O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 20
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-039-1Cadernos PDE
VOLU
ME I
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Ficha Catalográfica Artigo – trabalho final - Professor PDE/2008
Título O MUNDO DO TRABALHO NA ARTE MURAL DE POTY LAZZAROTTO: um estudo inicial sobre as possibilidades de trabalho com a imagem artística no ensino de História.
Autor Sergio Aguilar Silva
Escola de Atuação Colégio Estadual Costa Vianna
Município da escola São José dos Pinhais
Núcleo Regional de Educação Área Metropolitana Sul
Orientador Profª Drª Luciana Martha Silveira
Instituição de Ensino Superior UTFPR
Área do Conhecimento/Disciplina História
Relação Interdisciplinar Arte, Sociologia e Filosofia
Público Alvo Alunos e professores do Ensino Médio regular
Localização Rua Paulino Siqueira Cortes, nº 2685. Vila Braga
Resumo O presente artigo objetiva problematizar a questão da imagem na contemporaneidade em sua dupla dimensão artística e ideológica, por meio do estudo da Arte Mural de Poty Lazzarotto - presente em diversos locais públicos da cidade de Curitiba - buscando entender como o artista concebe e retrata o mundo do trabalho nas suas obras murais após a década de 1950. Analisaremos também os processos e resultados da aplicação na escola do Material didático de História em forma de um OAC (Objeto de Aprendizagem Colaborativa), produzido no âmbito do PDE, o qual versa sobre a relação entre a imagem artística e o ensino de História. Ao final nos propomos a discutir os limites e possibilidades do uso da imagem no ensino de história.
Palavras-chave ( 3 a 5 palavras) História, Imagem artística, Ensino e Mundo do Trabalho
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O MUNDO DO TRABALHO NA ARTE MURAL DE POTY LAZZAROTTO:
Um estudo inicial sobre as possibilidades de trabalho com a imagem
artística no ensino de História.*
Sergio Aguilar Silva¹
Luciana Martha Silveira²
Resumo – o presente artigo objetiva problematizar a questão da imagem na
contemporaneidade em sua dupla dimensão artística e ideológica, por meio do
estudo da Arte Mural de Poty Lazzarotto - presente em diversos locais públicos
da cidade de Curitiba - buscando entender como o artista concebe e retrata o
mundo do trabalho nas suas obras murais após a década de 1950.
Analisaremos também os processos e resultados da aplicação na escola do
Material didático de História em forma de um OAC (Objeto de Aprendizagem
Colaborativa), produzido no âmbito do PDE, o qual versa sobre a relação entre
a imagem artística e o ensino de História. Ao final nos propomos a discutir os
limites e possibilidades do uso da imagem no ensino de história.
Palavras-chave: História, Imagem artística, Ensino e Mundo do Trabalho
Resume - this article aims to discuss the issue of image in contemporary
society in his dual artistic and ideological dimension, through the study of the
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*Artigo científico elaborado no âmbito do Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE-
Mural Art of Poty Lazzarotto - present in several public places in the city of
¹ Professor de História da rede pública de ensino do Estado Paraná e integrante a turma PDE 2008/2009.
² Orientadora do PDE 2008/2009 e professora Drª do Programa de Pós-graduação em Tecnologia- PPGTE/UTFPR .
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Curitiba - seeking to understand how the artist sees and portrays the world of
work in his works murals after the 1950s. We also analyze the processes and
results of applying the material in school history textbook in the form of an OAC,
produced under the CLO (Collaborative Learning Object ), which is about the
relation between the artistic image and the teaching of history. At the end we
propose to discuss the limits and possibilities of the use of the image in the
teaching of history.
Keywords: History, artistic image, Teaching and the World of Work.
Introdução
Este artigo é parte integrante das atividades de conclusão do Programa de
Desenvolvimento Educacional - PDE 2008/2009 - voltado à formação
continuada dos professores da educação básica da rede pública estadual de
ensino do Paraná, em parceria com as Universidades Públicas do Estado,
neste caso a UTFPR, representado pela orientadora dos meus estudos e
produções no referido Programa, a Profª Drª Luciana Martha Silveira. O
conteúdo deste artigo está distribuído da seguinte forma: em primeiro lugar
discutiremos em linhas gerais a questão histórico-filosófica da imagem e o
conceito de imagem artística; num segundo momento abordaremos a relação
entre a Arte Mural de Poty, o mundo do trabalho e o ensino de História; em
seguida trataremos do processo e dos resultados da aplicação do material
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didático (OAC) na escola e suas considerações finais sobre os limites e
possibilidades do trabalho com a imagem artística no ensino de História.
A questão histórico-filosófica da imagem e a imagem artística
Existe uma assertiva que diz “uma imagem vale mais do que mil palavras”.
Poderíamos começar nosso ensaio por este ponto de partida, desdobrado em
mais alguns questionamentos, a saber: quais os conceitos de imagem e
palavra? Quais as semelhanças e diferenças entre elas? Por que a assertiva
contrapõe a primeira em detrimento da segunda? Em que contexto histórico a
afirmação foi produzida? Quais os significados e implicações culturais e
ideológicas desta afirmativa categórica? E qual seria seu grau de verdade?
Portanto, uma simples afirmação como esta carrega em si uma rede de
complexidades que vale pena aprofundar, como forma de desvelarmos a
essência por trás de singelas aparências, por vezes enganosas, mas que de
certa maneira representa uma determinada faceta verídica do real, ou de suas
representações.
