f.E r i v a l d o d e J e s u s
t [Kinli
ABlblicomoFonte Histricado Direito
"C J,, ,! ....., I 11 I . j|r*., u->j ;.,L ''I' ' n -i
r-rT;, ***r*w|_. **
H-JlkMa ici .Miik- - ou lu . .1.1 :
iU .riTHputu fcrir j KHJi firi'iiiia u f jl|% n t
.^mCuji ic r I L*, n.,5 ^ *~r* v
.ti. U jari* m Iu r*n 1j
rtUM imil-* u* IU*t,inik Jjil cn
"h i l h I i i
,1 inncfir
w WttS)u'i* * *|IM*
REGISTRO DA OBRA:
Ministrio da Cultura
Fundao Biblioteca Nacional
DADOS DA OBRA:
Ttulo: A Bblia como Fonte Histrica do Direito
Nvel: Ttulo Independente
Assunto: Teologia Devocional
Idioma: Portugus
Suporte: Papel
Capa: Brochura
Tamanho: Mdio
Cdigo de Barras: Digital
Autor: Erivaldo de Jesus Pinheiro
Pseudnimo: Pr. Erivaldo de Jesus
JNTEttG^
ADIB EDITORA - Academia de Inteligncia Bblica
Rua Manoel Vaz, 265 - Fundos - Jd. Consrcio - SP CEP 04437-050
(li) 5631-1684 / 5631-0041 Cel. ( l l ) 9977-9942
Site: www.erivaldodejesus.com.br E-mail: [email protected]
ERIVALDO DE JESUS
A Bblia como Fonte H ist rica
do D ireito
SO PAULO - 2013
Copyright 2012 ERIVALDO DE JESUS
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - proibida a reproduo total ou parcial desta obra, salvo com
autorizao por escrito do Autor.
Editorao: Gerao Masters Editora (11) 2951-0159
Impresso no Brasil/Printed in Brazil
SUMARIO
Introduo, 11
I AS FONTES DO DIREITO, 15
Fontes Materiais do Direito, 15
Fontes Histricas do Direito, 17
Fontes Formais do Direito, 18
Lei, 18 Costume, 20
Doutrina, 21 Jurisprudncia, 22
II AS FONTES HISTRICAS DO DIREITO CIVIL OCIDENTAL, 23
O Direito Romano, 23 O Direito Germnico, 25
O Direito Cannico, 27Classificao Gentica do Direito Civil Ocidental, 29
III A BBLIA COMO FONTE PRIMORDIAL DO DIREITO CANNICO, 30
Influncia da Bblia na Civilizao Ocidental, 31
IV FORMAO CRIST DA CIVILIZAO OCIDENTAL, 34
6 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
Aspectos Histricos que Contriburam para a Formao Crist da Civilizao Ocidental, 35
A Unidade e Universalidade Poltica do Imprio Romano, 36
O Transporte e a Segurana Proporcionado pelo Imprio Romano, 38
Universalizao da Lngua Grega e a Expanso do Latim, 40
A Contribuio da Filosofia Grega, 42 A Expanso do Judasmo da Dispora, 44
V H IST ORIC IDADE DA BBLIA C O M O LIVRO , 47
O Cdigo de Hamurabi, 47O Cdigo de Ur-Nammu, 50
A Torah - Lei de Moiss, 50
Lei Cerimonial, 52Lei Moral, 53Lei Civil, 53
Lei Penal, 53
Contedo Histrico dos Livros da Bblia, 54 Antigo Testamento, 56
Novo Testamento, 58
O Triunfo da Bblia sobre o Mundo Romano, 60
IV INFLUNCIA D A BBLIA N O PENSAMENTO
POLTICO DA SO C IEDA D E CRIST
PRIMITIVA, 65
A Contradio do Direito Romano, 70
Influncia da Bblia no Pensamento Poltico da Patrstica, 72
Influncia da Bblia no Pensamento Poltico da Sociedade Medieval, 75
Influncia da Bblia no Pensamento Poltico da Escolstica, 75
Influncia da Bblia no Pensamento Poltico dos Jusnaturalistas, 78
ERIVALDO DE JESUS 7
Influncia da Bblia no Pensamento Poltico de Thomaz Hobbes, 79
Influncia da Bblia no Direito Civil Moderno, 81
A Influncia Cannica no Direito Civil Brasileiro, 82
VII INFLUNCIAS RECPROCAS ENTRE O DIREITO CANNICO E O DIREITO ROMANO, 86
O Legado Deixado pelo Direito Romano, 88 O Legado Deixado pelo Direito Cannico, 91 Influncias Recprocas entre o Direito Romano e o
Direito Cannico na formao do Curso Universitrio de Direito, 93
VII O LEGADO DEIXADO PELA BBLIA SAGRADA, 98
VIII DISPOSITIVOS JURDICOS ENCONTRADOS POR TODA A BBLIA,
Fatos e Dispositivos Jurdicos Encontrados em Gnesis, 103
Fatos e Dispositivos Encontrados em xodo, 107 Dcalogo - O Cdigo Jurdico Divino, 108
O Cdigo Penal Mosaico, 112 Legislao Complementares Diversas, 114 Fatos e Dispositivos Encontrados em Levtico, 116
Fatos e Dispositivos Encontrados em Nmeros, 120 Deuteronmio o Livro mais Jurdico da Bblia, 124
Justia, 125Educao e Cultura, 126 Dispositivos de Direito Internacional, 127 Dispositivos de Direito Constitucional, 129
Dispositivos de Direito Penal, 130 Dispositivos de Direito Procesual, 135 Dispositivos de Direito Civil, 137
Dispositivos Jurdicos em Josu, 142 Dispositivos Jurdicos em Juizes, 142 Dispositivos Jurdicos em Rute, 144
Dispositivos Jurdicos em I Samuel, 145
8 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
Dispositivos Jurdicos em II Samuel, 147
Dispositivos Jurdicos em I Reis, 148Dispositivos Jurdicos em II Reis, 150
Fatos Jurdicos em I Crnicas, 152Fatos Jurdicos em II Crnicas, 156
Fatos Jurdicos no Livro de Esdras, 160
Fatos Jurdicos no Livro de Neemias, 163Fatos Jurdicos no Livro de Ester, 166
Fatos Jurdicos no Livro de J, 168
Fatos Jurdicos no Livro de Salmos, 175
Fatos Jurdicos no Livro de Provrbios, 181Fatos Jurdicos no Livro de Eclesiastes, 187
Fatos Jurdicos no Livro de Cantares de Salomo, 188Fatos Jurdicos no Livro de Isaas, 189Fatos Jurdicos no Livro de Jeremias, 192
Fatos Jurdicos em Lamentaes de Jeremias, 195Fatos Jurdicos no Livro de Ezequiel, 195Fatos Jurdicos no Livro de Daniel, 197Fatos Jurdicos no Livro de Osias, 200
Fatos Jurdicos no Livro de Joel, 201Fatos Jurdicos no Livro de Ams, 202
Fatos Jurdicos no Livro de Obadias, 203
Fatos Jurdicos no Livro de Jonas, 204
Fatos Jurdicos no Livro de Miquias, 204Fatos Jurdicos no Livro de Naum, 205
Fatos Jurdicos no Livro de Habacuque, 206Fatos Jurdicos no Livro de Sofonias, 207Fatos Jurdicos no Livro de Ageu, 208
Fatos Jurdicos em Zacarias, 209
Fatos Jurdicos em Malaquias, 210
Fatos Jurdicos no Evangelho de Mateus, 211
Fatos Jurdicos no Evangelho de Marcos, 214
Fatos Jurdicos no Evangelho de Lucas, 215
Fatos Jurdicos no Evangelho de Joo, 216
ERIVALDO DE JESUS 9
Fatos Jurdicos no Livros dos Atos dos Apstolos, 219
Fatos Jurdicos na Epstolas de Paulo aos Romanos, 223
Fatos Jurdicos na Primeira Epstola de Paulo aos Corntios, 225
Fatos Jurdicos na Segunda Epstola de Paulo aos Corntios, 227
Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo aos Glatas, 230
Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo aos Efsios, 231 Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo aos Filipenses, 233 Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo aos Colossenses, 233Fatos Jurdicos na Primeira Epstola de Paulo aos
Tessalonicenses, 235 Fatos Jurdicos na Segunda Epstola de Paulo aos
Tessalonicenses, 235 Fatos Jurdicos na Primeira Epstola de Paulo a
Timteo, 236 Fatos Jurdicos na Segunda Epstola de Paulo a
Timteo, 238 Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo a Tito, 240
Fatos Jurdicos na Epstola de Paulo a Filemom, 241 Fatos Jurdicos na Epstola aos Hebreus, 242
Fatos Jurdicos na Epstola a Tiago, 244 Fatos Jurdicos na Primeira Epstola de Pedro, 246 Fatos Jurdicos na Segunda Epstola de Pedro, 246
Fatos Jurdicos na Primeira Epstola de Joo, 247 Fatos Jurdicos na Segunda Epstola de Joo, 249 Fatos Jurdicos na Terceira Epstola de Joo, 250
Fatos Jurdicos na Epstola de Judas, 250
Fatos Jurdicos no Livro do Apocalipse, 251
Concluso, 255
Referncias bibliogrficas, 259
In t ro d u o
Otema do presente trabalho acadmico: A Bblia como Fonte Histrica do Direito ", nasceu com o objetivo inovador de mostrar ao mundo jurdico, a grande influncia que este livro trimilenar,
exerceu em todo o mundo, principalmente o Mundo
Ocidental. A Bblia um Livro reverenciado por mais de
dois bilhes de pessoas ao redor do planeta, e, reconhe
cido, ao lado de outros documentos antigos, como im
portante fonte histrica do Direito. Nenhum livro da
histria da humanidade jamais produziu um efeito to
revolucionrio, exerceu uma influncia to decisiva no
desenvolvimento de todo o Mundo Ocidental e teve uma
difuso to Universal como o Livro dos livros- a Bblia.
