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Vigilância em saúde e violência interpessoal e intrafamiliar Palavra-chave: violência nas relações familiares; vigilância em saúde

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Vigilância em saúde e violência interpessoal e intrafamiliar

Palavra-chave: violência nas relações familiares; vigilância em saúde

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Introdução

A violência é um problema mundialmente conhecido, que se caracteriza por sua

complexidade no contexto das sociedades. Apesar desta complexidade, o fenômeno pode

ser conceituado como “o uso da força física ou do poder, em ameaça ou na prática, contra

si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar

em lesão, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação” (KRUG et

al., 2002).

Fatores políticos, econômicos, sociais e culturais, traduzidos nas relações cotidianas

fomentam o fenômeno, que da mesma forma que é construído por determinadas sociedades

e em determinadas circunstancias, também pode ser desconstruído (MINAYO & SOUZA,

1999).

Estudos têm apontado que ao mesmo tempo em que fatores biológicos e individuais

explicam algumas predisposições à ocorrência de violências, é mais frequente que estes

fatores interajam com aspectos familiares, comunitários, culturais e externos, para desse

modo, se criar uma situação propícia às agressões (DALHBERG & KRUG, 2007).

As violências podem ser categorizadas em: 1) Violência autoinfligida; 2) violência

Interpessoal e 3) Violência coletiva. Além disso, estes tipos de violência desdobram-se em

diversas naturezas, podendo ser: Violência física, Sexual, Pscicológica, Negligencia

(KRUG et al., 2002).

A partir da década de 1980, a Saúde Pública tem desempenhado um crescente papel

no enfrentamento às situações de violência. Muitos estudos vêm sendo desenvolvidos na

área, a fim de se conhecer mais profundamente o fenômeno, e assim buscar soluções para a

prevenção e o enfrentamento.

Desta forma, o Ministério da Saúde (MS), ao reconhecer que as violências e os acidentes

exercem ônus social e econômico, lança a Política Nacional para Redução da

Morbimortalidade por Acidentes e Violências (BRASIL, 2001). Esta política estabelece

sete diretrizes entre as quais o monitoramento dos acidentes e violências, a capacitação de

recursos humanos e o apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas; e também

menciona as responsabilidades dos gestores nacional, estaduais e municipais quanto ao

desenvolvimento das ações relativas à vigilância epidemiológica de acidentes e de

violências.

Em 2006, o MS iniciou a implantação do Sistema de Vigilância de Violências e

Acidentes (VIVA), o qual possui dois componentes, um de vigilância contínua,

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inicialmente implantado em serviços de referência para atenção às vítimas de violência

interpessoal e outro de vigilância sentinela, realizado por meio de inquéritos bianuais em

serviços de urgências e emergências sobre os atendimentos às vítimas de acidentes e

violências (BRASIL, 2009).

O componente contínuo do VIVA, capta os casos suspeitos ou confirmados de

violência doméstica/intrafamiliar, sexual, autoprovocada, tráfico de pessoas, trabalho

escravo, trabalho infantil, intervenção legal e violências homofóbicas contra mulheres e

homens em todas as idades. No caso de violência extrafamiliar/comunitária, somente as

violências contra crianças, adolescentes, mulheres, pessoas idosas, pessoa com deficiência,

indígenas e população LGBT são objeto de notificação (BRASIL, 2014). O componente

contínuo do VIVA foi incorporado ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação

(Sinan Net), gradualmente a partir de 2009, e, desde janeiro de 2011 a violência doméstica,

sexual e/ou outras violências (componente contínuo do VIVA) se tornou um agravo de

notificação compulsória em todo o território nacional (Portaria nº104 de 25/01/2011 do

Ministério da Saúde).

As vigilâncias contínua e sentinela possuem sistemas de informação próprios, que

permitem a entrada e análise dos dados obtidos por meio de duas fichas distintas:

VIVA Contínuo: Ficha de Notificação de Violência Interpessoal/Autoprovocada

(BRASIL, 2014);

VIVA Inquérito: Ficha de Notificação de Violências e Acidentes em Unidades de

Urgência e Emergência (BRASIL, 2013).

A vigilância contínua objetiva, também, a atuação integrada com a “Rede de

Atenção e de Proteção Social às pessoas em situação de Violências”, objetivando a atenção

integral e humanizada, no âmbito das políticas de assistência social e do sistema de

proteção e garantia de direitos humanos (BRASIL, 2014).

