Alterações da Articulação:
Dislália
(3-6 anos)
Informação para Pais e outros Educadores
Autora: Liliana NunesOrientação e Revisão: Dra. Ana Oliveira
A LINGUAGEM VERBAL
Entende-se que a Linguagem verbal é a forma que o indivíduo utiliza mais frequentemente.
Apesar de existirem mais tipos de linguagem, e por isso, mais formas de representar, expressar
e comunicar o que é pensado e sentido, é por excelência a mais complexa que recorre a sinais
acústicos e gráficos.
A forma como se dá a evolução da linguagem numa criança, vai com toda a certeza ser
determinante para aquisições mais complexas. Nesse sentido, é importante que os pais e outros
intervenientes na educação da criança, tenham conhecimento de como a linguagem evolui para
estar alerta (no caso de haver alguma anomalia); e que conheçam algumas estratégias e
actividades que possam prevenir, reduzir ou eliminar os problemas deste foro.
EVOLUÇÃO DA LINGUAGEM DAS CRIANÇAS DOS 3 AOS 6 ANOS
Aos 3 anos
- Têm uma Linguagem compreensível;
- Usam orações;
- Começam a diferenciar tempos e modos verbais;
- Perguntam constantemente “Porquê?”;
- Usam artigos e pronomes;
- Começam a utilizar o singular e o plural.
Aos 4 anos
- Melhoram a construção gramatical, fazem conjugações verbais e articulações fonéticas;
- Utilizam nexos;
- Jogam com as palavras;
- Passam pela fase do monólogo individual e colectivo.
Dos 5 aos 6 anos
- Progridem a nível do raciocínio;
- Compreendem termos de comparação;
- Compreendem os contrários;
- Conseguem estabelecer semelhanças, diferenças e noções espaciais;
- Já não têm articulação infantil;
- Fazem construções gramaticais de forma correcta;
- Usam a linguagem social.
¯ Nota: No caso da criança não realizar uma algumas das habilidades anteriormente
apresentadas, não é motivo de preocupação. O que acontece é que todas as crianças são
diferentes dada a herança genética e dado o meio que a envolve (que vai influenciar o seu
desenvolvimento), e por isso é bem possível que existam alguns bebés que fazem algumas
habilidades antes do tempo aqui apresentado ou mesmo depois.
ALTERAÇÕES DA ARTICULAÇÃO
A dislália é uma perturbação na articulação dos fonemas, por omissão ou alteração de alguns
sons, ou pela sua substituição por outros de forma improcedente. Esta disfunção, por se
caracterizar através da omissão, substituição ou distorção dos fonemas, pode ser catalogada em
simples, múltipla, e generalizada, assim sendo são passíveis de distinção três grupos diferentes
de dislália:
- Dislália evolutiva- relacionada com a evolução da linguagem durante o desenvolvimento da
criança (não sendo de carácter patológico);
- Dislália orgânica- referente aos transtornos da linguagem que são motivados por uma causa
orgânica; ela pode classificar-se em três formas diferentes de acordo com a sua etiologia:
1. dislália audiógena, se o problema estiver relacionado com uma perda auditiva
2. disglósia, se houver lesões físicas ou se houver alguma má formação nos órgãos periféricos
da linguagem;
3. disartria, que é uma perturbação da fala caracterizada por uma descoordenação entre a
respiração, a articulação, o vozeamento, a ressonância e a entoação e que surge como
consequência de um défice neuro-muscular.
- Dislália funcional- deve ser encarada como uma disfunção para a qual não se encontra
nenhuma alteração orgânica que lhe possa ser atribuída. Podem surgir aspectos como a
escassa mobilidade motora oro-facial; perturbação na respiração ou até mesmo tonicidade
demasiado elevada ou demasiado baixa.
ACTIVIDADES E ESTRATÉGIAS
De seguida, serão apresentadas actividades e estratégias que se podem fazer em diversos
contextos. Entenda que se tratam apenas de exemplos, isto é, não são as únicas actividades e
estratégias para esta problemática, e que por isso podem servir de modelo e até mesmo ajudá-lo
a encontrar outras alternativas.
