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Volume 1 - Número 1 • Jan/Abr 2010arquivos.cruzeirodosuleducacional.edu.br/principal/new/revista_scien… · do conhecimento científico. Esse ambiente é atualizado a cada quatro

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Volume 1 - Número 1 • Jan/Abr 2010Sumário/Contents

EDITORIAL ............................................................................................................................................................................................................................... 4

RELATO DE PESQUISA

Complexidade nos processos inclusivos:a relação dialógica entre educação e saúdeComplexity in inclusive processes:the dialogic relationship between education and healthRoberta Galasso ................................................................................................................................................................................................................5-17

A difícil decisão do ser: a possibilidade de se constituir pela via do sintomaThe hard decision of being: the possibility of built yourself from the symptom wayRosemary Jimenez Ventura dos Santos ..................................................................................................................................................................... 18-24

Dificuldades motoras na infância: prevalência e relações com as condições sociais e econômicasMotor dificulty in infancy: prevalence and relations with social and economical conditionsRodrigo Teixeira, Roberto Gimenez, Dalton Lustosa de Oliveira, Luiz Eduardo Pinto Bastos Tourinho Dantas .................................. 25-34

O custo social e o controle de resíduos sólidos urbanosThe social cost and control of urbane solid wastesMariano Yoshitake, Moacyr C. Costa Júnior, Marinette Santana Fraga ............................................................................................................. 35-45

Controle de gestão por plano-sequência em hospital maternidadeManagement control by sequence-plan for maternity hospitalMariano Yoshitake, Adelmo Fernando Ribeiro Schindler Jr., Wagner Pagliato ................................................................................................ 46-54

Pensando em princípios para uma docência transdisciplinarThinking about principles for a transdisciplinary docencyRosamaria de Medeiros Arnt ....................................................................................................................................................................................... 55-64

Avaliação da durabilidade das restaurações e selantes realizados na filosofia art (Atraumatic Restorative Treatment)Evaluation restorations and sealants using the atraumatic restorative treatment philosophy

Carolina Mariano Bonzanini, Gerson Lopes, Dalva Cruz Laganá, Claudio Fróes de Freitas, Elaine Quedas de Assis ............................ 65-70

Vivenciando a graduação em enfermagem após formação em medicina: um olhar comparativo sobre as duas formaçõesFormation in nursing in a private universityLucélia Santos Oliveira, Adriano A. Bezerra Chaves .................................................................................................................................................71-6

Comparação de custos para o tratamento das lesões precursoras do câncer de colo do útero no serviço público de saúdeComparision of costs to treat cervical câncer precursors lesions at public health serviceAna Claudia Guedes Rita Elaine Francesca Curi, Sylvia Michelina Fernandes Brenna .................................................................................... 77-82

MINI-REVISÃO

Vacinas para papilomavírus humanoHuman papillomavirus vaccinesAline Mara Barreira, Vanesa Abreu de Oliveira, Valéria Menezes P. Machado, Sylvia Michelina Fernandes Brenna .................................83-7

PONTO DE VISTA

O papel da pressão de perfusão coronariana no remodelamento cardíaco.The role of coronary driving pressure on cardiac remodelling.Koike MK, E. de Carvalho ........................................................................................................................................................................................... 88-90

Reflexões sobre o planejamento da UniversidadeEico Uemura........................................................................................................................................................................................................................91-4

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Science in Health

A revista de saúde da Universidade Cidade de São Paulo.

Chanceler

PAULO EDUARDO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO

Reitor

RUBENS LOPES DA CRUZ

Vice-Reitor

SÉRGIO AUGUSTO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO

Editor ChefeCláudio Antônio Barbosa de Toledo

Vice EditorJoaquim Edson Vieira

Editoria Acadêmica Ester Regina Vitale Denise Aparecida Campos

Assistente Editorial Mary Arlete Payão Pela

Normalização e revisãoClaudia MartinsEdevanete de Jesus de Oliveira

Chefe de Edição e Editoramento Juarez Tadeu de Paula Xavier Ricardo Di SantoMaria Bernadete Toneto

EditoraçãoVinicius Antonio Zanetti Garcia

Revisão do idioma portuguêsAntônio de Siqueira da Silva

Assessoria de Marketing Lúcia Ribeiro Periodicidade: Quadrimestral

Corpo Editorial por Secção

1 - Biomedicina

Editor Sênior: Márcio Georges Jarrouge ([email protected])

Editores Associados: Ana Cestari, Marcia Kiyomi Koike

2 – Ciências Biológicas e Meio Ambiente

Editor Sênior: Débora Regina Machado Silva ([email protected])

Editores Associados: Maurício Anaya, Ana Lúcia Beirão Cabral,

3 – Educação Física

Editor Sênior: Roberto Gimenez ([email protected])

Editores Associados: Marcelo Luis Marquezi, Maurício Teodoro de Souza

4 – Enfermagem

Editor Sênior: Wana Yeda Paranhos ([email protected]) Editores Associados: Patricia Fera; Fabiana Augusto Neman, Adriano Aparecido Bezerra Chaves

5 – Fisioterapia

Editor Sênior: Francine Barretto Gondo ([email protected]; [email protected])

Editores Associados: Fábio Navarro Cyrillo, Sergio de Souza Pinto, Renata Alqualo Costa

6 – Formação e capacitação na área da saúde

Editor Sênior: Ecleide Cunico Furlanetto ([email protected])

Editores Associados: Julio Gomes de Almeida, Joaquim Edson Vieira, Stewart Mennin

7 - Gestão em saúde

Editor Sênior: Wagner Pagliato ([email protected])

Editores Associados: Marcelo Treff, Luiz Cláudio Gon-çalves

8 – Inclusão social

Editor Sênior: Edileine Vieira Machado da Silva ([email protected])

Editores Associados: Fernanda Mendonça Pitta, Juarez Tadeu de Paula Xavier

9- Informática na saúde

Editor Sênior: Waldir Grec ([email protected])

Editores Associados: Sergio Daré, Aníbal Afonso Ma-thias Júnior,

10 – Medicina

Editor Sênior: José Lúcio Martins Machado ([email protected])

Editores Associados: Jaques Waisberg, Sonia Regina P. Souza, Edna Frasson de Souza Montero, Marcelo Au-gusto Fontenelle Ribeiro Júnior, Sylvia Michelina Fernan-des Brenna

11 – Odontologia

Editor Sênior: Cláudio Fróes de Freitas ([email protected])

Editores Associados: Eliza Maria Agueda Russo, Rivea Ines Ferreira, Flavio Augusto Cotrim Ferreira

12 – Tecnologia em saúde

Editor Sênior: Willi Pendl ([email protected])

Editores Associados: Luiz Fernando Tibaldi Kurahassi, Rodrigo de Maio

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E D I T O R I A L

Prezado leitor

É com satisfação que chegamos à primeira edição de nossa Revista. A Science in Health se propõe a ser exatamente o que seu nome induz a pensar: um espaço criado para fomentar o cimento entre o pensamento crítico fundamentado no método, que simbolizamos por Ciência, e sua consequência para o bem-estar da co-letividade. Ela pretende combinar canais de divulgação e informações sobre as implicações das descobertas provenientes do meio científico em nossa sociedade, além de ser uma via que apresenta as reflexões de seus membros sobre diferentes aspectos que convergem para a Saúde.

Assim, o ambiente da Science in Health foi concebido como dois grandes elementos. O primeiro é um espaço mais voltado à comunidade acadêmica, com áreas específicas contendo Relatos de Pesquisa, Ensaios e Revisões, construídas segundo a austeridade do academicismo. Esse espaço tem o benefício oculto de introduzir esse rigor aos futuros autores, ambicionando ser uma primeira alternativa de contato com a produção e divulgação do conhecimento científico. Esse ambiente é atualizado a cada quatro meses, e sua periodicidade constituirá os volumes do elemento científico da revista. O segundo espaço almeja disseminar fatos e informações de uma forma mais coloquial, de modo a incentivar a leitura reflexiva de uma forma lúdica. É composto de notícias curtas, sugerindo interatividade do leitor com o evento ou suas decorrências. A proposta é que esse espaço sofra atualização bem mais frequente e que cubra eventuais acontecimentos de impacto imediato.

Nesta primeira edição, convidamos você a conhecer um pouco sobre a dificuldade em construir ambientes inclusivos e que respeitem a individualidade dos atores envolvidos, sejam deficientes, médicos, crianças, e o valor depreendido pela sociedade nesse desafio. Também discutimos o mérito da interdisciplinaridade e a re-lação interprofissional. Ponderamos sobre expensas no gasto com saúde, apresentamos novas perspectivas em doenças transmissíveis e possibilidade de intervenção terapêutica, e oferecemos uma importante ponderação sobre a amplitude do papel formador de um projeto universitário.

Por fim, mas não menos importante, nós gostaríamos de ressaltar que esta jornada apenas se iniciou e con-vidamos você a partilhá-la. Torne-se parceiro desta obra, enviando sua contribuição. Esperamos ansiosos por sua palavra.

Revista Science in HealthCorpo Editorial

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Science in Health 2010 jan-abr; 1(1): 5-17

COMPLEXIDADE NOS PROCESSOS INCLUSIVOS: A RELAÇÃO DIALÓGICA ENTRE EDUCAÇÃO E SAÚDE

COMPLEXITY IN INCLUSIVE PROCESSES: THE DIALOGIC RELATIONSHIP BETWEEN EDUCATION AND HEALTH

Roberta Galasso*

* Doutora pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP no Programa de Educação e Currículo. Coordenadora do Curso de Especialização da Unifesp - Educação Especial, Fundamentos para Educação Inclusiva com ênfase na Deficiência Física, Pesquisadora colaboradora do CNPq, no projeto - Docência transdisciplinar: a complexidade de uma prática a ser construída a partir de cenários e redes de aprendizagem integrada e ecoformadora e Coordenadora Pedagógica da Escola de Educação Especial do Lar Escola São Francisco - Centro de Reabilitação/Unifesp.

RESUMO

Neste artigo, são apresentadas considerações de uma pes-quisa que discute as possibilidades de inclusão de pessoas com deficiência e a relação dialógica entre educação e saú-de e suas implicações nos processos educacionais. Religar a diversidade dos saberes e compartilhá-los são sugestões para as ações inclusivas. Nesse sentido a aproximação do pensamento complexo neste artigo se apresenta como aposta ética, epistemológica e como estratégia cognitiva para compreender a complexidade dos fenômenos encon-trados. Destacam-se características da abordagem médico-psicológica e seus reflexos na relação entre as áreas en-volvidas; em continuidade são enfatizadas as incertezas, as dificuldades, os avanços e os recuos quando duas categorias de profissionais trabalham em conjunto e, finalmente, nas análises ressalto o papel do trabalho colaborativo, quando a relação dialógica é estabelecida, facilitando-se o processo de inclusão das pessoas com deficiência.

DESCRITORES: Educação das pessoas com deficiência. Saúde e educação.

ABSTRACT

In this article, are presented considerations of a survey to discuss the possibilities of including disabled people, the dialogical relationship between education and health and its implications in the educational processes. To reconnect the diversity of knowledge and share it are suggestions for in-clusive actions. In this sense, the complex thinking approach in this article is presented as an ethical, epistemological pro-posal, and a cognitive strategy to understand the complexi-ty of the phenomena found. Are highlighted characteristics of medical-psychological approach and its reflections on the relationship associated to the areas involved followed by uncertainties, difficulties, advances, and returns when two professional categories work together, and finally, in the analysis, It si emphasized the role of the collaborative work, when the dialogical relationship is established, making easy the educational and social inclusion of disabled people.

DESCRIPTORS: Education of persons with disabilities. Heath and educacion.

Relato de pesquisaFoRmação e CapaCitação na ÁRea da saúde

ISSN 2176-9095

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Galasso R • Complexidade nos processos inclusivos:a relação dialógica entre educação e saúde São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 5-17

Relato de pesquisaFoRmação e CapaCitação na ÁRea da saúde

ISSN 2176-9095

IntRoduçãoNeste artigo, apresentam-se considerações de

uma pesquisa que discute as possibilidades de in-clusão de pessoas com deficiência, a relação dialó-gica entre educação e saúde e suas implicações nos processos educacionais. Em um primeiro momento, são destacadas características da abordagem médico-psicológica e seus reflexos na relação entre as áreas envolvidas. Em um segundo momento são enfatizadas as incertezas, as dificuldades, os avanços e os recu-os quando duas categorias de profissionais trabalham em conjunto. Num terceiro momento, destacam-se o trabalho colaborativo, quando a relação dialógica é estabelecida, pode facilitar o processo de inclusão de pessoas com deficiência.

Nas áreas da educação e saúde, ao se contemplar o tema educação inclusiva, percebe-se a existência de fronteiras imprecisas e tensões conflitantes. São áreas que deveriam estar intimamente ligadas para articulação de práticas sociais e educacionais. O sis-tema de saúde é parte integrante do bem-estar social e os indicadores de saúde são componentes essen-ciais para uma melhor qualidade de vida. Basta dizer que saúde e doença são abstrações necessárias para que possamos descrever diferentes graus de sucesso na interação dos sujeitos com o meio que os cerca, bem como na dinâmica interna do seu próprio corpo (NARDI, 2007).

Pode-se analisar a articulação entre as áreas da educação e saúde de inúmeros ângulos ou pontos de observação, que aqui são chamadas de dimensões. Reunindo informações das múltiplas perspectivas, ou seja, fazendo uma análise multidimensional, pode-se ter uma visão mais clara e próxima da realidade.

Cabe à presente pesquisa conceber as perspecti-vas para a construção de uma escola inclusiva que leve em consideração o diálogo entre espaços regular e especial, contribuindo para a construção da cidadania e que compreenda a educação como realidade em movimento e a escola como um espaço de inclusão. Esta escola deve reconhecer diferentes competên-cias, talentos e possibilidades, sendo um lugar onde se respeita a vida, o desenvolvimento pessoal e co-letivo (MORAES E TORRES, 2004) para a realização plena da cidadania, rompendo com desigualdades e preconceitos.

Com esses pressupostos, os questionamentos

emergiram na busca de respostas que possibilitem o diálogo entre os espaços regular e especial e entre as áreas de saúde e educação na elaboração de ações significativas que garantam a percepção do outro como parte legítima de um processo que visa garantir a equidade.

O cenário da pesquisaNo ano de 1991, o Lar Escola São Francisco

(LESF)* estabeleceu uma parceria com a UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo) decidindo am-pliar seu campo de pesquisa e, consequentemente, seus atendimentos nas áreas da saúde.

Atualmente, o Lar Escola oferece as especialidades de fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, atividade física adaptada, psicologia, odontologia, ofici-na ortopédica, reabilitação gerontológica, pulmonar e reumatológica, fisiatria, enfermagem, psicopedagogia e escola de educação especial, tendo por objetivos:

Manter um centro de reabilitação de regime es-colar e ambulatorial em que pessoas com deficiência física recebam tratamento necessário e indispensável à sua reabilitação integral;

Proporcionar um centro de aprendizagem para avaliação, orientação e treinamento profissional do deficiente;

Proporcionar aos alunos de graduação espaço de estudos e pesquisas sobre reabilitação, deficiência fí-sica e inclusão social/educacional;

Cooperar com outras instituições, similares ou afins, contribuindo para a melhoria dos serviços em benefício do deficiente físico;

Promover parcerias e convênios da instituição com entidades nacionais ou internacionais, públicas ou privadas.

Escola de Educação Especial do Lar Escola São Francisco/Unifesp

É nesse cenário que se inicia este diálogo: uma es-cola de educação especial inserida em um centro de saúde que tem como objetivo a reabilitação de pesso-as com deficiência física.

A escola de educação especial do Lar Escola São Francisco foi fundada em 1943. Atualmente conta com 11 salas de aula e 90 alunos com deficiência físi-ca, decorrente de patologias diversas.

* Centro de Reabilitação e Instituição Beneficente que, desde 1943, aten-de pessoas com deficiência física.

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ISSN 2176-9095

Com base na Lei n° 9394/96 – LDB. - de 20/12/96, o ensino é ministrado dentro dos princípios de igual-dade de condições para acesso à educação e per-manência na escola; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar, divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber, cultivando o pluralismo de ideias e as con-cepções pedagógicas, articulando educação, trabalho e práticas sociais.

A instituição concebe os processos de aprendiza-gem, assumindo que o conhecimento é processo e não resultado. Destaca o respeito e a ética como fa-tores essenciais para a convivência social. De acordo com esta dimensão, aponta que o professor deve atu-ar junto ao aluno, auxiliando-o em seu processo de aprendizagem considerando os quatro movimentos: conhecer, fazer, ser e conviver.

Em segundo lugar, preconiza uma atuação em que o olhar do professor constantemente revise seu fazer pedagógico, avaliando diferentes estratégias de ensi-no. Não existem fórmulas prontas, pois isso signifi-caria deitar os alunos e o próprio conhecimento no Leito de Procusto, sob a pena de ambos serem des-truídos. Finalmente, atenta para a necessidade de se pensar o conteúdo em congruência com as exigências da vida moderna.

O Lar Escola São Francisco acredita que a escola especial é uma espécie de “passagem” com recursos diferenciados, que procura auxiliar o aluno com defi-ciência a ser incluído na educação regular. Nesta dará continuidade ao seu processo educativo.

A atuação do Lar Escola São Francisco é de adap-tação de seus alunos aos diferentes contextos so-ciais. Historicamente observa-se que, num primei-ro momento, o deficiente deveria ser segregado da sociedade, em virtude de sua diferença. A proposta atual considera que o ajuste é responsabilidade de todos. Reitera-se a importância da ação coletiva nes-te processo de inclusão social. Em tal contexto, en-contramos contribuições dos profissionais da saúde, especificamente uma equipe interdisciplinar de reabi-litação composta por fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, médico fisiatra, nutricionista e psicólogo.

Vislumbram-se, aqui, uma pedagogia com influ-ências marcantes nos processos de aprendizagem e uma perspectiva dialógica entre as áreas da Educação e Saúde como condição para a construção de conhe-

cimento. Essa afirmação tem o objetivo de apontar a relevância da equipe de saúde nos processos educa-cionais, porque os aspectos supracitados são essen-ciais para uma situação de aprendizagem adequada, pois se o aluno não possui mínimas condições como mobiliário, adaptações físicas e pedagógicas, muitas propostas educativas não são alcançadas. Por outro lado, quando se tem essa perspectiva dialógica como condição sine qua non para a construção do conheci-mento, como pensar a inclusão de pessoas com defi-ciência nas escolas regulares baseada no tripé lousa, giz e apagador?

Parceria entre Lar Escola São Francisco/Unifesp e Secretaria da Educação do Município de Santo André

Em 2002, o Lar Escola São Francisco - Centro de Reabilitação/Unifesp estabeleceu um diálogo, por meio de um projeto de Assessoria, com Município de Santo André, na tentativa de estruturar ações que contribuíssem na inclusão de pessoas com deficiência física nas escolas regulares. Surgem aí reflexões sobre a problemática da pesquisa.

Esse diálogo apontou para a necessidade de estru-turação de um projeto que levasse em consideração algumas ações que contribuíssem para as políticas pú-blicas de inclusão no Município de Santo André que, desde 1997, vinha construindo ações de inclusão após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de 1996 e o fechamento das classes especiais.

A estruturação do projeto permeou as demandas por meio de 3 eixos:

Diagnóstico de alunos com deficiência física;Formação de professores da rede regular de San-

to André;Acessibilidade física e pedagógica para auxiliar na

ação educativa. Dos eixos apontados, detive-me especificamente

nos dois primeiros. Mediante as práticas diagnósticas, procurei compreender as relações necessárias e pos-síveis entre educação e saúde, na construção de pro-cessos inclusivos e, por meio da análise da estrutura curricular das propostas de formação de professores e das avaliações dos participantes destas formações, busquei as concepções que as permearam e procu-rei levantar indicadores para ressignificar a interface entre a educação regular e especial na formação de professores.

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Práticas diagnósticasAs práticas diagnósticas, nos contextos que envol-

vem pessoas com deficiência, ainda são caracterizadas com vistas à patologia: deficiências, problemas, rótu-los que cristalizam certo estado de ser do indivíduo (VILLELA, 2003).

As considerações apontadas por perspectivas le-gais mostram as influências dos fatores biológicos nas práticas diagnósticas. Entretanto, gostaria de ressaltar que os fatores biológicos, mesmo relevantes, somen-te adquirem significado dentro da estrutura de siste-mas de valores culturalmente definidos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), órgão responsável pelas questões referentes à saúde mun-dial, procurou contemplar os diferentes estados e comprometimentos causados pela deficiência, ao criar uma classificação baseada no modelo médico-tradi-cional de doença (etiologia, patologia e manifestação) associando-as às categorias: deficiência, incapacidade e impedimento. Dessa forma, o conceito de deficiên-cia passou a ser reconhecido como (OMS, 2003)

Deficiência (impairment): perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica;

Incapacidade (disability): toda restrição ou falta de-vida a uma deficiência da capacidade de realizar uma atividade na forma ou na medida em que se considera normal a um ser humano;

Impedimento (handicap): situação desvantajosa para um determinado indivíduo, em consequência da instalação de uma deficiência ou incapacidade que li-mite ou impeça o desempenho de um papel conside-rado normal para sua idade, sexo, condições sociais e culturais.

Essas definições elaboradas pela OMS, em princí-pio, se aplicam a todos os tipos de incapacidade físi-ca e mental. Entretanto deveriam incorporar, além da origem da deficiência, sua repercussão funcional e suas consequências no desempenho de atividades consideradas normais.

No Brasil, as categorias de deficiência associadas ao modelo saúde/doença são reconhecidas na cons-tituição (Brasil, 1988) como de origem física, mental, auditiva, visual e múltipla. A deficiência é entendida através de conceitos como deficiência permanente (disability) e incapacidade (handicap). Assim:

Deficiência permanente - é aquela que ocorreu ou

se estabilizou durante um período de tempo suficien-te para não permitir recuperação ou ter probabilida-de de ser alterada, apesar de novos tratamentos.

Incapacidade - é uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessida-de de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa com deficiência possa receber ou transmitir informações que precisa para seu bem-estar e para o desempenho de função ou atividade a ser exercida.

Essa é a classificação que legalmente ampara e ga-rante à pessoa com deficiência o exercício de seus direitos legais. Entretanto, percebe-se que a defini-ção de deficiência permanece ancorada no conceito de normalidade, que reforça a diferença e incentiva a exclusão. Já a definição de incapacidade está atrela-da às repercussões sociais decorrentes da deficiência instalada, bem mais coerente, quando se pensa em igualdade e equidade (BERNDT, 2004).

Descrição e análise das práticas diagnósticasO eixo diagnóstico tinha como propósito garantir

uma atuação dos profissionais da reabilitação na iden-tificação da deficiência, diagnosticada pelo médico fi-siatra; levantamento das características referentes à patologia por meio das contribuições dos profissio-nais pertencentes à equipe de reabilitação (fonoau-diólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional, professor, psicopedagogo e fisioterapeuta) e, por fim, a elabo-ração de um relatório onde constava a deficiência, informações específicas de cada área, encaminhamen-tos ao serviços de saúde do Município de Santo An-dré e adaptações necessárias prescritas pela equipe.

As avaliações aconteciam semanalmente. Os cri-térios para organização da listagem de alunos para avaliação foi organizada segundo dois aspectos: casos mais comprometidos e alunos que nunca haviam fre-quentado um serviço de saúde especializado da defi-ciência física. Eram avaliados 4 alunos por semana e as avaliações ocorriam segundo as etapas descritas:

1ª etapa: avaliação da fisiatra;2ª etapa: avaliação conjunta da terapeuta ocupa-

cional, fisioterapeuta e fonoaudióloga;3ª etapa: avaliação conjunta da psicóloga, pedagoga

e psicopedagoga;4ª etapa: discussão do caso com a equipe do

LESF;

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5ª etapa: devolutiva com os resultados da avalia-ção a um grupo de cinco (5) professores assessores do Município de Santo André, responsáveis pela área da deficiência fí-sica.

As primeiras avaliações eram ainda fragmentadas, permeadas por um modelo médico-psicológico. Os profissionais, ao avaliarem os alunos, traziam contri-buições pontuais acerca das dificuldades e limitações decorrentes das patologias, constatando as dificulda-des cognitivas e sociais. Nessa perspectiva, a defici-ência é entendida, ao mesmo tempo, por um caráter organicista, biologicamente determinado e classifica-tório. Dessa forma, a concepção social é deixada em segundo plano.

Encontramos diversas referências desse modelo médico-psicológico na Educação Especial, em auto-res como Cambaúva (1988), Bueno (1993) e Jannuzzi (1992), demonstrando historicamente os vínculos da educação especial com as áreas da saúde. Cambaúva (ibid.), por exemplo, ao tratar sobre a educação dos deficientes mentais, explica a ligação da educação es-pecial à área médica pela presença de casos graves com quadros cuja patologia era profunda, além do que:

[...] o fato de o serviço de Higiene e Saúde Pública ter uma certa preocupação com a educação de defi-cientes mentais contribui para ter a vinculação de am-bos os campos, que, através desse órgão, buscavam enfatizar o discurso da eugenia, pregando a necessi-dade de medidas que visassem à regeneração física e psíquica através dos serviços de higiene (ibid., p. 70)

Essa autora ainda indica que a Psicologia tem gran-de influência no pensamento da Educação Especial no Brasil. Para ela, essa área, pautada pela observação e experimentação, traz como objetivo de seus estudos as questões relativas ao ajustamento e desajustamen-to do indivíduo à sociedade. Dessa maneira, é a pon-te para que a educação, no sentido positivista, aliada aos seus estudos e resultados, possa fazer de cada pessoa um indivíduo social, integrado em seu meio e contribuindo para a ordem e progresso da sociedade. (CAMBAÚVA, 1988, p. 66).

Essas características podem ser percebidas nos serviços da Educação Especial por meio da ênfase dada às práticas diagnósticas, permeadas por pro-cedimentos técnicos e de observação. Constatamos

diretamente as influências desse modelo nos encami-nhamentos pedagógicos como métodos, estratégias e técnicas de avaliação que compõem o processo edu-cativo.

El modelo patológico define lo normal/anormal de acuerdo con la presencia o ausencia de síntomas biológicos detectables. Los procesos biológicos que interfieren en la conservación del sistema son ‘malos’ o patológicos; aquellos otros que aumentan la vida del organismo son ‘buenos’ o saludables. Así pues, el mo-delo patológico es bipolar. En un polo se encuentra lo normal (es decir, la ausencia de síntomas patológicos y la presencia de salud); en el otro polo está lo anor-mal (es decir, la presencia de síntomas patológicos y de la enfermedad, o la ausencia de salud). El modelo patológico es esencialmente evaluativo: ser anormal es no estar sano; eso es ‘malo’, y debe ser prevenido o aliviado. (SKRTIC,1996, p. 39).

Dessa maneira, as ações dos sujeitos envolvidos nesse primeiro momento das práticas diagnósticas destacavam nos relatórios aspectos da deficiência que perpassavam por características organicistas, classificatórias e biológicas. Ao analisar essas práticas, identificamos que o diálogo entre educação especial e regular permanece com traços de um modelo mé-dico (biológico) que não se dissocia do psicológico. Eles caminham juntos e chegam a ser confundidos como um conhecimento próprio da Educação Espe-cial (SKRTIC, 1996).

Para o autor, a Educação Especial tem suas bases no Positivismo, propondo modelos e procedimentos que guiam as práticas educativas. Nesta perspectiva, a espe-cificidade da área traz o conhecimento prático trans-mitido aos profissionais da educação especial, na forma de habilidades e atitudes** (SKRTIC, 1996, p. 36).

Tais reflexões destacam os pressupostos que norteavam as ações referentes ao momento inicial das avaliações. No decorrer do processo, as práti-cas diagnósticas foram desvelando a possibilidade de contribuir para além das características que estavam sendo utilizadas pela equipe, mostrando a fragmen-tação dos relatórios, com modelos já definidos por práticas anteriores e com ausência do diálogo entre as áreas envolvidas. Também foram identificadas as características predominantes da concepção médico-

** Tradução da autora, do original em espanhol: transmitido a los profe-sionales de la educación especial, en forma de habilidades y actitudes.

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psicológica. Os relatos dos profissionais da equipe multiprofissional não ampliavam a discussão para a multidimensionalidade do sujeito envolvido. Dessa forma, as informações encerravam a deficiência no aspecto biológico (NARDI, 2007).

Mediante as análises iniciais das práticas diagnósti-cas, emergiram três eixos que possibilitaram o apro-fundamento na compreensão da articulação entre saúde e educação. São eles: saúde e inclusão, frag-mentação das áreas de conhecimento e diálogo.

Saúde e IncluSãoEncontramos indicadores do modelo médico-

psicológico em várias referências da Educação Espe-cial. Primeiramente, destaco-o como a base principal das práticas diagnósticas. Como aponta Nunes et al. (1999) este tem sido, historicamente, o eixo funda-mental que caracteriza as contribuições da saúde para o processo de inclusão. Segundo Skrtic (1996, p.43), para sair desse “marco de referência” que se tornou o modelo médico-psicológico, é necessário que:

[...] la educación especial se tome seriamente las críticas planteadas a su conocimiento teórico y apli-cado y, en consecuencia, contra sus suposiciones asumidas como algo que se da por sentado. Exigirá una crítica en el sentido clásico, es decir, un examen autorreflexivo acerca de los límites y la validez del conocimiento de la propia educación especial. Pero el problema es que la comunidad profesional de la edu-cación especial no acepta fácilmente la crítica teórica, precisamente porque ésta contradice las suposiciones asumidas como algo que se da por sentado dentro del campo acerca de la naturaleza de la discapacidad, el diagnóstico, la educación especial y el progreso.

A denominação médico-psicológico também é descrita por Costa (1990) e Rodrigues (2001), onde se percebe a marca da definição de “normalidade” e “anormalidade”.

Podemos constatar que a dificuldade em aceitar essa crítica está relacionada ao fato de que o pensa-mento hegemônico, não somente da Educação Espe-cial, está permeado pela compreensão de que a base biológica é a explicação para o insucesso educacio-nal.

Para alguns autores como Collares e Moysés (1996) e Patto (1991) esta concepção é histórica e ultrapassa os “muros” da educação. Para Collares e

Moysés (1996, p.27): O processo de transformar questões sociais em

biológicas, chamado de biologização, é bastante co-nhecido na história da humanidade. Nos momentos de grande tensão social, de movimentos revolucio-nários relevantes, a resposta da sociedade sempre foi no sentido de biologizar as questões que se haviam transformado em foco de conflitos. Nesse processo, sempre houve o respaldo de uma ciência de matriz positivista, cujos interesses coincidem com os de uma determinada classe social.

Segundo esses autores, o envolvimento dos pro-fissionais de saúde no processo educacional tem con-tribuído para biologizar esse mesmo processo:

Na escola, este processo de biologização geral-mente se manifesta colocando como causas do fracas-so escolar quaisquer déficits dos alunos. Desloca-se o eixo de uma discussão pedagógica para causas e so-luções pretensamente médicas, portanto inacessíveis à Educação. A isto, temos chamado medicalização do processo ensino-aprendizagem. Recentemente, por uma ampliação da variedade de profissionais de saúde envolvidos no processo (não apenas o médico, mas também o fisioterapeuta, o psicólogo, o fonoau-diólogo, terapeuta ocupacioanal e o psicopedagogo) (COLLARES e MOYSES 1996, p. 28).

Com base nessas referências conceituais foi feita a análise dos relatórios. Percebeu-se uma linguagem predominantemente médica, dificultando a compre-ensão por parte de um profissional que não tem a menor familiaridade com esses termos. Atrelada a isso, ocorre, na atualidade, com grande prejuízo para a sociedade, a precária formação de muitos profes-sores que jamais compreenderiam um relatório que contivesse as nomenclaturas supracitadas. Ainda, en-contramos incipiência nos cursos de formação para que os professores se apropriem do assunto. Muitos alunos com deficiência são matriculados nas escolas regulares sem o menor suporte.

A falta de clareza nas práticas diagnósticas pode trazer dificuldades importantes para que a escola co-nheça as possibilidades do aluno deficiente quando incluso na educação regular. Nessa dimensão, ressal-ta-se a importância da relação dialógica entre as ca-tegorias profissionais para uma inclusão responsável. Por outro lado, não queremos sobrepor ou excluir dados biológicos. Acreditamos que tais informações

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são relevantes ao considerar a multidimensionalidade do ser humano. Somos seres sociais, crescemos e nos desenvolvemos em permanente troca com o outro, intermediados pelo meio. A vida social extrai das re-lações biológicas fundamentais de reprodução pree-xistente um “simbolismo” para se organizar (MORIN, 1990, p. 40).

É na complexidade ocorrente da relação natural-cultural que se dá o desenvolvimento animal. Esse é um processo multidimensional e constituído por inter-relações, interações e interferências entre os fatores genéticos, ecológicos, praxistas, sociais e cul-turais. Morin (1990) chama a atenção para não redu-zir a hominização a uma única dimensão, evitando o privilégio de um traço, quer sociológico quer bioló-gico, por serem todos essenciais uns aos outros. A evolução hominídia, explicada pelo autor, realiza-se nas inter-relações físico-químico-sócio-cultural em que a mutação genética é “tracionada” pela evolução cultural.

Sendo assim, a complexidade permite desvelar a relação entre os universos físico e biológico, e assegu-ra a comunicação entre todas as partes. Dessa forma, se o conceito de biologia se alargar, se complexificar, tudo que é sociológico, antropológico é biológico. Morin (1990). Portanto a biologia, ou a perspectiva biologizante que envolve a deficiência deixa de redu-zir o conceito de deficiência à incapacidade e torna-se fundamental para compreendê-lo quando o mundo e o sujeito são considerados.

Fragmentação das áreas de conhecimentoOs relatórios que procuravam retratar informa-

ções relevantes apresentavam características disci-plinares. Cada profissional realizava seu diagnóstico de maneira unifocal, como se fosse posível separar o sujeito em partes. Entretanto, nos encontros dos di-versos profissionais envolvidos, percebia-se um início de articulação entre as áreas dos saberes, que não aparecia nos registros.

Há referências dessas práticas no paradigma da simplificação, que tem como princípios a disjunção, redução e abstração. Segundo Morin (1990), esses princípios separaram os três grandes campos do co-nhecimento cientifico: a física, a biologia e a ciência do homem. A hiperespecialização ainda aponta um retalhamento do complexo ao fazer acreditar que,

separando o real, encontra-se o próprio real. Des-ta forma, essas considerações levam a compreender práticas da especialização que, segundo Morin (1990, p. 18), destrói conjuntos e totalidades, isola os obje-tos daquilo que os envolve.

Essas referências são vistas de maneira explícita nas práticas diagnósticas, principalmente no que diz respeito aos registros construídos a partir das con-cepções dos sujeitos envolvidos, que levam em con-sideração o paradigma da ciência vigente, a discipli-narização das áreas do saber, bem como as práticas institucionais vivenciadas.

No entanto, ao considerar essas práticas, remeto-me aos momentos nos quais as intervenções eram necessárias para que os profissionais da equipe am-pliassem os olhares e, assim, pudessem visualizar a relevância dos aspectos sócio-culturais. Isso foi per-cebido somente na última etapa do diagnóstico, por ocasião da devolutiva aos professores assessores.

Percebeu-se, por meio dos relatos dos profissio-nais, uma preocupação inicial referente aos aspectos biológicos da deficiência. Em seguida, os possíveis en-caminhamentos aos serviços de reabilitação do mu-nicípio e, como última preocupação, o que aqueles sujeitos fariam na escola regular e quais encaminha-mentos seriam sugeridos pela equipe de saúde, pois, como já mencionado, os primeiros alunos avaliados apresentavam deficiências importantes.

As influências da condição biológica caracteriza-vam-se neste momento como principal indicador da equipe. Entretanto, esse cenário começou a ser alte-rado na medida em que fomos vivenciando, nos en-contros para última etapa da avaliação, a devolutiva. Observou-se um distanciamento entre profissionais da instituição e professores nos primeiros contatos. As informações eram ainda muito fragmentadas, pois a perspectiva sócio-cultural do sujeito não estava sendo considerada. Contudo, por meio de um movi-mento de auto-organização, possibilitada pelo diálogo entre as duas equipes, se reconfigurou gradativamen-te a percepção sobre o sujeito, desvelando-se a sua perspectiva multidimensional (NARDI, 2007).

Auto-organização é o fenômeno que caracteriza os seres vivos em sua organização tanto estrutural quanto funcional (ATLAN, 1992). É o núcleo da com-plexidade biológica (MORIN, 1999). É a emergência espontânea de novas estruturas e de novas formas

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de comportamento em sistemas abertos, que operam afastados do equilíbrio (CAPRA, 2000). É uma facul-dade inconsciente que se situa em todas as células do organismo vivo, no nível de suas interações com os fatores aleatórios do meio ambiente (ATLAN, 1992). É uma forma de inter-relações, existente no interior do organismo vivo que, além de mantê-lo vivo, es-trutura-o, mas não depende unicamente da natureza física de seus componentes, mas inclui suas relações (MATURANA e VARELA, 2001).

