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XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS SÉRGIO HENRIQUES ZANDONA FREITAS JULIA MAURMANN XIMENES LEONEL SEVERO ROCHA

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XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA

SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS

SÉRGIO HENRIQUES ZANDONA FREITAS

JULIA MAURMANN XIMENES

LEONEL SEVERO ROCHA

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Diretoria – CONPEDI Presidente - Prof. Dr. Raymundo Juliano Feitosa – UNICAP Vice-presidente Sul - Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet – PUC - RS Vice-presidente Sudeste - Prof. Dr. João Marcelo de Lima Assafim – UCAM Vice-presidente Nordeste - Profa. Dra. Maria dos Remédios Fontes Silva – UFRN Vice-presidente Norte/Centro - Profa. Dra. Julia Maurmann Ximenes – IDP Secretário Executivo - Prof. Dr. Orides Mezzaroba – UFSC Secretário Adjunto - Prof. Dr. Felipe Chiarello de Souza Pinto – Mackenzie

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Conselho Fiscal:

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Prof. Dr. Valter Moura do Carmo – UNIMAR

Profa. Dra. Viviane Coêlho de Séllos Knoerr – UNICURITIBA

S678

Sociologia, antropologia e cultura jurídicas [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI

Coordenadores: Sérgio Henriques Zandona Freitas, Julia Maurmann Ximenes, Leonel Severo Rocha – Florianópolis: CONPEDI, 2017.

Inclui bibliografia

ISBN: 978-85-5505-552-2Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Direito, Democracia e Instituições do Sistema de Justiça

CDU: 34

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Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito

Florianópolis – Santa Catarina – Brasilwww.conpedi.org.br

Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC

1.Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Encontros Nacionais. 2. Realidade Social. 3. Cultura. XXVICongresso Nacional do CONPEDI (27. : 2017 : Maranhão, Brasil).

Universidade Federal do Maranhão - UFMA

São Luís – Maranhão - Brasilwww.portais.ufma.br/PortalUfma/

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XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA

SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS

Apresentação

O XXVI Congresso Nacional do CONPEDI foi realizado em São Luís - Maranhão,

promovido pelo Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI) em

parceria com a Universidade Federal do Maranhão – UFMA, por meio do seu Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito e Instituições do Sistema de Justiça, no período de

15 a 17 de novembro de 2017, sob a temática “DIREITO, DEMOCRACIA E

INSTITUIÇÕES DO SISTEMA DE JUSTIÇA”.

O Grupo de Trabalho “Sociologia, Antropologia e Cultura Jurídicas” desenvolveu suas

atividades na data de 16 de novembro de 2017, no Campus da Universidade CEUMA, em

São Luís-MA, e contou com a apresentação de dezessete artigos científicos que, por suas

diferentes abordagens e aprofundamentos científico-teórico-práticos, possibilitaram

discussões críticas na busca de aprimoramento do renovado sistema brasileiro das ciências

sociais.

Os textos foram organizados por blocos de temas, coerentes com a sistemática do respectivo

Grupo de Trabalho, podendo-se destacar nas pesquisas as discussões sobre a sociedade pós-

moderna, complexa e líquida, com a apresentação, sob viés crítico, de caminhos e soluções

aos problemas abordados.

A coletânea reúne gama de artigos interdisciplinares, maduros e profícuos, que apontam

questões relativas à corrupção sistêmica e as políticas sociais, o “jeitinho” e a

“malandragem” brasileira, questões relativas a via alternativa de resolução de conflitos e a

análise sociológica dos conflitos judiciários brasileiros, as comunidades indígenas e suas

terras, o agronegócio, o etnodireito e o princípio da igualdade, a posse e a propriedade, com

viés de territorialidades rivais, bem como os territórios tradicionais pesqueiros, a sociedade

burguesa, os conflitos afetivos, a instituição policial e a crise do setor público, o

estruturalismo construtivista, as técnicas de ensinagem no Direito, mapas mentais e a

consequente evolução do profissional com atuação no Direito e, finalmente, a ideologia da

universalidade dos Direitos Humanos.

Como se viu, aos leitores mais qualificados, professores, pesquisadores, discentes da Pós-

graduação, bem como aos cidadãos interessados nas referidas temáticas, a pluralidade de

relevantes questões e os respectivos desdobramentos suscitam o olhar sobre os avanços e

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retrocessos dos direitos sociais no Brasil e a necessidade de se evoluir na discussão sobre o

comportamento humano e a sociedade de indivíduos, grupos e instituições.

Assim, os coordenadores do Grupo de Trabalho - SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E

CULTURA JURÍDICAS, agradecem a colaboração dos autores dos artigos científicos e suas

instituições multiregionalizadas, pela valorosa contribuição ao conhecimento científico e

ideias para o aprimoramento democrático-constitucionalizado do Direito brasileiro.