E considerado de longe o mais conhecido liuro do
mundo ocidental, assim reconheceu o autor do
best-seller Os 100 livros que mais influenciaram a hu
manidade, Martin Seymour-Smith. E praticamente im
possvel ignorarmos sua influncia na Civilizao
Ocidental. Essa influncia foi sentida na poltica, atra
12 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
vs do desenvolvimento do Absolutismo dos Sculos
XVIII e XIX, partir de interpretaes exageradas das
Escrituras, provocando o aumento do poder dos reis
com a teoria do direito divino dos reis. O Direito foi
profundamente influenciado pelas Escrituras na Idade
Mdia, quando o prprio brilho do Direito Romano foi
ofuscado pelo Direito Cannico, que tinha as Escritu
ras Sagradas como a sua Fonte Primordial. A Bblia
conseguiu atravs do Cristianismo, o aperfeioamento
e a humanizao do Direito Romano e Germnico, ao
enfatizar sempre a dignidade da pessoa humana, colo
cando todos os homens em p de igualdade. Por meio
da influncia positiva da Bblia, o Cristianismo conde
nou a escravatura legalizada por Roma, e, conseguiu
acabar com o infanticdio legalizado pelo Direito Ro
mano, quando era permitido aos pais rejeitarem crian
as indesejadas, por terem nascido com alguma
deficincia; bem como, houve uma humanizao bas
tante progressiva no Direito Germnico, atravs da
cristianizao desses povos brbaros pelo ensino hu
manitrio pregado nas Escrituras. Essa influncia ca
nnica claramente percebida no prprio
Ordenamento Jurdico Brasileiro, cuja origem est no
Direito Portugus, atravs das Ordenaes Filipinas,
Manuelinas e Afonsinas, fortemente influenciadas pelo
Direito Cannico, que tem como Fonte Primordial, s
Escrituras Sagradas. No o objetivo desta obra, trans
formar o Livro Sagrado dos Cristos num livro jurdico;
mas sim, demonstrar historicamente, atravs de funda
mentos crveis que, deste livro milenar podemos extrair
ERIVALDO DE JESUS 13
lies importantes de: Direito Divino, Direito Natural,
Direito Positivo, Direito Social, Direito Comercial, Di
reito Civil, Direito Penal, Direito Internacional, Direito
Tributrio e Direito Pblico e Privado em geral. O Dou
tor Edson Luiz Sampel, autor do livro Introduo ao
Direito Cannico, falando da discriminao sofrida
por este ramo do Direito em alguns crculos acadmi
cos nos afirma o seguinte: As uezes, ouvem-se crticas
pueris contra a existncia do Direito na Igreja. Ta-
xam-no de repressor, dizendo que ele empece a cami
nhada do povo de Deus rumo ao escaton. Tal postura
revela uma viso assaz perfunctria da prpria reali
dade eclesial. O Direito faz-se presente sempre que
ocorrer o fenmeno social; onde quer que haja seres
humanos reunidos para a persecuo de determina
do escopo comum. Tanto a sociedade civil quanto a
sociedade eclesial perseguem o bem comum. Alis,
v qualquer pretenso de criar uma dicotomia entre
as duas sociedades, como se os crentes no fossem
tambm cidados. Deveras, trata-se de nuanas dife
rentes, ou seja, modos peculiares de captar o fenme
no s o c ia lA Bblia o livro que mais enfatiza a Lei, a
Justia e o Direito em suas pginas. Exemplos: O voc
bulo lei aparece cerca de 410 vezes em suas pginas;
o vocbulo direito aparece cerca de 134 vezes; justi
a cerca de 377 vezes, juiz aparece cerca de 100 ve
zes, mandamentos, ordenanas e equivalentes
aparecem cerca de 800 vezes nas Escrituras Sagradas.
O Direito est presente em todas as pginas das Escritu
ras, atravs dos direitos e obrigaes do homem para
14 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
com Deus; e dos direitos e obrigaes do homem para
com o seu semelhante. Por fim, procurei demonstrar
historicamente a grande influncia da Bblia na forma
o Crist da nossa Civilizao Ocidental, e a grande
contribuio tica e moral, to resplandecentes nos seus
ensinamentos, tica esta, no encontrada em nenhuma
outra cultura, o que a crtica moderna bem sabe.
IAS FONTES DO DIREITO
A expresso fonte vem do latim fons, fontis, nascente, significando tudo aquilo que origina, que produz algo. Assim, a expresso Fontes do Direito indica, desde logo, as formas pelas quais o Direito
se manifesta. As fontes do Direito so as matrizes pelas
quais se originou um costume de efeito jurdico, ou mes
mo uma norma de efeito legal vigente at hoje. Quais as
fontes que influenciaram tal costume, ou tal norma?
Encontraremos a resposta ao pesquisarmos onde se en
contram a nascente de tais fenmenos sociais de efeitos
jurdicos. Vamos mostrar basicamente trs espcies de
fontes do Direito. Vejamos:
Fontes Materiais do DireitoAs fontes materiais do direito so os fatos sociais, as
prprias foras criadoras do Direito. Constituem a ma
tria-prima da elaborao deste, pois so os valores so
ciais que formam o contedo das normas jurdicas. As
fontes materiais no so ainda o Direito pronto, perfei
to, entretanto; para a formao deste concorrem sob a
16 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
forma de fatos sociais econmicos, polticos, religiosos
e morais. Vejamos os exemplos:
1) Como exemplo de fato econmico inspirador do Direi
to, podemos citar a quebra da bolsa de Nova Yorque
em 1929, que acarretou uma depresso econmica
profunda, com efeitos jurdicos sensveis.
2) Fatos sociais de natureza poltica encontraremos no
papel inegvel das ideologias polticas, ao originarem
movimentos polticos de fato, como a Revoluo Rus
sa de 1917, bem como outras revolues e quartela
das ao redor do mundo.
3) Na religio encontramos uma fonte destacada do Direito, haja vista a Antiguidade Oriental e a Clssica, nas quais encontramos Direito e Religio confundidos. A prpria pena imposta ao faltoso tinha carter de expiao, pois o crime, antes de ser um ilcito era um pecado, razo pela qual, no antigo Egito, aquele que atentava contra a lei do Fara cometia no apenas crime, mas tambm sacrilgio. Veja-se, nos dias atuais, a grande luta travada pela Igreja, nos pases cristos, contra o divrcio, o aborto, a unio civil com pessoas do mesmo sexo, a eutansia etc..., influenciando, com sua autoridade, durante muito tempo, a deciso dos parlamentares a respeito dessas questes. Isso percebido aqui no prprio Brasil, com o engavetamento da lei que reconhece a unio civil de pessoas do mesmo sexo, devido a forte influncia da Igreja, por ferir abertamente os princpios cristos exauridos das Escrituras Sagradas.
4) J como exemplo de fatores morais na elaborao do Direito, citem-se as virtudes morais como o decoro, a decncia, a fidelidade, o respeito ao prximo.
5) E como fatores naturais, citemos o clima, o solo, a raa, a geografia, a populao, a constituio anat-
ERIVALDO DE JESUS 17
mica dos povos. J Montesquieu, em sua obra mxima, O Esprito das Leis, informou, com muita graa e clareza, sobre a influncia das condies metereol- gicas sobre os povos e suas leis, que deveriam ser quelas apropriadas. Exemplo: Os fencios foram os maiores navegadores comerciantes da antiguidade, principalmente porque a aridez do solo a que viviam a isto os impeliu.
Fontes Histricas do DireitoAs Fontes Histricas do Direito so os documentos
jurdicos e colees coletivas do passado que, merc de
sua sabedoria, continuam a influir nas legislaes do
presente. Como exemplo, poderiam ser citados os mais
importantes: A Lei das Doze Tbuas de Roma, o clebre
Cdigo de Hamurabi, com sua pena de talio, na Babi
lnia; a Bblia Sagrada, o livro mais venerado do mundo
ocidental, onde existem condensado em suas pginas, a
famosa Lei de Moiss; e, os infalveis ensinos ticos de
Cristo compilados por seus discpulos nos Evangelhos; a
famosa compilao de Justiniano, e tambm, os Cno
nes, condensado no Corpus Jris Canonici, servindo
como nascente do Direito Cannico. So fontes histri
cas do Direito Brasileiro, por exemplo; o Direito Roma
no, o Direito Cannico, as Ordenaes Afonsinas,
Manuelinas e Filipinas, o Cdigo de Napoleo e a legis
lao da Itlia fascista sobre o trabalho.
Fontes Formais do DireitoAs fontes formais do Direito so: a Lei, os Costu
mes, a Doutrina e a Jurisprudncia. O Estado cria a lei e
d, ao costume e a jurisprudncia, a fora desta. O posi
18 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
tivismo jurdico defende a ideia de que fora do Estado
no h Direito, sendo aquele a nica fonte deste. As for
as sociais, os fatos sociais seriam to somente causa
material do Direito, a matria-prima de sua elaborao,
ficando esta sempre a cargo do prprio Estado, como
causa eficiente. A lei seria a causa formal do Direito, a
forma de manifestao deste. As fontes formais vem a
ser as artrias por onde correm e se manifestam as fon
tes materiais do Direito.
LeiEsclarea-se, desde logo, que a origem filolgica do
vocbulo Lei nunca foi satisfatoriamente clarificada.
Alguns atribuem seu timo Lex, de legere, ler. Outros
dizem vir de ligare, ligar. Assim, para Frederico Mourlon:
A palavra lei vem do latim ligare, o mesmo que ligar. Efetivamente, a lei liga, obriga, submete as pes
soas, pela esperana de recompensas ou pelo temor de castigos, ao cumprimento de seus deveres.
O sentido de lei a que nos reportamos nesta obra a
regra de Direito ditada pela autoridade estatal, e, tornada
obrigatria para manter, numa comunidade, a ordem e o
desenvolvimento. Normas ou conjunto de normas elabo
radas e votadas pelo poder legislativo. A ideia de lei que
empregamos aqui, advm do pacto social incorporado
pela Teoria Jurdica da Idade Mdia e desenvolvida com
redobrado vigor na Idade Moderna, pelos filsofos que
prepararam as revolues liberais dos Sculos XVII e
XVIII, especialmente Hobbes, Locke e Rousseau. Assim,
para ns, o conceito ser entendido como a prescrio
ERIVALDO DE JESUS 19
emanada de autoridade soberana, preceito oriundo do
poder legislativo; a regra geral que exprime a vontade im
perativa do Estado, a que todos so submetidos. Portan
to, a lei reveste os atos do poder legislativo numa
presumida manifestao da vontade popular. Atos estes
que, editados por rgos prprios, destinam-se a reger
as relaes entre os indivduos ou entre estes e o Estado.
H uma fiel unanimidade entre aqueles que se dedicaram
a estudar a matria e a elaborar uma definio de Lei, se
no vejamos:
1) Lei o preceito racional dirigido ao bem-comum e promulgado por aquele que tem a seu cargo o cuidado da comunidade.
2) Lei o pensamento jurdico deliberado e consciente, expresso por rgos adequados que representam a vontade preponderante.
3) Lei o preceito comum, justo, estvel, suficientemente promulgado.
Em todas as definies apresentadas, a origem estatal
e a generalidade esto presentes. Entretanto, h uma
lei verdadeira, norma racional, conforme a natureza,
inscrita em todos os coraes, tem Deus por autor,
no pode, por isso, ser revogada nem pelo Senado,
nem pelo povo; e o homem no a pode violar sem ne
gar a si mesmo e sua natureza e receber o maior cas
tigo, assim reproduziu a sabedoria clssica do grande
jurista e orador romano Ccero.
O primado da lei, nos Estados de Direito, tambm
representa sensvel evoluo em contraposio aos go
vernos de homens. Como leciona Del Vecchio:
20 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
A lei o mais alto e perfeito grau de formao do Direito Positivo, j que expresso racional do Direito, nor
ma geral e abstrata, atravs da qual se exprime a
vontade do rgo legislativo.
CostumeCostume, do latim consuetudine, significa uso,
hbito ou prtica geralmente observada, particularida
de, caracterstica, jurisprudncia baseada no uso e no
na lei escrita. Em sentido jurdico, porm, a tarefa de
conceituar costume no das mais fceis, haja vista que
o Direito Costumeiro, no tem origem certa, nem se lo
caliza ou suscetvel de localizar-se de maneira predeter
minada, visto que o mesmo bem anterior ao Direito
escrito ou codificado. Geralmente no sabemos onde e
como surge determinado uso ou hbito social, que, aos
poucos, se converte em hbito jurdico, em uso jurdico.
