Doença de Hirschsprung
Monitoras: Niara Oliveira e Ângela Piccoli ZieglerDisciplina de Genética Humana
FFFCMPA - 2002
Histórico1888: Harald Hirschsprung descreveu 2
garotos com constipação crônica , disten-são abdominal e megacolon
1940: ausência de células ganglionares intramurais dos plexos mioentéricos e submucosos
1948: Swenson e Bell desenvolveram procedimento cirúrgico – transmissão familiar
1973: Bolande propôs o termo neurocristo-patia
Definição
Malformação congênita do intestino
caracterizada pela ausência de células
gangliônicas intrínsecas parassimpáticas
nos plexos submucoso e mioentérico
Epidemiologia
incidência: 1:5000 nascidos vivos raça homens 4:1mulher (forma clássica) 4% prematuros aganglionose colônica total: feminino igual
a masculino;
Epidemiologia Ocorre como uma característica isolada em
70% dos casos Associação com anormalidade cromossô-
mica em 12% dos casos
Associação com anormalidades congênitas adicionais em 18% dos casos (algumas síndromes monogênicas )
Patologia
Parada prematura da migração craniocaudal
das células vagais da crista neurais no
intestino grosso entre a 5ª a 12ª semana de
gestação para formar o sistema nervoso
entérico (neurocristopatia)
Patologia 5a semana: precursores de neuroblastos no
intestino primitivo anterior 8a semana: colon transverso 12a semana: reto após a migração caudal dos neuroblastos, ocorrem
a distribuição e a migração dos mesmos para camadas mais superficiais e mais profundas da parede intestinal, seguidas de maturação dos neuroblastos para célula ganglionares
Patologia fatores imunológicos: destruição de células
ganglionares (?) ausência de células ganglionares nos feixes
intermuscular (Auerbach) e submucosas (Meissner) do intestino
zona aganglionar é aperistálica, espástica, contrai-se em bloco
Patologia segmentos proximais ganglionares se dilatam hipertrofia muscular e parede espessada vasos da parede se dilatam esfíncter interno do reto também tem sua
inervação alterada entre as zonas espástica e dilatada, há uma
zona de transição hipoganglionar (graus variáveis de hipertrofia de fibras nervosas; zona doente)
Classificação Forma curta: segmento agangliônico não se
estende além do sigmóide (80%) Forma longa: segmento agangliônico se
estende proximalmente ao sigmóide (20%) Limite inferior: esfíncter anal externo
Variantes:
1) Aganglionose colônica total (3-8%)
2) Aganglionose intestinal total
3) Forma ultra-curta (reto distal)
4) Aganglionose setorial (?): porção agangliônica está acima de um segmento distal normal.
Características Clínicas Obstrução intestinal com as seguintes
características:1) Falência na passagem do mecônio em 48h2) Distensão abdominal que alivia com
estimulação retal ou enema3) Vômitos4) Enterocolite neonatal 5) Desnutrição crônica
Características Clínicas A intensidade da sintomatologia depende
mais da maior quantidade de fibras
colinérgicas no reto (maior espasticidade),
do que da extensão da zona aganglionar
Diagnóstico 50% das crianças tem o diagnóstico feito no
período neonatal Radiografia simples de abdome Enema opaco Manometria anorretal Biópsia da parede retal Exames histológicos: coloração HE;
pesquisa da atividade da acetilcolinesterase
Alguns pacientes são
diagnosticados mais tardiamente
na infância ou até na idade adulta
com constipação severa, distensão
abdominal crônica, vômitos
Raramente se apresenta por
perfuração inexplicada do ceco ou
do apêndice
Radiologia
Distensão do intestino delgado e
colon proximal com reto vazio
Algumas vezes é possível
identificar zona retal espástica
Não dá diagnóstico de certeza
Enema Opaco
Bário (não tem efeito laxativo)
Presença de zona espástica ao nível do reto
e dilatação dos segmentos intestinais acima
Extensão do segmento agangliônico
Mais significativo quanto maior a idade e a
espasticidade da zona acometida
Enema Opaco
Não é sensível nem específico no período
neonatal
Sem preparo prévio
Obter um radiografia de retardo de 24 horas
MANOMETRIA ANORRETAL não é útil: RN com IG 39 semanas; 12
dias de vida útil como método de exclusão um crianças
com constipação intestinal método de triagem nos casos de megarreto,
criança com colostomia prévia e nos casos de diagnóstico duvidoso.