Finalmente, de forma dinâmica e comprometida com a formação do pensamento crítico

contemporâneo, o convite do CONPEDI, por meio dos organizadores da presente publicação,

para uma leitura prazerosa dos artigos apresentados, com a possibilidade de (re)construção

crítico-evolutiva do homem e da sociedade, ambos voltados na concretização de direitos e

garantias fundamentais insculpidos na Constituição de 1988.

São Luís/MA, novembro de 2017.

Profa. Dra. Julia Maurmann Ximenes - IDP

Prof. Dr. Leonel Severo Rocha - Unisinos

Prof. Dr. Sérgio Henriques Zandona Freitas - FUMEC

Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação

na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 7.3 do edital do evento.

Equipe Editorial Index Law Journal - [email protected].

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REPRESENTAÇÃO SOCIAL EM DURKHEIM: UM ESTUDO DA NOÇÃO DE FAMÍLIA NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO E A MEDIAÇÃO FAMILIAR COMO

VIA ALTERNATIVA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS.

SOCIAL REPRESENTATION IN DURKHEIM: A STUDY OF THE FAMILY CONCEPT IN THE BRAZILIAN JUDICIARY AND FAMILY MEDIATION AS AN

ALTERNATIVE CONFLICT RESOLUTION.

Verônica Gomes Oliveira

Resumo

O artigo apresenta o conceito de representação social em Durkheim como embasamento para

um estudo sobre a noção de família no judiciário brasileiro, com enfoque na Constituição

Federal de 1988 e a sua influência nas demais leis vigentes no país. Mostra como a noção de

família e a sua interpretação por parte dos membros do Poder Judiciário podem ser decisivas

para a resolução de conflitos familiares. E por fim, apresenta o tema de uma pesquisa em

construção sobre a mediação, como um instrumento de resolução de conflitos familiares.

Constitui-se numa abordagem de cunho bibliográfico com pesquisa na legislação jurídica

brasileira.

Palavras-chave: Representação social, Família, Judiciário brasileiro, Pacificação de conflito, Mediação

Abstract/Resumen/Résumé

The article presents the concept of social representation in Durkheim as a basis for a study on

the notion of family in the Brazilian judiciary, focusing on the Federal Constitution of 1988

and its influence on other laws in force in the country. It shows how the notion of family and

its interpretation by the members of the Judiciary can be decisive for the resolution of family

conflicts. Finally, it presents the theme of a research under construction on mediation, as an

instrument for resolving family conflicts. It is a bibliographical approach with research in

Brazilian legal legislation.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Social representation, Family, Brazilian judiciary, Conflict pacification, Mediation

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1. INTRODUÇÃO

A noção de família em uma dada sociedade depende da representação que os sujeitos

dela possuem, diante desta configuração e das peculiaridades desta noção no Estado brasileiro

apresentamos o conceito de Durkheim sobre as representações sociais, a fim de compreender

a influência desta no comportamento dos sujeitos. Em especial, abordando a noção de família

na legislação brasileira e como esta influencia na decisão advinda do judiciário brasileiro.

Neste sentido, objetiva-se discutir a noção de família a partir da legislação brasileira e

como a mudança do paradigma da família nuclear conjugal a partir da Constituição Federal de

1988 permitiu uma ampliação da representação do que seja família em nosso estado e como

isto se reflete no judiciário brasileiro assim como as controvérsias nesta área são resolvidas,

enfocando a mediação como via alternativa de resolução e pacificação de conflitos no âmbito

familiar.

2. REPRESENTAÇÃO SOCIAL EM DURKHEIM

A noção de representação social permite abordar diversos temas de interesse para as

Ciências Humanas, em especial, a noção de família para o Judiciário brasileiro. O criador do

conceito de representação social foi Durkheim, na medida em que lhe fixou e lhe reconheceu

a possibilidade de explicar os mais variados fenômenos sociais de uma dada sociedade.

Para Durkheim apud PINHEIRO FILHO (2011) a representação designava, em primeiro

lugar, uma vasta classe de formas mentais, de opiniões e de saberes sem distinção.

Apresentando uma imobilidade, enquanto conceito, e uma objetividade já que era partilhada e

reproduzida de maneira coletiva. Podendo designar, de maneira geral, tudo aquilo que,

afetando a mente ou emanando dela, é capaz de fixar-se com menor ou maior grau de

estabilidade.

O autor fez uma distinção entre representações individuais e representações coletivas,

de modo a distinguir que a representação coletiva significava o substrato do resultado dos

indivíduos associados, pois para ele a vida coletiva só pode existir no todo formado pela

reunião de indivíduos. Sendo, então, inicialmente uma forma de conhecimento produzido

socialmente. (PINHEIRO FILHO, 2011)

Na obra “As formas elementares da vida religiosa” (2000) Durkheim designa as

representações coletivas como uma síntese dos elementos dispersos no meio social,

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exprimindo o ideal coletivo que tem origem na religião. Constituindo-se assim, em um

elemento de intelecção do mundo e comunicação entre as razões individuais.

