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T - Você acaba de conquistar um prêmio muito importante para um
instrumentista. Fale sobre o concurso, sua importância, os principais
vencedores...
F - O Concurso faz parte do Festival internacional Primavera de Praga. Acontece
desde 1947 e revelou nomes como Mstislav Rostropovich, James Galway, Michel
Bequet e muitos outros nomes famosos na música erudita internacional. Para o
concurso de trompete de 2010, 105 trompetistas enviaram uma gravação com o
primeiro movimento do concerto de Haydn sem cadência. O fato de a gravação ter
que ser enviada de maneira anônima, demonstra a seriedade desse concurso. 60
candidatos foram selecionados para participar da prova em Praga entre 08 e 15 de
Maio. Destes 60, 12 seriam aprovados para a segunda fase e 4 para a final.
As fases foram dividas da seguinte forma: (minhas escolhas estão em negrito)
1 Fase - Eliminatória
1-) J. Haydn - Concerto para trompete completo com cadência
2-) Escolha do candidato entre as seguintes obras:
Jean Françaix - Sonatina
Bohuslav Martinu - Sonatina
Halsey Stevens - Sonata
2 Fase - Semi final
1-) Escolha do candidato
Michael Haydn - Concerto n. 2 em Dó maior
Leopold Mozart - Concerto em Ré maior
Giuseppe Tartini - Concerto em Ré maior
Antonio Vivaldi - Concerto em Lab Maior
2-) Peça solo do século 20 ou 21 significativa do repertório para trompete
Berio - Sequenza X
3-) Jan Kucera - The Joker - obra composta para o concurso.
3 Fase - Final
1-) Petr Eben - Okna - trompete e orgão
2-) George P. Telemann - Concerto em Ré maior
3-) André Jolivet - Concertino para trompete, piano e orquestra.
A banca de jurados de 2010 teve como presidente Guy Touvron. Jouko Harjanne,
Tamás Velenczei, James Thompson, Max Sommerhalder, Miroslav Kejmar e
Vladimir Rejlek foram os outros jurados.
Vale deixar claro que todos os candidatos fizeram suas apresentações completas,
sem interrupção por parte da banca. O candidato, após eliminado, tem acesso aos
jurados e recebe as críticas e orientações.
Os vencedores em trompete na história desse concurso:
1962
1 - Valentin Judin - União Soviética
2 - Valentin Malkov - União Soviética
2 - Jordan Kozucharov - Bulgária
2 - Anatolij Maximenko - Bulgária
3 - Não houve vencedor
1974
1 - Vladislav Kozderka - Tchecoeslováquia
2 - Guy Michel Touvron - França
2 - Stanislav Sejpal - Tchecoeslováquia
3 - Gérard Milliere - França
3 - Bernard Soustrot - França
1978
1 - Vladimír Rejlek - Tchecoeslováquia
1 - Zdenek Sedivy - Tchecoeslováquia
2 - Pál Petz
3 - Não houve vencedor
1982
1 - Andrej Ikov - União Soviética
2 - Zoltán Kovács - Hungria
3 - Premysl Cerník - Tchecoeslováquia
3 - Jan Broda - Tchecoeslováquia
3 - László Préda - Hungria
1987
1 - William Forman - USA
2- Eric Aubier - França
2 - Jouko Harjanne - Finlandia
3 - Jan Hasenöhrl - Tchecoeslováquia
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1992
1 - Jens Lindermann - Canada
2 - Franck Pulcini - França
3 - Wolfgang Bauer - Alemanhã
1997
1 - Não houve vencedor
2 - Gábor Boldoczki - Hungria
3 - Jeroen Berwaerts - Bélgica
2003
1 - Julian Sommerhalder - Suiça
2 - Clément Saunier - França
3 - Raphaël Dechoux - França
2010
1 - Alexandre Baty - França
2 - Flávio Gabriel - Brasil
3 - Olivier Bombrun - França
T - Por que participar de um concurso?
