UNIVERSIDADE DE COIMBRA
FACULDADE DE DIREITO
A INFORMAÇÃO PRÉVIA NO
ORDENAMENTO JURÍDICO-URBANÍSTICO
PORTUGUÊS
CATARINA BOTELHO
Coimbra
Março 2010
2
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
FACULDADE DE DIREITO
2º CICLO DE ESTUDOS EM DIREITO
A INFORMAÇÃO PRÉVIA NO
ORDENAMENTO JURÍDICO-URBANÍSTICO PORTUGUÊS
CATARINA ISABEL ALMEIDA BOTELHO
Dissertação apresentada no âmbito do
2º Ciclo de Estudos em Direito da Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra
Secção de Ciências Jurídico-Políticas
Área de Especialização de Direito Administrativo
Orientador: Dr.ª Fernanda Paula Oliveira
Coimbra
Março 2010
3
4
PRINCIPAIS ABREVIATURAS
AD – Acordãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo
BFD – Boletim da Faculdade de Direito
CEDOUA – Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do
Ambiente
CJA – Cadernos de Justiça Administrativa
CPA – Código do Procedimento Administrativo
CPTA – Código de Processo nos Tribunais Administrativos
CRP – Constituição da República Portuguesa
DL – Decreto-Lei
LBPOTU – Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de
Urbanismo
LPTA – Lei de Processo nos Tribunais Administrativos
PDM – Plano Director Municipal
RDRL – Revista de Direito Regional e Local
RGEU – Regulamento Geral das Edificações Urbanas
RJIGT – Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
RJUE – Regime Jurídico da Urbanização e Edificação
STA – Supremo Tribunal Administrativo
TCA – Tribunal Central Administrativo
5
ÍNDICE
PRINCIPAIS ABREVIATURAS .............................................................................................................. 4
I – INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 8
II – A FUNÇÃO DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA E A NATUREZA E EFEITOS DA
INFORMAÇÃO PRÉVIA ....................................................................................................................... 10
1 – NOÇÃO E FUNÇÕES DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA ......................... 10
2 – EVOLUÇÃO DA FIGURA NO ORDENAMENTO URBANÍSTICO PORTUGUÊS
................................................................................................................................................. 13
2.1 – LOTEAMENTOS E OBRAS DE URBANIZAÇÃO ............................................ 13
2.1.1 - O Decreto-Lei n.º 46.673, de 29 de Novembro de 1965 ................................... 13
2.1.2 - O Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de Junho .......................................................... 13
2.1.3 - O Decreto-Lei n.º 400/84, de 31 de Dezembro ................................................. 14
2.1.4 - O Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro ................................................. 16
2.2 – OBRAS PARTICULARES ...................................................................................... 19
2.2.1 - O Decreto-Lei n.º 166/70, de 15 de Abril .......................................................... 19
2.2.2 - O Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro ................................................. 21
2.3 – O Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro........................................................ 23
3 – A INFORMAÇÃO PRÉVIA FAVORÁVEL OU DESFAVORÁVEL – CONTEÚDO,
NATUREZA E EFEITOS PARA REQUERENTE, ADMINISTRAÇÃO E
TERCEIROS DA RESPOSTA AO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA ................. 25
3.1 – O CONTEÚDO DA INFORMAÇÃO PRÉVIA .................................................... 25
3.2 –A NATUREZA E EFEITOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA ................................ 28
3.2.1 - A informação prévia favorável (ou favorável condicionada) ou desfavorável
como resposta ao pedido de informação prévia .......................................................... 28
3.2.2 - A informação prévia como decisão e não mera informação ........................... 29
3.2.3 - O pedido de informação prévia como procedimento próprio ........................ 30
3.2.3.1 – Os casos especiais de pedido de informação prévia obrigatório ............ 32
3.2.4 - A informação prévia como acto prévio? ........................................................... 34
3.2.4.1 – A Vorbescheid do direito alemão ............................................................... 37
3.2.5 - A informação prévia como promessa? .............................................................. 39
3.2.6 – Primeira aproximação à natureza jurídica da informação prévia – acto sui
generis? ........................................................................................................................... 42
6
3.2.7 - Os efeitos da informação prévia (favorável) para o requerente: carácter
constitutivo de direitos: que direito? Direito condicionado (pressupostos) e limitado
no tempo ......................................................................................................................... 44
3.2.7.1 – O artigo 81.º, n.º 1, do RJUE – o início dos trabalhos preparatórios após
o saneamento do pedido de licenciamento conforme com a anterior informação
prévia favorável ......................................................................................................... 49
3.2.8 – A impugnabilidade da informação prévia pelo requerente (os efeitos
externos e - potencialmente - lesivos); interesses/ reflexos económicos da
informação prévia ......................................................................................................... 51
3.2.8.1 – Os “interesses/ reflexos económicos” associados à informação prévia .. 54
3.2.9 – A informação prévia desfavorável: acto negativo; conteúdo (positivo)
informativo; efeitos e impugnabilidade ....................................................................... 54
3.2.9.1 – A impugnabilidade da informação prévia desfavorável – a
jurisprudência do STA.............................................................................................. 56
3.2.10 – A vinculatividade da informação prévia para a Administração ................. 58
3.2.11 – Os efeitos procedimentais (eventuais) da informação prévia ...................... 59
3.2.12 – Os efeitos da informação prévia em relação a terceiros .............................. 60
3.2.12.1 – Os vizinhos urbanísticos - as relações multilaterais da Administração e
os actos com efeitos em relação a terceiros ............................................................... 62
4 – CONFRONTO DA INFORMAÇÃO PRÉVIA COM OS DIVERSOS ACTOS DE
GESTÃO URBANÍSTICA – OS DIFERENTES ACTOS E DISTINTOS EFEITOS
PRODUZIDOS ...................................................................................................................... 69
4.1 - Licenciamento de operações loteamento (e obras de urbanização) e de obras de
edificação ............................................................................................................................ 69
4.2 - Admissão de comunicação prévia (de operações de loteamento ou obras de
edificação) .......................................................................................................................... 71
4.3 - Autorização de utilização ......................................................................................... 72
III – DISTINÇÃO DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA DE FIGURAS AFINS ................... 74
5 – O DIREITO À INFORMAÇÃO URBANÍSTICA ....................................................... 74
5.1 - O artigo 110.º do RJUE – o direito à informação .................................................. 74
5.2 - A alínea a) do n.º 1 do artigo 110.º: o direito à informação sobre normas
urbanísticas em vigor – noção, conteúdo, função e importância .................................. 77
5.3 - A informação urbanística nos diplomas anteriores ao RJUE ............................... 78
5.4 - A informação urbanística como acto meramente informativo/ declarativo; seus
efeitos - responsabilidade da Administração por informações erróneas; a questão da
alteração das normas urbanísticas ................................................................................... 81
5.5 - Legitimidade para requerer a informação ............................................................. 83
5.6 - Diferenças entre informação urbanística e informação prévia ............................. 84
7
5.7 – INFORMAÇÃO PRÉVIA E INFORMAÇÃO SOBRE NORMAS URBANÍSTICAS
NO DIREITO COMPARADO: as figuras do certificat d´urbanisme francês e do
certificato urbanistico italiano e o derecho a obtener información escrita do direito
espanhol .............................................................................................................................. 85
5.7.1 - O certificat d´urbanisme francês........................................................................ 86
5.7.2 – O certificato urbanistico italiano ....................................................................... 91
5.7.3 – O derecho a obtener información escrita do direito espanhol ....................... 91
6 – O ACTO DE APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA ................... 93
6.1 - A aprovação do projecto de arquitectura: natureza e conteúdo do acto; o
procedimento de licenciamento de obras como procedimento faseado ......................... 93
6.2 - A aprovação do projecto de arquitectura como acto prévio – efeitos para o
requerente e para a Administração ................................................................................. 95
6.2.1 - A alteração das regras urbanísticas entre a aprovação do projecto de
arquitectura e o acto final de licenciamento ............................................................... 97
6.3 - O acto de aprovação do projecto de arquitectura como acto impugnável –
lesividade e impugnabilidade por terceiros ..................................................................... 98
6.4 - Evolução jurisprudencial – a jurisprudência do STA relativamente ao acto de
aprovação do projecto de arquitectura ......................................................................... 102
6.5 - Informação prévia vs. aprovação do projecto de arquitectura ........................... 105
IV – A INFORMAÇÃO PRÉVIA NA LEGISLAÇÃO ACTUAL E ALGUMAS QUESTÕES
CONTROVERSAS ................................................................................................................................. 108
7 – OS ARTIGOS 14.º A 17.º DO RJUE ........................................................................... 108
8 – A LEGITIMIDADE PARA FORMULAR O PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
............................................................................................................................................... 113
9 – O EFEITO DA ALTERAÇÃO DAS REGRAS URBANÍSTICAS SOBRE A
INFORMAÇÃO PRÉVIA (favorável e eficaz) – as alterações dos planos; a não
suspensão dos procedimentos de controlo prévio suportados em anterior informação
prévia .................................................................................................................................... 117
9.1 – A indemnização pelo sacrifício .............................................................................. 123
10 – A POSSIBILIDADE DE “RENOVAÇÃO” DA INFORMAÇÃO PRÉVIA .......... 125
V – CONCLUSÕES: A INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO ACTO SUI GENERIS E A SUA
RENOVADA IMPORTÂNCIA............................................................................................................. 128
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................... 131
8
I – INTRODUÇÃO
O presente estudo dedica-se à informação prévia, figura não inédita, mas nem por
isso doutrinal e jurisprudencialmente unânime, no âmbito do ordenamento jurídico-
urbanístico português. Como pronúncia da Administração, cumpre-nos assumi-la e
apreciá-la dentro do esquema global da actividade administrativa; contudo, como
pronúncia da Admnistração municipal no âmbito da sua actividade urbanística, não
podemos perder de vista esse ―quadro especial‖ da actividade administrativa em que se
insere, se conforma e se afirma, pelo que a sua configuração dogmática há-de sempre
proceder, em última instância, do confronto com as outras pronúncias emitidas pela
Administração no âmbito dessa actividade urbanística, mais concretamente da
actividade de gestão urbanística.
Quando nos referimos a gestão urbanística, aludimos, nas palavras da melhor
doutrina, ao conteúdo normal e institucionalmente mais relevante da actividade de
execução dos planos urbanísticos, ou seja, de concretização do modelo territorial
previamente recortado. Mas tal actividade não esgota a gestão urbanística da
Administração, que abrange todas as actividades relacionadas com a ocupação, uso e
transformação do solo, realizadas pela Administração ou pelos particulares sob a
direcção, promoção, coordenação ou controlo daquela, independentemente do seu
enquadramento no contexto da execução de um plano urbanístico.1 E como
instrumentos de gestão urbanística, interessam-nos, nesta sede, o loteamento urbano e o
licenciamento de obras particulares, no âmbito dos quais a Administração pratica actos
de gestão urbanística, amplamente considerados como decisões pelas quais uma
autoridade administrativa exerce um controlo sobre a legalidade ou a conveniência de
uma operação urbanística2 a realizar ou já realizada
3.
Entre esses actos de gestão urbanística englobam-se os actos prévios e finais, os
actos parciais e globais, os actos operativos entre entes públicos ou entre entes públicos
e particulares, os actos informativos, autorizativos e verificativos, os actos expressos e
1 Cfr. F. ALVES CORREIA, As Grandes Linhas da Recente Reforma do Direito do Urbanismo
Português, reimpressão, Almedina, 1993, pp. 64-65. 2 Operações urbanísticas, amplamente configuradas nos termos do actual RJUE, são ―as
operações materiais de urbanização, de edificação, utilização dos edifícios ou do solo desde que, neste
último caso, para fins não exclusivamente agrícolas, pecuários, florestais, mineiros ou de abastecimento
público de água” – alínea j) do n.º 2 do diploma. 3 Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA/PEDRO GONÇALVES, A Nulidade dos Actos
Administrativos de Gestão Urbanística, in Revista do CEDOUA, n.º 3, Ano II, 1.1999, p. 24.
9
silentes, todos eles, contudo, de carácter real4, e entre os quais se encontra, portanto,
independentemente da natureza jurídico-dogmática que lhe cometamos a final, o acto de
informação prévia.
Delimitado e enquadrado o objecto do nosso trabalho, passamos à esquematização
delineada para este percurso argumentativo. Principiamos com a noção do pedido de
informação prévia e funções que, numa primeira análise eventualmente perfunctória,
entendemos que tal instituto cumpre. Seguimos com a recensão dos diplomas legais que
consagraram a figura ou figuras que originaram a actual, independentemente do seu
nomen iuris, com especial referência às questões da legitimidade para requerer o pedido
e da atribuição ou não de carácter constitutivo de direitos ao acto, conforme resultava
não só dos textos legais, mas, igualmente, da doutrina e jurisprudência administrativas à
época. Passamos ao conteúdo da informação prévia, posto o qual estaremos em
condições de averiguar da sua natureza jurídica e efeitos, atendendo à evolução descrita
da figura e à sua conformação legal, doutrinal e jurisprudencial actual. Acerca de tais
questões não poderemos concluir sem antes proceder a um confronto com os restantes
actos de gestão urbanística – os actos permissivos (licença, admissão de comunicação
prévia e autorização de utilização), mas, sobretudo, o igualmente não permissivo (e
igualmente controverso!) acto de aprovação do projecto de arquitectura. Além da
delimitação da informação prévia relativamente à figura da informação urbanística
sobre normas em vigor, designadamente destacando a imbricação entre as
características de ambas que parece definir determinadas figuras existentes noutros
ordenamentos jurídico-urbanísticos influenciadores do nosso – ordenamentos francês,
italiano e espanhol. Por fim, cabe apreciar detalhadamente alguns aspectos da
informação prévia dos artigos 14.º a 17.º do actual Regime Jurídico da Urbanização e
Edificação, em especial algumas das questões mais controversas que no seu âmbito se
têm colocado, como a da legitimidade para fazer o pedido, a das consequências da
alteração das normas de planeamento sobre a informação prévia, e a da inovatória
possibilidade da sua ―renovação‖, posto o que nos propomos a delinear conclusões
acerca da figura.
4 Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA/PEDRO GONÇALVES, A Nulidade…, cit., p. 24.
10
II – A FUNÇÃO DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA E A NATUREZA E
EFEITOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
1 – NOÇÃO E FUNÇÕES DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
Nos termos do n.º 1 do artigo 14.º do actual Regime Jurídico da Urbanização e
Edificação5, o pedido de informação prévia traduz-se no pedido, feito por qualquer
interessado à câmara municipal, a título prévio, de informação acerca da viabilidade de
realizar determinada operação urbanística ou conjunto de operações urbanísticas
directamente relacionadas, assim como acerca dos condicionamentos legais e
regulamentares aplicáveis à pretensão, relativos a infra-estruturas, servidões
administrativas e restrições de utilidade pública, índices urbanísticos, cérceas,
afastamentos e demais condicionantes aplicáveis.
Já no âmbito da anterior legislação, a doutrina definia o pedido de informação
prévia como faculdade6 reconhecida ao interessado de requerer à câmara municipal
informação sobre a possibilidade de realizar determinada obra sujeita a licenciamento
municipal e respectivos condicionamentos7, correspondendo, assim, a um direito
daquele8.
Definido, em termos gerais, o pedido de informação prévia, avançamos com as
diferentes funções que entendemos serem cometidas pela lei actual a esse instituto.
Assim, atendendo aos artigos 14.º a 17.º do RJUE, disciplinadores do pedido de
informação prévia, sustentamos desempenhar essa figura as seguintes funções:
5 DL n.º 555/99, de 16 de Dezembro, alterado pela Lei n.º 13/2000, de 20 de Julho, pelo DL n.º
177/2001, de 4 de Junho, pelas Leis n.ºs 15/2002, de 22 de Fevereiro, e 4-A/2003, de 19 de Fevereiro,
pelo DL n.º 157/2006, de 8 de Agosto, e pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro. 6 VIEIRA DE ANDRADE define faculdades jurídicas como representações dos vários modos
possíveis de manifestação ou actuação de um direito subjectivo ou de uma posição jurídica subjectiva,
cujo conteúdo constituem, correspondendo, designadamente, a ―segmentos ideais‖ das normas jurídicas
que os prevêem, como por exemplo as diversas faculdades que integram o direito de propriedade. Cfr.
VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 8.ª edição, Almedina, 2006, p. 82. 7 Cfr. F. ALVES CORREIA, ob. cit., p. 131, nota 77. O Autor reporta-se à figura consagrada
pelo artigo 10.º do pretérito DL n.º 445/91, de 20 de Novembro, na versão alterada, por ratificação, pela
Lei n.º 29/92, de 5 de Setembro. 8 Cfr. F. ALVES CORREIA, ob. cit., pp. 136 e 97, aqui em referência ao artigo 7.º do DL n.º
448/91, de 29 de Novembro, na versão alterada, por ratificação, pela Lei n.º 25/92, de 31 de Agosto,
afirmando o Autor o designado pedido de informação como o direito de requerer à câmara municipal
informação escrita sobre os elementos de facto e de direito que possam limitar ou condicionar o
licenciamento das operações de loteamento ou de obras de urbanização.
11
a) Função de informação: através do pedido de informação prévia o requerente é
informado da possibilidade de realizar a pretensão apresentada, tendo em conta
as normas que lhe são aplicáveis, e respectivos condicionamentos legais e
regulamentares, isto na medida da informação pretendida e dos elementos
apresentados pelo requerente no pedido – n.ºs 1 e 2 do artigo 14.º. Trata-se,
deste modo, de uma função de informação que podemos designar como
concretizada, característica que distingue o pedido de informação prévia do
direito à informação da alínea a) do n.º 1 do artigo 110.º do RJUE, conforme
ulteriormente apreciaremos. Esta função de informação encontra-se presente,
também, nos n.ºs 3 e 4 do artigo 16.º, que prescrevem, respectivamente, a
obrigatoriedade de indicação, na informação prévia favorável, do procedimento
de controlo prévio a que se sujeita a operação projectada, e a obrigatoriedade, no
caso de informação desfavorável, da indicação dos termos em que a mesma pode
ser revista, conformando-se com as regras aplicáveis.
b) Função de garantia: a câmara municipal fica vinculada à informação emitida, em
caso de posterior pedido de licenciamento ou apresentação de comunicação
prévia pelo interessado requerente, no prazo de um ano, e na medida da
conformação do ulterior pedido aos termos da informação prestada, e quer seja a
mesma favorável ou desfavorável à pretensão do particular – artigo 17.º, nºs 1, 2
e n.º 4 do artigo 16.º. Esta função de garantia para o particular requerente
encontra-se potencializada, ainda, pela possibilidade de renovação prevista no
n.º 3 do artigo 17.º, e pelo afastamento da suspensão dos procedimentos de
licenciamento e comunicação prévia suportados em precedente informação
prévia nas áreas a abranger por novas regras urbanísticas, constantes de plano
municipal ou especial de ordenamento do território ou sua revisão, entre o início
da fase de discussão pública até à entrada em vigor do instrumento de
planeamento, conforme prescreve o n.º 4 do artigo 17.º.
Já a doutrina anterior à actual lei reconhecia ao pedido de informação prévia esta
função de garantia, apresentando-o como “instrumento de segurança dos
particulares, diminuindo os riscos de não aprovação do projecto da obra, cujos
12
custos são normalmente elevados”9, correspondente à necessidade dos
proprietários dos terrenos e potenciais investidores de obterem informação
escrita sobre a possibilidade de realizar operações urbanísticas, e à prática
corrente da apresentação de “estudos prévios” ou “ante-projectos”10
.
c) Função de simplificação procedimental: o artigo 15.º prescreve a realização de
consultas externas, no âmbito do procedimento de informação prévia, às
entidades cujas pronúncias condicionem a informação a prestar, sendo essa
consulta devida num eventual pedido de licenciamento ou apresentação de
comunicação prévia respeitante à operação em causa, e antecipando-se, assim,
essas consultas obrigatórias, que, sendo favoráveis à pretensão, não terão de
repetir-se no procedimento de controlo prévio posterior à informação prévia,
desde que esta abarque todos os pressupostos a apreciar por aquelas entidades e
o posterior pedido lhes seja conforme11
. Esta hipótese é expressamente
configurada na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 17.º, que prevê a sujeição da operação
objecto da informação prévia favorável ao regime de comunicação prévia, nos
casos em que o pedido de informação prévia se apresenta na sua modalidade
mais abrangente (do n.º 2 do artigo 14.º), dispensando-se a realização de novas
consultas externas necessárias. As pronúncias das entidades exteriores ao
município fazem parte integrante da informação prévia aprovada, nos termos do
n.º 2 do artigo 16.º, sendo obrigatoriamente notificadas ao requerente, com a
informação prévia. Estas características permitem-nos cometer ao pedido de
informação prévia uma função de antecipação, agilização e simplificação
procedimental, que beneficia quer o particular requerente quer a
Administração12
-13
.
9 Cfr. F. ALVES CORREIA, ob. cit. p. 132, nota 77.
10 Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, Legislação Fundamental de Direito do
Urbanismo Anotada e Comentada, Vol. II, Lisboa, Lex, 1994, pp. 532 e 825. 11
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, Regime Jurídico da Urbanização e
Edificação Comentado, 2.ª edição, Almedina, 2009, pp. 220-221. 12
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação ao Acordão do STA de 20.06.2002, in
Revista do CEDOUA, n.º 10, Ano V, 2.2002, p. 125. 13
JOÃO PEREIRA REIS e outros afirmam ser objectivo fundamental do pedido de informação
prévia fornecer ao particular um conjunto de informações fiáveis e credíveis, que lhe permitam analisar
da viabilidade e interesse da operação urbanística, nomeadamente nos aspectos legais e económicos, e,
simultaneamente, definir o quadro de referência que vai reger a “formatação” dos procedimentos de
controlo prévio, objectivos que se podem reconduzir às três funções que assinalámos à figura em estudo.
13
2 – EVOLUÇÃO DA FIGURA NO ORDENAMENTO URBANÍSTICO
PORTUGUÊS
2.1 – LOTEAMENTOS E OBRAS DE URBANIZAÇÃO
2.1.1 - O DECRETO-LEI N.º 46.673, DE 29 DE NOVEMBRO DE 1965
Embora este diploma fosse omisso em relação a tal possibilidade, admitia-se,
durante a sua vigência, a solicitação de informações sobre a viabilidade de loteamentos
às câmaras municipais, considerando-se, no entanto, tais deliberações como actos
meramente opinativos, que não criavam nem extinguiam qualquer direito ou interesse
digno de tutela jurídica, e sendo, consequentemente, e de acordo com a jurisprudência
do STA, insusceptíveis de impugnação contenciosa.
Veja-se, a este propósito, o Acordão do STA de 18 de Junho de 197614
, no qual
se afirmava que a decisão favorável sobre pedido de viabilidade de loteamento,
proferida na vigência deste diploma, mais não constituía que “mero parecer ou modo de
ver de um órgão sem intenção de produzir efeitos imediatos”15
.
2.1.2 - O DECRETO-LEI N.º 289/73, DE 6 DE JUNHO
O DL n.º 289/73, de 6 de Junho, previa, no seu artigo 4.º16
, poderem os
interessados “requerer à câmara municipal da situação do prédio informação sobre a
possibilidade de realizar as operações previstas neste diploma e seus
condicionamentos”. E o n.º 2 do mesmo artigo prescrevia que “a validade das decisões
respeitantes a pedidos de informação caduca se, no prazo de um ano, a contar da data
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação Anotado, 3.ª
edição revista e actualizada, Almedina, 2008, pp. 86 e 87. 14
Acordãos Doutrinais do STA, n.º 182, Ano XVI, Fevereiro de 1977, p. 1830. 15
Acordãos Doutrinais, cit., p. 1830. 16
―Artigo 4.º
1. Os interessados poderão requerer à câmara municipal da situação do prédio informação sobre a
possibilidade de realizar as operações previstas neste diploma e seus condicionamentos.
2. A validade das decisões respeitantes a pedidos de informação caduca se, no prazo de um ano, a contar
da data da sua comunicação aos requerentes, não for apresentado o respectivo pedido de loteamento.
3. É aplicável ao pedido de informação previsto neste artigo o disposto nos artigos 2.°, 3.°, 8.º, 15.° e 16.°
do presente diploma.‖
14
da sua comunicação aos requerentes, não for apresentado o respectivo pedido de
loteamento”.
A jurisprudência do STA assumiu papel de destaque na conformação do instituto
assim consagrado neste diploma. No seu domínio, entendeu o STA ser o deferimento do
pedido de viabilidade de loteamento vinculativo para a Administração, criando um
direito ou, pelo menos, um interesse legítimo para o interessado – veja-se o citado
Acordão de 18/06/197617
, onde se afirma tal acto como acto administrativo definitivo e
executório18
.
Consequentemente, nesse mesmo sentido, se pronunciou a doutrina, afirmando
estar a relevância do pedido de informação, na economia do diploma, dependente do
carácter constitutivo de direitos da deliberação camarária, carácter este cujo
reconhecimento sairía, de acordo com o mesmo Autor, reforçado pela prescrição da
caducidade da informação nos termos do n.º 2 do artigo citado19
.
Contudo, alguns Autores citicaram a deficiente explicitação, legal e
jurisprudencial, do conteúdo do assumido direito ou interesse juridicamente tutelado,
admitindo poderem as soluções oscilar entre o direito de obter a licença (de lotear),
desde que respeitados os termos da informação, e o direito a ser indemnizado pelos
prejuízos sofridos na eventualidade da Administração, posteriormente e prejudicando o
conteúdo técnico concreto da anterior informação, indeferir o pedido de loteamento,
dentro do prazo de um ano (prazo de validade da decisão de viabilidade)20
.
2.1.3 - O DECRETO-LEI N.º 400/84, DE 31 DE DEZEMBRO
O DL n.º 400/84, de 31 de Dezembro, enunciava, no n.º 1 do seu artigo 7.º21
, a
faculdade de qualquer interessado “requerer, por escrito, à câmara municipal do lugar
17
Acordãos Doutrinais, n.º 182, cit., pp.1819 e ss; cfr. FILIPA URBANO CALVÃO, Os actos
precários e os actos provisórios no direito administrativo, Porto, Universidade Católica Portuguesa,
1998, p. 51, nota 67; igualmente, JOSÉ MIGUEL SARDINHA, O Novo Regime Jurídico das Operações
de Loteamento e das Obras de Urbanização Comentado e Anotado, Coimbra Editora, 1992, pp. 28 e 29. 18
Acordãos Doutrinais, n.º 182, cit., pp. 1831-1832. 19
Cfr. OSVALDO GOMES, Manual dos Loteamentos Urbanos, Atlântida Editora, 1980, pp. 92
e 93. 20
Cfr. MARIA DO PATROCÍNIO PAZ FERREIRA/LUÍS PERESTRELO DE OLIVEIRA,
Legislação Urbanística: 2 – Loteamentos, ed. da D.G.P.U., Dezembro de 1981, p. 21, citado pelos
mesmos Autores na sua obra posterior, O novo regime jurídico dos loteamentos urbanos, Decreto-Lei n.º
400/84, de 31 de Dezembro Anotado, Direcção Geral do Planeamento Urbanístico, Almedina, 1985, p. 31. 21
“Artigo 7.°
15
da situação do prédio, informação sobre a possibilidade de realização das operações
ou obras referidas no artigo 1.º e respectivos condicionamentos, esclarecendo
suficientemente a pretensão e juntando plantas à escala 1:25 000 e 1:1000, com a
indicação do local da situação do prédio”. Apesar da maior concretização quanto à
apresentação do pedido e ao conteúdo da informação - vejam-se, além daquele n.º 1, os
n.ºs 2 e 3 do artigo 7.º - relativamente ao diploma precedente, prescrevia o n.º 2 do
artigo 8.º22
deste DL, expressamente, que “a informação fornecida nos termos do
presente capítulo não é constitutiva de direitos nem fonte geradora de expectativas
susceptíveis de protecção jurídica”. Esta previsão afastou a jurisprudência gerada ao
abrigo do diploma anterior, no sentido do efeito constitutivo de um direito ou interesse
legítimo da deliberação camarária.
Nestes termos, a doutrina cometia natureza meramente indicativa à informação
prévia23
, justificada, designadamente, pelo facto do processo decorrer apenas a nível
municipal24
, o que não excluía a responsabilidade civil do município por informações
erróneas ou deficientes, dolosas ou negligentes, das quais resultasse um prejuízo para o
interessado, nos termos do artigo 485.º, n.º 2 do Código Civil, assim como a
1-Qualquer interessado poderá requerer, por escrito, à câmara municipal do lugar da situação do prédio
informação sobre a possibilidade de realização das operações ou obras referidas no artigo 1.° e
respectivos condicionamentos, esclarecendo suficientemente a pretensão e juntando plantas à escala 1:25
000 e 1:1000, com a indicação do local da situação do prédio.
2-A informação mencionará as disposições do plano regional de ordenamento, do plano director
municipal, de planos de urbanização, gerais, parciais ou de pormenor, ou das normas provisórias a que se
refere o artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 794/76, de 5 de Novembro, ou, na sua falta:
a) O zonamento e ou índices urbanísticos, nomeadamente densidade de ocupação e número de fogos e
pisos permitidos;
b) Os dados disponíveis sobre infra-estruturas, equipamentos e serviços gerais;
c) As servidões públicas ou outros condicionamentos legais existentes.
3-A informação referida no n.° 2 mencionará expressamente o seu prazo de validade, o qual não pode ser
inferior a 6 meses.‖ 22
―Artigo 8.°
1-A câmara municipal deliberará sobre o pedido de informação no prazo de 30 dias após a entrega do
requerimento a que alude o artigo anterior, devendo a respectiva deliberação ser comunicada ao
requerente no prazo de 15 dias.
2-A informação fornecida nos termos do presente capítulo não é constitutiva de direitos nem fonte
geradora de expectativas susceptíveis de protecção jurídica.‖ 23
Isto considerando que não existia plano, ou estudo relativo ao local, plenamente eficaz, uma
vez que o conteúdo da informação consistiria na menção das disposições pertinentes dos planos em vigor
na área em questão. Cfr. MARIA DO PATROCÍNIO PAZ FERREIRA/LUÍS PERESTRELO DE
OLIVEIRA, O novo regime…, ob. cit., pp. 29-30. 24
Diversamente do anterior DL n.º 289/73 que, no n.º 3 do artigo 4.º, remetia para disposições
relativas à emissão de pareceres por entidades externas à câmara municipal.
16
responsabilidade civil por danos emergentes da omissão da informação no prazo fixado
para tal pelo n.º 1 do artigo 8.º, reunidos os pressupostos do artigo 486.º do CC.25
Quanto ao prazo de validade da informação - nos termos do n.º 3 do artigo 7.º
daquele diploma, a informação prestada, com o conteúdo estabelecido no n.º 2,
―mencionará expressamente o seu prazo de validade, o qual não pode ser inferior a seis
meses” – os mesmos Autores referem-se à sua definição pela câmara em face das
circunstâncias objectivas, devendo ter-se em conta factos como a alteração iminente de
um plano, a cessação iminente de normas provisórias, se o aproveitamento urbanístico
da área em causa se encontrava em estudo ou em vias de aprovação, entre outros26
. Tal
disposição espelhava, assim, contudo, uma intenção de estabilidade normativa e
segurança jurídica dos particulares relativamente às operações de loteamento.27
2.1.4 - O DECRETO-LEI N.º 448/91, DE 29 DE NOVEMBRO
O DL n.º 448/91, de 29 de Novembro, que revogou o DL n.º 400/84, consagrou,
no seu artigo 7.º28
, sob a epígrafe de “pedido de informação”, o direito de qualquer
interessado “requerer à câmara municipal informação escrita, a fornecer no prazo de
20 dias, sobre os elementos de facto ou de direito que possam limitar ou condicionar o
licenciamento das operações de loteamento ou de obras de urbanização”.
25
Cfr. MARIA DO PATROCÍNIO PAZ FERREIRA/LUÍS PERESTRELO DE OLIVEIRA, ob.
cit., pp. 30-31. 26
Cfr. MARIA DO PATROCÍNIO PAZ FERREIRA/LUÍS PERESTRELO DE OLIVEIRA, ob.
cit., p. 30. 27
Note-se, ainda, o artigo 9.º do DL n.º 400/84, relativo a processos especiais de loteamento, que
prescrevia: “O licenciamento das operações de loteamento que, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 3.°,
seguem a forma de processo especial depende da aprovação prévia pela câmara municipal de um estudo
preliminar de urbanização da área a abranger pelas mesmas, a apresentar pelo interessado.” Face a esta
disciplina, alguma doutrina chegou a afirmar o pedido de informação do artigo 7.º do ulterior DL n.º
448/91 como “um sucedâneo” deste pedido de aprovação do estudo preliminar de urbanização, como fase
necessária do (mais complexo) processo especial de loteamento, extinto em 1991. Cfr. CARLOS
ALEGRE, Novo Regime dos Loteamentos Urbanos Anotado, Rei dos Livros, 1993, p. 24. 28
Artigo 7.º do DL 448/91, na versão originária:
“ Pedido de informação
1 - Qualquer interessado tem o direito de requerer à câmara municipal informação escrita, a fornecer no
prazo de 20 dias, sobre os elementos de facto ou de direito que possam limitar ou condicionar o
licenciamento das operações de loteamento ou de obras de urbanização.
2 - Para efeitos do número anterior, o requerente deve explicitar os elementos sobre os quais pretende
informação e identificar o local da situação do prédio, juntando planta à escala 1:25 000 ou superior.
3 - Na resposta ao pedido de informação, a câmara municipal indica quais as entidades que legalmente se
devem pronunciar no âmbito do processo de licenciamento.‖
17
A doutrina dividiu-se quanto à natureza constitutiva de direitos da figura assim
consagrada na versão originária deste diploma. De acordo com alguns Autores, esta
informação não seria constitutiva de direitos, nem fonte geradora de expectativas
susceptíveis de protecção jurídica, tal como o precedente “pedido de informação
prévia” do DL n.º 400/84, por aquela substituído29
.
Em sentido contrário, ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA E OUTROS
propugnaram pelo carácter vinculativo para a câmara municipal da decisão relativa ao
pedido de informação, apesar da falta de previsão legal desse carácter vinculativo e do
prazo de validade da decisão. A favor da natureza constitutiva de direitos da informação
favorável argumentavam com o reconhecimento dessa natureza ao pedido de
informação consagrado no âmbito do DL n.º 289/73, com a duvidosa
constitucionalidade do pretérito artigo 8.º, n.º 2 do DL n.º 400/84, e, ainda, com o facto
da lei prever, no artigo 67.º, n.º 1, o deferimento tácito em geral face “à falta de
deliberação, autorização ou aprovação nos prazos fixados no presente diploma” - 20
dias no caso do pedido de informação, nos termos do n.º 1 do artigo 7.º, formando-se
deferimento tácito decorrido esse prazo30
.
O DL n.º 334/95, de 28 de Dezembro, alterou substancialmente a disposição do
artigo 7.º da versão originária do DL n.º 448/91, introduzindo, inclusive, um novo
artigo, o artigo 7.º-A, para disciplina da figura que passou a designar de “pedido de
informação prévia”31
. Dessa nova e mais pormenorizada disciplina, destaca-se, desde
29
Cfr. JÚLIO PEREIRA DA CUNHA, Regime de licenciamento de obras particulares e de
operações de loteamento e obras de urbanização, Anotado, 2.ª edição revista e actualizada, Edição da
Atam, 1993, p. 197. 30
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 533. No mesmo sentido, JOSÉ
MIGUEL SARDINHA tomava em consideração a orientação jurisprudencial do STA no domínio do DL
n.º 289/73, favorável ao carácter criador de um direito ou, pelo menos, um interesse legítimo para o
interessado, do deferimento do pedido de viabilidade de loteamento urbano. Cfr. JOSÉ MIGUEL
SARDINHA, ob. cit., p. 29. 31
Artigos 7.º e 7.º-A do DL 448/91, na versão do DL 334/95:
“Artigo 7.º
Pedido de informação prévia
1 - Qualquer interessado pode requerer à câmara municipal informação escrita prévia sobre a
possibilidade de realizar determinada operação de loteamento ou obras de urbanização sujeitas a
licenciamento municipal e respectivos condicionamentos urbanísticos, nomeadamente relativos a infra-
estruturas, servidões administrativas e restrições de utilidade pública, índices urbanísticos, cérceas,
afastamentos e demais condicionamentos que impendam sobre a ocupação, uso e transformação do
terreno.
2 - O pedido de informação prévia é dirigido ao presidente da câmara municipal, sob a forma de
requerimento, e nele devem constar o nome e a sede ou domicílio do requerente, bem como a indicação
da qualidade de proprietário, usufrutuário, superficiário ou mandatário.
3 - O requerimento deve ser apresentado em duplicado, sendo a cópia devolvida ao requerente depois de
nela se ter aposto nota datada da recepção do original.
18
logo, a restrição da legitimidade para requerer a informação aos interessados com
legitimidade para, eventual e posteriormente, requererem o licenciamento da operação
urbanística visada, passando o n.º 2 do artigo 7.º a prescrever que “o pedido de
informação prévia é dirigido ao presidente da câmara municipal, sob a forma de
requerimento, e nele devem constar o nome e a sede ou domicílio do requerente, bem
como a indicação da qualidade de proprietário, usufrutuário, superficiário ou
mandatário”. Por sua vez, o artigo 7.º-A passa a determinar expressamente o carácter
constitutivo de direitos da deliberação relativa àquele pedido e vinculatividade do seu
conteúdo para a câmara municipal, em caso de subsequente pedido de licenciamento, no
prazo de um ano – vejam-se os n.ºs 3 e 4 desse artigo.
Estas alterações vão de encontro ao regime do pedido de informação prévia
estabelecido na versão originária do DL n.º 445/91, de 20 de Novembro, que de seguida
apreciaremos, uniformizando, deste modo, expressamente, o regime da figura em
questão em relação aos diversos tipos de operações urbanísticas - obras particulares e
operações de loteamento e obras de urbanização.
4 - O pedido de informação prévia é acompanhado dos elementos definidos em portaria conjunta dos
Ministros do Planeamento e da Administração do Território e das Obras Públicas, Transportes e
Comunicações.
5 - Compete à câmara municipal promover a consulta às entidades referidas no n.º 1 do artigo 12.º, no n.º
2 do artigo 40.º e no n.º 1 do artigo 42.º, remetendo-lhes, para efeito, a documentação necessária, no prazo
de oito dias, após recepção do pedido.
6 - As entidades consultadas, nos termos do número anterior, devem pronunciar-se exclusivamente no
âmbito das suas competências e no prazo de 30 dias a contar da data de recepção do processo.
7 - A não recepção do parecer das entidades consultadas dentro do prazo fixado no número anterior
entende-se como parecer favorável.
8 - Os pareceres das entidades referidas neste artigo só têm carácter vinculativo quando se fundamentem
em condicionalismos legais ou regulamentares.
Artigo 7.º-A
Deliberação final
1 - A câmara municipal delibera no prazo máximo de 15 dias a contar:
a) Da data da recepção do requerimento;
b) Da data da recepção dos pareceres, autorizações ou aprovações emitidas pelas entidades consultadas ou
do termo do prazo estabelecido para a recepção dos mesmos.
2 - No caso de deliberação total ou parcialmente desfavorável, a câmara municipal indica,
fundamentalmente, os termos em que a mesma pode ser revista, por forma a serem cumpridas as normas
estabelecidas, designadamente as constantes de instrumentos de planeamento.
3 - A deliberação da câmara municipal é constitutiva de direitos e da respectiva de direitos e da respectiva
notificação deve constar, obrigatoriamente, a indicação das entidades cujos pareceres, autorizações ou
aprovações, bem como a respectiva natureza, condicionam a licença a emitir e dos prazos legais para a
respectiva emissão.
4 - O conteúdo da informação prévia prestada pela câmara municipal é vinculativo para um eventual
pedido de licenciamento, desde que este seja apresentado dentro do prazo de um ano, a contar da data da
sua comunicação ao requerente.
5 - Os pareceres, autorizações ou aprovações emitidos nos termos do artigo anterior devem
obrigatoriamente acompanhar a deliberação final.‖
19
Por fim, cumpre-nos destacar a alteração operada pela Lei n.º 26/96, de 1 de
Agosto, preceito que acrecentando um número ao artigo 7.º do diploma, determinou o
―realargamento‖ da legitimidade para requerer a informação prévia a qualquer
interessado em sentido amplo, estatuindo que “sempre que o pedido de informação
prévia for solicitado por quem não é proprietário do terreno, a resposta da câmara
municipal deve ser igualmente notificada ao respectivo proprietário, se a respectiva
identidade for conhecida”.32
2.2 – OBRAS PARTICULARES
2.2.1 - O DECRETO-LEI N.º 166/70, DE 15 DE ABRIL
O artigo 7.º do DL n.º 166/70, de 15 de Abril, preceituava que “quando a
localização dos edifícios dependa de autorização, pode o interessado solicitá-la à
câmara municipal ou, por intermédio desta, à entidade competente para a conceder,
antes de elaborado o referido projecto, instruindo o pedido com os elementos
necessários”33
.
Este doutrinalmente designado de “parecer ou pedido de viabilidade” da
localização de determinados edifícios é assumido pela mesma doutrina como antecessor
do pedido de informação prévia que viria posteriormente a ser consagrado, no que à
realização de obras particulares diz respeito, pelo DL n.º 445/91, de 20 de Novembro34
,
admitindo-se, no entanto, o carácter distinto de ambas as figuras, uma vez que se tratava
aqui, em rigor, de uma “autorização de localização”35
.
