UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LILIAN FERREIRA RODRIGUES BRAIT
ATIVIDADES RÍTMICAS E LINGUAGEM CORPORAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL
CUIABÁ
2006
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LILIAN FERREIRA RODRIGUES BRAIT
ATIVIDADES RÍTMICAS E LINGUAGEM CORPORAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Dissertação apresentada ao curso de pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, área de concentração Teorias e Práticas Pedagógicas da Educação Escolar, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação do Prof. Dr. Cleomar Ferreira Gomes.
CUIABÁ
2006
Aos sujeitos desta pesquisa, alunos e professores
da Escola Pedacinho do Céu II e do Colégio
CESUT. Uns que me emprestaram o movimento
e outros que garantiram o ritmo da caminhada.
AGRADECIMENTOS
A Cleomar Ferreira Gomes, pela competência e dedicação durante a orientação do trabalho, e,
sobretudo, pela amizade e compreensão.
A CAPES, pelo apoio financeiro, me cedendo uma bolsa de estudo.
A Fundação Educacional de Jataí, pela minha liberação para cursar o programa de mestrado.
A Cancionila Janzkovski Cardoso e Sueli Barbosa Thomaz pelas valiosas sugestões.
A Renata Machado, Kelly Suêmia, Vivianne e Ana Vergínia, pela ajuda, amizade e
encorajamento oferecidos.
A Rosely e Fabiane, pelo abrigo, companhia e amizade durante toda a jornada cuiabana.
Aos queridos colegas de trabalho do curso de Educação Física da UFG/CAJ, pelo incentivo e
liberação para a dedicação integral a pesquisa.
A Carlos Henrique, companheiro, pela compreensão e apoio incondicional em todos os
momentos.
Aos meus pais, Liemi e Evangelista, e minhas irmãs Lígia e Lívia, pelo carinho, incentivo,
preocupação, compreensão e encorajamento em todas as minhas decisões.
A Maria Solange e Nilson Brait, meus sogros, pelo amparo dado ao Carlos Henrique durante
a minha ausência.
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo compreender como as atividades rítmicas,
enquanto componentes constituintes da linguagem corporal, vêm sendo trabalhadas na
Educação Infantil. A criança não só usa o intelecto, mas também age, sente e se relaciona, daí
à preocupação desta pesquisa em valorizar suas atividades rítmicas e a linguagem corporal
que a criança apresenta nesta fase. Foi realizada uma pesquisa do tipo etnográfica, tendo sido
selecionadas duas instituições, uma pública e outra privada, no município de Jataí/GO, e que
contam com professores de Educação Física atuando na área. Para a coleta de dados, foi
utilizada a observação não-participante das aulas de Educação Física, registro em caderno de
campo, fotografias, filmagens e entrevista semi-estruturada. Esse percurso metodológico
possibilitou compreender que as atividades rítmicas, na escola pública, vêm sendo trabalhadas
em vários momentos das aulas de Educação Física, além de estarem presentes na sala de aula,
no recreio, na chegada e na saída da escola. No colégio particular, essas atividades estão
praticamente ausentes nas aulas de Educação Física, sendo observadas apenas em algumas
ocorrências: às vezes como relaxamento, outras como parte principal da aula, e as outras em
apresentações em festividades escolares. Em relação à linguagem corporal, nenhum dos
professores demonstrou ser capaz de observar-interpretar-registrar as mensagens produzidas
pelo corpo das crianças. Dessa forma, foi possível obter elementos que levem a uma reflexão
e retificação acerca não só do trabalho do professor de Educação Física na Educação Infantil,
mas também de sua formação e, portanto, sua função social na educação escolar.
ABSTRACT
The present study has like objective understanding as the rhythmic activities, while
components representatives of the corporal language, they have been worked in the Children´s
Education. The child not only it uses the intellect, but he/she also acts, he/she sits down and
he/she links, then the concern of this research in valuing your rhythmic activities and the
corporal language that the child presents in this stage. A research of the type etnographyc was
accomplished, having been selected two institutions, one public and another private, in the
municipal district of Jataí/GO, and that depends on Physical Education Teachers acting in the
area. For the collection of data, the no-participant observation of the Physical Education
classes, register in a field notebook was used, pictures, filming and interview semi-structured.
This methodological course made possible to understand that the rhythmic activities, in the
public school, they have been worked in several moments of the physical education classes,
beyond they be present in the class room, in the recreation, in the arrival and in the exit of the
school. In the private school, those activities are practically absent in the Physical Education
classes, being just observed in some occurrences: sometimes as relaxation, other as main part
of the class, and the other ones in presentations in school festivities. In relation to the
Corporal Language, none of the teachers demonstrated to be able to observe-interpret-register
the messages produced by the children's body. In this way, it was possible to obtain elements
that taking near to a reflection and rectification not only of the Physical Education Teacher's
work in the Children´s Education, but also of their formation and, therefore, its social function
in the school education.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................10
PRIMEIRA PARTE – EDUCAÇÃO INFANTIL, LINGUAGEM CORPORAL E
ATIVIDADES RÍTMICAS......................................................................................................14
1 – Educação Infantil: um espaço para o movimento.........................................................15
– O movimento Corporal.................................................................................................19
– O brincar.......................................................................................................................23
– O professor de Educação Física na Educação Infantil..................................................28
2 – A linguagem corporal e as atividades rítmicas.............................................................39
2.1 – O corpo – sua expressão e linguagem...........................................................................42
2.2 – O ritmo..........................................................................................................................49
2.3 – A atividade rítmica e sua função na Educação Infantil................................................52
SEGUNDA PARTE: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS..........................................59
1 – O caminho percorrido...................................................................................................60
1.1 – Instrumentos de coleta de dados...................................................................................61
1.2 – A escolha dos sujeitos...................................................................................................63
1.3 – Caracterização dos sujeitos...........................................................................................65
1.3.1 – Centro de Ensino Superior de Jataí (CESUT)................................................65
1.3.2 – Escola Pedacinho do Céu II...........................................................................66
1.4 – Coleta e organização dos dados....................................................................................68
TERCEIRA PARTE: AS ATIVIDADES CORPORAIS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
FÍSICA......................................................................................................................................74
1 – O movimento rítmico e expressivo nas aulas de Educação Física................................75
1.1 – A presença/ausência das atividades rítmicas nas aulas de Educação Física.................77
1.1.1 – As atividades evidenciadas nas aulas.............................................................78
1.1.2 – Concepções e formação dos professores........................................................94
1.1.3 – Prática cotidiana e as dificuldades encontradas............................................100
1.2 – A percepção do professor quanto à linguagem corporal da criança............................107
1.2.1 – As atividades expressivas na escola.............................................................108
1.2.2 – A percepção e a sensibilidade dos professores: a linguagem corporal nas
aulas de educação física.................................................................................................114
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................123
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................128
ANEXOS................................................................................................................................134
A - Plano de ensino da disciplina Educação Física do Colégio CESUT.....................135
B - Matriz curricular da disciplina Educação Física das escolas municipais de Jataí........................................................................................................................140
C - Carta de autorização para uso de imagens.......................................................142
D - Roteiro de entrevista para professores..................................................................143
E - Roteiro de entrevista para as crianças...................................................................144
10
INTRODUÇÃO
“A brincadeira é acompanhada e ritmada por atitudes posturais e gestuais, assim como por rituais verbais. No desenrolamento de cada sessão, é dita de novo a ordem do mundo diante de um tempo não só destruidor, mas também criador”. (Claude Rivière).
A Educação Infantil, ao longo dos anos, elucida-se como objeto de pesquisa de vários
estudiosos, no entanto, a relação entre a Educação Física e Educação Infantil tem sido
abordada em menor proporção. Apesar de André (2001) afirmar que existem apenas dois
trabalhos entre 1990-1998, que tratam sobre a Educação Física, na área de estudos da
Educação em geral, nos últimos anos, esta produção tem se intensificado. Isto justifica a
escolha do tema e permite destacar a relevância desta pesquisa para a produção científica da
área da Educação, especificamente para a Educação Física e a Educação Infantil.
Go Tani (1988) registra que as primeiras respostas de uma criança são motoras e que
seu progresso é acompanhado através de movimentos, mas, no âmbito educacional, essa
expressão é, muitas vezes, negligenciada. A natureza da atividade rítmica é fundamentada na
Educação Infantil pelo movimento natural que promove uma compreensão dessas atividades
como um meio de auxílio na educação integral da criança. É provável que essas atividades
imprimam um valor ao permitir que o ritmo próprio da criança se expresse, possibilitando a
percepção de novas formas de comunicação nas ações motoras, através de um sentimento
rítmico e livre.
O estudo proposto tem por objetivo compreender como as atividades rítmicas vêm
sendo trabalhadas na Educação Infantil, bem como analisar a linguagem corporal pela via das
atividades rítmicas, vista como gramática corporal, que pode muito dizer de um corpo que
pula, brinca e expressa sua animalidade infantil ou, com outras palavras, que se comunica.
11
Também busco entender as distâncias entre a formação acadêmica dos professores de
Educação Física e a prática pedagógica, estabelecendo uma relação entre os conhecimentos
transmitidos nos cursos superiores e o que de fato é realizado nos ensinos escolares.
De acordo com Oliveira (2000), a criança nos coloca frente a frente com o mundo
idealizado e construído por nós, e por isto ela traz a oportunidade de reflexão, a partir do seu
ponto de vista, para um olhar mais crítico sobre o mal - estar provocado por nossa cultura.
Portanto, é preciso fazer novas reflexões em função do desenvolvimento da criança. É
importante que haja qualidade e diversidade durante o processo ensino aprendizagem e
aquisição de novos conhecimentos.
Acredito que a receptividade à música e ao ritmo é um fenômeno tão natural que
ocorre desde o nascimento do bebê, quando este já tem contato com cantigas e com seus
movimentos corporais involuntários. Já nos primeiros dias de vida, a criança tem a
possibilidade de iniciar suas experiências corporais a partir da música, do ritmo e de
descobertas corporais que ocorrem a cada dia. Várias experiências demonstram que a criança,
com um ano de idade, e às vezes até menos, é incitada a balançar-se ao ouvir uma música, e,
apesar de não haver sincronia entre a musicalidade, o ritmo e o balanço, esta se estabelece
com o passar do tempo, quando a criança vai adquirindo precisão em seus movimentos.
Segundo Monteiro e Artaxo (2003), as crianças em idade pré-escolar, frequentemente,
ao lhes ser pedido que reproduzam sons com o ritmo, apresentam uma batida firme, mas sem
nenhuma relação com a música, inconscientes de sua incompatibilidade, mas alegres com a
atividade. Algumas batem mais depressa ao aumentar o volume e mais devagar ao abaixá-lo.
Por isto, dizem as autoras que é preciso muita aprendizagem para elas produzirem uma batida
inicial, e como praticamente em todas as atividades corporais é possível visualizar um
trabalho rítmico, esse não poderia ser dissociado das atividades motoras e da própria vida.
Portanto, as atividades rítmicas educacionais merecem maior atenção no programa e na
prática de Educação Física. Seus métodos educacionais devem permitir que a criança produza,
crie, expresse e não observe somente.
As autoras explicam que a criança possui instintiva noção de ritmo, mas, em princípio,
não tem controle sobre ele. Esse fato se deve pela falta de maturação de seu sistema nervoso
central, que impede o estabelecimento de coordenações neuromusculares necessárias. O
ajustamento temporal do movimento é realizado através das referências sonoras e visuais, as
quais são explicadas pelo papel modulador neuromuscular. Para a introdução do trabalho com
ritmo, devem ser realizadas as seguintes observações:
12
No início, as atividades devem ser simples, explorando movimentos com pequenas variações. Deve-se observar o ritmo de cada criança, ressaltando-se o ritmo biológico. Dar importância à descoberta do próprio corpo e de suas possibilidades de movimento. Trabalhar em conjunto com outras capacidades físicas (força, velocidade, equilíbrio e flexibilidade). Utilizar-se da música, excelente auxiliar na identificação da pulsação, do ritmo, da pausa, dando importância ao ajuste da música e ao movimento, pois disso depende a educação do sentido rítmico. (MONTEIRO e ARTAXO, 2003, p.13).
Concordando com as autoras, reforço mais uma vez a preocupação em compreender
como as atividades rítmicas estão sendo trabalhadas na Educação Infantil. As inquietações me
levaram a elencar ainda os seguintes objetivos específicos desse estudo: analisar onde e
quando as atividades rítmicas acontecem e estão mais presentes; observar a existência ou não
da relação entre atividade rítmica e linguagem corporal; perceber se as crianças conseguem
utilizar o corpo para se comunicarem; e, finalmente, analisar a percepção e a sensibilidade do
professor em observar-interpretar-registrar as mensagens produzidas pelo corpo da criança.
No intuito de compreender uma determinada, realidade desenvolvi uma pesquisa
qualitativa do tipo etnográfica. Foram selecionadas duas instituições no município de Jataí –
estado de Goiás, que trabalham com a Educação Infantil e contam com um professor
qualificado para ministrar as aulas de Educação Física. Para a coleta de dados, foi utilizada a
observação não-participante das aulas de Educação Física, aquisição de imagens através de
fotografias e filmagens, entrevista semi-estruturada tanto com os professores como com
algumas crianças selecionadas, e também análise do plano de ensino e matriz curricular da
disciplina em observação.
Acredito que, para tratar de questões referentes à Educação Infantil, elas requerem um
aprofundamento em relação ao seu surgimento e legitimação. Portanto, para essa pesquisa, o
estudo foi ordenado e sistematizado em três partes: A primeira parte apresenta um pouco da
história da Educação Infantil, abordando seus principais precursores, bem como a visão da
mesma em tempos passados e como ela está após sua legalidade através das leis
governamentais, assinalando o desenvolvimento da criança de zero a seis anos através da
aprendizagem escolar. Nesta perspectiva, são apresentadas ainda as questões do movimento
corporal e do brincar para esta primeira fase escolar, fazendo também uma abordagem a
respeito do professor de Educação Física na Educação Infantil, mostrando os conflitos,
angústias, vitórias e o papel da Educação Física na formação dos indivíduos.
Ainda na primeira parte é abordada a linguagem corporal em busca da compreensão
do que vem a ser a comunicação não-verbal, aprofundando o estudo sobre o corpo, sua
expressão e linguagem, e como estes vêm sendo tratados na escola, mostrando sua
13
importância tanto para o desenvolvimento da criança como um todo como também para o
adulto. Abordo ainda, o registro de estudos sobre o ritmo, verificando o tratamento deste por
alguns autores e permitindo uma melhor compreensão dessa temática. Ao entender o que vem
a ser ritmo, é possível chegar a uma melhor percepção do que vem a ser atividade rítmica;
assim, faço uma descrição sobre tais atividades, mostrando sua função e necessidade para o
desenvolvimento corporal e intelectual da criança na Educação Infantil.
Na segunda parte é apresentado o percurso metodológico adotado para a investigação,
que inclui os instrumentos utilizados para a coleta de dados, a escolha dos sujeitos, a definição
e a caracterização das escolas selecionadas, bem como é feita a descrição do processo de
organização e a análise dos dados.
Na terceira parte é realizada a análise das informações obtidas à luz dos estudos
teóricos realizados, resultando na elaboração de duas categorias de análise: a primeira, que,
aborda a presença ou a ausência das atividades rítmicas nas aulas de Educação Física; e a
segunda, que, elucida a percepção do professor quanto à linguagem corporal da criança.
Por fim, faço uma reflexão mais detida dos dados encontrados, com o intuito de
contribuir com as discussões acerca da formação profissional do professor de Educação Física
e sua atuação na Educação Infantil.
14
PRIMEIRA PARTE:
EDUCAÇÃO INFANTIL, LINGUAGEM CORPORAL E ATIVIDADES RÍTMICAS.
15
1 Educação Infantil: Um espaço para o movimento
A Educação Infantil é a primeira fase escolar da criança e é de grande importância
para o seu desenvolvimento físico, intelectual, afetivo e social. Para tratar melhor dessa etapa,
utilizo as contribuições de Oliveira (2004), que apresenta alguns dos principais pioneiros em
Educação Infantil. A autora traz a idéia de que educar crianças menores de seis anos em
diferentes condições sociais já era tratada por Comenius (1592-1670) quando, já nessa época,
propunha que o processo de aprendizagem teria início pelos sentidos, defendendo a educação
das crianças através da utilização de materiais e atividades diferentes como passeios, quadros,
modelos e coisas reais.
No século seguinte, Pestalozzi (1746-1827) surge com a proposta de modificar os
métodos de ensino, especialmente aqueles usados pela escola elementar, formalizando
procedimentos para treinamento de professores, defendendo também a educação através de
um ambiente mais natural possível, amoroso, mas com disciplina, para assim obter um melhor
desenvolvimento do caráter infantil. O autor propunha atividades de arte, soletração,
geografia, aritmética, música e várias atividades de linguagem oral e contato com a natureza.
Em seguida, Froebel (1782-1852), que era discípulo de Pestalozzi, propôs a criação de
Jardins de Infância, onde as crianças estariam livres para aprender sobre si mesmas e sobre o
mundo. Deveriam predominar as atividades práticas geradas pelos interesses das crianças,
constando de atividades de cooperação e jogo livre como proposta educacional, assim como o
manuseio de objetos, participação em diversas atividades de livre expressão através de gestos,
música, construções com argila, papel, blocos e comunicações lingüísticas.
Por último, a autora cita Maria Montessori (1870-1952), que também se inclui entre os
pioneiros da idéia de uma educação voltada para a criança. A criação de materiais adequados
à exploração sensorial pelos infantes, com objetivo educacional específico, tornou-se sua
marca. Ela elaborou também a proposta de diminuição do tamanho do mobiliário usado pelas
crianças para se adequarem ao seu tamanho. No entanto, sofreu críticas por sua ausência de
preocupação com a formação do ser social.
Oliveira (2004), partindo deste breve histórico, analisa a forma como a Educação
Infantil tem se organizado na história das sociedades ocidentais e ilustra que “[...] as
instituições pré-escolares nasceram no séc. XVIII em resposta à situação de pobreza,
abandono e maus tratos de crianças pequenas cujos pais trabalhavam em fábricas, fundições e
minas criadas pela Revolução Industrial que se implantava na Europa ocidental”. (p.15).
16
Nessa época, a Educação Infantil era vista apenas como assistencialista. A criança ia para as
creches e pré-escolas apenas para brincar e ser cuidada por um responsável, enquanto seus
pais trabalhavam.
Segundo Oliveira (2004), dentro de alguns setores da elite, defendia-se a idéia de que
não seria bom para a sociedade como um todo que as crianças pobres fossem educadas, e a
estas, era proposta a educação da ocupação e da piedade, o que fez surgir as escolas de tricô,
onde mulheres tomavam conta de grupos de infantes pobres e lhes ensinavam a Bíblia e a
tricotar, assim, dando início à concepção de pré-escola baseada no binômio cuidado e
educação.
Angotti (2004) salienta as principais tendências ligadas às concepções de atendimento
infantil: a concepção de cuidado infantil, surgida na época da Revolução Industrial para
crianças pobres exploradas como classe trabalhadora ativa; a concepção de preparação para a
escola fundamental, de influência norte-americana e com caráter compensatório das
desigualdades culturais; e a concepção de antecipação da alfabetização apresentada em
propostas pedagógicas como a de Maria Montessori.
Em nosso país, o delineamento da história da Educação Infantil tem trazido luzes
novas à questão através das obras de autores como Kramer, Vieira, Kishimoto, Oliveira,
Kuhlmann Jr., Civiletti, entre outros. Ainda no Brasil, historicamente, “a defesa de uma
concepção mais assistencialista ou mais educativa para o atendimento realizado em creches e
pré-escolas tem dependido da classe social das crianças por elas atendidas”. (OLIVEIRA,
2004, p.17).
Percebe-se que hoje esta fase é vista de forma diferenciada. Prova disso são crianças
cada vez mais adiantadas na escola, independentemente da classe social à qual pertence.
Porém, em relação à creche no Brasil,
[...] apenas quando segmentos da classe média foram procurar atendimento em creches para seus filhos é que esta instituição recebeu força de pressão suficiente para aprofundar a discussão de uma proposta verdadeiramente pedagógica, compromissada com o desenvolvimento total e com a construção de conhecimentos pelas crianças pequenas. (OLIVEIRA, 2004, p. 18).
Nas décadas de 70 e 80, através dos movimentos operários e feministas que lutavam
pela democratização do país e pelo combate às desigualdades sociais, em busca de uma
democratização da educação pública brasileira, foi possível a conquista do reconhecimento da
educação em creches e pré-escolas, na constituição de 1988 como direito da criança e um
dever do Estado. (OLIVEIRA, 2004)
17
Angotti (2004, p. 52) afirma que “pela primeira vez na história, uma constituição do
Brasil faz referências a direitos específicos da criança, que não sejam aqueles circunscritos ao
âmbito do Direito da Família”. Enquanto as constituições anteriores limitavam-se a
expressões como “assistir” ou “amparar a maternidade e a infância”, essa de 1988 institui
formas concretas de garantir não só amparo, mas, principalmente, a educação à criança.
Observa-se que, nas últimas décadas, a Educação Infantil vem se fortalecendo, e, para garantir
e consolidar o atendimento educacional a esta faixa etária, os avanços na pesquisa e os ganhos
obtidos constitucionalmente têm sido fundamentais. A autora expõe ainda que o atendimento
pré-escolar tem sido chamado a responder às necessidades sociais próprias da sociedade,
como a jornada de trabalho da mulher fora do âmbito familiar, para garantir não só a entrada
de mais um salário para o sustento da família, como a sua própria realização pessoal através
de um trabalho profissional.
O RCNEI1 confirma que a expansão da Educação Infantil, não só no Brasil como no
mundo, tem ocorrido de forma crescente nas últimas décadas, o que provocou o aumento das
instituições de Educação Infantil, como também o reconhecimento deste atendimento às
crianças de zero a seis anos pela Constituição Federal de 1988. (BRASIL, 1998)
A Educação Infantil é a primeira etapa da Educação da criança e tem como finalidade
o desenvolvimento integral da mesma. Está ressalvada pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional 9.394/96, que estabelece o vínculo entre o atendimento às crianças de zero
a seis anos e à educação. O reconhecimento legal dessa primeira fase marcou também a
exigência de profissionais competentes para trabalhar com crianças, e não somente
assistencialistas sem formação.
Sobre esse assunto, Goulart (2002, p. 51) apresenta algumas reflexões: “educação
infantil, que lugar é esse?” Para a autora, são muitas denominações que o espaço educativo da
criança recebe: creche, pré-escola, escola, enfim, o ajuste destas denominações deve ser
refletido especialmente no que tange à sua função social enquanto instituição educativa. “Mas
que espaço seria esse?” Ela comenta que, ao se considerar de maneira geral, em um século de
prática e reflexão sobre os espaços educativos no Brasil, pode-se atribuir como “um lugar de
brincar, correr, pular, comer, aprender a interagir e a usar os instrumentos culturais básicos
em nossa cultura, como os talheres, os pratos, o lápis, a tinta, o papel”. No seu entender, as
crianças necessitam explorar o mundo e por isso querem conhecer e entender tudo o que está
1 Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.
18
à sua volta e no ambiente escolar. Entre choros e risos vão conhecendo e compreendendo os
mistérios da vida.
Goulart (2002) registra ainda que muitas vezes, dentro das instituições de Educação
Infantil, a vida não é nada fácil, e em outras esta se torna leve e gratificante. Ensina-se e
aprende-se dentro dessa comunidade, na qual o cotidiano é muito mais complexo do que
parece ser à primeira vista, portanto, procurar apreendê-lo e analisá-lo não é tarefa simples ou
fácil.
Gouvêa (2002) menciona que a criança ocupa um papel central em nossa sociedade, e
suas necessidades e interesses são diferentes dos do adulto, por isso, deve ocupar um lugar
distinto no universo social. O infante não inventa o mundo, mas apropria-se do mesmo através
da internalização de valores, normas e ações que são impostas a ele através do universo social
em que está inserido. A criança dialoga com os elementos da cultura, mas esta se forma na
relação com a cultura adulta e, ao longo de seu desenvolvimento, aprende não apenas valores,
hábitos e comportamentos do seu grupo social, mas produções que são voltadas para si.
Carvalho e Guimarães (2002) notabilizam que a criança está a todo tempo em contato
com outras pessoas, sejam adultos, adolescentes ou mesmo com outras crianças, com isso o
seu desenvolvimento ocorre como um processo gerado por uma rede de relações sociais.
“Assim a aquisição da linguagem, a aprendizagem de hábitos e costumes, estão diretamente
ligadas ao fato de a criança fazer parte desse universo maior de relações sociais”. (p. 32).
Segundo as autoras, a aprendizagem ocorre através da fala, da leitura, da escrita, da
brincadeira, enfim, da exploração do mundo, que permite exprimir a afetividade através do
desenho, do olhar e do corpo. Todo o aprendizado faz parte da cultura, à qual, partindo dela,
atribui-se o significado do mundo particular de cada ser humano.
Segundo Gouvêa (2002), o universo infantil aparece cada vez mais destacado e
diferenciado do universo adulto, e é através das produções adultas que são mediadas pelo
caráter lúdico que os adultos passam sua visão de mundo. A autora mostra também que as
brincadeiras, cantigas, histórias tradicionais têm se perdido na vivência urbana da criança, e
esta tem substituído o brincar ativo pela passividade dos videogames, TV e Computador. Para
Gomes (2005a), é muito simplista, saudosista e perigosa essa análise, porque existem outros
fatores que vão compor essa “passividade”: falta de segurança pública, o assédio do conforto
do aparelho tecnológico, o crescimento demográfico, a precariedade das vias públicas, o
aumento exagerado de automóveis, entre outros, que levam as crianças a preferirem ficar
dentro de suas casas. Portanto, devemos pensar que é o caráter lúdico que irá mediar a ação da
19
criança no mundo, principalmente, em suas atividades, busca o prazer de sua execução e não a
objetividade de resultados buscados pelo adulto. É possível perceber que as crianças, ao se
relacionarem entre si, conseguem desenvolver suas habilidades com intensidade maior, pois
esse contato permite a aprendizagem e a expressão de suas emoções.
