138
A ins da C talação d Comunid do COMP dade de Dese Dissertaç graduaçã requisito Mestre em Orien Y PERJ e a Itambi (It envolvime ção aprese ão em Ge parcial p m Geograf ntador: Aug Yana dos a des-re- taboraí, entos e S Disser entada ao eografia d para obte fia. gusto Cesa Santos -territoria Rio de J Sustentab tação de M Programa da PUC-R nção do ar Pinheiro Rio d Abr Moysés alização aneiro): bilidades Mestrado a de Pós- Rio como grau de o da Silva de Janeiro ril de 2010

Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

  • Upload
    lamdung

  • View
    231

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

A insda C

talação dComunid

do COMPdade de

Dese

Dissertaçgraduaçãrequisito Mestre em

Orien

Y

PERJ e aItambi (Itenvolvime

ção apreseão em Ge

parcial pm Geograf

ntador: Aug

Yana dos

a des-re-taboraí, entos e S

Disser

entada ao eografia dpara obtefia.

gusto Cesa

Santos

-territoriaRio de J

Sustentab

rtação de M

Programada PUC-Rnção do

ar Pinheiro

Rio dAbr

Moysés

alização aneiro):

bilidades

Mestrado

a de Pós-Rio como

grau de

o da Silva

de Janeiro ril de 2010

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 2: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

Page 3: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

A insda C

talação dComunid

do COMPdade de

Dese

DissertPós-Grcomo título dComiss

P

PDep

Vice-D

Y

PERJ e aItambi (Itenvolvime

tação aprraduação requisito

de Mestre são Exami

Prof. Augu

Departam

Profª Denispartamento

ProfªDepart

Prof. RIn

Decana de

Rio d

Yana dos

a des-re-taboraí, entos e S

resentada em Geogparcial paem Geogrinadora ab

usto Césa

mento de G

se Pini Roo de Serviç

ª Gisela Atamento de

Rogério Hnstituto de

Pós-GradCiências

e Janeiro,

Santos

-territoriaRio de J

Sustentab

ao proggrafia da ara a obterafia. Aprovbaixo assin

ar PinheiroO

Geografia –

osalem da ço Social –

quino Piree Geografi

Haesbaert Geociênc

Profª Mônuação do C

s Sociais –

30 de abr

Moysés

alização aneiro):

bilidades

grama de PUC-Rio

enção do vada pela

nada.

o da Silva Orientador – PUC-Rio

Fonseca – PUC-Rio

es do Rio ia – UFRJ

da Costa cias – UFF

nica Herz Centro de

– PUC-Rio

ril de 2010

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 4: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização do autor, do orientador e da universidade.

Yana dos Santos Moysés

Graduada em Oceanografia pela Faculdade de Oceanografia da UERJ. Atualmente mestranda em Geografia da PUC- Rio, Linha de Pesquisa: Espaço e Sustentabilidades. Integrante do Grupo de Pesquisa Gestão Territorial no Estado do Rio de Janeiro. Atuando, principalmente, nos temas: desenvolvimento socioespacial, sustentabilidade, planejamento e gestão do território.

Ficha Catalográfica

CDD: 910

Moysés, Yana dos Santos A instalação do COMPERJ e a des-re-territorialização da Comunidade de Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro): desenvolvimentos e sustentabilidades / Yana dos Santos Moysés ; orientador: Augusto Cesar Pinheiro da Silva. – 2010. 135 f. : il.(color.) ; 30 cm Dissertação (Mestrado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Geografia, 2010. Inclui bibliografia 1. Geografia – Teses. 2. Comunidade de Itambi. 3. COMPERJ. 4. APA de Guapimirim. 4. Desenvolvimento(s). 5. Sustentabilidade(s). I. Silva, Augusto Cesar Pinheiro da II. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Geografia. III. Título.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 5: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Às mulheres e aos homens da Comunidade de Itambi.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 6: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Agradecimentos

Essa dissertação contou com a contribuição e participação de várias pessoas e instituições, sem as quais, certamente, essa pesquisa não seria possível.

Antes de tudo, agradeço ao meu orientador Augusto César Pinheiro da Silva, pelas suas críticas, sugestões, pelos seus “puxões de orelha” e, principalmente, pela sua efetiva presença do início ao fim na realização dessa pesquisa.

Ao Departamento de Geografia da PUC-Rio, seus professores e funcionários, em especial, ao professor Rogério de Oliveira, sempre disposto a ajudar, e à Márcia, pela atenção, disponibilidade e por apresentar uma competência inigualável.

E à CAPES pelo importante auxílio financeiro concebido.

Agradeço à professora Denise Fonseca, tanto pela sua participação e contribuições nas bancas de qualificação e defesa, quanto pelas valiosas discussões em sala de aula.

À professora Gisela Aquino Pires do Rio, pelas importantes contribuições na banca de qualificação que certamente me fizeram amadurecer academicamente e novamente pela sua atenção e disponibilidade para participação na banca de defesa.

Ao professor Rogério Haesbaert, pela gentileza, atenção e disponibilidade para participação na banca de defesa e pelas ricas discussões em sala de aula que contribuíram significativamente na elaboração desse trabalho.

Ao professor e amigo Gian Mario Giuliani, pela sua participação na banca de qualificação e pela sua constante disposição mesmo distante fisicamente.

Aos colegas que também realizam pesquisas na região, em especial, a Bárbara e David do IFCS-UFRJ, ao Guilherme e Graziella da UFF, pelas discussões, saídas de campo e suas importantes contribuições na construção desse trabalho.

Aos colegas do GeTERJ, em especial ao Marcelo e a professora Rejane, pelas discussões semanais, contribuindo tanto para o enriquecimento desse trabalho quanto para o meu amadurecimento acadêmico.

Agradeço aos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e aos chefes da APA de Guapimirim e da ESEC da Guanabara, em especial ao Breno Herrera, pela atenção, gentileza e disponibilidade, contribuindo significativamente na elaboração dessa pesquisa.

Sobretudo, um justo agradecimento à Comunidade de Itambi pela confiança e disponibilidade, sem a qual, obviamente, esse trabalho seria impossível.

Por fim, um agradecimento especial à minha família, minha mãe Cristina, meu pai Zich e meus irmãos Thiago e Raphael pelo apoio físico e emocional e por ser o meu eterno porto seguro.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 7: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

À minha tia Angélica, sempre presente e disposta a ajudar, sendo várias pessoas em uma só.

Ao meu avô Manoel pela torcida, apoio e amor.

À minha querida comadre - irmã Letícia pela imensa contribuição nesse trabalho, pela sua leitura, sugestões, paciência... e, principalmente, pela sua amizade.

Ao meu querido Daniel por ter participado efetivamente de todas as etapas dessa dissertação, saídas de campo, leituras, sugestões e, principalmente, pela sua paciência, seu carinho e amor.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 8: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Resumo

Moysés, Yana dos Santos; Silva, Augusto Cesar Pinheiro da. A instalação do COMPERJ e a des-re-territorialização da Comunidade de Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro: Desenvolvimentos e Sustentabilidades. Rio de Janeiro, 2010, 135p. Dissertação de Mestrado. Departamento de Geografia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

A Comunidade de Itambi, localizada no Município de Itaboraí, na Região

Metropolitana do Rio de Janeiro, será des-re-territorializada dos mangues da

APA de Guapimirim para um Conjunto Habitacional, ao mesmo tempo em que o

Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro se instala no município. As

contradições entre o modelo de desenvolvimento socioespacial via COMPERJ

com as potencialidades locais são nítidas, divergindo das concepções de

desenvolvimento(s) e sustentabilidade(s) defendidas nessa pesquisa, as quais são

entendidas de acordo com as perspectivas particulares dos territórios, que emanam

cultura e história específicas e, portanto, outras racionalidades ligadas a ideia de

qualidade de vida. Os gestores envolvidos nessa política de desenvolvimento

baseiam-se em uma concepção parcial da produtividade, entendida como

capacidade dos investimentos de aumentar a renda financeira em curto prazo,

mesmo que diminuam a produtividade de energia, capital natural e desmantelem

as diversidades culturais. Defende-se dessa forma que as potencialidades

específicas locais devam ser potencializadas com a participação da Comunidade

de Itambi nos processos decisórios nos projetos de desenvolvimento do território

em que esses estão inseridos. Procura-se fortalecer então a luta da Comunidade de

Itambi e de outras populações do Brasil por mais direitos e liberdades. Esse

trabalho tenta contribuir dessa forma com a luta pela efetiva justiça social, para a

diminuição das desigualdades, e para o reconhecimento da diversidade territorial.

Palavras-chave Comunidade de Itambi, COMPERJ, APA de Guapimirim,

desenvolvimento(s), sustentabilidade(s).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 9: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Abstract

Moysés, Yana dos Santos; Silva, Augusto Cesar Pinheiro da (Advisor). The installation of COMPERJ and the de-re-territorialization of Community of Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro): Developments end Sustainabilities. Rio de Janeiro, 2010, 135p. MSc. Dissertation - Departamento de Geografia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

The Community of Itambi, located in the municipality of Itaboraí,

Metropolitan Region of Rio de Janeiro, will be de-re-territorialized the

mangroves of the Environmental Protection Area of Guapimirim for a Housing,

while the Petrochemical Complex of Rio de Janeiro (COMPERJ) is installed in

the municipality. The contradictions between the model of social and spatial

development via COMPERJ with local potential are sharp, diverging from the

conceptions of development (s) and sustainability (s) defended in this research,

which are construed in accordance with the particular perspectives of the

territories that emanate history and culture specific and, therefore, other rationales

linked the idea of quality of life. The managers involved in policy development

based on a concept of partial productivity, understood as the ability of investments

to increase the financial income in the short term, even if they reduce the

productivity of energy, natural capital and dismantle the cultural diversities. It is

argued that how the specific potential sites to be leveraged with the involvement

of the Community of Itambi in decision making in development projects in the

territory in which they are inserted. It seeks to strengthen the fight then the

Community of Itambi and other peoples in Brazil for more rights and freedoms.

This paper attempts to contribute so effectively to the fight for social justice, to

reduce inequalities, and the recognition of territorial diversity.

Keywords

Community of Itambi; COMPERJ; Environmental Protection Area of Guapimirim ; development(s); sustainability(s).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 10: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Sumário

1. Introdução 13

2. Territorialidades, Desenvolvimentos e Sustentabilidades: algumas reflexões acerca de suas funcionalidades como ferramentas políticas 19

2.1. A busca da(s) territorialidade(s) para desenvolvimento(s) com maior autonomia 21

2.2. Do desenvolvimento uno aos desenvolvimentos múltiplos 29 2.3. Do desenvolvimento sustentável para a(s) sustentabilidade(s) 36 2.4. Desenvolvimentos e sustentabilidades democraticamente mais justos 41

3. O COMPERJ: modelo de desenvolvimento hegemônico e contradições no espaço local 46

3.1. Os gestores e seus discursos no Estado do Rio de Janeiro 47 3.2. Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ): visão da empresa 51 3.3. Projetos de modernização: uma análise crítica do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro 53 3.4. As contradições do modelo de desenvolvimento via COMPERJ 71

4. A Comunidade de Itambi: potencialidades e perspectivas de um território em transmutação 75

4.1. A Comunidade de Itambi 77 4.2. A saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim:

algumas considerações 82 4.3. As múltiplas dimensões do processo de saída vivenciado pela Comunidade de Itambi 94 4.4. As expectativas da reterritorialização da Comunidade de Itambi no conjunto habitacional 104 4.5. Resistências, alternativas e a busca por outras racionalidades 109

5. Considerações finais 115 6. Referências bibliográficas 120 Anexos 129

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 11: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Lista de figuras

Figura 1 – Localização do COMPERJ e sua proximidade da APA de Guapimirim 51 Figura 2 – O COMPERJ e o Arco Metropolitano no contexto da integração regional 52 Figura 3 – Área de Proteção Ambiental de Guapimirim (área verde) – Reserva de Manguezal 59 Figura 4 – Vista aérea da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim 60 Figura 5 – Representação esquemática do distrito de Itambi e da área do Manguezal de Itambi 77 Figura 6 – Rua de terra na entrada da vila (à direita, as casas e ao fundo, um campo de futebol) 78 Figura 7 – Foto realizada durante a entrevista com A. O. Casa do A.O. localizada à direita. À esquerda, o barco utilizado para a coleta atracado 79 Figura 8 – Estabelecimento comercial (no fundo da figura) e alguns moradores sentados em sua frente debaixo de uma grande mangueira 80 Figura 9 – Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 83 Figura 10 – Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de esgoto e drenagem (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 84 Figura 11 – Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro 85 Figura 12 – Imagem de satélite na qual se visualiza o local onde será realizada a recuperação ambiental e que está sendo construído o centro comunitário (área da Bacia, Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 85 Figura 13 – Maquete do Conjunto Habitacional Nova Itambi 86 Figura 14 – Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro 87 Figura 15 – Crianças brincando no campo de futebol de Itambi 96 Figura 16 – Varais de roupa na comunidade 96 Figura 17 – Rua transversal a entrada da rua da comunidade, na qual já pode ser observado canos da CEDAE e a direita da foto as obras já iniciadas do Centro Comunitário 97 Figura 18 – Creche do Conjunto Habitacional já finalizada 97 Figura 19 – Posto de saúde do Conjunto Habitacional já finalizado 98

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 12: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Figura 20 – BR-493: uma via do Arco Metropolitano 98 Figura 21 – Quintal da moradora J.B. À direita, a construção do Centro Comunitário e parte do abacateiro cortado 99

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 13: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Renascer da própria força, própria luz e fé, memória

Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós, história Somos a semente, ato, mente e voz, magia

Não tenha medo, meu menino povo, memória Tudo principia na própria pessoa, beleza

(Gonzaguinha, Redescobrir)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 14: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

1. Introdução

Iniciei o trabalho com a Comunidade de Itambi1 no início de 2007 para a

elaboração do projeto final do curso de graduação em Oceanografia da UERJ.

Naquela época, já me angustiavam as distâncias existentes entre as ciências

naturais e as ciências sociais e, da mesma forma, entre os conhecimentos

científico-acadêmicos e os conhecimentos ditos tradicionais. Dessa maneira,

finalizei, no começo de 2008, a monografia intitulada A importância da

articulação dos conhecimentos científicos e tradicionais para a conservação dos

manguezais da APA de Guapimirim2.

Desde o começo dessa pesquisa, a instalação do Complexo Petroquímico do

Estado do Rio de Janeiro (COMPERJ) já era foco de discussão tanto em Itaboraí

como em outros municípios do estado do Rio de Janeiro. Os caranguejeiros de

Itambi, em alguns dos seus relatos, se preocupavam com a entrada dos

investimentos do complexo na região; entretanto, apenas no final do ano de 2007

escutei rumores sobre o desmonte da comunidade “em prol do desenvolvimento”.

Vale ressaltar que naquele momento os moradores por mim entrevistados na

localidade evitavam falar a respeito dessa provável mudança, e a comunidade,

nitidamente, silenciava sobre o assunto. No mesmo período, tive o conhecimento

de um parecer técnico (a ser avaliado mais adiante) que informava que, de fato, a

Comunidade de Itambi seria retirada do seu território atual.

Naquela mesma época, o COMPERJ já era associado (através da divulgação

no site da Petrobrás, em folhetins, pelo Estado, mídia e, inclusive, por ONGs que

atuam no local) às concepções de desenvolvimento e sustentabilidade. A soma

dessas questões que se verificavam no território em questão tornou inevitável o

                                                            1 Reconhece-se a existência de uma literatura vasta sobre o conceito de comunidade (ANDERSON, 2008 (1991); CASTELLS, 2000; BAUMAN, 2003;). Entretanto, esse trabalho não discutirá esse termo conceitualmente. A opção pela utilização da denominação Comunidade de Itambi se deu, devido a essa população de caranguejeiros de Itambi já ser assim referenciada em outros trabalhos (ALBUQUERQUE, A.L., 2002; BOTELHO, 2003; MOYSÉS, 2008; PANDEFF, 2009; HERRERA, no prelo), pelo filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, por documentos (PLANO DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001; GIULIANI et al., 2005), em grupos de pesquisa (“Biodiversidade, Áreas Protegidas e Inclusão Social”-LATTES, CNPq, UFRJ; GeTERJ- PUC-RJ) e comumente reconhecida entre os membros dos conselhos gestores do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense (MMACF) e da APA de Guapimirim e ESEC da Guanabara (CONAPAGUAPI), dentro dos quais possuem representantes da comunidade. 2 Monografia do curso de Oceanografia da Faculdade de Oceanografia da UERJ. Defendida em janeiro de 2008 e orientada pelo sociólogo Dr. Gian Mario Giuliani IFCS/UFRJ.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 15: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

14

prosseguimento da pesquisa e o despertar do meu interesse em realizar esta

dissertação.

A necessidade de uma visão integradora (cultural, política, econômica,

ambiental) e não-dicotômica na relação cultura-natureza foi fundamental para que

essa dissertação fosse realizada no campo da Geografia por sua tendência atual de

integração holística da análise espacial. E em especial, a opção pelo Programa de

Pós-Graduação de Geografia da PUC-Rio pela sua proposta pautada na

interdisciplinaridade no tratamento dos processos ecológicos, sociais e culturais

que ocorrem no espaço, tornou possível a realização desse trabalho.

Dessa maneira, a dissertação analisa o atual processo de instalação do

COMPERJ e a des-re-territorialização (a ser discutida nesse trabalho a partir de

Haesbaert (2004)) da Comunidade de Itambi, localizada no município de Itaboraí,

região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro. Esta comunidade pertence à

Área Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim, o que já mostra a contradição

dos projetos de gestão dos territórios na localidade.

A realidade aqui estudada vem passando por rápidas transformações e

durante a pesquisa observou-se significativas mudanças nas relações comunitárias

de Itambi, o que influenciou em grande medida a metodologia desse trabalho.

A dissertação foi organizada em três capítulos. O primeiro aborda os

principais referenciais teórico-conceituais utilizados nessa pesquisa. O segundo

discute as contradições do modelo de desenvolvimento via COMPERJ, enfatizado

o momento geohistórico vivenciado com a instalação desse pólo petroquímico. E

no terceiro capítulo, busca-se um olhar especificamente na Comunidade de

Itambi, compreendendo como essa vem sendo afetada pelas políticas públicas do

município de Itaboraí. Apesar dessa divisão, a prática e a teoria foram realizadas

conjuntamente no desenvolvimento dessa pesquisa, e os trabalhos de campo,

entrevistas, o levantamento e leitura de documentos, foram realizados em

momentos intercalados com o levantamento e a leitura teórico-conceitual. O olhar

sobre o real e suas visíveis transformações durante a pesquisa fez necessária a

busca freqüente por referenciais teórico-conceituais que servissem não apenas de

instrumentos para a compreensão dessa realidade, mas que participassem e

interviessem nesse real.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 16: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

15

Houve dificuldades, nos primeiros contatos, no estabelecimento de laços de

confiança com a comunidade, devido a experiências anteriores com outros

pesquisadores, principalmente as desenvolvidas por ONGs. Segundo os próprios

moradores, certas informações da comunidade foram obtidas sem o devido

reconhecimento das pessoas entrevistadas e retorno de benefícios aos moradores.

Contudo, ao iniciarmos a presente pesquisa o contato e a familiarização com a

comunidade já estavam consolidados.

Durante toda a pesquisa, foram realizadas visitas a comunidade, de modo

que o sentimento de confiança foi mantido. As observações diretas e a

continuidade do contato a partir de conversas informais foram privilegiadas na

realização desse trabalho. Desta forma, percebeu-se uma maior abertura dos

moradores, facilitando a compreensão da comunidade como todo.

A partir da compreensão das observações e conversas, foram realizadas

algumas entrevistas gravadas semi-estruturadas (ANEXO 1). As perguntas foram

curtas, pois se privilegiou a fala dos próprios moradores. A escolha pelas pessoas

deveu-se, obviamente, pelos moradores que se disponibilizaram a participar.

Também se tentou entrevistar diferentes faixas etárias, buscando uma

uniformidade numérica entre homens e mulheres. Por último, procurou-se

entrevistar tanto pessoas mais ligadas às lideranças comunitárias quanto aquelas

mais distantes delas. É importante ressaltar, contudo, que por ser uma comunidade

pequena houve a percepção da baixa discrepância entre as posições dos

moradores, que foram muito semelhantes em suas opiniões e interpretações e

falas. Em quase todas as entrevistas gravadas, outros comunitários também

participavam conjuntamente, entretanto foram apenas transcritos os trechos das

pessoas que haviam sido informadas sobre a gravação e me autorizado quanto a

isso. Porém, mesmo estando autorizada a utilizar tais entrevistas, busquei

preservar o máximo possível as identidades dessas pessoas. O último contato com

a comunidade para a realização desse trabalho se deu em fevereiro do corrente ano

(2010).

No segundo semestre de 2009, foram realizadas entrevistas também com

alguns agentes de gestão envolvidos nas políticas públicas do município de

Itaboraí que afetam diretamente a Comunidade de Itambi. Também foram

realizadas entrevistas semi-estruturadas com poucas perguntas curtas, de maneira

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 17: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

16

que também se privilegiou a fala desses gestores e o direcionamento para outras

questões (ANEXO 2). Durante o processo de investigação houve ainda a

participação em uma reunião dos membros do Conselho Gestor da APA de

Guapimirim e da Estação Ecológica (ESEC) da Guanabara - CONAPAGUAPI.

Foram utilizadas ainda algumas respostas do chefe da APA Guapimirim via

e-mail. Também a partir de poucas questões (ANEXO 3), o gestor me enviou suas

respostas em forma de texto. Além disso, tanto o arquiteto e urbanista do

Conjunto Habitacional do PAC como o chefe da APA de Guapimirim me

enviaram diversos documentos via e-mail referentes ao projeto do PAC, o que

inclui dados sobre o Conjunto Habitacional.

Nessa pesquisa também foram utilizados diversos documentos oficiais: o

RIMA do COMPERJ; o Parecer Técnico 53/2007; a Ação Civil Pública do MPF

n°1.30.003.000055/2006-07; a Manifestação técnica sobre os impactos ambientais

potenciais decorrentes da implantação do COMPERJ nas unidades de conservação

federais da região do IBAMA e ICMBio; as atas das audiências públicas do

Empreendimento Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro e da BR 493, entre

outros.

Houve também o levantamento e a leitura de diversos trabalhos realizados

na área de estudo, além do contato permanente com outros pesquisadores que

também realizam trabalhos na região, principalmente do IFCS-UFRJ, PosGeo –

UFF e das Ciências Ambientais – UFF, e a participação no Seminário

Internacional Direito à Cidade nos Municípios do CONLESTE e os objetivos de

Desenvolvimento do Milênio, realizado pela ONU-HABITAT, Petrobras, UFF e

COLESTE que contribuíram para o enriquecimento dos dados e compreensões

acerca desta dissertação.

Como dito anteriormente, o COMPERJ insere-se no território da

comunidade em questão trazendo consigo concepções de desenvolvimento e

sustentabilidade no seu discurso. Nessas concepções, as contradições entre as

potencialidades locais e o discurso modernizante do complexo são nítidas e

devem ser analisadas para que projetos de desenvolvimento não continuem a ser

implementados de maneira aleatória em relação às transformações socioespaciais

dos grupos territorializados nos espaços. Um olhar atento sobre a realidade da

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 18: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

17

Comunidade de Itambi torna-se necessário para que as populações de diversas

localidades possam ser compreendidas como parte inerente desse

desenvolvimento sob uma perspectiva da “diferença e singularidade” que projetos

modernizadores devem considerar para que transformem as realidades locais de

acordo com os interesses de quem vive, trabalha e concebe os territórios (SILVA,

2007).

Busca-se assim compreender a realidade estudada à luz do conceito de

território, na medida em que esse conceito servirá tanto como instrumento para

interpretação dessa realidade quanto como instrumento de uso, transformando o

real que ele mesmo reconhece (HAESBAERT, 2008).

No capítulo 1 será realizada uma análise teórico-conceitual fundamentada

na leitura crítico-reflexiva da bibliografia referente aos conceitos/noções de

território, territorialidade, desenvolvimento e sustentabilidade. As discussões

passarão ainda pelas reflexões acerca das concepções de identidade territorial e

autonomia.

Buscar-se-á, nesse capítulo, identificar os diferentes caminhos e visões

acerca dos conceitos / noções de desenvolvimento e sustentabilidade, suas

representações e discursos hegemônicos especificando quais deles são

privilegiados no âmbito da intelectualidade brasileira recente. Entende-se assim o

caráter reflexivo da concepção de sustentabilidades para os desenvolvimentos de

acordo com as perspectivas particulares dos territórios, que emanam cultura e

história específicas e, portanto, outras racionalidades ligadas à ideia de qualidade

de vida.

No capítulo 2, o COMPERJ será apresentado do ponto de vista da empresa,

a partir de fontes dadas pela própria estrutura gestora do complexo, como o

Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), o site, folhetins e documentos oficiais

da Petrobras, as ONGs locais e a mídia. Em seguida, averiguar-se-ão as

concepções de desenvolvimento e sustentabilidade que os gestores do COMPERJ

se baseiam, na medida em que se compreenderão as ações e discursos voltados

para a instalação do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro no

território em questão. Dessa maneira, será feita uma análise crítico-reflexiva em

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 19: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

18

relação ao pólo, em que se abordarão as contradições existentes do projeto de

desenvolvimento via COMPERJ com as realidades de gestão local.

Por fim, no capítulo 3 será realizada uma caracterização da comunidade e

sua relação com o seu lugar. As potencialidades e perspectivas serão identificadas

e analisadas frente ao possível deslocamento do grupo social para outra realidade

e à entrada do COMPERJ no município de Itaboraí. Serão abordados os motivos

dessa mudança, a opinião dos moradores de como vem sendo o processo (a saída

deles dos mangues e a entrada do COMPERJ no município, a des-re-

territorialização de uma maneira geral) e a transparência das políticas públicas do

município que os envolvem diretamente. Procura-se assim alertar para as

contradições e riscos embutidos nas políticas feitas por outros grupos que não

sejam os diretamente envolvidos nestas políticas, e se essas de fato contribuirão

para uma melhor qualidade de vida e mais justiça social para essa população.

A preocupação central é então conceber, a partir das experiências desses

sujeitos, outras racionalidades para projetos de gestão na localidade, a partir de

estratégias que visem à justiça social e qualidade de vida, concepção que também

deve ser entendida pela vivência, ideais e especificidade da própria comunidade.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 20: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

 

2. Territorialidades, Desenvolvimentos e Sustentabilidades: algumas reflexões acerca de suas funcionalidades como ferramentas políticas

A comunidade de caranguejeiros, localizada em Itambi, distrito do

município de Itaboraí, na região metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ), na

parte leste da Baía de Guanabara, e sob jurisdição da Área de Proteção Ambiental

de Guapimirim, será des-re-territorializada3 devido à entrada do maior

empreendimento da Petrobras4 na RMRJ, o Complexo Petroquímico do Estado do

Rio de Janeiro (COMPERJ).

A população residente atualmente em Itambi ocupa casas nos mangues da

APA de Guapimirim e será transferida de seu lugar de vida, sobrevivência e

convivência para prédios de um conjunto habitacional que está sendo construído

na rodovia BR-493, no estado, que será um dos segmentos do futuro Arco

Metropolitano do Rio de Janeiro.

Ao mesmo tempo, o complexo traz consigo, pelo seu Relatório de Impactos

Ambientais (RIMA), concepções acerca de desenvolvimento, modernização e

sustentabilidade que são difundidas pelo site da Petrobras, em seus folhetins

informativos, Estado, mídia e por Organizações Não-Governamentais (ONGs) que

atuam no local. São visíveis, perante uma análise cuidadosa destes meios de

informação, as contradições entre as potencialidades locais e o discurso do

COMPERJ, de modo que se torna necessária uma reflexão crítica sobre tal

condição a fim de que projetos de desenvolvimento passem a considerar de fato as

possíveis transformações socioespaciais das populações territorializadas nos

espaços visados pela atividade econômica em questão.

O território estudado abarca múltiplas dimensões (cultural, política,

econômica e as da natureza), o que torna necessária uma visão integradora e não-

                                                            3 Esse trabalho utiliza des-re-territorialização hifenizado baseado em Rogério Haesbaert, já que a partir do autor, entende-se que toda desterritorialização está acompanhada de reterritorialização(ões). 4 A Petrobras (corporação majoritária no consórcio empresarial criado para viabilizar o empreendimento) apresenta a obra em seu site, em diversos meios de comunicação e pelo próprio RIMA do COMPERJ como o maior investimento individual de sua história, cerca de oito bilhões de dólares (Disponível em < http://www.comperj.com.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 21: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

20

dicotômica que evite a separação entre cultura-natureza e material-imaterial. A

busca pela compreensão da realidade estudada à luz do conceito de território

significa que o conceito não apenas servirá de instrumento para interpretação e

significação de uma realidade “em devir”, como o próprio é componente dessa

realidade. Esse é também instrumento de uso, já que intervém nessa realidade “em

processo”, participando e modificando, ou seja, transformando o “real”, que ele

mesmo “re-conhece” (HAESBAERT, 2008).

Nesse sentido, compreende-se aqui o território como o lugar de luta,

resistência e busca por melhores condições de vida, estas entendidas como

qualidade de vida, justiça social e desenvolvimento(s)5. Entende-se que a

territorialidade (a ser discutida mais adiante) possa ser potencializada como

estratégica política na busca desse(s) desenvolvimento(s) com mais autonomia

dos sujeitos envolvidos.

Acredita-se que o olhar sobre a territorialidade da Comunidade de Itambi

seja necessário para que outras populações do Brasil também possam ser

entendidas como singulares, ou seja, com culturas, interesses, necessidades e

desejos diferentes e particulares, mesmo estando inseridas, em maior ou menor

grau, em um contexto nacional e global. Dessa maneira, espera-se contribuir para

que os projetos de desenvolvimento transformem as realidades locais de acordo

com os interesses das populações diretamente envolvidas.

Ainda neste capítulo trabalharemos também com a compreensão das

representações e discursos hegemônicos dos conceitos/noções de

desenvolvimento e sustentabilidade. A partir dela, pode-se expor as bases das

concepções de desenvolvimento e sustentabilidade sobre as quais os gestores do

COMPERJ se apóiam e suas contradições com o território, o que será mais

amplamente discutido no capítulo 2.

Como um contraponto, serão analisadas reflexões acadêmicas que prezam

pela necessidade de pensarmos as sustentabilidades para os desenvolvimentos

pautadas nas particularidades do território, ou seja, em outras racionalidades não-

hegemônicas que são correntemente ignoradas.

                                                            5 Explicar-se-á mais detalhadamente o que esse trabalho entende pelo conceito/noção de desenvolvimento no decorrer deste capítulo.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 22: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

21

Neste sentido, as discussões centrais do presente capítulo passarão pelas

reflexões acerca dos conceitos/noções de território/territorialidade, identidade

territorial, autonomia, desenvolvimento local e sustentabilidade(s), todos eles

entendidos como instrumentos de intervenção no real através da organização e

luta pela cidadania e participação na gestão do diferente e do desigual (SAQUET,

2008).

2.1. A Busca da(s) territorialidade(s) para desenvolvimento(s) com maior autonomia

A abordagem territorial aqui proposta enfatiza as relações de poder que

constituem o território. Estas, baseando-se em Haesbaert (no prelo, p.09-10),

abrangem desde a natureza estatal-administrativa e político-econômica até a mais

simbólica, o que inclui a própria identidade territorial da Comunidade de Itambi

entendida aqui também como instrumento de poder.

Entende-se assim que o território não envolve unicamente o tradicional

poder político. O mesmo autor (2007) compreende que o território diz respeito

tanto ao poder na dimensão mais explícita, de dominação, até a mais implícita, de

apropriação e, baseado em Lefèbvre6, entende que os processos de dominação

estão vinculados a dinâmicas mais concretas, “funcionais”, de valor de troca,

enquanto que os de apropriação seriam os relacionados aos processos mais

simbólicos, do “vivido”, ao valor de uso. O território, dessa maneira, estaria

sempre dentro de um continuum, entre a dimensão de dominância “funcional”, em

um extremo, e de dominância simbólica, em outro extremo, dois pólos que, por

sua vez, não necessariamente se opõem.

Entretanto, como se observa no caso da Comunidade de Itambi, o “território

funcional e simbólico” de interesses de certos grupos ao imporem a des-re-

territorialização dessa comunidade, invade “as funções” da comunidade,

refazendo e interferindo, dessa maneira, na própria re-configuração das

construções identitárias desse grupo, ou seja, interfere no “vivido” dessa

comunidade.

                                                            6 Haesbaert (2007, p.21) afirma que embora Lefèbvre se refira sempre a espaço e não a território, ele não trata o espaço de maneira genérica e abstrata, e sim como um espaço-processo. Assim, o espaço, enquanto concebido, percebido e vivido, é sempre um espaço socialmente construído.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 23: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

22

Seguindo esse raciocínio, Rua (2007) também baseado em Lefèbvre,

compreende então que o espaço (feito território), ao mesmo tempo em que traz

simbolismos do cotidiano, do vivido, do particular, pode também transmitir

mensagens de poder e de dominação hegemônica, “expressões do geral, do

concebido que, muitas vezes, são aceitas/impostas como única alternativa”

(p.162). Nesse sentido, o COMPERJ traz consigo esse discurso, visto como uma

“possibilidade única”, até então “nunca conquistada”, e “desejada por todos”, de

“desenvolvimento”, “progresso”, “modernização” na região metropolitana do Rio

de Janeiro, em especial no município de Itaboraí. Tal ideário passa a ser divulgado

pelo Estado e pelos interesses de alguns grupos em seus diversos meios de

comunicação, e a força com que esse discurso é imposto e circulado sem

questionamentos e alternativas faz com que grande parte da população local, do

estado do Rio de Janeiro e do Brasil o aceitem e contribuam para a sua

proliferação.

Então, como Saquet (2007) evidencia, os mediadores da reprodução do

poder e do controle do/no espaço desses grupos hegemônicos, são “a formação de

redes de circulação e comunicação que ligam o singular ao universal e vice-versa,

interferindo dessa forma diretamente nas territorialidades dos diferentes

indivíduos e classes sociais” (p.129). Isto pode levar mesmo ao “fim” de certos

grupos e territorialidades e à perda dos seus principais referências simbólicos,

impossibilitando a própria sobrevivência dos indivíduos.

Em alguns relatos, não apenas dos moradores da Comunidade de Itambi,

como também dos gestores das unidades de conservação envolvidos no projeto de

modernização, Itambi está fadada a desaparecer. A perda do território significa

assim o fim do próprio grupo com a desvinculação direta da funcionalidade com a

identidade.