A religião em sua obra é tomada como coisa eminentemente social, como uma

característica geral da sociedade humana fazendo parte da constituição do homem enquanto

sujeito social e as representações religiosas são representações coletivas. Deste modo, inseriu

a concepção das representações sociais advindas da apreensão que os sujeitos têm da própria

realidade no qual estão inseridos, isto é, da apreensão do real que têm por base referências

produzidas coletivamente.

Durkheim afirma que a organização de tempo e espaço são reflexos e produtos da

organização da sociedade e estes funcionam como categorias de entendimento essenciais ao

funcionamento da vida social. A concepção de categoria introduzida na obra “As formas

elementares da vida religiosa” (2000) permite-nos entender que categoria é o conteúdo mais

expressivo dos conceitos mais gerais, possuindo a função de envolver todos os outros

conceitos que permeiam uma determinada realidade social. (PINHEIRO FILHO, 2011)

As representações podem ser consideradas fatores produtores de realidade, com

repercussões na forma como interpretamos o que acontece ao nosso redor e à nós mesmos,

elas são um saber prático que se alimenta não só das teorias científicas mas também dos

grandes eixos culturais, das ideologias formalizadas, das experiências e das comunicações

quotidianas.

Neste sentido, uma representação pode ser considerada social porque é coletivamente

construída e partilhada por um conjunto de indivíduos. É um produto das interações e dos

fenómenos de comunicação no interior de um grupo social, refletindo a situação desse grupo.

Funcionando, então, como um modo de retratar e compreender a realidade. (PINHEIRO

FILHO, 2011).

3. REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA FAMÍLIA

O Direito tem sua origem nos fatos sociais, entendendo-se como tais os acontecimentos

da vida em sociedade, práticas e condutas que refletem seus costumes, valores, tradições, até

mesmo os sentimentos dos sujeitos sociais e a sua cultura, cuja elaboração apresenta-se de

modo gradual e espontânea da vida social. O Direito não pode formar-se alheio aos fatos que

permeiam uma dada sociedade. (CAVALIERI FILHO, 2007)

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Neste aspecto, ressalta-se que a relação entre Sociologia e o Direito tem como precursor

Émile Durkheim que fixou as relações entre estas duas ciências, no final do século XIX, e por

isso mesmo é imprescindível estudar a ciência jurídica com base numa relação dialética com a

realidade social e com os fatos que nela ocorrem, pois as normas do Direito são regras de

conduta para disciplinar o comportamento do indivíduo no grupo, normas estas que são

ditadas pelas próprias necessidades e conveniências sociais. (CAVALIERI FILHO, 2007)

O sistema jurídico de um determinado país, como advém da sociedade com o intuito de

regular as relações sociais estabelecidas, possui uma carga valorativa que representa o próprio

modo de constituição deste estado enquanto nação e se reflete na própria constituição do

sistema normativo que regula as relações sociais dentro deste Estado. Por isso, optou-se por

analisar a categoria família no Estado brasileiro dentro de seu sistema jurídico, tomar-se-á por

base a Constituição Federal de 1988, o Código Civil e outras legislações infraconstitucionais.

Deste modo, faz-se necessário categorizar a noção de família dentro da realidade

jurídica brasileira a fim de se compreender o sentido e percepção que o judiciário brasileiro

possui desta categoria.

4. FAMÍLIA: BREVE HISTÓRICO

A família traz, em sua estrutura, aspectos relativos ao momento histórico em que ela se

posiciona, Friedrich Engels (1995), atribui a cada período um tipo específico de família, com

sua respectiva forma de casamento. Neste sentido, o estágio inicial da organização social

humana seria a horda, o modo mais primitivo, caracterizado pela ausência de restrições

sexuais, onde qualquer indivíduo do sexo feminino poderia manter relações com qualquer

indivíduo do sexo masculino e vice-versa. Caracterizando um estado primitivo das relações,

que posteriormente evoluiu para o término da horda e o início da família.

Após o término da horda, surgiu a primeira forma de organização social a chamada

família consanguínea, caracterizada pela proibição de casamento entre ascendente e

descendente, ainda que permitido entre irmãos e irmãs. Em seguida surgiu a família

“punaluana”, que passou a restringir o casamento entre irmãos. Aparecendo então o chamado

“direito materno”, pois somente era possível definir a descendência pelo lado feminino, ou

seja, pelo fato das mulheres possuírem mais de um marido, os filhos herdavam os bens da

mãe. (ENGELS, 1995)

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Em seguida, aparece a família pré-monogâmica, vigente na barbárie, onde, devido ao

aumento das restrições de uniões entre irmãos e irmãs, tornou-se impossível o casamento por

grupos. Neste tipo de família, um homem vive com uma mulher, porém a poligamia e a

infidelidade ocasional permanecem direitos somente daquele. O vínculo conjugal era

facilmente dissolúvel por qualquer das partes e os filhos ficavam com a mãe. As mulheres

constituíam o grande poder dentro dos clãs.