A Educação Infantil proporciona interação e socialização entre crianças que fazem
parte de culturas diferentes, devido à criação e à educação familiar recebida, e as mesmas, ao
se socializarem na escola, acabam por conhecer e trocar diferentes experiências culturais. Para
que esse desenvolvimento social possa se dar na escola,
o professor deverá proporcionar à criança espaços e oportunidades para o contato mais estreito consigo e com outras crianças, da mesma idade e de idades diferentes; ambientes ricos em objetos e instrumentos culturais, principalmente a linguagem (oral e escrita); acesso a outros ambientes como bibliotecas, zoológicos, parques, casa de colegas, entre outros; estímulos diversos que propiciem à criança explorar, criar, manipular, ler, jogar, brincar, pensar, discutir, elaborar, construir. O professor deve ainda, planejar estratégias de organização e intervenção que facilitem a aprendizagem pela criança. (CARVALHO E GUIMARÃES, 2002, p 46).
Angotti (2004) ilustra que estudos científicos têm apontado a importância dos
primeiros anos de vida para a constituição do sujeito. Então, deve-se ter na educação pré-
escolar a meta de desenvolvimento da criança enquanto ser cognoscente e cognoscível para
garantir-lhe, assim, as condições necessárias para a construção de sua pessoa. Percebe-se que
atuar na Educação Infantil não é tarefa fácil, porém sabe-se que esta fase é a base da educação
escolar e, por isso, deve ser muito bem trabalhada, organizada e estruturada para garantir a
melhor contribuição possível da escola para a criança.
Discutir a importância do movimento para o melhor desenvolvimento da criança é
imprescindível. Sobre isso faço uma reflexão no próximo tópico.
1.1 O movimento corporal
Ao se abordar o movimento corporal é necessário compreendê-lo como uma
necessidade da criança para o seu desenvolvimento físico, mental e psicológico, como é
apresentado em freqüentes discussões de especialistas no assunto. De acordo com Brasil
(1998), o movimento tem uma importante dimensão para o desenvolvimento e para a cultura
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humana, pois as crianças se movimentam desde que nascem, adquirindo, no dia a dia, maior
controle sobre seu corpo e interagindo cada vez mais com o mundo. Então, o movimento
humano, “[...] é mais do que simples deslocamento do corpo no espaço: constitui-se em uma
linguagem que permite às crianças agirem sobre o meio físico e atuarem sobre o ambiente
humano, mobilizando as pessoas por meio de seu teor expressivo”. (p. 15).
Tanto Go Tani (1988) como Strazzacappa (2001) salientam que é através do corpo que
o indivíduo age no mundo, mais especificamente através do movimento. Esse movimento
corporal possibilita às pessoas trabalharem, se comunicarem, aprenderem, sentirem o mundo e
serem sentidos. Este possui grande importância, tanto biologicamente, como psicológica,
social, cultural e evolutivamente. As primeiras respostas de uma criança são motoras e seu
progresso é acompanhado através de movimentos, mas, no âmbito educacional, essa
expressão é muitas vezes negligenciada.
Essa idéia é corroborada por Mattos e Neira (1999, p. 27), quando dizem que
O desenvolvimento destas formas de manifestação humana se explica a partir da interação do ser com o mundo. A evolução das faculdades perceptiva - motoras, trazendo consigo a possibilidade de agir sobre o mundo é o motor do desenvolvimento infantil. Como poderia uma criança ler e escrever sem antes conhecer o mundo e sentir necessidade de se relacionar?
Os autores enfatizam que não existe um movimento pelo movimento; toda ação tem uma
intenção, podendo ser funcional ou expressiva, mas sempre determinada pela dimensão
cultural como um esporte, uma expressão, um trabalho, um jogo, uma dança, enfim, qualquer
gesto realizado é sempre sustentado por um significado.
Alguns teóricos dão ao movimento o sentido apenas de músculos e tendões, fibras,
força, resistência e velocidade, porém Mattos e Neira (1999) entendem que o gesto tem
significado, intenção e sentido e pensam no trabalho com o corpo de uma forma que abarque
o movimento vinculado ao raciocínio, às intenções, aos planos de ações organizadas, e com
atividades que tenham significado, diretamente ligadas ao real, concreto, permitindo que o
aluno se interesse mais pelas ações propostas.
De acordo com Brasil (1998), a criança deve se sentir protegida e segura para vencer
os desafios e se arriscar, uma vez que quanto mais rico for o ambiente, maior a possibilidade
de ampliação do conhecimento sobre si mesma, dos outros e do meio em que vive. Nesta
mesma obra encontro, ainda, que o trabalho com o movimento deve contemplar múltiplas
funções e manifestações do ato motor, permitindo um desenvolvimento amplo dos aspectos
da motricidade das crianças, devendo abranger a reflexão sobre as posturas corporais
21
implicadas nas atividades cotidianas e naquelas voltadas para a ampliação da cultura corporal
da criança. Mas, Strazzacappa (2001) aponta que ainda existe um preconceito contra o
movimento dentro da escola.
Embora conscientes de que o corpo é o veículo através do qual o indivíduo se expressa, o movimento corporal humano acaba ficando dentro da escola, restrito a momentos precisos como as aulas de educação física e o horário do recreio. Nas demais atividades em sala, a criança deve permanecer sentada em sua cadeira, em silêncio e olhando para frente. (STRAZZACAPPA, 2001, p.02)
Scarpato (2001) diz que relegar o corpo em benefício ou privilégio da mente pode
empobrecer a aprendizagem. É importante notar que aqui, ao se tratar do corpo, diz-se
daquele que se movimenta fisicamente diferenciando as atividades do intelecto. A autora
alega que é necessário ver o homem como ser único, total, que quer aprender de forma
envolvente, dinâmica e prazerosa. Diz, ainda, que fazer com que o aluno permaneça imóvel
não quer dizer que ele esteja envolvido com o trabalho realizado na sala de aula, pois este
pode estar inquieto internamente, com vontade de se movimentar, uma vez que é insuportável
permanecer na mesma posição por muito tempo.
Essa idéia de imobilidade já não deveria mais existir nos tempos atuais. É possível
encontrar algumas pesquisas que investigam a importância do movimento dentro e fora da
sala de aula, como Go Tani (1988), Kishimoto (1998), Moyles (2002), dentre outros. Mesmo
assim, infelizmente, ainda, são encontrados, em algumas escolas, professores que trabalham
com o controle do movimento dos alunos em suas aulas. Segundo Strazzacappa (2001), a
escola, ao incorporar a noção de disciplina,
[...] sempre foi entendida como "não-movimento". As crianças educadas e comportadas eram aquelas que simplesmente não se moviam. O modelo escolar-militar da primeira metade do século XX era aplicado desde o momento em que a criança chegava na escola. As filas por ordem de tamanho para se dirigirem às salas de aula, o levantar-se cada vez que o diretor ou supervisor de ensino entrava na sala etc. [...] Nas escolas da rede pública das grandes cidades, esta realidade já não existe. Apesar da ausência destas atitudes disciplinares, a idéia do não-movimento como conceito de bom-comportamento prevalece. Muitas escolas aboliram as filas e os demais símbolos de respeito a diretores e professores; no entanto, foram criadas outras maneiras de se limitar o corpo. (STRAZZACAPPA, 2001, p.02)
A autora afirma que o movimento corporal sempre funcionou como uma moeda de
troca. Então, é comum alunos indisciplinados, lembrando que o excesso de movimento pode
levar uma criança a ser chamada de indisciplinada, serem restringidos de realizar atividades,
seja sendo proibidos de participar do recreio ou mesmo das aulas de Educação Física. Já
22
aquele que possui bom comportamento, que permanece quieto e atencioso, é contemplado
com o prêmio de ir mais cedo para o pátio brincar. Tais atitudes evidenciam o sinônimo de
prazer para o movimento e desconforto para a imobilidade.
Mattos e Neira (1999) abordam que é impossível qualquer espécie de ação sem
empregar recursos corporais. Na escola, lançou-se ao corpo apenas a quadra, o pátio e o
recreio, e a sala de aula tornou-se espaço exclusivo do raciocínio e da inteligência. O corpo é
a sede de todos os sentimentos, ações e pensamento; faz pensar que não existe manifestação
humana não-corpórea. Na sala de aula, não há apenas cérebros, mas também corpos, e
obrigatoriamente, todo conhecimento passará pelo “canal corporal”. (MATOS E NEIRA,
1999). Para esses autores, o movimento é o meio de expressão fundamental das crianças na
Educação Infantil, então, os educadores devem compreender que o corpo que corre, cresce e
sua é o mesmo que sente, conhece e se expressa.
Segundo Scarpato (2001), a “consciência corporal” é gerada pelo trabalho com o
corpo e é através desse trabalho que o aluno começa a se questionar e a compreender o que
acontece ao seu redor e consigo mesmo, possibilitando maior espontaneidade e expressão de
desejos de uma forma mais natural.
[...] Infeliz educação a que pretende, pela explicação teórica, fazer crer aos indivíduos que podem ter acesso ao conhecimento pelo conhecimento e não pela experiência. Produziria apenas doentes do corpo e do espírito, falsos intelectuais inadaptados, homens incompletos e impotentes. (Freinet, 1991 apud SCARPATO,2001, p. 42)
De acordo com esta teórica, é necessário compreender o movimento além de um olhar
biológico ou fisiológico, é imprescindível uma compreensão mais científica dele. Deve-se
perceber a necessidade da criança em correr, andar, saltar, pois é inevitável o seu agir tanto
numa atividade individual, como social. Ao censurar os movimentos do infante, estamos
prejudicando o seu desenvolvimento. A autora diz ainda que o que contribui para o
desenvolvimento dos músculos, da curiosidade e da audácia é a criança viver experiências
variadas: cair, gritar, escorregar, sujar as mãos, ou seja, vivenciar atividades corporais.
Mattos e Neira (1999), citados acima, salientam que, para Wallon, o movimento
constitui-se de três tipos: reflexo, voluntário e automático. O primeiro é aquele que nos é
natural desde o momento do nascimento; o segundo refere-se à necessidade de se estabelecer
um plano de ação, uma tomada de decisão, e o terceiro é seguido do movimento voluntário, o
qual, se repetido muitas vezes, torna-se movimento experiente e passa a ser automático como
correr, andar e dançar.
23
Os autores explicam também que é possível encontrar, em algumas obras, duas linhas
de trabalho para o movimento: “A educação do movimento” e a “educação pelo movimento”,
que, embora apresentem semelhanças, diferenciam-se em seus objetivos. Eles nos explicam
que compreendem o primeiro como a realização de atividades que visam o desenvolvimento
das habilidades motoras, da capacidade e das qualidades físicas, ou seja, prioriza-se o aspecto
motor na formação do aluno. Já o segundo vai além do componente motor, priorizando
também os aspectos afetivos, cognitivos e sociais. Para concluir acerca desse tema apresento a
seguinte citação:
[...] A evolução das faculdades perceptivo-motoras, trazendo consigo a possibilidade de agir sobre o mundo é o motor do desenvolvimento infantil. Como poderia uma criança ler e escrever sem antes conhecer o mundo e sentir necessidade de se relacionar com os outros? (COLELLO, 1900 apud MATTOS E NEIRA, 1999, p. 27).
Ao reforçar a importância do movimento para a criança e entendendo que este é o
primeiro sinal de vida do ser humano, destaco a necessidade de se dever trabalhar, através do
corpo, todos os aspectos de desenvolvimento da criança, tanto cognitivo como motor. O
brincar é parte integrante do movimento e com isso torna-se relevante aduzir sobre seu
conceito e demonstrar como este ocorre na escola e fora dela, estabelecendo sua importância e
necessidade para o desenvolvimento da criança. É o que apresento no próximo tópico.
1.2 O brincar
Ao pronunciar esta palavra brincar, é impossível desvinculá-la da idéia de diversão,
de alegria, de prazer, de liberdade, de esquecer o resto do mundo enquanto se brinca, pois, ao
brincar, a criança distrai, desliga-se do mundo real e vive intensamente uma fantasia que
muitas vezes é baseada na realidade, mas naquele momento é apenas brincadeira. É assim que
vejo, à primeira vista, o significado da palavra brincar, algo que traz liberdade, diversão,
alegria e prazer.
Os teóricos que escrevem sobre esse tema corroboram com os interessados e trazem
vários elementos de análise acerca do assunto. Assim, é preciso compreender alguns deles
para tentar apreender a real importância do brincar para o desenvolvimento da criança. Para
Dantas (1998), brincar é a forma mais livre e individual que designa o exercício funcional
24
original. Para a autora, quando se pede à professores de Educação Infantil sinônimos para o
termo brincar, o que se percebe é a tendência a aparecer prazeroso e nunca livre. Esta
tendência é uma “distorção de conseqüências infelizes”; consiste em perceber o efeito e não a
causa: o prazer é o resultado do caráter livre, gratuito, e pode associar-se a qualquer atividade.
Inversamente, a imposição pode retirar o prazer também a qualquer uma.
Winnicott (1975) diz que brincar tem um lugar e um tempo, é natural, implica
confiança e essencialmente satisfaz, é inerentemente excitante e precário. “O brincar envolve
o corpo: devido à manipulação de objetos e porque certos tipos de intenso interesse estão
associados a certos aspectos de excitação corporal.” (p. 77). Em outras palavras, o autor diz
que a brincadeira é universal e própria da saúde, pois facilita o crescimento, conduz aos
relacionamentos, permite à criança comunicar-se. Então o brincar está a serviço de uma
comunicação da criança consigo mesma e com os outros. Já para Brougère (1998), esta é uma
atividade dotada de uma significação social precisa que, como outras, necessitam de
aprendizagem. No entender de Moyles (2002), outra teórica, além da alegria e do
divertimento proporcionado, vem crescendo rapidamente a lista de vantagens decorrentes do
brincar.
Segundo Gomes (2001, p. 22), “[...] o brincar significa um libertar-se dos horrores do
mundo através da reprodução miniaturizada: as crianças, rodeadas por um mundo de gigantes,
criam para si, enquanto brincam, um pequeno mundo próprio”. No entender deste, a maioria
dos autores aborda que as palavras brinquedo e brincadeira se fundem num só sentido: o de
brincar. Ele explica que o brinquedo faz parte da vida da criança, simbolizando a relação de
pensamento-ação, e, por isto, ao possibilitar o uso da fala, do pensamento e da imaginação,
este se torna a matriz de toda atividade lingüística.
Gomes (2005b) apresenta algumas explicações sobre o motivo pelo qual as crianças
brincam:
As crianças brincam porque têm excesso de energia; […] porque é um instinto que as leva a preparar-se para a vida futura; […] porque a hereditariedade e o instinto as levam a recapitular as atividades ancestrais importantes para o indivíduo; As crianças brincam para descarregar suas emoções de forma catártica; As crianças brincam porque é agradável. […]; O brincar é um aspecto de todo comportamento. Ele está implícito na assimilação que o indivíduo realiza em relação à realidade. (GOMES, 2005b, p. 13 e 14).
Enfim, as crianças brincam porque gostam; divertem-se, porque é importante para sua
formação e seu desenvolvimento, mas principalmente porque não é uma obrigação.
25
Dantas (1998) aborda, também, que mesmo o recém nascido brinca ao exercitar suas
possibilidades sensoriais. Ele brinca de se olhar, de gorjear, enfim, suas reações primárias não
passam de brincadeiras funcionais:
O primeiro brinquedo da criança é o próprio corpo, que ela começa a explorar já nos primeiros meses de vida. Depois, passa a explorar, no seu entorno, os objetos que produzem estimulações visuais, auditivas e cinestésicas. A partir de então o brinquedo estará sempre presente na vida da criança, do adolescente e até mesmo do adulto. Para Nunes de Almeida, o mundo do brinquedo é um mundo composto. É um mundo de imaginação, imitação e de representação, fazendo parte de uma vontade de crescer e de se desenvolver. Quando brinca com uma boneca ou um utensílio doméstico em miniatura, a criança exercita a manipulação dos objetos, compondo-os, designando-lhes um espaço e uma função, dramatizando suas próprias relações com aquilo que esses objetos representam e eventualmente seus conflitos. (GOMES, 2001, p. 20).
É possível perceber que a criança utiliza sua realidade para brincar e que muitas de
suas brincadeiras são construídas a partir de sua vida familiar ou escolar, enfim, de sua
relação social com outros adultos e crianças. Desta forma, a fantasia, durante a brincadeira, é
muito utilizada, e um termo que se pode ouvir bastante durante as brincadeiras de crianças é o
faz de conta. A partir desta frase, a imaginação pode voar longe, fazendo com que a
brincadeira se torne ainda mais divertida, porque são as próprias crianças que instauram as
leis daquela brincadeira, as leis de sua cultura infantil, para usar um termo que é caro a
Brougère.
Para Vigotsky (1998), o brinquedo que é envolvido em uma situação imaginária é
baseado em regras, e vai além ao afirmar que não existe brinquedo sem regras, pois, segundo
ele, qualquer forma de brinquedo em situação imaginária contém regras de comportamento,
mesmo que não seja um jogo com regras formais estabelecidas anteriormente, mas o fato de a
criança se imaginar no papel da mãe e a boneca no papel da filha deve obedecer às regras de
apresentação do comportamento maternal.
O autor afirma, ainda, que é incorreto dizer que uma criança pode se comportar em
uma situação imaginária sem regras, pois se ela utiliza a representação da vida real, sua
relação com um objeto sempre resultará em regras. Acrescenta, também, que “da mesma
forma que uma situação imaginária tem que conter regras de comportamento, todo jogo com
regras contém uma situação imaginária”. (p.125)
Entretanto, acredito que, mesmo utilizando tais regras de comportamento, no momento
da brincadeira, estas são criadas pela criança e não pelo adulto, mesmo que esteja imitando ou
encenando uma situação da vida real. É ela quem cria suas próprias regras naquele momento
26
e, por isso, torna-se uma atividade prazerosa. Ao contrário, se fosse o adulto a estabelecer as
regras da brincadeira, a ação não teria a mesma conotação de alegria ou prazer, pois seria algo
que lhe foi imposto por outra pessoa, e não por ela mesma.
Para Winnicott (1975), o brincar é por si mesmo uma terapia. É necessário que pessoas
responsáveis estejam disponíveis quando as crianças brincam, mas não necessariamente
precisam ingressar no brincar destas. A característica essencial do que o autor deseja
comunicar diz respeito ao brincar sempre como uma experiência criativa, uma experiência na
continuidade espaço-tempo, uma forma básica de viver. A criança deve aprender a brincar, no
entender de Brougère (1998), e as brincadeiras entre a mãe e a criança são indiscutivelmente
um dos lugares essenciais dessa aprendizagem.
O conteúdo de um brinquedo não determina a brincadeira da criança. Pelo contrário, é
o ato de brincar que irá revelar o conteúdo do brinquedo, isto devido ao fato de a criança usar
a imaginação na hora de brincar. A criança,
[...] “ao puxar alguma coisa, torna-se cavalo; ao brincar com areia, torna-se padeiro; ao esconder-se, torna-se ladrão ou guarda”. Para uma criança, quanto mais atraente ou sofisticado for o brinquedo, mais distante estará de um valor como instrumento de brincar. […] Nada é mais adequado à criança do que associar em suas construções os materiais mais heterogêneos como pedras, bolinhas, papéis, madeira. Um simples pedaço de madeira, uma figurinha ou uma simples pedrinha reúne em sua solidez, na unidade de sua matéria, uma exuberância das mais variadas figuras: ninguém é mais sábio em relação aos materiais e ao que faz com eles do que a criança. (GOMES, 2001, p. 21).
Baseando-se nas afirmações do autor, entende-se que a fantasia e a imaginação são peças
chave para a brincadeira infantil, pois até mesmo o brinquedo, que geralmente já tem uma
função, pode ser totalmente transformado através da imaginação e fantasia da criança, pois é
ela quem escolhe a brincadeira e, conseqüentemente, cria as regras.
Vigotski (1998) explica que a imaginação é um processo psicológico novo para a
criança, e que o velho conceito “de que o brincar da criança é imaginação em ação deve ser
invertido; podemos dizer que a imaginação, nos adolescentes e nas crianças em idade pré-
escolar, é o brinquedo sem ação”. (p.123). A criança cria uma dada situação imaginária no
brinquedo, e esta sempre foi vista apenas como um tipo de brincadeira.
Segundo o autor, é durante a fase pré-escolar que ocorre a divergência entre o
significado e a visão, ou seja, os objetos têm suas funções modificadas, como foi citado por
Gomes (2001) anteriormente. Assim “o pensamento está separado do objeto e a ação surge
das idéias e não das coisas” (cabo de vassoura torna-se um cavalo). (p.128). A criança faz
então uma inversão de sua relação com a situação real, imediata e concreta, dificultando uma
27
subestimação dos seus significados. Esta transformação não é realizada de uma única vez pela
criança, pois é extremamente difícil para ela separar os objetos de seu significado.
Gomes (2001), tomando emprestado de Lorenz, considera que a criança brinca porque
a brincadeira é um fenômeno da corporeidade humana. Afirma que quando a criança chega à
escola, e o professor diz que ali não é lugar de brinquedos e brincadeira, isso traz um
significado de que a escola é um lugar onde não existe prazer, pois não se pode brincar. O
infante fora da escola pode jogar, brincar, pular e fazer o que quer e lá dentro tudo isso acaba,
inclusive sua naturalidade e espontaneidade. Não se tem mais autonomia.
O autor salienta que muitos professores ainda acham que o espírito é que tem que
funcionar na sala de aula, o corpo só deve agir fora da sala, no parque, no pátio. Não se pode
dicotomizar, num contexto de brincadeira, pois o corpo, o espírito, as relações sociais, o
cognitivo, o afetivo, o simbólico estão inseridos num só, é único, assim corpo e mente estão
em constante interação, por isso brincar e aprender são pólos de uma mesma energia. “Só
existe uma forma de aprender que é o agir, não existe melhor forma de agir do que o brincar, a
criança está muito estática na escola. É por isso que temos uma criança que aprende muito
pouco”. (GOMES, 2001, p. 53)
É importante o favorecimento do agir, é necessário pensar-se numa dimensão mais
ampla, pois o corpo, quando age, o espírito (a mente) também age, e assim a criança pode se
expressar, se expor, observar e descobrir novos conhecimentos.
Moyles (2002) afirma que, se a visão do professor for de um instrutor ou doador de
conhecimentos, o brincar livre talvez não deva ocorrer nas escolas, mas, se o professor tiver a
noção de um mediador e iniciador de aprendizagem, o brincar livre e o dirigido tornam-se
essenciais para a interação professor/aluno, pois o professor não só permite, mas também
proporciona os recursos necessários e apropriados para essa aprendizagem. Através dos
autores apresentados, é possível perceber a dimensão do brincar para o desenvolvimento da
criança, tanto fora como dentro da escola. É preciso, então, que professores da Educação
Infantil tomem maior conhecimento sobre a importância do brincar na escola para que possam
finalmente incluir esse conteúdo em seus trabalhos.
Para tratar mais especificamente do profissional que trabalha com essa faixa etária,
busco algumas discussões de estudiosos que abordam a atuação e formação do professor de
Educação Física na Educação Infantil. Este assunto será apresentado no próximo tópico.
28
1.3 O professor de Educação Física na Educação Infantil
Nesse momento torna-se importante compreender o trabalho da Educação Física em
creches e pré-escolas, uma vez, que na maioria dos casos, ela ocorre sem a devida
fundamentação teórica. As dificuldades no processo de formação do professor, direciona para
uma preocupação voltada para às especificidades da Educação Infantil, na condição de área de
produção de saber.
Lopes (1999) escreve sobre a qualificação cada vez menor dos profissionais que
trabalham com a Educação Infantil, informando que a maioria destes, que procuram uma
instituição de Educação Infantil para trabalhar, tem pouco conhecimento a respeito desta fase
da educação, ou conhecem razoavelmente bem as crianças de 6 e 11 anos, mas não tem a
mínima idéia sobre as necessidades das crianças de creche e pré-escola. É possível verificar
também aqueles que possuem um discurso bem articulado e com conhecimento teórico
bastante vasto, no entanto, a prática não tem a ver com o discurso. Tal situação provoca uma
preocupação com a formação de professores, bem como com a identidade profissional e
também a identificação de concepções diversas sobre o infante.
O autor esclarece que só acredita em um atendimento de qualidade para a criança, se
os profissionais responsáveis diretos com a educação dela estiverem conscientes dessa
necessidade e tiverem bagagem teórica e metodológica. No entanto, para que isso ocorra, é
necessário que haja uma compreensão do professor e do aluno “como sujeitos produtores da
história e da cultura inseridos na linguagem”. (p.102). E, para isso, é necessário compreender
e pensar a cultura diante do seu processo, ou seja, a escola tem o papel de transmitir a cultura
e perceber a influência que ela provoca no sujeito que irá recriá-la.
De acordo com Pinto (2000-2001, p. 136), a “Educação Física deve estar presente nas
instituições de Educação Infantil, tematizando o rico acervo de práticas culturais expressas
pela corporeidade e pela motricidade humanas.” A partir da contemplação das diferentes
linguagens, que, na criança, externam-se através do brincar, da gestualidade, da oralidade, da
leitura, da escrita, da corporeidade e pela musicalidade, o papel da Educação Física e o espaço
pedagógico de seus professores, na Educação Infantil, precisam ser “(re)pensados”. Para uma
ampliação do conhecimento corporal tanto de crianças como de professores em direção à
compreensão de si mesmos, dos outros e do mundo, faz-se necessário que os jogos, ginásticas,
danças, esportes, lutas, entre outras expressões e linguagens, devam ser trabalhados em uma
perspectiva interdisciplinar.
29
Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002, p. 94) afirmam que “pensar a presença da
Educação Física na escola pressupõe a compreensão de que ela é construída ‘na’ e ao mesmo
tempo, construtora ‘da’ cultura escolar”. Sendo assim, isso exige o envolvimento pleno de
seus professores com o projeto político pedagógico da escola, além, é claro, de estarem
abertos ao diálogo crítico com a realidade social e com as crianças, considerando seus
interesses e suas necessidades, e estando sempre atentos à dimensão cultural das práticas
corporais de movimento.
Segundo Sayão (2002), para que a Educação Física possa se situar no PPP2 das
instituições educativas infantis, é necessário reunir produções decorrentes das discussões
acerca da pedagogia da Educação Infantil. Então, dá-se inicio a um processo de
“formulação/reformulação das práticas pedagógicas”, as quais possam ser refletidas a partir
de espaços de vivência das crianças nas instituições infantis.
Em relação à organização do trabalho pedagógico da Educação Física na Educação
Infantil, Sayão (2002) ressalta que é preciso organizar-se para além de uma disciplina que
domina um conteúdo definido previamente.