Haesbaert (2007, p.23), baseado em Milton Santos (2000) e Jean Gottman,

diferencia o território para os “atores hegemônicos” do território para os “atores

hegemonizados”. Nessa distinção, o primeiro trata o território como recurso,

como acumulação e lucro em nosso sistema de produção, ou seja, “um meio para

obter um fim”, estando esses atores, muitas vezes, desvinculados com o território.

Já o segundo compreende o território como abrigo, proteção, ou seja, “um fim em

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 24: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

23

si mesmo”. Enquanto o primeiro pode abstrair-se da identificação com o território,

para o segundo, a perda do território pode significar “desaparecer”.

Contudo, o chefe da APA de Guapimirim e o chefe da Estação Ecológica da

Guanabara vão mais além: eles acreditam que com a instalação do COMPERJ no

local, mesmo que as pessoas permaneçam em seu território de vida de até então, a

comunidade “desapareceria” da mesma forma, já que seus membros perderiam

seus referenciais simbólicos, seus recursos materiais de sobrevivência e a

afetividade com o território. Ou seja, a Comunidade de Itambi seria forçada, de

qualquer maneira, a se deslocar em um futuro próximo.

Observa-se assim, a partir das interpretações tanto da própria comunidade

como dos gestores das Unidades de Conservação (UCs), que a Comunidade de

Itambi estaria vivenciando uma precarização territorial tanto no sentido simbólico-

cultural como no político-econômico. Isso nos leva diretamente à discussão de

Haesbaert (2004) quando o geógrafo relaciona desterritorialização à exclusão

social. A partir das interpretações dos parágrafos anteriores compreende-se que os

territórios sejam também recursos inerentes à reprodução social e, dessa maneira,

a exclusão social e a efetiva pobreza equivaleriam à exclusão territorial. A partir

daí, a desterritorialização deve ser vista no seu sentido mais forte e mais estrito:

(...) a desterritorialização como exclusão, privação e/ou precarização do território enquanto “recurso” ou “apropriação” (material e simbólica) indispensável à nossa participação efetiva como membros de uma sociedade (HAESBAERT, 2004, p.315).

Dessa maneira, segundo o autor, a desterritorialização em seu aspecto social,

tão pouco enfatizada na discussão de desterritorialização, é a que poderia carregar

melhor essa noção, ou seja, é quando os grupos, de fato, perdem o seu referencial

simbólico, seu lugar de abrigo, proteção e sobrevivência.

Entretanto, sendo justos ao autor, essa desterritorialização nunca é absoluta,

sendo sempre acompanhada de reterritorialização(ões)7. Nesse sentido, a

Comunidade de Itambi vive efetivamente um processo de des-re-territorialização,

                                                            7 Discussão central em seu livro de 2004, O Mito da Desterritorialização, no qual o autor afirma que não estaríamos vivendo uma desterritorialização, como muitos defendiam/defendem, como Virilo e Badie, e sim vivenciando uma multiterritorialidade. A interconexão de territórios-zona, mais tradicionais, com territórios-rede, mais envolvidos pela fluidez e a mobilidade, nos leva, dessa maneira, a expressão da multiterritorialidade vivenciada por diferentes sujeitos, porém mantendo a sua singularidade nos diferentes lugares, assim como afetando diferentemente e desigualmente os diferentes lugares e grupos sociais.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 25: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

24

sendo a análise deste processo necessária para detectar sua precarização territorial,

tanto no sentido da dimensão político-econômica do território quanto da dimensão

simbólico-cultural.

Busca-se nesse trabalho, a partir, principalmente, das falas dos moradores da

comunidade em estudo, compreender o processo de desterritorialização dos

mangues da APA de Guapimirim, analisando tanto conseqüências que já podem

ser visualizadas como o próprio imaginário dessa população no que diz respeito

ao futuro do grupo. Ou seja, busca-se entender esse processo desde o sentimento

da perda gradual já concretamente efetivada de certos referenciais simbólicos (o

abrigo, convivência e afetividade com outros moradores) até a do controle do

território. No capítulo 3, um olhar nas múltiplas dimensões dos processos

econômico-político e simbólico-cultural será realizado mais detalhadamente.

Pode-se assim compreender o medo da desterritorialização como exclusão

social. Entretanto, seguindo com o raciocínio de Haesbaert (2004), é importante

atentar para a compreensão da noção de exclusão. Nas palavras do autor, esta:

(...) deve ser sempre qualificada, adjetivada (...) jamais deve ser vista na perspectiva conservadora que faz uso do termo para legitimar medidas paliativas de “reinserção” social, sem questionar as condições de (in)justiça social, (in)quidade econômica, (falta de) autonomia política e reconhecimento cultural dos grupos sociais nela envolvidos (p.319)

Essa racionalidade sobre a exclusão pode servir de base para discursos e

estratégias de determinados grupos que agem de acordo com interesses próprios

alegando estarem a serviço do “bem comum” de muitos, sem que estes sejam

consultados ou participem das decisões sobre a sua própria existência. A própria

re-territorialização da Comunidade de Itambi dos mangues para um conjunto

habitacional é justificada em alguns documentos de gestores envolvidos na obra

do Programa de Aceleração do Crescimento8 (PAC) e de outros das UCs

envolvidas na política de “bem comum” da comunidade. Entretanto, esse “bem”

para comunidade é questionado nas próprias falas dos moradores da Comunidade                                                             8 Segundo o site do Governo Federal, o PAC além de ser um programa de expansão do crescimento, é considerado um novo conceito de investimento em infra-estrutura, já que aliado a medidas econômicas tem o objetivo de estimular os setores produtivos e, ao mesmo tempo, levar benefícios sociais para todas as regiões do país (Disponível em: <https://www.pac.gov.br/>, Acesso em 15 de abril de 2009). Ver os investimentos do PAC no Estado do Rio de Janeiro: http://www.brasil.gov.br/pac/.arquivos/relatorioRJ_090409.pdf.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 26: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

25

de Itambi que alegam não terem sido consultados, mas apenas comunicados de

sua futura remoção. Alguns moradores argumentam que eles deveriam ter sido

perguntados sobre o que eles pensam sobre o que é o “bem” deles9. Este ponto

será aqui retornado e trabalhado nos capítulos seguintes.

A partir disso, torna-se agora necessário levantar a questão da identidade

territorial, baseando-se na reflexão de Haesbaert (2007a). Para este autor, essa

identidade é uma estratégia de luta e/ou resistência, o que deve ser ampliado pela

visão de Saquet (2007) para quem deve ser destacado o caráter político da

identidade como possibilidade de transformação social.

Como Haesbaert (2007a) nos lembra, a questão não é a discussão da

veracidade ou falsidade de uma construção identitária, mas sim de sua eficácia

política. A identidade é ligada diretamente a ações de natureza política e

paralelamente também se constitui em um recurso por um mínimo de

reconhecimento, “tendo em vista romper com a indiferença e o ‘desconhecimento’

que a massificação (em especial, mas não unicamente, da pobreza) promove”

(HAESBAERT, no prelo, p.4). Seria, dessa maneira, o reconhecimento da

diferença.

Encontrou-se nas falas dos moradores da Comunidade de Itambi a afirmação

e reivindicação de sua identidade, as quais podem aqui ser interpretadas como

estratégias de luta, que incluem a luta pelo próprio território em sua dimensão

material. Haesbaert (2007a), baseado em Lévi-Strauss (1977), afirma que de

algum modo a luta pela afirmação das diferentes identidades tem suas causas e

consequências materiais, ou seja, “é entre aqueles que estão mais destituídos de

seus recursos materiais que aparecem formas as mais rigorosas de apego a

identidades territoriais ou ‘territorialismos’” (HAESBAERT, 2007, p.23).

O mesmo grupo e/ou comunidade pode abrir-se ou fechar-se em diferentes

tempos históricos. A busca pela legitimação de uma identidade mais fechada, ou

mais aberta, é consequência de sua estratégia de luta e resistência, e é aí que a

territorialidade pode ser potencializada na busca por desenvolvimento(s).

                                                            9 Ressalta-se aqui que esse é apenas um dos argumentos para a saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim para o conjunto habitacional. Serão discutidos, mais detalhadamente, os motivos e as justificativas da mudança da comunidade no capítulo 3 dessa dissertação.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 27: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

26

Pode-se perceber também nos relatos dos moradores da Comunidade de

Itambi uma sobrevalorização de recursos simbólico-identitários. Os

caranguejeiros falam sobre a perda da “referência do caranguejo”, sobre o fato de

já estarem acostumados a morar no local (em casas nos mangues), se queixam que

perderão sua tranquilidade, questionam onde plantarão suas árvores, ficarão seus

barcos (que ficam hoje atracados atrás de suas casas), colocarão suas galinhas,

abordam a perda da sombra e do espaço conquistados, alegam que terão que

conviver com pessoas que não estão acostumados, preocupando-se até com o

campeonato de futebol que é realizado uma vez por ano na comunidade. A busca

pela valorização de referenciais simbólicos pela afirmação de certas diferenças

pode constituir de fato a luta pela sua própria sobrevivência, assunto também a ser

tratado no capítulo 3. Da mesma forma, a territorialidade da Comunidade de

Itambi, se potencializada, pode servir de instrumento político para a

transformação social. Tal afirmação se coaduna com a afirmação de Haesbaert

(2007a) para quem a territorialidade tanto pode buscar constituir laços puramente

simbólicos “como levar a ações efetivas na construção ou na defesa e/ou

manutenção material de espaços de identidade” (p.44).

Mesmo que a relevância da identidade se dê pela sua eficácia política e não

propriamente pela sua verdade, no caso da Comunidade de Itambi, a referência a

recortes espaciais reais pode auxiliar, e muito, a eficácia dos discursos identitários

(HAESBAERT, 2007a, p.44).

A territorialidade da Comunidade de Itambi, ou seja, as suas relações sociais

(econômicas, políticas e culturais), atividades diárias e relações com a natureza,

pode ser valorada e utilizada por esse grupo como estratégia político-cultural

(SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009, p.8). Nesse sentido, Dematteis (2008)

distingue territorialidade passiva e ‘negativa’ de territorialidade ativa e ‘positiva’,

a partir das diferentes abordagens dessa concepção por Sack (1986) e Raffestin

(1981, 2007). O primeiro autor a entende como “a tentativa, por um indivíduo ou

grupo, de atingir/afetar, influenciar ou controlar as pessoas, fenômenos e

relacionamentos, pela delimitação e afirmação do controle sobre uma área

geográfica. Esta área será chamada território (...)” (SACK, 1986, p.19). O

segundo, juntamente com outros autores, entende-a como:

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 28: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

27

Conjunto de relações que nasce em um sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo, com vistas à maior conquista possível de autonomia, compatível com os recursos de um sistema (...) conjunto de relações que uma sociedade, e por isso os indivíduos, têm com a exterioridade e com a alteridade para satisfazer os próprios desejos com a ajuda de mediadores, na perspectiva de obter a maior autonomia possível, tendo em conta os recursos de um sistema (DEMATTEIS, 2008, p.34).

Nesse sentido, a primeira partiria de estratégias de controle e normas

associadas, excluindo sujeitos e recursos, e a segunda visaria estabelecer a

construção de estratégias de inclusão a partir “de ações coletivas territorializadas e

territorializantes dos sujeitos locais” (p.35). O autor, porém, ressalta que nem

sempre os objetivos da territorialidade passiva são negativos, já que antes de tudo

é “com a finalidade do bem” que se exerce o controle. Entretanto, com a

transferência da Comunidade de Itambi dos mangues para um conjunto

habitacional, este ‘bem’ é delegado a partir de interesses de determinados grupos,

e não a partir da autonomia e dos interesses das populações locais “com a

finalidade do bem”.

Souza (2001), baseado em Castoriadis (1983), define autonomia,

contrapondo-a a heteronomia. Segundo ele, a autonomia apresenta duas faces:

...a individual (capacidade psicológica e possibilidade material e institucional efetiva de o indivíduo estabelecer fins para a sua existência e persegui-los de modo lúcido, em igualdade de oportunidades com os outros indivíduos da mesma sociedade) e a coletiva (presença de instituições sociais que garantam igualdade efetiva - e não apenas formal - de oportunidades aos indivíduos para a satisfação de suas necessidades e, muito especialmente, para a participação em processos decisórios relevantes na regulação da vida cotidiana) (SOUZA, 2001, p.159).

Assim sendo, a autonomia de cada comunidade pode ser a construção de

outras racionalidades “de baixo para cima”, ou seja, a partir da participação social

inerente aos seus valores culturais e seus interesses, e não como normalmente é,

“de cima para baixo”, com o domínio do mercado e do Estado sobre os povos,

ditando as leis e normas às sociedades (heteronomia). Contudo, como nos lembra

o geógrafo brasileiro, devemos ter em mente que a conquista da autonomia é um

processo e que o diálogo uma vez buscado entre culturas distintas não deve ser

rejeitado. (SOUZA, 2001).

Seguindo esse raciocínio, Souza (2001, p.163-164) acredita que a

territorialidade autônoma seja então a gestão radicalmente democrática do

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 29: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

28

território e a capacidade da defesa do mesmo, incluindo seus simbolismos, em

face de ameaças externas. Assim como o autor, não se defende aqui uma auto-

suficiência da Comunidade de Itambi sob um velho anarquismo, mas sim a

conquista crescente de mais direitos e liberdades para o maior número de pessoas

possíveis. Nesse sentido, compreende-se aqui que a territorialidade seja a

mediação, relação social, prática e cognição em que se acrescenta a necessidade

da qualidade de vida, o que inclui qualidade ambiental, na geração de relações

autônomas (SAQUET, 2007). Dessa maneira, a territorialidade de Itambi inclui

também as concepções de qualidade de vida do grupo que a constitui e as suas

relações com a natureza exterior, as quais também obviamente terão um caráter

singular.

Dessa maneira, a abordagem territorial desse trabalho procura reconhecer o

movimento, contradições, natureza, relações de poder e identidade territorial, os

quais certamente necessitam de organização política, na busca pela autonomia,

para o(s) desenvolvimento(s).

Cada indivíduo, cada família, cada instituição pública ou privada, cada unidade produtiva e de consumo, de vida produzem relações históricas e multiescalares, de poder, territoriais, territorialidades que podem ser potencializadas para um desenvolvimento 10com mais autonomia, que incorpore a distribuição de terras, de capital, as diferenças culturais, a vida em sociedade e em natureza, sem medo, vícios, armadilhas (SAQUET, 2007, p.176).

Nesta citação do autor, o vocábulo ‘desenvolvimento’ foi sublinhado para

que se comece a caracterizar o desenvolvimento desejado neste trabalho.

Acredita-se, como Saquet (2007), que esse processo deva ser identificado

localmente, de acordo com as necessidades dos indivíduos e a autonomia de cada

lugar, sem rejeitar ou desconhecer o outro. O desenvolvimento deve ser sempre

territorial, construído com a participação dos diferentes sujeitos, interesses e

necessidades. A territorialidade da Comunidade de Itambi assim pode ser

potencializada como estratégia de organização e luta na busca pelo seu próprio

desenvolvimento territorial.

Acredita-se que mesmo com as diversas críticas nas últimas três décadas ao

chamado “mito do desenvolvimento”, onde a idéia de desenvolvimento foi

rejeitada como se referisse, unicamente, à hegemonia do crescimento econômico                                                             10 Grifo nosso.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 30: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

29

somada à modernização tecnológica11, é possível re-contextualizarmos o termo

sob uma forma alternativa, a de desenvolvimento socioespacial12, conforme

concebe Souza (2003).

Sob esta reflexão, o COMPERJ insere-se no território da comunidade em

questão trazendo consigo concepções de desenvolvimento e sustentabilidade no

seu discurso. Entretanto, contradições entre as realidades locais e as propostas do

complexo industrial são percebidas, o que torna necessária uma revisitação das

noções de desenvolvimento socioespacial e sustentabilidade.

Nesse momento, analisar-se-á o conceito/noção desenvolvimento e em

seguida o de sustentabilidade, compreendendo o papel de suas representações e

discursos, defendendo-se a busca por modelos de desenvolvimentos e

sustentabilidades diferentes e singulares, alternativos aos impostos até então, nos

diferentes lugares.

2.2. Do desenvolvimento uno ao(s) desenvolvimento(s) múltiplo(s)

Nesse momento merecem destaque as reflexões de Celso Furtado, que

durante toda a sua trajetória de vida intelectual, acadêmica e de gestão preocupou-

se em pensar e “construir” o Brasil em consonância com as diferentes épocas de

sua formação. A busca do/pelo desenvolvimento, salientando-se a plena

participação dos indivíduos nos processos decisórios, sempre esteve presente em

seus escritos, nos quais da mesma maneira sempre afirmava as diversidades e

singularidades existentes nos diferentes lugares do Brasil, os seus “diferentes

Brasis”. Seria injusto então se a discussão aqui proposta não começasse a partir

das concepções do célebre economista brasileiro, já que a pesquisa em curso foi

pensada, desde seu início, a partir das leituras de sua obra. Além disso, acredita-se

e reforça-se a importância do legado do economista para a construção de um

Brasil democraticamente mais justo.

                                                            11 Um dos autores que nega a própria idéia de desenvolvimento, é Porto-Gonçalves (2006), entendendo-a unicamente como nome-síntese da idéia de dominação da natureza e trabalhando com a ideia des-envolver, o que tira o envolvimento (a autonomia de cada povo e cultura). 12 Souza (2003) discute no livro ABC do desenvolvimento urbano o conceito/noção de desenvolvimento de maneira introdutória e didática. O autor afirma que o espaço social foi com freqüência, totalmente ou quase totalmente, esquecido pelos teóricos do desenvolvimento e defende que o desenvolvimento que leve em conta os interesses legítimos de toda uma sociedade, devendo ser socioespacial.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 31: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

30

Furtado (1978) nos lembrava das ambigüidades inerentes à idéia de

desenvolvimento, em que o mesmo conceito / noção é utilizado para processos

históricos diferentes, salientando ainda que o processo de desenvolvimento não

possa existir sem que haja a liberação criadora de um povo. O autor supracitado

acredita que a “modernização” afastou-se das necessidades mais elementares da

população. Dessa maneira, os obstáculos à passagem da simples modernização ao

desenvolvimento cimentam-se na esfera social (FURTADO, 1984).

Em 1962, Furtado nos afirmava que “acima de tudo devemos ter um plano

de desenvolvimento econômico e social à altura de nossas possibilidades e em

consonância com os anseios de nosso povo” (p.32). Naquele momento, o autor já

nos alertava sobre a utilização de modelos de desenvolvimento fechados e pré-

fabricados em outras realidades para as soluções dos nossos problemas.

Acreditava que deveríamos buscar, em nossa realidade, uma política que

orientasse o desenvolvimento do país.

O economista, em 1978, já defendia que, em muitos lugares, o que incluía o

Brasil, o processo de modernização significava ocidentalização, ou seja, o

perecimento dos valores das culturas locais. Na continuidade dessa ideia, Rua

(2007) compreende, a partir de Latouche (1994), que o trinômio modernização-

progresso-desenvolvimento é sinônimo de Ocidentalização, sendo o Ocidente

muito mais uma noção ideológica do que uma noção meramente geográfica. Da

mesma maneira, Celso Furtado acreditava que a civilização industrial poderia ser

lida como “uma crônica do avanço da técnica”, ou seja, todas as formas criativas

seriam subordinadas à racionalidade instrumental (1978, p.78).

O projeto civilizatório do Ocidente, de acordo com Rua (2007), formado

pelo tripé modernização-progresso-desenvolvimento, ao se tornar hegemônico foi

imposto a todos os cantos do globo. “O desenvolvimento passou assim a fazer

parte do próprio imaginário social e os seus discursos pareciam ‘colonizar’ a

realidade” (p.145).

Rua (2007), baseado em Escobar (1995), acredita que o colonialismo e o

desenvolvimento introduziram uma violência moderna engendrada por meio de

representações, tornando ela mesma uma fonte de identidade. E mesmo com as

diversas críticas, a partir dos anos 1980, a essas representações que se tornam

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 32: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

31

dominantes e “colonizam a realidade”, o discurso do mercado e do neoliberalismo

reafirmam a visão do desenvolvimento como modernização (p.145-146). Segundo

Rua (2007), a modernização seria a base concreta da modernidade, tendo como

conceito-gêmeo o progresso13. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a ambos

foi acrescentado o conceito síntese desenvolvimento. Nas palavras do autor:

Evolucionista, como os anteriores, de caráter sempre positivo, como os dois conceitos que o têm acompanhado (progresso e modernização), o desenvolvimento tem se mostrado ainda mais forte ideologicamente. Além do caráter positivo e evolucionista, sintetiza, também, um projeto civilizatório ocidental que coloca como instrumento operativo de um paradigma a ser seguido por todos (RUA, 2007, p.149).

Muitos pós-colonialistas14 trazem a cultura para o centro nos estudos de

desenvolvimento e como Rua (2007) ressalta essa abordagem é importante para

enfatizar outras dimensões além da econômica; a partir dessa racionalidade, essa

pesquisa ao analisar o projeto de desenvolvimento via COMPERJ na RMRJ,

verifica outras dimensões, o que inclui assim os próprios valores da Comunidade

de Itambi, seus recursos simbólicos-identitários e sua relação com a natureza

exterior. Entretanto, não podemos cair no culturalismo e deixarmos o econômico

de lado, vendo a cultura como uma dimensão autônoma, a-histórica.

A partir de uma análise crítica da ocidentalização imposta ao mundo em suas

territorialidades dominantes, percebem-se as histórias de alguns, impostas a todos.

Nessa concepção, ocorre não apenas a repressão do espacial como da

possibilidade de outras temporalidades, de outras trajetórias que sejam diferentes

                                                            13 Segundo Furtado (2000), “as raízes da idéia de progresso podem ser detectadas em três correntes do pensamento europeu que assumem uma visão otimista da história a partir do século XVIII. A primeira delas filia ao Iluminismo, que concebe a história como uma marcha progressiva para o racional. A segunda brota da idéia de acumulação de riqueza, na qual está implícita a opção de um futuro que encerra uma promessa de melhor bem-estar. A terceira, enfim, surge com a concepção de que a expansão geográfica da influência européia significa para os demais povos da Terra, implicitamente considerados ‘retardados’, o acesso a uma forma superior de civilização (p.9). 14 A partir de Sousa Santos (2004), entende-se por pós-colonialismo um conjunto de correntes teóricas e analíticas, com forte implantação nos estudos culturais, presentes hoje em todas as ciências sociais, que dão primazia teórica e política às relações desiguais constituídas historicamente no colonialismo entre os países do Norte e do Sul para explicação e/ou compreensão do mundo contemporâneo. Essa corrente de pensamento acredita que mesmo com o fim do colonialismo enquanto relação política há ainda colonialismo enquanto relação social, enquanto mentalidade e forma de sociabilidade autoritária e discriminatória. Hall (2003) afirma que uma das principais críticas aos pós-colonialistas seria a ausência em seus textos do relacionamento do pós-colonialismo com o capitalismo global. Como exemplo de autores pós-coloniais, destacamos o historiador e crítico literário palestino Edward Said e seu livro O Orientalismo (1978).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 33: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

32

do modelo ocidental europeu. A importância dada à dimensão cultural está

justamente nesse ponto:

(...) colocando-a no plano da econômica, política, simbólica ou ecológica, pretendemos lembrar a importância dessa dimensão para análise do desenvolvimento como um processo imposto a partir de um autodenominado centro mundial (Ocidente/capitalismo) (RUA, 2007, p.183).

Portanto, a busca do/pelo desenvolvimento no território estudado deve assim

levar em conta as características e os modos de vida locais. Dessa maneira, nos

perguntamos: os gestores do COMPERJ consideraram ou estão considerando os

valores das populações que lidam e vivem dos/nos mangues da região?

Entende-se assim, a partir de Souza (1996), que só teria sentido falar em

“desenvolvimento” se esse se distanciasse da conotação teológica, etnocêntrica e

capitalística, assim como da sua idéia-irmã de “progresso”. Desenvolvimento

implica, segundo o autor, uma idéia de valor, um objetivo ou objetivos a serem

alcançados, entretanto, esses fins não significam um “estágio final” ou que exista

um certo paradigma e uma certa trajetória “evolutiva” (p.10).

Não existe, dessa maneira, uma “nova teoria” para o desenvolvimento

territorial da Comunidade de Itambi. Os objetivos almejados por esse grupo

deveriam assim ser buscados a partir do juízo de valor dado pela própria

comunidade, ou seja, a partir dos interesses e das necessidades dessa população

nos seus diferentes tempos históricos. Dessa maneira, só terá sentido falar em

qualidade de vida e justiça social para a Comunidade de Itambi, se essas

concepções também forem construídas de “baixo para cima”, em outras palavras,

se também forem concebidas a partir da própria comunidade. Obviamente, assim,

os próprios moradores da Comunidade de Itambi devem ter voz ativa nas decisões

que afetam e interferem “suas funções” e seu “vivido”.

Dessa forma, não existem outras soluções homogeneizadoras para a

diversidade e complexidade do “real”. O projeto de civilização ocidental

(modernização / desenvolvimento) não pode ser simplesmente substituído por

outras generalizações. Souza Santos (2004), trabalhando com a concepção de

emancipação social15, defende que esta deva ser reinventada, “indo mais além da

teoria crítica produzida no Norte e na práxis social e política que ela subscrevera”                                                             15 Concepção ocidental, como nos alerta Rua (2007).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 34: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

33

(p.6). O autor critica o universalismo e historicismo, enfatizando a possibilidade

de modernidades alternativas. Entretanto ele afirma, tal como Rua (2007), que não

devemos buscar uma teoria geral para emancipação social, ou seja, devemos

pensá-la em sua pluralidade, em emancipações construídas a partir da participação

dos diferentes povos. Assim sendo, a emancipação social da Comunidade de

Itambi só terá sentido se for pensada e buscada a partir da participação dos

próprios moradores da comunidade.

Defende-se, então, tal como Rua (2007), o desenvolvimento local como uma

ação possível, apesar de se reconhecer algumas restrições explicativas /

instrumentais na diversidade e complexidade das realidades locais. É importante

ressaltar aqui que não negligenciamos nenhuma escala, o papel do Estado (o qual

consideramos fundamental em qualquer política, seja local, regional ou nacional)

e as questões de classe social. A intenção não é supervalorizar a escala local que,

por si só, é vazia, mas acreditamos que o ponto de partida deva ser as

compreensões das vivências das pessoas, do cotidiano, do local (embutido de

valores e caracteres globais). Portanto, explicar-se-á melhor o quê esse trabalho

compreende por local.

O local surge de dentro do global como Hall (2003) nos lembra, mas não é

apenas um simulacro deste. Ou seja, a mistura das relações sociais globais com

locais interage e afeta de maneira diferentemente e desigualmente nos/os

diferentes lugares. A referência pode assim ser construída em um lugar em

movimento, mantendo um elemento que é o da singularidade que tem um caráter

único. É a combinação das coisas de uma forma específica em um determinado

lugar, “que interagem com a história acumulada de um lugar e ganham um

elemento a mais na especificidade dessa história” (MASSEY, 2002 [1994],

p.185). A Comunidade de Itambi, então, mesmo não estando desconectada de um

contexto global, nacional, possui singularidades e particularidades em seus modos

de vida, círculo de convivência e relações com a natureza que são facilmente

percebidas e ressaltadas nas falas dos moradores, que sempre enfatizaram “que

suas vidas e seus cotidianos são muito diferentes do que eu, os cariocas e as

pessoas que eu conheço estão acostumados” 16.

                                                            16 Desde o primeiro contato com a Comunidade de Itambi, no início de 2007, os moradores da Comunidade de Itambi sempre fizeram questão de destacar que o ritmo de vida deles era muito

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 35: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

34

Rua (2007), seguindo o mesmo raciocínio de Massey (2002):

(...) defende a abordagem multiescalar/transescalar17 lembrando que ela se realiza não apenas na relação global x local, local x global, mas na relação particularidade (global x local = total x particular) com a singularidade, isto é, o “jogo” desenvolvido no local que identifica (e o torna único em alguns aspectos) (RUA, 2007, p.176).

Outro ponto que esse trabalho procura se atentar quando se refere a

desenvolvimento local é identificar os seus agentes, já que, muitas vezes,

diferentes deles também podem fazer uso desse discurso para reproduzir um

“desenvolvimento hegemônico” que vigora em amplo global. Em outras palavras,

a pesquisa procura assim também identificar quais são os agentes que logram o

“desenvolvimento” no território em que o COMPERJ está sendo instalado e a

partir de quais interesses. De forma que, observam-se contradições nos discursos

proferidos entre os gestores envolvidos no COMPERJ e a Comunidade de Itambi,

bem como os gestores das unidades de conservação envolvidas.

Defende-se, assim como Saquet (2007), que “há uma relação de

complementaridade entre o local e o global sem anular o território” (p.114). As

sociedades produzem território(s) e territorialidades(s) de acordo com suas

normas, regras, crenças, valores, ritos e mitos, com suas atividades cotidianas

(SAQUET, 2007). Dessa maneira, afirma-se novamente que a Comunidade de

Itambi, ao possuir parâmetros diferentes e específicos de desenvolvimento,

consequentemente, deveria também participar na construção do seu próprio

desenvolvimento.

O conceito/noção de desenvolvimento precisa assim acentuar a ideia de cada

povo, cada grupo social, os quais devem possuir autonomia suficiente para defini-

lo de acordo com suas necessidades e com suas características culturais (SOUZA,

1996, p.10).

                                                                                                                                                                   diferente dos cariocas e que a relação que eles tinham com a natureza seria muito próxima. O próprio horário de acordar e dormir é definido pelas marés, já que as marés baixas e cheias definem o horário da cata do caranguejo, principal atividade econômica realizada pela comunidade para a sobrevivência. As singularidades e particularidades da Comunidade de Itambi serão amplamente discutidas no capítulo 3. 17 Rua (2007a) entende que as múltiplas territorialidades são vividas em diferentes escalas. “A multiescalaridade estaria relacionada à capacidade de vivenciar várias escalas sincrônica ou diacronicamente. Já a transescalaridade poderia relacionar-se à capacidade de ‘transitar” indiferenciadamente pelas diversas escalas. O primeiro termo poderia estar mais ligado aos indivíduos, socialmente diferenciados, o segundo as empresas (p.276).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 36: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

35

O COMPERJ, desde o início de sua instalação, sempre carregou consigo o

semblante de “desenvolvimento”. Entretanto, as des-re-territorializações das

comunidades que estão na sua área de implantação, como é o caso da Comunidade

de Itambi, assim como a sua proximidade do Mosaico da Mata Atlântica Central

Fluminense (MMACF), principalmente com a APA de Guapimirim, divergem da

concepção de desenvolvimento que defendemos no parágrafo anterior. A

instalação do COMPERJ parece um exemplo das contradições entre os modelos

de desenvolvimento socioespacial. No capítulo seguinte, aprofundar-se-á a análise

da contradição existente entre as realidades locais e o discurso do COMPERJ,

para que possamos compreender as diversas faces desse processo.

Concorda-se então novamente com Rua (2007) que afirma que se deve

deixar que os indivíduos de diferentes lugares decidam as formas de vivenciar as

suas territorialidades e assim o seu(s) desenvolvimento(s), ou seja, seus

parâmetros de justiça social e qualidade de vida, nos quais as relações com a

natureza também seriam especificas. Neste momento, fala-se aqui então de

sustentabilidade(s), termo que vem sendo muito utilizado nas Ciências Sociais da

atualidade e que não deixa de ser criticado por ser considerado por muitos como

apenas mais um qualitativo adicionado à noção hegemônica de desenvolvimento.

Igualmente, a partir de Rua (2007), acredita-se que a sustentabilidade aparece

como a evidência de uma ação possível assim como as múltiplas vivências

correspondem a modelos particulares de desenvolvimentos; essas correspondem,

da mesma forma, a modelos particulares de sustentabilidades.

Entretanto, o discurso ambiental pode também ser apropriado para evocar

um ambiente único e, dessa maneira, todos juntos deveriam defendê-lo em uma

só política. Certamente, contudo, a política a ser validada seria referente a

interesses de um grupo impostos como ‘a melhor para todos’. Novamente, o

pensamento único, agora de um ambiente único, na prática, mais uma vez, nos

leva ao ambiente dos negócios (ACSELRAD, 2009).

Observam-se, entretanto, diferentes usos e apropriações do conceito de

sustentabilidade. Ao se discutir criticamente o discurso de sustentabilidade que o

COMPERJ possui, torna-se necessário, nesse momento do trabalho, compreender,

mesmo que brevemente, a história, agentes e atores envolvidos na formulação do

conceito/noção de sustentabilidade. Tal abordagem é concebida, prioritariamente,

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 37: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

36

sob o viés da lógica mercantil e empresarial dado o que se observa do debate

ambiental a partir dos anos de 1990 (PORTO-GONÇALVES, 2006). A partir

desse debate pode-se apontar para outras racionalidades e estratégicas que visem,

principalmente, a justiça social e a qualidade de vida que também deverão ser

específicas nos diferentes povos e culturas, questões que vêm sendo esquecidas e

substituídas pelo avassalador poder da busca da eficiência econômica.

2.3. Do desenvolvimento sustentável para a(s) sustentabilidade(s)

Para a compreensão de um conceito de sustentabilidade(s) que abrigue uma

agenda política democraticamente mais justa, a partir de outros valores (éticos,

culturais e ambientais) e outras racionalidades que fogem a eficiência econômica

puramente, entende-se antes de qualquer coisa, a partir da visão de Ascerald

(2009), que o conceito/noção sustentabilidade ainda está relacionado,

exclusivamente, à lógica das práticas, “articulando-se a efeitos desejados, a

funções e práticas que o discurso pretende tornar realidade objetiva” (p.45).