E a partir da exigência de fidelidade da mulher, surge a figura do autêntico pai. Os

filhos, porém, não herdavam os bens do progenitor, que pertencia a um clã diferente. Isto

ensejou a supressão do direito materno e o surgimento do direito hereditário paterno. Nasce,

então, a família patriarcal, onde todos os indivíduos (mulher, filhos e escravos) estavam

submetidos ao poder do pai.

O último tipo de família, que perdura até a atualidade, é a monogâmica, Seu surgimento

se deveu a circunstâncias puramente econômicas. Baseia-se no domínio masculino e na

exigência de fidelidade da mulher, de modo que a paternidade fosse indiscutível e os filhos

herdassem os bens do pai. Somente o homem podia romper o vínculo conjugal e só a ele

assistia o “direito” de ser infiel.

O relato histórico da noção de família a partir de Engels (1995) sofreu críticas de

autores como Claude-Lévi-Strauss (2010) que se insurgiu contra a ideia da não existência de

núcleos familiares nos povos arcaicos e que já existiria registros de famílias monogâmicas nas

denominadas sociedades rudimentares. Porém, mesmo com a existência de críticas, a leitura

deste autor é importante para a percepção do que seja família, no aspecto de sua mutabilidade

e da não ocorrência de uma universalidade familiar. (SANTOS e, MENESES, 2014).

Assim, percebe-se que o relato histórico da noção de família a partir de Engels (1995)

sofreu críticas de autores como Claude-Lévi-Strauss (2010) que se insurgiu contra a ideia da

não existência de núcleos familiares nos povos arcaicos e que já existiriam registros de

famílias monogâmicas nas denominadas sociedades rudimentares.

Porém, mesmo com a existência de críticas, a leitura de Engels (1995) é importante

para a percepção do que seja família, no aspecto de sua evolução e da não ocorrência de uma

universalidade familiar (SANTOS; MENESES, 2014). Também porque ele apresenta o

aspecto econômico como um elemento, entre outros, importante na constituição da família e

cada vez mais essa questão importa no âmbito do direito familiar contemporâneo.

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Inicialmente, nessa perspectiva, a família pode ser definida como um grupo de pessoas

diretamente unidas por parentesco. As relações familiares são sempre reconhecidas dentro de

grupos de parentesco, ora identificadas como famílias nucleares, quando compostas somente

pelo casal e seus descendentes e ora também denominada de família ampliada quando em sua

composição há a inclusão de sogros, irmãos, avós ou outros parentes do casal nuclear.

Há ainda autores como Haim Gruspun (2000), que analisam as relações familiares

numa outra perspectiva, distinta da análise de Engels, veem a família como um sistema onde

se conjugam valores, crenças, conhecimentos, no qual o indivíduo ensaia os primeiros passos

para viver em sociedade com o seu semelhante, num contínuo confronto com suas vontades e

refreando os seus impulsos num constante equilíbrio para com os outros membros em que

convive. Pois, segundo Gruspun (2000): “(...) o sistema familiar é o processo no qual as

pessoas chegam para convier em conjunto, numa fusão, criando simbiose e relacionamentos,

onde se encontram confortos emocionais recíprocos.” (GRUSPUN, 2000, p. 65).

Neste sentido, numa leitura mais atual, estudar a família e a vida familiar, conforme

Giddens (2004) apresenta, depende da perspectiva em que o pesquisador esteja inserido,

diante das constantes transformações ocorridas, como aquelas decorrentes da

industrialização, da cultura e da evolução da sociedade em geral.

Sob a ótica da perspectiva funcionalista, que é aquela que vê a sociedade como um

conjunto de instituições sociais que desempenha funções específicas para assegurar

continuidade e o consenso, a família desempenha funções importantes que contribuem para

satisfazer as necessidades básicas da sociedade e auxiliam a perpetuar a ordem social

(GIDDENS, 2004).

Para esta perspectiva, o processo de industrialização do século XVIII alterou a ordem

econômica e social, a família tornou-se assim menos importante como unidade de produção

econômica e mais concentrada na reprodução, na educação de seus membros e na socialização

(LOURENÇO, 1991; SILVA, 2006). Neste aspecto, há duas principais funções atribuídas

pelo sociólogo Talcott Parsons à família: a socialização primária e a estabilidade da

personalidade. Pois, para este autor a família tem como função socializar os filhos e,

sobretudo, assegurar o equilíbrio psicológico dos adultos (SILVA, 2006).

Parsons (1956), conforme Giddens (2004), considerava a família nuclear uma unidade

mais bem preparada para lidar com as demandas da sociedade industrial, pois com a redução

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da família e a respectiva especialização de cada uma de suas funções internas, o marido

adotaria a função “instrumental” de provedor e a mulher a função “afetiva”, emocional dentro

do ambiente doméstico. Visão esta ultrapassada, pois negligenciam a variação nos padrões

familiares o que não permite o seu uso na atualidade (GIDDENS, 2004).

