1. Da inexecução do contrato de promessa de compra e venda de imóveis
Todos já ouviram essa frase: “os contratos fazem lei entre as partes. Essa
é a norma básica de todos os contratos. Todavia, a mitigação do dogma da
intangibilidade do conteúdo contratual (pacta sunt servanda), visa equilibrar as
relações contratuais, não interferindo na autonomia privada, mas buscando o bem
estar social através dos princípios da função social do contrato e da boa-fé, entre
outros já consagrados pelo ordenamento jurídico brasileiro, que são utilizados
principalmente no desfazimento dos contratos e nas relações de consumo.
Nos contratos de promessa de compra e venda de imóveis não é diferente,
a obrigação criada entre as partes é recíproca, estando o promitente vendedor
obrigado a vender o imóvel ao compromissário comprador e repassar a outorga da
escritura, ao final do pagamento, nos exatos termos e prazo estabelecidos. Enquanto
o promissário comprador está obrigado a pagar o preço estabelecido na forma e
condições acordadas.
Ocorre que, nesses contratos cuja modalidade é incorporação imobiliária
há sempre a promessa ou compromisso futuro que não garante a propriedade. Muitas
vezes, o imóvel que está em negociação ainda não existe nem física, nem
formalmente, sendo comum o pagamento parcelado.
Nessas transações onde o bem imóvel está na planta ou em construção, o
contrato pode ser ou um instrumento particular ou escritura pública de promessa de
compra e venda de imóvel.
Com base nessa contratação inicial, os direitos e obrigações das partes
estarão vinculados, assim como a venda propriamente dita. Por isso, esse contrato de
promessa precisa ser bem analisado, especialmente quando se trata das cláusulas de
resolução.
Para compreender os efeitos da inexecução do contrato de promessa de
compra e venda de imóveis, questiona-se quais as formas de desfazimento desse
contrato e os efeitos jurídicos incidentes. A resposta desse questionamento promove
maior segurança na celebração dos negócios jurídicos, assiste na discussão das
cláusulas, amplia o conhecimento dos direitos e deveres dos contratantes, e provoca
o interesse de terceiros, exemplo do cônjuge que pode suportar os efeitos da
inexecução do contrato.
1.1. Inexecução pelo promissário comprador
A inexecução da promessa de compra e venda registrada pode ocorrer de
descumprimento da prestação do promissário comprador ou do promitente vendedor.
Primeiramente, estudaremos a inexecução em razão do não pagamento pelo
promissário comprador do valor devido. O art. 475 CC trata sobre a cláusula
resolutiva e afirma que a resolução expressa se dá de pleno direito e a tácita depende
de interpelação judicial. Dessa forma, se o promissário comprador deixar de pagar o
preço e se houver cláusula resolutiva expressa no contrato, este se resolve
independente de qualquer notificação ou resolução. Se não tiver cláusula resolutiva
expressa, a condição resolutiva será contida de forma tácita, isso ocorre diante de um
contrato bilateral ou sinalagmático e produzirá efeitos apenas após a interpelação
judicial. Essa cláusula resolutiva tácita é a alegação ou exceção de contrato não
cumprido, submetida para o caso em que uma das partes não cumpra a sua
obrigação, tornando o negócio extinto (arts. 474 e 476 CC). (BRASIL, Lei n. 10.406,
2002)
O Decreto-Lei 745/1969 determina quanto aos imóveis não loteados, em
que a cláusula é expressa, deve ocorrer por meio de processamento judicial, ou de
ofício especial do registro de títulos e documentos. Primeiramente, mediante
interpelação, notifica-se o devedor de que lhe é concedido o prazo de 15 dias para a
purgação da mora, não havendo resposta, o promitente vendedor ingressará com a
ação competente de rescisão com fundamento na inadimplência e no art. 475 do
Código Civil de 2002. e art. 1° do Decreto- Lei 745/1969. Averiguar-se, nesse caso, a
presença de efeito ex tunc, que retroagem ao momento do inadimplemento.
Compartilhando desse entendimento, transcreve-se, da jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça:
O supremo Tribunal de Justiça, no REsp. 261.533-MG, da 4ª
turma, j. em 7.08.2001, DJ de 19.11.2001, tem firmado a
obrigatoriedade da interpelação: ‘Verificada a mora ex re do
promissário comprador, impõe-se ao promitente vendedor a sua
prévia a interpelação para constituir em mora o devedor.