Conceituar o que é a imagem e palavra, não é tarefa das mais simples, pois
depende do referencial teórico e da visão de mundo de cada pesquisador. Sem
contar a complexidade de cada época. A imagem para os homens primitivos
retratada nas suas pinturas rupestres e esculturas rudimentares tinha um
significado determinado pela forma de produção de sua existência, e que
segundo aos estudos da antropologia cultural poderiam ter significados
relacionados à magia, ao animismo: ao se desenhar a caça, ou o inimigo
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apreendia-se sua força, sua alma, ou por outro lado, poderiam ter sido as
primeiras formas inconscientes de registro de suas ações necessariamente
gregárias. Pode-se dizer que as pinturas rupestres em geral foram as primeiras
imagens produzidas pelo ser humano, as primeiras representações, numa fase
em que a arte não se separava da vida, e, portanto, não existia a noção de
arte, mas talvez uma necessidade básica de comunicação, de expressão - o
que não deixa de ser a essência da Arte, afinal toda ela é uma forma de
expressão humana individual ou coletiva – e neste caso, a representação da
imagem rupestre era a palavra escrita existente naquele momento das
comunidade ágrafas. Ou seja, a imagem registrada era a palavra escrita que
não tinha sido ainda desenvolvida. Mas seria então a imagem a principal forma
de comunicação e expressão? Se mesmo não existindo a palavra escrita havia
a fala, a comunicação oral, como até hoje ocorre em sociedades indígenas
ágrafas, as pinturas e imagens representativas de alguma coisa ou de
determinadas ações humanas, eram uma das formas de comunicação e
expressão.
Nesse sentido, podemos arriscar que as imagens representadas na forma
rupestre, estavam estreitamente relacionadas ao desenvolvimento da
linguagem falada, sendo também parte da linguagem. Portanto, tanto a
linguagem falada, quanto a produção de imagens a partir de técnicas de
pinturas, pressupõe um estágio cultural mais desenvolvido do ponto de vista da
hominização do ser humano, resultado de seus enfrentamentos na produção
de sua existência. Neste caso então, a imagem era o texto naquele contexto
histórico de desenvolvimento humano, e a partir do momento que a imagem se
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torna parte de uma representação anímica de religiosidade, estamos falando
em cultura, que na nossa concepção entendemos como resultante da relação
do homem com outros homens, e com a natureza, através do trabalho, -
elemento diferenciador com os animais - pois o homem não só adapta-se, mas
transforma a natureza em seu benefício, e, por conseguinte transforma-se a si
mesmo nesta relação, segundo Engels (1997).
Por outro lado, sociedades altamente desenvolvidas do ponto de vista político,
econômico, religioso, militar, cultural e artístico como os Astecas e Incas não
desenvolveram a escrita, mas comunicavam-se de todas as formas possíveis e
tiveram uma riqueza ímpar na produção de imagens pintadas, gravadas ou
esculpidas. E também neste caso as imagens eram o texto, a palavra.
Contudo o que é a palavra e o texto? A palavra escrita culminou na cultura do
texto. O desenvolvimento da escrita na antiguidade oriental seja
mesopotâmica, indiana ou chinesa foi resultado de processos históricos
paralelos de desenvolvimento. A escrita não surge do nada. Ela tem origem na
materialidade social, pari passu ao desenvolvimento político, sócio-econômico
e cultural de uma sociedade, de uma civilização em processo de construção de
si mesma. Ela se desenvolveu por que passou a ser necessária, devido à
complexidade social de determinado processo histórico. No entanto, durante
grande parte da antiguidade e do medievo, a escrita não se disseminou a
população como um todo. Ela passou muitas vezes a ser mais um instrumento
de poder das camadas sociais dominantes, sejam econômicas ou religiosas.
Ler e escrever não eram para todos, mas para poucos. Nesse sentido, a
imagem permanecia como uma forma preponderante de comunicação e
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registro visual, “a imagem dizia mais que mil palavras”, pois ela continuava
sendo a palavra, um texto visual não-escrito.
Se palavras soltas pouco comunicam, elas só podem ter sentido ao formarem
um texto que quer dizer alguma coisa, portanto, um texto escrito pressupõe ser
composto obrigatoriamente de palavras. Segundo as escrituras judaico-cristãs
no princípio era o verbo, portanto a palavra falada que se fez vida, mas o
desenrolar da vida de um povo, de uma cultura está registrada de forma
escrita, nas sagradas escrituras, que só se tornaram sagradas por que foram
escritas, e assim registradas historicamente como forma de serem repassadas
com mais convencimento às gerações subseqüentes.
Podemos notar neste processo histórico de desenvolvimento da escrita, do
texto escrito, de forma diferenciada entre as sociedades, que o texto procurou
sobrepor-se ao mundo mágico das imagens, da idolatria, do culto religioso às
imagens. Temos aí mais um elemento novo: o monoteísmo judaico, cristão e
posteriormente islâmico, sendo que estes últimos foram altamente difundidos,
popularizados e mundialmente disseminados em diferentes momentos e de
diferentes formas. Também Platão, herdeiro de uma sociedade marcada pelas
reflexões filosóficas com base no texto escrito - contraditoriamente ao seu
mestre Sócrates que não deixara nada escrito, por que se negava a fazê-lo,
acabou registrando por escrito em suas obras as reflexões de Sócrates -
posicionou-se de forma contrária às imagens como representação, para ele tida
como enganosa, da ordem do sobrenatural, portanto, fantasmagórica e não
confiável. Pois se as imagens eram apenas representações do real, e portanto
não eram o real e sim ilusões deste, então não poderiam ter utilidade ao
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conhecimento racional, ao mundo da idéias de Platão. De certa forma ele
também estava se posicionando contra a idolatria religiosa das imagens
gregas, no contexto histórico em que o pensamento racional buscava sobrepor-
se ao mítico.