Ao longo dos anos, o MS tem procurado aperfeiçoar os instrumentos de vigilância

em saúde, de acordo com as diversas políticas, com as quais se avança na efetivação dos

princípios do SUS e nas demais políticas de inclusão e justiça social. Desta forma, seus

instrumentos (fichas de captação de informação) têm produzido efeito em diversas

políticas e documentos balizadores das ações do âmbito da Saúde e de outros ministérios

do campo social. Dentre estas políticas, vale mencionar: o Plano Nacional de

Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-juvenil (CONANDA – 12/07/2000); Plano

Nacional de Políticas para as Mulheres (Decreto no 5.390, de 8 de março de 2005); Maria

da Penha (Lei nº 11340, de 07/08/2006); Plano de Ação para o Enfretamento da Violência

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Contra a Pessoa Idosa – SEDH/PR – 2005; Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico

de Pessoal (Decreto nº 5948 de 26/10/2006); Política Nacional de Saúde da Pessoa com

Deficiência (Portaria n.º 1060/GM, de 05 /06/2002); Política de Saúde para a População do

Campo (Portaria Nº 719/GM de 16/04/2004); Política Nacional de Saúde Integral da

População Negra (Portaria n° 992, de 13/05/2009); Política Nacional de Saúde Integral de

Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT – 2008; Estatuto do

Desarmamento (Lei n° 10.826, de 22/12/2003), entre outros. Todo este trabalho e

melhoramento da vigilância de violências, somado às políticas de atenção integral à saúde,

proteção e garantia de direitos, foi fortalecido com a publicação da Portaria GM/MS nº

1.271 de 06 de junho de 2014 que define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de

doenças, agravos e eventos em saúde pública e torna imediata a notificação dos casos de

violência sexual e de tentativas de suicídio na esfera municipal, com o objetivo de garantir

a intervenção oportuna nos casos (BRASIL, 2014). Além disso, em novembro de 2014

juntamente com a nova versão do Sistema de Informação de Agravos de Notificação

(SINAN) foi instituída uma nova versão da ficha de notificação de violências do

componente contínuo do VIVA, que passou a se chamar Ficha de Notificação de Violência

Interpessoal/Autoprovocada, tendo sido incluídos novos campos referentes ao nome social;

orientação sexual; identidade de gênero; motivação da violência e ciclo de vida do

provável autor da agressão.

Esse conjunto de normas e ações evidencia o esforço conjunto de gestores,

pesquisadores, profissionais de saúde, técnicos, acadêmicos, políticos e lideranças sociais,

para organizar e estruturar as ações de enfrentamento da violência no âmbito do Sistema

Único de Saúde, de modo articulado às outras esferas do poder público e da sociedade em

geral. O estudo dos aspectos concernentes à vigilância de violências torna-se fundamental,

para que se possa agir de forma preventiva e fornecer um atendimento de qualidade às

vítimas e pessoas envolvidas em qualquer tipo de violência (Mafioletti et al, 2013). E, para

isso, é necessário acompanhar e avaliar o processo de implantação das estratégias de

vigilância às violências interpessoais e autoprovocadas.

A violência não é um fenômeno abstrato, é fenômeno sócio-histórico e ocorre em

cada lugar de forma específica, existindo a necessidade de estudos operacionais in loco e

também estratégias intersetoriais de enfrentamento. A vigilância epidemiológica é a

estratégia imprescindível para dar visibilidade a esse agravo, principalmente no que diz

respeito ao estabelecimento de um diagnóstico situacional do impacto da violência em

determinada população, em certo local e tempo, necessário para o planejamento de ações e

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o fomento de políticas públicas para seu enfrentamento. A notificação de violências pelos

serviços de saúde, então, tem um papel fundamental nesse processo e deve ser a base para

esse diagnóstico.

As informações geradas a partir das notificações de violência doméstica, sexual e

outras violências, obtidas através da Ficha de Notificação de Violência

Interpessoal/Autoprovocada, são valiosas para o conhecimento das situações de violência

mais comuns em determinado local, embora o contexto em que elas ocorrem muitas vezes

seja omitido. Para se conhecer esse contexto, e intervir de forma eficaz, é necessário

também ouvir os profissionais de saúde que lidam diretamente com essas situações, e estão

em contato direto com as vítimas. E para que essas informações sejam utilizadas para o

planejamento e execução de ações, não só na área da saúde, mas ações intersetoriais, é

necessário a interlocução, e boa comunicação entre os diversos setores envolvidos com a

questão da violência, que é transversal a tais setores, e assim, tais informações, para além

de constituírem números, contribuam para que as vítimas tenham uma rede de atendimento

para serem encaminhadas.