Súmula 76 do STJ: A falta de registro de compromisso de
compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação
para constituir em mora o devedor.
Flávio Tartuce explica que: “Em suma, sendo tácita a cláusula resolutiva, a
natureza da sentença é constitutiva e, portanto a resolução se dá com a sua prolação
( efeito ex nunc). Segundo Agostinho Alvim, a diferença entre clausula resolutiva
expressa e a tácita é que, na primeira, há uma impossibilidade de purgação mora pelo
devedor, no caso, o promissário comprador; e, na segunda, essa possibilidade existe
ate a contestação da lide”. (TARTUCE, 2012)
Em relação aos loteamento rural, de acordo com o art. 14 do Decreto-Lei
58/1937 “vencida e não paga a prestação, considera-se o contrato rescindido 30 dias
depois de constituído em mora o devedor”. (BRASIL, Decreto-Lei 58, 1937)
Nesse sentido, refere-se a mora é ex persona nos termos do parágrafo §
1º, art.14 desse decreto, “para este efeito será o promissário comprador intimado a
requerimento do compromitente vendedor, pelo oficial do registo a satisfazer as
prestações vencidas e as que se vencerem até a data do pagamento, juros
convencionados e custas da intimação”. (BRASIL, Decreto-Lei 58, 1937)
Ainda no art.14 do Decreto, em seu § 2 º “Julgada procedente a ação a
sentença, uma vez transitada em julgado, adjudicará o imóvel ao compromissário
comprador, valendo como título para a transcrição. Todavia, com a certidão de não
haver sido feito o pagamento em cartório, os promitentes requererão ao oficial do
registro o cancelamento da averbação (art.14, § 3º). (BRASIL, Decreto-Lei 58/1937)
Muitos doutrinadores entendem esse processo de cancelamento fere o
princípio ampla defesa, pois não dá oportunidade de defesa ao compromissário, uma
vez que a mora do devedor exige sua culpa para que se configure. (AZEVEDO
JÚNIOR, 1998)
Ressalta-se que no art.12, §1º do Decreto-Lei 58/1937, prevê a
possibilidade de inexecução pelo promissário comprador, a restituição dos valores
pagos. (BRASIL, Decreto-Lei 58,1937)
Já em relação a lei de parcelamento dos solos urbanos (Lei 6.766/1979), a
mora é igualmente ex persona, vejamos o art. 32, “Vencida e não paga a prestação, o
contrato será considerado rescindido 30 (trinta) dias depois de constituído em mora o
devedor. Decide também que, purgada a mora, convalescerá o contrato (Art. 12, § 2º).
Por sua vez, o art.32 da Lei, com a certidão de não haver sido feito o pagamento em
cartório, o vendedor requererá ao Oficial do Registro o cancelamento da averbação,
com ressalva para as críticas, uma vez que a mora do devedor exige sua culpa para
que se configure.
Quanto as benfeitorias nos casos de rescisão por inadimplemento do
promissário comprador quanto ao preço, classifica o art. 34 da Lei 6.766/1979, as
benfeitorias necessárias ou úteis por ele levadas a efeito no imóvel deverão ser
indenizadas, sendo de nenhum efeito qualquer disposição contratual em contrário.
De acordo com o art. 35. que, correndo o cancelamento do registro por
inadimplemento do contrato e tendo havido o pagamento de mais de um terço do
preço ajustado, o oficial do registro de imóveis mencionará este fato no ato do
cancelamento e a quantia paga. Somente será efetuado novo registro relativo ao
mesmo lote, se for comprovada a restituição do valor pago pelo vendedor ao titular do
registro cancelado, ou mediante depósito em dinheiro à sua disposição junto ao
Registro de Imóveis.
Finalizando o tema por parte do inadimplemento por parte do promissário
comprador, o Superior Tribunal de justiça ratifica que se o loteamento for clandestino,
infringir normas urbanísticas, for irregular por falta de registro (não foi feito ou não
poderá sê-lo), o promitente vendedor não poderá constituir o promissário comprador
inadimplente em mora, nem exigir resolução do contrato, aplicando-se a excepio non
adimplenti contract prevista no art. 476 do CC. (STJ, REsp 35.649/SP, rel. Min. Nilson
Naves, 3a. Turma, j.22.11.1994, DJ 19.12.1994, p 35.308)
1.2. Inexecução pelo promitente vendedor
O direito do promissário comprador à escritura de compra e venda ou ao
instrumento particular (se o valor do imóvel for de trinta salários mínimos), para que a
propriedade do imóvel lhe seja transferida, surge após quitado o preço. Contudo,
pode ocorrer a recusa do promitente vendedor para outorgar a escritura definitiva.