Retornando à cultura judaico-cristã e islâmica podemos perceber
historicamente que elas têm forte sustentação na palavra, no texto escrito, nas
suas escrituras, e que conseqüentemente difundiram no mundo ocidental e
oriental a palavra escrita, a cultura do texto em detrimento da imagem, pois
nasceram combatendo a idolatria das imagens, segundo FLUSSER (1998). Por
outro lado, a história do catolicismo cristão tomou outro rumo, quando
incorporou novamente as imagens ao seu culto, certamente como forma de
ampliar sua penetração popular nas massas iletradas da população ocidental.
No entanto, este direcionamento católico foi ao menos duas vezes fortemente
questionado: primeiro no Cisma do ano mil, o qual levou ao surgimento da
Igreja Cristã Ortodoxa, que já apontava para a iconoclastia, e depois
principalmente com a Reforma Protestante européia do século XVI que
reafirmou as escrituras e abominou todo e qualquer tipo de culto às imagens.
Desta forma, tanto o Protestantismo e suas derivações, quanto o Islamismo
desenvolveram e difundiram-se combatendo o culto às imagens e sobrepondo
o poder das suas escrituras, do texto escrito de vertente monoteísta. Ou seja, o
texto novamente sobrepunha-se à imagem.
“A invenção da imprensa e a introdução da escola obrigatória generalizaram a consciência histórica; todos sabiam ler e escrever passando a viver historicamente, inclusive camadas até então sujeitas à vida mágica: o campesinato proletarizou-se. Tal conscientização se deu graças a textos baratos: livros, jornais, panfletos. Simultaneamente todos os textos se baratearam (inclusive o que está sendo escrito). O pensamento conceitual
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barato venceu o pensamento mágico-imaginístico com dois efeitos inesperados. De um lado, as imagens se protegiam dos textos baratos, refugiando-se em guetos chamados - museus - “e exposições“, deixando de influir na vida cotidiana. De outro lado, surgiam textos herméticos (sobretudo os científicos), inacessíveis ao pensamento conceitual barato, a fim de se salvarem da inflação textual galopante. Deste modo, a cultura ocidental se dividiu em três ramos: a imaginação marginalizada pela sociedade, o pensamento conceitual hermético e o pensamento conceitual barato. Uma cultura assim dividida não pode sobreviver, a não ser que seja reunificada.” (FLUSSER,1998, p.19-20)
Além do mais Flusser ainda nos relembra que imagem, vem de imago, que
etimologicamente se refere à magia, a algo mágico, por conseguinte
sobrenatural. Segundo JOLY (2007) “ um dos sentidos de imago em latim, (...),
designa a máscara mortuária usada nos funerais na antiguidade romana.”
Nesse sentido, a imagem pressupõe o lugar da representação, do místico, do
não-racional.
No entanto, o combate histórico à idolatria das imagens pelo texto, levou à
textolatria, ou seja, o culto à palavra escrita como verdade absoluta, presente
nas sagradas escrituras, ou até mesmo nos textos filosófico-políticos dos
séculos XIX e XX tomados de forma dogmática. Sendo assim, a reação
histórica à textolatria segundo o referido autor foi o retorno ao mundo da
imagem, capitaneado pelo desenvolvimento das diferentes formas de
reprodução gráfica, como a fotográfica, cinematográfica e mais tarde televisiva
e de computação virtual.
Neste momento, cabe precisarmos melhor o conceito de imagem. Segundo
JOLY ( 2007) a ideia sobre imagem sempre foi muito plural e ampla, mas na
contemporaneidade ela se diversificou ainda mais e pode ser concebida como
imagens visuais, mentais e virtuais, contudo, “material ou imaterial, visual ou
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não, natural ou fabricada, uma “imagem” é antes de mais nada algo que se
assemelha a outra coisa.” (p.38) Portanto uma representação de algo, de
alguma coisa, não sendo a coisa-em-si.
Naquele combate histórico entre imagem e texto que atravessou milênios, a
imagem artística foi se aprimorando e adaptando-se à cultura histórica de
cada contexto. Certamente, foi ao longo do Renascimento entre os séculos XIV
e XVI, que floresceram os grandes nomes da pintura, desde Giotto à Da Vinci.
Ao mesmo tempo em que o artista profissionalizava-se, a sociedade européia
aburguesava-se. Notadamente podemos perceber clara diferença de
abordagem dos temas: sagrados nos países de domínio católico (Rafael,
Michelângelo por exemplo), e geralmente terrenos (Bruegel, Van Eik e
Rembrant) nos países protestantes. Além de gradativamente surgirem em
ambos os temas referências às personalidades ou mecenas, como burgueses,
nobres, reis ou papas. Parece-nos que a liberdade artística estava mais
relacionada à técnica e à forma do que ao conteúdo do que era pintado, pois os
limites estavam dados pelo contexto mencionado da época.
Cabe ressaltar que no renascimento a imagem artística convivia com o texto,
por meio da crescente produção literária, filosófica e científica de reforço da
palavra e do pensamento racional investigativo. A própria produção de imagens
artísticas buscava iluminar-se pelo texto, pelo pensamento científico do
racionalismo moderno, como no caso conhecido de Michelangelo e Da Vinci.
Como nos referimos acima, a partir do final do século XIX, mas principalmente
ao longo do XX a textolatria, o predomínio palavra segundo Flusser, passou a
ser questionada pela produção técnica das imagens, desde a fotografia com
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base na imagem fixa, até a televisão, o cinema, e a virtualidade das imagens
em movimento, como pela publicidade que incorpora as duas formas. O retorno
do predomínio das imagens neste momento histórico sobre a palavra é típico
de uma época em que o estágio avançado do capitalismo cultural ou tardio
segundo JAMESON (1996), produz a indústria cultural voltada para o consumo
das massas, e esta produção cultural precisa ser assimilada e acessível a
todos, e nada melhor que as imagens fixas ou em movimento como forma mais
apropriada de fácil comunicabilidade. As imagens passam a encantar, a dizer
mais que as palavras, por meio de símbolos fabricados se produzem culturas
de massa. Reproduções gráficas em série, e imagens em movimento do
cinema à computação visual atingem melhor os objetivos da comunicação de
massas da indústria cultural em ascensão. Os regimes políticos totalitários do
século XX souberam manipular muito bem as imagens a seu favor, muitas
vezes reforçando ideologias racistas e regimes de força.