Há, certamente, uma intencionalidade educativa em todas as ações docentes na Educação Infantil e na Educação Física; nas interações que crianças e adultos mais experientes estabelecem, é necessário incorporar a idéia de que os/as pequenos/as possuam saber provenientes de suas experiências culturais anteriores. “Ampliá-las significa considerar que o “conhecimento cognitivo” é apenas uma das dimensões humanas e não a sua razão última. (SAYÃO, 2002, p. 50)
Assim, pensar a Educação Física escolar é pensar sua prática docente e a forma como
esta se realiza na escola. Para Sayão (2002), na perspectiva de Educação Infantil que
considera a criança como sujeito social e possuidor de múltiplas dimensões, as atividades ou
os objetos de trabalho não deveriam ser compartimentados em funções e/ou especializações
profissionais. Todavia, o problema não está no fato de vários profissionais atuarem no
currículo da Educação Infantil, mas sim nas concepções de trabalho pedagógico de tais
profissionais, que separam as funções de uns e de outros, isolando-se em seus próprios
campos.
Esses problemas só se resolvem através da aquisição de novos conhecimentos, através
do trabalho conjunto e interdisciplinar. Assim, Pinto (2000-2001) aborda que a crescente
produção teórica brasileira em relação às práticas corporais, a qual demonstra preocupações
de grupos de pesquisa e docência, tem avançado nos questionamentos, reflexões e
2 Projeto Político Pedagógico
30
intervenções no contexto da Educação Infantil, o que muito contribui para a área de
conhecimento.
Percebo, através de algumas discussões e reflexões acerca da Educação Física na
Educação Infantil, a necessidade de profissionais especializados para dar conta da
complexidade do trabalho com a educação da criança de zero a seis anos. Por isso, é
necessário um olhar mais crítico para a formação inicial desse professor de Educação Física e,
até mesmo, para a formação continuada, tendo como foco a qualidade dessa formação voltada
especificamente para essa faixa etária:
[...] a interação, a brincadeira e as diferentes linguagens da criança são os eixos fundamentais num processo educativo no qual a criança é vista como um todo indissociável. Portanto, não se trata de atribuir “funções para as linguagens” para um/a outro/a profissional e designar “hora para as linguagens”. O/a professor/a de Educação Física deve ser mais um adulto com quem as crianças estabelecem interações na creche. No entanto, só se justifica a necessidade de um/a profissional dessa área na Educação Infantil se as propostas educativas que dizem respeito ao corpo e ao movimento estiverem plenamente integradas ao projeto da instituição, de forma que o trabalho dos adultos envolvidos se complete e se amplie visando possibilitar cada vez mais experiências inovadoras que desafiem as crianças. (SAYÃO, 2002, p. 59).
Através de Pinto (2000-2001), noto ser fundamental discutir a formação inicial do
professor de Educação Infantil, uma vez que este é um sujeito da educação responsável direto
pela mediação dos saberes culturais e pela leitura da produção cultural da criança. Pinto
(2004) ilustra que não se trata apenas de uma ampliação curricular nos cursos de formação,
que permita criar uma ou mais disciplinas que abordem a problemática da corporalidade. É
necessário repensar as propostas curriculares e buscar o trabalho interdisciplinar entre áreas,
disciplinas e professores-formadores, objetivando superar a fragmentação do conhecimento. A
autora sugere que seja estabelecido um local de discussão, reflexão e vivência da/sobre a
corporalidade nos cursos de formação de professores, especialmente na universidade,
contemplando, assim, tanto o âmbito dos fundamentos filosóficos, sociológicos e históricos da
educação, quanto o âmbito dos fundamentos relativos ao fazer pedagógico.
Lopes (1999) traz um alerta sobre a necessidade de os professores terem acesso ao
conhecimento que é construído na Educação Infantil e também da cultura como um todo,
pois, assim, os professores podem ao mesmo tempo refletir e repensar sua prática e participar
efetivamente de uma construção e consolidação do conhecimento. É necessário que o
professor seja profundamente comprometido e permanentemente seja um pensador,
organizador e construtor do trabalho educativo para que possa, dessa forma, se educar.
31
O autor, ao citar Jung, explica que, para educar alguém, é necessário antes se educar:
“[...] o problema educacional tem orientação falha porque vê somente a criança como sujeito
que deve ser educado e não considera que o adulto também precisa ser educado”. (p.117). E
traz também a necessidade da construção de uma proposta pedagógica que deve contar com a
participação de todos os sujeitos envolvidos no processo de educação: professores, alunos,
crianças, adultos, família, outros profissionais da escola e também a população em geral. É
importante que os profissionais estejam em formação permanente para que as crianças tenham
a oportunidade de adquirir e construir conhecimentos que verdadeiramente as tornarão
“cidadãs autônomas”. E para que o professor possibilite a construção de conhecimento, é
imprescindível que ele seja desafiado a construir o seu.
Para Pinto (2000-2001), as competências necessárias para a função docente na
Educação Infantil tornam-se mais complexas se se levar em conta que “Vygotsky e Benjamim
apontam para o jogo, a brincadeira e o movimento como suportes da cultura infantil”.(p. 141).
O que se percebe é que há pouca ou nenhuma discussão, na realidade, dos cursos de
formação, sobre o papel social daquilo que caracteriza a cultura da criança.
Segundo a mesma autora, quando existe essa discussão, ela é enfatizada apenas nos
aspectos funcionais do jogo, da brincadeira e do movimento, privilegiando, assim, a
abordagem instrumental desses conteúdos. Essa problemática agrava-se devido à inexistência
de vivências e experiências significativas do movimento, do jogo e da brincadeira no processo
de formação docente.
Sayão (2002) acrescenta que uma forma de qualificar o trabalho docente é possibilitar
a formação permanente de profissionais da Educação Infantil, através de cursos, oficinas,
visitas, passeios, relatos de experiência, seminários, os quais poderão aproximar os
professores entre si e o coletivo, objetivando sensibilizar a escola para que esta se volte para
as práticas provenientes da Educação Infantil. A autora acredita que a troca de experiências e
o relato das práticas favorecem um clima de companheirismo e solidariedade entre os
professores e demais profissionais da instituição infantil, possibilitando uma constante
reflexão em torno da docência.
Silva e Pinheiro (2001-2002) apresentam ainda uma outra problemática que diz
respeito à articulação mais consistente entre a Educação Física e a concepção de Educação
Infantil, que surge em três tendências de pesquisa da área: a psicomotricidade, o
desenvolvimento motor e a ludicidade. Historicamente as concepções teóricas que
influenciaram a Educação Física na pré-escola foram as da recreação, psicomotricidade e de
desenvolvimento motor.
32
Recreação entendida como compensação de energias gastas pelo massacre da sala de aula ou como desenvolvimento de atividades com fins em si mesmas; Psicomotricidade como instrumental e preparação para as atividades ‘futuras’ – a alfabetização – ou como metodologia relacional, que se confundiu, pedagogicamente, com a recreação, incentivada por certa crença no ‘espontaneísmo’; Desenvolvimento Motor que, tendo no esporte de rendimento seu fim último, quando aplicado à Pré-Escola, tenta antecipar o treino de habilidades importantes para a formação de atletas do ‘futuro’. (SAYÃO, 1997, p.265).
Está implícita nessas tendências uma concepção de Educação Infantil compensatória, ou seja,
a pré-escola com função essencial de compensar as deficiências culturais e do próprio
desenvolvimento (físico e intelectual), apresentadas pelas crianças das classes populares para
que não fracassem na escola mais tarde. Posso verificar que a intenção de instrumentalização
do movimento humano ainda persiste, permanecendo então um entendimento reducionista dos
processos de aprendizagem e desenvolvimento humano.
Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002) asseguram que o diálogo cotidiano entre
professores e alunos das escolas públicas envolve a Educação Física em circunstâncias que, às
vezes, afloram em problemas que precisam ser enfrentados:
O reforço nas práticas escolares da dualidade corpo-mente, materializado no isolamento pedagógico, espacial e temporal da disciplina; a interpretação do conhecimento atinente à Educação Física como “um saber escolar da quadra”, considerado, portanto, como “de fora” da escola; ou como “saber escolar realizado no pátio” e, assim, tratado como tempo de descanso e de recomposição para novos trabalhos sérios em sala de aula; o desprezo por seu potencial educativo e formador; a esportivização das práticas corporais, que muitas vezes tenta naturalizar um aprendizado que é socialmente construído [...]. (DEBORTOLI, LINHALES E VAGO, 2001-2002, p. 94-95).
Nessa perspectiva, acredita-se que não só a formação do professor de Educação Física, mas de
todos os professores da Educação Infantil deva ser repensada, pois urge a necessidade de
reflexão acerca do papel dos professores frente à educação dessa faixa etária. Afinal, acredito
que a formação desses professores deva favorecer um trabalho interdisciplinar em que todos
estejam envolvidos no trabalho e que possam reconhecer não só a importância da função do
professor de sala de aula, mas também do professor de Educação Física. Só assim a escola
infantil poderá progredir para uma educação total.
Segundo Pinto (2000-2001), várias pesquisas demonstram que o trabalho dos
professores de Educação Infantil e das séries iniciais baseia-se pelo desprezo às questões
relativas à experiência motora e lúdica e pelo uso instrumental do brinquedo e da brincadeira.
Com isso, os futuros professores têm suas competências parcializadas enquanto mediadores
33
culturais, pela impossibilidade de apreenderem o valor do movimento, da brincadeira e do
jogo como suportes da cultura da infância.
Segundo Lopes (1999), os professores são profissionais cidadãos e, por isso, agentes
culturais e sociais. Portanto, deve-se privilegiar a qualidade do conhecimento. Para isso,
O professor/recreador precisa estar inserido em um novo paradigma, que pressupõe educar sempre conforme uma visão de totalidade. Educar pessoas inteiras, que integrem todas as dimensões: corpo, mente, sentimentos, espírito, psiquismo a dimensão pessoal, a grupal e a social, que tentem encontrar as pontes, as relações entre as partes e o todo, entre o sensorial e o racional, o concreto e o abstrato, o individual e o social. A maior tarefa dos educadores consiste em serem eles mesmos, plenamente, e ajudar para que os outros também o sejam. [...]. (LOPES, 1999, p.122).
O autor acrescenta que é necessário criar possibilidades para que a cultura e o conhecimento
sejam apropriados pelos professores/educadores, e que estes tenham acesso às teorias sobre a
Educação Infantil. É importante que a cultura seja o ponto central dos currículos, de forma
que assegure o conhecimento através dos livros, música, teatro, grupos de estudo, artes e
linguagens diversas. Já Dantas (1998) sugere que, na educação, dever-se-ia introduzir cada
nova atividade através de uma etapa lúdica. Brincar com palavras, com letras, com o
computador: manuseá-los livremente, ludicamente, antes de dar a este manuseio um caráter
instrumental.
Para Gomes (2001), o lúdico ou as atividades lúdicas são aquelas que não se
submetem a regras ou normas; o importante é o prazer de brincar. Essa atividade possui
características básicas como o comportamento durante uma brincadeira, que é exercido pelo
organismo em situação lúdica, ou seja, espontaneidade, alegria e senso de humor. Resumindo,
é um sentimento de prazer: “O corpo que brinca provavelmente ri, sorri, mostra-se relaxado –
e muitas vezes suado – mostrando emoção: há um ‘forte elemento de prazer na atividade que
é lúdica’”. (p.32).
Sobre isso, Dantas (1998) salienta que a linguagem deve ser desenvolvida através da
brincadeira com palavras, ou seja, deve-se utilizá-las melodicamente, através de sons
musicais, tendo em vista a grande sensibilidade do bebê à melodia da voz, e também a
preferência das crianças por rimas e ritmos. Assim, brincar com a linguagem é usar a
linguagem, e brincar com o gesto é usar o gesto. Para esta teórica, é importante
Brincar de andar, de pular, de subir e descer, de por e tirar, de empilhar e derrubar, de fazer e desfazer, de criar e destruir. Educar neste momento é sinônimo de preparar o espaço adequado, o espaço ´brincável´, isto é, explorável”. [...] Educar é agora sinônimo de abastecer com material, sugestões e proposições de natureza
34
artística. Música, pintura, escultura, dança, poesia, narrativa, teatro. Brincar de fazer e fruir de todas as manifestações estéticas”. (DANTAS,1998, p. 117 e 118).
Tendo em vista a futura ação do profissional que se forma, Pinto (2000-2001) afirma
que a formação inicial de professores de Educação Infantil deve-se constituir em um espaço
onde seja possível vivenciar, conhecer e refletir sobre o jogo, o movimento e a brincadeira,
em um tempo de desalienação do movimento e de suas expressões lúdicas, de modo
significativo para a ação futura do profissional. Para Gomes (2001), a escola, ao tentar conter
o impulso lúdico, expulsando-o pela porta, o faz voltar pela janela sob forma de algazarra,
indisciplina e transgressão.
Moyles (2002) ilustra que existem várias evidências da dificuldade encontrada nas
escolas de Educação Infantil e Ensino Fundamental em relação ao “brincar”, pois este é
freqüentemente desprezado a atividades, brinquedos e jogos que a criança pode escolher
depois de terminado seu “trabalho”. A autora menciona a dificuldade que os professores
envolvidos na organização cotidiana da aprendizagem infantil têm para extrair e justificar as
atividades lúdicas no contexto educacional, embora aceitem o valor do brincar. A dicotomia
para os professores, apresentada pela autora, é “por um lado de que as crianças aprendem
muito pouco sem a direção da professora, e, por outro, o brincar auto-iniciado pela criança é
defendido como proporcionador de um melhor contexto de aprendizagem”. (p.18). É possível
perceber o difícil e complexo papel do educador infantil, e Moyles (2002) sugere que os
professores deveriam ter a oportunidade de desenvolverem um sólido conceito do brincar para
justificar a sua existência prática nas escolas de Educação Infantil e Fundamental.
Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002) esclarecem que a Educação Física, como área
de conhecimento escolar, tem, em sua prática pedagógica, como objeto de ensino, a “Cultura
Corporal de Movimento”, e com isso tem o compromisso de garantir o direito de acesso à
riqueza dos temas e conteúdos de ensino da Educação Física, especialmente sua reinvenção,
partilha e reconstrução coletiva, em integração com os diferentes conhecimentos e prática
escolares. Os autores afirmam que, infelizmente, ainda não foram superadas as representações
constituídas socialmente acerca dos professores de Educação Física, que ainda são vistos
como professores “rola-bola”, descomprometidos e sem responsabilidades pedagógicas. Essa
visão é responsável pelo desprestígio social e educacional da Educação Física, provocada por
essas representações reducionistas e demanda cuidado e divisão de responsabilidades, além de
requerer estratégias para a construção de um fazer pedagógico diferente destes.
Segundo os autores acima citados, não se deve desprezar os problemas pedagógicos
existentes, mas também não se deve esquecer que existem muitos professores com potencial
35
inovador e inventivo, os quais incorporam ao desenvolvimento da Educação Física escolar o
compromisso com a formação humana e com a construção de uma sociedade justa e digna.
Também,
Outro aspecto a merecer consideração é o fato de que a Educação Física escolar apresenta-se, para a grande maioria das crianças e dos jovens matriculados no sistema público de ensino, quase que como a única possibilidade de conhecimento, sistematização, vivência e problematização dos saberes relacionados às práticas corporais de movimento culturalmente organizadas. Aqui, o direito a uma Educação Física de qualidade agrega-se ao direito social à educação pública. Essa disciplina, como os demais saberes escolares, deve constituir um tempo/espaço de aprendizagem que considere: a participação de todos na reconstrução permanente da vida em sociedade, a democracia como princípio orientador das ações políticas e a cidadania como condição legitima de pertencimento à vida social. (DEBORTOLI, LINHALES E VAGO, 2001-2002, p. 95).
Para isso, é necessária uma formação de qualidade, que se preocupe com a formação cultural
da criança, o que permite a certeza de que a Educação Física não pode ser pensada de maneira
isolada.
Para uma consolidação da Educação Física na Educação Infantil, Debortoli, Linhales e
Vago (2001-2002) dizem que há necessidade de observar alguns princípios orientadores:
qualificação permanente do professor; a eliminação da fragmentação dos saberes escolares
que reforçam a lógica dual, que separa corpo/mente, sensibilidade/razão, agir/pensar e
prática/teoria e que retiram da Educação Física os elementos necessários à sua organização
como área de conhecimento escolar e seu diálogo com os demais saberes escolares; e também
a desfragmentação de tempo/espaço pedagógico dessa disciplina, que tem sido tratado como
dispositivo de compensação dos desgastes e insatisfações presentes no cotidiano escolar, e
que promove a idéia de um fazer compensatório, pouco ou nada sistematizado e destituído de
intencionalidade.
Segundo Silva e Pinheiro (2001-2002), é normal que a Educação Física, na pré-escola,
carregue uma visão de corpo biologizado e fragmentado da sociedade, despreocupada com a
perspectiva educativa das instituições de Educação Infantil: a expansão da pós-graduação em
Educação Física no Brasil sempre esteve ligada ao desenvolvimento da aptidão física, em que
a maioria das linhas de pesquisas privilegiava estudos dessa natureza. No entanto, esses
autores explicitam um contraponto a essa realidade, apresentando o aumento e crescimento do
número de pesquisas (dissertações e teses) que vêm abordando as questões pertinentes à
Educação Infantil, de uma forma mais articulada e elaborada, a partir dos anos 90, quando
surgiu a tendência em estudos da ludicidade, o que indica uma mudança em relação à
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Educação Física na Educação Infantil, uma vez que o brincar e o brinquedo tornaram-se temas
de pesquisa.
Quando o campo de intervenção da Educação Física é a creche ou a pré-escola,
Silva e Pinheiro (2001-2002) salientam que seu objeto de estudo passa a ser o movimento ou
o corpo da criança, a qual é objeto da Educação Infantil. Ao considerar que a problemática da
Educação Física é o movimento humano e seus objetivos culturais, na perspectiva de uma
participação/contribuição para a educação do homem, é mais do que justificável que essa área
possa e deva contribuir para uma reflexão do corpo, do movimento e da cultura corporal da
criança na creche e na pré-escola.
Para isso torna-se necessária a construção de uma prática educativa pedagógica
fundamentada nas representações da Educação Física. É imprescindível considerar a “cultura
corporal de movimento” uma especificidade pedagógica da disciplina, com sua diversidade de
conteúdos e práticas para a educação de crianças. Assim,
A prática de Educação Física como conhecimento escolar se aproxima das crianças para encontrá-las em seu tempo de descobertas, de invenção de conhecimentos, de vivências de infinitas formas humanas de expressão e linguagem contidas no “movimentar-se humano”. (DEBORTOLI, LINHALES E VAGO, 2001-2002, p. 103).
Também se verifica em Pinto (2004) que, em relação à abordagem da corporalidade na
formação de professores, algumas experiências têm sido realizadas por professores de
Educação Física e aduzem para uma ampliação nesse sentido. Alguns pesquisadores citados
pela autora, como Carneiro, Câmara & Cavalcanti e Mendes, vêm abordando alguns temas da
cultura corporal junto a professores e estudantes de magistério e cursos de pedagogia, e
direcionam, então, para uma mudança na compreensão da Educação Física, enquanto prática
puramente motora, excluída da dimensão cognitiva. Consequentemente, há a compreensão de
que as ações corporais não estão desvinculadas das ações intelectuais. Também indica que a
valorização dos processos de ludicidade entre os futuros professores está relacionada à
presença da Educação Física no espaço/tempo da formação profissional, porém, esta presença,
embora essencial, ainda se encontra em construção, o que deve ocorrer a partir de uma
perspectiva de um trabalho integrado aos demais professores e áreas curriculares.
O reconhecimento de alguns pesquisadores da área em relação ao papel do brinquedo
no desenvolvimento e aprendizagem da criança, bem como a responsabilidade que o professor
de Educação Física exerce nesse processo, representa um avanço em direção à possibilidade
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de se construir uma relação mais concreta com a Educação Infantil, o que é extremamente
valioso para a formação e qualificação de futuros profissionais da área.
Pinto (2000-2001) assegura que a formação inicial de professores de Educação
Infantil pode e deve se constituir em uma base de desalienação do movimento e de suas
expressões lúdicas e que o espaço de formação deve ser um lugar que se possibilite vivências,
conhecimentos e reflexões acerca da brincadeira, do jogo e do movimento, de modo
significativo, tendo sempre em vista a futura ação do profissional que se forma. A autora
afirma ainda que, nos cursos de formação, não se deve abdicar da dimensão “reflexivo-
transformadora da ação educativa”. O professor não pode se especializar sem compreender os
determinantes socioeconômicos e políticos nos quais a infância e a cultura acontecem, muito
menos de forma abstrata e aistórica.
É possível compreender, através das abordagens da autora, que devem ser
proporcionadas à formação docente situações que levem a uma conscientização das limitações
culturais, sociais e ideológicas da própria profissão docente, ou seja, deve-se privilegiar, nos
cursos de formação, a concepção de um professor intelectual transformador, sem, porém,
priorizar e hegemonizar a aprendizagem intelectual sobre a aprendizagem corporal e motora.
É necessário, na perspectiva de uma formação inicial crítica, o rompimento da dicotomia
teoria-prática, para oportunizar aos alunos/futuros professores as condições essenciais de uma
apropriação ampla e crítica da cultura e do conhecimento. E mais:
[...] apesar de suas limitações históricas, a Educação Física enquanto área de conhecimento acadêmico tem potencial para contribuir significativamente nos processos de formação de profissionais da educação. Ao tematizar a cultura corporal como linguagem, essa área pode oferecer conhecimento, experiências e vivências realmente importantes para a superação das concepções hegemônicas – de movimento, jogo, brinquedo, corpo, criança/infância, homem/mulher, educação, educação infantil – presentes não só na escola como também no contexto ampliado da realidade. (PINTO, 2004, p. 15)
Posso perceber a grandeza da importância de uma educação/formação de qualidade,
que se inicia na Educação Infantil e vai até a universidade, para que os profissionais da
Educação Física e Educação Infantil possam transformar suas práticas pedagógicas e se
envolverem em um trabalho interdisciplinar de qualidade e superação. É necessário repensar
a formação desses profissionais de maneira que possam superar todas as dicotomias e
preconceitos existentes em relação ao movimento, brincadeira, jogo, enfim, da cultura
corporal de movimento.
38
A Educação Física, ao tratar da cultura corporal, aborda como conteúdo específico
da área, a linguagem corporal que é de grande importância para o desenvolvimento da
criança, principalmente na Educação Infantil. A seguir, elucidarei sobre essa linguagem do
corpo, cujas atividades rítmicas podem contribuir de forma significativa para seu
aprimoramento.
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2 A linguagem corporal e as atividades rítmicas
A criança não só usa o intelecto, mas também age, sente e se relaciona, daí à grande
preocupação desta pesquisa em valorizar a linguagem corporal, nomeada, aqui, também, de
comunicação não-verbal, e igualmente o conteúdo das atividades rítmicas que proporcionam
um melhor desenvolvimento desta linguagem corporal.
Mendes e Fonseca (1987) notabilizam que pouca ou nenhuma importância vem sendo
dada a este tipo de comunicação, a não-verbal, mas que não se deve ignorá-la, pois o corpo
contém em si próprio um sentido e uma expressão intelectual e mental, que privilegia a
relação e a comunicação com o exterior.
Baseio-me principalmente na obra de Knapp e Hall (1999) para buscar um maior
esclarecimento do que vem a ser essa comunicação não-verbal: estes afirmam que muitas
pessoas pensam na expressão “comunicação não-verbal” como referente a uma comunicação
realizada por meio diferente das palavras, uma vez se supõe que estas são elementos
“verbais”. Segundo os autores, a dimensão verbal está tão intimamente ligada e representada
em tudo aquilo que a princípio está rotulado de não-verbal que o termo nem sempre expõe de
modo adequado o comportamento em estudo.
Os autores exemplificam essa questão apontando para os gestos que compõem a
linguagem dos surdos os quais são claramente lingüísticos, então, verbais. Porém, gestos
freqüentes com as mãos são considerados comportamentos diferentes das palavras. Outra
confusão em relação à definição de comunicação não-verbal surge através dos
comportamentos que utilizam meios “diferentes das palavras”. Geralmente, quando se faz
referência ao comportamento não-verbal, fala-se de sinais aos quais serão atribuídos
significados, e não do processo de atribuição de significado.
Segundo Knapp e Hall (1999), uma outra maneira de definir ou diferenciar a
comunicação verbal e não-verbal é aquela que considera a sua função, como, por exemplo, a
visão decorrente da idéia de que “o comportamento verbal é narrativo e conceitual, transmite
idéias, ao passo que o não-verbal comunica emoções”. (p.18). No entanto, expõem que essa
distinção “conceito/emoção” não é adequada para definir comportamento verbal e não-verbal,
uma vez que as palavras podem trazer muita emoção. Podemos comunicar emoção nas
“entrelinhas”, da mesma forma que sinais não-verbais são frequentemente usados com outros
propósitos que não o de passar emoção.
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Mesquita (1999) salienta que os movimentos e gestos compõem os inúmeros canais de
comunicação que o ser humano emprega para expressar suas emoções e sua personalidade,
transmitir informações nas cerimônias, propagandas, rituais, encontros políticos e sociais,
demonstrações de arte, bem como para comunicar atitudes interpessoais.
Para o ser humano as comunicações não-verbais se processam através de três suportes. O primeiro, o corpo, nas suas qualidades físicas, fisiológicas e nos seus movimentos. O segundo, no homem, ou seja, objetos associados ao corpo como os adornos, as roupas, ou mesmo as mutilações, marcas ou cicatrizes de tatuagens, de rituais ou não; neste suporte ainda podem ser relacionados os produtos da habilidade humana que podem servir à comunicação. Finalmente, o terceiro suporte se refere a dispersão dos indivíduos no espaço, este espaço engloba desde o espaço físico que cerca o corpo até o espaço que a ele se relacione, o espaço territorial. (MESQUITA, 1997, p.158)
Knapp e Hall (1999) explicam melhor essa questão abordada pela autora acima,
apresentando um esquema de classificação bem detalhada da conduta ou comportamento não-
verbal. Essa classificação é dividida de acordo com as investigações científicas. São elas: o
ambiente da comunicação; a aparência física do comunicador; a proxêmica; o movimento do
corpo ou comportamento cinestésico; e a paralinguagem. Segundo os autores, embora a
ênfase maior nas pesquisas não-verbais seja referente à aparência e ao comportamento das
pessoas em comunicação, a atenção para os fatores não-humanos tem sido cada vez maior
como os ambientes que podem afetar o humor, a escolha das palavras e as ações. O ambiente
da comunicação é um elemento que interfere no relacionamento humano, e os fatores
ambientais, em que a interação ocorre, podem incluir o estilo arquitetônico, a decoração, o
mobiliário, a iluminação, a cor, temperatura, os ruídos, a música, e os similares.
