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VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS E FÍSICAS Bianca Pires dos Santos (1) Munique Therense Costa de Morais Pontes (2) INTRODUÇÃO: O parto e o nascimento de um filho são momentos marcantes na vida dos familiares, principalmente para a mãe. Todavia, o parto passou a ser uma experiência traumática na vida das mulheres que perdem sua autonomia, sendo agredidas de diversas maneiras por aqueles que prestam sua assistência. Sendo assim, define-se o termo Violência Obstétrica 1 como qualquer ato ou omissão por profissional de saúde, seja direta ou indiretamente, que leva à apropriação indevida dos processos corporais e reprodutivos das mulheres, expressando-se em tratamento desumano e contribuindo negativamente na qualidade de vida das mulheres que perdem a capacidade de decidir sobre seu próprio corpo. Segundo o Dossiê da Violência Obstétrica “Parirás com dor” 2 , a violência contra a mulher constitui um grave problema de saúde pública. Pode ser considerada como física, sexual, e psicológica. Entre as condutas identificadas como violência, o Dossiê pontua a episiotomia, procedimentos invasivos e danosos à mulher em trabalho de parto e parto, falta de esclarecimento e consentimento da paciente, manobra de Kristeller, omissão de informações, ameaças, preconceito, entre outros. Alguns procedimentos invasivos, tais como cesárea de emergência, indução do parto e nascimento vaginal instrumental são percebidos pelas mulheres como trauma e estão associados ao aparecimento de transtorno de estresse pós- traumático 3 . OBJETIVO: Identificar possíveis consequências de saúde em mulheres relacionadas à assistência no parto. MÉTODO: Trata-se de um estudo do tipo revisão integrativa da literatura, realizado no mês de abril de 2016, utilizando-se artigos publicados nas bases de dados eletrônicos LILACS e BDENF - Enfermagem, por meio da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Os descritores usados foram parto, violência e episiotomia. Os critérios de inclusão foram: artigos publicados nos últimos cinco anos (2012 a 2016), em idiomas português e inglês sobre o tema referido. Foram excluídos artigos que não estivessem disponíveis para leitura completa online. Por se tratar de uma pesquisa bibliográfica não foi necessário aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa. RESULTADOS: Após filtragem conforme critérios de inclusão foram encontrados 133 pesquisas, porém mediante leitura do título e do resumo e posteriormente leitura completa selecionaram-se para análise do estudo 5 artigos. Os resultados foram divididos em duas categorias: Consequências psicológicas e físicas. DISCUSSÃO: Entre as condições desrespeitosas e/ou consideradas como violência durante o ciclo gravídico puerperal foi revelado que a peregrinação das parturientes trouxe repercussões psicológicas, que durante o percurso a vários serviços de saúde até conseguir uma vaga, vivenciaram inúmeros sentimentos negativos, como medo, raiva, estresse, angústia, dentre outros. Tais sentimentos afetaram diretamente a fisiologia do parto, pois em situações de estresse o organismo libera adrenalina e inibe o hormônio ocitocina que tem ação na contratilidade, dilatação e apagamento do colo uterino. Por sua vez, a diminuição desse hormônio faz com que a mulher sinta mais dor durante o processo parturitivo, favorecendo para uma experiência menos prazerosa e tranquila. A peregrinação em busca de vaga é uma das principais causas de mortalidade materna, além de contrariar a norma de RDC 36 de 2008 da ANVISA que afirma que o serviço de saúde deve assegurar na recepção à mulher a sua transferência se necessário, em transporte adequado após ter conhecimento da existência de vaga no serviço de referência 2 . Evidenciou-se em um estudo que a presença de transtornos de Adaptação (TA) estava relacionada a fatores biológicos, obstétricos, sociais e psicológicos. O

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VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS E FÍSICAS

Bianca Pires dos Santos (1)

Munique Therense Costa de Morais Pontes (2)