Para Daniel Coelho de Souza, o costume se apresenta
como norma constante, no-escrita obrigatria, s di
versa da lei no aspecto formal. A lei escrita, o costu
me no. Tambm, a lei intencionalmente elaborada, o
costume forma-se espontaneamente. Primitivamente, o
Direito assumiu a forma de costume. Com a evoluo da
escrita e inveno da imprensa, a legislao passou a con
quistar a primazia. Era portanto, o nico veculo do Direi
to, inexistindo legislador. Da que a regra de Direito
nasce, pois, pelo uso e extrai sua autoridade da convic
o que se forma lentamente nos espritos de que im
prescindvel sua aplicao, cada vez que se produz o
mesmo acontecimento" - Vescovi. E deste sentimento
referido por Vescovi que decorre a convico de obrigato
ERIVALDO DE JESUS 21
riedade do costume. Da a maioria das definies de costu
me navegarem pelas mesmas guas. Vejamos:
1) Costume a observncia constante de uma norma jurdica no baseada em lei escrita.
2) Costume a prtica de uma forma de conduta, repetida de maneira uniforme e constante pelos membros de uma comunidade, acompanhada da convico de sua obrigatoriedade.
3) Costume o uso reconhecidamente obrigatrio, a norma de conduta que surgiu na prtica social e a comunidade consagrou obrigatria.
DoutrinaA doutrina, conhecida como a opinio dos doutos
(opinus doctorum), o conjunto de estudos que os juris
tas realizam atravs do Direito, ora com um fim pura
mente terico de sistematizao de seus preceitos, ora
com a finalidade de interpretar suas normas e orientar
sua aplicao. A doutrina entre ns tem extrema utilida
de na vida prtica do foro, posto que contribui para ilu
minar o campo da abrangncia da normatividade da lei.
Noutros casos, comum a doutrina de maior enverga
dura influenciar o prprio processo legislativo, conven
cido pela lio dos grandes mestres do Direito. Os
juristas so porta vozes da comunidade. Neles se mani
festa uma aguda capacidade para intuir as exigncias do
desenvolvimento social. So os primeiros a adquirir a
conscincia dos desajustes entre o Direito vigente e as
novas circunstncias sociais. A doutrina se tornou uma
fonte importante do Direito desde que o Imperador Ro
mano Justiniano determinou que: nos casos contro
22 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
vertidos devia prevalecer a opinio dos jurisconsultos
Gaio, Papiniano, Ulpiano, Paulo e Modestino.
JurisprudnciaO vocbulo aqui empregado no como sinnimo de
cincia jurdica, mas em sentido que exprime a constante
atividade da magistratura na aplicao do Direito aos ca
sos submetidos ao seu julgamento. A Jurisprudncia ,
por assim dizer: o modo pelo qual, os tribunais realizam,
interpretativamente, a aplicao das normas legais vigen
tes. Atualmente, o papel desempenhado pela Jurispru
dncia h de ser compreendido de maneira restritiva, vez
que, entre ns, no h lei alguma que obrigue o juiz a se
guir jurisprudncia alguma; por mais consagrada e justa
que seja, e por mais elevado que seja o tribunal que a
inspirou. Embora as decises dos tribunais j tenham em
nosso Direito fora vinculante. As Smulas dos Tribunais,
j possuiam fora vinculante h muito tempo.
II
AS FONTES FISTRICAS d o D ireito C ivil
O cidental
Numa classificao filogentica do Direito, a evoluo parte do Direito ariano, prolongando-se pelo Direito grego, romano e medieval, para chegar ao Direito moderno, tal como o concebem e praticam os
povos ocidentais.
O Direito RomanoO estudo do Direito Civil inicia-se no Direito Romano,
quanto mais no fosse porque continua a ser o substrato
do Direito Privado dos nossos dias. Dele se diz que foi a
razo escrita. O Direito Privado dos romanos compreen
dia o jus naturale, o jus gentium e o jus civile.
/ Jus naturale era quod natura omnia animalia do-
cuit, o que a natureza ensinou a todos os animais.
/ Jus gentium , o que regula as relaes dos estrangei
ros (peregrini). A organizao poltica no permitia
que se regrassem pelo jus civile, privilgio dos
cidados romanos.
24 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
/ Jus civile, dividiam-se em trs partes: Direito das
Coisas, das Gentes e das Aes.
O Direito Romano sistematizou-se na compilao ordenada pelo Imperador Justiniano, no Sculo VI da era
Crist. Seu conhecimento e estudo se facilitaram, ense
jando-lhe a irradiao na Histria, sobretudo a partir dos ltimos Sculos da Idade Mdia. A despeito de se aponta
rem defeitos dessa obra, dos quais sobrelevam as desfiguraes do Direito Romano Clssico, proclama-se que conservou em boa parte, o fruto do gnio dos juriscon
sultos romanos. O Corpus juris civile compe-se de 4 livros, na seguinte ordem: Institutas, Digesto ou Pandec- tas, Codex e Novelas. As Institutas elaboradas por Tribo-
niano so uma condensao de cunho elementar. O Digesto ou Pandectas, obra de maior flego, contm excertos dos escritos de numerosos jurisconsultos clssicos,
notadamente Ulpiano, Paulo, Papiniano, Gaio e Modes- tino. O Codex, publicado ulteriormente, uma coletnea das constituies imperiais, desde Adriano. As Novelas,
leis especiais baixadas pelo prprio Justiniano, entre 536 e 565 d.C, com fora derrogatria das disposies em contrrio das trs partes do Corpus juris, a ele se inte
graram, formando aps a sua morte, o quarto cdigo. Do Sculo XII ao Sculo XVI, o Corpus juris civile foi objeto de intensa exegese, sem cunho sistemtico; por parte de
juristas, conhecidos pelo nome de glosadores, porque redigiam breves anotaes entre as linhas (glossae interli-
neares) ou margem (glossae marginales) dos textos justinianeus. Dentre eles, gozam de maior fama Irnrio e Acrsio, este o autor da glosa ordinria. Seguem-se os
ps-glosadores, cuja atividade se caracterizou pelo esforo para adaptar a doutrina dos glosadores s necessidades da poca e aos costumes vigentes. Os principais
ERIVALDO DE JESUS 25
representantes dessa escola so Brtolo e Baldo. No Scu
lo XVI, a investigao do Direito Romano adquire colorido mais brilhante, devido ao empenho no melhor conhecimento das suas fontes e pela nova orientao, de carter
sistemtico, que se procura seguir. As figuras marcantes desse movimento so Cujcio e Doneau. Desde ento at nossos dias, o estudo das fontes romanas, principalmente
na Alemanha e na Itlia, se vem fazendo para melhor fixao de um momento alto da evoluo jurdica. Esses estudos tem concorrido decisivamente no s para o
esclarecimento das manifestaes do gnio jurdico dos romanos, mas tambm para o aperfeioamento da tcnica jurdica, em cujo manejo foram insuperveis. Decerto
no possvel conserv-la em nossos dias, to distantes e to diferentes daqueles tempos, mas seu conhecimento continua indispensvel ao jurista moderno, por ser de
grande utilidade compreenso do Direito atual. Atravs do Corpus juris civile, da obra dos glosadores e ps-glosa- dores, dos pesquisadores de suas fontes e dos prprios
romanistas modernos, o Direito Romano constitui-se no mais importante elemento de formao do Direito moderno. E a sua fonte histrica por excelncia.
O Direito GermnicoUma corrente de pensamento jurdico, fluente prin
cipalmente na Alemanha, propugna a existncia de um
Direito Germnico como elemento universal na forma
o do Direito Civil moderno do mundo ocidental. Esse
Direito teria instituies originais, que no teriam sofri
do influncia do Direito Romano. Mas a escola que sus
tenta a universalidade desse elemento no pretende que
tais instituies penetrem no Direito moderno por inter
mdio da legislao dos povos germnicos, tal como
26 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
existiam primitivamente. Assevera que, na sua essncia,
concorreram para a formao de uma ideologia pr
pria, que seria trao caracterstico do esprito popular
alemo, expresso peculiar da alma dos povos germni
cos. Seria, em suma, um modo peculiar de conhecer cer
tas instituies jurdicas, como, por exemplo, a
propriedade e a famlia, distinto, fundamentalmente, do
romano.
Nesse pressuposto, adianta-se que a concepo ger
mnica transindividualista, em contraposio ao indi
vidualismo dos romanos. Na concepo germnica, o
indivduo teria seus direitos limitados como os de um
funcionrio a servio da comunidade, sendo o Direito
Privado uma irradiao do Direito Pblico. A proprieda
de consistiria apenas num poder de disposio, que se
exerceria at o limite compatvel com os interesses da
comunidade. A predominncia caberia aos direitos reais
limitados. Em suma, o transindividualismo germnico
seria uma antecipao das ideias socializantes de nossos
dias. Irrecusvel a influncia dessas ideias, cujo substra
to se denomina o Direito Germnico, o qual, com im
portncia menor, pode situar-se ao lado do Direito
Romano e Direito Cannico, como fator expressivo da
evoluo do Direito Civil. Essa ideologia jurdica se de
senvolveu, contudo, margem da influncia decisiva
dos outros elementos universais, mas sofreu, nos albo
res da Idade Moderna, o impacto do Direito Romano.
At o meado do Sculo XV, os germnicos governa
ram-se por usos e costumes, variveis de cidade a cidade
at o imperador Maximiliano determinar a adoo do
Direito Romano. H quem no empreste grande signifi
ERIVALDO DE JESUS 27
cao a esse acontecimento, sob o fundamento de que
se aceitou o Direito Romano em carter subsidirio, eis
que podia ser modificado pelo direito das cidades. A re
cepo do Direito Romano na Alemanha suscetvel de
universal relevncia. Radbruch a interpreta como fen
meno parcial do grande movimento espiritual contem
porneo que, em cincia se chama Humanismo; na arte
Renascimento, e, em Religio, Reforma.
A recepo incorpora-se a esse movimento para li
bertao do indivduo. Ao criar a Cmara Judicial do Re-
ich, o imperador Maximiliano facilitou a tarefa dos juizes,
ordenando-lhes a aplicao do Direito Romano comum,
que era escrito, enquanto o Direito, at ento vigente, se
conservava consuetudinrio. Esse direito costumeiro va
riava de localidade a localidade, o que dificultava sua apli
cao. Foram estes, em sntese, os motivos determinantes
da medida imperial: segurana e uniformidade das regras
jurdicas. O povo alemo renunciou a seu Direito nacio
nal, para se submeter ao Direito Romano, velho de mil
anos. O fenmeno singular.
O Direito CannicoO Direito Cannico concorreu consideravelmente
para a formao do Direito Civil moderno. A Igreja criou
importantes regras de conduta, denominadas cno
nes, reunidas no Sculo XVI sob o nome de Corpus j
ris canonici, que compreendia:
1) O Decreto de Graciano, compilado em 1150;
2) As Decretais de Gregrio IX, publicada em 1234;
3) O Liber sextus, promulgado por Bonifcio VIII;
28 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
4) As Clementinas, em 1313 e 1317;
5) As Extravagantes, decretais publicadas em 1500.
