A INTERFERÊNCIA DA ORALIDADE NA ESCRITA
EM REDAÇÕES ESCOLARES
Aline Suzart Moreira
Ana Paula Espírito Santo Paim
Fabiana Prudente Correia
Ligia Pellon de Lima Bulhões
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A relação entre a fala e a escrita está documentada em textos de todas as épocas.
Entretanto, até meados do século XX, esta relação não era discutida nos círculos de estudos
linguísticos, que valorizavam a língua como sistema. Os estudos linguísticos contemporâneos,
por seu turno, apropriam-se de uma visão contínua e processual das relações entre língua
escrita e língua falada, considerando que a língua é definida pelos usos que se fazem dela.
Os usos de uma língua, por seu turno, configuram-se como caracterizadores dos mais
diversos grupos sociais marcados pelos diferentes usos de uma língua. Cagliari (1991)
considera que os modos diferentes de falar acontecem porque as línguas são um fenômeno
dinâmico, isto é, estão sempre em evolução. Pelos usos diferenciados ao longo do tempo e nos
mais diversos grupos sociais, as línguas passam a existir como um conjunto de falares
diferentes, todos semelhantes entre si, porém cada qual apresentando suas peculiaridades com
relação a alguns aspectos linguísticos.
Nessa perspectiva, a criança, ao dar início ao seu processo de alfabetização, já domina
a fala do seu grupo social e pode ser considerada uma falante nativa com domínio da língua.
De modo sucinto, Lima (2000) esclarece que “a fala é anterior à escrita. Todo ser humano,
dentro das suas normalidades, tem a capacidade de falar. Já a escrita é adquirida, não sendo,
pois, de acesso a todos.” Dessa forma, durante o processo de aquisição da linguagem escrita,
crianças e adultos levam para a sala de aula toda a experiência que têm com a oralidade. Além
disso, convivem com usos diferenciados de escrita que encontram-se presentes na sociedade.
Convivem, assim, com a interferência da atividade linguística oral e com os vários tipos de
produção escrita que estão em sua volta.
Conforme Olson e Torrance (1995), “nas sociedades de cultura escrita, o discurso oral
cerca e condiciona os usos do texto escrito”. Nas instituições de ensino brasileiras, a aquisição
da língua escrita tem-se constituído um grande desafio para educadores e educandos. De fato,
a realidade escolar tem revelado, como afirma Lima (2000), que “grande contingente de
alunos são excluídos da escola, no início mesmo da alfabetização, por apresentarem
resultados insuficientes no domínio da leitura e escrita”.
Considerando a língua oral e a escrita como duas instâncias diferentes da linguagem
que, por sua vez, apresentam características próprias, o presente trabalho propõe analisar
algumas produções escritas de alunos, verificando a existência de traços da língua oral que
revelam o processo de aquisição da língua em sua modalidade escrita. Através de redações
escolares, é possível identificar características da língua oral em diversos níveis – fonéticos,
lexicais, morfológicos e sintáticos – representadas na escita.
2 FENÔMENOS LINGUÍSTICOS DOCUMENTADOS EM REDAÇÕES
O texto, documento de um estado de língua, é portador de marcas que possibilitam
ao linguista o estudo da língua vernacular, determinada pelos usos que se fazem dela.
Utilizando a Linguística para analisar a língua manifestada no texto, estudam-se, nesse
trabalho, os fenômenos linguísticos que revelam a “transposição dos hábitos da fala para a
escrita” (BORTONI-RICARDO, 2005, p.54). Para tanto, o presente trabalho conta com a
observância um corpus marcado pela sua heterogeneidade: consiste em cinco redações de
uma escola particular, com ensino regular, tendo os alunos do sexo masculino e feminino
entre 13 e 15 anos. Além disso, tomaram-se dez produções escritas por alunos do Serviço
Social da Indústria (SESI), em turma de nível médio para jovens e adultos, com idade superior
a 20 anos. Ambas as instituições estão estabelecidas na cidade de Salvador, capital da Bahia.
Embora as redações apresentem, em sua maioria, alternâncias da representação
gráfica dos fonemas, possivelmente devido à arbitrariedade do sistema linguístico (cujo ideal
seria que cada fonema representasse uma só letra e vice-versa), tais casos não foram
considerados nesta análise que, tomando como suporte teórico-metodológico o trabalho
desenvolvido por Bortoni-Ricardo (2005, p.54), diferencia os “erros decorrentes da própria
natureza arbitrária do sistema de convenções da escrita” dos “erros decorrentes da
transposição dos hábitos da fala para a escrita”, ocupando-se apenas da segunda categoria.
O quadro abaixo evidencia os fenômenos apresentados nos textos estudados,
indicando o processo fonológico a que correspondem. (esqueça isso)