Situação em que caberá ao promissário prejudicado cobrar os prejuízos sofridos,
desde que os prove. (TARTUCE, 2012)
Nesse caso, a cobrança das perdas e danos é em razão do
inadimplemento do compromisso de compra e venda de imóveis. Um exemplo, se o
compromissário perde um financiamento para construção do imóvel por ausência do
registro do loteamento, ou perde uma venda do lote a terceiro, que desfaz o negócio
por falto do registro, poderá o promissário cobrar indenização pelo negócio perdido.
Destaca Flávio Tartuce, a tutela genérica de cobrança das perdas e danos
não resolve a questão, porque, perante o Cartório de Registro de Imóveis, o
compromissário comprador não assume a titularidade do bem adquirido e
integralmente pago. (TARTUCE, 2012)
Será mais contundente para o promissário se valer das tutelas específicas
contidas no Código de Processo Civil para o cumprimento da obrigação de fazer.
Dispõe o art. 461, CPC, na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de
fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se
procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático
equivalente ao do adimplemento. Poderá, inclusive, o promissário pedir ao juiz que
determine por sentença a outorga da escritura, sob um prazo determinado sob pena
de multa diária (astreintes) (art. 461, §4º, CPC). (BRASIL, Lei 5.869/173)
No caso do promitente vendedor não cumprir sua obrigação, a sentença
valerá como título hábil a transferir a propriedade e será registrado no cartório de
registro de Imóveis. (TARTUCE, 2012)
Existe também a possibilidade prevista no art.1.418 do CC, o promitente
comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros,
a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e
venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer
ao juiz a adjudicação do imóvel. A sentença defere a adjudicação compulsória do
imóvel, logo será averbada em cartório de registro de imóveis e transferir-se-á o
domínio, sendo adimplida a obrigação assumida pelo promitente de maneira forçada.
(TARTUCE, 2012)
Quanto ao rito processual, o art. 466-B do CPC dispõe que o rito será o
ordinário, salvo se a adjudicação for compulsória, em que o procedimento é sumario.
O art. 16 do Decreto Lei 58/1937 dispõe que que a respeito do rito especial.
Sobre a questão da necessidade ou não do registro do compromisso junto ao
Registro Imobiliário, citamos a Súmula 239 do Superior tribunal de Justiça e a Súmula
413 do Supremo Tribunal Federal, respectivamente:
STJ Súmula nº 239, Adjudicação Compulsória - Registro do
Compromisso de Compra e Venda.
O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao
registro do compromisso de compra e venda no cartório de
imóveis.
STF Súmula nº 413 O compromisso de compra e venda de
imóveis, ainda que não loteados, dá direito à execução
compulsória, quando reunidos os requisitos legais.
Os requisitos legais para propositura da ação de adjudicação, não se exige
o registro preliminar para o ajuizamento da ação de adjudicação compulsória, sendo
esse registro indispensável para sua validade perante terceiros. Este o entendimento
do STJ, conforme se depreende:
ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. REGISTRO DA PROMESSA -
PREQUESTIONAMENTO - PRECEDENTES DA CORTE - 1 -
Está assentada a jurisprudência da Corte no sentido não ser
exigido o registro da promessa para o ingresso da ação de
adjudicação compulsória. 2 - Permanecendo o Acórdão recorrido
no plano do exame do contrato, enquadrado na Lei n. 4.591/64,
faltou o devido prequestionamento para a questão do
litisconsórcio e da multa excessiva. (STJ, REsp n. 203581 – SP,
Terceira Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJU
8.3.2000).
Entre outros requisitos temos: a) ausência de faculdade de arrependimento;
b) recusa do promitente vendedor em outorgar a escritura; c) quitação integral do
débito por parte do compromissário comprador; e d) regularidade do contrato de
promessa de compra e venda, inclusive no que tange à outorga do cônjuge do
promitente vendedor. (BARROS,2005)
No tocante à natureza da ação de adjudicação, entende-se que é pessoal,
porque o objetivo da demanda é a execução in natura do contrato, a sentença por si
só, não transfere a propriedade, é necessário o registro no cartório.