Os objetivos da última etapa do diagnóstico ti-nham como propósito garantir um espaço de forma-ção continuada a todos os envolvidos, de tal forma que as especificidades dos saberes pudessem consti-tuir um domínio linguístico comum. O conhecimento é complexo ou, nas palavras de Morin (1999), “insim-plificável”. Dessa maneira, o todo não é simplesmente a junção das partes, mas vai além, tendo em vista o aspecto dinâmico e auto-organizacional das mesmas. Em cada parte, na relação com o todo, surgem parti-cularidades que, ao serem fragmentadas, perdem suas propriedades.

A partir dessas considerações, percebe-se a im-portância da compreensão da multidimensionalidade dos sujeitos. Cada característica, social, psicológica, biológica, cultural, é uma parte do todo que não pode ser descartada, ou prejudicará o entendimento do ser. A clivagem existente demonstrava que, na prá-tica, cada categoria profissional não internalizava a proposta trazida pelo grupo de formação, cujas ideias baseavam-se no princípio da interatividade, da relação parte e todo. Ficava explícita a compartimentação do saber. Dentro dessa visão reducionista, não seria pos-sível a interação entre a equipe.

Essas informações foram gradativamente mos-trando a importância da perspectiva sócio-cultural do sujeito para os encaminhamentos e posicionamentos da equipe da saúde. Interessante, nessa perspectiva, é considerar a relação dialógica entre o biológico e o social, categorias que devem ser consideradas de ma-neira associada, pois, caso contrário, define-se uma visão multifacetada do deficiente.

Ainda assim, os resultados iniciais apresentados pelas duas equipes se mostravam reducionistas. Na discussão e troca de informações do grupo, emergiam características do sujeito que eram fundamentais para que a articulação dos resultados, oriundos das carac-

terísticas biológicas, pudessem compor um documen-to que, de fato, auxiliasse as práticas educativas.

Nesse sentido, se houvesse um diálogo tanto dos profissionais da educação quanto da saúde, avanços consideráveis seriam verificados, pois a complemen-taridade seria estabelecida.

Vale ressaltar que essa trajetória se desvelou à medida que a relação do grupo foi se tornando mais interativa e efetiva. A composição das áreas se cons-tituiu em um processo de novas relações, na tentativa de refletir sobre domínios linguísticos que, de fato, contribuíssem para a complexidade do diagnóstico, considerando as diferentes dimensões: biológica, so-cial psicológica e cultural.

Embora o domínio das interações e relações de um sistema como uma totalidade seja determinado por sua organização, suas interações e relações efeti-vas se dão por meio de seus componentes. As conse-quências dessa situação são duas: o sistema interage como uma totalidade, sua estrutura passa mudanças desencadeadas por suas interações; a outra é que, como a estrutura do sistema muda, quer como resul-tado de sua própria dinâmica ou como resultado das interações do sistema como uma totalidade, o domí-nio de interações e relações do sistema como totali-dade também muda. (MATURANA, 2003, p. 216)

A partir dessa perspectiva, o grupo constituído foi se auto-organizando. Percebeu-se que, aos poucos, as relações se efetivavam. O discurso e a prática, den-tro de uma linha de interatividade, considerando a visão plural para o processo de inclusão, convergiam. A busca de novos indicadores que pudessem fornecer encaminhamentos mais adequados, menos excluden-tes e mais significativos para todos, foi tomando es-paço das informações fragmentadas e classificatórias que encerravam o deficiente em suas incapacidades.

Esse processo ocorreu de maneira gradual, mais dinâmico, com intervenções pontuais acerca de con-ceitos referentes aos processos de desenvolvimento e aprendizagem, pois a cada encontro percebia-se a necessidade da articulação das informações das duas equipes.

A estrutura inicial foi alterada. Os encontros dos profissionais da instituição foram abertos aos profes-sores, de forma que a etapa de discussão somente da equipe de saúde foi finalizada. Ganhou espaço a união das duas equipes, na tentativa de que os interlocuto-

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res fizessem algo em comum, criando juntos novas perspectivas para os processos inclusivos.

Quanto aos grupos envolvidos, a construção de processos inclusivos tomou novas formas, pois à me-dida que as contradições foram aparecendo, o diálogo permitiu um novo olhar de ambas às partes, respei-tando assim a complexidade do processo.

Dessa forma, emergiu a necessidade de rever os modos historicamente estabelecidos de se fazer tal construção. Isto é, as necessidades são emergentes, trazendo perspectivas de novas habilidades e ritmos para buscar, mediante os diagnósticos, elementos de análise nos espaços regulares e especiais. São aspec-tos que trazem novos indicadores para ressignificar o papel da escola; a relevância dos serviços de saúde e de um novo sentido dos serviços de educação es-pecial.

As práticas diagnósticas gradativamente assumi-ram uma dimensão dinâmica na direção de mapear as possibilidades, potencialidades e recursos que os indi-víduos carregam consigo. O diagnóstico, mais do que prescrever um formato, passou a oferecer material para criação e invenção de medidas que contribuiriam na expansão do sujeito, para além de suas dificuldades e deficiências. (VILLELA, 2003).

Percebeu-se a necessidade de considerar a inte-ração entre as áreas envolvidas para conduzir ações articuladas nos contextos vivenciados pelos sujei-tos avaliados. Constatou-se nesse processo, um in-tercâmbio entre áreas, levando a uma construção e enriquecimento mútuo de profissionais e pacientes, colaborando de forma significativa nos processos de adaptação e acessibilidade dos deficientes nas esco-las.

Nesse sentido, foram percebidos indícios tímidos quanto à necessidade de constituir novas relações, que tivessem como objetivo principal a interação entre as áreas do conhecimento, ou seja, a percep-ção dessas relações dentro de um sistema total, sem quaisquer limites rígidos entre os saberes.

A continuidade dos processos, diálogos, reflexões, discussão de casos, juntamente com a responsabilida-de da equipe em contribuir, de fato, com ações inclu-sivas no decorrer dos diagnósticos, ampliou o nível de percepção sobre as ações diagnósticas. Ou seja, houve a reunião de diferentes disciplinas articuladas em torno de uma mesma temática, com diferentes

níveis de integração. Na descrição das possibilidades de análise dessa

ação, a equipe passou por diferentes níveis de per-cepção, o que trouxe uma reflexão sobre os níveis de realidade em que os profissionais se encontravam, pois as ações diagnósticas, realizadas pela equipe, se mostravam claramente diferenciadas, percebidas por meio dos registros e contribuições apresentadas, umas voltadas para possibilidades e eficiência dos su-jeitos com deficiência e outras para a ineficiência.

Um dado importante registrado é o de que um projeto que vise à parceria dos profissionais da área de saúde com a área educacional em busca da inte-gração dos saberes, deve ser concebido para longos prazos. Até então sempre foi norma acreditar que um aluno de escola especial jamais tivesse condições de freqüentar a escola regular. Barreiras, preconceitos, classificações devem ser quebrados, o que leva um determinado tempo.

Por outro lado, deve-se ter a clareza de que nem para todo deficiente a frequentar a escola regular, com suas atuais características, é a melhor opção, uma vez que ao longo de toda a vida irá precisar de um serviço diferenciado. Há que se pensar na singularidade de cada pessoa com deficiência, respeitando-a indepen-dentemente de sua dificuldade, o que também equiva-le a uma inclusão humana dentro da sociedade.

Acreditar na eficiência de pessoas com deficiência permite que se reconstruam alguns conceitos para a realidade atual, ou seja, privilegiar o intelecto e rela-tivizar a sensibilidade e o corpo foram necessários na era passada, a fim de permitir a explosão do conhe-cimento. Mas, se esse privilégio continuar, seremos empurrados na lógica louca da eficiência pela eficiên-cia, que só poderá terminar em autodestruição. (NI-COLESCU, 1999).

Conforme referência a partir das contribuições de Nicolescu (ibid.), constata-se a necessidade de uma mudança de conceitos que possam avançar nas práti-cas cotidianas, revendo a dimensão estética e ética do ser humano perante a diferença. O entendimento do “outro como legítimo outro” mostra como emergên-cia, antes de tudo um sujeito sócio-histórico, produ-to de interações acopladas e articuladas, dependentes necessariamente de um contexto. Não existe uma re-alidade objetiva independente do sujeito, senão que sujeito e realidade se co-constroem e co-evoluem em

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uma relação sócio-histórica.São diversos os sentidos que a existência de um

projeto que discute os papéis da educação e saúde têm para os sujeitos envolvidos, e é perceptível como o projeto, por si só, não se caracteriza como garantia para alcançar os objetivos previamente traçados. A abrangência deste depende de como será recebido pela categoria de profissionais das diversas áreas, qual a visão de mundo, de sociedade que possuem, quais projetos e valores acreditam.

De qualquer forma, quando se acredita que a inte-ração é possível e se busca a valorização do ser huma-no, independente de suas diferenças, projetos dessa natureza sempre serão viáveis e necessários.

DiálogoAs análises no processo de diagnóstico mostram

aspectos ainda muito voltados para modelos biologi-zantes da deficiência nas ações e posturas dos pro-fissionais. Entretanto, foram percebidas emergências nos relatos e indícios de mudanças nos seus registros ao longo do projeto.

Como foi dito anteriormente, o projeto passou por ações paradoxais. De um lado a preocupação dos profissionais em abranger as dificuldades decorrentes da deficiência, de outro, a preocupação de fornecer informações relevantes sobre o sujeito para as suas famílias e professores assessores nas diferentes eta-pas do processo.

A linguagem utilizada apresentava, de maneira pre-dominante, referências da saúde. No entanto, cons-tatou-se a preocupação dos profissionais em utilizar terminologias que “traduzissem” as informações para as famílias e professores assessores de tal forma que o relatório pudesse de fato contribuir com proces-sos de adaptação e acessibilidade do sujeito na escola regular. Constataram-se indícios de novos domínios linguísticos que puderam contribuir para a compre-ensão de algo que vai para além das preocupações específicas do saber.

Fundamental destacar o avanço ocorrido a partir dos encontros e das trocas de experiências. Cons-tatou-se essa relação dialógica quando as categorias profissionais se propõem a trabalhar em conjunto. Identificou-se a preocupação em se traduzir a lingua-gem científica tornando-a, adequada aos demais pro-fissionais. Muito mais que simplificação da linguagem, deve-se ler essas menções como um sinal de alteri-

dade e respeito por outras categorias, na maioria das vezes leigas no assunto e que, de posse de dados co-nhecidos, podem auxiliar na composição de um pro-cesso inclusivo.

Vale acrescentar que, dentro de uma perspecti-va inclusiva, a ditadura da linguagem não pode ser utilizada como uma arma de exclusão. Geralmente, determinadas áreas do conhecimento utilizam-se das palavras como forma de manutenção de poder. O poder do médico sobre o corpo do paciente; o po-der da jurisprudência sobre a alma do condenado; o poder de determinadas palavras por parte dos educa-dores. Todos, dentro de um sistema léxico, quando assim procedem, excluem em vez de incluir. Vivemos numa sociedade para quem o domínio do saber, mui-tas vezes, reproduz a desigualdade. Segundo Foucault (1977), o saber produz poder.

Caso se pretenda uma sociedade inclusiva, não se deve deixar que as relações se percam na meritocra-cia lingüística. Estabelecer um diálogo com qualquer segmento social implica numa comunicação entre am-bas as partes.

Quando determinadas palavras, até então de do-mínio de uma categoria social, são traduzidas como as que se observam dentro dos parênteses nos quadros de referência, percebe-se a democratização das pala-vras, a humanização da comunicação e, para além do horizonte, a convicção de que o diálogo entre saúde e educação é extremante possível, quando não muito necessário, para a inclusão de seres humanos até en-tão completamente marginalizados.

Para Maturana e Varela (2001), a coordenação lin-guística de ações aparece como distinções linguísticas. Elas descrevem objetos no ambiente daqueles que operam num domínio linguístico. Portanto, quando um observador age num domínio linguístico, opera também num domínio de descrições. Dessa forma, nas análises da pesquisa, percebe-se que o domínio linguístico de uma determinada área do saber torna-se parte do ambiente no qual as coordenações lin-guísticas acontecem. Ao usar a linguagem para per-fazer as observações referentes aos diagnósticos, os profissionais recorrem à linguagem e a todas as suas descrições em um mesmo campo semântico.

Entretanto os desdobramentos das relações so-ciais e dos propósitos da ação diagnóstica sugerem di-álogos relativos à composição das relações humanas

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e sociais, pois todo conhecimento depende do obser-vador e conhecer é sinônimo de fazer (MATURANA e VARELA, 2001) e só se viabiliza pelo e no agir. A função da linguagem é a produção de campos consen-suais de conduta dos observadores na sociedade e, dessa forma, a comunicação é oriunda da construção de campos interativos comuns e do desenvolvimento de esferas consensuais resultantes da acoplagem es-trutural dos observadores.

As “traduções” que se identificam nos relatórios produzidos pela equipe trouxeram reflexões sobre o que se chama de interação e que pode ser entendi-da como uma abertura para o diálogo. Os sinais da linguagem “materializam” experiências comunicati-vas e dialógicas. Eles não se referem a entidades não verbais da “realidade”, mas ao conhecimento comum de possíveis referências. Os sinais da linguagem que podemos identificar se referem às práticas sociais, ou seja, à maneira de comunicar de uma determinada área do saber e como transpor para um domínio lin-guístico que de fato seja compreendido por todos e estabeleça o diálogo.

Segundo Maturana e Varela (2001), os seres vivos são determinados por sua estrutura que é definida por seus componentes e suas interações. Num siste-ma vivo a estrutura muda o tempo todo, o que mos-tra que ele se adapta às modificações do ambiente,

que também são contínuas. O que nos acontece de-pende de nossa estrutura atual. Esse conceito chama-se determinismo estrutural.

Os sistemas vivos e o meio em que atuam se modificam de forma congruente. A esse fenômeno, Maturana e Varela (2001) deram o nome de acopla-mento estrutural. Quando um organismo influencia outro, este replica, influenciando o primeiro. A partir desses pressupostos pode-se analisar as interações entre as duas equipes e os indícios de novos domí-nios linguísticos por meio do acoplamento estrutural. Dessa forma, a disposição para uma maior interação dos envolvidos no projeto auxilia na construção de um produto e fortalece as relações sociais, possibili-tando a reflexão das práticas atuais.

Para concluir, em um contexto em que estão pre-sentes muitos enredos, verdadeiras teias de necessi-dades, avanços e retrocessos, seria precipitado falar de mudanças. Entretanto, neste estudo, ficou claro que os processos são constituídos por ambiguidades, contradições e resistências. Algumas mudanças, iden-tificadas e consideradas relevantes, permitem a cons-trução de pontes entre os serviços de educação e saúde, em um projeto de educação inclusiva e possibi-litam o surgimento de emergências, ressignificando o papel de ambos os contextos: o especial e o regular.

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ABSTRACT

Individual’s day to day systematic learning occurs through scholar institutions. Thus, when we think about the function that learning has inside our society, we can understand how scholar institutions have the capacity to make a significant difference within individuals. Usually, a good academic re-cord results in an expected success. However, often there is no answer to this demand for success, which generates doubt about the student’s capacity.

The present work aims to discuss the various discursive practices that exist within the scholar environment, this together with medical input supports diagnose of a social exclusion.

KEywORDS: Learning psychology. Exclusion, social

A DIFÍCIL DECISÃO DO SER: A POSSIBILIDADE DE SE CONSTITUIR PELA VIA DO SINTOMA

THE HARD DECISION OF BEING: THE POSSIBILITY OF BUILT YOURSELF FROM THE SYMPTOM WAY

Rosemary Jimenez Ventura dos Santos*

* Doutoranda em Psicologia Social – Núcleo de Pesquisa: Psicanálise e Sociedade – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP-2009 - [email protected]

RESUMO

A instituição escolar responde no dia-a-dia pela aprendi-zagem sistematizada dos indivíduos e, quando se pensa na função que o aprender tem dentro da sociedade, pode-se compreender como ela é capaz de marcar diferenças entre os indivíduos. Nessa perspectiva, bons resultados acadêmi-cos respondem a uma expectativa de sucesso. Entretanto, muitas vezes não há resposta a essa demanda de sucesso, instalando-se, assim, um questionamento sobre a capacida-de dos alunos.

O presente trabalho visa discutir sobre as diferentes práti-cas discursivas existentes nos ambientes escolares que, en-contrando dialogia com o saber médico, apoia-se no diag-nóstico como forma de poder para a manutenção de uma exclusão social.

PAlAvRAS-ChAvES: Psicologia da aprendizagem. Exclusão so-cial

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IntRoduçãoA instituição escolar responde no dia-a-dia pela

aprendizagem sistematizada dos indivíduos, de acor-do com a necessidade da sociedade. A sociedade contemporânea deposita sobre a criança uma imensa carga ideológica, composta por ideias, ideais, fanta-sias, crenças, mitos, valores, tradições, anseios por meio de práticas discursivas que são produtoras de sentidos a partir das dialogias e interações sociais que se produzem cotidianamente no interior dessas insti-tuições. O desafio que se impõe à escola tem sido o de se reconstruir simultaneamente às grandes trans-formações que a revolução tecnológica vem impondo nos últimos anos, entretanto sabemos que há uma linguagem social sendo produzida, através de ações carregadas que perdem a dimensão das possíveis con-sequências.

Quando se pensa na função que o aprender tem dentro da sociedade, é que se percebe o quanto ela é importante e capaz de marcar diferenças entre os indivíduos. Especialmente numa sociedade que coloca o indivíduo como centro da existência humana, como aquele que busca exclusivamente o sucesso pessoal a fim de produzir o benefício coletivo. Portanto, a vida na contemporaneidade tem sido marcada por uma ideologia capitalista mensurada pelo poder, pela riqueza e pelo consumo.

Nessa perspectiva, boas notas, bons resultados acadêmicos são destinados a dar prazer, portanto respondem a uma expectativa de sucesso, conforme esclarece Cordié, (1996, p.24):

(...) A criança percebe muito bem que ela tem de responder a uma expectativa. O sucesso é exatamen-te este objeto de satisfação que ela deve proporcio-nar aos pais. Boas notas, bons currículos são desti-nados a dar prazer. Ela pode responder docilmente a essa demanda durante um certo tempo, mas, cedo ou tarde, sozinha diante da folha branca ou da tarefa a desempenhar, ela será confrontada com seu próprio desejo.

Entretanto, muitas vezes não há resposta a essa demanda de sucesso, instalando-se, assim, um ques-tionamento sobre a capacidade dos alunos e para dar conta dessa questão tem-se desenvolvido uma prática diagnóstica que tenta reduzir manifestações subjeti-vas e sociais a categorias de distúrbios e transtornos ancoradas nos avanços das neurociências.

O exercício no presente trabalho é abrir espaço para uma ressignificação crítica sobre as diferentes práticas discursivas existentes nos ambientes escola-res que, encontrando dialogia com o saber médico, apoiam-se no diagnóstico como forma de poder para a manutenção de uma exclusão social.

Para que se possa utilizar a linguagem em ação como foco para este trabalho se faz necessário per-correr as maneiras de como se trabalhar com a lin-guagem. E para isso é preciso percorrer o que se en-tende por Giro linguístico. Expressão introduzida por volta da década de 70/80 para designar uma mudança ocorrida na filosofia e em várias ciências humanas e sociais e, que passou a dar maior atenção ao papel desempenhado pela linguagem ao introduzir novos conceitos sobre a natureza do conhecimento e novas estratégias para se compreender a realidade social e cultural. Enfim, um aumento de atenção à linguagem durante o século XX que acabou proporcionando uma modificação na concepção da natureza da lingua-gem.

A própria expressão “giro linguístico” sugere a imagem de um momento no qual se produziu algo que não é lingüístico para o espaço linguístico, um fenômeno que se formou progressivamente e foi ado-tando várias modalidades ao longo do seu desenvol-vimento.

O giro linguístico surge com uma preocupação de superar a antiga lógica herdada de Aristóteles, ou seja, a argumentação lógica perfeita e inventar uma nova lógica formal capaz de dar vida a essa linguagem ideal e perfeita.

Vários pensadores contribuíram, a seu modo, para se compreender e fazer ciência. Russell, Frege, Saus-sure, Chomsky (apud IÑIGUEZ, 2005, p.21) partindo de algumas premissas produziram um deslocamento do estudo das ideias para o estudo dos enunciados linguísticos. Não é para dentro da mente que se tem de olhar e, sim, para os discursos. Deixar de conside-rar que são as ideias que se relacionam com o mundo e, sim, que são as palavras que se correspondem com os objetos do mundo. Passa-se de uma posição clás-sica da representação da realidade para o papel de co-construtores numa dada formação social.

Com os filósofos de Oxford e a corrente analítica centrada na linguagem há um grande avanço metodo-lógico, em que a riqueza da linguagem cotidiana vai

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para além de sua função descritiva e se diversifica em uma enorme variedade de usos e funções. Esse per-curso foi influenciado pelo afastamento da tradição cartesiana, promovendo o papel da linguagem como atividade e caracterizando-o como performativo da linguagem, sendo esta tomada como ação na vertente teórica metodológica da Análise do Discurso e não sendo tomada apenas como ação sobre o mundo, mas também sobre os demais para criar realidades diversas, e, por fim, a linguagem como constitutiva da realidade, servindo como instrumento de atuação sobre o mundo e sobre os semelhantes.

Iñiguez (2005) entende que essas influências abri-ram novas possibilidades a partir do giro linguístico e a linguagem passa a ser importante elemento de análise a ser estudada em diferentes metodologias. A linguagem fica compreendida, a partir desse giro, não como algo estático, mas como um instrumento que pode produzir, formar e transformar realidades.

Há uma realidade com a qual nos deparamos den-tro dos ambientes escolares: as crianças não estão aprendendo. Há, assim, uma necessidade de nomear os motivos, as razões dessa não-aprendizagem. Busca-se encontrar respostas, encaminhando essas crianças a especialistas que possam dar diagnósticos e, dessa forma, produzir um sentido. Estes tentam apresen-tar explicações genéticas para questões de aprendi-zagem, apoiando-se numa visão biológica e tratando questões escolares como sendo de natureza orgânica, encobrindo, assim, diferenças sociais e individuais.

Nesse contexto, entende-se que a prática social que atualmente circula dentro dos ambientes escola-res produz um discurso que tenta justificar o desem-penho escolar insatisfatório pelo modelo represen-tado pela área médica, baseado em uma concepção organicista em que predomina uma visão biológica do determinismo das doenças, e que, portanto, procura com o diagnóstico definir qual a patologia apresenta-da pela criança.

Uma vez definida a patologia apresentada, ficam tamponadas todas as outras possibilidades de ques-tionamentos em relação ao ambiente escolar, à me-todologia de ensino, a própria formação do profes-sor ou, ainda, os questionamentos sobre a relação da dinâmica familiar, o lugar e a posição que cada um ocupa dentro desse arranjo, a maneira como o apren-der circula nessa estrutura, e todas as outras possibi-

lidades de transformação que poderiam advir desses questionamentos. Anulam-se todas as possibilidades de se reavaliar o contexto, as intenções e o modo como as práticas são vivenciadas e passa-se a engen-drar um novo domínio de saber, bem apontado por Focault (1973, p.8) :

(...) as práticas sociais podem chegar a engendrar domínios de saber que não somente fazem aparecer novos objetos, novos conceitos, novas técnicas, mas também fazem nascer formas totalmente novas de sujeitos (...).

Talvez um sujeito muito pouco implicado com a própria existência, porém absolutamente fiel ao lugar em que está sendo posto, o de incapaz e doente, lugar este que historicamente foi construído e ocupado.

Os chamados problemas de aprendizagem têm um histórico bem antigo. Têm origem na Europa, ainda no século XIX, e sempre se remeteram ao aprendente, às suas limitações e não às suas potencialidades. Tais problemas foram considerados, inicialmente, dentro do âmbito escolar e eram tratados por educadores numa ação terapêutica que articulava aspectos peda-gógicos e psicológicos no tratamento de crianças que apresentavam fracasso escolar.

Entretanto, as primeiras classes especiais foram introduzidas em 1898 por Claparède (apud BOSSA, 1994), professor de psicologia e neurologista, desti-nadas à educação de crianças com retardo mental. Essa foi a primeira iniciativa registrada de médicos e educadores no campo da reeducação. E entre 1904 e 1908, iniciaram-se as primeiras consultas médico-pedagógicas, com o objetivo de encaminhar crianças para classes especiais. (BOSSA, 1994, p.29)

Nesse período, a neuropsiquiatria, através de uma equipe formada por educadores e médicos, passa a se ocupar, dentro do cenário da educação, dos pro-blemas neurológicos que afetam a aprendizagem, e as dificuldades de aprendizagem passam a ser considera-das consequências de problemas neurológicos, abrin-do-se espaços para que o discurso médico pudesse instalar-se. Mas, que discurso é esse? Que significados ele comporta?

Segundo Clavreul (1983) na obra ”A ordem médi-ca”, a medicina é apresentada como um discurso que instaura uma ordem. O discurso médico é normativo, tem estatuto de lei e seus executantes, os médicos, estão a serviço dessa lei. O que interessa não é o ho-

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mem, “o homem, tal como é definido pelo humanis-mo e pela medicina, é da ordem do Sollen”. O homem é do dever-ser (Sollen).

Pode-se considerar que a influência do discurso médico nos ambientes escolares vem ganhando es-paço ao longo da história, especialmente porque esse discurso carrega em si um discurso de poder. No Brasil, o contexto que favoreceu o florescimento das dificuldades de aprendizagem está relacionado direta-mente à história da escolarização, influenciando signi-ficativamente as primeiras concepções apresentadas.

O paradigma que ainda rege as práticas escolares está baseado nos modelos positivistas, que se anco-ram na ideia de normalidade. Ou seja, qualquer ma-nifestação de diferença que o sujeito deveria ter ou apresentar, em relação a um determinado padrão passa a ser considerada como doença, como desvio. Obviamente, se há desvio, se há doença, como en-tende essa concepção, é necessário haver cura, haver amparo.

Considerando-se as raízes históricas em que se construíram os chamados problemas de aprendi-zagem, entende-se que se construíram repertórios linguísticos trazidos da ciência médica; assim, diag-nóstico, etimologicamente significa conhecimento ou determinação de uma doença, termo corrente no campo da medicina. Entretanto, passou a ser usado no campo da educação, de forma pouco criteriosa.

Alevato (apud JIMENEZ, 2008, p.28) refere-se ao processo de transformar questões não médicas em questões médicas, isto é, tentar encontrar no campo médico as causas e soluções de problemas de outra natureza. A concepção de ciência médica discute o processo saúde-doença como centrado no indivíduo, privilegiando a abordagem biológica, organicista. Daí as questões medicalizadas serem apresentadas como problemas individuais, perdendo sua determinação coletiva.

A queixa mais comum encontrada hoje nos am-bientes escolares e que tem sido a principal causa de encaminhamento de crianças para serviços especia-lizados, segundo Rodhe e Mattos (apud LIMA, 2005, p.14), é a falta de atenção e o comportamento hipera-tivo. Repertório que faz parte da linguagem cotidiana de professores e pais: crianças agitadas, desorganiza-das, desatentas, irresponsáveis, indisciplinadas. O que antes tinha uma leitura de ordem pessoal, hoje passou

a ser enquadrado nos critérios diagnósticos de trans-tornos, figurando nos manuais de medicina conheci-dos como DSM – Diagnostic Manual of Mental Disea-ses, atualmente em sua quarta edição – DSM-IV.

Seguindo ainda essa linha de pensamento, uma das possíveis consequências de um diagnóstico seria a prescrição de medicamentos. Nesse caso, a pres-crição de metilfenidato, que circula com o nome co-mercial de Ritalina, uma medicação estimulante para o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade. No Brasil, segundo dados publicados pela imprensa, houve um aumento de 140% na sua prescrição nos últimos dois anos e o consumo passou de 23 kg em 2000 para 93 kg em 2005, segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA (apud LEG-NANI, 2008, p.8). Isso sugere um uso indiscriminado dessa medicação podendo encobrir problemas de ou-tra ordem.

E no contexto da educação as análises da lingua-gem em uso no cotidiano escolar necessariamente não podem perder a dimensão do coletivo, do social, caso contrário corre-se o risco de tratar como pro-blemas individuais o que seria de uma dimensão cole-tiva, criando-se uma patologização generalizada.

Há muito que se discutir nesse campo de ideias que são oferecidas como verdades científicas, por-tanto absolutas e inquestionáveis para o imaginário popular, quando os mais respeitados pesquisadores sabem da incompletude de seus saberes e conheci-mentos.

Hoje, essas constatações começam a incomodar. Mas é necessário ir além desse incômodo. É preci-so olhar criticamente as próprias convicções e aquilo que vem inspirando as melhores intenções.

É necessário estranhar o cotidiano, em que está presente uma prática que exclui, produzindo estigmas e rótulos fortalecendo a exclusão social como natu-ral. Dessa forma, tomando em consideração todos os aspectos apontados, torna-se necessário questionar o lugar que o discurso médico vem ocupando dentro dos ambientes escolares.

Entende-se que há uma questão ideológica que perpassa o atual discurso científico, aparecendo sob a forma de uma destituição da importância da subjetivi-dade. Pode-se inferir que existem interesses por trás dessa anulação para a manutenção de um determina-do projeto político, econômico e social.

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Compreende-se que, no mundo contemporâneo, existe uma promessa de solução muito difundida na mídia e que está pautada no ponto de vista da far-macologia, aliada à Neurociência que tem alcançado avanços significativos nas últimas décadas em função das descobertas do sistema de regulação e trans-missão do sistema nervoso como uma questão de neuroregulação e neurotransmissão, indicando que podemos controlar bioquimicamente os sintomas, reduzindo-os dessa forma a uma questão de neuro-transmissão e neuroregulação.

Os diagnósticos médicos continuam sendo, em sua maioria, significações arbitrárias às quais os sujei-tos aderem, sobrando muito pouco para se estabe-lecerem outras significações. Clavreul (1983, p.119) considera que “o único sujeito do discurso médico é aquele que o enuncia, isto é, o médico”.

Em primeiro plano, poderia ser dito que a concep-ção de diagnóstico está pautada na identificação de sintomas e sinais. Exatamente o que se apresenta aos professores em sala de aula, sendo estes os primeiros a se depararem com aquilo que escapa.

A instituição escola foi idealizada como local onde a criança poderia ser controlada, vigiada, submetida ao tempo e ao espaço, a exames, sanções e punições. Espaço em que deveria ser corrigida em seus desvios para fazer parte de uma norma socialmente aceita.

Com base numa ideia normatizadora, criou-se uma concepção de criança normal, o que tornou mais visí-veis as crianças diferentes, indisciplinadas, portadoras de dificuldades de aprendizagem, entre outras. Não sendo reconhecidas em suas diferenças, passaram a ser diagnosticadas, adotando-se, dessa forma, certa roupagem social através de seus sintomas.

Ganhou espaço a criança ideal, que seria destinada a transformar-se num indivíduo racional centrado em sua consciência, para fazer parte de uma sociedade denominada, por alguns teóricos, como pós-moder-na, que se ancora no acesso aos bens de consumo proporcionados pelo progresso da ciência e da tec-nologia, com a promessa de que, adquirindo tais bens, estaria adquirindo a felicidade, a completude.

Mas quem é a criança que escapa a esse ideal? Ha-verá um sentido nisso? Quem é essa criança que, com a sua diferença, distancia-se do ideal? O que pode ser expresso nesse não-caber no ideal? Quem é essa criança que não atende à demanda social estabelecida

a priori pela família, pela escola? Quem é essa criança que insiste em não aprender? Que verdade pode ha-ver em escapar a esse ideal?

Essa forma de escapar a esse ideal não poderia ser uma forma de denunciar um certo mal-estar vi-vido pelas crianças no cotidiano escolar? Um certo mal-estar de viver numa sociedade que requer o ime-diatismo, o superficial, o rápido, o descartável, que determina, cobra e espera a homegeinização e, ao mesmo tempo, cria uma ilusão com a promessa do prazer total?

A cultura atual, marcada pelo narcisismo e pelo individualismo, desenvolveu expectativas por desejos de garantias e certezas; os filhos nessa perspectiva se tornaram a possibilidade de perfeição. Perfeição esta também idealizada pela educação que hoje está regida pelo sistema capitalista e pela ciência que, com seus saberes, define o tipo ideal de escola e de aluno de que a sociedade de consumo necessita.

A possibilidade de escapar a essa disciplinação, a essa normatização, talvez venha pela via do sintoma, como a própria produção do sujeito no sentido de sua singularidade.

O sintoma, como elemento psicopatológico por excelência, para Freud (1980, p.1917) não se con-funde com a doença, pois ela é a capacidade de for-mar sintomas, que são por sua vez manifestações do inconsciente. Se a doença é um sentido prático e o sentido do sintoma comporta um “para quê”, tem primazia o uso que se faz dele.

O sintoma pode ser encarado como uma inven-ção, uma solução, à medida que circunscreve a parti-cularidade do sujeito, tem um valor de uso, enquanto portador de uma mensagem, tem um valor de troca. (MILLER, apud BASTOS, 2004).

Entende-se que o sintoma analítico não pode ser confundido com o sintoma “socializado”, pois este se nutre dos diagnósticos médicos, que apoiados nos discursos dominantes, não podem produzir muito mais além do silêncio. Não sou mais o João, Ana ou Maria, “sou um hiperativo”, “sou um desatento”.

O sintoma socializado, apoiado nos discursos da Ciência, avessos ao particular e à subjetivação, vem crescendo nos ambientes escolares, forçando a se pensar em medidas de ordem social que possam mini-mamente denunciar a lógica que constantemente leva a pensar no impossível. Como bem aponta Pacheco

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(2005, p.155): “Sintomas sociais, estes, que respon-derão pelas mais altas realizações da cultura humana, mas, também, por outro lado, pelas exclusões e pre-conceitos de toda ordem (...)”.

A ciência atual parece se remeter quase exclusiva-mente a padrões biológicos, fisicalistas, que, apoiados em critérios de normalidade, acabam por reduzir a constituição da subjetividade.

É um momento sócio-histórico, em que surge a troca de segurança pela liberdade desregulada, descri-to por Bauman (1998) como uma crônica incerteza e a necessidade de constituições pessoais flexíveis para sobreviver em um mundo sem indicadores estáveis; em que o trabalho e a família continuam a ser pode-rosas matrizes na construção da subjetividade, família esta que, segundo Lash (1991) vem esvaziando-se pela anulação da competência parental no cuidado com os filhos e enfraquecendo-se em seu potencial formador à medida que está sendo privada de sua função de

socialização de suas crianças; que obriga os ambientes educacionais a passar por reformas a fim de preparar o cidadão trabalhador para o mundo capitalista como ser que aprende a conhecer, aprende a ser, aprende a fazer e aprender a aprender, pilares da Educação do século XXI, segundo a UNESCO. Onde sobra espaço para o sujeito estar?

Num mundo em que experimentar as difíceis de-cisões de ser, o esforço de escolher e a possibilidade de viver, próprias das condições da existência, são minimizadas por um discurso globalizado economica-mente que transforma os homens em objetos, conta-bilizados pelos seus sucessos no aqui e agora, talvez sobre espaço para o sujeito estar pela via do sintoma, como um caminho possível na constituição de sua subjetividade. Caminho este que não se assemelha nem na urgência nem na emergência prometida pelo mundo contemporâneo.

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DIFICULDADES MOTORAS NA INFÂNCIA: PREVALÊNCIA E RELAÇÕES COM AS CONDIÇÕES SOCIAIS E ECONÔMICAS

MOTOR DIFICULTY IN INFANCY: PREVALENCE AND RELATIONS WITH SOCIAL AND ECONOMICAL CONDITIONS

Rodrigo teixeira*Roberto Gimenez**

dalton lustosa de oliveira***luiz eduardo Pinto Bastos tourinho dantas****

* Universidade Nove de Julho/Curso de Educação Física ** Universidade Cidade de São Paulo/Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor (GECOM)/Universidade Nove de Julho*** Universidade Nove de Julho/Universidade Presbiteriana Mackenzie/Grupo de Estudos sobre o Comportamento Motor (GECOM)**** Universidade de São Paulo/Grupo de Estudos sobre o Desenvolvimento da Ação e Intervenção Motora

RESUMO

De acordo com a literatura, crianças com problema de co-ordenação correspondem de 5% a 6% das crianças nor-mais. O termo adotado pela Associação Americana de Psi-quiatria corresponde a Transtorno no Desenvolvimento da Coordenação (APA1 1995). São diversos os testes utilizados para a identificação desse problema. Um dos testes mais utilizados no mundo para a identificação de crianças com dificuldades motoras é o Movement Assessment Battery for Children (MABC). Esse teste ainda não foi suficiente-mente aplicado no Brasil. O presente estudo tem como objetivo investigar a aplicabilidade do teste MABC para a identificação de crianças com Transtorno no Desenvolvi-mento da Coordenação. Além disso, buscou-se investigar também as possíveis relações entre os problemas de coor-denação motora e a classe sócio-econômica das crianças. Tomaram parte deste estudo 43 crianças na faixa etária en-tre 9-10 anos de idade. O teste possibilitou a avaliação de destreza manual, habilidades com bola, equilíbrio estático e dinâmico. Os dados referentes à prevalência das crianças foram compatíveis entre escola pública e privada. Entretan-to, a natureza das dificuldades motoras depende de fatores econômicos.