A aparência física do comunicador, dizem Knapp e Hall (1999), é um aspecto que
permanece inalterado durante a interação. É influente sinal não-verbal, mas não é governado
pelo movimento. Trata-se do aspecto físico ou forma do corpo, altura, peso, beleza, cor e tom
de pele, entre outros. Os objetos associados aos interlocutores, que também podem afetar a
aparência física, também são considerados. Esses artefatos incluem roupas, óculos, perucas,
maquiagem, jóias, óculos e acessórios, como pasta executiva.
Os autores salientam que a “proxêmica é definida como o estudo da utilização e da
percepção do espaço social e pessoal.”. (p. 25). Esse estudo tem a preocupação com a
ocupação do espaço, levando em consideração o posicionamento em relação ao fluxo da
comunicação, à liderança e à tarefa a cumprir. Essa orientação pessoal, algumas vezes, é
apreciada no contexto da distancia da conversa, e também pelas diferenças em relação ao
status, papéis, formação cultural, sexo, entre outros.
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Em relação ao movimento do corpo ou comportamento cinestésico, são envolvidos
movimentos do corpo, gestos, expressões faciais, comportamento ocular e a postura. Existem
vários gestos, mas os mais estudados são aqueles que independem da fala, mas têm tradução
verbal direta, como os gestos representados por alguns membros de certa cultura para
expressar “OK” ou “paz”. A postura é analisada com a finalidade de distinguir o estado de
atenção ou envolvimento, a posição de status em relação ao outro na interação, ou ainda o
grau de empatia pelo outro interlocutor. O comportamento tátil é o toque que, em geral, é
realizado com o intuito de comunicar e muitas vezes pode refletir um hábito ou estado
particular da pessoa. No que diz respeito à expressão facial, grande parte dos estudos tem
como objetivo os aspectos que demonstram os estados afetivos, uma vez que o rosto é a
origem elementar do afeto. Os principais afetos e os mais estudados são raiva, tristeza,
surpresa, alegria, medo e nojo. Para o comportamento ocular, os autores expõem que o olhar
relata o movimento ocular que geralmente se faz em direção ao rosto de outra pessoa, e
também quando e por quanto tempo se olha no decorrer de uma interação. (KNAPP E HALL,
1999).
Os autores finalizam essa classificação dos estudos da linguagem não-verbal com a
paralinguagem, que analisa o modo como se diz algo e não o que foi dito. Esta dedica-se aos
sinais vocais não-verbais que cercam a fala comum. A análise dos signos vocais aborda um
extenso campo de interesse, que vai desde as questões ligadas a estereótipos até os efeitos da
fala na compreensão e na persuasão. Grande parte das pesquisas sobre o comportamento vocal
e seus efeitos na interação humana se referem a
Nível de altura e variabilidade; duração dos sons (rápido ou lentos); pausas em meio ao fluxo da fala e da resposta durante as alternâncias de interlocutores; nível de intensidade e variabilidade; ressonância; articulação precisa ou palavras “engolidas”; ritmo; velocidade; e sons intrusos durante a fala, tais como “ah” e “humm”. (KNAPP E HALL, 1999, p. 28).
Estes mesmos autores, ao abordarem Argyle (1998), transmitem, ainda, que o comportamento
não-verbal tem funções básicas na comunicação humana tais como: transmitir atitudes
interpessoais, do tipo dominação/submissão ou afeto/desafeto, entre outros; expressar
emoção; acompanhar a fala com o objetivo de dominar a alternância entre os interlocutores, a
atenção, o tema da conversa, entre outros; e apresentar a personalidade ao outro.
Knapp e Hall (1999) salientam que as crianças utilizam gestos para comunicar
mensagens importantes, e elas não costumam demorar muito para reconhecer alguns tipos de
sinais não-verbais, apesar de o gerenciamento da interação levar certo tempo para se
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desenvolver. Os pré-escolares são capazes de julgar sinais referentes a gostar/não gostar
partindo da orientação da cabeça ou “olhar para ou desviar o olhar de”, no entanto, a precisão
de outros sinais só ocorre mais tarde.
O desenvolvimento ontogenético da fala humana recebeu mais atenção do que o desenvolvimento e origem de comportamentos não-verbais. [...] Sabemos que nos primeiros anos da vida de uma criança um extenso repertório de sinais não-verbais é exibido, também sabemos que, logo após o nascimento a criança começa a aprender e interpretar vários sinais não-verbais recebidos das outras pessoas. (KNAPP E HALL, 1999, p. 427).
Através dessa afirmação, é possível dizer que o desenvolvimento da fala, e ouso dizer
também, da escrita e da leitura, vem sendo valorizadas em detrimento ao movimento corporal
e comportamento não-verbal.
Entendendo melhor essa comunicação não-verbal e percebendo que a criança em fase
pré-escolar é capaz de reconhecer alguns sinais não-verbais, torna-se relevante abordar as
questões mais específicas do corpo para compreendê-lo melhor e entender como se dá sua
expressividade. No próximo tópico, então, abordo com maior profundidade essa linguagem
corporal.
2.1 O corpo – sua expressão e linguagem
Sobre o corpo, pode-se dizer que é a primeira forma de visibilidade humana, é um
campo de forças que não pára de inquietar e confortar. Sua presença conquista lugares, requer
percepção, indica funcionamentos sociais, gera disciplinamento, enfim, ele é um verdadeiro
arquivo vivo e inesgotável fonte de prazeres e agitação que provoca o interesse de várias áreas
do conhecimento.
Rivière (1996) salienta que, enquanto presença, o corpo aplica significações além das
relativas à linguagem verbal, pois este tem uma comunicação própria que se utiliza de
posturas, posições e gestos. A designação de uma relação com o mundo pode ser simbolizada
por gesto e mímica. Porém, as sociedades ocidentais preferem o distanciamento nas relações
interpessoais. Dentre os cinco sentidos, o olhar é privilegiado e os demais como o tato, o
olfato, a audição e o paladar são desprezados. Acredita-se assim que o homem ocidental
procura não sentir o corpo. O autor explica que, no cotidiano, a evidência do corpo é apagada
pela ritualização corporal que é feita de “evitamentos e apagamentos” para canalizar as
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emoções que ameaçam, bem como o rompimento do equilíbrio, os quais aparecem como uma
criação social de ausência do corpo. Ou seja, os distanciamentos, o controle das emoções e o
cumprimento das regras de discrição fazem com que o corpo seja negado.
Segundo Rector e Trinta (2003), o corpo é uma mensagem mesmo quando não se tem
a intenção de comunicar. Ele é um instrumento eficiente para compartilhar idéias e emoções e
também para propagar ordens. A sua linguagem própria tem a idade do homem, ou seja, desde
seu nascimento, a criança dá inicio à sua expressão corporal. Ao pensar no corpo da criança,
posso dizer, então, que a fase pré - escolar é uma das etapas da vida em que as crianças
tomam contato com novos conhecimentos e aprendizagens, e tudo que é novo também é
desafiador para elas. Tendo em vista que elas sentem prazer e alegria em movimentar-se, é
importante possibilitar-lhes novas formas de linguagens, expressões e comunicações.
Segundo Go Tani (1988, p.12), “[...] Onde existe vida, existe movimento e onde
existem crianças, existe movimento quase perpétuo [...]”. Sendo assim, não se deve negar às
crianças o direito de movimentar-se, de brincar, de dançar e divertir-se. Declaram Mattos e
Neira (1999) que toda ação tem uma intenção, podendo ser expressiva ou funcional, mas é
sempre determinada pela dimensão cultural própria, assim, um jogo, um trabalho, um esporte,
uma dança, uma expressão, qualquer gesto é sempre sustentado por um significado. Mendes e
Fonseca (1987, p.59) exprimem, ao citar Ajuriaguerra, que “a evolução da criança é sinônimo
de consciencialização e conhecimento cada vez mais profundo do seu corpo. É com o corpo
[...] que a criança elabora todas as suas experiências vitais e organiza toda a sua
personalidade”.
Segundo Ant’Anna (2001), o corpo é “biocultural” tanto no nível genético como na
expressão gestual e oral. O corpo é transitório, desde o nascimento até a morte, portanto,
sujeito às transformações nem sempre desejáveis ou previsíveis, pois, ao longo dos anos, tudo
vai se modificando: seu peso, suas formas, seus ritmos e seu funcionamento. Em relação ao
corpo a seguinte afirmação diz que
Ele é inscrição que se move e cada gesto aprendido e internalizado, revela trechos da história da sociedade a que pertence. Sua materialidade concentra e expõe códigos, práticas, instrumentos, repressões e liberdades. É sempre submetido a normas que o transformam, assim, em texto a ser lido, em quadro vivo que revela regras e costumes engendrados por uma ordem social. Como lugares de inscrição da cultura, dos corpos são retirados e acrescentados elementos que apresentem desvios, excesso, falta [...] Atos de extração ou de acréscimo em relação ao corpo remetem-no a determinados códigos e o submetem a normas que são internalizadas por um meticuloso processo de educação. (SOARES, 2001, p. 109).
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Daólio (1995) também assinala que os movimentos realizados pelo corpo humano
geralmente são determinados e desenvolvidos em função de uma cultura. Todos os homens
são sempre influenciados pelos costumes de determinados lugares, não existindo um homem
sem cultura. Soares (2001) concorda com este autor e comenta que os corpos são educados
por todas as coisas com as quais convivem, pela realidade que os cercam, pelas relações
estabelecidas em espaços delimitados e definidos por atos de conhecimento. Ou seja, a
educação se dá não só por palavras, mas por gestos, coisas, olhares, pelo lugar onde se vive.
Então a criança já nasce submetida a um conjunto de regras, valores e normas sociais
que vão influenciando seu comportamento. Posso dizer que a cultura influencia diretamente a
expressão corporal, pois no corpo estão inscritas todas as regras, normas e valores de uma
sociedade específica; em outras palavras, o corpo é veículo de contato do indivíduo com o
ambiente que o cerca. O corpo é fruto da interação natureza/cultura, e, portanto precisa ser
compreendido em sua totalidade, mais que isso, não se pode esquecer sua natureza social,
sendo possível pensar em novos usos para o corpo, já que a cultura é passível de reinvenções
e recriações.
Através de Soares (2001), é possível compreender que o gesto possui forças que
revelam um poder de persuasão que é impossível para a palavra. Ele permite um
reconhecimento da pessoa em suas dimensões psicológica e moral, e coloca em jogo todos os
sentidos não só daquele que o executa, mas também de quem o observa.
É preciso ressaltar que há preceitos a serem seguidos para alcançar uma educação plena dos corpos. Assim, o simples bocejar, assoar o nariz, caminhar ou participar de jogos são atos que irão sujeitar-se a uma intervenção dirigida, materializada por diferentes pedagogias cuja finalidade é o corpo educado. (SOARES, 2001, p.112)
Compreendo, então, que o corpo é educado pela sociedade e carrega as marcas dessa
educação ao longo de sua vida, estando sempre sujeito às novas normas e regras, ou, ainda, a
adaptações do corpo em uma outra sociedade na qual venha a se inserir. Rector e Trinta
(2003) reforçam essa idéia, ao salientarem que cada gesto do ser humano o situa como
membro de uma determinada comunidade e, ao mesmo tempo, trai suas peculiaridades, o que
os constituem individuais, diferentes e sociais. Ainda Daólio (1995) demonstra que o controle
do uso do corpo aparece como necessário ao surgimento da cultura, que nada mais faz do que
dispor o universo por meio da organização de regras sobre a natureza. Explica também que o
homem, através de seu corpo, passa por um processo de “inCORPOração” da cultura.
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Para Rivière (1996), o corpo é o elemento indispensável para a inserção do homem no
mundo, mas a tendência da vida em sociedade inclui rituais de “evitamento, reabsorção e
escamoteação do corpo” através das regras em veemência. Cada cultura possui seus símbolos
corporais, que revelam a origem social do sujeito: a distância entre os interlocutores, a
extensão dos movimentos, de sua familiaridade ou pudor, da verbalização de emoções e
sensações, da sua naturalidade ou reserva.
Segundo o autor, o controle de si ocorre desde o século XVI, quando os tratados de
civilidade o reconheciam como preceito necessário para o convívio em família e em
sociedade. No entanto, as regras são modificadas a cada época, acrescentando novas normas e
concepções nos gestos, movimentos, posturas, os quais vão estabelecendo novos elementos
dos usos e costumes.
Para Rector e Trinta (2003), é a cultura que ordena o comportamento social do corpo,
por isso aprende-se a se aproximar das pessoas, a cumprimentá-las e a despedir-se delas,
aprende-se quando tocar, como olhar, o que fazer com as mãos, olhos, tronco, pernas.
Portanto, ao se estabelecerem padrões e determinar referências, a cultura acaba por moldar os
usos e costumes sociais, que evidenciam um povo e os diferenciam de outros povos. Então,
O estudo das expressões corporais características de cada cultura não pode se reduzir a simples levantamento e classificação de movimentos e de técnicas corporais, mesmo que se faça posteriormente uma comparação desses dados com os de outras culturas. [...] Mais do que saber que os corpos se expressam diferentemente porque representam culturas diferentes, é necessário entender quais os princípios, valores e normas que levam os corpos a se manifestar de determinada maneira. Enfim, é preciso compreender os símbolos culturais que estão representados no corpo. (DAÓLIO, 1995, p. 40-41).
Posso dizer, então, que o corpo se expressa, ele fala; mesmo em culturas diferentes é possível
verificar o seu significado expressivo, e assim como as diversas línguas existentes a
linguagem do corpo também se diferencia através das variadas sociedades culturais, logo é
preciso compreender os diversos símbolos representados pelo corpo.
De acordo com Rivière (1996), a arte de viver bem evidencia a organização da
sociedade, sua função, seus valores e significações, destacando a diferença entre contato,
posição e compostura. Já se sabe que a interação entre pessoas não ocorre unicamente pela
palavra. Existem outros elementos que contribuem para essa comunicação como
a maneira de vestir em sua referência às modas, às convenções dos grupos sociais e à maneira como cada qual interpreta tais referências; a apresentação de si (natural ou embaraçada) e o comportamento (rebuscado, afetado, neutro ou excêntrico); também as mímicas, os gestos, a postura do corpo, a tonalidade da voz... Todos
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esses fatores, que se servem do corpo como suporte, constituem indícios, símbolos ou sinais que tecem uma densa rede de mensagens que circulam entre os indivíduos. Tendem a ser codificados pela cultura sob a forma de regras de cortesia, uso, normas estéticas ou morais. (RIVIÈRE apud PICARD, 1996, p. 186-187).
Segundo Rector e Trinta (2003), o comportamento expressivo do homem é exonerado
de significado fora de um dado contexto cultural, pois sempre que se busca avaliar, no plano
social, as atitudes significativas da cultura, esta desempenha um importante papel, pois numa
interação social, a cultura de uma comunidade revela seu estilo de vida, hábitos lingüísticos,
modos peculiares de pensar e perceber os fatos ocorridos no mundo, bem como suas formas
usuais de comunicação social, normas e convenções que regulam os comportamentos e
também os costumes e valores morais coletivos. E Daólio (1995, p. 41) explica que “o que
define corpo é o seu significado, o fato de ele ser produto da cultura, ser construído
diferentemente por cada sociedade, e não as suas semelhanças biológicas universais”.
E Rivière (1996) acrescenta que cada sociedade interpreta as normas de suas leis, de
acordo com uma lógica formal e simbólica, que não são homogêneas mundialmente; isso se
atribui, variando de uma cultura para outra, ora a valores sociais e morais, ora à utilização,
decoro e tradição, ora à elegância e estética. É possível observar sinais corporais em toda
sociedade, e esses sinais podem ser categorizados da seguinte maneira: sinais de
reconhecimento; de respeito; de seguimentos relacionais; e os sinais específicos de
determinada classe social, como o uso de uma linguagem verbal e gestual específica.
Desse modo, Rector e Trinta (2003) salientam que, no tocante à “educação não-
verbal”, a aprendizagem humana pode ser formal, informal e técnica. A primeira é aquela
transmitida pelos pais durante a fase de crescimento, aquilo que chamamos de “bons modos”;
esta aprendizagem é situada por aquilo que se considera socialmente “certo” ou “errado”,
tornando-se, assim, um guia social de uso do corpo. A segunda se dá através da imitação e é
marcada pelas influências culturais. E a terceira é aquela ensinada no âmbito escolar, que
requer disciplina, aptidão e inteligência. Os autores dizem que o comportamento não-verbal
não somente se ajusta à expressão lingüística, mas também favorece a expressão de intenções
e de estados afetivos, incidindo sobre todas as formas de relação interpessoal, o que regula a
interação e propicia o contraste de atitudes e personalidades individuais, sem falar que é parte
integrante de cerimônias e rituais, bem como componente necessário de artes como a mímica,
o teatro e a dança.
Através do RCNEI, compreendo que a criança se expressa através do movimento de
seu corpo e sente um grande prazer em realizar tais expressões. Estimular as reações como
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balançar o corpo, bater pés e mãos, imitar objetos, animais e personagens é tão importante nos
jogos e brincadeiras como também na dança. (BRASIL, 1998). Entendo que a expressão
corporal indica uma representação mais livre ou espontânea dos movimentos e dos gestos, ou
ainda as atitudes de prazer, sensualidade ou mesmo de exploração representativa e visual do
corpo em encenações que envolvem mímicas e dramatização. É uma manifestação de
sentimentos e sensações internas.
Garcia e Haas (2003) afirmam que na dança, a expressão corporal pode ser
compreendida como representação profunda de sentimentos e emoções através do corpo,
sendo que o semblante facial pode ser assinalado como a enunciação do olhar (alegre, triste,
malicioso, etc.), dos lábios (tensos, sedutores, relaxados, etc.), e do rosto em sintonia com o
corpo, o que torna complexa e completa a expressão corporal como um todo, não sendo
possível fracionar em porções expressivas.
Segundo as autoras, a dança é um movimento no espaço que permite sentir o corpo
livre, podendo o ser humano comunicar-se consigo mesmo desfrutando e liberando-se de
preconceitos, vergonhas e medos. É uma linguagem corporal, que, para enviar mensagens,
não solicita nenhuma condição, nem mesmo sexo ou idade. Portanto, a dança é uma arte que
utiliza o corpo em movimento como linguagem expressiva, que enuncia emoções e contribui
para o desenvolvimento harmônico do ser humano.
Se a dança é um movimento que leva a uma expressão corporal, apresento a idéia de
Stokoe (1987), a qual afirma que tal expressão é uma linguagem imediata pela qual o ser
humano expressa-se a si mesmo sem necessidade de recorrer a elementos ou instrumentos
alheios a ele. É possível perceber que a expressão corporal é uma linguagem por meio da qual
o indivíduo pode sentir-se, perceber-se, conhecer-se e manifestar-se através de seus
movimentos, posições e atividades. A autora expõe que a atividade de expressão corporal,
por ter um caráter de linguagem, torna-se um meio de comunicação. Mendes e Fonseca (1987,
p. 83) parecem concordar com a autora afirmando que “muitos significados simbólicos que
estão nas idéias e sentimentos não podem ser efetivamente expressos em palavras e por isso
(nestes casos) é o corpo o seu veículo de expressão”.
Gonçalves (1994) expõe, ainda, que a experiência corporal e o movimento são
fundamentais para a criança: essa experiência corporal está na transformação do próprio
corpo, no decorrer da vida e na realização de cada movimento. Mas esse processo de
comunicação deve ser estimulado para desenvolver meios que permitam as crianças a
questionar o mundo e assim apropriar-se dele. O infante, ao movimentar-se, sente tanto prazer
que pressupõe que, através destes movimentos, o estímulo para o processo de aquisição da
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comunicação torna-se mais agradável, além de possibilitar um grande desenvolvimento
motor, fisiológico, psicológico, entre outros.
Segundo Mendes e Fonseca (1987), a comunicação do corpo expressa-se e concretiza-
se através da atividade corporal, que é portadora do significado psicológico, que será
transformado em linguagem propriamente dita. Ou seja, quando se comunica verbalmente,
utiliza-se ou apóia-se em uma expressão e comunicação corporal, o que ratifica o significado
das palavras e frases.
O homem é um ser em movimento, ao mover-se, põe em funcionamento formas de expressão completas e complexas, que são, de resto, socialmente partilhadas, a exemplo das formas de língua. Portanto, ao exprimir-se com o seu corpo, ele o faz de maneira tão clara, que não mais há como se desdizer ou voltar atrás. (RECTOR e TRINTA, 2003, p.21).
Assim como as palavras, a expressão corporal passa sempre por situações que permitem a
utilização da comunicação não-verbal através das ações corporais.
Através de Rector e Trinta (2003), compreende-se que os elementos não-verbais
constituem cerca de sessenta e cinco por cento do total de mensagens enviadas e recebidas nas
comunicações sociais. Segundo os autores, a comunicação do corpo se dá através do grande
recurso de gestos que é, portanto, uma ação corporal visível, pela qual certo significado é
transmitido por meio de uma expressão voluntária.
De acordo com Brikman (1989), para ir ao encontro da linguagem do corpo é
necessário desenvolver todas as possibilidades do movimento corporal e, para isso, é
necessária a descoberta do próprio corpo através da sua sensibilização, conscientização e
vivência. A valorização do próprio corpo e o cuidado com o mesmo devem ser tarefas
integradas com o desenvolvimento e educação da personalidade como um todo. A autora
expõe, ainda, que a pessoa pode adquirir consciência do que acontece com seu próprio corpo
através do movimento no contexto do tempo e do espaço. Assim a expressão corporal de
movimento realiza a linguagem corporal em suas estruturações, desenvolvimento e
componentes. Deve-se entender a expressão corporal em suas várias possibilidades e
significações. Assim é possível ter conhecimento “do que se é e sentir-se como se é”,
compreendo que com a atitude corporal é possível “comunicar-se consigo mesmo e com os
outros”, e com isso ocorre a aceitação do corpo e uma atitude de sensibilidade e criatividade.
Para um trabalho bem sucedido, no que tange ao movimento corporal de expressão, é
importante que tal ofício seja adequado às peculiaridades corporais de cada etapa do
desenvolvimento, buscando em cada movimento a unidade corpo-mente, pois o movimento é
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o suporte de um trabalho planejado como uma atividade comprometedora da totalidade do ser
humano.
Segundo Girard e Chalvin (2001), a criança, desde o nascimento, explora o espaço que
a cerca, identificando e registrando um grande número de informações sobre o mundo em sua
volta, assim ela gera condições de construir sua imagem do corpo. Compreendo, então, que a
criança precisa descobrir e conhecer seu corpo para que possa, enfim, se comunicar
corporalmente, conseguindo ler no corpo de seu próximo todas as mensagens e significados
que este lhe está transmitindo, bem como permitir que os outros consigam fazer essa mesma
leitura de suas expressões.
Finalmente, encerro este capítulo proferindo as palavras de Daólio:
Fica evidente, portanto, que o conjunto de posturas e movimentos corporais representa valores e princípios culturais. Consequentemente, atuar no corpo implica atuar sobre a sociedade na qual esse corpo está inserido. Todas as práticas institucionais que envolvem o corpo humano - e a Educação Física faz parte delas -, sejam elas educativas, recreativas, reabilitadoras ou expressivas, devem ser pensadas nesse contexto, a fim de que não se conceba sua realização de forma reducionista, mas se considere o homem como sujeito da vida social. (DAÓLIO, 1995, p.42)
O corpo é social, por isso deve ser compreendido e respeito em sua totalidade. Sua
expressão e linguagem fazem parte do conjunto que deve ser desenvolvimento juntamente
com a inteligência, com o cognitivo. Após evidenciar a temática da linguagem corporal é
necessário esclarecer as influências que as atividades rítmicas exercem para a aquisição
daquela. E, para entender melhor tais atividades, são indispensáveis alguns apontamentos
acerca do ritmo e da rítmica. È o que se evidencia no próximo tópico.
2.2 O ritmo
Em busca de uma definição para o que vem a ser ritmo, foi possível trabalhar com
poucos autores, uma vez que quase não encontrei obras voltadas para essa temática. A maior
parte dos escritos analisados sobre o assunto está mais ligada aos estudos da música. De
acordo com Garcia e Haas (2003, p.27), “a palavra ritmo é derivada do termo grego Rytmus,
significa e/ou designa tudo o que flui e o que se move no universo”. Piccolo (1995) parece
concordar com esta afirmativa, ao expor que a palavra ritmo pode ser traduzida em “fluir”,
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pois este está em incessante movimento. Ele é algo como uma expressão interna do
movimento, é preciso entendê-lo como uma expressão dinâmica em harmonia com a vontade
do sujeito que age, canta, dança, interpreta ou mesmo fala. Assim, o ritmo é algo interno que
impulsiona uma realização subjetiva na música, na poesia, no canto, na dança e no movimento
natural.
Tanto Monteiro e Artaxo (2003) como Garcia e Haas (2003) apresentam praticamente
as mesmas definições para o ritmo. Assim optei por apresentar a seguinte:
Ritmo é vida e está intimamente ligado às necessidades do mundo atual. Ele surge no homem desde sua concepção, e o acompanha até a sua morte. [...] No ser humano é a integração das forças estruturais: corpo/mente-espírito/emoção de significado e expressão, pois é este que dá emoção, que torna viva, colorida, pessoal, a expressão da emoção que sente o ser naquele momento particular. (GARCIA E HAAS, 2003, p.27).
Ao abordar outros estudiosos, pude perceber que existem ainda outras definições para ritmo, o
que dificulta a adoção de uma específica como a mais adequada. O ritmo não acontece por si
só, mas sempre com uma intenção. Toda e qualquer função do desenvolvimento humano é
impulsionado pela ritmicidade, pois é o ritmo que gera o equilíbrio para tal desenvolvimento,
ou seja, através dos próprios movimentos corporais, que apresentam estruturas funcionais
rítmicas, é possível atingir uma educação global. (PICCOLO, 1995). E mais:
O ritmo do homem é natural, pois todos nascem com ritmo, apenas uns o tem mais desenvolvido que outros. Na distribuição do movimento pode-se fazer com os mesmos elementos, o mesmo ritmo; e com o mesmo movimento e mesmos elementos, ritmos diferentes. O ritmo pode ser ainda individual ou grupal. Como ritmo individual no movimento deve-se entender a interação de forças e contrações musculares que atuam no mesmo movimento. A dança apresenta exemplos de ritmo grupal, cuja sincronia se alcança por meio de um modo geral, de estímulos acústicos. (FAHLBUSCH, 1990, p. 90).