Em referência ao prazo para adjudicação ou execução específica, é
imprescritível, ou seja, não decai e não se dá a prescrição do exercício da prestação,
segundo a corrente mais aceita pelo STJ: “Não prescreve o direito de a promissária
compradora obter a escritura definitiva do imóvel, direito que só se extingue frente ao
de outrem amparado por usucapião. (REsp. nº 369.206-MG, da 4ª Turma em
11.03.2003, DJU de 30.06.2003).
2. Da extinção do contrato de promessa de compra e venda
Normalmente a doutrina lista como motivos de extinção da promessa de
compra e venda de imóveis: a) execução voluntária, b) distrato c) descumprimento
das partes d) perda do objeto e e) evicção. (TARTUCE, 2012)
a) Execução Voluntária: é a forma normal de extinção de qualquer contrato. Nos
contratos de promessa de compra e venda de imóveis ela se dá através da execução
voluntária do contrato pelas partes, ou seja, pela escritura definitiva ou pelo
instrumento particular (o preço do imóvel for igual ou inferior a 30 vezes o valor do
salário mínimo).
b) Distrato: é a dissolução convencional do contrato, ou seja, as partes podem prever
a extinção do contrato.
c) Descumprimento das partes: pode ocorrer por descumprimento do promissário
comprador ou promitente vendedor, como foi explicado no item 3.5.
d) Perda do objeto: ocorre nas hipóteses em que o imóvel compromissado é
desapropriado.
e) Evicção: é a perda da propriedade, posse ou uso atribuindo-a a terceiro, pode
ocorrer por sentença judicial como decisão administrativa. No contrato de promessa,
surge de vício redibitório substancial que atinge a essência da coisa.
Contudo, observa-se que são diversos os motivos que podem levar ao
desfazimento do contrato, frisa-se que, para a extinção do direito real, não são
apenas as situações citadas acima, é necessário fazer o cancelamento junto ao
Registro de Imóveis.
Vale destacar que, a extinção do contrato a que se refere, está
propositadamente protegendo o comprador contra possíveis ações de má-fé por parte
do vendedor, situações de irregularidades do bem imóvel, entre outros, todas
previsíveis no direito brasileiro. No entanto, em nada impedindo que por alguma
dessas razões aqui destacadas, as partes possa a qualquer momento se convir de
que devam romper o contrato, até mesmo de forma consensual, desde que observado
o direto de terceiros.
2.1. Consequências da inexecução do contrato de promessa de compra e
venda de imóvel no Código de Defesa do Consumidor
A proteção do consumidor foi introduzida como principio fundamental a
partir da Constituição Federal de 1988, inciso XXXII do art. 5°, “o Estado promoverá,
na forma da lei, a defesa do consumidor”. Adiante, o inciso V do art. 170 também
ratifica como princípio da ordem econômica a proteção do consumidor, e o art.48 do
Ato das Disposições Transitórias preceitua que, “o Congresso Nacional, elaborará, o
Código de Defesa do Consumidor”.
Os contratos regidos pelo Código Civil que possuem caráter consumerista,
sempre que oportuno e conveniente terão aplicação da Lei 8.078/190 (CDC). Essa
conclusão, foi consolidada no direito brasileiro através da professora Cláudia Lima
Marques tomando por base seus estudos na Alemanha, a qual importou para o Brasil
a Teoria do Diálogo entre Fontes, tal como idealizada pelo jurista germano Erik
Jayme. Essa teoria tem sido bastante aplicada em situações que se sujeitam,
concomitantemente, a disposições contidas tanto no Código Civil, quanto no Código
de Defesa do Consumidor. (MARQUES, 2006)
O contrato de promessa de compra e venda de imóvel, em que as partes
estão inseridas nas definições do art. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor,
tem o caráter consumerista, que por sua vez são normas de ordem pública e de
interesse social e não pode ser derrogadas pela vontade das partes, vejamos:
Dispõe o art. 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire
ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
[...]Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou
privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou
imaterial. (BRASIL, Lei 8.078, 190)
Adiante, analisaremos os efeitos da inexecução do contrato de promessa
de compra e venda de imóveis já exposto no item 3.5, que estão relacionados com as
cláusulas abusivas prevista no CDC.
3. Cláusulas abusivas nos contrato de promessa compra e venda de imóvel
As cláusula abusivas encontram-se muito presentes nos contratos de
consumo atuais, o que causa um considerável desequilíbrio entre as partes
contratantes. Por isso se torna essencial identificar o que o CDC considera como
cláusula abusiva e quais as consequências da mesma.