EXAMES HISTOLÓGICOS
coloração pela hematoxilina – eosina
(ausência de células ganglionares e
existência de troncos hipertrofiados)
pesquisa da atividade de acetilcolinesterase
(aumentada no HSCR)
Biopsia da Parede Retal ausência de células ganglionares nos plexos hipertrofia das camadas musculares; fibras nervosas pré-ganglionares
hipertrofiadas (provenientes da cadeia parassimpática paravertebral
Diagnóstico diferencial Íleo meconial ( fibrose cística) Malformação intestinal: atresia intestinal
baixa ou colônica, mal rotação ou duplicação intestinal, etc
Anormalidade do SNE: síndromes de pseudo – obstrução intestinal crônica
Obstrução intestinal funcional resultante de infecção materna, intoxicação materna, hipotireoidismo congênito
Etiologia Clinicamente a doença de HSCR pode ser
dividida em: Doença de HSCR Sindrômica
Doença de HSCR Isolada
Doença de HSCR Sindrômica
Síndrome de Lesch-NyhanDisplasia Mesomélica
MiscelâneaHSCR com anormalidades de membros
Síndrome de KaplanGoldberg-Shprintzen
Síndrome de Clayton-SmithHSCR mandatória
Distrofia muscular congênita de Fukuyama
Síndrome de Riley-Day
HSCR raramente associadaSíndrome da Hipoventilação Central Congênita
Síndrome de Smith-lemli-OptizMEN 2
Síndrome de McKusick-KauffmanSíndrome Waadenburg
HSCR ocasionalNeurocristopatias
Alterações Cromossômicas
Síndrome de DownA trissomia livre do 21 é a alteração
citogenética mais comumente associada à Doença de HSCR (2 a 10% dos casos de
HSCR). Nesses casos, a prevalência de S-HSCR e do sexo masculino é ainda maior
que nos casos não-sindrômicos.
Alterações Cromossômicas
Síndrome de DownA superexpressão dos genes do
cromossomo 21 como predisposição ao desenvolvimento da doença de HSCR é
uma das hipóteses.
(gene suscetível mapeado na região 21q22)
Alterações CromossômicasMicrodeleções
Algumas deleções intersticiais associadas a HSCR têm sido importantes para a
identificação de genes predisponentes: Deleção intersticial 10q11.2 em pacientes
com L-HSCR e aganglionose total (que levou à identificação e mapeamento do primeiro gene para doença de HSCR);
Alterações Cromossômicas
Deleção intersticial 13q22.1-32.1 em pacientes com S-HSCR (que levou ao
mapeamento de um segundo gene EDNRB);
Síndrome da deleção intersticial 2q22-23 em pacientes com HSCR (que levou à
identificação do gene SIP1)
Alterações Cromossômicas
Outras anormalidades cromossômicas raras já foram descritas em associação com HSCR:
Síndrome de DiGeorge, mosaico para trissomia do 8, Síndrome XXY; duplicação parcial do cromossomo 2q, tetrassomia 9p e
deleção 20p.
Alterações CromossômicasN0. Casos Gene Características ClínicasCromossomo
4?Síndrome dos Olhos de GatoTri 22pter-q11
4?MCA/RMDel 17q21
3SIP1Microcefalia, RM, epilepsia, dismorfias faciais e HSCR
Del 2q22
7EDNRB
RM, retardo crescimento, dismorfias e S-HSCR
Del 13q22
2RETRM e L-HSCRDel 10q11
2 a 10% casos HSCR
?Síndrome de Down e
S-HSCR
Tri 21
Doença de HSCR Sindrômica
Na doença de HSCR Sindrômica o padrão de herança obedece ao padrão de herança
característico de cada síndrome.
Doença de HSCR Isolada
A doença de HSCR isolada é considerada
uma Doença de Herança Complexa
Pode se apresentar com padrão de herança mendeliana monogênica ou com padrão de
herança multifatorial.
Hirschsprung disease as genetic model of a complex inheritance
Genetic Heterogeneity Synergistic
Mutations in anyone of several genes are sufficient for phenotypeexpression of HSCR
The cumulative effect of mutations in multiple genescontributes to the phenotypein one individual
The interaction of both mechanisms determines all disease phenotypes in a HSCR population
Doença de HSCR Isolada Uma mutação em apenas um dos genes
predisponentes pode causar o fenótipo da doença de HSCR – Herança Monogênica
Mutações em diversos genes podem determinar em conjunto o fenótipo de HSCR – Herança Multifatorial
Doença de HSCR Isolada
Independentemente, o principal gene envolvido no desenvolvimento da Doença
de HSCR é o RET.