32
Artigo 7.º, n.º 3 do DL 448/91, na versão dada pela Lei 26/96:
―3—Sempre que o pedido de informação prévia for solicitado por quem não é proprietário do terreno, a
resposta da câmara municipal deve ser igualmente notificada ao respectivo proprietário, se a respectiva
identidade for conhecida.‖ 33
“Artigo 7.°
1. Quando a localização dos edifícios dependa de autorização, pode o interessado solicitá-la à câmara
municipal ou, por intermédio desta, à entidade competente para a conceder, antes de elaborado o referido
projecto, instruindo o pedido com os elementos necessários.
2. Nos casos a que se refere o número anterior, considera - se aplicável o disposto nos n.°s 2 a 4 do artigo
5.º e no n.° 3 do artigo 9.°‖ 34
Cfr. F. RODRIGUES DE BASTOS, O Licenciamento de Obras Particulares e a Implantação
da Construção-Zonamento, in Revista de Direito Autárquico, Ano 1.º, n.º 2, 1992, p. 77, citado por F.
ALVES CORREIA, ob. cit., p. 132, nota 77. 35
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 825. Também JÚLIO
PEREIRA DA CUNHA reconhece a ambas as figuras o escopo comum de diminuição de riscos e custos
20
Nos casos em que a autorização de localização, necessária para determinados
edifícios, não fosse formulada como um pedido de informação concreto, com indicação
das características do edifício, de molde a possibilitar, à câmara ou à entidade
competente para a autorização, a formulação de um juízo legitimador da consequente
decisão, o parecer emitido revestia um carácter meramente opinativo sobre a pretensão,
não se enquadrando naquela previsão legal do artigo 7.º, e sendo, portanto, um simples
pedido de informação sobre a possibilidade de construir em determinado terreno. Neste
sentido veja-se o Acordão do STA de 21 de Fevereiro de 1985, que opera tal
distinção, atendendo aos termos em que é formulado o pedido.36
À doutrina do STA, relativa ao pedido de localização do artigo 7.º do DL n.º
166/70, alude também OSVALDO GOMES, citando o Acordão de 10 de Maio de
1973, nos termos do qual protesta o Supremo, no que ao licenciamento de construções
diz respeito, que não apenas a aprovação dos respectivos projectos reveste natureza de
acto constitutivo de direitos, podendo assumir essa natureza actos anteriores à
aprovação dos projectos, desde que definam, com carácter vinculativo, a posição da
Administração perante certas pretensões dos interessados, criando ou modificando,
quanto a eles, poderes jurídicos37
. Caso contrário, ficaria desprovida de qualquer
interesse prático a simples autorização de localização de edifícios prevista naquele
dispositivo, tal como a regulamentação que lhe é dada nos artigos 12.º e 13.º do mesmo
diploma, com a formação de acto tácito de autorização38
, doutrina que o Autor estende
ao pedido de informação do artigo 4.º do DL n.º 289/73, como supra mencionámos, nos
termos do Acordão do STA de 18/06/197639
.
Notem-se, inclusivamente, as considerações tecidas pelo STA em anterior
Acordão de 19 de Dezembro de 1968 (Tribunal Pleno), embora se registem quatro
votos de vencido, de que um despacho incidente sobre a utilização de um terreno para
fins industriais concedia a autorização para a instalação de empreendimento industrial,
e definia as condições a que o mesmo ficava sujeito, sendo, portanto, constitutivo de
dos projectos, admitindo, contudo, em rigor, a sua não correspondência. Cfr. JÚLIO PEREIRA DA
CUNHA, ob. cit., p. 30. 36
Cfr. JÚLIO PEREIRA DA CUNHA, ob. cit., p. 31; e Acordãos Doutrinais do STA, n.º 286,
Ano XXIV, Outubro de 1985, p. 1054. 37
Acordãos Doutrinais n.º 139, Ano II, Julho de 1973, p. 996. 38
AD n.º 139, cit., pp. 989 e ss. 39
AD n.º 182, cit., pp. 1819 e ss; cfr. OSVALDO GOMES, ob. cit., pp. 92 e 93.
21
direitos, definitivamente, e gerador de uma situação jurídica que tinha que ser
respeitada40
.
Destaca-se, ainda, nesta sede, o Acordão do STA de 03/07/197041
, nos termos do
qual as informações camarárias sobre a viabilidade de construções envolviam apenas a
formulação de um juízo liminar, fundado em elementos pretéritos, não de um
compromisso ad futurum, traduzindo, deste modo, uma declaração de ciência e não
uma declaração de vontade. Assim, concluía o Supremo, se a câmara certificasse a
existência de proibições, no todo ou em parte, para a construção idealizada, sendo a
informação vinculante para uma futura deliberação municipal sobre o pedido de licença,
o particular adquiria a certeza da impossibilidade da obtenção daquela, mas, pelo
contrário, se nenhuma proibição existisse, a construção seria viável, embora não
estivesse antecipadamente autorizada42
. É aqui notória a falta de clareza jurisprudencial,
no que à consideração doutrinal da figura em questão diz respeito.
2.2.2 - O DECRETO-LEI N.º 445/91, DE 20 DE NOVEMBRO
O DL n.º 445/91, de 20 de Novembro, veio disciplinar o controlo prévio da
realização de obras particulares, surgindo o processo de licenciamento de obras
seccionado, e correspondendo-lhe tramitações específicas, em quatro secções, a aplicar
conforme as regras urbanísticas em vigor na área de localização da construção
pretendida: área abrangida por plano de pormenor ou alvará de loteamento, área
abrangida por plano de urbanização, área abrangida por plano director municipal, e área
não abrangida por plano municipal de ordenamento do território ou alvará de
loteamento. Em conformidade com esta divisão, o epigrafado “pedido de informação
prévia” surgia disciplinado no início de cada uma daquelas secções, correspondendo-
lhe, assim, os artigos 10.º a 13.º, 31.º a 33.º, 37.º e 38.º e 42.º a 44.º.
Estatuía o artigo 10.º poder qualquer interessado “requerer à câmara municipal
informação sobre a possibilidade de realizar determinada obra sujeita a licenciamento
municipal e respectivos condicionamentos”, indicando, no requerimento dirigido ao
presidente da câmara, a “qualidade de proprietário, usufrutuário, locatário, titular do
40
AD n.º 89, Ano VIII, Maio de 1969, p. 834. 41
AD n.º 109, Ano X, Janeiro de 1971, p. 15. 42
Citando tal Acordão, ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 833.
22
direito de uso e habitação, superfíciário ou mandatário”, nos termos do n.º 2 do mesmo
artigo, restringindo-se, assim, a legitimidade para tal pedido aos simultaneamente
titulares de legitimidade, desde esse primeiro momento, para requerer o eventual e
posterior pedido de licenciamento da obra – pressuposto que poderemos designar de
legitimidade restrita ou reforçada.
O artigo 11.º preceituava acerca dos elementos que deveriam instruir o pedido,
determinando, por sua vez, o artigo 12.º, o prazo máximo de 20 dias para deliberação da
câmara sobre o pedido (n.º 1), a indicação dos termos de revisão da informação, no caso
de ser desfavorável (n.º 2), e, no n.º 3, que “a deliberação da câmara municipal é
constitutiva de direitos”. E ditava o seguinte artigo 13.º, sob a epígrafe de “validade”,
que “o conteúdo da informação prévia prestada pela câmara municipal é vinculativo
para um eventual pedido de licenciamento, desde que este seja apresentado dentro do
prazo de um ano relativamente à data da sua comunicação ao requerente”.43
43
Artigos 10.º a 13.º do DL 445/91, versão originária:
“Do pedido de informação prévia
Artigo 10.°
Requerimento 1 - Qualquer interessado pode requerer à câmara municipal informação sobre a possibilidade de realizar
determinada obra sujeita a licenciamento municipal e respectivos condicionamentos.
2 - O pedido de informação prévia é dirigido ao presidente da câmara municipal, sob a forma de
requerimento, e nele devem constar o nome e a sede ou domicílio do requerente, bem como a indicação
da qualidade de proprietário, usufrutuário, locatário, titular do direito de uso e habitação, superficiário ou
mandatário.
3 - O requerimento deve ser apresentado em duplicado, sendo a cópia devolvida ao requerente depois de
nela se ter aposto nota, datada, da recepção do original.
Artigo 11.°
Instrução do processo O pedido de informação prévia é acompanhado dos elementos a seguir indicados:
a) Memória descritiva, esclarecendo devidamente a pretensão;
b) Plantas à escala 1:25 000 e 1:2000, ou superior, com a indicação precisa do local onde pretende
executar a obra;
c) Quando o pedido diga respeito a novas edificações ou a obras que impliquem aumento da área
construída, devem, sempre que possível, constar do pedido de informação prévia os seguintes elementos:
planta de implantação à escala 1:200, definindo o alinhamento e perímetro dos edifícios; as cérceas e o
número de pisos acima e abaixo da cota de soleira; a área de construção e a volumetria dos edifícios; a
localização e o dimensionamento das construções anexas e a indicação do uso a que se destinam as
edificações.
Artigo 12.°
Deliberação final 1 - A câmara municipal delibera no prazo máximo de 20 dias, a contar da data da recepção do
requerimento.
2 - No caso de deliberação desfavorável, a câmara municipal indica, sempre que possível, os termos em
que a mesma pode ser revista, por forma a serem cumpridas as normas estabelecidas, designadamente as
constantes do plano de pormenor ou do alvará de loteamento, válido nos termos da lei.
3 - A deliberação da câmara municipal é constitutiva de direitos.
Artigo 13.°
Validade
23
Deste modo, a doutrina reconhecia o carácter constitutivo de direitos da
deliberação camarária decorrente do pedido em causa, embora com efeitos
temporalmente limitados44
, e assumia esse carácter, legalmente atribuído de forma
expressa, como resposta à tradicional dúvida persistente no domínio do licenciamento
de obras particulares, acerca do “efeito constitutivo” do acto de decisão sobre aquele
tipo de pretensão – acto criador de direitos subjectivos ou de mera expectativa
juridicamente tutelada? – discussão, contudo, conclui-se, que se tornara desprovida de
sentido, perante o artigo 140.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 do CPA, que confere igual
protecção a ambos os tipos de actos45
. Assumiam, no entanto, alguns Autores, uma
criticável “dualidade de regimes”, coexistindo, por um lado, a informação prévia
constitutiva de direitos, nos termos do n.º 3 do artigo 12.º, quando a pretensão dissesse
respeito a área abrangida por plano de pormenor ou alvará de loteamento, e, por outro
lado, a informação prévia desprovida desse carácter constitutivo, quando o pedido
recaisse sobre área abrangida por plano de urbanização, por plano director municipal, ou
sobre área não abrangida por plano municipal de ordenamento do território ou alvará de
loteamento. Este entendimento teve origem na falta de remissão expressa dos artigos
31.º, 37.º e 42.º para o n.º 3 do artigo 12.º, que remetiam apenas para as disposições
daquela primeira secção relativas ao requerimento, instrução e validade da
deliberação46
. O DL n.º 250/94, de 15 de Outubro, afastou definitivamente essa
compreensão, uma vez que alterou o DL n.º 445/91, acrescentando, nos artigos 31.º,
37.º, n.º 1 e 42.º, n.º 1, a remissão expressa para o n.º 3 do artigo 12.º.
2.3 – O DECRETO-LEI N.º 555/99, DE 16 DE DEZEMBRO
O DL n.º 555/99, de 16 de Dezembro, revogou os Decretos-Lei n.º 445/91, de 20
de Novembro e n.º 448/91, de 29 de Novembro, reunindo, no mesmo diploma, os
regimes jurídicos aplicáveis às obras particulares e às operações de loteamento e obras
O conteúdo da informação prévia prestada pela câmara municipal é vinculativo para um eventual pedido
de licenciamento, desde que este seja apresentado dentro do prazo de um ano relativamente à data da sua
comunicação ao requerente.‖ 44
Cfr. F. ALVES CORREIA, ob. cit., p. 132, nota 77. 45
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 829. 46
Idem, ibidem, pp. 830 e 895; também, JÚLIO PEREIRA DA CUNHA, ob. cit., pp. 34 e 91; em
sentido contrário, reconhecendo o carácter constitutivo de direitos ao acto camarário, independentemente
das regras urbanísticas aplicáveis à pretensão, afastando a interpretação literal da lei, ANTÓNIO
PEREIRA DA COSTA, Regime Jurídico de Licenciamento de Obras Particulares, Anotado, Coimbra
Editora, 1993, pp. 131 e 132.
24
de urbanização – Regime Jurídico da Urbanização e Edificação. Deste modo, o pedido
de informação prévia surge regulado nos artigos 14.º a 17.º do RJUE, regime comum
aos diferentes tipos de pretensões urbanísticas previstas no diploma.
A consagração da figura nos moldes operados pelo RJUE, na sua versão
originária, é tributária da evolução conceptual apreciada do instituto da informação
prévia, como apreciaremos subsequentemente.
Tendo em conta que as supracitadas disposições do RJUE serão objecto de
ulterior apreciação no âmbito deste trabalho, na versão actual do diploma resultante da
Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, mas não deixando de se considerar a sua versão
originária e alterações operadas pela referida lei, escusamo-nos, neste momento, a tecer
demais considerações acerca desse regime.
No entanto, atendendo aos elementos examinados em relação aos diplomas
anteriores, cuja análise se centrou no reconhecimento ou não reconhecimento do
carácter constitutivo de direitos da informação prestada, abordando, ainda que de forma
breve, a evolução quanto à legitimidade para o pedido, entendemos ser de relevar, desde
já, duas ―inovações‖ do RJUE relativamente aos diplomas anteriores:
O desaparecimento da prescrição expressa do carácter constitutivo de direitos
da informação prévia, diferentemente aos artigos 12.º, n.º 3 do DL n.º 445/91 e
7.º-A, n.º 3 do DL n.º 448/91, adiantando a doutrina, como justificação para tal
omissão, o alargamento da legitimidade para fazer o pedido47
;
O alargamento da legitimidade para requerer a informação prévia a todos os
interessados em sentido amplo, nos termos já consagrados pelo artigo 7.º, n.º 3
da última versão do DL n.º 448/91, mas diferentemente ao exigido pelo artigo
10.º, n.º 2 do DL n.º 445/91.
47
Uma vez que a informação prévia só será constitutiva de direitos se o seu titular tiver
legitimidade para requerer a licença, ab initio ou entretanto adquirida, conforme apreciaremos infra. Cfr.
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, O Novo Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, A Visão de
um Jurista, in Revista do CEDOUA, n.º 8, Ano IV, 2.2001, pp. 43-44.
25
3 – A INFORMAÇÃO PRÉVIA FAVORÁVEL OU DESFAVORÁVEL –
CONTEÚDO, NATUREZA E EFEITOS PARA REQUERENTE,
ADMINISTRAÇÃO E TERCEIROS DA RESPOSTA AO PEDIDO DE
INFORMAÇÃO PRÉVIA
3.1 – O CONTEÚDO DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
O conteúdo da informação prévia é descrito pelo artigo 14.º do RJUE, nos seus
n.ºs 1 e 2, disposições que passamos a apreciar. Nos termos do n.º 1, a informação recai
sobre a “viabilidade de realizar determinada operação urbanística ou conjunto de
operações urbanísticas directamente relacionadas, bem como sobre os respectivos
condicionamentos legais ou regulamentares, nomeadamente relativos a infra-
estruturas, servidões administrativas e restrições de utilidade pública, índices
urbanísticos, cérceas, afastamentos e demais condicionantes aplicáveis à pretensão”,
estabelecendo, por sua vez, o n.º 2 que “quando o pedido respeite a operação de
loteamento, em área não abrangida por plano de pormenor, ou a obra de construção,
ampliação ou alteração em área não abrangida por plano de pormenor ou operação de
loteamento, o interessado pode requerer que a informação prévia contemple
especificadamente os seguintes aspectos, em função da informação pretendida e dos
elementos apresentados”, passando, então, a enumerar, nas alíneas a) a f) esses
elementos:
a volumetria, alinhamento, cércea e implantação da edificação e dos muros de
vedação;
condicionantes para um adequado relacionamento formal e funcional com a
envolvente;
programa de utilização das edificações, incluindo a área bruta de construção a
afectar aos diversos usos e o número de fogos e outras unidades de utilização;
infra-estruturas locais e ligação às infra-estruturas gerais;
estimativa dos encargos urbanísticos devidos; e
áreas de cedência destinadas à implantação de espaços verdes, equipamentos de
utilização colectiva e infra-estruturas viárias.
26
Constatamos, assim, que a informação prévia pode assumir conteúdo variável,
consoante o pedido e elementos apresentados pelo requerente, as regras em vigor na
área da parcela ou lote objecto da pretensão urbanística, e o tipo de operação urbanística
visada. O conteúdo consagrado no n.º 1 não é exaustivo, correspondendo ao pedido de
informação genérico, incidente sobre concretas pretensões apresentadas
independentemente das normas urbanísticas que lhes sejam aplicáveis, e afirmando-se,
no nosso entender, como conteúdo mínimo útil da informação prévia, embora não
obrigatório, uma vez que a resposta da câmara municipal se encontra condicionada pelo
pedido e elementos apresentados pelo particular interessado. Isto considerando,
consequentemente, que não deve a câmara recusar pedido de informação prévia não
instruído com todos os elementos prescritos pela Portaria n.º 232/2008, de 11 de Março
– artigos 1.º a 6.º, correspondendo a apresentação desses elementos a um ónus do
requerente, que vê o conteúdo da resposta balizado pelos mesmos, e tendo em conta a
facultatividade que reveste o pedido de informação prévia. Além disso, em rigor, o
pedido de informação prévia pode referir-se a qualquer tipo de operação urbanística
regulada pelo RJUE, pelo que tal obrigatoriedade seria desconforme com o referido
conteúdo constante do n.º 1 do artigo 14.º, insusceptível de aplicação às obras de
demolição, à alteração de utilização de edifícios ou fracções e outras operações
urbanísticas – vejam-se os citados artigos da Portaria.
Quanto ao n.º 2 do artigo em apreciação, consagra o mesmo o que podemos
designar de informação prévia qualificada quanto ao seu conteúdo, de carácter mais
pormenorizado, aplicável às operações de loteamento e obras de construção, ampliação
ou alteração, às quais não seja aplicável plano de pormenor ou plano de pormenor ou
operação de loteamento, respectivamente, ou seja, operações dos tipos referidos não
situadas em áreas plenamente consolidadas em termos jurídico-urbanísticos.
Entendemos afirmar-se esta disposição como reconhecimento implícito do carácter
conformador – note-se que estão incluídos no âmbito de apreciação da informação
prévia quer elementos de apreciação estritamente vinculada, quer elementos que
encerram um espaço de conformação própria da câmara municipal, designadamente no
que às “condicionantes para um adequado relacionamento formal e funcional” diz
respeito, alínea b) e artigo 20.º, n.º 2 - e constitutivo de direitos da informação prévia,
clarificando o efeito útil da figura face a eventual posterior pedido de licenciamento ou
apresentação de comunicação prévia, e cumprindo, deste modo, as apontadas funções de
27
informação, garantia e simplificação procedimental. Destaca-se a este propósito, ainda,
a sujeição da operação urbanística objecto da informação prévia proferida nos termos
deste preceito ao regime de comunicação prévia e à dispensa expressa da realização de
novas consultas externas, quando a elas deva haver lugar – n.º 1 do artigo 17.º.
Também este conteúdo aprofundado se encontra condicionado ao pedido
formulado pelo particular e elementos apresentados – princípio do pedido que constitui
especificidade do pedido de informação prévia, que o condiciona em todos o seus
aspectos – conteúdo e, consequentemente, procedimento e efeitos48
-49
.
Ainda relativamente ao conteúdo da informação prévia, cumpre-nos apontar a
obrigatoriedade legalmente prescrita de inclusão, na informação prévia, de três
indicações que revestem manifesta importância:
a inclusão dos pareceres, autorizações ou aprovações de entidades externas ao
município na notificação, ao requerente, da informação prévia, desta fazendo
parte integrante, nos termos do n.º 2 do artigo 16.º do RJUE;
a indicação, na informação favorável, do procedimento de controlo prévio a que
se encontra sujeita a realização da operação pretendida – n.º 3 do mesmo artigo;
e a indicação, na informação desfavorável, dos termos em que a mesma pode ser
revista, ―convertendo-se‖ em informação favorável – n.º 4 do artigo 16.º.
Note-se, por fim, que deve admitir-se como potencial objecto do pedido de
informação prévia, também, as pretensões de legalização de construções já existentes,
associadas, regra geral, à necessidade de realização de operações urbanísticas
(alterações ao pré-existente), de molde à sua conformidade com as normas aplicáveis.
48
Afirma a doutrina a intenção do legislador de clarificar o objecto possível do pedido de
informação prévia, designadamente, embora não exclusivamente, nas situações em que esse objecto
pareceria mais duvidoso, face à maior fluidez das regras de planeamento. Cfr. FERNANDA PAULA
OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 216. Sustenta-se, no sentido do exposto, o interesse do particular em que
a câmara se pronuncie de uma forma o mais desenvolvida possível, antecipando-se, verdadeiramente, a
apreciação do projecto, sua conformação, e vinculando o município a matérias essencialmente do seu
foro. Cfr. idem, ibidem, p. 219. Também ANDRÉ FOLQUE se refere a esse interesse do particular na
maior especificação do pedido, que contende com a extensão da resposta, cfr. ANDRÉ FOLQUE, Curso
de Direito da Urbanização e da Edificação, Coimbra Editora, 2007, p. 224. 49
Ainda no que aos termos em que é feito o pedido diz respeito, alguma doutrina considera
poderem os interessados fazer pedidos subsidiários ou alternativos, pondo à consideração da câmara
várias hipóteses de operações urbanísticas, por uma razão de economia e celeridade, possibilidade
admitida pelo n.º 2 do artigo 74.º do CPA. Cfr. ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA, ob. cit., p. 75.
28
Parece-nos manifesta a relevância que tal prática pode assumir no âmbito da reposição
da legalidade urbanística, tendo presentes as funções que a figura em análise cumpre.
3.2 –A NATUREZA E EFEITOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
3.2.1 - A INFORMAÇÃO PRÉVIA FAVORÁVEL (OU FAVORÁVEL CONDICIONADA)
OU DESFAVORÁVEL COMO RESPOSTA AO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
O pedido de informação prévia provoca a emissão, pela câmara municipal50
, da
informação prévia, que pode assumir sentido favorável à pretensão apresentada pelo
particular – viabilidade de realização da operação urbanística pretendida, face às regras
aplicáveis, ou ser desfavorável a essa pretensão – impossibilidade de ulterior
concretização da operação urbanística idealizada, desconforme com as disposições
legais e/ou regulamentares aplicáveis, indeferimento este só possível com base nos
mesmos fundamentos, e apenas com base nesses, que legitimariam o indeferimento de
pedido de licenciamento ou a rejeição de comunicação prévia relativamente à operação
urbanística pretendida51
-52
.
Admitimos, ainda, a possibilidade de uma informação prévia favorável
condicionada53
-54
, ou seja, que se pronuncia pela viabilidade da pretensão urbanística,
desde que cumpridos determinados requisitos ou exigências não contemplados no
pedido, ou desde que alterados determinados aspectos da pretensão apresentada,
considerados não essenciais numa análise global daquela. Parece-nos que tal opção fará
sentido em situações de pedido bastante concretizado, no que toca à pretensão
urbanística pretendida, e revelando-se esta conforme à regulamentação urbanística
50
Competência eventualmente delegada no seu presidente, com faculdade deste de subdelegação
nos vereadores – n.º 3 do artigo 5.º do RJUE. 51
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 91. 52
Nos termos do n.º 1 do artigo 16.º do RJUE, a câmara municipal dispõe do prazo de 20 dias,
ou 30 dias no caso do pedido qualificado do n.º 2 do artigo 14.º, para deliberar acerca do pedido de
informação prévia, prazo contado nos termos das alíneas a), b) e c) da mesma disposição. A falta de
resposta da câmara no prazo legalmente previsto consubstanciará deferimento tácito do pedido de
informação prévia – informação prévia silente, favorável portanto, com os mesmos efeitos atribuídos à
informação prévia expressa, considerando-se esta situação incluída na previsão da alínea c) do artigo
111.º do RJUE. Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 223. 53
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 91. 54
Também a jurisprudência admite tal possibilidade; veja-se, exemplificativamente, o Acordão
do STA de 18/06/2009 (P. n.º 0282/09), in www.dgsi.pt.
29
aplicável, sendo o pedido, no entanto, omisso quanto a determinados parâmetros não
essenciais, mas cujo cumprimento a Administração entenda, desde logo, dever
salvaguardar, contendentes, designadamente, com aspectos de conformação própria da
Administração municipal, que assim acautela, desde logo, o cumprimento das suas
opções urbanísticas55
. Ou, igualmente, em situações em que, sendo o pedido formulado
com determinado grau de pormenor, se verifica a sua coerência global com as normas
urbanísticas, embora seja necessário proceder à alteração de certos parâmetros da
operação, para uma integral concordância com os parâmetros urbanísticos aplicáveis,
aspectos menores que não contendem com o modelo urbanístico normativamente
estabelecido. Pelo que nestas situações seria desadequada aos interesses em presença,
quer do requerente quer da Administração, a emissão de uma informação em sentido
desfavorável, conciliando-se através desta possibilidade as vantagens concedidas pela
informação favorável e a salvaguarda do cumprimento de parâmetros necessários, mas,
de uma perspectiva urbanística mais ampla, não considerados fulcrais.
Cumpre-nos, de seguida, averiguar da natureza jurídica que esta ―resposta‖ da
Administração ao pedido de informação prévia assume, determinante do tipo de efeitos
que produz relativamente aos diversos sujeitos envolvidos e das garantias que lhes
concede. Questões estas que se constituem como o cerne da compreensão da figura em
apreço, sobre as quais se debruçam a jurisprudência e a doutrina administrativas desde a
origem do instituto, como pudemos constatar supra.
3.2.2 - A INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO DECISÃO E NÃO MERA INFORMAÇÃO
Os termos em que os consecutivos diplomas urbanísticos consagraram a
informação prévia ditaram a sua consideração pela doutrina e pela jurisprudência,
embora não unanimemente, como acto constitutivo de direitos para o particular
requerente, sem prejuízo da sua dimensão informativa, reconhecendo-o, assim, como
55
Tais ressalvas não terão utilidade quando correspondam a parâmetros legalmente positivados e
de carácter vinculado, independentemente da sua não consideração no pedido, e da essencialidade ou não
essencialidade que assumem na globalidade da operação urbanística. Será o caso de elementos relativos
às construções constantes do RGEU e de legislação especial avulsa.
30
verdadeira decisão administrativa e não mera informação, e, assim, como verdadeiro
acto administrativo, com características e consequências próprias desses actos56
.
Evitando alongarmo-nos em torno da questão tradicionalmente central do Direito
Administrativo do conceito de acto administrativo (concepção substantiva restrita vs.
concepção ampla), assumimos tal qualificação em relação à informação prévia,
perspectivada no quadro dos actos de gestão urbanística, face à sua configuração legal
actual como acto conformador de posições jurídicas, acto final de um procedimento, e
acto contenciosamente recorrível. Tal consideração procede do percurso discursivo que
empreendemos ao longo deste trabalho, pelo que nos escusamos a desenvolvimentos
mais aprofundados sobre a mesma.
3.2.3 - O PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO PROCEDIMENTO PRÓPRIO
Tradicionalmente, a doutrina assumia o pedido de informação prévia como um
primeiro passo, ainda que facultativo, para o licenciamento da operação urbanística,
constituindo-se o procedimento de licenciamento como o procedimento definitivo,
atendendo ao carácter permissivo do acto de licenciamento, de realização da operação
urbanística, em contraposição com a informação prévia.
Assim, no âmbito da vigência dos diplomas anteriores ao DL n.º 555/99, a
doutrina sustentava enquadrar-se já o pedido de informação prévia no processo de
licenciamento, daí que apenas os particulares com legitimidade para requerer o
licenciamento pudessem requerer a informação prévia57
.
Orientação diversa assume a doutrina posterior ao DL n.º 555/99, destacando-se,
desde logo, FERNANDA PAULA OLIVEIRA, que atesta corresponder a informação
56
Note-se a concepção do acto administrativo de VIEIRA DE ANDRADE, que o perspectiva
nas suas dimensões substantiva, procedimental e adjectiva, cometendo-lhe as seguintes funções:
definitória, tituladora, estabilizadora, procedimental e processual. É no cumprimento destas funções que o
Autor justifica, actualmente, uma concepção restrita de acto administrativo formal, em que confluem as
três referidas dimensões. Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, Algumas reflexões a propósito da sobrevivência
do conceito de “acto administrativo” no nosso tempo, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor
Rogério Soares, Stvdia Ivridica, 61, Ad Honorem – 1, BFD, Coimbra Editora, 2001, pp. 1219-1220. 57
Cfr. ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA, ob. cit., p. 74. O Autor refere-se ao pedido de
informação prévia no âmbito do DL n.º 445/91, designando mesmo o processo de informação prévia
como “uma espécie de procedimento cautelar em relação ao processo de licenciamento”, daí a
competência da mesma entidade para decidir ambos os processos. Idem, ibidem, p. 77. FREITAS DO
AMARAL, dissecando a tramitação do procedimento de licenciamento de obras particulares, apelidava o
pedido de informação prévia de pré-procedimento. Cfr. D. FREITAS DO AMARAL, Direito do
Urbanismo (Sumários), Lisboa, 1993, p. 130.
31
prévia a “um acto que põe fim a um procedimento próprio e autónomo do procedimento
onde se integra o acto que condiciona” - o acto de licenciamento ou a admissão da
comunicação prévia58
.
Efectivamente, tendo em conta a sua configuração actual, o pedido de informação
prévia só pode compreender-se como procedimento próprio e autónomo face ao
eventualmente posterior procedimento de licenciamento ou comunicação prévia. Desde
logo, face ao seu carácter facultativo, constituindo-se como uma faculdade para os
interessados, embora esta característica não alicerce, só por si, a referida autonomia.
Mas assume já relevância para esse efeito se conjugada com a actual legitimidade
alargada admitida para o pedido (artigo 14.º, n.ºs 1, 3 e 4), que pode ser requerido por
qualquer interessado nessa informação, independentemente da titularidade de qualquer
direito sobre a parcela ou lote visado, no momento do pedido de informação, ou seja,
independentemente da legitimidade para requerer posterior licenciamento ou admissão
de comunicação prévia, legitimidade que poderá nunca vir a adquirir - assim como o
titular de legitimidade para desencadear esses procedimentos permissivos poderá nunca
fazê-lo, mesmo tendo anteriormente requerido e obtido informação prévia favorável à
realização de determinada operação urbanística sobre o terreno, ou pode perder,
entretanto, aquela legitimidade, no caso de se verificar mudança na titularidade do
direito real sobre o terreno.
Parece-nos, assim, que estas duas especificidades da figura – facultatividade e
legitimidade alargada – são, desde logo, idóneas a alicerçar a autonomia procedimental
do pedido de informação prévia. Note-se, ainda, que, numa perspectiva formal, a
própria sistemática do actual RJUE pressupõe tal consideração, disciplinando a figura
em questão em subsecção própria (subsecção II), da secção atribuída às diferentes
formas de procedimento - secção II do capítulo II do RJUE, subseccionada em
―informação prévia‖, ―licença‖, ―autorização‖, ―comunicação prévia‖ e ―procedimentos
especiais‖.
58
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, ―Que direitos me dás, que direitos me recusas” –
Reflexão em torno da questão da impugnabilidade das informações prévias desfavoráveis, in Revista do
CEDOUA, n.º 20, Ano X, 2.2007, p. 150. No mesmo sentido, JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p.
86. Em sentido diverso parece orientar-se ANDRÉ FOLQUE, que adianta não ser a informação prévia um
acto materialmente definitivo, por se esgotar enquanto pressuposto de um outro procedimento
administrativo, não permitindo, por si, que o interessado desenvolva a operação urbanística. Cfr. ANDRÉ
FOLQUE, ob. cit., p. 224.
32
3.2.3.1 – OS CASOS ESPECIAIS DE PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
OBRIGATÓRIO
Cumpre-nos, no entanto, ressalvar os casos especiais de pedido de informação
prévia obrigatório, legal ou regularmente determinados. Destaca-se, no que à
informação prévia legalmente obrigatória diz respeito, o DL n.º 21/2009, de 19 de
Janeiro, diploma que estabelece o regime jurídico da instalação e modificação dos
estabelecimentos de comércio a retalho e dos conjuntos comerciais, cujo artigo 5.º, n.º
1, prescreve: “Para efeitos de instrução do processo de autorização de instalação e de
modificação dos estabelecimentos e conjuntos comerciais, e desde que o mesmo
implique uma operação urbanística sujeita a controlo prévio, os interessados devem
solicitar à câmara municipal pedido de informação prévia sobre a conformidade do
empreendimento na localização pretendida com os instrumentos de gestão territorial
vigentes, nos termos dos artigos 14.º e seguintes do Decreto -Lei n.º 555/99, de 16 de
Dezembro, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro”.
Surge, assim, o pedido de informação prévia como um primeiro passo a percorrer,
obrigatoriamente, pelos particulares interessados (e com legitimidade para tal) na
instalação de um estabelecimento comercial abrangido pelo diploma, como uma fase
preliminar do procedimento de autorização necessário, não lhe correspondendo, ao
contrário do que se verifica com a figura do pedido de informação prévia geral do
RJUE, uma autónoma pretensão ou interesse do particular requerente. Tal pedido limita-
se à conformidade da localização do empreendimento com os instrumentos de gestão
territorial vigentes – informação prévia de localização, – nos casos em que a
autorização da instalação (ou sua modificação) implique a realização de operação
urbanística sujeita a controlo prévio. Note-se, no entanto, que neste caso a entidade
competente para a emissão da informação prévia (câmara municipal) é diversa da
entidade competente para a autorização final global de instalação (Comissão de
Autorização Comercial, sob a coordenação da Direcção Geral das Actividades
Económicas – artigo 11.º, n.º 1 do diploma), constituindo-se a informação prévia
favorável como elemento instrutório do pedido de instalação – anexos A e B, pontos I,
alíneas c) do DL n.º 21/2009.
Quanto ao pedido de informação prévia regularmente obrigatório, veja-se,
exemplificativamente, o Regulamento Municipal da Urbanização e da Edificação de
33
Ílhavo59
, cujo n.º 6 do artigo 3.º dispõe: “O pedido de informação prévia relativo a
operações de loteamento, obras de edificação é obrigatório, com excepção das
seguintes situações:
a. Informação prévia de loteamento: quando a operação incidir sobre área
abrangida por Plano de Pormenor que contenha as menções constantes nas alíneas c),
d) e f) do n.º 1 do artigo 91.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão
Territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 316/2007, de 19 de Setembro, adiante
designado por RJIGT.
b. Informação prévia de obras de edificação: quando as obras incidirem sobre
área abrangida por Plano de Pormenor que contenha as menções constantes nas
alíneas c), d) e f) do n.º 1 do artigo 91.º, do RJIGT, ou sobre área abrangida por alvará
de loteamento em vigor.”.
Nos termos desta disposição, o pedido de informação prévia surge como uma fase
obrigatória e preliminar aos pedidos de licenciamento de loteamento e obras de
construção, excepto quando estes incidam sobre área abrangida por plano de pormenor
ou por alvará de loteamento, no caso das obras de construção – alíneas a) e b) do artigo.
Como fase preliminar do procedimento complexo de licenciamento, o pedido de
informação prévia revela-se vantajoso para a Administração, permitindo-lhe um
primeiro contacto conformador com a operação urbanística pretendida, agilizando o
procedimento de licenciamento.
Podemos concluir que a informação prévia obrigatória, como acto preliminar
relativamente ao acto final de licenciamento, se subsume na categoria de acto prévio,
considerado nos termos que passamos a apreciar.
59
Regulamento Municipal da Urbanização e da Edificação de Ílhavo (publicado no Diário
da República, apêndice 70, 2.ª série, n.º 107, de 9 de Maio de 2003), na versão resultante da alteração
operada pelo Regulamento n.º 59/2009, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 19, de 28 de
Janeiro de 2009.
34
3.2.4 - A INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO ACTO PRÉVIO?
Contendente com a questão da relação entre os procedimentos de informação
prévia e licenciamento ou comunicação prévia, surge a possibilidade de configuração do
acto de informação prévia como acto prévio.
Doutrinalmente, as pré-decisões (categoria de actos endo-procedimentais, ao lado
dos pareceres vinculativos) apresentam-se como medidas ou actos inseridos em
procedimentos faseados ou escalonados, assim constituídos para resolver questões
particularmente complexas, e que, precedendo o seu acto final, decidem logo,
peremptória ou vinculativamente, sobre a existência de condições ou requisitos de que
depende a prática de tal acto. Estas pré-decisões subdividem-se em actos ou decisões
parciais – decisão constitutiva antecipada do procedimento no que respeita a uma parte
ou aspecto da decisão final global, com efeito ou carácter permissivo, exemplificando a
doutrina com a chamada ―licença de estruturas‖ do procedimento de licenciamento de
construção, que permite ao requerente a realização de trabalhos preliminares60
, - e em
60
Denota-se uma confusão doutrinal entre as figuras da licença parcial para construção da
estrutura e da ―autorização” para demolição, escavação e construção periférica. Assim constata, desde
logo, ANTÓNIO CORDEIRO, Arquitectura e Interesse Público, Almedina, 2008, pp. 296 e 304. No
actual RJUE, a licença parcial para construção de estrutura surge nos n.ºs 6 e 7 do artigo 23.º, como
possibilidade de iniciar a construção da estrutura de uma obra de edificação logo após a aprovação do
projecto de arquitectura, desde que:
Sejam entregues todos os projectos das especialidades;
Seja prestada caução para garantia da demolição da estrutura até ao piso de menor cota, em caso
de indeferimento final do licenciamento.
Tal possibilidade depende de requerimento do interessado e a licença parcial é titulada por alvará (n.º 7),
correspondendo-lhe a devida taxa de emissão. Esta previsão reforça a consideração do acto de aprovação
do projecto de arquitectura como acto central do procedimento de licenciamento, conforme
desenvolveremos infra. Neste sentido, FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 255-256.
Por sua vez, o artigo 81.º do RJUE consagra a possibilidade de dar início aos trabalhos preparatórios à
edificação ou urbanização – trabalhos de demolição, escavação e contenção periférica – nos
procedimentos de licenciamento, a requerimento do interessado, logo após o saneamento do artigo 11.º,
quando haja anterior informação prévia favorável (n.º 1, como veremos melhor adiante), ou após a
aprovação do projecto de arquitectura (n.º 2), desde que:
O requerente preste caução para reposição do terreno nas condições originais, caso venha a ser
indeferido o licenciamento (n.º 1, parte final);
O requerente apresente plano de demolições, projecto de estabilidade ou projecto de escavação e
contenção periférica, consoante o requerido (n.º 3).
O presidente da câmara decide acerca deste pedido no prazo de 15 dias (n.º 4), sendo título bastante para
iniciar os trabalhos o deferimento do pedido (n.º 5 - notificação de decisão expressa ou decisão tácita, nos
termos do artigo 111.º, alínea c); cfr. ob. cit., p. 498).
ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA afirma a licença parcial do artigo 23.º, n.º 6, como decisão parcial
ou parcelar, inclusivamente em termos formais (alvará), enquanto que a figura do artigo 81.º, n.º 2, resulta
apenas, segundo o Autor, da permissão do presidente da câmara, que pressupõe a anterior aprovação do
projecto de arquitectura, pelo que parece que esta integra já aquela decisão, só condicionada à
apresentação dos projectos exigidos. Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA, A natureza da
aprovação do projecto de arquitectura e a responsabilidade pela confiança no Direito do Urbanismo –
Acordão do STA de 16.5.2001, in CJA, n.º 45, Maio/ Junho, 2004, pp. 32-33.
35
actos prévios – actos que, embora decidindo sobre um aspecto particular da decisão
final, da pretensão autorizatória formulada, não produzem qualquer efeito permissivo,
não autorizam o particular a realizar a operação visada, exemplificando-se,
tradicionalmente, com as decisões relativas à localização de uma indústria poluente, as
informações prévias de viabilidade urbanística e a aprovação do projecto de arquitectura
no procedimento de licenciamento de obras.61
VASCO PEREIRA DA SILVA apresenta a clarificação e antecipação do
previsível desenvolvimento das relações administrativas através do escalonamento e
desdobramento das decisões – quando estão em causa questões complexas, pelo número
de destinatários da decisão, pelo carácter duradouro das relações em causa, ou pelo
tecnicismo da decisão - como uma das novas funções cometidas ao acto administrativo
no contexto do Estado pós-social, fazendo as decisões prévias parte desse fenómeno de
faseamento do procedimento. O acto administrativo, amplamente considerado, surge,
assim, como instrumento funcionalmente ligado à criação de clareza e previsibilidade
quanto ao desenvolvimento futuro das relações jurídicas entre Administração e
particulares, relações estas que assumem um carácter duradouro e continuado.62
Este fenómeno de divisão dos procedimentos administrativos em partes, em razão
do tempo e do objecto, com vista à criação de previsibilidade da actuação administrativa
e, consequentemente, diminuição do risco de investimento dos particulares
(ERICHSEN), constitui objecto de aprofundado estudo pela doutrina alemã, que
distingue, como actos administrativos intermédios, as “decisões prévias” e as
“decisões parciais”, caracterizando a “decisão prévia”, designada de Vorbescheid,
como a que é emitida pela Administração em relação a certas condições de decisão,
quando a lei assim determine ou o requerente possa para tal fazer valer um interesse
jurídico, verificando-se, assim, a autonomização de parcelas da decisão. A decisão
prévia é um acto administrativo com eficácia jurídica limitada à parte da decisão a que
respeita, regulada em primeiro lugar, e que pode ser impugnada pelos interessados
(BADURA), ou, na fórmula de diverso Autor, uma decisão final sobre questões isoladas
das quais depende a atribuição da autorização global (BREUER). Para a distinção das
decisões prévias relativamente às decisões parciais, muito contribui o carácter
61
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA/R. ESTEVES DE OLIVEIRA, Código de Processo nos
Tribunais Administrativos Comentado, Vol. I, Almedina, 2004, pp. 344-345. 62
Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, reimpressão,
Almedina, 2003, pp. 461 e ss.