Cláusula abusiva é aquela desfavorável à parte mais vulnerável na relação
contratual. No contrato de promessa de compra e venda de imóveis considera
desfavorável o promissário comprador, e na relação de consumo é o consumidor.
Todavia, vale destacar que, quando se tata de cláusula abusiva, independe
se o contrato de promessa é de adesão ou de comum acordo, basta a relação
jurídica de consumo para que o negócio receba proteção contra as cláusulas
abusivas.
O Código de Defesa do Consumidor trata na seção II Das Cláusulas
Abusivas, e expressamente no art. 51 dispõe que:
Art.51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais ao fornecimento de produtos e serviços que: I -
impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do
fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e
serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas
relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa
jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações
justificáveis; II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso
da quantia já paga, nos casos previstos neste código; III -
transfiram responsabilidades a terceiros; IV - estabeleçam
obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; V - (Vetado); VI -
estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do
consumidor; VII - determinem a utilização compulsória de
arbitragem; VIII - imponham representante para concluir ou
realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; IX - deixem ao
fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora
obrigando o consumidor; X - permitam ao fornecedor, direta ou
indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; XI -
autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente,
sem que igual direito seja conferido ao consumidor; XII -
obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua
obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o
fornecedor; XIII - autorizem o fornecedor a modificar
unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua
celebração; XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas
ambientais; XV - estejam em desacordo com o sistema de
proteção ao consumidor; XVI - possibilitem a renúncia do direito
de indenização por benfeitorias necessárias.[...] (BRASIL, Lei
8.078, 190)
Em vista dessa observância, podemos analisar quais as cláusulas abusivas
mais comum aplicadas no contrato de promessa de compra e venda.
São consideradas cláusulas abusivas:
I. A cláusula que impossibilita, exonera ou atenua a
responsabilidade do promitente vendedor por vícios de qualquer
natureza no imóvel ou implique renúncia ou disposição de direitos
(indenização por perdas e danos, propriedade, escritura
definitiva);
O intuito legis é nítido e repousa no impedimento de que o consumidor
renuncie previamente aos direitos decorrentes do contrato. Proíbe-se, a rigor a
cláusula de irresponsabilidade, ou seja aquela que imuniza o fornecedor quanto ao
eventual descumprimento das suas obrigações. (OLIVEIRA, 2009)
II. Subtraia ao promissário comprador a opção de reembolso da
quantia já paga e a renúncia de direito de indenização por
benfeitorias necessárias;
A cláusula contratual que prevê a perda total da quantia paga pelo devedor
inadimplente inserida no contrato de promessa interpreta-se como sendo uma
cláusula penal moratória, com a finalidade de garantir alternativamente o cumprimento
da obrigação principal. Na hipótese de ser convencionado valor excessivo da
penalidade, o juiz pode considera-la anulável e proceder à redução, limitando a perda
parcial da quantia paga pelo devedor.
Quanto as benfeitorias necessárias ou úteis nos casos de rescisão por
inadimplemento do promissário comprador quanto ao preço, defeito no imóvel
deverão ser indenizadas, sendo de nenhum efeito qualquer disposição contratual em
contrário.
Já em relação as arras confirmatórias e a comissão da corretagem, o
Ministro Ruy Rosado de Aguiar, relator do Recurso Especial 257.582/PR, STJ,
entendeu que compromissário comprador deve receber a restituição do que pagou na
execução do contrato com fundamento no art.51.II, CDC.
Nesse mesmo entendimento, foi decidido em grau de apelação pela Juiza
Jurema Brasil Martins:
Tendo as partes livremente rescindido o contrato particular de
promessa de compra e venda de imóvel, reconhecendo o
promitente vendedor a existência de créditos do promissário
comprador, correspondente a parte dos valores pagos, não pode
aquela restringir sua utilização para compra de outro imóvel de
que é proprietário, por estar subtraindo ao consumidor a opção
de reembolso de parte de quantidade já quitada, contraindo o
disposto no art.51, II do CDC. (TAMG, Ap. Civel 203973-4/00,
rel. Juíza Jurema Brasil Martins, j.14.11.95).