Em 2011, teve início o estudo “Monitoramento e avaliação do processo de

implantação das estratégias de vigilância às violências em Niterói” no Instituto de Estudos

em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IESC/UFRJ), com objetivo

de “Monitorar e avaliar o processo de implantação da Vigilância às Violências em Niterói,

em conjunto com a Coordenação de Vigilância em Saúde da Fundação Municipal de Saúde

de Niterói (COVIG/FMS/Niterói), a fim de ampliar o conhecimento e subsidiar a

proposição de intervenções frente à violência interpessoal no município”. Contou com

apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ,

Programa APQ1 - Processo Nº E-26/110.596/2011) e foi aprovado pelo Comitê de Ética

em Pesquisa do IESC/UFRJ (Processo nº 40/2011). Em 2013, o estudo “Monitoramento e

avaliação da vigilância contínua de violências em municípios do estado do Rio de Janeiro”

com apoio do CNPQ (Edital Universal/2012, Processo nº 479796/2012-2), também

aprovado pelo CEP/IESC (Parecer nº 554.083 de 12/03/2014) deu seguimento ao estudo

iniciado em Niterói, ampliando a investigação para os municípios de Campos de

Goytacazes, Duque de Caxias, Petrópolis e Queimados, todos no estado do Rio de Janeiro.

Neste trabalho apresentamos a trajetória do estudo no município de Niterói, e as

reflexões a partir das investigações realizadas. Tem por objetivo refletir acerca das

estratégias de vigilância às violências interpessoais na estruturação de redes intersetoriais

de prevenção da violência e promoção da saúde.

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A realização do estudo em Niterói demandou a interlocução entre setores distintos

responsáveis respectivamente pela vigilância dos agravos, a Coordenação de Vigilância em

Saúde (COVIG), e pela supervisão técnica, treinamento e formulação das estratégias de

enfrentamento às violências, Departamento de Supervisão Técnico-Metodológica

(DESUM) no âmbito da Fundação Municipal de Saúde de Niterói (FMSN). Assim, foi

possível identificar os entraves e as potencialidades da vigilância às violências no

município, e, com base na discussão e pactuação, estabelecer um plano de intervenção. A

constituição de uma equipe de pesquisa com participação de professor, estudantes e

técnicos do serviço promoveu a interlocução, discussão e tomada de decisões. O

desenvolvimento do estudo em conjunto com os profissionais de saúde, permitiu contatos,

reuniões e discussões acerca do tema, que anteriormente ao início da pesquisa, eram raros.

Metodologia

Pesquisa estratégica e avaliativa articulada à Fundação Municipal de Saúde de

Niterói (FMSN) por meio da Coordenação de Vigilância em Saúde (COVIG), do

Departamento de Supervisão Técnica Metodológica (DESUM) e do Núcleo de Educação

Permanente e Pesquisa do Programa Médico de Família (NEPP/PMF), vinculados à Vice-

presidência de Atenção Coletiva Ambulatorial e da Família (VIPACAF). Foram utilizados

procedimentos e técnicas de pesquisas qualitativas (entrevistas, grupos de discussão,

observação direta e análise documental) e quantitativas (análise de banco de dados). O

processo avaliativo foi norteado pela construção do modelo lógico da vigilância às

violências em Niterói e do fluxo da atenção às pessoas em situação de violência no

município. Foi priorizada a avaliação da implantação da Ficha de Notificação/Investigação

de Violência Doméstica Sexual e/ou Outras Violências.

Foi realizada a análise dos registros de notificações de Violência Doméstica, Sexual

e/ou Outras violências (atualmente Violência Interpessoal/Autoprovocada) do Sistema de

Informação de Agravos de Notificação (Sinan) localizado na COVIG, a análise de

relatórios da COVIG e do DESUM, observação direta com registro em diário de campo,

reuniões e discussões em grupo, bem como entrevistas individuais com a Coordenação de

Vigilância em Saúde (COVIG) e com a responsável pela supervisão das unidades nas

ações de enfrentamento às violências no DESUM. Foi utilizado roteiro semiestruturado, as

entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas, tendo sido assinado o TCLE

(Termo de Consentimento Livre e Esclarecido).

A identificação das dificuldades na implantação da vigilância às violências e a

proposição de estratégias alternativas visando à superação dos empecilhos, ocorreram ao

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longo do estudo. As análises, evidências e observações dos pesquisadores foram discutidas

com os técnicos e profissionais de saúde em reuniões conjuntas. As atividades

desenvolvidas em cada etapa, pelos estudantes e pesquisadores envolvidos no estudo,

foram acordadas em reuniões com os técnicos da COVIG e do DESUM responsáveis pelas

atividades relacionadas às ações de vigilância às violências na FMSN.