F - Vencer concursos internacionais importantes, como o de Praga, é uma forma de
você se destacar na comunidade musical. Com isso você pode conseguir alguns
benefícios bastante interessantes, como receber convites para atuar como solista
em diversas orquestras, ter obras compostas e dedicas a você ou até mesmo ser
aceito para participar em audições de grandes orquestras. Motivos suficientes para
qualquer trompetista que almeje uma carreira profissional reconhecida
internacionalmente.
Existe outro lado importante de participar em concursos que é o aprendizado. A
preparação das obras é sempre muito mais eficaz quando existe uma data marcada
para que elas sejam apresentadas. Saber que você será ouvido por especialistas é
uma motivação muito grande para que se preste atenção a todos os detalhes.
Somado a isso, temos o desafio de tocar em um mesmo recital obras que
dificilmente colocaríamos juntas por escolha própria.
T - Como foi a sua rotina para a preparação do repertório?
Das obras que tinha em mãos, três representavam um grande desafio para mim;
Haydn por uma questão de estilo, Sequenza X, que dispensa a apresentação de
motivos para ser considerada um desafio e a Sonatina de Françaix. O 1 movimento
da sonatina dura aproximadamente 1 minuto, coisa simples, não fosse ele todo de
semicolcheias em stacatto simples pianíssimo, o 2 movimento tem frases longas na
região média e aguda e até o começo da cadência no final do 2 movimento a
dinâmica mais forte que temos impressa na partitura é piano. Divertido, não?
Comecei a estudar em Dezembro, então vocês podem fazer as contas de quanto
tempo tive de preparação. Segui os conselhos de Gabriele Cassone e dividi o Berio
em várias partes, tratando de estudar uma por dia. Com o Françaix fiz um
treinamento inusitado em minha vida. Achei um metrônomo perdido no armário e
passei a estudar o 1 movimento em várias tonalidades com a semínima marcando
52, a metade do andamento sugerido pelo compositor. Procurei tocar o Haydn em
dias alternados e com muita indecisão vaguei de uma cadência a outra até criar
uma própria.
Passei boa parte do período de preparação focado nessas três peças. A lógica que
tinha em mente é que a primeira fase deveria ser muito bem tocada. Somente
assim poderia me destacar dentre os 60 candidatos selecionados, e realizar o
desejo de tocar o Berio, obra em que depositei praticamente todas minhas fichas,
na segunda fase.
Durante a preparação pedi que vários amigos me ouvissem e também realizei um
recital na EMESP (Antiga ULM de SP) para uma sala cheia de trompetistas poucos
dias antes da minha viagem com o repertório da 1 e 2 fase juntos. Além de dicas
importantes, recebi muito apoio.
T - A apresentação no concurso não foi o resultado de seis meses de
estudo, mas de muitos anos de trabalho. Como vc estuda, métodos,
rotinas, trechos orquestrais, como tem sido seu dia-a-dia com o trompete
nos últimos anos?
F - Tive uma boa base nos anos de aulas com Clóvis em Campinas. Trabalhamos
muito com Maggio, Clarke e Schlossberg. Na universidade, Naílson me fez trabalhar
com uma grande variedade de métodos, praticamente todos no estilo de estudos
característicos, como Balay, S. Jacome, Charlier, Bitch, Tull, Clarke, Arban e etc...
Além do desafio de apresentar 3 ou mais desses estudos característicos por aula,
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havia o trabalho de repertório solo para trompete, além dos usuais trechos de
orquestra.
Ao terminar a faculdade, aos 23 anos de idade, havia passado oito deles sobre a
orientação desses dois professores. Nos anos que seguiram, procurei revisar o que
havia aprendido, mas com uma cobrança própria muito maior.
Procurava tocar pelo menos um estudo característico de algum dos métodos citados
acima, por dia. Foi ótimo para me manter em forma e também ajudou muito a
desenvolver uma interpretação musical mais coerente. Fiz algo parecido com o
repertório solo. Selecionava algumas obras e montava possíveis recitais,
estudando-os diariamente e realizando "recitais" em casa mesmo, ao fim de uma
semana de estudos.