DESCRITORES: Transtorno das habilidades motoras. Educação física e treinamento. Inclusão social.

ABSTRACT

In accordance with literature, children with coordination problem correspond to 5% 6% of the normal children. The term adopted by the American Association of Psychiatry corresponds to the Developmental Coordination Disorder (DCD) (APA1 1995). The tests used for the identification of this problem are diverse. One of the most used tests in the world for the identification of children with motor di-fficulties is the Movement Assessment Battery for Children (MABC). This test was not applied in Brazil yet. This present study has as objective to investigate the applicability of the test MABC for the identification of children with Develo-pment Coordination Disorder (DCD). Moreover, it also intends to investigate the possible relations between the problems of motor coordination and the partner-economic classroom of the children. Thus, 43 children with 9-10 years of age were selected. The test made possible the evaluation of manual dexterity, abilities with ball, static and dynamic balance. The data appointed that the prevalence of the children is compatible between public and private schools. However, the nature of the motor difficulties depends on economical factors.

DESCRIPTORS: Motor skills disorder. Physical education and training. Social inclusion.

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Teixeira R, gimenez R, Oliveira DL, Tourinho LEPBD. Dificuldades motoras na infância: prevalência e relações com as condições sociais e econômicas • São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 25-34

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IntRoduçãoO desenvolvimento motor é marcado pela simila-

ridade entre os seres humanos. Entretanto, existem casos que ultrapassam os limites dentro do que é determinado normal para o desenvolvimento. Assim, surgem as pessoas que são consideradas muito habili-dosas ou muito desajeitadas.

Pessoas com muita habilidade motora vêm sen-do estudadas pelos pesquisadores do treinamento esportivo. Por outro lado, as crianças consideradas desajeitadas normalmente são alvo de investigação por parte de pesquisadores da área da aprendiza-gem motora, da educação e psicologia. Os problemas motores enfrentados pelas crianças com dificuldades motoras acabam sendo atribuídos a desordens de ordem psicológica ou neurológica (Missiuna10 1994). Porém, existem crianças que não têm nenhum diag-nóstico psicológico ou neurológico, mas que, reco-nhecidamente, apresentam problemas motores. No início, essas crianças eram chamadas de atrapalhadas, desajeitadas. Posteriormente, elas foram classificadas como portadoras de um transtorno no desenvolvi-mento motor. Desde o início do século XX já se vem estudando sobre essa síndrome, todavia somente na década de 60 pesquisadores se aprofundaram nos es-tudos e apontaram evidências sobre a problemática.

O Transtorno no Desenvolvimento da Coorde-nação (TDC) pode acarretar alguns problemas para a criança, uma vez que o nível de proficiência moto-ra é um elemento importante para a integração no grupo social. Essa desordem, até onde se sabe, não tem nenhum diagnóstico, nem evidências de ordem psicológica e neurológica, ou seja, é uma síndrome restrita às funções motoras. A criança diagnosticada com transtorno do desenvolvimento da coordenação tem dificuldade para exercer as atividades básicas da vida diária, como abotoar uma camisa, amarrar o ca-darço do tênis, manipular e transportar objetos ou locomover-se pelo ambiente (Santos et al.14 2004; Pe-tersen e Oliveira13 2004). No recinto escolar, reco-nhecidamente essas crianças apresentam problemas de caligrafia e de interação com o grupo. Grande par-te das vezes, trata-se daquela criança que está sempre isolada do grupo e não tem muito contato com os colegas ou então pode se tornar a mais “bagunceira” da turma para obscurecer suas reais dificuldades. As crianças portadoras dessa desordem normalmente

se afastam das atividades esportivas coletivas e pro-curam atividades individuais (Jogmans et al.6 2003). Alguns estudos mostraram que as crianças conside-radas TDC apresentam grande probabilidade de se tornarem indivíduos tímidos, com autoestima baixa e, na adolescência, com possibilidade de apresentarem problemas de agressividade e de ordem acadêmica.

É fundamental que todos os profissionais envolvi-dos com a área da educação conheçam os possíveis impactos dessas dificuldades, bem como os possíveis fatores de ordem social, cultural e econômica que permeiam o problema. Portanto, prevalece a neces-sidade de estudos que possibilitem investigar essas crianças. Considerando-se que o seu problema seja de natureza motora e com impacto nas atividades da vida diária, a discussão da relação entre os problemas de coordenação e as características do ambiente me-recem mais atenção.

De acordo com os vários trabalhos essas crian-ças podem ou não ser identificadas, dependendo do contexto ambiental. Além disso, essa discussão tam-bém não pode deixar de levar em consideração as possíveis influências sócio-culturais e econômicas no desenvolvimento motor. Recomenda-se que a criança receba determinados estímulos em certos períodos da vida, nos quais ela estaria mais vulnerável à apren-dizagem, conhecido como períodos críticos. Grande parte das vezes, o meio econômico e social acaba re-presentando uma variável determinante no processo de desenvolvimento motor.

De acordo com Gallahue e Ozmun4 (2001), o de-senvolvimento motor é uma alteração contínua no comportamento motor ao longo do ciclo de vida. O desenvolvimento seria fruto de uma interação entre organismo e ambiente; portanto, quando se tem um ambiente favorável pode-se ter melhor aproveita-mento no desenvolvimento motor. O organismo ex-ploraria os recursos contidos no meio ambiente para construir seu próprio comportamento e, assim, tare-fas e ambiente moldariam e seriam moldados pelas ações dos indivíduos (Perrotti e Manoel12 2001).

O desenvolvimento motor na infância caracteriza-se pela aquisição de um amplo espectro de habilida-des motoras, o que possibilita à criança um amplo do-mínio do seu corpo em diferentes posturas (estáticas e dinâmicas), locomover-se pelo ambiente de várias formas (andar, correr, saltar, etc.), manipular objetos

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e instrumentos diversos (receber uma bola, arremes-sar uma pedra, chutar, escrever, etc.), estabilização (giros, apoios, rolamentos, etc.). Essas habilidades básicas são requeridas para a condução de rotinas diárias em casa e na escola, como também servem a propósitos lúdicos, tão característicos da infância. As-sim, a criança reuniria condições para combinar esses padrões, ou seja, seria capaz de correr e saltar, cor-rer e chutar, saltar e bater, etc. (Santos et al.14 2004, Böhme3 1988; Jiménez e Ugrinowitsch 2002).

Essas habilidades básicas são vistas como alicerce para a aquisição de habilidades motoras e especializa-das na dimensão artística, esportiva, ocupacional ou industrial (Tani18 1988).

A restrição das tarefas e do meio ambiente são exemplos de aspectos que afetam os processos de desenvolvimento e os padrões fundamentais do mo-vimento. As experiências anteriores da criança cor-respondem a outro fator importante. Magill7 (1998), por exemplo, sugere que a aprendizagem ocorre com maior eficiência em alguns períodos de vida e para a aquisição de novas habilidades motoras é fundamental que, anteriormente, criança tenha ultrapassado ade-quadamente outras experiências anteriores.

Tani18 (1998) destaca que as características do ambiente podem ser muito influenciadas por opor-tunidades oriundas do contexto sócio-econômico e cultural.

Dentre esses fatores, vale ressaltar que os de ordem econômica e cultural podem exercer grande influência. Um dos principais aspectos é a renda fa-miliar, porque, quando se tem salário muito baixo, se tem dificuldade de ter boa educação, a alimentação é inadequada, a habitação é precária e se tem um baixo nível de qualidade de vida e a criança pode ser limi-tada numa série de possibilidades (Marcondes9 1981, Bee2 1996, Stabllini Neto et al.16 2005). O rendimen-to mensal familiar está intimamente relacionado com o nível de instrução dos pais, com uma condição de moradia melhor, uma alimentação mais adequada. No entanto, quando se tem no maior rendimento mensal, pode-se propiciar melhor condição de vida.

De acordo com Papalia e Olds11 (2000), a pobreza traça uma típica trajetória de sofrimento psicológico para os adultos, resultando em problemas na criação dos filhos. Alguns estudos vêm mostrado que famílias consideradas de baixa classe econômica são compos-tas por um número muito maior de pessoas quando

comparadas com a média populacional, com menor intervalo de tempo entre um filho e outro e a mo-radia nem sempre tem acomodações adequadas para todos. Com relação à moradia, o saneamento bási-co, que muitas vezes é precário, pode trazer diversos problemas de saúde, pelo fato do abastecimento ir-regular, e as instalações sanitárias têm relação dire-ta com o nível de saúde da população (Marcondes9 1981). Portanto, o saneamento é fundamental para evitar algumas doenças que podem interferir no de-senvolvimento de uma criança.

Existe forte argumento na literatura de que pais que vivem em condição de pobreza, conversam me-nos com seus filhos e, na maioria das vezes, não têm condições de oferecer entretenimento que estimule o desenvolvimento intelectual. De modo geral, esses pais são mais rígidos com castigos físicos e mais auto-ritários, o que contribui de forma considerável para minimizar a tomada de decisão por parte das crian-ças. Normalmente, observam o mau comportamento das crianças e ignoram o bom comportamento. Assim seus filhos acabam tendo problemas sociais, emocio-nais e comportamentais (Bee2 1996, Papaliae Olds11 2000). Esses fatos podem estar relacionados com a criação que esses pais podem ter recebido na sua in-fância.

Malina e Boucahrd8 (2003), entretanto, enfatizam que a criação permissiva de pais de baixa classe eco-nômica pode contribuir para maior liberdade para a prática de atividade motora por parte dos filhos. Na idade escolar, as crianças de classe econômica baixa apresentavam maior liberdade de movimento, quan-do comparadas com crianças de classes mais favore-cidas. Assim, assume-se que com a maior liberdade das crianças de classes economicamente mais baixas haveria a oportunidade de aprimorar habilidades mo-toras. Por outro lado, reconhece-se que as crianças de família de classe econômica favorecida têm opor-tunidade de vivenciar atividades motoras em contex-to sistematizado, como acontece nas “escolinhas de esporte” ou nos programas extra-curriculares dos colégios particulares.

Invariavelmente, quando se levam em consideração questões dessa natureza, a identificação de crianças com dificuldades motoras em diferentes contextos, tomando-se como base o critério sócio-econômico, é de grande relevância. O estudo de Sugden e Wri-ght17 (1998), por exemplo, avaliou a lista de checagem

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do teste ABC do movimento em escolas do Singa-pura. As escolas eram organizadas e administradas por quatro zonas, sendo escolhidas cinco escolas de cada zona. Foram selecionadas 212 crianças de 6 a 9 anos de idade, assegurando-se o mesmo número de meninos e meninas. Foi evidenciado um alto nível de correlação, num montante de 120 listas de checagem, no que diz respeito ao teste e ao re-teste que ocor-reu duas semanas após a aplicação do teste. Apesar da correlação dos componentes, houve uma exceção para meninas de oito anos na seção 2 da lista que ana-lisava a criança em movimento e o ambiente estável.

Esse estudo mostrou que os professores tiveram dificuldade de comentar sobre as atividades que esta-vam fora do contexto escolar. Por exemplo, 30% dos professores não conseguiram comentar as atividades com bloco, pinos, e quebra-cabeça, assim como 50% foram incapazes de responder se as crianças utiliza-vam brinquedos com pedal (carrinho, moto ou bici-cleta). Portanto, os autores admitiram que há alguns itens da lista de checagem que necessitam serem ajus-tados de acordo com a realidade cultural.

Segundo os autores, os resultados foram consi-derados satisfatórios para serem usados em Singapu-ra, pois foram identificados 4,72% de crianças tendo problemas de movimento e 10,85% como grupo de risco, e esses resultados foram úteis para que profes-sores e autoridades escolares ficassem atentos aos problemas que certas crianças enfrentavam e, até o momento, recebiam pouca atenção.

Considerando o âmbito nacional, Souza et al.16 (2004) aplicaram o teste Movement ABC na na região de Manaus, buscando traçar um perfil das crianças das zonas rurais e urbanas. Foram aleatoriamente sele-cionadas 240 crianças de sete e oito anos de idade de ambos os sexos, sendo 195 da zona urbana e 45 da zona rural. Os ambientes sócio-culturais e eco-nômicos das crianças e oportunidades eram a rigor diferentes. Por exemplo, as crianças da região rural tinham condições precárias tanto nas residências quanto nas escolas, onde nem sequer havia quadra para a realização das aulas de educação física, que não ocorriam com freqüência, enquanto que nas escolas da zona urbana havia uma estrutura física apropriada para as crianças, pois dispunham de biblioteca, pátio, quadra esportiva coberta e com aulas de educação física com frequência.

De acordo com as zonas em que moravam, as crianças tinham oportunidades diferentes em relação ao ambiente, porque a zona rural era composta pelas áreas da Rodoviária, localizada à beira da estrada, ao passo que a Ribeirinha era localizada à beira de um rio onde o acesso só ocorre por meio de barco ou canoa. As crianças utilizavam o rio para realizarem tarefas motoras relacionadas à higiene pessoal, para brincar e pescar. Além disso, elas tinham o hábito de colher frutas nas árvores, local também utilizado para brincarem. Portanto, era o local onde desenvolviam o seu repertório motor, o que indica um ambiente, ob-viamente, diferenciado das crianças da zona urbana.

As crianças da zona urbana apresentavam um am-biente mais favorável à aprendizagem de algumas ha-bilidades manuais e com bola, pelo fato de terem nas escolas computadores, ludoteca, playground, quadras e pátios e um profissional de educação física minis-trando aula para elas, possibilitando-lhes novas expe-riências motoras.

Souza et al.15 (2007) observaram que as crianças das zonas rurais e urbanas tinham uma diferença só-cio-econômica muito grande e, mesmo assim, obtive-ram resultados semelhantes nos testes.

Com relação à porcentagem, foram identificados 4,4% das crianças da zona rural como sendo TDC e na zona urbana 11,8% de crianças diagnosticadas como TDC. No entanto, esses resultados possibilitam dizer que o teste ABC do movimento não é abrangente o suficiente em diferentes ambientes, visto que se espe-ra encontrar, com o teste, em torno de 5% ou 6% da população como sendo TDC.

Com relação aos resultados, não foi encontrada nenhuma diferença quando comparadas às zonas ru-rais e urbanas e suas subzonas, e o autor concluiu que, apesar de terem sido verificadas porcentagens diferentes nas três categorias, os resultados permiti-ram concluir que crianças de ambientes diversificados obtiveram desempenho semelhante no teste ABC do movimento em outras partes do mundo (Souza et al.15 2007).

Contudo, ainda persistem dúvidas acerca da apli-cabilidade do teste Movement ABC em crianças bra-sileiras. Outro aspecto diz respeito ao impacto do contexto sócio-econômico (ambiental) no processo de desenvolvimento motor de crianças com dificulda-des motoras. Em especial, é possível que sejam iden-

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tificadas crianças com dificuldades motoras tanto em classes mais favorecidas quanto nas menos, porém é esperado que existam diferenças na natureza das dificuldades motoras encontradas nesses grupos. As-sim, o presente trabalho teve por objetivo investigar a aplicabilidade da bateria motora do teste Movement ABC, bem como verificar as possíveis associações de crianças com dificuldades motoras com a classe só-cio-econômica.

MateRIal e MÉtodoA amostra correspondeu a 43 crianças de 9 e 10

anos de idade, regularmente matriculadas nas esco-las públicas e privadas da região da Zona Norte da cidade de São Paulo. Foi solicitado aos professores generalistas e de educação física que selecionassem as crianças que apresentassem dificuldades de mo-vimento. Foi informado aos professores que teriam que selecionar as crianças que apresentassem proble-mas em tarefas de manipulação, tarefas com bola e tarefas de equilíbrio. A participação das crianças teve o consentimento de seus pais ou responsáveis, e de seus respectivos estabelecimentos de ensino.

O teste aplicado foi o Movement ABC, que é divi-dido em quatro versões. Cada versão corresponde a uma faixa etária (4-6 anos, 7-8, 9-10, 11-12). Todas as versões apresentam tarefas de destreza manual, habi-lidades com bola e equilíbrio estático e dinâmico. No presente estudo, a versão utilizada correspondeu à faixa etária de 9-10 anos. As tarefas utilizadas corres-ponderam à movimentação de pinos, rosquear porca no parafuso e tracejar uma flor (Destreza Manual); recepção de uma bola de tênis com as duas mãos, lançamento de um saco de feijão em uma caixa alvo (Habilidade com Bola); equilíbrio em uma só perna sobre uma placa (Equilíbrio Estático); saltitar por qua-drados e equilibrar uma bola sobre a placa de madeira (Equilíbrio Dinâmico).

Os escores no teste têm como base uma escala de zero a cinco. O escore zero indica o sucesso e o escore cinco o insucesso. A identificação das crianças leva em consideração a soma de todos os escores. Após a aplicação do teste, as crianças que apresen-taram na soma de todos os escores um desempenho igual ou superior a 13.5 foram classificados com TDC. As crianças que obtiveram escore inferior a 13.5 fo-ram consideradas normais.

Como forma de verificar os possíveis impactos

dos contextos econômico e sócio-cultural sobre o processo de desenvolvimento motor, foi aplicado um questionário sobre o nível de atividade física. Além disso, foi realizada uma entrevista com cada criança identificada com TDC para possibilitar uma análi-se sobre a natureza das atividades cotidianas desses grupos. Mais especificamente, o questionário corres-pondeu a questões fechadas que pretendiam mapear a renda familiar. O levantamento sócio-econômico possibilitou a divisão das crianças estudadas em dois grupos com características diferentes: Escola Pública e Privada. Outro aspecto investigado correspondeu ao nível de atividade física praticado pelas crianças. Em especial, as questões foram direcionadas à com-preensão da natureza da atividade física praticada, do contexto em que ocorre a prática, assim como da frequência e duração das atividades praticadas.

ReSultadoSOs resultados foram analisados tomando-se como

base a classe econômica. Desse modo, procurou-se diferenciar os dados obtidos em escolas públicas e privadas.

Figura 1 - Prevalência de crianças com Transtorno no Desen-volvimento da Coordenação em função da classe econômica.

É possível observar (Figura 1) que a Escola Públi-ca apresentou um percentual de 5.24% das crianças identificadas com Transtorno no desenvolvimento da Coordenação. Por outro lado, na Escola Privada a porcentagem chegou a 2.66%. A média entre escola pública e privada atingiu 4.16%. Essa porcentagem foi calculada a partir do total de alunos que estavam de-vidamente matriculados nas escolas e que possuíam a mesma faixa etária dos alunos testados.

A condução de uma análise de variância para dados não paramétricos de Krukal Wallis não apontou dife-

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renças entre os grupos de Escola e Pública e Privada, o que sugere a mesma prevalência do problema.

nação.A Figura 3 apresenta os valores de média do es-

core parcial de destreza manual. Na escola pública, as crianças identificadas com Transtorno no desenvolvi-mento da Coordenação tiveram uma média de 9.35. E com relação à escola particular, as crianças com Transtorno no Desenvolvimento da Coordenação ti-veram a média de 8.6. Pode-se notar que as crianças das escolas públicas apresentaram uma média supe-rior à das crianças da escola particular: Kruskal Wallis X2 (2, n=43) = 72,24 p=0,001.

Deve ser lembrado que o escore parcial em des-treza manual é composto por três tarefas, quais se-jam: a) tarefa de mover o pino; b) tarefa de rosquear o parafuso; c) tracejar a flor. Vale ressaltar ainda que os escores mais altos sugerem maior dificuldade mo-tora, conforme o teste Movement ABC.

A análise pormenorizada do desempenho em cada tarefa de manipulação não indica diferenças entre os grupos. Porém, nota-se uma tendência das crianças de escola pública de apresentarem desempenho inferior na tarefa de mover os pinos quando comparadas às crianças de escola privada. Por outro lado, no que diz respeito à tarefa de rosquear as porcas no parafuso as crianças de escola privada apresentaram desempenho inferior ao das crianças da escola pública. Finalmente, quando comparadas na tarefa de tracejar a flor, as crianças da escola pública apresentaram escores mais altos, o que sugere pior desempenho das crianças da escola privada.

Figura 2 - Prevalência entre gêneros em função da classe econômica.

Com relação ao percentual entre meninos e me-ninas identificados com Transtorno no Desenvolvi-mento da Coordenação, nota-se que, na escola pú-blica, houve uma prevalência maior de meninos. No entanto, na escola privada, o número de meninas foi superior ao de meninos. A condução de uma análise de variância para dados não paramétricos indicou que houve diferença substancial na prevalência do proble-ma em meninos, na comparação entre Escola Pública e Privada: Kruskal Wallis X2 (2, n=43) = 42,27, p=0,002. Um fator que deve ser levado em consideração é que as crianças participantes dos testes foram seleciona-das pelos professores generalistas e por professores de educação física. Na escola privada, houve a parti-cipação de todos os professores. Neste caso, foram selecionadas para o teste as crianças que estavam apresentando dificuldade nas tarefas em sala de aula e nos contextos típicos de aulas de educação física. Nas escolas públicas, o processo de seleção envolveu apenas as professoras generalistas. Uma das premis-sas é que as professoras de Escola Pública podem ter indicado crianças com problemas de comportamento e não exatamente com algum problema de coorde-

Figura 3 - Escores de destreza manual das crianças com TDC em Escolas Públicas e Privadas.

Figura 4 - Escores de Habilidades com Bola de crianças com TDC de escola Pública e Privada.

Conforme a Figura 4, nas tarefas com bola exis-te diferença nítida nas habilidades com bola entre os grupos. Crianças que foram identificadas como TDC nas escolas públicas atingiram uma média de 4.7, en-quanto que para as de escola privada a média foi de 4,4. A análise de variância para dados não paramé-

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tricos de Kruskal Wallis apontou diferenças entre os grupos Kruskal Wallis X2 (2, n=41) = 89,34 p=0,000.

A tarefa motora das habilidades com bola é com-posta por duas tarefas, quais sejam: a) lançar a bola na parede com uma das mãos e receber com as duas; b) lançar o saco de feijão.Comparando o escore obtido em cada uma das tarefas, as crianças da escola públi-ca tiveram melhor desempenho na tarefa de lançar e receber a bola, e na tarefa de jogar o saco de feijão na caixa as crianças da escola privada tiveram me-lhor desempenho. Esses resultados podem estar re-lacionados às oportunidades que são oferecidas pelo ambiente que essas crianças frequentam, o que leva a pensar no papel do contexto escolar no desenvol-vimento motor.

p=0,000.Esses achados também despertam uma discussão

a respeito dos possíveis impactos do contexto sócio-cultural nos indivíduos, e sobre suas possíveis associa-ções com fatores de ordem sócio-econômica.

Reconhecidamente, uma das variáveis de grande impacto para o entendimento do papel do contexto das crianças no desenvolvimento motor refere-se à possibilidade de prática de atividade motora em con-textos sistematizados fora do ambiente escolar. Em especial, isso seria representado pela participação em programas de natação ou escolinhas de esporte.

Figura 5 - Escores de equilíbrio estático e dinâmico de crian-ças com TDC de Escola Pública e Privada.

No que diz respeito à variável equilíbrio, as crian-ças da escola pública tiveram uma média de 4,6 e as de escola privada uma média de 5,7. Mais especifica-mente, foram encontradas diferenças estatisticamen-te significativas entre os grupos Kruskal Wallis X2 (2, n=40) = 12,21 p=0,002.

Essa capacidade de equilíbrio estático e dinâmico é caracterizada por três tarefas, das quais uma cor-responde a equilíbrio estático e duas a equilíbrio di-nâmico. A tarefa de equilíbrio estático corresponde a equilibrar-se sobre uma placa de madeira e a de equilíbrio dinâmico é composta pela tarefa de saltitar pelo quadrado e equilibrar a bola de tênis numa ban-deja de madeira.

Quando analisadas separadamente por tarefa, no equilíbrio estático não houve diferença entre as crianças das duas escolas. Por outro lado, no que diz respeito a equilíbrio dinâmico, as crianças de escola pública apresentaram um desempenho consideravel-mente superior Kruskal Wallis X2 (2, n=39) = 51,53

É possível notar que os alunos das escolas públicas estão frequentando menos atividade motora fora do contexto escolar (Figura 6). Os dados sugerem que 90% dos alunos identificados com TDC não partici-pam de nenhum programa sistematizado de atividade motora. No entanto, 75% das crianças de escola pri-vada praticam. Invariavelmente, essa diferença entre as crianças da escola pública e privada estaria relacio-nada à condição sócio-econômica em que as crianças se enquadram. A aplicação de uma análise de variân-

Figura 6 - Crianças que praticam atividade física fora do contexto escolar.

Figura 7 - Natureza de atividade motora sistematizada praticada pelas crianças.

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cia apontou diferenças significativas entre os grupos Kruskal Wallis X2 (2, n=42) = 11, 23 p=0,000.

Os dados também indicam que as crianças de es-cola privada praticam atividades esportivas de natu-reza individual. É possível observar, ainda, que todas as crianças com TDC de escola privada praticam ati-vidade física fora do contexto escolar. A modalidade mais recorrente corresponde à natação que, por se tratar de uma modalidade caracterizada por habilida-des motoras fechadas, não envolve grande demanda de timing. Essa constatação vai ao encontro de dados presentes na literatura, que sugerem preferência de crianças com dificuldades motoras pela participação em contextos de prática de modalidades esportivas individuais, nas quais, em geral, prevalece mais esta-bilidade ambiental (Petersen e Oliveira13 2004). Por outro lado, dentre os alunos da escola pública que re-alizam atividade motora, nenhum pratica modalidades individuais. A modalidade mais procurada é o futebol. Vale destacar que, apesar da modalidade esportiva do futebol ser caracterizada por habilidades motoras abertas, a escolha pode estar associada às oportuni-dades que derivam da condição sócio-econômica dos indivíduos.

classificadas como TDC da escola privada, nota-se que 100% praticam atividades extracurriculares no âmbito da própria escola, local com ampla estrutura para a prática de modalidades esportivas. Além disso, 25% dessas crianças praticam também em clubes o que configura uma ampliação do envolvimento com a prática esportiva. A escola pública não proporciona às crianças a oportunidade de praticar modalidades esportiva de forma extracurricular. Portanto, todas elas praticam atividades em parques municipais.

conSIdeRaçÕeS FInaISNão existe influência do contexto sócio-econô-

mico na prevalência de crianças com dificuldades motoras. A comparação das duas escolas não indi-cou diferenças na quantidade de crianças identificadas com dificuldades motoras por meio do instrumento utilizado.

Entretanto, foi detectada uma influência na nature-za das dificuldades motoras encontradas nas crianças. Essas diferenças poderiam ser atribuídas a diferenças sócio-culturais da escola, que, por sua vez, podem es-tar associadas às diferenças de contexto econômico. Em especial, as crianças das escolas particulares apre-sentaram mais dificuldades motoras em habilidades de manipulação, ao passo que as das escolas públicas, em tarefas de manipulação.

Outro aspecto diferenciador corresponde justa-mente à tipologia de prática corporal das crianças. As crianças de escola pública geralmente praticam atividades extracurriculares de natureza coletiva, fun-damentalmente em contextos de estabelecimentos públicos. Por outro lado, as crianças de escolas pri-vadas apresentam tendência de praticar modalidades esportivas individuais em contextos de escolinhas de esporte, academias ou clubes privados.

O presente estudo se propôs a mapear também a quantidade de prática semanal de atividade motora. De modo geral, constatou-se que nas crianças de es-cola privada a frequência média corresponde a duas vezes por semana, com duração de aproximadamente uma hora por dia. Por outro lado, na escola pública a prática ocorre uma vez por semana, aos finais de semana e dura em torno duas horas.

Procurou-se investigar, ainda, o local utilizado para praticar atividades motoras. Dentre as crianças

Figura 8 - Quantidade semanal e duração das sessões de prática de crianças com TDC de Escola Pública e Privada.

Figura 9 - Local de prática das atividades realizadas pelas crianças TDC de escolas públicas e privadas

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Tais constatações despertam a reflexão sobre os projetos pedagógicos das escolas, sobre as possibili-dades de intervenção motora por meio das aulas de Educação Física. A escola, de modo geral, necessita rever seu papel. No que tange especialmente à Esco-la Pública, verifica-se a necessidade de se repensar o papel desse contexto, cuja proposta seria prioritaria-mente voltada para a inclusão e que operacionalmen-te pode contribuir para a exclusão social.

Esses dados também vão ao encontro da ideia de que o contexto sócio-econômico desempenha um pa-pel primordial no desenvolvimento motor das crian-

ças, dadas as oportunidades criadas pelos contextos sistematizados associados à condição de supremacia econômica.

Futuros estudos devem retomar o problema, verificando a prevalência numa região maior da cida-de de São Paulo, servindo-se de um número maior de escolas e alunos investigados. Esses trabalhos devem atribuir atenção especial aos possíveis impactos dos contextos de intervenção e suas possíveis relações com a qualificação dos profissionais e com a realidade sócio-econômica.

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* Anais do X Colóquio Internacional de Gestão Social. Desenvolvimento e Gestão Social de Territórios, CIAGS - Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia, no período de 11 a 13 de dezembro de 2006.

Mariano Yoshitake*

Moacyr c. costa Júnior**

Marinette Santana Fraga***

* Doutor em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP. Atualmente é Professor da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID.** Graduado em Contabilidade, Mestrado em Contabilidade pela FVC/BA; Docente em cursos de graduação e Pós-Graduação; Atualmente é servidor público na Prefeitura Municipal de Contagem*** Mestra em Contabilidade pela Fundação Visconde de Cairu – FVC/Bahia. Leciona nas Faculdades Integradas Funcec – João Monlevade/MG. Professora e pesquisadora na área contábil.

O CUSTO SOCIAL E O CONTROLE DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS*

THE SOCIAL COST AND CONTROL OF URBANE SOLID WASTES

ABSTRACT

The aim of this paper is to present the Sequence-plan of costing from the Theory of Management Control as a tool of management control in the integrated management of municipal solid wastes. The theoretical framework deals with concepts and outlines the interactions on the topic. Proposes a Sequence-plan with the relevant operational ac-tivities and a sequence cost model that includes the actions, their cost items and the measurement criteria to highlight the costs of services sweeping, curbside and landing. Thus, the Sequence-plan of costs, by means of defined events must then not only provide the controllability of costs, as well as the generation of information and evaluation of ac-tions involved.

DESCRIPTORS: Sequence-plan. Sequence cost model. Theory of management control. Solid wastes.

RESUMO

O objetivo deste trabalho é apresentar o Plano-seqüência de Custos da Teoria do Controle Gerencial como uma ferramenta de controle na gestão integrada dos resídu-os sólidos urbanos. A fundamentação teórica versa sobre conceitos e expõe as interações existentes sobre o tema. Propõe-se um Plano-seqüência com as atividades opera-cionais relevantes e um modelo de custeio seqüência que contempla as atividades, seus itens de custos e os critérios de mensuração para se evidenciar os custos dos serviços de varrição, coleta domiciliar e aterragem. Assim, o Plano-se-qüência de Custos, por meio dos eventos definidos precisa, então, não só proporcionar a controlabilidade dos custos, como também a geração de informações e avaliação das atividades envolvidas.

DESCRITORES: Plano-sequencia. Modelo de custo seqüência. Teoria do controle gerencial. Resíduos sólidos.

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1 - IntRodução O objetivo deste trabalho é apresentar o Plano-

sequência de Custos da Teoria do Controle Geren-cial como uma ferramenta de controle na gestão inte-grada dos resíduos sólidos urbanos. A fundamentação teórica versa sobre conceitos e expõe as interações existentes sobre o tema. Propõe-se um Plano-sequ-ência com as atividades operacionais relevantes e um modelo de custeio-sequência que contempla as ati-vidades, seus itens de custos e os critérios de men-suração para se evidenciarem os custos dos serviços de varrição, coleta domiciliar e aterragem. Assim, o Plano-sequência de Custos por meio dos eventos definidos precisa, então, não só proporcionar a con-trolabilidade dos custos, como também a geração de informações e avaliação das atividades envolvidas.

2 – eStRutuRa e deSenvolvIMentoO êxodo para as áreas urbanas tem aumentado

consideravelmente desde os idos de 1800. Nessa época apenas cinco em cada cem habitantes do mun-do moravam em cidades. De lá para cá, esse número aumentou para quarenta. (DUDA, 2002).

Os Estados Unidos da América – (EUA) lideram o mundo na produção de lixo. Segundo relatórios da Environmental Protection Agency – (EPA, 2001), o órgão de controle ambiental federal dos EUA, cada america-no produz 2,0 kg/dia de lixo, sendo gerado, em todos os EUA, 229 milhões de toneladas/ano de lixo. Essa quantidade é suficiente para encher um comboio de caminhões de lixo dando a volta oito vezes no globo terrestre. Desse total, 56% vão para os aterros, 14% são incinerados e 30% são separados para reciclagem (EPA, 2001).

De acordo com relatórios Indicator Fact Sheet Sig-nals 2001 – Chapter Waste da European Environment Agency – (EEA, 2001), órgão da Comunidade Euro-peia para o meio ambiente, esta gera 1,3 bilhões de toneladas/ano de lixo. Dentro da União Europeia - (UE), países de referência para as políticas sobre re-síduos - Alemanha, Holanda e Suécia - juntos, geram 448 milhões de toneladas/ano de lixo, ou seja, 34% da geração total de lixo da UE. Do total gerado, 67% vão para os aterros, 17% são incinerados e 10% são recuperados e encaminhados para a reciclagem.

No Brasil, a Pesquisa Nacional de Saneamento Bá-sico – (PNSB), realizada pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística – (IBGE, 2000), editada em 2002, mostrou que o crescimento populacional, bem como o aumento do grau de urbanização, não foram acompanhado de medidas necessárias para dar ao lixo gerado por essa população um destino adequado. A mesma pesquisa mostra que o Brasil, com uma po-pulação estimada em 182 milhões de habitantes, gera aproximadamente 83 milhões de toneladas/ano de lixo de origem domiciliar e comercial. Afirma, tam-bém, que, do lixo que chega a ser coletado, 21% são dispostos a céu aberto nos chamados lixões, 38% são destinados para aterros controlados, 36% para ater-ros sanitários, 3% para usina de compostagem e ape-nas uma pequena parcela é separada para reciclagem.

Com a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – (BRASIL, 1997), ocorrida na cidade do Rio de Janeiro em 1992, esta-beleceu-se um compromisso maior dos países par-ticipantes e, nela, os conceitos de “ambientalmente correto” e “desenvolvimento sustentável” ganharam uma dimensão maior. (FERREIRA, 2003).

Desse evento surgiu a Agenda 21, adotada por 178 países, que se destaca como o mais importante pro-tocolo dessa Conferência e reconhece a necessidade de mobilizar atores em níveis global, regional e local para promoção do desenvolvimento sustentável.

A Agenda “está voltada para os problemas pre-mentes de hoje e tem o objetivo, ainda, de preparar o mundo para os desafios do século XXI. Reflete um consenso mundial e um compromisso político no ní-vel mais alto no que diz respeito a desenvolvimento e cooperação ambiental...”

A Agenda 21 preconiza que “as principais cau-sas da deterioração ininterrupta do meio ambiente mundial são os padrões insustentáveis de consumo e produção [...] motivo de séria preocupação, pois tais padrões de consumo e produção provocam o agrava-mento da pobreza e dos desequilíbrios.”

Acrescente-se a isto o questionário aplicado para a 1ª Avaliação Regional 2002 dos Serviços de Manejo de Resíduos Sólidos Municipais nos Países da Amé-rica Latina e Caribe, encomendado pela OPAS/OMS (BRASIL, 2003). Em seu formulário 21 - principais limitações e conquistas para o ordenamento, inte-gração e desenvolvimento do setor, perguntas 21.1 - Principais limitações para o ordenamento, integração e desenvolvimento do setor e 21.2 - Principais con-

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quistas para o ordenamento, integração e desenvolvi-mento do setor que apresentou, conforme Avaliação Regional dos Serviços de Gestão de Resíduos Sólidos 2002 (BRASIL, 2003), em sua parte V: informação se-torial geral, referente à área econômico-financeira o seguinte resultado:

Diante desse cenário, há possibilidades de estudio-sos da ciência contábil virem a dar sua contribuição,

pois não são o objeto da contabilidade os fenômenos ocorridos no patrimônio das células sociais?