A diferenciação é um dos processos de mudança estrutural previsto na teoria

parsoneana e está intimamente ligada à complexidade de um sistema, que provocou um

isolamento da família nuclear ao permitir uma maior especialização entre seus membros, por

conta do complexo processo de diferenciação da unidade econômica de produção

relativamente ao agregado familiar, que acompanha o desenvolvimento da sociedade

industrial (LOURENÇO, 1991).

Partindo desta noção histórica e evolutiva é necessário analisar a noção de família

inserida no ordenamento jurídico brasileiro e como esta pode ser decisiva na construção de

decisões judiciais e do modo de como o Poder Judiciário propõe a resolução de conflitos no

direito de família.

5. FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

No Brasil, a ideia de família já foi alicerçada no fato de ser constituída por pais e filhos

unidos a partir do casamento, constituindo-se num modelo patriarcal, que antes era traduzida

pelo Código Civil de 1916. (CACHAPUZ, 2011).

No entanto, a partir da Constituição Federal de 1988 – CF/88 houve o surgimento de

uma nova concepção de família, regulando a possibilidade do reconhecimento de novas

entidades familiares, em que a dignidade de seus membros constituintes passou a ser o foco

principal. Pois, a CF/88 deixou de centrar a ideia de família apenas como sendo aquela

advinda do casamento.

A importância desta nova concepção de família possibilitou uma reestruturação da

legislação, pois as leis dentro de um determinado país não podem contrariar a sua lei maior,

isto é, a sua Constituição. Deste modo, a legislação civilista foi alterada com a entrada em

vigor do Código Civil de 2002 – CC/02, que não reproduziu ideias tais como: a

impossibilidade de dissolução do casamento, o não reconhecimento de uniões sem o laço

matrimonial assim como o não reconhecimento de filhos. (DIAS, 2007)

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Então, somente a partir da CF/88 é que houve um alargamento da compreensão do que

seja família, pois a partir disto o núcleo familiar deixou de ser hierarquizado, para se tornar

igualitário entre os sujeitos que compõe uma dada realidade familiar, isto é, homem e mulher,

relações homoafetivas, pais e filhos que passam a ter o mesmo nível, fundado no respeito à

dignidade humana, como se depreende do art. 226.

A CF/88 no art. 226, traz: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do

Estado.” 1 Nos parágrafos que se seguem, há referências a modelos específicos de família: os

parágrafos primeiro, segundo e sexto, fazem alusão ao casamento; o parágrafo terceiro

anuncia o reconhecimento da união estável entre homem e mulher como entidade familiar, o

parágrafo quarto dispõe sobre a família monoparental, formada por um dos pais e seus

descendentes. Há doutrina jurídica conservadora que defende que estes seriam os modelos de

família admitidos pelo ordenamento jurídico.

Porém, o consenso é que a constituição atual não trouxe um tipo específico de família,

mais apenas igualou os direitos entre seus integrantes, ampliando a noção de entidade

familiar, materializando o princípio da dignidade humana2, princípio este esculpido no art. 1º

da CF/88, entre seus integrantes.

Outra legislação que merece ser destacada é o Código Civil de 2002 – CC/2002, que

mesmo entrando em vigor após a CF/88 não trouxe as inovações que deveriam ter sido

reguladas, como por exemplo, aquelas que decorrem das novas formas de famílias, que se

distanciaram do modelo patriarcal precedente, pois a família contemporânea se pluralizou,

existindo atualmente famílias recompostas, monoparentais, homoafetivas, dentre outras

formas. (DIAS, 2007).

1 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade

familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus

descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos

casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos.

2 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do

Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:[...]

III - a dignidade da pessoa humana;

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Dentre os clássicos da Sociologia, Durkheim preocupou-se com o tema família e situou

a família moderna no centro de um movimento duplo, caracterizado por uma privatização, por

meio das relações interpessoais nela existentes, e uma socialização com uma maior

intervenção por parte do Estado. (DURKHEIM apud SINGLY, 2010).

Neste sentido, o Estado por seus instrumentos legais normatiza as relações que se

formam na vida familiar, e no Brasil este regramento materializa-se através do CC/2002 no

Livro IV, intitulado Do Direito de Família, que traz regramentos atinentes ao casamento civil,

relações de parentesco, direito patrimonial advindo do casamento, dentre outros, que não são

objeto deste estudo.

Vale ressaltar, que a noção de família no sistema jurídico brasileiro ampliou-se e que a

representação social desta instituição no Poder judiciário reflete nos modos de decisão por

parte de seus integrantes e como as demandas nesta área são resolvidas.