Com base nas informações obtidas com as entrevistas, análise documental,

observações de campo, discussões e reuniões de equipe, foi descrito o processo de

identificação, registro e fluxo das notificações e da atenção às pessoas em situação de

violência no município, e elaborado o Modelo Lógico de Vigilância às Violências em

Niterói, baseado no modelo proposto pelo CDC (Centers of Disease Control)

(BRASIL,2007). A partir do Modelo Lógico de Vigilância às Violências, foi elaborado o

plano de avaliação ou modelo teórico de avaliação para a implantação da Vigilância às

Violências em Niterói. Neste estudo denominou-se plano de avaliação ou modelo teórico

de avaliação às ferramentas utilizadas para sistematizar os passos da avaliação e

caracterizar o tipo de avaliação a ser realizada (Brasil, 2007). A partir da discussão do

plano de avaliação, a equipe de pesquisa, com integrantes da universidade e da FMSN

definiu como primeiro componente a ser avaliado, a implantação da Ficha de

Notificação/Investigação de Violência Doméstica Sexual e/ou Outras Violências, em

seguida, avaliar as ações decorrentes da notificação nas unidades de saúde (no setor saúde);

e por último, avaliar as ações decorrentes da notificação na rede de proteção às pessoas em

situação ou risco de violência (Conselho Tutelar, Conselho de Direitos da Mulher /

CODIM, Promotoria do Idoso, e Núcleo de Atenção Especializada à Criança e ao

Adolescente /NAECA).

Em seguida foram então pactuadas, as perguntas avaliativas que definiram os

elementos do sistema de vigilância monitorados. Tendo em vista que a implantação das

estratégias de vigilância às violências constitui um processo, e que, no contexto do VIVA,

a primeira etapa deste processo consiste na implantação da Ficha de

Notificação/Investigação de Violência Doméstica, Sexual e/ou Outras Violências (FNV),

foi acordado com a equipe da COVIG e do DESUM o propósito de avaliar a implantação

da FNV no município de Niterói. A partir da pergunta avaliativa “1) Qual o grau de

implantação da ficha de notificação às violências em Niterói?”; foi definido o Plano de

Avaliação e as seguintes perguntas decorrentes a serem respondidas: “2) A notificação de

violência está atendendo a meta do Ministério da Saúde?”; “3) A quantidade de unidades

notificadoras está adequada?”; “4) A notificação de violência é sistemática?”; “5) Quantas

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e quais unidades vem notificando violências?”; “6) A qualidade de preenchimento das

notificações é satisfatória?”; “7) A divisão de atribuições e articulação entre DESUM e

COVIG está funcionando?”; “8) A qualidade das informações do banco de notificações de

violências é satisfatória?”; 9) “O relatório é informativo?”; “10) Para cada uma das

perguntas acima: o que pode ser feito para melhorar?”.

A etapa de julgamento do mérito no processo avaliativo de implantação da

vigilância às violências, nos meses finais da pesquisa, se deu no contexto de transição do

poder executivo municipal com a mudança do Prefeito, do Presidente da Fundação

Municipal de Saúde e Secretário Municipal de Saúde e demais cargos de confiança na

FMSN. Essa transição configurou também a mudança do partido político à frente da

administração da cidade acarretando em uma ampla mudança que se estendeu às direções

das unidades de saúde, chefias de vigilância epidemiológica, entre outros. Optou-se então

por enviar um questionário por meio eletrônico para os profissionais de saúde treinados

para realização de ações de vigilância de violências. E, no segundo semestre de 2014, foi

realizada uma oficina com gestores e profissionais das unidades de saúde para

apresentação dos resultados e sensibilização quanto a importância da notificação e

vigilância das situações violência doméstica, sexual e outras violências interpessoais.

Resultados e discussão

Para entender como funciona a vigilância às violências no município, é preciso

primeiramente se conhecer o fluxo da notificação de violência interpessoal/autoprovocada,

bem como o fluxo de atendimento às vítimas (Figura 1). O fluxo da vigilância

epidemiológica da violência tem início com a notificação do caso suspeito ou confirmado

de violência. A Notificação é a comunicação da ocorrência de determinada doença ou

agravo à saúde, feita à autoridade sanitária por profissionais de saúde ou qualquer cidadão,

para fins de adoção de medidas de intervenção pertinentes (Brasil, 2009). Historicamente,

a notificação compulsória tem sido a principal fonte da vigilância epidemiológica, a partir

da qual, na maioria das vezes, se desencadeia o processo informação-decisão-ação. A

listagem das doenças de notificação nacional é estabelecida pelo Ministério da Saúde entre

as consideradas de maior relevância sanitária para o país. E a partir da publicação da

Portaria 104/201, pelo Ministério da Saúde, a violência é considerada um agravo de

notificação compulsória.

