CASO CLÍNICO: DOENÇA DE KAWASAKI
Ellen Andrade DominguesHelder Nogueira Aires
Coordenação: Luciana Sugai, Sueli Falcão
15-8-2008www.paulomargotto.com.br
IDENTIFICAÇÃO
• IFP, 1 ano e 8 meses, feminina, branca, natural de Brasília, residente em Jardim Ingá, acompanhada pela mãe, registro: 201106-2 e admitida no HRAS em 05/07/08
HDA• Acompanhante relata que a criança iniciou quadro de
obstrução nasal, secreção nasal amarelada e tosse produtiva esporádica há 7 dias. Há 5 dias associou-se a um quadro de febre não aferida que melhorava ao uso de dipirona. Refere início de vômitos e de mácula eritematosa em região cervical, além de pápulas por todo o corpo há 3 dias. Relata persistência da febre neste período. Fez uso de eritromicina 250mg, hixizine e bromoprida. Mãe relata que houve confluência das lesões de pele e nega prurido. Refere associação com hiperemia conjuntival, edema de pés e mãos há 2 dias.
REVISÃO DE SISTEMAS
• Refere hiporexia desde o início do quadro.• Nega diarréia e dor abdominal. • Nega alterações da cavidade oral. • Nega taquicardia e palpitação. • Relata diurese preservada e urina de aspecto
normal.
ANTECEDENTES PESSOAIS
• Nega intercorrências gestacionais e no trabalho de parto. Nascida de parto normal, a termo, com 3.560g de peso, 50cm de estatura, 34cm de perímetro cefálico, APGAR 10 e chorou ao nascer. Nega intercorrências neonatais. Seio materno exclusivo até 6 meses, início de leite de vaca aos 9 meses. Nega alergias. Cartão de vacina atualizado.
ANTECEDENTES SOCIAIS
• Residem 7 pessoas em casa de alvenaria com fossa asséptica, sem rede de esgoto, 5 cômodos, sem animais de estimação.
ANTECEDENTES FAMILIARES
• Mãe de 37 anos, pai de 56 anos, irmãos de 18, 17, 12 e 7 (gemelares) anos todos saudáveis.
EXAME FÍSICO
• Ectoscopia : REG, hipocorada (2+/4+), hidratada, acianótica, anictérica, irritada, febril (38oC). Gânglio de 1,5cm em cadeia cervical posterior à direita e indolor.
• Pele: placas eritematosas, urticariformes, confluentes, coloração vermelho-violáceo, em tronco e membros, poupando face e que desaparecem a dígito-pressão.
EXAME FÍSICO
• Oroscopia: Edema e hiperemia de lábio com fissuras. Língua e tonsilas sem alterações.
• Olhos: Hiperemia conjuntival, sem secreção. • Ap. respiratório: Murmúrio vesicular rude,
sem ruídos adventícios e FR: 28irpm.
EXAME FÍSICO
• Aparelho cardiovascular: Ritmo cardíaco regular em 2 tempos, bulhas normofonéticas, sem sopros e FC: 160bpm.
• Abdome: Plano, flácido, sem visceromegalias, RHA +, indolor à palpação.
EXAME FÍSICO
• Extremidades: Edema duro de pés sem cacifo, discreta descamação de região plantar. Pulsos cheios e simétricos.
• SNC: Ausência de sinais meníngeos.