36
permissivo das últimas, enquanto que as primeiras não possuem essa natureza, contêm
apenas a “regulação” da parte da decisão final a que respeitam (BADURA)63
.
À semelhança de MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA E OUTROS, também
FILIPA URBANO CALVÃO apresenta a informação prévia prestada pelas câmaras
municipais, no âmbito dos procedimentos de licenciamento de obras particulares e de
operações de loteamento, como exemplo de acto administrativo prévio. Procedendo à
distinção entre esse tipo de actos (e os actos parciais) e os actos precários e
provisórios64
, destaca a sua função de pré-aviso em relação ao que poderá sudecer no
final do procedimento, sobretudo como meio de dimunuir o risco de investimento dos
particulares, assinalando-lhes um objectivo de transparência e previsibilidade da
actuação administrativa. Refere a Autora que ACHTERBERG, “pai” do conceito,
acabaria por não clarificá-lo devidamente, definindo-o como medida ou providência
precedente de um outro acto, que estabelece uma regulamentação definitiva de um
complexo parcial do procedimento decisório, e, simultaneamente, uma regulamentação
provisória do complexo procedimental global, abarcando, assim, sob essa designação,
não só as regulamentações prévias, como as parciais, as provisórias, e, inclusive, as
precárias. Isto não obstante a sua intenção de distinguir o acto prévio do acto parcial,
fazendo-os, em termos paralelos, corresponder aos conceitos de sentença interlocutória
e sentença parcial, respectivamente. Segundo a Autora, os actos prévios são praticados
num momento em que ainda não é possível decidir sobre a autorização global, mas em
que algumas condições para a sua concessão podem já ser objecto de uma decisão,
63
A doutrina alemã apresenta como exemplos de “procedimentos escalonados” a distinção, no
direito do urbanismo, da autorização de urbanização e da autorização de construção, e a relação entre a
promessa e a emissão do acto administrativo prometido (ERICHSEN), e, igualmente, como exemplo de
decisão prévia, a decisão relativa ao local de instalação de uma indústria poluente, acto intermédio lesivo
dos direitos dos particulares e, como tal, recorrível. Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, ob. cit., pp. 457
e 461-466. 64
Funcionalmente considerados, os actos provisórios visam “assegurar a realização imediata
do interesse público, pautando-se por uma intenção cautelar, sob pena de aquela ficar gorada se a
decisão administrativa só surgir posteriormente”, e os actos precários procuram “garantir a constante
realização do interesse público”, face às suas evoluções relevantes. Assim, enquanto que o acto
provisório pressupõe sempre e necessariamente uma decisão ulterior, ao acto precário pode ou não seguir-
se um acto de conteúdo diferente, em função das exigências do interesse público.
Quanto à sua natureza jurídica, a Autora consubstancia o acto precário como acto administrativo que
integra no seu conteúdo eventual uma cláusula acessória, a condição resolutiva; por sua vez, o acto
provisório não corresponde a um acto administrativo sujeito a qualquer das cláusulas acessórias típicas,
será antes um acto administrativo sujeito a uma cláusula acessória mista ou atípica – “cláusula de
provisoriedade”. Cfr. FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., pp. 22-23, 105-106 e 142-144.
37
antecipativa, quanto aos pontos decididos, relativamente à decisão global, embora não
possua efeito permissivo, não podendo o destinatário exercer o direito ao seu abrigo65
.
Mais recentemente, destaca-se FERNANDA PAULA OLIVEIRA que, citando as
definições adiantadas por Mário Esteves de Oliveira e outros, supra referidos, enquadra
a informação prévia na categoria dos actos prévios, como acto prévio de natureza
verificativa e sem carácter permissivo, reconhecendo-lhe, contudo, certas
especificidades relativamente ao conceito doutrinal daqueles actos, que o distinguem,
designadamente, do acto de aprovação do projecto de arquitectura - exemplo típico de
acto prévio, como desenvolveremos adiante66
.
No sentido da qualificação da informação prévia como acto prévio parece,
igualmente, situar-se ANDRÉ FOLQUE, ainda que não de forma expressa, afirmando
ser certo não se tratar aquela de um acto materialmente definitivo, por se esgotar
enquanto pressuposto de um outro procedimento administrativo, investindo o
interessado não no direito de desenvolver a operação urbanística, mas apenas no
interesse legalmente protegido a não ver indeferido um pedido de licença67
.
Nesse mesmo sentido, FREITAS DO AMARAL apresenta a informação prévia
como acto prévio, definindo tal tipo de actos como “actos administrativos pelos quais a
Administração resolve questões isoladas de que depende a posterior decisão da
pretensão autorizatória ou licenciatória formulada pelo particular”, sem qualquer
efeito permissivo68
.
3.2.4.1 – A VORBESCHEID DO DIREITO ALEMÃO
O desenvolvimento da categoria dogmática da decisão prévia deve-se, como
referimos, à doutrina alemã, na qual surge genericamente designada de Vorbescheid,
sendo desta figura que a doutrina portuguesa parte para a consideração da informação
prévia como acto prévio.
Acerca da Vorbescheid como decisão preliminar, afirma MAURER que, enquanto
a autorização contempla o projecto na sua globalidade, não podendo ser concedida pela
65
Cfr. FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., pp. 46-52. 66
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 149-151. 67
Cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., p. 224. 68
Cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, 7.ª reimpressão da
edição de 2001, Almedina, 2007, pp. 263-264.
38
Administração sem a verificação do cumprimento de todas as condições legalmente
exigidas, a Vorbescheid pronuncia-se apenas acerca da verificação de certas condições
daquela, mas de forma definitiva e vinculativa para a Administração, sendo, assim, ela
própria um acto administrativo69
, como decisão antecipatória. Apresenta como exemplo
a “autorização para urbanização”, quando, havendo um particular interessado em
construir um prédio numa zona não urbanizada, possa revelar-se adequado apreciar, em
primeiro lugar, a conformidade da pretensão com as regras do direito do urbanismo (não
ainda com as regras do direito da construção). E sendo a resposta da Administração, a
essa questão, negativa, o particular poderá recorrer da mesma na jurisdição
administrativa, e, em caso de improcedência, terá economizado dinheiro, por se ter
escusado a apresentar os “projectos detalhados” da construção. A pré-decisão,
limitando-se, quanto ao conteúdo, a apreciar a conformidade da construção projectada
com o direito do urbanismo, é uma ―parte antecipada da licença de construir‖ - neste
sentido se pronuncia o Tribunal Administrativo Federal alemão. O particular só pode
construir com a ―autorização de construção‖, mas, alicerçando-se esta na decisão prévia,
pode confiar que o seu projecto não será recusado por motivos atinentes ao direito do
urbanismo.
Acrescenta o Autor poder encontrar-se esta ―autorização preliminar‖ noutros
procedimentos, exemplificando com a autorização de localização de centrais nucleares,
e em matéria de autorização de outras instalações (quando está em causa,
designadamente, a protecção contra a poluição, face a determinados empreendimentos),
podendo, para além das situações ―legais-padrão‖, verificar-se a utilização deste tipo de
decisão noutras situações não expressamente prescritas, uma vez que a conformação do
procedimento, incluindo a sua divisão em várias partes, se situa no âmbito do poder
discricionário do órgão decisor.
Uma vez emitida a decisão prévia, se a situação de facto ou de direito que a
alicerçou se alterar, incluindo a modificação do ―plano de urbanização‖ que a
determinou, ela continua a produzir os seus efeitos jurídicos, ao contrário do que
acontece com a figura da promessa de acto administrativo, podendo, no entanto, ser
69
Embora, em considerações introdutórias antecedentes, relativas às figuras da promessa, da
informação, da decisão prévia, da autorização parcial, e do acto provisório, afirme o Autor não poderem
essas figuras ser qualificadas, em termos absolutos, como actos administrativos. Cfr. HARTMUT
MAURER, Manuel de Droit Administratif Allemand (Allgemeines Verwaltungsrecht), tradução de Michel
Fromont, Paris, L.G.D.J., 1994, p. 224; e Direito Administrativo Geral, 14.ª edição revisada e
complementada, tradução de Luís Afonso Heck, São Paulo, Manole, 2006, p. 248.
39
revogada nos termos das regras da revogação dos actos administrativos, caso a
Administração considere essa solução adequada.70
-71
3.2.5 - A INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO PROMESSA?
Importa ainda, para efeitos da qualificação do acto de informação prévia, atentar
na figura da promessa, que igualmente se destaca no direito alemão. Cumpre, desde
logo, referir que parte da doutrina alemã qualifica a supra aludida “autorização para
urbanização” como promessa sob a forma de acto administrativo72
.
MAURER, que distingue a decisão prévia da promessa, nos termos expostos,
caracteriza a última – Zusage - como compromisso de carácter obrigatório assumido
pela autoridade competente para tomar ou não tomar uma determinada medida
administrativa. Constitui, assim, seu elemento decisivo a vontade da Administração se
vincular - Bindungswille, aludindo, no mesmo sentido, o Tribunal Administrativo
Federal alemão a uma obrigação de praticar ou abster-se de praticar, no futuro, um acto,
conformando a Administração o seu poder de autoridade de forma impositiva para si
própria – domínio de conformação própria (discricionária), acrescentamos nós. Como
subcategoria de promessa surge a promessa referente à emissão ou à não emissão de um
acto administrativo - Zusicherung. O mesmo Autor destaca o relevante papel que ambas
as figuras desempenham na prática, exemplificando com o comprometimento da
Administração em conceder uma autorização para construção, de promover um
funcionário, de dispensar o administrado do cumprimento do serviço militar obrigatório,
de adoptar medidas de planeamento relativamente a determinado terreno, de devolver
certos documentos, de proporcionar a colocação de cartazes durante uma campanha
eleitoral.
70
Cfr. HARTMUT MAURER, ob. cit., pp. 227-228 (trad. francesa), e pp. 252-253 (trad.
brasileira). 71
Por oposição à decisão prévia, MAURER define a decisão parcial – Teilgenehmigung, como
decisão definitiva mas limitada a uma parte do projecto submetido a autorização, avançando com o
exemplo da autorização para avançar com os trabalhos de escavação, quando solicitada uma licença de
construção, enquanto as questões relativas às fases seguintes da construção serão apenas apreciadas
posteriormente, de forma aprofundada. Cfr. HARTMUT MAURER, ob. cit., p. 228 (trad. francesa) e p.
253 (trad. brasileira). 72
DÜRR, citado por MAURER, ob. cit., p. 227 (trad. francesa); também SELMER/ SCHULZE,
quanto à decisão prévia no âmbito do direito de protecção contra as emissões poluentes, cujo conteúdo
consideram ter carácter de promessa, citados por FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., p. 49, nota 59.
40
Quanto à questão da qualificação da promessa como acto administrativo, afirma-a
MAURER como controversa, dividindo-se a doutrina entre os que destacam o carácter
criador de uma obrigação e regulador da promessa e, diversamente, aqueles que negam
conter a mesma uma regulação, mas apenas uma previsão, posição que o Autor
considera acertada73
-74
.
A lei de procedimento administrativo alemã prescreve, no entanto, a aplicação de
várias normas relativas ao acto administrativo à promessa de praticar um acto
administrativo, por analogia, retirando interesse prático à discussão acerca da sua
qualificação75
, dispondo, ainda, ser a promessa feita sob reserva de manutenção da
situação material e jurídica pressuposta. Dispõe, assim, o artigo 38.º do Código do
Procedimento Administrativo Alemão:
“Promessa (Zusicherung).
(1) Para ser eficaz, a promessa da autoridade competente de vir a praticar ou a não
praticar um determinado acto administrativo (promessa), necessita de ser efectuada
por escrito. Se, em virtude de uma disposição legal, for necessário que antes da prática
do acto administrativo prometido sejam ouvidos os interessados ou obtida a
participação de outra autoridade ou de um órgão colegial, então, a promessa só deve
ser feita depois da audição dos interessados ou da participação dessa autoridade ou do
órgão colegial.
(2) No que concerne à ineficácia da promessa, são aplicáveis, por analogia, sem
prejuízo do número (1), primeira frase, o § 44, o § 45, número (1), pontos 3.5. e número
73
MAURER, ob. cit., pp. 224-226 (trad. francesa) e pp. 248-251 (trad, brasileira). 74
No mesmo sentido, SCHIMMELPFENNIG entende que a promessa não estabelece a
regulação imediata de uma situação jurídica, diversamente dos actos condicionados ou das decisões
prévias. Só através do cumprimento da promessa o objecto da decisão se transforma em “realidade da
vida”, e a precedência da promessa em relação ao momento decisório faz com que ela represente apenas
um compromisso por um lapso de tempo, desde a promessa à sua realização ou cumprimento. Autor
citado por FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., p. 58, nota 84, e pp. 59 e 60. 75
Desta aplicação analógica destaca-se a eficácia jurídica e vinculativa da promessa inválida
(excepto se for nula), eventual indemnização do destinatário face à sua revogação (protecção da
confiança), cfr. artigo 48.º do CPA alemão; situação diversa se verifica perante promessa válida, mas
ocorrendo alteração da situação fáctica ou jurídica que a baseou, nos termos do número (3) do artigo 38.º
- cfr. ALBERTO AUGUSTO ANDRADE DE OLIVEIRA, Código do Procedimento Administrativo
Alemão, Tradução e Notas, Livraria da Universidade, Coimbra. Acrescenta MAURER a possibilidade do
destinatário da promessa recorrer contenciosamente para obrigar a Administração a praticar o acto
prometido, e a possibilidade de impugnar um acto desconforme com a promessa. Admite, ainda, a
possibilidade de terceiro prejudicado pela promessa, como por exemplo um vizinho quando esteja em
causa promessa de autorização de construção, impugnar a mesma. Constituem pressupostos para a
vinculatividade da promessa, além da inexistência de nulidade, a sua emissão pela autoridade competente
e por escrito. Cfr. HARTMUT MAURER, ob. cit., pp. 224-226 (trad. francesa) e p. 249 (trad. brasileira).
41
(2), no respeitante à sanação por vícios relativos à audição de interessados e à
participação de outras autoridades ou órgãos colegiais, o § 48, quanto à revogação
com fundamento em invalidade, o § 49, quanto à revogação de actos válidos, sem
prejuízo, neste caso, do disposto no presente número (3).
(3) Se, depois da promessa, se alterar a situação de facto ou de direito de modo tal
que a autoridade não teria feito tal promessa se tivesse tido conhecimento dessas
alterações, ou de tal modo que não a poderia ter feito, por razões jurídicas, deixa essa
autoridade de ficar vinculada a tal promessa.”
WOLFF, BACHOF e STOBER destacam a importância da promessa como forma
de realização de segurança jurídica, diminuindo riscos de investimento do destinatário.
Neste sentido, igualmente, SCHEUING, acerca da concessão de subvenções às
empresas, afirma deverem as empresas garantir-se, através da promessa, junto da
Administração, antes de realizarem os investimentos e operações dos quais dependem a
concessão das subvenções, contribuindo, assim, esta figura para a realização dos
interesses colectivos.76
Quanto à doutrina nacional, FREITAS DO AMARAL considera que tais actos
não definem situações jurídicas, por nada decidirem, apenas criarem a expectativa de vir
a decidir, mas assume o seu carácter vinculativo para a Administração77
-78
.
Consideração criticada por VASCO PEREIRA DA SILVA, que a reputa de
contraditória, afirmando que admitir o carácter vinculativo da promessa significa
admitir que a posição da Administração ficou, desde logo, definida por esse acto, ainda
que os seus efeitos na esfera jurídica dos particulares dependa da prática do acto
prometido. Acrescenta o Autor, no contexto da noção ampla de acto administrativo que
advoga, serem as promessas, indiscutivelmente, actos administrativos, como decisões
destinadas à produção de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta (artigo
120.º do CPA), designadamente para efeitos da sua recorribilidade, na medida em que
lesem direitos dos particulares (artigo 268.º, n.º 4 da CRP).79
76
Autores citados por FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., p. 57, notas 82 e 83. 77
Cfr. FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, Vol. III, Lisboa, 1989, pp. 219-220. 78
Efeito de vinculação que a doutrina reputa de reduzido, uma vez que, face à necessidade de
manutenção dos pressupostos de facto e jurídicos para emissão do acto prometido, é incerta a verificação
deste acto. WOLFF/ BACHOF/ STOBER, citados por FILIPA URBANO CALVÃO, ob. cit., p. 59. 79
Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Em busca…, ob. cit., pp. 729-732.
42
Relativamente à distinção da promessa da mera informação - Auskunft, afirma
MAURER que esta se distingue da promessa por ser desprovida do elemento de vontade
de auto-obrigação da autoridade, constituindo uma simples comunicação de carácter
puramente documental, sobre circunstâncias de facto ou jurídicas. Não se trata, assim,
de um acto administrativo, não fundamenta qualquer direito à prestação, apenas,
eventualmente, um direito à reparação de danos causados, caso se venha a revelar
ilegal.80
3.2.6 – PRIMEIRA APROXIMAÇÃO À NATUREZA JURÍDICA DA INFORMAÇÃO
PRÉVIA – ACTO SUI GENERIS?
Apreciadas as funções, evolução legal, conteúdo e conformação procedimental da
informação prévia, e descritas as notas caracterizadoras das categorias dogmáticas
susceptíveis de, genericamente, assimilarem tal figura, parece-nos ser o momento
adequado para proceder a uma primeira aproximação à natureza jurídica da mesma, por
referência às ditas categorias doutrinais.
Assim, no que diz respeito à identificação/ delimitação da informação prévia
relativamente aos actos prévios, na sua configuração típica da doutrina alemã, é claro
que, numa perspectiva funcional, temos que admitir a sua recondução a tal categoria. As
funções de garantia e simplificação procedimental, sobretudo, mas, igualmente, a
função de informação, que teleologicamente orientam a informação prévia e estão na
sua origem, concretizam-se mediante a perspectivação da informação prévia na sua
relação com o hipotético ulterior procedimento de controlo prévio da realização da
operação urbanística visada. A informação prévia consubstancia uma garantia em
relação a um posterior pedido de licenciamento, uma agilização procedimental em
relação a um posterior procedimento de licenciamento, e uma informação em relação a
uma pretensão urbanística que eventualmente se decidirá efectivar. Assim
perspectivada, e notando, ainda, a sua natureza não permissiva, a informação prévia
afirma-se como acto prévio relativamente a um procedimento de licenciamento (ou de
comunicação prévia). Contudo, estritamente considerada, a informação prévia não se
esgota na figura do acto prévio, possui antes uma autonomia prática e formal que a
especifica em relação àquele tipo de actos.
80
Cfr. HARTMUT MAURER, ob. cit., p. 226 – 227 (trad. francesa) e 251-252 (trad. brasileira).
43
Quanto à figura da promessa, parece-nos faltar o elemento de vontade de auto-
vinculação da Administração, determinante para que à mesma possamos reconduzir a
informação prévia, sendo esta um acto de gestão urbanística legalmente devido e
amplamente positivado. Note-se, contudo, que tal como na promessa da prática de um
acto administrativo, a informação prévia surge (potencialmente) como um acto sobre
um outro acto – um acto que teleologicamente se dirige à conformação de um acto
posterior (eventual), o acto de licenciamento, que vai conformar/ condicionar (e,
eventualmente, gerador de um direito sobre outro direito81
– direito de obter o direito à
realização da operação urbanística conforme com a informação prévia).
Parece-nos possuir a informação prévia uma especificidade intrínseca – como
decisão e acto final e definitivo de um procedimento próprio e autónomo, decorrente de
um pedido teleologicamente formulado para a sua emissão e que nesta se esgota, sem
deixar de assumir uma pretensão de projecção num eventual posterior procedimento de
licenciamento – especificidade que, se por um lado a identifica com os actos prévios e
com as promessas da prática de actos administrativos, por outro lado a delimita
relativamente aos mesmos, estritamente considerados, atribuindo-lhe uma natureza
dogmática própria, sui generis, tal como melhor apreciaremos no seguimento do nosso
trabalho.
81
WOLFF/BACHOF/STOBER classificam os direitos públicos subjectivos em direitos de
domínio, direitos de reinvindicação (ou de exigência, que incluem todas as legitimações de atribuição), e
direitos de conformação, como direitos à intervenção directa numa situação jurídica, especialmente para
a criação, a modificação e a extinção de relações jurídicas; parece-nos que o direito conferido por uma
informação prévia favorável, na sua especificidade, se aproximará mais desta última figura. Claro é que
está em causa uma verdadeira legitimação (na doutrina dos mesmos Autores), decorrente de uma norma
de obrigação (e não um mero reflexo do direito objectivo), atendendo ao fim de protecção da norma
como critério de delimitação. Como pressupostos da aceitação de uma legitimação como direito
subjectivo, quando o legislador não definiu a sua existência ou não previu com detalhe o seu
aparecimento, afirmam os Autores: a existência de uma lei material que, com base numa sua previsão de
facto (Tatbestand), permita estabelecer para um titular de direito subjectivo, que não seja apenas
provisório ou ocasionalmente beneficiado em termos materiais pelos seus efeitos jurídicos, um benefício
face a um obrigado, de forma directa e exclusiva, ou pelo menos também no seu interesse próprio (fim ou
intenção de favorecimento). Cfr. WOLFF/BACHOF/STOBER, Direito Administrativo, vol. I
(Verwaltungsrecht, I), 11.ª edição revista, 1999, tradução de António F. de Sousa, Fundação Calouste
Gulbenkian, Julho 2006, pp. 657-660 e 668. Quanto à crítica à teoria da protecção da norma, veja-se
idem, ibidem, pp. 664-666.
44
3.2.7 - OS EFEITOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA (FAVORÁVEL) PARA O
REQUERENTE: CARÁCTER CONSTITUTIVO DE DIREITOS: QUE DIREITO? DIREITO
CONDICIONADO (PRESSUPOSTOS) E LIMITADO NO TEMPO
A evolução legal, doutrinal e jurisprudencial da figura da informação prévia
determinou o reconhecimento do seu carácter constitutivo de direitos, quando favorável
à pretensão do requerente.
Isto não obstante a dificuldade de concretização dessa fórmula. ANTÓNIO
DUARTE DE ALMEIDA afirmava, a propósito da informação prévia prevista pelo DL
n.º 445/91, tratar-se, em rigor e abstraindo da formulação legal, de um acto criador,
apenas, de uma expectativa juridicamente tutelada82
, uma vez que não criava na esfera
jurídica do requerente o direito a construir, por não lhe conferir o direito à emissão de
uma licença de construção83
. Contudo, admitia o Autor que, visando a formulação legal
da informação prévia como constitutiva de direitos um escopo de reforço dos direitos e
garantias dos particulares face à pronúncia da Administração, perdia sentido a discussão
acerca desse carácter, uma vez que, com o artigo 140.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 do CPA,
os actos constitutivos de direitos e os actos constitutivos de interesses legalmente
protegidos passaram a merecer igual protecção em termos de revogabilidade84
.
Outros Autores sustentavam, igualmente no âmbito do DL n.º 445/91, que o efeito
constitutivo de direitos da informação prévia positiva se traduzia na aquisição do direito
de construção por parte do requerente, também assim se justificando a restrição da
legitimidade para requerer a informação prévia a quem tivesse legitimidade para o
licenciamento posterior da construção85
.
82
VIEIRA DE ANDRADE define expectativas jurídicas como situações concretas em que
alguém espera que se completem os elementos susceptíveis de dar origem a um direito subjectivo seu,
direito ―in fieri‖ ou em formação, adiantando como exemplo clássico o da expectativa da promoção,
quando o funcionário possui já alguns dos requisitos legais necessários para tal. Acrescenta consistir a sua
tutela jurídica apenas na proibição à Administração de impedir arbitrariamente a produção do facto ou
acto que dê origem ao direito, não constituindo, em si, posições jurídicas subjectivas actuais, e não devem
confundir-se com as posições dos particulares no contexto de procedimentos complexos faseados, em que
já foram tomadas decisões parcelares ou parciais, estas sim verdadeiros direitos ou interesses legalmente
protegidos. Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça…, ob. cit., p. 82. 83
Porque só vincula a câmara municipal dentro dos limites do pedido apresentado, e recorrendo,
para tal juízo, à definição de actos administrativos constitutivos de direitos avançada por FREITAS DO
AMARAL, como aqueles que “atribuem a outrem direitos subjectivos novos, ou que ampliam direitos
subjectivos existentes, ou que extinguem restrições ao exercício de um direito já existente”. Cfr.
ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 829. 84
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 829. 85
Cfr. ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA, ob. cit., pp. 74 e 78.
45
A propósito desta questão destacam-se as mais recentes considerações de
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, atestando que a informação prévia favorável não
atribui direitos de edificabilidade ou a uma determinada edificabilidade ao seu
destinatário, tendo apenas este, por força da informação prévia, direito ao licenciamento
(ou, actualmente, à admissão da comunicação prévia) de um certo projecto. Este direito
revela-se, no entanto, condicionado pela verificação de três pressupostos:
a) Que o projecto apresentado para licenciamento seja conforme aos elementos
apreciados no âmbito da informação prévia;
b) Que o beneficiário da informação prévia tenha legitimidade, ou a adquira
entretanto, para requerer o licenciamento, face à legitimidade alargada
admitida pela actual legislação para formular o pedido de informação prévia;
e
c) Que o pedido de licenciamento seja formulado no prazo de um ano a contar
da comunicação da informação prévia – artigo 17.º, n.º 2 do RJUE.
Assim, pressupondo o cumprimento destas condições cumulativas e
indispensáveis, considera-se que a informação prévia favorável confere ao seu
beneficiário o direito à licença (ou admissão da comunicação prévia), e é esta que, por
sua vez, lhe confere o direito à edificabilidade pretendida. Pelo que o direito à
edificabilidade é apenas indirectamente concedido pela informação prévia, através da
intermediação do acto de licenciamento, razão pela qual, conclui a Autora, aquela figura
só pode ser entendida em função deste acto86
. Já em texto posterior, a Autora precisa
este raciocínio, asseverando que, uma vez que a informação prévia apenas aprecia as
questões urbanísticas em causa na pretensão, ou seja, no caso de obras particulares,
apenas as questões referentes ao projecto de arquitectura - ficando de fora questões
relativas aos projectos de especialidades, que compõem, igualmente, a licença, - a
informação prévia apenas criará na esfera do beneficiário, em rigor, o direito à
aprovação do projecto de arquitectura, não o direito ao acto global e final da licença,
que não se limita àquele87
.
86
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação ao Acordão do STA de 20/06/ 2002, cit., p.
107. 87
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., p. 152.
46
A Autora clarifica, deste modo, a posição dos diferentes actos de gestão
urbanística no quadro do sistema urbanístico português. Os procedimentos de
informação prévia e de licenciamento apresentam vocações distintas, dando origem a
actos que cumprem funções diversas, e, consequentemente, produzem diferentes efeitos.
Enquanto que, com o pedido de informação prévia o particular visa apenas a pronúncia
da Administração acerca da viabilidade de determinada pretensão urbanística, que
poderá posteriormente realizar ou não – pretensão não edificatória, - com o pedido de
licenciamento, o particular assume desde logo a intenção de realizar a operação
urbanística apresentada. Assim, enquanto a informação prévia é desprovida de carácter
permissivo, é através da licença que o interessado adquire o direito a lotear, urbanizar
ou construir, ou seja, o direito de realizar a operação urbanística desejada88
.
Atentemos, agora, nos pressupostos supra referidos, condicionantes do carácter
constitutivo de direitos da informação prévia (favorável):
a) Pressuposto de conteúdo: conformidade entre o projecto apresentado para
licenciamento e o que foi objecto da informação prévia favorável, já que a
informação prévia apenas vincula a câmara municipal quanto aos elementos
apreciados na mesma, tendo em conta o pedido e os elementos apresentados pelo
particular, e na medida dos mesmos. Ou seja, a câmara pode indeferir o posterior
pedido de licenciamento (ou rejeitar a comunicação prévia) com base em
fundamento não apreciado, ou não apreciado de forma completa, na informação
prévia, quer porque o pedido de informação prévia não o contemplava, ou o
interessado não juntou os elementos necessários para a sua apreciação, quer
porque o projecto de arquitectura introduz elementos desconformes com o
anteriormente apreciado - falta de correspondência entre as pretensões
urbanísticas apresentadas, antes e depois.
Este pressuposto surge de forma expressa no n.º 1 do artigo 17.º do RJUE - “…a
efectuar nos exactos termos em que foi apreciada…”, referente ao pedido de
informação prévia qualificado do n.º 2 do artigo 14.º, face à maior completude
deste pedido e, consequentemente, da informação prestada nesses casos, e a
consequência da sujeição da operação sobre que recai ao regime da comunicação
88
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 152-153.
47
prévia - exigindo, por sua vez, o n.º 2, declaração dos autores e coordenador dos
projectos quanto ao respeito dos limites constantes da informação.
Apesar de entendermos que a Administração procede, ou deve proceder, a um
juízo esclarecido acerca dos elementos apresentados no pedido de informação
prévia, face ao risco que um juízo deficiente representaria, atendendo aos efeitos
do acto (e embora esteja em causa apenas a apresentação de um anteprojecto),
concluimos já anteriormente depender a informação prévia, quanto ao seu
conteúdo, dos termos concretos do pedido – princípio do pedido, que se reflecte
na extensão dos seus efeitos.
b) Pressuposto de legitimidade: legitimidade do beneficiário da informação prévia
para requerer o licenciamento da operação urbanística, existente já ao tempo do
pedido de informação prévia ou adquirida posteriormente. Este pressuposto
decorre da actual consagração da legitimidade alargada para fazer o pedido,
reconhecida a qualquer interessado no mesmo, independentemente da sua
qualidade de proprietário ou titular de outro direito real sobre o prédio visado –
n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 14.º do RJUE, questão sobre a qual nos debruçaremos
adiante.
c) Pressuposto temporal: o pedido de licenciamento (ou comunicação prévia) tem
que ser requerido durante o ano seguinte à notificação da informação prévia ao
beneficiário89
, ou da notificação da sua renovação nos termos do n.º 3 do artigo
17.º90
, pelo que a não apresentação do pedido de licenciamento dentro desse
prazo funcionará como condição resolutiva dos efeitos constitutivos de direitos
da informação prévia91
.
ALVES CORREIA refere-se a “efeitos temporalmente limitados” da
informação prévia92
, e ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA a protecção de
89
Devendo assim considerar-se apesar do n.º 2 do artigo 17.º se referir a “prazo de um ano após
a decisão favorável do pedido de informação prévia” uma vez que não podem considerar-se oponíveis
aos interessados os actos cuja notificação é devida, nos termos do artigo 66.º do CPA, enquanto a mesma
não ocorrer. Pelo que a contagem do prazo a partir da decisão de informação prévia só valerá nos casos de
deferimento tácito do pedido. Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 227-228. 90
Contando-se desde a renovação tácita, se a ela houver lugar, nos termos da mesma disposição. 91
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação ao Acordão do STA de 20/06/2002, cit., p.
106. 92
Cfr. F. ALVES CORREIA, As Grandes Linhas…, ob. cit, p. 132, nota 77.
48
“alcance limitado no tempo” da informação, estando em causa um prazo de
caducidade dos efeitos da informação pela verificação de um facto negativo -
não apresentação do pedido de licenciamento, e não um prazo de validade, como
erradamente anunciava a epígrafe do artigo que o prescrevia, em diplomas
anteriores ao DL n.º 555/9993
.
Passado esse prazo sem que o particular tenha requerido o licenciamento, a
informação prévia perde o seu carácter constitutivo de direitos para o
beneficiário, mas mantém a sua natureza informativa, não podendo a câmara
indeferir, sem mais, o pedido de licenciamento posterior, porque embora aquela
informação já não a vincule, ela sempre está sujeita à previsão do n.º 2 do artigo
7.º do CPA, e pode colocar-se, em caso de desconformidade da decisão com a
anterior informação, a questão da responsabilidade pela prestação de
informações erróneas. Pelo que, nesses casos de desconformidade, e admitindo
que se mantêm os pressuposto de facto e de direito existentes ao tempo da
emissão da informação prévia, existirá para a Administração um dever acrescido
de fundamentação, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 124.º do CPA94
.
Concluimos estar aqui em causa uma das especificidades da informação prévia,
que fazem dela um acto sui generis: o acto é válido e eficaz (e vinculativo para a
Administração, conforme veremos) ab initio, contudo, e porque funcionalmente se
identifica como acto prévio ao acto de licenciamento, o seu carácter constitutivo de
direitos encontra-se condicionado pelos pressupostos enunciados, cuja verificação
depende do seu beneficiário.
Notem-se, por fim, as considerações do Supremo Tribunal Administrativo que,
em Acordão recente95
, se refere a uma posição jurídica de vantagem em que a
informação prévia favorável coloca o particular, definindo, desde logo, a sua situação
jurídica quanto à conformidade do projecto com as regras do direito do urbanismo,
vinculando a Administração, embora temporariamente, a decidir o pedido de
licenciamento de acordo com a informação prestada. Tal acto “enriquece” a esfera
jurídica do interessado, pelo que, se não lhe atribui o direito à construção, confere-lhe,
93
Designadamente, o artigo 13.º do anterior DL n.º 445/91. Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE
ALMEIDA, ob. cit., p. 832. No mesmo sentido, ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA, ob. cit., p. 78. 94
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação…, cit., pp. 111-112. 95
Acordão de 12/03/2009, P. n.º 01018/08 (1.ª subsecção do Contencioso Administrativo), in
www.dgsi.pt.
49
com repercussão patrimonial (atente-se na tão comum hipótese do requerente apenas
estar interessado na venda do imóvel, e não em efectivar, ele próprio, a operação
urbanística) o direito de aproveitamento do solo com o conteúdo da informação prévia
favorável.96
3.2.7.1 – O ARTIGO 81.º, N.º 1, DO RJUE – O INÍCIO DOS TRABALHOS
PREPARATÓRIOS APÓS O SANEAMENTO DO PEDIDO DE LICENCIAMENTO
CONFORME COM A ANTERIOR INFORMAÇÃO PRÉVIA FAVORÁVEL
O artigo 81.º do RJUE prescreve a possibilidade, já existente no regime anterior
ao DL n.º 555/99, de requerer o início dos trabalhos preparatórios à edificação ou
urbanização – demolição, escavação e contenção periférica – logo após o acto de
aprovação do projecto de arquitectura, antes, portanto, do acto final (permissivo) de
licenciamento da operação urbanística (n.º 2). O n.º 1 do mesmo artigo acrescenta,
inovatoriamente, a possibilidade de tal requerimento ser feito logo após o saneamento
do pedido de licenciamento, quando esteja em causa este tipo de procedimento de
controlo prévio e o pedido tenha sido instruído com anterior informação prévia
favorável eficaz. Dispõe, assim, que “quando o procedimento de licenciamento haja
sido precedido de informação prévia favorável que vincule a câmara municipal, pode o
presidente da câmara municipal, a pedido do interessado, permitir a execução de
trabalhos de demolição ou de escavação e contenção periférica até à profundidade do
piso de menor cota, logo após o saneamento referido no artigo 11.º, desde que seja
prestada caução para reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes
do início dos trabalhos”.
Tal faculdade depende, desde logo, da prestação de caução, que acautela um
eventual (embora não muito provável) indeferimento do licenciamento a final, e, ainda,
da apresentação do plano de demolições, do projecto de estabilidade ou do projecto de
escavação e contenção periférica, consoante a situação – n.º 3. ANTÓNIO CORDEIRO
sustenta dever exigir-se a aprovação desses projectos, não a mera entrega,
designadamente quando esteja em causa a demolição de edifício pré-existente, situação
irreversível, insusceptível de ser acautelada através de caução97
.
96
Deixamos, ainda, uma nota crítica a alguma jurisprudência administrativa, cuja falta de rigor
conceitual se denota, afirmando, em acordãos recentes, o “direito à construção” como direito decorrente
da informação prévia favorável – vejam-se os Acordãos do STA de 17/04/2008 (P. n.º 0558/07) e do
TCA Norte de 03/07/2008 (P. n.º 01628/04.5BEPRT), in www.dgsi.pt. 97
Cfr. ANTÓNIO CORDEIRO, Arquitectura…, ob. cit., p. 363, nota 110.
50
Deste modo, a entrega do projecto de arquitectura e a mera verificação da sua
conformidade com a anterior informação prévia favorável e em vigor (na fase de
saneamento e apreciação liminar do pedido de licenciamento), à qual a aprovação
daquele projecto se encontra, portanto, vinculada98
, basta para começar a executar os
trabalhos preparatórios da operação pretendida. ANTÓNIO CORDEIRO parte desta
previsão para contrariar a ideia de menor força garantística da informação prévia,
quando comparada com o acto de aprovação do projecto de arquitectura. Expõe o Autor
que o estudo prévio que alicerça a informação prévia tem que conter todo o
esclarecimento necessário para que a câmara municipal possa ajuizar acerca das
implicações urbanísticas da intervenção pretendida, resultando dos termos legais a mera
análise liminar do projecto de arquitectura, a sua redução à verificação da conformidade
com a informação prévia, que se afirma como determinante – uma ―pré-aprovação‖ do
projecto de arquitectura. Tal efeito, bem como a não suspensão dos procedimentos,
prevista no n.º 4 do artigo 17.º do RJUE, ilustram, segundo o Autor, o carácter
determinante da informação prévia, no que às questões urbanísticas diz respeito, pelo
que, em princípio, são os parâmetros de decisão que a basearam que prevalecem para
efeitos do posterior licenciamento.99
Coloca-se, então, a questão de saber se esta previsão do n.º 1 do artigo 81.º do
RJUE será susceptível de conferir à informação prévia um carácter permissivo,
constituindo o direito de iniciar os trabalhos preparatórios de uma operação urbanística.
Parece-nos claro que não será assim. Tal possibilidade integra-se já no âmbito da fase
de apreciação do projecto de arquitectura (e do procedimento de licenciamento,
portanto), e decorre da sua pré-aprovação, não directa, mas apenas indirectamente da
informação prévia. Contudo, é indiscutível que o carácter conformador (e constitutivo
de direitos, relativamente às questões urbanísticas) da informação prévia sai daqui
reforçado, já que a referida pré-aprovação do projecto de arquitectura se esgota na
verificação da sua conformidade com aquele acto anterior. Pelo que entendemos que tal
possibilidade só será viável nos casos de pedido de informação prévia abrangente do
grosso das questões urbanísticas da pretensão. Em conformidade, deverá estender-se
98
Idem, ibidem, pp. 277-278. 99
Cfr. ANTÓNIO CORDEIRO, Arquitectura…, ob. cit, pp. 277-280.
51
essa faculdade aos casos de comunicação prévia instruída com informação prévia
favorável, emitida nos termos do n.º 2 do artigo 14.º do RJUE100
.
3.2.8 – A IMPUGNABILIDADE DA INFORMAÇÃO PRÉVIA PELO REQUERENTE (OS
EFEITOS EXTERNOS E - POTENCIALMENTE - LESIVOS); INTERESSES/ REFLEXOS
ECONÓMICOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
Admitida a informação prévia como acto administrativo, como acto final de um
procedimento próprio e autónomo, e como acto constitutivo de direitos para o
beneficiário, incontroversa se nos revela a sua impugnabilidade pelo interessado
requerente. Mesmo se tipificado (funcionalmente) como acto prévio, o seu carácter
potencialmente lesivo da esfera do particular requerente – e a produção de efeitos
externos - assegura a admissão da sua recorribilidade, independentemente, portanto, de
se lhe cometer ou não definitividade horizontal101
.
Assim, já anteriormente ao CPTA, recorrendo ao n.º 4 do artigo 268.º da CRP e
à noção substantiva de acto administrativo do artigo 120.º do CPA, alguma doutrina
assumia a recorribilidade de todos os actos administrativos, independentemente do
estádio do procedimento em que fossem praticados, sempre que lesivos de direitos dos
particulares – lesividade como pressuposto processual da recorribilidade. VASCO
PEREIRA DA SILVA, atendendo aos actos prévios e aos actos parciais, assume
conterem os mesmos uma “decisão final”, sendo, como tal, recorríveis, quando
assumam carácter lesivo da posição do particular. A impugnação contenciosa imediata
desses actos, correspondentes a diferentes momentos de decisão e exteriorização da
vontade administrativa no âmbito do procedimento faseado, permite, assim, o controlo
preventivo da actividade administrativa e a antecipação da tutela dos particulares102
.