Assim, os Contadores, como membros da socie-dade, têm-se voltado para as questões ambientais re-lacionadas com a sustentabilidade, a ecologia, tendo como finalidade estudar e pesquisar para compreen-der como essas questões interagem com a riqueza patrimonial das células sociais. Certamente, hoje os

PONTOS FRACOS Muito grave Grave Moderada Não se aplica

Área econômico-financeira

Reduzido orçamento do governo central e local para a gestão dos resíduos.

X

Escasso conhecimento de benefícios econômicos inerentes a uma gestão adequada de resíduos.

X

Falta de informação confiável sobre custos reais do sistema de gestão de resíduos.

X

Inadequado sistema de faturação e cobrança. X

Baixo nível de cobrança de taxas/tarifas pelo serviço de limpeza pública.

X

Falta de recursos financeiros (recursos orçamentários, créditos ou doações) para realizar investimentos.

X

Quadro 1.1 – Limitações na área econômico-financeira

Fonte: IBGE/PNSB, (2000).

Fonte: IBGE/PNSB, (2000).

PONTOS FORTES Excelente Boa Moderada Não se aplica

Área econômico–financeira

Adequado orçamento do governo central e local para a gestão dos resíduos.

X

Crescente identificação dos benefícios econômicos inerentes a uma gestão adequada de resíduos.

X

Sistema de informação sobre custos reais da gestão de resíduos desenvolvidos ou em processo de desenvolvimento.

X

Sistema de faturação e cobrança adequado. X

Aumento no nível de cobrança de taxas/tarifas pelo serviço de limpeza pública.

X

Recursos financeiros (recursos orçamentários, créditos ou doações) para realizar investimentos identificados e em processo de obtenção.

X

Existência de disposições econômico-financeiras que forneçam segurança ao setor privado para a execução de projetos de investimento e operação de serviços de gestão de resíduos.

X

Quadro 1.2 – Conquistas na área econômico-financeira

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estudiosos da Contabilidade já contribuem, desenvol-vendo teorias e práticas contábeis que corroboram com o desenvolvimento sustentável e a preservação do meio ambiente.

Partindo dessa premissa, o lixo é uma questão sócio-ambiental de extremada urgência a ser gerida de forma integrada pelas Ciências, todas elas dando sua contribuição, a fim de minimizar a degradação do meio ambiente pela geração e destinação do lixo.

Resíduos sólidos urbanosO conceito de lixo e de resíduo pode variar con-

forme a época e o lugar. Depende de fatores jurídi-cos, econômicos, ambientais, sociais e tecnológicos como afirma Calderoni (1998).

A definição e a conceituação do termo resíduo e lixo diferem, também, conforme a situação em que sejam aplicadas.

De fato, lixo é todo e qualquer material descarta-do pela atividade humana doméstica, social e indus-trial. Lixo é tudo que se joga fora, pois para o seu proprietário não tem mais valor.

Já o termo resíduo é uma palavra adotada para designar sobra no processo produtivo e é equivalente a refugo ou rejeito.

Em outras situações, a conceituação de resíduo é equivalente a lixo. Na opinião de Calderoni, é nes-se sentido a definição dada ao termo resíduo pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): “Material desprovido de utilidade pelo seu possuidor. (sic) (Normas Brasileiras Registradas – NBR 12.980, 1993, item 3.84, p. 5)”.

Sob o ponto de vista econômico, lixo é todo pro-duto que não gera mais nenhum benefício ao seu pos-suinte. Ainda, para Calderoni (1998), sob o ponto de vista econômico, resíduo ou lixo é todo material que uma dada sociedade ou agrupamento humano des-perdiça. Isso pode decorrer por várias razões, como, problemas ligados à disponibilidade de informações ou meios para realizar o aproveitamento do produto descartado, inclusive pela falta de desenvolvimento de um mercado para produtos recicláveis.

Os resíduos sólidos são classificados de acordo com a sua origem. O lixo – resíduo sólido urbano – que está sendo tratado neste estudo, segundo a Fun-dação Estadual do Meio Ambiente – (FEAM), órgão ambiental do Estado de Minas Gerais (2002): “É for-

mado por resíduos sólidos gerados num aglomerado urbano excetuados os resíduos industriais perigosos, de serviços de saúde e de portos e aeroportos”. E este pode ser subdividido em:

Lixos domiciliares, gerados das atividades residen-ciais e que apresentam elevado percentual de maté-ria orgânica (da ordem de 60%). São constituídos de restos de alimentação, material de varredura, folha-gens, lodos de fossas sépticas, embalagens, plásticos, vidros, latas, etc.;

Lixo comercial, que é gerado nos estabelecimentos comerciais. Sua composição varia de acordo com as atividades desenvolvidas; no caso de bares, restauran-tes, hotéis, etc., predominam os resíduos orgânicos, já nos escritórios verifica-se a existência de grande quantidade de papéis;

Lixo público, que é formado pelos resíduos re-sultantes das atividades de limpeza das vias e logra-douros públicos. É constituído por resíduos de varri-ção, capina, raspagem, poda, etc.; bem como animais mortos, entulhos de obras, móveis velhos e outros materiais deixados pela população indevidamente nas ruas ou retirados das residências através do serviço de remoção especial.

Acondicionamento do lixoAcondicionamento é a fase na qual os resíduos só-

lidos são preparados pelo gerador do mesmo, de tal modo que possa ser mais facilmente manuseado nas etapas de coleta e destinação final.

O lixo deve ser tratado e disposto em locais afas-tados do seu ponto de geração. D’Almeida e Vilhena (2000), definem que o envio do lixo envolve uma fase interna e outra externa. A primeira, sob a respon-sabilidade do gerador (residência, estabelecimento comercial etc.) compreende coleta interna, acondi-cionamento e armazenamento. A fase externa abran-ge os chamados serviços de limpeza. Essa fase é de responsabilidade das administrações municipais.

VarriçãoA varrição é o conjunto de atividades e procedi-

mentos através do qual se coleta, manual ou mecani-camente, o lixo espalhado em ruas e em logradouros públicos - praças, praias, parques - (BARROS, 1995). Tem como objetivo minimizar riscos à saúde pública; manter a cidade limpa e prevenir enchentes e assore-

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amento dos corpos d’água.

Coleta convencionalA coleta do lixo e o seu transporte até o ater-

ro sanitário são ações de responsabilidade do poder público municipal, de grande visibilidade para a popu-lação, pois impedem a proliferação de vetores trans-missores de doenças que têm no lixo seu habitat.

A NBR-12980 define os diferentes tipos de servi-ços de coleta de lixo: A coleta domiciliar (ou conven-cional), que consiste na coleta do lixo de residências, estabelecimentos comerciais e industriais, cujo volu-me não ultrapasse o previsto na legislação municipal; Coleta de feiras, praias, calçadas e demais equipamen-tos públicos; Coleta de resíduos de serviços de saúde, englobando hospitais, ambulatórios, postos de saúde, laboratórios, farmácias, clínicas veterinárias, etc.

Coleta seletivaA coleta seletiva de lixo é um sistema de recolhi-

mento de materiais recicláveis previamente separa-dos pela fonte geradora - o munícipe.

Os materiais recicláveis tais como papéis, vidros, plásticos e metais devido ao seu potencial econômico são hoje os mais procurados.

A essência da coleta seletiva são os 3R – reduzir, reutilizar, reciclar. Os aspectos positivos da coleta se-letiva são: proporciona boa qualidade dos materiais recuperados, uma vez que estes estão menos con-taminados pelos demais materiais presentes no lixo; estimula a cidadania, pois a participação popular re-força o espírito comunitário; permite maior flexibili-dade, uma vez que pode ser feita em pequena escala e ampliada gradativamente; permite articulações com catadores, empresas, associações ecológicas, escolas, sucateiros, etc. Reduz o volume do lixo que deve ser disposto.

Tratamento e disposição final do lixoEssa fase consiste no local onde se depositará o

lixo proveniente da coleta convencional, tendo-se em vista que a coleta seletiva não é destinada ao ater-ramento. Lixão é o local em que a disposição final do lixo é feita de forma inadequada e se caracteriza pela simples descarga sobre o solo, sem medidas de proteção ao meio ambiente ou à saúde pública. O acondicionamento dos resíduos dessa maneira acar-reta problemas à saúde pública, como a proliferação

de vetores de doenças (ratos, baratas, moscas mos-quitos, etc.), geração de maus odores, poluição do solo e das águas superficiais e subterrâneas.

Outra forma de disposição é o Aterro Controla-do. É um conjunto de ações aplicadas ao local onde existia um lixão. Essa não é a técnica mais recomen-dada, mas preferível ao lixão, pois a poluição gerada é menor. Consiste em alguns princípios da engenharia para confinar o lixo, cobrindo-o com uma camada de material inerte, como exemplo, o uso de terra. A for-ma consagrada na Engenharia Ambiental é o Aterro Sanitário, pois, ao contrário do aterro controlado, é concebido antes de haver a disposição final do lixo. Seguindo todas as diretrizes legais e técnicas para a sua implementação, visa, inclusive, ao uso futuro da área.

Contabilidade governamentalA contabilidade governamental ou pública é um

ramo da ciência contábil que se volta para o patri-mônio das instituições públicas. No Brasil é regida pela Lei 4.320/64, que dita Normas Contábeis para a Administração Pública corroborada com a Lei com-plementar 101/2000, conhecida como Lei de Respon-sabilidade Fiscal.

Andrade (2002) a conceitua como sendo uma ci-ência que registra, controla e estuda os atos e fatos administrativos e econômicos operados no patrimô-nio público de uma entidade. Como se vê, a contabi-lidade é um sistema de informações pertinente que executa e transforma dados em informações que, jun-tamente com os demais sistemas, geram informações que impactam na continuidade do ente público.

Contabilidade de custosA contabilidade é uma ferramenta de gestão. Dela

advêm informações para a tomada de decisões com relação ao patrimônio da entidade. É um elemento de grande significância no sistema de controle para o atingimento dos objetivos e finalidade da adminis-tração.

A Contabilidade de Custos evoluiu com a Revo-lução Industrial (século XVII) dada a necessidade de avaliação de estoques das indústrias. É o ramo da Contabilidade que gera informações para os diversos níveis gerenciais de uma empresa.

Segundo Leone (2000), “[...] como auxilio às fun-ções de determinação de desempenho, de planeja-

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mento e controle das operações e de tomada de de-cisões. A Contabilidade de Custos coleta, classifica e registra os dados operacionais das diversas atividades da entidade [...].”

Assim, a Contabilidade de Custos tem duas fun-ções relevantes definidas por Martins (2003): o au-xílio ao controle e a ajuda às tomadas de decisões. Ainda, segundo Berliner e Brimson (1992):

A meta de um sistema é gerar informações que auxiliem as empresas a utilizarem seus recursos lucra-tivamente, para produzir serviços ou produtos que sejam competitivos em termo de custos, qualidade, funcionalidade e pontualidade de entrega no mercado global.

Plano-sequência de custosPara Yoshitake (2004), autor da Teoria do Con-

trole Gerencial, da qual faz parte o plano-sequência de controle, o controle pressupõe a existência de uma sequência nas situações do cotidiano das pessoas e entidades. A sequência é uma sucessão ininterrupta de planos ou cenários que formam uma unidade te-mática ou estrutural.

Afirma o autor que a sequência implica na sucessão de eventos, no sentido de séries de eventos relacio-nados, na existência de sequências básicas de eventos, ações ou movimentos que são repetidos ou a repetir nas ações humanas. Em sua obra enuncia:

No conceito de Plano-sequência de controle ge-rencial precisa-se identificar a estrutura organizacio-nal da entidade e as sequências relevantes de cada unidade da estrutura organizacional. Esse plano per-mitirá a construção de um Plano-sequência de men-suração das transações e eventos de natureza econô-mica. Yoshitake (2004).

As sequências, diz Yoshitake (2004), precisam ser detalhadas quanto aos tempos envolvidos em cada unidade de trabalho; os materiais empregados; os profissionais e especializações humanas requeridas e suas remunerações nas sequências desempenhadas; os serviços prestados por outros setores internos e externos à organização.

O propósito do Plano-sequência de controle ge-rencial segundo o seu precursor, visa:

[...] O plano-sequência de controle gerencial tem por objetivo a pesquisa de princípios e conhecimen-tos necessários para aumentar a controlabilidade das

operações de uma entidade. Precisa servir como base para estabelecimento de parâmetros ou padrões. Pre-cisa ter base suficiente para explicar e prever ocor-rências de custos, avaliar desempenhos, construir indicadores e testar se houve ou não agregação de valor às operações. Yoshitake (2004).

Na definição de Plano-sequência, captar a realida-de das coisas, suas causas e efeitos torna-se essencial para se determinarem os procedimentos que consti-tuirão as sequências em cada unidade de ação.

A unidade de ação é o trabalho, o esforço que se faz para execução de uma atividade. Conforme Yoshi-take (2004), dessa forma, a unidade de ação pode ser caracterizada como um conjunto de atividades cons-tituídas por uma sequência de eventos ou procedi-mentos.

n

U = ∑ Sqi e Uni = Sq1 + Sq2 + … Sqk

i=1

Legenda:Un = unidade de açãoSq = sequência de eventos ou procedimentosn = número de sequências

A sequência de unidade de ação pode ser explica-da como ritmo e cadência de aspectos, de aconteci-mentos e lógica das ideias. A sequência corresponde à somatória de eventos que são necessários para a sua formação (YOSHITAKE, 2004).

Sq = ev1 + ev2 + ... evk Sendo Sq = sequência

ev = evento

Explana Yoshitake (2004) que o Plano-sequência é a somatória de sequências das unidades de ações ob-serváveis nas ações e comportamentos dos gestores de uma organização.

U1 = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn

U2 = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn�Un = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn

n

= PS e PS = ∑Ui

i=1

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operações de uma entidade. Precisa servir como base para estabelecimento de parâmetros ou padrões. Pre-cisa ter base suficiente para explicar e prever ocor-rências de custos, avaliar desempenhos, construir indicadores e testar se houve ou não agregação de valor às operações. Yoshitake (2004).

Na definição de Plano-sequência, captar a realida-de das coisas, suas causas e efeitos torna-se essencial para se determinarem os procedimentos que consti-tuirão as sequências em cada unidade de ação.

A unidade de ação é o trabalho, o esforço que se faz para execução de uma atividade. Conforme Yoshi-take (2004), dessa forma, a unidade de ação pode ser caracterizada como um conjunto de atividades cons-tituídas por uma sequência de eventos ou procedi-mentos.

n

U = ∑ Sqi e Uni = Sq1 + Sq2 + … Sqk

i=1

Legenda:Un = unidade de açãoSq = sequência de eventos ou procedimentosn = número de sequências

A sequência de unidade de ação pode ser explica-da como ritmo e cadência de aspectos, de aconteci-mentos e lógica das ideias. A sequência corresponde à somatória de eventos que são necessários para a sua formação (YOSHITAKE, 2004).

Sq = ev1 + ev2 + ... evk Sendo Sq = sequência

ev = evento

Explana Yoshitake (2004) que o Plano-sequência é a somatória de sequências das unidades de ações ob-serváveis nas ações e comportamentos dos gestores de uma organização.

U1 = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn

U2 = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn�Un = Sq1 + Sq2 + ... + Sqn

Legenda: PS = plano sequência U = unidade de ação Sq = sequência de eventos ou procedimentos n = número de sequências

O conceito de Plano-sequência é aplicável, para Yoshitake (2000), a situações que requerem dispo-sições ou arranjos compatíveis com a noção de con-trole sequencial. Assim, um exemplo de aplicação do Plano-sequência encontra-se na Contabilidade de Custos, pois o custeio sequencial pesquisa os princí-pios e conhecimentos que aumentam a produtividade dos setores da economia do país.

Yoshitake (2004) define o custeio sequência ou Plano-sequência de custos como:

[...] um modelo em que a pesquisa precisa iden-tificar as menores unidades de um processo, em se tratando de uma área operacional produtiva; de um procedimento, em se tratando de uma área operacio-nal de serviço. As menores unidades de um processo ou de um serviço são denominadas de procedimentos com o propósito de facilitar a nomenclatura utilizada neste trabalho.

Modelo proposto para o custeioMuitos dos municípios não possuem sistemas de

apuração de custos e vários dos que possuem admi-tem dificuldades para garantir a confiabilidade dos custos apurados. Isso torna ainda mais difícil a análise do justo preço a cobrar pelos serviços.

Além disso, falta na maioria dos municípios a ado-ção de sistemas adequados e confiáveis para apuração dos custos reais do gerenciamento integrado dos re-síduos sólidos urbanos.

O que se objetivou com este estudo foi propiciar uma contribuição aos gestores públicos com o desen-volvimento de um modelo exequível para a evidencia-ção, a mensuração e a apuração dos custos relaciona-dos ao gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos, criando valor social e ambiental, e ainda, tornando possível o controle dos gastos de forma sistêmica.

Características geraisO método utilizado neste modelo é o de Plano-

sequência de custos. A aplicação do método na apu-ração dos custos dos resíduos sólidos urbanos pode-rá propiciar uma melhor visão dos custos incorridos nas atividades, visto que as atividades são a base do

método. Para tanto, é preciso identificar no gerenciamento

integrado dos resíduos sólidos urbanos dos Municí-pios as atividades relevantes.

As atividades identificadas como relevantes são: a varrição; a coleta domiciliar (convencional e seleti-va); a de tratamento e disposição final; administração geral; o transporte; a manutenção; o almoxarifado. Apresentadas no diagrama a seguir:

A T I V I D A D E S

ATIVIDADE APOIO ATIVIDADE FIM

Adm. Geral

Transporte

Manutenção

Almoxarifado Tratamento e

disposição final

Coleta Domiciliar

Varrição

Figura 4.1 Diagrama das atividades

Atividades operacionaisIdentificadas as atividades, aplicou-se o método de

plano-sequência para a sistematização do processo. Este foi elaborado para atender às necessidades bá-sicas de informações de três atividades: varrição; co-leta domiciliar (convencional e seletiva); tratamento e disposição final (central de tratamento de resíduos sólidos).

Modelo de custeio-sequênciaO objeto de custeio são os serviços de varrição,

coleta domiciliar (convencional e seletiva) e tratamen-to e disposição final dos resíduos sólidos urbanos.

O modelo ora desenvolvido para o objeto de cus-teio foi definido considerando-se a característica se-quencial dos serviços:

sistema de acumulação de custos por processo; custeio por absorção;as atividades fins; eas atividades de apoio às operações. No sistema de Plano-sequência de custos os itens

de custos são todos aqueles que são consumidos em essência de forma objetiva pela atividade-fim.

A partir do plano-sequência das atividades desen-volveu-se um modelo de Plano-sequência de custos para a varrição, coleta e aterro. Buscou-se identificar

Font

e: A

utor

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Relato de pesquisaGestão em saúde

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PLANO - SEQUÊNCIA DA COLETA DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS UNIDADE 1 VARRIÇÃO Sequência 1 Definição das vias pública s e sarjetas

Evento 1 D efini ção da periodicidade e tipo de serviço a ser executado Sequência 2 Formaç ão de equipes

Evento 1 Entrega do s uniformes e EPI’s aos funcionários Sequência 3 Transporte

Evento 1 A equipe é levada ao local para executar o serviço Sequência 4 Varrição

Evento 1 Fazer a varrição e acondicionar o resíduo para ser coletado UNIDADE 2 COLETA DOMICILIAR Sequência 1 Coleta convencional

Evento 1 Os coletores coletam o s resíduos (úmidos) na porta dos domicílios Evento 2 Os resíduos são enviado s ao aterro sanitário Sequência 2 Coleta seletiva

Evento 1 Os coletores coletam o lixo (seco) na porta dos domicílios E vento 2 O s resíduos são levado s à associação de catadores UNIDADE 3 TRATAMENTO E DISPOSIÇÃO FINAL Seqüência 1 Recepção

Evento 1 Pesagem dos caminhões Evento 2 Autoriza a d escarga do s resíduos nas células do aterro Sequência 2 Cobertura d o s resíduos

Evento 1 Movimentação e conformação da massa de resíduos Evento 2 Cobertura do s resíduos com solo Evento 3 Fechamento das células Sequência 3 Drenagem

Evento 1 Das águas pluviais Evento 2 De biogás e percolado da massa de resíduos Sequência 4 Esta ção de tratamento de efluentes líquidos

Evento 1 Tratamento do chorume Sequência 5

Manutenção da condição de operação do aterro sanitário Evento 1 Sistema de monitoramento Evento 2 Vias internas Evento 3 Limpeza da área de domínio Evento 4 Manute nção de má quinas, equipamentos e instalações. Evento 5 Cinturão verde

Quadro 4.1 – Plano-sequência da coleta de resíduos sólidos urbanos

PLANO - SEQUÊNCIA DE CUSTOS DOS SERVIÇOS DE VARRIÇÃO E COLETA DOMICILIAR

UNIDADE 1

VARRIÇÃO Sequência 1

Varrição de vias, logradouros, feiras, etc.

Item de custo Critério de Mensuração Mão - de - obra Valor da H/h x tempo

despe ndido Evento 1

Administração Geral Equipamentos Depreciação em função da vida econômica do bem

Evento 2 Kit uniforme

Calça , camisa, luvas, botas, óculos, boné,

capa de chuva , colete, capacete

Preço de aquisição x quantidade consumida

M ão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Evento 3 Transporte da

equipe de trabalho Veículos Depreciação em função da vida econômica do bem

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Veículos e equipamentos

Depreciação em função da vid a econômica do bem

f erramentas Preço de aquisição x quantidade consumida

Evento 4

Limpeza de vias, logradouros, feiras,

etc. Sacos plásticos Preço de aquisição x

quantidade consumida Mão - de - obra Valor da H/h x tempo

despendido Evento 5 Manutenção de

máquinas e equipamentos Peças Preço de aquisiç ão x

quantidade consumida UNIDADE 2

COLETA DOMICILIAR Sequência 1

Coleta do lixo úmido e seco dos domicílios e da varrição.

Item de custo Critério de Mensuração Mão - de - obra Valor da H/h x tempo

despendido Evento 1

Administração Geral Equipament os Depreciação em função da vida econômica do bem

Evento 2 Kit uniforme

Uniformes, luvas, botas, óculos,

protetores auriculares, capa

de chuva, capacetes

Preço de aquisição x quantidade consumida

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Evento 3 C oleta do lixo Veículos Depreciação em função da

vida econômica do bem Mão - de - obra Valor da H/h x tempo

despendido Evento 4 Manutenção de

máquinas e equipamentos Peças Preço de aquisição x

quantidade consumida

Quadro 4.2 - Plano-sequência de custos dos serviços de varrição e coleta domiciliar

Fonte: Autor

Fonte: Autor

as modalidades de operações para se definirem os itens de custos e quais seriam os critérios de mensu-ração dos itens de custos das atividades.

Os esquemas a seguir mostram o fluxo do custo distribuído aos centros de custos da varrição e coleta e da CTRS.

SERVIÇOS PRESTADOS DE VARRIÇÃO E COLETA DOMICILIAR

ADM. GERAL

ALMOXARIFADO

TRANSPORTE

MANUTENÇÃO

ITEM DE CUSTO

ITEM DE CUSTO

ITEM DE CUSTO

ITEM DE CUSTO

CUSTOS DOS SERVIÇOS

DE COLETA (convencional e seletiva)

CUSTOS DOS SERVIÇOS

DE VARRIÇÃO

Figura 4.1 - Centro de custos da varrição e coleta

Font

e: A

utor

SERVIÇOS PRESTADOS PELA CENTRAL DE TRATAMENTO DE RESÍDUOS

ADM. GERAL

ALMOXARIFADO

MANUTENÇÃO

ITEM DE CUSTO

ITEM DE CUSTO

ITEM DE CUSTO

CUSTOS DA MANUTENÇÃO DAS OPERAÇÕES DA CTRS

CUSTOS DO TRATAMENTO

E DISPOSIÇÃO FINAL

CUSTOS DO

ATERRO SANITÁRIO

Figura 4.2 - Centros de custos da CTRS

Font

e: A

utor

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PLANO - SEQUÊNCIA DE CUSTOS DOS SERVIÇOS DA

CENTRAL DE TRATAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS (CTRS)

UNIDADE 1

TRATAMENTO E DISPOSIÇÃO FINAL

Sequência 1

Recepção dos resíduos sólidos urbanos

Item de custo

Critério de Mensuração

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Evento 1 Pesagem dos cami nhões

compactadores Máquinas

Depreciação em função da vida

econômica do bem Sequência 2

M ovimentação , conformação e cobertura

da massa de resíduos

Item de custo Critério de Mensuração

Mão - de - obra

Valor da H/h x tempo despendido

Evento 1 M ovimentação e

conformação da massa de resíduos

Máquinas

Depreciação em função da vida econômica do bem

Mão - de - obra

Valor da H/h x tempo despendido Evento 2

Cobertura dos resíduos Máquinas

Depreciação em função da vida

econômica do bem Sequência 3

Drenagem Item de custo

Critério de Mensuração

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Materiais

Preço de aquisição x quantidade

consumida

Evento 1

Águas pluviais

Máquinas

Depreciação em função da vida econômi ca do bem

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Materiais

Preço de aquisição x quantidade

consumida

Evento 2

Biogás e percolado da massa de resíduos

Máquinas

Depreciação em função da vida

econômica do bem Sequência 4

Estação de tratamento de efluentes líquidos

Item de custo

Critério de Mensuração

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Equipamentos

Depreciação em função da vida

econômica do bem

Evento 1

Tratamento dos efluentes líquidos

Reagentes químicos

Preço de aquisição x qua ntidade consumida

UNIDADE 2

MANUTENÇÃO DAS CONDIÇÕES DE OPERAÇÃO DA CTRS

Sequência 1 Sistema de

monitoramento

Item de custo Critério de Mensuração

Mão - de - obra

Valor da H/h x tempo despendido Evento 1

Medições físico - químicas e biológicas

Equipament os

Depreciação em função da vida econômica do bem

Sequência 2 Manutenção das

instalações

Item de custo Critério de Mensuração

Mão - de - obra

Valor da H/h x tempo despendido

Máquinas

Depreciação em função da vida econômica do bem

Evento 1

Vias internas

Materiais

Preço de aquisição x quantidade consumida

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Veículos

Depreciação em função da vida

econômica do bem

Evento 2

Limpeza da área de domínio

Ferramentas

Preço de aquisição x quantidade consumida

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Ferramentas

Preço de aquisição x quantidade

consumida

Eve nto 3

Cinturão verde

materiais

Preço de aquisição x quantidade consumida

Mão - de - obra Valor da H/h x tempo despendido

Evento 4 Manutenção de máquinas,

equipamentos e instalações

Peças

Preço de aquisição x quantidade

consumida

Quadro 4.3 - Plano-sequência de custos da CTRS

3 - concluSÕeSO custo na gestão pública tem divulgação restrita

na literatura administrativa e contábil, sendo, portan-to, justificável pesquisar o assunto e suas aplicações. O que, geralmente, os gestores públicos conhecem sobre os sistemas de custeios são meramente frag-mentos de custeios soltos, desestruturados, que não

corroboram efetivamente para o controle e tomada de decisões.

A cultura da administração pública é controlar o fim do processo – o pagamento das despesas. Não se desenvolveu, ainda, uma política de gerenciamento de processos, em que o estudo dos custos toma uma dimensão importante como ferramenta de controle

e gestão, dando aos entes públicos condições de modernização da ad-ministração pública.

Apenas determinar ou calcular custos de forma mais tradicional não atende mais à exigência de um ambiente onde a tônica é a moder-nização administrativa e fiscal. Essa realidade se mostra ainda mais evi-dente no contexto dos Municípios que, por força constitucional, têm obrigações maiores do que os par-cos recursos públicos disponíveis para atender à população local.

Para um gerenciamento integra-do de resíduos sólidos urbanos, o correto equacionamento de custos terá seus efeitos sobre a efetivação da cooperação do mesmo e, conse-quentemente, sobre o seu sucesso na medida em que as informações de custos se tornaram cada vez mais importantes para o controle e a tomada de decisão. Num ambien-te, onde se valoriza o bem-estar so-cial do cidadão, a forma tradicional de gestão não atende mais às neces-sidades de controle e informações para a tomada de decisão com fle-xibilidade e rapidez.

Conclui-se que essa necessidade se torna mais premente nas enti-dades públicas e, em particular, no gerenciamento do lixo, pois este atua em segmento com forte apelo econômico, ambiental e social, cujo caráter de trabalho faz com que as decisões relativas a custos devam estar ainda mais amparadas em in-formações sintonizadas com as exi-

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gências da sociedade.Assim sendo, parece factível aplicar o Plano-sequ-

ência de custos, pelo menos no que tange ao plano-sequência das atividades de forma mais explícita e sistemática. Nesse sentido, o Plano-sequência de cus-tos, através dos eventos definidos, deve, então, não só proporcionar a controlabilidade dos custos, mas

também a geração de informações e avaliação das ati-vidades envolvidas.

O resultado desta pesquisa poderá contribuir para que se possa, no futuro, melhorar as informações, principalmente a econômico-financeira, do gerencia-mento do lixo, auxiliando na tomada de decisão do gestor público.

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CONTROLE DE GESTÃO POR PLANO-SEQUÊNCIA EM HOSPITAL MATERNIDADE

MANAGEMENT CONTROL BY SEQUENCE-PLAN FOR MATERNITY HOSPITAL

Mariano Yoshitake*

adelmo Fernando Ribeiro Schindler Jr.**

Wagner Pagliato***

* Doutor em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP. Atualmente é Professor da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID.** Mestra em Contabilidade pela Fundação Visconde de Cairu – FVC/Bahia. Professora na Funcec – João Monlevade/MG. Professora e pesquisadora na área contábil.*** Professor, Contador, Coordenador dos Cursos de Pós Graduação em Controladoria e Finanças Coorporativas, Auditoria e Perícia Contábil e Con-tabilidade Internacional, e professor do curso de graduação em Ciências Contábeis da Universidade Cidade de São Paulo, Mestrado e Pós Graduado.

RESUMO

O objetivo deste trabalho é aplicar a metodologia de custeio-sequência na área hospitalar, onde geralmente se emprega o custeio por procedimentos ou o custeio base-ado em atividades. Utilizou-se de pesquisa exploratória na busca de dados primários junto à rede hospitalar da região metropolitana de Salvador/Bahia, procedendo-se também a uma análise documental dos atuais procedimentos mé-dicos, como as tabelas da Associação Médica Brasileira, as tabelas de procedimentos da Associação dos Hospitais do Estado da Bahia, do Sistema de Informações Hospitalares pertencente ao Sistema Único de Saúde e Colégio Brasilei-ro de Radiologia. A metodologia de custeio adotada foi a de Yoshitake7 (2003) que utiliza o conceito de plano-sequência, fixando, dessa maneira, as bases para o estabelecimento do controle de gestão na área em estudo. A aplicação foi feita com base em estudo de caso, porém, limitado a desenvol-ver um único procedimento médico-hospitalar, a operação cesariana em um hospital maternidade. Os resultados preli-minares indicam que a utilização do custeio-sequência gera informações detalhadas do custo dos serviços da operação cesariana, permitindo estabelecer referenciais para a conta-bilidade de custos e o controle gerencial.

DESCRITORES: Custeio seqüência. Custeio por procedimento. Plano-sequência. Controle de gestão

ABSTRACT

The objective of this work is to apply the methodology of sequence costing in the hospital, where he usually is used the procedures costing or activity-based costing. We used an exploratory research in the pursuit of primary data with the hospital network in the metropolitan region of Salvador, Bahia, is also carrying out a review of the current document medical procedures, such as tables of Brazilian Medical As-sociation, the tables of procedures of the Associação dos Hospitais do Estado da Bahia, of the Hospital Information System belonging to the Unified Health System and the Brazilian College of Radiology. The cost methodology adop-ted was that of Yoshitake (2003) that uses the concept of sequence-plan, setting, thus, the basis for the establishment of management control in the study area. The application was based on case study, however, limited to develop a sin-gle-hospital medical procedure, a caesarean procedure in a maternity hospital. Preliminary results indicate that the use of sequence costing generated detailed information about the cost of the services of cesarean procedures, establishing benchmarks for cost accounting and management control.

DESCRIPTORS: Sequence costing. Procedures costing. Se-quence-plan. Management control.

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IntRoduçãoO objetivo de gestão em uma unidade de saúde

privada é o atendimento adequado aos clientes, além da busca-se um resultado financeiro em suas opera-ções. O contexto atual motiva os administradores a estabelecer controles para que os resultados opera-cionais possam ser sinônimos de lucros. As indica-ções existentes apontam que, num passado não muito remoto, as organizações atuantes no ramo da saúde eram suficientes e qualquer tipo de administração ob-tinha resultados satisfatórios. A demanda era acentua-da, assim sendo, não havia a necessidade de controles rígidos e os preços dos serviços eram estabelecidos, sem preocupação com a retração do quantitativo de atendimentos.

Com o passar do tempo, a “inflação de demanda” começou a transformar-se em “inflação de custos” e o preço passou a ser estabelecido pelo mercado, sendo o lucro determinado pela diferença entre o preço a ser praticado e os custos que envolviam o processo.

A organização hospitalar pode ser considerada como um conjunto de empreendimentos, por exem-plo, hotelaria, o restaurante, o centro cirúrgico, etc. Sendo assim, existe a necessidade de cálculo corre-to dos custos atrelados a informações tempestivas e, principalmente, o controle em todos esses centros de resultado é, a princípio, a única forma de sobrevi-vência dessas organizações no contexto atual.

Quando nos deparamos com alguma enfermida-de, a nossa tendência é o encaminhamento para um especialista. Chegando lá, o paciente mais perspicaz observa que o médico trabalha com procedimentos padronizados, ou seja, quando de um acometimento X um tratamento Y e assim sucessivamente. Dessa forma, o controle de gestão em unidades de saúde deve objetivar esses procedimentos padronizados e, mais, conhecê-los detalhadamente, evitando-se assim, perdas que comprometem o resultado dessas unida-des.

O controle de gestão pressupõe o conhecimen-to minucioso das principais sequências de ações que se repetem e, por essas razões, previsíveis e explicá-veis no comportamento dos gestores. Em razão dos procedimentos médicos serem sequências na maior parte do tempo, segue-se daí que os controles de gestão precisam acompanhar as mesmas. A literatura

na área-objeto desta pesquisa não evidencia tais sequ-ências ou plano-sequência no sentido amplo.

Plano-SeQuÊncIaPara que possamos entender o conceito do PS

(plano-sequência), precisamos conceituar unidade bá-sica de ação, sequência de unidades de ação e cone-xões das sequências de ações com o comportamento ou modelo de decisão do gestor. “É, portanto, um conjunto de regras e procedimentos organizados me-todologicamente, os quais têm o objetivo de orien-tar na elaboração de controles internos da empresa” (Yoshitake7, 2003).

Entende-se como uma unidade básica de ação, o esforço que se faz para realização de uma tarefa. As-sim sendo, uma unidade de ação é caracterizada pelo conjunto de atividades constituído por uma sequên-cia de eventos e/ou procedimentos. É o resultado da divisão de um trabalho em unidades que podem ser realizadas em durações previstas pelo gestor de uma organização (Yoshitake7, 2003). Segundo este último, “A sequência corresponde à somatória de eventos que são necessários para a sua formação”.

A sequência é uma forma de registro de registro de algum procedimento que se queira estudar, deta-lhando os passos que se seguem, bem como acontece a observação dos participantes aos acontecimentos e o seu papel, do ambiente e das situações, o onde e em que circunstâncias acontecem os fatos.

Podem existir casos em que sejam necessários mais de um plano-sequência para que o controle seja estabelecido na entidade. Se o controle for dirigido para a gestão de uma organização, ter-se-á um con-ceito de controle de gestão. Portanto, o PS é definido como o número de sequências de unidades de ação.

Nesse momento, pode-se concluir que parte da teoria do controle de gestão está relacionada à pes-quisa e construção de fluxos onde as sequências do comportamento dos gestores, bem como das ativida-des desenvolvidas são observadas. (Yoshitake7, 2003) diz que: “se podem caracterizar duas espécies de PS, uma baseada em previsão, como sendo o PS previs-to; e outra baseada no tempo real, como sendo PS contínuo”.

O PS contínuo é medido pela duração real de uma sequência ou procedimento. A ação do gestor preci-sa ser dirigida para que a duração de uma sequência

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coincida com o tempo real. Isso equivale a dizer que o gestor procura fazer o tempo previsto de duração de uma unidade de ação coincidir com o tempo real.