A apropriação do termo é um processo de legitimação/ deslegitimação. De

acordo com Acselrad (1999; 2009), são diversos discursos em disputa, distintas

representações e valores associados à noção de sustentabilidade na busca de sua

expressão mais legítima. Essa suposta indefinição em torno da concepção de

sustentabilidade sugere que ainda não haja uma hegemonia estabelecida entre os

diferentes discursos. Contudo, é evidente que o discurso econômico até o presente

momento foi o que melhor se apropriou da noção de sustentabilidade

(ASCELRAD, 1999). A questão ideológica deve estar dessa maneira no cerne da

discussão de sustentabilidade, já que se percebe claramente que sustentabilidade

(ou desenvolvimento sustentável) constitui uma poderosa ferramenta política nos

dias de hoje, perceptivelmente, utilizado por diversas empresas atualmente,

constituindo-se em um importante slogan da Petrobras e um dos principais

discursos inseridos na implementação do COMPERJ. São perceptíveis os

impactos sócio-ambientais do COMPERJ no território de sua instalação, contudo

o semblante de desenvolvimento sustentável está presente nos documentos

oficiais do empreendimento, em seu site e em seus diversos meios de divulgação,

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 38: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

37

ancorado principalmente por um Corredor Ecológico a ser criado em Itaboraí18 e

pela Agenda 21 COMPERJ19. Contudo pela opinião de Afonso Sobrinho

(representante da Associação de Pescadores da Praia de São Gabriel em Itaoca,

São Gonçalo) “a Agenda 21 do COMPERJ é uma forma que a empresa Petrobrás

encontrou de legitimar o seu empreendimento” (BANDEIRA DE MENEZES,

2009, p.27).

Em 1992, Furtado afirmava que a civilização criada pela Revolução

Industrial, na qual uma minoria dispõe dos recursos não-renováveis sem se

preocupar com as gerações futuras, levaria a grandes calamidades. A principal

tarefa para o novo século que se aproximava seria o estabelecimento de novas

prioridades para uma ação política que apontasse para uma nova concepção de

desenvolvimento, este posto ao alcance de todos os povos e capaz de preservar o

                                                            18 De acordo com o site do COMPERJ o Corredor Ecológico tem como objetivo “recuperar a flora nativa para conectar o manguezal à Mata Atlântica da região do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. Para isso, serão plantados quatro milhões de mudas de árvores, além de ser criado um berçário florestal na Fazenda Viveiros, localizada em Itaboraí, com capacidade de produção anual de 300 mil mudas de espécies da Mata Atlântica. Esse viveiro estará disponível para visitas técnicas das escolas da região. A Petrobras conta com vários parceiros nessa empreitada: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por intermédio da Fundação Johanna Döbereiner, desenhou o projeto conceitual do Corredor. A OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Innatus capacitou cerca de 400 pessoas da comunidade em cursos semestrais de práticas de silvicultura, além de artesanato. Já a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) vai elaborar projetos para a recuperação das áreas degradadas” (Disponível em: <http://www.comperj.com.br/CorredorEcologico.aspx.>, Acesso em 2 de fevereiro de 2010). 19 Novamente pelo site do COMPERJ: “A Agenda 21 é um plano de ação resultante da Conferência Rio 92. Criada consensualmente com a contribuição de governos e sociedade civil de 179 países, pode ser adotada de forma global, nacional e local em todas as áreas nas quais a ação humana representa algum tipo de impacto ao meio ambiente. É seguindo os princípios desse planejamento que a Petrobras se relaciona com a sociedade dos 15 municípios da área de influência do Complexo Petroquímico, construindo conjuntamente com ela planos locais de desenvolvimento sustentável. A Agenda 21 estimula o exercício da cidadania, a mobilização social e a formação de parcerias entre os diversos setores da sociedade para o alcance da sustentabilidade social, ambiental e econômica” (Disponível em: <http://www.comperj.com.br/Agenda_21.aspx>, Acesso em 2 de fevereiro de 2010). Entretanto, segundo Bandeira de Menezes (2009) “o sistema de Agenda 21 apresenta uma clara disputa de interesses, a começar pela divisão dos debates por setores. No 1º setor estão os membros de órgãos públicos, o 2º setor engloba empresários, industriais e comerciantes, no 3º setor participam representantes de ONGs, sindicatos, associações de classe e fundações, enquanto o 4º setor é o da representação dos movimentos sociais, de membros da sociedade civil organizada e de associações de moradores. Através de licitações o poder público selecionou ONGs executoras dos Fóruns de Agenda 21 para cada setor. Foram vencedoras o Instituto Ipanema (1º. setor); o ISER (2º setor); a Roda Viva (3º setor) e a ASA (4º setor). O sistema de Agenda 21 prevê Fóruns Municipais de caráter deliberativo para elaborar planos de desenvolvimento locais. Nestes são eleitos quatro delegados (um de cada setor) que representarão os municípios no Fórum Regional da Agenda 21. Desta maneira se forja a representatividade da sociedade civil no âmbito das decisões da agenda. O problema vai além da pseudoparidade, pois também passa pelo próprio entendimento da categoria “comunidade” como um todo homogêneo”(p.26-27). 

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 39: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

38

equilíbrio ecológico. De acordo com autor, o principal desafio que se colocava

então no século XXI era:

(...) nada menos que mudar o curso da civilização, deslocar o seu eixo da lógica dos meios a serviço da acumulação, num certo horizonte de tempo, para uma lógica dos fins em função do bem-estar social, do exercício da liberdade e da cooperação entre os povos (FURTADO, 1992, p.75-76).

Em outras palavras, Celso Furtado já nos alertava que a grande utopia, o

devir, o projeto do nosso século, seria então a busca pela sustentabilidade. O

economista, em 1992 ligava claramente a concepção de desenvolvimento à de

sustentabilidade, pensado a partir da nossa realidade, satisfazendo as necessidades

de nosso povo e, dessa forma, pela ação criativa dos homens e mulheres de nosso

país, afirmando que deveríamos reconhecer/buscar/assumir a nossa própria

identidade (FURTADO, 1992).

Entretanto, os rumos no processo de conceituação de sustentabilidade ou

desenvolvimento sustentável, principalmente nas duas últimas duas décadas, não

parecem seguir exatamente a utopia desejada por Furtado. Desde a Conferência

das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em

1972, a questão da sustentabilidade vem sendo pautada em diferentes conteúdos

(FONSECA, 2005). A partir dos anos 1980, a discussão em torno do tema de

sustentabilidade vem se tornando cada vez mais presente. Em 1987, a Comissão

Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento gera como documento final o

Relatório Brundtland, o qual define desenvolvimento sustentável como o

“desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a

capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” 20.

A questão ambiental tornou-se pauta internacional de discussão nos anos

1990. A queda do muro de Berlim (1989) e o colapso da URSS contribuíram para

o enfraquecimento do Estado, o alavanque das organizações não-governamentais21

                                                            20 WWF BRASIL (online). Disponível em: < http://www.wwf.org.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010. 21 Chamo atenção para a precisão neoliberal da expressão não-governamental que Porto-Gonçalves (2006) discute. Primeiramente, a expansão da expressão ONGs se deu em um momento em que se tentava relacionar tudo que era vinculado ao Estado como negativo. Somado ainda a um discurso de que os países (pobres) não possuem dinheiro suficiente para se desenvolverem e cuidarem do meio ambiente, e de que seus governos são por si só corruptos. Dessa maneira, o Banco Mundial e outras instituições multilaterais financiam e estimulam as organizações não-governamentais a “substituírem” e fazerem o papel do Estado (PORTO-GONÇALVES, 2006).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 40: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

39

e, principalmente, para o fortalecimento da ideologia liberal (PORTO-

GONÇALVES, 2006).

Nesse contexto ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), na qual o princípio de sustentabilidade

começa ser concebido como um discurso científico e político (GUIMARÃES,

1997; MARQUARDT, 2006; PORTO-GONÇALVES, 2006) internacionalmente,

ganhando a sua expressão mais legitima de desenvolvimento sustentável, que

começou a aparecer nos documentos preparatórios e a ser inserida nas agendas

políticas de diversos países.

Segundo Guimarães (1997), desde a Conferência do Rio (1992) a percepção

predominante é de que os problemas do meio ambiente estão vinculados aos

problemas do desenvolvimento. Entretanto, os principais atores promotores do

desenvolvimento sustentável são basicamente os que constituem a base social do

modelo dominante atual. Dessa maneira, a lógica pouco se modificou e,

consequentemente, tampouco os fundamentos econômicos do processo produtivo:

capital, trabalho e recursos naturais. Dessa maneira, não é de se estranhar que o

Banco Mundial tem sido o principal gestor financeiro de estratégia de

desenvolvimento sustentável e o financiador da Agenda 21 (GUIMARÃES,

1997).

Como Acselrad (1999) nos lembra, se as mesmas forças hegemônicas no

projeto desenvolvimentista (Estado e empresariado) incorporam a crítica

à insustentabilidade do modelo de desenvolvimento constituinte, certamente seus

discursos estarão presentes na própria ideia/noção/conceito de sustentabilidade.

Segundo Fonseca (2005), naquele período, definia-se o conceito de

desenvolvimento sustentável:

(...) o termo desenvolvimento significava a capacidade dos países de produzir mais, o que equivale dizer, que a sua primeira parte estava ligada ao campo da economia. A palavra sustentável, naquele momento, se referia às idéias de preservação, conservação e proteção ambiental. Desta maneira o termo funcionava como um adjetivo do substantivo de desenvolvimento (FONSECA, 2005, p.4) 22.

Instalou-se dessa maneira a primeira grande contradição do conceito de

desenvolvimento sustentável. A autora supracitada compreende que os valores da

                                                            22 Grifos da autora Fonseca (2005).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 41: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

40

economia e natureza são por si só incompatíveis e antagônicos, uma tensão

essencial, dessa maneira, se estabeleceria desde então (FONSECA, 2005).

Segundo Porto-Gonçalves (2006), essa contradição é vista de forma ainda mais

cristalina quando relacionada ao conceito de território. O meio ambiente

não é apenas um objeto de troca, não é apenas o lugar da produção, mas também

o lugar da vivência, da convivência e da solidariedade. Esse é o mesmo lugar

onde, no processo de produção, ficam os rejeitos (fumaça, poluição, lixo...)

(PORTO-GONÇALVES, 2006, p.301).

Dessa maneira, a proximidade do COMPERJ com o Mosaico da Mata

Atlântica Central Fluminense, principalmente com a APA de Guapimirim, a des-

re-territorialização das comunidades locais, como é o caso da Comunidade de

Itambi, e as possíveis conseqüências ambientais do empreendimento que podem

tornar inviáveis as atividades de subsistência das populações locais (pesca, cata de

caranguejo, siri...) se contradizem com o discurso de desenvolvimento sustentável

envolvido na implementação do complexo.

Furtado (1984) nos lembra, criticamente, que o pensamento baseado em uma

racionalidade econômica (técnico-produtiva) não leva em conta os custos sociais e

ambientais, gerando a repartição desigual de ônus e bônus entre as classes e

grupos sociais (inclusive dentro do mesmo território), gerando, como

conseqüência, a desertificação cultural e humana.

Analogicamente ao pensamento do autor supracitado, já podemos perceber

os primeiros reflexos da instalação do COMPERJ na transformação do território

em questão no que diz respeito à repartição desses custos. Em um olhar inicial,

dentre as primeiras vítimas desse “desenvolvimento” inclui-se a Comunidade de

Itambi, perceptivelmente destinada a compartilhar os custos sociais e ambientais,

ou seja, os ônus, podendo até perder as bases de sua principal fonte de renda,

referência e de segurança e com perspectiva reduzida de inserção nessa nova

lógica territorial. Em vários depoimentos os catadores ressaltam a importância da

permanência da possibilidade da cata do caranguejo para seus filhos, eles

argumentam que mesmo se seus filhos optarem por outra profissão, se eles

precisarem poderão ter a opção da cata para a sobrevivência. Na fala de um dos

caranguejeiros: “(...) poder deixar isso para eles (...) porque isso eles sabem se

precisarem, deixar uma segurança”

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 42: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

41

Fonseca (2005) acredita que para que o desenvolvimento sustentável seja

uma relação de congruência devemos buscar outros valores para desenvolvimento,

sustentabilidade e cultura, re-conceituando, dessa maneira, a discussão sobre

desenvolvimento sustentável a partir do resgate dos valores éticos e culturais.

Certamente esse trabalho possui anseios e objetivos comuns com os da autora na

busca por outras racionalidades e por um agir ético, e acredita-se que a economia

deva estar a serviço (um meio e não um fim) da integridade ambiental e equidade

social. Conforme os ideais propostos até aqui, as realidades são múltiplas e dessa

forma a ferramenta política da sustentabilidade deve assim ser pensada em sua

multiplicidade23. Nesse sentido, busca-se aqui um esforço para pensarmos

sustentabilidade(s) no plural (RUA, 2007) fugindo, dessa maneira, das armadilhas

ideológicas do pensamento único.

2.4. Desenvolvimentos e sustentabilidades democraticamente mais justos

Guimarães (1997) entende que os problemas ocasionados pela desigualdade

social e degradação ambiental não podem ser definidos como problemas

individuais, já que constituem, de fato, problemas sociais. O autor acredita ser

impossível adquirirmos signos de sustentabilidade sem que seja resolvida a

imensa desigualdade no acesso e distribuição dos recursos naturais, econômicos e

políticos, intra e entre nações. A partir disso, o autor enumera algumas dimensões

de sustentabilidades que devem ser aqui destacadas: planetária, ecológica,

ambiental, demográfica, cultural, social, política e institucional (GUIMARÃES,

1997).

Da mesma forma, Saquet (2007), baseado em Magnaghi (2000) compreende

que a sustentabilidade deve ser pensada para além da proteção da natureza, em

que o território, a sustentabilidade política, econômica, cultural e ambiental

devem também ser incorporados no seu raciocínio. “Degradar o território significa

degradar o ambiente e ‘vice-versa’, sendo que esse ‘vice-versa’ é que tem

centralidade” (p.116).

                                                            23 Nesse ponto, divergimos de Fonseca (2005), apesar de possuímos ideais comuns, utilizamos ferramentas conceituais diferentes, já que a autora defende a utilização do conceito de desenvolvimento sustentável, entendido nesse trabalho como um conceito já impregnado de ideologia neoliberal.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 43: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

42

Leff (2001) trabalha com o princípio de incomensurabilidade para nos dizer

da impossibilidade da redução dos processos ambientais a valores do mercado, ou

seja, de se atribuir preços às externalidades ambientais, e acrescenta que “as

influências culturais, sociais e institucionais na valorização das externalidades não

coincidem com nenhum balanço contábil de custo-benefício, nem é possível

atribuir taxas de desconto para atualizar preferências e valorizações futuras”

(LEFF, 2001, p.70). Ainda segundo este autor, o processo fundado na

racionalidade econômica e no direito privado não só ignora as forças ecológicas

de sustentabilidade e de vida do planeta, que é o suporte de todo sistema

produtivo, como também transforma e destrói os valores humanos, culturais e

sociais (ibidem, 2001).

Pelos argumentos expostos até então, não estaria o COMPERJ fundado

ainda numa racionalidade econômica ignorando forças ecológicas de

sustentabilidade, tais como áreas de preservação permanente, e destruindo valores

culturais e sociais? No capítulo seguinte será discutido mais detalhadamente essa

questão.

Ainda Leff nos remete aos movimentos de resistência existentes que se

colocam em oposição à apropriação capitalista da natureza e da cultura,

levantando a questão da justiça ambiental ao acreditar que não existem normas

nem da economia nem da ecologia para equacioná-la. Dessa maneira, esse autor

compartilha ideias como as de Acselrad e Leroy (1999), que indicam que novos

atores sociais devem fazer parte da condução de ações políticas, participando

assim da tomada de decisões para a construção de outras racionalidades24 e de

sustentabilidades democraticamente mais justas.

Para isso, os autores mencionados anteriormente, baseados nos princípios da

equidade social e diversidade cultural, corroboram com a ideia de que devem ser

construídos desenvolvimentos alternativos com mais justiça social e qualidade de

vida. Contudo, a própria ideia de qualidade de vida não pode ser vista como única

aos diferentes povos e culturas. Observa-se nesse trabalho, nas diferentes falas dos

                                                            24 Enrique Leff trabalha com a ideia de racionalidade ambiental. Segundo o autor, a partir da perspectiva dessa nova racionalidade, “os objetivos de equidade e sustentabilidade implicam abolir o domínio do mercado e do Estado sobre a autonomia dos povos”. Dessa maneira, criaria condições para a “apropriação dos potenciais ecológicos” de cada uma das regiões de acordo com os valores culturais e interesses de cada comunidade (LEFF, 2001, p.77).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 44: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

43

diferentes grupos sociais (gestores do PAC, gestores das UCs envolvidas,

moradores da Comunidade de Itambi), nos diversos documentos analisados e na

mídia, diferentes opiniões e concepções de qualidade de vida. Entretanto, percebe-

se, em entrevistas e outros materiais analisados na pesquisa, que algumas dessas

concepções são impostas como se fossem inquestionáveis, ou seja, concebíveis,

aceitas e almejadas da mesma maneira por todos os sujeitos. No capítulo 3

analisar-se-á o que a Comunidade de Itambi compreende por qualidade de vida,

suas reivindicações e, consequentemente, contradições com as políticas que são

implementadas para o benefício dessa comunidade.

Mesmo que até o presente momento, as resistências e a busca por

territorialidades alternativas que vão contra as des-re-territorializações impostas

pelos grupos dominantes, tenham sido quase sempre silenciadas pela força, elas

apresentam momentos de viva atividade:

(...) Há sempre uma relação dialética entre os processos globais de reestruturação do capitalismo com as resistências de nível local que, quase sempre derrotadas até o presente momento, têm antagonizado os modelos ocidentais de desenvolvimento. Essas resistências se dão nas nesgas do vivido das práticas espaciais cotidianas em oposição ao processo brutal e transescalar das transformações (desenvolvimento) criadoras de renovadas representações (RUA, 2007, p.162).

Dessa maneira, busca-se, tal como Siqueira (2007), encontrar, através de

valores éticos, a construção de conceito de sustentabilidade(s) que valorize a

diversidade e a pluralidade. O ethos cultural global baseado em uma racionalidade

econômico-política global reprodutor de um conceito teórico de sustentabilidade

desenraizado e desubstancializado não pode servir de inspiração nesse processo de

re-conceitualização.

Esse trabalho então buscará os valores éticos da Comunidade de Itambi no

ethos local, na esfera da sustentabilidade local, envolvendo dessa maneira seus

valores culturais, ambientais e religiosos, construídos na escala local do território

e que eticamente deixaram suas raízes identitárias (SIQUEIRA, 2007).

Acredita-se assim, tal como Furtado (2007), que o fator político é a esfera

mais nobre das atividades criativas e que devemos tomar gosto pelo exercício da

imaginação para assim darmos continuidade à construção do Brasil. Assim sendo,

pensamos como Rua (2002) para quem o lugar é o ponto de partida para modelos

de desenvolvimento menos desiguais e excludentes e, dessa maneira, a partir dele

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 45: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

44

é que se devem buscar as sustentabilidades, valorizando as tradições das

populações locais ao invés de supervalorizar os interesses internacionais e

nacionais (SILVA, 2006). Como salienta Siqueira (2007), “a força do ethos local

é, sem dúvida, um paradigma de sustentabilidade para a formação do ethos

global” (SIQUEIRA, 2007, p.20).

A construção de um espaço multidimensional, feito território, percebido

como político e pleno de relações de poder/saber dentro de um continuum de

apropriação e/ou dominação e socialmente mais justo necessita, assim, de

desenvolvimentos autênticos com sustentabilidades específicas, autônomas,

“portanto participativas inequívocas das transformações sociais” (RUA, 2007,

p.172).

Concorda-se, então, com Acselrad (2009) para quem o caráter de uma

política de desenvolvimento e sustentabilidade se trata, de fato, de escolhas.

Saquet e Briskievicz (2009) ratificam que dependendo do caráter do projeto de

desenvolvimento, se preservará ou não os traços identitários e simbólicos de cada

território. Portanto, defende-se a busca de escolhas éticas e políticas que

confrontam essa visão do pensamento único, ambiente único em que devemos

economizar recursos. Segue-se então com alguns questionamentos de Acselrad

(2009):

(...) com a realização de um grande investimento infraestrutural, quais riscos devem ser priorizados? O risco de descontinuar os planos de um modelo de integração com os capitais internacionais ou o risco de desestruturar as bases materiais de existência das populações locais (p.34)?

Analogicamente, identificamos essas questões com a realidade estudada.

Que escolhas vêm sendo priorizadas com a entrada do COMPERJ no território

estudado? Quais são os discursos? Quais são os interesses privilegiados? De quem

e para quem? Quais são as contradições? O que está sendo desmantelado e o que

está sendo construído? Quais são os sujeitos envolvidos? Questões que

serão retomadas, analisadas e discutidas nos capítulos seguintes, para que assim

possamos compreender também as resistências, as alternativas, as estratégias de

luta e sobrevivência a partir de outras racionalidades.

Ainda neste trabalho serão observadas outras racionalidades, o que inclui a

própria ideia de qualidade de vida a partir da própria Comunidade de Itambi, ou

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 46: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

45

seja, a partir de seus referenciais simbólicos, interesses e relação com a natureza,

salientando assim a importância desses indivíduos nos processos decisórios na

transformação do território em que eles estão inseridos, procurando fortalecer a

luta dessa comunidade por mais direitos e liberdades.

Contudo, antes de qualquer coisa, é necessário compreender o contexto

histórico-geográfico da realidade estudada, quais são as forças e os interesses

envolvidos, para que possamos compreendê-la em suas diversas faces. Mais

importante do que qualquer caracterização do território, muitas vezes genérica e

dicotômica, é perceber a sua historicidade, ou seja, o seu contexto histórico-

geográfico, já que os objetivos dos processos de territorialização tanto de

dominação quanto o de apropriação, variam no tempo e no espaço, o que nos

possibilita compreender a multiplicidade de poderes, os múltiplos sujeitos

envolvidos e as múltiplas territorialidades em que estamos mergulhados

(HAESBAERT, 2007).

Compreender assim o processo de des-re-territorialização vivenciado pela

Comunidade de Itambi é entender o contexto multiescalar em que está inserida, o

que envolve forças e interesses específicos. Territorialidades e interesses podem

ser tanto econômicos e/ou políticos e/ou culturais e esses dão/darão as formas e

determinados conteúdos ao território e aos territórios. Essas mesmas forças

determinarão a desterritorialização e reterritorialização da Comunidade de Itambi,

e a possível constituição de novas territorialidades nos mesmos ou diferentes

lugares e períodos históricos (SAQUET, 2007, p.128).

No capítulo seguinte verificar-se-á o contexto histórico-geográfico em que a

Comunidade de Itambi se insere, analisando-se as estratégias de desenvolvimento

privilegiadas entre os gestores do território fluminense, na medida em que se

compreenderão as ações e discursos voltados para a instalação do Complexo

Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro no território em questão. Assim sendo,

se verificarão os diversos atores, agentes, sujeitos e interesses, disputas,

resistências e contradições que também se estabelecem no território. Somente

assim poder-se-á compreender a dinâmica por qual passa hoje a Comunidade de

Itambi e suas estratégias de luta por mais direitos e liberdades.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 47: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

3 O COMPERJ: modelo de desenvolvimento hegemônico e contradições no espaço local

No capítulo anterior, observou-se que parte da Academia já se encontra, em

grande medida, posicionada criticamente contra a redução do conceito de

desenvolvimento às concepções de crescimento econômico e modernização

tecnológica, simplificações típicas das chamadas teorias da modernização e do

crescimento que tiveram seus apogeus na década de 1960. Essas críticas não vêm

somente de intelectuais identificados com as chamadas teorias da dependência e

do imperialismo como Celso Furtado, mas tornaram-se também cada vez mais

aceitas entre setores não necessariamente identificados de maneira ideológica com

“a esquerda”25.

Exemplos disso são as ideias de que a erradicação da pobreza não depende

apenas das altas taxas de crescimento econômico e do progresso da técnica, e que

o principal objetivo de uma política de desenvolvimento seria de fato a satisfação

das necessidades básicas (SOUZA, 1996).

Dessa maneira, questionou-se, no capítulo anterior, o modelo de

desenvolvimento eurocêntrico imposto a todos os cantos do globo e que

recentemente ganhou o adjetivo, mundialmente conhecido, “sustentável”.

Defendeu-se, porém, modelos de desenvolvimentos e sustentabilidades

alternativos e singulares nos diferentes lugares, conquistados no(s) território(s) a

partir da autonomia dos diferentes sujeitos.

Entretanto, como Souza (1996) ressalta, mesmo com essas diversas críticas

ao modelo de desenvolvimento “tradicional”, o qual preconiza que é apenas uma

questão de tempo para que os efeitos positivos comecem aparecer a partir dos

processos de crescimento e de modernização, esse modelo ainda é observado no

campo prático das estratégias e políticas públicas no Brasil.

Como já referendado no capítulo anterior, Ascelrad (2009) afirma que a

busca por um projeto ou outro de desenvolvimento, por uma prática ou outra de

sustentabilidade em um determinado território, seja uma questão de fato de

                                                            25 Souza (1996) cita dois exemplos: o enfoque “redistribuição com crescimento” do Banco Mundial e a vertente que enfatiza “a satisfação de necessidades básicas” (p.7).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 48: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

47

escolhas. Partiremos, neste momento da análise, da escolha da instalação do maior

empreendimento da Petrobras (maior obra do PAC no estado do Rio de Janeiro - o

Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro) pelo município de Itaboraí,

analisando, da mesma maneira, as outras conseqüentes escolhas que vêm sendo

atribuídas a partir da instalação do complexo.

Observa-se que o COMPERJ é propagado pelo discurso de desenvolvimento

e sustentabilidade em seus diversos meios de divulgação. A partir das discussões

do que entendemos por esses conceitos/noções no capítulo anterior, averiguar-se-

ão sob quais concepções os gestores do COMPERJ se baseiam e que contradições

existem entre as potencialidades locais e as propostas do complexo industrial.

Iniciaremos compreendendo brevemente as ações privilegiadas entre os

gestores do território fluminense que dizem respeito ao tema em questão e, dessa

maneira, as representações do COMPERJ para a gestão atual do estado do Rio de

Janeiro. Assim, analisaremos criticamente a escolha pelo município de Itaboraí, o

licenciamento ambiental, os discursos dos gestores do COMPERJ, dos órgãos

ambientais locais, da mídia e dos diferentes moradores, suas contradições,

resistências... A partir daí far-se-á uma análise crítico-reflexiva em relação ao pólo

petroquímico, em que se abordarão as possíveis contradições existentes entre o

projeto de desenvolvimento via COMPERJ e as realidades de gestão local,

notadamente a partir da legislação das Unidades de Conservação (UCs)26.

3.1. Os gestores e seus discursos no Estado do Rio de Janeiro

No capítulo 1 discutimos o modelo hegemônico de desenvolvimento que foi

sendo implantado por diferentes lugares do mundo, inclusive no Brasil.

Destacaram-se as reflexões de Celso Furtado que, já na década de 1980, entendia

                                                            26 Unidade de Conservação é o nome dado no Brasil às áreas protegidas fazendo parte do sistema brasileiro de proteção ao meio ambiente, e são controladas pelo órgão federal ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Em 2000, o Brasil institui um Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)- Lei Federal 9.985, atendendo ao oitavo artigo da Convenção sobre Diversidade Biológica As unidades de conservação integrantes do SNUC dividem-se em duas categorias:UC de proteção integral (parques nacionais, estações ecológicas, etc.) de caráter mais preservacionista e restritivo quanto ao uso dos recursos naturais; e UCs de uso sustentável (áreas de proteção ambiental, reservas extrativistas, etc.) mais flexíveis quanto às possibilidades de uso humano de seus recursos (SNUC, 2000).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 49: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

48

que o desenvolvimento deveria ser fundado na preservação da identidade cultural

de cada uma das regiões que formam o país e em função de prioridades definidas

pela própria coletividade. O autor salientava a importância do planejamento que,

segundo ele, seria o único meio que permitiria a introdução da dimensão espacial

(e, portanto, geográfica) no cálculo econômico. Dessa maneira, os custos

ecológicos e sociais da aglomeração espacial das atividades produtivas, ignorados

pelas empresas privadas e públicas, poderiam ser corrigidos (1984).

Entretanto, apesar de toda reflexão teórico-acadêmica do renomado

economista, e, como dissemos anteriormente, também de variados intelectuais e

estudiosos do desenvolvimento, verifica-se, ainda na atualidade, que os discursos

e ações voltados para a modernização do território do Estado do Rio Janeiro pelos

seus gestores públicos, como nos lembra Silva (2007), se apóiam na idéia

“tradicional de desenvolvimento”, ou seja, que a modernização da base técnico-

produtiva, por si só, trará o bem estar. Como tradicional, deve-se destacar a visão

etapista de desenvolvimento de W. W. Rostow (1953)27 ainda prevalecente nas

perspectivas de gestão pública, em que os espaços rurais, por exemplo, são

entendidos como atrasados. Dessa maneira, este tipo de organização societária

deveria ser extinta para que a modernidade fosse atingida, ou seja, como caminho

condicional para uma sociedade industrial. Tal percepção ainda atinge os povos

tradicionais como os das florestas, pescadores, caranguejeiros... que desenvolvem

atividades artesanais e de subsistência.

A partir de uma perspectiva etapista, algumas atividades industriais são

privilegiadas no território fluminense, tais como o padrão petrolífero de Macaé e o

nuclear de Angra do Reis. Verificam-se, de acordo com Silva (2006), articulações

com grandes corporações e empresas de alta tecnologia e, com isso, mudanças nas

características pré-estabelecidas dos locais a partir de processos técnico-

científicos que remontam e re-significam os lugares (SILVA, 2006). Em outras

palavras, desvalorizam as tradições locais e regionais em busca da

“modernização” (SILVA, 2007).

                                                            27 Ver: ROSTOW, W.W. Chapter 2, "The Five Stages of Growth-A Summary. In: The Stages of Economic Growth: A Non-Communist Manifesto. Cambridge: Cambridge University Press, 1960. Disponível em: < http://www.mtholyoke.edu/acad/intrel/ipe/rostow.htm>. Acesso em 26 de abril de 2009. 

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 50: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

49

Nessa perspectiva, não há uma racionalidade para a discussão dos custos

sociais, ambientais e políticos em longo prazo. Preconiza-se o pensamento em

curto-prazo e, da mesma forma, interesses globais/ nacionais se sobrepõem aos

interesses locais (FURTADO, 2007).

Ainda em 1984, Furtado criticava o centralismo político e defendia a

autonomia regional. Com a Constituição de 1988 e a descentralização do poder, a

escala subnacional foi valorizada, conquistando maior autonomia administrativa e

financeira.

Os conselhos municipais, ou seja, canais institucionais que possibilitam

maior controle sobre as atribuições das prefeituras e ampliam a participação

popular, foram assim também definidos em 1988 e institucionalizados e

difundidos na década de 90 (CASTRO, 2005, p.207). Entretanto, segundo Rua

(2002), no Brasil a descentralização tributária e o fortalecimento dos municípios

podem tanto representar a participação popular na gestão dos recursos como

privilegiar as oligarquias locais que serão fortalecidas com a entrada de recursos,

podendo anular ou manipular a participação das comunidades locais. Exemplo

disto são os diversos conselhos locais que existem formalmente para cumprirem

as leis e garantirem a entrada dos recursos (RUA, 2002).

Os gestores envolvidos na implementação do Complexo Petroquímico do

Rio de Janeiro (COMPERJ) vinculam o complexo diretamente às concepções de

modernização, desenvolvimento e sustentabilidade que vêm sendo justificadas

como fundantes da decisão de alocação do pólo na região metropolitana do Rio de

Janeiro. A partir disso, então, começaremos a compreender as racionalidades

predominantes nas quais se apóiam os gestores do território fluminense

envolvidos na instalação do COMPERJ no Município de Itaboraí.

Numa perspectiva histórica, percebemos que o Rio de Janeiro passou nas

últimas décadas por diversos episódios que afetaram a auto-estima da sua

população: a transferência da capital do país para Brasília, a fusão autoritária dos

Estados da Guanabara e o do Rio de Janeiro, a perda gradual da gestão sobre o

capital privado para São Paulo, entre outros.

O estado do Rio de Janeiro (o que inclui a sua capital), como nos lembra

Souza (2000), é marcado por uma mediocridade administrativa e um contexto

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 51: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

50

subregional economicamente problemático, o que subtrai possibilidades de

emergência dessa unidade da federação no contexto político nacional. Assim

sendo, o COMPERJ é interpretado como uma oportunidade de crescimento

econômico, de “desenvolvimento” e de “modernidade” que interfere no

sentimento da população, principalmente dos cariocas que assistem, de longe, as

possíveis benfeitorias do complexo, mas não vivenciam diretamente as

conseqüências socioespaciais (atuais e futuras) na região. E é dessa maneira que o

Relatório de Impactos Ambientais (RIMA) o descreve:

O estado do Rio de Janeiro tem hoje a possibilidade de reverter um processo de esvaziamento econômico que começou com a mudança da capital federal para Brasília, acentuou-se na fusão com a Guanabara e aprofundou-se com a fuga de investimentos, aumento da criminalidade e perdas ambientais no interior. Este empreendimento pode dar oportunidade de crescimento econômico de forma positiva para o estado (RIMA-COMPERJ, 2007, p.7)

Entretanto, a des-re-territorialização das comunidades que estão na área do

COMPERJ, assim como a proximidade do complexo com o Mosaico da Mata

Atlântica Central Fluminense (MMACF)28, principalmente com a Área de

Proteção Ambiental de Guapimirim (figura 1), leva a questionamentos de diversas

entidades da sociedade civil tais como os Conselhos Gestores29 das respectivas

áreas, de comunidades locais, da Academia, entre outros30, em relação à

localização do pólo petroquímico. Dessa maneira, primeiramente torna-se

necessário apresentar o COMPERJ do ponto de vista da empresa para

                                                            28 De acordo com o SNUC, em seu artigo 26, mosaicos de unidades de conservação: “quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional”. O Ministério do Meio Ambiente reconhece cinco mosaicos, entre eles o Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense, criado em 2006, através da Portaria n°350 do MMA, dentro do Corredor da Serra do Mar (IBAMA-INSTITUTO CHICO MENDES, 2008). O MMACF foi criado pela Portaria do Ministério do Meio Ambiente em dezembro de 2006 e reúne 22 Unidades de Conservação: 2 Reservas Biológicas, 3 Estações Ecológicas, 1 Monumento Natural, 4 Parques, 8 Áreas de Proteção Ambiental, 4 Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Destas UCs, 5 são Federais, 7 Estaduais, 6 Municipais e 4 Privadas. Ocupando uma área de 233.710 hectares em 13 municípios (GIULIANI, 2007). 29 De acordo com o SNUC, todas as UCs e mosaicos devem dispor de conselhos gestores: colegiados que participam da gestão da unidade, consultiva ou deliberativamente dependendo da categoria da UC, compostos por representantes dos órgãos ambientais e da sociedade civil, como associações de moradores locais, colônias de pesca etc. 30 GIULIANI, Gian Mario. As áreas naturais protegidas e a responsabilidade social e ambiental das empresas: o caso do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense e do Comperj. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 16, p. 21-37, jul./dez. 2007. Editora UFPR.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 52: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

51

posteriormente ser feita uma análise crítica do empreendimento, compreendendo

assim as contradições das potencialidades locais com o discurso proferido pelos

gestores do complexo.