Contudo, mesmo após a entrada em vigor do CPTA e consagração expressa do
―conceito processual‖ do acto administrativo no n.º 1 do artigo 51.º - acto impugnável
100
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 498. 101
Perante a substituição da fórmula do “acto definitivo e executório” pela do “acto lesivo dos
direitos e interesses dos particulares” como critério aferidor da impugnabilidade do acto administrativo,
desde logo com a redacção dada ao n.º 4 do artigo 268.º da CRP pela revisão constitucional de 1989,
actualmente consolidada pelo CPTA, no seu artigo 51.º, n.º 1, e com a fórmula do “acto com efeitos
externos”. 102
VASCO PEREIRA DA SILVA, defensor do modelo de contencioso subjectivista que acabou,
em certa medida, por ser consagrado no CPTA, e da afirmação do procedimento como centro da
actividade administrativa, em detrimento do acto administrativo. Em busca…, ob. cit., pp. 463-464 e 697
e 701.
52
como todo aquele com eficácia externa, designadamente face à susceptibilidade de lesar
direitos ou interesses legalmente protegidos, independentemente da sua posição no
âmbito do procedimento administrativo, - a recorribilidade das pré-decisões não
constitui questão doutrinalmente consensual.
Como eficácia ou efeitos externos ao procedimento, entendem ESTEVES DE
OLIVEIRA E OUTROS a projecção autónoma de efeitos, de natureza definitiva ou
provisória, pelo acto procedimental, na própria pretensão material que se intentava fazer
valer através dele ou no próprio bem, direito, interesse ou posição jurídica a que a
Administração ou qualquer interessado aspiravam mediante o procedimento103
, ou,
ainda, em qualquer bem, direito, interesse ou posição exterior ao procedimento, dos nele
interessados ou de terceiros104
. Os mesmos Autores concluem pela impugnabilidade dos
actos parciais, dotados dessa eficácia externa, mas, quanto aos actos prévios,
reconhecem-na a uns – como a constituição de um júri para prestação de provas de
acesso a um grau académico, mas negam-na relativamente a outros actos, como a
aprovação do projecto de arquitectura, embora reconhecendo-o como acto nuclear do
procedimento de licenciamento105
.
No mesmo sentido da inclusão dos actos destacáveis do procedimento,
designadamente os actos prévios e parciais, na categoria dos actos com eficácia externa,
para efeitos processuais106
, se manifesta VIEIRA DE ANDRADE, afirmando,
103
Incluem-se aqui os chamados actos destacáveis do procedimento, exemplificando-se com a
suspensão do arguido em processo disciplinar, as medidas provisórias decretadas ao abrigo do artigo 84.º
do CPA, os actos parciais e os actos de exclusão de um interessado num procedimento plural. Cfr. M.
ESTEVES DE OLIVEIRA/R. ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. cit, p. 344. 104
Como, por exemplo, a imposição de um encargo pecuniário a quem participa no
procedimento, ou alguns actos de abertura de concursos, lesivos de terceiros que tenham um direito aos
contratos postos a concurso. Cfr. idem, ibidem, p. 344. 105
Cfr. idem, ibidem, pp. 343-344 e 346. 106
VIEIRA DE ANDRADE, discursando acerca do conceito de acto administrativo impugnável
no âmbito do CPTA, recorre à tradicional designação de actos destacáveis do procedimento – actos que,
embora inseridos num procedimento, produzem efeitos jurídicos externos autonomamente, sem ser
através do acto principal do procedimento, incluindo quer os actos prévios ou parciais – actos que
terminam uma fase autónoma ou um sub-procedimento, nos procedimentos complexos, quer os actos de
trâmite que excluam alguém de um procedimento (procedimento concursivo), quer, ainda, medidas
provisórias. E como decisões administrativas preliminares designa aquelas que determinam
peremptoriamente a decisão final de um procedimento com efeitos externos, mas que não têm, elas
próprias, capacidade para constituir tais efeitos externos (relativamente aos particulares), que se
produzem através da decisão final, nelas enquadrando as pré-decisões e os pareceres vinculantes. Como
exemplos de pré-decisões (que englobam, além dos actos prévios – que decidem definitivamente certas
condições da decisão global, as decisões parciais – que já constituem a decisão final relativamente a
alguns dos efeitos, como a “licença de estruturas”), adianta a decisão de constituição de um júri num
procedimento de concurso ou de prestação de provas, com efeitos próprios, embora meramente
procedimentais, e a aprovação do projecto de arquitectura no procedimento de licenciamento de obras
particulares, “constitutiva de direitos” - embora, recorrendo à doutrina italiana, reconheça não dever
53
relativamente aos primeiros, que, embora, em rigor, esses actos não visem produzir o
efeito lesivo, pode sustentar-se e aceitar-se a impugnabilidade de algumas dessas
“decisões”, como expressão de uma defesa antecipada ou precoce dos interessados,
que, com grande probabilidade, serão por eles lesados na sua esfera jurídica107
.
Acrescenta o Autor parecer, no entanto, não estar essa impugnabilidade contemplada no
artigo 51.º do CPTA, embora este também não a exclua de forma explícita, pelo que ela
deveria decorrer expressa ou inequivocamente de uma lei específica, tal como o CPTA
faz relativamente aos actos administrativos pré-contratuais (contratos dos artigos 100.º e
seguintes). E adianta, desde logo, a conveniência da previsão legal da impugnabilidade
das decisões sobre o projecto de arquitectura, admitindo poder aqui sustentar-se a sua
produtividade externa, por aquela decisão constituir direitos na esfera do particular,
ainda que limitados – vincula a decisão final de licenciamento, mas não constitui um
direito susceptível de execução específica, apenas pode obter-se do tribunal a
condenação à prática do acto devido e a sentença de execução não será substitutiva108
.
Ora, considerando a informação prévia como acto administrativo (e como acto
prévio em sentido funcional), como decisão, entendemos, desde logo, ser a mesma
dotada dos elementos que possibilitam a sua qualificação como acto administrativo em
sentido processual (objectivo, aliás, norteador da sua inclusão, pela doutrina, na
categoria dos actos prévios), impugnável, portanto, nos termos do artigo 51.º, n.º 1 do
CPTA. Assumimos, assim, a informação prévia, sem prejuízo das suas especificidades,
como decisão final de um procedimento próprio e autónomo, geradora de efeitos
externos para os particulares requerentes (na medida da pretensão material formulada
e dos efeitos que cria), e potencialmente lesiva das posições jurídicas dos mesmos.
confundir-se a força determinante do conteúdo com a força constitutiva da decisão, e, consequentemente,
confundir-se a vinculatividade de um parecer vinculante, de uma deliberação preliminar, de um facto num
juízo de ciência, com a autoridade constitutiva da decisão, própria do acto administrativo, - na medida em
que vincula a decisão final de licenciamento, embora não constitua um direito susceptível de execução
específica, podendo apenas obter-se a condenação da administração, pelos tribunais adminstrativos, à
prática do acto devido, não sendo a sentença de execução substitutiva. Sem a prática da decisão final, os
efeitos externos para que essas decisões tendem não se produzem, podendo mesmo nunca vir a produzir-
se se o orgão competente para a decisão final, mesmo que ilegalmente, nada decidir ou decidir em sentido
divergente daquela pronúncia. Situação diferente é a da decisão que dependa de aprovação de outro
orgão, porque aí os seus efeitos não se produzem através da aprovação, mas estão apenas condicionados
pela sua prática ou recusa. Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, A justiça…, ob. cit., pp. 217-219. 107
Quanto aos actos parciais, o Autor admite, desde logo, a sua eficácia externa e potencialidade
lesiva de posições jurídicas dos particulares. Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., p. 219, nota 425. 108
Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, O novo modelo de impugnação judicial dos actos
administrativos – tradição e reforma, in O acto no contencioso administrativo, Colóquio Luso-Espanhol,
Colaço Antunes/Sáinz Moreno (coordenadores), Almedina, 2005, pp. 196-199.
54
3.2.8.1 – OS “INTERESSES/ REFLEXOS ECONÓMICOS” ASSOCIADOS À
INFORMAÇÃO PRÉVIA
A questão dos efeitos externos da informação prévia não fica completa sem uma
referência aos potenciais reflexos económicos associados à sua emissão em sentido
favorável. As funções que a informação prévia cumpre, designadamente a função de
garantia, potencializam a sua utilização pelos particulares como factor de valorização
dos terrenos, com reflexos (maiores ou menores) no comércio imobiliário. Assim, o
proprietário de um terreno terá interesse em que sobre o mesmo recaia informação
prévia favorável, perspectivando que tal facto beneficie a sua transacção, pelo que a
existência daquele acto consubstanciará uma vantagem económica na sua esfera
jurídica. Por outro lado, também para os interessados na compra de um terreno poderá
ser conveniente requerer um pedido de informação prévia antes da efectivação do
negócio, dirigindo-se o seu interesse à realização de uma específica operação
urbanística, ou até como forma de garantia para facilitar a concessão de um crédito
bancário109
. Ora, tais potenciais reflexos económicos do pedido de informação prévia na
esfera jurídica dos seus beneficiários ilustram a potencialidade lesiva da figura.
3.2.9 – A INFORMAÇÃO PRÉVIA DESFAVORÁVEL: ACTO NEGATIVO; CONTEÚDO
(POSITIVO) INFORMATIVO; EFEITOS E IMPUGNABILIDADE
Referência autónoma merece a informação prévia desfavorável, face às
especificidades que a lei lhe prescreve e considerações jurisprudenciais e doutrinais
recentemente tecidas a seu propósito.
A informação prévia desfavorável afirma-se como resposta negativa da
Administração ao pedido de informação prévia do particular, ou seja, a Administração
pronuncia-se pela inviabilidade do licenciamento (ou da admissão da comunicação
prévia) da operação urbanística pretendida, considerada com as características
apontadas no pedido, perante a sua desconformidade com as regras urbanísticas
aplicáveis. Os fundamentos para a emissão de informação prévia desfavorável terão que
ser os mesmos que a lei, taxativamente, prescreve para o indeferimento do pedido de
109
Acerca do papel desempenhado pelo certificat d´urbanisme do direito francês no âmbito do
financiamento imobiliário, veja-se ALAIN GOURIO, Intervention – Deuxième Table Ronde sur
“Securité Juridique dês Constructeurs et Certificat d´Urbanisme”, in Droit et Ville, IEJUC, n.º 31, Ville
de Toulouse, USST, 1991, pp. 57-58.
55
licenciamento – artigo 24.º do RJUE, valendo nesta sede o princípio da taxatividade dos
motivos de indeferimento do pedido110
. Atente-se, a este propósito, no artigo 108.º, n.º 1
do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação de Lisboa111
, que opta por
expressamente prescrever tal solução, nestes termos: “o pedido de informação prévia é
objecto de decisão desfavorável quando se verifique um dos fundamentos de
indeferimento de pedido de licenciamento ou rejeição da comunicação prévia, previstos
nos artigos 24.º e 36.º do RJUE, respectivamente.”.
Destaca-se, a propósito desta figura, o n.º 4 do artigo 16.º do RJUE, segundo o
qual, sendo a informação desfavorável, “dela deve constar a indicação dos termos em
que a mesma, sempre que possível, pode ser revista, por forma a serem cumpridas as
prescrições urbanísticas aplicáveis, designadamente as constantes de plano municipal
de ordenamento do território ou de operação de loteamento”. Prevê, assim, esta
disposição a possibilidade de ―revisão‖ pela câmara municipal da sua pronúncia
desfavorável ao pedido de informação prévia formulado pelo interessado. Entendemos
que se faculta ao requerente, desde logo, a possibilidade de reformular o pedido de
molde ao cumprimento das prescrições aplicáveis, para beneficiar, posteriormente, de
informação prévia favorável e dos efeitos que lhe estão associados112
. Esta
―reformulação‖ acaba, contudo, por constituir um novo pedido de informação prévia –
designadamente, parece-nos, para efeito do pagamento da taxa aplicável a tal acto, mas
devendo aproveitar-se os elementos instrutores do anterior pedido, desde que
inalterados. Perante a referida previsão legal – termos de revisão da informação
desfavorável como menção obrigatória dessa deliberação, a doutrina reconhece-lhe
carácter vinculativo para a câmara na medida das indicações fornecidas113
. Entendemos
que significa isto que se o beneficiário requerer o licenciamento da operação em causa,
conformando o pedido com as indicações dadas na informação desfavorável, opção
tanto mais viável quanto mais concreto for o pedido de informação formulado, a
Administração deve decidir de acordo com as indicações de revisão incluídas na
informação desfavorável (dizemos ―deve” porque não se poderá aqui falar de
informação constitutiva de direitos…). Está aqui em causa um acto administrativo
110
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., pp. 91-92. 111
Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação de Lisboa, publicado no Diário da
República, 2.ª Série, n.º 8, de 13/01/2009, Aviso n.º 1228/2009. 112
Estando a câmara vinculada a deferir esse pedido reformulado se conforme com as indicações
prestadas – logo aqui presente a vinculatividade conferida à informação desfavorável. 113
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., pp. 831-832.
56
negativo, mas que comporta uma dimensão positiva de informação114
. Note-se que o
particular dispõe da possibilidade de impugnar a informação desfavorável, por a
considerar ilegal, questão que abordaremos de seguida.
Dota-se, deste modo, a informação prévia de efeito útil para o interessado,
independentemente do sentido positivo ou negativo, o que constituirá um incentivo ao
seu recurso pelos particulares, que, mesmo em caso de indeferimento, poderão avançar
com maior segurança para um pedido de licenciamento115
.
3.2.9.1 – A IMPUGNABILIDADE DA INFORMAÇÃO PRÉVIA DESFAVORÁVEL – A
JURISPRUDÊNCIA DO STA
Particular destaque assume a questão da impugnabilidade da informação prévia
desfavorável, questão realçada após a posição quanto a ela assumida pelo STA em
Acordão de 07/12/2007116
, que foi objecto, contudo, e após a crítica da doutrina, de
inflexão jurisprudencial posterior.
Estando em causa, no citado Acordão, um pedido de informação prévia sobre
determinada construção, e pronunciando-se a câmara municipal desfavoravelmente à
pretensão do particular, o STA vem (contraditoriamente…) afirmar que, apesar do seu
conteúdo meramente informativo e carácter de mera antecipação da provável decisão
final da Administração, a informação prévia pode ser constitutiva de direitos, quando é
favorável, concedendo ao requerente o direito de exigir o deferimento do pedido de
licenciamento, desde que este não exceda o conteúdo da informação. Pelo contrário,
sustenta o Tribunal, a informação desfavorável não faz nascer na esfera jurídica do
recorrente qualquer direito, e porque, por um lado, não constitui a última palavra da
Administração, e, por outro lado, não tem aptidão lesiva, essa pronúncia é irrecorrível.
FERNANDA PAULA OLIVEIRA critica as considerações tecidas no Acordão,
designadamente a confusão entre os procedimentos de informação prévia e de
licenciamento, quando se afirma que a pronúncia da Administração, em sede de
informação prévia, não constitui o acto final, o acto definidor da situação jurídica do
requerente quanto ao licenciamento da obra pretendida, mas uma mera antecipação da
114
Veja-se o Acordão do STA de 02/03/2005 (P. n.º 02017/03, in www.dgsi.pt), que, a este
propósito, se refere a uma obrigação de informar. 115
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., pp. 830-831. 116
P. n.º 0415/07.
57
provável decisão final da Administração, e, igualmente, quanto à desconsideração da
aptidão lesiva da informação desfavorável, como acto negativo117
que é, acto que recusa
a concessão de um determinado direito ao interessado118
, e tendo, como tal, aptidão
lesiva, se for ilegal. Assim, procedendo à caracterização e distinção do instituto da
informação prévia no quadro dos actos de gestão urbanística existentes, a Autora reforça
a configuração da informação prévia como acto final de um procedimento autónomo,
positivo (informação favorável) ou negativo (informação desfavorável), e a falta de
sentido de impedir o particular de impugnar a informação desfavorável, obrigando-o a
fazer o pedido de licenciamento, com os custos inerentes, para poder recorrer do seu
indeferimento ilegal, numa altura em que a informação prévia é cada vez mais vista
como instrumento de segurança no tráfico jurídico, podendo o seu carácter desfavorável
inviabilizar a realização de negócios jurídicos sobre o terreno em causa119
.
Cumpre-nos, no entanto, salientar com agrado a inflexão jurisprudencial operada
pelo STA, relativamente à posição acima descrita, em Acordão de 12/03/2009120
, no
qual se discutia acerca de informação prévia desfavorável supostamente ilegal. Apesar
do Ministério Público, no seu parecer, pugnar, em sede de questão prévia, pela
irrecorribilidade do acto em causa, citando e expondo os argumentos do Acordão de
2007, o Tribunal conclui ser a pronúncia desfavorável da câmara municipal sobre
pedido de informação prévia um acto administrativo negativo, contenciosamente
recorrível. Declara, assim, improcedente a questão prévia suscitada, afirmando a
informação prévia desfavorável como uma inovação, um acto administrativo
verificativo definitivo, mas negativo, que introduz na ordem jurídica, como efeito
jurídico novo, a recusa da possibilidade de aproveitamento do solo nos termos
requeridos pelo particular, pelo que imediatamente lesiva para este e,
consequentemente, imediata e autonomamente (relativamente à deliberação decorrente
117
Nas palavras de ROGÉRIO SOARES, está em causa um acto negativo, recusa ou negação de
acto, quando “a Administração, provocada a praticar um acto com um determinado conteúdo, se recuse
a fazê-lo, e positiva e expressamente manifeste a sua decisão de não alterar as situações jurídicas
existentes”. Esta recusa tem um valor positivo, alterando a situação jurídica dos pretendentes – efeitos
jurídicos externos. Acrescenta o Autor que, nos procedimentos de iniciativa do particular, a rejeição do
pedido (indeferimento) constituirá “sempre e para todos os efeitos um acto”. Cfr. ROGÉRIO SOARES,
Direito Administrativo (Lições), Coimbra, policopiado, 1978, pp. 97-99. 118
Embora o direito recusado não seja, como vimos já, o direito de edificar, como acontece com
o indeferimento do pedido de licenciamento ou a rejeição da comunicação prévia, mas o direito ao
deferimento do pedido de licenciamento conforme com a informação prévia favorável. 119
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 141 e ss, 146-147 e 154-157. 120
P. n.º 01018/08, in www.dgsi.pt.
58
do pedido de licenciamento) recorrível (face aos artigos 268.º, n.º 4 da CRP e 25.º da
pretérita LPTA), conclusão que isentamos de crítica.
3.2.10 – A VINCULATIVIDADE DA INFORMAÇÃO PRÉVIA PARA A
ADMINISTRAÇÃO
Decorre do que vimos dizendo o carácter vinculativo da informação prévia para a
Administração, concretamente para a câmara municipal competente para a sua emissão,
como informação qualificada que é, e acto administrativo constitutivo de direitos para o
particular.
Nos termos do n.º 1 do artigo 17.º do RJUE, “a informação prévia favorável
vincula as entidades competentes na decisão sobre um eventual pedido de
licenciamento ou apresentação de comunicação prévia da operação urbanística a que
respeita”. Significa isto que, achando-se cumpridos os três pressupostos que
descrevemos anteriormente – de conteúdo, de legitimidade e temporal, a câmara
municipal encontra-se obrigada a licenciar (rectius, a aprovar o projecto de arquitectura)
a operação urbanística visada, sobre a qual recaia anterior informação prévia favorável.
Afirmada ficou já, também, a vinculatividade para a câmara municipal da
informação prévia desfavorável, na medida das indicações facultadas acerca dos termos
da sua revisão, conformando-se a pretensão com as regras urbanísticas que lhe sejam
aplicáveis, designadamente as constantes de plano municipal de ordenamento do
território ou alvará de loteamento – áreas jurídico-urbanisticamente já consolidadas, em
maior ou menor grau, pelo que a câmara não terá dificuldade em proceder, desde logo, à
identificação e aplicação dos parâmetros urbanísticos a cumprir de molde a que a
concreta operação urbanística se conforme com aquelas regras. Ou seja, se o particular
requerer novo pedido de informação atendendo às indicações de revisão prestadas – e
considerando que se mantêm os pressupostos de facto e de direito que alicerçaram essas
indicações, a câmara terá que ter em conta aquelas indicações dadas na primeira
informação desfavorável. Ou se o particular decidir apresentar, desde logo, um pedido
de licenciamento sobre a operação urbanística objecto dessa informação, conformando o
projecto nos termos das indicações de revisão prestadas, a câmara terá que ter estas em
conta na ulterior decisão (na aprovação do projecto de arquitectura), considerando que
se mantêm os pressupostos de facto e de direito referentes à anterior informação. Esta
59
dimensão de vinculatividade da informação prévia, nos casos em que seja desfavorável
à pretensão apresentada, resulta do n.º 4 do artigo 16.º do RJUE, que prescreve a
indicação dos termos de revisão da informação prévia como menção obrigatória da
mesma, e confere-lhe um efeito útil para o particular requerente, independentemente do
sentido negativo à pretensão concreta (embora não possa falar-se aqui de acto
constitutivo de direitos), reforçando a função de informação que este instituto também
prossegue.
3.2.11 – OS EFEITOS PROCEDIMENTAIS (EVENTUAIS) DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
Antes de encerrarmos a questão dos efeitos da informação prévia para as partes –
particular requerente/ beneficiário e Administração, importa referirmo-nos aos efeitos
procedimentais da informação prévia, ou seja, os efeitos que a mesma terá sobre o
hipotético ulterior procedimento de controlo prévio da realização da operação
urbanística pretendida, efeitos que beneficiam quer a Administração quer o requerente,
resultando em economia de meios e maior celeridade procedimental – função de
simplificação procedimental da informação prévia. São eles:
A sujeição da operação urbanística ao regime da comunicação prévia, nos casos
do pedido de informação qualificado do n.º 2 do artigo 14.º, de acordo com o
n.º 1 do artigo 17.º do RJUE;
A dispensa121
de realização de novas consultas externas, quando a elas tenha
havido lugar nos termos do artigo 15.º, nos casos do n.º 2 do artigo 14.º, mas,
igualmente, nos restantes casos em que se hajam realizado essas consultas, não
se verificando razão justificativa da duplicação de consultas também nesses
casos – n.º 1 do artigo 17.º, in fine122
;
Tais efeitos da informação prévia no ulterior procedimento de controlo prévio
reforçam o carácter conformador da figura, não só em termos procedimentais,
modelando o referido procedimento posterior, mas, igualmente, em termos materiais,
121
Trata-se, em rigor, de uma isenção, cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit.,
p. 221. 122
Cfr. idem, ibidem, p. 221.
60
suscitando, desde logo, a pronúncia de entidades externas, pronúncias potencialmente
definitivas (e eventualmente determinantes) quanto à possibilidade de efectiva
concretização da operação urbanística apresentada.
No mesmo sentido, note-se o n.º 2 do artigo 37.º do RJUE, relativo a operações
urbanísticas cujo projecto necessita de aprovação da Administração central,
prescrevendo que, regra geral, não podem os órgãos municipais aprovar informação
prévia favorável (tal como não podem deferir pedidos de licença ou comunicações
prévias) relativa a operações daquele tipo sem que o requerente apresente documento
comprovativo da aprovação da Administração central.
3.2.12 – OS EFEITOS DA INFORMAÇÃO PRÉVIA EM RELAÇÃO A TERCEIROS
Explicitados os efeitos da informação prévia para o particular requerente e para a
Administração que a emite, terminamos a apreciação desta questão com a análise dos
efeitos da informação prévia para terceiros relativamente à relação administrativa
bilateralmente considerada, estabelecida entre requerente/ beneficiário e Administração.
Apresentamos, como ponto de partida, o Acordão do STA de 24/09/2003123
, no
qual se colocava a questão da recorribilidade de uma informação prévia favorável a
determinada construção, por um terceiro vizinho da parcela de terreno sobre a qual
recaía aquele acto. O Tribunal conclui que, face ao critério da idoneidade para a
produção de efeitos imediatamente lesivos dos direitos ou interesses legalmente
protegidos do interessado como critério aferidor da recorribilidade dos actos
administrativos, é imediatamente recorrível o deferimento de um pedido de informação
prévia de viabilidade de construção de uma estrutura metálica de grandes dimensões, se
resulta provado que o interessado, proprietário de um solar do séc. XVII, utilizado para
turismo de habitação, contíguo ao local da pretendida construção, vê afectadas as
reservas de turistas em consequência da divulgação pública da eminência da referida
construção.
A sentença recorrida rejeitara o recurso contencioso considerando que o acto
impugnado não era susceptível de lesar direitos ou interesses de terceiros, como era o
caso da recorrente. Esta veio alegar perante o Supremo a desvalorização do seu prédio,
bastando a mera possibilidade ou forte indício que constitui a informação prévia
123
P. n.º 0749/03, in www.dgsi.pt.
61
favorável para afectar o valor intrínseco e comercial de um prédio com as características
do seu. Acrescenta, ainda, ser a informação prévia favorável lesiva pelas consequências
que acarreta para o processo de licenciamento, não só face à vinculação da autoridade
recorrida relativamente a esse acto, mas, igualmente, porque os organismos externos
não seriam chamados de novo a emitir parecer sobre a operação urbanística, e tornando-
se, assim, o procedimento de licenciamento mais simples e célere, daí resultando
prejuízo para a recorrente e para a defesa efectiva dos seus interesses124
. Destaca-se,
ainda, o facto de o local em causa não ser abrangido por instrumento de planeamento
territorial.
O STA pronunciou-se de forma inovadora quanto à questão em apreço,
relativamente à sua anterior jurisprudência, que, como é referido no próprio Acordão,
afirmava a recorribilidade do acto de informação prévia apenas para o requerente que vê
o seu pedido indeferido125
, uma vez que o desatendimento da pretensão constrange o seu
direito de propriedade (considerando que o requerente seja, simultaneamente, o
proprietário do terreno) e ofende direitos ou interesses legalmente protegidos, mas não
para terceiros, já que o deferimento do pedido de informação não constitui a úlima
palavra da Administração quanto ao pedido de licencimento da obra, pelo que não é
imediatamente lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos daqueles, sendo
recorrível para terceiros, apenas, o acto de licenciamento.
Com efeito, o Tribunal vem sustentar, no Acordão em análise, que sendo
recorríveis os actos que, em concreto, atendendo aos direitos e interesses invocados pelo
recorrente, se apresentam com autonomia funcional e com eficácia lesiva imediata
daqueles (citando Gomes Canotilho), nos termos do artigo 268.º, n.º 4 da CRP - critério
da recorribilidade dos actos administrativos pela sua idoneidade para produzirem efeitos
imediatamente lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos - a simples
possibilidade de, no prazo de um ano, vir a ser construída no prédio contíguo uma
estrutura metálica de grandes dimensões para albergar autocarros afectará, desde logo,
negativamente, o valor comercial do prédio da recorrente, tendo, igualmente, influência
nas marcações de estadias no solar pelos turistas interessados em visitar a região,
124
Invocava, ainda, a recorrente, argumentos que contendem com questões que extravasam o
objecto da nossa apreciação nesta sede, além da violação de normas referentes à sua intervenção e
participação no procedimento de informação prévia, o desrespeito dos pareceres (negativos) legalmente
exigidos e destinados a assegurar a correcta inserção daquela obra naquele local, e, por fim, a necessidade
de defesa do património cultural da localidade, a beleza da paisagem e o próprio ambiente e salubridade
pública. 125
Não assim, contudo, no Acordão de 2007 anteriormente apreciado…
62
reservas efectuadas, geralmente, com grande antecedência, e considerando a
controvérsia gerada acerca da viabilidade daquela construção, amplamente divulgada na
imprensa local. Deste modo, tal bastaria para afirmar a lesividade imediata dos
interesses da recorrente e, consequentemente, a recorribilidade da informação prévia
pela mesma. O STA concedeu, assim, provimento ao recurso.
Destaca-se, contudo, o voto de vencido de um dos Conselheiros, expondo
entender que o acto que se pronuncia pela afirmativa num pedido de informação prévia
sobre viabilidade de construção ou localização é destituído de lesividade em relação a
terceiros, por nada decidir, de forma definitiva, sobre o licenciamento.
3.2.12.1 – OS VIZINHOS URBANÍSTICOS - AS RELAÇÕES MULTILATERAIS DA
ADMINISTRAÇÃO E OS ACTOS COM EFEITOS EM RELAÇÃO A TERCEIROS
A questão dos efeitos dos actos administrativos de gestão urbanística em relação a
terceiros vem sendo desde há muito discutida pela doutrina e jurisprudência no que aos
actos permissivos (de licenciamento e de autorização) diz respeito126
, debate construído,
designadamente, em torno dos conceitos de vizinhança urbanística como critério de
legitimidade, procedimental e processual, de terceiros, e de relações administrativas
multipolares ou poligonais (e actos administrativos com efeitos duplos ou em relação a
terceiros, emitidos no seu âmbito) como esquema dogmático idóneo ao enquadramento
da intervenção/ reacção de tais sujeitos nesses procedimentos ou contra esses actos de
gestão urbanística.
Parece-nos, assim, relevante, desde já, o recenseamento da principal doutrina
nacional que sobre estas ideias se deteve, anteriormente ao actual CPTA (e, alguma,
anterior mesmo ao CPA).
Principiamos com as considerações tecidas por MARCELLO CAETANO acerca
da noção de interessado. Segundo o Autor, haveria que distinguir (no esquema
dogmático do acto administrativo como elemento central do Direito Administrativo),
entre as partes – pessoa ou pessoas a quem directamente respeita o caso concreto
considerado e que são os destinatários dos comandos ou permissões que o acto encerra,
e os terceiros – pessoas que, não sendo partes no acto, podem ser favorecidas ou
126
E, mais recentemente, quanto ao acto prévio de aprovação do projecto de arquitectura, acerca
do qual nos debruçaremos adiante.
63
prejudicadas pelos seus efeitos. E conclui que partes e terceiros poderão ser designados
genericamente por interessados.127
Quanto ao conceito de vizinhança urbanística destacou-se GOMES
CANOTILHO, que primeiramente se manifestou em anotação ao Acordão do STA de
28 de Setembro de 1989, no qual o Tribunal afirmava ter legitimidade para impugnar o
acto de autorização da instalação de uma sala de ordenha, além de quem vivesse
permanentemente no local (alegando prejuízos para o ambiente e como titular desse
interesse difuso), o proprietário de habitação que possa ser directamente afectado por
essa instalação. GOMES CANOTILHO aplaude a orientação expressa (cometendo-se,
contudo, à descodificação das confusões conceituais em que o Acordão se baseia), e
adianta, desde logo, a conveniência de uma acção de vizinhança urbanística, de
natureza preventiva e cautelar, contra o perigo de perturbações e lesões dos direitos à
habitação e à qualidade de vida, no contexto do direito do urbanismo. Como exemplos
de direitos de defesa de terceiros apresenta: direitos de defesa contra emissões
provenientes de edificações vizinhas, contra privações de luz, sol e vistas, contra
edificações incompatíveis com o tipo de construções preexistentes ou instalações
industriais em zonas próximas de perímetros residenciais. E como principais
pressupostos do recurso anulatório de vizinhança enuncia a ilegalidade do acto
autorizativo, ofensivo das normas jurídicas reguladoras do urbanismo e da construção, e
a titularidade, pelo terceiro, de um direito ou interesse qualificado e suficientemente
individualizável. Quanto a este segundo pressuposto – legitimidade para impugnar o
acto, o Autor delimita o conceito de vizinho urbanístico recorrendo a três elementos:
Elemento pessoal: um conjunto de pessoas diferente da colectividade em geral;
Elemento espacial: um círculo de pessoas cuja localização espacial é abrangida
pela norma ou normas reguladoras do acto autorizativo, designadamente
instrumento de planeamento que o regula;
Elemento temporal: pessoas que, na qualidade de proprietários, trabalhadores,
inquilinos, têm permanência no local e estreitas relações com o mesmo no plano
da existência físico-espiritual.
127
Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, Tomo I, 9.ª edição, p. 475,
citado por OSVALDO GOMES, ob. cit., p. 88.
64
O recurso aos conceitos de vizinho e lesão ou afectação qualificada expressam o
cepticismo do Autor quanto à idoneidade do conceito de interesses difusos para a tutela
de direitos fundamentais subjectivamente radicados128
-129
. Segue-se, assim, a via dos
Autores alemães que alicerçam as pretensões de defesa de terceiros vizinhos,
directamente, na invocação de direitos fundamentais constitucionalmente consagrados,
estando em causa actos administrativos autorizativos que, de forma previsível,
legitimem a realização de obras susceptíveis de provocar, pela sua natureza ou
finalidade, agressões graves e insuportáveis em direitos fundamentais de terceiros
vizinhos. Acrescenta o Autor, ainda, a necessidade de considerar a questão central da
interpretação das normas urbanísticas pressupondo que estas incluem a positivação da
exigibilidade de ponderação de interesses de terceiros vizinhos – princípio de
ponderação ou exigência de tomada em consideração dos interesses de terceiros, em
cuja dimensão subjectiva se poderia alicerçar também a questão da legitimidade
processual.130
VASCO PEREIRA DA SILVA parte do enquadramento das relações
administrativas multilaterais, e dos actos com efeitos em relação a terceiros emitidos no
seu âmbito, para chegar ao reconhecimento de direitos subjectivos dos terceiros,
128
O conceito de interesses difusos seria, assim, infrutífero para resolver os problemas suscitados
em torno das designadas relações jurídico-administrativas poligonais (e dos actos administrativos com
efeitos múltiplos surgidos no seu âmbito), relações cuja caracterização deveria assentar nas dimensões
salientadas por STEINBERG, que GOMES CANOTILHO enuncia em texto posterior, a propósito das
relações administrativas ambientais: a) programação legal relativamente ténue; b) complexidade de
situações e tarefa de avaliação de riscos apelativos de conhecimentos técnico-científicos; c) pluralização e
interpenetração de interesses públicos e privados; d) legitimidade de intervenção dos interessados no acto
procedimental praticado pela Administração. Exemplo de relações jurídico-administrativas multipolares
ou poligonais, de carácter determinado e dominadas pelo conflito de interesses, públicos e privados, seria
o do licenciamento da actividade industrial. Cfr. GOMES CANOTILHO, Anotação ao Acordão do STA
de 28 de Setembro de 1989, in RLJ, Ano 124.º, n.º 3813, Coimbra Editora, 1992, p. 364; e GOMES
CANOTILHO, Relações jurídicas poligonais, ponderação ecológica de bens e controlo judicial
preventivo, in RJUA, n.º 1, Junho 1994, Almedina, pp. 56-58. 129
ANTÓNIO CORDEIRO critica o cepticismo de GOMES CANOTILHO no que à utilidade da
categoria dos interesses difusos diz respeito. Este Autor conclui pela necessidade de interpretação da
fórmula do “interesse directo, pessoal e legítimo” na impugnação em conformidade com a formulação
ampla do direito fundamental de acesso à justiça do artigo 20.º da CRP e a igualmente ampla
possibilidade de acesso à justiça administrativa do artigo n.º 268.º, n.ºs 4 e 5, considerando que pessoal
não é a mesma coisa que exclusivo, ideia para que aponta, também, a fórmula de interessados do n.º 4 do
artigo 268.º. Acrescenta que a concreta possibilidade de impugnação dependerá da situação particular em
que o terceiro interessado se encontre relativamente ao acto, variando os fundamentos invocáveis com a
diversidade de interesses que possam estar envolvidos, e devendo, portanto, atender-se à tipologia dos
possíveis terceiros interessados – o vizinho ―civil‖, o vizinho ―urbano‖, o munícipe ou o cidadão, segundo
a categorização do Autor, – para avaliar qual o seu título de legitimidade. Cfr. ANTÓNIO CORDEIRO, A
protecção de terceiros em face de decisões urbanísticas, Almedina, 1995, pp. 136-160 e 203-205. 130
Cfr. GOMES CANOTILHO, Anotação ao Acordão…, cit., pp. 361-365.
65
legitimadores da sua intervenção. O desenvolvimento das chamadas relações
administrativas multilaterais, e, consequentemente, daquele tipo de actos, é inerente ao
Estado pós-social e à denominada Administração de infra-estruturas. Com efeito, no
Estado pós-social, a Administração revela-se como conformadora da realidade social, e
a sua actividade como mecanismo de composição de interesses diversos, que se
manifestam no procedimento.131
O Autor, partindo da doutrina alemã da relação jurídica, atribui a esta nova
realidade jurídico-administrativa as notas da multilateralidade, alargamento da
protecção jurídica subjectiva, durabilidade das relações jurídicas, e esbatimento da
diferenciação entre formas de actuação genéricas e individuais. No que à característica
da multilateralidade das decisões administrativas diz respeito, mesmo tratando-se de
decisões individuais, os seus efeitos são susceptíveis de afectar imediatamente outros
sujeitos além dos particulares visados. Designadamente os actos de gestão urbanística
da Administração – o Autor exemplifica com as autorizações de construção -
apresentam-se como, simultaneamente, actos singulares, dirigidos a indivíduos
determinados, e instrumentos reguladores de um sector da actividade económica:
dimensão social, perante os efeitos que produzem em relação a terceiros afectados – os
vizinhos - devendo a posição destes ser ponderada aquando da emissão do acto.
Consequentemente, afirma-se a necessidade de alargamento da protecção jurídica
subjectiva dos terceiros afectados, procedimental e processualmente, que deve efectivar-
se através da ampliação do conceito de direito subjectivo, baseada nos direitos
fundamentais, e que origina direitos subjectivos novos – o direito dos vizinhos do dono
da obra. Este alargamento do domínio dos direitos subjectivos públicos urbanísticos
manifesta-se, no direito alemão, no amplo reconhecimento das acções jurídico-públicas
de vizinhança, e resultou, igualmente, da evolução da moderna doutrina da norma de
protecção, considerando-se a protecção dos vizinhos também abrangida pelo âmbito de
protecção de determinadas normas do direito da construção.132
Conclui o Autor que face à consagração, pelo ordenamento jurídico português, de
um entendimento amplo dos direitos subjectivos públicos - que podem ter como fonte a
Constituição, o direito internacional, a lei ordinária, o regulamento, o acto
administrativo ou o contrato - e, ainda, a consagração de direitos fundamentais e a
131
Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Em busca…, ob. cit., pp. 122-129. 132
Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Em busca…, ob. cit., pp. 122-144 e 260-281, onde o
Autor apresenta com desenvolvimento as diversas teses da doutrina alemã a este propósito.
66
necessidade de entender os direitos subjectivos públicos à luz dos mesmos, serão
titulares de direitos subjectivos públicos também os lesados por uma actuação
administrativa que, embora não os tenha como imediatos destinatários, podem, em
virtude de agressão verificada, ou da sua eventualidade, alegar um direito de defesa
decorrente dos direitos fundamentais. Este entendimento amplo dos direitos subjectivos
públicos ancora-se, não apenas nas normas constitucionais consagradoras dos direitos
fundamentais, mas também, designadamente, no artigo 53.º do CPA, que, no seu n.º 1,
confere legitimidade procedimental, entre outros, aos titulares de “direitos subjectivos
ou interesses legalmente protegidos”, correspondendo esses interesses aos direitos
subjectivos públicos. E também a “legitimidade para a protecção de interesses difusos”
da alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo corresponde, segundo o Autor, ao âmbito de
aplicação de direitos fundamentais, e ao reconhecimento expresso de direitos de defesa
dos particulares alicerçados nesses direitos, englobando, em caso de efectivação da
lesão, direito de recurso jurisdicional por parte dos particulares lesados (orientação
germânica). Assim, no que às relações multilaterais de vizinhança diz respeito, a
violação de normas jurídicas objectivas por parte da Administração pode originar a
lesão de direitos subjectivos dos vizinhos, estando em causa o seu direito fundamental
de propriedade – artigo 62.º, n.º 1 da CRP. O reconhecimento de tais direitos de defesa
decorrentes da agressão do direito fundamental de propriedade inclui a possibilidade da
sua intervenção no procedimento – tutela preventiva, - assim como a garantia da sua
protecção jurisdicional – impugnação dos actos administrativos lesivos.133
-134
-135
133
Cfr. VASCO PEREIRA DA SILVA, Em busca…, ob. cit., pp. 281-297. O Autor exemplifica,
como direitos subjectivos públicos dos vizinhos, o direito do vizinho a que a licença de obras não
contrarie as disposições de planeamento, implicando grave lesão do seu direito de propriedade, direito a
que as autoridades administrativas ordenem a demolição de construções que ameacem ruir para cima do
terreno do vizinho, direito do vizinho a que a edificação a construir respeite a distância mínima
relativamente à fachada do seu prédio, direito a que os prédios vizinhos sejam ligados à rede pública de
esgotos, de forma a que a água e os dejectos não desagúem na sua propriedade, direito a que a construção,
reconstrução ou modificação dos prédios vizinhos não faça perigar a segurança do seu prédio, direito a
que sejam respeitadas as regras de segurança contra incêndios, evitando o alastramento de sinistros à sua
propriedade (com remissão para diversas regras estabelecidas pelo RGEU – Decreto n.º 38 382, de 7 de
Agosto de 1951). Cfr. idem, ibidem, pp. 288-290. 134
Por sua vez, ANTÓNIO LORENA DE SÈVES, reportando-se ao licenciamento de
loteamentos urbanos e obras de urbanização, elenca como possíveis terceiros interessados, além dos
vizinhos, os peritos autores dos projectos, os adquirentes dos lotes e o técnico responsável pela direcção
técnica da obra, e como modalidades de determinação da protecção jurídica dos terceiros: a consideração
dos direitos fundamentais afectados, a densificação do conceito de terceiros-vizinhos (quando estão estes
em causa), a protecção jurídica procedimental de terceiros nessas operações, e a protecção através de
standards legalmente fixados para essas operações. E conclui, na senda da jurisprudência e doutrina
alemãs, designadamente de ALEXY, dever sempre ser assegurada protecção judicial aos terceiros-
vizinhos com fundamento directo no direito fundamental de propriedade, desde que a autorização ou uma
67
Mais recentemente, JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, delimitando a acção
particular da acção popular, reforça a legitimidade (processual) activa de vizinhos
titulares de um interesse directo – projecção do benefício da anulação do acto
directamente na sua esfera jurídica, pessoal – benefícios sentidos na sua esfera jurídica
pessoal, não na de terceiros ou na comunidade, indiferenciadamente, e legítimo – a sua
pretensão não é censurada pela ordem jurídica, mas mesmo protegida, uma vez que as
normas violadas se destinam, não apenas a proteger o interesse público a um adequado
ordenamento do território e desenvolvimento do espaço urbano, mas, também, a
defender os direitos e os interesses das pessoas que possam ser prejudicadas pela sua
violação.136
Parece-nos que, actualmente, face à ampla consagração da legitimidade para
impugnar actos administrativos, pelo artigo 55.º do CPTA, a admissão da
recorribilidade da informação prévia por terceiros surge mais facilitada. Prescreve a
alínea a) do n.º 1 daquele artigo, ter legitimidade para impugnar um acto administrativo
“quem alegue ser titular de um interesse directo e pessoal, designadamente por ter sido
lesado pelo acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos”. Tal interesse
pressupõe-se, igualmente, legítimo, como resultava da fórmula expressa, anteriormente,
nos artigos 821.º do Código Administrativo e 46.º do Regulamento do Supremo
Tribunal Administrativo137
. A doutrina traduz o interesse directo e pessoal no
provimento da impugnação como obtenção, através da anulação ou declaração de
nulidade do acto administrativo, de uma vantagem ou benefício específico imediato
sua utilização altere duradouramente uma situação do terreno do vizinho urbanístico previamente
delimitada, ultrapassando, dessa forma, os limites de inexigibilidade da expropriação, atingindo-o de
modo grave e insuportável. Cfr. ANTÓNIO LORENA DE SÈVES, A protecção jurídico-pública de
terceiros nos loteamentos urbanos e obras de urbanização, in Revista do CEDOUA, n.º 2, Ano I, 2.1998,
pp. 61-63 e 63-75. 135
WOLFF/BACHOF/STOBER atribuem a aceitação da protecção de terceiros ao alargamento
da teoria de protecção da norma à teoria de protecção normativa de terceiros, adiantando, no que aos
vizinhos de construções diz respeito, que estes deverão alegar a violação de uma norma jurídica com
carácter de protecção de vizinhos (e não a ilegalidade objectiva da licença), como por exemplo normas
que regulam o distanciamento em relação à partilha, normas relativas ao fogo e normas relativas à saúde.