Por outro lado, MARCUSE (1967) já apontava que mesmo nos regimes
democráticos institui-se uma sociedade administrada, altamente controlada e
limitante das liberdades, pois a manipulação política, econômica, cultural, e
portanto ideológica do capitalismo cultural se exerce também pelo domínio das
imagens sobre a palavra, presente na publicidade de imagens fixas ou em
movimento. Uma sociedade democrático-capitalista também no fundo
autoritária, pois transforma a multiplicidade da experiência humana numa
unidimensionalidade, moldando o homem à padrões de vida e consumo únicos,
singulares.
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Do ponto de vista da contemporaneidade, muitos autores como JAMESON
(1996), ANDERSON (1999), BAUMANN (2008), EAGLETON (1998) discutem
que estamos vivendo sob o signo da pós-modernidade, e isto significa a
descrença completa nas meta-narrativas (ou seja na força do texto para
compreensão do real), o enfoque no micro, no fragmento, na diferença como
identidade, na verdade como discurso, na multiculturalidade, e na
incognocibilidade do real, na subjetividade, em detrimento da visão racional e
científica de totalidade calcada nos “universais”, no homem como ser social, e
na necessidade de determinadas referências e autoridades sociais como forma
de manter a coesão social. O pensamento e a vida pós-moderna permeada de
crescente fluidez, num mundo de relações líquida segundo BAUMANN (2008),
o qual tem sua materialidade no capitalismo flexível pós-70, em q ue a
verticalização fordista foi substituída pela horizontalização toyotista, a produção
em larga escala pela produção em pequena escala para determinados nichos
do mercado, e a mão de obra teve que tronar-se multifuncional e polivalente
como forma de atender às oscilações constantes do mercado.Em suma um
modelo de produção flexível passou a exigir também uma superestrutura fluída,
liquida, maleável pronta a adaptabilidade do mercado de consumo. Neste
ponto a fragmentação do pensamento pós-moderno serve e reflete
adequadamente o atual contexto histórico-cultural, como também o predomínio
indiscriminado e a saturação das imagens são causas e conseqüências dessa
fase de disseminação da transformação da produção cultural em mercadoria,
do capitalismo cultural em estágio avançado. Segundo ANDERSON
(1999,p.132) “O movimento de reforma religiosa começou com a destruição
das imagens: o advento do pós-moderno instaurou como nunca o domínio das
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imagens.” E nesse sentido, a imagem também se transforma num produto
cultural para ser consumida, como tanto outros produtos da indústria cultural
massificados. Anderson em Origens da Pós-Modernidade discutindo o ensaio
“Transformações da imagem”, de JAMESON (2006) discute
“o objeto específico de sua crítica é o renascimento de uma pronunciada estética da beleza no cinema. (...) Sua conclusão é draconiana: onde antes a beleza poderia ser um protesto subversivo contra o mercado e suas funções utilitárias, hoje a mercantilização universal da imagem absorveu-a como uma traiçoeira pátina da ordem estabelecida: “ a imagem é a mercadoria atual e é por isso que é inútil esperar dela uma negação da lógica da produção de mercadorias; é por isso, finalmente, que toda beleza hoje é meretriz.” (ANDERSON, p.127)
Em suma, a imagem em sua diversidade de formas visuais e virtuais dentro do
contexto pós-moderno do capitalismo flexível vem sendo subsumida pela lógica
da mercadoria, do capital, e este processo é constatável na realidade diária.
Sendo assim, somos bombardeados diariamente por uma hiper saturação de
imagens, que tendem a banalizá-las e massificá-las para o consumo fácil e
acrítico, colocando em segundo plano o texto, a palavra racional para
compreensão da complexidade do real, ficando desta forma na superficialidade
representativa da saturação das imagens, que não foram feitas para explicar as
contradições da realidade do mundo e das coisas, ou seja, tem as suas
naturais limitações, contrariando assim, a afirmação histórica e culturalmente
produzida que “ uma imagem vale mais do que mil palavras”.
A Arte mural de Poty Lazzarotto, o mundo do trabalho e o ensino de
história
O Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola esteve fundamentado na
fronteira disciplinar entre Arte e História, e buscou discutir os limites e
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possibilidades dessa possível relação quando destinada ao ensino de História.
A base teórica deste projeto está na noção ampliada de fontes e documentos
históricos preconizada pela nova historiografia a partir da Escola de Annales, e
nesse sentido, em considerar a obra de Arte também como um
documento/monumento (LE GOFF, 1986), uma fonte e construção histórica,
que pode ser problematizada, questionada, interpretada e contextualizada.
Portanto, questionamos o uso da Arte e das imagens apenas como ilustrações
do passado, como provas irrefutáveis daquilo que realmente aconteceu, tal
como concebe a visão positivista de História. Do ponto de vista da nova
historiografia e estudos de arte, a imagem não fala por si só, e não é o retrato
fiel da realidade. Ela foi produzida por alguém que não está isento de ideologia,
por isso não é neutra, está carregada de significados, pretende expressar algo,
está inserida num contexto sócio-histórico e cultural, segundo MACHADO
(1984).