EXAMES COMPLEMENTARES
• HM: 3,97; Ht: 35,0; Hb: 11,5• VCM: 88; HCM: 28,1; CHCM: 33 • Leuc: 16.200; seg: 71; bast: 05; linf: 22; mono:
01; meta: 01 • VHS: 50; PCR: 13,8;• Ur: 10; Cr: 0,3 • TGO: 31; TGP: 102• Na: 143; K: 4,9; Ca: 8,9
SINAIS E SINTOMAS: • Coriza• Tosse produtiva• Febre intermitente• Exantema• Hiperemia conjuntival• Edema de mãos e pés• Adenomegalia cervical• Fissuras e hiperemia labial
• SÍNDROME DO CHOQUE TÓXICO:• Rash cutâneo • Foco infeccioso • Toxemia • Hipotensão
• ESCARLATINA:• Foco estreptocóccico• Febre e calafrios• Sinal de Filatov e Pastia• Rash cutâneo
• SARAMPO:• Coriza exsudativa• Conjuntivite exsudativa• Vacinação prévia ausente• Sinal de Koplik• Exantema febril
• ENTEROVIROSE:• Lesões vesiculares• Febre e exantema• Síndrome Mão-pé-boca
• MONONUCLEOSE:• Linfadenopatia generalizada• Febre• Faringite• Hepato-esplenomegalia• Exantema maculopapular
• EXANTEMA SÚBITO:• Febre• Diarréia• Linfadenopatia occipital, cervical e pós-auricular• Exantema maculopapular
• SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON:• Mucosa genital afetada• Lesões bolhosas• Lesões em mucosa oral• Rash cutâneo
• DOENÇA DE KAWASAKI:• Febre• Congestão ocular • Alterações da cavidade oral• Exantema polimorfo • Alterações nas extremidades• Linfadenopatia cervical
CONCEITO
• É uma doença multissistêmica de etiologia DESCONHECIDA, caracterizada por vasculite de pequenos e médios vasos.
• Pode associar-se ao comprometimento das artérias CORONÁRIAS, que pode ser assintomático ou levar à morte súbita ou IAM.
EPIDEMIOLOGIA
• Mundialmente distribuída• Predileção pela raça amarela• Crianças < 5 anos, rara em < 3 meses• Meses frios• 3 a 4% de recaídas• Masculino > Feminino (2,2/1)
ETIOLOGIA
• Apesar de 30 anos desde o reconhecimento, NÃO se descobriu o agente etiológico
• Alterações laboratoriais -> CLARA e INTENSA estimulação do sistema imune
• Forte suspeita de etiologia INFECCIOSA• Predisposição genética• Semelhança com choque tóxico ->
superantígenos ?
PATOLOGIA
• VASCULITE: vasos com edema de endotélio e alterações inflamatórias na camada adventícia (fase aguda – polimorfonucleares; substituídos por mononucleares).
• Camada média com edema e necrose da musculatura e lesões na lâmina elástica -> enfraquecimento da parede -> ANEURISMAS
• 1 a 2 meses após: regeneração, espessamento da camada íntima -> estenose e tortuosidade da artéria -> TROMBOS
QUADRO CLÍNICO
SINTOMAS PRINCIPAIS:• Febre• Congestão ocular • Alteração dos lábios e cavidade oral• Exantema polimorfo• Alteração nas extremidades• Linfadenopatia
FEBRE
• Etiologia desconhecida• Persiste por 5 ou mais dias• PRINCIPAL sinal (95 a 99%)• Abrupta, alta, remitente; oscilante (38 a 40°C) e
sem defervescência completa• Com ou sem rinorréia• Dura > 30 dias se não tratada a doeça• Preditor de coronariopatia (se > 14 dias, risco
maior)
CONGESTÃO OCULAR
• BILATERAL• Presente em 88% dos casos• Aparece de 2 a 4 dias após início do quadro• Hiperemia; raramente exsudativa • Ausência de prurido e dor• Pode haver uveíte anterior• Regride de 1 a 2 semanas
ALTERAÇÃO DOS LÁBIOS E CAVIDADE ORAL
• Presente em 90% dos casos• Hiperemia, ressecamento, fissuras, crostas
sanguinolentas, descamação e hemorragias dos LÁBIOS
• LÍNGUA com hiperemia e com proeminência de papilas - “Língua em framboesa ou morango”
EXANTEMA POLIMORFOO
• Presente em 92% dos casos• Surge entre 1°e 2° dia de febre• Inicialmente no tronco e posteriormente nas
extremidades• Maculopapilar, morbiforme, urticariforme e
escarlatiniforme• Presença de vesículas e bolhas torna o
diagnóstico POUCO PROVÁVEL
ALTERAÇÕES NAS EXTREMIDADES