Consideram ainda a protecção jurídico-constitucional da vizinhança, susceptível de fundar um recurso de
vizinhança. Cfr. WOLFF/BACHOF/STOBER, ob. cit. (trad.), pp. 661-663. 136
Cfr. JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, O recurso contencioso de anulação em matéria
urbanística: tempestividade, legitimidade e natureza da relação jurídica controvertida, in Revista do
CEDOUA, n.º 6, Ano III, 2.2000, pp. 105-106. Note-se que o Autor atende ainda à fórmula legal do
interesse directo, pessoal e legítimo dos pretéritos artigos 821.º do Código Administrativo e 46.º do
Regulamento do STA. 137
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA/R. ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. cit., p. 364.
68
para a esfera jurídica ou económica do autor. Atendendo à concretização conceitual a
que procede a jurisprudência, há interesse processual impugnatório, numa acção
particular, quando o autor retire logo da anulação uma utilidade ou vantagem dignas de
tutela jurisdicional, conexionadas com o aproveitamento do bem a que a posição
jurídica violada respeita. Acrescentam os Autores que, face à fórmula final do lesado
pelo acto nos seus direitos e interesses legalmente protegidos, a lesão de uma posição
jurídica substantiva não é condição necessária da legitimidade (ou do interesse em agir,
dependendo da perspectiva), bastando-se esta com a invocação do tal interesse pessoal e
directo no provimento do pedido invalidatório, o que engloba até os chamados
“interesses ocasionais indiferenciados” (como a vista que disfruto da minha janela ou a
vantagem de estacionar na rua em frente da porta de minha casa).138
-139
Aplaudimos, assim, o referido Acordão do STA de 24/09/2003, como manifesto
da consideração da informação prévia como acto administrativo autónomo
(relativamente a qualquer acto permissivo que, eventualmente, lhe suceda), e,
consentaneamente, da admissão da legitimidade do vizinho urbanístico para a sua
impugnação, directa e pessoalmente interessado na invalidação do acto reputado de
ilegal.140
138
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA/R. ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. cit., pp. 364-365. 139
Ressalvados do âmbito desta reacção de terceiros, contra o acto administrativo de gestão
urbanística praticado pela Administração, ficam os direitos de natureza privada de terceiros, decorrentes
das normas de construção de natureza civilística (noção de vizinho civil em questão), considerando a
submissão exclusiva das licenças de construção – e, assim, dos demais actos de gestão urbanística – às
regras de direito público, e a concessão de tais actos sob reserva de direitos (privados) de terceiros. Sobre
esta questão, veja-se FERNANDA PAULA OLIVEIRA, As licenças de construção e os direitos de
natureza privada de terceiros, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Rogério Soares, Stvdia
Ivridica, 61, Ad Honorem – 1, BFD, Coimbra Editora, 2001, pp. 991-1048. 140
Resta, por fim, reconhecer, igualmente, a legitimidade de intervenção no procedimento de
informação prévia por parte dos vizinhos urbanísticos, nos termos do n.º 1 do artigo 53.º do CPA, face à
verificação de um interesse pessoal, directo e legítimo para tal participação.
69
4 – CONFRONTO DA INFORMAÇÃO PRÉVIA COM OS DIVERSOS ACTOS
DE GESTÃO URBANÍSTICA – OS DIFERENTES ACTOS E DISTINTOS
EFEITOS PRODUZIDOS
4.1 - LICENCIAMENTO DE OPERAÇÕES LOTEAMENTO (E OBRAS DE URBANIZAÇÃO)
E DE OBRAS DE EDIFICAÇÃO
Percorrendo os diversos actos de gestão urbanística previstos no RJUE, com
exclusão dos actos prévios (aprovação do projecto de arquitectura, que apreciamos
infra) e parciais (licença parcial, acerca da qual nos pronunciámos já), começamos por
aquele que se assume como acto de controlo prévio da realização de operações
urbanísticas por excelência, no ordenamento urbanístico português – o acto de
licenciamento. Nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do actual RJUE, “a realização de
operações urbanísticas depende de prévia licença, nos termos e com as excepções
constantes da presente secção”. O licenciamento das operações urbanísticas
(amplamente consideradas nos termos da alínea j) do artigo 2.º do RJUE) afirma-se,
assim, como procedimento-regra, e, por outro lado, como procedimento supletivo
(atente-se na alínea g) do n.º 2 do artigo 4.º), da realização de operações urbanísticas.
Destacam-se, entre as operações sujeitas a este procedimento, que o RJUE regula nos
seus artigos 18.º a 27.º, entre outras, as operações de loteamento (n.º 2, alínea a)), as
obras de urbanização (alínea b)), e as obras de edificação (designadamente, alíneas c) e
d)).
No que à natureza jurídica da licença diz respeito, relacionada com a concepção
do ius aedificandi como componente essencial ou não do direito de propriedade dos
solos, a doutrina oscila entre a sua consideração como autorização (meramente
permissiva) ou verdadeira licença (autorização constitutiva de direitos)141
. ALVES
CORREIA, referindo-se especificamente à licença de obras particulares (“licença de
construção”) define-a como autorização, por meio da qual a Administração realiza um
controlo prévio da actividade dos administrados (…) com vista a verificar se ela
[operação urbanística que se pretende realizar] se ajusta ou não às exigências do
interesse público urbanístico, tal como ele se encontra plasmado no ordenamento
jurídico vigente, cometendo-lhe, assim, o Autor, a dupla função de controlo não só das
141
Veja-se, quanto a esta questão, a perspectiva ―actualizada‖ de FERNANDA PAULA
OLIVEIRA, O Novo Regime…, cit., p. 36.
70
normas respeitantes ao direito da construção, mas igualmente de controlo do respeito
pelas normas disciplinadoras da ocupação, uso e transformação do solo, especialmente
as decorrentes de planos urbanísticos.142
E atribui-lhe, ainda, as seguintes características
fundamentais: carácter geral da sua aplicação territorial e material, carácter real,
submissão exclusiva a regras de direito do urbanismo, natureza federadora de todas as
pronúncias exigidas por lei para projecto, sujeição a um regime estrito de
revogabilidade (como acto constitutivo de direitos), carácter vinculado (princípio da
taxatividade dos motivos de indeferimento), sujeição à regra do deferimento tácito, e
ilicitude da execução das operações urbanísticas sem alvará de licenciamento (título
cuja emissão é condição de eficácia da licença – veja-se o n.º 1 do artigo 74.º do RJUE)
ou em desacordo com o projecto aprovado.143
Posto isto, forçosa é a conclusão de que o
direito decorrente do acto de licenciamento de obras de edificação, para o benefiário, é o
direito de edificar, nos termos permitidos pela licença144
Quanto ao licenciamento das operações de loteamento (e obras de urbanização
geralmente associadas), embora comungue das descritas características, a apreciação
dos direitos dele decorrentes não fica completa sem uma referência, ainda que breve, às
especificidades de tal tipo de operações urbanísticas. Assim, o RJUE define,
inovatoriamente, na alínea i) do seu artigo 2.º, as operações de loteamento como acções
que tenham por objecto ou por efeito a constituição de um ou mais lotes destinados,
imediata ou subsequentemente, à edificação urbana e que resulte da divisão de um ou
vários prédios ou do seu reparcelamento. Como principais elementos constitutivos dos
loteamentos destacam-se: divisão (ou reparcelamento) predial (e voluntária), material ou
jurídica; e constituição de lotes, como novos prédios urbanos (unidades autónomas),
independentemente do seu número (pode ser um só) e área respectiva, com uma
capacidade edificativa precisa (artigo 77.º, n.º 1, alínea e)), destinados, imediata ou
sucessivamente, a construção urbana. Como consequência relevante de tais operações
surge o estabelecimento de encargos a satisfazer pelo requerente e beneficiário do
licenciamento, designadamente, a cedência à câmara municipal de parcelas de terreno
para espaços verdes e de utilização colectiva, infra-estruturas e equipamentos públicos,
e a realização de obras de urbanização, condições especificadas no alvará de
loteamento, título vinculativo da câmara municipal, do proprietário do prédio e dos
142
Cfr. F. ALVES CORREIA, Estudos de Direito do Urbanismo, Almedina, 1998, pp. 132-133. 143
Idem, ibidem, pp. 133-136. 144
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., p. 159.
71
adquirentes dos lotes (n.º 3 do artigo 77.º), que está sujeito a registo predial (alínea d) do
n.º 1 do artigo 2.º do Código do Registo Predial).145
De tal caracterização resulta que o acto de licenciamento de operações de
loteamento confere aos interessados os direitos à transformação fundiária (ao loteador)
e à concretização das operações urbanísticas e edificabilidade nele previstas (aos
adquirentes dos lotes, designadamente, que assim adquirem o direito a obter uma
decisão favorável no posterior procedimento de obras de edificação conforme com as
regras do loteamento).146
4.2 - ADMISSÃO DE COMUNICAÇÃO PRÉVIA (DE OPERAÇÕES DE LOTEAMENTO OU
OBRAS DE EDIFICAÇÃO)
A Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, tendo em vista o objectivo primordial de
simplificação procedimental, procedeu à alteração da tipologia dos actos de gestão
urbanística disciplinados no RJUE. Assim, como principal novidade, surge a
conformação da figura da comunicação prévia como alternativa procedimental ao
licenciamento, ficando sujeitas este tipo de controlo prévio as operações elencadas nas
alíneas c) a h) do n.º 1 do artigo 6.º do RJUE (n.º 3 do mesmo), assim como as
operações de loteamento em área não abrangida por plano de pormenor, ou obras de
construção, ampliação ou alteração em área não abrangida por plano de pormenor ou
operação de loteamento, instruídas com base em anterior informação prévia favorável
vigente emitida nos termos do n.º 2 do artigo 14.º - n.º 1 do artigo 17.º.
O procedimento de comunicação prévia consta dos artigos 34.º a 36.º-A do RJUE.
O pedido, ou melhor a apresentação da comunicação prévia deve ser acompanhada de
todos os elementos necessários à efectivação da operação urbanística, sendo
expressamente rejeitada nos termos do artigo 36.º ou tacitamente admitida decorridos
os prazos prescritos sem ocorrer aquela rejeição – artigo 36.º-A, n.º 1. Perante a
verificação desse acto tácito de admissão (ou de não rejeição…), o interessado pode
iniciar os trabalhos, após auto-liquidação das taxas devidas – n.º 2 do artigo 36.º-A. A
admissão da comunicação prévia é titulada pelo recibo da sua apresentação
145
Relativamente ao exposto e mais desenvolvimentos referentes aos loteamentos,
designadamente a sua evolução legal (e conceitual) e delimitação em relação a outras figuras, como a
propriedade horizontal, cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 44 e ss; e
FERNANDA PAULA OLIVEIRA/SANDRA PASSINHAS, Loteamentos e Propriedade Horizontal:
guerra e paz, in Revista do CEDOUA, n.º 9, Ano V, 1.2002, pp. 45-77. 146
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 158-159.
72
acompanhado do comprovativo informático de não rejeição, de acordo com o n.º 2 do
artigo 74.º do RJUE. Assim, o acto de admissão da comunicação prévia confere ao
beneficiário o direito a concretizar a operação urbanística (loteamento ou edificação) a
que respeita147
.
Esta actual configuração da comunicação prévia é censurada pela doutrina, que a
designa de falaciosa, por englobar, praticamente na íntegra, as operações que na
anterior versão do RJUE estavam sujeitas ao procedimento de autorização, por
corresponder a uma tramitação mais complexa (e, eventualmente, mais onerosa para o
particular, que terá que entregar, de uma só vez, os projectos relativos à arquitectura e às
especialidades…) do que a desse procedimento, e por nada ter a ver com a figura da
comunicação prévia constante daquela versão do diploma, como forma de controlo
bastante simplificada e prevista para operações com impacto urbanístico muito
reduzido.148
4.3 - AUTORIZAÇÃO DE UTILIZAÇÃO
Relativamente à figura da autorização, a Lei n.º 60/2007 revogou os artigos 28.º a
33.º do RJUE, que a disciplinavam como procedimento de controlo prévio alternativo
ao licenciamento (e simplificado relativamente a este), de acordo com a densidade de
planeamento vigente na área da operação urbanística visada e com o tipo de operação a
realizar149
, limitando-a, agora, à utilização dos edifícios e suas fracções autónomas ou
alterações de utilização dos mesmos – n.º 4 do artigo 4.º do actual RJUE.
Deste modo, tal acto limita-se a verificar a conformidade da obra concluída com o
projecto aprovado e as condições do licenciamento ou comunicação prévia, ou a
conformidade do uso previsto com as normas legais e regulamentares aplicáveis e a
idoneidade do edifício ou fracção autónoma para o fim pretendido (vejam-se os artigos
62.º a 66.º do RJUE), e confere ao interessado o direito a utilizar o edifício (ou a utilizá-
lo para determinado fim), para o qual a licença ou admissão de comunicação prévia não
147
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 158-159. 148
Assim sustenta FERNANDA PAULA OLIVEIRA, A alteração legislativa ao Regime
Jurídico da Urbanização e Edificação: uma lebre que saiu gato…?, in RDRL, n.º 0, Out./ Dez. 2007, pp.
54-58. 149
Assim, verificar-se-ia uma menor intensidade de controlo preventivo e uma maior
concretização da posição subjectiva do particular na autorização, por contraposição à licença. Cfr.
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, O novo Regime…, cit., pp. 36-37.
73
constituem título suficiente, afirmando-se, assim como o acto constitutivo de direitos
―no fim da fila‖ dos procedimentos urbanísticos.150
150
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 159-160.
74
III – DISTINÇÃO DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA DE FIGURAS
AFINS
5 – O DIREITO À INFORMAÇÃO URBANÍSTICA
5.1 - O ARTIGO 110.º DO RJUE – O DIREITO À INFORMAÇÃO
O artigo 110.º do actual RJUE prescreve, num capítulo dedicado às garantias dos
particulares, o direito dos interessados à informação decorrente da actividade
urbanística e de planeamento da Administração, consagrando-o, amplamente, em três
dimensões:
Informação sobre os instrumentos de desenvolvimento e planeamento territorial
em vigor para determinada área do município, e demais condições gerais a que
devem obedecer as operações urbanísticas consagradas no RJUE – alínea a) do
n.º 1;
Informação sobre o estado e andamento dos processos que digam directamente
respeito aos particulares requerentes, com especificação dos actos já praticados e
respectivo conteúdo, e dos que ainda devam sê-lo, e respectivos prazos
aplicáveis – alínea b) do n.º 1;
Consulta dos processos, pelos interessados, que lhes digam directamente
respeito, designadamente por via electrónica, e obtenção de certidões ou
reproduções autenticadas dos documentos que os integram, mediante o
pagamento das importâncias devidas – n.º 3.
O direito dos particulares à informação surge, aqui, como concretização, no
âmbito da actividade urbanística, do direito consagrado pela CRP e conformado, desde
logo, pelo artigo 7.º do CPA.
Assim, a CRP prescreve, no seu artigo 268.º, sob a epígrafe “direitos e garantias
dos administrados”, o direito dos cidadãos serem informados pela Administração,
sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam directamente
interessados, e o direito de conhecerem as resoluções definitivas que sobre eles sejam
tomadas – n.º 1, e, ainda, o direito dos cidadãos de acesso aos arquivos e registos
75
administrativos, com ressalva do legalmente disposto em matérias referentes à
segurança interna e externa, investigação criminal e intimidade das pessoas – n.º 2,
estabelecendo que deve a lei fixar um prazo máximo de resposta por parte da
Administração face a esses pedidos de informação – n.º 6.
Nos termos da jurisprudência do Tribunal Constitucional, está em causa no artigo
268.º a consagração de direitos fundamentais, de natureza análoga aos direitos,
liberdades e garantias, sendo-lhes aplicável o regime próprio desses151
. A doutrina
bifurca aqueles dois preceitos em direitos procedimentais no n.º 1, reconhecidos aos
directamente envolvidos em procedimentos administrativos (estreitamente relacionados
com a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes
disserem respeito – n.º 5), e um direito genérico à informação, no n.º 2, do qual serão
titulares todos os membros da comunidade, tratando-se de um direito fora do âmbito de
qualquer procedimento administrativo. Contudo, na prática, o Tribunal Constitucional
interpreta conjuntamente os dois preceitos, assumindo, designadamente, o direito à
informação procedimental do n.º 1 como um direito à transparência documental do
procedimento, inclusivo, não só do direito de informação acerca do andamento e
conhecimento da resolução final do processo, mas, igualmente, em conjugação com o
direito de acesso aos registos e arquivos administrativos do n.º 2, do direito de acesso
aos documentos que integram o próprio procedimento administrativo152
.
Por sua vez, e concretizando a previsão constitucional, o artigo 7.º do CPA
dispõe, como princípio geral da colaboração da Administração com os particulares,
que “os órgãos da Administração Pública devem actuar em estreita colaboração com
os particulares, procurando assegurar a sua adequada participação no desempenho da
função administrativa, cumprindo-lhes, designadamente”, a prestação, aos particulares,
das informações e esclarecimentos de que careçam (alínea a)), e o apoio e estímulo das
iniciativas dos particulares e recepção das suas sugestões e informações (alínea b)) – n.º
1 do citado artigo. Os deveres de colaboração da Administração para com os
particulares não se limitam, assim, ao decurso do procedimento, mas estendem-se aos
momentos anteriores ao seu desencadear, proporcionando aos particulares uma
151
Cfr. JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III,
Coimbra Editora, 2007, p. 598. 152
Idem, ibidem, pp. 598-560.
76
―participação adequada‖ no procedimento153
. Além deste artigo, o direito à informação
surge concretizado nos artigos 61.º a 64.º do CPA, assumindo a tripla faceta de direito a
informações directas, dos directamente interessados no procedimento (artigo 61.º154
),
direito à consulta do processo (artigo 62.º, n.ºs 1 e 2), e direito à certificação do
processo (n.º 3 do artigo 62.º e artigo 63.º - obtenção de certidões e reprodução ou
declaração autenticada dos documentos constantes do processo). Destaca-se, ainda, o
artigo 65.º - princípio do arquivo aberto - direito de acesso aos arquivos administrativos
reconhecido a todos os cidadãos155
-156
.
Estas considerações gerais abrangem a actividade urbanística da Administração,
apesar do direito à informação revestir neste campo algumas especificidades. No que à
actividade de planeamento urbanístico diz respeito, a doutrina destaca o relevo
acrescido que este instituto assume, indispensável para a realização do direito de
participação dos interessados na “elaboração dos instrumentos de planeamento físico
do território” (artigo 65.º, n.º 5 da CRP), só deste modo se garantindo a ampla
ponderação dos interesses públicos e privados co-envolvidos na actividade em apreço,
assumindo-se o direito de participação como corolário do princípio da imparcialidade
da Administração e reforço do princípio democrático, e o direito à informação como
sua consequência fundamental - vejam-se os artigos 5.º, alínea f) e 12.º da LBPOTU, e o
artigo 5.º do RJIGT157
.
O direito à informação assume, igualmente, importância significativa no âmbito
da actividade de gestão urbanística, como ilustrado pelo artigo 110.º do RJUE, que o
consagra, por um lado, como um típico direito à informação procedimental, e, por outro
lado, numa dimensão extra-procedimento, como direito à informação sobre normas
urbanísticas em vigor, condicionantes da realização de operações urbanísticas (alínea a)
do n.º 1)158
, vertente esta que nesta sede nos interessa, perante a necessidade de
proceder à sua distinção relativamente à informação prévia.
153
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA e outros, Código do Procedimento Administrativo
Comentado, 2.ª edição, Almedina, 2005, pp. 117-118. 154
Exigindo-se um interesse atendível ou legítimo no procedimento – requisito de ordem
substancial, e a sua comprovação documental – requisito de ordem documental, requisitos preenchidos,
em princípio, pelos particulares intervenientes, a qualquer título, no procedimento. 155
Regulado pela Lei n.º 46/2007, de 24 de Agosto, Lei de Acesso aos Documentos
Administrativos. 156
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 579-580. 157
Cfr. idem, ibidem, pp. 580-582. 158
Idem, ibidem, p. 582.
77
Antes disso, cumpre-nos destacar a preocupação de efectivação do direito à
informação que a lei denota, designadamente, estabelecendo prazos para a
Administração responder às diferentes solicitações dos particulares - 15 dias para
informação procedimental e extra-procedimental do n.º 1, e 10 dias para acesso ao
processo e passagem de certidões, e, relativamente a ambas, independentemente de
despacho – n.ºs 2 e 4 do artigo 110.º - e mediante a disposição do n.º 5 do artigo 110.º,
segundo a qual “a câmara municipal fixa, no mínimo, um dia por semana para que os
serviços municipais competentes estejam especificadamente à disposição dos cidadãos
para a apresentação de eventuais pedidos de esclarecimento ou de informação ou
reclamações”. Note-se, ainda, que o particular dispõe da via judicial da intimação para
a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, dos artigos
104.º a 108.º do CPTA, em caso de recusa da câmara no cumprimento deste seu dever
de prestação de informação159
.
5.2 - A ALÍNEA A) DO N.º 1 DO ARTIGO 110.º: O DIREITO À INFORMAÇÃO SOBRE
NORMAS URBANÍSTICAS EM VIGOR – NOÇÃO, CONTEÚDO, FUNÇÃO E IMPORTÂNCIA
Particular interesse assume a modalidade de informação extra-procedimental (ou
ante-procedimental160
) da alínea a) do n.º 1 do artigo 110.º - informação sobre os
instrumentos de desenvolvimento e planeamento territorial em vigor para determinada
área do município, e demais condições gerais a que devam obedecer as diferentes
operações urbanísticas consagradas no RJUE. Significa isto que qualquer interessado
pode requerer à câmara municipal informação acerca das regras urbanísticas vigentes
em determinada área – condições gerais e abstractas limitadoras do aproveitamento
urbanístico num determinado local do território161
. Esta informação abrangerá, assim:
Os instrumentos de planeamento e de gestão urbanística em vigor para a área
delimitada - planos municipais de ordenamento do território, alvarás de
loteamento e planos especiais de ordenamento do território (instrumentos
imediatamente vinculativos dos particulares);
A existência de servidões administrativas e restrições de utilidade pública;
159
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 584. 160
Cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., p. 222. 161
Cfr. idem, ibidem, p. 222.
78
A inserção da zona em questão em área de desenvolvimento urbano prioritário
ou área de construção prioritária;
Medidas preventivas em vigor na área em causa;
A existência de declaração de utilidade pública para efeitos de expropriação que
abranja a área em causa.
Deste modo, o instituto da informação sobre normas em vigor encerra uma
importante função de informação dos particulares eventualmente interessados na
realização de operações urbanísticas numa determinada área territorial, afirmando-o a
doutrina como condição de participação política e administrativa dos particulares, como
condição de acesso aos tribunais e a outros meios de defesa dos direitos, e, desse modo,
como condição de convergência entre o interesse público e os interesses legítimos dos
particulares, ou seja, de realização do interesse geral. Dimensões que assumem
substancial relevo face ao défice informativo no que às questões urbanísticas diz
respeito, devido à volatilidade dos instrumentos de gestão territorial, leis e regulamentos
aplicáveis, à elevada complexidade técnica das disposições urbanísticas, e às
dificuldades que a consulta de peças desenhadas ou cartografadas, por vezes em escalas
ilegíveis, suscitam162
.
5.3 - A INFORMAÇÃO URBANÍSTICA NOS DIPLOMAS ANTERIORES AO RJUE
Dos diplomas de gestão urbanística revogados pelo DL n.º 555/99 constava já
disposição semelhante à consagrada no actual artigo 110.º, n.º 1, alínea a) do
diploma.163
162
Cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., p. 221. 163
Artigo 110.º - Versão originária do DL n.º 555/99:
“Direito à informação 1 - Qualquer interessado tem o direito de ser informado pela respectiva câmara municipal:
a) Sobre os instrumentos de desenvolvimento e planeamento territorial em vigor para determinada área do
município, bem como das demais condições gerais a que devem obedecer as operações urbanísticas a que
se refere o presente diploma;
b) Sobre o estado e andamento dos processos que lhes digam directamente respeito, com especificação
dos actos já praticados e do respectivo conteúdo, e daqueles que ainda devam sê-lo, bem como dos prazos
aplicáveis a estes últimos.
2 - As informações previstas no número anterior devem ser prestadas independentemente de despacho e
no prazo de 10 dias.
3 - Os interessados têm o direito de consultar os processos que lhes digam directamente respeito, e de
obter as certidões ou reproduções autenticadas dos documentos que os integram, mediante o pagamento
das importâncias que forem devidas.
79
No que às obras particulares diz respeito, o DL n.º 445/91, de 20 de Novembro,
estatuía o direito de qualquer interessado ser informado pela câmara municipal acerca
“dos instrumentos de planeamento em vigor para determinada área do município, bem
como das demais condições gerais a que devem obedecer as obras previstas na alínea
a) do n.º 1 do artigo 1.º” (todas as obras de construção civil) – nº 1 do artigo 7.º,
dispondo a câmara, para tal, de 10 dias – n.º 3 do mesmo artigo. Contudo, no âmbito
desta prescrição, certa doutrina identificava esse pedido de informação com o pedido de
informação prévia, nos casos em que existisse plano de pormenor ou alvará de
loteamento aplicáveis à área objecto do pedido de informação, instrumentos
conformadores da realização de qualquer eventual operação urbanística e que contêm
toda a informação susceptível de ser prestada – áreas jurídico-urbanisticamente
consolidadas, afirmando-se como casos em que o pedido de informação prévia se
encontrava destituído de qualquer utilidade prática164
-165
.
4 - O acesso aos processos e a passagem de certidões deve ser requerido por escrito e é facultado
independentemente de despacho e no prazo de 10 dias a contar da data da apresentação do respectivo
requerimento.
5 - A câmara municipal fixa, no mínimo, um dia por semana para que os serviços municipais competentes
estejam especificadamente à disposição dos cidadãos para a apresentação de eventuais pedidos de
esclarecimento ou de informação ou reclamações.
6 - Os direitos referidos nos n.os 1 e 3 são extensivos a quaisquer pessoas que provem ter interesse
legítimo no conhecimento dos elementos que pretendem e ainda, para defesa de interesses difusos
definidos na lei, quaisquer cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e as associações e
fundações defensoras de tais interesses.‖
Artigo 110.º - versão de 2001, DL n.º 177/2001:
“Direito à informação 1 - Qualquer interessado tem o direito de ser informado pela respectiva câmara municipal:
a) Sobre os instrumentos de desenvolvimento e planeamento territorial em vigor para determinada área do
município, bem como das demais condições gerais a que devem obedecer as operações urbanísticas a que
se refere o presente diploma;
b) Sobre o estado e andamento dos processos que lhes digam directamente respeito, com especificação
dos actos já praticados e do respectivo conteúdo, e daqueles que ainda devam sê-lo, bem como dos prazos
aplicáveis a estes últimos.
2 - As informações previstas no número anterior devem ser prestadas independentemente de despacho e
no prazo de 15 dias.
3 - Os interessados têm o direito de consultar os processos que lhes digam directamente respeito, e de
obter as certidões ou reproduções autenticadas dos documentos que os integram, mediante o pagamento
das importâncias que forem devidas.
4 - O acesso aos processos e a passagem de certidões deve ser requerido por escrito e é facultado
independentemente de despacho e no prazo de 10 dias a contar da data da apresentação do respectivo
requerimento.
5 - A câmara municipal fixa, no mínimo, um dia por semana para que os serviços municipais competentes
estejam especificadamente à disposição dos cidadãos para a apresentação de eventuais pedidos de
esclarecimento ou de informação ou reclamações.
6 - Os direitos referidos nos n.ºs 1 e 3 são extensivos a quaisquer pessoas que provem ter interesse
legítimo no conhecimento dos elementos que pretendem e ainda, para defesa de interesses difusos
definidos na lei, quaisquer cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e as associações e
fundações defensoras de tais interesses.‖ 164
Cfr. JÚLIO PEREIRA DA CUNHA, ob. cit., pp. 26 e 32.
80
Quanto às operações de loteamento e obras de urbanização, o DL n.º 448/91, de
29 de Novembro, na sua versão originária, não consagrava, ainda, o direito de
informação na sua dimensão de informação sobre normas em vigor166
, prevendo apenas
a vertente procedimental desse direito – artigo 6.º, “direito à informação”. Esse artigo
foi, contudo, objecto de alteração pelo DL n.º 334/95, de 28 de Dezembro, que passou a
consagrar a figura nos termos em que a mesma surgia no DL n.º 445/91.167
165
DL n.º 445/91, versão originária:
―Artigo 7.°
Direito à informação 1 - Qualquer interessado tem o direito de ser informado pela respectiva câmara municipal:
a) Dos instrumentos de planeamento em vigor para determinada área do município, bem como das demais
condições gerais a que devem obedecer as obras previstas na alínea a) do n.° 1 do artigo 1.°;
b) Sobre o estado e andamento do processo de licenciamento de obras que lhe diga directamente respeito,
com especificação dos actos já praticados e daqueles que ainda devam sê-lo, bem como dos prazos
aplicáveis a estes últimos.
2 - A câmara municipal fixa, no mínimo, um dia por semana para que os serviços técnicos camarários
estejam especificamente à disposição para eventuais pedidos de esclarecimento e ou reclamações dos
cidadãos, relativamente a processos de licenciamento municipal.
3 - As informações previstas no n.° 1 devem ser prestadas no prazo de 10 dias.‖ 166
Parecia, aliás, englobar esta figura na previsão do n.º 7 - “pedido de informação”, abrangendo
este, segundo a doutrina, todos os pedidos referentes a elementos de facto ou de direito anteriores a um
processo de licenciamento. Cfr. CARLOS ALEGRE, ob. cit., p. 23. 167
DL n.º 448/91, versão originária:
―Artigo 6.°
Direito à informação Sem prejuízo do disposto na lei sobre consulta de documentos ou processos e passagem de certidões,
qualquer interessado tem o direito de ser informado, a seu pedido e no prazo de 15 dias, sobre o estado e o
andamento dos processos de licenciamento de operações de loteamento ou de obras de urbanização que
lhe digam directamente respeito, com especificação dos actos já praticados e daqueles que ainda devam
sê-lo.‖
DL n.º 448/91, versão do DL n.º 334/95:
―Artigo 6.°
Direito à informação 1 - Qualquer interessado tem direito de ser informado pela respectiva câmara municipal:
a) Dos instrumentos de planeamento em vigor para determinada área do município, bem como das demais
condições a que devem obedecer as operações de loteamento e das obras de urbanização;
b) Do estado e do andamento do processo de licenciamento de operações de loteamento ou de
urbanização que lhe diga directamente respeito, com especificação dos actos já praticados e daqueles que
ainda devem sê-lo, bem como dos prazos aplicáveis a estes últimos.
2 - A câmara municipal deve fixar, no mínimo, um dia por semana para que os serviços técnicos
camarários estejam especificamente à disposição para eventuais pedidos de esclarecimentos e ou
reclamações dos cidadãos, relativamente a processos de licenciamento de operações de loteamento e de
obras de urbanização.
3 - As informações previstas no n.º 1 devem ser prestadas no prazo de 10 dias.‖
DL n.º 448/91, versão da Lei n.º 26/96:
―Artigo 6.°
Direito à informação 1 - Qualquer interessado tem direito de ser informado pela respectiva câmara municipal:
a) Dos instrumentos de planeamento em vigor para determinada área do município, bem como das demais
condições a que devem obedecer as operações de loteamento e das obras de urbanização;
b) Do estado e do andamento do processo de licenciamento de operações de loteamento ou de
urbanização que lhe diga directamente respeito, com especificação dos actos já praticados e daqueles que
ainda devem sê-lo, bem como dos prazos aplicáveis a estes últimos.
81
5.4 - A INFORMAÇÃO URBANÍSTICA COMO ACTO MERAMENTE INFORMATIVO/
DECLARATIVO; SEUS EFEITOS - RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO POR
INFORMAÇÕES ERRÓNEAS; A QUESTÃO DA ALTERAÇÃO DAS NORMAS
URBANÍSTICAS
Como acto decorrente do dever geral da Administração de prestar informações, a
informação sobre normas em vigor não se traduz numa decisão, não revestindo as
características próprias de um verdadeiro acto administrativo, antes se constitui como
acto meramente informativo, declarativo ou opinativo. Assim, face ao seu carácter
genérico (como resposta a um requerimento genérico), esta informação não é
constitutiva de qualquer direito ou expectativa legítima para o particular requerente,
nem vinculativa para a câmara municipal que a presta, relativamente a qualquer
eventual pedido concreto posterior do particular168
.
Coloca-se, contudo, a questão da responsabilidade da Administração pelas
informações prestadas, nos termos do n.º 2 do artigo 7.º do CPA, que dispõe que “a
Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos
particulares, ainda que não obrigatórias”. Abrangida por esta prescrição encontra-se,
assim, a informação urbanística sobre as normas em vigor, admitindo que seja a mesma
prestada por escrito169
, e constituindo informação obrigatória, face à sua solicitação,
nos termos da lei, requisito este, no entanto, dispensável para efeitos de reconhecimento
da responsabilidade da Administração pelas informações.
Segundo a doutrina, está aqui em causa o princípio de que a Administração
Pública é responsável, ou seja, responde pelas informações prestadas aos particulares,
no âmbito do seu dever geral de informação, independentemente de se tratarem de
informações prestadas no cumprimento de uma obrigação legal ou informações livres,
informações com relevância procedimental ou de outra natureza, ou informações que
2 - A câmara municipal deve fixar, no mínimo, um dia por semana para que os serviços técnicos
camarários estejam especificamente à disposição para eventuais pedidos de esclarecimentos e ou
reclamações dos cidadãos, relativamente a processos de licenciamento de operações de loteamento e de
obras de urbanização.
3 - As informações previstas no n.º 1 devem ser prestadas no prazo de 10 dias.‖ 168
Veja-se, exemplificativamente, ao abrigo do DL n.º 445/91, ANTÓNIO PEREIRA DA
COSTA, ob. cit., p. 67. 169
Porque também dessa forma deve ser requerida; neste sentido, expressamente, ANTÓNIO
PEREIRA DA COSTA, ob. cit., p. 68. A informação, para efeitos de responsabilidade do n.º 2 do artigo
7.º, tem que ser prestada por escrito e oficialmente, cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA e outros,
Código…, ob. cit., p. 121.
82
respeitem ou não às condições de exercício de uma competência administrativa170
.
Neste caso, trata-se de uma informação legalmente obrigatória – direito legal de
informação, sem relevância procedimental, que respeita a condições de exercício da
competência de gestão urbanística da câmara municipal. Além de admitirem a
responsabilidade da Administração por informações no sentido lato referido, os mesmos
Autores propõem uma interpretação extensiva da alínea c) do n.º 1 do artigo 124.º do
CPA, pugnando pela obrigatoriedade da fundamentação dos actos administrativos
posteriores à informação e com ela desconformes, mesmo que aquela seja anterior à
abertura do procedimento171
.
Quanto ao conteúdo desta responsabilidade, afirma a doutrina significar que a
Administração responde civilmente pelas informações erróneas prestadas aos
particulares, ficando obrigada a ressarcir os danos que daí resultem172
, recusando-se,
portanto, a interpretação da responsabilidade como absolutização do eventual efeito
vinculativo da informação, como se expõe de seguida173
.
Situações especiais de informações prestadas pela Administração são as das
informações que constituem verdadeiros actos administrativos conformadores de
posições jurídicas e das doutrinalmente apelidadas de informações qualificadas. Quanto
às primeiras, são actos constitutivos de direitos quando favoráveis aos particulares,
vinculando a Administração ao seu conteúdo, à prática de actos administrativos com
elas conformes, das quais constituem exemplos paradigmáticos, segundo os mesmos
Autores, as informações prévias de viabilidade existentes no direito do urbanismo. São
casos de informações objecto de procedimentos específicos, colocando-se a questão da
responsabilidade da Administração para efeitos do n.º 2 do artigo 7.º do CPA, por
170
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 118. 171
Cfr. idem, ibidem, p. 118. No mesmo sentido veja-se FERNANDA PAULA OLIVEIRA, que
fala num dever de fundamentação acrescido nos casos de desconformidade entre a decisão de
licenciamento de uma operação urbanística com anterior informação prévia favorável incidente sobre a
mesma, quando o pedido de licenciamento seja feito depois do prazo de caducidade da informação prévia,
ficando esta a valer como informação genérica. Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação…, cit.,
pp. 111-112. 172
Sendo necessária a verificação dos pressupostos gerais da responsabildade civil, regra geral,
salvaguardando a eventual dispensa da culpa quanto às informações não vinculadas, sem prejuízo da sua
consideração como sujeitas a reservas, implícita ou explicitamente – reservas de melhor conhecimento
superveniente da matéria e de eventual emergência posterior de outras posições ou interesses no
procedimento, que afastam a responsabilidade em caso de desconformidade da decisão com a anterior
informação, não errónea contudo; afastada, desde logo, está a responsabilidade quando a
desconformidade se deva a alteração das circunstâncias de facto ou de direito que fundaram a informação.
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 119-120. 173
Cfr. idem, ibidem, p. 121.
83
informação errónea, quando se verificar a sua revogação por ilegalidade. As
informações qualificadas correspondem, em rigor, a esses mesmos casos de previsão
legal especial, e implicam a exteriorização de um juízo crítico, estimativo ou
interpretativo da Administração, pressupondo um processo decisório. Como tal,
desempenharão as funções concretizadora e estabilizadora dos actos administrativos,
quando obrigatórias, pelo que produzem efeito vinculativo para o órgão emissor.
Concretizando estas ideias relativamente à informação prévia, cumpre destacar
que, perante uma informação (originalmente) ilegal dessa natureza, deverá prevalecer a
sujeição da Administração ao princípio da legalidade em detrimento da vinculação à
precedente informação, verificando-se, eventualmente, a revogação tácita de um acto
administrativo informativo constitutivo de direitos, mas que originará a
responsabilidade da autoridade administrativa pela informação errónea (efeito
vinculativo da informação limitado à informação conforme à lei)174
.
5.5 - LEGITIMIDADE PARA REQUERER A INFORMAÇÃO
No que à legitimidade para requerer a informação sobre normas em vigor diz
respeito, refere-se o n.º 1 do artigo 110.º do RJUE a “qualquer interessado”, e dispõe o
n.º 6 do mesmo artigo serem os direitos de informação aí prescritos extensivos a
“quaisquer pessoas que provem ter interesse legítimo no conhecimento dos elementos
que pretendem e ainda, para defesa de interesses difusos definidos na lei, quaisquer
cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e as associações e fundações
defensoras de tais interesses”. Consagra-se, assim, expressamente, legitimidade aos
titulares de direitos de participação e da acção popular, de acordo com o n.º 3 do artigo
52.º da CRP e da Lei n.º 83/85 de 31 de Agosto – participação procedimental e acção
popular175
.