INTRODUÇÃO: O parto e o nascimento de um filho são momentos marcantes na vida dos

familiares, principalmente para a mãe. Todavia, o parto passou a ser uma experiência

traumática na vida das mulheres que perdem sua autonomia, sendo agredidas de diversas

maneiras por aqueles que prestam sua assistência. Sendo assim, define-se o termo Violência

Obstétrica1 como qualquer ato ou omissão por profissional de saúde, seja direta ou

indiretamente, que leva à apropriação indevida dos processos corporais e reprodutivos das

mulheres, expressando-se em tratamento desumano e contribuindo negativamente na

qualidade de vida das mulheres que perdem a capacidade de decidir sobre seu próprio corpo.

Segundo o Dossiê da Violência Obstétrica “Parirás com dor” 2

, a violência contra a mulher

constitui um grave problema de saúde pública. Pode ser considerada como física, sexual, e

psicológica. Entre as condutas identificadas como violência, o Dossiê pontua a episiotomia,

procedimentos invasivos e danosos à mulher em trabalho de parto e parto, falta de

esclarecimento e consentimento da paciente, manobra de Kristeller, omissão de informações,

ameaças, preconceito, entre outros. Alguns procedimentos invasivos, tais como cesárea de

emergência, indução do parto e nascimento vaginal instrumental são percebidos pelas

mulheres como trauma e estão associados ao aparecimento de transtorno de estresse pós-

traumático3. OBJETIVO: Identificar possíveis consequências de saúde em mulheres

relacionadas à assistência no parto. MÉTODO: Trata-se de um estudo do tipo revisão

integrativa da literatura, realizado no mês de abril de 2016, utilizando-se artigos publicados

nas bases de dados eletrônicos LILACS e BDENF - Enfermagem, por meio da Biblioteca

Virtual de Saúde (BVS). Os descritores usados foram parto, violência e episiotomia. Os

critérios de inclusão foram: artigos publicados nos últimos cinco anos (2012 a 2016), em

idiomas português e inglês sobre o tema referido. Foram excluídos artigos que não estivessem

disponíveis para leitura completa online. Por se tratar de uma pesquisa bibliográfica não foi

necessário aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa. RESULTADOS: Após filtragem

conforme critérios de inclusão foram encontrados 133 pesquisas, porém mediante leitura do

título e do resumo e posteriormente leitura completa selecionaram-se para análise do estudo 5

artigos. Os resultados foram divididos em duas categorias: Consequências psicológicas e

físicas. DISCUSSÃO: Entre as condições desrespeitosas e/ou consideradas como violência

durante o ciclo gravídico puerperal foi revelado que a peregrinação das parturientes trouxe

repercussões psicológicas, que durante o percurso a vários serviços de saúde até conseguir

uma vaga, vivenciaram inúmeros sentimentos negativos, como medo, raiva, estresse, angústia,

dentre outros. Tais sentimentos afetaram diretamente a fisiologia do parto, pois em situações

de estresse o organismo libera adrenalina e inibe o hormônio ocitocina que tem ação na

contratilidade, dilatação e apagamento do colo uterino. Por sua vez, a diminuição desse

hormônio faz com que a mulher sinta mais dor durante o processo parturitivo, favorecendo

para uma experiência menos prazerosa e tranquila. A peregrinação em busca de vaga é uma

das principais causas de mortalidade materna, além de contrariar a norma de RDC 36 de 2008

da ANVISA que afirma que o serviço de saúde deve assegurar na recepção à mulher a sua

transferência se necessário, em transporte adequado após ter conhecimento da existência de

vaga no serviço de referência 2

. Evidenciou-se em um estudo que a presença de transtornos de

Adaptação (TA) estava relacionada a fatores biológicos, obstétricos, sociais e psicológicos. O

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tipo de parto, em sua grande maioria cesáreo e a não presença do acompanhante durante o

parto contribuíram para possíveis sinais de TA. Os transtornos de adaptação podem se

manifestar entre 90 a 180 dias após o evento estressante, ou seja, o parto traumático,

caracterizados pelo desenvolvimento de sintomas emocionais, levando ao aparecimento de

depressão e ansiedade, os quais trazem repercussões negativas na saúde materno-neonatal,

pois interferem no vínculo e no cuidado com o bebê, na amamentação, dentre outros 4