• Presente em 88 a 94% dos casos• Eritema e edema endurado palmoplantar• Aparece dentro de 5 dias da doença• Descamação periungueal APÓS 10 a 15 dias do
início do quadro • Bastante CARACTERÍSTICO da doença
LINFADENOPATIA
• Cervical aguda não-supurativa• Presente em 50 a 75% dos casos• Uni ou bilateral• Varia de 1,5 a 7 cm de diâmetro• Gânglio firme, doloroso e não flutua• Desde o início da doença• Acompanha torcicolo e rigidez de nuca
OUTROS SISTEMAS
• GASTROINTESTINAIS: diarréia, vômito, dor abdominal, íleo paralítico, disfunção hepática com icterícia, hidropsia de vesícula biliar, pancreatite
• MUSCULOESQUELÉTICO: artrite, miosite, artralgia
• RESPIRATÓRIO: rinorréia, dispnéia, tosse, faringite necrosante, otite média, pneumonia, efusão pleural
OUTROS SISTEMAS
• SNC: irritabilidade (lactentes), meningite asséptica, paralisia facial, convulsão, hemiplegia, pleocitose do LCR (25%)
• URINÁRIO: piúria estéril, nefrite, IRA• OUTROS: uveíte, iridodociclite, hipoacusia,
alopécia, reativação do BCG, gangrena de extremidades, necrose de supra-renal, orquite, hidrocele
DIAGNÓSTICO
• CLÍNICO!!• 5 dos 6 principais sinais presentes (FEBRE é
obrigatório) ou 4 sinais associados à aneurisma coronariano (evidenciado pelo ecocardiograma ou angiografia)
• Incompleto ou atípico: 3 sinais associados a aneurisma coronariano
EXAMES COMPLEMENTARES
• ERITROGRAMA: anemia normocítica e normocrômica
• LEUCOGRAMA: leucocitose com desvio a esquerda (FASE AGUDA) chegando a 20.000mm³ por 1 a 3 semanas
• PLAQUETAS: normais na 1ª semana podendo ocorrer trombocitose com pico na 3ª semana. Média de 600.000 a 800.000mm³ (chega a 2milhões/mm³)
EXAMES COMPLEMENTARES
• VHS: aumentada em quase 100%, precoce e mantida por 6 a 12 semanas
• PCR: positiva, precoce e mantida por 6 a 12 semanas
• OUTROS: piúria estéril e C3 aumentado na 1ª semana
EXAMES COMPLEMENTARES
• ECOCARDIOGRAMA: é obrigatório em TODOS os casos, devendo ser realizado no momento do diagnóstico e repetido em 4 a 8 semanas, período em que surgem os aneurismas. Se alterações coronarianas, as artérias devem ser avaliadas ANGIOGRAFICAMENTE.
GAMAGLOBULINA• 10 a 40% dos não tratados -> arterite coronariana nas
primeiras semanas com dilatação ou formação de aneurisma das artérias coronarianas
• Uso da gamaglobulina -> INCIDÊNCAI CAI PARA 5%!!!!• Mecanismo de ação desconhecido• Intravenosa: 2g/kg dose única, infusão contínua por
12h• Melhor resultado se iniciada até 10° dia (fase febril)• Sinais desaparecem m 24 horas• Efeitos adversos: anafilaxia, calafrios, cefaléia e mialgia
SALICILATOS
• Doses antiinflamatórias: 100mg/kg/dia até 3 dias após desaparecimento da febre
• Reduzir para 3 a 5mg/kg/dia (efeito anti-trombótico) até a normalização das plaquetas, geralmente 8 a 12 semanas após início da doença
• Presença de ANEURISMA CORONÁRIO: manter indefinitivamente e imunizar contra catapora (profilaxia da síndrome de Reye)
DIPIRIDAMOL
• Usado junto com AAS se aneurisma coronariano associado com elevações marcantes na contagem plaquetária
GLICOCORTICÓIDES
• Alguns autores preconizam a utilização de pulsoterapia para pacientes que não respondem ao tratamento com gamaglobulina intravenosa
• CUMARÍNICO ou HEPARINA: aneurismas gigantes ou múltiplos
• ESTREPTOQUINASE: pacientes com trombose coronariana ou isquemia arterial periférica
• BYPASS ARTERIAL e TRANSPLANTE CARDÍACO: dependendo do grau de lesão
PROGNÓSTICO
• Sem lesão coronariana: EXCELENTE• Aneurismas pequenos: regridem
espontaneamente em 6 a 24 meses • Aneurismas gigantes (diâmetro > 8mm):
dificilmente regridem e podem vir a sofrer eventos isquêmicos na adolescência ou vida adulta