Garcia e Haas (2003) abordam ainda que o ritmo é todo movimento, que pode ser
categorizado da seguinte forma: o espontâneo, que provém de um gesto natural ocorre através
das reações de espontaneidade; o natural, que é considerado o ritmo dos crescimentos, dos
fenômenos de natureza animal, vegetal e universal; o mecânico, que é um movimento
uniforme e não varia, não modifica e não transforma; o disciplinado, que é um
condicionamento a um movimento pré-determinado; e o refletido, que ocorre a partir da
reflexão sobre a métrica, que significa medida do ritmo. Para explicitar melhor sobre a
métrica e o ritmo, essas autoras se baseiam em Jeandot que os diferencia: a qualidade rítmica
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deriva das diferenças de duração (curto e longo), enquanto a qualidade métrica deriva das
diferenças de acentuação (tempo forte e tempo fraco).
O ritmo do movimento é manifestado por ondas rítmicas, conforme Laban citado por
Piccolo (1995). Essas ondas são estabelecidas por intensidade, velocidade, fuidez e tamanho.
Ao se ajustar as diferentes combinações destes fatores é ocasionada a variação do ritmo
expresso em diversos movimentos. Em relação aos objetivos do ritmo para com o homem, é
possível perceber que ele ajuda a
Promover a melhoria e o aperfeiçoamento das qualidades físicas do ser humano, em especial, a coordenação motora, agilidade, equilíbrio, resistência e velocidade; promover o desenvolvimento e a melhoria da natureza socioemocional e afetiva do ser humano no sentido de despertar potencialidades sociais (positivas) como cooperação, socialização, solidariedade, liderança, compreensão, laços de amizade/de apego, etc.; promover o desenvolvimento e a melhoria da natureza cognitiva do ser humano no sentido de despertar potencialidades reflexivas como raciocínio, atenção, concentração, criatividade, senso estético; e, promover a melhoria e o controle da qualidade de vida dos seres humanos, em especial, no sentido da busca da energia, harmonia e estímulos positivos. (GARCIA E HAAS, 2003, p. 38-39).
Piccolo (1995) aponta ainda para o valor de uma atividade física que permita o ritmo
próprio do indivíduo, ao se expressar, e manifeste o sentimento rítmico, que se revela nas
ações motoras. Ritmar é dar forma ao movimento. O ritmo ocorre por intervenção de uma
ação do músculo no tempo de acentuação. Existe um aspecto rítmico em qualquer movimento
voluntário, e o ritmo deve ser entendido como um fenômeno do movimento e não como um
acontecimento comum no tempo, pois o tempo está dentro de um decurso rítmico.
Monteiro e Artaxo (2003), ao abordarem sobre a importância do ritmo, dizem que o
seu desenvolvimento e aperfeiçoamento são de extrema importância, pois o ser humano
necessita dele em todas as atividades, seja na vida diária, profissional ou esportiva e de lazer.
Em relação à sua função, as autoras apresentam que este facilita a aprendizagem motora e,
como conseqüência,
Auxilia a incorporação técnica; estimula a atividade do executante; determina a qualidade do movimento; colabora na dosagem do movimento e de seus diferentes níveis de forma; incentiva a economia do trabalho (físico e mental), retardando a fadiga e aumentando o resultado; permite melhor domínio do movimento; produz prazer; reforça a memória; facilita a liberdade de movimentos; facilita a expressão total e autêntica; facilita a realização do movimento com naturalidade; é um fator que disciplina, cria hábitos e atitudes; aperfeiçoa a coordenação; apóia a determinação da beleza. (MONTEIRO E ARTAXO, 2003, p. 09).
52
Percebo, então, que o ritmo faz parte da vida e da natureza; está em tudo que se
movimenta; está presente na vida de todo ser existente; é um momento de movimento
presente em qualquer ação, no crescimento das plantas, no caminhar dos animais, na
alimentação, na respiração, no vento que bate na folha e a faz balançar, enfim, em qualquer
movimento.
Compreendendo o que é ritmo, seus objetivos e função para o desenvolvimento do ser
humano, é importante entender melhor as atividades rítmicas e seu ofício na Educação
Infantil, sendo assim, tratarei no próximo tópico desse assunto.
2.3 A atividade rítmica e sua função na Educação Infantil
Neste momento, são feitas as seguintes indagações: o que, afinal, é a atividade
rítmica? Qual sua função para a Educação Infantil? Como ela deve ser trabalhada? Qual a sua
importância? Essas e outras respostas foram buscadas em alguns autores, os quais
subsidiaram uma melhor compreensão da problemática. A rítmica pode ser uma ordem e
sistematização do ritmo espontâneo, pois ela apresenta diversos aspectos como a música, a
dança, a ginástica e o ritmo, o que reúne todas as possibilidades rítmicas espontâneas,
permitindo sua organização, desenvolvimento e enriquecimento.
Segundo Queirós (2002), as atividades rítmicas consistem em exercícios que têm o
movimento natural como princípio básico. Ou seja, utilizam-se as formas básicas de
locomoção como andar, correr, saltar, saltitar, girar e suas diferentes variações e associações
desenvolvidas naturalmente com sons ou música. Ou melhor, a atividade rítmica deve
destacar fundamentos que dão ênfase ao movimento com sons e música para inspirar o
movimento, através de vivências e experiências diversas, no sentido de possibilitar a
expressão corporal e a educação rítmica, desenvolvendo de forma simultânea o domínio
motor, cognitivo e afetivo-social. Desta forma, tal conteúdo deve ser integrado e aliado aos
outros conteúdos educacionais da área de atuação, caracterizando-se, assim, uma opção a mais
de vivência, aprendizagem e aperfeiçoamento da motricidade humana.
As crianças são muito sensíveis e estão sempre exteriorizando essa sensibilidade
através de canções ou brincadeiras ritmadas. Então, ao se acrescentar as associações de
movimentos simples, elas terão a possibilidade de desenvolver uma consciência rítmica, é o
que aponta Cunha (1992). E acrescenta, ainda, que a utilização constante de atividades
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ritmadas possibilita um melhor e mais rápido agrupamento dos processos de educação do
corpo e do movimento através do ritmo. Ao introduzir algumas práticas que auxiliem na
identificação dos dois contrastes rítmicos, pode-se despertar nas crianças uma consciência
rítmica, como, por exemplo, com
Desenhos realizados pela criança, com contrastes de cores fortes e suaves; bater palmas só nos tempos fortes de uma música ou somente nos suaves; andar acentuando os tempos fortes com batidas de pés, palmas ou utilizando instrumentos de percussão (pauzinho, latas, caixas e outros materiais sonoros); andar nas meias pontas dos pés nos trechos musicais suaves, e assim por diante. (CUNHA, 1992, p. 26)
Mas Queirós (2002) salienta que, ao fazer uma retrospectiva histórica das atividades
rítmicas, as canções infantis, os brinquedos cantados e as danças folclóricas e populares, que
em tempos passados faziam parte do cotidiano da criança e do jovem, como manifestações
lúdicas em espaços familiares, escolares e sociais, atualmente são inexpressivas na cultura
infanto-juvenil, sendo estas substituídas por outras atividades mais modernas. Segundo a
autora, essas mudanças se devem ao fato da vida moderna, pelo avanço tecnológico de
brincadeiras, jogos e brinquedos, pela transformação crescente dos espaços urbanos:
“moradias minúsculas, ausência de quintais e espaços, ruas e praças tornaram-se perigosos
para convivência, além de outros aspectos sociais”. (QUEIROS, 2002, p. 01). Com tudo isso,
os valores sociais e culturais, bem como as atitudes, passaram por profundas transformações,
o que permitiu que outras manifestações lúdicas tomassem o lugar das vivências rítmicas
folclóricas e populares na diversão das crianças e jovens. Mas, embora com alterações, essas
atividades ainda hoje fazem parte da vida do ser humano e ocupam lugar importante na
cultura infantil pelo seu caráter lúdico e recreativo. Percebo, assim, a necessidade existente de
resgatar essas atividades para que estas possam, através de todas as suas vantagens, beneficiar
a criança para que esta tenha um melhor desenvolvimento tanto físico como cognitivo. E a
recuperação dessas ações deve partir da escola, do meio educacional, só assim, poderão voltar
para o cotidiano do infante.
De acordo com Soares e Haas (2003), as atividades rítmicas e expressivas, sejam
brinquedos cantados, rodas ou dança, podem ser caracterizadas como educação básica pelo
fato de permitirem o desenvolvimento das capacidades físicas, cognitivas, sociais, afetivas de
forma integral, e apresentar a possibilidade de uma percepção do que se sente, vê e escuta.
Tais atividades podem reforçar a aprendizagem em um processo de interdisciplinaridade, e
também podem fornecer alternativas de ajuda para mediar a interação de crianças tímidas ou
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com dificuldade de relacionamento. As autoras afirmam que a atividade rítmica, além de
possibilitar o bem estar - social e de saúde, permite a internalização de costumes e culturas de
outros povos, proporcionando e estimulando o potencial criativo e de improvisação de
soluções de problemas e tomada de decisões, através da espontaneidade e expressão natural
do educando.
Através de Pallarés (1979), observa-se que o que possibilita a compreensão e
utilização da atividade rítmica, como meio de auxílio na educação integral da criança, é
justamente a sua fundamentação através do movimento natural e orgânico, pois é a execução
de movimentos apoiados em ritmos adequados que possibilita a oportunidade de se
aperfeiçoar os movimentos rítmicos. A atividade rítmica oportuniza um domínio próprio da
coordenação rítmica, segurança e confiança para elevação de formas mais complexas de
movimentos, alegria na automatização do mesmo, além de propiciar as vivências sociais em
grupo, bem como o desenvolvimento da sensibilidade, concentração, acuidade auditiva,
reflexo e atenção. Ainda sobre esse assunto, Queirós (2002, p.02-03) afirma que
[...] compreender a Atividade Rítmica na perspectiva do crescimento e desenvolvimento motor, visando uma educação integral do ser humano, não é tarefa tão fácil, principalmente por estar relacionada às áreas da música e arte e por ser comumente concebida na Educação Física e no Lazer apenas como meras atividades lúdicas com o intuito de divertir, entreter e passar o tempo. Concepção esta, que deve ser revista pelos profissionais, necessitando maiores reflexões e aprofundamentos, no sentido de compreender seus conteúdos, significados e valores enquanto manifestação da cultura corporal, bem como, entender as suas relações com as outras áreas do conhecimento humano.
Para Zurawski (1998), quando o professor está atento à expressão corporal da criança,
e observa a forma como ela utiliza o movimento para responder as manifestações e
necessidades afetivas, ele estará valorizando não só o movimento, mas os gestos e a mímica
também, favorecendo a comunicação com a criança. Mas se, ao contrário, for sério ou rígido
demais, poderá comprometer o desenvolvimento de uma harmonia na expressão corporal.
Queirós (2002) aborda que, no que diz respeito à Educação dos movimentos naturais
através da percussão corporal, instrumental e musical, estes movimentos “destinam-se a
atender às necessidades de movimentação dinâmica dos jovens em idade escolar”. (p. 03).
Cada movimento natural pode ser representado por vários estímulos que lhe dão
características próprias em relação à forma, à direção, à trajetória, à duração, à intensidade e à
força. Essas variações influenciam por si próprias na natureza do ritmo dos movimentos
naturais, e o ritmo se estrutura na manifestação do movimento num tempo e espaço
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determinados em qualquer ação motora, observando-se, assim, que os movimentos naturais
são regidos pelo ritmo na perspectiva individual ou grupal, ao vivenciar as diferentes formas
básicas de locomoção e os vários estímulos que representam as suas diferenciações,
desenvolvendo a educação rítmica do movimento humano.
O professor de Educação Física, que trabalha essas atividades na escola consegue
perceber as dificuldades que os alunos encontram para a realização das mesmas, como
também sabe distinguir aqueles que têm mais dificuldade e/ou facilidade. Ao tentar amenizar
as dificuldades, o professor pode trabalhar de forma harmoniosa e pode ainda aprimorar os
movimentos daqueles alunos com mais facilidade, utilizando-se de acontecimentos diários e
cotidianos de cada criança. No entender de Piccolo (1995), no ser humano ocorrem diferentes
oscilações rítmicas de forma subjetiva, impregnadas de sentimentos, sendo determinadas pela
vivência psíquica do indivíduo. Não se deve esquecer que é a ritmicidade que impulsiona toda
e qualquer função no desenvolvimento do ser humano. Então, partindo dos próprios
movimentos corporais que apresentam estruturas funcionais rítmicas, pode-se atingir uma
educação global.
É possível compreender que para a execução e acompanhamento do ritmo, deve haver
harmonia, podendo trabalhar com propostas que permitam o ritmo fluir naturalmente,
respeitando a individualidade de cada sujeito, sem precisar de imposições ou movimentos
mecânicos. As atividades rítmicas podem ser organizadas de forma que se evidencie o
equilíbrio rítmico, expressivo, musical, dinâmico, num tempo e espaço que permita à criança
desenvolver seus movimentos de forma natural até chegar a uma criatividade expressiva.
Assim, o profissional que trabalha com atividades rítmicas na escola, deve ter criatividade e
dar motivação ao aluno para que esse consiga êxito nas atividades propostas.
Queirós (2002) compreende que os conteúdos da atividade rítmica para
desenvolvimento do ensino-aprendizagem do movimento consistem, enquanto atividade
física, na educação dos movimentos naturais com percussão corporal, instrumental e musical;
dramatização com canto ou música, dança folclórica, popular, elementar e de salão em ritmos
regionais, nacionais ou internacionais; e ainda os brinquedos cantados ou jogos rítmicos. O
brinquedo cantado pode ser designado também por outros termos: “declamação ritmada,
brincadeira de roda, cantiga de roda, brincadeira cantada, jogo falado e jogo rítmico”. (p.03).
Recomenda-se, também, a dramatização com canção ou música, enquanto conteúdo da
atividade rítmica, que estimule, os alunos a se movimentarem através da expressão corporal,
manifestando, assim, o conteúdo das músicas que podem ser popular, erudita, folclórica ou de
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massa, veiculadas ou não pelos meios de comunicação. No que se refere ao jogo rítmico, a
autora se fundamenta em Noda e Melcherts para explicar que se trata de
Temas musicados e criativos que implicam em reações individuais ou grupais, às vezes, com perguntas e respostas, com gritos ou ecos e com formas de movimento, ou como “um jogo pré-determinado, recreativo e educativo em que a criança canta e se movimenta [...] de fácil assimilação e de agrado da mesma, caracterizando-se a forma mais elementar e antiga de Atividade Rítmica”. (NODA E MELCHERTS apud QUEIRÓS, 2002, p.03-04).
Para a autora, os educadores devem oferecer aos alunos propostas de movimentos naturais
específicos ou associados, através de recursos acústicos como percussão instrumental, musical
e corporal, utilizando-se de diferentes variações que representem tais movimentos, como
forma, duração, intensidade, força, direção e trajetória, com o objetivo de maximização
rítmica na expressão dos movimentos naturais dos alunos.
Pallarés (1979) ressalta que a prática de atividades rítmicas permite ao aluno distinguir
e identificar características dos movimentos básicos naturais e consegue ainda adquirir o
sentido do movimento. Assim o aluno tem a possibilidade de atingir a criatividade de
expressão. Com isso, as experiências vivenciadas e apreendidas serão organizadas em
esquemas de movimentos, evidenciando o equilíbrio rítmico, expressivo, dinâmico, musical e
temporoespacial. A autora salienta que normalmente a criança é espontânea, assim suas
atividades diárias fazem com que ela demonstre naturalidade nos movimentos. Entretanto, é
possível verificar que umas conseguem alcançar movimentos de coordenação, harmonia e
equilíbrio, já outras manifestam dificuldades na realização de alguns ou de todos esses
movimentos, mesmos os mais simples e naturais.
A maioria das pessoas possui uma capacidade inata para acompanhar determinados ritmos, tamborilando com os dedos ou marcando os acentos com o pé. Com base nessa premissa, será de importância vital fornecer aos alunos uma série de experiências rítmicas, através das inúmeras destrezas físicas que estão ao nosso alcance. Sugerir movimentos que se assemelhem a fatos ou fenômenos naturais que eles já tiveram oportunidade de observar, ou ainda aqueles que os cercam no cotidiano, poderão se transformar numa das fórmulas para a conquista de uma consciência rítmico-corporal. (CUNHA, 1992, p. 23).
Para a autora, a compreensão do ritmo da criança deve ser estimulada, possibilitando-
lhe que sinta a íntima relação ritmo/movimento e vice-versa. Deve-se conduzir a criança a
esse entendimento através do treinamento senso-perceptivo-auditivo, pelo qual cria condições
de desenvolvimento das qualidades de inteligência, acuidade auditiva, motricidade fina, além
57
da sensibilidade emocional, através de canções e melodias infantis. A partir disso, a criança
poderá aprender a dominar os ritmos de compassos simples.
Segundo Queirós (2002), a atividade rítmica, enquanto conhecimento da Educação
Física formal, tem como objetivo básico a formação e educação do movimento para o
desenvolvimento integral, mas representa também a possibilidade de diversão, descanso e
desenvolvimento pessoal e social. As atividades rítmicas devem ser exploradas de diferentes
formas, situações e materiais, alegre e criativa, dinâmica, uma vez que atividades repetitivas
causam desinteresse, indisciplina e apatia, não proporcionando nenhuma aprendizagem. É
importante perceber a atividade rítmica como uma prática pedagógica que deve ter como
princípio básico a ludicidade e a recreação através da diversidade e variabilidade de atividades
físicas ou “rítmico-motoras”. As crianças, de maneira geral, desejam movimentar-se,
explorando e experimentando novas formas de dominar habilidades, testar possibilidades e
exibir potencialidades em relação ao movimento.
Piccolo (1995) propõe o aprimoramento do ritmo da criança, o que dá oportunidade
para que ela explore seus movimentos, deixando fluir o seu ritmo natural. Deve-se buscar a
maior harmonia nas expressões das crianças. Entendo que o objetivo não pode ser só
aprender, e sim, criar, repetir, imitar, associar, dominar, perceber, expressar, deve haver uma
seqüência gradativa de complexidade e com atividades que estimulem a percepção.
Sincronizar a execução de um movimento com um ritmo determinado exige da criança uma série de qualidades facilitadoras, que podem ser inatas ou adquiridas. Portanto, para se conseguir esta sincronização, não basta perceber o ritmo dado [...]. É possível definir que a percepção de um ritmo pode ser aprimorada com atividades que compreendam qualidades estimuladoras desta sincronização. (PICCOLO, 1995, p. 75).
A autora ilustra, então, que em certos momentos é possível perceber o ritmo
claramente e, em outros, torna-se obscuro aos nossos olhos, pois o ritmo que flui nos
movimentos das crianças é próprio de cada uma delas, o que se pode afirmar que, ao observá-
las correndo, saltando, girando, andando, é possível notar combinações de movimentos de
diversas variedades e bonitas pela simplicidade. Uma coisa é certa, conforme Cunha (1992),
não se deve negligenciar às crianças a possibilidade de desenvolvimento do senso rítmico,
substituindo o desenvolvimento do sentido rítmico somente pela graciosidade da criança.
Segunda a autora, quem pratica atividades com acompanhamentos musicais pode sofrer um
aumento da sensibilidade, mas vale prestar atenção na escolha da música: a mesma deve ser
alegre, bem marcada, possuir uma apropriada diferença rítmica ao movimento e permitir que
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o sentido rítmico do movimento seja adquirido e que a execução seja expressiva. O
importante é perceber que
[...] os conteúdos da Atividade Rítmica constituem um conhecimento legítimo e efetivo da Educação Física e do Lazer que têm como objetivo principal aflorar o instinto rítmico e desenvolver o senso rítmico do ser humano, contribuindo para a educação rítmica, proporcionando o divertimento e o desenvolvimento pessoal e social das crianças. Assim, torna-se fundamental que a prática pedagógica dos profissionais destas duas áreas de atuação, seja também, norteada por este conhecimento enquanto cultura corporal, integrando-a e aliando-a aos outros meios educacionais, caracterizando-se uma opção a mais de vivência, aprendizagem ou aperfeiçoamento do desenvolvimento motor e dos demais domínios do ser humano. Além disso, que as vivências sejam desenvolvidas de acordo com os critérios de valores vinculados pelos princípios educativos e indicativos de relevância, assinalados pela referência teórica da Educação Física e do Lazer. (QUEIRÓS, 2002, p.07).
Observo que a atividade rítmica na escola, principalmente na Educação Infantil, é uma
contribuição para o processo educativo, pois oportuniza o crescimento da criança em todas as
suas possibilidades físicas, intelectuais e sociais. E, para finalizar esse capítulo, tomo as
palavras de Espósito, citado por Piccolo (1995, p. 80): “É sempre importante abrir espaço para
um novo processo, romper limites dados, avançar para além... construir horizontes, fazer
educação”.
Compreendendo melhor a linguagem corporal e a contribuição das atividades rítmicas
para um melhor desenvolvimento dessa comunicação não-verbal, e tendo em vista sua
necessidade e importância dentro da Educação Infantil através da Educação Física, passo para
a segunda parte, a qual explicará o caminho percorrido para a realização desta pesquisa.
59
SEGUNDA PARTE:
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
60
1 O caminho percorrido
A pesquisa em questão é qualitativa do tipo etnográfica. Ao tratar da investigação
qualitativa, Lüdke e André (1986) abordam que o estudioso é visto como principal
instrumento e também que o ambiente natural é sua fonte direta de dados; a preocupação com
o processo prevalece ao produto; e os dados coletados são predominantemente descritivos,
sendo sua análise tratada através de um processo indutivo. O estudo qualitativo “é o que se
desenvolve numa situação natural, é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível
e focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada”. (p.18).
André (1995) refere-se à pesquisa etnográfica como pesquisa desenvolvida pelos
antropólogos para estudar a cultura e a sociedade, tendo como foco de interesse a descrição da
cultura de um grupo social. Já a preocupação central dos estudiosos da educação é com o
processo educativo. Assim, a autora aponta que o que se tem feito é uma adaptação da
etnografia à educação, o que a leva a dizer que, então, faz-se estudo do tipo etnográfico e não
etnografia em si.
Também Wolcott (1975) esclarece que uma pesquisa é considerada etnográfica,
quando uma pessoa a lê e consegue interpretar aquilo que ocorre no grupo estudado tão
apropriadamente como se fosse um membro desse grupo. Assim, para a realização desta
pesquisa, toma-se como etnografia a descrição dos modos de viver de uma comunidade
determinada, ou seja, o comportamento de pessoas – no caso as crianças e seus professores –
em local natural - a escola -, cujo foco se centra na interpretação cultural desse
comportamento, especificamente nas atividades rítmicas e na linguagem corporal.
Tendo como objetivo principal compreender como as atividades rítmicas, enquanto
componentes constituintes da linguagem corporal, vêm sendo trabalhadas na Educação
Infantil, a pesquisa do tipo etnográfica foi a que se mostrou mais adequada para revelar o
intuito deste estudo, uma vez, que de acordo com Gomes (2001),
A etnografia pode ser considerada um método de imersão no espaço de vivência do grupo estudado, onde o pesquisador participa pelo menos superficialmente do contexto local, podendo observar as interações que se dão nesse contexto. Tendo uma relação de proximidade com os sujeitos, o observador tem a confiança e a colaboração necessária para a obtenção de informações mais substanciais e representativas de seu viver de grupo. (GOMES, 2001, p.60)
61
O autor menciona que a intenção da pesquisa etnográfica é descritiva e interpretativa. Aborda
também que uma pesquisa interpretativa é aquela em que o “pesquisador interpreta os fatos
que observa procurando entendê-los como os atores os entendem. A descrição etnográfica
pretende ser um relato daquilo que é, não daquilo que deve ser”. (GOMES, 2001, p. 63).
Ao adentrar no espaço escolar escolhido para realizar as observações, busquei essa
relação de proximidade com os sujeitos para obter a confiança e a colaboração dos mesmos e
na intenção de passar a fazer parte da paisagem deles. Neste sentido, foi possível, através dos
instrumentos de coleta de dados utilizados, analisar também outros objetivos da pesquisa,
como a sensibilidade e a percepção do professor em observar-interpretar-registrar as
mensagens produzidas pelo corpo da criança, considerando suas ações corporais; observar
onde e quando as atividades rítmicas acontecem, onde e quando estão mais presentes, e
perceber a existência ou não de uma relação entre a atividade rítmica e a linguagem corporal.
1.1 Instrumentos de coleta de dados
Os instrumentos de coleta de dados utilizados foram a observação não-participante, o
uso de imagens (fotografias e filmagens), entrevistas e análise dos documentos: Plano de
Ensino e Matriz Curricular das escolas selecionadas.
Optei pela observação não-participante devido ao fato de a pesquisadora ser apenas
uma expectadora, sem nenhuma interferência no processo. Isso facilita a obtenção dos dados
sem produzir queixas ou suspeitas nos membros das comunidades, grupos ou instituições que
estão sendo estudadas. E também por não interferir no resultado final da pesquisa.
Para o uso de imagens, Ferraz (2005) assegura que este recurso compreende os
processos de simbolização, através das imagens fotográficas, como uma técnica de pesquisa
etnográfica. A fotografia documenta, é uma maneira que auxilia na compreensão das formas
sociais. “A imagem é técnica que faz falar. [...] O uso de meios visuais de representação
desvenda o processo de comunicação de idéias que forma a base do encontro etnográfico”.
(p.02). Ferraz declara também “a concepção do filme etnográfico como o meio mais fácil de
estabelecer o diálogo entre o antropólogo e seus sujeitos”. (p.03).
Sobre isso, Loizos (2002) acrescenta que a imagem oferece um registro poderoso de
ações temporais e de acontecimentos reais – concretos, materiais. Ela pode empregar
62
informação visual que não necessita ser nem em forma de palavras escritas, nem em forma de
números.
Entendo, então, que o uso da imagem fotográfica pode ser configurada também como
uma comunicação não-verbal, pois através dela é possível compreender seu significado, sem o
uso de palavras, e como a pesquisa trata dessa questão, então, nada tão interessante e
importante como o uso da imagem como técnica de pesquisa.