Continuo tentando fazer isso atualmente. Procuro conhecer o repertório importante
do nosso instrumento que ainda não estudei, ao mesmo tempo que tento deixar em
dias os tradicionais concertos e estudos.
T - E a preparação mental?
F - A insegurança é uma sensação muito desconfortável. Com o intuito de amenizar
esse desconforto, procurei estudar o máximo possível todas as obras. Em
pouquíssimas vezes me dei por satisfeito com o resultado dos meus estudos. Mas
ao invés de reclamar, ficava feliz por perceber o que poderia ser melhorado. Essa
exigência com atitude positiva me ajudou muito.
Busquei algumas informações específicas sobre psicologia em competições e o livro
mais interessante que encontrei foi o The Inner Game of Tenis de Timothy Gallwey.
Aconselho esse livro para qualquer pessoa que pratica algum instrumento musical.
Como havia ido até a semi-final no concurso Maurice André em 2006, 4 anos
passados, esperava ir até a final, afinal todos nos julgamos melhorar com o passar
do tempo. Esse pensamento somente serviu para gerar ansiedade e aflição,
afetando diretamente na minha maneira de tocar. Como solução procurei pensar
apenas na fase do concurso em que me encontrava, e fazê-la o melhor possível.
Mesmo assim, nos dias anteriores as provas, tinha vários enjôos e não conseguia
comer quase nada. Cerca de duas horas antes das provas, enquanto me arrumava,
tocava mentalmente a prova do começo ao fim, me visualizando no palco tocando
bem e contente com o resultado sonoro alcançado. Esse momento de concentração
me deixava bastante confiante e na hora da prova tocava como se estivesse
repetindo algo que havia acabado de fazer.
T - Qual seu conselho para os jovens trompetistas que desejam participar
de concursos e preparar um repertório de alto nível no instrumento?
F - 1-) Não fique esperando dominar o instrumento para somente depois começar a
estudar as obras importantes do nosso repertório. Estude devagar, toque uma
oitava abaixo as notas que você ainda não consegue tocar, mas não deixe de ler os
grandes concertos. O amadurecimento dessas obras leva tempo. Em 1997 li pela
primeira vez o concertino de Jolivet, passei alguns dias tentando tocar essa obra e
depois guardei a partitura. Nos anos seguintes fiz a mesma coisa. Quando toquei o
concertino na final do concurso de Praga, 13 anos passados da primeira leitura, fiz
apenas um ensaio com a orquestra e praticamente toda a música estava lá, de
maneira natural.
2-) Procure um excelente professor e estude com ele até lhe dizer que você está
tocando muito bem, quando isso acontecer, é hora de procurar um professor ainda
melhor.
3-) Escute boas gravações e tente copiá-las tocando. Isso é uma ótima maneira de
aprender e desenvolver a linguagem. Não se preocupe, você jamais soará igual ao
músico que está copiando.
4-) O trompete é considerado um instrumento muito difícil. A grande vantagem é
que ele é difícil para 99,9% dos trompetistas. Sendo assim, qualquer pessoa, em
qualquer ponto do planeta, tem as mesmas chances de participar e vencer um
concurso de trompete internacional. Isso inclui você que está estudando o seu
trompete em algum canto do nosso país. O jurado Max Sommerhalder, em um
jantar após a final nos contava que antigamente, no cenário de concursos apenas a
França produzia vencedores. Segundo ele, isso foi mudando lentamente. Belgas,
Húngaros e Suiços começaram a aparecer. Agora ele não tinha dúvidas, é a vez da
América latina.
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T - Quais são seus planos para o futuro?
F - Pretendo continuar estudando como fiz nesses últimos anos, buscando novos
desafios e tentando aprimorar aquilo que já fiz. Sei que vai parecer clichê, mas
cada dia de estudo me deixa com mais vontade de estudar.