O Direito Cannico est condensado no Codex juris
canonici, promulgado em 25 de janeiro de 1983, pelo
Papa Joo Paulo II, tendo entrado em vigor em 27 de no
vembro do mesmo ano. O atual Cdigo de Direito Can
nico possui 1.752 cnones, est dividido em 7 livros. O
stimo e ltimo livro dedicado ao processo civil e ao
processo penal. O Direito Cannico jamais regulou, na
sua totalidade, as matrias do Direito Privado. Grande
parte dos cnones so indiferentes s relaes disciplina
das pela lei civil. H, no entanto, matrias comuns, nas
quais foi decisiva a sua influncia no desenvolvimento das
instituies reguladas em todas as partes do Direito Civil.
Acerca disso, assim reconheceu o grande civilista Orlan
do Gomes:
No s a legislao cannica propriamente dita, mas
tambm as concepes do Cristianismo exerceram considervel influncia no desenvolvimento de diversos
institutos, devendo ressaltar-se, no campo do Direito
Obrigacional, a condenao usura, e, no dos Direitos Reais, o alargamento da proteo possessria, pela im
portncia atribuda a boa-f na aquisio dos direitos; onde, porm, se manifesta mais fortemente no Direi
to de Famlia, em relao a condio dos filhos e quan
to ao matrimnio. A distino entre os impedimentos matrimoniais, a forma de celebrao do casamento, a condio da mulher na sociedade conjugal, o divrcio e
o casamento putativo so, dentre outras de menor porte, diretrizes de origem cannica a que se subordinam
ainda muitas legislaes. As regras estatudas e as reso
lues dos conclios, notadamente o de Trento, sempre
ERIVALDO DE JESUS 29
tiveram ampla repercusso nos povos da Europa; parti
cularmente os que se mantiveram fiis a Roma, de tal modo que o Direito Cannico pode ser considerado um
dos elementos universais da formao do Direito Civil
moderno. (1999, pg. 57-58).
Classificao Gentica do Direito Civil Ocidental
Os pases do Ocidente podem ser distribudos em
trs grupos, sob o ponto de vista da gnese do Direito
Civil de cada qual. Vejamos:
1) No primeiro, incluem-se a Inglaterra, a Rssia, a Su
cia, a Noruega, a Dinamarca e a Finlndia, bem como os Estados Unidos da Amrica, com exceo de al
guns Estados da Unio. Esse primeiro grupo de pases situa-se em posio singular, porque foi insignificante
a influncia do Direito Romano na formao do seu
Direito Moderno.
2) No segundo, pertencem a Frana e a Alemanha. Nesse grupo, influram o Direito Romano e o Direito Germnico. A codificao de cada qual, tornou-se maior
foco de irradiao de Direito Civil no Ocidente.
3) No terceiro, a Itlia, a Espanha, Portugal e os pases
latino-americanos. Nesse terceiro grupo de pases, ao
lado do Direito Romano, houve influncia do Direito Cannico. As concepes germnicas repercutiram na Lombardia, influindo palidamente na formao do
Direito dos povos ibricos, influenciados antes pelo Direito visigtico e mulumano. No Brasil, o Direito Romano e o Direito Cannico eram fontes subsidi
rias do Direito Civil, enquanto no criou seu Direito independente do portugus.
I l l
A Bblia c o m o Fonte Prim o rd ia l d o
D ireito Ca n n ic o
r onte, repitamos, aquilo de onde algo procede. Fonte cannica a origem das normas jurdicas eclesisticas. Fonte, tomamos no sentido da origem capaz de explicar a razo de ser de determinados
fenmenos, fatores, conexes e consequncias de
acontecimentos histricos. As fontes so divididas con
forme sua procedncia e destinao. Podem ser de Di
reito Divino (provenientes da Revelao) ou de Direito
Humano (provenientes da autoridade eclesistica, da ci
vil ou de ambas). Ao iniciarmos a exposio das fontes
do Direito Cannico certamente til lembrar, mais
uma vez que, pela prpria constituio da Igreja suas
leis se radicam na Palavra de Deus, expoentemente re
velada por seu Verbo feito Homem que no apenas o
Salvador e Redentor da humanidade, mas tambm seu
Legislador. Ora, a Revelao se nos apresenta pela Pa
lavra contida nos livros sagrados inspirados - a Sagrada
Escritura - mas tambm por aquela que nos chegou
oralmente - a Sagrada Tradio. Essas so, certamente,
as fontes primrias cognoscitivas do Direito Cannico e
ERIVALDO DE JESUS 31
a parte mais nobre das leis eclesisticas, constituindo-se
nelas o Direito Divino positivo como expresso da von
tade do Supremo Legislador e Juiz da Igreja, alm de
ser, talvez por outro ttulo, expresso da Lei Natural.
Quanto Sagrada Escritura, em ambos os Testamentos
nos consta como autor o Esprito Santo, aval de sua
inspirao e inerrncia. Os dois Testamentos nos ofe
recem verdades de f e normas de conduta. Do Antigo
Testamento subsistem algumas delas, aperfeioadas
pelo Novo Testamento, sendo abolidas as de ordem
litrgica e jurdica, e permanecendo as que eram corolri
os da Lei Natural. No Novo Testamento, os dogmas e
preceitos so fontes diretas de maior valor para o Direi
to Cannico. Por meio delas conhecemos, em grandes
linhas, a matria jurdica da Igreja, sua constituio, seu
direito sacramental, administrativo e coercitivo. Por
isso, a Sagrada Escritura tida como Cdigo Sagrado,
estabelecido pelo Fundador da Igreja, e consequente
mente ocupa uma posio de mxima dignidade. Dessa
forma inaceitvel apelar to somente para a evoluo
histrica do Direito Cannico com o propsito de expli
car suas leis, sem levar em conta o que foi originalmente
proferido como norma pela Palavra Divina (Monse
nhor. Maurilio C. de Lima).
Influncia da Bblia na Civilizao Ocidental
A influncia da Bblia na nossa civilizao Ocidental
algo inquestionvel. Muitas pessoas admitem que o
mundo hoje melhor humanizado devido aos princpios
ticos e morais que resplandecem nas pginas das Escri
32 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
turas Sagradas. Ideais de justia, equidade, fraternidade,
igualdade e solidariedade, so ensinados nas linhas sa
gradas das Escrituras Hebraico-Crists. A influncia da
Bblia claramente percebida tanto na formao de in
divduos, como tambm na formao de grandes naes
do Mundo Ocidental. Mesmo os crticos deste milenar li
vro sagrado, admitem que, nenhum livro em toda a his
tria da humanidade teve tamanha influncia para o
bem; todos reconhecem o seu efeito sadio na Sociedade
Ocidental. A histria da sua influncia a histria da
prpria Civilizao. Conta-se que certa ocasio, ao ser
indagada quanto a prosperidade da Inglaterra, a Rainha
Vitria agitou com o punho a Bblia e respondeu: Este
Liuro d a razo da supremacia da Inglaterra. Geor-
ge Washington, primeiro presidente dos Estados Uni
dos, ao reconhecer a influncia do Velho Livro sobre a
nao norte-americana, exclamou: Impossvel gover
nar bem o mundo sem Deus e sem a Bblia. Sbios do
mundo inteiro tem reconhecido o seu valor inestimvel
para a civilizao mundial. Vejamos:
1) O grande fsico Sir Isaac Newton afirmou em certa ocasio: H mais indcios de autenticidade na Bblia do que em qualquer histria profana.
2) O grande pensador alemo Immanuel Kant afirmou o seguinte: A existncia da Bblia, como liuro para o pouo, o maior benefcio que a raa humana j experimentou. Todo esforo por depreci-la um crime contra a humanidade.
3) Reconhecendo a fora sobre-humana desse livro, o grande imperador francs Napoleo Bonaparte, ex- pressou-se da seguinte forma: A Bblia no um simples liuro, seno uma Criatura Viuente, dotada de uma fora que uence a quantos se lhe opem.
ERIVALDO DE JESUS 33
4) Horace Greeley afirmou que impossvel escravizar mental ou socialmente um povo que l a Bblia. Os princpios bblicos so os fundamentos da liberdade humana.
5) Thomas Huxley disse em certa ocasio que a Bblia tem sido a Carta Magna dos pobres e oprimidos. A raa humana no est em condies de dispens-la.
6) Goethe, outro grande intelectual desejou o seguinte: Continue avanando a cultura intelectual; progridam as cincias naturais sempre mais em extenso e profundidade; expanda-se o esprito humano tanto quanto queira; alm da elevao e da cultura moral do Cristianismo, como ele resplandece nos Evangelhos, que no iro.
Diante de todas estas declaraes de pessoas to im
portantes, uma coisa certa, a civilizao mundial no
tem condies de desassociar-se da influncia da Bblia em
sua formao. Foi devido a influncia que a Bblia exercia
sobre a vida de milhares de Cristos espalhados pelo
Imprio Romano nos primeiros sculos da era Crist,
que alguns imperadores ordenaram que fossem queima
dos os exemplares que existissem desse Livro Sagrado,
como fez o imperador romano Diocleciano (3 Sculo
d.C) em sua furiosa perseguio contra o Cristianismo.
Entretanto, o fato da Bblia ter sofrido todos estes ata
ques atravs da histria, e ter sobrevivido, continuando a
influenciar milhes de vidas em todo o mundo, evidncia
sua origem sobre-humana.
IV
Fo r m a o Crist da C iv ilizao O cidental
Quando o Cristianismo surgiu, e durante os primeiros sculos de sua existncia, os romanos eram os senhores do mundo. Assim os consideramos, no obstante o fato de que havia muitas regies fora de
seu domnio, porque a parte que governaram foi aquela
onde a civilizao do mundo estava ento, realizando os
seus notveis progressos. Os habitantes desse Imprio o
consideravam como abrangendo o mundo, pois ignora
vam o que existia alm de suas fronteiras. Alm disso, o
mundo romano inclua todas as terras que seriam alcan
adas pelo Cristianismo durante os primeiros trs scu
los da era Crist. Por volta do ano 50 d.C, o Imprio
Romano abrangia da Europa ao Sul do Reno e do Dan
bio, at a maior parte da Inglaterra, o Egito e toda a cos
ta ao Norte da frica, como tambm grande parte da
sia, desde o Mediterrneo Mesopotmia. No eram
somente pela fora que os romanos dominavam estas
regies; eles as governavam efetiva e inteligentemente,
pois onde quer que estendessem o seu domnio levavam
uma civilizao incomparavelmente superior anterior
ERIVALDO DE JESUS 35
mente existente naquelas terras. O poder desse imprio
foi mais acentuado e sua administrao mais eficiente
nas terras adjacentes ao Mediterrneo, exatamente onde
o Cristianismo foi primeiramente implantado. Com seu
poderio, os Romanos se tornaram os mais teis instru
mentos de Deus no preparo do mundo para o advento
do Cristianismo. Esse Imprio, que inclua grande parte
do gnero humano, foi uma lio objetiva que provava
ser a humanidade uma s. Por muitas eras, governos se
parados formaram agrupamentos humanos que se sen
tiam diferentes e isolados de outros grupos; mas com o
Imprio Romano, os povos se unificaram, no sentido de
que todos os governos tinham sido derrubados e um po
der nico dominava em toda parte. O Cristianismo
uma religio de carter universal, no conhecendo dis
tines de raas, apelando para os homens como sim
plesmente homens, tornando todos um em Cristo. Para
tal religio, a preparao mais valiosa foi a unificao de
todos os povos sob o poder poltico de Roma. Cavalgan
do sobre a sela desse poderoso Imprio, a Igreja con
quistou o mundo romano, e mudou para sempre a
histria da Civilizao Mundial.