Em relação às entrevistas, para Lüdke e André (1986, p. 34), estas “permitem
correções, esclarecimentos e adaptações que a tornam sobremaneira eficaz na obtenção das
informações desejadas”. Portanto optei em fazer entrevistas não só com os professores como
também com as crianças para obter maiores esclarecimentos e informações a respeito do
objeto pesquisado. Foi realizada uma entrevista semi-estruturada em que, segundo Pádua
(2000, p. 67), “o pesquisador organiza um conjunto de questões sobre o tema que está sendo
estudado, mas permite, e às vezes até incentiva, que o entrevistado fale livremente sobre
assuntos que vão surgindo como desdobramentos do tema principal”. Assim, o pesquisado
pode discorrer livremente sobre o tema proposto. A entrevista foi individual para todo o grupo
de sujeitos. Com as crianças, foi realizada em horário de aula, em dia combinado com a
professora de sala, para não atrapalhar o andamento dos trabalhos realizados pela mesma.
Com os professores, a entrevista foi marcada com antecedência, respeitando a disponibilidade
dos entrevistados, e esta só foi realizada após eu ter concluído todas as observações de suas
aulas. Todas as entrevistas ocorreram tranquilamente e sem imprevistos.
Quanto aos documentos, o Plano de Ensino e Matriz Curricular possibilitou a
verificação dos conteúdos planejados para o ano letivo de 2005. De acordo com Pádua (2000),
um conceito amplo para documento “é toda base de conhecimento fixado materialmente e
suscetível de ser utilizado para consulta, estudo ou prova”. Assim, sendo o Plano de Ensino e
Matriz Curricular uma base referencial a ser seguida pelo professor, compreendo ser de
fundamental importância analisá-lo para aumentar a autenticidade da triangulação de dados.
Assim, após explicitar os instrumentos utilizados para a pesquisa, passo, no próximo
tópico, a tratar como ocorreu a escolha dos sujeitos.
63
1.2 A escolha dos sujeitos
Definido que os sujeitos seriam crianças de zero a seis anos, da Educação Infantil, e
também professores de Educação Física que atuam nesta fase do processo educacional,
busquei selecionar duas escolas, preferencialmente uma pública e uma particular, devido à
diferenciação de suas especificidades, o que permitiria ter a revelação do objeto de pesquisa
de forma distinta e diferenciada pelo fato de serem realidades diferentes.
Parti, então, para a escolha dos locais de pesquisa, quando foi realizado um
levantamento das escolas públicas e particulares da cidade de Jataí/GO, com o intuito de
verificar, em primeira instância, aquelas que trabalhavam com a Educação Infantil e que
possuíam um professor específico da área de Educação Física, de preferência com formação
em nível superior. Dentre as escolas particulares, duas escolas tinham um professor de
Educação Física atuando na Educação Infantil. Dessas, optei pela de maior estrutura física e
melhor localização. Entre as escolas públicas, encontrei cinco escolas e uma creche que
possuíam as características buscadas. Assim, ao analisar a localização das mesmas e as séries
que eram trabalhadas, optei por aquela que fica mais próxima à periferia da cidade, num
bairro de classe baixa. Os locais de pesquisa selecionados são distantes entre si e com
realidades totalmente diferentes em termos sociais e culturais, para que ao término do
trabalho, eu pudesse fazer uma análise das duas realidades, sem comparações, buscando
interpretar a influência destas questões para o resultado final do trabalho.
Em relação às turmas, decidi por observar as de pré-escolar por ser uma série comum
nas duas escolas. Iniciei, então, as observações em duas turmas de cada escola: duas vezes por
semana na escola municipal e uma vez por semana na escola particular, pois, esta última tem
uma única aula de Educação Física por semana.
Durante as visitas nas escolas, a princípio, as crianças foram acompanhadas com o
intuito de selecionar seis de cada turma. Para isso, observei características diversas para cada
criança, tais como comportamento, biotipo, entre outras, como: o mais gordinho, o negro, o
índio, o menor ou o maior da turma, o tímido, o extrovertido, o quieto, o bagunceiro, o brigão,
o inquieto, enfim, características que me permitissem uma diversificação de sujeitos. Então,
foram escolhidos três meninos e três meninas de cada turma, somando um total de doze
crianças por escola e vinte quatro crianças para as duas escolas; ambas com a faixa etária
64
entre cinco e seis anos de idade. Estas crianças foram observadas, fotografadas, filmadas e
entrevistadas.
Para manter o anonimato dos sujeitos, optei por denominar as crianças da Escola
Pedacinho do Céu II de P1 a P6 para as meninas e, de P7 a P12 para os meninos, já para o
Colégio CESUT a denominação foi C1 a C6 às meninas e C7 a C12 aos meninos.
Também são sujeitos da pesquisa os professores de Educação Física das escolas
selecionadas. Estes são licenciados em Educação Física, sendo um deles especialista em
psicopedagogia. Para eles também foram escolhidos nomes fictícios: o professor do colégio
CESUT foi batizado como César e a professora da escola Pedacinho do Céu II como Patrícia.
As entrevistas estes professores foram realizadas no final das observações da pesquisa, para
que não houvesse nenhuma interferência no trabalho de observação das aulas. Gomes (2001,
p. 61), sobre esse assunto, assegura:
Com uma imersão no cotidiano do grupo, o pesquisador tem mais e mais seguras oportunidades de fazer cruzamento – “triangulação” – das informações obtidas, de uns com as de outros, daquelas colhidas pelo olhar direto com aquelas colhidas com a escuta, das interpretações de atos e atitudes feitas pelos atores com aquelas próprias do pesquisador. Noutras palavras, estando “dentro”, o pesquisador tem possibilidades de ver de perto, no sentido mais concreto, o “ser-dizer-fazer-saber” do grupo através das lentes dos próprios sujeitos do grupo. Esse entendimento “de dentro” quase sempre escapa do ângulo de visão de quem está de fora, ou longe da experiência mesma dos observados.
Esta reflexão deu subsídios para que eu pudesse encontrar o momento exato de seguir
com os procedimentos da pesquisa, pois estando “dentro” do contexto é possível perceber
aquilo que poderá contribuir e o que poderá prejudicar no andamento da pesquisa, e por isso,
optei por não fazer as entrevistas com professores antes do final das observações de suas
aulas. Destaco agora, no próximo tópico, as características de cada uma das escolas onde
foram realizadas as observações de campo.
65
1.3 Caracterização das escolas
1.3.1 Centro de Ensino Superior de Jataí (CESUT)
Instituição privada que oferece ensino para as seguintes séries:
Nível de ensino Turno Educação Infantil Vespertino Educação Básica Vespertino Ensino fundamental Matutino Ensino Médio Matutino Ensino Superior Noturno
Quadro 1 – Cursos oferecidos pelo colégio CESUT
Antigamente, o colégio funcionava somente como faculdade. Atualmente mantém o
mesmo nome para disponibilizar tanto os cursos superiores como os outros. Ela está
localizada em bairro de classe média alta.
Existem quatro professores de Educação Física atuando no colégio, cada um em áreas
diferentes: um deles atua com a Educação Infantil e o Ensino Básico, sendo responsável por
todas as aulas destas fases. A aula de Educação Física ocorre uma vez por semana, para cada
turma, com duração de quarenta minutos.
A estrutura física do colégio é bem ampla, possui duas quadras, uma coberta e outra
não, um parque de diversão, dezoito salas de aula, uma cantina, quatro banheiros, duas salas
para secretaria e coordenação, uma sala de almoxarifado e depósito de livros, uma sala de
matrícula, uma sala para diretoria, uma sala de atendimento psicológico, um laboratório
experimental, e ainda uma biblioteca, um auditório e uma sala de professores, com banheiros,
que atende ao colégio e à faculdade. Existem ainda no prédio outras salas de uso exclusivo da
faculdade: uma sala de recepção, uma sala da diretoria, uma sala de coordenação, uma sala
para secretaria, uma para tesouraria, uma para secretaria geral e atendimento direto ao
graduando. A referida escola possui também dois amplos estacionamentos, um interno e outro
externo. Dentro do estacionamento interno há a casa do caseiro e outra, onde funciona a
associação dos professores. E do outro lado da rua, fora do prédio, há um laboratório de
66
informática, de propriedade do colégio também, onde todos os alunos inclusive, os da
Educação Infantil, assistem aulas de informática. A foto a seguir mostra a entrada do colégio.
Fig. 01 - Entrada do Colégio CESUT
1.3.2 Escola Municipal Pedacinho do Céu II
Escola municipal conveniada com a Igreja Presbiteriana Independente de Jataí; este
convênio permitiu à escola utilizar o espaço físico da igreja e a prefeitura arca com todas as
despesas de funcionários, materiais e mobiliários. Esta foi denominada de Pedacinho do Céu
II porque, no centro da cidade há outra instituição, com sede em outra congregação, que tem o
mesmo nome. A origem deste nome surgiu em função de seu funcionamento ocorrer na sede
da igreja. A instituição oferece o pré-escolar da Educação Infantil e todas as séries de ensino
básico distribuídas nos turnos matutino e vespertino. Ela fica localizada em um bairro de
67
classe baixa da cidade, mas ainda não chega a ser o bairro mais pobre. Existem outros
considerados mais pobres.
A estrutura física da escola é pequena. Nela funcionam quatro turmas por período,
pois a escola possui quatro salas de aula; há dois banheiros, uma sala para secretaria e
diretoria juntas, uma sala de almoxarifado, uma cozinha, e o salão da igreja, utilizado como
sala para professores. Há ainda um pequeno pátio aberto, localizado entre a secretaria e uma
sala de aula, e um outro na entrada da escola, onde funcionam as aulas de Educação Física. A
escola conta com uma professora de Educação Física que trabalha com todas as turmas, do
pré – escolar até a quarta série, nos dois turnos, sendo um total de duas aulas por semana, com
duração de quarenta e cinco minutos cada aula. A figura a seguir mostra a entrada da escola.
Fig. 02 - Entrada da Escola Pedacinho do Céu II
68
1.4 Coleta e organização dos dados
Para a coleta dos dados, iniciei a pesquisa de campo no mês de março de 2005, quando
então comecei a observar as aulas de Educação Física das turmas de pré-escolar das duas
escolas selecionadas. Inicialmente foram feitas observações e anotações em caderno de campo
e, seguindo os passos do orientador da pesquisa, transformei os dados registrados em
pequenas cenas. Assim, apresento, a seguir, algumas cenas iniciais, como a curiosidade de
algumas crianças do colégio CESUT ao verem a pesquisadora em todas as aulas de Educação
Física, esta é retratada na cena 01, e também os rituais diários das duas escolas, bem como o
espaço físico para a realização das aulas de Educação Física, que são apresentados nas cenas
02 e 03.
CENA 01 – A NAMORADA DO PROFESSOR
Nas primeiras aulas do Colégio CESUT, a minha presença chama a atenção das crianças que tentaram se aproximar. Durante a aula não puxaram assunto, apenas faziam de tudo para chamar a atenção: conversavam, sorriam, cochichavam e subiam na mureta. Ao término da segunda aula observada, três meninas me perguntaram: Você é namorada do professor? O que você fica fazendo aqui? – Ao esclarecer suas dúvidas, as meninas voltaram para a sala e, a partir daí, não se incomodaram mais.
CENA 02 – RITUAL DAS ESCOLAS
No colégio CESUT, todos os dias, as crianças que já estão condicionadas para esse ritual vão até suas salas, deixam seus materiais escolares e se posicionam em filas, por turmas na quadra coberta. Então, todos juntos, após soar o sinal, iniciam o ritual do Hino Nacional e, logo que termina, fazem uma oração de agradecimento e pedido de proteção para todos (Fig.03). Na escola Pedacinho do Céu II, as orações são realizadas todos os dias na sala de aula, cada turma, em sua sala, oram e cantam música gospel.
69
Fig. 03 - Ritual do Colégio CESUT
CENA 03 – RITUAL DA EDUCAÇÃO FÍSICA
Todos os dias na escola Pedacinho do Céu II são realizados, conforme estipulação da professora de sala de aula, uma fila das meninas e uma dos meninos, do menor para o maior, em uma turma; e na outra, é realizada uma única fila, de acordo com a disposição das crianças nas carteiras. Ao término da aula de Educação Física, esse ritual é repetido. (Fig.04). No colégio CESUT, é feita sempre uma única fila com direção à sala de aula; e depois, para voltar, não há uma ordem específica de menor para maior ou vice-versa. A primeira turma do dia, por já estarem na quadra para fazer o ritual do colégio, já permanece ali para a realização da aula de Educação Física. São perdidos cinco minutos todos os dias no começo da aula, devido a esse ritual. (Fig. 05).
70
Fig. 04 - Ritual da Educação Física da Escola Pedacinho do Céu II
Fig. 05 - Ritual da Educação Física no Colégio CESUT
71
CENA 04 – O ESPAÇO DA EDUCAÇÃO FÍSICA
No primeiro dia de observação, na Escola Pedacinho do Céu II, presenciei a dificuldade da professora por não ter espaço para trabalhar. Logo que as crianças chegaram ao pátio, começou a chuviscar e ela teve que buscar outro lugar; foi para a sala de aula, mas depois resolveu ir para o salão da igreja onde há mais espaço, no entanto o piso é muito escorregadio. Depois que passou o chuvisqueiro, a turma voltou novamente para o pátio. Isso fez com que perdessem quinze minutos de aula à procura de espaço para a realização da mesma. Já no colégio CESUT não há esse problema, pois existem duas quadras, uma coberta e outra não, pátios, parque, e uma sala de dança, o que possibilita uma ampla variação de espaços onde se possa trabalhar.
Fig. 06 - Pátio da escola Pedacinho do Céu II, onde acontecem as aulas de Educação Física.
72
Fig. 07 - Quadra coberta onde ocorrem as aulas de Educação Física no colégio CESUT
Do final do mês de abril ao início de maio, comecei a enviar as cartas de autorização
para os pais assinarem (Anexo C). Essa carta diz respeito à permissão para que eu pudesse
fotografar e utilizar as imagens das crianças futuramente. Nesta etapa encontrei bastante
dificuldade, primeiro na escola Pedacinho do Céu II, pois a carta foi enviada, aos pais, através
do diário das crianças, e estes, por não entenderem exatamente do que se tratava, não
assinavam. Sendo assim, foi necessário entrar em contato com esses pais para lhes explicar,
modo mais informal e com maior clareza, o motivo da autorização. Da mesma forma ocorreu
com o colégio CESUT, no entanto, um pouco mais trabalhoso: a diretora passou-me o número
do telefone dos pais de cada criança e pediu-me para que eu os procurasse pessoalmente.
Após entrar em contato por telefone e agendar uma visita, foi possível explicar
individualmente para cada pai ou mãe do que se tratava; só então foram colhidas todas as
assinaturas necessárias. Esse processo demorou mais de duas semanas, devido à não
disponibilidade de tempo de alguns pais.
Concluído esse processo de autorização dos pais, iniciei a aquisição de imagens
através de fotografias e alguns trechos de filmagens de momentos da aula. Nessa fase de
73
aquisição de imagens, quando já imaginava não ser mais notada, surpreendi-me com a reação
de algumas crianças, como descrevo na cena 05 a seguir:
CENA 05 – TIRA UMA FOTO DE MIM
No primeiro dia em que fotografei as aulas do colégio CESUT, três meninas, ao perceberem que eu estava fotografando, aproximaram-se e me disseram: “Tira uma foto de mim”, e depois pediam para ver, uma vez que a máquina é digital e esse recurso é possível. E apesar de pedir para que voltassem para a aula, as meninas não paravam de pedir para serem fotografadas e para verem as fotos, o que me fez pensar que não teria como fazer mais imagens se tal situação permanecesse. Já na escola Pedacinho do Céu II, isso não ocorreu. Nos primeiros dias: as crianças ficavam olhando muito ao ver que estavam sendo fotografadas, mas permaneceram em suas atividades sem se dispersarem por esse motivo.
Então, na penúltima semana do mês de maio foram realizadas as entrevistas com
quatro crianças de cada escola, e as demais foram entrevistadas no início da segunda quinzena
de junho. Já os professores foram entrevistados no final do mês de junho, quando as aulas
foram encerradas, concluindo assim a pesquisa de campo e a coleta de dados. Assim, dei
inicio à transcrição das entrevistas, e, logo após, ao processo de triangulação e análise dos
dados, o qual será apresentado a seguir.
74
TERCEIRA PARTE:
AS ATIVIDADES CORPORAIS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO FÍSICA
75
1 O movimento rítmico nas aulas de Educação Física
O sujeito se constitui e se desenvolve através da relação com o próximo e em
convivência em grupo. É por intermédio da linguagem e de atividades práticas comuns e
cotidianas que as interações humanas acontecem e são, portanto, sociais. Toda interação
social deve levar em conta os valores culturais dos seres envolvidos nesta relação.
Segundo Kramer (1998), falar de cultura é o mesmo que falar do ar que respiramos. É
possível abordá-la em dois aspectos:
Um relativo a tradições culturais, costumes e valores dos diferentes grupos, suas trajetórias, suas experiências, seu saber; outro referente ao acervo de conhecimentos culturais disponíveis a cada momento da história de uma dada sociedade, um povo, um país. No primeiro caso, temos uma imensa pluralidade de experiências possíveis, de valores e saberes: na dança e na música [...]; na produção de objetos [...]; nas comemorações civis ou religiosas; nos modos de cuidar das crianças, da terra, dos alimentos, das vestimentas etc. Além disso, nas trajetórias contadas, experiências sofridas, perdas, conquistas das famílias, dos grupos, das etnias. (KRAMER, 1998, p.14)
É possível perceber que, na convivência em grupo, o conhecimento é construído
coletivamente, passando este, posteriormente, a ser individual. Existe muita influência não só
dos familiares, mas também dos profissionais que lidam diretamente com as crianças e
também da própria relação entre estas crianças, que, devido a essa interação, podem
internalizar conceitos, conhecimentos, valores, preconceitos e normas de convivência social.
(LOPES, 1999).
Esse autor esclarece que tais conhecimentos podem ser transmitidos de forma “clara e
contundente”. Ou seja, em alguns momentos, a transmissão dos preconceitos, valores e
normas podem ser escondidos. Eles podem ser demonstrados através de gestos, expressões e
olhares. Portanto, o professor tem um papel importante e principal em oferecer uma relação
interpessoal que permita construir um maior conhecimento, proporcionando possibilidades de
“criar, modificar e reafirmar valores, conceitos, preconceitos, conhecimentos” (LOPES, 1999,
p. 107).
Kramer (1998) salienta que a experiência com a produção cultural contribui muito
para a formação das crianças, dos jovens e dos adultos, pois ela permite resgatar informações
e trajetórias, estimular discussões de crenças e valores, bem como oportunizar uma reflexão
crítica, tanto da que originamos, como daquela que nos produz, promovendo um repensar
sobre o sentido da vida, da sociedade, e nela, o papel de cada um de nós.
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Daólio (1995, p. 40) afirma que “o homem aprende a cultura por meio do seu corpo”.
Partindo dessa afirmação, acredito que o trabalho com as crianças exige não só conhecimento,
mas também sabedoria para desenvolver um ofício que contribua para o seu desenvolvimento
geral. E para que isso aconteça, as atividades corporais são de suma importância para o
crescimento e progresso físico/cognitivo do ser humano. Daí a necessidade de o professor de
Educação Física desenvolver com responsabilidade sua função na escola, pois ele lida
diretamente com as mais diversas manifestações corporais, o que lhe permite melhor
compreender e entender o significado desses elementos dentro de um contexto social.
Após todo esse embasamento teórico adquirido através desta pesquisa, posso afirmar
que as atividades rítmicas expressivas muito contribuem para o desenvolvimento de uma
linguagem corporal, ou melhor, para a manifestação cultural do corpo, enquanto linguagem, e
portanto é de fundamental importância que essa ação esteja presente nas aulas de Educação
Física em todas as escolas e principalmente, nas de Educação Infantil e Fundamental, pois é
nesta fase que a criança está mais disposta a adquirir novos conhecimentos, sendo também a
base não só de sua educação escolar, mas também de seu desenvolvimento motor/cognitivo.
Nesse sentido, pensando na formação educacional e cultural das crianças e também buscando
novos conhecimentos, adentrei-me no espaço cultural escolar de duas instituições Do
município de cidade de Jataí/Goiás, sendo uma pública e outra privada, para alcançar os
objetivos essenciais propostos por essa pesquisa. Em contatos mais próximos com a realidade
foi possível deparar-me com várias situações que julguei importantes para uma proximidade
da pesquisadora com os sujeitos pesquisados.
Dessa forma, essa Parte será organizada em torno de duas categorias de análise: a
primeira aborda a presença/ausência das atividades rítmicas nas aulas de Educação Física, e é
organizada em três sub-categorias: as atividades evidenciadas nas aulas, as concepções e
formação dos professores, a prática cotidiana e as dificuldades encontradas; e a segunda
categoria elucida a percepção do professor quanto à linguagem corporal da criança, na qual
também se apresentam duas sub-categorias: as atividades expressivas na escola, e a percepção
e sensibilidade dos professores para a linguagem corporal. Ambos os grupos analíticos
contribuíram para compreender como as atividades rítmicas vêm sendo trabalhadas dentro de
duas escolas do interior de Goiás.
77
1.1 A presença/ausência das atividades rítmicas nas aulas de Educação Física
Ao entrar no espaço de pesquisa, foi reforçado o objetivo principal do estudo de
compreender como as atividades rítmicas vêm sendo trabalhadas na Educação Infantil, e,
juntamente, foi permitido perceber onde e quando tais atividades acontecem e estão mais
presentes, uma vez que, segundo Queirós (2002), as vivências e experiências diversas,
enfatizadas através da atividade rítmica, possibilitam o desenvolvimento tanto da educação
rítmica quanto da expressão corporal, contribuindo, assim, simultaneamente, para o domínio
motor, cognitivo e afetivo-social.
Buscando compreender melhor como estas atividades rítmicas devem aparecer e ser
trabalhadas na Educação Infantil, verifiquei qual a proposta que o RCNEI traz para que os
professores dessa faixa etária possam trabalhar essa questão. Foi possível observar que os
conteúdos e objetivos, neste documento, são separados de acordo com a faixa etária. Consta
como objetivos da prática educativa para crianças de zero a três anos que estas devem
desenvolver a capacidade de descobrir os variados gestos e ritmos corporais que lhes
permitam se expressar tanto nas brincadeiras como também em situações de interação social.
Como conteúdo a ser trabalhado, aponta a “[...] expressão de sensações e ritmos corporais por
meio de gestos, posturas e da linguagem oral”. (BRASIL, 1998, p. 27). Para as crianças de
quatro a seis anos, além de aprofundar e ampliar os objetivos da faixa etária anterior, consta
que a criança deverá ser capaz de
ampliar as possibilidades expressivas do próprio movimento, utilizando gestos diversos e o ritmo corporal nas suas brincadeiras danças, jogos e demais situações de interação; explorar diferentes qualidades e dinâmicas do movimento, como força, velocidade, resistência e flexibilidade, conhecendo gradativamente os limites e as potencialidades de seu corpo [...]. (BRASIL, 1998, p. 27)
Para alcançar tais objetivos, o documento ilustra que o conteúdo a ser trabalhado deve ser
“[...] a percepção de estruturas rítmicas para expressar-se corporalmente por meio da dança,
brincadeira e de outros movimentos [...]”. (BRASIL, 1998, p. 32). Portanto, ao verificar a
proposta do RCNEI, através de seus objetivos e conteúdos que devem ser seguidos e
trabalhados na Educação Infantil, como um meio de facilitação do trabalho do professor dessa
faixa etária, passo a descrever então a realidade encontrada nas escolas pesquisadas.
Para melhor estruturação desta categoria de análise, surgiram três sub-categorias, que
foram distribuídas da seguinte forma: a primeira trata das atividades evidenciadas nas aulas, a
segunda evidencia as concepções e a formação dos professores e a terceira aborda a prática
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cotidiana e as dificuldades encontradas. Passo, então, a descrever sobre a primeira sub-
categoria.
1.1.1 As atividades evidenciadas nas aulas
Já no espaço de pesquisa, ao observar as atividades trabalhadas, foi possível notar que
algumas delas são mais evidenciadas que outras. Tais atividades são bem diferentes entre as
duas escolas. Para melhor estruturação desta análise, apresentarei as atividades de cada escola
separadamente, ou seja, num primeiro momento, tratarei da escola pública e num segundo
momento, da escola particular. As principais atividades reveladas nessas escolas foram
descritas em cenas para melhor compreensão.
Logo no primeiro mês de observação, foi possível verificar que as brincadeiras
cantadas, cantigas de roda e brinquedos ritmados são atividades constantes na Escola
Pedacinho do Céu II. Dentre todas as cantigas, percebi que uma atividade em especial,
denominada de “Dona Aranha”, foi trabalhada durante todo o período de investigação, sendo
a preferida das crianças. Portanto descrevo-a na cena 06, e apresento as fotos referentes a essa
atividade, exibindo as figuras 08 e 09.
CENA 06 – A “DONA ARANHA”
A professora Patrícia, da Escola Pedacinho do Céu II, sempre começa a aula de Educação Física com cantigas. Nos primeiros dias, parecia que tais atividades eram realizadas apenas como aquecimento para a aula, mas depois percebi que eram trabalhadas em vários momentos, e não só no início. Entre tantas cantigas, as crianças sempre pedem a “Dona Aranha”, que é uma brincadeira cantada, a qual diz: “A dona aranha subiu pela parede, veio a chuva forte e a derrubou ... (refrão)”. Ao cantarem essa música, as crianças sobem em qualquer lugar que conseguem, e quando dizem que “a chuva a derrubou” todas caem no chão. Como essa atividade está presente em praticamente todas as aulas, a professora utiliza algumas variações solicitando que cantem rápido e aumentem a voz, vai acelerando até ficar muito rápido e alto, e também diminui o ritmo até ficar bem devagar e a voz
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bem baixa. Em outras variações, altera a música para a “dona aranha” descer, ao invés de subir.
Fig. 08 - Ao cantar a música da dona aranha, as crianças sobem na grade.
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Fig. 09 - Ao dizer que a chuva derrubou a dona aranha, as crianças caem no chão.
Em praticamente todas as aulas da professora Patrícia, as atividades rítmicas estavam
presentes, sendo raro os dias que não tinha pelo menos uma delas. Além das cantigas que as
crianças já sabem, ela sempre traz novas atividades que contêm música e/ou ritmo, como as
demonstradas nas cenas 07 e 08.