Um bom exemplo desta representação, ainda tradicional, por parte do judiciário

brasileiro é o caso do juiz de Goiânia, que proibiu os cartórios sob sua jurisdição3 de

registrarem uniões homoafetivas, sob o fundamento de que dois indivíduos do mesmo sexo

não constituem uma família, que só pode ser formada por um homem e uma mulher, única

forma de conjunção humana capaz de gerar prole. O juiz contrariou o reconhecimento de

união estável por pessoas do mesmo sexo por parte do Supremo Tribunal Federal – STF,

órgão guardião da Constituição Federal, que demonstrou o entendimento de que a família não

comporta somente a sua significação tradicional.

Deste modo, observa-se que a noção do julgador ainda atrela-se à visão de família

nuclear, formada por membros heterossexuais. Porém, a partir da decisão do STF, o Conselho

Nacional de Justiça - CNJ editou a Resolução Nº 175, autorizando a celebração de casamento

civil entre pessoas do mesmo sexo, de observância obrigatória por todos os Tribunais

brasileiros. Constituindo-se, assim, um marco para o reconhecimento de outras formas de

entidade familiar distinta daquela nuclear formada por homem e mulher e seus descendentes.

Ressalta-se, que a legislação brasileira, ainda possui lacunas, quanto ao regramento da

variedade de formas familiares, porém as causas e os conflitos levados ao Poder judiciário

devem ser solucionados com base na construção sócio cultural de família contemporânea

3 Jurisdição: poder pertencente aos magistrados de aplicar o direito. (GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri.

Dicionário compacto jurídico. 9ª ed. São Paulo: Rideel, 2006)

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brasileira, fundada na afetividade, na estabilidade, na comunhão de vida e exclusão das

relações casuais, assim como na ostensibilidade, ou seja, na publicidade da unidade familiar.

(FARIAS e, ROSENVALD, 2014).

Pois, o que observamos é uma transformação no conceito de família de mera

instituição fundada e sacralizada no casamento para uma acepção mais ampla no sentido de

designar as relações familiares, como o que fez o Novo Código Civil de 2002 que utiliza esta

expressão tanto para designar as pessoas que se uniram pelo vínculo do casamento, como

aquelas unidas apenas por laços afetivos (FARIAS; ROSENVALD, 2014).

Portanto, na legislação brasileira o que prevalece é o entendimento constitucional que

abarcou uma concepção múltipla e aberta de entidade familiar e assim toda e qualquer

legislação infraconstitucional deve obedecer este preceito.

Nesse sentido, os conflitos advindos das relações familiares no Brasil podem ser

solucionados tanto de forma judicial quanto extrajudicial4, já que estas relações envolvem

aspectos múltiplos, isto é, afetivos, sexuais, emocionais, dentre outros. E um instrumento que

permite possibilitar o aprimoramento na pacificação de conflitos familiares é o uso da

mediação familiar, como mecanismos de solução de conflitos.

6. ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E A MEDIAÇÃO COMO

INSTRUMENTO DE PACIFICAÇÃO DE CONFLITOS

Inicialmente, devemos categorizar conflito, como sendo uma palavra derivada do latim

“conflictu”, referindo-se a combate, discussão e discórdia. Nem sempre o conflito possui

conotação negativa, pois através dele é possível alcançar uma nova diretriz consensual.

(CACHAPUZ, 2011).

Simmel (1983) considera o conflito uma forma de “sociação5”, pois assim como o

universo precisa de “amor e ódio”, forças de atração e forças de repulsão para que tenham

4 Extrajudicial: ato praticado fora do juízo, voluntariamente, sem formalidade processual ou judicial, mas com

capacidade de produzir efeitos jurídicos. (GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário compacto jurídico.

9ª ed. São Paulo: Rideel, 2006)

5 Sociação: Esse termo para Simmel (1983) corresponde a sua ideia de sociedade, pois para o autor a sociedade

só é possível como resultante das ações e reações dos indivíduos entre si, isto é, por meio de suas interações. O

autor afirma que: “o processo básico de sociação é constituído pelos impulsos dos indivíduos, ou por outros

motivos, interesses e objetivos; e pelas formas que essas motivações assumem” (SIMMEL, 1983, p. 21). Essa

mesma sociedade só é possível pela existência de formas de sociação, que são determinadas por três condições: a

primeira é a determinação quantitativa de grupos; a segunda condição de sua existência é o processo de

dominação e subordinação e a terceira condição é o conflito. Simmel aponta o conflito como “forma pura de

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forma qualquer, também a sociedade, para alcançar uma determinada configuração, precisa de

quantidades proporcionais de harmonia e desarmonia, de associação e competição, de

tendências favoráveis e desfavoráveis. Nesse sentido, a sociedade é resultante destas

interações positivas e negativas advindas dos conflitos existentes em seu interior (SIMMEL,

1983).