Ao mesmo tempo temos que considerar o caráter subjetivo da produção
artística, ou seja, ela não tem uma função explícita de estudo ou análise da
realidade, como as Ciências Humanas, tal como a História, Sociologia e
Antropologia. Antes de tudo a obra de arte é uma representação, seja através
das artes plásticas, seja via imagens técnicas como a fotografia, o cinema,
vídeo ou virtuais.
Consideramos nosso projeto como um estudo iconográfico do ponto de
vista do ensino de História. Buscando situar a representação artística no seu
contexto histórico de produção. Nesse sentido, nosso estudo iconográfico,
particularmente sobre a obra de arte, enfatiza a imagem como construção e
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fonte histórica na dimensão do Mundo do Trabalho (BURKE, 2004; CIAVATTA,
2004; CARVALHO, 1990; ALVES, 2000/2006;).
Centralizamos nosso estudo na percepção do artista e na representação
de sua obra de arte sobre o mundo do trabalho, dentro do contexto histórico de
sua produção. Mas não deixamos de abordar de alguma maneira as
possibilidades de estudo a partir das imagens técnicas como a fotografia,
cinema, vídeo e digitalizadas. Portanto, discutimos tanto as dimensões
conceituais e de análise das imagens como monumento histórico, quanto como
documento histórico representativo de uma época. Para tanto a imagem em
estudo precisa ser lida e interpretada nestas dimensões.
Partimos da Arte Mural de Poty Lazzarotto, distribuída publicamente pela
cidade de Curitiba. Apontamos suas técnicas de produção artística, mas o
aprofundamento desta dimensão estética ficará a cargo do Professor de Arte. A
dimensão artística que verdadeiramente nos interessa é como o artista através
da sua obra expressa o mundo do trabalho e suas mudanças históricas. Como
o artista percebe, registra e representa estas mudanças, e como concebe o
trabalho humano e suas contradições sociais. Ou seja, por que o artista ao
retratar um painel histórico do estado do Paraná, da tecnologia, das profissões,
ou da cidade de Curitiba, mesmo sob encomenda oficial, deixa transparecer a
presença do trabalho humano em todos os momentos? Através do trabalho
indígena, escravo, do colono na lavoura, do ferreiro, do criador de gado, ou do
operário da construção civil ao fundo ou em primeiro plano.
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Detalhe do Mural “História da Tecnologia” em Lajota cerâmica, no Centro Politécnico da UFPR (1966). Foto do autor.
Identificamos e discutimos até que ponto a origem social trabalhadora do
artista está presente na sua imensa obra, neste caso a mural, mesmo em suas
obras sob encomenda oficial. Parece-nos que o trabalho se apresenta para o
artista como uma categoria ontológica de sua vida e arte. A partir do momento
que sua própria arte pressupunha um projeto individual que só poderia
concretizar-se através de um trabalho coletivo, construído por muitas mãos
contratadas para o serviço. Como um projeto de construção civil arquitetado
por uns e edificado por tantos outros.
Portanto, a história do Estado, da cidade e seu cotidiano, ou mesmo da
evolução tecnológica e industrial retratada pelo artista em seus murais, passa
pela produção essencialmente humana, feita pelos homens em suas relações.
E isto nos parece uma dimensão social da produção e do trabalho. A máquina,
a indústria, o artefato, o objeto, a cidade, a agricultura e a pecuária, os meios
de transporte e a tecnologia, todos registrados pelo artista, são produtos
culturais eminentemente humanos e não existem sem eles. Sendo assim,
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identificamos e estudamos se o artista percebia tanto as positividades, quanto
à alienação no mundo trabalho, conforme indica a sociologia do trabalho de
formação marxista (ALVES, 2000; ANTUNES, 1999).
Detalhe do Mural "Emancipação Política do Estado", monumento ao centenário do Estado localizado na Praça 19 de dezembro. Painel em azulejos (1953).Foto do autor.
Abordamos também a materialidade da obra artística mural de Poty, a partir
da sua contextualização histórica e da origem social do artista e sua
percepção sobre o mundo do trabalho. Dentro dos limites e possibilidades
desta análise. Caminhando entre a subjetividade da produção do artista e a
objetividade social e coletiva das mudanças históricas no mundo do trabalho.
Nesse sentido, investigamos como sua obra em foco expressa esta relação
entre o subjetivo e o social em processo de mutação, pois os últimos
cinqüenta anos de intensa produção mural do artista coincidem com a
acelerada modernização urbano-industrial brasileira, com o gradativo
predomínio do trabalho urbano sobre o rural, do fabril sobre o artesanal.
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Portanto, décadas de profundas transformações sociais, produtivas e
culturais testemunhadas pelo artista e de alguma forma representadas na
sua arte mural.
Detalhe do Mural "Ciclos Econômicos do Paraná" (1998).Foto do autor.
Estudamos também como o artista retratou em sua obra as mudanças no
mundo trabalho em curso. Sua obra resiste e/ou aceita a estas mudanças? É
nostálgica, crítica ou assimiladora sua forma de representação? O que nos
dizem suas imagens muralistas sobre sua visão de mundo? Quais seriam seus
significados subjetivos e explícitos? Como sua visão de mundo e do trabalho
transparece mesmo em obras murais sob encomenda oficial? Por que colonos,
ferreiros, escravos, pequenos vendedores, garimpeiros, lenhadores e
carroceiros insistem em marcar presença em sua obra? O que eles significam
para o artista?
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Mural “Curitiba e sua gente”(1993). Foto do autor.