Figura 1: Localização do COMPERJ e sua proximidade da APA de Guapimirim

Fonte: ULTRA, BNDES e PETROBRÁS (agosto de 2007).

3.2. Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ): Visão da empresa

O Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ) é o maior

empreendimento individual da história da Petrobras, com um investimento de R$

15 bilhões e está previsto para entrar em operação em 2012. Além disso, constitui-

se em uma das partes importantes do Programa de Aceleração do Crescimento -

PAC - lançado no inicio de 2006 pelo Governo Federal (RIMA-COMPERJ,

2007).

O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do COMPERJ também prevê

que o pólo irá gerar cerca de 200 mil empregos diretos, indiretos e efeito de renda

em âmbito nacional. Além disso, o texto evidencia que a produção do complexo

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 53: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

52

irá estimular a instalação de outras indústrias de bens de consumo na região de

influência do pólo. Estudos da Fundação Getúlio Vargas estimam que 720

empresas serão instaladas na região até 2015 para produzir plásticos (copos e

sacos plásticos, embalagens de alimentos e de cosméticos brinquedos, fibras para

a indústria têxtil e garrafas de refrigerantes e de água, assim como componentes

para as indústrias montadoras de automóveis, eletrodomésticos), a partir da

transformação dos produtos petroquímicos do COMPERJ.

Atualmente, o Brasil exporta óleo cru pesado e importa uma significativa

quantidade de óleo leve. O pólo refinará 150 mil barris diários de petróleo pesado

cru do campo de Marlim, Bacia de Campos. O projeto apresenta uma nova

tecnologia que será utilizada pela primeira vez no Brasil e, consequentemente,

poderá ser uma alternativa competitiva para promover o crescimento da indústria

petroquímica no país (Ibidem).

O RIMA acrescenta que a escolha da localização do pólo se deu devido á

(ao): disponibilidade e facilidades da região, o que inclui o futuro Arco

Metropolitano viabilizado pelo COMPERJ, ligando Itaboraí ao Porto de Itaguaí;

melhor aproveitamento da logística existente; maior competitividade para cadeia

produtiva; maior inclusão social para região (2007) (figura 2).

Figura 2: O COMPERJ e o Arco Metropolitano no contexto da integração regional

Fonte: RIMA-COMPERJ (2007).

O Relatório sustenta ainda que o complexo não só proporcionará uma

renovação econômica como ambiental, e que já deu início a um Corredor

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 54: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

53

Ecológico que prevê o plantio de quatro milhões de mudas, acrescentando que a

ideia é garantir que a implantação do empreendimento no local atenda aos

princípios do desenvolvimento sustentável e da responsabilidade social (p.8).

Percebemos, conforme já afirmamos, que o COMPERJ traz consigo, pelo

RIMA, as ideias de desenvolvimento, modernização, desenvolvimento sustentável

e responsabilidade social difundidas pelo site da Petrobras, seus folhetins, Estado,

mídia e por ONGs que atuam no local. Entretanto, essas concepções também vêm

sofrendo diversas críticas. Cabe, portanto, aprofundar a analise para que possamos

compreender as diversas faces desse processo.

3.3. Projetos de modernização: uma análise crítica do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro

De acordo com o depoimento do biólogo Breno Herrera, chefe da APA de

Guapimirim31, há cerca de seis anos iniciou-se uma campanha no Rio de Janeiro

para que a refinaria anunciada pela Petrobras fosse instalada no estado. O governo

estadual, na época sob a gestão de Rosângela Matheus Garotinho, opositora ao

governo federal e com forte base eleitoral em Campos, no norte fluminense (como

na gestão anterior de Anthony Garotinho), já divulgava em diversos meios de

comunicação o logotipo: “A refinaria é nossa”. Após a definição de que o Rio de

Janeiro sediaria a refinaria, as discussões voltaram-se para a escolha do espaço

físico no território, Campos e Itaguaí eram as duas cidades mais cotadas.

Entretanto, quando o governo federal anunciou definitivamente a locação do pólo,

o município de Itaboraí foi o escolhido. Segundo o biólogo, IBAMA e ICMBio

(esses dois últimos se expressando através do documento Manifestação técnica

sobre os impactos ambientais potenciais decorrentes da implantação do

COMPERJ nas unidades de conservação federais da região, elaborado em 6 de

março de 2008 por um grupo de trabalho), a escolha foi indesejável do ponto de

vista ambiental. Neste documento, os representantes do IBAMA e do ICMBio

afirmam que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) fez uma análise muito

superficial, dada a magnitude do empreendimento, em apenas quatro páginas, dos

                                                            31 Resposta via e-mail dia 04/11/2009.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 55: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

54

possíveis locais de implantação do COMPERJ e que a melhor alternativa

apontada pelo EIA, a área de Itaboraí, seria de fato a pior.

As justificativas para a escolha do município de Itaboraí, apontadas pelo

EIA, são então questionadas por esse grupo de trabalho, tais como os quesitos da

proximidade com a matéria-prima e da dinamização da economia, os quais, de

acordo como o EIA, favoreceram Itaboraí. Segundo a manifestação técnica do

IBAMA- ICMBio (2008), esses critérios deveriam favorecer a alternativa de

Campos-Travessão, dada a proximidade com a Bacia de Campos, e de acordo com

o mesmo documento, pela região norte fluminense ser mais pobre do que a região

metropolitana do Rio de Janeiro. O mesmo trabalho ainda questiona o EIA

quando se refere às “restrições geotécnicas” nas áreas de Itaguaí e Campos, não

especificando quais seriam essas restrições e características mecânicas do solo,

apontando soluções técnicas para estruturas e intervenções no solo da região de

Itaboraí. Estas, por sua vez, não são muito diferentes das duas outras opções

locais. Além disso, também observa que Itaguaí já possui outras indústrias de

porte semelhante.

O biólogo Breno Herrera também acredita que a escolha mais viável para a

implantação seria a do município de Campos dos Goytacazes. O EIA levanta

“dificuldades e custos de implantação de um terminal portuário” (IBAMA-

ICMBIO, 2008, p.3), sem levar em conta, segundo o mesmo documento, a

implantação do Porto do Açu no Norte Fluminense, nem a possibilidade de se

construir um terminal portuário próprio, o que está previsto para Itaboraí com

consequências diretas no manguezal da APA de Guapimirim e da ESEC da

Guanabara. Outra justificativa do EIA pelo descarte da implantação do

COMPERJ no Norte Fluminense seria a proximidade com cultivos de cana de

açúcar32, sendo que essa priorização se dá em detrimento da vegetação de

preservação permanente, o que é criticado tanto pelo chefe da APA de

Guapimirim como pelo documento supracitado.

                                                            32 Vale lembrar o processo de antropização, degradação e empobrecimento do solo desta região, em conseqüência de muitos ciclos de cultivo desde os tempos coloniais (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.3)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 56: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

55

Dessa maneira, sob o ponto de vista de áreas preservadas e unidades de

conservação, observa-se uma grande diferença entre as três alternativas

locacionais apresentadas pelo EIA (ANEXOS 4,5 e 6).

A partir dos mapas selecionados, observa-se que a localidade Campos do

Goytacazes-Travessão possui apenas uma unidade de conservação no raio de

20km (a Estação Ecológica Estadual de Guaxindiba a 18 km) do local que seria

previsto para implantação do COMPERJ. Já em Itaguaí haveria uma UC de uso

sustentável no raio de 10 km (a APA Estadual de Mangaratiba, a cerca de 5 km) e

quatro UCs no raio de 20 km (a APA estadual do Gericinó-Mendanha a 15 km; a

Floresta Nacional Mário Xavier a 16 km; o Parque Estadual da Pedra Branca a 17

km; e a Reserva Biológica e Arqueológica Estadual de Guaratiba a 18 km)

(IBAMA- ICMBIO, 2008, p.3)

Na localidade de Itaboraí, observam-se duas unidades de conservação em

um raio de 10 km (a APA Estadual da Bacia do Rio Macacu, na qual está

proposto o empreendimento e a APA Federal de Guapimirim a 6 km) e seis UCs

no raio de 20 km (Estação Ecológica Federal da Guanabara a 11 km; a Estação

Ecológica Estadual do Paraíso a 13 km; a APA de Petrópolis a 14 km; a APA

Federal da Bacia do Rio São João a 14 km; o Parque Estadual dos Três Picos a 17

km; o Parque Nacional da Serra dos Órgãos a 19 km).

Os mapas mostram apenas as unidades de conservação federais e estaduais,

entretanto é importante ressaltar que na localidade de Itaboraí ainda se encontra a

APA Municipal de Guapi-guapiaçu, sob administração da Prefeitura de

Guapimirim. Todas essas UCs citadas compõem o Mosaico de Unidades de

Conservação da Mata Atlântica Central Fluminense (ibidem, p.3). A opção de

Itaboraí, do ponto de vista ambiental, dessa maneira, seria a mais imprópria.

Contudo é importante observar a partir de Irving, Giuliani e Loureiro (2008)

que a regulamentação do SNUC- política que institui as UCs- fortalecida pelo

Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP)33 institui também a

                                                            33 Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006 (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5758.htm, Acesso em 28 de março de 2010). Segundo Irving, Giuliani e Loureiro (2008) diversos princípios e diretrizes estabelecidos pelo PNAP reforçam a perspectiva de integração sociedade-natureza no âmbito de implementação de políticas públicas, dentre os quais: “valorização dos aspectos éticos, culturais, estéticos e simbólicos da conservação da natureza (Princípio II); valorização do patrimônio cultural e do bem difuso, garantindo os direitos das gerações atuais e futuras (Princípio IV);

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 57: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

56

obrigatoriedade da gestão participativa das UCs, envolvendo Estado e sociedade,

procurando ir além do viés ambiental. Alguns dos objetivos do SNUC são: a

promoção do desenvolvimento sustentável, a partir dos recursos naturais

(Objetivo IV); promoção da utilização dos princípios e práticas de conservação da

natureza no processo de desenvolvimento (Objetivo V); importância da

valorização econômica e social da diversidade biológica (Objetivo XI). Observa-

se entre os objetivos do SNUC, portanto, sob a ótica de planejamento, articulações

entre as políticas de proteção da natureza e aquelas vinculadas à promoção do

desenvolvimento econômico e social (p.14). Além disso, enfatiza em algumas de

suas diretrizes34 a questão da participação social “como garantia da efetividade da

própria política de proteção da natureza” (p.15)

Mesmo, então, que no momento da criação de uma UC ainda prevaleça à

defesa da unidade de conservação da ameaça da ação humana, em sua gestão o

compromisso da participação social caminha para uma nova percepção:

(...) a de que o êxito dessa política de proteção da natureza depende do efetivo engajamento das populações locais no processo de gestão, a partir da internalização da natureza como patrimônio coletivo e da percepção de integração da área protegida com a dinâmica sócio-econômica do entorno (IRVING, GIULIANI e LOUREIRO, 2008, p.15)

                                                                                                                                                                   reconhecimento das áreas protegidas como um dos instrumentos eficazes para a diversidade biológica e sócio-cultural (Princípio VII); repartição justa e equitativa dos custos e benefícios advindos da conservação da natureza, contribuindo para a melhoria de qualidade de vida, erradicação da pobreza e redução das desigualdades regionais (Princípio XII); desenvolvimento de potencialidades de uso sustentável das áreas protegidas (Princípio XIII); reconhecimento e fomento às diferentes formas de conhecimento e práticas de manejo sustentável dos recursos naturais (Princípio XIV); harmonização com as políticas públicas de ordenamento territorial e desenvolvimento regional sustentável (Princípio XVII); pactuação e articulação das ações de estabelecimento e gestão das áreas protegidas com os diferentes segmentos da sociedade (Princípio XVIII); promoção da participação, da inclusão social e do exercício de cidadania na gestão das áreas protegidas, buscando permanentemente o desenvolvimento social, especialmente para as populações no interior e do entorno das áreas protegidas (Princípio XX); consideração do equilíbrio de gênero, geração, cultura e etnia na gestão das áreas protegidas (Princípio XXI); garantia de ampla divulgação e acesso público às informações relacionadas às áreas protegidas (Princípio XXIV)” (p.15-16). 34 “Mecanismos e procedimentos devem ser assegurados para o envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da Política Nacional de Unidades de Conservação (Diretriz II); A participação efetiva das populações locais deve ser assegurada na criação, implantação e gestão de Unidades de Conservação (Diretriz III); As necessidades das populações locais devem ser consideradas no desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável de recursos naturais, independentemente das diferentes categorias de manejo previstas (Uso Sustentável ou Proteção Integral) (Diretriz XIX)” (IRVING, GIULIANI e LOUREIRO, 2008, p.15).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 58: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

57

Segundo o estudo “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio35:

perspectivas na América Latina e Caribe” (CEPAL, 2005) o objetivo da garantia a

sustentabilidade ambiental era um dos que apresentava maior desafio para a

região. Acrescentando que na década de 90 a área coberta por florestas no Brasil

diminuiu de 66,3% para 63,6% (p.2). Uma das estratégias governamentais para

minimizar o cenário histórico de degradação da Mata Atlântica é a criação de

áreas especialmente protegidas como unidades de conservação, mosaicos e

corredores ecológicos. Dentre dezoito pontos críticos identificados no planeta, a

costa do Brasil é caracterizada como uma das principais áreas remanescentes de

alta biodiversidade e grande parte da Mata Atlântica é considerada Reserva da

Biosfera pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO)36, indicando a prioridade para a conservação e o

desenvolvimento sustentável. No conjunto de ecossistemas que compõem a Mata

Atlântica, a UNESCO considera determinadas regiões como prioritárias para

conservação, tanto pela sua relevância ambiental, como pela sua importância

social e no conhecimento cientifico e tradicional. Dentre essas regiões, encontra-

se o Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar37 (PROGRAMA MOSAICOS

DA MATA ATLÂNTICA – RBMA – PROJETO DE APOIO AO

                                                            35 “Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) foram adotados em 2000 pelos governos de 189 países — incluindo o Brasil — como um compromisso para diminuir a desigualdade e melhorar o desenvolvimento humano no mundo. Ele prevê oito grandes objetivos, a serem cumpridos, em sua maioria, até 2015: erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento” (CEPAL, 2005, p.1). 36 Em uma reunião realizada no dia 29 de outubro de 2009 com os conselheiros da APA de Guapimirim, foi feito um abaixo-assinado pra que APA de Guapimirim fosse reconhecida ainda como posto avançado da Mata Atlântica pela UNESCO. Para uma UC ser reconhecida como Posto Avançado é necessário que a instituição desenvolva pelo menos duas das dessas três funções básicas: proteção da biodiversidade, do desenvolvimento sustentável e do conhecimento científico e tradicional sobre a Mata Atlântica, as quais a APA de Guapimirim já desenvolve. 37 O Corredor da Serra do Mar abrange grande parte do Rio de Janeiro, além do litoral de São Paulo, o sul de Minas Gerais e o extremo norte do Paraná. Este fato está associado às boas condições de conservação de diversas áreas dessa região, que se reflete em um alto grau de diversidade biológica, na existência de endemismos e na ocorrência de espécies raras e ameaçadas de extinção nos ecossistemas regionais. Está associado também à interação intensa desses recursos com a ação humana, já que o Corredor da Serra do Mar engloba algumas das áreas mais densamente populosas do Brasil. Neste Corredor concentram-se importantes fragmentos florestais, além de uma vasta diversidade sociocultural em interação com estes fragmentos. A conservação destes fragmentos é fundamental para a conservação da biodiversidade da Mata Atlântica (PROGRAMA MOSAICOS DA MATA ATLÂNTICA – RBMA – PROJETO DE APOIO AO RECONHECIMENTO DE MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO CORREDOR DA SERRA DO MAR., 2007, p.53-54).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 59: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

58

RECONHECIMENTO DE MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

DO CORREDOR DA SERRA DO MAR, 2007, p.53-54).

Determinadas porções do Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar são

consideradas ainda como áreas de prioridade extrema para conservação, dentre

elas se encontra a região do Mosaico de Unidades de Conservação da Mata

Atlântica Central Fluminense, que abrange a Serra dos Órgãos e se estende do

Maciço do Tinguá até Macaé de Cima, incluindo a parte leste da Baía de

Guanabara. O documento do Ministério do Meio Ambiente, que subsidiou a

elaboração do Mapa de Áreas Prioritárias para Conservação no Brasil, intitulado

“Avaliação e identificação de áreas e ações prioritárias para conservação,

utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira”

considera esta região como de Prioridade de Conservação e Uso Sustentável –

Extremamente Alta. Devido à importância ambiental, social e econômica desses

manguezais para toda a baía, eles ainda são protegidos pelo Código Florestal. A

situação prioritária para conservação dos mangues da Baía de Guanabara levou ao

estabelecimento de ações importantes de um grande programa de conservação dos

mangues, o GEF38 Mangue, cujo objetivo é promover a conservação e uso

sustentável de ecossistemas manguezais no Brasil (ibidem, p. 54-55).

As unidades de conservação APA Guapimirim e Estação Ecológica da

Guanabara localizam-se na região da foz de diversos rios de outras UCs do

Mosaico. Há deposição de sedimentos finos que possibilitam a tomada das

margens por vegetação de manguezal. A partir desses rios, os manguezais são

cortados por canais que se entrecruzam, formando uma rede de irrigação. Esses

rios são oriundos do alto das serras que compõem a bacia da Baía de Guanabara,

sendo os principais elos de ligação das regiões de baixada com as demais áreas do

mosaico. A gestão da APA Guapimirim e da ESEC Guanabara39, portanto,

depende diretamente da gestão das demais UCs do mosaico, que têm parte de suas

áreas drenando para ela (ibidem, p.56).

                                                            38 Fundo Global para o Meio Ambiente, na sigla em inglês. 39 De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade- ICMBio, pelo regimento interno dessas unidades de conservação, oficialmente a APA de Guapimirim e a ESEC da Guanabara constituem uma unidade integrada. Dessa maneira, possuem gestão integrada e as duas unidades de conservação possuem assim o mesmo espaço consultivo formalmente, o conselho da APA Guapimirim – CONAPAGUAPI. Disponível em: http://www.icmbio.gov.br/apaguapimirim/?id_menu=52, Acesso 05 de fevereiro de 2010.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 60: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

59

Figura 3: Área de Proteção Ambiental de Guapimirim (área verde) - Reserva de Manguezal

Fonte: Instituto Baia de Guanabara (2007).

Hoje, os manguezais da Baía de Guanabara estão restritos a uma área total

de 81,50 Km2 concentrada, principalmente, na APA de Guapimirim, que

corresponde a uma área de 68,75 Km2, com cerca de 14.000 hectares e abrange os

municípios de Magé, Guapimirim, Itaboraí e São Gonçalo (AMADOR, 2001)

(figuras 3 e 4).

Esta APA40 foi criada em 1984, pelo Decreto Federal nº 90.225 (PLANO

DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001), em resposta à primeira ação

comunitária em defesa da Baía de Guanabara, que obrigou a DNOS (responsável

pelas maiores transformações das bacias fluviais da baía) a desistir do projeto que

criaria terrenos para as indústrias saneando a área compreendida pelos Rios

Macacu-Guapi, Guaraí, Guaximdindiba, com seus canais de marés e manguezais

                                                            40 De acordo com a Lei Federal n.º 9.985/00, SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, em seu artigo 15, a APA (Área de Proteção Ambiental) é definida: “... como uma área em geral extensa; com certo grau de ocupação humana; dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e que tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais; constituída por terras públicas ou privadas (§1º); onde podem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização da propriedade privada (§ 2º), condições para a realização de pesquisa científica e visitação pública, pelo seu órgão gestor, nas áreas públicas (§ 3º), e pelo seu proprietário, nas privadas (§ 4º); dispondo de um Conselho, presidido pelo órgão administrador e constituído por representantes dos órgãos públicos, de ONG (Organização Não Governamental) e da população residente (§ 5º)” (SNUC, 2003).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 61: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

60

associados (AMADOR, 1992, p.207). A APA de Guapimirim funciona como um

berçário para milhares de espécies marinhas e é considerada, popularmente, como

o “pulmão” da Baía de Guanabara já que:

...assegura a manutenção de condições naturais de trechos da baía, viabilizando a sua recuperação como ecossistema e garantindo a vida na baía, representada pela cadeia biológica constituída por microorganismos, crustáceos, moluscos, camarões, peixes e mamíferos (como os botos) (AMADOR, 2001, p. 137).

Dessa maneira, a vida marinha existente em toda baía é dependente desses

manguezais, assim como eles são vitais para a manutenção dos estoques

pesqueiros (KAMEL et al., 2004). A APA é assim fundamental para a produção

de pescado em toda a da Baía de Guanabara, o que evidencia uma grande

importância econômica e social, principalmente no que diz respeito à quantidade

de pessoas envolvidas nessas atividades produtivas41.

Figura 4: Vista aérea da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim

Fonte: PREFEITURA DE ITABORAÍ (2006).

Com o intuito de proteger os manguezais da APA, e assim toda Baía de

Guanabara, uma Estação Ecológica foi implantada dentro da APA de Guapimirim

por iniciativa do IBAMA. Pelo Decreto s/n de 15 de fevereiro de 2006, a Estação

                                                            41 Em um trabalho realizado por JABLONSKI et al. (2006) a produção de pescado na Baía de Guanabara registrada, entre abril de 2001 e março de 2002, foi, aproximadamente, de 19.000 ton., correspondente a um valor de 4,8 milhões de dólares. E a quantidade de pescadores envolvidos foi de, aproximadamente, 3700 pescadores.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 62: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

61

Ecológica da Guanabara42 foi implementada, mesmo não tendo sido consenso nas

comunidades interessadas, sobretudo a dos pescadores e caranguejeiros43

(GIULIANI, 2007). Esta é considerada a área mais preservada da Baía de

Guanabara abrangendo os municípios de Itaboraí e Guapimirim (IBAMA, 2006).

Dessa maneira, a instalação do COMPERJ com uma área de 4.529,8 ha,

mais de duas vezes e meia maior que a área da ESEC Guanabara e localizando-se

cerca de 6 km à montante da APA de Guapimirim, certamente afetará o regime

hidrológico que sustenta os manguezais44 (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.10).

Soares (2007)45 acrescenta outros pontos que também deveriam ser levados

em conta quanto à localização do pólo petroquímico no município de Itaboraí: a

escassez de água da região e a fragilidade do ecossistema da Baía de Guanabara.

Esses pontos, que segundo a manifestação técnica do IBAMA e ICMBio (2008)

causam preocupação devido à falta de planejamento integrado em relação ao

fornecimento de água e destinação dos efluentes, possuem licenciamentos

separados.                                                             42 De acordo com SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - em seu artigo 9: A Estação Ecológica tem com objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas; A Estação Ecológica é de posse e domínios públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei (§1º); é proibida a visitação pública, exceto quando o objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico (§2º); A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento (§3º); Na Estação Ecológica só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de: I- medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados, II- manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica, III- coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas; IV- pesquisas científicas cujo o impacto sobre o meio ambiente seja maior do que aquele causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de um mil e quinhentos hectares (§4º) (SNUC, 2003). 43 Por motivos óbvios a Comunidade de Itambi era contrária a implementação de uma Estação Ecológica, já que a ESEC se enquadra na categoria de UC de Proteção Integral, restringindo assim a cata de caranguejo e a pesca. A defesa dos caranguejeiros se baseava que não adiantaria fechar uma área se não atacasse diretamente os focos de poluição. Em trabalho anterior Moysés (2008) mostrou o conflito existente entre os gestores das UCs com as populações que residem nestas, defendendo que a Comunidade de Itambi na realidade contribuía para a conservação e preservação dos mangues da APA de Guapimirim. Atualmente, os membros do Conselho Gestor da APA de Guapimirim estão entrando em acordo, que mesmo pelo SNUC seja proibida qualquer atividade extrativista na ESEC, os caranguejeiros e os pescadores cadastrados da região poderão realizar suas atividades, assunto a ser retomado no capítulo seguinte. 44 É importante destacar aqui que segundo a manifestação técnica do IBAMA - ICMBio (2008) a metodologia empregada no EIA onde se considera o ponto central da área do COMPERJ na definição dos raios das áreas diretamente afetadas (ADA) e de influência direta (AID), está equivocada, dada a magnitude da área do empreendimento (4.529,8 ha) (p.14). 45 Mário Luiz Gomes Soares é oceanógrafo, professor da Faculdade de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e membro do Conselho Gestor da APA Guapimirim e do Conselho Consultivo do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 63: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

62

No RIMA, são apontadas as seguintes alternativas para captação de água: os

Rios Paraíba do Sul e Guandu, a construção de barragem no Rio Guapiaçu e de

captação de água no reservatório de Juturnaíba. Entretanto, segundo a

manifestação técnica, são opções de difícil implantação, já que o Rio Paraíba do

Sul demandaria um bombeamento extraordinário para transpor a Serra dos

Órgãos; o Guandu por abastecer a RMRJ já se encontra saturado; a construção da

barragem no Rio Guapiaçu afetaria sensivelmente as unidades de conservação à

jusante, sendo assim considerada de grande risco ambiental; e a opção de captação

de água no reservatório de Juturnaíba46 demandaria estudos do hidrograma

ecológico da bacia do rio São João, já que hoje ainda não existem dados que

permitam a autorização da captação daquele reservatório (p.6).

Seguindo o mesmo documento, ainda se afirma que a vazão média de

efluentes líquidos irá atingir 13,7 m3/s47 já que este deverá ter a contribuição da

drenagem de águas pluviais contaminadas, questionando-se a adoção da Refinaria

do Paraná (REPAR) e não a de Duque de Caxias (REDUC) como referência para

se estimar as características dos efluentes. O estudo ainda acrescenta que

deveriam ser incluídas as substâncias que serão empregadas nos processos

petroquímicos, já que o COMPERJ também realizará essa atividade, além do

refino, esclarecendo se o petróleo pesado de Marlim não terá um potencial maior

de impacto ambiental, com compostos mais complexos e persistentes, já que

demanda maior tratamento e por ser um processo pioneiro de refino. Portanto, é

possível haver subprodutos e resíduos com riscos potenciais não previstos nos

efluentes descartados (p.7).

Dessa maneira, Soares (2007) nos alerta que o COMPERJ e sua forte

demanda por água, além do possível risco de contaminação por resíduos

industriais, somar-se-ão às outras indústrias que se instalarão no local e aos novos

                                                            46 Não apenas o reservatório, mas como todos os rios contribuintes estão sofrendo problemas de assoreamento e o reservatório vem perdendo sua capacidade de armazenamento de água, esse problema se agrava pelo fato do reservatório de Juturnaíba ser responsável pelo abastecimento de uma população de mais de 500 mil pessoas da Região dos Lagos, que chega a quadriplicar no verão (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.6). 47 Como comparação, a maior Estação de Tratamento de Esgotos do PDBG, ETE Alegria, que atende uma população de 1.500.000 habitantes e na época de sua inauguração era maior do Brasil, tem a capacidade de tratar 5,0m3/s, embora não opere a plena carga (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.7).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 64: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

63

assentamentos urbanos, o que certamente comprometerá o futuro das bacias de

drenagem da região.

Nos últimos anos ocorreram alguns acidentes envolvendo petróleo e

derivados que atingiram os manguezais do recôncavo da Baía de Guanabara48.

Tais eventos devem ser considerados como prioritários em termos de gestão. Nas

entrevistas realizadas nessa pesquisa, os catadores de caranguejo em algumas de

suas falas remetem aos episódicos acidentes como momentos de dificuldades,

principalmente quando se referem ao acidente mais recente e mais próximo da

área em que vivem atualmente49. Durantes esses eventos, a cata de caranguejo e a

pesca foram gravemente atingidas, sendo proibidas pelo IBAMA de ocorrer

durante algum tempo, afetando assim o principal meio de sobrevivência dessa

população.

Soares (2007) salienta ainda que a localização do pólo petroquímico

contraria o próprio Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da

Baia da Guanabara (PDRH-BG), que recomenda:

(...) impedir que áreas inundáveis ainda não ocupadas venham a ser urbanizadas, evitando assim futuros problemas. Recomenda-se delimitar estas áreas e criar legislação nos respectivos municípios tornando-as não urbanizáveis.50

O mesmo plano, em relação à bacia do Rio Guapimirim, diz: “os resultados

indicam que é aconselhável que se proceda a preservação destas águas,

impedindo-se a localização de indústrias poluidoras na sua área de influências...”

(IBAMA- ICMBIO, 2008, p.9).

Também, segundo o PDRH-BG, os municípios de Itaboraí e Guapimirim

são os piores em termos de disponibilidade de rede de esgoto, água pluvial e

                                                            48 Como exemplo, devem ser destacados o acidente da Refinaria Duque de Caxias, em janeiro de 2000, com mais de 1 milhão de litros de óleo combustível na Baía de Guanabara (SOARES, 2002) e o acidente da Ferrovia Centro Atlântica, em abril de 2005, quando cerca de 60.000 litros de óleo diesel atingiram o Rio Caceribu (VIANA, 2009, p.34). 49 O filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, retrata as conseqüências para a Comunidade de Itambi, quando o trem descarrila e derrama óleo diesel nas margens do rio Caceribu. Mostra o dia em que cada família, alguns com mais de 10 filhos, ganha uma lata de sardinha como ajuda para seu sustento enquanto a pesca e a cata de caranguejo não retornassem ao normal. O filme ainda retrata algumas das discussões referentes à implantação da Estação Ecológica da Guanabara, nas quais a Comunidade de Itambi nitidamente se posiciona contrária. 50 SOARES GOMES, Mario L. Responsabilidade socioambiental: a difícil transposição do “abismo“ que separa a retórica da prática. Considerações sobre a proposta de localização do Comperj. Palestra - Desafios e conflitos na conservação e gestão de manguezais. UERJ, Rio de Janeiro. 2007.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 65: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

64

coleta e deposição final do lixo (SOARES, 2007). A manifestação técnica do

IBAMA e do ICMBio (2008) afirma que devam ser muito bem definidas e

exigidas as responsabilidades pelo saneamento, planejamento e ordenamento

urbano da região. Segundo o próprio RIMA do COMPERJ a construção do pólo

aumentará a pressão nas áreas urbanas e urbanizáveis devido à atração de grupos

populacionais em busca de trabalho51. Entretanto, o RIMA delega a

responsabilidade dos impactos aos órgãos públicos e organizações da sociedade

civil local (GIULIANI, 2007). Segundo o documento:

(...) este impacto sobre o uso do solo e a infraestrutura disponível, acontecerá se não houver medidas governamentais adequadas para absorver mão de obra, ampliar a infraestrutura e controlar o uso do solo (...). A chegada de mão de obra para a fase de construção, vinda de outros municípios, poderá aumentar a ocupação irregular das áreas vazias em volta do COMPERJ, na ausência de controle do uso do solo pelo poder municipal (RIMA-COMPERJ, p.103).

Os municípios da região atraídos pela perspectiva de recursos de royalties se

associaram em um consórcio - Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento do

Leste Fluminense (CONLESTE)52. Com isso, os próprios municípios assumiram

essas responsabilidades e ainda estão sendo cobrados pelos gestores envolvidos na

implantação do COMPERJ53.

                                                            51 A manifestação técnica nos dá como exemplo o Município de Duque de Caxias que tem o segundo maior potencial poluidor do estado em diversos parâmetros físico-químicos e toxicológicos, em conseqüências da implantação da REDUC que atraiu outras indústrias do ramo e químicas relacionadas (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.7). 52 De acordo com o site Fórum COMPERJ, a decisão da implantação do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro - COMPERJ, em Itaboraí, município na Região Metropolitana Leste, “pelo nível de investimentos, geração de empregos e arrecadação de impostos, trará nítidos benefícios e transformará, significativamente, o perfil sócio-econômico de todo o entorno do Complexo. Nesta perspectiva, os municípios que compõem esta área de influência criaram o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento do Leste Fluminense – CONLESTE, com o objetivo de definir estratégia e atuação conjuntas diante dos possíveis impactos sociais decorrentes da implantação do megaprojeto de investimento do Complexo. O CONLESTE, além de Itaboraí, reúne os municípios de Niterói, São Gonçalo, Cachoeiras de Macacu, Casimiro de Abreu, Guapimirim, Magé, Maricá, Rio Bonito, Silva Jardim e Tanguá (http://www.forumcomperj.com.br/, Acesso em 03 de fevereiro de 2010). 53 Portanto, não se generaliza aqui que todos os gestores dos municípios assumiram todas as responsabilidades e não cobrem essas da Petrobras. Na ata da Audiência Pública do Empreendimento do COMPERJ, no dia 09 de junho de 2009, que se discutiu o empreendimento denominado Estrada de Acesso Principal ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ), o Coronel Samuel Dionísio, da Secretaria do Transporte do Município de Itaboraí, traz a questão : “ Como vai conviver a população de Manilha e de Itambi com o aumento de tráfego gerado por essa nova rodovia?” mesmo corroborando que seja “fundamental a instalação do COMPERJ para o município, que vai ganhar na mega sena o maior prêmio de todos os tempos, é como se amanhã estivesse ganhando 64 milhões na mega sena e ficasse espantado com esse processo de crescimento”. Ele argumenta que “ há de se ter tecnicamente uma situação, uma condição de que a Petrobrás participe junto com o município e não entube goela abaixo do

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 66: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

65

No seminário internacional Direito à cidade nos municípios do CONLESTE

e os objetivos de desenvolvimento do milênio, realizado nos dias 5 e 6 de outubro

de 2009, pela ONU-HABITAT em parceria com a Petrobras, Universidade

Federal Fluminense (UFF) e CONLESTE, em Niterói, um Diretor de Créditos e

Inclusão Social do BNDES, na época, cobrou dos municípios avanços na

infraestutura das cidades.

O diretor observou que os “Indicadores do Milênio” 54 dos municípios do

CONLESTE tendem a piorar com a chegada de outras empresas e grupos

populacionais atraídos pelo COMPERJ. Dessa maneira, ele alerta os gestores dos

municípios que eles podem “não darem conta”, se não começarem já os seus

planos municipais de esgoto, planejamento e ordenamento urbano, “sozinhos ou

com a ajuda do BNDES”55. Apoiando a sua fala com a ideia de que os benefícios

(impostos, royalties) aos municípios só chegarão daqui a 5 anos e a declaração de

que “nós todos queremos”, o diretor ressaltou que todos devem “rachar a conta”,

dividir o ônus e as responsabilidades, porque a Petrobras não irá pagar tudo

sozinha.