Face à extensão do conceito de interessado assim operada, para requerer
informação sobre normas em vigor bastará invocar a condição de proximidade, de
vizinho urbanístico - interesse legítimo no conhecimento dos elementos, ou, visando-se
a defesa de interesses difusos, fazer prova da qualidade de eleitor ou do objecto da
associação representada como defensora de tais interesses, mas só recebendo
acolhimento, contudo, os interesses legítimos, não contrários à boa fé, afastando-se
174
Cfr. M. ESTEVES DE OLIVEIRA e outros, Código…, ob. cit., pp. 120-121. 175
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 582.
84
aqueles que sejam comprovadamente abusivos (e meramente dilatórios) e,
consequentemente, contrários à razão de ser do direito à informação como direito
acessório ou instrumental para defesa de outros direitos e interesses legalmente
protegidos176
.
5.6 - DIFERENÇAS ENTRE INFORMAÇÃO URBANÍSTICA E INFORMAÇÃO PRÉVIA
Apreciado o direito à informação sobre normas urbanísticas em vigor em
determinada área territorial, quanto à sua natureza e características essenciais, fica
facilitada a tarefa de distinção da informação prévia relativamente a esta figura.
Vejamos:
Quanto ao pedido formulado pelo particular: enquanto que o pedido de
informação sobre normas urbanísticas em vigor apresenta um carácter abstracto
e genérico, na informação prévia o requerente tem já em vista uma concreta
pretensão urbanística, visando uma resposta dirigida a essa específica
pretensão177
;
Quanto à legitimidade para requerer a informação: a legitimidade para requerer
a informação prévia é mais restrita (ou, simplesmente, não coincidente, como
apreciaremos infra) do que a exigida para a informação sobre as normas em
vigor, decorrente do dever geral de informação e do princípio da colaboração a
que a Administração se encontra sujeita;
Quanto à natureza da pronúncia da Administração: a informação prévia
constitui-se como verdadeiro acto administrativo, como decisão, sendo-lhe
inerentes as funções próprias desses actos, não obstante a sua natureza
verificativa e não permissiva178
– informação qualificada e constitutiva de
direitos, - enquanto que a informação urbanística sobre normas em vigor se
afirma como acto meramente informativo ou declarativo, isento de qualquer
juízo administrativo crítico;
176
Cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., p. 222. 177
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, As garantias dos particulares no RJUE, in O novo
RJUE, J. M. Sérvulo Correia e outros, Lisboa, Lex, 2002, pp. 121-122; Que direitos…, cit., pp. 150-151;
Anotação…, cit., p. 106; ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., p. 825; JOÃO PEREIRA
REIS e outros, ob. cit., pp. 301-302. 178
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., p. 151.
85
Quanto aos efeitos da informação: a informação decorrente do direito à
informação do artigo 110.º não é constitutiva de direitos nem de expectativas
jurídicas para o particular, e não vincula a Administração, sem prejuízo da sua
eventual responsabilidade civil quando preste informações erróneas causadoras
de prejuízos ao particular; já a informação prévia favorável é um acto
constitutivo de direitos para o seu beneficiário, e é vinculativa para a câmara
municipal relativamente a uma eventual decisão ulterior acerca do licenciamento
da operação urbanística visada.
Sem prejuízo de comungarem de uma função informativa e de uma dimensão
garantística dos particulares, as figuras da informação prévia e da informação sobre
normas urbanísticas em vigor distinguem-se quanto aos objectivos que cumprem e
efeitos que produzem, não podendo ser confundidas179
-180
.
5.7 – INFORMAÇÃO PRÉVIA E INFORMAÇÃO SOBRE NORMAS
URBANÍSTICAS NO DIREITO COMPARADO: AS FIGURAS DO CERTIFICAT
D´URBANISME FRANCÊS E DO CERTIFICATO URBANISTICO ITALIANO E O DERECHO A
OBTENER INFORMACIÓN ESCRITA DO DIREITO ESPANHOL
Afigura-se-nos propositado, neste momento, proceder a uma resenha, ainda que
breve, de algumas figuras de direito comparado que, em maior ou menor medida, se
identificam com a informação prévia do nosso ordenamento urbanístico. Reputamos ser
tal apreciação adequada ao encerramento deste ponto da delimitação entre a informação
prévia e a informação sobre normas urbanísticas em vigor, uma vez que as figuras a que
atenderemos encerram características de ambas, ilustrando a imbricação tendencial que
entre os dois tipos de informações se verifica.
179
Isto não obstante as reservas manifestadas pela doutrina quanto à sua aproximação, face à
configuração legal actual da informação prévia, designadamente a legitimidade alargada para a requerer e
a possibilidade da sua renovação, questões que veremos adiante. Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA,
Que direitos…, cit., pp. 153-154, e FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 233. 180
Inconfundibilidade reconhecida pela jurisprudência administrativa; veja-se, a título de
exemplo, o Acordão do TCANorte de 16/12/2004, que procede à distinção das figuras (P. n.º
00493/04.7BECBR), in www.dgsi.pt.
86
5.7.1 - O CERTIFICAT D´URBANISME FRANCÊS
No direito do urbanismo francês existe a figura do certificat d´urbanisme, que
teve origem na prática administrativa das “notes de renseignements” (“notas
informativas”), pedidas pelos notários previamente às transacções imobiliárias,
susceptíveis de gerar a responsabilidade da administração, quando inexactas ou
incompletas, segundo jurisprudência do Conselho de Estado. A sua consagração legal
verificou-se com a Lei n.º 71-581, de 16 de Julho de 1971, que instituiu duas
modalidades de ―certificados‖ (como actualmente existem), um deles como verdadeiro
acto administrativo (decisão), susceptível, inclusivamene, de recurso contencioso por
desvio de poder (jurisprudência do Conselho de Estado), constitutivo de um direito e de
uma garantia contra alterações normativas durante determinado período de tempo. Tal
garantia de estabilidade foi, contudo, estendida pela doutrina e jurisprudência ao outro
tipo de certificado (mais próximo das notes de renseignements), cumprindo ambas as
figuras as funções de conhecimento das regras urbanísticas e de segurança jurídica dos
construtores.
No entanto, apesar das disposições urbanísticas subjacentes ao certificado
urbanístico não puderem ser postas em causa, em posterior pedido de autorização,
BOUYSSON e HUGOT constatavam o carácter ilusório de tal garantia, na prática, face
ao surgimento de novas servidões administrativas que poderiam obstaculizar a tal efeito,
diferentemente das regras urbanísticas ―em sentido estrito‖ aprovadas ou alteradas após
a emissão do certificado (como os POS – planes d´occupation des sols). Assim, os
mesmos Autores qualificavam o certificado urbanístico como “menos que uma
autorização, mais que uma nota informativa (“note de renseignements”)”, sendo a
figura objecto de críticas por parte da doutrina, face às dúvidas que se colocavam
quanto ao seu âmbito de apreciação, designadamente em relação aos elementos de
conformação própria da entidade emissora (conformação a ter lugar, eventualmente,
apenas aquando da posterior autorização de construção), assim como face à
impossibilidade de pronúncias definitivas devidas por entidades externas,
condicionantes da realização da operação urbanística. Isto apesar do reconhecimento do
seu papel como factor de segurança jurídica no domínio da urbanização e construção.181
181
Cfr. HENRI JACQUOT, Sécurité Juridique des Constructeurs et Certificat d´Urbanisme, in
Droit et Ville, IEJUC, n.º 31, Ville de Toulouse, USST, 1991, pp. 43-56; e F. BOUYSSON/ J. HUGOT,
Code de l´Urbanisme, commenté et annoté, Paris, Litec, 1996, pp. 335-338.
87
O regime do certificat d´urbanisme foi alterado em 2005182
-183
, verificando-se,
como anteriormente, a co-existência de dois tipos de certificados no direito do
urbanismo francês:
a. O certificat d´urbanisme ordinaire ou certificat de type A - “certificado
urbanístico comum ou genérico” – artigo L. 410-1 a do Code de l´urbanisme;
b. O certificat d´urbanisme détaillé ou certificat de type B – “certificado
urbanístico detalhado ou qualificado” – artigo L. 410-1 b do Code de
l´urbanisme.184
O certificat d´urbanisme ordinaire traduz-se na informação acerca das normas
urbanísticas aplicáveis a determinada parcela de terreno, devendo enunciar todo o tipo
de normas urbanísticas (designadamente, planos urbanísticos e alvarás de loteamento)
em vigor nessa área, susceptíveis de condicionar qualquer operação urbanística a ter aí
lugar, assim como as limitações administrativas ao direito de propriedade aplicáveis. A
insuficiência de informação pode conduzir à responsabilidade da administração185
. Este
182
Ordonnance n.º 2005-1527, de 8 de Dezembro de 2005, relativa à licença de construção e
autorizações urbanísticas, versão consolidada de 1 de Outubro de 2007, e décret d´application de 5 de
Janeiro de 2007 – décrete n.º 2007-18, que alteraram o Code de l´Urbanisme, reformando a disciplina dos
actos de gestão urbanística no direito do urbanismo francês, e assumindo a ideia de simplificação
procedimental como um dos seus principais objectivos. 183
A caracterização da figura a que procedemos, na sua actual configuração, baseia-se na mais
recente doutrina sobre o tema; cfr. JÉRÔME TREMEAU, Le certificat d´urbanisme, un an après - La
reforme des autorisations d´urbanisme un an après: premier bilan, in Droit de l´Aménagement, de
l´Urbanisme, de l´Habitat, GRIDAUH, Paris, Editions Le Moniteur, 2009, pp. 35-61. 184
Artigo L. 410-1 do Code de l´Urbanisme:
“Le certificat d'urbanisme, en fonction de la demande présentée :
a) Indique les dispositions d'urbanisme, les limitations administratives au droit de propriété et la liste des
taxes et participations d'urbanisme applicables à un terrain ;
b) Indique en outre, lorsque la demande a précisé la nature de l'opération envisagée ainsi que la
localisation approximative et la destination des bâtiments projetés, si le terrain peut être utilisé pour la
réalisation de cette opération ainsi que l'état des équipements publics existants ou prévus.
Lorsqu'une demande d'autorisation ou une déclaration préalable est déposée dans le délai de dix-huit
mois à compter de la délivrance d'un certificat d'urbanisme, les dispositions d'urbanisme, le régime des
taxes et participations d'urbanisme ainsi que les limitations administratives au droit de propriété tels
qu'ils existaient à la date du certificat ne peuvent être remis en cause à l'exception des dispositions qui
ont pour objet la préservation de la sécurité ou de la salubrité publique.
Lorsque le projet est soumis à avis ou accord d'un service de l'Etat, les certificats d'urbanisme le
mentionnent expressément. Il en est de même lorsqu'un sursis à statuer serait opposable à une
déclaration préalable ou à une demande de permis.
Le certificat d'urbanisme est délivré dans les formes, conditions et délais déterminés par décret en
Conseil d'Etat par l'autorité compétente mentionnée au a et au b de l'article L. 422-1 du présent code.” 185
Exemplifica o Autor citado com a falta de indicação, pelo certificado urbanístico, da inserção
do terreno em área abrangida por lei reguladora da gestão urbanística das áreas litorais, da sua inserção
em zona classificada, ou de que se encontra abrangido por disposições que estabeleçam encargos de um
88
tipo de certificado urbanístico menciona, também, a lista das taxas urbanísticas
aplicáveis aos diversos tipos de operações urbanísticas. Deve, ainda, mencionar a
possibilidade, quando haja projectos de alteração normativa em curso, de suspensão dos
procedimentos urbanísticos de controlo prévio (“surcis à statuer”), assim como a
necessidade de pronúncia, relativamente a determinada operação, de entidade pública
externa à entidade competente para emitir a informação, entre outras eventuais
informações complementares. A doutrina critica, no entanto, o silêncio do certificado de
tipo A quanto ao estado das infra-estruturas públicas existentes na área ou previstas,
menção considerada particularmente importante na definição da edificabilidade de um
terreno, uma vez que a administração pode recusar uma licença de construção ou
urbanização atendendo à consequente necessidade de alargamento das redes públicas de
água, electricidade ou saneamento. JÉRÔME TREMEAU fala mesmo de uma
edificabilidade funcional, relacionada com a existência dessas infra-estruturas, além da
edificabilidade dita normativa186
. Tal supressão de conteúdo, face ao anterior regime
dos certificados urbanísticos, encontra justificação no objectivo de agilização
procedimental da reforma, designadamente perante a necessidade de consulta de
entidades externas gestoras das infra-estruturas, para se poder incluir tal menção187
.
O certificat d´urbanisme detaillé assume-se como um ―aprofundamento‖
relativamente à anterior figura, cumprindo, além da função de informação sobre as
normas urbanísticas em vigor, comum a ambos os tipos de certificado, um objectivo de
pronúncia acerca da viabilidade (“faisabilité”) de uma operação urbanística concreta. O
pedido de certificado qualificado deve referir a natureza da operação pretendida, a sua
―localização aproximada‖ (“localisation approximative”) e a utilização visada para o
edifício. A administração pronuncia-se sobre o projecto emitindo um certificado
positivo ou negativo, que realiza, em ambos os sentidos, a descrita função genérica de
loteamento, o que constitui um vício. Cfr. JÉRÔME TREMEAU, Le certificat…, ob. cit., p. 39, citando a
jurisprudência do Conselho de Estado. 186
O próprio Conselho de Estado considerou, na vigência de anterior regime urbanístico, que,
em caso de insuficiência de infra-estruturas públicas, o certificado podia declarar um terreno como não
urbanizável, mesmo que nenhuma regra urbanística impusesse uma recusa total de construção. Cfr. idem,
ibidem, p. 41. 187
Além de que essa informação pressuporia o conhecimento da natureza do projecto visado, de
cujas características (dimensão, utilização…) dependem tais necessidades. Argumento este que, porém, o
Autor recusa, por entender que tal menção se dirige a uma situação de facto objectiva, relativa a um
momento determinado e que não é função de um projecto concreto, rematando que a supressão de tal
informação essencial pode conduzir à inutilidade do recurso à figura do certificado urbanístico. Cfr.
JÉRÔME TREMEAU, Le certificat…, ob. cit., p. 42.
89
informação, uma vez que também o certificado negativo indica as regras aplicáveis, em
abstracto, ao terreno em questão.
Como grande novidade da reforma surge a previsão de um certificado urbanístico
tácito, sancionador da inércia da administação, que se forma decorrido o prazo de
pronúncia de um ou dois meses, consoante se trate de pedido de certificado genérico ou
detalhado. Embora não conceda qualquer informação sobre as normas aplicáveis ao
terreno ou pronúncia acerca de uma concreta operação urbanística, o certificado tácito
conduz à estabilização (própria da figura do certificado urbanístico) das normas
aplicáveis ao tempo do termo do prazo para a resposta da administração, tendo como
efeito a formação de direitos adquiridos. Sustenta TREMEAU, no entanto, que esta
previsão prejudica a função essencial de informação, típica da figura do certificado
urbanístico, porquanto, embora determine a aplicação, a um eventual pedido posterior
de autorização da operação urbanística, das regras em vigor à data da formação do
certificado tácito, fica prejudicado o visado conhecimento dessas normas pelo particular
requerente. Pode, assim, contrariamente ao desejado, potencializar-se a inércia
administrativa; contudo, o Conselho de Estado admite a possibilidade de um certificado
expresso intempestivo, emitido após a ultrapassagem dos prazos legalmente prescritos,
não devendo esquecer-se, ainda, a possibilidade de recorrer à justiça administrativa para
impôr a prática do acto, se estiver em causa atentado grave e manifestamente ilegal à
liberdade de disposição de bens, face ao importante papel desempenhado pelos
certificados urbanísticos na venda de terrenos.
Especial referência é devida à denominada função de conservação dos
certificados urbanísticos, presente em ambos os tipos de certificados, que se traduz na
aplicação das normas conformadoras do certificado emitido, aquando de posterior
pedido de autorização coincidente com aquele acto. Os direitos adquiridos através dos
certificados urbanísticos são temporalmente limitados, face ao imperativo da rápida
aplicação de novas regras urbanísticas, pelo que a lei prescreve um prazo de 18 meses
para o particular beneficiar de um certificado urbanístico. Este prazo não é suspenso
nem interrompido por um eventual recurso contencioso contra o certificado, e pode ser
prorrogado uma ou várias vezes, com o limite de prorrogação de um ano, e desde que
se mantenham as disposições urbanísticas que o conformaram. A garantia de
manutenção do direito aplicável engloba quer as regras urbanísticas em vigor aquando
90
da emissão do acto, quer o regime das taxas urbanísticas, quer, ainda, as limitações
administrativas ao direito de propriedade vigentes àquele tempo.
Como limites a este princípio dos direitos adquiridos pela pronúncia
administrativa surgem:
As normas que visam a preservação da segurança ou da salubridade pública;
A consideração, aquando da apreciação do pedido de autorização, de outras
normas eventualmente não mencionadas no acto, uma vez que está em causa o
direito do particular de ver o pedido de autorização relativo à pretensão visada
apreciado à luz da regulamentação em vigor aquando da emissão do certificado
urbanístico, e não à luz das disposições especificamente mencionadas no
certificado – limite ao princípio dos direitos adquiridos perspectivado quanto ao
conteúdo expresso do acto; e
A ilegalidade do certificado urbanístico, que impede a formação de direitos
adquiridos, podendo tal acto ser revogado pela administração a todo o tempo.
O certificat d´urbanisme detaillé confere, ainda, garantias suplementares ao
particular beneficiário, tratando-se não apenas de um acto declarativo, como o é o
certificat d´urbanisme ordinaire (sem prejuízo, igualmente, do efeito estabilizador
deste), mas uma verdadeira decisão sobre os elementos principais de um projecto
concreto. Note-se que, tratando-se dessa modalidade de certificado, a pronúncia da
administração engloba aspectos legalmente submetidos ao seu poder discricionário, cuja
apreciação seria, a priori, cometida à fase da concessão da licença de construção.
Por fim, quanto à legitimidade para requerer um certificado urbanístico, não é
exigido qualquer título específico para tal, diversamente do que se passa quanto ao
pedido de autorização de construção, pelo que qualquer pessoa poderá requerê-lo, sem
necessidade de alegar qualquer ligação com o terreno sobre que recai o pedido. Além
disso, e contrariamente ao estabelecido no anterior regime, o proprietário não é
notificado do acto requerido por terceiro, apenas o será o próprio requerente (que não
terá, sequer, que identificar o proprietário, no pedido), facto que constitui outra medida
de simplificação procedimental, mas que, segundo o Autor que vimos citando, terá
consequências a nível do prazo para um eventual recurso contencioso proposto pelo
proprietário, contra o certificado urbanístico – é-lhe reconhecido direito de recurso
91
contencioso a todo o tempo, tal como a outros eventuais terceiros, face à não
publicitação dos certificados urbanísticos. Por fim, o beneficiário dos direitos
adquiridos através do certificado pode, igualmente, divergir do seu titular (havendo
transmissão de direitos sobre o terreno em causa), face ao carácter real do acto e
legitimidade alargada para o requerer.188
5.7.2 – O CERTIFICATO URBANISTICO ITALIANO
No direito italiano, a doutrina dá conta da existência de um “certificato
urbanistico”, como instrumento de agilização procedimental da autorização de
construção e garantia na edificação, para os particulares, sendo também designado de
“certificato di destinazione urbanistica” ou “certificato de uso”.
Assim, o particular com legitimidade para pedir a autorização da construção pode
solicitar ao Sindaco um certificado no qual se indique a qualificação urbanística de
determinada área, consolidando-se, desse modo, as prescrições urbanísticas relativas à
mesma. O certificado é emitido no prazo de 60 dias desde a data da apresentação do
requerimento, tem validade de um ano a contar da data da emissão, e garante a
manutenção da situação urbanística da área em causa desde que nesse período não se
verifique uma alteração das normas urbanísticas.189
5.7.3 – O DERECHO A OBTENER INFORMACIÓN ESCRITA DO DIREITO ESPANHOL
No direito espanhol, o artigo 165 do Reglamento de Planeamiento Urbanístico
(Decreto 248/2004, de 14 de Setembro) prescreve a possibilidade dos particulares
solicitarem, por escrito, informação do regime urbanístico aplicável a um prédio,
propriedade ou área de terreno, apresentando o requerimento no respectivo Registro del
Ayuntamiento. Tal requerimento deve especificar a localização e circunstâncias de facto
do prédio em questão. A entidade emitente da informação (Ayuntamiento) deve atender
a todos os dados fornecidos pelo administrado no pedido, e a outros que permitam
188
Cfr. JÉRÔME TREMEAU, Le certificat…, ob. cit., p. 36-37 e 57-58. 189
Cfr. PIETRO VIRGA, Diritto Amninistrativo, I Principi, 1, terza edizione riveduto e
aggiornata, Milano, Giuffrè editore, 1993, pp. 551-552.
92
individualizar o prédio, assinalando classe e categoria do solo, tal como os usos e
potencialidade edificatória atribuídos ao mesmo pelos instrumentos de planeamento.
Note-se, também, que o artigo 164 do citado RPU consagra, em termos amplos, o
direito de acesso aos documentos e a consulta de instrumentos urbanísticos, conferindo
aos cidadãos o direito a consultar todos os documentos e peças que integram os planos,
normas, programas e projectos urbanísticos. Para tal, os Ayuntamientos devem dispôr de
um exemplar completo de cada instrumento de planeamento destinada exclusivamente a
esse fim. Reconhece-se, assim, e face ao mandato constitucional nesse sentido, o direito
de acesso aos registos públicos e documentos que fazem parte dos processos
administrativos, independentemente da forma em que são expressos e do tipo de suporte
material que os contenha, desde que tais arquivos correspondam a procedimentos
terminados.190
190
Cfr. RICARDO ESTÉVEZ GOYTRE, Manual de Derecho Urbanístico, cuarta edición,
Granada, Comares/ Urbanismo, 2005, pp. 237-238.
93
6 – O ACTO DE APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA
6.1 - A APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA: NATUREZA E CONTEÚDO DO
ACTO; O PROCEDIMENTO DE LICENCIAMENTO DE OBRAS COMO PROCEDIMENTO
FASEADO
A questão da natureza da aprovação do projecto de arquitectura tem sido objecto
de ampla discussão doutrinal, face às considerações jurisprudenciais que a seu
propósito, e desde a sua consagração legal, têm sido tecidas.
Nos termos do artigo 20.º, n.º 1 do RJUE, face a pedido de licenciamento relativo
a obras de edificação191
, a câmara municipal procede à apreciação do projecto de
arquitectura apresentado pelo requerente, apreciação que incide sobre “a sua
conformidade com planos municipais de ordenamento do território, planos especiais de
ordenamento do território, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano
prioritário, área de construção prioritária, servidões administrativas, restrições de
utilidade pública e quaisquer outras normas legais e regulamentares relativas ao
aspecto exterior e a inserção urbana e paisagística das edificações, bem como sobre o
uso proposto”192
. E de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo, a câmara delibera acerca
dessa conformidade no prazo de 30 dias, contados nos termos das alíneas a), b) e c)
desse número, devendo, posto isso, o interessado apresentar “os projectos de
engenharia das especialdades necessários à execução da obra no prazo de seis meses a
contar da notificação do acto que aprovou o projecto de arquitectura caso não tenha
apresentado tais projectos com o requerimento inicial” – n.º 4 do artigo 20.º. Prescreve,
por sua vez, o artigo 23.º os prazos para a deliberação final da câmara sobre o pedido de
licenciamento, que, no caso das obras de construção é de 45 dias – alínea c) do n.º 1,
contados a partir da data de apresentação dos projectos de especialidades, ou da data de
aprovação do projecto de arquitectura, se aqueles tiverem sido apresentados logo com o
pedido (e juntamente com o projecto de arquitectura), ou da data da última pronúncia de
entidades externas, quando necessárias (ou, na falta de pronúncia, decorrido o prazo
para a sua recepção pela câmara municipal) – n.º 4 do mesmo artigo. No n.º 6 desse
191
Em rigor, relativo às operações previstas nas alíneas c), d), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 4.º. 192
Em sentido idêntico dispõe o artigo 21.º, quando esteja em causa a aprovação de projectos
relativos a operações de loteamento, obras de urbanização e trabalhos de remodelação de terrenos,
embora aqui não se siga a apresentação de projectos de especialidades, existentes nas obras de construção,
não se verificando, assim, o faseamento do procedimento cometido para o licenciamento das construções,
amplamente consideradas nos termos do n.º 1 do artigo 20.º.
94
artigo 20.º, estatui o legislador a possibilidade do interessado na licença de obras de
construção193
requerer a aprovação, pela câmara, de uma licença parcial para
construção da estrutura, cujo deferimento conduz à emissão de alvará de licença parcial
(n.º 7), mediante a mera entrega dos projectos de especialidades, e desde que o projecto
de arquitectura tenha já sido aprovado e seja prestada caução para demolição da
estrutura até ao piso de menor cota em caso de indeferimento final do licenciamento.
Deliberação final que, por sua vez, deferindo o pedido de licenciamento,
“consubstancia a licença para a realização da operação urbanística” – artigo 26.º.
A recensão normativa efectuada permite-nos concluir pela caracterização do
procedimento de licenciamento de obras como procedimento faseado, assim
conformado pela lei, não expressa, mas implicitamente, atendendo à tramitação que lhe
comete, escalonando-o em duas etapas – aprovação do projecto de arquitectura e
aprovação dos projectos de especialidades. Este fenómeno de faseamento, justificado
pela crescente complexidade do licenciamento de obras, foi introduzido pelo pretérito
DL n.º 445/91, de 20 de Novembro, que expressamente distinguia os momentos de
apreciação do projecto de arquitectura e apreciação dos respectivos projectos de
especialidades – artigo 15.º do DL n.º 445/91, que só admitia mesmo a apresentação dos
projectos de especialidades pelo particular após a aprovação camarária do projecto de
arquitectura, enquanto que, actualmente, o RJUE admite a sua apresentação conjunta,
embora pressuponha que a respectiva apreciação seja sucessiva – n.º 4 do actual artigo
20.º194
.
Analisando os parâmetros a que a câmara tem que atender para apreciação do
projecto de arquitectura, nos termos do artigo 20.º, vemos que essa apreciação, que
apresenta momentos vinculados e momentos discricionários195
, se dirige à avaliação da
conformidade da pretensão edificatória com os intrumentos de planeamento em vigor
para a área visada (planos municipais e especiais de ordenamento do território) e demais
condicionantes, legais e regulamentares, da realização de operações urbanísticas –
medidas preventivas, áreas de desenvolvimento urbano prioritário ou de construção
prioritária, servidões administrativas e restrições de utilidade pública, inserção urbana e
193
Aqui estritamente consideradas – apenas abrangendo, logicamente, as obras das alíneas c), d)
e e) do n.º 2 do artigo 4.º. 194
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 238. 195
Idem, ibidem, pp. 238-238.
95
paisagística e uso proposto para a edificação196
. Ou seja, a aprovação do projecto de
arquitectura abrange a apreciação de todos os aspectos da pretensão relativos à
arquitectura (estrutura, implantação, inserção na envolvente, cércea, alinhamento,
respeito das condicionantes dos planos, entre outros), aspectos esses que ficam
definitivamente apreciados e decididos, sobrando, apenas, o exame dos projectos de
especialidades, para obtenção da licença final global197
.
6.2 - A APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA COMO ACTO PRÉVIO –
EFEITOS PARA O REQUERENTE E PARA A ADMINISTRAÇÃO
Assumindo-se, deste modo, o parcelamento do procedimento de licenciamento de
obras, e o papel nele desempenhado pelo acto de aprovação do projecto de arquitectura
– encerramento da primeira fase do procedimento, abrangente de todos os elementos
relativos à arquitectura - concluimos pela qualificação desta pronúncia da
Administração como acto administrativo prévio, e não mero acto preparatório do acto
final de licenciamento. Sobre a qualificação deste acto, e tendo como pano de fundo as
considerações jurisprudenciais tecidas a seu respeito, manifestaram-se vários Autores,
pelo que passamos, assim, a elencar as diversas apreciações doutrinais.
No sentido exposto, manifestou-se, desde logo, FERNANDA PAULA
OLIVEIRA, em comentário dirigido a Acordão do STA de 05/05/1998198
, abrindo
caminho à discussão doutrinal em torno da figura. A Autora afirma o acto de aprovação
do projecto de arquitectura como acto administrativo prévio, que se pronuncia sobre as
questões da arquitectura de modo final e vinculativo para a Administração, funcionando
como pressuposto da posterior decisão final de licenciamento – acto complexo199
.
Assim, em relação a esses aspectos que ficam definitivamente decididos, o acto de
aprovação é constitutivo de direitos para o requerente – direito a que esses aspectos não
venham a ser postos em causa no decurso do procedimento, e vinculativo para a câmara
municipal, que não pode indeferir o licenciamento, a final, com fundamento em algum
196
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit, pp. 238-239. 197
Cfr. idem, ibidem, p. 241. 198
Acordão do STA de 05/05/1998 (P. n.º 43497), no qual a natureza jurídica da aprovação do
projecto de arquitectura se coloca face à sua impugnação por terceiros contra-interessados, como veremos
adiante. 199
Decorrente da apreciação dos projectos das especialidades; note-se que, não sendo o projecto
de arquitectura aprovado, há apenas uma decisão de indeferimento do pedido de licenciamento, não se
verificando aquela autonomização da decisão de recusa do projecto, e não se colocando aqui qualquer
óbice à qualificação da pronúncia administrativa como verdadeiro acto administrativo.
96
desses mesmos aspectos. Assume, deste modo, o acto em questão uma função
estabilizadora típica dos actos administrativos, conexa com a função do próprio acto de
aprovação de salvaguarda dos direitos e interesses dos particulares de evitar encargos
inúteis com a elaboração dos projectos das especialidades, caso o projecto de
arquitectura não viesse a ser aprovado ou fosse necessário proceder a alterações
relativamente à sua versão original. A Autora rejeita, portanto, o entendimento,
jurisprudencialmente sufragado, como veremos adiante, da aprovação do projecto de
arquitectura como mero elemento da fase de instrução do procedimento de
licenciamento, instrumental ou pré-ordenada à produção do acto final-principal, este
sim constitutivo.200
No sentido da recusa da qualificação do acto de aprovação do projecto de
arquitectura como acto meramente instrumental relativamente ao acto final de
licenciamento, pronuncia-se, também, JOÃO GOMES ALVES, e a propósito do mesmo
Acordão do STA. Destaca este Autor a autonomia entre a aprovação do projecto de
arquitectura e a aprovação dos projectos das especialidades, e afirma o primeiro como
acto destacável ou prejudicial no âmbito do procedimento global de licenciamento201
,
acto que, nas palavras de Marcello Caetano, “compromete, irremediavelmente, em certo
sentido, a decisão a tomar”.202
Destaca-se, ainda, MÁRIO TORRES, que se manifestou sobre a questão a
pretexto do Acordão do Tribunal Constitucional n.º 40/2001, de 31 de Janeiro de
2001203
, qualificando o acto em apreço como acto central do procedimento de
licenciamento de construção, condicionante dos actos procedimentais subsequentes, e
que põe termo a um sub-procedimento demarcado do procedimento de licenciamento,
sem cuja conclusão não se avança para as fases seguintes (aprovação dos projectos de
especialidades)204
. Esse carácter central é, igualmente, destacado por ANTÓNIO
DUARTE DE ALMEIDA, que define a aprovação do projecto de arquitectura como o
acto que concentra e esgota o exercício dos poderes constitutivos urbanísticos dos
200
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Duas questões no direito do urbanismo: aprovação
do projecto de arquitectura (acto administrativo ou acto preparatório?) e eficácia de alvará de
loteamento (desuso?), in CJA, n.º 29, Set./ Out., 2001, pp. 51-55. 201
E, dessa forma, contenciosamente impugnável pelos contra-interessados, como veremos. 202
Cfr. JOÃO GOMES ALVES, Natureza jurídica do acto de aprovação municipal do projecto
de arquitectura, in CJA, n.º 17, Set./ Out., 1999, p. 14. 203
P. n.º 405/99 - mais uma vez, a recorribilidade do acto por terceiros em causa. 204
Cfr. MÁRIO TORRES, Ainda a (in)impugnabilidade da aprovação do projecto de
arquitectura, in CJA, n.º 27, Maio/ Junho 2001, p. 42.
97
órgãos municipais205
, encontrando-se, a partir desse momento, preliminarmente
determinado o conteúdo urbanístico do acto principal – aprovação do projecto de
arquitectura como decisão prévia ou preliminar.206
6.2.1 - A ALTERAÇÃO DAS REGRAS URBANÍSTICAS ENTRE A APROVAÇÃO DO
PROJECTO DE ARQUITECTURA E O ACTO FINAL DE LICENCIAMENTO
Considerando o acto de aprovação do projecto de arquitectura como o acto central
do procedimento de licenciamento, como o acto que encerra definitivamente a
apreciação das questões urbanísticas respeitantes à pretensão, não podendo a câmara
“reapreciá-las” em momento posterior, torna-se clara a irrelevância de qualquer
alteração normativa que ocorra após a aprovação, mas antes do acto final de
licenciamento. Nos termos gerais do princípio do tempus regit actum, o acto de
aprovação do projecto de arquitectura reger-se-á pelas normas vigente ao tempo da sua
prática, e, tratando-se de um acto administrativo válido e constitutivo de direitos, não
pode ser posto em causa por alterações normativas supervenientes. Só assim não será
nos casos em que o próprio plano disponha em sentido diferente (admitindo que está em
causa alteração de instrumento de planeamento); contudo, determinando o novo plano a
caducidade da anterior aprovação do projecto de arquitectura, o particular requerente
terá direito a uma indemnização207
, tal como quando se verifique a ulterior anulação,
declaração de nulidade ou revogação do mesmo.208
Estão aqui em causa os princípios da
protecção da confiança, da segurança jurídica e da boa fé da actuação administrativa,
uma vez que, como expusemos, a aprovação do projecto de arquitectura constitui
garantia segura quanto à possibilidade de realizar a construção tal como consta desse
projecto209
.
205
Face, também, ao n.º 8 do artigo 20.º do RJUE, que exclui a apreciação prévia dos projectos
da engenharia de especialidades mediante declarações de responsabilidade dos autores dos projectos
inscritos em associação pública. 206
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA, A natureza…, cit., p. 32. 207
Constitui um dos casos doutrinalmente chamados de “expropriações do plano”, a que melhor
nos referiremos adiante, quando questionarmos este mesmo problema a propósito da informação prévia
favorável. 208
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 239-242; no mesmo sentido,
designadamente, ANTÓNIO CORDEIRO, Arquitectura…, ob. cit., p. 362. 209
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Duas questões…, cit., p. 54.
98
6.3 - O ACTO DE APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA COMO ACTO
IMPUGNÁVEL – LESIVIDADE E IMPUGNABILIDADE POR TERCEIROS
A controvérsia em torno da natureza do acto de aprovação do projecto de
arquitectura conflui para a questão da sua impugnabilidade judicial, questão esta objecto
de considerações divergentes tecidas pela doutrina e jurisprudência, à luz das sucessivas
leis administrativas processuais (pretérita LPTA e actual CPTA).
Assumindo o acto em causa como acto prévio, funcionalmente autónomo no
âmbito do procedimento de licenciamento, forçosamente admitimos a sua
recorribilidade imediata pelo requerente do licenciamento, como decisão definitiva das
questões urbanísticas a apreciar pela câmara municipal210
, constitutiva de direitos em
relação àquele.
Mas a questão da recorribilidade deste acto coloca-se com especial acuidade em
relação aos terceiros que se considerem, desde logo, afectados por aquela aprovação, os
contra-interessados no licenciamento. À relutância da jurisprudência em admitir tal
possibilidade, contrapõe-se a sua afirmação por parte da doutrina maioritária.
Acolhendo a solução jurisprudencial dominante à época, FERNANDA PAULA
OLIVEIRA, no seu supracitado comentário ao Acordão do STA de 05/05/1998, e não
obstante recusar a qualificação cometida ao acto pelo Tribunal, conclui pela
inimpugnabilidade contenciosa do acto de aprovação do projecto de arquitectura pelos
contra-interessados no licenciamento. Atesta a Autora que embora, como acto
administrativo, o acto em questão produza efeitos externos, estes limitam-se ao
requerente da licença de construção, e não tendo tal acto eficácia imediata,
consequentemente, é insusceptível de lesar a esfera jurídica dos terceiros relativamente
à relação jurídica constituída, não existindo garantia de que a decisão final seja positiva,
210
Na prática, a questão da impugnação autónoma da pronúncia municipal relativa ao projecto
de arquitectura pelo próprio requerente só se colocará nos casos da sua aprovação condicionada, uma vez
que, sendo o projecto aprovado na íntegra, tal como apresentado pelo particular, este não terá interesse na
sua impugnação, e, sendo o projecto recusado não se verifica a existência de uma pronúncia autónoma da
câmara nesse sentido, antes e desde logo, o indeferimento do pedido de licenciamento por
desconformidade do projecto de arquitectura com as normas urbanísticas vigentes, ou seja, a pronúncia
acerca do projecto de arquitectura consome-se no acto de recusa do licenciamento, tal como entendemos
que se passa com os projectos das especialidades nos casos de deferimento do pedido de licenciamento,
ou indeferimento provocado pela sua desconformidade com as normas legais e regulamentares, projectos
esses absorvidos pelo acto final global de licenciamento, que não são, portanto, objecto de uma pronúncia
autónoma por parte da Administração - note-se que o RJUE se refere apenas à aprovação do projecto de
arquitectura e à deliberação final sobre o licenciamento, designadamente no artigo 23.º. Veja-se
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Duas questões…, cit., p. 53; diversamente, considerando a aprovação
dos projectos de especialidades como pronúncia autónoma, JOÃO GOMES ALVES, posição referida
supra, cfr. Natureza jurídica…, cit., p. 14.
99
uma vez que pode a licença vir a ser recusada por motivos alheios ao projecto de
arquitectura. Este carácter não lesivo relativamente aos contra-interessados decorre da
natureza prévia e índole não permissiva do acto, pelo que, nas palavras do STA, a
aprovação do projecto de arquitectura produz efeitos “apenas virtuais ou meramente
eventuais” em relação àqueles terceiros, que não têm um interesse directo, pessoal e
legítimo na sua anulação - interesse em agir - assumindo-se o acto de aprovação do
projecto de arquitectura, em relação aos mesmos, como mero acto instrumental,
preparatório e de efeitos internos, pelo que só poderão impugná-lo, a final, por via da
impugnação da licença de construção.211
Diversamente, JOÃO GOMES ALVES invoca a existência de relações trilaterais
ou mesmo multilaterais no âmbito dos procedimentos de licenciamento de obras, que
conferem aos vizinhos do requerente direitos subjectivos públicos, nos moldes arguidos
por Vasco Pereira da Silva, anteriormente explanados. Os vizinhos do requerente têm
legitimidade para intervir no procedimento de licenciamento, nos termos do n.º 1 do
artigo 53.º do CPA, uma vez que podem ser afectados nos seus direitos e interesses
legalmente protegidos, ou quando estejam em causa “bens fundamentais” - nos termos
do n.º 2 do mesmo artigo e artigo 12.º e seguintes da CRP. O acto de aprovação do
projecto de arquitectura é susceptível de lesar, designadamente, o direito fundamental
de propriedade dos vizinhos - artigo 62.º da CRP. A eficácia do acto, que só se produz
com o licenciamento final – eficácia diferida, não pode confundir-se com a apreciação
da sua legalidade, e, sendo o acto perfeito, embora apenas, nas palavras de Rogério
Soares, “potencialmente produtor de consequências”, não pode excluir-se a
possibilidade de recurso imediato, por terceiro vizinho, quando esteja em causa a lesão
de um seu direito fundamental, antecipando-se, assim a tutela dos direitos particulares,
com benefício para o próprio requerente da licença, que vê definido esse acto antes de
gastar tempo e dinheiro com os projectos das especialidades. O único entrave a esta
faculdade de tutela antecipada será a falta de conhecimento do acto de aprovação do
projecto pelos terceiros.212
Por sua vez, MÁRIO TORRES argumenta, desde logo, com a relevância
económica da actividade edificativa, e consequentes repercussões económicas e sociais
da eficiência ou ineficiência da administração da Justiça, devendo, como tal, a
211
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Duas questões…, cit., p. 55. 212
Cfr. JOÃO GOMES ALVES, Natureza jurídica…, cit., pp. 14-16.