Alterações Moleculares
RET (“rearranged during transfection”)
Estima-se que mutações no RET sejam responsáveis por mais de 50% dos casos de
HSCR isolada.
Alterações MolecularesOutros genes envolvidos no
desenvolvimento da doença de HSCR incluem:
GDNF (5p13) EDNRB (13q22) NTN (19p13) SOX10 (22q13)
Características do gene RET Definição: É um proto-oncogene que
codifica uma glicoproteína transmembrana relacionada à família dos receptores tirosina-kinase.
Localização: 10q11.2 Tamanho: 60 Kb/21 éxons (O íntron 1
corresponde a 24Kb, ficando o restante do gene (éxons 2 a 20) dispostos em apenas 31kb).
Características do gene RET Proteína: Codifica uma proteína
transmembrana tirosina-kinase, similar às demais proteínas da família de receptores tirosina-kinase, exceto pela presença de um domínio caderina-like (responsável pela adesão célula-célula) e uma região rica em cisteína na porção extracelular.
Características do gene RET Isoformas: Devido ao mecanismo de
splicing alternativo do RNAm, a proteína RET é expressa em duas principais isoformas, RET 43 e RET 51. A RET 51 é a maior das isoformas, com 1114 aminoácidos. É co-expressa com a RET 9 na maioria dos tecidos.
Mecanismo de Ativação do RET‘Ménage à trois’
O RET se associa ao GFR-1 (“GDNF family
receptors”) e forma receptores para a família de ligantes GDNF (“glial-cell-line-derived neurotrophic
factor”). O GDNF faz parte da família dos GFLs (“glial-cell-line-derived neurotrophic factor ligands”),
que também inclui NRTN (“neurturin”), ARTN
(“artemin”) e PSPN (“persephin”).
RET-Receptor complex
Extracellular
IntracellularTK2
TK1
CD
CYS
TK2
TK1
CD
CYS
RET
GFR2GFR1
GDNF NTN
Cell membrane
Gentilmente cedido por Alexandre Serra
Mecanismo de Ativação do RET
A molécula dimérica de GDNF se liga a dois monômeros de GFR-1 e esse complexo se
liga ao RET, promovendo sua homodimerização e ativação.
Mecanismo de Ativação do RETO RET não é capaz de se ligar ao GDNF na ausência do GFR-1. No entanto, a afinidade
desses dois compostos entre si não é modificada pela presença ou não do RET.
Por isso, mutações que afetam apenas o GDNF também podem causar HSCR (causa
rara, menos de 5% dos casos).
Mecanismo de Ativação do RET
A ativação do RET promove a autofosforilação dos resíduos de tirosina-kinase na cauda citoplasmática, criando
locais de sinalização para múltiplos segundos-mensageiros (PI3K, JNK, PLC,
Ras-MAP kinase).
Papel do RET no desenvolvimento do SNP
O RET é expresso em uma população de células da crista neural que migram do
neuroepitélio cerebral e colonizam todo o tubo digestivo, formam o gânglio simpático cervical superior e dão origem às células C
da tireóide.
Papel do RET no desenvolvimento do SNP
Células RET + são detectadas durante a sua migração no mesênquima intestinal e subseqüentemente são observadas nos plexos nervosos (Plexos de Auerbach e
Meissner) que formam o SNE.
Papel do RET no desenvolvimento do SNP
As células que migram da crista neural para o tubo digestivo co-expressam RET e GFR-1
e dependem da interação com o GDNF durante a migração ou no local de
gangliogênese para que sejam funcionais.
Papel do RET no desenvolvimento do SNP
O GDNF é expresso em todo mesênquima embrionário gastrintestinal – é um potente
quimiotrófico, mitogênico e fator trófico de diferenciação para precursores entéricos
derivados da crista neural. O GDNF promove a proliferação e a sobrevivência
dos progenitores do SNE cultivados in vitro.
O RET também é expresso em tumores derivados de células da crista neural, como neuroblastomas, carcinomas medulares de
tireóide e feocromocitomas – o que sugere a participação do gene no controle da
proliferação, diferenciação, migração e funcionalidade das células da provenientes
da crista neural!