Por outro lado, este estudo de uma determinada produção mural de um
artista como Poty, pode servir de sugestão de análise para outras obras
artísticas na sua relação com o ensino de História. Pois temos uma infinidade
de artistas nacionais e estrangeiros que poderiam ser mais trabalhados nesta
perspectiva pedagógica, desde os renascentistas, barrocos, impressionistas e
modernos, como por exemplo, Picasso até um Portinari, ou de Van Gogh até
uma Tarsila do Amaral. O que interessa saber e formular é qual a pergunta que
fazemos a obra de determinado artista? O que queremos saber dela? Em
nosso caso queremos desvendar como Poty representou o mundo do trabalho
e suas mudanças em sua obra mural, tão somente. Outras perguntas poderiam
ser feitas à mesma obra.
Aplicação do material didático na escola – relato e considerações
O material didático produzido o âmbito do PDE foi um Objeto de Aprendizagem
Colaborativo (OAC), pois era a melhor tipologia de material que se adaptava a
proposta de trabalho com imagens artísticas no ensino de História. O material
se intitulou A IMAGEM ARTÍSTICA NO ENSINO DE HISTÓRIA - Um estudo inicial
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sobre as possibilidades de trabalho com a imagem artística no ensino de
História, a partir do registro do Mundo do Trabalho, na Arte Mural de Poty
Lazzarotto.
O referido material didático visava “discutir a questão das imagens - mais
especificamente as imagens artísticas – e sua melhor utilização no ensino de
história do ponto de vista do estudo iconográfico, dialogando com o ensino da
Arte e com outras áreas disciplinares como Sociologia e Filosofia. E insere-se
nas Diretrizes Curriculares de História (DCE) para o Ensino Médio, no
Conteúdo Estruturante: Relações de Trabalho, e no Conteúdo Básico:
Urbanização e Industrialização - Urbanização e industrialização no Paraná no
contexto da expansão do capitalismo.”(OAC)
O material didático produzido foi implementado durante o processo de
intervenção pedagógica do Projeto numa escola de ensino fundamental e
médio e profissionalizante do município de São José dos Pinhais. Em primeiro
lugar apresentei o Projeto à direção e equipe pedagógica do referido
estabelecimento para seu conhecimento. Num segundo momento, apresentei e
repassei o OAC produzido aos professores de História, Sociologia e Arte do
Ensino Médio para que estes tomassem conhecimento do material,
entendessem seu propósito e pudessem a qualquer momento utilizá-lo em
suas aulas. No decorrer da apresentação do material aos professores, surgiu
também a possibilidade de trabalhar com a professora da disciplina de
Metodologia do ensino de História ministrada para turma de Formação de
Docentes, antigo Magistério. Num terceiro momento foi implementado o
Projeto e o material didático para duas turmas selecionadas: uma turma do 2º
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ano do ensino médio e uma turma do curso de formação de docentes do último
ano.
A apresentação do material aos professores das disciplinas mencionadas
foi de certa maneira burocrática, e não senti grande receptividade, pois tive que
utilizar um tempo da hora-atividade de cada professor de forma individual e
separada, por que a escola não proporcionava a hora-atividade conjunta por
disciplina, inclusive devido ao estabelecimento de ensino estar passando por
um processo de intervenção na direção. Nesse sentido, mergulhados na
burocracia diária de manutenção dos diários de classe e da correção de provas
e trabalhos, os professores não mostravam disposição para uma atividade
experimental no ensino de história, mesmo que se mostrasse completamente
inserida nas Diretrizes Curriculares de História para o Ensino Médio.
O propósito inicial era aplicar o Projeto e ao material didático
primeiramente com os professores de História e Arte, mas frente as condições
reais escolares que se apresentavam, resolvi implementar o Projeto e o
material diretamente com os alunos, em duas turmas citadas anteriormente. A
experiência foi muito gratificante do ponto de vista educacional, proporcionado
pontos altos e baixos do processo.
Utilizei 8 aulas distribuídas ao longo de dois meses letivos, sendo 1 aula
por semana para cada turma. Combinei com a equipe pedagógica da Escola e
os professores de História e Metodologia das referidas turmas selecionadas a
cessão das aulas semanais. Em primeiro lugar a implementação foi mais
produtiva e qualificada na turma do regular do que na turma de Formação de
Docentes. A turma do regular foi mais receptiva ao trabalho e à discussão da
abordagem em relação á História e a imagem artística, portanto seu retorno
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foi mais produtivo, enquanto a outra turma o trabalho foi prejudicado pela
apatia, falta de seriedade e compromisso com o conhecimento e com a
educação em geral por parte de grande parte da turma, que
contraditoriamente estava no último ano do curso de Formação de docentes, e
também por estarem voltados para outros objetivos como conclusão do curso
não se mostraram receptivos.Acabei então centrando o trabalho na turma de 2º
ano do ensino médio se mostrou mais receptiva e pronta para discussão, além
de se mostrarem argutos e inteligentes quando eram por mim instigados.
A aplicação do Projeto e implementação girou em torno do trabalho com a
Imagem artística e a imagem em geral no ensino de História do Paraná, tendo
como foco a obra mural de Poty Lazzarotto. Em primeiro lugar apresentei em
linhas gerais o Projeto e seu propósito e fomos direto para a discussão da
relação entre imagem e ensino de história. Discutindo se as imagens eram a
imitação real de uma época histórica, ou eram apenas representações de uma
realidade histórica na visão e concepção do seu autor. Para tanto iniciamos
com o uso da TV Pen-drive com as pinturas de Domingos Jorge Velho de
Benedito Calixto, datada de 1903, de Tiradentes esquartejado de Pedro
Américo de 1893 e O martírio de Tiradentes de Aurélio Figueiredo de 1905
contida no OAC.
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Domingos Jorge Velho, Benedito Calixto, Museu Paulista.