Aspectos Histricos que Contriburam para a Formao Crist da Civilizao
OcidentalAs circunstncias que caracterizaram o ambiente s-
cio-poltico do primeiro sculo foi por demais benefi
cente ao alastramento da f crist, embora pelo menos
duas cruis perseguies do Estado contra a Igreja te
nham sido verificadas. Contudo, a mesma poltica ro
36 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
mana que, em dados momentos, to severamente per
seguiu, acabou, por outro lado, legando quela gerao
crist uma contribuio sumamente relevante para o su
cesso de sua misso evangelizadora. Essa contribuio
poltica, associada influncia cultural grega e partici
pao religiosa dos Judeus da Disperso (ou Dispora),
transformaram o primeiro sculo num fertilssimo cam
po missionrio transcultural. Vejamos:
A Unidade e Universalidade Poltica do Imprio Romano
Embora a humanidade j tivesse presenciado, em
outras pocas, a ascenso de imprios que, pelo pode
rio de seus exrcitos, estenderam suas fronteiras para
muito alm de suas origens, nunca fora antes verificado
a conquista de tal unidade social sob uma mesma bandei
ra, como a que se seguiu ao advento de Roma. Nem
mesmo Alexandre Magno, com seu vasto imprio Gre-
co-Macednio - cujos limites atingiram as longnquas
regies da ndia - conseguiu imprimir nos coraes de
seus contemporneos semelhante senso de unidade po
ltica. Sinais de algumas rebelies localizadas ainda se le
vantavam de tempos em tempos, contudo no pairava
qualquer dvida de que Roma era a sela sobre a qual se
assentavam as regies da Europa, norte da frica e sia
Menor. Augusto e seu sucessor, Tibrio, cavalgaram fir
memente e por longo tempo sobre esta sela. Qualquer
rei que questionasse esta posio, ou qualquer provncia
que ousasse a desafiar a Csar, rapidamente se conven
cia - no sem sangunolncia - de quem realmente diri
gia o mundo. O prolongamento da Pax Romana trouxe
ERIVALDO DE JESUS 37
prosperidade, comrcio, educao e homogeneidade
cultural e lingustica, alm de segurana para as viagens,
ou seja, uma preparao ideal para a chegada dos aps
tolos e missionrios cristos. Roma, com sua nfase so
bre a justia e a dignidade do cidado, construiu uma
sociedade que reunia diferentes raas e credos sob uma
mesma lei e um mesmo soberano. A universalidade resul
tante desse regime poltico acabou colaborando para
uma atmosfera receptiva ao Cristianismo, j que a men
sagem crist ressaltava as condies iguais dos homens
diante do Criador. Com o Evangelho abria-se tambm a
oportunidade de participao no Reino Divino, mediante
a f na obra redentora da Cruz, que tornaria os que nela
cressem membros indistintos do maior organismo cos
mopolita do mundo conhecido como Igreja. Diversas re
ferncias neotestamentrias, como a de So Paulo em
Efsios 2.19, e de So Pedro em 1 Pedro 2.9, esto im
pregnadas desse raciocnio:
Assim j no sois estrangeiros e peregrinos, mas concidados dos santos, e sois da famlia de Deus.
Vs, porm, sois raa eleita, sacerdcio real, nao santa, povo de propriedade exclusiva de Deus...
Do mesmo modo, a ideia de um Soberano Absoluto,
concretizada com o poder dos csares, contribuiu positi
vamente para uma clara compreenso do Deus anuncia
do pelos apstolos, j que o Messias era tambm
apresentado como Rei Supremo e Universal. Este con
ceito parece ter sido impresso com tal profundidade na
mente dos cristos primitivos que acabou por se adotar,
com muita frequncia, a expresso Pantocrator
38 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
(aquele que governa sobre todo o universo), um dos ter
mos gregos que mais evidenciam a ntima relao da
Igreja dos primeiros trs sculos com seu Senhor e Sal
vador Jesus Cristo. Infelizmente, esse mesmo pendor
romano para a supremacia mundial sob o estandarte
de uma autoridade universal acabou, mais tarde, influen
ciando negativamente os rumos da Igreja, estimulan
do-a a uma rpida e danosa secularizao. Essa
influncia encontrou na pessoa do imperador Constan
tino (Sculo IV d.C), ao proclamar-se Pontfice Maxi
mus da Igreja, o ingrediente necessrio para
transformar grande parte da Igreja na verso crist do
poderio poltico temporal da Idade Mdia.
O Transporte e a Segurana Proporcionado pelo Imprio Romano
A enorme extenso territorial do imprio romano
tornou necessrio o desenvolvimento e a construo de
uma malha viria que permitisse um fluxo comercial e
militar compatvel com s suas riquezas. O cidado ro
mano do primeiro sculo habitava regies sobremodo
distantes entre si, como, por exemplo, a Lusitnia (hoje
Portugal), ndia ou o Egito. O governo romano tratou
de tornar, o quanto fosse possvel, seguro e confortvel
o trnsito entre as regies que compunham o imprio.
Na verdade, as tcnicas romanas de pavimentao j
existiam, pelo menos, desde o Sculo IV a.C., quando
da construo da Via Appia - uma obra de engenharia
antiga - que ainda hoje utilizada. O emprego sistem
tico de mo de obra escrava tornou economicamente
possvel aos romanos a construo de um sistema virio
ERIVALDO DE JESUS 39
que atingiu, ainda nos tempos apostlicos, a marca ex
traordinria de cem mil quilmetros de extenso. Para
que se tenha uma ideia da magnitude desse feito, basta
dizer que, at 1980, o Brasil, em sua proporo conti
nental, possua menos de cento e noventa mil quilme
tros de rodovias, entre federais e estaduais - ou seja,
menos do dobro daquilo que os romanos edificaram
dois mil anos atrs! Esse magnfico sistema virio do pri
meiro sculo era composto por estradas dispostas de
modo estratgico, cruzando vales e montes e atingindo
no apenas as regies mais distantes do Imprio, como
tambm as fronteiras das naes no dominadas por
Roma. Por esses caminhos, tornados relativamente se
guros pela presena do exrcito, pisaram, em misso
evangelizadora, no apenas clebres apstolos, mas
muitos cristos incgnitos os quais, como mercadores
escravos, soldados ou simples viajantes contriburam de
maneira preponderante para a exploso da mensagem
crist no mundo de ento. As rotas martimas ofereciam,
de igual modo, uma perspectiva bastante animadora
para aqueles que delas se valiam com intenes missio
nrias. Com efeito, a paz no Mare Nostrum (Mar Medi
terrneo) havia sido arduamente garantida algumas
dcadas antes do advento de Cristo, com as incurses
da frota romana, sob Pompeu, diante de cujo poderio
foram varridos os perigosos piratas mediterrneos.
Acerca dessa conjuntura, Justo Gonzlez, em seu livro
'Uma Histria Ilustrada do Cristianismo (Vol. 1 p.
24-5), comenta:
De fato, ao ler acerca das viagens de Paulo vemos que
o grande perigo da navegao dessa poca era o mau
40 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
tempo. Uns sculos antes, os piratas que infestauam o
Mediterrneo era muito mais terrveis do que qualquer tempestade.
Universalizao da Lngua Grega e a Expanso do Latim
Assim como um indivduo que domina o ingls co-
munica-se perfeitamente por quase todo mundo moder
no, na Antiguidade, esse mesmo conforto poderia ser
desfrutado por quem pudesse se expressar atravs do
grego popular. Na verdade, a lngua grega comeara
seu processo de popularizao j no Sculo IV a.C.,
com a proposta ideolgica de Alexandre Magno de ex
portar a cultura grega atravs das conquistas que forma
ram o vasto Imprio Grego-Macednio. Seus incontveis
soldados falavam uma variante do grego clssico, conhe
cida como koin, que se disseminou por toda a bacia
do Mediterrneo, levada no s por eles, mas tambm
por comerciantes e transeuntes de origem helnica.
Embora aversos a todo tipo de cultura forasteira, conside
rada uma ameaa s suas tradies sagradas, os Judeus
acabaram igualmente influenciados pelo uso da lngua
grega, uma vez que a Palestina tambm estivera inserida
nos limites do Imprio Macednio. Assim, em Israel,
onde o aramaico se disseminara h alguns sculos antes
do perodo apostlico, a popularizao da lngua helni
ca veio a tornar-se uma realidade muito antes do advento
da era crist. Semelhantemente, os judeus que viviam
fora da Terra Santa, chamados de judeus da Dispora,
j haviam adotado o grego como lngua natural, cerca
de dois sculos antes de Cristo. No Egito, por exemplo,
ERIVALDO DE JESUS 41
onde existia uma grande colnia de judeus, de tal modo
se perdeu o contato com o idioma hebraico, que se fez
necessria uma traduo das Escrituras para o grego,
conhecida como Septuaginta ou Verso dos Setenta
(nome relacionado aos setenta telogos judeus que tra
balharam na traduo). Esse trabalho literrio cumpriu
um papel de uma relevncia extraordinria, preparando
o mundo para o advento de Cristo (vaticinado pelos pro
fetas naquelas mesmas Escrituras traduzidas). Acerca
disso lembra mais uma vez Justo Gonzlez:
A importncia da Septuaginta foi enorme para a Igreja Crist Primitiva. Esta a Bblia que a maioria dos Auto
res do Novo Testamento cita, e exerceu uma influncia
indubitvel sobre a formao do vocabulrio cristo dos primeiros sculos. Ademais, quando aqueles pri
meiros crentes se derramaram por todo o Imprio com a mensagem do evangelho, encontraram na Septuagin
ta um instrumento til na sua propaganda. De fato, o
uso que os cristos fizeram da Septuaginta foi tal e to efetivo que os judeus se viram obrigados a produzir
novas verses - como a de Aquila - e a deixar os
cristos na posse da Septuaginta.
Embora militarmente dominados pelos romanos, os gregos deixaram claro, atravs de expresses culturais
como a lngua, as artes, e o pensamento filosfico, que haviam logrado um incontestvel triunfo sobre seus con
quistadores no campo intelectual. E aceitvel que os apstolos, de modo geral, falassem grego fluente, em
particular, pelo fato de quase todos serem oriundos da Galilia, regio caracterizada por uma considervel in
fluncia cultural helnica, dada sua proximidade com a provncia da Sria, assim como das cidades gregas de
42 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
Decpolis. Por outro lado, importante termos em mente que os romanos tambm possuam sua prpria
lngua, o latim, lngua esta igualmente difundida em lar
ga escala, especialmente nas partes ocidentais do Imprio, como por toda a pennsula itlica, as Glias, a
Lusitnia, a Britnia, alm da Numdia, na frica, onde
se encontrava a prspera Cartago. Note-se que a cruz
sobre a qual Jesus pendeu ostentava o escrito de sua condenao tambm em latim (Iesus Nazarenus Rex Iu-
daerum), como vemos no Evangelho de So Joo 19.19-20. A familiaridade dos apstolos com esse idio
ma pode ser verificada pelo emprego de algumas pala
vras de origem latina nas narrativas neotestamentrias, como, por exemplo, denrio (Mateus 18.28; 20.2;
22.19; Marcos 6.37; 12.15; Lucas 20.24; Joo 6.7;
12.5 e Apocalipse 6.6) e pretrio (Mateus 27.27;
Marcos 15.16; Joo 18.28; Atos dos Apstolos 23.35 e Filipenses 1.13). Para que missionrios como Pedro,
Joo, Filipe, Simo Zelote, Paulo e Jos de Arimatia
pregassem o Evangelho nas regies ocidentais do Imprio, como reza a tradio apostlica, era necessrio que possussem algum conhecimento da lngua latina.