100
determinação dos actos administrativos contenciosamente impugnáveis obedecer a um
critério pragmático de oportunidade temporal. Sendo na fase da aprovação do projecto
de arquitectura, como acto central do procedimento de licenciamento, que podem surgir
ofensas de direitos ou interesses legalmente protegidos de terceiros ou da comunidade,
não faz sentido que não possam aqueles desde logo impugná-lo, inclusivamente porque
basta a aprovação do projecto de arquitectura213
para iniciar os trabalhos de escavação
até ao piso de menor cota (artigo 18.º, n.º 1 do pretérito DL n.º 445/91). Reitera este
Autor a conveniência da imediata impugnação da aprovação do projecto de arquitectura
para o interesse público, os terceiros e o próprio requerente, a eficácia do acto como
requisito não imprescindível para a sua impugnabilidade, e o carácter facultativo e não
preclusivo (relativamente à impugnabilidade do acto final de licenciamento) dessa
impugnabilidade imediata, considerando os problemas que se colocam quanto à
cognoscibilidade do acto pelos terceiros.214
Também ANTÓNIO DUARTE DE
ALMEIDA salienta a suficiência da potencialidade de produção de efeitos lesivos para
terceiros, para a admissão da impugnação do acto pelos mesmos, lesividade que, aliás,
se revela, em muitos casos, como actual, face às figuras da licença parcial para
construção da estrutura e da realização de obras de demolição ou escavação – artigos
23.º, n.º 6, e 81.º, n.º 2 do DL n.º 555/99.215
ANTÓNIO CORDEIRO remata afirmando ser o acto de aprovação do projecto de
arquitectura contenciosamente recorrível, quer no domínio do actual CPTA, quer no
domínio da pretérita LPTA, face à alteração constitucional de 1989 - artigo 268.º, n.º 4
da CRP. Segundo o Autor, há que atender a todos os efeitos da aprovação do projecto de
arquitectura, típicos – permitir o requerente continuar com o procedimento, pronúncia
constitutiva de direitos em relação ao mesmo, e, eventualmente, a ofensa da propriedade
alheia, “em planta” ou mesmo já fisicamente concretizada, quando esteja em causa
projecto de arquitectura de edificação já construída, que se pretende legalizar a
posteriori, - e “não típicos”, dependentes da lei e das circunstâncias concretas – caso do
inquilino, permitindo a aprovação do projecto de arquitectura relativo a legalização de
prédio já existente que lhe fosse, de imediato, imposta a saída do prédio arrendado.
213
E dos projectos de estabilidade ou de escavação e contenção periférica, antes da aprovação
dos restantes projectos de especialidades, e do licenciamento final. 214
Cfr. MÁRIO TORRES, Ainda…, cit., pp. 41-45. 215
Cfr. ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA, A natureza…, cit., pp. 32 e 33.
101
Sistematizando todos os efeitos produzidos, na óptica dos direitos constituídos na esfera
do particular requerente, enuncia o Autor:
Fixação do momento de referência urbanística para a apreciação do pedido, pelo
que ulteriores modificações dos parâmetros urbanísticos à luz dos quais foi
aferida a legalidade e viabilidade do projecto só é admissível mediante o
ressarcimento dos prejuízos daí decorrentes, causados ao particular;
Prosseguimento do procedimento, com a entrega dos projectos das
especialidades, ou se já entregues, o início da contagem dos prazos para a
subsequente decisão camarária;
Início eventual da execução dos trabalhos de escavação e construção periférica
até à profundidade do piso de menor cota do edifício projectado, caso seja
pedido (e mediante a prestação de caução), antecedendo-lhe a demolição de
edifício pré-existente – artigo 81.º do RJUE;
Início eventual da execução da obra pretendida, mediante a obtenção, pelo
proprietário ou promotor, de uma licença parcial para construção de estrutura,
“imediatamente após” a entrega dos projectos de especialidade, com prestação
de caução – artigo 23.º, n.ºs 6 e 7 do RJUE.
Assim, sendo a aprovação do projecto de arquitectura condição essencial para
proceder às referidas primeiras fases de trabalho de uma construção, é difícil, afirma o
Autor, aceitar a ficção da jurisprudência de que se trata de um mero “acto de trâmite”.
Conclui atestando que o critério da “eficácia externa” que o artigo 51.º, n.º 1 do actual
CPTA enuncia tem que ser assumido a partir da consideração do acto administrativo
como acto de autoridade216
, que se reflecte na esfera jurídica dos administrados e os
216
Depois de proceder à recensão das diversas soluções doutrinais para a questão, o Autor
conclui que a regra do artigo 39.º do CPTA – interesse processual nas acções de simples apreciação –
conforta a posição da imediata impugnabilidade do acto de aprovação do projecto de arquitectura, uma
vez que representando esse acto uma ofensa a regras legais e direitos de terceiros, estes têm que poder
evitar a consumação dessa lesão, através da verificação judicial da ofensa. E quanto ao critério da
eficácia externa do artigo 51.º, n.º 1, como critério da recorribilidade dos actos – não a sua lesividade,
conclui não estar em causa a eficácia do artigo 54.º do mesmo Código, nem a decisão de que depende a
configuração e produção dos efeitos, bastando-se, aparentemente, com o seu mero anúncio. Destaca-se a
crítica feita pelo Autor à posição de Vieira de Andrade, segundo o qual a aceitação da impugnabilidade
das decisões prévias é expressão de uma “defesa antecipada” ou “precoce” dos interessados, face à
grande probabilidade de lesão dos direitos dos particulares, impugnabilidade que, embora não
explicitamente excluída, parece não estar determinada no artigo 51.º, n.º 1 do CPTA, pelo que deveria
decorrer expressamente ou inequivocamente de uma lei – a lei deveria prever, designadamente, a
102
beneficia ou prejudica, e devendo ser simetricamente tratadas, nas relações poligonais,
a situação do beneficiário do acto prévio, que vê constituídos direitos na sua esfera
jurídica, e a situação dos terceiros a quem ele virá a prejudicar assim que forem
exercidos aqueles direitos. Ou seja, o acto prévio tem de assumir a mesma externalidade
de efeitos para os vários sujeitos jurídicos envolvidos; se garante ao seu beneficiário
uma situação de vantagem, tem que, no mesmo momento, permitir aos terceiros
eventualmente prejudicados o seu re-exame judicial. Um acto da Administração será
impugnável sempre que traduza uma tomada de posição definitiva sobre parte das
questões a decidir no procedimento, e permita identificar a possível lesão que do seu
conteúdo resultará para terceiros, no fim do procedimento, garantindo-se, assim, uma
legítima defesa.217
6.4 - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL – A JURISPRUDÊNCIA DO STA RELATIVAMENTE
AO ACTO DE APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA
Passamos à evolução da consideração do acto de aprovação do projecto de
arquitectura pelo STA, jurisprudência desenvolvida ainda no âmbito da anterior LPTA,
e que motivou a discussão doutrinal em torno deste acto.218
Destaca-se, desde logo, o Acordão de 21/03/1996219
, estando em causa a
impugnação da aprovação do projecto de arquitectura por arrendatária de prédio que se
pretendia demolir para construção de novo edifício nos termos desse projecto, e no qual
o STA, apesar da referência ao artigo 268.º, n.º 4 – idoneidade para a produção de
efeitos imediatamente lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos como
critério da recorribilidade contenciosa dos actos administrativos, conclui ser necessário
estar em causa um verdadeiro acto administrativo, não um mero acto preparatório
como o recorrido, acto este que, estando directamente ligado à produção de um outro,
apenas contribui para a determinação do seu conteúdo. Além de mais, assumindo-se a
aprovação do projecto de arquitectura como acto preliminar, sem autonomia funcional
impugnabilidade das decisões sobre o projecto de arquitectura, face ao seu carácter “central” no
procedimento, embora o Autor acabe por admitir que, neste caso, talvez seja de considerar a
produtividade externa do acto, na medida em que constitui direitos nas esferas dos particulares, apesar de
limitados. Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, A justiça…, ob. cit., pp. 218-220, nota 426. 217
Cfr. ANTÓNIO CORDEIRO, Arquitectura…, ob. cit., pp. 358-373. 218
É ANTÓNIO CORDEIRO quem procede a esta recensão jurisprudencial acerca do acto de
aprovação do projecto de arquitectura; veja-se Arquitectura…, ob. cit., pp. 282-295. 219
P. n.º 39097.
103
relativamente ao acto de licenciamento (embora contribua para o seu conteúdo), e,
assim, sem imediata eficácia lesiva, também por esta via não se lhe pode reconhecer
imediata recorribilidade, por os seus efeitos típicos não atingirem a esfera jurídica da
recorrente.
Seguiu-se o Acordão de 10/04/1997220
, estando em causa a possibilidade de
revogação do acto de aprovação do projecto de arquitectura face a plano director
municipal posterior e que o inviabilizava, o Tribunal assumiu o carácter preparatório
daquele acto e concluiu não se tratar de um acto constitutivo de direitos que devesse ser
respeitado – recusa, assim, o STA, segundo ANTÓNIO CORDEIRO, a recorribilidade
do acto não só por terceiros, mas, igualmente, pelo seu requerente. Destaca-se,
posteriormente, o já referido Acordão de 05/05/1998221
, que determinou o início da
discussão doutrinal em torno desta questão, e no qual o Supremo mantém o seu
entendimento relativamente à caracterização do acto como meramente preparatório e à
recusa da sua recorribilidade por terceiros.
Em Acordão de 17/11/1998222
, o STA chega mesmo a afirmar a possibilidade da
Administração, em face dos projectos de especialidades, ter que alterar os parâmetros
anteriormente aprovados para o projecto de arquitectura, na resolução final de
licenciamento da construção, denotando, assim, uma leitura errada do procedimento de
licenciamento de obras. Deste Acordão foi interposto recurso para o Tribunal
Constitucional, dando origem à primeira pronúncia deste Tribunal acerca da questão –
Acordão n.º 40/2001, de 31/01/2001223
. O Tribunal Constitucional considerou não
inconstitucional a interpretação da norma do n.º 1 do artigo 25.º da LPTA, restritiva do
recurso contencioso aos actos definitivos e executórios, e face ao n.º 4 do artigo 268.º da
CRP, concluindo, portanto, não ser excessivo esse condicionamento ao direito de
recurso contencioso.
Destaca-se, posteriormente, o Acordão do STA de 30/09/1999224
, no qual, apesar
de se admitir a aprovação do projecto de arquitectura como “elemento decisório não
terminal de um acto complexo de formação sucessiva”, se reitera a falta de
definitividade horizontal do mesmo e o princípio da impugnação unitária, face às suas
vantagens de economia de meios e de segurança jurídica. Apenas no Acordão de
220
P. n.º 39573. 221
P. n.º 43497. 222
P. n.º 43772. 223
P. n.º 405/99. 224
P. n.º 44672.
104
23/05/2000225
, o STA dá conta da doutrina discordante da sua posição quanto à
aprovação do projecto de arquitectura, mas acaba por se ancorar na “lesividade apenas
potencial” para manter a sua orientação, registando-se, contudo, já um voto de vencido.
Note-se, de seguida, o Acordão de 28/11/2000226
, em que o requerente incluíu no
projecto de arquitectura uma área significativa pertencente ao terceiro recorrente,
mantendo o Tribunal o princípio da impugnação unitária, não admitindo que nesse caso
esse princípio resultava manifestamente prejudicial para o próprio requerente. Destaca-
se, posteriormente, Acordão de 22/10/2003227
, face às particularidades do caso
concreto, porquanto se tratava de aprovação de projecto de arquitectura inserido em
processo de legalização de edifício já construído – situação igualmente verificada nos
Acordãos de 24/11/2004228
e de 05/04/2005229
, e que se limitava a reproduzir a obra já
executada, com invasão do prédio de proprietários limítrofes, surgindo especialmente
despropositada a afirmação do Supremo de que o acto de aprovação do projecto de
arquitectura não permite a promoção e execução da operação pretendida, quando a obra
já tinha sido levada a cabo.
Apenas em Acordão de 16/05/2001230
, o STA se refere a “naturais efeitos
constitutivos de direitos” da aprovação do projecto de arquitectura, tratando-se de um
pedido de indemnização à câmara municipal pela aprovação ilegal daquele, e posterior
recusa de emissão de alvará, considerando-se o prejuízo (despesas inúteis) a que aquela
aprovação deu origem.
Nos Acordãos de 19/04/2005231
e de 25/01/2006232
, o STA continua a defender o
princípio da impugnação unitária, argumentando com a sua bondade constitucional
face ao artigo 268.º, n.º 4 da CRP – posição de defesa do mínimo constitucionalmente
exigível, e advogando categoricamente o entendimento tradicional da lesividade em acto
e não em potência, como critério de recorribilidade, face ao referido princípio e à
consideração da utilidade e eficácia do recurso contencioso, sem prejuízo de admitir, no
segundo dos acordãos referidos, e considerando o novo CPTA, que o critério da
225
P. n.º 45768. 226
P. n.º 46506. 227
P. n.º 660/02. 228
P. n.º 1878/02. 229
P. n.º 100/04. 230
P. n.º 46227. 231
P. n.º 1415/04. 232
P. n.º 1127/05.
105
definitividade pudesse ser afastado pela nova lei pelo critério da externalidade, não
adiantando, contudo, os resultados de tal ―mudança‖ quanto ao acto em causa.
Pomos termo a esta recensão jurisprudencial citando o recente Acordão do STA
de 09/12/2009233
, no qual se afirma: “constitui acto administrativo impugnável, o acto
que aprovou projecto de arquitectura praticado no âmbito de um processo de
legalização de uma obra de construção, que havia sido levada a efeito em
desconformidade com um anterior licenciamento, o qual permitiu a implantação
daquela obra de molde a não permitir um correcto arejamento, iluminação natural e
exposição à luz solar de um prédio vizinho”. Esta significativa inflexão jurisprudencial
decorre da consideração do artigo 51.º, n.º 1 do CPTA, à luz do qual o Tribunal afere da
recorribilidade do acto, que assume como acto prévio, com conteúdo decisório, que
produz efeitos externos e é lesivo de interesses de terceiro.
6.5 - INFORMAÇÃO PRÉVIA VS. APROVAÇÃO DO PROJECTO DE ARQUITECTURA
Caracterizado o acto de aprovação do projecto de arquitectura e apreciadas as
principais questões que em seu torno se colocam, estamos agora em condições de o
distinguir da informação prévia. Começamos, contudo, por notar a ligação funcional
que existe entre os dois actos: funcionalmente perspectivada, a informação prévia
propõe-se a antecipar a apreciação dos elementos (ou de parte deles) que
consubstanciam a aprovação do projecto de arquitectura (questões urbanísticas e de
arquitectura referentes à construção pretendida) – potencial identidade de objecto entre
os dois actos, - conferindo ao particular uma garantia para a posterior apresentação
daquele projecto. A informação prévia, sendo favorável, constitui, a benefício do
requerente, o direito à aprovação do projecto de arquitectura - assumindo o acto de
aprovação do projecto de arquitectura, como o assumimos, como acto central e
funcionalmente autónomo no procedimento de licenciamento, acto que esgota a
apreciação daqueles elementos no que à pretensão apresentada diz respeito, - relativo à
mesma operação urbanística e com ela conforme (e verificados os pressupostos de
conteúdo, de legitimidade e temporal da informação prévia), ficando, assim, a
apreciação do projecto de arquitectura condicionado àquela anterior pronúncia. Mas esta
233
P. n.º 019/09 (da 2.ª subsecção do Contencioso Administrativo).
106
tendencial ligação funcional entre os dois actos não permite a sua identificação
dogmática, perante a actual configuração de ambos na legislação urbanística. Assim:
A informação prévia favorável é um acto administrativo de natureza
verificativa, constitutivo de direitos, que encerra, de modo definitivo e final, um
procedimento próprio e autónomo de qualquer outro que lhe suceda. A
aprovação do projecto de arquitectura é, igualmente, um acto administrativo não
permissivo, constitutivo de direitos para o particular requerente, é um acto
definitivo e final no que aos elementos que aprecia diz respeito, contudo,
consubstancia um sub-procedimento, uma fase, dentro do procedimento
complexo de licenciamento de obras, um acto que tende, portanto, para o acto
final, global e complexo de licenciamento, que, uma vez praticado, o consome;
A legitimidade para fazer o pedido de informação prévia é alargada,
relativamente à legitimidade para fazer o pedido de licenciamento da construção,
pedido que conduz à aprovação do projecto de arquitectura, não se restringindo
o primeiro, ao contrário do que acontece quanto ao segundo, aos titulares do
direito de propriedade ou de outro direito real sobre o terreno ao qual se dirige a
pretensão edificatória;
Ao pedido de licenciamento que desencadeia a aprovação do projecto de
arquitectura, e a este mesmo acto, não subjazem a pretensão e função de
informação que também orientam o pedido de informação prévia e caracterizam
a informação prévia, mesmo desfavorável, uma vez que os primeiros tendem à
efectivação da operação urbanística, enquanto os segundos se dirigem e esgotam
numa pronúncia de viabilidade da operação urbanística, não se verificando uma
comunhão necessária de interesses entre os dois pedidos e os dois actos,
comunhão apenas tendencial ou eventual - só se verificando se ao pedido de
informação prévia e consequente informação prévia suceder pedido de
licenciamento da construção sobre a qual aquele acto recaia e com ele coincida o
projecto de arquitectura.
É esta diferenciação que nos conduz à consideração da informação prévia como
acto sui generis, acto funcionalmente prévio - e que preenche, igualmente uma função
informativa, como concluimos aquando da sua distinção relativamente à figura da
107
informação urbanística, mas que tal como legalmente configurado, e sem prejuízo das
especificidades que o conformam, se assume como acto administrativo.
Já o acto de aprovação do projecto de arquitectura corresponde integralmente à
categoria dogmática do acto prévio (estritamente considerado ou em sentido próprio),
como acto que se pronuncia de modo final e vinculativo sobre uma parte da pretensão
formulada, encerrando uma fase do procedimento complexo em que se insere e
consumindo-se no acto final, global e complexo para que tende, sem prejuízo da
autonomia funcional que apresenta, por decidir acerca dos elementos sobre que recai.
108
IV – A INFORMAÇÃO PRÉVIA NA LEGISLAÇÃO ACTUAL E ALGUMAS
QUESTÕES CONTROVERSAS
7 – OS ARTIGOS 14.º A 17.º DO RJUE
Caracterizado (e qualificado) o acto de informação prévia, e delimitado
relativamente às figuras que lhe são mais próximas, cumpre-nos, agora, expôr alguns
aspectos ainda não devidamente focados em relação à sua actual configuração legal,
detendo-nos com especial atenção sobre certas questões que com maior acuidade se
colocam no âmbito deste instituto, como sejam a da legitimidade para fazer o pedido de
informação prévia, a dos efeitos das alterações normativas sobre a informação prévia
válida, e a possibilidade, introduzida pela última alteração ao RJUE, de renovar a
informação prévia favorável.
O procedimento de informação prévia é regulado nos artigos 14.º a 17.º do DL n.º
555/99, de 16 de Dezembro - RJUE, na versão resultante da Lei n.º 60/2007, de 4 de
Setembro. O artigo 14.º dispõe acerca do pedido de informação prévia, seu conteúdo e
legitimidade para a sua formulação. O artigo 15.º prescreve acerca das consultas
externas a ter lugar no âmbito do pedido de informação prévia. No artigo 16.º, a lei
regula a deliberação camarária que recai sobre o pedido, prazos e conteúdo da mesma.
Por sua vez, e por fim, o artigo 17.º enuncia os efeitos da informação prévia, prazo de
caducidade e possibilidade da sua renovação. Esquematizando o procedimento de
informação prévia, nos seus diversos momentos, atendendo àqueles normativos e às
disposições procedimentais gerais adaptáveis às suas especificidades, constantes dos
artigos 8.º a 13.º-B do RJUE, temos:
Requerimento da informação prévia, pelo interessado, instruído com os
elementos necessários à apreciação da pretensão, de acordo com a informação
pretendida e nos termos da Portaria n.º 232/2008, de 11 de Março, que relaciona
os elementos que devem instruir os pedidos de informação prévia atendendo aos
diversos tipos de operações urbanísticas regulados pelo RJUE – artigos 1.º a 6.º
da Portaria e artigo 14.º do RJUE. A apresentação do pedido é documentada por
recibo, que deve identificar o gestor do procedimento, nos termos do n.º 4 do
artigo 8.º. Notem-se, ainda relativamente ao requerimento inicial, o artigo 8.º-A,
109
que determina a tramitação informática dos procedimentos, e o artigo 9.º,
relativo às formalidades do requerimento e instrução dos pedidos;
Notificação, pela câmara municipal, do proprietário do prédio/ terreno objecto
do pedido, e demais titulares de direitos reais sobre o mesmo, da abertura do
procedimento, quando o requerente seja um interessado que não o proprietário,
cabendo ao interessado identificar aqueles através de certidão emitida pela
conservatória do registo predial – n.ºs 3 e 4 do artigo 14.º do RJUE;
Saneamento e apreciação liminar, nos termos do artigo 11.º, adaptado ao
procedimento de informação prévia: eventual despacho de aperfeiçoamento do
pedido, da competência do presidente da câmara municipal e no prazo de oito
dias a contar da data da apresentação, nos casos de omissão da identificação do
requerente, ou do proprietário/ titulares de outros direitos reais sobre o prédio
não requerentes, do âmbito do pedido ou localização do prédio visado, ou de
documento instrutório exigível e indispensável à apreciação da pretensão, e cuja
falta não possa ser oficiosamente suprida – n.ºs 1 e 2 do artigo 11.º, e
notificação do requerente para, assim, corrigir ou completar o pedido, no prazo
de 15 dias, sob pena de rejeição liminar, suspendendo-se o procedimento
durante esse período de tempo – n.º 3 do artigo 11.º e artigo 16.º, n.º 1, alínea
a)234
. Presume-se que o requerimento se encontra correctamente instruído, se
não houver convite para aperfeiçoamento – n.º 5 do artigo 11.º. Entendemos não
se aplicar a este procedimento a possibilidade de rejeição liminar do n.º 4 do
mesmo artigo, correspondendo a situação descrita a uma informação prévia
desfavorável, que deve especificar os termos da sua revisão, no cumprimento da
função de informação que lhe é cometida;
Consulta às entidades externas cujos pareceres, autorizações ou aprovações
condicionem a informação a prestar, quando tal consulta seja devida num
eventual pedido de licenciamento ou apresentação de comunicação prévia, nos
termos dos artigos 13.º, 13.º-A e 13.º-B do RJUE – artigo 15.º, princípio do
paralelismo procedimental com o procedimento que normalmente se seguirá235
;
Apreciação do pedido, em conformidade com as regras urbanísticas em vigor –
projecto de decisão;
234
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 91. 235
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 220.
110
Audiência prévia do requerente, designadamente em caso de deliberação
desfavorável, nos termos gerais dos artigos 100.º e seguintes do CPA236
.
Audiência de eventuais interessados que suscitem intervenção no procedimento,
nos termos do n.º 1 do artigo 53.º do CPA;
Deliberação final (fundamentada), da competência da câmara municipal,
delegável no seu presidente, e subdelegável nos vereadores, no prazo de 20 dias,
ou 30 dias nos casos de pedido qualificado do artigo 14.º, n.º 2, contados da
data de recepção do pedido ou dos elementos em falta, da data da recepção do
último parecer, autorização ou aprovação de entidades externas ao município,
ou do termo do prazo (20 dias – artigo 13.º, n.º 4) para a sua recepção, na falta
de pronúncia dentro desse prazo de alguma entidade (valendo aqui a regra do
deferimento tácito do n.º 5 do artigo 13.º) - artigo 16.º, n.º 1, alíneas a), b) e c).
Sendo a informação favorável, decisão com indicação do procedimento de
controlo prévio a que se encontra sujeita a realização da operação urbanística
pretendida – n.º 3 do artigo 16.º; sendo a informação desfavorável, com
fundamento no artigo 24.º do RJUE, decisão com indicação dos termos da sua
revisão – n.º 4 do artigo 16.º; ou, ainda, sendo a informação favorável
condicionada, decisão com indicação dessas condições. Deferimento tácito da
pretensão, ou seja, informação prévia favorável tácita, nos termos do artigo
111.º, alínea c), quando decorridos os prazos referidos sem se verificar a
pronúncia da câmara municipal, sem prejuízo da sua nulidade ou anulabilidade
quando viole normas legais ou regulamentares237
;
Notificação da deliberação ao requerente, nos termos gerais dos artigos 66.º e
seguintes do CPA, que inclui obrigatoriamente os pareceres, autorizações ou
aprovações das entidades externas – n.º 2 do artigo 16.º;
Eventual requerimento de revisão da informação prévia (que corresponde, em
rigor, a novo pedido, sua rejeição caso não se conforme com as indicações
constantes da anterior informação desfavorável), ficando o requerente
dispensado de juntar os elementos que instruiram o primeiro pedido, nos termos
do n.º 9 do artigo 11.º - n.º 4 do artigo 16.º;
236
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 89; igualmente, a jurisprudência
administrativa – a título de exemplo, veja-se o Acordão do STA de 05/07/2007, in www.dgsi.pt. 237
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 223-224.
111
Eventual requerimento de declaração de manutenção dos pressupostos de facto e
de direito que consubstanciaram a anterior informação favorável, decorrido o
seu prazo de caducidade de um ano, decisão da competência do presidente da
câmara, no prazo de 20 dias, considerando-se o pedido deferido na falta de
pronúncia dentro desse prazo – renovação da informação prévia favorável do
n.º 3 do artigo 17.º, que mais detalhadamente apreciamos infra.
Quanto às alterações operadas à versão originária do DL n.º 555/99, de 16 de
Dezembro238
, no que aos artigos 14.º a 17.º diz respeito, o DL n.º 177/2001, de 4 de
Junho, acrescentou o prazo de 30 dias para a deliberação, nos casos do n.º 2 do artigo
14.º - n.º 1 do artigo 16.º; especificou, no n.º 3 do mesmo artigo 16.º, as pronúncias das
entidades externas ao município como parte integrante da deliberação da câmara; e
limitou a redução dos prazos para metade para a decisão sobre o pedido de
licenciamento ou autorização aos casos de informação prévia favorável nos termos do
n.º 2 do artigo 14.º - n.º 3 do artigo 17.º. Mais significativas (e com verdadeira
relevância prática) foram as alterações operadas pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro:
Acrescentou, no n.º 1 do artigo 14.º, a possibilidade do pedido recair sobre um
“conjunto de operações urbanísticas directamente relacionadas”,
compatibilizando este procedimento com a prescrição do n.º 3 do artigo 9.º do
RJUE, segundo o princípio da economia processual239
;
Acrescentou a alínea f) ao n.º 2 do artigo 14.º: áreas de cedência destinadas à
implantação de espaços verdes, equipamentos de utilização colectiva e infra-
estruturas viárias como aspecto a contemplar pela informação formulada ao
abrigo desse dispositivo;
Substituiu o termo “aprovada” pelo termo “favorável” no n.º 3 do artigo 16.º
(e, da mesma forma, no n.º 1 do artigo 17.º), clarificando que a informação
prévia aprovada engloba quer a informação favorável quer a desfavorável240
– o
termo ―aprovada‖ refere-se, nesta sede, à existência de deliberação expressa,
238
Entrado em vigor a 14 de Abril de 2000, mas suspenso, face ao clima de dúvidas gerado
quanto à sua entrada em vigor, pela Lei n.º 13/2000 de 20 de Julho, suspensão prolongada pela Lei de
autorização n.º 30-A/2000, de 20 de Dezembro, até à entrada em vigor do DL n.º 177/2001 de 4 de Junho. 239
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 88. 240
Cfr. idem, ibidem, p. 92.
112
pelo que só no caso de informação favorável é devida a indicação do
procedimento de controlo prévio a aplicar à operação urbanística pretendida;
Acrescentou, no n.º 1 do artigo 17.º, o efeito procedimental de sujeição da
operação urbanística pretendida ao regime da comunicação prévia, nos casos do
pedido do n.º 2 do artigo 14.º, assumindo-se esse procedimento como
potencialmente aplicável a todas as pretensões e operações urbanísticas, e como
tal alargando substancialmente o seu âmbito de aplicação, relativamente às
situações especificadas no n.º 3 do artigo 6.º do RJUE241
; acrescentou, ainda, a
dispensa da realização de novas consultas externas, nesses casos. A doutrina
estende esta isenção aos casos não expressamente consagrados de licenciamento
precedido por informação prévia favorável242
;
Passou a regular o prazo de caducidade de um ano da informação favorável,
autonomamente, no n.º 2 do artigo 17.º (não já na 2.ª parte do n.º 1), alterando a
fórmula “a contar da data da notificação da mesma ao requerente” por “após a
decisão favorável do pedido de informação prévia”, considerando, no entanto, a
doutrina, que deve manter-se a regra da contagem do prazo a partir da
notificação da decisão, não podendo exigir-se ao particular o cumprimento do
ónus de apresentação do pedido de licenciamento ou apresentação da
comunicação prévia se o facto que lhe dá origem não lhe tiver sido notificado
(sendo-lhe desconhecido e, consequentemente, inoponível), e valendo a nova
regra apenas para as situações de deferimento tácito do pedido243
. Acrescentou,
no mesmo n.º 2, que, no caso de sujeição ao regime de comunicação prévia
prescrito pelo n.º 1/ in fine, essa comunicação deve ser acompanhada de
declaração dos autores e coordenador dos projectos de que a operação
urbanística respeita os limites constantes da informação - consequência da
configuração dada à nova figura da comunicação prévia como acto de controlo
prévio das operações urbanísticas;
Eliminou o anterior n.º 3 do artigo 17.º, em conformidade com a alteração
anteriormente descrita - agilização dos procedimentos através da figura da
comunicação prévia - que prescrevia que “quando a informação prévia
favorável respeite a pedido formulado nos termos do n.º 2 do artigo 14.º e tenha
241
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 231. 242
Cfr. idem, ibidem, p. 231. 243
Idem, ibidem, pp. 227-228.
113
carácter vinculativo nos termos do n.º 1 do presente artigo, é reduzido para
metade o prazo para a decisão sobre o pedido de licenciamento ou
autorização”244
;
Acrescentou um novo n.º 3 ao artigo 17.º, que prescreve a possibilidade de
renovação da informação prévia favorável – novidade sobre a qual nos
pronunciamos detalhadamente infra;
Por fim, completa o n.º 4 do artido 17.º, acerca da não suspensão dos
procedimentos de controlo prévio suportados em anterior informação prévia,
especificando estarem em causa as áreas a abranger por novas regras
urbanísticas, constantes de plano municipal ou especial de ordenamento do
território ou sua revisão, e entre a data do início da discussão pública até à
entrada em vigor do instrumento de planeamento.
8 – A LEGITIMIDADE PARA FORMULAR O PEDIDO DE INFORMAÇÃO
PRÉVIA
Um dos aspectos mais controversos do regime da informação prévia diz respeito à
legitimidade para fazer o pedido, questão que contende com a caracterização,
qualificação e aplicação prática da figura. Como vimos supra, quando analisámos a
evolução deste instituto nos diversos diplomas reguladores da gestão urbanística, a
legitimidade exigida para requerer uma informação prévia oscilou entre a legitimidade
alargada, reconhecida a qualquer interessado no pedido, e a legitimidade restrita -
faculdade de requerer a informação prévia apenas reconhecida aos titulares de
legitimidade, no momento do pedido de informação prévia, para requerer o eventual e
posterior pedido de licenciamento da operação urbanística, titulares, portanto, do direito
de propriedade ou outro direito real (ou o locatário, ou, ainda, mandatário daqueles)
sobre o prédio objecto do pedido.
244
A referência ao carácter vinculativo da informação justifica-se, quanto a nós, pela confusão
que se verificava entre informação aprovada e informação favorável, confundindo-se neste artigo,
consequentemente, a informação favorável com a informação vinculativa; ora a informação aprovada
engloba quer a informação favorável quer a desfavorável, significando antes informação expressa e não
tácita, e quer a informação favorável quer desfavorável são vinculativas para a câmara municipal,
entendimentos que resultam claros da actual redacção da lei, mas que se retiravam já da disciplina global
da figura, antes da Lei n.º 60/2007, apesar das imprecisões terminológicas susceptíveis de indução em
erro.
114
Actualmente, o RJUE consagra a legitimidade alargada para requerer a
informação prévia, referindo-se o n.º 1 do artigo 14.º a “qualquer interessado”,
prescrevendo o n.º 3 do mesmo artigo que “quando o interessado não seja o
proprietário do prédio, o pedido de informação prévia inclui a identificação daquele
bem como dos titulares de qualquer outro direito real sobre o prédio, através de
certidão emitida pela conservatória do registo predial”, e estatuindo o n.º 4 a
notificação, pela câmara municipal, do proprietário e titulares de outros direitos reais da
abertura do procedimento de informação prévia, nos casos previstos no n.º 3.
A opção legislativa entre a legitimidade alargada ou restrita para requerer o
pedido de informação é discutível. Alargando a legitimidade para o pedido de
informação prévia a qualquer interessado no mesmo, a lei acaba por estimular o
relevante papel que a informação prévia desempenha no comércio imobiliário,
designadamente permitindo que um eventual interessado na aquisição de um terreno
formule o pedido, equacionando essa aquisição a partir da resposta obtida, conforme
seja favorável ou desfavorável à pretensão urbanística idealizada245
. Contudo, por outro
lado, esta legitimidade alargada é susceptível de se revelar mais onerosa para a
Administração, em termos de volume de procedimentos gerados e a tramitar pela
câmara municipal, podendo dar-se o caso de sobre o mesmo terreno incidirem,
simultaneamente, diversos pedidos, feitos por diferentes interessados não titulares de
qualquer direito real sobre o mesmo, e independentemente da falta de interesse do
proprietário do prédio na sua transacção246
. Verificando-se uma restrição da
legitimidade, sempre poderia o proprietário do prédio, no momento em que pretendesse
a sua transacção, formular o pedido de informação correspondente ao interesse
edificatório do eventual interessado ou interessados na aquisição, cumprindo-se, assim,
o propósito de segurança no comércio jurídico imobiliário (e consequente valorização
económica do terreno) inerente à informação prévia, e diminuindo aquele risco de
estrangulamento da actividade camarária de gestão urbanística. Parece-nos, assim, que a
restrição da legitimidade para requerer a informação prévia aos titulares dos referidos
direitos seria a opção mais conveniente de um ponto de vista da praticabilidade e
utilidade efectiva do instituto, assim como da eficiência da actividade administrativa,
245
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, As garantias…, cit., p. 123. 246
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, As garantias…, cit., p. 123, e Anotação…, cit., p.
107.
115
sem descurar o relevante papel que a informação prévia assume no âmbito da venda de
imóveis.
FERNANDA PAULA OLIVEIRA assume o alargamento da legitimidade para
requerer a informação prévia como elemento descaracterizador da figura, atendendo à
sua configuração típica e função original, atribuindo-lhe a consequência da eventual
perda do carácter prévio do pedido de informação prévia, em relação ao pedido de
licenciamento. A Autora afirma mesmo que, de acto prévio a um procedimento de
licenciamento, a informação prévia tem vindo a tornar-se, designadamente por força
desta legitimidade alargada para a requerer, num instrumento de confirmação das
regras aplicáveis, aproximando-se do direito à informação do artigo 110.º do RJUE247
.
Efectivamente, a legitimidade alargada para formular o pedido constitui um dos
vectores que alicerçam o nosso afastamento da tipificação da informação prévia como
acto prévio em sentido próprio, não obstante, numa óptica funcional, lhe reconheçamos
essa natureza. Parece-nos, contudo, que a restrição da legitimidade para requerer a
informação prévia não será suficiente, só por si, para lhe conferir natureza de acto
estritamente prévio, tal como este é tradicionalmente configurado pela doutrina. Atente-
se na sua conformação legal em termos amplos (autonomia procedimental), e, inclusive,
na sua manifestação prático-social, já que tendo em conta as contingências que o
mercado imobiliário actualmente enfrenta, nos parece natural que se verifiquem mais
situações de pedidos de informação prévia, mesmo feitos pelos proprietários dos prédios
sobre que incidem, sem que lhes suceda qualquer pedido de licenciamento, mesmo
sendo a informação prévia favorável.
Entendemos, ainda, que, em abstracto, a legitimidade para requerer a informação
prévia não é coincidente com a legitimidade para pedir a informação urbanística do
artigo 110.º, n.º 1, alínea a) do RJUE. Assim, titulares desse direito à informação sobre
normas urbanísticas em vigor serão, como vimos supra, aqueles que invoquem um
interesse legítimo no conhecimento dos elementos abrangidos, designadamente, a
condição de proximidade com a área sobre a qual recai o pedido de informação –
vizinhança urbanística, e, visando-se a defesa de interesses difusos, nos termos do
artigo 52.º, n.º 3 da CRP, bastará povar a condição de eleitor ou da promoção e defesa
247
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 151, nota 13, e 153-154; e
FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 233.
116
desses interesses como objecto da associação representada248
. Quanto ao pedido de
informação prévia, parece-nos que, não sendo o requerente o proprietário ou titular de
qualquer direito que lhe permita fazer o posterior pedido de licenciamento ou
apresentação de comunicação prévia sobre o prédio, ou seu mandatário, interesse
legítimo para requerer esse tipo de informação apenas poderá ser reconhecido a quem
invoque um interesse, efectivo ou eventual, na aquisição da parcela sobre a qual o
pedido recai. Interesse, contudo, insusceptível de prova, o que resulta, na prática, no
carácter meramente formal da sua invocação, e consequente impossibilidade de
proceder a qualquer filtragem dos pedidos por esta via - em último termo, resulta num
reconhecimento ilimitado da legitimidade para fazer os pedidos, e no potencial
congestionamento da actividade administrativa de gestão urbanística.
Face ao alargamento da legitimidade para requerer a informação prévia, não
podemos recusar a possibilidade de se requererem, simultânea ou sucessivamente,
várias informações prévias sobre o mesmo terreno, relativas a operações urbanísticas
idênticas ou distintas. Não obstante ser o melhor entendimento o de que, ao abrigo da
legitimidade restrita, apenas era possível, em cada momento, a apreciação de um único
pedido para cada terreno, havia já mesmo quem defendesse poder o próprio proprietário
formular vários pedidos sobre o seu terreno. Recusamos, contudo, igualmente ao abrigo
da lei actual, e seguindo FERNANDA PAULA OLIVEIRA, essa possibilidade,
entendendo que, se após um pedido de informação prévia, o seu requerente formula
novo pedido sobre o mesmo terreno, relativo a diferente ou à mesma operação
urbanística, o novo pedido deve interpretar-se como desistência do procedimento
anterior, ou, caso já exista uma informação prévia favorável, como renúncia aos direitos
decorrentes dessa informação anterior e à perda dos seus efeitos vinculativos para a
câmara municipal, assim se procurando evitar uma absoluta instrumentalização da
informação prévia à mera especulação fundiária249
. Ou seja, temos que admitir a
possibilidade de existirem vários pedidos ou várias informações prévias simultâneas
para o mesmo terreno, mas aceitamos apenas, em cada momento, um único pedido por
requerente ou uma única informação por beneficiário, procurando, com isto, impedir a
perniciosa sobrevalorização dos terrenos através da informação prévia, e um drástico
esvaziamento funcional da figura.
248
Cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., p. 222. 249
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação…, cit., pp. 107-108.
117
Outra questão que se coloca, conexionada com a da legitimidade para o
requerimento da informação prévia, é a de saber se o particular com legitimidade para
requerer o licenciamento (ou apresentar comunicação prévia) de determinada operação
urbanística pode beneficiar de informação prévia favorável já existente, mas requerida
por outrem. A esta questão responde a doutrina, de forma acertada, afirmativamente,
justificando com a natureza iminentemente real, e apenas indirectamente pessoal, dos
actos de gestão urbanística, promovendo-se, desta forma, e perante o alargamento da
legitimidade para formular o pedido, a racionalização da actuação administrativa,
evitando que a Administração se pronuncie duplamente sobre pedidos iguais ou
similares, para que se produzam os efeitos legais da informação prévia favorável250
-251
.
9 – O EFEITO DA ALTERAÇÃO DAS REGRAS URBANÍSTICAS SOBRE A
INFORMAÇÃO PRÉVIA (FAVORÁVEL E EFICAZ) – AS ALTERAÇÕES DOS
PLANOS; A NÃO SUSPENSÃO DOS PROCEDIMENTOS DE CONTROLO PRÉVIO
SUPORTADOS EM ANTERIOR INFORMAÇÃO PRÉVIA
Uma das questões mais delicadas que a respeito da informação prévia se coloca é
a das consequências da alteração das regras urbanísticas que alicerçaram a sua
emissão, durante o seu período de vigência de um ano, designadamente, em que sentido
deve a câmara municipal decidir do pedido de licenciamento (ou apresentação de
comunicação prévia) baseado em anterior informação prévia favorável à operação
urbanística pretendida, considerando que o prazo de caducidade da informação ainda
não terminou, mas que, entretanto, se verificaram alterações normativas e a consequente
desconformidade regulamentar (ou legal…) – invalidade superveniente - da informação.
Está aqui em causa a problemática da sucessão das normas jurídicas no tempo, perante
a necessidade de regulação de relações não instantâneas, mas que se prolongam no
tempo. É o que sucede com a relação que se constitui com a emissão de uma informação
prévia, se favorável à pretensão apresentada pelo particular, estabelecendo-se uma
250
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 218. 251
Veja-se, quanto a esta questão, o Acordão do STA de 17/04/2008 (P. n.º 0558/07, in
www.dgsi.pt), no qual, diversamente, porque estava em causa norma contendo elemento de vinculação
pessoal da decisão de licenciamento de construção – norma regulamentar que exigia a propriedade do
terreno pelo requerente há mais de dez anos (ou que fosse herdeiro em condições análogas) – se nega a
possibilidade de aproveitamento de informação prévia favorável por terceiro adquirente do terreno que
não preenche tais requisitos (procedimento fraudulento).
118
relação duradoura entre este e a Administração, que se encontra vinculada à pronúncia
emitida durante um ano, e face ao direito adquirido pelo particular ao deferimento de
pedido de licenciamento conforme com essa pronúncia, se o apresentar nesse prazo de
um ano a partir da sua emissão.