No município de Niterói, essa notificação deverá ser preenchida em três vias sendo

que uma fica na unidade de Saúde onde o caso foi notificado, uma via vai para a COVIG e

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uma via vai para os órgãos de defesa dos direitos seja da criança e do adolescente, da

mulher ou do idoso.

Na unidade de saúde notificadora a vítima recebe o primeiro atendimento de saúde.

No caso de ser uma vítima de violência sexual é protocolado um fluxo de atendimento para

profilaxia de agravos decorrentes dessa violência, e a notificação deve ser realizada em até

24hs.

Caso haja necessidade, dependendo do grau de violência sofrido, a vítima é

internada em rede hospitalar para receber os devidos cuidados. Se após o atendimento

inicial não houver necessidade de internação, a vítima recebe alta referenciada para a

unidade de saúde que a acompanha, seja ela uma Unidade Básica de Saúde, um módulo do

Programa Médico de Família ou uma Policlínica. É preconizado que na esfera da saúde,

essa vítima seja acompanhada na rede de atenção básica.

Da unidade de saúde notificadora uma via da FNV vai para a COVIG onde é

centralizada a informação, ou seja, as informações são inseridas no SINAN. Após essa

etapa a COVIG semanalmente envia lotes de informações para o nível estadual, para a

Secretaria Estadual de Saúde e esta envia lotes quinzenalmente para o Ministério da Saúde.

Os órgãos de direito pactuados para acompanhamento dos casos de violência são o

Conselho Tutelar nos casos de violência contra crianças e adolescentes, a Coordenação dos

Direitos das Mulheres (CODIM) nos casos de violência contra a mulher e a Promotoria do

Idoso nos casos de violência contra o idoso.

Por fim, o Núcleo de Atenção Especial à Criança e Adolescente (NAECA) constitui

uma unidade da esfera de atenção secundária da FMSN para onde são encaminhadas as

vítimas de violência doméstica e sexual para atendimento e acompanhamento por

profissionais especializados. Criado para atenção às crianças e adolescentes vítimas de

violência, posteriormente o NAECA passou a atender também mulheres e outros adultos

vítimas de violência.

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Fonte: COVIG e DESUM, 2013.

Figura 1: Fluxograma da Estratégia de Vigilância às Violências em Niterói

O monitoramento da implantação da FNV no município de Niterói se deu por meio

da análise exploratória de abordagem quantitativa da base de dados Dbf do sistema de

informação VIVA/Sinan-Net, localizada na COVIG/FMSN, por meio dos programas

Tabwin e Excel, para os anos de 2010 a 2012.

Nos anos de 2010, 2011, 2012 e 2013, 38 unidades de saúde realizaram ao menos

uma notificação de caso de violência nesses anos. Do total de notificações, 84% foram

provenientes de emergências hospitalares.

Proporção de notificações de Violência Doméstica, Sexual, e/ou Outras Violências por

tipo de unidade de saúde notificadora, em Niterói, em 2010, 2011 e 2012. (N=890)

Unidade 2010 2011 2012 2013 Total

Hosp. G. V. F. 118 105 36 39 298

Hosp. Est. A. L. 117 105 132 139 493

Hosp. Univ. A. P. 41 42 46 51 180

Hosp. Mun. C. T. 0 4 1 4 9

Outros 47 45 52 43 187

Total 323 301 266 276 1166

Figura 1- Fluxograma da notificação e atendimento às vítimas de violência interpessoal/autoprovocada no

município de Niterói-RJ.

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Proporção de notificações de violência, por unidade notificadora, Niterói, 2010, 2011, 2012 e

2013 (n=1166)

A partir das notificações extraídas do SINAN, foi elaborado um informe de

vigilância às violências no município, com a análise destas informações. Neste informe,

foram consolidadas as informações referentes aos anos de 2010 a 2012. Desse modo,

foram identificados os tipos de violência mais notificados no município, em que faixa

etária e sexo. Também foram identificadas as principais unidades notificadoras. Além

disso foi elaborado um diagrama com o fluxo das informações e da atenção às pessoas em

situação de violência no município.

A análise das informações evidenciou que a maioria das notificações dos casos

suspeitos e confirmados de violência, eram oriundas das emergências, e após a notificação,

não se estabelecia nenhum contato com a vítima, os agressores e os familiares envolvidos

na situação. Desta forma, a equipe de técnicos e pesquisadores, reconheceu que a

vigilância de violências no município se restringia ao registro das notificações, sem que

nenhuma ação dirigida às vítimas e de combate a violência fosse deflagrada a partir da

notificação. Além disso, havia fragilidade intersetorial, o que dificultava a interação das

ações de vigilância.