A sequência é constituída por unidades de ação. Nesse sentido, o controle pode ser conceituado como: “a unidade de ação contida num plano contí-nuo de sequências. Portanto, o controle é a unidade de ação que ocorre em tempo real dentro de um pla-no contínuo de sequências (Yoshitake7, 2003)”. O PS global é o conjunto de PS unitários necessários para completar a decisão. Para que os custos dos proce-dimentos cirúrgicos sejam mensurados com confia-bilidade, é necessário o conhecimento detalhado das ocorrências desde os momentos que antecedem o parto até fim da prestação dos serviços. Serão anali-

Unidade de ação 1 Consulta pré-natal

Sequência 1:Avaliação geral e solicitação de exames

Unidade de ação 2 Exames Pré-Parto

Sequência 1: Exames Laboratório

Sequência 2:Exames de ultrassonografia e pre-ventivo ginecológico

Unidade de ação 3 Internamento

Sequência 1: Admissão do paciente

Unidade de ação 4 Parto

Sequência 1: Ato cirúrgico

Unidade de ação 5Parto assistência ao RN (Recém nascido)

Sequência 1: Trabalho do Neonatologista

Sequência 2: Aquecimento do RN

Unidade de ação 6Assistência e acompanhamento pós-parto (mãe)

Sequência 1: Trabalho do obstetra

Unidade de ação 7Assistência e acompanhamento pós-parto (Recém nascido)

Sequência 1: Trabalho do Neonatologista

Unidade de ação 8 Alta do paciente + RN

Sequência 1: Consulta final

Sequência 2: Alta do paciente e RN

sados, em função desse plano-sequência, os custos do procedimento pelas seguintes fontes pagadoras:

1. Particular2. Plano ou seguro-saúde3. SUS (Sistema Único de Saúde)

Unidade de ação 1 Consulta pré-natalA Tabela 2 representa a unidade de ação 1 do mo-

delo PS e suas sequências.

Tabela 2 – Unidade de ação 1

Unidade de ação 1 Consulta pré-natal

Sequência 1:Avaliação geral e solicitação de

exames

Nessa unidade, os profissionais médicos acom-panham o desenvolvimento da gestação, bem como as alterações apresentadas, quando a orientação ao paciente é uma das funções dessa fase. As mudanças apresentadas pelo corpo humano vêm acompanhadas de sintomas que devem ser amenizados por meio de medicamentos específicos, orientações dietéticas e comportamentais. A série de consultas que se se-guem nessa fase são realizadas em nível ambulatorial e geralmente pelo mesmo profissional que fará o parto, tendo pouco dispêndio de materiais e medicamentos. O tempo médio de cada consulta é de trinta minutos e são realizadas a cada trinta dias quando são obser-vados na avaliação clínica alguns itens, a saber:

• Níveis de pressão arterial;• Ganho ponderal (massa corpórea).Para que a avaliação periódica tenha índices satis-

fatórios de confiança nessa fase, o profissional médico solicita exames e faz indicações dietéticas e compor-tamentais ao paciente.

Unidade de ação 2 Exames Pré PartoA Tabela 3 representa a unidade de ação 2 do mo-

delo PS e suas sequências.

Tabela 3 – Unidade de ação 2

Unidade de ação 2 Exames Pré-Parto

Sequência 1: Exames Laboratório

Sequência 2:Exames de ultrassonografia e

preventivo ginecológico

Nessa unidade, são relacionados os exames de

Tabela 1 - Plano-sequência para uma cirurgia de parto cesariana

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pré-parto que visam avaliar o bem-estar físico para evitar contingências (problemas) no decorrer do ato cirúrgico. Os exames laboratoriais de rotina, nesses casos, são:

Hemograma;• Sumário de urina;• Parasitológico de fezes;• Pesquisa HIV;• Rubéola;• Hepatite;• Glicemia;• VDRL;• Tipologia sanguínea;• Sífilis.•

Os exames de ultrassonografia avaliam o desen-volvimento do feto investigando a sua formação por meio de imagem. Em relação ao preventivo ginecoló-gico, é o método de avaliar, por meio de exame local, o trato genital ou canal do parto. Nesta unidade de ação, os controles devem ser rígidos, para que todo o custo possa ser remunerado por meio de uma futura cobrança efetiva.

Unidade de ação 3 InternamentoA Tabela 4 representa a unidade de ação 3 do mo-

delo PS e suas sequências.

Tabela 4 – Unidade de ação 3

Unidade de ação 3 Internamento

Sequência 1: Admissão do paciente

Essa unidade é caracterizada pela chegada do pa-ciente, previamente marcada, em razão de tratar-se da intervenção cirúrgica de caráter eletivo. O proces-so de admissão deste paciente é feito pela recepção, devendo esta controlar os dados cadastrais e veri-ficar qual a fonte que vai originar o recurso para o pagamento dos serviços. O internamento é feito no dia que antecede ao ato cirúrgico, e assim todo tipo de consumo deve ser controlado antes mesmo dos procedimentos médicos; a simples entrada do pacien-te na unidade de saúde determina que os controles na hotelaria e no restaurante sejam exercidos com eficiência. A avaliação nessa fase consiste em ausculta fetal, ganho ponderal, verificação dos níveis de pres-são arterial e batimentos cardíacos.

Unidade de ação 4 Parto

A Tabela 5 representa a unidade de ação 4 do mo-delo PS e suas sequências.

Tabela 5 – Unidade de ação 4

Unidade de ação 4 Parto

Sequência 1: Ato cirúrgico

Nessa unidade, ocorre o procedimento cirúrgico propriamente ou, mais precisamente, o ato cirúrgi-co. A cesariana é um ato cirúrgico em que o cirur-gião retira o feto do corpo da mãe, por um corte no abdômen. Os minutos que antecedem o ato em si são reservados para que o profissional anestesista possa iniciar o procedimento anestésico, de eleição para cada paciente, sendo consumidos materiais e medicamentos específicos que são controlados para futura cobrança. O profissional de anestesia procede ao acompanhamento da paciente até o término do ato cirúrgico que tem uma duração aproximada de quarenta e cinco minutos; após avaliação pelo anes-tesista, a paciente é liberada para retornar ao leito. Pode-se exemplificar como matérias e medicamentos consumidos, nessa fase, alguns itens, a saber:

Anestésicos de uma maneira geral e oxigênio;• Fios cirúrgicos de várias espessuras;• Instrumentais que foram esterilizados por • meio de estufa ou autoclave;Antibióticos locais.•

Unidade de ação 5 Parto assistência ao RNA Tabela 6 representa a unidade de ação 5 do mo-

delo PS e suas sequências.

Tabela 6 – Unidade de ação 5

Unidade de ação 5 Parto assistência ao RN

Sequência 1:Trabalho do

Neonatologista

Sequência 2: Aquecimento do RN

Essa unidade é caracterizada pelo trabalho do Ne-onatologista, profissional habilitado para o trato do RN (recém-nascido) e acontece na sala de parto. São procedimentos que também têm consumo de mate-riais, medicamentos, horas do profissional especialis-ta, bem como o oxigênio consumido e utilização de equipamentos específicos, a exemplo, o berço aque-cido. A intervenção do profissional Neonatologista é indispensável à manutenção da vida do RN (Recém-

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nascido) e o quantitativo de materiais e medicamen-tos consumidos são controlados, bem como as taxas pelo uso de aparelhos específicos. O tempo médio que esse profissional gasta na realização dessas tare-fas é de aproximadamente quinze minutos e, dentre as funções inerentes a essa atividade, enumeram-se os itens abaixo:

Corte do cordão umbilical;• Aspiração das vias aéreas do recém-nascido • (RN);Avaliação geral das funções vitais do recém-• nascido (RN).

Observa-se, nessa etapa, o uso de um equipamen-to específico com a função de manter a temperatura do recém nascido - o berço aquecido. O tempo de utilização desse equipamento deve ser determinado pelo profissional, cabendo aos profissionais de co-brança o controle sobre a sua utilização.

Unidade de ação 6 Assistência e acompanhamento pós-parto ( mãe )

A Tabela 7 representa a unidade de ação 6 do mo-delo PS e suas sequências.

Tabela 7 – Unidade de ação 6

Unidade de ação 6Assistência e acompanhamento

pós-parto ( mãe )

Sequência 1: Trabalho do obstetra

Nessa unidade de ação, ao contrário da anterior, nota-se o trabalho do profissional de obstetrícia, ou seja, o cirurgião responsável pelo parto e também do profissional de enfermagem que interagem com a paciente nas trocas de curativo e no controle da medicação administrada. Os controles dão-se pela prescrição sugerida pelo obstetra e pelo consumo destes medicamentos e sua relação com o material adequado. Essa assistência vai até a alta da paciente e começa na sala de cirurgia, ao final do ato cirúrgi-co. Também inserem-se os profissionais de nutrição e fisioterapia nessa fase. Essas visitas são periódicas e todos os profissionais envolvidos participam separa-damente, sendo observados os seguintes itens:

Realização de curativo inicial;• Verificação dos níveis de pressão arterial;• Verificação da temperatura corporal;• Utilização de medicações por meio venoso;• Utilização de medicações por meio oral;•

Orientações dietéticas e comportamentais.•

Unidade de ação 7 Assistência e acompanhamento pós-parto ( RN)

A Tabela 8 representa a unidade de ação 7 do mo-delo PS e suas sequências.

Tabela 8 – Unidade de ação 7

Unidade de ação 7Assistência e acompanhamento

pós-parto ( RN)

Sequência 1: Trabalho do Neonatologista

Nessa unidade, continua o trabalho do Neona-tologista, agora fora da sala de cirurgia, onde visitas diárias são realizadas, a fim de se avaliar o estado de saúde do RN. Essa avaliação é feita por meio de exa-mes físicos diários e não há consumo de materiais e medicamentos, exceto se houver alguma contingência (problemas). Dentre as funções realizadas e inerentes a esse profissional nesta fase, destacam-se os itens:

Avaliação de ganho ponderal do recém-nas-• cido;Exames físicos de rotina. •

Unidade de ação 8 Alta do paciente + RNA Tabela 9 representa a unidade de ação 8 do mo-

delo PS e suas sequências. Tabela 9 – Unidade de ação 8

Unidade de ação 8 Alta do paciente + RN

Sequência 1: Consulta final

Sequência 2: Alta do paciente e RN

Nessa unidade, depois de uma consulta final, uma junta médica composta pelos profissionais envolvidos nesse procedimento determina a alta do paciente. O processo administrativo que antecede a alta é a verifi-cação do consumo de material e medicamento, horas de profissional e taxa de equipamentos específicos. Quando se tem o quantitativo desses valores, o clien-te reconhece o serviço prestado por meio de assi-natura e o convenio é comunicado através de fatura na data acordada em contrato. É importante que em todas as etapas haja um controle efetivo, pois dessa maneira os índices de glosa são diminuídos conside-ravelmente.

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aPlIcação do Plano-SeQuÊncIa SEGURO SAÚDEEssa aplicação restringe-se à mensuração do parto

cesariana, que tem como fonte pagadora dos serviços o seguro-saúde.

Item 1 - Para náuseas e vômitos, frequente-• mente no período gestacional;Item 2 - Para anemias próprias do período • gestacional são usadas vitaminas associadas a sulfato ferroso, a depender de cada caso e peso do binômio mãe e filho.

Unidade de ação 2Exames Pré-

Parto

Sequência 1 Exames laboratoriais Mensuração

1 - Hemograma - (30CH X R$ 0,27) R$ 8,10

2 - Sumário de urina - (14CH X R$ 0,27) R$ 3,78

3 - Parasitológico de fezes - (14CH X R$ 0,27)

R$ 3,78

4 - Pesquisa HIV - (200CH X R$ 0,27) R$ 54,00

5 - Rubéola - (220CH X R$ 0,27) Sorologia - 60CH; IGM - 120CH; IGG - 40CH.

R$ 59,40

6 - Hepatite - HCV (100CH X R$ 0,27) R$ 27,00

7 - Glicemia - (14CH X R$ 0,27) R$ 3,78

8 - VDRL - (10CH X R$ 0,27) R$ 2,70

9 - Tipologia sanguínea - (20CH X R$ 0,27) Grupo Sanguíneo - 10CH; Fator RH – 10CH.

R$ 5,40

10-Sífilis - (35CH X R$ 0,27) R$ 9,45

Total – sequência 1 R$ 177,39

Sequência 2Exames de ultrasso-nografia e preventivo ginecológico

Mensuração

1 - Exame de ultrassonografia (140CH X R$ 0,27) Filme – Mensuração conforme qua-dro 6

R$ 40,88

2 - Exame preventivo ginecológico - (90CH X R$ 0,27) Colposcopia – 30 CH Citologia – 60 CH

R$ 24,30

3 - Remuneração dos profissionais médi-cos da sequência 2 (50%) Conforme figura quadro 7

(R$ 31,05)

Total – sequência 2 R$ 34,13

Total – Unidade de ação 2 R$ 211,52

Quadro 3 – Exames Pré-Parto.

A escala de mensuração dessa aplicação é a CH

Unidade de ação 1 Consulta pré-natal

Sequência 1Avaliação geral e solicitação de

examesMensuração

1 – Medicamentos (conforme especi-ficações dadas na consulta) conforme

quadro 4R$ 26,27

2 – Orientações dietéticas e compor-tamentais (consulta-tempo médio 30

minutos) – (70 CH X R$ 0,27)R$ 18,90

3 – Remuneração do Profissional médi-co obstetra (5 0%)

(R$ 9,45)

Total – sequência 1 R$ 35,72

Quadro 1 – Avaliação geral e solicitação de exames.

A escala de mensuração dessa aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, nesse particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. Não existe um padrão obrigatório de medica-mentos para as consultas de pré-natal. Os clientes de maneira geral são avaliados nas diversas fases ou pe-ríodos da gestação e a depender da evolução clínica, aliada aos resultados dos exames complementares, e mais a sintomatologia da gestante, pode-se optar por medicamentos específicos. Em se tratando de medi-cação-padrão, foram mensurados dois medicamentos usados neste caso particular e os seus valores são estabelecidos pelo Brasíndice, edição de outubro de 2003, conforme o quadro 4.

Item Medicação Custo (R$)

1DRAMIN B6 - apresentação caixa com 20 comprimidos.

5,28

2MATERNA - apresentação

frasco com 30 drágeas 20,99

Total 26,27

Quadro 2 – Mensuração do evento 1 da sequência 1 na unidade de ação 1.

Os medicamentos são prescritos conforme des-crições abaixo:

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(Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, nesse particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. O filme da Ultrassonografia tem a sua men-suração estabelecida pelo Colégio Brasileiro de Ra-diologia, que estabelece a seguinte relação: 0,1900 X 16,20 (Corresponde a m² do filme), assim o custo do Filme representa R$ 3,08.

Sequência 2

Evento 1 – R$ 40,88 – R$ 3,08 (Custo do filme) = R$37,80, sendo que 50% remuneram a mão-de-obra direta equivalendo a R$18,90;

Evento 2 – R$ 24,30 sendo que 50% remuneram a mão-de-obra direta equivalendo a R$12,15.

Total remuneração dos profissionais envolvidos na sequência 2 = R$ 31,05

Custos da sequência 2 = R$ 31,05 + custo do filme(R$3,08) = R$ 34,13

Quadro 4 – Mensuração do evento 2 da sequência 2 na unidade de ação 2.

Unidade de ação 3 Internamento

Sequência 1Admissão do paciente

Mensuração

1 – Diária de apartamento (remunera-ção de duas diárias) Custo unitário – R$ 40,00 X 2

R$ 80,00

2 – Gastos com alimentação são inclu-sos na diária do apartamento (dieta de acordo com a prescrição médica e café da manhã para o acompanhante)

Total – sequência 1 R$ 80,00

Quadro 5 – Internamento.

A escala de mensuração desta aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, neste particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

A escala de mensuração dessa aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, nesse particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

A escala de mensuração dessa aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência,

Unidade de ação 4 Parto

Sequência 1 Ato cirúrgico Mensuração

1 – Parto cesariano com assistência (obstetra) (1000CH X R$ 0,27)

R$270,00

2 – Anestesia (anestesista) (750 CH X R$ 0,27)

R$202,50

3 – Primeiro auxiliar de cirurgia (300CH X R$ 0,27)

R$ 81,00

4 – Total de materiais (Requisição) R$257,24

5 – Total de medicamentos (Requi-sição)

R$ 92,85

6 – Taxa de sala cirúrgica (Tabela AHSEB II)

R$ 85,84

8 – Oxigênio na sala cirúrgica (p/hora) (Tabela AHSEB II)

R$ 49,00

Remuneração dos profissionais Obs-tetra, Anestesista e 1º aux. (50%)

(R$ 276,75)

Total – sequência 1 R$ 761,68

Quadro 6 – Parto.

Unidade de ação 5 Parto assistência ao RN

Sequência 1Trabalho do Neonatologista

Mensuração

1 – Assistência ao RN (Recém-nasci-do) sala de parto (210CH X R$0,27)

R$ 56,70

Remuneração do profissional Neonatologista(50%)

(R$ 28,35)

Total – sequência 1 R$ 28,35

Sequência 2Aquecimento do RN

Mensuração

1 – Berço aquecido (Tabela AHSEB II)

R$ 4,07

2 – Oxímetro de Pulso (Tabela AHSEB II)

R$ 2,50

3 – Aspirador por sessão (Tabela AHSEB II)

R$ 0,81

4 – Medicamentos (Por requisição) R$ 7,85

Total – sequência 2 R$ 15,23

Total – Unidade de ação 5 R$ 43,58

Quadro 7 - Parto assistência ao RN.

neste particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

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Unidade de ação 6Assistência e acompanhamento pós-parto (mãe)

Sequência 1Trabalho do Obstetra

Mensuração

1 – Já remunerado no parto (conforme unidade de ação 4 – sequência 1)

2 – Materiais (Materiais são os mesmos do parto)

3 – Medicamentos (por requisição) R$ 27.42

Total – sequência 1 R$ 27.42

Quadro 8 - Assistência e acompanhamento pós-parto (mãe).

A escala de mensuração desta aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, neste particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

Unidade de ação 7 Assistência e acompanhamento pós-parto (RN)

Sequência 1Trabalho do Neonatologista

Mensuração

1 – Consulta do Neonatologista (210 CH X R$ 0,27)

R$ 56,70

Remuneração do profissional Neonatologista

(R$ 28,35)

Total – sequência 1 R$ 28,35

Quadro 9 - Assistência e acompanhamento pós-parto ( RN ).

Unidade de ação 8Alta do paciente

+ RN

Sequência 1 Consulta Final Mensuração

1 – Consulta final (Já foi remunerada no parto, conforme unidade de ação 4 – sequência 1)

-

Total – sequência 1 R$ 0,00

Sequência 2Alta do paciente + RN

Mensuração

1 – Alta do paciente + RN (não é remunerado)

-

Total – sequência 2 R$ 0,00

Total – Unidade de ação 8 R$ 0,00

A escala de mensuração dessa aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, neste particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

A escala de mensuração desta aplicação é a CH (Coeficiente de Honorário), a tabela de referência, neste particular, é a AMB 90, Associação Médica Bra-sileira. A mensuração das diárias e taxas tem como referência a tabela AHSEB II e os valores são estabe-lecidos em moeda corrente.

Os dados obtidos pelo estudo do plano-sequência foram comparados a partir de sua fonte pagadora e

demonstrado na tabela de comparação de resultados a seguir:

conSIdeRaçÕeS FInaISUtilizando a metodologia idealizada por Yoshitake7

(2003), foi possível identificar cada passo no processo de produção do serviço a que se destina a organiza-ção e, assim, melhorar os processos internos, tendo uma fonte fidedigna e detalhada de informações para tomada de decisões. No decorrer da pesquisa, foi identificada uma preocupação atual da classe médica, materializada no projeto diretriz e na CBHPM (Clas-sificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos). O projeto diretriz, bem como a CBHPM significam o esforço da classe médica em hierarquizar e balizar os valores dos seus serviços para a comuni-dade como um todo. No desenvolvimento do plano-sequência, foram identificadas três planos-sequências distintos: o desenvolvido para os planos ou seguros saúde, o desenvolvido para clientes particulares e, fi-nalmente, o desenvolvido para o (SUS) Sistema Úni-co de Saúde. As unidades de ação identificadas foram comuns aos três planos desenvolvidos, com ressalva apenas aos eventos mensuráveis no Sistema Único de Saúde. O plano-sequência desenvolvido permite a mensuração de custos de todos os eventos e se-quências e, portanto, das unidades e, finalmente da totalidade que é o plano-sequência. Este trabalho, de mensuração, não tem como intento a implantação de um sistema de custeio, da razão pela qual somente são apreciados aqui os custos relacionados direta-mente com o procedimento estudado em cada sequ-

Quadro 10 - Alta do paciente + RN.

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SEGURO SAÚDETOTAL

Seguro SaúdeCLIENTE

PARTICULARTOTAL

Cliente ParticularSUS Conforme

quadro 30

TOTAL SUS Valores pre-estabelecidos

Unidades de Ação (R$) Unidades de Ação (R$)eventos

mensuráveis(R$)

1 35,72 1 46,27 1 230,00

2 211,52 2 228,93 2 102,00

3 80,00 3 80,00 3 5,00

4 761,68 4 1.149,93

5 43,58 5 75,23

6 27,42 6 27,42

7 28,35 7 60,00

8 0,00 8 0,00

TOTAIS 1.188,27 1.667,78 337,00

Tabela 10 - Comparação dos Resultados

ência de atividades no parto cesariana. Os resultados alcançados permitem afirmar que o plano-sequência construído pode servir como subsídio para a formu-lação de um sistema de custos na área hospitalar. Há

indícios de que o custeio elaborado a partir do plano-sequência tem um maior grau de detalhamento que os sistemas de custos tradicionais em hospitais, como o custeio por procedimento e o custeio por ativida-des.

Referências

1. Beulke R, Berto DJ. Gestão de custos e resultados na saúde: hospitais, clínicas, labora-tórios e congêneres. São Paulo: Saraiva; 2000.

2. Borba VR. Estudo de cenários para a formulação de estratégias para o controle de gestão de entidade filantrópica no setor de saúde. [Dissertação]. São Paulo: Centro Universitário Moura Lacerda; 2003.

3. Brimson James A. Contabilidade por atividades. São Paulo; 1996.

4. Hong Yuh Ching. Gestão baseada em custeio por atividades. 3.ed. São Paulo; 2001.

5. Leone GSG. Custos: planejamento, implantação e controle. 3.ed. São Paulo; 2000.

6. Schindler Jr. AFR Controle de gestão por plano-sequência em Hospital Maternidade. [Dissertação]. Salvador, BA: Fundação Visconde de Cairu - Salvador/Bahia; 2004.

7. Yoshitake M. Teoria do controle gerencial. São Paulo: Ibradem; 2003.

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PENSANDO EM PRINCÍPIOS PARA UMA DOCÊNCIA TRANSDISCIPLINAR

THINKING ABOUT PRINCIPLES FOR A TRANSDISCIPLINARY DOCENCY

Rosamaria de Medeiros arnt*

* Pesquisadora do CNPq, integrante do Grupo de Pesquisa Ecotransd: ecologia dos saberes, transdisciplinaridade e educação.

RESUMO

Este artigo apresenta um estudo sobre a transdisciplinari-dade na forma de princípios para uma docência transdisci-plinar. Considera-se que a docência transdisciplinar parte de princípios que configurem uma postura do ser perante o conhecimento que vá além da disciplina, articulando ciên-cia, artes, filosofia, tradições e experiência espiritual, reco-nhecendo a multidimensionalidade humana e os múltiplos níveis de realidade, permitindo a interconexão do ser com a natureza, com o outro, consigo mesmo, alicerçando a ética, conspirando pela comunhão a favor da vida. Os princípios foram constituídos a partir da análise da Carta da Trans-disciplinaridade e da experiência da autora na docência. Toma-se princípio como ponto de partida, num movimento auto-eco-organizado, sendo cada um necessário mas não suficiente para a docência transdisciplinar. Cada princípio desdobra-se em gestos que possibilitam sua operacionaliza-ção. São eles: reconhecer o mundo em que vivemos, atra-vés da articulação do conhecimento disciplinar, permitindo a consciência do significado de ser e fazer parte da socieda-de/meio; abrir-se para o tempo de ser, buscando a reflexão atenta através da integração das múltiplas dimensões hu-manas; acolher/conhecer o outro – o sujeito de nossa ação docente, consciente de que é impossível conhecer as partes sem conhecer o todo; criar um espaço de comunhão para a aprendizagem, consciente de que é impossível conhecer o todo sem conhecer as partes; criar um cenário para que, em parceria, docente e discentes sejam atores e autores do processo educativo, numa postura dialógica, mantendo a dança constante entre os quatro princípios anteriores, numa perspectiva recursiva e retroalimentadora.

DESCRITORES: Docência - transdisciplinaridade. Formação de professores

ABSTRACT

This article presents a study about the transdisciplinarity as principles to a transdisciplinary docency. It is considered that a transdisciplinary docency begins with principles that, toghether, make a way of facing the knowledge that goes beyond a particular subject, articulating science, arts, philo-sophy, traditions and spiritual experiences. That allows an interconnection between somebody and the nature, the others, himself, making the ethics stronger and conspiring for a better life. The principles were built from the Charter of Transdisciplinarity and the author’s experience as a do-cent working with the formation of teachers. In this article we consider principle as a starting point. The five principles presented work, each one of them, complementing the four others. Each one of them is important but doesn’t work without the others. Each principle becomes an action that takes its idea to our reality. These actions are: recognizing the world we live in, discovering our time’s to, be, sheltering the others, weaving our living together, building in a group.

DESCRIPTORS: Docency-transdisciplinarity. Teacher educa-tion.

Relato de pesquisaFoRmação e CapaCitação na ÁRea da saúde

ISSN 2176-9095

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Arnt RM. Pensando em princípios para uma docência transdisciplinar São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 55-64

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Relato de pesquisaFoRmação e CapaCitação na ÁRea da saúde

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IntRoduçãoDesde os primeiros estudos que fiz sobre Trans-

disciplinaridade, em 1999, busco nela a organização de meu pensamento para fundamentar uma atitude que possa, minimamente, representar uma contribui-ção nos ambientes educacionais seja na universidade, na formação de professores, seja nos projetos de for-mação continuada ou nas atividades desenvolvidas em ambientes sócio-educativos, em regiões de vulnerabi-lidade social, na cidade de São Paulo.

Acredito que a transdisciplinaridade pode emba-sar e inspirar uma atitude que repercuta positiva-mente no fazer docente, na mediação pedagógica, nas interações e relações entre professor e alunos. Lem-brando Freire (1997), é preciso manter-se a atenção ao rigor nos processos educativos e buscar o prazer nas circunstâncias criadas em sala de aula, fugindo ao laissez-faire, ou ao prazer pelo prazer. Por intermédio de Maturana (1997) sabemos que fluímos de acor-do com as circunstâncias, criando campos vibracio-nais com nosso pensar, sentir, agir, que se acoplam ao pensar, sentir, agir daqueles que compartilham os espaços de aprendizagem conosco.

Como tantos, vivo constantemente sob uma indig-nação que se expressa num verso que se repete, da música Promessas de Sol*, marcando o passo de cada dia: Que tragédia é esta que cai sobre todos nós? Tragé-dia que se mostra nas populações de rua, na miséria, fome, violência em diferentes níveis e formas. Tragé-dia que se mostra na falta de esperança, nas grades de casas e edifícios que se tornam cada vez mais altas. No medo, nas armas, na intolerância. Tragédia que se mostra no desemprego, no subemprego, na barganha pela vida, como se a vida fosse mercadoria. Tragédia que se estampa nos que se entregam a qualquer tipo de vida, vida sem sentido, por não visualizar alterna-tivas. A educação vem sendo apontada como o cami-nho por onde passa a solução dos problemas sociais, políticos, econômicos, ambientais, existenciais. Mas onde começa esse caminho?

Queremos a paz no campo, nas cidades, entre os povos. Ela não se dissocia da paz nos lares, nas esco-las. Que por sua vez não se encontra isolada da paz entre familiares e no convívio em sala de aula. E a paz interior? É possível a construção da paz sem que

* Música dos compositores brasileiros Milton Nascimento e Fernando Brant.

ela seja, concomitantemente, buscada e construída no interior do ser humano? Todos sabemos da impor-tância do diálogo, mas onde aprendemos a dialogar? As teorias nos apontam caminhos. Como começar a trilhá-los? Quem começa?

A transdisciplinaridade pode contribuir para a educação, influenciando, inicialmente, a atitude, tornando-a propícia à construção de uma docência transdisciplinar, que acolha o rigor, a abertura e a to-lerância, como preconizado na Carta da Transdisci-plinaridade**. Considero que essa docência poderá se refletir, pelas circunstâncias criadas, nos seres que ali interagem, modificando as relações professor-aluno, favorecendo o desenvolvimento humano, na sua mul-tidimensionalidade.

Já não é possível ficar impassível diante das ques-tões sociais. Mesmo sabendo que as cenas já não nos impactam, como a dos meninos de rua. A cada manhã nos vem o angustiante questionamento: ‘O que fa-zer?’. Continuar a fugir do contato visual com pessoas que desafortunadamente não possuem o mínimo para manter a dignidade humana? Ignorar desesperança, cansaço, apatia, indiferença, descaso, tédio, desres-peito por si mesmo, pelo outro, pela sociedade que formamos?

A busca pela docência transdisciplinar funda-se na esperança de que ela represente um leque de ca-minhos significativos que possa auxiliar na mudança através da educação; funda-se, ainda, na compreensão de que a atuação profissional acha-se profundamente imbricada com as questões aqui apontadas, carregan-do em sua essência a valorização da vida e da digni-dade humanas. Segundo Laszlo (2001), é preciso uma mudança no nível de consciência para evitarmos o co-lapso da civilização. Em que pese a complexidade do desafio, há que se fazer com que, de alguma maneira, essa mudança se consubstancie. No meu entender, eis também o compromisso da docência transdiscipli-nar e a importância de conceituá-la para criar campos de atuação e aproximação.

** A Carta da Transdisciplinaridade é um documento escrito por ocasião do Primeiro Congresso Mundial de Transdis-ciplinaridade, no Convento de Arrábida, Portugal, no ano de 1994, sintetizando as discussões ali havidas, consis-tindo, no dizer de D’Ambrosio4 (1997), um dos signatários, um pacto moral entre todos os homens definitivamente interessados numa nova perspectiva de futuro para a hu-manidade.

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Debruçar-me sobre o tema da transdisciplinari-dade permitiu-me constatar o quanto ainda precisa ser construído. Essa construção requer, por um lado, o cuidado com a articulação teórica, a necessidade de uma compreensão aprofundada dos princípios da transdisciplinaridade, a partir dos documentos origi-nais***, para que não nos deixemos seduzir por mo-dismos, ideias e teorias pasteurizadas e reducionistas, numa simplificação apressada. Além disso, há ainda que se analisar, sob diferentes teorias, certos con-ceitos importantes, como o de zona de não-resistên-cia, que nos abre o entendimento do significado da compreensão, do conhecimento pela intuição e pelo amor, para que sejam vinculados à prática pedagógica. Dessa maneira, acredito que se possa gradativamente construir uma prática docente impregnada de trans-disciplinaridade, desfazendo-se a ideia de que esta se-ria uma condição utópica.

Ao ler as declarações de fóruns patrocinados pela UNESCO (2006), integrados por renomados cien-tistas, filósofos, artistas, que marcaram o início do pensamento transdisciplinar e de uma nova maneira de vislumbrar o conhecimento e o mundo, dou-me conta de que tais eventos aconteceram nos anos 80. Ora, esta em 2007. Embora maravilhosos e inspirado-res, aqueles escritos permanecem ‘trancafiados’ em algumas publicações, ou sendo ainda objeto de dis-cussões em meios acadêmicos; pouco, ou quase nada, se avançou no sentido de levá-los adiante – a núcleos de formação, por exemplo. Este artigo nasce também da vontade de encontrar um meio de levar para a formação docente, inicial ou continuada, pontos que possam direcionar discussões mais abrangentes, dan-do continuidade ao movimento que se iniciou com homens de vulto. Meu propósito, ao organizar os princípios da docência transdisciplinar (ARNT, 2009), é o de construir um arcabouço de ideias que possam dar base à formação da docência transdisciplinar. Ao descrever e analisar princípios, pretendo criar cami-nhos para trilhar com os professores, visando uma maior aproximação em relação à transdisciplinari-dade, mantendo sempre presente a necessidade do contato com a realidade mais imediata da sala de aula. Dessa forma, acredito que estaremos ampliando a re-flexão na direção apontada pelos pensamentos que

*** Veja documentos sobre a transdisciplinaridade no site www.ecotransd.com.br

nos reconectam a nós mesmos, à natureza, à huma-nidade.

Sobre o caminhoCheguei aos princípios da docência transdiscipli-

nar, partindo de experiências, ou cenas, de minha prática docente. Tomo a palavra cena com seu signi-ficado original: parte de filme ou de vídeo que focaliza determinada situação e um mesmo ambiente, geral-mente com as mesmas personagens, podendo incluir diversos planos ou tomadas. Algumas cenas são for-madas por uma única situação. Outras são compos-tas, organizando-se em torno de um tema.

Designo de experiência aquilo que nos aconte-ce, o que vivenciamos, diferenciando-a daquilo que acontece, simplesmente. Esta definição (LARROSA, 2002) vincula a experiência ao sujeito da experi-ência, como o espaço onde esta acontece. Assim, o sujeito da experiência precisa ser receptivo, disponí-vel, aberto e passivo. Com uma passividade, anterior à oposição entre ativo e passivo, uma passividade feita de paixão, de padecimento, de paciência, de atenção, como uma receptividade primeira, como uma disponibilidade fundamental, como uma abertura essencial (ibid.:24). Não há segurança em ser sujeito da experiência, pois ao enfrentar a incerteza e o inesperado, há a perda do poder e do controle. Larrosa (ibid.) salienta que é incapaz de experiência o sujeito firme, forte, impávi-do, inatingível, erguido, anestesiado, apático, autode-terminado, definido por seu saber, por seu poder e por sua vontade. A experiência, para ser o que nos acontece, apodera-se de nós. O saber da experiência, portanto, não está fora de nós. Não podemos tornar nossa a experiência de outrem, revivendo-a. Através do diálogo, podemos, no entanto, enriquecer nossa própria experiência, transformando-a em experiência formadora, como concebe Josso (2004, p.39). Esta autora caracteriza a experiência formadora como uma aprendizagem que articula, hierarquicamente: sa-ber-fazer e conhecimentos, funcionalidade e significação, técnicas e valores num espaço-tempo que oferece a cada um a oportunidade de uma presença para si e para a situação, por meio da mobilização de uma pluralidade de registros.

A narrativa das experiências pressupõe a narração de si mesmo, por meio de recordações-referências, ou experiências que podemos utilizar como ilustra-

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ção. São tais narrativas o ponto de partida de meu método de pesquisa, de aprendizagem, esencadeando o processo dialógico e reflexivo de uma pesquisa-formação.

Josso (2004) diferencia as experiências em três modalidades. Ter experiências representa as situações que são vividas sem que as tenhamos provocado. São experiências feitas a posteriori. Fazer experiências re-presenta as que provocamos, com intencionalidade. São experiências a priori. Pensar sobre as experiências, tanto as a posteriori como a priori, permite a interpre-tação e elaboração das mesmas, possibilitando novas significações, o alargamento da consciência, a mudan-ça, a criatividade, a autonomização, a responsabilização (JOSSO, 2004, p.51).

Para a emergência de novas significações, esta au-tora destaca três atitudes interiores indispensáveis: abertura para si, para outrem e para o meio, visando a exploração e o conhecimento.

Numa primeira etapa, as experiências não inten-cionais (a posteriori) surpreendem-nos, causam impac-to e conduzem-nos a momentos de reflexão e revisão de conceitos e atitudes. Interrompe-se uma lógica que, a partir de então, já não nos permite integrar o que se passa ao que é conhecido, e ficamos afetivamente pertur-bados, porque uma temporalidade foi quebrada ou, ainda, porque um funcionamento foi interrompido. O primeiro momento da experiência é esta suspensão de automatis-mos, é o imprevisto, é o espanto (JOSSO, 2004, p.52). Importante lembrar que uma experiência, mesmo compartilhada, não produz os mesmos significados: estes são sempre diferentes, singulares. Portanto, é impossível repetir-se uma experiência. Ao tentar re-vivê-la, só pela intenção, não será uma experiência a posteriori. A partir de experiências que classifico como não intencionais, dialogando com autores, chego aos princípios que serão mencionados a seguir.