Assim, pois, o mundo apostlico, com a predominncia do idioma grego e a larga difuso do latim, ofereceu um
panorama lingstico indubitavelmente favorvel veloz
difuso do Cristianismo, tanto nas grandes concentraes urbanas, como nas regies mais afastadas do
Imprio Romano.
A Contribuio da Filosofia GregaO sistema filosfico greco-romano igualmente cola
borou na preparao do mundo para o recebimento do
Evangelho, naquilo que Paulo chamou de plenitude
ERIVALDO DE JESUS 43
dos tempos. Isto porque o exerccio intelectual a que a
filosofia exps muitos dos cidados de ento, acabou
por tornar incompatvel a devoo deste a muitas das
antigas religies pags. Justo Gonzlez, comenta assim
esse fenmeno:
Ora, Scrates, Plato e toda a tradio de que ambos eram parte, hauiam criticado os deuses pagos, dizendo que eram mais perversos do que os seres humanos. E,
acima de tudo isto, Plato falava de um ser supremo, imutvel, perfeito que era a suprema bondade e beleza.
E ainda, tanto Scrates como Plato criam na imortalidade da alma, e portanto na vida aps a morte. Por essas razes, a filosofia platnica exerceu um influxo
sobre o pensamento cristo que ainda hoje perdura. (op. cit., p. 29)
Assim como o Platonismo, o Estoicismo tambm
trouxe luz a necessidade de uma vida cuja sabedoria
estivesse permeada por valores morais. Embora no pe
rodo apostlico o Estoicismo fosse apenas sombra de
sua glria passada, seus ensinamentos continuavam a
enfatizar aspectos morais importantes, como a lei uni
versal que agia sobre a conscincia humana e a sujeio
das paixes razo. Foi no apelo s doutrinas filosfi
cas estoicistas e platonistas que muitos crentes primiti
vos elaboraram a defesa da f crist, diante das
crescentes acusaes de atesmo que tinham de enfren
tar face a uma sociedade absolutamente idoltrica. Essa
apologia, no obstante tenha tido sua funo naquele
momento histrico, acabou abrindo um precedente pe
rigoso da tentativa de se estabelecer paralelos teolgi
cos entre a f crist e a filosofia pag. Essa tendncia foi
44 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
especialmente sentida no perodo imediatamente
ps-apostlico, com os chamados apologistas. Contu
do, no foi apenas questionando os valores ticos das
religies pags que a filosofia greco-romana contribuiu
para o triunfo do Cristianismo. Na verdade, ela prpria
acabou se transformando num sistema individualista
subjetivista, incapaz de responder aos anseios daqueles
que buscavam por um Deus com o qual se pudesse esta
belecer um relacionamento ntimo, como registra Earle
Cairns, no seu livro O Cristianismo atravs dos scu
los, p. 33:
Na maioria dos casos, a filosofia apenas aspirava por Deus, fazendo dele uma abstrao; jamais revelava um
Deus pessoal de amor. Este fracasso da filosofia do
tempo de Cristo tornou as mentes humanas prontas para atender uma apresentao mais espiritual da vida.
S o Cristianismo pode preencher o vazio na vida
espiritual de ento.
A Expanso do Judasmo da DisporaUm outro aspecto histrico importante para a for
mao crist da civilizao ocidental, foi sem dvida a
expanso do Judasmo da Dispora. O Judasmo da
Dispora, da mesma sorte, colaborou para o advento do
Cristianismo, ao terem estimulado a produo das pri
meiras tradues das Escrituras para o grego, uma vez
que grande parte dessa populao havia perdido a fami
liaridade com o hebraico. Essas tradues viabilizaram a
utilizao do Velho Testamento num mundo de lngua
grega, dinamizando e enriquecendo a transmisso da
mensagem evanglica. A Septuaginta, por exemplo, a
ERIVALDO DE JESUS 45
mais antiga traduo bblica de que se tem noticia, foi
organizada em Alexandria, entre 200 e 100 a.C., vindo
a consagrar-se como uma espcie de verso autoriza
da do Cristianismo primitivo. A ela pertence a maior
parte das citaes veterotestamentrias encontradas
nos escritos apostlicos. Seu reconhecimento por parte
da Igreja Crist pode ser medido pelo fato de a Igreja
Ortodoxa Grega adot-la, at os dias atuais, como sua
verso oficial do Velho Testamento. A forte influncia
da sinagoga atingiu tambm o seio da Igreja Primitiva,
para a qual exportou alguns de seus elementos, percep
tveis tanto na estrutura organizacional, como na liturgia
daquele perodo. Originada nos tempos do cativeiro ba
bilnico, em funo do afastamento do templo e visan
do manter viva a chama da fidelidade aos ensinamentos
de Jeov, a sinagoga transformou-se, a partir de mais
ou menos 200 a.C. numa organizao desenvolvida, es
truturada e solidamente infiltrada na cultura dos judeus,
tanto dos que habitavam a Palestina como nos dispersos
pela imensido do mundo romano. Nas sinagogas, os
judeus da disperso, assim como os proslitos e simpati
zantes dentre os gentios, disseminavam, com grande ar
dor, a esperana messinica, colaborando para a
familiarizao do mundo greco-romano com a mensa
gem apostlica, que anunciava na pessoa de Jesus Cris
to o Prometido das naes. Como podemos verificar
nas viagens missionrias de So Paulo, narradas ao lon
go do livro de Atos dos Apstolos, a sinagoga transfor
mou-se numa parada obrigatria para os muitos cristos
primitivos de ascendncia judaica, os quais, em suas
misses evangelizadoras, se valeram dessa instituio
para praticarem a regra de irem primeiro aos judeus e,
46 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
ento, aos gentios (Confira Atos dos Apstolos 13.46).
Afinal de contas, a sociedade ocidental no pode negar
que suas origens so hebraico-crists. Quer queiram ou
no, ns somos semitas de esprito. O termo semitas
de esprito empregado para destacar o enorme patri
mnio espiritual legado ao Cristianismo pelo povo Ju
deu. Em 6 de setembro de 1938, numa mensagem de
rdio, o Papa Pio XI expressou que: Atravs de Cristo e
em Cristo, ns pertencemos linhagem de Abrao...
Somos semitas de esprito. Dos gregos, herdamos a
democracia, a concepo clssica das artes e, principal
mente a Filosofia. Dos romanos, herdamos o colossal
monumento jurdico esculpido em sua experincia pri
vada e pblica e, em excelncia o Direito. Dos judeus,
herdamos o conhecimento de um Deus nico e Verda
deiro, a Religio Monotesta e, em excelncia nos lega
ram o Livro mais sagrado do mundo - A Bblia.
VH istoric idade da Bblia c o m o Livro
A Bblia um dos livros mais antigos do mundo. Acredita-se que suas primeiras palavras foram escritas por Moiss por volta do Sculo XV antes de Cristo. At pouco tempo, cria-se, geralmente, que a es
crita era desconhecida nos primrdios da histria do
Antigo Testamento. Era essa uma das bases tericas da
crtica moderna, segundo a qual, alguns livros do Antigo
Testamento foram escritos muito depois dos fatos por
ele relatados, de sorte que continham apenas tradio
oral. Hoje, porm, a p dos arquelogos vem nos reve
lar que registros escritos de importantes acontecimen
tos foram feitos desde a alvorada da histria. Dentre os
documentos mais antigos do mundo, podemos destacar
os seguintes:
O Cdigo de HamurabiO Cdigo de Hamurabi foi sem dvida uma das mais
importantes descobertas arqueolgicas que j se fizeram. Hamurabi, rei da cidade de Babilnia, cuja data parece ser de 1792-1750 a.C, comumente identificado com o Anrafel, mencionado na Bblia em Gnesis 14, um dos
48 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
reis que Abrao perseguiu para libertar o seu sobrinho L. Foi um dos maiores e mais clebres dos primitivos reis babilnios. Fez seus escribas coligir e codificar as leis
do seu reino; e fez que estas se gravassem em pedras para serem erigidas nas principais cidades. Uma dessas pedras originalmente colocada na Babilnia, foi achada em 1902, nas runas de Susa (levada para l por um rei elamita, que saqueara a cidade de Babilnia no Sculo12 a.C), por uma expedio francesa dirigida por M.J.Morgan. Acha-se no museu de Louvre, em Paris. Trata-se de um bloco lindamente polido de duro e negro diorito, de 2 m por 60 cm de largura, 60 cm de altura e meio metro de espessura, um tanto oval na forma, belamente talhado nas quatro faces, com gravaes cuneifor- mes da lngua semito-babilnica (a mesma que Abrao falava). Consta de umas 4.000 linhas, equivalendo, quanto matria, ao volume mdio de um livro da Bblia; a placa cuneiforme mais extensa que j se descobriu. Representa Hamurabi recebendo as leis das mos do rei-sol Chams: Leis sobre os cultos dos deuses nos tem
plos, a administrao da justia, impostos, salrios, juros, emprstimos de dinheiro, disputas sobre propriedades, casamento, sociedade agrcola, comercial, trabalho em obras pblicas, iseno de impostos, construo de canais, a manuteno dos mesmos; regulamentos de passageiros e servio de transportes pelos canais e em caravanas, comrcio internacional e muitos outros assuntos de relevncia jurdica, no que diz respeito ao direito civil, comercial e penal, lembrados mais tarde pelo grande legislador hebreu Moiss, nos primeiros cinco livros da Bblia, conhecidos como Torah ou Lei, reverenciado como fundamento pilar da Nao Hebraica. Temos a, um livro jurdico, escrito em pedra, no uma cpia, mas o prprio autgrafo original feito nos dias de Abrao, ainda existente hoje, para testemunhar no s a
ERIVALDO DE JESUS 49
favor de um sistema bem desenvolvido de jurisprudncia, seno tambm, do fato que j nos dias de Abrao a capacidade literria do homem j havia atingido um grau notvel de adiantamento. Tudo isso tem sua relao com a autoria histrica dos primeiros livros da Bblia. Mostra, que a praxe de registrar eventos importantes era comum desde o alvorecer da Histria Universal, dando certo que os primeiros eventos do livro cannico de Gnesis podiam ter sido registrados em documentos contemporneos daqueles fatos, o que muitssimo verossmil, tornando mais e mais crvel que desde o principio, Deus preparou o ncleo de sua Palavra e superintendeu a sua transmisso e desenvolvimento atravs das eras, confirmando a tese de que as Escrituras Sagradas no exigem credulidade cega por parte daqueles que a examinam a fim de estud-las, mas sim, crena inteligente fundamentada na base de fatos crveis.