Estas actividades e jogos deverão incidir em três grupos:
1. Bases funcionais da articulação;
2. Actividades que asseguram a integração dos fonemas;
3. Actividades que estimulam a Linguagem espontânea.
BASES FUNCIONAIS DA ARTICULAÇÃO
Discriminação Auditiva1. Estimule frequentemente a criança, com todos os sons e ruídos em todos os contextos
(em casa, na rua, na escola, quando ouve música, etc), pedindo para ter atenção àquele
som, explicando o que é dando sempre o nome, e mais tarde pergunte “Que som é
este?” “De onde vem?”;
2. Coloque músicas, ou cante músicas que a criança conheça, e peça que a mesma diga o
nome, ou diga de onde é esta música;
3. Coloque o rádio a tocar em algum local que não seja visível, e peça à criança para
encontrar o rádio;
4. Desafie a criança a segui-lo pela voz, sendo que a mesma vai ter os olhos vendados;
5. Imite sons de animais e peça à criança para adivinhar de que animal se trata;
6. Sensibilize a criança relativamente ao som dos diferentes instrumentos; dos diferentes
tipos de música; etc. Se possível, apresente mais do que um instrumento e ajude a
criança a explorar os vários sons (ajudando-a sempre com descrições).
Sopro e Respiração
7. Para que haja a consciencialização da respiração, pode pedir à criança para se deitar.
De seguida coloque um objecto leve em cima da barriga da criança, e sugira-lhe que
observe esse mesmo objecto. Enquanto a criança observa o objecto a subir e a descer,
deverá explicar que o objecto sobe quando “engole ar” e que o objecto desce quando
“sopra”. Desafie-a a aumentar e diminuir a intensidade, perguntando sempre se o
objecto subiu mais ou menos.
8. Pode brincar com a criança com palhas: peça para a criança soprar em determinadas
partes do seu corpo; peça para a criança empurrar (soprando para a palha) um balão ou
uma bola leve. Com esta última actividade pode proporcionar uma situação de
competição, participando desta forma no jogo: a bola/balão que chegar à meta, ganha.
9. Desafie a criança a cheirar diferentes aromas e a adivinhar que aroma se trata.
10. Coloque à disposição da criança vários instrumentos de sopro. Através destes
instrumentos, pode controlar a respiração. Por exemplo, se pedir para soprar muito
tempo sem pausa, a criança vai perceber (mesmo que para isso tenha de recorrer à
explicação) que tem de “engolir” muito ar, e que se o deitar logo todo fora não aguenta
muito tempo. Se pelo contrário, pretender que sopre pouco tempo e por isso faça
inspirações curtas, peça-lhe que engula pouco ar e que quer ouvir o som do sopro
muitas vezes de seguida. Exemplifique e participe.
11. Peça à criança para “engolir ar” enquanto levanta os braços ou pernas, e que o deixe
sair enquanto baixa os braços ou pernas. Pode fazer ao mesmo tempo que a criança, de
forma a controlar os ritmos da respiração e de forma a ir alternando esses mesmos
ritmos. Pode fazer o mesmo jogo com outras acções como “lançar e receber a bola”.
Relaxação
Nestes jogos, é importante que participe e exemplifique
12. Relaxar o rosto:
- Peça à criança para fazer várias expressões como a de zangada, de alegre.
13. Relaxar a mandíbula:
- Peça à criança para abrir ao máximo a boca (aguentando uns segundos);
- Peça à criança para fingir que está a mascar pastilha;
- Peça para a criança mexer a mandíbula para a frente, para a esquerda e para a direita.
14. Relaxar o céu-da-boca:
- Peça para a criança bocejar de boca aberta e depois de boca fechada;
- Peça para a criança gargarejar com água e que faça bolinhas;
15. Relaxar as maçãs do rosto:
- Peça para a criança encher as bochechas de ar ao máximo sem poder abrir a boca, e
passados alguns segundos deixe o ar sair devagar;
16. Relaxar os lábios;
- Peça à criança para sorrir de orelha a orelha e para manter o sorriso durante algum tempo;
- Peça à criança para esticar e encolher os lábios;
- Peça à criança para relinchar como o cavalo;
17. Relaxar a Língua
- Peça à criança para deitar a língua de fora; para a dobrar;
- Peça à criança para tocar com a língua nas bochechas empurrando-as.
ACTIVIDADES QUE ASSEGURAM A INTEGRAÇÃO DOS FONEMAS
As actividades que se seguem, têm o intuito de evitar que existam problemas articulatórios
fonéticos; no caso de já existirem, estas actividades visam a correcção das alterações fonéticas.
É importante que a criança esteja em frente ao espelho e que observe o que acontece aos
lábios, à língua e mesmo à expressão facial, nos diferentes sons.
Fonema p
18. Peça à criança para encher as bochechas de ar e de seguida peça para soltar o ar e
dizer “pa”. Exemplifique, e tenha em atenção que este “pa” é rápido e não comprido.
Repita esta brincadeira com “pe”, “pi”, “po” e “pu”.