Portanto, o conflito é inevitável no modo de viver-se em sociedade. Na própria

caracterização dos tempos modernos como podemos perceber em diversos autores como

Durkheim (1921), Talcott Parsons (1955), Weber e Marx (1954), apesar da dissonância entre

eles, o que varia nos seus pontos de vistas é como cada um analisa as funções, causas e efeitos

dos conflitos nas estruturas sociais e não a negação do mesmo (OUTHWAITE;

BOTTOMORE, 1996).

Desse modo, o conflito pode ser considerado como algo inevitável e salutar, em

especial nas sociedades ditas democráticas, pois o que importa é não considerá-lo como um

fenômeno patológico e sim encará-lo como um fato, um evento importante, positivo ou

negativo, conforme os valores inseridos no contexto social analisado, pois uma sociedade sem

conflitos é estática (SPENGLER, 2008).

Assim, compreender a existência dos conflitos em uma dada sociedade e a relação que

estes estabelecem possibilita-nos ampliar a multiplicidade de relações estabelecidas numa

dada estrutura social, pois o seu existir já estimula interesse e curiosidades, visto que a

eliminação do conflito na sociedade humana está destinada ao fracasso, pois esse faz parte da

vida dos seres humanos, sendo por isso mesmo tão fundamental na associação humana quanto

à cooperação (OUTHWAITE; BOTTOMORE, 1996; SIMMEL, 1983).

Desse modo, ressalta-se que Max Weber formulou uma teoria de conflito, derivando das

relações intrínsecas de poder, trabalhando com ênfase na distinção entre poder legítimo e

ilegítimo. Estas relações de poder derivam da autoridade de determinadas pessoas e

instituições, no qual os indivíduos a elas se submetem. E a partir disso, distinguiu três tipos de

autoridade/legitimidade de poder: a) a carismática; b) a tradicional; c) a legitimidade

legal/racional que é aquela no qual o respeito se funda sobre regras formais. (WEBER apud

MORAIS e, SPENGLER, 2012).

sociação e tão necessária à vida do grupo e sua continuidade como o consenso”. É ele indispensável à coesão do

grupo. (SIMMEL, 1983, p. 23).

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Partindo desta ótica, a autoridade pode ser descrita enquanto poder legítimo, embora a

autoridade seja associada com posições ou papéis sociais. E para tratar os conflitos nascido da

sociedade, o Estado, enquanto detentor do monopólio da força legítima utiliza-se do Poder

Judiciário. E o juiz, como operador do direito, deve decidir os litígios porque o sistema social

não suportaria a perpetuação conflitual (MORAIS e, SPENGLER, 2012).

Nesse aspecto, no âmbito jurídico o conflito pode ser entendido como uma disputa em

relação a um bem determinado, algo com valor determinado, valor este não apenas

mensurável em termos patrimoniais, mais também quanto ao valor afetivo, como bem da vida,

isto é, quanto aos aspectos emocionais, pois em sua maioria os conflitos são gerados por eles,

em especial, na área de família. (CACHAPUZ, 2011)

E um instrumento, utilizado no ordenamento jurídico desde o ano de 2010, por

recomendação do Conselho Nacional de Justiça através da Resolução nº 125/2010, é a

mediação que é apresentada como um meio hábil para a pacificação de conflitos na área de

família.

Pois, a mediação permite o tratamento do conflito6 pelos próprios sujeitos conflituosos,

que por intermédio do mediador, constroem a solução de seu conflito, isto é, não há uma

decisão imposta por um terceiro, como, por exemplo, aquela proveniente do magistrado.

Deste modo, a mediação atua diferentemente da solução apresentada pelo Poder

Judiciário, por quais os conflitos são analisados sob a ótica legalista e os sujeitos apenas com

enfoque adversarial, isto é, autor e réu, apresentam seus problemas para que um outro com

base na lei decida, neste caso, o juiz.

A mediação de conflitos, em especial, a familiar se apresenta como uma forma

inovadora de abordagem jurídica e também como alternativa ao sistema tradicional do

judiciário adotado para tratar os conflitos, pois o fato de que o Judiciário tem como função a

decisão de conflitos, isso não significa a sua eliminação principalmente quando os conflitos

envolvem as denominadas relações continuadas, como as de família.

6 Tratamento do conflito: adota-se esta expressão em vez de resolução de conflito justamente por entender que os

conflitos sociais não são solucionados pelo Judiciário, no sentido de resolvê-los, suprimi-los, elucidá-los ou

esclarecê-los. Salienta-se que, a supressão dos conflitos é relativamente rara. Assim como relativamente rara é a

plena resolução dos conflitos, isto é, a eliminação das causas, das tensões, dos contrastes que os originaram

(quase por definição, um conflito social não pode ser ‘resolvido‘) (OLIVEIRA, 2012, p.60).

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Para tanto, a mediação de conflitos surgiu inicialmente como uma alternativa à

jurisdição, em que os próprios sujeitos, por meio de técnicas desenvolvidas pelo mediador

(um profissional com formação interdisciplinar sujeito a uma formação desenvolvida pelos

Tribunais brasileiros, sob as diretrizes do CNJ), propiciaram aos sujeitos mediados a

pacificação de seu conflito, ora pela pactuação de acordo ou ora pela retomada de diálogos

entre as partes, o que é bastante valioso quando se trata de relações familiares rompidas ou em

processo de rompimento.