2. Princípios da docência transdisciplinarA palavra ‘princípio’ é ligada à ideia de origem,

começo, ponto de partida de um processo qualquer. Aristóteles (apud ABBAGNANO, 1998) enumerou seus significados, dos quais destaco o ‘ponto de par-tida’, ou, mais especificamente, o melhor ponto de partida – o que facilita uma situação de aprendizagem. ‘Princípio’ também pode ser associado a algo que de-termina movimento, mudanças, ou ainda, remeter às demonstrações matemáticas, às premissas que fazem

parte de um processo de conhecimento.A concepção de ‘princípio’ aqui utilizada corres-

ponde à constituição do ponto de partida, da base so-bre a qual se possa pensar a docência transdisciplinar. Porém, é preciso enfatizar que não faço concessão a princípios rígidos, que possam cristalizar-se e crista-lizar-me. Ao contrário, tento fugir da construção de gaiolas**** onde me aprisione, saindo da disciplinari-dade para fixar-me numa proposta que não me per-mita visualizar outras possibilidades de entendimento da vida, da educação e da atuação docente. Penso em princípios que se relacionem de forma dinâmica, aberta e processual, caracterizados pelo movimento e pelo fluxo, permitindo sempre novos arranjos, in-corporando idéias que se agreguem e complementem o aqui exposto. A partir dos princípios, a cada novo grupo de aprendizagem que formamos, os pontos de chegada serão sempre outros, negociados pelos com-ponentes do sistema humano em construção, sistema este que terá características próprias, que deverão ser compreendidas à medida que os indivíduos inte-rajam. Num tempo em que princípios antes consi-derados universais deixam de sê-lo, levo em conta a transitoriedade do conhecimento, seu inacabamento, mas também a necessidade de ter uma base de tra-balho, de pensamento, de ação, mesmo que móvel, mutante.

A própria construção dessa base requer “mate-riais” que se liguem, se entrelacem. Tais materiais podem ser considerados macroconceitos (MORIN, 1990; MORAES, 2004) ou pressupostos que confor-mam meu olhar, permitindo-me criar o caminho que me proponho. Explicito aqui tais pressupostos: com-plexidade, transdisciplinaridade e minha compreensão sobre o diálogo e consciência humana.

Assim, minhas experiências formadoras vão sen-do sistematizadas, na forma de princípios da docência

**** Referência às gaiolas epistemológicas, metáfora de D’Ambrosio (1997) para a compreensão da disciplina, da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Se a disciplina é vista como uma gaiola que permite um con-tato reduzido com a vida, a interdisciplinaridade seria a aproximação de gaiolas com portas abertas entre si, possibilitando o contato mais estreito com o outro, com a vida, mas ainda engaiolados. A transdisciplinaridade representa as gaiolas abertas. Permanecendo abertas nos propiciam o voo livre para a compreensão da vida, com a gaiola continuando acessível, com alimento e água para nosso reconforto e segurança.

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transdisciplinar, como ponto de partida de um pro-cesso de conhecimento, de organização da prática, de criação e recriação constante de meu ser no mundo.

a. Primeiro princípio: reconhecer o mundo em que vivemos, ou a necessidade do conhecimen-to disciplinar

O primeiro princípio da docência transdisciplinar pauta-se na necessidade de reconhecer o mundo em que vivemos, num movimento de integração, compreendendo que somos parte dele através de um gesto de consciência e abertura, com vistas a uma ação enraizada em nosso tempo, permitindo a consciência do significado de fazer parte da socieda-de/meio em que vivemos, ressaltando a importância do acoplamento estrutural, enquanto reconhecemos também a possibilidade de interferir no meio, nele desencadeando mudanças. O fazer docente não é descompromissado ou insignificante perante a com-plexidade da realidade. Será descompromissado e insignificante, porém, se não houver consciência de nosso papel nesse contexto. Dessa forma, imerso na realidade complexa, o pensamento transdisciplinar revela-se na tomada de consciência de nosso tempo e de nosso ser no tempo, abrindo-se numa dimensão de cuidado e trabalho, num gesto consciente de aber-tura, que incorpora a incompletude, o inacabamento. Assim, temos a possível segurança diante da cegueira do conhecimento e nos colocamos em diálogo com as disciplinas, com os pensadores de nosso tempo e de outros tempos, tecendo e refazendo a teia de nosso olhar sobre a realidade, reconhecendo-a multidimen-sional e multirreferencial, ou seja, se apresentando em diferentes níveis e sendo percebida sob diferentes níveis de percepção (NICOLESCU, 1999).

A fragmentação do conhecimento, segundo Weil (1993), se dá pela fragmentação do Real pela mente humana, ao separar o sujeito que conhece do objeto conhecido e considerar o conhecimento como algo externo. Morin (1999) pondera que o mesmo mo-vimento, que amplia desmesuradamente determina-da ideia ou ação, é responsável pelo surgimento do movimento contrário. Assim, o big-bang disciplinar, chegando a pontos extremos, começa a despertar a necessidade de junção, num movimento de síntese, pois os objetos de estudo tornam-se estanques, cor-rendo-se o risco de isolar o objeto em estudo, como

se não fizesse parte do universo. Destaca-se ainda que tais movimentos não signi-

ficam o fim das disciplinas, mas a busca da sua ecolo-gização (MORIN, 1999), levando-se em conta os as contextos, condições culturais e sociais, observando-se como e em que meio nascem, como colocam seus problemas, como se esclerosam e se metamorfo-seiam. O conhecimento disciplinar continua impor-tante na apreensão da realidade, mas compreende-se a necessidade de que a disciplina seja ao mesmo tem-po aberta e fechada, pois o que se dá além da disci-plina é também necessário à própria disciplina. Morin (ibid.:37) lembra Pascal, que considerava impossível conhecer as partes sem conhecer o todo e vice-ver-sa, complementando que esta ideia nos remete a um conhecimento em movimento, a um conhecimento em cir-cuito pedagógico, em espiral, que progride ao ir das partes ao todo e do todo às partes.

b. Segundo princípio: encontrar-se com o tempo de ser

A docência transdisciplinar pressupõe uma relação diferente com a própria realidade. Mas também deve incluir uma relação diferente do docente consigo mesmo, num movimento de autoconhecimento, pos-sibilitando a distinção e a integração consciente em relação ao meio. Pressupõe uma racionalidade aberta dialogando com a não-racionalidade, para que vislum-bremos o significado de transitar pela zona de não-resistência, ou o sagrado. A docência transdisciplinar pressupõe o cuidado consigo mesmo, dando origem ao segundo princípio: encontrar-se com o tempo de ser através de um gesto de interrupção que permita a suspensão do automatismo da ação.

A zona de não-resistência é um importante conceito trazido por Nicolescu (1999) que nos per-mite reconhecer que, no contato com a realidade, temos duas maneiras de compreendê-la. Uma, já bas-tante estudada, compreende a racionalidade. Mas há outra possibilidade, que no diálogo com a racionalida-de nos permite a compreensão e interpenetração da realidade. É a região de não-racionalização, de trans-parência absoluta ao real. É a zona da intuição, da compreensão pelo amor, ou, no dizer de Nicolescu (1999), do sagrado. A não-resistência dessa zona de-ve-se, simplesmente, aos limites de nosso corpo e de nossos órgãos dos sentidos, quaisquer que sejam os

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instrumentos de medida que prolonguem esses ór-gãos. O sagrado não se opõe à racionalidade. Trata-se de um terceiro incluído, do exercício de complemen-taridade, possibilitando a coexistência dialógica da ra-cionalidade com a não-racionalidade. Acredito, como descrito por Wilber (2003), que existe um tipo de conhecimento somente possível através da vivência. Este é caso da experiência não-racional e também do conhecimento obtido a partir de um gesto de interrup-ção. Gesto de interrupção é uma expressão utilizada por Larrosa (2002) que nos faz suspender o auto-matismo da ação, transformando-nos num sujeito da experiência, reconhecendo que a experiência é algo que nos acontece, necessitando para tanto de entre-ga, uma entrega consciente, passiva e ativa ao mes-mo tempo. Um abandono consciente, um controle descontrolado. O gesto de interrupção requer parar para olhar, perdendo-nos nos detalhes, sentindo com os olhos, conhecendo com os olhos. Requer escutar por inteiro, escutar mais devagar, suspendendo a opi-nião. Requer parar para sentir, de diferentes formas, sempre renovadas. Um gesto de interrupção nos per-mite abrir um canal de contato com a realidade, culti-vando a atenção e a delicadeza. Permite ainda encon-trar o tempo para falar sobre a própria experiência, contando o que nos acontece, alimentando o diálogo com o outro, com a vida. Aprendemos a viver um ou-tro tempo, o tempo interior, o tempo sem tempo, o tempo da lentidão, o tempo de ser, cultivando a arte do encontro com nós mesmos, sem nos apartarmos do convívio, da comunhão.

Suspendendo o automatismo da ação, posso ex-perimentar a reflexão atenta (VARELA et al., 2003), reconhecendo que a razão pode combinar-se com a intuição e o amor, permitindo a transgressão para além da lógica indutivo-dedutivo-identitária (MO-RIN, 2000). A reflexão atenta, ou ação incorporada, é aquela que acontece com corpo e mente unidos. Dessa maneira, a própria reflexão é uma forma de experiência, desempenhada com atenção/consciência, interrompendo uma cadeia de padrões de pensamen-tos habituais e preconcepções, tornando-se aberta a possibilidades diferentes daquelas contidas nas repre-sentações comuns que uma pessoa tem usualmente. Essa união mente-corpo, segundo esses autores, é algo a ser desenvolvido e está presente, por exemplo, naqueles que meditam.

No relatório da UNESCO (1999, p.85) para a edu-cação para o século XXI, encontramos o desenvolvi-mento humano na finalidade da educação:

Desenvolver os talentos e as aptidões de cada um corresponde, ao mesmo tempo, à missão fundamen-talmente humanista da educação, à exigência de equi-dade que deve orientar qualquer política educativa e às verdadeiras necessidades de um desenvolvimento endógeno, respeitador do meio ambiente humano e natural, e da diversidade de tradições e de culturas. E mais especialmente, se é verdade que a formação permanente é uma ideia essencial dos nossos dias, é preciso inscrevê-la, para além de uma simples adap-tação ao emprego, na concepção mais ampla de uma educação ao longo de toda a vida, concebida como condição de desenvolvimento harmonioso e contínuo da pessoa.

As questões que me coloco neste momento são: por onde começar um processo de mudança que ga-ranta esse desenvolvimento e direcione o engajamen-to para a melhora da vida humana no planeta? Onde se pode alicerçar tal movimento? Como agir para pro-mover o desenvolvimento harmonioso e contínuo da pessoa? Como podemos ser mais autônomos, mais conscientes, mais interligados ao que nos cerca, se ao mesmo tempo vivemos num tempo que nos tolhe, nos reduz, em termos de educação, à unidimensiona-lidade racional ou profissional?

Quem é professor, geralmente é incapaz de ainda fazer algo para o próprio bem, está sempre pensando no bem de seus alunos, e cada conhecimento só o alegra na medida em que pode ensiná-lo. Acaba por considerar-se uma via de passagem para o saber, um simples meio, de modo que perde a seriedade para consigo (NIETZSCHE, 2000, p.138).

O pressuposto de cuidar deve começar pelo cui-dado consigo mesmo, encontrando o espaço e o tem-po de ser, de viver, de ser um sujeito da experiência.

Assim, ao propor o exercício do gesto de inter-rupção, convido à pausa para respirar, respirando mais devagar e profundamente. Respirar mais deva-gar para sentir a vida que somos. Respirar mais de-vagar para nos sentirmos vivos a cada instante, tendo consciência de cada momento vivido. Respirar para perceber nosso corpo e sua dinâmica. Respirar mais devagar para, na lentidão do gesto, conscientemente realizar o movimento que permite basicamente nosso

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ser no mundo. Conscientes da respiração, conscienti-zamo-nos de nossa ligação primeira com o meio onde nos inserimos, com o qual interagimos. Conscientes da respiração, tornamo-nos conscientes do ar que nos envolve interna e externamente e através dele descobrimos que estamos em contato com o mundo. Nesse contato, a sensação de interdependência, de au-tonomia relativa. Interdependência porque não somos isolados. Nossa existência, nosso ser no mundo é de-pendente de tudo o mais que existe. Somos porque tudo o mais também é. Autonomia (MATURANA, 1995; VARELA, 1995) como a capacidade de especi-ficar nossas próprias leis, o que é próprio do ser, tri-lhando caminhos próprios. Autonomia que é sempre relativa, pois ao viver somos dependentes em nossas interações com o meio; autonomia que, conhecendo sua interdependência, pode tornar-se consciente de suas possibilidades.

Através do gesto de interrupção exercitamos em nós o saber ser preconizado pela UNESCO (1996), significando a necessidade do desenvolvimento da li-berdade de pensamento, discernimento, sentimentos e imaginação, para sermos, na relativa autonomia, se-nhores de nosso destino. Impossível pensar-se nesse desenvolvimento sem o conhecimento de si mesmo. E, no mergulho para o conhecimento de si mesmo, encontramos o infindável processo de aprendizagem, dialético e dialógico, desdobrando-se ora para o inte-rior, ora para o exterior. Esse movimento pressupõe que não oferecemos o que não temos. Logo, como olhar o aluno em sua inteireza, em sua multidimen-sionalidade, se não lançamos esse olhar para nós mes-mos?

c. Terceiro princípio: acolher as partesEstando em contato com o meio formado pelo

outro-sociedade-natureza, estando em contato con-sigo mesmo, a docência transdisciplinar pressupõe o cuidado e o acolhimento do outro-aluno. É impossí-vel conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes. Assim, o terceiro princípio é acolher as partes, ou seja, o aluno/aluna. Ao acolher a parte, reconhecer sua multidimensionalidade e buscar com-preendê-la em sua inteireza. O gesto que expressa esse princípio é o olhar que identifica o aluno, a alu-na, procurando conhecê-lo, conhecê-la, distinguindo a parte do todo, sem separá-la do todo ao qual per-tence.

Nesse sentido, há duas facetas a serem considera-das: cuidar e acolher.

Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Por-tanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupa-ção, preocupação, de responsabilização e de envolvi-mento afetivo com o outro (BOFF, 1999).

É através do cuidado que saímos de nós mesmos em direção ao outro. Encontrado nosso ‘tempo de ser’, podemos partir em direção ao aluno com des-velo e solicitude. No modo-de-ser-cuidado ocorrem resistências e emergem perplexidades. Mas elas são su-peradas pela paciência perseverante. No lugar da agressi-vidade, há a convivência amorosa. Em vez da dominação, há a companhia afetuosa, ao lado e junto com o outro (BOFF, 1999, p.96).

Em sentido inverso ao movimento da sair de si em direção ao outro, há o acolhimento. Acolher significa oferecer ou obter refúgio, proteção ou conforto físi-co; dar ou receber hospitalidade. O professor, como ‘primeiro habitante’ da sala de aula, pode ser também pensado como o que oferece abrigo e hospedagem. A hospedagem pressupõe cuidado com a infraestrutura necessária à vida escolar. Se a instituição é responsá-vel pela infraestrutura física, ao professor cabe a res-ponsabilidade pelo ambiente, pelos ‘ares’ da sala de aula. Tal responsabilidade posteriormente deve ser compartilhada, mas a iniciativa primeira, sem dúvida, cabe ao professor, que dá o ‘tom’ da convivência. O acolhimento, enfim, deve cuidar do que é necessário ao aluno para que sua aprendizagem aconteça.

d. Quarto princípio: criar circunstâncias para a comu-nhão

É impossível conhecer as partes sem conhecer o todo. Assim, o movimento contínuo nos leva a procu-rar o conhecimento do todo – grupo de aprendizagem – constituindo-se também um princípio da docência transdisciplinar. O conhecimento do todo tem uma intencionalidade, que é criar circunstâncias para a comunhão – o estar junto com objetivos comparti-lhados e tendo a convivência marcada pela aceitação do outro como legítimo outro (MATURANA, 1997), formando um sistema social humano. A tessitura do todo é dependente do diálogo. Assim, o gesto que permite esse princípio está entre os que favorecem o diálogo, ou a escuta, a atenção aos detalhes, aos gestos, à entonação da voz, aos múltiplos sinais que

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cruzam o espaço em sala de aula. Na atenção à configuração do todo, que faz com

que cada turma seja única, é preciso criar circunstân-cias que possibilitem compreender quais as caracte-rísticas do grupo para que as ações propostas sejam congruentes e nutridoras do todo em formação. Eis o porquê da impossibilidade de repetir programas, trabalhar rigidamente com planejamentos pensados e organizados a priori, antes de conhecer os alunos.

Entrar em sintonia, num grupo, pode significar a busca de um estado de frequência comum. Estado que não pode ser alcançado por imposição, mas atra-vés de um consentimento interior, predispondo-se a compreender outro ‘estado de frequência’, fazendo os ajustes necessários para que aconteça a similitu-de.

Entrar em sintonia pressupõe anteriormente a es-cuta, a abertura ao diálogo, compreendendo o diálo-go como a possibilidade de compreensão da lógica de pensamento do outro e não uma discussão ou deba-te. O diálogo como cooperação, concepção de algo novo, só é possível pela interação, pela troca.

Esse princípio visa à construção da sintonia e da harmonia para o ‘fazer junto’, com uma atitude dialógi-ca, permitindo que tenhamos referências comuns, como se pudéssemos conceitualmente habitar um mesmo nível de realidade*****, buscando compartilhar os níveis de percepção e consciência. O fazer junto, por sua vez, propicia o surgimento da intimidade, da cumplicidade, mesmo com as diferenças reconhecidas entre as partes. A partir das referências comuns, das experiências, vamos adquirindo uma ontogenia de grupo, ou a história das mudanças estruturais pelas quais passamos juntos.

***** O Real, para Nicolescu (1999) se apresenta em di-ferentes níveis, ou conjuntos de sistemas invariantes sob a ação de leis gerais. Cada nível de realidade tem uma lógica própria sob a qual se manifesta. Cada nível de realidade é apreendido por um nível de percepção. Os níveis de realidade são infinitos e estão ligados pela lógica do terceiro incluído, segundo a qual duas ideias contraditórias em um nível de realidade são uni-das por um terceiro ponto ou concepção que está em outro nivel de realidade, onde são percebidas como complementares. Os níveis de realidade, a lógica do terceiro incluído e a complexidade são os três pilares da transdisciplinaridade, de acordo com diferentes do-cumentos, anteriormente citados, que a definem e ca-racterizam.

e. Quinto princípio: criar juntos nossas próprias his-tórias

Em se tratando de transdisciplinaridade, creio que a maneira de configurar a prática em sala de aula deva emergir primeiramente do ser-professor, desdobran-do-se, a seguir, no acolhimento do aluno e do seu es-paço de criação: como se, já no primeiro dia de aula, de posse de um plano previamente esboçado, desen-rolássemos um tapete mágico, convidando os alunos a sentarem-se também sobre ele para que juntos possamos viver uma história que juntos criemos. Eis o sentido do quinto princípio: criar juntos nossas próprias histórias. O gesto? Um gesto que integre o ser, cada ser presente em sala de aula num movi-mento que tenha em si a possibilidade de distinção, integração e interação na conformação de um todo. Um gesto que se mostre como uma dança conjun-ta, harmoniosa e bela.

Ao pensar na prática, saliento a relevância da cria-ção coletiva e do significado de ‘dar vida’ a algo. A transdisciplinaridade está profundamente tecida, enraizada, na compreensão da Vida. Funde-se com a Vida. Logo, na docência transdisciplinar, é preciso criar, dar vida, para saber o que significa. Como esta-mos em sala de aula, com objetivos bem definidos, é preciso que nosso planejamento comporte a criação, algo que, como uma história, tenha início, meio e fim. Tenha personagens, tenha vida...

Assim, trabalhamos na criação de um cenário, previsto para ser construído e habitado por alunos e professor. Enfrentamos, em sua criação, a incerteza. A ação será aquela ecologizada (MORIN, 2000a), ou seja, a partir do início da ação seu desenrolar foge das intenções iniciais, entrando no jogo do círculo retroativo e recursivo, nas relações de interdepen-dência, nas emergências, com abertura ao inespe-rado e ao incerto. Com isso, nas diferentes etapas haverá o espaço para a co-criação e a definição mais específica das ações será realizada no decorrer do trabalho. As estratégias são compartilhadas e discu-tidas a cada passo. Morin (2000a, p.90) salienta que o cenário pode e deve ser modificado de acordo com as informações recolhidas, os acasos, contratempos ou boas oportunidades encontradas ao longo do caminho. Pode também acolher pequenas partes com programação mais fechada e detalhada. Para atuar no cenário, a es-tratégia é importante, porque flexível. É na estratégia

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que se apresenta, sempre de maneira singular, em função do contexto e em virtude do próprio desenvolvimento, o problema da dialógica entre fins e meios (ibid.:91).

Para compor o cenário, a cada etapa é revisto o percurso já realizado e recomposta a próxima etapa, a partir do que foi previamente traçado. Sabemos que o calendário acadêmico ou escolar nos reserva sur-presas. Um cronograma muito rígido certamente nos deixará à mercê de cortes ou mutilações que inviabi-lizem o conjunto do trabalho, por faltar tempo para uma sistematização adequada.

No cenário é definida uma matriz de conceitos, formada por pontos que são os nós da rede, portanto imprescindíveis para a organização do que será traba-lhado. Temas secundários vão se conectando, inter-relacionando, de forma natural. Outros temas, margi-nais ou periféricos, como que ficam ‘disponíveis’, para serem trazidos de acordo com as configurações que o cenário assumir. Ao pensarmos em emergências, inesperados e incertezas, é preciso ter em mente que o excesso de informação não condiz com a fle-xibilidade e a busca de sentido. É preciso proceder a uma pesquisa criteriosa, com seleção de ‘conteúdos’, estabelecimento de prioridades, reconhecendo que, para dar o tempo da formação do grupo, do trabalho conjunto, da ressignificação que cada aluno procurará fazer, na busca da qualidade, na busca da compreen-são subjetiva, como dito acima, há escolhas, decisões envolvidas.

A maneira de educar privilegiando a inteireza hu-mana está definida no educar para o sentipensar. Sen-tipensar indica o processo mediante o qual coloca-mos para trabalhar, conjuntamente, o pensamento e o sentimento. “É a fusão de duas formas de interpretar a realidade, a partir da reflexão e do impacto emocional, até convergir num mesmo ato de conhecimento a ação de sentir e pensar” (TORRE, aprid MORAES e TORRE, 2004, p.54).

Através das estratégias de sentipensar se produzirá a prática da integração e da integridade, da escuta inclusiva e da ênfase no cuidar do ser, a partir de um fazer mais

coerente com o pensamento e o sentimento. Alinhando pensamentos, emoções, sentimentos e ações com algo mais elevado de nós mesmos, então a vida se tornará mais rica, plena, cheia de significado e sentido (MORAES e TORRE, 2004, p.69).

3. Para continuar o diálogoHá uma conjunção entre os princípios e é a consci-

ência dela que consubstancia a vivência transdisciplinar em sala de aula. O diálogo entre eles, vívido em nossa ação, tem por base e por fundo a paz, significando que nada pode desenvolver-se em isolamento. É através da interação e integração harmoniosa entre eles que podemos pensar em paz como um estado de espírito a ser alcançado, representando no diálogo conscien-te e ininterrupto com tudo o que existe, para além do conhecimento disciplinar, num fluxo amoroso que pressupõe compreensão e aceitação, produto da eco-logia interior, da ecologia social e da ecologia ambiental, como três ecologias em constante interação (MORAES e TORRE, 2004, p.144).

Acredito que os princípios da docência transdis-ciplinar são complementares ao que conhecemos no âmbito da aprendizagem, didática, avaliação etc, já presentes na formação de professores. O enfoque adequa-se ao pensamento ecos-sistêmico de Mora-es e Torre (2004). Ao partirem do cuidado com o ser responsável pela ação educativa, consideram a importância dessa consciência como desencadeadora de processos educacionais que nos possibilitem pen-sar na cidadania planetária, acolhendo o indivíduo em suas relações complexas com o outro-sociedade e com o meio-natureza, atendendo ao equilíbrio pro-posto pelo triângulo da vida (D’AMBROSIO, 1997). Os princípios propõem um movimento contínuo e envolvente, numa rede que contenha em seus fios o amor, o respeito, a alegria, propiciando a esperança, substantivo do verbo esperançar (FREIRE, 1997), pela união com a responsabilidade e compromisso que nos fazem agentes conspiradores pela vida em paz.

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Relato de pesquisaFoRmação e CapaCitação na ÁRea da saúde

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* Cirurgiã dentista pela UNICID** Mestre em odontopediatria pela UNIP e professor da Universidade da Cidade de São Paulo - UNICID*** Professora titular da disciplina de prótese parcial removivel do departamento de prótese da FOUSP**** Professor associado da disciplina de radiologia do departamento de estomatologia da FOUSP. Professor e Diretor do curso de odontologia da Uni-versidade da Cidade deSão Paulo - UNICID***** Mestre em Odontopediatria - USP - Professora da Universidade da Cidade de São Paulo - UNICID

AVALIAÇÃO DA DURABILIDADE DAS RESTAURAÇÕES E SELANTES REALIZADOS NA FILOSOFIA ART (ATRAUMATIC RESTORATIVE TREATMENT)

EVALUATION RESTORATIONS AND SEALANTS USING THE ATRAUMATIC RESTORATIVE TREATMENT PHILOSOPHY

carolina Mariano Bonzanini*

Gerson lopes**

dalva cruz laganá***

claudio Fróes de Freitas****

elaine Quedas de assis*****

RESUMO

O Tratamento Restaurador Atraumático (ART) foi reco-nhecido pela OMS em 1994 para ser utilizado nos países em desenvolvimento, por ser eficiente e eficaz, uma forma simplificada de trabalho e relativamente indolor. Baseia-se na remoção de dentina infectada de lesões de cárie, usan-do-se apenas instrumentos manuais, realizandose seu pre-enchimento com material adesivo, o cimento de ionômero de vidro, que também possui propriedades de liberação de flúor, Frencken et al.2 (1996).

O ART em associação com ações de promoção e preven-ção de saúde poderá colaborar para a universalidade, in-tegralidade e equidade da atenção básica em saúde bucal, fazendo-se necessária a avaliação da eficiência da técnica.

A proposta deste trabalho é avaliar a durabilidade das res-taurações e selantes realizados na filosofia ART, durante o projeto “Sorria Itapira”.

As restaurações e selantes foram realizadas de acordo com as recomendações elaboradas pela OMS por graduandos do terceiro ano de Odontologia da Universidade Cidade de São Paulo. Sendo avaliadas 405 restaurações e 343 selantes, após 6 e 12 meses em 164 pacientes na faixa etária de 3 a 10 anos de idade.

Observou-se que as restaurações apresentaram sucesso de 56,65 e 54,50% e os selantes de 91,76 e 89,12%, para 6 e 12 meses respectivamente.

DESCRITORES: Selantes de fossas e fisuras. Restauração dentá-ria permanete. Cimento de ionômero de vidro.

ABSTRACT

The Atraumatic Restorative Treatment (ART) was recog-nized by the OMS in 1994 to be used in the developing countries, for being efficient and effective, a simplified work and relatively painless form. It is based on the sepit dentine removal carious tooth tissue using only hand instruments, filling with glass ionomer cement, adhesive material and that it also posses properties as the fluorine release, Frencken et al.2 (1996).

The ART in association with action prevention and promo-tion health will be able to collaborate for the universality, completeness and fairness of the attention in oral health, for this it becomes necessary to evaluate its efficiency tech-nique.

The proposal of this paper was to evaluate the durability of the restorations and sealants carried through in philosophy ART, during the project “Sorria Itapira”.

The restorations and sealants had been carried through in accordance with the recommendations elaborated by the OMS for students of the third year of dentistry in the Uni-versidade Cidade de São Paulo. After 6 and 12 months, 405 restorations and 343 sealants had been evaluated, in 164 patients aged 3 to 10 years.

It was observed that the restorations had presented suc-cess 56,65 and 54,50%, and the sealants 91,76 and 89,12%, for 6 and 12 months, respectively. DESCRIPTORS: Pit and fissure sealants. Dental restauration,

permanent. Glass ionomer cemen

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IntRoduçãoA cárie dentária apresenta grande prevalência na

população mundial, embora tenha diminuído nas últi-mas décadas. Segundo a OMS, atinge entre 50 e 99% das pessoas em todas as comunidades.

No passado, a Odontologia estava voltada apenas para a prática de extrações dentárias com a intenção de aliviar a dor do indivíduo. Posteriormente, passou a restaurar dentes, originando a odontologia cirúrgico-restauradora, que é repetitiva, ineficaz e dispendiosa, com a preocupação de tratar as sequelas da doença.

Com base na visão moderna de mínima interven-ção e máxima preservação de estrutura dentária sadia, o tratamento restaurador atraumático (ART) foi de-senvolvido num programa de prevenção da Tanzânia, em meados de 1980, por Frencken e Holmgren, onde o número de lesões de cárie em crianças aumentava e nenhuma intervenção era realizada.

O tratamento consiste basicamente em um pro-grama de base educativo-preventiva seguido de uma etapa restauradora na qual é realizada remoção par-cial do tecido cariado, utilizando-se apenas instrumen-tos cortantes manuais e na subsequente restauração e selamento das fissuras adjacentes à lesão com um material adesivo, o cimento de ionômero de vidro (CIV).

Em 1994, o ART foi reconhecido pela OMS e dian-te dos excelentes resultados obtidos com essa filoso-fia de abordagem, estimulou mundialmente seu uso.

O ART deve ser considerado uma medida de Saú-de Pública e também ser visto como um programa de controle de cáries de caráter permanente. Não é uma etapa de transição e sim um tratamento definitivo, que se distingue da adequação do meio bucal. Além disso tem caráter preventivo devido às propriedades de liberação de flúor do CIV.

Sendo assim, a proposta deste trabalho é avaliar a durabilidade das restaurações e selantes realizados na filosofia ART, durante o projeto “Sorria Itapira”, em 2007.

MateRIal e MÉtodoSO estudo foi realizado em seis escolas públicas da

cidade de Itapira, no estado de São Paulo. As escolas selecionadas foram: EMEI Edmeé Boretti Rocha, EMEI Yolanda Avancini Brunialti, EMEI Cônego Mateus, EMEI Maria Teresa Fonseca, EMEI Candido Moura e “Nai Criança Feliz”.

Para realização do trabalho, o Protocolo de Pes-quisa n° 13329631 foi submetido à Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo - UNICID e aprovado em 12 de setembro de 2007.

Inicialmente, as crianças passavam por escovação supervisionada, sendo encaminhadas à triagem e clas-sificadas em 4 grupos de acordo com a indicação de tratamento e/ou conduta:

Grupo I: sem indicação de tratamento ou ART, encaminhamento para educação em saúde e preven-ção;

Grupo II: restauração ART, encaminhamento para educação em saúde e prevenção;

Grupo III: selante, encaminhamento para educação em saúde e prevenção;

Grupo IV: encaminhamento para UBS, educação em saúde e prevenção.

Foram examinadas nesse projeto 458 crianças, das quais 227 tinham indicação de tratamento utilizando o ART (grupos II e III).

Os critérios para indicação das restaurações fo-ram determinados pela presença de cavidade atingin-do uma única face envolvendo dentina, sem exposi-ções pulpares, história de dor e presença de fístula, e para selantes o risco de cárie individual.

Foram realizadas 515 restaurações e 501 selantes, utilizando-se a técnica ART de acordo com as reco-mendações elaboradas pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

A avaliação da durabilidade das restaurações e se-lantes foi realizada após um período de 6 e 12 meses por avaliador devidamente treinado e calibrado, se-guindo os passos:

Paciente posicionado sobre uma mesa com um acolchoado.

Exame das restaurações e selantes realizado por meio de espelho clínico e sonda CPI.

Auxiliar anotando os escores da avaliação Os escores de avaliação foram os utilizados em

estudos de ART, de acordo com Frencken et al.2 (1996):

Os resultados obtidos foram tabulados e analisa-dos em porcentagens de sucesso (escores 0, 1 e 7) e insucesso (escores 2, 3, 4 e 8) para restaurações, sendo os escores 5, 6 e 9 excluídos da amostra. Para os selantes, os escores de sucesso foram 0, 1 e 3, de insucesso 2 e 4 e para exclusão da amostra escore

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Escores de avaliação para restaurações

0 – presente, sem necessidade de substituição

1 – presente, com defeito marginal menor que 0,5mm, sem necessidade de substituição

2 – presente, com defeito marginal entre 0,5 e 1,0mm, com necessidade de substituição

3 – presente, com defeito marginal maior que 1,0mm, com necessidade de substituição

4 – restauração parcial ou totalmente ausente, tratamento necessário

5 – restauração ausente, outro tratamento foi realizado

6 – ausente, dente foi extraído

7 – presente, desgaste menor que 0,5mm sem necessidade de substituição

8 – presente, desgaste maior que 0,5mm com necessidade de substituição

9 – impossível de diagnosticar

Escores de avaliação para selantes

0 – selante presente

1 – selante parcialmente presente, com fissuras livres de atividade de cárie, sem necessidade de tratamento

2 – selante parcialmente presente, com fissuras livres que mostram atividade de cárie, com necessidade de tratamento

3 – selante não presente, com fissuras que não mostram atividade de cárie, sem necessidade de tratamento

4 – selante não presente, com fissuras que mostram atividade de cárie, com necessidade de tratamento

9 – impossível de diagnosticar

Escores

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

6 152 34 15 13 124 20 16 23 6 2

meses 41,42% 9,26% 4,09% 3,54% 33,79% - - 6,27% 1,63% -

12 130 43 15 14 132 20 16 27 6 2

meses 35,42% 11,72% 4,09% 3,81% 35,97% - - 7,36% 1,63% -

Tabela 5.1. Distribuição em números e porcentagens de dentes de acordo com os escores de avaliação em cada período de controle (6 e 12 meses) para restaurações.

Escores

0 1 2 3 4 9

6 meses244 31 5 37 23 3

71,76% 9,12% 1,47% 10,88% 6,76%

12 meses207 59 6 37 31 3

60,88% 17,35% 1,76% 10,88% 9,12%

Tabela 5.2. Distribuição em números e porcentagens de acordo com os escores de avaliação em cada período de controle (6 e 12 meses) para selantes.

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9. Observando-se que os tratamentos considerados insucessos foram reavaliados e tratados conforme a necessidade.

ReSultadoSDos 227 pacientes que receberam tratamento,

164 foram avaliados após 6 e 12 meses, que rece-beram um total de 405 restaurações e 343 selantes. Os resultados obtidos estão distribuídos nos escores preconizados para a técnica conforme tabelas 5.1 e 5.2.

O sucesso e insucesso da técnica para restaura-ções e selantes após seis e doze meses estão repre-sentados nos gráficos 5.1 e 5.2.

dIScuSSãoUm crescente número de pesquisas em campo

tem sido realizados em várias regiões do mundo com o objetivo de investigar a eficácia do ART. Frencken

Restaurações56,95% 54,50%

43,05% 45,50%

6 meses 12 meses

Sucesso Insucesso

Selantes

91,76% 89,12%

8,23% 10,88%

6 meses 12 meses

Sucesso Insucesso

Gráfico 5.1 Sucesso e insucesso das restaurações após 6 e 12 meses.

Gráfico 5.2 Sucesso e insucesso dos selantes após 6 e 12 meses.

e Holmgren4 (1999) chamam a atenção para a impor-tância desses estudos em programas de saúde bucal coletiva, pois contribuem para a compreensão das li-mitações e vantagens do ART, tanto em campo quan-to na clínica.

No presente estudo, o índice de sucesso para res-taurações foi de 54,50% após 1 ano, próximos aos valores obtidos por Motsei et al.9 (2001) com 56,5% para dentes decíduos e 84% para dentes permanen-tes, onde os autores relatam que os baixos índices alcançados estão relacionados com o material utiliza-do, o treinamento prévio, motivação e habilidade do operador. Frencken et al.3 (1998) tiveram um maior sucesso após 1 ano, com índice de 98,6% das 297 res-taurações avaliadas, embora os autores tenham rela-tado que as restaurações realizadas por profissionais experientes tiveram mais sucesso quando compara-das com aquelas realizadas por profissionais menos experientes. As diferenças entre os operadores estão na maioria das vezes relacionadas com a diferença en-tre a qualificação dos profissionais, segundo Mallow et al.7 (1998), que obtiveram sucesso de 76,3% após um ano nas restaurações com ART. Concordando, Frencken et al.2 (1996), relatam que foi observado que uma THD obteve resultados inferiores de sucesso, em trabalho executado por 7 CDs e 2 THDs, com-prometendo os resultados finais.

Nessa linha, podemos comparar os operadores de nosso trabalho, que foram graduandos do terceiro ano do curso de Odontologia, com THDs, devido à menor experiência clínica e na maioria das vezes, o treinamento acontecer no próprio trabalho de cam-po.