RET e HSCR Fisiopatologia
Mutações no RET são responsáveis por mais de 50% dos casos familiares de HSCR
isolada.As mutações distribuem-se por toda a
extensão da seqüência codificadora – não há um hot spot bem estabelecido (umas das
poucas coisas que se sabe com certeza!) .
Mutações do RETOs tipos de mutações que podem ocorrer
incluem: Deleções e inserções Mutações frameshift Mutações missense e nonsense Alterações de splicing
Mutações do RETAs conseqüências funcionais das mutações
estão relacionadas à sua posição na seqüência codificadora e são classificadas
em 4 grupos: Mutações Classe I: localizadas no domínio
extracitoplasmático, alteram a maturação do RET e inviabilizam o envio do sinal através da membrana plasmática
Mutações do RET
Mutações Classe II: causam substituição de um dos 4 resíduos extracitoplasmáticos de cisteína por um aa diferente, provendo uma alteração constitutiva na proteína, que diminui sua presença na superfície celular
Mutações do RET Mutações Classe III: afetam o domínio
tirosina-kinase, diminuindo sua função catalítica (diminuem sinalização)
Mutações Classe IV: não diminuem sua atividade tirosina-kinase, mas interferem especificamente na transmissão do sinal para os segundos-mensageiros
1. Impairment of
RET transport to
the cell membrane
TM
NH2
TK2TK1
COOH
CD CYS
5' Exon Skipping 3' alternative Splicing
extracellular intracellular
2. Impairment of
RET transport to
the cell membrane
and covalent
dimerization
3. Complete or
partial loss of
RET kinase activity
4. Disruption of
the binding of
transduction
proteins on
Tyr 1062
Gentilmente cedido por Alexandre Serra
FisiopatologiaAs mutações do RET identificadas em
pacientes com HSCR são todas em heterozigose, indicando que uma única
cópia do gene normal é insuficiente para o desenvolvimento adequado do SNE. Isso
pode ser explicado em termos de HAPLOINSUFICIÊNCIA.
Correlação Fenótipo x Genótipo
Cada uma dessas mutações tem efeito específico, dependendo do tecido onde o RET está sendo expresso. Podem resultar
tanto em proliferação celular descontrolada (ganho de função) quanto em indução de
apoptose (perda de função).
RET proto-oncogene
Activation
Inactivation
Neurocristopathy
- Multiple Endocrine Neoplasia type 2- Sporadic MTC
- Hirschsprung disease- Ondine‘s curse ?
Pluripotentialprecursor cellsof the neuralcrest
Embryo-genesis
Gentilmente cedido por Alexandre Serra
Correlação Fenótipo x Genótipo
É muito pobre a correlação fenótipo X genótipo na doença de HSCR! Mutações
isoladas no gene RET são responsáveis pelo fenótipo, no entanto, mutações isoladas em outros genes predisponentes também podem determinar o desenvolvimento da doença.
Tratamento Depende da extensão de cólon comprometida: Colectomias parciais com anastomose
primária Colectomia total com construção de bolsa
ileal (J-Pouch) Derivação do trânsito intestinal (Duhamel)
Aconselhamento GenéticoNos casos de Doença de HSCR monogênica
(mutação no RET), o padrão de herança é autossômico dominante com penetrância
incompleta, expressividade variável e sexo-dependente.
Mutações em outros genes também podem seguir padrão de herança mendeliana.
Aconselhamento Genético
Nos casos isolados de HSCR, um adequado risco relativo para a prole do probando pode
ser calculado levando em consideração o sexo e tamanho do segmento acometido no probando e o sexo da prole (Paradoxo de
Carter).
Aconselhamento Genético
5% / 3%33% / 9%Probando feminino
5% / 1%17% / 13%Probando masculino
Risco de Recorrência (irmãos homem:mulher)
17:452:40 Penetrância (%) (homem:mulher)
MultifatorialDominanteModelo de Herança
5,51,75Razão por sexo (H:M)
8119% de probandos
S-HSCRL-HSCR
Aconselhamento Genético
O risco de recorrência global da doença de HSCR na irmandade de um indivíduo
afetado é de 4%.
Lembrar: Pobre correlação fenótipo X
genótipo!!
Aconselhamento Genético
Não está indicado screening de mutações para doença de HSCR, exceto a testagem para mutações no éxon 10 e 11 do gene RET,
que são locais de mutações predisponentes ao desenvolvimento da Síndrome MEN2A.
“The dream is over!”
Agradecimentos especiais à Prof. Carla Graziadio e à Prof. Beth