19. Ensine a criança a fazer o som do Pintainho- “piu piu”; da buzina do carro “pii pii”;
Sugira à criança que cante uma música que conheça bem, com os sons do “p”.
20. Ensine a seguinte lenga lenga: “ O pinto pia a pia pinga”. Incentive a criança a dizê-la
várias vezes. Participe e diga com ela.
Fonema b
21. Peça à criança para encher as bochechas de ar e de seguida peça para soltar o ar e
dizer “b”. Exemplifique, e tenha em atenção que este “b” é rápido e não comprido.
22. Peça à criança para dizer “ba”, “be, “bi” ,“bo” e “bu” (uma de cada vez), colocando a mão
na zona da garganta de forma a que ela sinta a vibração.
23. Coloque o seguinte à frente da criança: Banana, boneca, bota, bolo (por exemplo), e
peça-lhe para dizer os nomes:
Pode encontrar num livro ou num filme de desenhos animados, imagens cujos nomes
começam por “b”. Nesses casos pergunte: “O que é isto?”.
Fonema t
24. Esta actividade visa a consciência do ponto em que a língua deve tocar para emitir o “t”.
Mesmo que se trate de uma criança com 3 ou 4 anos, e que tenha dificuldade em ter
esta consciência, é importante que lhe explique que para dizer “t” e palavras com esta
letra, a língua toca no céu-da-boca.
Desafie a criança a dizer muitas vezes “ta” e depois “te,ti, to e tu”, e depois de repetir
muitas vezes cada uma, desafie-a a explicar-lhe onde a língua toca cada vez que disse
os sons “ta,te,tu,to,tu”.
25. Ensine à criança várias palavras com a letra “t”, e peça que repita depois de si.
Fonema d
26. Peça à criança para encher as bochechas de ar e de seguida peça para soltar o ar e
dizer “d”. Exemplifique, e tenha em atenção que este “d” é rápido e não comprido.
27. Peça à criança para dizer “da”, “de, “di” ,“do” e “du” (uma de cada vez), colocando a mão
na zona da garganta de forma a que ela sinta a vibração.
28. Construa frases com várias palavras com “d”: “O Diogo disse que ontem desenhou
dados, dinossauros, etc. Depois de ter desenhado, ficou com dores nos dedos e para
ficar contente comeu tantos doces que ficou com uma grande dor de dentes. Estas
frases podem ser ditas em diálogo com a criança. A partir daqui pode simplesmente
pedir para a criança repetir palavras e posteriormente que responda a questões relativas
à história.
Fonema k
29. Actividades que façam com que a criança diga repetidamente “Ca, que, qui, co, cu”;
30. Peça à criança para cantarolar só com “Ca”. Experimente com os outros sons.
31. Conte histórias com galinhas. Desafie a criança a dizer “có có ró có có” sempre que diga
a palavra galinha. Pode fazer o mesmo com a palavra pato, em que a criança terá de
dizer “quá quá quá”.
Fonema g
32. Actividades que façam com que a criança diga repetidamente “ga, gue, gui, go, gu”;
33. Cante com a criança a canção “Atirei o pau ao gato…” várias vezes.
Fonema m
34. Peça à criança para produzir o som “m” com a boca fechada, ou seja, o som sai “pelo
nariz”. Desafie a criança a colocar os dedos no nariz para sentir a vibração.
35. Conte histórias com gatos e ovelhas. Sempre a criança ouvir a palavra gato terá de o
imitar: “miauuuu” e em relação à ovelha terá de dizer “méeee méeee”.
Fonema n
36. Esta actividade visa a consciência do ponto em que a língua deve tocar para emitir o “n”.
Mesmo que se trate de uma criança com 3 ou 4 anos, e que tenha dificuldade em ter
esta consciência, é importante que lhe explique que para dizer “n” e palavras com esta
letra, a língua toca atrás dos dentes.
Desafie a criança a dizer muitas vezes “na” e depois “ne, ni, no e nu”, e depois de repetir
muitas vezes cada uma, desafie-a a explicar-lhe onde a língua toca cada vez que disse
esses sons.
Diga à criança para colocar a mão no seu nariz e no dela, de forma a sentir a vibração.
Com isto, a criança deverá perceber que este som é nasalado.
Fonema nh
37. Actividades que visam a repetição dos sons: “nha, nhe, nhi, nho e nhu”, e posteriormente
peça à criança para colocar a mão no nariz para sentir a vibração.
38. Diga o nome de vários animais (por exemplo: cão, gato, pássaro, etc) e depois pergunte
como se chama o cão pequeno (cãozinho), etc.