Os conflitos familiares possuem peculiaridades próprias, diferenciando-se, portanto, de

outros tipos de conflitos como já apresentado. Neste sentido, considerando tais peculiaridades,

faz-se necessário uma forma diferenciada para a resolução destes conflitos, sendo que a

mediação familiar judicial se apresenta como mais uma via a serviço dos sujeitos como meio

mais apropriado para o tratamento de conflitos em família em decorrência de seu caráter

interdisciplinar (BARBOSA, 2015).

Ressalta-se, que a mediação foi inserida no Novo Código de Processo Civil, que

entrará em vigor a partir de 17 de março de 2016, trazendo a mediação em vários de seus

dispositivos legais, demonstrando que este instrumento tem potencial para lidar com as

controvérsias entre os sujeitos não apenas no começo da abordagem do conflito, mas há

qualquer momento, isto é, mesmo quando as partes já estiverem litigando num processo junto

ao Poder Judiciário poderão suspendê-lo e se submeterem à mediação, buscando uma saída

conjunta.

A Lei nº 13.140 de 26 de junho de 2015 institui a mediação como meio de solução de

controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública, o

que reforça a Política Judiciária Nacional para o tratamento adequado de conflitos, pela via da

autocomposição.7

Após a inserção da mediação tanto no Novo Código de Processo Civil - NCPC quanto

na Lei nº 13.140/2015 este instrumento passará a ser realizado tanto no âmbito do judiciário

quanto extrajudicial, isto é, nos centros de mediação existentes no Brasil, ligados, em sua

maioria a instituições de ensino superior.

7 Autocomposição: é uma das modalidades utilizadas na solução de conflitos, quando prevalece a vontade das

partes sobre a sujeição de uma vontade à de outra, ou de ambas à vontade de um terceiro. Alcança-se pela

arbitragem, conciliação, ou ainda, pela mediação. (GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário compacto

jurídico. 9ª ed. São Paulo: Rideel, 2006)

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Portanto, a mediação já faz parte ordenamento jurídico brasileiro, através do NCPC e da

Lei nº 13.140/2015, podendo ser utilizada judicialmente ou extrajudicialmente. Assim como,

antes, durante ou depois da formalização de um processo junto ao Poder judiciário.

Tendo como objetivo o restabelecimento da comunicação, entre as partes submetidas

a este instrumento, assim como a prevenção e o tratamento dos conflitos, em especial, os

familiares. Pois, a mediação familiar foca na resolução do conflito a partir da autocomposição

dos sujeitos, em que estes através do diálogo facilitado e intermediado pelos (as) mediadores

(as) buscam o consenso por meio da comunicação estabelecida durante as sessões de

mediações, nas quais se submetem.

7. CONCLUSÃO

O objetivo do presente artigo foi apresentar a representação social de família no

judiciário brasileiro, sob o enfoque da legislação atual, que não define um tipo específico de

família na Constituição Federal de 1988, mais sim como sendo a base da sociedade e

admitindo formas variadas, como a família monoparental e a união de pessoas sem a

sacralização do casamento.

Ressaltou-se, que a ausência de um rol taxativo de formas familiares na CF/88 não retira

a possibilidade de reconhecimento de novos arranjos familiares, pois o que deve prevalecer é

a dignidade da pessoa humana, enquanto sujeito de direito.

A teoria de representação social de Durkheim foi utilizada para demonstrar que os

conceitos advindos das individualidades de uma dada sociedade formam a representação

coletiva, que se materializam em conceitos que podem ser apoderados pelas instituições e

seus sujeitos constituídos.

A própria Constituição Federal brasileira de 1988 não trouxe mais um modelo de

família único, e sim adota um novo modelo fundado na igualdade entre os seus membros,

sendo considerada plural e democrática (FARIAS e, ROSENVALD, 2014). O pluralismo

refere-se à variedade de membros que a constituem, fundada numa democracia onde todos os

seus membros são iguais em direitos e deveres. Daí, conclui-se que os conflitos advindos das

relações familiares devem ser tratados pelo Estado de forma diferenciada, pois são conflitos

que possuem diversas peculiaridades por conta de questões emocionais dos sujeitos, em

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especial, aqueles provenientes da ruptura conjugal, como os conflitos decorrentes de

separação ou divórcio.

Para tanto, apresentou-se a mediação como tema a ser pesquisado, a partir de sua

importância como meio de resolução de conflitos no âmbito familiar, pois se constitui num

instrumento desburocratizado e consensual de retomada de diálogo entre as partes

conflituosas, em que os próprios envolvidos por meio de um processo dialético de ajuste,

buscam a pacificação do conflito.

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