Em 2010 e 2011 o Departamento de Supervisão Técnico-Metodológica (DESUM)

realizou dois treinamentos com profissionais dos hospitais públicos com emergência, das

Policlínicas Comunitárias de Saúde, Unidades Básicas de Saúde (UBS) e supervisores do

Programa Médico de Família, entre outros, para o Preenchimento da Ficha de Notificação

de Violência Interpessoal/Autoprovocada (versão antiga), (em 07/05/2010, em 09/07/2010,

HGVF

26%

HEAL

42%

HUAP

15%

HMCT

1% Outros

16%

HGVF

HEAL

HUAP

HMCT

Outros

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em 10/12/2010, ou em 13/12/2010); e para implantação da Rede de Atenção à Saúde das

Vítimas e Violência Doméstica e/ou Sexual no município de Niterói: o papel de cada um

(em 26/07/2011 ou em 28/07/2011).

Após a constatação do número tão reduzido de notificações provenientes de

unidades de saúde da esfera da atenção primária ou básica, optou-se por realizar uma

atividade avaliativa exploratória por meio de correio eletrônico, a fim de captar a

percepção dos profissionais treinados a respeito da violência intrafamiliar, das estratégias

de vigilância às violências no município, e obter elementos para uma avaliação preliminar

dos treinamentos realizados. Foi elaborado um questionário com dez itens, sendo sete

perguntas fechadas e três perguntas abertas, enviado, por meio eletrônico (e-mail), para

114 profissionais de saúde submetidos aos treinamentos do DESUM, juntamente com o

“Informe sobre Violências”. Quinze profissionais (13,2%) enviaram as respostas para o e-

mail institucional [email protected]. Apesar da pequena quantidade, o retorno

contribuiu bastante para que se conhecessem as demandas dos profissionais de saúde em

relação à vigilância de violências. As categorias profissionais que responderam o

questionário se distribuem de forma equilibrada entre médicos (n=4), enfermeiros (n=4),

psicólogos (n=4) e assistentes sociais (n=3). Estas categorias são as que comumente

assistem às vítimas e realizam as notificações de violência.

Quatorze profissionais responderam a primeira pergunta do questionário “Sua visão

a respeito da violência doméstica, sexual e outras violências, mudou a partir do

treinamento? Se sim, como e por quê?”. Destes, oito profissionais responderam

afirmativamente (57,1%), cinco responderam que não (35,7%), e um assinalou o item “não

sei dizer” (7,1%).

Os profissionais mencionaram terem ampliado a visão sobre o que constitui

violência (não apenas violência física e sexual), as possíveis vítimas (não apenas crianças e

mulheres); o papel do profissional de saúde no atendimento às vítimas de violência, a

importância da identificação e notificação da violência bem como o conhecimento do fluxo

do atendimento e da notificação.

Porque a partir do treinamento passamos a perceber que não só as mulheres e

crianças são vítimas da violência doméstica, mas também os homens. Também

porque foram abordadas outras formas de violência, não só a sexual ou agressão

(P2).

Ampliou minha visão quanto ao papel do profissional de saúde, no atendimento

às vítimas de violência. Atendimento, que muitas vezes não acontece por alguns

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obstáculos, como medo por parte do profissional, entendimento de que a vítima

deva passar primeiro pela delegacia ou fazer exame no IML. Acredito que por

desinformação, muitos profissionais adiam o atendimento, que é tão importante,

para um quadro de tanta fragilidade e sofrimento (P5).

Entre os respondentes, desde o treinamento, onze (73%) atenderam pessoas em

situação de violência doméstica, sexual ou outras violências; destes, dez consideram que o

treinamento os ajudou na realização do atendimento. Dez (66,7%) respondentes já

notificaram uma situação de violência doméstica, sexual ou outras violências. Segundo os

respondentes, a capacitação contribuiu muito para oito profissionais na realização da

notificação de situações de violência, médio para cinco profissionais e não teve nenhuma

contribuição para dois profissionais. Na orientação da pessoa em situação de violência, oito

profissionais consideram que a capacitação contribuiu muito, seis acham que essa

contribuição foi média e para um deles a capacitação não teve nenhuma contribuição para a

orientação de pessoas em situação de violência. Com relação ao encaminhamento da

pessoa em situação de violência, a capacitação contribuiu muito para seis profissionais,

médio para cinco, pouco para dois e para um profissional a capacitação não teve nenhuma

contribuição na orientação de pessoa em situação de violência.

Com relação à pergunta aberta “Na sua opinião, quais as principais dificuldades no

atendimento às pessoas em situação de violência?”, as respostas foram reunidas segundo

às seguintes macro categorias: menção à Rede Intersetorial de atenção às pessoas em

situação de violência interpessoal; questões relativas aos profissionais de saúde/recursos

humanos; Infraestrutura; e Usuários. O quadro abaixo apresenta a consolidação das

respostas segundo essas categorias empíricas/operacionais.