A Bblia o livro mais lido, mais traduzido, mais editado, mais pesquisado, mais conhecido, mais valioso, mais ensinado, mais proclamado, mais exaltado, mais amado e ao mesmo tempo mais odiado do mundo. A Bblia j foi traduzida para 2.062 idiomas dos cerca de trs mil idiomas falados na face da Terra, sendo a mais recente traduo para o mongol. Assim, hoje, 90% da populao do planeta terra tem condies de lerem alguma poro da Bblia, O LIVRO MAIS VENDIDO DE TODOS OS TEMPOS. O nmero de edies nas diferentes lnguas impressionante: Em 1994 foram impressas 18 milhes de Bblias completas, 13,8 milhes de exemplares do Novo Testamento, 48,4 milhes de trechos e 5,42 milhes de selees de algumas passagens bblicas. Segundo dados oficiais, desde 1980 vende-se no Japo um milho de Bblias por ano, apesar de existirem apenas 800 mil japoneses cristos. Talvez esteja sendo cumpri
50 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
da a profecia feita por um pastor chamado Ams, que h cerca de 2.750 anos se apresentou em Israel dizendo: Viro dias, diz o Senhor Deus, em que enviarei fome sobre a terra, no uma fome de po, nem uma sede de gua, mas fome e sede de ouvir as palavras do Se
nhor (Ams 8.11).
O Guinness Book - O Livro dos Recordes, edio de 1995, publicou a seguinte estatstica: O Livro mais vendido e de maior distribuio no mundo a Bblia. Calcula-se que entre 1815 e 1975 foram vendidos aproximadamente 2,5 bilhes de exemplares da Bblia.. Os dados atualizados do Guinness Book - O Livro dos Recordes, edio de 2007, j apresenta dados estatsti
cos de cerca de cerca de 6 bilhes de exemplares de Bblias vendidas at o ano de 2007.
Cdigo Judicirio de Ur-NammuSegundo o Guinnes Book 1995, o cdigo judicirio
mais antigo existente o do rei Ur-Nammu da terceira dinastia de Ur (cidade originria de Abrao), no Iraque, da
tada de cerca de 2.250 antes de Cristo (Guinnes Book - O Livro dos Recordes, 1995, pg. 242).
A Torah - Lei de MoissAcredita-se que Abrao recebeu de Sem (filho mais ve
lho de No), a histria da criao, da queda do homem no den e do Dilvio, narrada no primeiro livro da Bblia. Ele prprio recebera de Deus uma chamada direta (de Ur dos Caldeus) para tornar-se fundador de uma nao, mediante a qual um dia a raa humana seria abenoada. Vivia, portanto, numa sociedade de cultura, de livros, de cdigos jurdicos e bibliotecas. Reis contemporneos de sua poca conservavam os anais de suas naes nos arquivos dos templos. Abrao era um homem de convices e qualidades de lder organizado. Por certo deve ter
ERIVALDO DE JESUS 51
tirado cpias cuidadosas de narraes e registros recebidos de seus ancestrais; a esses registros acrescentou a histria de sua prpria vida e das promessas que Deus lhe fizera, em placas de barro, na lngua cuneiforme, destinadas aos anais da nao que ia fundar, mais tarde agrupadas por Moiss (formado em todas as cincias do Egito: Matemtica, Metafsica, Geografia e Astronomia) no Pentateuco, que so os primeiros cinco livros da Bblia. Decorridos trs meses da sada do Egito, o povo de Israel acampa-se ao p do Monte Sinai. Moiss escala suas alturas para um retiro solitrio. Quando volta, seu rosto resplandece, emite fachos de luz. Algum tradutor, muitos sculos depois, leu, em vez de Karan (fachos), Keren (chifres) - o que levou Michelangelo a colocar aquelas duas estranhas protuberncias na sua - de resto maravilhosa - obra prima, a escultura de Moiss.
Das alturas do Monte Sinai, Moiss traz consigo duas tbuas inscritas com Dez Palavras. Dez Mandamentos, to simples, to bsicos que, at hoje, os homens no aprenderam observ-los. O primeiro o prembulo que declara a Autoridade, os dois seguintes falam ao homem da sua conduta na relao com Deus, e sete ensinam o homem a viver eticamente em sociedade. Ou seja, do primeiro ao quarto mandamento; est contido as obrigaes do homem para com o seu Criador; e, do quinto ao dcimo mandamento; est contido as obrigaes do homem para com o seu prximo. Vejamos o seu resumo:
1. Eu sou o teu Deus, quem te tirou do Egito.
2. No ters outros deuses. No fars imagens.
3. No tomars o nome de Deus em vo.
4. Lembra-te do Sbado para santific-lo.
5. Honrars teu pai e tua me.
6. No Matars.
52 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
7. No cometers adultrio.
8. No roubars.
9. No dars falso testemunho.
10. No cobiars.
E respondeu todo o povo a uma voz, dizendo: Todasas palavras que Deus falou, faremos (Ex. 24.3).
Os mestres de perodos posteriores diriam que nesse instante, Israel tornou-se parceiro de Deus. A lei que Moiss entrega ao povo no se restringe aos Dez Mandamentos. No um mero regulamento para a vida errante no deserto, mas um projeto de vida para a sociedade na terra a ser conquistada. A Lei que Deus entregou aos Israelitas atravs de Moiss semelhante em muitos aspectos aos antigos tratados que os reis do Oriente Mdio faziam com os seus sditos. Nesses tratados o rei impunha certas obrigaes aos seus vassalos. Vassalos eram os servos estrangeiros, algumas vezes os prprios reis, compelidos a obedecer ao tratado. Nesse caso os Israelitas estavam se tornando servos do Rei dos reis, sob a gide da Lei Mosaica. Torah como os Judeus chamam os Cinco Livros de Moiss, palavra que tem um sentido mais abrangente do que Lei, algo como Ensinamento, Instruo, Caminho da Vida. Algumas partes neste conjunto de instrues so muito especficas e tcnicas, podendo ser divididas em: Lei Cerimonial, Lei Moral, Lei Civil e Lei Penal. Vejamos:
Lei CerimonialA lei cerimonial traz um vasto emaranhado de regras
de pureza, sacrifcios e ritos, descrevendo nos mnimos detalhes a construo do Tabernculo a ser levantado e as vestimentas de levitas e sacerdotes. Muitos ordenamentos foram, no correr dos sculos, adaptados a situa
ERIVALDO DE JESUS 53
es novas por meio de engenhosas interpretaes hermenuticas, muitos outros continuam monumentais
na sua simplicidade.
Lei MoralDentro das leis visando moralidade do convvio so
cial, encontramos alguns exemplos:
Ao estrangeiro no oprimireis, pois estrangeiro fostes no Egito.
A nenhuma viva ou rfo afligireis, pois se clamarem a mim, escutarei!
Suborno no tomes que tora as palavras dos justos.
No ds ouvido maledicncia, no acompanhes o mau para servir de falso testemunho.
Lei CivilA Torah penetra fundo na economia, sempre direcio
nada defesa do pobre:
Se em penhor tomares roupa do teu companhei
ro, at o pr do sol a devolvers, pois se s esta cobertura que ele tem, em que se deitar?
Empobrecido teu irmo, no tomars dele usura e
viver contigo.
E o grandioso: E a terra no ser vendida em perpetuidade. Porque, Minha a terra!.
Quando ferires um homem, lhe pagars para sua cura, temos aqui a indenizao por danos fsicos causa
dos Etc...
Lei PenalA despeito da rigidez penal aplicada aos criminosos
daqueles tempos, principalmente, a famosa lei de talio do olho por olho e dente por dente, tem sido mal
54 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
interpretada por muitos estudiosos, quando interpretadas ao p da letra. Sobre este assunto veja o que disse Hans Borger, no seu livro Uma Histria do Povo Judeu.
O frequentemente mal interpretado olho por olho,
dente por dente, mesmo no tempo mais remoto no era usado na sociedade israelita no sentido da Lei de Talio Romana, mas como a afirmao de que todos so iguais perante a lei, o olho ou o dente do pobre deve ser compensado igual ao dente ou olho do rico. J no h compensao financeira em relao ao assassinato: o sangue derramado ser punido com sangue, porque a vida no tem preo, o homem no um item econmico. A distino entre propriedade e vida humana um
conceito tico de justia nico na Antiguidade - o dono que mata seu escravo merecer pena igual do escravo que mata seu dono. A Torah difere em muitos aspectos do Cdigo de Hamurabi e do Livro dos Mortos Egpcios, duas das legislaes mais antigas. As comparaes frequentemente feitas fariam bem em destacar as diferenas ao invs das semelhanas, apontando para a busca da tica na justia. Hamurabi decreta: quem entregar um escravo fugitivo ao seu dono, receber uma recompensa; Moiss probe entreg-lo. (Hans Borger, 1999, pg.
36-37).
Contedo Histrico dos Livros da Bblia
A Bblia foi escrita num perodo de aproximadamen
te 1600 anos, por mais de 40 escritores, sendo pessoas das mais variadas profisses e posies sociais, desde
reis e prncipes, mdico e advogado, poeta e filsofo,
profetas e estadistas, pastores e agricultores, funcion
rio pblico e pescadores, sacerdotes e generais, juizes e
ERIVALDO DE JESUS 55
msicos, pecuarista e telogo, boiadeiro e astrnomos, para que a Bblia se tornasse o livro de todas as classes
sociais e amado por todos. A Bblia possui duas princi
pais divises: Antigo e Novo Testamento. O Antigo Testamento foi originalmente escrito na lngua hebrai
ca, possuindo algumas partes em aramaico. O Novo
Testamento foi escrito originalmente na lngua grega. No o grego clssico falado pelos eruditos, mas sim, o
grego comum falado pelo povo, conhecido como Koi-
n. A Bblia uma Biblioteca Divina que possui 73 livros (Traduo Catlica); 66 livros (Traduo
Evanglica). A Traduo Catlica possui 1.328 captu
los e cerca de 40.030 versculos. A Traduo Evanglica possui 1.189 captulos e 31.173 versculos. Segundo
alguns estudiosos da Bblia, suas palavras no texto origi
nal so 773.692 palavras e 3.566.480 letras. Sendo
592.429 palavras e 2.728.100 letras no Antigo Testamento, e, 181.253 palavras e 838.380 letras no Novo
Testamento. No Antigo Testamento, o vocbulo empre
gado para a palavra Testamento Berith que significa concerto. Representa o Antigo Pacto ou Antigo
Concerto feito por Deus com o povo eleito. O ttulo Antigo Testamento foi primeiramente aplicado aos li
vros das Escrituras Hebraicas, por Tertuliano e Orge-
nes. No Novo Testamento, o vocbulo empregado para a palavra Testamento diatheke e significa alian
a ou Testamento. Sabemos que testamento um
documento contendo a ltima vontade de algum, quanto a distribuio de seus bens, aps sua morte. Para os
eruditos no assunto, o duplo sentido do termo grego nos
mostra que a morte do testador (Jesus Cristo) ratificou
ou selou a Nova Aliana, garantindo-nos toda a herana espiritual e eterna deixada por Ele. Ou seja, na
primeira diviso principal da Bblia, temos o Antigo
56 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
Concerto (tambm chamado Pacto ou Aliana), que
veio pela outorga da Lei, feita no Monte Sinai, e selada com o simblico sangue de animais (xodo 24.3-8). Na
segunda diviso principal, temos o Novo Testamento,
ou, Novo Concerto, que veio pelo Senhor Jesus Cristo,
selado com o seu prprio sangue, no Monte Calvrio (Lucas 22.20 e Epstola aos Hebreus 9.11-15), sendo,
por isso, Um Concerto Superior. O vocbulo Bblia
vem da palavra grega biblos, nome que os gregos davam a folha de papiro preparada para escrita. Um rolo
de papiro de tamanho pequeno era chamado biblion e vrios destes eram uma Bblia. Portanto, literalmente, a palavra Bblia, quer dizer: coleo de livros pe
quenos. Com a inveno do papel, desapareceram os rolos de papiro, e a palavra biblos deu origem a livro, pois, de Bblia deriva-se biblioteca, bibliografia,
biblifilo. E consenso geral entre os doutos no assunto que o nome Bblia, foi primeiramente aplicado s Sagradas Escrituras por Joo Crisstomo, Patriarca de Cons
tantinopla, no (Sculo IV d.C.), um destacado orador, que, chegou receber o apelido de boca de ouro. O contedo histrico dos livros da Bblia, podem ser classificados por assuntos na seguinte ordem: LEI,HISTRIA, POESIA, PROFECIA, EVANGELHOS,
HISTRIA DA IGREJA PRIMITIVA E APOCALIPSE.
