleiro,não como uma escolha entre a virtude e o prazer,mas como a possibilidade de não excluir nemuma nem outra, deixando os dois caminhos emaberto. Ambas as figuras femininas alegóricas doPrazer e da Virtude têm uma postura meditativa,perante o cavaleiro semiadormecido que as in -corpora no seu sonho: o cavaleiro não renuncia àvirtude, à cultura, às armas, ao dever, nem ao prazernem à liberdade. A paisagem de fundo corrobora

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a ponte possível entre os caminhos diferentes queas duas belíssimas figuras alegorizam. Tudo ficaem aberto, como na viagem sinuosa do pensa-mento camoniano, na poesia lírica e épica consi-derada como um único texto que culmina na Ilhado Amor, em cujo sonho poético tudo fica abertopara o futuro. Eis uma ponte importante entre opensamento de Ficino — que defendia a união davida contemplativa, vida ativa e o prazer —, deRafael e de Camões, retomando ainda LeãoHebreu. Retomando o sonho de Cipião, mas jásem a bipolaridade entre o ser e o dever-ser: ape-nas o ser espraiado na vida e no serviço à comu-nidade, aberto a um futuro. Neste sentido, Rafaele Camões condensam uma abrangente e sábiavisão do mundo, aberta, sem conflitualidade dedialéticas nem de atitudes perante a vida. O idealdo cavaleiro, na pintura de Rafael e n’Os Lusía -das é o da conciliação da virtù, das Armas e Letrascom o amor e o prazer. Daí a preocupação deCamões sobre a crise de cultura e a ignorância doscavaleiros e nautas portugueses que se afastamdesse mesmo ideal humanista (Os Lusíadas, V.95 --100), não têm suficiente interesse pela culturaliterária. Guerreiros e nautas circunscrevem-se àsarmas e ao amor, a Vénus e a Mar te: a Ilha cumulaos nautas e cumulará os «bravos Martes» de pra-zer, no convívio com as ninfas, permitindo-lhesascender ao estatuto de divinização.

A visão ectoscópica da Ilha do Amor, osonho poético da alegoria, com marcas de utopia,que é a Ilha do Amor, e a visão do mundo emminiatura, reiteram que o amor e o humanismocívico poderão unir-se nos homens que procuremconverter a sua inteligência para a luz, a retidão,a justiça; converter o seu coração para o dom e oamor — contrários à filáucia que é o egoísmo —,amor aberto à comunidade; converter o seu corpopelo esforço heroico e empenho ao serviço dacomunidade. Ilha de Amor, sabedoria e harmonia,abundância de frutos, força genesíaca da nature-za, justiça, luz, música, beleza, alegria, paz, sembarreiras sociais, conducente à fraternidade, àesperança face ao futuro.

A viagem nas Cartas I e II. Considerando asCartas de Camões como um único texto, vemosque há vários sentidos e modulações da viagem,desde a viagem que obrigou o autor ao exílio, àsperdas que resultam da viagem, à impossibilidadede a viagem mudar a dor interior que pode evoluir

para o enraizamento na tristeza, na depressãoobsessiva, assumida na Carta II como uma doençadas profundezas, passível de acometer cada serhumano, sem dúvida experimentada por Camões eexpressa nos seus meandros, na lírica. Na Carta I,o inevitável testemunho da doença social, que é a«pura inveja» que tudo entrava, de que Camõesfoi alvo e que o obrigou a procurar o caminho doexílio. A inveja é também a última palavra de OsLusíadas, embora associada à emulação literária.O texto das Cartas evolui para o movimento finalde anábase do pensamento sobre a vida e a morte,a visão do mundo no qual se perderam os valoreshumanos, tendo a certeza de que se pode morrerde excessos e da ausência de amor. Permanece odesafio para cultivar a generosidade e o bem --fazer. O texto das Cartas é como que o fecha -mento de um círculo de reencontro do autorempírico consigo próprio, homem e poeta,enquanto, na lírica, filtrada pelo código petrar-quista, exprimiu os universos complexos dosvários eus, a travessia da tristeza, da frustração noamor e as ambiguidades da beleza; na bucólica, osofrimento, as doenças sociais e o mal de ausên-cia, filtrados pelos códigos da bucólica de Teó -crito a Virgílio; na épica, a complexidade dahistória, da viagem à Índia, dos deuses, das meta-forizações e alegorizações da viagem, para culmi-nar no sonho poético da Ilha do Amor, uma ilhade bem-aventurança e luz onde se alcança umavisão do mundo, a visão da máquina do Mundo.Sendo a Ilha do Amor a um tempo um dos eixosde leitura de toda a poesia camoniana e a cúpulado eixo, as Cartas constituem um eixo de síntesepara o conhecimento do seu itinerário do essencialda viagem ao pensamento, cuja cúpula é a visãodo mundo e da vida, a aceitação estoica da vida ea esperança.

BIBL.: ANTUNES, Manuel, Indicadores de Civilização(cap. «Humanismo clássico e Humanismo Moderno»),Lisboa, Verbo, 1978; AZEVEDO, Maria Antonieta Soares de,«A Ilha dos Amores. Introdução a uma leitura simbólica»,Lisboa, Brotéria, 1980, 11, n.os 1, 2 e 3, pp. 123-136; CEN -TENO, Yvette, Helder Godinho, Stephen Reckert e M. C.Almeida Lucas, A Viagem em Os Lusíadas. Símbolo e Mito,Lisboa, Arcádia, 1980; CÍCERO, De Re pu blica, VI, pp. 15-16;FICINO, Marsilio, «De sanitate tuenda», de «Vita Triplici», inOpera, Basileae, 1561, I, fol. 495-509; HEBREU, Leão, Diálo -gos de A mor, trad. de Giacinto Manu ppella, Bibliografia.Lisboa, Instituto Nacional de Investi gação Científica, 1983;

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LANGROUVA, Helena, A Viagem na Poesia de Camões,Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian-FCT, 2006; id.,Actualidade d’Os Lusíadas, Lisboa, Roma Editora, 2006; id.,De Homero a Sophia. Viagens e Poéticas, Coimbra, AngelusNovus, 2004; LANGROUVA, Helena, NASCIMENTO, Aires A.,MARTINS, J. V. Pina e EARLE, Thomas F., «As Cartas deCamões — da viagem ao pensamento», Humanismo para oNosso Tempo — Estudos de Homenagem a Luís de SousaRebelo, Braga, Fundação Calouste Gulben kian (patrocínio),APPACDM (difusão e comercialização), 2004; MACEDO,

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Helena Langrouva

VIAGEM N’OS LUSÍADAS, NAS RIMAS E NAS CARTAS DE CAMÕES

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