CENA 07 – CORRE CUTIA
Ao chegar ao pátio com as crianças, a professora Patrícia, da Escola Pedacinho do Céu II, ensina as crianças a brincaram de “Corre Cutia”. Ela utiliza uma garrafa para fazer a atividade. Os alunos ficam sentados em círculo e aprendem a música que devem cantar, enquanto um dos colegas corre atrás do círculo que formaram. À medida que vai trocando as crianças, vão cantando mais rápido, ou mais devagar, de acordo com o comando da professora, e a criança que fica com a garrafa deve seguir o ritmo, mas nem todos conseguem. As crianças ficaram animadas, cantavam e riam muito, mas aos poucos se cansaram, e, no final, quase não cantavam mais.
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CENA 08 – “O TREM MALUCO”
As crianças da escola Pedacinho do Céu II chegaram ao pátio e iniciaram as atividades de Educação Física com cantigas; elas dançaram e cantaram várias músicas. A maioria consegue acompanhar cantando e dançando e realizando os movimentos com ritmo e coordenação. Os alunos se sentam e a professora ensina uma nova música do “Trem Maluco”. Como ela tem quatro refrões, foi ensinado um por um, e depois ela uniu todos. No final, as crianças levantaram, cantaram e dançaram com a professora. Os alunos tiveram dificuldades apenas com o último refrão, pois é o mais complicado de cantar, por envolver a matemática. A canção fala o seguinte: “O trem maluco, quando sai de Pernambuco, vai fazendo chique, chique, até chegar ao Ceará. Rebola pai, rebola mãe, rebola filha, eu também sou da família, também quero rebolar. Minha mãe me pôs na escola, pra aprender o B a Ba, a danada da professora me ensinou a namorar. Sete e sete são quatorze, com mais sete vinte um. Tenho sete namorados, mas não gosto de nenhum”.
Para as festividades do dia das mães, a professora utilizou uma cantiga, trabalhada de
forma conjunta com as crianças, pois estas a ajudaram na coreografia, como demonstra a
cena a seguir:
CENA 09 – ENSAIO PARA APRESENTAÇÃO DO DIA DAS MÃES
O dia estava frio e nublado, por isso a professora Patrícia escolheu ficar na sala. Todos permaneceram sentados porque não tinha como afastar as carteiras que são muitas para uma sala pequena. A professora, com o auxilio de um aparelho de som, apresentou a música da apresentação do dia das Mães. Os alunos a ouviram várias vezes, e logo começaram a fazer os movimentos a que a música induz: bater palmas, bater pés e girar. Resolveram ir para o pátio e lá cantaram sozinhos, sem o auxílio do som, e depois montaram a coreografia. Todos forneceram opiniões e a professora não só acatou como ajudou a melhorar os movimentos. A música é do “Caranguejo”: Caranguejo não é peixe; Caranguejo peixe é. Caranguejo só é peixe na enchente da maré... Para a outra turma, a música é a do Pezinho: Ai bota aqui, ai bota ali, o teu pezinho; o teu pezinho bem juntinho com o meu...
Além das atividades que a professora propunha, em vários momentos as crianças pediam
para fazer uma ou outra atividade de sua preferência, e muitas vezes ela acatava, o que
deixava os alunos extremamente alegres. A foto a seguir os mostram cantando “Atirei o pau
no gato”.
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Fig. 10 - As crianças cantando “Atirei o pau no gato”.
Dentre tantas atividades, uma chamou atenção por não ser comum acontecer da forma
como ela se deu: a professora permitiu, em uma de suas aulas, que as crianças ficassem livres
para dançar e cantar as músicas que eles mesmos escolhessem, ela levou alguns CDs infantis,
e eles puderam ficar à vontade, como descrevo na cena 10 e demonstro na foto 11.
CENA 10 – DANÇAR A VONTADE
A professora Patrícia colocou um CD com músicas infantis e deixou as crianças livres para dançar e fazer o que quisessem. A única regra era não poder ultrapassar o limite do espaço, que foi demarcado com uma cadeira, mas algumas crianças, a todo instante, quebravam a norma. Ficaram durante quase todo tempo dançando. No final, a professora pôs uma música mais calma, e os alunos sentaram e cantaram para diminuir a euforia e se encaminharem de volta à sala de aula.
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Fig. 11 - Dançando a vontade.
De acordo com Queirós (2002), essas atividades desenvolvidas pela professora Patrícia são
consideradas atividades rítmicas, pois evidenciam movimentos com sons e música para
introduzir o movimento. Ao citar Cauduru, a autora afirma que a atividade “rítmico-motora”,
quando bem orientada, pode levar o sistema nervoso central da criança a um desenvolvimento
dos impulsos de imagens motoras as quais levam a uma disposição interior, que permite
sensações de autodomínio e de equilíbrio.
Talvez isso explique o motivo que levam as crianças a gostarem tanto dessas
atividades. O prazer por essas ações é demonstrado tanto durante as atividades como nas
entrevistas, quando então ficou evidenciado o gosto das crianças pela dança e pela música,
uma vez, que dentre as doze crianças, onze disseram que gostam muito de dançar e cantar e
que praticam essa ação tanto em casa como na escola, nos horários de recreio, de saída e
chegada da escola, às vezes na sala de aula com a professora, mas a aula de Educação Física
foi a mais citada. Todo o grupo de crianças disse que gosta das aulas de Educação Física pelo
fato de ser bom e poder brincar. Dentre as atividades rítmicas preferidas, cinco citaram a
“Dona Aranha”, duas citaram a “Cobra” e cinco apontaram outras, como é possível verificar
em alguns depoimentos, a seguir:
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É da aranha. Gosto, porque é bom, é divertido. (P1 – 5anos). Gosto mais é da..., acho que é a dona aranha. Porque ela é boa, tem que subir, é bom subir e depois cair. (P2 – 5 anos) Da cobrinha... é divertido. (P4 – 5 anos)
Do trem maluco, mamãe que pôs na escola e rebola bola. Canto tudinho. (P7 – 5 anos)
Da cobra e da mulher de ló. (P9 – 6 anos) A dona aranha subiu pela parede, e atirei o pau no gato. (P11 – 5 anos) Da barata da saia de filó. É legal. (P12- 5 anos)
Foi possível perceber que as atividades rítmicas, nesta escola, também estão presentes
na sala de aula, não sendo exclusividade das aulas de Educação Física, uma vez que em
alguns momentos, em que aguardava o início da aula de Educação Física, ficava olhando a
sala de aula, conforme descrevo na cena a seguir:
CENA 11 – ESPIANDO A SALA DE AULA
Antes de começar a aula de Educação Física da escola Pedacinho do Céu II, eu ficava observando, à espreita, as aulas ministradas pelas outras professoras. E algumas vezes, foi possível observar, que as crianças de pé, cantavam e gesticulavam junto com a professora. Cantarolavam músicas da igreja como a “Mulher de Ló” e “Joãozinho e seus martelos”.
Nos depoimentos abaixo, que foram os mais relevantes, as crianças confirmam que cantam
na sala de aula com a professora.
Na sala de aula, de vez em quando, quando a gente chega de casa. Canta, mas é outras músicas. (P2 – 5 anos) Na sala de aula, pode quando a professora canta com a gente. Huhum! É as mesma, tem horas que é as mesmas, tem hora que é umas outras. (P 7 – 5 anos)
Huhum! Na sala canto. Outras músicas. De vez em quando. (P8 – 5 anos)
Anham, na sala canto também. Tem vez que é as mesmas e tem vez que umas diferentes. Canta sempre. (P9 – 6 anos)
Para as crianças, essas atividades são interpretadas apenas como brincadeira: elas não
conseguem perceber que existe um objetivo específico nesse brincar, e é por isso que gostam
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tanto dessas atividades, porque significa prazer e bem estar para elas. Segundo Moyles
(2002), o brincar é recreação e, em situações educacionais, possibilita um meio real de
aprendizagem, promovendo novas aprendizagens tanto no domínio afetivo como no cognitivo
e motor. Portanto, a professora, ao brincar na sala de aula, possibilita uma nova forma de
ensino aprendizagem para a criança.
Queirós (2002) explica que as atividades rítmicas são institucionalizadas pelas escolas,
portanto fazem parte da educação geral, sendo então um conhecimento a ser utilizado por
diversas disciplinas, tornando-se assim um objeto de aprendizagem e observação dentro do
contexto escolar pedagógico. E Moyles (2002, p. 14) acrescenta: “Longe de ser uma atividade
supérflua, para ‘o tempo livre’... o brincar, em certos estágios iniciais cruciais, pode ser
necessário para a ocorrência e o sucesso de toda a atividade social posterior”.
Passo agora, a demonstrar as atividades que mais ocorreram no Colégio CESUT. O
que percebi, nesta escola, é que os jogos recreativos são bastante trabalhados,
predominantemente os de pique-pega. Assim, através das observações, percebo que os jogos
de pique-pega são trabalhados nesse colégio na mesma proporção que são trabalhadas as
atividades rítmicas na escola Pedacinho do Céu II, como se pode observar na cena seguinte:
CENA 12 – VARIAÇÕES DE PIQUE-PEGA
Pude notar que a atividade de pique-pega é prioritária e constante nas aulas de Educação Física do professor César do colégio CESUT. Em todas as aulas, há pelo menos duas variações dessa atividade. Para explicar cada uma dessas variações, o professor sempre inventa uma história, deixando a brincadeira mais fantasiosa. Os nomes dados para tais variações são “Elefante Narigudo”, “Acorda seu Urso”, “Gelim Gelão”, “O leão na Jaula”, “A raposa e os pintinhos na Floresta”, “O lobo manco”, “Pique esconde” e outros. As fotos, a seguir, mostram alguns momentos da aula com atividades de pique-pega.
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Fig. 12 – Pique-pega
Fig. 13 – Pique-pega
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Essas variações de pique-pega, por estarem presentes em todas as aulas de Educação Física
observadas nesse colégio, permitiram-me o entendimento de que elas podem estar
substituindo outras, como a atividade rítmica, por exemplo.
A predominância dessas atividades levou-me à curiosidade de verificar o plano de
ensino do professor (Anexo A), para analisar se realmente era intenção dele dar ênfase aos
jogos recreativos, e observar ainda se as atividades rítmicas estavam ou não incluídas nesse
documento. Pude verificar, então, que tais atividades faziam parte da programação bimestral,
para as turmas em observação. Na prática do professor César, durante quatro meses de
observação, foram trabalhadas as seguintes atividades: uma cantiga de roda, um brinquedo
cantado, uma atividade com música, e, no último mês de observação, todas as aulas de
Educação Física foram substituídas por ensaios de quadrilha. Essas atividades são descritas
nas cenas 13, 14 e 15.
CENA 13 – PULAR CORDA
Hoje o professor César, do colégio CESUT, trabalhou com a atividade de pular corda; ele ficou com um aluno batendo a corda, enquanto os outros ficavam na fila aguardando sua vez de pular. Uma criança pulava e as outras cantarolavam: Com quem você, pretende se casar? Com loiro, moreno, careca, cabeludo. Rei, soldado, polícia, ladrão. Moço bonito do seu coração. Qual é a letra do seu namorado? A, B, C... Alguns ficaram muito empolgados e aguardavam ansiosos por sua vez, já outros ficaram conversando, saindo da fila e não quiseram participar da brincadeira. Logo, alguns começaram a correr e brincar de outras coisas, ocorrendo pequenas brigas. Quando o professor percebeu que não conseguia bater a corda e manter a turma sob controle, mudou a atividade.
CENA 14 – “CAIXINHA DE BORBOLETA”
Depois de dois meses de observação, o professor César trabalhou com uma cantiga de roda para volta à calma. Fizeram uma roda, cantaram e ao término da música, todos caíram no chão e permaneceram como estátua. O último a se mexer é o vencedor. Os alunos cantaram uma vez e depois voltaram para a sala de aula. As fotos abaixo mostram a atividade. Fotos 14 e 15.
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Fig. 14 - As crianças paradas como estátuas.
Fig. 15 - As crianças ao fundo aguardando para ver quem será o vencedor.
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CENA 15 – “DANÇA DOS STEPS”
O professor César, do colégio CESUT, iniciou a aula com uma variação de dança das cadeiras. Ele distribui alguns steps na sala de dança, e as crianças vão andando em volta deles até parar a música; quem não consegue sentar no step sai, e, à medida que saem, retira-se um step até sobrar apenas um. É utilizado um aparelho de som e músicas da Xuxa, Sandy e Júnior e Eliana. Foi a primeira vez, em três meses, que ele deu uma atividade com música. A foto abaixo ilustra essa atividade.
Fig. 16 – “Dança dos steps”.
Essas cenas e fotos ilustram as três ocorrências de atividades rítmicas no colégio CESUT, e,
através das fotografias, é possível observar a expressão de alegria no rosto das crianças. Elas
parecem gostar, mas essas atividades não são trabalhadas com freqüência.
As atividades rítmicas foram trabalhadas em maior proporção neste colégio, quando
foi necessário realizar os ensaios de quadrilha para a festa junina, assim, as aulas de
Educação Física foram tomadas por essa atividade durante todo o mês de junho. As cenas 16
e 17 e as fotos, a seguir, demonstram como ocorreu essa atividade.
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CENA 16 – ENSAIO DE QUADRILHA
A partir do dia dez de junho, no colégio CESUT, iniciaram-se as atividades de ensaio para a quadrilha. Assim, todas as aulas de Educação Física foram tomadas para esse fim. O professor César uniu as duas turmas de pré, no entanto, nem todas as crianças quiseram participar da dança, então, estas ficaram na sala com a professora. As músicas selecionadas são cantigas de rodas como “Eu entrei na roda”, “Cai, Cai balão”, “Caranguejo”, “Balaio”, “Onde está a Margarida”, entre outras. Durante os ensaios o professor César apresentou certa dificuldade com a coreografia, e contava com a ajuda de um funcionário do colégio e das professoras de sala. Algumas crianças também apresentaram dificuldades na execução da coreografia, muitas não conseguiam acompanhar o ritmo e não tinham coordenação. Apesar de os ensaios terem ocorrido durante todos os dias, somando um total de mais ou menos 12 ensaios, com duração mínima de quarenta minutos cada, as crianças não conseguiram melhorar sua coordenação e ritmo até no último dia.
Fig. 17 – Ensaio de Quadrilha.
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CENA 17 – FESTA JUNINA
O último sábado do mês de junho foi marcado pela festa junina do Colégio CESUT. A decoração estava muito bonita, e todos os professores estavam vestidos a caráter, assim como as crianças. As meninas, a todo tempo, desfilavam seus vestidos maravilhosos confeccionados especialmente para a festa; os meninos corriam para lá e para cá com suas botinas, camisas de mangas compridas, calças enfeitadas com retalhos e seus chapéus de palha. Até o momento de início da dança, as crianças ficaram bem livres, afinal era dia de festa. Quando iniciaram as apresentações, os professores organizaram as crianças em pares e em fila para aguardarem a vez de dançar. A turma dançou bem, sem errar a coreografia, mas, em relação à coordenação e ritmo, apresentaram maior dificuldade do que nos ensaios, possivelmente devido ao grande público que estava presente, o que pode ter provocado uma inibição maior nas crianças.
Fig. 18 – Quadrilha no dia da Festa Junina.
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Fig. 19 - Quadrilha no dia da Festa Junina
Percebendo a pouca ocorrência das atividades rítmicas, e notando que as mesmas faziam
parte do plano de ensino do professor César, eu não conseguia entender o motivo pelo qual
isso acontecia. Dessa forma, surgiu a inquietação de que talvez as crianças daquela turma, ou
do colégio, não gostassem dessas atividades por se tratar de uma outra cultura social. Para
esclarecer tal inquietação, busquei, então, através das entrevistas, descobrir se as crianças
gostavam ou não dessas atividades.
Durante as entrevistas, foi possível observar, que dentre as doze crianças analisadas,
nove disseram que gostam muito de música e de dança, também; duas falaram que gostam de
música, mas não gostam de dançar, e uma disse que não gosta muito de dançar porque tem
vergonha, mas adora música. Em relação às atividades rítmicas na aula de Educação Física,
todas as crianças disseram que gostam desse tipo de atividade e chegaram a citar algumas. De
todas as crianças, oito falaram que não fazem essas brincadeiras “porque o professor não dá”;
um aluno disse que “é porque ele dá só de vez em quando” (C11 – 5anos), e três não
souberam responder o motivo. A seguir, apresento algumas falas:
Tem da borboleta, essa eu gosto, daquela que fala não mexe comigo senão eu caio. Gosto da corre cutia e batata quente. Mas na aula não tem. É, legal, divertido. Canta de vez em quando. O professor que não dá. (C1 – 6 anos)
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Não, nós cantava na aula do professor Romário3. Gosto da borboleta. Canta só de vez em quando, eu gosto. O professor não dá. (C2 – 5 anos) Gosto da barata, atirei o pau no gato, borboletinha. Canta de vez em quando. Gosto. O professor não dá. (C5 – 6anos) A dança do tamborete, vamos rodando assim dançando, e quando parar a música a gente senta nele e se alguém fica fora sai. Batata quente também. É tão bom brincar dessas brincadeiras. Atirei o pau no gato. Estátua, aquela da caixinha de borboleta enfeitada de bambolá, quem mexe primeiro sai. Canta de vez em quando. O professor que não dá. (C6 – 6 anos) Não canta, nem dança porque ele não faz brincadeira de dançar! Nunca conheci essas brincadeiras! Só tem uma que é atirei o pau no gato, e da borboletinha, que vira estátua. Gosto. Nós tá fazendo muita brincadeira invés de cantar mais. (C8 – 6 anos). Batata quente, corre cutia. Dá de vez em quando, às vezes. Gosto. Eu canto a corre cutia de noite e de dia. Gosto. Canta de vez em quando. Porque o professor dá de vez em quando. (C11 – 5 anos)
Essa situação confirma o que Queirós (2002) registra sobre as atividades rítmicas,
quando afirma que tais atividades, enquanto conhecimento tanto da Educação Física como do
Lazer, não têm se efetivado na prática pedagógica dos profissionais, alguns a utilizam apenas
como atividades lúdicas eventuais, ou são desenvolvidas para apresentações com fins
artísticos em dias especiais. Essa situação pode ser verificada no Colégio CESUT, quando
algumas crianças, ao falarem sobre a dança na escola, dizem:
Pode dançar na hora da apresentação, lá no pátio, lá onde o professor dá aula pra gente, é na quadra, e só. (C2 – 5 anos) Eu danço quando tem quadrilha, umas coisas assim. Pode dançar numa apresentação, na quadrilha e também no recreio se quiser. (C3 – 6 anos) Pode. Só quando a professora4 pedir. Dançar quadrilha, só. (C6- 6 anos) Danço quando vai ensaiar dança, lá na quadra. A tia5 que manda. (C7 – 6 anos) Pode, na apresentação, só lá na quadra. (C9 – 5 anos).
Segundo Queirós (2002), ao citar Noda e Melcherts, no ensino escolar as atividades
rítmicas, enquanto conhecimento da Educação Física, é um conteúdo educacional a mais para
os alunos, e estas podem ser adaptadas conforme o interesse e necessidade do momento. Esse
meio de expressão corporal
3 A aluna citou o nome de um antigo professor de Educação Física, por isso seu verdadeiro nome foi mantido em sigilo, e adotei o nome fictício de Romário para evitar constrangimentos. 4 A criança se refere à professora de sala de aula, e não ao professor de Educação Física. 5 Idem, idem.
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[...] é a disciplina do sentido rítmico muscular; [pois] converte o corpo em um instrumento onde vibra o ritmo. Tem como finalidade essencial, estimular e desenvolver o ritmo físico, educar o ritmo emocional e proporcionar conhecimentos indispensáveis do ritmo musical..., através da ginástica, da ritmoplastia e da dança como conteúdos que estão intrinsecamente relacionados, sendo a dança o coroamento da ritmoplastia, que por sua vez, é o aperfeiçoamento da ginástica. (QUEIRÓS, 2002, p.03)
A autora explica que os educadores devem oferecer aos alunos propostas de movimentos
naturais tendo em vista uma maximização rítmica na expressão desses movimentos, que
podem ser utilizados em diferentes variações de representação como força, intensidade,
forma, trajetória, duração e direção, através de recursos acústicos, que são encontrados não só
na música, mas também na percussão instrumental e corporal.
Percebo, assim, que existem várias maneiras de utilizar as atividades rítmicas na
Educação Física e não só através da dança ou da música especificamente, portanto, essa
discrepância existente nas duas escolas: em uma, as atividades rítmicas são constantes e, na
outra, quase não aparecem, podem estar vinculadas ao que Daólio (1995) denomina de
manifestação da cultura corporal, a qual está relacionada com grupos sociais diferentes, uma
vez que cada sociedade se expressa diferentemente por meio de corpos diferentes. Por outro
lado, a presença/ausência dessas atividades rítmicas pode sofrer influência, também, das
concepções e da prática docente dos professores, que trabalham com estas crianças. Ou seja,
depende das condições oferecidas para que elas exercitem a ritmicidade na escola, ou ainda
pode ser devido à formação profissional e cultural desse professor, bem como, à maneira
como apresenta sua própria manifestação corporal. Esses assuntos serão tratados nos
próximos tópicos.
1.1.2 Concepções e formação dos professores
Em busca de uma compreensão da discrepância existente nas duas escolas, procurei
novas informações que pudessem esclarecer o motivo, em uma escola, que levavam as
atividades rítmicas a ser tão constantes, e, na outra, estas raramente eram trabalhadas. Então,
parti para as entrevistas com os professores, os quais poderiam esclarecer tantas dúvidas ainda
presentes.
De acordo com Kramer (1998), a experiência dos profissionais da educação, nos mais
variados ambientes culturais, permite informar sua visão, flexibilidade e sensibilidade de seu
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próprio conhecimento, propiciando condições, que caracterizem momentos importantes de
aprendizagem, levando em consideração o ponto de vista ético, estético, político e cultural.
Essa formação representa os profissionais como pessoas, no que se refere à satisfação estética
e aos princípios éticos. Assim, a formação desse profissional colabora para a atuação do
trabalho com crianças, jovens e adultos, tanto dentro como fora da escola. Portanto, entendo
que os professores, ao longo de sua experiência profissional, vão formando novas concepções,
novos conceitos a respeito não só de seu trabalho, mas também da educação em geral.
Assim, ao falar sobre o que entendem por atividades rítmicas, um professor declara:
Para mim são atividades em que as crianças têm que utilizar um determinado ritmo para estar desenvolvendo aquela atividade e baseado em movimentos que elas têm que ter uma certa constância para estar desempenhando aqueles movimentos. Através daí se dá o ritmo, eu não sei aprofundar mais a respeito deste assunto. Eu tento trabalhar de certa forma. Às vezes, têm várias atividades que englobam vários aspectos, capacidades que eu quero desenvolver nas crianças, ajudar a desenvolver nas crianças, e as atividades rítmicas entram juntamente com outras. Às vezes eu coloco um jogo que vai entrar junto com a lateralidade, por exemplo, vai trabalhar um pouco do ritmo da criança. Acredito que, com certeza, as atividades rítmicas estão ligadas à dança, porque a dança em si, ela é toda pautada em ritmo, está totalmente ligado. (Professor César).
A professora Patrícia apresenta a seguinte concepção:
Eu acho, no meu modo de pensar, que são atividades que precisam de movimentos sempre coordenados dentro de um espaço determinado, com tempo determinado e ela pode ser individual ou não, né, em grupo. De acordo com o que eu falei, trabalho. É batata quente, escravo de jó. (Professora Patrícia)
É possível notar que o professor César, mesmo não trabalhando freqüentemente as atividades
rítmicas, conseguiu apontar um conceito mais próximo daquilo que Queirós (2002) afirma ser
as atividades rítmicas, consideradas como atividades naturais acompanhadas por ritmos de
sons e música. Seguindo esse mesmo foco analítico, a professora Patrícia, que trabalha
constantemente as atividades rítmicas, dentro dos conteúdos propostos na matriz curricular de
sua escola (anexo B), embora não esteja completamente equivocada, não conseguiu
aproximar-se muito do conceito atribuído por essa autora.
Essa questão pode ser explicada por Queirós (2002), quando salienta que muitos
professores de Educação Física e Lazer consideram as atividades rítmicas como simples
atividades lúdicas, que têm como objetivo o entretenimento e a diversão, ou uma forma
prazerosa de passar o tempo. Essa concepção acontece devido ao fato de as atividades
rítmicas estarem justamente relacionadas com a música e a arte. A autora aborda que essa
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concepção deve ser revista, e para isso é necessário reflexões e aprofundamento para
compreensão dos significados, valores e sentidos dessas atividades.
Como as atividades rítmicas fazem parte do conteúdo trabalhado pela dança, torna-se
relevante entender como ela é trabalhada na Educação Infantil. A esse respeito, o professor
César relata seu trabalho.
É uma falta que eu tenho, falando do primeiro semestre todo, eu acho que eu devo ter dado por turma no máximo duas aulas com dança. É uma deficiência minha mesmo, a não ser, por exemplo, ensaios para apresentações. Tirando isso, conteúdo de aula mesmo eu tenho dado só isso. É uma deficiência minha, eu não dou conta de trabalhar com dança. (Professor César)
Através de sua fala, é possível compreender a pouca ocorrência das atividades rítmicas em
suas aulas, e isto coincide com o que as crianças já tinham apontado: o professor não oferecia
essas atividades. O professor César esclarece, assim, o motivo de as atividades rítmicas não
serem trabalhadas com certa freqüência no colégio CESUT. Trata-se de uma dificuldade
encontrada pelo professor em relação à dança, e como, de acordo com a sua opinião, as
atividades rítmicas estão totalmente ligadas à dança, isto o limita a trabalhar com tais
atividades. Ele não consegue trabalhar com as mesmas, reconhecendo a pouca habilidade
metodológica na condução de aulas rítmicas. Recorro à afirmação de Daólio (1995), já
mencionada, a respeito da manifestação da cultura corporal, para comentar que o professor
César, ao apresentar sua carência metodológica, demonstra que a mesma é causada por sua
manifestação corporal que encontra obstáculos para o desenvolvimento de um trabalho com
dança ou ritmos.