Categorias

operacionais

Principais dificuldades no atendimento às pessoas em situação de violência na visão de

profissionais de saúde que responderam ao questionário (n=15)

Rede intersetorial Rede intersetorial: grande dificuldade de articulação entre os serviços. A resposta

institucional para o caso de violência doméstica

Profissional

Profissional: grande rotatividade de profissional devido a precarização do vínculo

empregatício; dificuldade em abordar o caso, falta de conhecimento técnico, aos

protocolos, dificuldade no acolhimento por ser uma situação de carater subjetivo, baixa

adesão aos treinamentos, falta de informação sobre o que realmente acontece com as

notificações. Precisam de algum retorno para incentivar o trabalho, medo de notificar.

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Infra-estrutura Infraestrutura: pouca privacidade para atender esse tipo de caso, ficha cansativa,

invasiva e pouco otimizada

usuário

Usuário: procura tardia do serviço impede determinados encaminhamentos, não dar

prosseguimento ao tratamento por medo do agressor, resistência em levar o caso às

autoridades. O temor da vítima com o encaminhamento e fechamento do caso, os

possíveis desdobramentos da situação em que se encontra a vítima. O medo de

expressar o fato ocorrido, vergonha e medo de vingança.

Os profissionais emitiram comentários e sugestões com relação à vigilância às violências

em Niterói, apresentadas no quadro a seguir:

Sugestões com relação à vigilância às violências em Niterói

Investimento na qualificação (treinamentos) do profissional, gerando assim a qualificação dos

dados e informações. Necessidade de eventos, seminários que abordem assistência às Vítimas

de Violência doméstica. Reuniões semestrais para troca de experiências.

Divulgação das políticas públicas

Feedback. Produção de conhecimento em cima dos dados coletados e devolução aos

profissionais em eventos anuais. Sugestão de criar uma equipe que se responsabilize por isso.

Falta de serviço de saúde mental para acompanhamento integral do usuário, incluindo um

apoio às vítimas que não possuem apoio de seu círculo social.

Ação intersetorial junto às escolas e comunidades. Maior interação com os conselhos e

autoridades

Apesar do reduzido número de profissionais que responderam ao questionário, o

conteúdo das respostas se mostrou consistente e bastante significativo, as dificuldades e

sugestões apontadas estão em consonância com a avaliação de pesquisadores experts no

tema. Pode-se concluir que para os profissionais respondentes, o treinamento foi útil e

adequado, sendo necessário realizar novos treinamentos, dando continuidade ao debate

acerca da vigilância às violências entre os profissionais de saúde. Como estratégia para

sensibilizar os profissionais da esfera da atenção primária para as estratégias de vigilância

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às violências, decidiu-se então realizar oficinas com estes profissionais, a fim de apresentar

as informações e discutir o enfrentamento às situações de violência no âmbito da sua

atuação (nas localidades, próximos às residências e cotidianos dos usuários dos serviços).

No segundo semestre de 2014, foram realizadas três oficinas por regionais de saúde

(Região Oceânica, Centro-Sul e Região Norte) para apresentação da análise das

notificações de violência em Niterói e sensibilização dos gestores e profissionais de saúde

envolvidos com a vigilância (diretores de unidades de saúde, chefias de vigilância

epidemiológica, supervisores de saúde coletiva do Programa Médico de Família, entre

outros), destacando a importância da notificação das situações violência

interpessoal/autoprovocada. Nessa ocasião foram discutidas as dificuldades da vigilância

às violências com vistas a construção de proposições visando a superação das fragilidades

identificadas no decorrer do estudo relativas às estratégias de vigilância às violências em

Niterói. A dificuldade para preenchimento da ficha de notificação, a falta de segurança e

apoio aos profissionais, escassez de recursos humanos e a falta de integração intersetorial

foram apontadas pelos profissionais como tais fragilidades. Na organização e realização

das oficinas participaram além de técnicos da COVIG e do DESUM, dois psicólogos do

NAECA, que desde então, passaram a acompanhar e participar da condução e

encaminhamento das estratégias de vigilância às violências no município.