O DL n.º 555/99 consagra, no seu artigo 67.º, o princípio do tempus regit actum,
nos termos do qual aos actos de gestão urbanística devem aplicar-se as normas em vigor
no momento da sua prática; prescreve, assim, que “a validade das licenças, admissão
das comunicações prévias ou autorizações de utilização das operações urbanísticas
depende da sua conformidade com as normas legais e regulamentares aplicáveis em
vigor à data da sua prática, sem prejuízo do disposto no artigo 60.º”. Este artigo 60.º
consagra a doutrinalmente apelidada de garantia do existente, nas suas vertentes
passiva (edificações erigidas ao abrigo de lei anterior – confirmação do princípio do
tempus regit actum) e activa (obras de reconstrução/ alteração de edificações erigidas ao
abrigo de lei anterior que se revelam desconformes com as supervenientes regras
urbanísticas – desvio ao princípio do tempus regit actum)252
. Por sua vez, o artigo 68.º
do RJUE dispõe serem nulas as licenças, admissões de comunicações prévias ou
autorizações de utilização que violem plano municipal ou especial de ordenamento do
território, medidas preventivas ou licença de loteamento – alínea a) do referido artigo253
.
A doutrina anterior ao DL n.º 555/99 - e restante legislação reformadora do
sistema urbanístico e de ordenamento do território português, designadamente, a Lei de
Bases do Ordenamento do Território e do Urbanismo – Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto,
e o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial – DL n.º 380/99, de 22 de
Setembro - assumia a protecção do direito do particular constituído pela informação
prévia favorável como muito forte, vinculando a câmara a respeitar o conteúdo da
informação prévia prestada, na decisão sobre pedido de licenciamento formulado dentro
do prazo de um ano de vigência da informação, e mesmo que, entre a data da decisão
sobre o pedido de informação prévia e a data da decisão do pedido de licenciamento,
252
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 396-399. 253
Assim como os actos omissos quanto a aprovação da administração central, estando em
causa determinadas operações urbanísticas, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º, e, ainda, os actos
praticados com omissão da obrigatória consulta prévia a entidades externas ao município, ou
desconformes com as pronúncias emitidas pelas mesmas – alíneas b) e c) do artigo 68.º.
119
entrassem em vigor normas urbanísticas que alterassem o regime até aí vigente na área
em causa254
.
Neste sentido, implicitamente, parece manifestar-se alguma doutrina, já posterior
ao DL n.º 555/99, afirmando constituir um dos objectivos fundamentais do pedido de
informação prévia “definir o quadro de referência que vai reger a “formatação” dos
procedimentos de controlo prévio”255
, ou apresentando como vantagem conferida ao
interessado, pela informação prévia favorável, a salvaguarda “contra vicissitudes do
plano”256
. Entendemos ser esta a solução que a priori se assume como consentânea com
o carácter constitutivo de direitos e efeito vinculativo da Administração cometidos à
informação prévia.
A este respeito destacam-se as considerações tecidas por FERNANDA PAULA
OLIVEIRA, que tem vindo a abordar a questão em vários escritos, no mais recente
deles a propósito da inserção, em alguns planos directores municipais, de disposições
que salvaguardam, expressamente, determinadas preexistências à sua elaboração,
designadamente direitos ou expectativas legalmente protegidos durante o período da
sua vigência, por exemplo os decorrentes de informação prévia favorável (tal como
decorrentes de aprovações de projectos de arquitectura, entre outras situações)257
. A
Autora afirma a legalidade de tais disposições, contrariando os argumentos aduzidos em
sentido contrário, fundamentando-as, desde logo, na imposição constitucional e legal de
ponderação de todos os interesses públicos e privados co-envolvidos no planeamento,
que exige a tomada em consideração de todas as situações existentes à data de
elaboração (ou revisão) do plano, existentes fáctica ou juridicamente – “situações
tituladas por actos administrativos constitutivos de direitos ainda não concretizadas ou
254
Cfr., ao abrigo do DL n.º 445/91, ANTÓNIO DUARTE DE ALMEIDA e outros, ob. cit., pp.
829-830. 255
Cfr. JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., pp. 86-87. 256
Assim como “contra diferentes apreciações de base autónoma (discricionariedade,
qualificação segundo conceitos indeterminados)”, cfr. ANDRÉ FOLQUE, ob. cit., pp. 224-225. No
mesmo sentido, FREITAS DO AMARAL, que afirma a informação prévia como garantia do seu
destinatário “contra as alterações supervenientes da regulação urbanística ou dos critérios de decisão
dos órgãos administrativos”. Cfr. Curso…, ob. cit., p. 263. 257
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, A regulamentação de situações intertemporais pelos
planos directores municipais, in Revista de Direito Público e Regulação, CEDIPRE, Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra, n.º 2, Julho de 2009, pp. 41-42. A Autora reporta-se, concretamente,
ao Plano Director Municipal da Maia, aprovado pela Assembleia Municipal em 18 de Dezembro de 2008,
publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 17, de 26 de Janeiro de 2009 (Aviso n.º 2383/2009), e
cujo n.º 2 do artigo 6.º prescreve: “São também consideradas preexistências, nos termos e para efeitos do
disposto no número anterior, os direitos ou expectativas legalmente protegidos durante o período da sua
vigência, considerando-se como tal, para efeitos do presente regulamento, os decorrentes de alienações
em hasta pública, de aprovações de projectos de arquitectura e de informação prévia favoráveis”.
120
por pré-decisões que, não obstante não seja consensual o seu carácter constitutivo de
direitos, se aceita que, no mínimo, são criadoras de legítimas expectativas dignas de
tutela no plano director municipal”. Assim, tais cláusulas de salvaguarda genérica
terão que considerar-se legítimas quando, da ponderação efectuada pela Administração,
se conclua serem os benefícios da sua afectação, para o modelo territorial visado com o
plano, manifestamente inferiores aos prejuízos decorrentes para a esfera jurídica dos
particulares, que seria, em caso de solução contrária, desproporcionalmente afectada –
princípio da proporcionalidade - mesmo considerando a atribuição de eventuais
indemnizações. Além de consagradoras de um regime especial, estas normas visam
regular a própria aplicação no tempo dos planos, tarefa a que estes, como normas
jurídicas que são, não estão impedidos de proceder, devendo o recurso à máxima geral
do direito do urbanismo do tempus regit actum limitar-se aos casos de silêncio do plano,
no que à sua aplicação temporal diz respeito. Diversamente, a falta de ponderação, pelo
plano, de todas as situações existentes é que contenderia com a validade do mesmo,
violada a supracitada imposição constitucional de ponderação de interesses e direitos
pré-existentes.258
Acrescenta a Autora que, embora considerando o momento da perfeição do acto
como determinante da norma aplicável, há que atender aos procedimentos
administrativos em que se verifica um momento autónomo de antecipação da formação
da decisão administrativa, conferindo-se, desde logo, ao interessado, uma posição
jurídica que o acto final do procedimento apenas formaliza, situação que não pode ser
posta em causa pela superveniência de normas diversas, no decurso do procedimento.
Pelo que o plano não pode aplicar-se a actos de gestão urbanística que, anteriormente,
embora de forma parcial, definiram, definitivamente, pretensões urbanísticas – situações
juridicamente consolidadas antes da sua entrada em vigor, como sejam as informações
prévias e as aprovações de projectos de arquitectura.259
Isto aplicando os princípios
gerais, nos termos supracitados, na ausência, portanto, de disposição especial do plano.
Se a opção do plano for pela afectação dos actos administrativos constitutivos de
direitos (incluindo os actos prévios referidos) emitidos antes da sua entrada em vigor,
258
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, A regulamentação…, cit., pp.45-48. 259
Cfr. idem, ibidem, pp. 48-49.
121
tal implica o pagamento de indemnização, nos termos do artigo 143.º do RJIGT260
-
situações doutrinalmente apelidadas de expropriações do plano ou de sacrifício261
.
Esquematizando o raciocínio expendido por FERNANDA PAULA
OLIVEIRA262
, a alteração das regras urbanísticas (designadamente, planos municipais
de ordenamento do território, mas igualmente normas regulamentares de outro tipo,
como medidas preventivas), conformadoras de anterior informação prévia favorável
vigente (e validamente concedida) tem como efeito:
A não afectação daquela decisão anterior pelas novas regras urbanísticas, como
regra geral, face à sua configuração como acto administrativo constitutivo de
direitos; ou
A afectação da anterior informação prévia, ou seja, a sua desconsideração
aquando da decisão de posterior pedido de licenciamento sobre a mesma
pretensão urbanística, atendendo-se às novas regras entretanto entradas em
vigor, desde que: tal opção seja normativa e expressamente consagrada,
designadamente tratando-se de plano municipal de ordenamento do território
elaborado ou revisto; e tal opção resulte da ponderação obrigatória de todos os
interesses em jogo no planeamento – interesses privados na manutenção das
situações juridicamente consolidadas na informação prévia e interesse público
no não pagamento de indemnizações pela afectação dessas posições inferiores
ao interesse público da concretização de um novo modelo de planeamento,
através das novas regras, devendo este resultado ser, igualmente, expresso no
próprio plano; e, ainda, indemnização dos titulares de informação prévia
favorável vigente, pela afectação da situação juridicamente consolidada.
Note-se, contudo, a conveniência da salvaguarda expressa, no plano, das
informações prévias favoráveis vigentes, tal como assume FERNANDA PAULA
260
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, A regulamentação…, cit., p. 50. 261
Cfr. F. ALVES CORREIA, Manual de Direito do Urbanismo, Vol. I, 4.ª edição, Almedina
2008, p. 764 e ss. 262
Cfr., além do texto da Autora que vimos citando, FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Quem
dá pode voltar a tirar….? Novas regras de ordenamento e direitos adquiridos, in Revista do CEDOUA,
n.º 13, Ano VII, 1.2004, pp. 158-159; Anotação…, cit., pp. 109-110; e O novo Regime…, cit., p. 44.
122
OLIVEIRA263
, face à controvérsia dogmática gerada em torno da figura, evitando-se
situações de dúvida, e, sobretudo, assegurando-se a constitucionalmente prescrita
ponderação de interesses subjacente ao planeamento, objectivo a que não será alheia a
prescrição da Portaria n.º 138/2005, de 2 de Fevereiro (elementos que acompanham os
planos municipais), que exige a indicação das informações prévias em vigor em
relatório e/ ou planta que acompanhe o plano director municipal, o plano de urbanização
e o plano de pormenor – alíneas c) dos artigos 1.º, 2.º e 3.º da Portaria, respectivamente.
Entendemos ser a posição da Autora consentânea com a natureza de acto
administrativo constitutivo de direitos da informação prévia.264
A solução da não
afectação da informação prévia favorável e em vigor pela alteração das normas
regulamentares parece, também, decorrer da previsão do n.º 4 do artigo 17.º do RJUE,
nos termos do qual os procedimentos de licenciamento ou comunicação prévia, relativos
a áreas a abranger por novas regras, não se suspendem se instruídos com informação
prévia, no período entre o início da discussão pública até à entrada em vigor dos planos
municipais ou especiais de ordenamento do território – excepção aos artigos 12.º-A do
RJUE e 117.º do RJIGT265
. Note-se, ainda, o n.º 6 do artigo 107.º do RJIGT, segundo
o qual se excluem do âmbito de aplicação das medidas preventivas (estabelecidas em
áreas abrangidas por elaboração, alteração ou revisão de plano municipal em curso),
além das acções validamente autorizadas antes da sua entrada em vigor, igualmente as
acções em relação às quais exista já informação prévia favorável válida, a não ser que,
tal acção prejudique grave e irreversivelmente as finalidades do plano (casos
excepcionais), podendo aquela previsão ser afastada (n.º 7), mas mediante a concessão
de indemnização – artigo 116.º, n.º 2 (alíneas a) e b) do mesmo diploma.
263
Cuja falta poderá gerar mesmo, segundo a Autora, a invalidade das normas que ponham em
causa as informações prévias anteriores, por revelarem omissão do referido dever de ponderação; cfr.
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, A regulamentação…, cit., pp. 47 e 48. 264
Questão diversa, igualmente delicada, é a da consequência da adopção novas regras legais
urbanísticas – designadamente, o estabelecimento por lei de novas servidões administrativas ou restrições
de utilidade pública, – sobre as informações prévias favoráveis em vigor. Parece-nos incontornável a sua
afectação, contudo, tal situação deve contabilizada para efeitos de indemnização decorrente da servidão
ou restrição. 265
Note-se, contudo, a incongruência da disposição, relativamente ao regime da suspensão dos
procedimentos constante do artigo 117.º do RJIGT (para o qual remete o artigo 12.º-A do RJUE), nos
termos do qual tal suspensão tem um prazo máximo de 150 dias (n.º 3). Cfr. FERNANDA PAULA
OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 231.
123
9.1 – A INDEMNIZAÇÃO PELO SACRIFÍCIO
ALVES CORREIA engloba a afectação de informação prévia em vigor por novas
regras de plano municipal (ou especial) de ordenamento do território nos casos que
denomina de expropriações do plano ou expropriações de sacrifício – “restrições
significativas de efeitos equivalentes a expropriação, a direitos de uso do solo
preexistentes e juridicamente consolidados”, na formulação do n.º 2 do artigo 18.º da
LBPOTU266
. Esta disposição prescreve o dever de indemnizar sempre que tal efeito
resulte de instrumento de gestão territorial vinculativo dos particulares, e não possa
recorrer-se a mecanismos de perequação compensatória – carácter subsidiário da
indemnização (n.º 1 do artigo 18.º e artigo 143.º, n.º 1 do RJIGT). Está, assim, em causa
o princípio da igualdade perante encargos públicos. O artigo 143.º do RJIGT concretiza
aquela previsão da Lei de Bases, determinando o seu n.º 2 serem indemnizáveis as
―restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo,
preexistentes e juridicamente consolidadas, que comportem uma restrição significativa
na sua utilização de efeitos equivalentes a uma expropriação”; sendo, por sua vez, as
restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo resultantes
de revisão dos instrumentos de gestão territorial indemnizáveis apenas quando “a
revisão ocorra dentro do período de cinco anos após a sua entrada em vigor,
determinando a caducidade ou a alteração das condições de um licenciamento prévio
válido” – n.º 3.
É na fórmula de “restrições singulares às possibilidades objectivas de
aproveitamento do solo juridicamente consolidadas” que a doutrina enquadra as
situações de existência de informação prévia favorável, como acto constitutivo do
direito ao licenciamento ou admissão da comunicação prévia267
.
Quanto aos casos de modificações dos planos prescritos pelo n.º 3, face à falta de
clareza do preceito, FERNANDA PAULA OLIVEIRA assume os requisitos prescritos
como não cumulativos, havendo lugar a indemnização por revisão, alteração ou
suspensão de um plano quando tais situações ocorram dentro do período de cinco anos
desde a sua entrada em vigor, independentemente da titularidade de licença pelo
particular (restrição de carácter antecipado de possibilidades urbanísticas previstas em
266
Cfr. F. ALVES CORREIA, Manual…, ob. cit., pp. 764 e ss, designadamente a p. 771. 267
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Reflexão sobre algumas questões práticas no âmbito
do Direito do Urbanismo, in Volume Comemorativo do 75.º Tomo do BFD, Coimbra, 2003, p. 968.
124
anterior plano), ou quando aquelas alterações determinem a caducidade ou a alteração
das condições de um prévio licenciamento válido, ou ponham em causa direito
constituído por outro acto, designadamente quando existe uma informação prévia
favorável, independentemente do tempo decorrido desde a entrada em vigor do plano –
situações distintas, mas que espelham, ambas, a ideia de protecção da confiança
legítima que os administrados depositam na actuação da Administração268
.
Entendemos que o direito à indemnização do particular beneficiário de
informação prévia favorável, decorrente da alteração das normas do plano, deve
efectivar-se aquando do requerimento, posterior à alteração normativa, portanto, do
licenciamento da operação urbanística objecto da informação prévia. Questão esta
acerca da qual a doutrina diverge, propendendo nós no sentido exposto face à
consideração do direito resultante da informação prévia favorável como direito
condicionado à verificação dos pressupostos anteriormente definidos, e à previsão
expressa, no n.º 5 do artigo 143.º do RJIGT, da indemnizabilidade das “despesas
efectuadas na concretização de uma modalidade de utilização prevista no instrumento
de gestão territorial vinculativo dos particulares se essa utilização for posteriormente
alterada ou suprimida por efeitos de revisão ou suspensão daquele instrumento e essas
despesas tiverem perdido utilidade”, enquadrando-se aqui as despesas suportadas pelo
particular com o requerimento do licenciamento, designadamente com a elaboração do
projecto de arquitectura. Embora a tais argumentos possa logicamente contrapôr-se a
falta de sentido de ficcionar a intenção de realização de uma operação urbanística que
não se pretende, verdadeiramente, efectivar, ou que se sabe, à partida, que não poderá
concretizar-se…269
268
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Reflexão…, cit., pp. 968-970. Diversamente,
assumindo tais requisitos como cumulativos, F. ALVES CORREIA, Manual…, ob. cit., pp. 781 e ss. 269
É esta a solução que F. ALVES CORREIA avança em relação a tal questão; em sentido
contrário, FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Anotação…, cit., p. 116, nota 9, dando conta de ambas as
posições.
125
10 – A POSSIBILIDADE DE “RENOVAÇÃO” DA INFORMAÇÃO PRÉVIA
A grande novidade da Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, que introduziu
alterações ao DL n.º 555/99, de 16 de Dezembro (RJUE), no que à informação prévia
diz respeito, foi a inédita previsão da possibilidade de ―renovação” da informação
prévia favorável caducada. Assim, nos termos do actual n.º 3 do artigo 17.º do RJUE,
“decorrido o prazo fixado no número anterior, o particular pode requerer ao
presidente da câmara a declaração de que se mantêm os pressupostos de facto e de
direito que levaram à anterior decisão favorável, devendo o mesmo decidir no prazo de
20 dias e correndo novo prazo de um ano para efectuar a apresentação dos pedidos de
licenciamento ou de comunicação prévia se os pressupostos se mantiverem ou se o
presidente da câmara municipal não tiver respondido no prazo legalmente previsto”.
Significa esta norma que, decorrido o prazo de caducidade de um ano prescrito
pelo n.º 2 do artigo 17.º para a informação prévia favorável, pode esta continuar a
produzir os efeitos para que tende por mais um ano, ou seja, o particular dispõe de mais
um ano para requerer o pedido de licenciamento ou apresentar a comunicação prévia,
tendo o direito ao deferimento ou admissão da mesma, se conforme com a anterior
informação prévia. Isto desde que se verifiquem os seguintes requisitos:
Requerimento, ao presidente da câmara, dessa renovação, pelo particular;
Manutenção dos pressupostos de facto que conduziram à anterior informação
prévia favorável (incluindo aqui a doutrina a não alteração das rotinas de
apreciação da Administração e a aprovação de operações urbanísticas que
possam influenciar o objecto de apreciação270
);
Manutenção dos pressupostos de direito que alicerçaram a anterior informação –
regras legais e regulamentares aplicáveis;
Declaração das entidades externas ao município, que se pronunciaram no âmbito
da anterior informação, de que se mantêm os pressupostos de facto e de direito
subjacentes à sua pronúncia (relativamente às matérias da sua competência) –
necessidade de confirmação dos anteriores pareceres, autorizações ou
aprovações, prevenindo situações de ilegalidade da informação prévia favorável
renovada, confirmação que não consta expressamente da lei, mas que a doutrina
270
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 232.
126
adianta dever ser solicitada pelo presidente da câmara àquelas entidades. Isto
porque, note-se, embora não esteja aqui em causa uma reapreciação da anterior
informação favorável271
, mas apenas o reconhecimento da manutenção dos
pressupostos de facto e de direito que a alicerçaram, esta constatação
determina automaticamente a prorrogação dos efeitos da anterior informação
favorável, e uma vez que o presidente da câmara não dispõe dos dados
necessários para avaliar dos pressupostos determinantes das pronúncias
externas, incidentes normalmente sobre legislação sectorial, matérias fora do
âmbito da sua competência272
;
Que a informação prévia favorável não tenha sido já anteriormente renovada –
posição que explicitaremos infra.
Esta renovação pode ser expressa – declaração do presidente da câmara, ou tácita,
caso aquele não se pronuncie dentro do prazo de 20 dias que a lei lhe concede para o
efeito. Entendemos, no entanto, ser aqui aplicável o n.º 1 do artigo 16.º, equiparando-se
a renovação da informação prévia favorável à deliberação sobre o pedido de informação
prévia para efeitos da contagem do prazo para a declaração, devendo, assim, aqueles 20
dias contar-se a partir da confirmação das entidades externas, ou do termo do prazo para
a mesma, pois, caso assim não se considere, e face à omissão legal, inviabiliza-se essa
confirmação, necessária para uma efectiva renovação da informação favorável273
.
Por sua vez, o novo prazo de vigência da informação prévia favorável, de um ano,
deve contar-se a partir do deferimento do pedido de renovação - declaração favorável,
de manutenção dos pressupostos de facto e de direito que alicerçaram a anterior
informação, do presidente da câmara, - ou a partir do termo do prazo para tal declaração
– renovação tácita da informação favorável. Em caso de declaração desfavorável ao
271
O que implica que a câmara municipal não possa alterar opções discricionárias assumidas na
anterior informação prévia. 272
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., p. 153; e FERNANDA PAULA
OLIVEIRA e outros, ob. cit., pp. 232-233. 273
E deve, da mesma forma, recorrer-se, na medida do necessário e com as necessárias
adaptações, aos artigos 13.º a 13.º-B, para conformação dos termos em que deve efectuar-se a consulta
para confirmação de anteriores pareceres, designadamente quanto ao prazo para confirmação de que
dispõem as entidades externas – 20 dias, nos termos do n.º 4 do artigo 13.º, verificando-se confirmação
tácita na ausência de resposta tempestiva. Este problema da exiguidade do prazo para renovação da
informação prévia favorável, face à eventual necessidade de solicitar confirmação de anteriores pareceres
a entidades externas, é, desde logo, identificado por FERNANDA PAULA OLIVEIRA no seu citado
comentário de 2007, Que direitos…, cit., p. 153; e FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit.,
pp. 232-233.
127
pedido de renovação – indeferimento do pedido face à alteração dos pressupostos de
facto ou de direito que basearam a anterior informação favorável, considera-se esta
automaticamente caducada, deixando a informação, portanto, de produzir os seus
efeitos.
Note-se, ainda, que a lei não fixa um prazo máximo para requerer a renovação da
informação prévia, esgotado o seu prazo de caducidade274
, contudo, o protelamento
desse pedido acabará por esvaziá-lo de sentido, determinando a sua inutilidade para o
beneficiário da informação, já que será maior a probabilidade de terem ocorrido,
entretanto, alterações de facto ou de direito que inviabilizem a renovação.
Por fim, quanto à possibilidade de renovação sucessiva de informação prévia
favorável, acerca da qual a lei é omissa, entendemos, aderindo à posição de
FERNANDA PAULA OLIVEIRA, não dever a mesma admitir-se, só podendo aquela
informação ser renovada uma vez275
. A Autora argumenta ser esta a solução mais
consentânea com a natureza original do instituto, de antecipação e garantia
relativamente a ulterior pedido de licenciamento276
-277
, admitindo, no entanto, e face à
descaracterização da figura já operada pelo alargamento da legitimidade para o pedido,
poder ser intenção do legislador permitir a renovação sem limites do pedido de
informação prévia278
. Em nosso entender, não pode admitir-se tal solução, que poderia
redundar em substancial prejuízo para o normal desenvolvimento da actividade
camarária de gestão urbanística, e na transformação da informação prévia em figura
funcionalmente oca, subjugada à sua idoneidade para produzir reflexos económicos/
especulativos no mercado imobiliário.
274
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA e outros, ob. cit., p. 232. 275
Igualmente, de forma implícita, JOÃO PEREIRA REIS e outros, ob. cit., p. 95, referindo-se
ao prazo máximo de dois anos para o particular beneficiário da informação favorável requerer o
licenciamento da operação urbanística visada. 276
Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…, cit., pp. 153-154. 277
E constitui este um dos argumentos aduzidos pela Autora, juntamente com o alargamento da
legitimidade, para a afirmação da transformação da informação prévia, de acto prévio a um procedimento
de licenciamento, em instrumento de confirmação das regras aplicáveis, e sua consequente aproximação
do direito à informação do artigo 110.º do RJUE. Cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Que direitos…,
cit., p. 154. 278
Conclusão expressa na posterior Anotação ao RJUE da co-autoria de FERNANDA PAULA
OLIVEIRA/MARIA JOSÉ CASTANHEIRA NEVES/DULCE LOPES/FERNANDA MAÇÃS, ob. cit.,
p. 233, mas que parte daquele raciocínio exposto pela primeira Autora no citado texto de 2007.
128
V – CONCLUSÕES: A INFORMAÇÃO PRÉVIA COMO ACTO SUI GENERIS
E A SUA RENOVADA IMPORTÂNCIA
1. Na origem do actual pedido de informação prévia urbanística encontra-se a
necessidade social e económica de garantia da viabilidade de realização de operações de
loteamento (e obras de urbanização) e obras particulares, e a consequente prática da
Administração municipal de informar os particulares que se lhe dirigiam acerca de tal
possibilidade.
2. A relevância de tal prática foi assumida pelo legislador, através da sua positivação
nos sucessivos diplomas disciplinadores da actividade de gestão urbanística da
Administração, com variável configuração, designadamente no que à legitimidade para
fazer o pedido de informação diz respeito, assim como à previsão expressa do seu
carácter constitutivo de direitos para o beneficiário.
3. A jurisprudência administrativa e a doutrina assumiram papel de destaque na
concretização do instituto, ao abrigo dos diversos regimes legais aplicáveis, salientando-
se a falta de unanimidade no tratamento dado por ambas à figura, que, contudo,
impulsionou a evolução da sua expressão normativa até ao actual regime.
4. Actualmente, a informação prévia, consagrada nos artigos 14.º a 17.º do RJUE,
afirma-se como acto de gestão urbanística de conteúdo variável, dependendo o seu
carácter conformador do pedido feito pelo interessado, que determina os elementos
abrangidos pela resposta camarária.
5. Tal resposta pode ser favorável (ou favorável condicionada) ou desfavorável à
pretensão apresentada pelo particular, e afirma-se como verdadeiro acto administrativo
(decisão), constitutivo de direitos, sendo favorável, ou acto administrativo negativo, se
desfavorável.
6. As funções de garantia e de economia procedimental que originária e
teleologicamente marcam a informação prévia conduziram à sua concepção pela
doutrina nacional como acto prévio, em relação ao eventual posterior procedimento de
controlo prévio de realização da operação urbanística, que a informação prévia irá
condicionar.
129
7. Assim forçosamente se conclui, perspectivando a figura na sua dimensão funcional;
contudo, a apreciação do seu modelo legal actual, tal como do relevante papel que
assume no domínio do mercado imobiliário, ditam a sua especificidade relativamente
àquela categoria dogmática (e, consequentemente, a sua distinção do acto de aprovação
do projecto de arquitectura): o pedido de informação prévia apresenta-se como
procedimento próprio e autónomo em relação ao posterior procedimento de controlo
prévio, assume-se como uma faculdade, e a lei admite a legitimidade alargada para o
requerer, correspondendo, então, a informação prévia à resposta a uma pretensão ou
interesse autónomo ou próprio, que se distingue da pretensão de efectivação da
operação urbanística.
8. Tal natureza não se esgota, igualmente, na figura da promessa administrativa de
praticar um acto, uma vez que o seu carácter conformador e condicionante do
hipotético ulterior acto de controlo prévio da efectivação da operação urbanística não se
acha na mera dependência da vontade (e conveniência) da Administração se auto-
vincular.
9. A informação prévia favorável constitui na esfera jurídica do beneficiário o direito ao
licenciamento ou admissão de comunicação prévia (rectius, à aprovação do projecto de
arquitectura) da operação urbanística apresentada, desde que tal pedido se conforme
com os termos da informação prévia, seja feito por particular com legitimidade para tal
e no prazo de um ano desde a emissão daquela.
10. Como acto potencialmente decisivo no que aos elementos urbanísticos (de
arquitectura) da operação urbanística diz respeito, a informação prévia é imediatamente
impugnável pelo beneficiário, tal como por terceiros (vizinhos) potencialmente
afectados pela mesma nas suas posições jurídicas.
11. Incontornável é, igualmente, a função de informação que a figura cumpre, dimensão
sempre presente, independentemente do sentido positivo ou negativo da resposta da
câmara municipal, mas que não significa a sua identificação com o instituto da
informação sobre normas urbanísticas em vigor igualmente consagrado no RJUE, do
qual se distingue claramente, quer quanto ao pedido formulado e legitimidade para o
fazer, quer quanto à natureza e efeitos da pronúncia administrativa.
130
12. A imbricação entre ambas as figuras (e sendo a informação prévia uma informação
qualificada) é, no entanto, inegável, e visível na consagração, em ordenamentos
jurídico-urbanísticos estrangeiros, influentes do direito do urbanismo português, de
figuras que reunem características de ambos os institutos – atente-se, nomeadamente, no
certificat d´urbanisme do direito francês, no certificato urbanistico italiano e no
derecho a obtener información escrita do ordenamento urbanístico espanhol.
13. A natureza constitutiva da informação prévia dita a necessidade da sua consideração
e ponderação pela Administração aquando da alteração das normas de planeamento que
a alicerçaram, uma vez que a sua afectação regulamentar superveniente é susceptível de
consubstanciar a doutrinalmente designada expropriação de sacrifício.
14. Por fim, a informação prévia afirma-se como acto sui generis no quadro dos actos
de gestão urbanística, com características específicas e inéditas relativamente aos
restantes actos desse tipo (quer os igualmente não permissivos – aprovação do projecto
de arquitectura, quer os permissivos – licença parcial, licenciamento ou admissão de
comunicação prévia de operações urbanísticas e autorização de utilização de edifício), e
assume-se, actualmente, face à sua ampla conformação pelo RJUE (nomeadamente os
efeitos que lhe são associados), desde a sua versão originária, mas potencializada pelas
alterações da Lei n.º 60/2007, como acto de uma renovada importância no sistema de
gestão urbanística português.
131
BIBLIOGRAFIA
Acordãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo:
- n.º 109, Ano X, Janeiro de 1971, pp. 15-22;
- n.º 139, Ano XII, Julho de 1973, pp. 989-997;
- n.º 182, Ano XVI, Fevereiro de 1977, pp. 1819-1838;
- n.º 286, Ano XXIV, Outubro de 1985, pp. 1048-1055;
- n.º 89, Ano VIII, Maio de 1969, pp. 832-837;
ALEGRE, Carlos, Novo Regime dos Loteamentos Urbanos, Anotado, Rei dos
Livros, 1993;
ALMEIDA, António Duarte de, A natureza da aprovação do projecto de
arquitectura e a responsabilidade pela confiança no Direito do Urbanismo, in
Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 45, Maio/ Junho, 2004, pp. 20-35;
ALMEIDA, António Duarte de/MONTEIRO, Cláudio/CAPITÃO,
Gonçalo/GONÇALVES, Jorge/MARCOS, Luciano/GOES, Manuel
Jorge/VIEIRA, Pedro Siza, Legislação Fundamental de Direito do Urbanismo
Anotada e Comentada, Volume II, Lisboa, Lex, 1994;
ALVES, João Gomes, Natureza jurídica do acto de aprovação municipal do
projecto de arquitectura, Anotação ao Acordão do STA de 5.5.1998, in
Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 17, Set./ Out., 1999, pp. 13-16;
AMARAL, Diogo Freitas do, Direito Administrativo, Volume III, Lisboa, 1989;
AMARAL, Diogo Freitas do, Direito do Urbanismo (Sumários), Lisboa, 1993;
AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 7.ª
reimpressão da edição de 2001, Almedina, 2007;
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Algumas reflexões a propósito da
sobrevivência do conceito de “acto administrativo” no nosso tempo, in Estudos
em Homenagem ao Professor Doutor Rogério Soares, Stvdia Ivridica, 61, Ad
Honorem – 1, Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra Editora, 2001, pp.
1189-1220;
ANDRADE, José Carlos Vieira de, O novo modelo de impugnação judicial dos
actos administrativos – tradição e reforma, in O Acto no Contencioso
Administrativo, Colóquio Luso-Espanhol, Colaço Antunes/Sáinz Moreno
(coordenadores), Almedina, 2005, pp. 189-212;
132
ANDRADE, José Carlos Vieira de, A Justiça Administrativa (Lições), 8.ª edição,
Almedina, 2006;
BOUYSSON, F./HUGOT, J., Code de l´Urbanisme, commenté et annoté, Paris,
Litec, 1996;
CALVÃO, Filipa Urbano, Os actos precários e os actos provisórios no direito
administrativo, Porto, Universidade Católica Portuguesa, 1998;
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Relações jurídicas poligonais, ponderação
ecológica de bens e controlo judicial preventivo, in Revista Jurídica de
Urbanismo e Ambiente, n.º 1, Junho 1994, Almedina, pp. 55-66;
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Anotação ao Acordão do STA de 28 de
Setembro de 1989, in Revista de Legislação e Jurisprudência, 124.º Ano, n.º
3813, 1991-1992, Coimbra Editora, 1992, pp. 359-365;
CORDEIRO, António, A protecção de terceiros em face de decisões
urbanísticas, Almedina, 1995;
CORDEIRO, António, Arquitectura e Interesse Público, Almedina, 2008;
CORREIA, Fernando Alves, As Grandes Linhas da Recente Reforma do Direito
do Urbanismo Português, reimpressão, Almedina, 2000;
CORREIA, Fernando Alves, Estudos de Direito do Urbanismo, Almedina, 1998;
CORREIA, Fernando Alves, Manual de Direito do Urbanismo, Volume I, 4.ª
edição, Almedina, 2008;
COSTA, António Pereira da, Regime Jurídico de Licenciamento de Obras
Particulares, Anotado, Coimbra Editora, 1993;
CUNHA, Júlio Pereira da, Regime de Licenciamento de obras particulares e de
operações de loteamento e obras de urbanização, Anotado, 2.ª edição, revista e
actualizada, Edição da Atam, 1993;
DIAS, José Eduardo Figueiredo, O Recurso Contencioso de Anulação em
Matéria Urbanística: tempestividade, legitimidade e natureza da relação
jurídica controvertida, in Revista do CEDOUA, n.º 6, Ano III, 2.2000, pp. 93-
110;
FERREIRA, Maria do Patrocínio Paz/OLIVEIRA, Luís Perestrelo de, O novo
regime jurídico dos loteamentos urbanos, Decreto-Lei n.º 400/84, de 31 de
133
Dezembro Anotado, Direcção Geral do Planeamento Urbanístico, Almedina,
1985;
FOLQUE, André, Curso de Direito da Urbanização e da Edificação, Coimbra
Editora, 2007;
GOMES, José Osvaldo, Manual dos Loteamentos Urbanos, Atlântida Editora,
1980;
GOURIO, Alain, Intervention – Deuxième Table Ronde sur “Sécurité Juridique
des Constructeurs et Certificat d´Urbanisme”, in Droit et Ville, l´Institut des
Études Juridiques de l´Urbanisme et de la Construction, n.º 31, Ville de
Toulouse, Université des Sciences Sociales de Toulouse, 1991, pp. 57-58;
ESTÉVEZ GOYTRE, Ricardo, Manual de Derecho Urbanístico, cuarta edición,
Granada, Comares/ Urbanismo, 2005;
JACQUOT, Henri, Sécurité Juridique des Constructeurs et Certificat
d´Urbanisme, in Droit et Ville, l´Institut des Études Juridiques de l´Urbanisme et
de la Construction, n.º 31, Ville de Toulouse, Université des Sciences Sociales
de Toulouse, 1991, pp. 43-56;
MAURER, Hartmut, Direito Administrativo Geral, 14.ª edição revisada e
complementada, tradução de Luís Afonso Heck, Barueri, São Paulo, Manole,
2006;
MAURER, Hartmut, Manuel de Droit Administratif Allemand (Allgemeines
Verwaltungsrecht), tradução de Michel Fromont, L.G.D.J., Paris, 1994;
MIRANDA, Jorge/MEDEIROS, Rui, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo
III, Coimbra Editora, 2007;
OLIVEIRA, Alberto Augusto Andrade de, Código do Procedimento
Administrativo Alemão, Tradução e Notas, Livraria da Universidade, Coimbra;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, “Que direitos me dás, que direitos me recusas?” –
Reflexão em torno da questão da impugnabilidade das informações prévias
desfavoráveis, in Revista do CEDOUA, n.º 20, Ano X, 2.2007, pp. 141-160;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, A alteração legislativa ao Regime Jurídico da
Urbanização e Edificação: uma lebre que saiu gato…?, in Revista de Direito
Regional e Local, n.º 0, Out./ Dez., 2007, pp. 53-70;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, A regulamentação de situações intertemporais
pelos planos directores municipais, in Revista de Direito Público e Regulação,
134
Centro de Estudos de Direito Público e Regulação, Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, n.º 2, Julho de 2009, pp. 41-55;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, Anotação ao Acordão do STA de 20.06.2002, in
Revista do CEDOUA, n.º 10, Ano V, 2.2002, pp. 97-117;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, As Garantias dos Particulares no RJUE, in O novo
RJUE, J.M. Sérvulo Correia e outros, Lisboa, Lex, 2002, pp. 113-136;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, As licenças de construção e os direitos de natureza
privada de terceiros, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Rogério
Soares, Stvdia Ivridica, 61, Ad Honorem – 1, Boletim da Faculdade de Direito,
Coimbra Editora, 2001, pp. 991-1048;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, Duas questões no direito do urbanismo:
aprovação do projecto de arquitectura (acto administrativo ou acto
preparatório?) e eficácia de alvará de loteamento (desuso?), in Cadernos de
Justiça Administrativa, n.º 13, Jan./ Fev., 1999, pp. 42-57;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, O Novo Regime Jurídico da Urbanização e
Edificação, A Visão de um Jurista, in Revista do CEDOUA, n.º 8, Ano IV,
2.2001, pp. 35-52;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, Quem dá, pode voltar a tirar…? Novas regras de
ordenamento e direitos adquiridos, in Revista do CEDOUA, n.º 13, Ano VII,
1.2004, pp. 141-163;
OLIVEIRA, Fernanda Paula, Reflexão sobre algumas questões práticas no
âmbito do Direito do Urbanismo, in Volume Comemorativo do 75.º Tomo do
Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra, 2003, pp. 934-976;
OLIVEIRA, Fernanda Paula/NEVES, Maria José Castanheira/LOPES,
Dulce/MAÇÃS, Fernanda, Regime Jurídico da Urbanização e Edificação
Comentado, 2.ª edição, Almedina, 2009;
OLIVEIRA, Fernanda Paula/GONÇALVES, Pedro, A Nulidade dos Actos
Administrativos de Gestão Urbanística, in Revista do CEDOUA, n.º 3, Ano II,
1.1999, pp. 17-46;
OLIVEIRA, Fernanda Paula/PASSINHAS, Sandra, Loteamentos e Propriedade
Horizontal: guerra e paz!, in Revista do CEDOUA, n.º 9, Ano V, 1.2002, pp. 45-
77;
135
OLIVEIRA, Mário Esteves de/OLIVEIRA, Rodrigo Esteves de, Código do
Procedimento nos Tribunais Administrativos Comentado, Volume I, Almedina,
2004;
OLIVEIRA, Mário Esteves de/GONÇALVES, Pedro Costa/AMORIM, João
Pacheco de, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª edição,
Almedina, 2005;
REIS, João Pereira/LOUREIRO, Margarida/LIMA, Rui Ribeiro, Regime
Jurídico da Urbanização e da Edificação, Anotado, 3.ª edição revista e
actualizada, Almedina, 2008;
SARDINHA, José Miguel, O Novo Regime Jurídico das Operações de
Loteamento e de Obras de Urbanização, Comentado e Anotado, Coimbra
Editora, 1992;
SÈVES, António Lorena de, A Protecção Jurídico-Pública de Terceiros nos
Loteamentos Urbanos e Obras de Urbanização, in Revista do CEDOUA, n.º 2,
Ano I, 2.1998, pp. 51-87;
SILVA, Vasco Pereira da, Em Busca do Acto Administrativo Perdido,
reimpressão, Colecção Teses, Almedina, 2003;
SOARES, Rogério Ehrhardt, Direito Administrativo (Lições), Coimbra,
policopiado, 1978;
TORRES, Mário, Ainda a (in)impugnabilidade da aprovação do projecto de
arquitectura, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 27, Maio/ Junho 2001;
TREMEAU, Jérôme, Le certificat d´urbanisme, un an après - La réforme des
autorisations d´urbanisme un an après: premier bilan, in Droit de
L´Aménagement, de l´Urbanisme, de l´Habitat, Groupement de Recherche sur
les Institutions et le Droit de l´Aménagement, de l´Urbanisme et de l´Habitat,
Paris, Editions Le Moniteur, 2009;
VIRGA, Pietro, Diritto Amninistrativo, I principi, 1, terza edizione riveduto e
aggiornata, Milano, Giuffrè editore, 1993;
WOLFF, Hans J./BACHOF, Otto/STOBER, Rolf, Direito Administrativo,
Volume I, (Verwaltungsrecht, Vol. I), 11.ª edição revista, 1999, tradução de
António F. de Sousa, Fundação Calouste Gulbenkian, Julho 2006;
www.dgsi.pt.
136