Antigo TestamentoO contedo dos livros do Antigo Testamento podem
ser classificados assim:
1) LEI - So os primeiros 5 livros da Bblia, conhecidos como Pentateuco e chamados pelos judeus de Torah, reconhecidos pela maioria de judeus e cris-
ERIVALDO DE JESUS 57
tos como sendo de autoria do grande legislador hebreu Moiss.
2) HISTRIA - So os livros que ocupam da Histria de Israel nos seus vrios perodos, subdivididos da seguinte forma:
2.1) TEOCRCIA - Durou cerca de 300 anos sob o governo dos juizes, perodo retratado pelo cannico livro de Juizes, culminando com o advento da Monarquia Israelita.
2.2) MONARQUIA - Durou cerca de 490 anos, e pode ser subdivididos em duas fases:
a) REINO UNIDO - Durou cerca de 120 anos, sob o governo de Saul, Davi e Salomo, os quais reinaram 40 anos cada um;
b) REINO DIVIDIDO - Durou cerca de 370 anos, sob as dinastia de Davi em Jud (Reino Sul) e a desastrosa dinastia de vrios reis de Israel (Reino Norte).
2.3) CATIVEIRO - Comeou mais cedo para as Dez Tribos do Reino Norte de Israel, quando em 722 a.C, foram levados em cativeiro por Sargo II, rei
da Assria. E, mais tarde, foi a vez do Reino Sul (Jud), serem levados em cativeiro por Nabucodo- nozor, rei do Imprio Babilnico, por volta do ano 606 a.C, na primeira deportao, e 586 a.C, na
segunda deportao de judeus para Babilnia.
2.4) PS-EXLIO - Este perodo descreve o fim do ca
tiveiro dos judeus, que durou cerca de 70 anos, quando sob o decreto do grande rei da Prsia Ciro, aconteceu o retorno dos exilados judeus sob a liderana de Esdras, Neemias e Zorobabel,
em conjunto com os ltimos profetas do Antigo Testamento Ageu, Zacarias e Malaquias.
58 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
3) POESIA - Representam a categoria dos livros poticos ou devocionais da Bblia, contendo o seguinte: Um Drama Potico (Livro cannico de J); Poesias Lricas (Livro cannico de Salmos); Didtica Potica (Livro cannico de Provrbios); Idlios Poticos (Livro cannico de Cantares de Salomo); Didtica Filosfica (Livro cannico de Eclesiastes).
4) PROFECIA - Correspondem aos livros que levam o nome dos respectivos profetas literrios. Durante trs sculos, a sequncia dos profetas clssicos hebreus constitui um fenmeno totalmente mpar na Histria. O profeta sempre um gnio da linguagem, cujo ritmo e simbolismo desafiam o mais brilhante tradutor a alcanar um inimitvel original. Esto subdivididos em dois grupos:
4.1) PROFETAS MAIORES - So Isaias, Jeremias, Ezequiel e Daniel.
4.2) PROFETAS MENORES - So Osias, Joel, Ams, Obadias, Jonas, Miquias, Naum, Haba- cuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. O termo empregado para maiores ou menores no se referem ao mrito ou notoriedade do profeta, mais ao tamanho do livro e a extenso do respectivo ministrio.
Novo TestamentoO contedo histrico dos livros do Novo Testamento
podem ser classificados assim:
1) EVANGELHOS - So os 4 Evangelhos: So Mateus, So Marcos. So Lucas e So Joo. Contm a Biografia do Senhor Jesus Cristo e a descrio de seu glorioso Ministrio terreno, cuja vida, obra, e seus ensinamentos formam o alicerce do Cristianismo. E nos Evangelhos que resplandece a cultura moral e es-
ERIVALDO DE JESUS 59
piritual do Cristianismo, condensado nos ensinamentos do Mestre dos mestres - Jesus Cristo - A Pessoa mais pura que j pisou nesta Terra.
2) HISTRIA DA IGREJA PRIMITIVA - o Livro de Atos dos Apstolos narrado por So Lucas, onde descrito um resumo do incio do Cristianismo Ps-Ressurreio e Ascenso de Jesus Cristo ao Cu, com a descida do Esprito Santo no dia da Festa Judaica de Pentecostes, culminando com o incio triunfal da maior Sociedade Cosmopolita do Mundo - a Igreja Crist.
3) EPSTOLAS APOSTLICAS - So cerca de 21 Epstolas Apostlicas endereadas aos primitivos cristos e igrejas espalhadas pelo vasto Imprio Romano, e contm o desenvolvimento sistemtico dos ensinamentos de Cristo, naquilo que podemos denominar de Teologia Apostlica, Teologia Paulina, Teologia Pe- trina, Teologia Joanina etc. As Epstolas Apostlicas podem ser subdivididas em dois grupos:
3.1) EPSTOLAS PAULINAS - Escritas por So Paulo (Saulo de Tarso), que veio a se tornar no maior Telogo do Cristianismo e o grande mentor intelectual da F Crist por todo o mundo;
3.2) EPSTOLAS GERAIS - Escritas por So Tiago, So Pedro, So Joo e So Judas.
4) APOCALIPSE - o ltimo livro da Bblia, onde numa linguagem excessivamente figurativa, enigmtica e simblica, So Joo recebe na Ilha de Patmos (Mar Egeu) a grande revelao do fim do mundo, descrevendo em vivas cores a Vinda Pessoal de Cristo terra para estabelecer o seu Governo Universal e proferir a grande sentena do famoso Juzo Final, havendo em seguida uma fuso do reino terreno com o reino celestial e eterno.
60 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
Aps ter apresentado o contedo dos assuntos trata
dos nas pginas das Escrituras Sagradas, o leitor no
ter dificuldade de entender o raciocnio a que se pro
pe esta obra, visto que o estudo do Direito Cannico e
mais especificamente da Bblia como fonte histrica do
Direito, exige uma cautela adicional do estudioso que
dever se afastar de muitos conceitos tpicos do proces
so secular, haja vista que, sob o prisma axiolgico, o
presente estudo no guarda qualquer similitude com o
escopo reservado ao estudo puramente laico do Direito.
Para bem entender as vicissitudes que demarcaram a
origem do Direito Cannico, o interessado deve ainda
considerar, na medida do possvel, as determinantes
histricas que caracterizaram o surgimento do
Cristianismo.
O Triunfo da Bblia sobre o Mundo Romano
Os imperadores romanos fizeram tudo o que lhes es
tava no alcance para destruir a nova F Crist. Queima
ram cristos e manuscritos bblicos em todo o vasto
Imprio. Por exemplo: Em cerca de 303 d.C, o impera
dor Diocleciano assinou um decreto mandando matar
os cristos e queimar seus livros sagrados. O professor
S. L. Greenslade descreve esta perseguio: Um edito
imperial, divulgado em toda parte, ordenava a demo
lio das igrejas e a destruio pelo fogo, das Escritu
ras. Ordenava tambm que os lderes das igrejas
perdessem todos os direitos civis, enquanto os que
mantinham a fe teriam reunies domsticas, teriam
sua liberdade suprimida se persistissem em se profes
ERIVALDO DE JESUS 61
sar cristos (Prof. Stanley L. Greenslade, Cambridge
History Of The Bible, Cambridge University Press,
1963). Entretanto, o entusiasmo e a dedicao dos cris
tos s Escrituras naqueles primeiros sculos da nossa
era, motivaram-nos a produzirem inmeros manuscri
tos, que eram vastamente copiados, distribudos e tradu
zidos por todo o Imprio. O Novo Testamento a
poro da Bblia mais intensamente citada na Histria,
desde a poca em que foi escrito pelos apstolos at
nossos dias. Santo Incio, bispo de Antioquia no ano 70
d.C, sob cujo ministrio estava vrias igrejas na Sria, j
citava extensamente o Novo Testamento em seus escri
tos. So Clemente, bispo de Roma no ano 70 d.C, tam
bm citava largamente o Novo Testamento, e isso
apenas quarenta anos depois da Ressurreio de Jesus
Cristo. Os historiadores encontraram quase cem mil
manuscritos e cartas dos sculos iniciais de nossa era
composto por autores cristos. O amor e devoo que
tinham pelas Escrituras Sagradas eram to avassalado
res, que aquelas cartas tm enorme quantidade de cita
es diretas do Novo Testamento. Era principalmente
desse modo que as Escrituras Inspiradas eram transmiti
das por todo o Imprio Romano, a despeito da perse
guio cruel e da queima de Bblias promovida pelos
imperadores romanos. Ainda que o governo romano ti
vesse sido bem sucedido, destruindo todos os exempla
res do Novo Testamento existentes no Imprio
Romano, todas aquelas 100 mil cartas dos primeiros
cristos garantiriam a sobrevivncia da Palavra de Deus.
Pois, nessas numerosas cartas de nossos antigos irmos
contm a inacreditvel cifra de 98% do Novo Testamen
to. Em outras palavras, mesmo que os romanos tives-
62 A BBLIA COMO FONTE HISTRICA DO DIREITO
sem tido xito na destruio do Novo Testamento,
ainda poderamos reconstruir com confiana de 98% do
texto sagrado, partir dessas numerosssimas citaes.
Isso mostra a absoluta integridade do texto da Bblia
como o conhecemos hoje, e a paixo maravilhosa dos
primeiros cristos pela Bblia Sagrada. Apesar dos es
foros dos imperadores pagos em queimar cada exem
plar da Bblia durante os primeiros trs sculos depois
de Cristo, o Cristianismo acabou triunfando sobre o
mundo romano, tornando-se a religio oficial do Imp
rio Romano, aps a converso do imperador Constanti
no, em cerca de 313 d.C. E, como prova do triunfo da
Bblia sobre o mundo romano, Euzbio (264-340 d.C),
bispo de Cesaria, Historiador da Igreja, viveu e foi pre
so durante a perseguio de Diocleciano, no ltimo e
desesperado esforo de Roma por varrer da terra o Cris
tianismo. Porm, sobreviveu esta ltima perseguio
e, viveu at o reinado de Constantino, vindo a ser o seu
principal conselheiro. Um dos primeiros atos de Cons
tantino, ao ascender o trono, foi mandar preparar, sob
a direo de Euzbio e a cargo de hbeis copistas,
CINQUENTA BBLIAS para as Igrejas de Constantino
pla, no mais delicado ve