Como desdobramento das oficinas foi realizada uma reunião juntamente com a

Coordenação do PMF (Programa Médico de Família) e chefias das unidades de saúde. A

técnica do DESUM apresentou a proposta de um sistema de contrafluxo, em que os casos

notificados nas emergências, seriam encaminhados às suas respectivas equipes de saúde da

família de suas áreas, e assim os profissionais das equipes tomariam conhecimento de que

aquela família está vulnerável, dando assim maior atenção. A ideia seria fazer uma visita

domiciliar rotineira para contatar a vítima. Desta forma, aquela família, mulher, criança, ou

quem quer que fosse, passaria a ser acompanhada na esfera da atenção primária. Presente

na reunião, a Diretora da Policlínica Comunitária de Saúde da Engenhoca, na Região

Norte, colocou a unidade a disposição para receber e encaminhar as fichas e realizar o

acompanhamento dos casos, com apoio do NAECA. Assim, no final de 2015 teve início o

projeto piloto de vigilância às violências na regional norte da Engenhoca. Passaram a ser

realizadas reuniões mensais, inicialmente apenas com os profissionais de saúde da família

da região, da policlínica regional, da COVIG, do DESUM e do NAECA, para distribuição

das notificações de violência do território de abrangência das respectivas unidades,

discussão dos casos e tomada de decisão quanto aos encaminhamentos a serem feitos.

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Posteriormente técnicos das secretarias de educação e ação social, professores e

conselheiros tutelares também foram chamados e passaram a participar das reuniões e da

vigilância às situações notificadas, trazendo novas informações e às vezes novos casos.

A Policlínica Comunitária de Saúde do Fonseca, também na região norte, foi a

segunda a ser incorporada ao chamado projeto piloto de investigação e vigilância às

violências. E, em meados de 2015, a Policlínica Comunitária de Saúde de Itaipu foi

também incorporada ao projeto. Sempre com a participação de agentes comunitários de

saúde, psicólogos, assistentes sociais das policlínicas; conselheiros tutelares, professores da

secretaria de educação e assistentes sociais dos centros de referência de assistência social.

Na região oceânica, participam das reuniões profissionais da saúde mental, dos Centros de

Atenção Psicossocial, e técnicos do ministério público que atuam na defesa de direitos das

crianças e adolescentes.

Conclusão

Este trabalho propiciou a constatação de que a vigilância contínua às violências

constitui um processo em construção no qual se encontram diferentes lógicas, uma de

controle e combate às doenças, derivada da vigilância epidemiológica tradicional e

historicamente constituída no âmbito da saúde, e outra relacionada ao campo da promoção

da saúde, concernente ao papel dos profissionais de saúde no enfrentamento da violência,

que busca compreender os fenômenos em sua complexidade histórica e social, com

atuação interdisciplinar e intersetorial. O uso de um instrumento conhecido pelos

profissionais de saúde, aceito e reconhecido como próprio dos serviços de saúde, tem

propiciado a superação da resistência em atuar nas situações de violência e possibilitado a

articulação de uma rede intersetorial de promoção da saúde e atuação nas situações de

violência.

A realização de oficinas para sensibilizar os profissionais de saúde para as

estratégias de vigilância às violências, melhorar a qualidade de preenchimento da FNV e

aumentar o número de notificações especialmente nas unidades de saúde da esfera de

atenção primária; a análise sistemática das informações registradas na FNV, e o

acompanhamento dos episódios de violência notificados pela esfera local de forma

intersetorial, com participação de profissionais e técnicos da atenção básica, da educação,

da assistência social, bem como representantes dos conselhos tutelares, ministério público

e ONGs com atuação na defesa dos direitos de crianças e adolescentes, constitui um

resultado importante do estudo. Essa experiência esta em curso, como projeto piloto de

vigilância às violências, no município de Niterói, tendo se iniciado em dezembro de 2014,

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na área de adscrição da Policlínica Comunitária da Engenhoca, se estendendo em 2015

para as áreas de adscrição da Policlínica Comunitária do Fonseca e para a Policlínica

Comunitária de Itaipu.

Conclui-se ser necessário implementar pesquisas operacionais articulando

pesquisadores e estudantes de instituições de pesquisa e formadoras de recursos humanos

na área da saúde, com técnicos e profissionais de saúde das secretarias municipais e

estadual de saúde, com o propósito de fomentar a efetivação das estratégias de vigilância

às violências interpessoais e autoprovocadas, bem como favorecer a construção das redes

intersetoriais de enfrentamento e prevenção da violência e promoção da saúde e da paz.

Agradecimento

À Coordenação de Vigilância em Saúde e aos técnicos do Departamento de

Supervisão Técnica Metodológica da Fundação Municipal de Saúde de Niterói, pelo apoio

e atuação conjunta no presente estudo, em especial à Drª Ana Lucia Eppinghaus

(Coordenadora da COVIG), à Drª Suely Cotta (DESUM), à sanitarista Jacqueline Ramos

de Almeida (Chefe de Informação da COVIG), à residente Mariana Ramos Guimarães

(UFF) e à estudante de graduação em saúde coletiva Larissa Santos de Oliveira

(IESC/UFRJ).

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