Retornando ao depoimento do biólogo Breno Herrera, este aponta as

contradições no licenciamento ambiental realizado. Segundo ele, o licenciamento

do COMPERJ praticamente desconsiderou a legislação ambiental quanto à

necessidade de apresentação de alternativas locacionais para empreendimentos

poluidores56, já que das cerca de 10.000 páginas do EIA, menos de 10 são

                                                                                                                                                                   município as situações em que as pessoas que moram em Itaboraí estão envolvidas, ou seja, a preocupação do transporte e do trânsito da prefeitura de Itaboraí é exatamente fazer com que a Petrobrás cuide das pessoas e não só das vias e não só dos animais. Essa é a situação, essa é a nossa preocupação e hoje nós estamos perguntando a Petrobrás: Quais vão ser as medidas tomadas na convivência das pessoas com os trechos do impacto da nova rodovia?” (p.20). (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audiencia_estrada_COMPERJ.pdf.>, Acesso 4 de fevereiro de 2010). Como a Comunidade de Itambi será transferida para um Conjunto Habitacional na rodovia BR-493 sofrerá os impactos diretos dessa nova rodovia, dessa maneira, esse assunto será melhor retomado no próximo capítulo. 54 Esses indicadores (no total de 58) foram definidos pelas equipes da ONU-HABITAT e da Universidade Federal Fluminense, com a participação de gestores locais do CONLESTE, em consonância com os 9 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e com os princípios do Pacto Global da ONU. Os objetivos são: acabar com a fome e a miséria; educação básica de qualidade para todos; igualdade entre sexos e valorização da mulher; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde das gestantes; combater a AIDS, a malária e outras doenças; qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento; e de equidade social no CONLESTE. 55 Grifo nosso. Esse gestor dá destaque em sua fala à palavra “ajuda”, ressaltando que a responsabilidade desses planos não é da Petrobras, e sim dos municípios. 56 Resolução CONAMA 01/06.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 67: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

66

dedicadas à análise locacional, sendo os argumentos apresentados para a exclusão

da alternativa Campos dos Goytacazes de difícil aceitação pelos especialistas. O

chefe da APA de Guapimirim acrescenta ainda que o abastecimento hídrico no

município do norte fluminense seria resolvido com a utilização das águas

próximas à foz do Rio Paraíba do Sul, o mais caudoloso do estado, e sob

quaisquer aspectos ambientais seria a alternativa mais viável, já que não haveria

nenhuma UC dentro de um raio de 20 km do empreendimento.

Ainda o biólogo acrescenta que, a Federação das Indústrias do Rio de

Janeiro (FIRJAN) contratou e pagou os salários da maior parte do corpo técnico

responsável pelo licenciamento no estado: a FEEMA, criando assim profundas

implicações éticas sobre a independência necessária entre o licenciador ambiental

e o os agentes do capital industrial.

Dentre outras irregularidades apontadas pela Ação Civil Pública

1.30.003.000055/2006-07, apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF)

contra FEEMA, Petrobras e IBAMA, evidencia-se um alinhamento entre o órgão

ambiental e a Petrobras. Essa ação também se embasa na manifestação técnica do

IBAMA e ICMBio (2008) aqui utilizada, observando-se que a elaboração da

manifestação se deveu ao fato de que apesar de o MPF ter sido avisado de que o

órgão ambiental federal participaria de forma integrada no processo de

licenciamento, a presença de apenas dois técnicos do IBAMA nesse grupo de

trabalho não permitiu que eles tivessem a mesma voz ativa nas conclusões sobre o

EIA/RIMA. Dessa maneira, os peritos federais deixaram o colegiado, e a

autarquia ambiental passou a analisar os estudos apresentados pelo empreendedor,

oferecendo essa manifestação técnica separadamente (p.3). A ação civil, então,

destaca a conclusão dos 14 analistas que subscreveram a manifestação técnica:

Portanto, concluímos pelas razões acima expostas e pelo princípio de precaução, norteador da gestão e do direito ambiental pela impossibilidade da emissão de anuências pelas unidades de conservação federais à implantação do empreendimento na localidade proposta, enquanto não sejam apresentados estudos complementares, referentes aos impactos sobre as unidades de conservação (p.5).

Da mesma forma, o somatório de elementos apresentados anteriormente,

que sugerem uma inadequação do COMPERJ em relação à sua área de instalação,

fez com que os Conselhos Gestores da APA de Guapimirim e do Mosaico das

Unidades de Conservação da Mata Atlântica Central Fluminense se

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 68: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

67

manifestassem contrários ao empreendimento. Entretanto, essa posição foi

derrotada com a emissão da licença prévia pelo órgão ambiental estadual.

Segundo a ação civil, em que pese o teor da manifestação técnica, em 25 de

março de 2008, o então Superintendente do IBAMA no estado do Rio de Janeiro,

Rogério Rocco, emitiu a autorização ao FEEMA57 para que desse prosseguimento

ao licenciamento sob as condicionantes da autorização. No dia seguinte, 26 de

março de 2008, foi expedida pela FEEMA a licença prévia do COMPERJ com as

condicionantes, dentre elas a obrigatoriedade da apresentação de diversos projetos

e documentos pela Petrobras. Apenas dois dias após, no dia 28 de março de 2008,

foram produzidos o Parecer Técnico de Análise de Risco e o Parecer Técnico de

Licença de Instalação n° 1.651/2008, “na mesma data que exarados os

documentos” (p.5). Dessa maneira, a ação civil escreve:

Não se pretende aqui afirmar que seria impossível à Petrobrás vislumbrar - em razão da experiência por ela acumulada- projetos e documentos que poderiam eventualmente ser exigidos para concessão LI em comento. Causa estranheza, no entanto, que tenha ela entregue exatamente todos os projetos e documentos elencados como condição de Licença de Instalação (...), antes mesmo de o próprio parecer técnico que lastreou a concessão da Licença da Prévia. É dizer: ainda não havia a FEEMA se manifestado sobre as condicionantes da LI (ou havia?), mas já tinha a PETROBRÁS conhecimento das mesmas (p.47)58.

A ação civil ainda registra que a FEEMA informou ter o empreendedor

apresentado, antes do pedido de licença de instalação em 20/02/2008 e atualizado

em 07/03/2008, planos e programas integrantes do Plano Ambiental Básico (PBA)

e, em 27/02/2008, o Projeto Executivo (PEX) referente à implantação da

infraestrutura do COMPERJ, “a fim que se fosse precedida analise prévia dos

mesmos, objetivando verificar a necessidade de serem realizados eventuais

ajustes” (p.47).

                                                            57 Lembramos aqui que isso ocorreu antes da criação do INEA. O Governo do Estado do Rio de Janeiro criou através da Lei nº 5.101, de 04 de outubro de 2007, o Instituto Estadual do Ambiente (INEA) com a missão de proteger, conservar e recuperar o meio ambiente para promover o desenvolvimento sustentável. O novo instituto, instalado em 12 de janeiro de 2009, unifica e amplia a ação dos três órgãos ambientais vinculados à Secretaria de Estado do Ambiente (SEA): a Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA), a Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA) e o Instituto Estadual de Florestas (IEF). Em sua inauguração o governador do estado, Sérgio Cabral, afirmou: "Teremos um órgão fortalecido, que permitirá simplificar e agilizar a concessão de licenciamentos ambientais. O órgão nasce, trazendo quadro de pessoal renovado com 214 novos servidores, selecionados em concurso público realizado pela primeira vez na história ambiental do Rio. É um ganho de qualidade extraordinário” (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/>., Acesso em 29 de janeiro de 2010). 58 Grifo da Ação Civil Pública 1.30.003.000055/2006-07.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 69: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

68

A ação civil levanta ainda outras irregularidades, tais como a não inclusão

do sistema de adução de água caracterizando partição do licenciamento do

empreendimento, uma vez que a implantação de um depende do outro. Dessa

maneira, o EIA não considera a Lei Estadual 3111 de 18 de novembro de 199859,

que estabelece:

Quando houver mais de um EIA para a mesma bacia hidrográfica a FEEMA deverá realizar a análise conjunta dos empreendimentos, para definir a capacidade de suporte do ecossistema, a diluição dos poluentes e os riscos civis, sem prejuízo das analises individuais (p.7)

Além disso, na região da implantação do COMPERJ há vários outros

projetos de grande magnitude, licenciados ou em processos de licenciamento, que

se enquadram também nessa consideração: terminais de gás natural liquefeito-

GNL e gás liquefeito de petróleo na Baía de Guanabara, Arco Rodoviário do Rio

de Janeiro, o gasoduto REDUC-Cabiúnas e ampliação da REDUC, além do

terminal aquaviário da Ilha Comprida e a linha 3 do metrô.

O licenciamento de parte (principal) do Complexo petroquímico, anterior e isoladamente, além de ocultar a lesividade do conjunto, e obstar a intervenção e análise do órgão protetor das unidades de conservação federais em todo o processo, terá, inevitavelmente o efeito nefasto de induzir a concessão de licença para as demais obras (...) uma vez implantadas as principais instalações do COMPERJ, e não sendo estas suficientes à operação do empreendimento concebido pela Petrobrás, tornar-se-á absolutamente necessária a aprovação das obras complementares. Estará o órgão licenciador, assim, refém das circunstâncias então criadas (AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MPF n°1.30.003.000055/2006-07, p.41).60

Deve-se destacar também a inclusão, no capítulo do meio ambiente da

Constituição do Estado do Rio de Janeiro, das emendas referentes à Baía de

                                                            59 Como Breno Herrera nos lembra, essa lei é de autoria do Sr. Carlos Minc, na época deputado estadual e presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa. Em 2008, como secretário estadual do meio ambiente, Minc licenciou o COMPERJ, contrariando, dessa maneira, a lei de sua própria autoria. 60 Esse desmantelamento do conjunto é visto, por exemplo, na Ata da Audiência Pública do Empreendimento do COMPERJ, no dia 09 de junho de 2009, quando se discutiu o empreendimento denominado Estrada de Acesso Principal ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ). Mesmo com o próprio nome da ata se referindo ao COMPERJ, foram comuns as repostas como a de Sergio Tolipan, da consultora CONCREMAT, responsável pela elaboração do estudo de impacto ambiental e do relatório do impacto ambiental: “Pelo que estou entendendo, esta pergunta diz respeito ao COMPERJ, não à estrada. Seria uma pergunta sobre o gerenciamento dos resíduos químicos do COMPERJ. O processo dos efluentes do COMPERJ vai ser outro processo de licenciamento que não diz respeito à estrada. Eu não saberia responder” (p.23-24) (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br>, Acesso em 04 de fevereiro de 2010). Dificulta-se assim as compreensões do processo em todo seu conjunto.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 70: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

69

Guanabara: Área de Preservação Permanente61 e Área de Relevante Interesse

Ecológico62 (AMADOR, 1992). O relatório PROBIO63 2000 e sua revisão em

2006, do Ministério do Meio Ambiente, qualificam essa baía como área de alta

importância biológica (SOARES, 2007). Além disso, visando a melhoria da sua

qualidade ambiental, o Programa de Despoluição de Baía da Guanabara64 já

consumiu bilhões de reais, o qual tem como premissa a redução das descargas de

esgotos domésticos e industriais para esse ambiente (GIULIANI, 2007).

Por último, mas não menos importante, lembra-se aqui a importância da

APA de Guapimirim para as comunidades que vivem em seus arredores.

A política que tende a instituir Unidades de Conservação de Uso

Sustentável65 permite que se possa conservar os sistemas naturais mantendo certas

atividades econômicas ligadas à extração de seus recursos. Nesse sentido, as

políticas de proteção de área estariam também tentando amenizar as condições

socialmente desfavoráveis das populações ditas tradicionais.                                                             61 De acordo com Código Florestal brasileiro (Lei 4.771 de 15/09/1965), incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001, Área de Preservação Permanente: área protegida nos termos dos artigos 2o e 3o desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. (Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4771.htm>, Acesso em 30 de março de 2009). 62 De acordo com o SNUC (lei n° 9.985, de 18 de Julho de 2000, no art.16), Área de Relevante Interesse Ecológico é uma área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e tem como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local, e regular o seu uso admissível, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza (SNUC, 2003). 63 Entre 1997 e 2000, o Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira - PROBIO, componente executivo do Programa Nacional da Diversidade Biológica- PRONABIO, apoiou a realização de um estudo mediante ampla consulta para a definição de áreas prioritárias para conservação nos biomas brasileiros. Essas áreas foram reconhecidas pelo Decreto no. 5092, de 21 de maio de 2004 e instituídas pela Portaria no 126 de 27 de maio de 2004 do Ministério do Meio Ambiente. A portaria prevê a revisão periódica pela Comissão Nacional de Biodiversidade (CONABIO), em prazo não superior a dez anos, devido à dinâmica do avanço do conhecimento e das condições ambientais (Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/zoneamento-ambiental/areas_prioritarias/>, Acesso em 30 de março de 2009). 64 O Programa de Despoluição da Baia da Guanabara (PDBG) foi iniciado em 09 de março de 1994. Desenvolvido pelo governo do Estado do Rio de Janeiro em conjunto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o governo japonês, é constituído por um conjunto de ações multidisciplinares que compreendem obras, bens e serviços relativos a intervenções nas áreas de esgotamento sanitário, abastecimento de água, coleta e destinação final de resíduos sólidos, drenagem de águas pluviais, dragagem de rios e lagoas, controle ambiental e mapeamento digital. Tais ações visam à redução dos níveis de poluição da Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara (Disponível em: http://www.cedae.rj.gov.br, Acesso em 30 de março de 2009). 65 Unidades de Uso Sustentável têm como objetivo tanto a proteção do meio ambiente natural, como as próprias atividades das populações residentes. Entre estas unidades, destacam-se: as Reservas Extrativistas (RESEX) e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e as Áreas de Proteção Ambiental (APAs). Ver: Mercadante (2001); Sant’Anna (2003).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 71: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

70

Este foi, então, um dos mecanismos que a sociedade teria encontrado para

regular aquele processo que, através da devastação da natureza, levaria à

decomposição de grupos sociais inteiros que lidam diretamente com ela e retiram

da mesma seus principais recursos econômicos.

A Comunidade de Itambi66, além de tirar sua subsistência do manguezal

seja pela cata de caranguejo, siri e pela pesca de robalo ou outros peixes, também

possuí os seus modos de vida adaptados à região, assunto que se verifica no

próprio RIMA-COMPERJ. Este afirma que os manguezais da APA (...)

“fornecem o sustento para diversas comunidades que recolhem animais” (RIMA-

COMPERJ, 2007, p.67-68.).

Contudo, com a entrada do COMPERJ na região, a Comunidade de Itambi

será des-re-territorizada de seu lugar de vida para blocos de prédio distantes dos

manguezais. A população de caranguejeiros, entretanto, desde o início da pesquisa

sempre careceu de informações sobre tal mudança e, a partir de relatos dos

próprios moradores da comunidade, tal situação foi apenas comunicada, não tendo

havido nenhuma consulta prévia.

Parece-nos assim que, como recorrente no território fluminense, as

audiências públicas novamente servem estritamente para comunicar as decisões e

a aparente abertura da participação da sociedade civil e da população diretamente

envolvida em projetos de modernização é basicamente formal, ainda muito

distante de projetos de gestão participativa67.

                                                            66 A Comunidade de Itambi estaria então vivenciando dois conflitos contraditórios momentaneamente. O conflito com os gestores da APA de Guapimirim, na busca de uma “proteção da natureza”, e o conflito com uma territorialização ecologicamente degradante - o COMPERJ ,que dada as intrepetações dos entrevistados e documentos dessa pesquisa, impedirá a habitação e a sobrevivência, expulsando, as populações de seus territórios de vida e obrigando-as a se deslocarem. Contudo, com a entrada do COMPERJ na região podemos ver também uma maior aproximação das populações residentes na APA de Guapimirim com seus gestores. 67 Entende-se aqui, a partir de Souza e Rodrigues (2004), que o desejável na prática do planejamento e da gestão, do ponto de vista político, seja que os próprios cidadãos tenham a oportunidade de decidir sobre os destinos de seus espaços e de suas cidades, situação em que o papel dos técnicos e estudiosos seja “de consultores do conjunto dos cidadãos organizados, e não de conselheiros e funcionários a serviço de estruturas de poder nebulosas e autoritárias” (p.35).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 72: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

71

3.4. As Contradições do Modelo de Desenvolvimento via COMPERJ

A instalação do COMPERJ é um exemplo claro do domínio de uma

concepção de desenvolvimento socioespacial a partir dos pressupostos de certos

grupos sociais sobre outros grupos. Tal domínio expressa contradições muito

evidentes nas políticas públicas atuais que afetam o espaço fluminense: as

necessidades da realidade local periferizadas por outras definidas pelo COMPERJ

em relação ao desenvolvimento socioespacial.

Uma gerente do COMPERJ, em palestra no já referido seminário

internacional realizado pela ONU-HABITAT, UFF e COLESTE, afirmou que a

chegada da Petrobras na região foi ancorada no “princípio da transparência”, e que

o diálogo com as populações locais foi sempre permanente. Em sua apresentação,

ela também acrescentou que o COMPERJ segue alguns princípios, na seguinte

ordem: busca por viabilidade econômica, discurso ecologicamente correto e

socialmente justo. Em referência ao ecologicamente correto, o COMPERJ se

apóia no corredor ecológico e se baseia na valorização da cultura local, em ações

de responsabilidades sociais e projetos de Educação Ambiental.

Tal discurso institucional mostra as contradições da fala da gerente do

COMPERJ como as realidades locais. Observa-se ainda que o COMPERJ

privilegia alguns requisitos comuns entre os gestores do Estado: visão em curto

prazo e interesses globais sobrepondo-se aos interesses locais, racionalidade

estritamente técnico-científica, assim como outros anteriormente já descritos.

O COMPERJ, a partir dessa análise se enquadra perfeitamente nos

discursos de desenvolvimento dos gestores do estado do Rio de Janeiro e se

distancia das concepções de desenvolvimento e sustentabilidade que acreditamos

serem os caminhos de possíveis gestões democráticas e participativas no

território, defendidas anteriormente.

Apesar das claras contradições entre o ponto de vista ambiental e as

previsíveis conseqüências do empreendimento industrial no território de sua

instalação, a Petrobras e o governo do estado, com promessas de melhoria

econômica (genericamente) e oferta de empregos, conseguem o apoio de grande

parte da população local e, principalmente, do poder público das prefeituras

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 73: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

72

locais. A implantação do COMPERJ é assim divulgada pela prefeitura, pela

Petrobras, pela mídia e pelas ONGs locais como o único meio para o

desenvolvimento (econômico) local e seus impactos negativos são camuflados

pelo discurso de desenvolvimento sustentável.

O chefe da APA de Guapimirim interpreta que a Petrobras e o governo se

utilizam de mecanismos de “chantagem ambiental”, as quais podem ser vistas

principalmente no âmbito das compensações ambientais68. A lógica da criação das

UCs se subverte, “já que entes públicos dispõem de parte de seu território para

implantação de empresas poluidoras, sacrificando sua qualidade ambiental em

troca de benefícios pecuniários diretos.” 69 Um exemplo claro na região seria a

criação da APA Municipal de Suruí, em Magé, motivada, de acordo com Breno

Herrera, pela Secretaria do Meio Ambiente Municipal para recolher benefícios de

compensação do COMPERJ.

Segundo o pescador Afonso Sobrinho (representante da Associação de

Pescadores da Praia de São Gabriel em Itaoca, São Gonçalo):

(...) a Petrobras fez de que iria ter um empreendimento de oito bilhões de dólares aqui na região. Portanto, a partir desse anúncio, todas as pessoas passaram a entender, o grosso da população passou a achar, que teria um emprego, que seus filhos teriam um emprego, que conseguiriam um espaço dentro do COMPERJ e isso não é verdade (BANDEIRA DE MENEZES, 2009, p. 27).

Entende-se assim que, conforme sinalizamos anteriormente, o processo da

instalação do COMPERJ ainda se baseia na redução do conceito/noção

desenvolvimento ao crescimento econômico e a modernização tecnológica e não

leva em conta os custos sociais e ambientais, e a repartição desigual dos ônus e

bônus entre as classes e grupos sociais. Ressalta-se, a partir da visão de Souza

(2000), que as vítimas da segregação socioespacial certamente serão as que mais

sofrerão com “a vingança das forças da natureza” (p.120).

Da mesma forma, observou-se que os gestores envolvidos na política de

desenvolvimento para o território em questão, baseando-se na visão de Dematteis

(2008, p.44), em vez de adaptarem aos ambientes locais o conhecimento e as

                                                            68 Segundo o SNUC (2003), em seu artigo 36, “nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental (...) o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação (...)”. 69 Resposta via e-mail dia 04/11/2009

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 74: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

73

técnicas disponíveis, estão adaptando o lugar à técnica, nivelando-as às

tecnologias que atualmente são rotuladas como as mais produtivas. Entretanto, se

trata de uma concepção parcial da produtividade, entendida como capacidade dos

investimentos de aumentar a renda financeira em curto prazo, mesmo que

diminuam a produtividade de energia, capital natural e desmantelem as

diversidades culturais.

Em outras palavras, as potencialidades específicas locais que poderiam ser

utilizadas como vantagens competitivas são desvalorizadas em detrimento de

interesses globais/nacionais, e com isso se perde a reprodução de saberes

contextuais ambientais no que se refere às formas produtivas locais, se aumentam

as desigualdades e os efeitos ecológicos, e diminui a diversidade territorial

(DEMATTEIS, 2008).

O chefe da APA de Guapimirim afirma: “se nem mesmo a oposição do

Mosaico seja suficiente para evitar os impactos ambientais negativos do

COMPERJ, este não será um movimento em vão se estabelecer-se como um dos

elos de uma rede de resistência maior”70. O biólogo acredita que a organização da

resistência ambiental deve então, além de reforçar os movimentos de resistência

local, construir estratégias de ampliação da escala de atuação. Ele afirma que a

articulação das UCs no Mosaico Central Fluminense já segue esse princípio e

devem ir além, associando-se a casos similares de resistência como os da usina

hidrelétrica do Rio Madeira e a abertura do banco de Abrolhos à exploração

petrolífera, ensejando assim movimentos integrados de resistência ambiental.

Por outro lado, como visto a partir das discussões acima e somadas às

entrevistas com os moradores da Comunidade de Itambi e gestores das UCs

envolvidas, percebe-se também que não só as referências simbólicas, os laços de

convivência e solidariedade da Comunidade de Itambi estão “fadados a

desaparecer”; mas também a própria fonte de sobrevivência desse grupo também

está ameaçada, assim como de outras populações locais que dependem

diretamente dos recursos das unidades de conservação que serão afetadas pelo o

COMPERJ.

                                                            70 Resposta via e-mail dia 04/11/2009.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 75: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

74

Dessa maneira, torna-se importante nesse momento averiguar o processo que

a população vivencia para pensar a partir das experiências dos sujeitos envolvidos

outras racionalidades para projetos de gestão na localidade. Tal observância pode

contribuir para que outros projetos de desenvolvimento no Brasil considerem as

realidades locais, as suas diferentes culturas, interesses, necessidades e assim

transformem o território levando em conta as potencialidades locais com a

participação efetiva dos diferentes grupos em seus diferentes projetos de

desenvolvimento e sustentabilidade. Acredita-se que assim se diminuiriam as

desigualdades e se aumentariam os direitos e liberdades para o maior número de

pessoas possível contribuindo para a construção de um Brasil democraticamente

mais justo.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 76: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

4. A Comunidade de Itambi: potencialidades e perspectivas de um território em transmutação

A comunidade de caranguejeiros de Itambi, localizada nos mangues da APA

de Guapimirim, será transferida para um conjunto habitacional, o qual está

inserido em um projeto do PAC do município de Itaboraí, às margens da BR- 493,

futura via do Arco Metropolitano.

Ao mesmo tempo, a instalação de um pólo petroquímico na região, o

COMPERJ, certamente ocasionará futuros danos nos mangues da APA de

Guapimirim, a partir das interpretações dos documentos e de entrevistas de/com

gestores do IBAMA e ICMBio analisados no capítulo anterior, que possivelmente

interferirão nos modos de vida e sobrevivência dessa comunidade. A comunidade

passa assim por um processo de perda de seu lugar de vida, afetividade,

convivência e sobrevivência.

Como já se afirmou nesse trabalho, a partir da Constituição de 1988, a escala

local da política nacional ganhou novas atribuições e a partir de exigências da

sociedade em busca de direitos da cidadania, essa escala pode ganhar maior

visibilidade. Contudo, como se observou no capítulo anterior, o processo de

organização do território, o projeto de desenvolvimento via COMPERJ, assim

como outras políticas que estão sendo implementadas hoje no município de

Itaboraí em virtude e/ou em conseqüência da entrada do pólo petroquímico, são

escolhas que revelam muito mais interesses nacionais do que condizem com as

potencialidades locais (CASTRO, 2005).

Acredita-se assim, baseando-se em Castro (2005), que seja ainda necessária

a inversão de certos valores e que se acrescentem outros no debate sobre

município, já que atualmente, preferencialmente tem-se o “recorte espacial da

informação estatística (...) útil para as análises setorializadas da atividade

econômica, das finanças e da sociedade”. Contudo, ineficaz para revelar sobre o

próprio município como objeto de conhecimento e as condições diferenciadas

tanto nacionais, como até mesmo locais (p.136).

Esse capítulo analisará então as políticas públicas que atualmente impactam

o território de vida da Comunidade Itambi – a saída da comunidade dos mangues

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 77: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

76

e a entrada do COMPERJ do município. Em outras palavras, analisaremos a des-

re-territorialização71 da Comunidade de Itambi, que ultrapassa a perda do

território em sua dimensão material, buscando-se considerar outras racionalidades

a partir das perspectivas, desejos e necessidades da população comunitária, grupo

diretamente atingido pelas políticas públicas de desenvolvimento em andamento

no município de Itaboraí. Tais políticas estão focadas, ao mesmo tempo, como

estratégias de proteção ambiental e como possibilidade de “desenvolvimento”

associada à transformação da base técnico-produtiva da indústria moderna.

Diferentes motivos são apontados para a saída da Comunidade de Itambi dos

mangues tanto pelos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e das Unidades

de Conservação envolvidas, como pelos próprios moradores da comunidade.

Verifica-se a ideia de qualidade de vida nos diferentes discursos, mas buscar-se-á

compreender tal concepção a partir dos valores da própria comunidade ao mesmo

tempo em que se verificarão as contradições dessa concepção nos demais

discursos.

A partir de Souza (2000a), dessa maneira, entende-se a defesa da autonomia

como um princípio básico72. Dessa forma, compreende-se que o caminho

democraticamente mais legítimo na busca de mais justiça social e de melhor

qualidade de vida seja quando os próprios indivíduos e grupos sociais envolvidos

definem seus conteúdos concretos e estabelecem prioridades referentes a estes

(p.79).

Seguindo o raciocínio do autor supracitado, esse capítulo não visa então,

fazer um receituário ou um esquema pretensamente universal, já que somente o

debate sobre a realidade entre os caranguejeiros de Itambi tem a capacidade e

responsabilidade de orientar na intervenção sobre o real (p.85). Procura-se aqui

propor e alertar para as contradições e riscos embutidos nas políticas feitas por

outros grupos que não sejam os diretamente envolvidos nestas, assim como

perceber a transparência dessas políticas públicas que envolvem os moradores da

Comunidade de Itambi e se essas contribuirão para uma melhor qualidade de vida

e mais justiça social para essa população.

                                                            71 Entende des-re-territorialização a partir de Haesbaert (2004), abordada no capítulo 1 desta dissertação. 72 Grifos do autor Souza (2004).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 78: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

77

Primeiramente, torna-se necessário apresentar a Comunidade de Itambi e sua

relação com o território em que ainda se localiza. Posteriormente, verificar-se-á o

local para onde a comunidade será re-territorializada, os motivos dessa mudança,

a opinião dos moradores de como vem sendo o processo (a des-re-

territorialização de uma maneira geral), para então buscarmos as resistências,

alternativas, estratégias de luta e sobrevivência, partindo de uma outra

racionalidade: a da comunidade em questão.

4.1. A Comunidade de Itambi

A comunidade de caranguejeiros está localizada em Itambi, distrito do

município de Itaboraí, situado na região metropolitana do Rio de Janeiro, na parte

leste da Baía de Guanabara. Itambi é a única área do município que tem ligação

com a baía, localizando-se no chamado “Recôncavo da Guanabara” (figura 5).

Figura 5: Representação esquemática do distrito de Itambi e da área do Manguezal de Itambi

Fonte: Adaptado PREFEITURA DE SÃO GONÇALO / PREFEITURA DE ITABORAÍ (2007).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 79: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

78

Uma importante característica do distrito é a presença de manguezais,

ecossistemas que representam uma área de transição entre o ambiente marinho e

terrestre. O manguezal de Itambi localiza-se na Área de Proteção Ambiental de

Guapimirim. A comunidade extrai recursos do manguezal para sua subsistência e

tem seus modos de vida relacionados com esse ambiente.

Os habitantes da Comunidade de Itambi, localizados especificamente na

chamada Bacia, são, predominantemente, catadores de caranguejo, e vivem em

casas próprias, muito simples, em ruas não asfaltadas (figura 6), de onde são

vistos os barcos normalmente parados à beira do rio, por detrás das casas (figura

7). O local se caracteriza por um ambiente familiar, em que todos se conhecem e

vários possuem algum parentesco, de modo que eles ajudam uns aos outros. Os

poucos que têm barco a motor saem com os que não possuem, normalmente em

quatro pessoas e “(..) eles mesmos que são os mecânicos do motor também, são

todos unidos” (Moradora J., 11/02/2010). Os catadores de Itambi saem para a

catação entre as 6 e 7 horas da manhã e retornam por volta das 5 horas da tarde,

realizando a captura dos caranguejos em horários da baixa-mar (Caranguejeiro

A.O, 20/12/2007).

Figura 6: Rua de terra na entrada da vila (à direita, as casas e ao fundo, um

campo de futebol)

Fonte: Arquivo Pessoal (27/07/2007)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 80: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

79

Figura 7: Foto realizada durante a entrevista com A. O. Casa do A.O.

localizada à direita. À esquerda, o barco utilizado para a coleta atracado

Fonte: Arquivo Pessoal (20/12/2007).

A maioria dos catadores são homens e as mulheres realizam os afazeres

domésticos. No local há uma deficiente infraestrutura; todavia, os entrevistados

caracterizam a região como calma e tranqüila, “aqui nós temos paz”

(Caranguejeiro S., 27/07/2007). A tranqüilidade e a segurança local são sempre

ressaltadas nas falas dos moradores:

(...) aqui a gente fica até tarde, todo mundo conversando, (...) a gente tem segurança, aqui é praticamente é uma família, um toma conta da casa do outro assim, não tem caso aqui de ninguém for assaltado aqui dentro, não teve roubo na casa de ninguém (Morador J., 16/09/2009).

Os caranguejeiros também não saem de suas casas para a venda do

caranguejo ou do pescado, sendo a comercialização realizada na própria Bacia.

(...) pessoal entra aqui dentro, o pessoal vende caranguejo aqui dentro, vem gente de tudo que é lugar pra comprar caranguejo aqui dentro, larga o carro aqui, entra lá pra dentro, vai comprar caranguejo, volta, o carro tá aberto do mesmo jeito que deixou, não acontece nada (...) ninguém sai daqui para lugar nenhum pra vender um caranguejo, vendo o caranguejo aqui, ali na frente, ali na pracinha, não vai pra Niterói, não vai pra São Gonçalo, vende aqui, o pessoal de São Gonçalo, de Niterói, do Rio, de Magé, vem tudo pra cá comprar caranguejo, porque o nosso caranguejo é o melhor que tem, é o maior e o melhor, vem todo mundo aqui

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 81: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

80

comprar, esse menino da casa de caranguejos lá das Charitas, Floriano, vem aqui comprar caranguejo do nosso mangue pra levar para casa deles comer, a gente não sai daqui pra poder vender, os garotos não saem daqui pra vender peixe, pra poder caranguejo, eles vendem dentro de casa, ninguém sai daqui pra vender nada (Moradora J., 11/02/2010).

No fim da rua, há um estabelecimento comercial. Observa-se, em frente a

esse estabelecimento, a partir das observações nas diversas visitas realizadas

durante essa pesquisa e pela fala dos próprios moradores, um local de encontro

tanto dos moradores como de pessoas de outras localidades que vão para a Bacia

comprar caranguejo. As pessoas ficam debaixo de uma grande mangueira

comendo caranguejo e consumindo bebidas do estabelecimento comercial.

(...) você senta aqui oh, adora essa árvore, todo mundo que vem aqui fica apaixonado, come caranguejo aqui de baixo, bebe, vai , fala que vai voltar mais vezes e volta, nada, melhor lugar que tem é aqui, tem até um colega da gente que mora lá em Visconde que fala ‘é aqui que o pobre vive, debaixo dessa mangueira, bebendo uma cerveja, comendo um caranguejo’ (Moradora J.A., 11/02/2010).

Além da mangueira (figura 8) verificam-se nos quintais dos moradores

plantações de abacate, laranja, goiaba, manga, banana, milho e aipim, assim como

criações de pato, galinha e porco.

Figura 8: Estabelecimento comercial (no fundo da figura) e alguns moradores sentados em sua frente debaixo de uma grande mangueira.

Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 82: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

81

Em seus horários de lazer, os moradores da comunidade se encontram

frequentemente na rua, onde as mulheres normalmente ficam em frente de suas

casas conversando uma com as outras e cuidando dos seus filhos e dos filhos de

outras moradoras que não estão presentes. As crianças normalmente estão

brincando, principalmente no campo de futebol. Outro ponto também destacado

nas falas dos moradores, principalmente pelas mulheres, é o campeonato de

futebol que ocorre uma vez por ano no local e que, segundo elas, é freqüentado

por pessoas de toda a região para participar e assistir.

Em outro trabalho73, em 2008, verificou-se o sentimento de apropriação e

identificação com os mangues nas falas de alguns habitantes da comunidade.

Percebeu-se que os caranguejeiros de Itambi possuem um vasto conhecimento da

biologia dos caranguejos, identificam os principais problemas dos manguezais e

entendem profundamente as modificações e transformações do ambiente ao longo

dos anos, já que o trabalho dos caranguejeiros, além de ser diário, é herança de

gerações anteriores, o que faz com que eles recebam, assim, conhecimento do

ambiente passado (MOYSÉS, 2008).