Fonte - http://commons.wikimedia.org/wiki/Benedito_Calixto
O martírio de Tiradentes, Aurélio Figueiredo, Museu Histórico Nacional. Fonte: http://www.museuhistoriconacional.com.br/
As imagens artísticas apresentadas foram um pretexto proposital para se
iniciar a discussão entre a relação Arte e História. Fomos interpretando as
imagens por meio de perguntas aos alunos, sobre o que eles estavam vendo, o
que estava representado, a que época se referia. Se era uma representação
sobre determinadas personagens históricas ou o próprio retrato fiel de uma
época ou personagem. Esclareci sobre as datas em que foram pintadas as
obras, portanto em outra época histórica dos referidos personagens, e nesse
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sentido, não passavam de representações artísticas e histórico-culturais de
uma época sobre a anterior, e que as imagens apresentadas diziam mais sobre
o contexto da produção artística do que sobre os personagens retratados. Os
personagens eram representados segundo a concepção da época sobre eles,
como heróis e símbolos da nação brasileira em construção.
A intenção foi abrir a discussão sobre como a imagem, no caso, a
imagem artística é apenas uma representação do real e jamais o real, além
dela representar a idéia , a concepção de uma época. Nesse sentido, os alunos
passaram a entender também a imagem artística sobre um fato histórico como
possível de manipular o fato reduzindo-o ou glorificando-o. Os alunos
imediatamente relacionaram como a imagem pode manipular sua
representação por meio da imagem televisiva, virtual e publicitária.
Orientei então uma leitura e discussão do “Mito da Caverna” de Platão, de
forma que os habitantes da caverna viviam numa ilusão, pois acreditavam que
havia gigantes, quando de fato eram as sombras de transeuntes atravessados
pela luz que se projetavam na parede da caverna. Os gigantes eram imagens,
sombras projetadas e não a realidade. Discutimos então a imagem enquanto
representação e mesmo como ilusória e que, portanto, as imagens precisam
ser lidas e interpretadas criticamente para que não se imponham como o
retrato do real, nem serem assimiladas passivamente. Debatemos então os
problemas do atual predomínio do mundo das imagens sobre a palavra, sobre
o texto, e as suas possíveis conseqüências sócio-culturais. Como dissemos os
alunos logo relacionaram a atual fabricação de imagens com algo não
confiável, e neste caso a desconfiança é uma forma crítica e positiva de se
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relacionar com o mundo da imagem. Evidentemente que não é nada fácil para
a juventude que está diariamente bombardeada e mergulhada no mundo da
imagem para consumo, mas de uma forma ou de outra eles parecem reagir à
indústria cultural de massificação mercadológica, mesmo que seja pela apatia,
indiferença e atos irresponsáveis, pois perguntei em sala se além das pinturas
apresentadas de mais se manipulavam e fabricavam-se imagens e
responderam prontamente que a televisão, o computador e a propaganda, que
no fundo são suportes, meios de transmissão das imagens.
Num segundo momento discutimos um texto do OAC sobre urbanização
e industrialização do Paraná. A partir das questões sobre o texto discutimos o
processo de urbanização e industrialização no Paraná, desde a economia
madeireira, da erva-mate, do café e da industrialização, bem como quem eram
os trabalhadores e suas condições vida, onde geograficamente situavam-se e
como estas economias estavam inseridas no contexto de urbanização,
industrialização e desenvolvimento do capitalismo brasileiro após a segunda
metade do século XIX. A intenção desta atividade foi uma de situar
historicamente os alunos nas temáticas nos murais de Poty sobre a história do
Paraná e sobre a história das técnicas e das tecnologias.
No terceiro momento da implementação, após situarmos os alunos no
contexto sócio-econômico e histórico do Paraná, trabalhamos basicamente
quatro grandes murais de Poty instalados em Curitiba, a saber: Emancipação
Política do Estado (1953), Ciclos Econômicos do Paraná (1998), Curitiba e
sua gente (1993) e História da Tecnologia (1966). Apresentamos aos alunos
alguns detalhes ampliados dos murais e propusemos que o professor de Arte
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trabalhasse como era a técnica de pintura em azulejo cerâmico, pois
entendemos que não caberia ao professor de História aprofundar esta questão
técnico-artística. Os detalhes dos murais mencionados acima foram
apresentados por meio da TV – PENDRIVE que está disponível em cada sala
de aula da rede pública estadual do Paraná e a partir dos detalhes
perguntamos aos alunos como as imagens relacionavam-se a qual economia
paranaense dos séculos XIX e XX, como os trabalhadores eram retratados,
quais os meios de transporte utilizados, as formas de trabalho e como o artista
representava estes diferentes momentos históricos. À medida que fomos
apresentando os detalhes dos murais e discutindo com os alunos as suas
impressões, fomos esclarecendo que as pinturas do artista sobre a história do
Paraná estavam baseadas na sua visão sobre o processo histórico paranaense
de urbanização e industrialização, marcadamente pela presença humana neste
processo, pois as imagens não apreciam descoladas do trabalho humano.
Nesse sentido, fomos esclarecendo também, que o autor poderia ter uma
concepção de história, quando o trabalho e a presença humana permeavam a
obra mural de Poty, e não apenas datas e fatos cronologicamente
estabelecidos. Portanto, com base em sua obra mural de Poty selecionada
para este estudo até podemos deduzir que a História para o referido artista era
feita pelos homens concretos em suas relações com a natureza e com outros
homens ao longo do tempo, pois o trabalhador: o colono, o imigrante, o
carroceiro, o ferreiro, o garimpeiro, o caçador, o indígena, os negros, o
caboclos, os operários, os ervateiros, tanto mulheres, como homens e crianças,
e seus respectivos patrões estão fortemente presentes nos murais. Sendo
assim, fomos aos poucos discutindo que os murais eram representações do
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artista sobre uma época, conforme a sua visão de mundo somada a visão
corrente de sua época sobre as outras. De forma a deixar claro que os murais
não eram um retrato fiel de diferentes momentos da história do Paraná, mas
representações do artista inserido na sua época sobre a história, ou seja, como
o artista via, concebia e representava uma determinada época. E neste caso
podemos perceber a importância da ação humana a todo o momento
representado em sua obra mural.