Os operadores devem ter critérios prévios rela-cionados com a remoção do tecido cariado, come-çando sempre pela junção amelo dentinária e pelas paredes circundantes. Cuidados relacionados com a inserção do material na cavidade (material com as-pecto brilhante e cavidade livre de contaminação), vedamento adequado, são aspectos relevantes para a conduta do operador. Mas, para Yee15 (2001) em seu estudo com 75% de sucesso para restaurações após 2 anos, relatou que não houve diferença entre os operadores na realização desse estudo, onde as restaurações foram feitas por cirurgiões-dentistas e agentes de saúde. Já, Lo e Holmgrem6 (2000) afirmam que a sobrevivência das restaurações do ART está

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mais relacionada ao número de faces afetadas que os outros fatores estudados, e Van Germet-Schriks et al.13 (2007) afirmam que os baixos índices de dura-bilidade são devidos às cáries secundárias e defeitos marginais, avaliando 129 restaurações após 3 anos, quando o índice de sucesso foi de 43,4% para dentes decíduos e 29,6% para dentes permanentes,

Vale salientar que resultados mais favoráveis foram obtidos por Pitiphat et al.10 (1993) com um sucesso de 87% em 93 restaurações após 6 meses, Phantumvanit et al.11 (1994) após um ano com um índice de sucesso de 93% para dentes permanentes e 79% para dentes decíduos, num total de 484 restaurações avaliadas, e Bresciani et al.1 (2005) com 97,3% de sucesso após seis meses das 152 restaurações realizadas pela técni-ca ART. Nesses trabalhos citados, apenas CDs reali-zaram as restaurações.

Comparando esses resultados com o presente trabalho e a estratégia utilizada em nosso projeto, podemos sugerir maior treinamento e reforço na manipulação do CIV, salientando que não é possível eliminar operadores, uma vez que estes fazem parte de um processo de aprendizado.

Neste projeto, além das restaurações foram utili-zados os selantes oclusais, que apresentaram sucesso de 91,76%% aos 6 meses e 89,12% após um ano. Re-sultados próximos aos encontrados por Frencken et al.3 (1998), com 89,9% e por Lo et al.5 (2001) com 96%, no mesmo período.

Resultados inferiores foram obtidos por Silva et al.12 (2005) que, após quatro meses, tiveram um su-cesso de 66%, e Motsei et al.8 (2000) que registraram a retenção dos selantes em apenas 10,4% após 12 meses.

Considerando nossos resultados e experiências

obtidas, é possível realizar algumas sugestões e infe-rências.

O insucesso cumulativo foi de 2,45% para as res-taurações e 2,64% para os selantes, o que nos leva a supor que a maior perda ocorre nos 6 primeiros me-ses. Esse fato indica a necessidade de trabalhos de du-rabilidade antes desse período, determinando, assim, qual a melhor estratégia a ser utilizada em relação à periodicidade do exame de manutenção.

Acreditamos que, com o uso de selantes e os resultados favoráveis, principalmente nos primeiros molares permanentes em pacientes de alto risco à cá-rie dentária, poderemos contribuir de maneira plane-jada na diminuição dos índices de cárie do município, principalmente para a idade de 12 anos.

O ART se encaixa perfeitamente nos modernos conceitos de prevenção, pois requer o mínimo de desgaste da estrutura dentária, sendo de fundamen-tal importância estar inserido em um programa de educação em saúde, para que, além de erradicar a doença cárie, o paciente adquira condições de manter sua saúde bucal.

E com a apresentação dos resultados, é possível concluir que:

O índice de sucesso para restaurações foi de 56,95% após 6 meses e 54,50% após um ano.

O índice de sucesso para selantes foi de 91,76% após 6 meses e 89,12% após um ano.

O insucesso cumulativo de 6 para 12 meses foi de 2,45% para as restaurações e 2,64% para os selantes.

aPoIo FInanceIRo

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VIVENCIANDO A GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM APÓS FORMAÇÃO EM MEDICINA: UM OLHAR COMPARATIVO SOBRE AS DUAS FORMAÇÕES

FORMATION IN NURSING IN A PRIVATE UNIVERSITY

lucélia Santos oliveira *

adriano a. Bezerra chaves**

* Aluna graduanda do Curso de Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo, Médica graduada pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública.** Professor Mestre do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo.

RESUMO

Este estudo relata a experiência de formação em enfer-magem em uma universidade privada, realizada no âmbito prático do estágio curricular supervisionado desenvolvido em hospitais e em uma rede básica de saúde, no período de 2008-2009. O estágio foi realizado por uma aluna já gra-duada em medicina, em uma faculdade privada, no ano de 2001. O objetivo deste estudo é avaliar as semelhanças e diferenças entre os dois cursos nos âmbitos da grade cur-ricular, do estágio curricular supervisionado, do perfil do aluno e do papel profissional do enfermeiro e do médico.

DESCRITORES: Bacharelato em enfermagem. Educação em enfermagem. Papel do profissional de enfer-magem. Educação de graduação em medicina. Profissional da saúde.

ABSTRACT

This study reports the experience of formation in nursing in a private university which took place in the practical scope of the supervised training, developed in hospitals and in a basic net of health during the period of 2008-2009. This training was developed by a student graduated in medicine in a private college in 2001. The objective of this study is to evaluate the similarities and differences between the two courses concerning the curricular timetable of the supervi-sed training, the profile of the student and the professional role of the nurse and the doctor.

DESCRIPTORS: Education, nursing, baccalaureate. Education nursing. Nurse’s role. Education, medical, un-dergraduate. Health personel.

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INTRODUÇÃOA história do ensino em enfermagem e em medi-

cina no Brasil sempre esteve fortemente influenciada pela política social e pelas necessidades da sociedade da época. Os seus primórdios refletem essa questão. A primeira escola de medicina foi inaugurada em 18 de fevereiro de 1808 na Bahia (Escola de Cirurgia) com a chegada do rei Dom João VI ao país, seguida pela fundação da Escola de Anatomia, Cirurgia e Me-dicina, em cinco de novembro do mesmo ano, no Rio de Janeiro. A Escola do Rio de Janeiro transforma-se em Academia Médico-cirúrgica após cinco anos, enquanto na Bahia ocorre apenas em dezembro de 1815 – Academia Médico-cirúrgica da Bahia. As duas academias permanecem atuando até 1832 quando são intituladas faculdades (Santos Filho6 1991).

Em 1813, cria-se o primeiro estatuto para as esco-las preconizando as matérias dadas no curso num pe-ríodo de cinco anos para medicina curativa e quatro anos para cirurgiões. Em 3 de outubro de 1832 deter-minou-se que o curso constasse de catorze matérias no período de 6 anos, cada matéria lecionada por um doutor em medicina. Em 1882, criam-se novas cadei-ras em medicina, passando o curso ser constituído de 26 cadeiras (Santos Filho6 1991).

O surgimento do ensino fundamental de enfer-magem ocorre por iniciativa de Carlos Chagas, em 1921, realizado por um grupo de americanas no Rio de Janeiro dando início ao serviço de enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, posterior-mente denominada Escola Anna Nery (Silva8 2009).

No período de 1921 a 1949, as escolas de enfer-magem eram reconhecidas pela Escola Anna Nery e posteriormente passam a ser regulamentadas pelo Ministério de Educação e Saúde. Segundo Fernandes (1964) “o país, no ano de 1943, dispunha apenas de cinco escolas equipadas e reconhecidas e 2500 enfermei-ras”.

A partir de 1961, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases, o Conselho Federal de Educação (CFE) passa a reger o ensino curricular dos cursos superiores, incluindo os cursos de medicina e enfer-magem e este último passa, a partir dessa data, a ser integrado ao sistema de ensino universitário. O CFE por meio do parecer 271 em 1962, aprova o currículo dos cursos de enfermagem com duração de três anos e cria os cursos de especialização de caráter optati-

vo. Desde então, o cenário nacional da educação tem passado por diversas mudanças nestas últimas quatro décadas, sendo iniciado com a revisão de currículos dos cursos superiores no ano de 1968 pela Reforma Universitária.

Em 1972 é aprovado o parecer 163 do CFE, es-tabelecendo um novo currículo mínimo dividido em ciclo pré-profissional, tronco profissional comum e três diferentes habilitações (Enfermagem Obstétrica, Enfermagem Médico-Cirúrgica, Enfermagem Saúde Pública). Esse modelo caracteriza-se por um ensino centrado no âmbito curativo e hospitalocêntrico.

Esse padrão curricular utiliza como referência o modelo flexneriano para formação de profissionais da saúde, pelo qual a medicina deve ser direcionada ao ambiente hospitalar, de caráter curativo e individual, influenciando concomitantemente as diversas áreas da saúde. O conhecimento no ciclo básico para as duas formações era oferecido por departamentos cada vez mais especializados, a Saúde Pública ficava em segundo plano, gerando profissionais com apenas noções gerais nessa área. Com a aprovação das dire-trizes para Política Nacional de Saúde na Constituição de 1988, instituindo o modelo de saúde direcionado para ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação do indivíduo e da comunidade com prin-cípios de equidade, universalidade e igualdade, surge a necessidade de um novo modelo de ensino para preparar profissionais de saúde habilitados para o de-senvolvimento, implantação e fortalecimento da atual política de saúde do país.

A publicação do parecer 314, em 1994, vem como resposta a essas questões, norteando uma mudan-ça no ensino com o objetivo de formar enfermeiros dotados de competência técnico-científica e política e mudanças no marco conceitual, que enfatizavam a compreensão conjuntural do país e do contexto de saúde. O novo currículo diverge do anterior dando relevância à Saúde Pública e não centrando apenas o treinamento a nível hospitalar, devendo-se favorecer as práticas voltadas para suprir as demandas de saúde da população e condizente com os princípios de uni-versalidade, equidade, integralidade e resolutividade das ações de saúde em todos os níveis de assistên-cia.

Finalmente em 2001 surge o parecer CNE/CES nº 1133/2001, definindo as “Diretrizes Curriculares Nacio-

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nais dos Cursos de Graduação em Enfermagem, Medicina e Nutrição”, reforçando e ampliando as alterações no ensino superior para alinharem-se ao modelo atual de saúde nacional; porém não ficou estabelecido o perí-odo de duração dos cursos. Essas diretrizes relatam sobre o perfil do formando profissional de enfermei-ros e médicos com atuação generalista, humanista, crítica e reflexiva, além de definir as competências gerais e específicas, conteúdos curriculares, organi-zação do curso e estágio curricular (Bagnato e Rodri-gues1 2007, Brasil3 2001).

Paralelamente, desponta a lei do Exercício Profis-sional de Enfermagem em 25 de julho de 1986, re-gulamentando as atividades do enfermeiro, técnico e enfermagem, delimitando a área de atuação de cada um dos membros da equipe (Brasil2 , 1986).

a eXPeRIÊncIa e Sua avalIaçãoA experiência, nas duas formações, ocorreu em

momentos diferentes. O aprendizado em medicina ocorreu num período de transição do modelo de saúde do país tendo um foco ainda individual, cura-tivista, hospitalocêntrico, com pouco enfoque na parte teórico-prática para Saúde Pública, prevenção, promoção e reabilitação da saúde. A grade curricular constava do ciclo básico, profissionalizante e estágio curricular supervisionado.

No ciclo básico administrado nos quatro primei-ros semestres concorreram as cadeiras de Anato-mia Descritiva, Biofísica, Embriologia, Ética Médica, Histologia, Neuroanatomia, Anatomia Topográfica, Bioquímica, Fisiologia, Higiene Médica Preventiva e Administração Hospitalar, Imunologia, Microbiologia e Parasitologia. O ciclo profissionalizante do quin-to ao oitavo semestres abrangeu as quatro grandes áreas: Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Ginecologia-Obstetrícia, Pediatria além de outras disciplinas como Farmacologia, Fundamentos da Cirurgia e Anestesio-logia, Patologia Geral Biomolecular e Clínica, Prope-dêutica, Dermatologia, Doenças Infecto-Contagiosas, Medicina Legal, Neurologia, Oftalmologia, Ortopedia, Otorrinolaringologia, Psiquiatria e Urologia.

O estágio curricular supervisionado ocorreu nos dois últimos anos com foco nas quatro grandes áre-as da medicina durante o primeiro ano e em Clínica Médica no segundo. O curso totalizou carga horária de 8024 horas. Esse ensino médico seguiu o mode-lo flexneriano e privilegiou a segmentação do estudo

com fortalecimento das especialidades e disciplinas, prejudicando a visão social, holística e coletiva na formação. Esse currículo estimula os graduandos a pensarem precocemente numa especialização, muitas vezes desenvolvida de modo concomitante ao curso regular, sendo rara a opção inicial para a medicina generalista (Walker e Silva9, 2009).

O curso de enfermagem foi realizado com dispen-sa nas disciplinas dos seis primeiros semestres segun-do aproveitamento obtido na formação curricular médica, sendo necessárias adaptações nas disciplinas de Educação em Saúde, Gestão I e II, como também a realização dos dois últimos semestres de estágio curricular supervisionado. Para a avaliação da grade curricular de enfermagem, foi utilizada como instru-mento a grade curricular referente aos ingressantes no ano de 2008, tendo a carga horária total de 3400 horas.

As disciplinas constam no primeiro ano de Bases Bioquímicas I, Construção do Conhecimento na área da Saúde, Contexto Epidemiológico, Bases Morfo-fisiológicas I, Instrumentos de Enfermagem I, Bases Bioquímicas II, Antropologia Cultural, Bases Morfofi-siológicas II. Durante o segundo ano, Bases Fisiopato-lógicas I, Instrumentos de Enfermagem II, Metodologia de Pesquisa em Enfermagem, Bases Fisiopatológicas II, Enfermagem no Ciclo Vital (Situações Prevalentes) e Instrumentos de Enfermagem III. As disciplinas do terceiro ano são: Educação em Saúde, Enfermagem no Ciclo Vital, Instrumentos de Enfermagem V, Ges-tão em Saúde e Ciclo Vital (Situações Especiais). Os dois últimos semestres são direcionados ao Estágio Curricular Supervisionado.

A formação em medicina e enfermagem possui cargas horárias diferentes, com o curso de enferma-gem representando 42,4% das horas determinadas ao de medicina, porém deve-se considerar a diversidade em extensão e complexidade entre eles. Em relação às disciplinas, ambos contêm as bases da área da saú-de: Anatomia, Fisiologia, Patologia e Bioquímica. O enfoque de matérias direcionadas para Saúde Pública foi deficiente, constituindo 4,7% do conteúdo teóri-co em medicina e 6,4% em enfermagem. Constata-se, dessa forma, a importância de rever o percentual de aulas delegado a esse tema, devido à atual política de saúde nacional e às Diretrizes Curriculares dos res-pectivos cursos. As cadeiras de especialidades mé-dicas durante o período de graduação corresponde-

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ram, em termos percentuais, ao mesmo período de tempo utilizado por cada uma das grandes áreas mé-dicas, enquanto, atualmente, na instituição em pauta, houve uma mudança na qual a Saúde Coletiva é in-troduzida com o mesmo nível de relevância em carga horária que as quatro grandes áreas da medicina. O aspecto gerencial é um atributo intenso à graduação de enfermagem desde os seus primórdios; na expe-riência deste relato pude acompanhar o desenvolver desse papel fundamental do enfermeiro por meio de aulas teóricas e práticas, divergindo da medicina onde a parte administrativo-gerencial é explanada super-ficialmente, talvez como reflexo do modelo flexne-riano, segmentado e não considerando a totalidade do processo saúde-doença, estimulando a busca pela especialização. (Scherer et al.7, 2005).

O Estágio Curricular Supervisionado (ECS) vi-venciado plenamente nas duas graduações transcor-reu na medicina em ambiente preponderantemente hospitalar e ambulatorial, enquanto na enfermagem o ambiente hospitalar representou 94,5% do perío-do destinado e 5,5% do restante corresponderam ao treinamento em uma rede básica de saúde. A primei-ra formação teve 47,1% da carga horária total de es-tágio curricular e a segunda formação 20%. Durante o ECS em medicina pude contar com a participação constante dos médicos e residentes do serviço dos hospitais envolvidos no processo do estágio, servin-do de grande valia para o crescimento e desenvolvi-mento científico pessoal, entretanto, nos estágios em enfermagem, na maioria das situações, havia um dis-tanciamento evidente entre os alunos e os enfermei-ros do serviço de saúde, prejudicando o crescimento de alunos, profissionais e do serviço. A dificuldade de encontrar profissionais capazes de modo ético-científico, como nos serviços do ECS de enfermagem, acentuou essa divergência, sendo nesse o período, no qual os graduandos estão definindo o próprio per-fil profissional, de suma importância o contato com pessoas que já estão atuando no campo de trabalho como referenciais a serem seguidos ou, infelizmente, a não serem aplicados (Costa e Germano4, 2007).

Outro aspecto diverso entre as duas formações foi o modelo didático-pedagógico, transitando do ensino memorativo e teórico com a especialização médica direcionada ao doente e focada no processo saúde-doença como disfunções orgânicas secundárias

a doença de base. Com a reforma da Educação em 2001, muda-se o conceito de ensino para a filosofia do aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver, aprender a ser, tendo o professor como facilitador do aprendizado e não mais como o centro do mesmo. No princípio tive sérias dificuldades nesse segundo modelo; havia sido treinada por um modelo memorativo durante seis anos na formação médica e, posteriormente, enxergar o professor como facilita-dor do aprender era algo contrário a todos os meus registros mentais; nesse novo processar descobri ter dificuldade em apresentar pensamento crítico diante de tanto conhecimento científico depositado no de-correr de anos, sendo a capacidade crítica um dos pontos essenciais do novo modelo educacional. Po-rém percebi falhas na busca de conhecimento cien-tífico por parte de muitos graduandos e na cobrança dos educadores envolvidos. Esses educadores obtive-ram suas formações no modelo flexneriano, memo-rativo e de centralização na figura do professor, por isso, podem ter dificuldades em atingir o ponto de equilíbrio para não incorrer no erro da omissão, este incompatível com o educador. Um fator diferencia-dor foi a relevância do tema gestão em enfermagem, presente na teoria e na prática, representando um percentual significativo do ECS, tema não abordado pelas universidades de medicina, exceto por noções básicas e gerais de administração hospitalar. O ECS em medicina embasou-se no trabalho individual, foca-do no acadêmico, médico responsável pelo paciente, ao passo que a enfermagem se direciona ao trabalho em equipe constantemente, sendo o profissional res-ponsável não só pelo seu próprio desempenho, mas por manter a boa funcionabilidade da equipe de en-fermagem.

O perfil do egresso profissional está vinculado à política de saúde da época e da instituição de ensino. No ano de 1996, regia a Resolução nº 08/69 do CFE, implementando o Currículo Pleno de Medicina, per-manecendo nas instituições de ensino um currículo especializado, curativo e segmentado, levando à for-mação de médicos especialistas ou em busca de espe-cialização, sem apresentar como foco o âmbito social, de prevenção ou promoção em saúde. As mudanças nas Diretrizes Curriculares se intensificaram na últi-ma década, culminando com o Parecer N. 1.133/2001 CNE/CSE, o qual associa a importância do direciona-

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mento educacional em conformidade com a política de saúde nacional, reforçando a formação generalista e crítica associada à identificação e interação da gê-nese do processo saúde-doença, objetivando medidas preventivas e de promoção de saúde e não só medidas curativas como previamente predominava no modelo anterior. Entretanto, a realidade das instituições de ensino muitas vezes não condizem com essa deter-minação, ainda gerando profissionais com excelente formação hospitalar mas superficial na prática de pre-venção e promoção de saúde, assim como na vivência em redes básicas de serviço e comunidades.

Segundo as novas Diretrizes Curriculares, o cam-po de atuação do enfermeiro e do médico tem como prioridade manter, promover e restaurar a saúde in-dividual ou coletiva, tendo o primeiro a função geren-ciar de modo constante a unidade de trabalho e de liderar sua equipe; portanto, as situações adversas do ambiente de trabalho hospitalar, ambulatorial ou de redes básicas de saúde são solucionadas, em geral, por enfermeiros. O médico direciona sua atenção ao indi-víduo ou comunidade visando à saúde, distanciando-se na maioria do tempo do gerenciar, esquecendo-se, muitas vezes, que não trabalha sozinho. A visão dos médicos como prestadores de serviço, denominados até mesmo como clientes de instituições privadas, re-alça esse fato.

conSIdeRaçÕeS FInaISA vivência na formação a nível superior em medi-

cina e enfermagem evidenciou quão recente é a gra-duação universitária em enfermagem no Brasil, tendo o curso passado por diversas mudanças relacionadas à sua duração, grade curricular e estágios, enquanto que o curso de medicina tradicional e antigo no país apresentou mudanças expressivas para alinhar-se à política de saúde nacional atual. Estas modificações podem ser comprovadas nas alterações dos Currícu-los Mínimos e Diretrizes Curriculares Nacionais nas últimas décadas.

As duas formações possuem como alvo a saúde individual e coletiva, divergindo na graduação e na atuação profissional quanto maior for o grau de apro-fundamento científico em disciplinas morfofisiológi-cas, patológicas e terapêuticas por parte da medicina e em gestão e assistência por parte dos enfermeiros.

A importância da qualidade de serviço dessas duas áreas da saúde é essencial para o bom desempenho da política de saúde nacional, de instituições particu-lares e públicas.

Na elaboração de sua programação e no processo de supervisão do aluno, pelo professor, deve ser as-segurada efetiva participação dos enfermeiros do ser-viço de saúde onde se desenvolve o referido estágio.

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COMPARAÇÃO DE CUSTOS PARA O TRATAMENTO DAS LESÕES PRECURSORAS DO CÂNCER DE COLO DO ÚTERO NO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE

COMPARISION OF COSTS TO TREAT CERVICAL CâNCER PRECURSORS LESIONS AT PUBLIC HEALTH SERVICE

ana claudia Guedes*, **

Rita elaine Francesca curi**

Sylvia Michelina Fernandes Brenna*, **

* Curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID)** Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo

RESUMO

A questão do uso racional de leitos hospitalares e o contro-le de custos em saúde têm sido enfatizados desde a década de 70. Este estudo aleatório comparou três estratégias para tratamento de lesões precursoras do câncer de colo do útero, no Hospital Maternidade Leonor Mendes de Bar-ros, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Foram incluídas 19 internadas, submetidas à conização a frio; 18 internadas submetidas à cirurgia de alta frequência (CAF) e 19 externas, submetidas à CAF ambulatorial. O custo mé-dio do procedimento foi de R$ 66,23, R$ 66,10 e R$ 5,36, para as mulheres submetidas à conização, CAF hospitalar e CAF ambulatorial respectivamente. A razão entre o maior e o menor custo foi de 12 vezes. A dor leve foi relatada em 3 casos (15,7%), 3 (16,6%) e 3 (15,7) pelas mulheres no primeiro, segundo e terceiro grupo, respectivamente. A hemorragia operatória foi observada em 6 (31,5%), 2 ca-sos (11,1%) e 2 (10,5%), respectivamente. Baseado nesses dados, o tratamento das lesões precursoras do câncer de colo de útero em regime ambulatorial deve ser conside-rado, pois o custo é menor do que o procedimento em regime hospitalar, com resultados similares.

DESCRITORES: Cirurgia ambulatorial. Custos hospitalares. Cus-to de cuidados de saúde.

ABSTRACT

The subject of the rational use of hospital beds and the control of health costs has been emphasized since the 70’s years. This randomized study compared three strategies for treatment of precursor’s lesions of the cervix cancer in women at the Leonor Mendes de Barros Maternity Hos-pital, State Secretariat of Health, São Paulo. For this study were 19 inpatients submitted to cold-knife conization, 18 inpatients submitted to loop electrosurgical excision pro-cedure (LEEP) and 19 outpatients submitted to LEEP for ambulatory surgical procedure. The average costs of the procedures were: R$ 66.23, R$ 66.10 and R$ 5.36, for cold-knife conization, LEEP inpatients, and LEEP outpatients, respectively. The proportion between the largest and the smallest cost was about 12 times. A soft pain was referred in 3 cases each for the first, second and third groups, repre-senting 15.7%, 16.6% and 15.7%, respectively. The operative hemorrhage was observed in 6 cases (31.5%) in the first group, and 2 (11.1%) and 2 (10.5%) for the next two in that order. Based on these data, the treatment of precursor’s lesions of the cervix cancer for outpatients should be con-sidered, because the cost is smaller than the procedures as inpatient regimen with similar results.

DESCRIPTORS: Ambulatory surgical procedures. Hospital costs. Health care costs

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Guedes AC, Curi REF, Brenna SMF. Comparação de custos para o tratamento das lesões precursoras do câncer de colo do útero no serviço público de saúde • São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 77-82

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IntRoduçãoA gestão de custos em saúde ressalta a importân-

cia de se minimizar os custos e maximizar os bene-fícios, para os usuários e para as instituições. A ra-cionalização e priorização dos cuidados da saúde são uma realidade e uma necessidade, todavia o controle de custos e a distribuição dos recursos devem iniciar, preferencialmente, na redução do desperdício (Vei-ga20 2008). A questão do uso racional de leitos hospi-talares ganhou ênfase na década de 70, quando alguns serviços de saúde passaram a comparar os custos de procedimentos simples e eletivos, sob diferentes re-gimes: internação hospitalar, hospital-dia e ambulato-rial (Craig4 1970, Martin e Rust12 1974, O’Donovan13 1979).

Desde a criação do Sistema Único de Saúde, tem havido alguns descompassos administrativos, que ameaçam a sua estratégia e eficiência. Há pressões, cada vez maiores, por uma reforma que minimize os custos, entretanto, um dos grandes problemas para que isso ocorra é a resistência interna ao modelo, ou seja, está nas formas operacionais do sistema, no modelo de gestão e no fluxo de recursos (Trevisan e Junqueira17 2007).

Ainda parece existir resistência por parte de al-guns gestores do sistema público de saúde em revisar e modificar o fluxo de procedimentos clássicos, que vem sendo realizados há muitos anos, sem preocu-pação com os custos. O objetivo deste estudo foi comparar três procedimentos utilizados para o tra-tamento das lesões precursoras do câncer de colo do útero, principalmente com relação aos custos e complicações.

MÉtodoSEste estudo foi aleatorizado e comparou três es-

tratégias para tratamento das lesões precursoras do câncer de colo de útero em mulheres: 19 internadas em regime hospitalar, submetidas à conização a frio; 18 também internadas, submetidas à cirurgia de alta frequência (CAF) ou cirurgia com alça de alta frequ-ência (CAAF) e 19 externas, submetidas à CAF ambu-latorial. A CAF é realizada com aparelho específico, o qual gera um circuito elétrico com frequência de 3,8 megahertz, que corta e coagula os tecidos. Elas foram admitidas no serviço de Patologia do Trato Genital Inferior do Hospital Maternidade Leonor Mendes de

Barros, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, entre 2004 e 2006.

O primeiro grupo, submetido à conização clássica, se internou antes e recebeu alta 24h após o proce-dimento. Recebeu anestesia de bloqueio tipo raqui para o assoalho pélvico, considerada padrão para o serviço de saúde onde foi realizado este estudo. O segundo grupo, submetido à CAF, também recebeu o mesmo regime de internação hospitalar e anestesia do grupo anterior. Não foi considerado o regime de hospital-dia, no qual a paciente deveria ser internada pela manhã e receberia alta hospitalar no mesmo dia, após o procedimento.

O terceiro grupo foi submetido à CAF ambulato-rial sob anestesia local, com 1,8ml de cloridrato de xylocaina a 2% sem vasoconstritor, aplicada no colo do útero com seringa carpule de cabo longo e agulha gengival as 2, 4, 8 e 10h. As pacientes não receberam nenhum tipo de sedação. O procedimento foi realiza-do sob visão colposcópica nas salas de atendimento ambulatorial. As mulheres foram liberadas uma hora após o procedimento, desde que não houvesse ne-nhum sangramento ou outra queixa relevante. Nos grupos submetidos a CAF, utilizou-se pasta hemos-tática com sulfeto férrico (Hemogin®) após o pro-cedimento.

Foram considerados apenas os custos diretos, como: drogas anestésicas, medicamentos, compres-sas de gaze, fios de sutura e custos de internação e alimentação. Não foram considerados os custos indi-retos relacionados ao material permanente ou à mão-de-obra especializada. Os custos basearam-se na ta-bela da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (processo 010/03) e as mulhe-res leram e assinaram o consentimento livre e escla-recido. Os resultados foram analisados no programas Excel e Epi Info, considerou-se o nível de significância de 5% e intervalo de confiança de 95% para cálculo do risco relativo (RR). O p valor foi calculado pelo teste exato de Fisher. Os custos médios foram compara-dos entre si, tendo-se como referência a conização clássica. A comparação de custos foi feita através da fração entre o custo de referência (conização clássi-ca) dividido pelo custo de cada procedimento.

ReSultadoSA média de idade das mulheres foi 39,8 anos (DP

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12,7) para conização, 36,3 (DP 13,2) para CAF hospi-talar e 37 (DP 11) para CAF ambulatorial. O tempo de internação variou de 2,2 dias para conização, 2 dias para CAF internada e nenhum dia para CAF am-bulatorial. O custo médio do procedimento foi de R$ 66,23, R$ 66,10 e R$ 5,36, para as mulheres subme-tidas à conização, CAF hospitalar e CAF ambulatorial respectivamente (Figura 1). (COLOQUE A FIGURA

A Tabela 1 mostra o risco de complicações dos procedimentos. A dor leve ou incômodo pélvico foi relatado em 3 casos (15,7%), 3 (16,6%) e 3 (15,7) pe-las mulheres com conização, CAF internada e CAF ambulatorial, respectivamente. O sangramento leve ou moderado foi observado em 6 casos (31,5%), 2 (11,5%) e 2 (10,5%) respectivamente para conização, CAF internada e CAF ambulatorial. O risco relativo foi calculado para dor e sangramento. Quando se comparou a conização com a CAF internado e com a CAF ambulatorial, a diferença entre os grupos não foi significativa: RR 0,9 (IC 0,2-4,1), p 0,64 para CAF internada e RR 1,0 (IC 0,3-4,3), p 0,67 para CAF am-bulatorial. A diferença também não foi significativa para sangramento: RR 2,8 (IC 0,6-12,3), p 0,13 para CAF internado e RR 3,0 (0,6-13,3), p 0,11 para CAF ambulatorial. Os casos de dor foram, tratados com analgésicos e os casos com sangramento foram sub-metidos à hemostasia e observação.

dIScuSSãoConsiderando-se apenas os custos diretos, pode-

se dizer que eles variaram conforme o regime de internação hospitalar, ou seja, não se associaram ao tipo de procedimento. Tanto o custo da conização quanto da CAF foi similar, quando a paciente foi in-ternada, todavia foi 12 vezes maior do que o procedi-mento ambulatorial. Os efeitos colaterais não foram significativos e puderam ser bem administrados tanto nas pacientes internadas quanto naquelas externas ou ambulatoriais.

Esses resultados são muito importantes em ter-mos de custo-benefício, do ponto de vista de saúde pública, principalmente em países em desenvolvimen-to, onde o câncer de colo de útero apresenta altas taxas de incidência (INCA, 2008) e é muito impor-tante tratar as lesões precursoras adequadamente, com métodos baratos, simples e com poucos riscos e efeitos colaterais. Problemas financeiros, técnicos e logísticos têm impedido o estabelecimento de políti-

cas efetivas de controle do câncer em muitos países em desenvolvimento.

O tratamento clássico para as lesões precursoras do câncer de colo de útero ou neoplasias intraepite-liais cervicais (NIC) grau 2/3 e padronizado na maio-ria dos hospitais públicos especializados tem sido a conização a frio. Ela deve ser realizada em regime de internação hospitalar, com anestesia de bloqueio (tipo raqui ou peridural) ou geral. Alguns serviços pú-blicos realizam a exérese da lesão pré-neoplásica com CAF, cuja grande vantagem é a de poder ser realizada em regime de hospital-dia ou ambulatorial, sob anes-tesia local, de forma a minimizar custos. Todavia, esse procedimento ainda não é considerado padrão nos hospitais públicos.

Os resultados do presente estudo estão em con-formidade com o consenso estabelecido por outros autores, desde a década de 90, em vários países: Es-tados Unidos (Krebs et al.11 1993, Saidi et al.15 1994, Eduardo et al.6 1996, Duggan et al.5 1999, Kleinherg et al.10 2003), Irlanda (Turner et al.18 1992), Polônia (Pa-wel Sielierski et al.14 1999), Alemanha (Hillemanns et al.8 2000), Servia (Bozanovic et al.2 2008), Canadá (Fe-renczy et al.7 1996), França (Brun et al.3 2002), Holan-da (Abrahamsson e Nellemann1 1998) e Cuba (Tor-riente Hernandez e Valdés Alvarez16 2003). Todos os autores abordaram a questão de minimizar custos no serviço de saúde, da facilidade de execução do pro-cedimento CAF e da possibilidade de realizá-lo em

R$ 0,00

R$ 10,00

R$ 20,00

R$ 30,00

R$ 40,00

R$ 50,00

R$ 60,00

R$ 70,00

ConizaçãoCAF internadaCAF ambulatorial

Figura 1. Custos diretos, em real, dos procedimentos, segun-do a tabela da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo

CAF – cirurgia de alta frequência

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pacientes não internadas, ou seja, em consultórios, clinicas ou salas de pequenas cirurgias. Esses estudos também abordaram a questão de custo-efetividade do procedimento para o tratamento das lesões pre-cursoras do câncer de colo, pois relacionam a sim-plicidade do método, com poucos efeitos colaterais, bons resultados e baixo custo.

O problema de racionalização e priorização dos recursos não é exclusivo do setor de saúde, e inde-pendentemente do grau de desenvolvimento dos pa-íses, a procura de cuidados na saúde excede a oferta, sejam eles pagos pelo sistema privado ou pelo público. Parece que a distribuição dos cuidados de saúde em geral é feita pela capacidade de pagar ou pela necessi-dade. Alguns países, como os Estados Unidos, usam o primeiro e outros países, principalmente na Europa, com sistemas nacionais de saúde, continuam a basear-se na necessidade (Vecina Neto e Malik19 2007).

Baseando-se nesse modelo, pode-se dizer que, no Brasil, a preocupação com custos ainda é incipiente. Ela ficou mais evidente há poucas décadas, após a di-fusão dos seguros-saúdes e do aparecimento de novas e cada vez mais caras tecnologias médicas. A despeito de todos os insumos diretos e indiretos envolvidos na assistência impactarem em custos, ainda existe uma inflação intrínseca do setor. O fenômeno é bastante reconhecido, pois os preços do setor saúde crescem

mais que os da economia em geral, talvez por causa da demanda crescente, perante uma oferta que não consegue acompanhar o crescimento (Vecina Neto e Malik19 2007).

Alguns autores acreditam que, em regra geral, o custo das atividades, na rede hospitalar publica brasi-leira, é desconhecido e a gestão existente é do regime de caixa. Quando há pacientes internados, a tecnologia disponível em termos de drogas terapêuticas, aneste-sia, procedimentos cirúrgicos e diagnósticos menos invasivos, permitem reduzir a permanência hospitalar. Assim, o número de leitos calculados como neces-sários pode estar superestimado e a tendência seria reduzir tanto o número de leitos quanto de peque-nos hospitais. Isso ajudaria a criar escalas econômicas mais adequadas para serviços de maior complexidade. Essa discussão tem profundas implicações econômi-cas, na medida em que se estima que 70% dos gastos do SUS são destinados a hospitais. Consequências da assistência prestada sem necessidade em hospitais é o desperdício de recursos, já escassos, e a perda de qualidade (Vecina Neto e Malik19 2007).

Existem cada vez mais possibilidades para substi-tuir ou complementar o regime de internação hos-pitalar. No sentido de promover a desospitalização, a tendência atual é optar por assistência domiciliar e hospital-dia, também chamados de home car e day hospital, respectivamente. Se for verdade que o SUS necessita de reformas e, entre elas, admite-se a ne-cessidade de minimizar custos (Trevisan e Junqueira17 2007), seria um contrassenso supor que procedimen-tos de baixo custo e alta efetividade, utilizados por mais de uma década em outros países, não sejam in-centivados e utilizados em larga escala como padrão nos hospitais da rede pública.

O tratamento das lesões precursoras do câncer de colo do útero em regime ambulatorial deve ser

CAF – cirurgia de alta frequência

Custo (R$) Razão

Conização 66,23 Ref

CAF internada 66,10 1,0

CAF ambulatorial 5,36 12, 3

Tabela 1. Razão entre os custos dos procedimentos, segundo a tabela da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.