Além disso, os catadores relacionam diretamente a preservação desse

ecossistema com a conservação de suas atividades e acreditam contribuir para a

manutenção desse sistema. Compreende-se assim que a manutenção dos

habitantes da Comunidade de Itambi nos mangues é de fundamental importância

para a conservação desse ambiente, bem como o fato de a sobrevivência dessa

comunidade de catadores depender da conservação dos manguezais (ibidem).

Entretanto, além da instalação do COMPERJ e os seus previsíveis impactos

negativos nos manguezais, já abordados nessa dissertação, essa comunidade sairá

do território que vive atualmente para um conjunto habitacional juntamente com

                                                            73 Trabalho de monografia da Faculdade de Oceanografia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), orientada pelo sociólogo Gian Mario Giuliani do IFCS- UFRJ. A distância existente entre os conhecimentos científicos e os conhecimentos populares foi a preocupação que norteou o trabalho. A partir dos conhecimentos dessa população, discutiu-se o ciclo de vida do caranguejo e as influências naturais e antrópicas que interferem nesse animal e, conseqüentemente, nas condições de vida desses caranguejeiros. Com isso, ao entender a importância da participação da Comunidade de Itambi nos planos de manejo local e em estudos, tais como a época mais apropriada para o Defeso e instrumentos utilizados na captura mais adequados para preservação desse ambiente, percebeu-se a peculiaridade dos conhecimentos culturais dessa população para a conservação desse ecossistema, assim como o fato de a preservação desse ambiente ser fundamental para a manutenção dessa comunidade (MOYSÉS, 2008).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 83: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

82

outras famílias residentes na rua Levi Barroso e Vila do Campo, afastando-a dos

mangues e dos rios pela Rodovia BR-493 RJ.

4.2. A saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim: algumas considerações

A des-re-teritorialização (HAESBAERT, 2004) da Comunidade de Itambi é

interpretada de maneira distinta entre os diferentes agentes envolvidos nesse

processo, assim como são apontados diferentes motivos referentes à saída da

comunidade do território ocupado atualmente.

Nesse momento da pesquisa, apresentar-se-á então o projeto do PAC, no

qual está incluído o conjunto habitacional para onde os habitantes da comunidade

serão deslocados, e as opiniões tanto dos gestores do PAC envolvidos nesse

projeto, dos gestores das Unidades de Conservação envolvidas (APA de

Guapimirim e ESEC da Guanabara), assim como a interpretação da própria

Comunidade de Itambi.

Na figura 9, pode-se observar a área em que ocupam as três comunidades

(Bacia, Rua Levi Barroso e Vila do Campo)74 que serão deslocadas. Também

podem ser visualizadas as margens da Rodovia BR 493 RJ, que será duplicada, e

um segmento do Arco Rodoviário. A Vila do Campo, como destacam os gestores

do PAC e os habitantes da Comunidade de Itambi, é marcada pelo tráfico de

drogas.

                                                            74 É importante ressaltar aqui, para evitar confusões, que a quem o trabalho se refere como Comunidade de Itambi, o projeto que inclui o Conjunto Habitacional do PAC do Município de Itaboraí, se refere a essa comunidade, como Comunidade da Bacia (como o local é reconhecido dentro de Itambi e área que está inserida dentro da APA de Guapimirim), já que a rua Levi Barroso e a Vila do Campo também se encontram dentro do distrito de Itambi. Esse trabalho optou pela denominação de Comunidade de Itambi, devido a comunidade de caranguejeiros de Itambi já ser assim referenciada em outros trabalhos (ALBUQUERQUE, A.L., 2002; BOTELHO, 2003; MOYSÉS, 2008; PANDEFF, 2009; HERRERA, no prelo), pelo filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, por documentos (PLANO DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001; GIULIANI et al., 2005), em grupos de pesquisa (“Biodiversidade, Áreas Protegidas e Inclusão Social”-LATTES, CNPq, UFRJ; GeTERJ- PUC-RJ) e comumente reconhecida entre os membros dos conselhos gestores do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense (MMACF) e da APA de Guapimirim e ESEC da Guanabara (CONAPAGUAPI), dentro dos quais possuem representantes da comunidade.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 84: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

83

Figura 9: Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)

INTERVENÇÕES

Rua Levi BarrosoBacia

Vila do Campo

REASSENTAMENTO

Conjunto Habitacional

Centro Antigode Itambi

BR 493

Fonte: Apresentação do PAC [2008?]

Segundo uma apresentação do PAC do município de Itaboraí75, o projeto

conta com a remoção de 256 famílias de “áreas insalubres e/ou perigosas” e o

reassentamento delas em um conjunto habitacional dotado de infraestrutura, posto

de saúde e creche. Além disso, no local em que ainda habitam e no novo local

haverá abastecimento de água, drenagem e rede de esgotamento sanitário, estação

de tratamento de esgoto, centro comunitário, pavimentação, ciclovia e áreas de

lazer (figuras 10, 11, 12).

Esse projeto é mais detalhadamente explicado no Memorial Descritivo de

Intervenções - PAC76, o qual, como o próprio nome diz, tem como objetivo

descrever as intervenções urbanas:

1) Infraestrutura Urbana com implantação de sistema de esgotamento sanitário, drenagem, pavimentação e recuperação ambiental no Centro Velho de Itambi, com retirada de famílias nas favelas existentes as margens do Canal Tambicu (Bacia)/

                                                            75 Em formato de Power Point, que me foi enviada pelo o arquiteto e urbanista do Conjunto Habitacional do PAC. 76 Esse memorial, por sua vez, me foi entregue pelo chefe da APA de Guapimirim.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 85: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

84

Córrego dos Padres e Rua Levi Barroso, bem como famílias adensadas inapropriadamente na favela da Vila do Campo.

2) Reassentamento em Jardim Itambi, das famílias retiradas das áreas mencionadas acima, próximo também ao Centro Velho de Itambi, onde será implantado Conjunto Residencial para 256 famílias e também haverá uma readequação da infra-estrutura urbana com a implantação de sistema de esgotamento sanitário, drenagem e sistema de abastecimento de água. Sendo que estas intervenções também atenderão a população instalada no entorno.

3) Com a instalação de equipamentos comunitários como posto de saúde e creche, não só as áreas acima mencionadas serão beneficiadas como também todas as comunidades do entorno, algo entre 1.800 a 2.000 famílias. Será implantado ainda um centro comunitário que ajudará na qualificação e geração de renda para os pescadores e catadores de caranguejo.

4) As intervenções acima visam à requalificação espacial e reestruturação urbana (exceto abastecimento de água, uma vez que a área já é atendida pela CEDAE) do Centro Velho de Itambi. Após a retirada das famílias da Bacia e Rua Levi Barroso será realizada uma recuperação ambiental, não permitindo que estas ou quaisquer outras famílias ocupem tal área

Figura 10: Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de esgoto e drenagem (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)

INTERVENÇÕES

Rua Levi BarrosoBacia

Vila do Campo

INFRA-ESTRUTURA

Centro Antigode Itambi

Esgoto/ Drenagem

ETE

Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 86: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

85

Figura 11: Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)

INTERVENÇÕES

Rua Levi BarrosoBacia

Vila do Campo

INFRA-ESTRUTURA

Centro Antigode Itambi

Pavimentação

Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]

Figura 12: Imagem de satélite na qual se visualiza o local onde será realizada a recuperação ambiental e que está sendo construído o centro comunitário (área da Bacia, Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)

INTERVENÇÕES

INFRA-ESTRUTURA

Recuperação AmbientalPlantio de Espécies Nativas

Centro Comunitário

ETE

Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]

. Segundo o Arquiteto e Urbanista do PAC, as famílias que serão

reassentadas nesse conjunto habitacional receberão um documento de Seção de

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 87: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

86

Uso para fins de moradia, o qual substitui a escritura, mas não permite que essas

pessoas vendam seus imóveis. Na figura 13, podemos visualizar a maquete do

conjunto habitacional. Os apartamentos ficam de frente para a BR 493 e por detrás

se observa, no centro, a creche; à esquerda se localiza o posto de saúde e à direita

uma área de lazer que inclui um campo de futebol.

Figura 13: Maquete do Conjunto Habitacional Nova Itambi

Fonte: Parecer Técnico 53/207 Apa-Guapimirim, 13 de dezembro de 2007.

O primeiro documento oficial registrado nessa pesquisa que constatou a

saída dessa comunidade dos mangues para o conjunto habitacional foi o parecer

técnico 52/2007 APA-Guapimirim (13 de dezembro de 2007) o qual dizia que a

transferência estava associada à construção de uma estrada principal de acesso e

de outros acessos secundários que serão construídos e/ou recuperados para

viabilizar o transporte de equipamentos e matéria prima até o COMPERJ. O

parecer apresentava também as figuras 13 e a 14 deste trabalho. Por esse

documento, o espaço onde, atualmente, os caranguejeiros vivem (contorno

amarelo da figura 4.10), serviria, em parte, para as obras do Arco Rodoviário do

Rio de Janeiro (GIULIANI, 2007). As mesmas figuras constam na apresentação

do PAC do município de Itaboraí e me foram enviadas pelo chefe da APA de

Guapimirim.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 88: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

87

Figura 14: Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)

Fonte: Parecer Técnico 53/207 Apa-Guapimirim, 13 de dezembro de 2007.

A comunidade irá residir em apartamentos e não em casas como moram

atualmente. No parecer técnico destacamos que:

(...) segundo a presidente da Associação de moradores da Bacia, a maioria das pessoas está satisfeita com a implantação do projeto, pois trará uma boa qualidade de vida para todos, haverá uma recuperação ambiental (como cita o projeto) (...). Fomos informados de que apenas uma minoria de moradores está insatisfeita, isto é, são contrários a residir em apartamentos como prevê o projeto. (p.2)

Em uma entrevista realizada com o chefe da APA de Guapimirim no dia 03

de novembro de 2009, ele afirma que teria visitado a comunidade no fim de 2007

e que eles na época teriam se posicionado a favor. Entretanto, segundo os relatos,

os moradores da Bacia de Itambi alegam que não foram consultados

anteriormente e que foram apenas comunicados que seriam transferidos do local,

não tido acesso às informações, mesmo tendo representações junto ao PAC77.

Além disso, os gestores do conjunto habitacional do PAC afirmam, em

entrevista direta, que nenhuma obra do COMPERJ passará pela área da Bacia,

assim como o chefe da ESEC da Guanabara que afirma que a Petrobras teria lhes

enviado uma planilha com todas as suas intervenções e que nessa não constaria                                                             77 De acordo com A. O. , ele e mais dois moradores representam a comunidade nas reuniões do PAC (13/10/2008).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 89: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

88

nenhuma intervenção de infraestrutura na Bacia. A assistente social e o pedagogo

do conjunto habitacional do PAC afirmam ainda nem saberem da existência desse

parecer.

Já o chefe da APA de Guapimirim, também em entrevista direta, afirma que

esse parecer teve “valor mínimo” e que a saída da comunidade se deve a um

projeto antigo da Prefeitura de Itaboraí, mas que, com certeza, a chegada do

COMPERJ na região teria acelerado a execução desse projeto, já que segundo ele,

“qualquer obra que ocorre hoje na região está diretamente ou indiretamente

relacionada com o pólo petroquímico” (entrevista realizada em 03/11/2009).

Indiretamente é óbvio que o COMPERJ tem a ver; todos os empreendimentos que ocorrem na região, todo PAC da região, a âncora econômica, que tá orbitando em volta é o COMPERJ, o COMPERJ é o peso, que tá descendo e vai todo mundo acompanhando aquilo (Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009)

Como afirma Souza (2000), então, não é apenas o Estado (resposta óbvia

em principio) que planeja e gere as relações sociais, mas certos agentes

modeladores do espaço (como o grande capital industrial, no caso o

COMPERJ78), a partir de geoestratégias, não raro, sofisticadas (p.86).

Os gestores da APA e da ESEC ressaltam, então, que esse projeto do PAC

(que inclui o conjunto habitacional) é da prefeitura e não do IBAMA ou do

ICMBio. Segundo os próprios, o projeto se deve a um aspecto burocrático e

também pelo fato de que o local em que hoje está alocada a Comunidade de

Itambi “tecnicamente não ser uma área de moradia preferencial”. Dessa maneira,

eles, os gestores, teriam dado apenas a anuência ambiental para o projeto.

Contudo também enfatizam que o aspecto formal deles naquele local é

prioritariamente ambiental e não social e, dessa maneira, mesmo que a

comunidade se posicionasse contra, o órgão ambiental deveria se posicionar a

favor, já que seu foco deve ser o ambiental. Para os gestores,

(...) por fins da legislação é clandestina essa ocupação, como é que se regulariza essa ocupação clandestina? (...) o mecanismo que a Prefeitura procurou adotar é esse, realocá-los em uma área próxima onde pudesse ser oferecido equipamentos urbanos mais favoráveis, aliado com uma auto-declaração dessas populações, dizendo que as condições de habitação são precárias, é isso que a nossa análise foi feita (...) Se os moradores tivessem dito não quero sai daqui, se a Prefeitura dissesse ‘socialmente não vai ser bom’, mesmo assim (...) não caberia o Ibama na

                                                            78 O qual não deixa de ser também o Estado.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 90: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

89

época ou ICMbio agora poder negar um empreendimento dessa ordem (...) nosso aspecto ali formalmente é um aspecto ambiental ( Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009).

(...) E deixar claro quem é o empreendedor da obra, não somos nós (...) é a Prefeitura (...)a quem cabe a responsabilidade sobre a execução da atividade aí no caso foi a Prefeitura, a Prefeitura que recebeu a nossa anuência (...) anuência ambiental (Chefe da ESEC da Guanabara, 03/11/2009).

No decorrer dessa pesquisa, até setembro de 2009, os moradores da

Comunidade de Itambi informavam que consultores os visitavam falando a

respeito de indenizações para a mudança do local. A última empresa que teria

entrado em contato com eles, segundo os próprios moradores e os gestores do

Conjunto Habitacional do PAC, seria a empresa PLANAVE79.

A assistente social do conjunto habitacional em uma conversa informal

realizada no dia 16 de setembro de 2009, afirmou que até onde ela saiba o

COMPERJ não tem nada a ver com a saída da comunidade, e que estaria

envolvida em uma obra do PAC do município de Itaboraí. Acrescentou ainda que

não sabia que o COMPERJ também se constitui em uma das obras do PAC e nem

que o Arco Metropolitano estaria sendo viabilizado pelo COMPERJ, não

entendendo porque uma empresa terceirizada do COMPERJ estava na época da

entrevista fazendo uma pesquisa com a comunidade com “pranchetas na mão” e

que com isso “rolou um boato” que iriam indenizá-los. Por fim, então,

questionava: “por que indenizá-los se já há um projeto do PAC há dois anos

fazendo um conjunto habitacional para eles?”. Afirmou ainda que tentou contato

com as agentes sociais do COMPERJ, mas até aquele momento ninguém havia

retornado suas solicitações.

Já em outra entrevista com o arquiteto e urbanista responsável pelo PAC,

realizada no dia 28 de setembro de 2009, ele afirmava já ter orientado aos

consultores da PLANAVE para não falarem mais sobre indenizações, já que este

seria um “assunto extremamente delicado”; contudo, afirmou também que o Arco

Metropolitano se resumiria à duplicação da via e que não haveria nenhum corte

entrando em comunidades. O profissional acrescentou que:

                                                            79 Segundo o próprio site da empresa, a PLANAVE foi fundada em 1969, está localizada na cidade do Rio de Janeiro e é especializada na prestação de serviços de Consultoria e Engenharia. (Disponível em: <http://www.planave.com/index.htm.>, Acesso em 20 de março de 2010).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 91: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

90

(...) o que existe hoje, nós fomos procurados pela Petrobras, é um estudo da Petrobras, a construção de uma via especial, de uma via de transporte pesado, estão estudando esse entorno, que vai desde São Gonçalo nas margens da Baía de Guanabara (...) Guaxindiba, Itambi, aí vai subindo até Guapimirim, estão fazendo um estudo onde seria o melhor local para implantação desse fluxo de veículos pesados, que não poderiam passar veículos de transporte comum, para não atrapalhar o fluxo certamente do Arco Metropolitano (Arquiteto e Urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).

Dessa maneira, os gestores do PAC não associam em suas falas a saída da

comunidade com o COMPERJ, atribuindo a diversos outros motivos que vão

desde a proteção ambiental até as questões assistencialistas. Segundo esses

gestores, a comunidade abriga um lugar impróprio, de risco e sem infraestrutura e,

dessa maneira, a mudança desta para o conjunto habitacional é visto de maneira

positiva. A assistente social afirma que “lá eles vivem em uma miséria, e em uma

pobreza, lá eles não tem nada, aqui eles terão tudo” (16 de setembro de 2009).

Os gestores alegam ainda outros fatores para importância desse projeto do

PAC em seu todo. Segundo o arquiteto e urbanista, esse projeto também tem a

“vertente do trabalho do social tiração de trabalho e renda”:

(...) então a gente trabalha com essas pessoas assim, elas (...) têm baixo grau de escolaridade e qualificação quase zero, qualificação mínima, então eles pegam os serviços mais simples, semente joga, as mulheres ficam ociosas a maior parte de tempo, dessa maneira, com experiências no município que deram certo, artesanato com reciclagem, então nós contratamos essa pessoa, que faz um trabalho muito grande com a Petrobras, Vale, com essas empresas maiores que normalmente patrocinam esses eventos, então nos contratamos essa professora que veio aqui ensinou algumas técnicas de confecção de bolsa e já está dando retorno para algumas pessoas, já estão tirando do artesanato não o sustento, mas a contribuição de renda (...) trouxemos uma nutricionista para ensiná-los a reaproveitar os alimentos, eles desperdiçam muito(...) (Arquiteto e urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).

O mesmo gestor afirma ainda que além de arquiteto e urbanista é

engenheiro de segurança do trabalho e dessa maneira, o projeto procurou

aglomerar os serviços, de forma que evitasse que as pessoas saíssem do conjunto

habitacional e tivessem que atravessar a estrada BR, futura via do Arco

Metropolitano. Estariam assim também prestando um serviço de proteção:

(...) aqui a gente tem a creche, saindo dessa creche vai direto para escola e posto de saúde, tem tudo no Conjunto Habitacional (...) então na verdade estamos prestando um serviço de prevenção, até porque ele não tem que sair daqui (Arquiteto e Urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 92: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

91

Por fim, acrescentam a criação de uma ciclovia para impedir que outros

moradores se instalem no local em que a Comunidade de Itambi reside

atualmente. Dessa maneira, acreditam que esse projeto, além de aumentar a

qualidade de vida das comunidades que morarão no conjunto habitacional,

também aumentará a qualidade de vida dos moradores que vivem no entorno.

Pelas falas desses gestores, a cata de caranguejo e a pesca continuarão a ser

realizadas com a entrada do COMPERJ na região. Dessa maneira, os catadores de

caranguejo manterão seu principal meio de sobrevivência, ressaltando ainda a

construção do Centro Comunitário, que já está em obras. Segundo o arquiteto, “o

Centro Comunitário vai regularizar a venda do pescado e do caranguejo, porque

eles são informais” 80.

Os chefes da APA de Guapimirim e da ESEC da Guanabara ainda

relacionam a saída da comunidade com o COMPERJ, porém de uma maneira um

pouco diferente. Eles afirmam que o Conselho da APA de Guapimirim foi

expressamente contrário ao COMPERJ. O conselho foi “uma das poucas

instituições que se manifestaram expressamente contrárias ao COMPERJ; fomos

derrotados junto com o Ministério Público, que foi outra instituição que também

se manifestou contra”. O gestor da APA de Guapimirim continua assim sua

reflexão:

(...) dentro desse conjunto do COMPERJ que a gente tá tendo que corrigir e trabalhar por algo que não acreditamos e achamos que tá errado, então a estratégia é, vamos reduzir o mal, é um mal inevitável, a gente vê que tem poucas coisas positivas, pouquíssimas (...) a gente vê como positiva a realocação daquela comunidade pela auto-declaração que foi manifestada para nós (Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009).

A partir dessa visão, os gestores suspeitam que “seria pior se eles

permanecessem onde estão”. Afirmam ainda que, por uma “perspectiva histórica e

por outras histórias”, certamente a chegada do COMPERJ diminuirá a qualidade

                                                            80 O Centro Comunitário já era uma reivindicação antiga da comunidade como destacaremos mais adiante nesse capítulo. Contudo é importante destacar aqui que vários caranguejeiros de Itambi já são cadastrados, recebendo inclusive o DEFESO implementado em 2001, a partir de uma parceria entre a OSCIP IDM-Instituto de Desenvolvimento Municipal e a Prefeitura Municipal de Itaboraí, através da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente. O projeto tem como objetivo proteger os manguezais e promover programas voltados à sustentabilidade das populações de catadores de caranguejos. Além da proteção e preservação através da fiscalização, o Defeso tem como premissa a remuneração dos catadores de caranguejo nos períodos em que a captura é suspensa (MOYSÉS, 2008).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 93: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

92

de vida daquela região e, dessa maneira, não acreditam que aquele estilo de vida

tradicional poderá continuar. Seguindo esse raciocínio, a saída da Comunidade de

Itambi dos mangues onde se instalou seria uma tentativa de minimizar os

impactos na APA de Guapimirim, já previstos. Em outras palavras, como essa

comunidade está fadada a “desaparecer” (aqui caberia o termo

desterritorialização), pois já é um “fato concreto” a entrada do COMPERJ na

região, acabaria se forçando, da mesma forma, a comunidade a se deslocar em um

futuro próximo, já que essa certamente perderá os seus referenciais simbólicos e

seus recursos materiais de sobrevivência.

A saída da comunidade da APA de Guapimirim seria uma medida para

tentar impedir ou dificultar de certa forma que outras populações se instalem

nesse local, sendo assim uma medida para minimizar as futuras consequências

ambientais, ou seja, no fundo sua preocupação central ainda estaria na proteção da

natureza. Apesar disso, o chefe da ESEC da Guanabara ainda relaciona que a

saída deles do mangue irá aumentar a qualidade de vida desse grupo, já que,

segundo esse gestor, certos parâmetros referentes à concepção de qualidade de

vida são essenciais e inquestionáveis:

Do outro lado da história, são pessoas falando que aquela área lá não é uma área que as pessoas podem morar, né, aquela área lá é uma área insalubre também, né, que a expectativa dessas pessoas diminui por morar em uma área com saneamento deficiente, com certeza. Como é que chega a água pra eles lá? Como eles obtêm água potável? A solução seria urbanizar aquela área (...) água potável e saneamento básico (...) se você me falar aqui para mim que isso não influencia na expectativa de vida das pessoas, digo pra você, você precisa conhecer um pouco mais sobre a história do desenvolvimento da civilização, né, aí eu vou te provar por ‘ a’ mais ‘b’ que hoje nossa expectativa de vida subiu porque temos água potável e nossos dejetos são destinados corretamente, tá, isso é uma parte da história (Chefe da ESEC da Guanabara, 03/11/2009).

Observa-se assim, novamente baseando-se em Souza (2004), que esses

“sustentabilistas”, com o auxílio de categorias vagas, examinam a pobreza e os

conflitos sociais, “devendo-se a preocupação com a pobreza parcialmente à sua

usual característica de ser um fator de degradação ambiental”. Nesse pensamento,

o “desenvolvimento sustentável” equivaleria à modernização combinada com

proteção ambiental. Não se avança assim para além de aspectos morais, apostando

ainda em um “Estado tipo keynesiano, que seja capaz de regular a expansão

urbana e investir na preservação do meio ambiente” (p.70).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 94: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

93

Contudo, ainda segundo o autor, ressalta-se aqui, que estratégicas de âmbito

municipal, não podem perder de vista que mesmo atividades econômicas “pouco

importantes” ou mesmo residuais, podem ter importância social assaz significativa

(p.78).

Por outro lado, então, os moradores da Comunidade de Itambi também

interpretam de formas diversas os motivos que levaram/levarão à saída de seu

território de vida, convivência e sobrevivência. Observam que isso se deve tanto a

uma questão ambiental, de proteção da APA de Guapimirim, como por questões

assistencialistas, por alegarem que estão em uma área de risco, sem

infraestrutura... Eles relacionam, ainda, em diversas falas, a saída deles com o

COMPERJ. A moradora J., em uma entrevista realizada dia 11/02/2010, afirmava

que eles terão que sair de seu território atual, “porque eles têm interesse aqui, né”,

segundo a moradora, todos lá têm conhecimento que irão sair, “porque o ônibus

da Petrobras vai passar por aqui”.

Entretanto, todos os motivos acima interpretados pela comunidade

referentes à sua saída dos mangues para o conjunto habitacional são questionados

nas falas dos próprios moradores. Da mesma forma, a comunidade compreende

que a entrada do COMPERJ na região afetará negativamente os mangues e,

consequentemente, tanto suas atividades de sobrevivência, círculo de convivência

e solidariedade, como suas áreas de lazer.

Pelos depoimentos dos gestores do PAC envolvidos na construção do

conjunto habitacional, assim como dos gestores das UCs envolvidas, observaram-

se vários juízos de valores colocados como universais.

Entende-se, entretanto, que os agentes sociais que elaboram estratégias de

ação e intervenção do território devem desafiar e buscar ultrapassar o senso

comum ao interrogar o não interrogado, duvidando de certezas não-questionadas.

Ao mesmo tempo, também não se pode simplesmente ignorar os saberes locais

dos homens e mulheres concretos, como se as aspirações e necessidades destes

devessem ser definidas por outros que não eles mesmos (SOUZA, 2000a, p.87).

A partir disso, então, torna-se importante averiguar nesse momento entre os

moradores da comunidade o processo que essa população vivencia em suas

múltiplas dimensões, econômico-política e simbólico-cultural. Busca-se

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 95: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

94

compreender esse processo então desde o sentimento de perda de seus referenciais

simbólicos até do próprio controle do território e de seus meios de sobrevivência

para pensar, a partir das experiências dos sujeitos envolvidos, outras

racionalidades para projetos de gestão na localidade.

Essa pesquisa, portanto, não pretende estabelecer prioridades e definir as

metas e objetivos em nome da Comunidade de Itambi. A partir de Souza (2004),

baseado em Paulo Freire (1986), essa pesquisa busca, sob um ângulo dialógico,

então chamar atenção daqueles cuja autonomia deve ser respeitada e estimulada

(p.179-180).

Analisar-se-á a seguir a evolução da situação identificada desde meados do

primeiro documento oficial referente à saída da Comunidade de Itambi, de

novembro de 2007 a fevereiro de 2010.

4.3. As múltiplas dimensões do processo de saída vivenciado pela Comunidade de Itambi

O chefe da APA de Guapimirim acredita que houve uma “variação temporal

da perspectiva” da Comunidade de Itambi, já que, como relatado anteriormente,

ele diz ter escutado dos próprios moradores, ao visitar a comunidade, que eles

estariam satisfeitos com a mudança para o conjunto habitacional; contudo, ressalta

que teria conversado com apenas um grupo de moradores.

No primeiro momento em que os moradores se manifestaram sobre a

possível saída da comunidade da Bacia, no fim de novembro de 2007, a maioria

dos catadores manifestou o seu medo. Ao falar sobre esse assunto, muitos deles

diziam não saber nada direito sobre o assunto, entretanto vários já se queixavam.

O caranguejeiro F.I., o único que falava naquele momento um pouco mais

abertamente sobre o assunto, em uma entrevista realizada em 04/12/2007,

afirmava que se “a Prefeitura e a Petrobras querem que a gente saia, o que você

acha? Se não fizer um acordo você pode sair prejudicado; é praticamente

obrigatório, mas também não vou aceitar qualquer coisa”.

No segundo semestre de 2008, toda a comunidade já falava mais

abertamente sobre esse assunto. Os moradores afirmavam que foram apenas

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 96: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

95

comunicados de sua saída, não tendo nenhuma participação na decisão desse

projeto. As queixas dos moradores eram diversas e em todos os depoimentos

observaram-se insatisfações, receios e medo. O caranguejeiro C. acrescentava,

naquele período, que as opiniões estariam sendo diversas, e que ele tinha medo

“de abrir a boca e se queimar sozinho” (13/10/2008). As mulheres perguntavam

onde colocariam suas galinhas, lavariam suas roupas... Dona M. acreditava ainda

que o campeonato de futebol realizado uma vez por ano iria acabar e acrescentava

que gostava de morar lá, já estava acostumada e não queria sair (a figura 15

mostra o campo de futebol da comunidade e a figura 16 mostra os varais nas

casas). Além disso, afirmava que já haviam sido informados pelos gestores do

conjunto habitacional do PAC (pedagogo, assistente social e arquiteto e urbanista)

que eles já estavam proibidos de fazer novas construções. Como exemplo, me

citava seu filho que acabara de casar e não tinha onde morar com a mulher, me

mostrando os materiais de construção que o filho já havia comprado para levantar

uma casa ao lado da sua.

C. reclamava das novas moradias (mudar para prédios) e achava que os

moradores deveriam receber uma indenização para que cada um morasse onde

quisesse. Ele me mostrava a casa “espaçosa” que já havia conquistado o quintal

com as árvores, a sombra conquistada81, não acreditando que iria encontrar isso

no prédio e que, além do mais, ele ainda teria que conviver com estranhos.

O caranguejeiro A.O., um dos representantes do PAC, alegava que a

comunidade deveria ficar nas proximidades, de preferência em casas, “mas

alegaram falta de terra” (13/10/2008). Acrescentava que naquele momento os

pescadores ainda não cadastrados, estariam sendo cadastrados e que alguns

comunitários ainda relutavam em se cadastrar. Porém, o caranguejeiro afirmava

que naquele momento, tentava convencê-los, esclarecendo as dúvidas legais e a

importância desse cadastro para que assim pudessem ter força para atuarem na

busca de certos direitos que eles achassem necessário reivindicar futuramente.

Pelas interpretações do caranguejeiro, as políticas públicas que estavam em

andamento no município de Itaboraí, especificamente o projeto do PAC do

município de Itaboraí que conta com a saída dessa população dos mangues e a

entrada do COMPERJ no município, certamente afetarão suas atividades                                                             81 Grafado no texto, porque o Caranguejeiro destaca essa conquista em sua entrevista.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 97: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

96

econômicas (cata de caranguejo, siri, pesca), salientando assim a importância do

cadastro.

Figura 15: Crianças brincando no campo de futebol de Itambi

Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008).

Figura 16: Varais de roupa na comunidade

Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008).

Já no segundo semestre de 2009, as obras do PAC já eram visíveis em

Itambi, principalmente na Bacia. Os ônibus já não entravam mais na vila,

passando apenas na BR-493. A obra do Centro Comunitário já havia começado e

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 98: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

97

a creche e o posto de saúde do conjunto habitacional já estavam prontos em

outubro daquele ano (figuras 17 a 20).

Figura 17: Rua transversal a entrada da rua da comunidade, na qual já pode ser observado canos da CEDAE e a direita da foto as obras já iniciadas do Centro Comunitário

Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)

 

Figura 18: Creche do Conjunto Habitacional já finalizada

Fonte: Arquivo Pessoal (28/09/2009)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 99: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

98

Figura 19: Posto de saúde do Conjunto Habitacional já finalizado

Fonte: Arquivo Pessoal (28/09/2009)

Figura 20: BR-493: uma via do Arco Metropolitano

Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)

Contudo, os moradores continuavam a se queixar e estão ainda mais

receosos com a perda de se seus referenciais simbólicos, do lugar de abrigo,

proteção e sobrevivência. O morador J. destaca que com o início das obras no

local, ele estaria mais inseguro, afirmando que duas colegas suas já haviam sido

assaltadas no caminho entre a BR e a comunidade, o que não era comum no local.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 100: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

99

Além disso, vários moradores me alertavam não visitá-los em dias de chuva, já

que lá nesses dias estaria ficando “pura lama”.

Com o início das obras do Centro Comunitário, algumas casas da

comunidade já tinham sido afetadas, como a casa da moradora J. B. que mostrava

que parte do seu quintal, juntamente com o seu abacateiro, já havia sido tomada

(figura 21).

Figura 21: Quintal da moradora J.B. À direita, a construção do Centro Comunitário e parte do abacateiro cortado

Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)

Um morador da Comunidade de Itambi que trabalha nas obras do Centro

Comunitário se diz receoso em dar entrevistas em dias de obra, pedindo para que

eu voltasse no final de semana. Além disso, pediu ainda para que não se tirasse

fotos dentro das obras do Centro Comunitário, acreditando que se o responsável

da obra chegasse, ele poderia se prejudicar. Entretanto, os outros moradores da

Comunidade de Itambi não estão trabalhando nas obras, já que segundo eles, os

moradores que possuem o cadastro de pescador não poderão receber a

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 101: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

100

aposentadoria de pescador82 se trabalharem com carteira assinada em outros

serviços.

De outubro de 2009 até fevereiro de 2010, última parte do trabalho de

campo dessa pesquisa, os moradores continuavam a questionar a saída deles do

local e os motivos dessa mudança para o conjunto habitacional. Algumas

mulheres afirmavam que não iriam sair, mas segundo elas mesmas, as casas delas

seriam derrubadas “mesmo com elas dentro”.

Eu só tenho uma coisa a dizer: eu não tô querendo sair da minha casa para ir para lá não, mas acho que a gente vai ter que obrigado a sair, né, se não sair eles derrubam a casa com a gente dentro, falaram (Moradora J.B, 16/10/2009).

 

Os moradores ainda se queixam das taxas que terão que pagar inclusive a do

condomínio do conjunto habitacional. Além disso, a mudança de casa para

apartamento, assim como o tamanho dos apartamentos do conjunto, é criticado

por todos os moradores entrevistados durante esse período. Os moradores

afirmavam que terão que se desfazer de vários móveis, porque eles não caberão no

apartamento, lembrando que as novas habitações serão por família, e que existem

algumas que são formadas por 5, 6 filhos. C. define os apartamentos como

“casinhas de pombo”, acrescentando: “a gente vai criar porco, galinha tudo dentro

de caixa” (16/09/2009).

Dona J. B. acredita que não terá de onde tirar dinheiro quando se mudar para

o conjunto habitacional. A moradora afirmava que sempre mexeu com caranguejo

e que hoje ela cozinha em seu fogão de lenha os caranguejos, vendendo-os no

local; lembra ainda do pé de abacate e de laranja que possui em seu quintal e que

perderá. Dessa maneira, observa que a transferência e o tamanho do apartamento a

ser habitado são problemas para continuar suas atividades de geração de renda.