Fonema f
39. Sugira à criança para colocar a mão em frente dos lábios, soltando de seguida o som
“ffffff..”.
40. Peça à criança para emitir o som do vento.
41. Coloque a criança em frente ao espelho, e de seguida peça-lhe para emitir os sons “Fa,
fe, fi, fo e fu”, bem como palavras como “Faca, fada, foca, folha, etc”.
Fonema v
42. Peça à criança para fazer o som do avião (“vvvv..”) e depois para colocar os indicadores
nos ouvidos.
43. Invente uma história com personagens cujo nome comece ou tenha a letra “v”. A criança
pode repetir quando pedir, ou pode responder a perguntas que lhe vai fazendo e que as
respostas impliquem a emissão das palavras em questão.
Fonema s
44. Peça à criança para dizer várias vezes: “sa, se, si, so e su”;
45. Conte à criança uma história sobre uma Serpente. Quando disser a palavra “serpente”, a
criança terá de fazer o som “sssssssssss”.
Fonema z
46. Peça à criança para dizer várias vezes: “za, ze, zi, zo e zu”;
47. Conte à criança uma história sobre uma abelha. Quando disser a palavra “abelha”, a
criança terá de fazer o som “zzzzz”.
48. Peça para a criança colocar os indicadores nos ouvidos quando faz o som “zzz”, e
pergunte o que sente.
Fonema x/ch
49. Conte histórias com as palavras: “chapéu, chuva, chave, xícara, chá, chinês, xadrez,
chaminé, bruxa, etc”.
Fonema j
50. Peça à criança para dizer várias vezes “já, je/ge, ji/gi, jo e ju”
51. Construa frases com palavras que tenham a letra “j”.
52. Disponha vários objectos que comecem pela letra “j” e pergunta à criança “O que é
isto?”. Exemplo: janela, jarro, jornal, laranja, feijão etc.
Fonema L
53. Peça à criança para dizer várias vezes “la, le, li, lo e lu”. Pergunte onde toca a língua.
54. Diga frases como: “A Lalá comeu laranja; A Lelé comeu um bolo; A Lili comeu Limão; A
Loló comeu um caramelo; A Lulu comeu chocolate.”
Fonema lh
55. Actividades que visam a repetição dos sons: “lha, lhe, lhi, lho e lhu”.
56. Pergunte à criança “O que é”, quando a mesma está a ver “folha, abelha, coelho,
palhaço, milho, telhado, toalha, agulha, etc”.
Fonema r/R
57. Peça à criança para dizer várias vezes “ara, ere, iri, oro e uru”.
58. Encontre em livros imagens de animais como: “aranha, cobra, crocodilo, rã, barata,
cabra, rato, tartaruga, girafa, tubarão, etc” ou de frutos: “pêra, laranja, amora, morango,
cereja, etc”.
59. Peça à criança manter um pouco de água na boca e gargarejar. Repetir mas sem água.
60. Aponte para o nariz da criança e pergunte-lhe o que é. Depois aponte para a sua barriga
e pergunte o que é. De seguida pergunte-lhe “Carregaste mais no “r” na palavra nariz ou
barriga?”. Pode utilizar mais pares de palavras como: “Rã/Rato; aranha/arranha”.
ACTIVIDADES QUE ESTIMULAM A LINGUAGEM ESPONTÂNEA
Estas actividades devem ser realizadas de forma natural e em todos os contextos.
Para estimular a linguagem espontânea, podem ser realizadas actividades de imitação e de
trocas de ideias.
Imitação
61. Comece por dizer palavra a palavra, e peça para que a criança o imite de seguida. Pode
aproveitar para trabalhar os fonemas anteriormente apresentados.
Depois peça para que a criança imite frases, primeiros mais simples e depois mais
complexas.
É importante que a criança articule muito bem as palavras, e que caso articule mal alguma
palavra, que insista um pouco de forma a melhorar.
Tenha muita atenção aos erros, de forma a dar uma maior ênfase aos fonemas que estão
comprometidos, todavia é importante que os fonemas que não apresentem alterações continuem
a ser trabalhados, para que mais tarde não fiquem comprometidos.
Troca de ideias
Como o próprio nome indica, é importante que dê as suas ideias e que ouça as ideias das
crianças.
Comente tudo o que vê na rua, em casa, na escola, na televisão, e faça sempre perguntas à
criança, estimulando-a a conversar sobre o que vê.
BIBLIOGRAFIA
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Silva, F; Catalão, V. (2004), Evolução das aprendizagens de um modelo de intervenção
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de Almada. Tese de licenciatura não publicada.