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A LUTA EM DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBLICA GRATUITA E DEMOCRÁTICA NA UNIFESP Rodrigo Medina Zagni A luta que vem sendo travada por professores, funcionários técnico-administrativos e alunos da Universidade Federal de São Paulo, por uma universidade pública gratuita e democrática, é certamente a luta de todos que defendem um ensino verdadeiramente emancipador, capaz de inserir quadros não apenas formados em termos técnicos para retroalimentar as relações de produção, mas de pensar criticamente o mundo em que vive, pré- condição para toda e qualquer ação transformadora. Enquanto a gratuidade das instituições públicas de ensino superior parece coisa óbvia, apesar do mantra entoado pela imprensa burguesa e toscos formadores de opinião - sobretudo após a “crise” das universidades estaduais paulistas - de que o “justo” seria cobrar mensalidades e tudo o mais que pudesse ser amoedado pelo capital (do estacionamento ao ar que ali se respira!); a proposta de implementação e aprimoramento de institutos e práticas democráticas, na universidade pública brasileira, vem parecendo cada vez mais absurda a muitos, o que inclui agências governamentais de fomento à pesquisa no Brasil que vêm defendendo a exclusão de alunos e funcionários dos órgãos colegiados onde têm curso os processos decisórios que efetivamente definem os rumos das universidades, enquanto ela goze minimamente de autonomia (sabe-se lá até quando!). Em seu lugar, apenas os doutos professores conduziriam seus destinos; mas para qual direção e servis a quais interesses? Vejamos: A lógica privatista (que paira como uma nuvem por sobre a UNIFESP e, em particular, sobre a Escola Paulista de Política, Economia e Negócios) vem convertendo as universidades públicas em instrumentos das “forças do mercado” e comprometendo diretamente o tripé “ensino – pesquisa – extensão”, dimensões indissociáveis e constitutivas do alicerce que deveria sustentar as instituições públicas de ensino superior uma vez que o professor, convertido em “dador de aula”, tende a tornar-se um mero transmissor mecânico de conhecimento; bem como o próprio conhecimento edificado no campo da pesquisa e difundido em termos de ensino e extensão (quando essa tríade se completa), resulta comprometido em razão da lógica que determina e articula essas três dimensões. Com isso, é cada vez mais comum o loteamento das pesquisas, permitindo-se que interesses privados utilizem recursos públicos, enquanto tornam-se cada vez mais comuns atividades pagas de extensão (comuns em instituições de referência como a USP), sendo a fronteira final o ensino.

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A LUTA EM DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBLICA GRATUITA E DEMOCRÁTICA NA UNIFESP

Rodrigo Medina Zagni

A luta que vem sendo travada por professores, funcionários técnico-administrativos e alunos da Universidade Federal de São Paulo, por uma universidade pública gratuita e democrática, é certamente a luta de todos que defendem um ensino verdadeiramente emancipador, capaz de inserir quadros não apenas formados em termos técnicos para retroalimentar as relações de produção, mas de pensar criticamente o mundo em que vive, pré-condição para toda e qualquer ação transformadora. Enquanto a gratuidade das instituições públicas de ensino superior parece coisa óbvia, apesar do mantra entoado pela imprensa burguesa e toscos formadores de opinião - sobretudo após a “crise” das universidades estaduais paulistas - de que o “justo” seria cobrar mensalidades e tudo o mais que pudesse ser amoedado pelo capital (do estacionamento ao ar que ali se respira!); a proposta de implementação e aprimoramento de institutos e práticas democráticas, na universidade pública brasileira, vem parecendo cada vez mais absurda a muitos, o que inclui agências governamentais de fomento à pesquisa no Brasil que vêm defendendo a exclusão de alunos e funcionários dos órgãos colegiados onde têm curso os processos decisórios que efetivamente definem os rumos das universidades, enquanto ela goze minimamente de autonomia (sabe-se lá até quando!). Em seu lugar, apenas os doutos professores conduziriam seus destinos; mas para qual direção e servis a quais interesses? Vejamos:

A lógica privatista (que paira como uma nuvem por sobre a UNIFESP e, em particular, sobre a Escola Paulista de Política, Economia e Negócios) vem convertendo as universidades públicas em instrumentos das “forças do mercado” e comprometendo diretamente o tripé “ensino – pesquisa – extensão”, dimensões indissociáveis e constitutivas do alicerce que deveria sustentar as instituições públicas de ensino superior uma vez que o professor, convertido em “dador de aula”, tende a tornar-se um mero transmissor mecânico de conhecimento; bem como o próprio conhecimento edificado no campo da pesquisa e difundido em termos de ensino e extensão (quando essa tríade se completa), resulta comprometido em razão da lógica que determina e articula essas três dimensões. Com isso, é cada vez mais comum o loteamento das pesquisas, permitindo-se que interesses privados utilizem recursos públicos, enquanto tornam-se cada vez mais comuns atividades pagas de extensão (comuns em instituições de referência como a USP), sendo a fronteira final o ensino.

É por esse motivo que a figura do docente, contratado em regime de 40 horas semanais de dedicação exclusiva ao ensino, pesquisa e extensão, vem dando lugar ao “professor-empreendedor”, via de regra contratado em regime de dedicação parcial, de 40 ou até mesmo 20 horas de atividades semanais, carga inviável para que as atividades de ensino contemplem as de pesquisa e de extensão que deixam então de constituir suas ocupações centrais. Há cursos que, dependendo de suas características, demandam quadros inseridos no mundo do trabalho a fim de auxiliar na formação dos discentes a partir da dimensão prática de seu ofício e que precisa ser apreendida. O que é inconcebível é, a partir desse argumento, a realização de um padrão no qual cursos, sobretudo de “negócios”, passem a se constituir majoritariamente (ou quase em sua totalidade!) por docentes que não são contratados em regime de dedicação exclusiva.

Isso porque o perfil almejado é o do “professor inserido no mercado”, capaz de captar recursos privados à universidade que em contrapartida firma seus compromissos não mais com a sociedade na qual o mercado está inserido; mas com “o mercado” diretamente. Não havendo condições autônomas para a pesquisa, esta passa a estar condicionada pela busca de seus próprios patrocinadores que, de acordo com seus interesses ensimesmados acabam dando a tônica de todo o processo de construção do conhecimento que passa a ser produzido. A lógica da precarização não foi apenas assumida, mas institucionalizada, por exemplo, pelo banco de equivalências no qual resulta “melhor negócio” contratar dois professores de 20

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horas e sem dedicação exclusiva, do que um professor dedicado exclusivamente ao ensino, pesquisa e extensão.

Servil aos interesses do mercado, para o qual se converte em nada mais do que uma “prestadora de serviços” e voltada para o atendimento de suas demandas, a atividade docente é convertida em simples “negócio”, deixando-se de atender sua função social mais primal.

Perguntara inicialmente qual era a direção apontada por interesses que, no caso da UNIFESP, não têm constrangimento algum em defenderem um modelo privatista de gestão da universidade pública, como se trata uma máquina de caça-níqueis. A resposta é a mesma que dera o jogador português João Pinto, cujo time segundo sua avaliação estava à beira de um precipício, mas que no momento culminante acabou tomando a decisão correta: “deu um passo à frente”.