Eu não to gostando não, não tô querendo sair da minha casa para ir pra lá não, porque aqui eu moro bem, tenho o meu ganha pão, que eu cozinho meu siri ali no fogão de lenha, cozinho meu caranguejo, descarno, entrego o moço, o moço me paga, agora vou cozinhar isso aonde lá? Dentro do apartamento não tem como, né? (Moradora J.B., 16/10/2009).

                                                            82 Nessa pesquisa, identifiquei dois senhores que moram na Bacia que recebem aposentadoria de pescador.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 102: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

101

Diversos moradores criticam o fato de não terem opinado sobre esse projeto,

já que eles são os principais afetados. A moradora J.B, neste sentido, questiona os

motivos assistencialistas vistos anteriormente e não entende as justificativas para a

transferência deles para o conjunto habitacional: “Se eles tão pensando que é pra

melhorar a gente, tá pior, tá saindo do que é nosso... esse tal de condomínio não

vai adiantar de nada, pra mim não tá me dizendo nada” (16/10/2009).

As medidas implementadas com “a finalidade do bem” por outros atores

sociais para a comunidade (DEMATTEIS, 2008), assim interpretadas pelos

gestores do Conjunto Habitacional do PAC no município de Itaboraí e das UCs

envolvidas, são assim criticadas pela própria comunidade:

As pessoas que não vivem aqui dentro, que não convivem aqui dentro, têm uma visão totalmente diferente, eu acho que eles lá de fora que fizeram esse projeto tem uma visão de miséria pra gente aqui e não é isso, é uma coisa totalmente diferente, todo mundo aqui tem suas casas, todo mundo aqui tem a sua vida, né, todo mundo tem o seu trabalho, ninguém aqui passa fome igual, tem lugares que é muito pior, tem pessoas que precisam muito mais, eu não tô falando que nós não precisamos, até o fato assim, se eles limpassem o rio, fizessem uma pavimentação aqui nesse lado, sei lá, ajudasse a gente a melhorar a fachada da casa, que seja, eu acharia que seria muito mais vantagem do que sair a gente daqui para lá, entendeu? (Morador J., 16/10/2009).

A moradora J. ressalta que os moradores deveriam ter participado da

elaboração do projeto, não acreditando que estejam saindo de lá por qualquer

motivo assistencialista. Afirma que o principal motivo ainda seja por aquele local

interessar a Petrobras.

O que deveria que ser feito, eles primeiro tinham que perguntar pra gente se a gente queria casa ou apartamento, tinham que perguntar, não é chegar com um projeto tudo pronto e falar assim ‘o projeto tá aqui, vocês vão sair pronto e acabou’, eles deviam saber nossa opinião, mas eles não quis saber nossa opinião, falaram que a gente mora em área de risco, que área de risco que a gente mora? Que dá chuva, dá tempestade e o rio da gente não alaga, não morre ninguém, cadê a área de risco que a gente mora? O rio da gente nunca encheu, a gente não mora em área de risco não, as crianças brincam aí direto até meia noite, onze horas da noite, a única coisa de risco que tem aqui é o maruim, mas não mata criança alguma, que é o mosquito, as crianças tá tudo aí, cresce, tá tudo aí, não tem área de risco nenhuma, só porque a gente mora na beira de um rio é área de risco? Área de risco é lá em São Paulo que já tem lá dois meses lá que o Rio Tietê tá cheio lá, mora no centro da cidade, a gente não, a gente mora aqui na roça, mas o rio da gente não enche, nunca teve uma enchente desde que eu moro aqui, a mais de vinte anos, que área de risco? Vai tirar a gente da área de risco, quero saber aonde ta área de risco, qual foi o dia que eles viram sair no jornal que aqui alagou e que morreu alguém afogado, ou inundado, ou aterrado, tem área de risco nenhuma, é porque eles tão querendo

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 103: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

102

mesmo tirar a gente daqui por causa desse negócio da Petrobras que vão passar por aqui, o interesse mesmo é tirar a gente (Moradora J., 11/02/2009).

Da mesma maneira, os moradores criticam o fato de terem que sair do local

para a proteção da APA de Guapimirim. Em todas as visitas realizadas na

comunidade, eles afirmam não serem os responsáveis pela poluição e

desmatamento dos manguezais, lembrando que a subsistência deles está

diretamente relacionada aos mangues e que eles ainda colaboram para a sua

conservação, ponto verificado também em trabalho anterior (MOYSÉS, 2008)83.

A comunidade, ao questionar o motivo da saída para a proteção da APA de

Guapimirim, relaciona-o diretamente com a entrada do COMPERJ na região,

identificando assim contradições nesse argumento ao observar que o COMPERJ

trará significativos impactos para os mangues:

O COMPERJ vai acabar com o mangue, como é que teve aí o derramamento de óleo aí que teve aí, o trem descarrilou aí, acabou com o mangue, os garotos que ninguém deu uma assistência nenhuma, não recebeu uma indenização nenhuma, foi só 300 reais que eles deram para poder calar a boca dos outros, e acabou, os freguês sumiram tudo porque falaram que os caranguejos da gente tava tudo contaminado, passamos um perrengue e ninguém veio ajudar a gente, ninguém veio ajudar a gente e isso que aconteceu, e eles vão fazer o quê? Acabar de estragar o mangue, depois diz o quê? Que é o caranguejeiro que estraga o mangue, o pescador, como é que vai estragar se é dali que ele arranca o sustento? Ele? A gente vive muito bem, não tem caranguejo, os garotos catam pet dentro do mangue pra poder vender, traz, o caminhão pega tudo, de garrafa pet pra poder vender, eles ainda tão ajudando, fazendo um favor ainda, o pessoal tá revoltado mesmo de ter que sair daqui, ninguém quer sair (Moradora J.A., 11/02/2010).

A população de caranguejeiros, dessa maneira, em suas falas, não acredita

que eles sentirão os benefícios divulgados pela Prefeitura de Itaboraí e Petrobras

do desenvolvimento via COMPERJ. Ao contrário disso, a comunidade teme pelas

futuras consequências desse empreendimento nos mangues que afetarão

diretamente suas atividades produtivas, sua relação com a natureza exterior, e pela

possível perda de seus referenciais simbólicos. Além disso, os moradores também

acreditam que a entrada do COMPERJ no município afetará suas relações de

vizinhança e diminuirá a segurança local.

                                                            83 Foram verificadas em trabalho anterior (MOYSÉS, 2008) atividades dos caranguejeiros que contribuem com a conservação dos mangues da APA de Guapimirim: catam garrafas pet, evitam cortar galhos de mudas e novas ramagens, plantam a vegetação de mangue por conta própria, não catam fêmeas e em período de desova, entre outros.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 104: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

103

O morador J. ainda diverge da opinião dos gestores de que a saída deles do

local seria uma medida mitigadora dos futuros danos do COMPERJ:

O COMPERJ vai ser uma coisa para Itaboraí crescer (...) empreendimentos, emprego, vai ser um pouco difícil porque é como todo mundo fala, marginalidade, enfim várias coisas, com certeza vai ter crescimento de população irregular, em todo lugar tem, eles não vão conseguir controlar, então tirando a gente daqui não adianta nada, vão se formar em outros lugares, outras pessoas virão e vão fazer casa, por exemplo, tem um barreiro ali, aí vem um, vem mais um,daqui pouco tá povoado aquilo ali, vira uma favela, o que eles vão fazer ali? Vão fazer igual tão fazendo do rio, pegam a casa das pessoas, deixam elas sem casas e destrói tudo? (...) A meu ver eu acho que não teria necessidade da gente sair daqui, no meu entendimento, eu penso assim, agora eles pensam diferente, quem somos nós para julgar, né? (Morador J., 16/10/2009).

Apesar de discordar da saída da comunidade por motivos relacionados à

preservação da APA de Guapimirim, o morador sugere que mesmo que a opinião

da Prefeitura ou dos gestores da APA de Guapimirim e da ESEC fosse essa, eles

ainda teriam alternativas como as de “fazer uma educação ambiental com todos nós”.

Muitos moradores assim ainda acreditam que a entrada do COMPERJ seja

de fato o principal responsável pela saída dessa população de seu território de vida

e se mostram receosos com a saída do seu lugar de vida, convivência e

sobrevivência juntamente com os já previsíveis impactos do COMPERJ.

Os moradores da Comunidade de Itambi então muitas vezes interpretam que

a saída deles dos mangues juntamente com a entrada do COMPERJ no município

pode resultar no “desaparecimento” dessa comunidade. Em outras palavras, pela

conjuntura maior do processo vivenciado no município (o COMPERJ), a

comunidade teme que a perda do território signifique o “fim da comunidade”

(HAESBAERT, 2007). Percebe-se que nesse momento entre os moradores da

comunidade uma afirmação e uma reivindicação pela identidade territorial

(HAESBAERT, 2007a).

Observa-se também que os fins das políticas públicas que os afetam

diretamente não estão claros para a população de caranguejeiros de Itambi.

Defende-se, contudo, baseando-se em Souza (2004), consoante o enfoque

autonomista, que os agentes sociais que elaboram estratégicas de intervenção e

ação no território, não podem simplesmente reivindicar, sentir e pensar em nome

da população que será afetada por essas políticas de intervenção, “presumindo a

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 105: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

104

racionalidade e a universalidade de suas próprias inclinações, de seus próprios

gostos e suas próprias necessidades” (p.179).

Segundo o mesmo autor, o usuário de um produto e não o expert que o

concebeu ou produziu é o legítimo juiz de suas qualidades, certamente, “esse juiz

não é infalível, mas é seu direito correr o risco de falhar em liberdade84” (SOUZA,

2000a, p.87).

4.4. As expectativas da reterritorialização da Comunidade de Itambi no conjunto habitacional

Nesse momento se verificará qual a opinião dos moradores da Comunidade

de Itambi sobre o projeto do PAC (em seu todo) em que eles estão incluídos.

Compreender-se-ão os juízos de valor da própria comunidade, ou seja, qual a

concepção de qualidade de vida dessa população e até que ponto esse projeto

aumentará ou diminuirá a qualidade de vida dos mesmos.

A perda de seu território é compreendida como um sentimento de incerteza

quanto ao futuro dos habitantes. Entretanto, essa incerteza está baseada, muitas

vezes, em algumas certezas dos moradores quanto à saída da comunidade dos

mangues para um conjunto habitacional, que fica às margens da BR-493, futura

via do Arco Metropolitano. Da mesma maneira, esse sentimento de perda traz a

indignação da comunidade de que o projeto lhes foi imposto sem ser questionado

e como lhes está sendo atribuídas culpas que sabem não serem deles. Os

moradores identificam ainda algumas contradições entre algumas das

justificativas referentes à saída deles dos manguezais e o processo maior que está

ocorrendo na região. Ou seja, ao mesmo tempo em que se explica que a saída

deles ocorrerá para a proteção da APA de Guapimirim, está havendo a entrada do

COMPERJ no município de Itaboraí.

Os habitantes da Comunidade de Itambi identificam, contudo, alguns pontos

positivos das intervenções desse projeto. O próprio Centro Comunitário já era

uma reivindicação antiga da comunidade. Desde meu primeiro contato com a

comunidade, no início de 2007, os caranguejeiros já diziam lutar a algum tempo                                                             84 Grifos do autor Souza (2000a).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 106: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

105

para a construção no local de um lugar onde eles pudessem armazenar e vender os

caranguejos e o pescado de maneira geral, assim como guardar diversos materiais

realizados na coleta, que são propostas do Centro Comunitário, além da venda de

artesanato. Ainda não parece definido se a gestão do centro será entregue para a

Associação dos Moradores da Comunidade de Itambi ou para Associação dos

Pescadores de Itambi- Itapesca. Entretanto, sua construção, apesar de alguns

receios por parte de alguns moradores, de uma maneira geral, é destacada como

ponto positivo do projeto. Outros pontos destacados são a construção do colégio

(creche)85 e do posto de saúde, que serão ocupados, como postos de trabalho,

preferencialmente, pelos moradores do conjunto habitacional.

A moradora J.A. afirma já estar trabalhando como merendeira no colégio e

uma amiga sua, também da Comunidade de Itambi, como professora. Observa

ainda que a AMPLA86 e Petrobras também afirmaram que dariam preferência aos

moradores do conjunto em outros serviços para complementação da renda e que

os moradores que trabalham no colégio ou no posto de saúde têm que,

necessariamente, voltar a estudar. A moradora entrevistada, mesmo afirmando não

gostar de estudar, vê essa obrigação “de forma positiva”, já que acredita que isso

seja um incentivo para poderem terminar os estudos.

Eles dão preferência pra gente, que nem agora o colégio tá funcionando, aí o pessoal do PAC veio aqui pediu pra gente lá colocar currículo que eles iam dá preferência pro pessoal que vai morar lá, pra poder trabalhar lá, poder trabalhar na creche, porque lá tem a creche, tem o colégio e tem o posto de saúde, então eles tão dando preferência pro pessoal da localidade que vai morar lá, a gente bota o currículo, aí eles vê lá o nome do pessoal que vai morar, aí eles tiram o pessoal que vai morar pra poder trabalhar, o pessoal da AMPLA também, eles falaram que era pra gente poder pegar o currículo e levar lá em cima que eles iam dá preferência pro pessoal que tá morando na comunidade, eles querem dá um serviço pro pessoal que é da comunidade, pra poder não ficar só vivendo da renda do caranguejo, o pessoal da Petrobras falou pra gente ‘todos os serviços que vir todos os benefícios que vir, primeiro lugar vai pro pessoal que vai morar lá em cima, a gente quer que o pessoal que vai morar lá em cima, o pessoal que vai sair da comunidade, a gente quer dar preferência pra vocês’, inclusive eu estou trabalhando no colégio, como merendeira (....) só que eu não to gostando muito porque eles colocaram para eu voltar a estudar, tive que lá fazer a matrícula pra voltar a estudar, também tão

                                                            85 De acordo com os gestores do Conjunto Habitacional do PAC, o colégio irá até o primário, mas existem projetos com o intuito de incluir o Ensino Fundamental e posteriormente o Ensino Médio. 86 De acordo com o site da própria empresa, a Ampla Energia e Serviços S.A distribui energia para 66 municípios do Estado do Rio de Janeiro (73% do território estadual). A Região Metropolitana de Niterói e São Gonçalo e os municípios de Itaboraí e Magé somam a maior concentração de clientes da distribuidora (Disponível em: <http://www.ampla.com/>, Acesso em 18 de março de 2010).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 107: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

106

botando todo mundo pra voltar a estudar, também é até um incentivo de botar o pessoal de poder terminar, voltar ao estudo, terminar, né (...) é até uma coisa boa, mas eu não sei se vou agüentar a terminar não (Moradora J.A., 11/02/2010).

Entretanto, a mesma moradora acredita que o projeto, de uma maneira geral,

é negativo, principalmente devido à saída deles de seu território de vida atual para

os novos apartamentos. Ela entende ainda que esta complementação de renda é

mais do que necessária, porque no conjunto eles terão muito mais gastos do que

nas casas. Dessa maneira, não apenas a moradora J.A., mas os outros moradores

têm muitas queixas em relação à saída deles. Entre essas queixas, eles identificam

as contradições nas falas dos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e das

UCs. Para eles, a ideia de qualidade de vida para esses gestores, ou seja, do que

realmente a comunidade entende que seja o melhor para eles, é muito diferente do

que os moradores realmente almejam.

Pontos essenciais e “verdades absolutas” encontrados nas agendas sociais

desses gestores como sendo ideais comuns e almejados por todos divergem de

alguns valores, interesses e necessidades, ressaltados pelos habitantes da

Comunidade de Itambi. A segurança, a convivência, a solidariedade, a sua relação

com a natureza exterior, assim como outros referenciais simbólicos os fazem

acreditar, nesse momento, que a Bacia seja um dos melhores lugares de se morar

na região. Contudo, a comunidade acredita que certas mudanças são necessárias,

mas que os moradores deveriam participar dos processos decisórios dos projetos

que intervêm na realidade dos mesmos.

Tá certo que a gente não tem um saneamento básico, não tem uma água encanada, mas isso daí a gente se vira, dá o nosso jeito, o melhor lugar que tem de se morar dentro de Itambi é aqui na Bacia (Moradora J.A, 11/02/2010).

O morador J. relaciona o que estão vivenciando com outro caso que teria

assistido na televisão e já aponta certas mudanças na região com a entrada do

PAC, acreditando que quando mudarem para o conjunto habitacional tenderá a se

agravar:

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 108: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

107

(...) esses dias eu estava vendo uma área lá na Amazônia e as pessoas chorando porque vai vir uma hidrelétrica enorme para aquele lugar (...) pessoas chorando com história de vida, pescadores, enfim, pessoas assim que nunca pensaram, quem aqui de nós falar ‘já pensava que isso ia acontecer’, é mentira, porque eu, se eles me chamassem para mim, J., para eu aprovar um projeto desses eu não ia aprovar, eu seria contra, nessas condições eu seria contra com certeza,quem assinou esse projeto (...), eu acharia que eles deviam conversar com a população daqui, que mora aqui, da Bacia, ‘o que vocês acham?’. Agora eles tem a casa deles, tem a mansão deles, tem um bairro bom, tudo asfaltado, acham que é melhor, ao meu ver eu acho que não é melhor não (...) a obra do PAC parou aqui dentro, os ônibus não passam aqui dentro, as pessoas estão sendo assaltadas nessas duas entradas, lá em cima e aqui, porque tem que saltar aqui para vir para cá (...)algumas pessoas se aproveitam, alguns marginais se aproveitam dessas condições (Morador J., 16/09/2009).

O morador J. acredita que irão perder muitas das coisas que já estão

acostumados, dentre as quais a segurança. Ressalta os laços de convivência e

solidariedade existentes na comunidade e suas possíveis perdas, assim como a

perda de suas referências; “eles deveriam pensar melhor o que estão fazendo

conosco, a referência do caranguejo é a Bacia” (16/09/2009).

As mulheres observam que irão morar na beira da auto-estrada frente ao alto

índice de acidentes que todos sabem possuir aquela região87 e se mostram

preocupadas com as crianças que estão acostumadas a brincar sozinhas. Ressaltam

ainda as diversas plantações existentes nos seus quintais, além da criação de

                                                            87 Na ata da audiência pública da BR 493, realizada 11 de fevereiro de 2009 a insegurança da estrada é destacada nas falas de todos os participantes da audiência. Um dos gestores responsáveis pelo EIA da duplicação da estrada afirma que em 2001 todo o tráfego de caminhões foi desviado para a BR 493, devido à limitação de tráfego de veículos pesados na ponte Rio- Niterói, sendo assim o único acesso ao norte do estado. Além disso, afirma que a rodovia atualmente conta com muitos problemas estruturais. Acrescentando outros motivos que levam a insegurança da rodovia: “Ela tem sete metros de largura, tem trechos de acostamento pavimentados, outros não pavimentados, muitos deles tomados por vegetação, cruzando as áreas urbanas de Magé e Itambi (...) toda circulação de pessoas, o tráfego local, travessia de ônibus, carros, tudo é feito pela rodovia que piora muito suas condições de tráfego, de segurança e a sua velocidade média, que está entorno de 50 km/h. A gente vê como o tráfego é misturado, você vê uma carroça passando bem na área urbana num ponto onde o limite de velocidade é de 50 por hora. Tem trânsito pesado de caminhões, a quantidade de caminhões que trafega pela rodovia é muito grande” (p.6). O mesmo gestor, contudo, afirma que com a duplicação da via dentre os impactos negativos, encontra-se o aumento do risco de acidentes, “na verdade aumento da fatalidade desse acidente é porque a velocidade vai ser maior, e a indução de processos erosivos também” (p.11). O engenheiro civil e sanitarista do Instituto Estadual do Ambiente, o INEA, também ressalta o risco de acidentes na rodovia e o aumento desses acidentes com a duplicação da via, acrescentando: “A BR 493 apresenta um tráfego de veículos pesados como já foi apresentado nos levantamentos e que transportam cargas perigosas. Quando será intensificado ainda com a instalação do COMPERJ em Itaboraí” (p.16) (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audit_public_br493.pdf>, Acesso em 20 de março de 2010).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 109: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

108

certos animais, acrescentando que quando forem desalojados terão que comprar

todos os produtos de consumo básico, principalmente os alimentares.

A importância das árvores ultrapassa a necessidade material e também é

vista muitas vezes de maneira simbólica. O medo da perda da grande mangueira e

de sua representação para a comunidade é salientada em diversas falas: é o lugar

da sombra, do encontro, da conversa, onde se come o caranguejo, onde se bebe a

cerveja; para muitos, o melhor lugar da Bacia. Todos os entrevistados ressaltam o

fato de que no conjunto habitacional não haverá árvores e, mesmo com os

gestores do PAC afirmando que irão plantar, afirmam que “terão que ficar

trancados nos apartamentos até as árvores crescerem”.

Além das árvores, os moradores temem pela perda do campo de futebol e

áreas comuns de circulação. “Eles dizem que o campo vai continuar aí, né, eles

não vão tirar nem os campos nem as árvores, mas vão derrubar as casas, dragar o

rio, vamos ver né, pra ver se é isso mesmo que vai acontecer” (Moradora M.H.,

11/02/2010).

Claramente, observa-se que as justificativas relacionadas para melhoraria da

qualidade de vida desse grupo não estão de acordo com os desejos e as

necessidades da Comunidade de Itambi. Vários moradores levantam que se

deveria, de fato, criar condições e investir para que aquela área constitua-se em

uma Vila de Pescadores, já que o local, segundo eles, possui condições naturais

favoráveis, atividade comunitária, saberes contextuais ambientais úteis tanto às

formas produtivas locais, como para a conservação e manutenção dos mangues da

APA de Guapimirim. Além disso, já se constitui em um ponto de referência em

relação ao caranguejo e com a construção do Centro Comunitário no local

fortaleceria ainda mais suas atividades produtivas, sendo ainda um lugar para a

venda de artesanatos, já que parte da comunidade já possui práticas nessa

atividade.

Essa perspectiva, portanto, baseando-se em Dematteis (2008, p.44), não é

um contraste em relação à “evolução dos conhecimentos científicos”, ou seja, “tal

evolução” poderia ser combinada com os conhecimentos contextuais locais. A

partir da valorização de produções típicas locais se exigiria uma reprodução

inovativa das tecnologias que fossem apropriadas às condições e experiências dos

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 110: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

109

lugares. Dessa maneira, permitiria tanto a “evolução de tecnologias” como o

estabelecimento de gestões democraticamente mais justas e apropriadas nos

diferentes lugares.

Segundo o sítio oficial da Prefeitura de Itaboraí, existe um projeto da

prefeitura para transformar o manguezal em atração turística. No site o secretário

Ricardo Guimarães, da Secretaria de Indústria, Comércio e Turismo declara:

Sabemos que essa é uma área de grande potencial ecológico e que infelizmente está esquecido e sem conservação. Nosso objetivo é preparar o mangue para que sejam realizados passeios ecológicos com embarcações. O projeto prevê ainda, a capacitação dos próprios moradores para que possam atuar como guias turísticos do local e assim, aprender outra profissão (Disponível em:<http://prefeitura-itaborai.blogspot.com/2009/07/projeto-da-prefeitura-pretende.html>, Acesso em 20 de março de 2010).

Esse projeto reforçaria ainda mais a permanência dessa comunidade nos

mangues da APA de Guapimirim. Ressalta-se que não se defende aqui essa

política em nome da Comunidade de Itambi, mas coloca-se uma possibilidade de

proposta para o debate, já que, como defendido até aqui, os fins da ação ou

intervenção proposta, sob um ângulo autonomista, devem advir de um debate

lúcido e democrático com a Comunidade de Itambi (SOUZA, 2004, p.178).

Observou-se em outro momento dessa dissertação que o caráter de uma

política de desenvolvimento e sustentabilidade é de fato uma questão de escolhas

(ACSELRAD, 2009). O projeto do PAC para a Comunidade de Itambi, assim

como a instalação do COMPERJ no município de Itaboraí, pela opinião dos

mesmos, parecem não considerarem os traços identitários e simbólicos da

comunidade (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009) e a importância do saber local

(SOUZA, 2000a). Compreenderemos então quais são as alternativas, as

estratégias de luta e sobrevivência dessa comunidade para cunhar outras

racionalidades.

4.5. Resistências, alternativas e a busca por outras racionalidades

A luta pela conquista de mais direitos e liberdades da Comunidade de Itambi

é constante. A população comunitária afirma que pela Associação dos Moradores

conseguiram luz, coleta de lixo na Bacia e outros benefícios, tais como algumas

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 111: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

110

reivindicações contra a cerâmica existente ao lado da comunidade. Os moradores

afirmam que antigamente a cerâmica depositava os restos dos materiais no campo

de futebol, alegando que a área que a Comunidade de Itambi habita pertencia à

cerâmica. Segundo os próprios moradores, eles encaminharam vários documentos

à prefeitura reivindicando essa situação, afirmando ainda que algumas crianças já

haviam se ferido e uma gravemente, ficando internada durante três meses. Com

isso, conseguiram pela justiça que a cerâmica fosse proibida de depositar qualquer

material na área em que hoje a população de caranguejeiros ainda vive.

Depois do derramamento de óleo em 200088, o qual teria afetado os mangues

de onde a comunidade tira sua subsistência, a população teria se unido e

constituído a Associação de Pescadores de Itambi- Itapesca, para que assim

pudessem ter mais força política e para que futuros impactos semelhantes a esse

fossem contornados com mais rapidez e intensidade.

Em uma reunião do Conselho Gestor da APA de Guapimirim e da ESEC da

Guanabara (CONAPAGUAPI), realizada dia 29 de outubro de 2009, com a

participação de membros da Associação dos Moradores e da Associação de

Pescadores de Itambi, constatou-se que, a partir da reivindicação dessas

associações em reuniões anteriores, os membros do conselho estariam entrando

em acordo para que os caranguejeiros e pescadores cadastrados da região

pudessem realizar suas atividades (cata de caranguejo, siri, pesca...) dentro da

ESEC, mesmo que pelo SNUC essa UC seja considerada área de preservação

permanente, estando proibida a coleta de componentes dos ecossistemas para

quaisquer outros fins que não sejam científicos.

Os gestores do PAC, segundo os moradores entrevistados, teriam informado

que a primeira comunidade a se mudar para o conjunto habitacional seria a Bacia.

Contudo, os moradores se mostram receosos devido à inconstância das políticas

públicas federais. Para eles,

(...) o ônibus da Petrobras vai passar aqui, aí eles querem que a gente saia primeiro, aí tiram a gente, jogam a gente pra lá, Lula perde (a eleição de 2010), aí a gente fica lá largado, abandonado, naqueles prédios tudo inacabado, e só a comunidade da gente que sai (Moradora J., 11/02/2010).

                                                            88 O acidente da Refinaria Duque de Caxias, em janeiro de 2000, com mais de 1 milhão de litros de óleo combustível na Baía de Guanabara (SOARES, 2002).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 112: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

111

Os entrevistados reafirmam, mais uma vez, que a Petrobras irá se utilizar daquela

área:

(...) o pessoal que tiveram aqui, o pessoal da PLANAVE, o pessoal da Petrobras teve aqui, aí falou que o pessoal da PLANAVE ia vir pra poder fazer a inscrição, para poder tirar o pessoal, aí ia vir de lá da entrada até aqui, essa casa aqui da minha sobrinha, (...) onde eles mediram que o ônibus vai passar, pegaram os documentos do pessoal pra poder receber uma indenização, mas aí depois eles já vieram com um outro papo falando que não ia mais passar por aqui que ia passar do lado de lá da linha de trem e ninguém ia receber nada, aí agora o pessoal do PAC já veio dizer pra gente que a primeira comunidade que vai sair é da gente, porque é da gente? Por que é a primeira que vai sair? Por que eles têm interesse aqui, né? Por isso que eles querem tirar a gente primeiro. Por que não tiram as três comunidades junto? (Moradora J., 11/02/2010).

Sob receio de serem a primeira comunidade a sair, os entrevistados avisam

que estão se organizando e que a Presidente da Associação dos Moradores já

haveria marcado uma reunião para discutir tal questão. O objetivo deles é criar

uma resistência afirmando que só sairão quando as outras duas comunidades (da

rua Levi Barroso e da Vila do Campo) saírem. Nesse sentido, os moradores já

acordaram que ninguém sairá de lá se a inauguração do conjunto habitacional não

for realizada com as três comunidades se mudando ao mesmo tempo e se as

condições dos apartamentos não estiverem iguais ao que consta na planta.

Observa-se assim que a comunidade tenta estabelecer resistências, entretanto,

segundo os mesmos, eles também precisam de ajuda externa, senão certamente,

pelo nível de forças envolvidas, ficarão largados à própria sorte.

Observou-se aqui contradições nas interpretações relacionadas às políticas

públicas que afetam diretamente a Comunidade de Itambi, o quê inclui a saída

dessa população dos mangues para o conjunto populacional, inserida em um

projeto do PAC apresentado nesse capítulo. Ao questionar aqui os motivos

referentes à mudança dessa população, demonstrando contradições e incertezas

nas falas dos gestores envolvidos e da comunidade, não se tem aqui o intuito

denunciativo, e sim de questionar a transparência nesse processo.

Evidencia-se a falta de clareza da Comunidade de Itambi em relação à sua

mudança, dos motivos, dos meios e dos fins, assim como dos trâmites legais dessa

política. Da mesma forma, evidencia a falta da participação da comunidade em

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 113: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

112

processos decisórios relevantes que interferem diretamente a vida desses

indivíduos.

Ainda nos depoimentos obtidos na Comunidade de Itambi, pode-se perceber

uma busca pela afirmação de suas diferenças, uma luta pela identidade territorial,

o que inclui a reivindicação pelo próprio território de vida em sua dimensão

material. Percebe-se também que a busca pela valorização de referenciais

simbólicos através da afirmação de certas diferenças é a luta pela própria

sobrevivência e o medo dessa comunidade “desaparecer” (HAESBAERT, 2007a).

A partir de Souza (2000a), compreende-se assim que os agentes sociais

envolvidos nas políticas de intervenção/ação do território da Comunidade de

Itambi, não consideram verdadeiramente a percepção e vivência da população

envolvida. Eles se utilizam de injeções políticas de “cima para baixo” com a

preocupação de atingir metas e objetivos impositivos e pretensamente racionais,

sendo impermeável a participação da comunidade ou reduzindo esta à

pseudoparticipação (apaziguamento, consulta e informação).

Identificam-se também algumas estratégias como ofertas de emprego que

podem atuar como medidas para desestabilizar e enfraquecer a ação política do

coletivo no que parece o principal objetivo da Comunidade de Itambi nesse

momento histórico, a permanência em seu território de vida, afetividade e

sobrevivência. Acredita-se, contudo, que a célula possível de pressão que se

verifica atualmente na comunidade possa ser fortalecida, frente às outras

conquistas políticas da comunidade pelas suas Associações de Moradores e

Pescadores. A comunidade parece, nesse momento, estar debatendo e se

organizando politicamente na busca de mecanismos para a defesa de seus direito

legítimos, a começar pelo direito de manterem sua identidade (SOUZA, 2004,

p.390).

A partir de Souza (2004), baseado em Habermas (1981; 1990), defende-se a

importância de um agir comunicativo, expandido o diálogo e “que o

autoritarismo, o qual costuma se aninhar mesmo nas relações entre companheiros

de causa e luta, seja coerentemente combatido e substituído por debates livres e

confrontos abertos de posições e argumentos” (p.337). Sem subestimar a

profundidade das contradições e o potencial dos conflitos, acredita-se que se deva

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 114: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

113

ter um compromisso prioritário com a não-violência e o diálogo como meios de

resolução de conflitos (p.390-391).

A comunidade, nesse momento, deve criar estratégicas a partir do confronto

racional de argumentos, demonstrando outras possibilidades de políticas públicas

que considerem e valorizem as potencialidades locais, tais como políticas que

visem à manutenção da qualidade de vida da Baía de Guanabara, assim como a

dos mangues da APA de Guapimirim, que fortaleçam as atividades produtivas

locais (a cata de caranguejo, de siri, a pesca), e até que desenvolvam o ecoturismo,

o que já se constitui em um projeto da Prefeitura de Itaboraí e a principal

possibilidade apontada pela Cooperativa de Manguezal Fluminense89

(HERRERA, FERREIRA e RODRIGUES, 2009). Dessa maneira, os moradores

poderiam buscar alianças em outras esferas de poder e organizações em rede com

outras comunidades de Itambi e do Brasil que passam por processos semelhantes

fortalecendo a luta por uma margem de manobra institucional que permita a sua

manutenção nos mangues e a constituição da área da Bacia em uma Vila de

Pescadores.

Políticas legítimas e dignas, além de reproduzirem o capital territorial local,

não destroem o capital local de outros sistemas ligados por interações materiais e

imateriais (DEMATTEIS, 2008, p.43). E pelo espírito de respeito às diferenças

legitimas pode, ademais, “servir para questionar a legitimidade das próprias regras

do jogo econômicas e políticas da sociedade atual” (SOUZA, 2004, p.390).

Acredita-se, nesta pesquisa, que um dos papéis da Academia seja a busca

por mudanças práticas na realidade. Em outras palavras, compreender outras

racionalidades a partir dos diferentes sujeitos, para que as mudanças se

concretizem quando os sujeitos forem mais participativos dos projetos de

desenvolvimento que os incluem.

Socializar o conhecimento sobre os problemas evidenciando outras

racionalidades, como nos alerta Souza (2000a), é essencial para incentivar mais

                                                            89 A formação da Cooperativa Manguezal Fluminense pautou-se em três fases: mobilização comunitária, cursos de capacitação profissional e discussão sobre o modelo de organização. O projeto foi desenvolvido entre março de 2006 e maio de 2009, com recursos do Programa PDA Mata Atlântica, do Ministério do Meio Ambiente. Foi executado pela OSCIP INNATUS (Instituto Nacional de Tecnologia e Uso Sustentável), em parceria com a APA Guapimirim (HERRERA, FERREIRA e RODRIGUES, 2009).

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 115: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

114

pessoas a se integrarem nos debates e processos decisórios como para prestar

contas aos atores já envolvidos, sobre os trâmites legais, as modificações e

implementações de propostas. O incentivo à mobilização e participação da

população deve ser compartilhado entre as organizações civis da sociedade e o

Estado. Devemos buscar mais dados sobre as realidades locais, e as estratégicas e

os planos devem estar disponíveis a uma população letrada, porém de baixa

escolaridade ou elementar. Ou seja, todas as propostas de intervenção/ação no

território devem ser totalmente claras aos principais envolvidos, o “requisito da

transparência é condição sine qua non para decisões com conhecimento de causa e

o exercício da autonomia”, sem a sonegação “de informações-chaves, seja quanto

aos fins, seja quanto aos meios” (p.96).