Trabalhamos também que inexistem estereótipos em sua obra mural
estudada, nem exaltação de personalidades, pois são coletividades, relações
humanas que estão presentes no processo histórico. Além do mais discutimos
que foram obras sob encomenda oficial para o artista, mas que mesmo assim
ele não enalteceu personalidades, mas o trabalho humano como construção de
uma história. Este foi o ponto fundamental dos murais apresentados,
proporcionar ao aluno um estudo histórico por meio da imagem artística. E
neste caso tendo o trabalho humano como foco central, mas situando também
os diferentes momentos da produção mural do artista, respectivamente nas
efervescentes e nacionalistas décadas de 50/60 e a década de 90 numa fase
de redemocratização política de viés econômico neoliberal no Brasil.Discutimos
ainda com os alunos que a própria obra mural de Poty, artista renomado
nacionalmente, tinha sua própria trajetória histórica ao longo das décadas de
40 à 90 e suas obras não deixam de conter este movimento de influências,
concepções e contradições sócio-econômicas do povo brasileiro. Podemos
relacionar a obra de Poty a de outros grandes artistas nacionais e também
muralistas como Di Cavalcanti e Portinary o quais tinham forte tendência
modernista de preocupação social e de respeito a maioria da população
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brasileira ao longo de nossa história de exploração colonial indígena,
escravocrata e imigrante, mas que certamente foram estes trabalhadores que
construíram e constituíram a história social do Brasil.
Breves conclusões
Ao final da implementação do Projeto e do material didático na Escola
diretamente com os alunos, com base na discussão do conceito de imagem e
suas possíveis manipulações, nos conteúdos de história sócio-econômica do
Paraná inserida no contexto nacional de urbanização e industrialização, e nas
obras murais de Poty, concluímos o trabalho proposto com os alunos
solicitando à eles um texto avaliativo no qual discorressem sobre o que
apreenderam da relação entre a história e a imagem artística. Os textos
produzidos foram bastante interessantes, argutos e elucidativos, pois os alunos
registraram que aprenderam “a olhar as imagens [e as imagens artísticas] com
outros olhos”, que passaram a entender a diferença entre “retratar e
representar” alguma coisa do passado ou do presente, a compreender que as
“coisas” são mais complexas do se pensa. Em suma, nós podemos concluir
que a obra de arte reflete muito mais a época que vive o artista, do que o
passado que ele procura representar, e que o artista tem sua própria visão de
mundo a qual está inserida na cultura de sua época, e assim todo o artista,
todo o homem é fruto do seu tempo, mesmo que ele ultrapasse os conceitos e
pré-conceitos de sua época ele constitui-se numa cultura histórica.
Por outro lado, podemos concluir também que a imagem do ponto de
vista crítico é pouco trabalhada no ensino de história na educação básica, elas
são tomadas mais como ilustrações de uma época do que como texto e
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documento ou fonte histórica que precisa ser lido e interpretado também, e não
assimilada como se fosse o real, pois ela nunca será o real, mas apenas uma
representação pessoal/cultural de determinado tema de uma época. Portanto
as imagens artísticas de cunho histórico acabam muito mais nos dizendo sobre
a época em que foi produzida, do que aquela que está se propondo a
representar, pois o artista e sua obra estão permeados pela cultura da sua
época. E isto precisa ser levado em conta para se estudar e buscar
compreender as imagens artísticas, mas também as imagens produzidas de
forma técnica e virtual, pois todas se tratam de representações bidimensionais
ou tridimensionais do real, nunca o real, e quando o forem deixarão de ser
imagens e sim o próprio real.
Por fim, o estudo da imagem artística no ensino de história possibilita
certamente uma compreensão mais ampla e crítica do seu uso, desde que ela
não seja tomada como prova cabal, mas como fonte histórica que precisa ser
criticamente interpretada por professores e alunos envolvidos no processo
ensino-aprendizagem. Abre também um amplo espaço para o trabalho com
outras possibilidades de imagens visuais desde as cinematográficas,
televisivas e virtuais no ensino, que também precisam ser dimensionadas como
produtos de uma época. Também os filmes que tratam temáticas históricas
podem nos informar mais sobre a visão de mundo da época em que foi
produzido, do que sobre a época que busca retratar. Assim não podem ser
tomados como provas de uma época, mas apenas como representações de
uma época sobre outra, pois também o que produzimos são conhecimentos
históricos sobre determinado tempo e estes conhecimentos produzidos
dependem da visão de mundo do observador. Portanto estudar as imagens
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artísticas é também entendê-las como um conhecimento histórico produzido
social e culturalmente por meio das imagens, e sua mensagem pode mais estar
no subtexto do que de forma explícita. Acima de tudo, precisamos desconfiar
das imagens que estamos estudando para que possamos apreendê-las
enquanto fontes históricas culturalmente produzidas, a carregadas de
contradições e ideologias. Em resumo, trabalhar com imagens artísticas no
ensino de história tem imensas possibilidades positivas como demonstramos
neste artigo e no projeto aplicado, mas também tem limitações se tomadas
apenas como ilustração ou prova irrefutável de determinado objeto do passado.
E se considerarmos que vivemos atualmente sob o predomínio do mundo das
imagens sobre o texto, sobre a palavra, urge trabalharmos a imagem de forma
crítica para que a juventude não assimile passivamente e possa ler e reagir à
manipulação e ao hiperconsumo imagético que nos cerca, pois a “imagem não
diz tudo!”.
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