. Outro

ponto de relevância são as cesáreas indesejadas. Quando a mulher deseja um parto vaginal

sem intervenções e este é substituído em último momento, sentimentos de decepção e fracasso

podem aflorar nas parturientes. Referente à categoria de consequências físicas relacionadas a

procedimentos desnecessários durante o parto, observou-se que as mulheres relataram medo

de alterações em sua genitália e de interferência na relação sexual devido à episiotomia. Além

de ter sua integridade perineal alterada, a mulher pode perder o prazer sexual, pois acarreta

em dispareunia. A cicatrização da episiotomia deve ser acompanhada já que algumas

mulheres referiram alteração na cicatrização e mesmo seis meses após o parto normal

relataram dor perineal e alterações na sensibilidade e na coloração da pele na região do

períneo bem como deiscência parcial. Ciello2 comenta que a episiotomia é um procedimento

realizado por meio de um corte na abertura da vagina, afeta diversas estruturas perineais como

vasos, músculos e tendões, e está relacionada ao agravamento de incontinência urinária e

fecal. O fato de se ter a ideia de que o corte acelera a saída do bebê, coloca a mulher em

posição de leiga sobre a capacidade do seu corpo e, portanto, aceite a intervenção, como

evidenciado por relatos das parturientes. CONCLUSÃO: Diante da análise e compreensão

acerca das publicações, observou-se que a mulher passou a ter seu corpo visto como máquina,

onde o profissional de saúde detém o poder de decisão sobre ele, omitindo informações,

negligenciando direitos simples que a mulher possui no processo de parir, sendo impedidas a

ter a presença de acompanhante, de expressar suas preferências, e por fim, submetidas a

procedimentos desnecessários e cientificamente prejudiciais. Tudo isso gera consequências

físicas e psicológicas como explanadas no estudo. Traumas estes que podem acompanhar por

muito tempo a vida da mulher e podem interferir negativamente na sua saúde. Portanto, o

cenário do parto no mundo e no Brasil, deve ser mudado, orientado pelas diretrizes de

humanização, pautado no respeito e dignidade para com a grande protagonista, a mulher. A

enfermagem tem papel fundamental na consolidação de mudanças à saúde obstétrica, pois lida

diretamente com o cuidado do paciente. Faz-se necessário a discussão e reflexão do tema

abordado para que haja cada vez mais a visibilidade de práticas violentas durante todo o

processo parturitivo e as reais consequências geradas. Descritores: Parto; violência;

episiotomia. REFERÊNCIAS: 1. Tesser, C.D.; knobel, R.; Andrezzo, H.F.A.; Diniz, S.G.

Violência obstétrica e prevenção quaternária: o que é e o que fazer. Rev Bras Med Fam

Comunidade. v. 10, n. 35, p.1-12 2015. 2. Ciello, C. et al. Violência obstétrica - “Parirás com

dor”. Dossiê elaborado pela Rede Parto do Princípio para a CPMI da violência contra as

mulheres. 2012. 188 p. 3. Bastos, M.H.; McCourt, C. Morbidity during the Postnatal Period:

Impact on Womem and Society In: Byrom, S.; Edwards, G.; Bick, D. Essential Midwifery

Practice: Postnatal Care. London: Wiley-Blackwell; p. 126-31. 2010. 4. Neves, M.A. Transtorno

de Adaptação no pós-operatório de crianças e adolescentes. [ Dissertação de mestrado ]. Belo

Horizonte: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais; 2007.

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1 Acadêmica do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade do Estado do Amazonas. Email: [email protected] 2 Psicóloga, Mestre; Especialista em Psicologia Clínica Fenomenológico-Existencial; Docente da Universidade do Estado do Amazonas –

UEA. Email: [email protected]