Dor Sangramento

n (%) RR (IC95%) p valor* n (%) RR (IC95%) p valor*

Conização 3 (15,7) Ref 6 (31.5) Ref

CAF internada 3 (16,6) 0,9 (0,2-4,1) 0,64 2 (11,1) 2,8 (0,6-12,3) 0,13

CAF ambula-torial

3 (15,7) 1,0 (0,3-4,3) 0,67 2 (10,5) 3,0 (0,6-13,3) 0,11

CAF – cirurgia de alta frequência*p valor por teste exato de Fisher

Tabela 2. Risco de complicações nas mulheres submetidas aos procedimentos

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considerado nos serviços públicos de saúde, pois o custo é bem menor do que as cirurgias em regime de internação hospitalar. Ao critério do serviço e para maior comodidade da paciente, a anestesia local pode ser associada à sedação, em sala de pequena cirurgia em regime de hospital–dia. Empiricamente, pode-se dizer que essa associação não aumentaria conside-ravelmente os custos, uma vez que o procedimento

continuaria a ser realizado sem o regime de interna-ção hospitalar clássico, ou seja, a paciente seria inter-nada e receberia alta no mesmo dia. Todavia, futuros estudos serão necessários para demonstrá-lo.

Agradecimentos: Este estudo foi parcialmente fi-nanciado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Es-tado de são Paulo (FAPESP), processo. 03/08180-6.

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VACINAS PARA PAPILOMAVÍRUS HUMANO

HUMAN PAPILLOMAVIRUS VACCINES

aline Mara Barreira*

vanesa abreu de oliveira*

valéria Menezes P. Machado*

Sylvia Michelina Fernandes Brenna*, **

* Faculdade de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID)** Hospital Maternidade Leonor Mendes de Barros, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.

Abstract

Epidemiological evidences have suggested that the Human Papillomavírus (HPV) is associated to sexually transmitted diseases and to the low genital tract carcinogenesis. The HPV vaccines are produced from virus-like particle, which is highly immunogenic and with no infection risk. In Brazil, the National Agency of Sanitary Surveillance authorized the trade of the HPV vaccines; however, such use is not yet available in the public health services. The HPV vaccinations seems to be a good approach in primary health preven-tion, but in spite of the great scientific progress and the optimism of the health professional staff, today there are many unanswered concerns that makes impossible to eva-luate the epidemiological cost-benefit of a wide population vaccination program addressed to prevent HPV infection and the cervix cancer.

DESCRIPTORS: Uterine cervical neoplasms. Sexually transmit-ted diseases. Vaccines. Papillomavirus vaccine.

Resumo

Evidências epidemiológicas têm demonstrado que o Papi-loma vírus humano (HPV) está associado a doenças sexu-almente transmissíveis e à carcinogênese do trato genital inferior. As vacinas para HPV são constituídas por partículas do tipo viral, altamente imunogênica e sem risco de infec-ção. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária já autorizou a comercialização dessas vacinas, todavia elas ainda não estão disponíveis nos serviços públicos de saúde. A vacinação para HPV parece ser efetiva como ação de saúde primária, todavia, apesar do grande avanço científico e do otimismo dos profissionais de saúde, ainda há muitas questões sem resposta e, neste momento, é difícil avaliar o custo-benefício epidemiológico de um programa popu-lacional de vacinação para prevenir a infecção por HPV e o câncer de colo.

DESCRITORES: Neoplasias do colo do útero. Doenças sexual-mente transmissíveis. Vacinas . Vacinas contra papillomavirus.

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IntRoduçãoInfecção por Papiloma vírus humano e câncer de colo

do úteroEvidências epidemiológicas e laboratoriais têm

demonstrado que o Papiloma vírus humano (HPV) está associado a doenças sexualmente transmissíveis (DST) e à carcinogênese do trato genital inferior. Trata-se de um vírus com estrutura DNA (acido de-soxirribonucleico), cuja infecção em humanos ocorre no epitélio cutâneo ou nas mucosas. Mais de 200 ti-pos já foram identificados e cerca de 40 deles podem infectar o trato genital. De acordo com o seu com-portamento biológico, o HPV foi subdividido em tipos de baixo risco oncogênico (ex: 6, 11, 42, 43 e 44) e em tipos potencialmente oncogênicos (ex: 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 53, 56, 58, 59 e 68). Acredita-se que a presença desse vírus seja indispensável, porém não suficiente, para o desencadeamento das lesões precursoras do câncer, pois há necessidade de co-fa-tores, tais como tabagismo, fatores hormonais, idade, carga viral, oncogenicidade do vírus e, principalmen-te, deficiência imunológica do hospedeiro (Syrjänen e Syrjanen12 2000, Franco e Ferenczy6 2001).

No Brasil, a prevalência global de HPV foi identifi-cada ao redor de 17.1%, variando e decrescendo com a idade: de 33,9% em mulheres abaixo dos 20 anos para 11% naquelas com mais de 41 anos (Longatto et al.6 2006). Embora a infecção por HPV seja muito comum em mulheres jovens sexualmente ativas, em geral, é transitória e resolve-se espontaneamente em até 90% dos casos, no período entre 24 a 36 meses. A infecção persistente pode ocorrer em mulheres aci-ma de 35 anos e estar relacionada à carcinogênese no colo do útero (Ferenczy e Franco5 2001)

Rastreamento para as lesões precursoras do câncer de colo do útero

O câncer do colo ainda representa um problema de saúde pública, devido a elevadas taxas de incidência e mortalidade, principalmente em países em desenvol-vimento. No Brasil, as estimativas para 2008 foram de 18.680 novos casos, com risco de 19 casos a cada 100 mil mulheres/ano. Entre as regiões brasileiras, a maior taxa de incidência foi na região Norte, 22/100.000; se-guida paradoxalmente pelas regiões: Sul, 24/100.000; Centro-Oeste, 19/100.000, Nordeste, 18/100.000 e Sudeste 18/1000.000 (INCA8 2008)

Um marco histórico no conhecimento do câncer do colo foi o estudo de Papanicolaou e Traut (1941), sobre o valor diagnóstico do esfregaço cervicovaginal na sua detecção precoce. Há evidências epidemioló-gicas obtidas por estudos de coorte, caso-controle e descritivos de que as taxas de mortalidade e inci-dência podem ser reduzidas pela utilização da colpo-citologia oncológica, ou exame de Papanicolaou, em programas de rastreamento populacional. Em outras palavras, o objetivo dos programas de rastreamento têm sido detectar precocemente as lesões precurso-ras. Dentre os cânceres do trato genital inferior, o do colo do útero é o que melhor pode ser rastreado, a nível populacional, devido às altas taxas de incidên-cia, prevalência e evolução lenta (Franco e Ferenczy6 2001).

Naturalmente, o custo de um programa de rastre-amento ou de ações preventivas deve ser bem menor do que o custo do tratamento de fases avançadas do câncer, devido à complexidade dos procedimentos e dos serviços envolvidos. Entre as causas mais co-muns de insucesso dos programas de rastreamento, podem-se citar: 1) problemas técnicos na colheita e interpretação dos resultados do Papanicolaou, cuja maior problema é a alta taxa de resultados falso-nega-tivos (Ferenczy e Franco5 2001); 2) muitas mulheres, em países em desenvolvimento, ainda não têm acesso ou não tem informação suficiente e não se submetem à colheita periódica do Papanicolaou (Brenna et al.3 2001); 3) políticas de saúde inadequadas (Zeferino15 1997).

Nos países desenvolvidos, os programas de ras-treamento populacional têm boa qualidade e, em geral, são organizados, todavia nos países em desen-volvimento, o rastreamento ocorre de forma menos abrangente e não é organizado. Nos programas orga-nizados, que visam otimizar os recursos disponíveis, as mulheres são convocadas pelos serviços de saúde para a colheita do Papanicolaou. O critério de sele-ção obedece à faixa etária de maior risco da doen-ça e a periodicidade para novas colheitas do exame pode ser a cada três ou cinco anos. Por outro lado, nos programas de demanda espontânea, as mulheres procuram os serviços de saúde e o Papanicolaou é realizado oportunamente nas consultas para planeja-mento familiar, pré-natal, queixas ginecológicas e ou-tras. Em geral, o exame é realizado sempre nas mes-

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mas mulheres que frequentam os serviços de saúde, a periodicidade para novas colheitas ocorre a cada seis meses ou um ano e, obviamente, a faixa etária coberta pelo programa acaba sendo diferente daquela considerada de maior risco para a doença (Zeferino15 1997, Brenna et al.3 2003).

Vacina para Papiloma vírus humano (HPV)A imunização tem sido uma das intervenções de

maior sucesso e melhor custo-efetividade, como me-dida de prevenção primária, no controle e erradica-ção de muitas doenças. A Organização Mundial de Saúde, em parceira com a UNICEF (United Nations Children’s Fund) pretendem expandir os programas de imunizações em todo o mundo e entre as estratégias propostas pode-se citar: aumento da cobertura vaci-nal, redução da morbidade e mortalidade por doenças que podem ser prevenidas e o desenvolvimento de novas vacinas. É nesse contexto que está sendo pro-posta a vacinação para HPV. A vacina profilática pode prevenir tanto as verrugas genitais quanto a infecção por alguns HPV oncogênicos e diminuir a incidência do câncer do trato genital inferior (WHO14 2006).

O desenvolvimento da vacina (profilática) por meio da técnica do DNA recombinante foi possível após a identificação do gene que codifica a produ-ção da proteína que forma o capsídeo viral. Essa capa proteica pode ser produzida em grandes quantidades, utilizando-se células de insetos, bactérias recombinan-tes ou leveduras. Portanto, a vacina é constituída por partículas do tipo virais denominadas VLP ou vírus-like particle, em inglês, que são altamente imunogênicas e sem risco de infecção. Ou seja, quando o ser humano recebe a vacina, o seu sistema imunológico entende que o próprio vírus está sendo injetado, passando a produzir anticorpos contra essas proteínas e, então, toda vez que o indivíduo entrar em contato com o HPV, o organismo reconhecerá o vírus e o destruirá (Franco e Harper7 2005).

Em fins de 2005, a Organização Panamericana de Saúde (PAHO10 2006) discutiu sobre custo, realida-de financeira de cada país, prioridades na saúde pú-blica, diferenças entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento e a insuficiência de vacinas para suprir satisfatoriamente a demanda global. Entre as necessidades discutidas, pode-se citar: 1) produção da vacina a menores custos, 2) criação de uma política

financeira governamental para sustentar os insumos da vacinação. Outros tópicos também foram discuti-dos, como: segurança e tempo de proteção da vacina; programação dos insumos necessários, aceitabilidade da vacina, impacto da vacinação e custo-efetividade. Inicialmente, a política de vacinação seria para mulhe-res entre 9 a 26 anos, com um custo entre US$200 a US$300 para as três doses. Todavia, discute-se se o melhor custo-efetividade para vacinação poderia ser em meninas a partir de 12 anos e posteriormente a vacinação seria estendida aos meninos.

Existem duas vacinas comercializadas atualmente. A primeira delas é quadrivalente, ou seja, seu espec-tro de ação engloba os HPV tipos 6, 11, 16 e 18 e é comercializada pelo laboratório farmacêutico Merck & Co, sob o nome Gardasil ®. A segunda delas é biva-lente, ou seja, com espectro de ação para os tipos 16 e 18 e é comercializada pela GlaxoSmithKline (GSK), sob o nome Cervarix ®. Ambas têm boa eficácia, ao redor de 100%, para prevenção de lesões genitais e devem ser administradas via intramuscular em três doses. Diferem apenas no esquema de aplicação das doses, a primeira ao 0, 2 e 6 meses; e a segunda ao 0, 1 e 6 meses. (WHO14 2006).

Sabe-se, por enquanto, que o tempo de proteção da vacina é de cerca de cinco anos (Villa et al.13 2006), todavia a duração global ainda é desconhecida, pois os estudos a respeito ainda são inconclusivos. Todavia, é possível que os estudos chequem à conclusão de que a imunização seja permanente, ou seja, que as três doses de vacina sejam suficientes para proteger o indivíduo por toda a sua vida. Sendo assim, seria ideal a introdução da vacina para HPV no calendário vacinal na infância (WHO14 2006). O custo de produ-ção da vacina ainda é caro, depende de conservação em baixas temperaturas e o esquema de administra-ção intramuscular em três doses parece desconfortá-vel para crianças e adolescentes (Derchain e Sarian4 2007).

As estratégias para uma futura implantação do pro-grama de imunização devem definir melhor a aborda-gem geral a ser utilizada. Um problema a ser avaliado seria a aceitação social da vacina no grupo de mulheres jovens, bem como o desenvolvimento de mensagens apropriadas como estratégias para aumentar o impac-to da vacinação. A aceitação da vacina e o público alvo dependerão da realidade de cada país, e dos hábitos

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e comportamento sexual da população. Devem ser considerados: a idade de início sexual, o número de parceiros, a prevalência de infecção nos parceiros se-xuais e o impacto social e emocional negativo que a doença representa entre a população. Ao se preten-der implantar a vacinação em adolescentes, menores legalmente, os pais necessitam serem informados dos riscos e benefícios, para que possam decidir por seus filhos ou aconselhá-los a serem imunizados. Ainda, a implementação de programa de vacinação inclui edu-car o público geral, principalmente pais, educadores e os profissionais de saúde (WHO14 2006).

Ainda existem algumas questões sem resposta. Apesar de testada a efetividade das vacinas para HPV, pouco se pode dizer das repercussões clínicas e epi-demiológicas que virão com programas de vacinação em larga escala. Por enquanto, não se podem inter-romper os programas populacionais de rastreamento para câncer de colo de útero. Embora tenha sido des-crita alguma reação cruzada para outros tipos virais, as vacinas não são polivalentes, ou seja, são específicas apenas para os tipos 6, 11, 16 e 18 e podem não pre-venir a infecção viral por outros tipos potencialmente carcinogênicos. Outra questão relevante é qual seria o efeito da vacinação no comportamento sexual dos jovens, pois uma vez vacinados, acreditando-se pro-tegidos para HPV e câncer de colo, podem assumir um comportamento sexual de alto risco, com conse-quente aumento de outras DST (Derchain e Sarian4 2007).

As estratégias para uma futura implantação do pro-grama de imunização devem definir melhor a aborda-gem geral a ser utilizada. Um problema a ser avaliado seria a aceitação social da vacina no grupo de mulheres jovens, bem como o desenvolvimento de mensagens apropriadas como estratégias para aumentar o impac-to da vacinação. A aceitação da vacina e o público alvo dependerão da realidade de cada país, e dos hábitos e comportamento sexual da população. Devem ser considerados: a idade de início sexual, o número de parceiros, a prevalência de infecção nos parceiros se-xuais e o impacto social e emocional negativo que a doença representa entre a população. Ao se preten-der implantar a vacinação em adolescentes, menores legalmente, os pais necessitam serem informados dos riscos e benefícios, para que possam decidir por seus

filhos ou aconselhá-los a serem imunizados. Ainda, a implementação de programa de vacinação inclui edu-car o público geral, principalmente pais, educadores e os profissionais de saúde (WHO14 2006).

Ainda existem algumas questões sem resposta. Apesar de testada a efetividade das vacinas para HPV, pouco se pode dizer das repercussões clínicas e epi-demiológicas que virão com programas de vacinação em larga escala. Por enquanto não se podem inter-romper os programas populacionais de rastreamento para câncer de colo de útero. Embora tenha sido des-crita alguma reação cruzada para outros tipos virais, as vacinas não são polivalentes, ou seja, são específicas apenas para os tipos 6, 11, 16 e 18 e podem não pre-venir a infecção viral por outros tipos potencialmente carcinogênicos. Outra questão relevante é qual seria o efeito da vacinação no comportamento sexual dos jovens, pois uma vez vacinados, acreditando-se pro-tegidos para HPV e câncer de colo, podem assumir um comportamento sexual de alto risco, com conse-qüente aumento de outras DST (Derchain & Sarian4 2007).

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitá-ria autorizou e normatizou a comercialização da vaci-na contra HPV desde 2006 (ANVISA1 2008), todavia ela pode ser adquirida em caráter privativo, ou seja, ela não está disponível gratuitamente nos serviços pú-blicos de saúde. Em outras palavras, devido ao seu alto custo, a vacina está disponível apenas para uma pequena parcela da população sob risco de adquirir o vírus.

A vacina para HPV parece representar uma ação de saúde primária efetiva, que, em curto prazo pode controlar melhor as DST e em longo prazo diminuir a incidência de câncer de colo do útero. Apesar do grande avanço científico que ela representa e do gran-de otimismo dos profissionais de saúde em torno do assunto, seria imprudente fazer qualquer especulação sobre as suas futuras repercussões. Considerando-se a realidade econômica brasileira, a extensão territo-rial e as dificuldades de acesso a novas tecnologias fora dos grandes centros urbanos, ainda é difícil pre-ver, neste momento, o custo-benefício epidemiológi-co de um programa populacional de vacinação sobre a redução da infecção por HPV e do câncer de colo.

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O PAPEL DA PRESSÃO DE PERFUSÃO CORONARIANA NO REMODELAMENTO CARDÍACO.

THE ROLE OF CORONARY DRIVING PRESSURE ON CARDIAC REMODELLING.

Koike MK*

de carvalho Frimm c**

* Bióloga, docente do curso de Biomedicina e Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID)** Médico assistente e orientador de pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

RESUMO

As doenças cardiovasculares, principalmente a insuficiên-cia cardíaca, estão entre as maiores causas de mortalidade mundial. Ela é causada por alterações intrínsecas do miocár-dio que levam ao remodelamento cardíaco. Apresentamos neste artigo o papel da pressão de perfusão coronariana no remodelamento cardíaco.

DESCRITORES: Fluxo sanguíneo regional. Infarto do miocárdio. Remodelação ventricular

ABSTRACTCardiovascular diseases, such as heart failure, are

major causes of disability and premature death throu-ghout the world. Heart failure is a consequence of intrinsic abnormalities of the myocardium, known as cardiac remodeling. In the present study the role of coronary driving pressure in cardiac remodeling is debated. DESCRIPTORS: Regional blood flow. Myocardial infaction. Ven-

tricular remodeling.

ponto de vistaBiomediCina

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ponto de vistaBiomediCina

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IntRoduçãoAs doenças cardiovasculares estão entre as maio-

res causas de mortalidade mundial. Entre elas, a insu-ficiência cardíaca é responsável por grande parte da morbi-mortalidade. Ela pode ser causada por altera-ções de bomba cardíaca em decorrência de modifica-ções intrínsecas das células miocárdicas. O objetivo deste trabalho é apresentar as consequências de uma das alterações hemodinâmicas presentes na insufici-ência cardíaca, a queda da pressão de perfusão coro-nariana, sobre o remodelamento cardíaco.

A pressão de perfusão coronariana pode ser de-finida como o gradiente de pressão que determina o fluxo arterial coronariano, e é calculada como a diferença entre a pressão diastólica na raiz da aorta e a pressão de enchimento do ventrículo esquerdo (pressão diastólica final do ventrículo esquerdo).

No ventrículo esquerdo, a perfusão miocárdica em condições basais, nas regiões do subendocárdio e subepicárdio, é homogênea (1:1). Quando há re-dução da pressão de perfusão coronariana, a perfu-são miocárdica fica prejudicada preferencialmente no subendocárdio (3:1). Na sobrecarga de volume, com a elevação da pressão de enchimento, há queda da pressão de perfusão coronariana e menor perfusão do subendocárdio. Portanto, a região subendocárdica é a mais susceptível ao processo isquêmico em condi-ções da elevação de pressões intracavitárias (Aldeas et al.1, 2000; Buckberg et al.3, 1972).

Na doença arterial coronária, o comprometimen-to do fluxo miocárdico se dá preferencialmente no subendocárdio do ventrículo esquerdo. Outras pato-logias cardíacas que comprometem a geometria ven-tricular podem também se acompanhar de alterações regionais da perfusão miocárdica. De fato, pacientes com doença cardíaca congênita, valvar ou pacientes submetidos à circulação extracorpórea apresentam maior ocorrência de necrose ou fibrose na região do subendocárdio do ventrículo esquerdo. Isso se deve, provavelmente, ao desbalanço entre o consumo de oxigênio e o fluxo miocárdico (Buckberg et al.2, 1977). Entretanto, nessas doenças o papel da queda da pres-são de perfusão coronariana no dano subendocárdico ainda não foi estudado.

Os estudos com modelos de cardiopatias em ra-tos como o infarto do miocárdio e a fístula aortocava têm sido conduzidos desde meados do século passa-

do para compreensão dos mecanismos fisiopatológi-cos que levam ao remodelamento cardíaco (Selye et al.8, 1960). Entretanto, apenas nos últimos anos, a re-lação da pressão de perfusão coronariana com dano miocárdico começou a ser investigada (Frimm et al.4, 2003; Guido et al.5, 2007).

Em 2003, demonstramos haver relação entre a redução da pressão de perfusão coronariana e a fi-brose no subendocárdio da região remota ao infarto (Frimm et al.4, 2003). Em outro modelo experimental, de fístula aortocava em ratos, observamos que a re-dução da pressão de perfusão coronariana também está associada ao aparecimento de fibrose na região do subendocárdio (Guido et al.6, 2004).

É possível que a pressão de perfusão coronariana seja um importante determinante da função ventri-cular (Tucci et al.9, 1980). Nossas investigações de-monstraram que há queda da pressão de perfusão coronariana já na fase aguda do infarto. Essa queda implica em lesões na região do subendocárdio remo-to ao infarto, tais como necrose, inflamação, fibropla-sia e fibrose durante a fase subaguda e crônica. Foram observadas importantes relações dessas lesões com a ocorrência da disfunção ventricular em cada momen-to estudado (Koike et al.7, 2007).

No modelo de fístula aortocava, já há queda da pressão de perfusão coronariana nas fases iniciais. Observamos que a redução da perfusão miocárdi-ca ocorre preferencialmente no subendocárdio e é acompanhada de aumento do estresse oxidativo, aumento da expressão e atividade de citocinas pro-inflamatórias e metaloproteinases e desenvolvimento de fibrose. O dano do subendocárdio e a queda da pressão de perfusão coronariana apresentaram cor-relação inversa com a função ventricular (Guido et al.5, 2007).

A intervenção sobre a pressão de perfusão coro-nariana particularmente com medidas terapêuticas que diminuam a pressão de enchimento do ventrículo esquerdo poderá minimizar o dano subendocárdico e favorecer a função ventricular durante o remode-lamento.

Até o momento, nossas investigações sugerem que a pressão de perfusão coronariana é a respon-sável pela integridade do subendocárdio e que a inte-gridade deste promove a manutenção da função ven-tricular nos modelos experimentais de sobrecarga de

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Teixeira R, Gimenez R, Oliveira DL, Dantas LEPBT • Dificuldades motoras na infância: prevalência e relações com as condições sociais e econômicas • São Paulo • Science in health • 2009 Jan-abr 1(1): 6-13

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Koike MK, de Carvalho Frimm C. O papel da pressão de perfusão coronariana no remodelamento cardíaco. São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 88-90

ponto de vistaBiomediCina

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volume (Koike et al.7, 2007). Assim, o aumento da pressão de enchimento do ventrículo esquerdo de-termina a queda da pressão de perfusão coronariana, dano subendocárdico e disfunção ventricular.

Baseado nestes estudos, o próximo passo de nos-sas pesquisas em modelos experimentais de sobre-

carga de volume é a intervenção sobre a pressão de perfusão coronariana com utilização de drogas que diminuam ou a pressão de enchimento do ventrículo esquerdo ou a pressão sistêmica, avaliando o impac-to da modulação da pressão de perfusão coronariana sobre o remodelamento cardíaco.

REFERÊNCIAS

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eico uemura*

O nosso propósito é registrar a experiência e conhecimentos construídos numa relação teoria-prática-teoria estabelecida no exercício profissional. Para isso fizemos um viés sem nos distanciar do foco, sintetizando a prática do planejamento institucional da Universidade Cidade de São Paulo. O texto está impregnado de aspectos técnicos sem a preocupação com a abordagem formal.

La práctica del planeamiento es algo cuyo origen se puede ubicar em la propia naturaleza humana. (SCHIE-FELBEIN, 1978, p.1)

A Universidade é uma organização complexa. Administrá-la é tarefa difícil, que poucos fazem com competência e desembaraço. A sua eficácia pode ser verificada no desempenho da Instituição e sua efici-ência, nos resultados. Não bastam os conhecimentos teóricos construídos nos bancos escolares ou a partir de sistema de produção, por exemplo. Administrá-la é colocar em prática o exercício dos conhecimentos e das experiências; é ter clareza daquilo que se quer; requer conhecimento dos meios dos quais dispõe ou necessita; é saber executar para se ter a empresa de-sejada; e, em síntese, é aceitar a realidade e decidir enfrentar a sua mudança. É oportuno citar um velho provérbio chinês (HUNTER, 2004, p.39).

Se você não mudar a direção,terminará exatamente onde partiu.

Nesse cenário, surge o planejamento com toda a sua força, impregnado de desejos e sonhos, exalando vontade e coragem. Nesse contexto, procede o pla-nejamento da Universidade Cidade de São Paulo.

Inicialmente, ações preliminares são desenca-deadas com a finalidade de delinear o perfil e, assim, “tomar pé” da realidade e permitir o redesenho da realidade futura. Conhecer a Universidade é preciso,

* Doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Uni-camp), Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP). Assessora de Planejamento da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID). Presidente da Comissão de Avaliação Institucional – CPA.

REFLEXÕES SOBRE O PLANEJAMENTO DA UNIVERSIDADE

conhecer o seu contexto sócio-econômico-cultural é indispensável. Imaginemos um triângulo, tendo em cada uma de suas pontas a comunidade acadêmica, a estrutura física e a infraestrutura acadêmica da Universidade. Esse triângulo representa o cenário e elenco de atores para aquilo a que se destina – de-senvolvimento do ensino, da pesquisa e da extensão de forma integrada e indissolúvel, sendo o seu obje-to a construção do conhecimento que tem como ser sujeito, o acadêmico. Dentre as ações preliminares, destacamos também o estudo dos resultados da au-toavaliação institucional, coordenada e elaborada pela Comissão Própria de Avaliação – CPA da Universida-de que abordaremos logo mais.

Ações preliminares – Perfil da comunidade acadêmi-ca

A comunidade acadêmica é o conjunto de alu-nos, professores e pessoal do quadro administrativo (dirigentes e funcionários) da Universidade. Estudo continuado da evolução do perfil de cada segmento permite conhecer a tendência e comportamento da sua evolução e, assim, administrá-la em função do propósito da Instituição. O perfil elaborado quin-quenalmente, e hoje trienalmente, permite a leitura e releitura da movimentação durante os períodos, de cada segmento em separado e por aspecto, e tam-bém conforme a relação entre dois ou três aspectos. Permite acompanhar o crescimento ou retração do número de profissionais e alunos, procurando manter o equilíbrio da relação entre os segmentos, as carac-terísticas pessoais e profissionais do grupo, em es-pecial da escolaridade ou titulação acadêmica, enfim obtém-se a visão global por segmento e por aspecto que o caracteriza. Assim é possível fotografar, a cada período letivo, a comunidade acadêmica, identificar as mudanças ocorridas e desejadas e projetar outras para serem, por nós, perseguidas.

O pessoal administrativo é identificado como aquele responsável pelo exercício das atividades meios, profissional que dá suporte e apoio, o facilitador das atividades fins. Quem é este pessoal administrativo? Qual a configuração do quadro por ele formado? São abordados aspectos quanto aos cargos ocupados/

ponto de vistaGestão em saúde

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ponto de vistaGestão em saúde

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funções exercidas, experiência e trajetória na Univer-sidade, escolaridade/titulação acadêmica, predisposi-ção e busca de crescimento/desenvolvimento, faixa de idade, tempo na IES. Como é o corpo docente, ou seja, com quais professores a Instituição conta ou dispõe para desenvolver a sua proposta de trabalho? É elaborado o seu perfil pessoal (faixa de idade, titu-lação acadêmica, estar em processo de capacitação, tempo de instituição) e profissional (cursos em que atua, cargo ocupado conforme o plano de carreira do magistério, jornada de trabalho). Chegou a vez de conhecer o aluno no que se refere aos dados pes-soais - faixa de idade, sexo e região de procedência; e, quanto aos dados acadêmicos - curso frequentado quanto à modalidade, nível e período, matrícula geral e regular, evasão, desempenho acadêmico.

Ações preliminares : Relatório de AutoavaliaçãoA análise do Relatório Final da Autoavaliação Ins-

titucional do período é outra ação preliminar consi-derada no planejamento. A autoavaliação institucional é um processo de autoconhecimento com a partici-pação da comunidade acadêmica e ex-alunos que tem como objetivos, definidos no projeto da Universidade Cidade de São Paulo, (2006, p. 30):

Construir conhecimentos sobre a realidade • da Universidade Cidade de São Paulo possibi-litando intervenções eficientes e eficazes.Proporcionar instrumentos para tomadas de • decisões cada vez mais acertadas em busca da Universidade de qualidade.

Os propósitos da autoavaliação declaram a co-municabilidade e o diálogo existentes entre ela e o planejamento, eles são confidentes entre si. Os seus resultados devem transitar e navegar por todo o pla-nejamento, eles permeiam os objetivos, os conteú-dos, as ações, os resultados, a avaliação; ora de for-ma pontual ora como força oculta que faz emergir subterfúgios até então não declarados. Nesse último caso, quando a necessidade das decisões encontra-se mascarada ou pouco evidente, a autoavaliação pode desencadear o processo de desmascaramento ou torná-lo mais perceptível.

Olhar a Universidade, sob todos os ângulos, por representantes dos diferentes segmentos da comuni-dade acadêmica e ex-alunos, resulta numa visão am-

pla e de dimensão até então não percebida. Cada um dos segmentos consultados, ao registrar sua opinião sobre todos os aspectos organizacionais a eles per-tinentes, da gestão à infraestrutura, do desempenho dos que o rodeiam à sua autoavaliação e ao ter os seus registros compatibilizados com o que dizem os demais documentos oficiais institucionais compro-vando as ocorrências, fornece tudo isso os elementos que compõem o perfil da Instituição com tonalidades e intensidades que indicam o real e o que ainda pre-cisa ser concluído.

O relatório final da autoavaliação da Universida-de, publicado em 2002, portanto quando ainda não existia o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior/SINAES, foi encerrado com uma mensagem sobre a nossa crença presente, ainda hoje, em relação aos herdeiros do legado de administrar a Universida-de, que:

...a avaliação seja agente provocador e estimulador para manter acesa a impaciência de seus herdeiros; seja participante ativa do empreendimento que não se con-clui porque é projeto que se renova a cada realização; e, ainda, seja aquela que facilita o permear e o emergir da sensibilidade latente, no trato com o ser humano, nas decisões e ações de seus herdeiros. A avaliação é parte integrante do projeto da Universidade. (p.185)

As ações preliminares aqui identificadas permitem a construção do conhecimento da nossa Instituição, a elaboração do diagnóstico da situação. O que somos, o que temos, do que dispomos. É o ponto central do qual se dá a partida para chegarmos ao “o que sere-mos”, “o que teremos” e “o que nos disponibilizam”. É o momento de fazer emergir o velho provérbio chi-nês.

Prática do planejamentoGostaria de desenvolver a nossa prática de plane-

jamento institucional, resgatando uma fala por oca-sião da autoavaliação, ainda em 2002, mas que marca forte presença nesse contexto.

Desenhar um perfil e não buscá-lo é perder-se no meio do caminho. Fazer as coisas acontecerem é ser o sujeito das mudanças, é fazer a história; ver as coisas acontece-rem é ser mero expectador, é ver a história simplesmente acontecendo. É preciso ser o “artista” que idealiza e sai

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Teixeira R, Gimenez R, Oliveira DL, Dantas LEPBT • Dificuldades motoras na infância: prevalência e relações com as condições sociais e econômicas • São Paulo • Science in health • 2009 Jan-abr 1(1): 6-13Uemura E. Reflexões sobre o planejamento da Universidade São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 91-4

ponto de vista

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Gestão em saúde

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em busca da construção de sua obra, da matéria-prima à forma “quase perfeita”; o educador que “sonha” e nele se embrenha com vontade de realizá-lo e concretizá-lo. O atributo qualidade só se faz presente se buscado e se con-quistado, ele não é fruto de ações ocasionais e fugazes. (UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO, 2002, p.183-184).

Essas ideias revestem cada afirmação da premên-cia do planejamento. O planejamento é o instrumento de orientação da busca do perfil desenhado; ele pos-sibilita ser o agente de mudança que faz acontecer; após idealizada a obra, ele promove a sua construção, desde a escolha da matéria prima até a proximidade com sua “quase perfeição” porque ela não se con-clui; ações ocasionais e fugazes dispensam qualquer planejamento, mas correm sérios riscos de chegar a lugares inesperados e, às vezes, indesejados.

Se a Instituição não for ao encontro do planeja-mento, a necessidade trará o planejamento até a Uni-versidade.

Es fácil observar que, en cualquier momento, existe uma tensión entre lo que se es (el yo actual, individual o colectivo) y lo que se quiere o espera ser (un yo ideal ou perfección), independentemente de la actividad humana que se estudie. (SCHIEFELBEIN, 1978, p. 2)

O planejamento é um instrumento imprescindível para subsidiar as ações dos dirigentes. Planejamento, Plano, Projeto, Programa, cada um com suas espe-cificidades e dimensões delimitadas pelas finalidades determinadas conforme são adjetivados, Institucional, Educacional, Escolar, de Ensino, embora com elemen-tos em comum, que nos interessam no momento – previsibilidade nocauteando o domínio da improvisa-ção, trajetória traçada descartando o rumo incerto; a força do movimento vencendo a inércia; a ação do su-jeito agente interferindo na realidade. Permite prever o comportamento da organização em anos futuros, aquela que idealizamos e partimos para a sua busca porque todo plano está intencionalmente direciona-do para o futuro. O plano por si só não é suficiente, não é eficaz. É preciso fazê-lo eficiente, isto depende do sujeito ou equipe que elabora, executa, avalia e aperfeiçoa. É parte de um universo que tem o papel de organizar e ordenar os vários elementos, de forma linear ou concomitantemente, que o compõem numa

combinação, nem sempre harmoniosa, mas que tem propósito único.

O Plano Institucional Anual operacionaliza o Plano de Desenvolvimento Institucional quinquenal, ele de-fine as linhas básicas de ação para o ano em questão, define os objetivos, as metas e as ações estratégicas. Ao findar o ano, é elaborado o relatório do plano com os resultados, as mudanças ocorridas ao lon-go do ano. É parte do Plano Institucional Anual, os Planos de cada órgão ou setor, o mesmo ocorrendo com o respectivo Relatório.

Hunter (2004) ao desenvolver sobre o velho pa-radigma, aborda a questão da mudança, aspecto este intimamente ligado ao planejamento. “A mudança nos desinstala, nos tira da nossa zona de conforto e nos força a fazer as coisas de modo diferente, o que é difícil.” (p.44). E antes, esse mesmo autor (p.44) afir-ma: “Se uma organização não está desafiando suas crenças e velhas maneiras de fazer as coisas, a con-corrência e o mundo simplesmente a ultrapassam.” Esta é uma demonstração clara da existência de uma relação íntima entre planejamento e mudança; avalia-ção, planejamento e mudança. Conhece-se a Institui-ção, decide-se para onde ir, onde e como interferir e como verificar seus resultados ao longo do processo e, consequentemente, a revisão do propósito.

Planejar é sempre atividade coletiva, cujos mem-bros têm parcelas significativas de responsabilidade no processo, nos resultados, no aperfeiçoamento; é processo de construção. Planejar é ação de quem sabe o que quer porque é ação intencional e interferidora. Com ele intervêm-se na realidade para modificá-la ou mesmo até para estagná-la. É ato responsável e de comprometimento.

Shinyashiki (1997 p.24) afirma que a felicidade também é lucro, em acordo com a posição de um administrador de empresa, que conheceu quando es-teve no Japão como bolsista, para quem lucro não era apenas recompensa financeira. Veja parte da fala des-te administrador “A sensação de estar construindo uma nação forte também representa um grande lu-cro.” E à semelhança deste administrador, afirmamos que a sensação de estar construindo uma universida-de forte também representa um grande lucro para a sociedade. A universidade, como toda construção, deve ser planejada.

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Teixeira R, Gimenez R, Oliveira DL, Dantas LEPBT • Dificuldades motoras na infância: prevalência e relações com as condições sociais e econômicas • São Paulo • Science in health • 2009 Jan-abr 1(1): 6-13

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Uemura E. Reflexões sobre o planejamento da Universidade São Paulo • Science in Health • 2010 jan-abr 1(1): 91-4

ponto de vistaGestão em saúde

ISSN 2176-9095

REFERÊNCIAS

HUNTER, James C. O monge e o executivo. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.

SCHIEFELBEIN, Ernesto. Teoría, técnicas, procesos y casos en el planeamiento de la educa-ción. Buenos Aires: Libreria “El Ateneo”. 1978. 789p.

SHINYASHIKI, Roberto. O sucesso é ser feliz. São Paulo: Gente, 1997.198p.

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO. Avaliação institucional 1997 a 2001: relató-rio final. S.Paulo. UNICID, 2002. 226p.

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO. Projeto de auto-avaliação institucional 2004/2006. In: Avaliação institucional 2004 a 2006: Relatório Final. São Paulo: UNICID, 2006. 91p.

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