II. cláusula que estabeleça obrigações consideradas iníquas,
abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
Toda cláusula que infringir o princípio da boa-fé é considerada, por lei,
como abusiva. O juiz tem poder para empreender do modo concreto o equilíbrio e a
equidade das relações contratuais, o que é muito comum nos contratos de promessa
de compra e venda de imóvel que se utilizam do dinheiro do Sistema Financeiro
Habitacional (SFH) para emprestá-lo ao consumidor, e, mesmo assim, proíbe a
venda, promessa de venda, cessão e promessa de cessão do débito ou dos direitos
sobre o imóvel para terceiros sem a anuência do agente SFH, atando o consumidor.
(NETO apud OLIVEIRA, 2009)
III. Cláusula que permita ao fornecedor, direta ou
indiretamente, variação do preço de maneira unilateral ou
autorizem modificar unilateralmente o conteúdo do contrato,
após sua celebração;
Esta cláusula não trata apenas de variação unilateral direta do preço, mas
de qualquer fator, como de conteúdo, que estando ao arbítrio de uma única parte,
tenha o poder de alterar indiretamente. (OLIVEIRA, 2009)
Sendo uma das causas mais comum a extinção do contrato de promessa
de compra e venda de imóveis o descumprimento do compromissário comprador em
relação a mora das prestações ajustadas tornam-se insuportáveis, não conseguindo
cumprir com o ajustado, e fatalmente poderá interromper o compromisso.
IV. Cláusula que autorize o fornecedor a cancelar o contrato
unilateralmente, sem que igual seja conferido ao consumidor;
A rescisão unilateral mesmo quando prevista de forma expressa no
contrato de promessa de compra e venda de imóvel deve ser apreciada pelo juiz.
V. Obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança
de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra
o fornecedor.
A previsão de pagamento, pelo consumidor, de honorários advocatício em
caso de cobrança extrajudicial, sem igual direito seja conferido contra o fornecedor é
nula.
Finalizando, as cláusulas que infrinjam ou violem normas ambientais e as
cláusulas que estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor, por
exemplo, as cláusulas que não observam o principio da boa-fé, lealdade,
transparência entre outras que podem ser encontradas nos contratos de promessa de
compra e venda de imóveis, são consideradas abusivas..
Conclui-se que, quando se decide se uma cláusula contratual deve ser
considerada abusiva, o seu conteúdo certamente será de grande importância. Quanto
mais ela se afasta do direito dispositivo em detrimento do consumidor, mais sujeita
está a ser considerada abusiva. Entretanto, como a decisão sempre é tomada no caso
concreto, outras considerações podem também ser relevantes. (THOMAS
WILHELMSSON,1990)
REFERÊNCIAS
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3. ALMEIDA, Juliana Evangelista de. A evolução histórica do conceito de contrato: em busca de um modelo democrático de contrato. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 99, abr. 2012. Disponível em: <http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11306>. Acesso em: 20 mar. 2014.
4. AZEVEDO JUNIOR, José Osório de. Compromisso de compra e venda. 4ª ed. São Paulo: Malheiros.
5. BARROS, Flávio Augusto Monteiro, Manual de Direito Civil, 2005.
6. BIERWAGEM, Mônica Yoshizato. Princípios e Regras de Interpretação de Contratos, 2a. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
7. BRASIL. Lei n° 4.380, de 21 de Agosto de 1964. Institui a correção monetária nos contratos imobiliários. Presidência da República: Casa Civil. Brasília, 29 set. 1964. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4380.htm, Acesso em 14 jan. 2014.
8. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. CDC. promessa de compra e venda. In: JusBrasil. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/1396308/cdc-promessa-de-compra-e-venda>. Acesso em: 31 jan. 2014.
9. BRASIL. Lei 8.078 de 11 de setembro de1990.
________. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
________. Constituição da Republica Federativa do Brasil, 1988.
________. Lei nº 4.59, de 16 de dezembro de 1964. Dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias. Presidência da República: Casa Civil. Brasília, 16 dez. 1964. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4591.htm>. Acesso em: 21 jan. 2014.
10.BRASIL. O contrato no novo código civil brasileiro. TJRJ, 2008. Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=66b592ce-dc82-45c7-894a-4ce02e571df8&groupId=10136>. Acesso em: 3 fev. 2014.
11.DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. 18. ed. Rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2003.
12.FREITAS, Luiz Roldão de. Contrato - Curso de Direito Civil. 2a. Ed. Rio de Janeiro. Renovar, 2006.
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4. TJT/MG, Ap. Cível 203973-4/00, rel. Juíza Jurema Brasil Martins, j.14.11.95.