Ao mostrar a realidade da Comunidade de Itambi procura-se evidenciar aqui

a identidade territorial como possibilidade de transformação social, fortalecendo

lutas que não necessariamente buscam certos “ideais comuns”.

Retomando Castro (2005), afirma-se a necessidade da inversão de certos

valores e a soma de outros no debate sobre município. Dessa maneira, ao serem

mostradas as políticas públicas implementadas no Município de Itaboraí que

afetam diretamente a Comunidade de Itambi, percebe-se que a importância dessa

inversão está em:

Perceber (1) que as diferenças vão muito além do problema tamanho da população ou riqueza, mas encontram-se profundamente inscritas nos territórios das sociedades locais; (2) que a isonomia da lei obscurece diferenças entre o que é ser pequeno ou pobre nas regiões Norte e Nordeste ou no centro-sul do país; (3) o que significa ser exatamente eficiente e onde; (4) que a produção de injustiças começam nessa escala (CASTRO, 2005,p.137).

Dessa maneira, a escala local é a escala privilegiada para experimentos

político-pedagógicos, para a formação de uma consciência de direitos e para a

prática da participação política (SOUZA, 2000a), e assim acredita-se que as

potencialidades específicas locais deveriam ser potencializadas com a participação

dos sujeitos nos processos decisórios nos projetos de desenvolvimento do

território em que esses estão inseridos. Procura-se assim fortalecer a luta dessa e

de outras populações do Brasil por mais direitos e liberdades. Esse trabalho tenta

contribuir dessa forma com a luta pela efetiva justiça social, para a diminuição das

desigualdades e para o reconhecimento da diversidade territorial.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 116: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

5. Considerações Finais

O COMPERJ, desde o início de sua instalação, carrega consigo a imagem

do “desenvolvimento” e “sustentabilidade”. Entretanto, as des-re-

territorializações das comunidades que estão na sua área de implantação, como é

o caso da Comunidade de Itambi, e sua proximidade com o Mosaico da Mata

Atlântica Central Fluminense (MMACF) divergem das concepções de

desenvolvimento e sustentabilidade defendidas nesta pesquisa. Entende-se, nesta

pesquisa, que se deve deixar que os indivíduos de diferentes lugares decidam as

formas de vivenciar as suas territorialidades e assim o(s) seu(s)

desenvolvimento(s) e sua(s) sustentabilidade(s), ou seja, seus parâmetros de

justiça social e qualidade de vida. A instalação do COMPERJ é, dessa maneira,

um exemplo das contradições entre os modelos de desenvolvimento socioespacial.

Observou-se que a política de desenvolvimento via COMPERJ ainda está

baseada na redução do conceito de desenvolvimento ao crescimento econômico e

modernização tecnológica, a partir de uma concepção de produtividade que é

parcial, pois que aumenta a renda financeira em curto prazo diminuindo a

produtividade de energia e capital natural local, desmantelando as diversidades

culturais. Da mesma forma, percebeu-se que a Comunidade de Itambi certamente

compartilhará dos custos sociais e ambientais, ou seja, dos ônus da política

pública em voga, em muitas instâncias do poder instituído.

Não se sabe ao certo se as infraestruturas relacionadas ao COMPERJ

afetarão concretamente o território atual da Comunidade de Itambi. Entretanto,

percebe-se que a saída dessa comunidade dos mangues está diretamente

relacionada com a entrada do COMPERJ naquele espaço, seja por uma política

ambiental que busca minimizar os futuros danos ambientais do pólo petroquímico

ou por uma política de cunho assistencialista como forma de fortalecer a entrada

do capital industrial no local.

Ainda se verifica, a partir dos depoimentos utilizados nessa dissertação, que

a chegada do COMPERJ no local (com suas previsíveis conseqüências sociais e

ambientais), levará a perda dos principais referenciais simbólicos, recursos

materiais de sobrevivência, ciclos de convivência e solidariedade e afetividade

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 117: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

116 

com o território da Comunidade de Itambi. Dessa maneira, percebe-se que a

comunidade estaria vivenciando um processo de des-re-territorialização

(HAESBAERT, 2004).

Nessa pesquisa salientou-se que os lugares estão inseridos, em maior ou

menor grau, em um contexto nacional e global e ainda assim possuem

particularidades e singularidades que devem ser valorizadas e potencializadas.

Estas devem ser utilizadas como vantagens competitivas, reproduzindo assim

saberes contextuais ambientais no que se refere às formas produtivas locais,

diminuindo os efeitos ecológicos e as desigualdades e conservando a diversidade

territorial. Contudo observou-se justamente o contrário, em que as potencialidades

específicas locais são desvalorizadas em detrimento de interesses globais/

nacionais.

É importante então que direcionemos “um olhar menos viciado” sobre a

Comunidade de Itambi para que se possa perceber outras racionalidades e

desmantelar certas “verdades”. A partir das próprias concepções da comunidade

verificou-se que os moradores não estão satisfeitos com a mudança para o

Conjunto Habitacional, dizendo-se não terem sido consultados, mas apenas

comunicados sobre esse projeto do PAC. Os juízos de valor em relação à ideia de

qualidade de vida atribuídos pelos os gestores do Conjunto Habitacional do PAC e

das Unidades de Conservação divergem das concepções dos habitantes da

Comunidade de Itambi.

A Comunidade de Itambi luta por mais direitos e liberdades. Contudo,

verificou-se um pedido de “ajuda” nessa luta, observando as forças desiguais e o

medo de seu “desaparecimento”, em outras palavras de sua exclusão social.

A partir dos depoimentos da Comunidade de Itambi, poder-se-ia investir

para que a área se constituísse em uma Vila de Pescadores com a manutenção dos

mangues pela comunidade. Dessa maneira, outras políticas públicas que

considerem e valorizem as potencialidades locais poderiam ser privilegiadas, tais

como políticas que visem à manutenção da qualidade de vida da Baía de

Guanabara, assim como dos mangues da APA de Guapimirim, que fortaleçam as

atividades produtivas locais (a cata de caranguejo, de siri, a pesca) e até que

desenvolvam o ecoturismo.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 118: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

117 

A comunidade, nesse momento, procura se organizar na busca por mais

direitos. Acredita-se, que a célula possível de pressão atual na comunidade tenha

que ser fortalecida e pelas suas associações de moradores e pescadores devam

criar estratégicas a partir de um confronto racional de argumentos e tentando

buscar alianças que fortaleçam seus mecanismos de ação política. Com isso, não

apenas seria uma política do reconhecimento da diferença e consequentemente da

diminuição de desigualdades, como também da reprodução de saberes ambientais

que contribuiriam para a conservação daqueles manguezais, favorecendo a

qualidade ambiental local/regional. Seria, dessa maneira, uma visão em longo

prazo.

Salientamos ainda que o território é o lugar de luta, resistência, busca pelo

desenvolvimento(s) e sustentabilidade(s), entendidos de acordo com as

perspectivas particulares dos territórios, que emanam cultura, história, interesses,

necessidades e desejos específicos e, portanto, outras racionalidades.

Da mesma maneira, foram observadas as múltiplas dimensões do território

(cultural, política, econômica e da natureza), afirmando assim a necessidade de

uma visão integradora e não-dicotômica entre cultura e natureza em seu estudo.

Entretanto, podemos observar uma separação ainda muito clara do

social/ambiental entre os gestores públicos envolvidos.

Dessa maneira é fundamental a importância da Academia nesse processo e o

papel da Geografia na transformação social, ressaltando a temática da pluralidade,

das diferenças e a de separação das políticas públicas sociais das ambientais.

Assim sendo, devem ser buscadas outras escalas do fazer político.

Como alertava Furtado (2007), devemos tomar gosto pelo exercício da

imaginação para a construção de um Brasil democraticamente mais justo, ou seja,

aprender a fazer política e criar condições, estratégicas e ferramentas para que

diferentes populações participem dos processos decisórios de políticas de

desenvolvimentos dos territórios em que estão inseridas.

Concorda-se ainda com Souza (2000a), quando lembra que o controle

cidadão pleno exige muito mais que uma transformação política na escala local,

sendo necessária uma transformação social mais profunda, impossível de ser

alcançada apenas dentro do raio de ação político, cultural e econômico local.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 119: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

118 

Contudo, como o próprio autor afirma, a escala local continua sendo a

privilegiada para experimentos político-pedagógicos, para a formação de uma

consciência de direitos e para a prática da participação política. Dessa maneira,

baseando-se em Rua (2002), acreditamos que o ponto de partida ainda seja o

lugar, rumo à superação da heteronomia, com a criação de mecanismos e adoção

de medidas que permitam a redução da segregação socioespacial e ir além da

pseudoparticipação (SOUZA, 2000a).

Esse trabalho procura contribuir com essa luta ao olhar para a

territorialidade da Comunidade de Itambi e buscar outras racionalidades. Com

esse olhar, outros projetos de desenvolvimento no Brasil para transformarem as

realidades locais devem ser compreendidos em suas diferenças, procurando

valorizá-las para diminuir as desigualdades do nosso país; em outras palavras,

esperamos que este trabalho possa contribuir para que diferentes territorialidades

possam ser potencializadas como estratégica política na busca desse(s)

desenvolvimento(s) com mais autonomia dos sujeitos envolvidos.

A realidade aqui estudada está se modificando rapidamente e ainda nos

deixa diversas questões. O futuro da comunidade ainda é incerto e o porquê de

empresas terceirizadas do COMPERJ conversarem com a comunidade a respeito

de indenizações também não podem ser respondidos nessa pesquisa. Da mesma

forma, o futuro do município de Itaboraí, assim como de outros municípios que

também estão sendo afetados pela política de desenvolvimento via COMPERJ

ainda deixa muitas dúvidas. As conseqüências ambientais e sociais tanto nas

Unidades de Conservação como em toda a Baía de Guanabara com a

implementação do pólo petroquímico no local, ainda que previstas, não são certas.

Além disso, a atual discussão em torno da redistribuição dos royalties merece um

olhar especial, já que pode afetar diretamente a política de desenvolvimento na

região, seus mecanismos de ação, o CONLESTE, assim como a própria opinião

pública.

“Só durante a própria marcha será possível vislumbrar os novos desafios

que irão surgir – as limitações das táticas e estratégicas – e as maneiras de vencê-

los” (SOUZA, 2000a, p.85). Dessa maneira, a continuidade na análise das

múltiplas faces desse processo, das modificações e conseqüências, assim como

das resistências e lutas é importante não apenas para compreensão dessa realidade,

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 120: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

119 

como para a criação de ferramentas, ou seja, de políticas capazes de intervirem

nessa realidade e fortalecerem tanto a luta dos sujeitos envolvidos nessa política

de desenvolvimento, como de outras populações do Brasil.

Outros projetos de desenvolvimento no Brasil devem transformar assim o

território levando em conta as potencialidades locais com a participação efetiva

dos diferentes grupos em seus diferentes projetos de desenvolvimento e

sustentabilidade. Acredita-se que assim se diminuiriam as desigualdades e se

aumentariam os direitos e liberdades para o maior número de pessoas possível,

contribuindo para a construção de um Brasil democraticamente mais justo, com

justiça social e reconhecimento da diversidade territorial dos lugares.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 121: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

 

6. Referências Bibliográficas

AÇÃO CIVIL PÚBLICA – MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL -n°1.30.003.000055/2006-07

ACSELRAD, Henri. Introdução. In: ACSELRAD, Henri. (org). A Duração das Cidades: Sustentabilidade e risco nas políticas urbanas. 2.ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2009, p. 19-42.

______. Sentidos da sustentabilidade urbana. In: ACSELRAD, Henri. (org). A Duração das Cidades: Sustentabilidade e risco nas políticas urbanas. 2.ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2009, p.43-70.

______. Discursos da Sustentabilidade Urbana. In: Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais. n°1, 1999, p.79-90.

ACSELRAD, Henri; LEROY, Jean-Pierre. Novas Premissas de Sustentabilidade Democrática. Rio de Janeiro: Projeto Brasil Sustentável e Democrático. FASE, 1999.

ALBUQUERQUE, A.L. As disparidades existentes entre a Proteção Ambiental e as Atividades Econômicas exercidas em áreas “naturais” analisadas em Itambi-RJ.In: X SIMPÓSIO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA FíSICA APLICADA, Rio de Janeiro, [2002].

AMADOR, Elmo da Silva. Roteiro de visita à Baía de Guanabara. In: Educação Ambiental: especialização e capacitação em educação para gestão ambiental. Vol. II. Rio de Janeiro: Gráfica UERJ, 2001.

______.Baía de Guanabara: um balanço histórico. IN: ABREU, Maurício de Abreu (org.). Natureza e Sociedade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Biblioteca Carioca. 1992.

ANDERSON, Benedict R. Comunidades Imaginadas: reflexões sobre a origem e a difusão do nacionalismo. São Paulo: Companhia das Letras, (2008 (1991).

ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA BR 493. Disponível em: http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audit_public_br493.pdf, Acesso em 20 de março de 2010.

ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO EMPREENDIMENTO COMPLEXO PETROQUÍMICO DO RIO DE JANEIRO – COMPERJ. Itaboraí, 09 de junho de 2009. Disponível online: http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audiencia_estrada_COMPERJ.pdf, Acesso em 4 de fevereiro de 2010.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 122: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

121

BANDEIRA DE MENEZES, Luis Guilherme Almeida. A Eclosão de tensões ambientais no Estado do Rio de Janeiro. O exemplo da Agenda 21 COMPERJ no Município de São - Gonçalo. In: Revista Geografar- UFPR. Curitiba; v.4, n.1, jan./jun. 2009, p. 16-33.

BAUMAN, Z. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. 141p.

BOTELHO, André Luiz Magalhães. Análise de contaminação por óleo na APA de Guapimirim – RJ: Aspectos Geoquímicos e Socioambientais. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais). Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2003.

BRASIL. Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006 (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5758.htm>, Acesso em 28 de março de 2010).

______. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000; Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002.Sistema Nacional de Unidade de Conservação da Natureza – SNUC: 3. ed. aum. Brasília: MMA/SBF, 2003.52p.

______. Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4771.htm>, Acesso em 30 de março de 2009.

CASTELLS, M. A era da informação: economia, sociedade e cultura. Volume II – O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

CASTRO, Iná Elias de. Geografia e Política: Territórios, escalas de ação e instituições. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.

CEDAE [online]. Disponível em: <http://www.cedae.rj.gov.br/raiz/080.ASP>, Acesso em 30 de março de 2009.

CEPAL. Objetivos de desenvolvimento do milênio: uma visão a partir da América Latina e do Caribe. Relatório sobre o desempenho da América Latina e do Caribe nos objetivos de desenvolvimento no milênio, junho de 2005. Disponível em:<http://www.pnud.org.br/arquivos/informativo_Brasil.doc, Acesso dia 29 de março de 2010.

DEMATTEIS, Giuseppe. Sistema Local Territorial (SLOT): um instrumento para representar, ler e transformar o território. In: Alves, Francelino Adilson; CARRIJO,Beatriz Rodrigues e CANDIOTTO, Luciano Zanetti Pessôa (org). Desenvolvimento territorial e Agroecologia. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p.33-46.

FONSECA, Denise Pini da. Discutindo os Termos de Uma Equação de Congruência: Cultura e Desenvolvimento Sustentável. In: Maxwell - Coleção Digital. PUC-Rio: Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: < http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/ >, Acesso em 25 de abril de 2009.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 123: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

122

FURTADO, Celso. O Capitalismo Global. 7. ed.São Paulo: Paz e Terra, 2007.

______. Introdução ao Desenvolvimento: enfoque histórico-estrutural.3 ed, revista pelo autor. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000.

______. Brasil: a construção interrompida. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

______. Cultura e Desenvolvimento em época de crise. 2.ed. Rio de Janeiro:Paz e Terra,1984.

______. Criatividade e Dependência na Civilização Industrial. São Paulo: CÍRCULO DO LIVRO S.A., 1978.

______. A Pré- Revolução Brasileira. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1962.

GUIMARÃES, Roberto P. Desenvolvimento Sustentável: da retórica à formulação de políticas públicas. In: BECKER, Berta e MIRANDA, Mariana (orgs.). A Geografia Política do Desenvolvimento Sustentável. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1997, p.13-44.

GIULIANI, Gian Mario. As áreas naturais protegidas e a responsabilidade social e ambiental das empresas: o caso do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense e do Comperj. In: Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 16, p. 21-37, jul./dez. 2007. Editora UFPR.

GIULIANI, G. M.; GONCALVES, S. D.; GIFFONI, P. R.;GUEDES, M.; MONNERAT, B. S.; CASTRO, R.; OLIVEIRA, R. R.; MONTENEGRO, T. Diagnóstico socioeconômico da população residente na localidade de ITAMBÍ, município de Itaboraí (RJ). Relatório, IFCS-UFRJ, 2005.

HAESBAERT, Rogério. Vivendo no Limite:Dilemas do Hibridismo e da Multi/Transterritorialidade. In: Zusman, P. et al. (org.). Geografias Culturales: aproximaciones, interesecciones y desafios. Buenos Aires: Editora UBA, no prelo.

_______. Hibridismo, Mobilidade e Multiterritorialidade numa perspectiva geográfico-cultural integradora. In: Ângelo Serpa. (Org.). Espaços Culturais: vivências, imaginações e representações. 1 ed. Salvador: EDUFBA, 2008, v. , p. 393-419.

______. Território e Multiterritorialidade: Um Debate. In: GEOgraphia. Ano IX, n°17. Niterói/RJ, UFF/EGG, 2007, p.19- 45.

______. Identidades Territoriais: Entre a multiterritorialidade e a reclusão territorial (ou: do hibridismo cultural à essencialização das identidades). In: ARAUJO, Federico Guilherme Bandeira de e HAESBAERT, Rogério (org). Identidades e territórios: questões e olhares contemporâneos. Rio de Janeiro: Access, 2007, p.33-56.

______. O mito da desterritorialização: Do “Fim dos Territórios” à Multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 124: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

123

HALL, Stuart. Quando foi o Pós-colonial? Pensando no Limite. In: Hall, S .Da Diáspora. Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representações da UNESCO no Brasil, 2003, p.101-128.

______. A questão multicultural. In: Hall, S .Da Diáspora. Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representações da UNESCO no Brasil, 2003, p.101-128.

HERRERA, Breno; FERREIRA, Francisco Pontes de Miranda e RODRIGUES, Layse. Experiência da Cooperativa Manguezal Fluminense na APA Guapimirim. In: IV Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social (SAPIS) – Belém (PA), 2009.

IBAMA- ICMBIO. Manifestação técnica sobre os impactos ambientais potenciais decorrentes da implantação do Comperj nas unidades de conservação federais da região. Mimeo, Rio de Janeiro, 2008.

ICMBIO [online]. Disponível em: <http://www.icmbio.gov.br/apaguapimirim/?id_menu=52>, Acesso em 05 de fevereiro de 2010.

IRVING, Marta, Áreas protegidas e inclusão social. Construindo novos significados, Aquarius, Rio de Janeiro, 2006.

IRVING, Marta de Azevedo; GIULIANI, Gian Mario; LOUREIRO, Carlos Federico B. Natureza e Sociedade: Demitificando mitos para a gestão de áreas protegidas. In: IRVING, Marta de Azevedo; GIULIANI, Gian Mario; LOUREIRO, Carlos Federico B.(org). Parques Estaduais do Rio de Janeiro: construindo novas práticas para a gestão. São Carlos: RiMa, 2008, p.1-19.

JABLONSKI, S.; AZEVEDO, A.F.; MOREIRA, L.H.A. Fisheries and Conflicts in Guanabara Bay, Rio de Janeiro, Brasil. In: Brasilian Archives of Biology and technology. Vol.49, nº1: 2006.p.79-91.

KAMEL, M.; AMARAL, S.; SOARES, M.L.G. Imagens CCD/CBERS e TM/Landsat para análise multi-temporal de manguezais no Nordeste brasileiro. Um estudo no litoral do Estado do Ceará. In: Anais XII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Goiânia, Brasil, INPE. 2005. p. 979-986.

LEFF, Enrique. A reapropriação social da natureza. In: Saber Ambiental. Petrópolis: Vozes, 2001.p.65-82.

______. Ética Ambiental e Direitos Culturais. In: Saber Ambiental. Petrópolis: Vozes, 2001.p.83-95.

MASSEY, Dorren. Um sentido Global do lugar. In: Arantes, A. (org.). O Espaço da Diferença. Campinas: Ed.Papirus, (2002 (1994)).

MENDES DE MELO, Gustavo. A interpretação dos conflitos na gestão dos parques sob a ótica das populações locais: os parques Nacionais Montanhas do Tucunumaque e Cabo Orange. Dissertação (Mestrado em Psicossociologia

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 125: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

124

de Comunidades e Ecologia Social, Programa de Estudos Interdisciplinares de Comunidades e Ecologia Social), Rio de Janeiro: EICOS-UFRJ, 2007.

MERCADANTE, Mauricio, Uma década de debate e negociação: a história da elaboração da Lei do SNUC, In: BENJAMIN (Cord.), A.H., Direito ambiental das Áreas Protegidas, Rio de Janeiro, Ed. Forense Universitária, 2001.

MILANO, M.S. Mitos no manejo de Unidades de Conservação no Brasil, ou a verdadeira ameaça, In: ANAIS DO II CONGRESSO BRASILEIRO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO, 2000, Mato Grosso do Sul, S.n., 2000.

______. Unidades de Conservação. Técnica, Lei e Ética para a Conservação da Biodiversidade, In: BENJAMIN (Coordenador), A.H., Direito ambiental das Áreas Protegidas. Rio de Janeiro, Ed. Forense Universitária, 2001.

MMA/IBAMA, Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim. 2001 [CD-Rom]

MOYSES, Yana dos Santos. A importância da articulação dos conhecimentos científicos e tradicionais para a conservação dos manguezais da APA de Guapimirim. Monografia (Final do Curso de Oceanografia) – Faculdade de Oceanografia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro: UERJ, 2008.

PANDEFF, Pando Angeloff. Gestão ambiental em unidades de conservação: Reflexões a partir do Projeto Defeso na APA-Guapimirim/RJ. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental). Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2009.

PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. A globalização da natureza e a natureza da globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.

PREFEITURA DE ITABORAÍ (BLOG OFICIAL). Disponível em:<http://prefeitura-itaborai.blogspot.com/2009/07/projeto-da-prefeitura-pretende.html>, Acesso em 20 de março de 2010.

PROGRAMA MOSAICOS DA MATA ATLÂNTICA – RBMA – PROJETO DE APOIO AO RECONHECIMENTO DE MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO CORREDOR DA SERRA DO MAR. Mosaicos de unidades de conservação no corredor da Serra do Mar. In: org. LINO,Clayton F., ALBUQUERQUE, João Lucílio de; DIAS, Heloísa. (coord.) Cadernos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. Série 1 Conservação e Áreas Protegidas- n° 32 -São Paulo: Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, 2007.

RIMA-COMPERJ. Petrobras- Concremat Engenharia [online]. Disponível em: <http://www2.petrobras.com.br/ Petrobras/ portugues/pdf/rima.pdf>, Acesso em 2009.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 126: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

125

ROSTOW, W.W. Chapter 2, "The Five Stages of Growth-A Summary. In: The Stages of Economic Growth: A Non-Communist Manifesto. Cambridge: Cambridge University Press, 1960. Disponível em: < http://www.mtholyoke.edu/acad/intrel/ipe/rostow.htm>. Acesso em 26 de abril de 2009.

RUA, João. Desenvolvimento, espaço e sustentabilidades. In: RUA, João (org.) Paisagem, Espaço e Sustentabilidades: uma perspectiva multidimensional da geografia. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2007, p.143-194.

______. As crises vividas pelo estado do Rio de Janeiro e a emergência de novas territorialidades em áreas rurais.In: MARAFON, Glaucio José, RUA, João e RIBEIRO, Miguel Angelo (org).Abordagens teórico-metodológicas em geografia agrária. Rio de Janeiro:edUERJ, 2007,p.271-298.

______. Urbanidades e Novas Ruralidades no Estado do Rio de Janeiro: Algumas considerações teóricas. In: MARAFON, Glauco José; RIBEIRO, Marta Foeppel (orgs.). Estudos de Geografia Fluminense. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Infobook Ltda. 2002, p.27-42.

______. Urbanização em áreas rurais no estado do Rio de Janeiro. In: MARAFON, Glauco José; RIBEIRO, Marta Foeppel (orgs.). Estudos de Geografia Fluminense. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Infobook Ltda. 2002, p.43-69.

SACK, R. Human territoriality. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.

SANT’ANNA, Renata, Sistema Nacional de Unidades de Conservação: reflexões antropológicas sobre a elaboração de uma lei ambiental, Dissertação (Mestrado em Sociologia), Rio de Janeiro: IFCS-UFRJ, 2003.

SAQUET, Marcos Aurelio e BRISKIEVICZ, Michele. Territorialidades e Identidade: Um patrimônio no desenvolvimento territorial. In: Caderno Prudentino de Geografia, n°31, vol.1, 2009.

SAQUET, Marcos Aurelio. Abordagens e concepções de território. São Paulo: Expressão Popular, 2007.

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL - MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE - APA DE GUAPIMIRIM. Parecer Técnico 53/2007. Guapimirim, 13 de dezembro de 2007.

SILVA, Augusto César Pinheiro da. Discursos e práticas institucionais no estado do Rio de Janeiro: paradoxos organizacionais na modernização do espaço rural fluminense.In: RUA, João (org.). Paisagem, Espaço e Sustentabilidades: uma perspectiva multidimensional da Geografia. Rio de Janeiro: Editora PUC, 2007, p.237-284.

______. As estratégias de modernização do espaço rural fluminense: técnica, planejamento e gestão no campo do Rio de Janeiro. In: Revista Eletrônica Campo-Território: Revista de Geografia Agrária, vol.1, n 2, 2006, p.92-122.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 127: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

126

SIQUEIRA, Josafá Carlos de. Ética e sustentabilidade local. In: O Social em Questão: Desenvolvimento socioambiental local. Rio de Janeiro: PUC- Rio. Departamento de Serviço Social. Ano. X, n°18, 2007.p.17- 25.

SOARES, David, G., Parque Estadual da Pedra Branca e Comunidade Monte da Paz, tensões e conflitos para os moradores de uma Área Protegida, Dissertação (Mestrado em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social, Programa de Estudos Interdisciplinares de Comunidades e Ecologia Social). Rio de Janeiro: EICOS-UFRJ, 2004.

SOARES, Mário Luiz Gomes. Diagnóstico de danos causados aos manguezais da baía de Guanabara pelo derramamento de 2000. Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Rio de Janeiro, 2002.

SOUSA SANTOS, Boaventura. Do Pós- Moderno ao Pós-Colonial. E Para Além de um e outro. In: Conferência de Abertura do VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Coimbra, 2004.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Mudar a Cidade: Uma Introdução Crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanos. 3ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.

______. ABC do desenvolvimento urbano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

______. Território do Outro, problemática do mesmo?O princípio da Autonomia e a superação da dicotomia Universalismo Ético versus Relativismo Cultural. In: ROSENDAHL, Zeny& CORRÊA, Roberto Lobato (orgs.). Religião, Identidade e Território. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001, p.145-176.

______. “Desenvolvimento urbano” e impactos ambientais nas metrópoles brasileiras. In: SOUZA, Marcelo Lopes. O Desafio Metropolitano-um estudo sobre a problemática socioespacial nas metrópoles brasileiras. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000, p.118-125.

______. O Planejamento e a gestão das cidades em uma perspectiva autonomista. In: Revista Território, Rio de Janeiro, ano V, n°8, 2000a, p.67-100.

______.Urbanização e desenvolvimento no Brasil. Atual.Série Princípios, Editora Ática, 1996.

SOUZA, Marcelo Lopes de., RODRIGUES, Glauco Bruce. Planejamento urbano e ativismos sociais. São Paulo: UNESP, 2004. 136p.

VIANA, Viviane Japiassú. Riscos ambientais associados ao transporte de produtos perigosos na área de influência da ETA Guandu-RJ. Dissertação (Mestrado em Engenharia). Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2009.

WWF BRASIL. Disponível em: < http://www.wwf.org.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 128: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

127

Outras fontes:

Apresentação PAC do Município de Itaboraí (POWER- POINT), enviada via e-mail pelo Arquiteto e Urbanista em novembro de 2009.

Memorial Descritivo das Intervenções do PAC, enviado via e-mail pelo chefe da APA de Guapimirim em novembro de 2009.

ONU-HABITAT- PETROBRAS- UFF- COLESTE. Seminário Internacional Direito à Cidade nos Municípios do CONLESTE e os objetivos de Desenvolvimento do Milênio, Niterói, dias 5 e 6 de outubro de 2009.

REUNIÃO do CONAPAGUAPI, 29 de outubro de 2009.

SOARES GOMES, Mario L. Responsabilidade socioambiental: a difícil transposição do “abismo” que separa a retórica da prática. Considerações sobre a proposta de localização do Comperj. Palestra- Desafios e conflitos na conservação e gestão de manguezais. UERJ, Rio de Janeiro. 2007.

Entrevistas:

Gestores do Conjunto Habitacional do PAC:

Arquiteto e Urbanista, Entrevista realizada no dia 28/09/2009.

Assistente Social, Entrevista realizada no dia 16/09/2009.

Pedagogo, Entrevistas realizadas nos dias, 16/09/2009 e 28/09/2009.

Gestores das Unidades de Conservação:

Chefe da APA de Guapimirim, Entrevista realizada em 03/11/2009.

Chefe da ESEC da Guanabara, Entrevista realizada em 03/11/2009.

Chefe da APA de Guapimirim (Resposta em formato de texto enviada via e-mail dia 04/11/2009)

Comunidade de Itambi :

A., caranguejeiro, 33 anos, 2 filhos.Nasceu em São Gonçalo, mora a 25 anos em Itambi. Entrevista realizada em 25-11-2007. O pai era caranguejeiro.

A.O., caranguejeiro, 35 anos, 2 filhos. Nasceu em Itambi. Entrevistas realizadas em 20-12-2007 e 13-10-2008. O pai e a mãe eram caranguejeiros.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 129: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

128

C., caranguejeiro, separado, 39 anos, 3 filhos.Nasceu em São Gonçalo, mora desde pequeno em Itambi. Entrevistas realizadas em 25-11-2007, 13-10-2008 e 16-09-2009. O pai era caranguejeiro.

F., caranguejeiro, casado, 72 anos, 5 filhos, nasceu em Itapiruna. Reside há 40 anos em Itambi. Entrevista realizada em 04-12-2007. Sempre foi caranguejeiro e o filho que mora com ele também é caranguejeiro.

J., casada. 30 anos. 1 filho. O marido é caranguejeiro e o pai é aposentado como pescador. Entrevista realizada em 11-02-2010.

J., 18 anos.Toda a sua família sempre trabalhou nos manguezais.Faz artesanatos.Entrevistas realizadas em 27-07-2007, 13-10-2008 e 16/09/2009.

J.A, casada. 31 anos. 2 filhos. O marido é caranguejeiro. Entrevista realizada em 11/02/2010.

J.B., 49 anos. 6 filhos, 5 netos. Mexe com caranguejo. Entrevista realizada 16/09/2009.

M., separada, 53 anos, 10 filhos gerados, seis filhos vivos. Nasceu em São Gonçalo. Mora a 40 anos em Itambi. Entrevistas realizadas em 27-07-2007, 13-10-2008 e 16/09/2009. O ex-marido é caranguejeiro e o filho que mora com ela também, durante toda a sua vida sua renda familiar veio dos manguezais.

M.H., casada, 50 anos. O marido é caranguejeiro. Mora com duas netas. Entrevista realizada em 11/02/2010.

P., caranguejeiro, 32 anos, 4 filhos. Nasceu em Niterói. Mora em Itambi desde os 3 anos de idade. Entrevista realizada em 01-12-2007. O pai era pescador, cata caranguejo desde os oito anos de idade.

S., casado, caranguejeiro, 63 anos, 10 filhos. Nasceu em São Gonçalo. Reside a 30 anos em Itambi. Entrevista realizada em 27-07-2007. Durante toda a vida trabalhou nos manguezais.

Saída de barco:

B., caranguejeiro, casado, nasceu em Itambi, sempre trabalhou nos manguezais. Saída: 07-10-2007

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 130: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

 

ANEXOS

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 131: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

130

ANEXO 1

Roteiro de Entrevistas (com a comunidade):

Nome:

Idade:

Quantos filhos:

Estado civil:

Atividade realizada:

1- Quando e como você ficou sabendo da mudança para o Conjunto Habitacional?

2- Quais são os motivos dessa mudança?

3- Qual a sua opinião sobre a mudança para o Conjunto Habitacional?

4- Qual a sua opinião sobre a entrada do COMPERJ no Município de Itaboraí?

 

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 132: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

131

ANEXO 2

Roteiro de Entrevistas (com os gestores): Atividade realizada:

1- Qual são os motivos da saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de

Guapimirim para o Conjunto Habitacional?

2- Qual a sua opinião sobre a mudança da comunidade para o Conjunto

Habitacional?

3- Qual a sua opinião sobre a entrada do COMPERJ no Município de Itaboraí?

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 133: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

132

ANEXO 3

Questões enviadas via e-mail para o chefe da APA de

Guapimirim:

1- Contextualização do momento vivenciado na região de instalação do COMPERJ;

2- Impactos ambientais previstos do COMPERJ na região;

3- O processo de licenciamento ambiental do COMPERJ;

4- Perspectivas para a região.

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 134: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

133

ANEXO 4

Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 135: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

134

ANEXO 5

Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)

 

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 136: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

135

ANEXO 6

Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)

 

DBD
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812108/CA
Page 137: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )

Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas

Page 138: Yana dos Santos Moysés A ins o COMPERJ e a des-re- lizaçãolivros01.livrosgratis.com.br/cp149831.pdf · ade de ... PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio

Baixar livros de LiteraturaBaixar livros de Literatura de CordelBaixar livros de Literatura InfantilBaixar livros de MatemáticaBaixar livros de MedicinaBaixar livros de Medicina VeterináriaBaixar livros de Meio AmbienteBaixar livros de MeteorologiaBaixar Monografias e TCCBaixar livros MultidisciplinarBaixar livros de MúsicaBaixar livros de PsicologiaBaixar livros de QuímicaBaixar livros de Saúde ColetivaBaixar livros de Serviço SocialBaixar livros de SociologiaBaixar livros de TeologiaBaixar livros de TrabalhoBaixar livros de Turismo