Já a professora Patrícia explica: “Não trabalho especificamente a dança, não”. Isso
permite verificar que a professora não considerou o brinquedo cantado e as cantigas de roda
como sendo atividades rítmicas, nem como dança. Ela exemplificou as atividades rítmicas
com “batata-quente e escravo de jó”, e ainda desconsiderou como dança o trabalho que faz,
cada vez que ensina novas músicas instigando os alunos a criarem os movimentos para a
mesma. Contudo, essa foi uma contradição bastante interessante, pois apesar de o professor
César ter um conceito mais próximo do que vêm a ser atividades rítmicas, este não consegue
trabalhar freqüentemente com as mesmas, e a professora Patrícia que tanto trabalha, não se
aproximou muito do conceito teórico dessas atividades.
Para compreender melhor as carências metodológicas apresentadas pelos professores,
foi necessário levantar o aspecto da formação dos mesmos, a fim de entender se a dificuldade
de um em trabalhar atividade rítmica, e do outro de compreendê-la. e conceituá-la. Pode ser
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um problema de formação, uma vez que Pinto (2000-2001) aponta para a necessidade de uma
formação de qualidade voltada para a Educação Infantil, pois acredita que, para dar conta da
complexidade do trabalho com essa faixa etária, é necessário profissionais especializados, e
para isso a formação inicial deve dar subsídios para esse professor.
Ao tratar a respeito de sua formação, os professores falaram sobre as disciplinas que
os orientaram para trabalhar com a Educação Infantil, e o que eles aprenderam que deve ser as
aulas de Educação Física para essa fase:
Que eu lembre, especificamente, eu lembro do primeiro ano do Ritmo e Movimento Criativo que trabalhava com as turmas menores, e da Ginástica I que era voltada para recreação também, só que para crianças mais crescidas. Tem que ser, para mim, com o que aprendi e com o que eu tenho de experiência, eu penso que a ênfase dela tem que estar voltada pro lúdico, as crianças têm que ter prazer em fazer as atividades, então, eu penso que isso está totalmente ligado com brincadeiras. Eu tento colocar nas minhas aulas, na maior parte das atividades, o lúdico, o recreacional, pra despertar além do aprendizado que as crianças vão ter normalmente, mas através do prazer que elas vão ter em brincar. (Professor César).
Tive Ginástica I e Dança. Nada. Aprendi mais dando aulas do que na minha formação, mas acho que as aulas de Educação Física, nessa faixa etária, elas devem ter limites, devem ter regras e serem bastante prazerosas, é assim, dar, impor regras, impor limites, mas também dar à criança a oportunidade de criar dentro daquelas regras, dentro daquele limite, dar uma oportunidade à criança de também mostrar outras formas, de se expressar do jeito que ela gostaria. (Professora Patrícia)
Ao abordar sobre a lembrança de terem ou não estudado conteúdos sobre corporeidade,
linguagem corporal, ludicidade, ritmo e atividades rítmicas, o discurso dos professores
demonstra que ou viram superficialmente, ou não viram:
Eu lembro a respeito, mas superficialmente, eu até não sei te falar profundamente a respeito do assunto, porque eu estou um pouco desfamiliarizado com os termos. (Professor César)
A professora Patrícia falou o seguinte: “Na minha formação só vi, aprender, que é bom,
nada”. Percebo então que os professores tiveram em sua formação, em algum momento, uma
disciplina ou outra que trabalhou com conteúdos de ritmo e atividades rítmicas, uma vez que
citaram ter, em sua grade curricular, disciplinas que trabalham esse conteúdo, como o Ritmo e
movimento criativo e a dança. No entanto, ao falar dos termos específicos, como
corporeidade, ludicidade e linguagem corporal, o professor César parece não ter segurança
com os termos, e a professora Patrícia foi clara em dizer que só aprendeu com sua prática,
mas não negou que tenha visto, talvez por também não se lembrar mais.
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Borges (1998) aponta que os professores, quando notam os limites dos seus saberes
pedagógicos, são levados a fazer uma crítica à sua formação, que segundo ela é originada
pelos seguintes casos:
uma rejeição completa à formação anterior e uma supervalorização dos aprendizados da prática – o professor é responsável pelo seu próprio sucesso – reafirmando, de certo modo, a presença de uma dicotomia na relação teoria e prática nos cursos de formação; uma reavaliação da formação e dos cursos realizados – alguns foram válidos, outros não serviram para grande coisa, etc; julgamentos mais matizados segundo os quais a universidade não pode ser responsabilizada por uma “missão impossível” – formar o professor. (TARDIF apud BORGES, 2002, p.60-61)
Segundo Gori (2000), o professor, ao ingressar no mundo escolar, continua seu processo de
formação através do exercício de sua prática docente cotidiana. Aos poucos, vai se adaptando
e se apropriando de saberes de que necessita para exercer sua profissão. Assim, as soluções
para problemas apresentados podem ser buscadas junto aos colegas com maior experiência ou
mesmo no processo de construção dos saberes.
Para compreender melhor essa questão, e entender a maneira como desenvolvem seu
trabalho na Educação Infantil, procurei averiguar o conteúdo abordado para essa primeira fase
da educação da criança. Mesmo já tendo analisado o plano de ensino do professor César e a
matriz curricular da escola da professora Patrícia, essa questão dos conteúdos que trabalham,
bem como outros fatores que influenciam suas aulas, foram levantadas durante a entrevista:
Eu não diferencio muito porque aqui no colégio eu senti uma dificuldade a respeito do seguinte: o colégio tem um convênio com o sistema de ensino Anglo, e o Anglo até então não tem um plano de curso e de conteúdo para a área de Educação Física, está em formulação, mas ainda não está pronto. Então o que que ocorre, a minha dificuldade agora, quando eu entrei, foi relacionar o conteúdo da Educação Física para essa faixa etária e que estivesse condizente com o ensino Anglo, com a linha pedagógica do Anglo também, então eu tive que fazer uma adaptação. O que ocorreu, pra início talvez eu até não esteja correto, esteja faltando algo, mas eu tentei levar de jardim até quarta série mais ou menos os mesmos desenvolvimentos, os mesmos aspectos que eu tenho que trabalhar, o que eu diferenciei foi desenvolvimento, elaborei mais assim tipo, procuro puxar mais atividades mais desenvolvidas para as faixas etárias maiores e atividades menos... mais ligth, para turmas menores, mas eu tento trabalhar o conteúdo em si. O meu objetivo é sempre tentar desenvolver lateralidade, noção espaço temporal, coordenação motora; nas primeiras turmas não, mas nas maiorzinhas eu tento trabalhar coordenação motora fina também, esquema corporal, ritmo, no geral é isso. (Professor César)
Percebi na fala do professor César, que ele se sente inseguro quanto ao conteúdo que
trabalha pelo fato de a escola ter mudado sua linha pedagógica, e, por esse motivo, o Projeto
Político Pedagógico da Educação Física ainda se encontra em reestruturação para se adaptar
ao novo sistema, e por isso ele se baseou no PPP antigo para construir seu plano de ensino.
99
Sua insegurança também pode ter sido provocada devido à própria entrevista, pois, ao falar
em termos que ele admitiu ter dificuldade em conceituar, pode ter desconfiado que a presente
pesquisa buscasse justamente averiguar as atividades rítmicas e a linguagem corporal em suas
aulas6.
Essa preocupação do professor César em sua interação com a escola, lembra a
afirmação de Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002), a respeito de a Educação Física escolar
ser “construída na” e “construtora da” cultura escolar, portanto isso exige um pleno
envolvimento dos professores com o projeto político pedagógico da escola. E como o PPP da
escola, que contempla a Educação Física, onde atua o professor César, encontra-se em
reestruturação, fica uma lacuna entre a prática docente e o plano de ação da instituição,
gerando certa insegurança quanto a “o que fazer” e “como fazer”, mesmo tendo o antigo
projeto da escola em mãos, uma vez que este encontra-se defasado.
Seguindo o foco analítico dos conteúdos abordados nas aulas, a professora Patrícia
evidencia, em sua fala, que não entende o brinquedo cantado e a cantiga de roda como
conteúdo, o que confirma o fato de que ela não tem um conceito formado sobre atividades
rítmicas. Ela ainda apresentou certa dificuldade em citar os conteúdos que trabalha com essa
faixa etária:
Trabalho esquema corporal, trabalho com, eu não sei separar os conteúdos assim, das habilidades, como que é. Eu misturo, brinquedo cantado é o que? É conteúdo? Cantiga de roda? Jogos pré-esportivos, no caso assim pra terceira e quarta série trabalho mais com pré-esportivos. No pré é ritmo, brinquedo cantado, dentro da cantiga de roda, às vezes a própria musiquinha que eu coloco pra eles cantarem e bater palmas no ritmo da música, bater o pé, esquema corporal e lateralidade. (Professora Patrícia).
Essa insegurança da professora Patrícia, ao tratar daquilo que ela coloca em prática, foge do
que tem ocorrido na prática de docentes, pois é comum ver professores com discursos bem
articulados e um conhecimento teórico bastante vasto, mas que, na prática, não conseguem
aplicar o que geralmente aparece em seus discursos. Com essa professora ocorre o contrário:
ela não tem um excelente discurso, mas em sua prática faz aquilo que muitos falam e não
conseguem fazer.
Esse é um dado novo, pois até hoje tenho visto pesquisadores preocupados em como
fazer para que os professores, que têm um excelente discurso e enorme conhecimento teórico,
6 Isso pode ter ocorrido devido ao fato de que o objetivo da pesquisa não foi explicitado, em momento algum, aos sujeitos, na intenção de não influenciar as suas afirmações.
100
também possam ter uma boa prática. E agora encontro uma professora com uma boa prática
pedagógica, mas que não tem um discurso equivalente à sua prática.
[...] A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexidade crítica sobre as práticas de reconstrução permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência. (NÓVOA, 1992, p.25).
De acordo com Borges (1998), é possível caracterizar o saber docente como “o conjunto de
saberes que o professor possui não só no que diz respeito aos conhecimentos já produzidos
que ele transmite, mas também, ao conjunto de saberes que integram sua prática e com os
quais ele estabelece diferentes relações”. (p.50). Os saberes da experiência permitem aos
professores se afastarem daqueles alcançados fora dessa prática, tanto que, em seus discursos,
os professores dão prioridade àqueles que qualificam de “práticos ou da experiência”.
Percebo, então, que a formação desses professores tem influência em sua prática, uma
vez que, a partir daqueles conteúdos apreendidos durante a graduação, lhes foi permitido ter
pelo menos um mínimo de conhecimento para trabalhar com as crianças. Mesmo não se
lembrando de termos mais específicos, ou dizendo que só viu e não aprendeu, e que a
aprendizagem ocorreu somente com a prática, é possível perceber, nesses professores, que, de
uma forma ou de outra, a vaga lembrança dos conteúdos estudados durante sua formação
fornecem a base para que possam, pelo menos, buscar novos conhecimentos.
1.1.3 Prática cotidiana e as dificuldades encontradas
É possível perceber, nas instituições de ensino, que a prática cotidiana muitas vezes
traz diversas dificuldades para o bom desenvolvimento do trabalho docente. Essa situação é
provocada tanto por questões práticas, de espaço físico e recursos materiais, como por
dificuldades pedagógicas e/ou metodológicas. De acordo com Gori (2000), a escola, nos
últimos anos, tem vivido uma situação “calamitosa”, tanto no que se refere ao espaço escolar
e organização do tempo, como também nas condições materiais e físicas. E a Educação Física
é uma das disciplinas, que mais são influenciadas por esse conjunto de determinantes. Por isso
é sempre importante verificar se esses fatores não estão prejudicando o bom andamento do
trabalho do professor.
101
Em relação às dificuldades encontradas e que prejudicam o trabalho dos professores, é
possível perceber, através do depoimento da professora Patrícia, que o que mais a prejudica é
o espaço físico e material, e estes acabam prejudicando a realização de uma boa aula. Em
relação à organização das atividades, tempo de aula e planejamento, a professora explica que
a duração da aula é de quarenta e cinco minutos “cronometrados”, e ela organiza a aula de
acordo com a turma, sendo seu planejamento preparado nos fins de semana, em sua casa.
O professor César diz que encontra dificuldade em adaptação com a pedagogia do
colégio, sendo esta sua única dificuldade, já que a estrutura física e material é satisfatória. Ele
afirma que, por ter apenas uma aula de Educação Física por semana, para cada turma,
costuma planejar as aulas mensalmente, e organiza a aula conforme a turma, diferenciando as
atividades para o grupo de crianças maiores.
Ao tratar a respeito da contribuição da Educação Física para o ensino de outras
disciplinas, a professora Patrícia não conseguiu responder com firmeza, dizendo que acha que
contribui no sentido cognitivo da criança, permitindo que esta se torne mais atenta e
cooperativa. O professor César disse que, “com certeza”, essa disciplina contribui com as
demais, abordando a questão da interdisciplinaridade, mas demonstrou, através de seu
depoimento, um pouco de dificuldade em abordar o assunto. Quanto à profissão em si,
disseram:
Trabalho com crianças de cinco até mais ou menos doze anos. Só trabalho pra esse nível, graças a Deus. Trabalho nas duas unidades da escola Pedacinho do Céu, com o mesmo nível. Adoro! Gosto, prefiro os pequenos. (Professora Patrícia) Trabalho com crianças desde o jardim I até quarta série, por volta de três a quatro até, acho que no máximo dez anos. Trabalho em colégios estaduais com quinta e sexta séries e em um outro colégio também eu trabalho com ensino médio. Ao todo são quatro escolas. Só aqui no colégio eu trabalho com Educação Infantil. Gosto muito, gosto demais. (Professor César)
O fato de o professor César trabalhar em mais de dois colégios, e atender a Educação Infantil,
Ensino Básico, Fundamental e Médio, tem uma maior diversificação de faixa etária e nível
escolar, bem como de realidades, pois atende à rede pública e privada de ensino.
Em relação ao bem-estar profissional, a professora Patrícia, em entrevista, mencionou
aprazimento pela docência, mas mediante expressões faciais e tom de voz, naquele momento,
houve contradições entre o que falava e o que demonstrava. Isto permitiu verificar certo
estado de insatisfação na prática docente. Outras evidências durante as observações também
ajudaram a perceber seu mal-estar, pois em algumas aulas, quando perdia a paciência com
algum aluno, foi possível ouvi-la dizer: “não nasci para ser educadora”; em outros momentos,
102
demonstrava esse sentimento através de suas expressões faciais e corporais. Algumas dessas
circunstâncias foram registradas nas cenas 18 e 19.
CENA 18 – UM DIA DE DESÂNIMO
Quando a primeira turma chegou ao pátio, a professora Patrícia, da escola Pedacinho do Céu II, realizou as atividades com música e dança. Depois as crianças se espalharam fazendo um círculo. A professora foi até uma janela, onde havia deixado a bola, pegou-a, virou para as crianças que estavam conversando, e disse com expressão de desânimo: “Ai! Ai! Oh! Senhor! Porque não me fizeste rica, ao invés de bela?”.
CENA 19 – ASSISTIR DESENHO ANIMADO
Hoje, na Escola Pedacinho do Céu II, a professora Patrícia levou uma fita de vídeo com desenho animado do Pernalonga. Enquanto as crianças assistiam ao vídeo, a professora organizava os diários. Todos ficaram quietos e compenetrados, sentados em frente à TV e pareciam gostar dos desenhos. Eles conversavam um pouco, entre um desenho e outro, às vezes mudavam de lugar, e logo começou uma sessão de pedidos para ir ao banheiro, e pareciam não estar mais tão entusiasmados com os desenhos, conversavam mais do que prestavam atenção. A professora deu permissão a todos que pediam para ir ao banheiro, um de cada vez, e continuou a organizar os diários até o final da aula. Com a outra turma, a aula ocorreu da mesma maneira, mas as crianças foram mais impacientes, conversavam mais, deitaram, riram e se movimentaram o tempo todo, mas a professora não ligou, disse que era dia de fazer diário. (Foto 20)
103
Fig. 20 - As crianças assistindo desenho animado.
Essa cena apresentou um ambiente de descontração das crianças, que tanto ficaram dispersas
com o recurso didático proporcionado pela professora, quanto atentas ao desenho animado.
Essa “liberdade” concedida aos alunos pela professora é verificada tanto na cena 10 –
Dançando à vontade como na cena 19, que foi apresentada logo acima, e também nas cenas
20 e 21, que serão apresentadas a seguir.
A respeito do estado de mal-estar profissional apresentados pela professora Patrícia,
pode ocorrer o que Gori (2000) aponta como “ciclo de vida profissional” dos professores.
Segundo a autora, a carreira varia entre a luta pela sobrevivência e o entusiasmo por um
mundo novo. Assim, os professores se defrontam no percurso profissional: o despreparo para
a prática docente, com as dificuldades referentes à condição de trabalho. A necessidade de se
aceitar como professor pode desencadear reações de rejeição e desejo de abandono da
profissão.
No entanto, a professora também apresentou momentos de contentamento em algumas
atividades, demonstrando alegria através de expressão sorridente, de carinho e um cuidado
especial com as crianças. Em algumas cenas, mesmo de longe, sem sua interferência, a
professora ficava a observar as crianças e às vezes chamava minha atenção para que eu
reparasse a expressão de alegria desses alunos. E apesar de as cenas 20 e 21 denotarem certo
desinteresse da professora, por haver pouca ou nenhuma intervenção dela, isso também me
leva a pensar que, naquele momento, sua intenção/objetivo era de realmente proporcionar
104
momentos de liberdade para seus alunos, mantendo-se atenta a toda movimentação dos
mesmos.
CENA 20 – O DIA DO BRINQUEDO
Hoje na escola Pedacinho do Céu II, a aula de Educação Física foi livre para que as crianças das duas turmas brincassem com seus brinquedos que trouxeram de casa. Todos foram avisados com antecedência para que não se esquecessem. As crianças ficaram livres para brincar; havia carrinhos e bonecas de todos os tamanhos e tipos. As crianças trouxeram mais de um brinquedo e, a todo instante, os trocavam com os colegas, o que permitiu uma maior variação das brincadeiras. Algumas se divertiram muito, outras permaneceram mais quietas, mas todas brincaram. Meninos e meninas não se misturaram muito. A segunda turma, depois de algum tempo da aula, faz uma roda, alternando uma criança e uma boneca; pegam nas mãos, formando um círculo e começam a cantar “Atirei o pau no gato”. Enquanto as crianças brincam, a professora permanece sentada, observando sem interferir. A todo instante as crianças trocam os brinquedos e brincadeiras até o final da aula, quando recolheram os brinquedos e voltaram para a sala de aula.
Fig. 21 - Os meninos com seus carrinhos.
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Fig. 22 - As meninas com suas bonecas.
CENA 21 – FUTEBOL
A aula de hoje na escola Pedacinho do Céu II foi toda voltada para o futebol. A professora Patrícia separou a turma em pequenos grupos de quatro crianças, pois o espaço é pequeno. Assim, enquanto uns jogavam, os outros permaneciam sentados esperando sua vez; a professora também ficou sentada marcando o tempo para ir alternando os grupos. Enquanto ficavam sentados, aguardando a vez de jogar, as crianças torciam pelos colegas, conversavam e se entusiasmavam com a proximidade da vez de jogar. Os meninos ficaram muito empolgados e se divertiram muito, quase não agüentavam ficar sentados olhando os colegas jogarem, queriam a todo instante entrar e jogar.
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Fig. 23 - Os meninos jogando futebol
Fig. 24 – As meninas também jogam.
107
As imagens apresentam, então, a liberdade das crianças nessas duas atividades trabalhadas
pela professora Patrícia, sem muita intervenção de sua parte. Durante a cena 20, era visível a
expressão de satisfação da professora, ao perceber que as crianças estavam gostando da
atividade. Durante a cena 21, as crianças, mesmo sentadas esperando a vez de jogar, ficaram
radiantes, torcendo, gritando, enfim, demonstrando um estado de grande prazer. Ao ver essa
felicidade das crianças, a professora também sorria. Nessas oportunidades, foi possível
verificar um estado de bem-estar dessa professora, isso significa que a profissão pode
provocar tanto momentos de mal-estar, como de bem-estar.
O professor César não demonstrou, em nenhum momento, esse estado de mal-estar em
relação à sua profissão. Tanto em sua fala e expressão, durante a entrevista, quanto em suas
reações durante as aulas observadas, demonstrou satisfação com o ofício.
Passo agora a abordar a questão da sensibilidade e percepção do professor em relação
ao seu olhar para a linguagem do corpo da criança.
1.2 A percepção do professor quanto à linguagem corporal da criança
Para conseguir realizar a leitura de uma linguagem corporal, é necessário que se tenha
os sentidos de percepção e sensibilidade bem desenvolvidos e atentos, pois, para fazer essa
leitura, é necessário antes, uma observação atenta para os movimentos realizados pelo corpo.
Segundo STOKOE (1987), a expressão corporal é movimento e linguagem imediata que
permite ao homem expressar-se sem necessidade de evocar outros elementos que não estejam
propriamente no corpo. O ser humano consegue, através de seu corpo, sentir, conhecer e
manifestar-se através de suas atividades e movimentos.
Rector e Trinta (2003) salientam que a comunicação corporal se confunde com a
própria vida. Comunicar é agir sobre a sensibilidade de alguém, procurando convencê-lo,
induzi-lo ou mobilizá-lo, sendo o corpo humano um recurso eficiente sempre que desejamos
compartilhar emoções, idéias, ou mesmo emitir ordens. Portanto, é essa a comunicação do
corpo, que, mesmo sem uma intenção determinada de se comunicar, noticia ou delata o que
pensamos e o que somos.
É a percepção e a sensibilidade das pessoas que lhes permitem fazer essa leitura das
mensagens produzidas pelo corpo dos sujeitos. Nesse sentido, esta categoria de análise vem
justamente com a intenção de compreender como se dá essa sensibilidade e percepção do
108
professor de Educação Física em observar-interpretar-registrar, um termo que é caro a Gomes,
as mensagem produzidas pelo corpo da criança. Pretende, verificar, também, a existência ou
não de uma relação entre a atividade rítmica e a linguagem corporal através das atividades
trabalhadas nesse contexto. Dessa forma, para compreender melhor como vem sendo
abordada a questão da linguagem corporal das escolas pesquisadas, apresento, a seguir, as
atividades expressivas ocorrentes nas escolas e a percepção e sensibilidade dos professores
para a linguagem do corpo das crianças em suas aulas.
1.2.1 As atividades expressivas na escola
Na escola Pedacinho do Céu II, a professora Patrícia trabalhou bastante a expressão
corporal das crianças, através não só do brinquedo cantado e cantigas de roda, mas também de
atividades de imitação e mímica. Ela utilizou a imitação de animais ou de pessoas, sentidos e
sentimentos. As cenas e fotos, a seguir, demonstram essas atividades:
CENA 22 – MÍMICA E IMITAÇÃO
A professora Patrícia, vez ou outra, trabalhou atividades de imitação e mímica, às vezes alternando com o brinquedo cantado. Hoje imitaram sapo, aranha, cavalinho de pau, Saci Pererê, girafa, caranguejo, entre outros. À medida que a professora lembrava, cantavam uma música que falava de algum bicho que deveriam imitar como a Dona Aranha, o Sapo, o Caranguejo. Foi uma aula que utilizou bastante a expressão corporal das crianças. (Foto 25).
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Fig. 25 – Imitando Caranguejo
CENA 23 – VOLTA À CALMA
As atividades de relaxamento ou volta à calma, na escola Pedacinho do Céu II, em sua maioria, são de imitação, ou canções mais calmas. A professora começa a falar, e as crianças vão fazendo os movimentos de cheirar a flor, respirar fundo, encher o pulmão e soprar a vela, sentir muito frio, muito calor, fazer careta de quem comeu pimenta, depois um chocolate, fazer de conta que estão tristes, chorando, alegres, dando muita gargalhada, com sono e dormindo. A professora vai falando e as crianças imitando, até dar o momento de voltarem para a sala. (Fotos 26 e 27)
110
Fig. 26 – Expressão de quem está dormindo.
Fig. 27 – Expressão de quem está comendo um chocolate.
111
Estas cenas e fotos apresentam o trabalho de expressão corporal da criança, que é
desenvolvido pela professora Patrícia em suas aulas. Esse tipo de atividade leva a criança a ter
um progresso mais apurado de sua expressão corporal. Queirós (2002) confirma que os
brinquedos cantados, devido à dramatização da letra, são essenciais para essa atividade, pois
auxiliam para/no desenvolvimento da expressão corporal, uma vez que esta se utiliza de muita
expressão facial, gestos e deslocamentos. Portanto, posso acrescentar, a partir dessa afirmação
da autora, que as brincadeiras de mímica e imitação também se encaixam nas atividades de
dramatização, além de também serem essenciais para o progresso da expressão e linguagem
corporal, uma vez que estas estão interligadas.
Acrescento aqui, também, a afirmação de Gonçalves (1994) de que a experiência
corporal é fundamental para seu desenvolvimento, logo, o processo de comunicação precisa
ser incitado para progredir em todos os aspectos. E Brikman (1989) salienta que a pessoa
adquire consciência de seu próprio corpo através do movimento dentro de um contexto e de
um tempo. A expressão corporal deve ser compreendida em suas diversas possibilidades e
significados: “saber que se é e sentir-se como se é”; proteger sua glória corporal; comunicar-
se com os outros e consigo mesmo; aceitar-se corporalmente.
As crianças da escola Pedacinho do Céu II confirmam gostar das atividades de
imitação quando falam do que mais gostam, e também do que fazem na escola. As
mencionadas como prediletas foram as brincadeiras de imitação de animais, principalmente,
sapo, onça e elefante, mas outras também foram citadas, como mostram alguns depoimentos
a seguir.
Gosto de imitar o soldadinho, leão, cobra, peixinho, de fazer careta. (P1- 5 anos) Gosto de imitar o Saci Pererê, sapo, fazer careta. (P3 – 5 anos). Gosto de todas. Gosto de imitar a cobra. (P6 – 5 anos) Humhum, de imitar eu gosto. Imito touro, porque ele é bravo. (P7 – 5 anos) De imitar? Huhum! Gosto. Dormir, deitar. (P8 – 5 anos) Gosto de imitar também. Ah!! tem vez que eu imito sapo, elefante, boi e vaca. Eu gosto de imitar cachorro. (P9 – 6 anos). Gosto de imitar elefante, onça. (P11 – 5 anos)
Apenas uma criança se divergiu das demais e disse que não gosta de imitações. Partindo dos
depoimentos, percebi que as crianças brincam na escola Pedacinho do Céu II em vários
momentos como na entrada e saída da escola, no recreio, às vezes na sala com a professora,
112
além das aulas de Educação Física. E dentre as brincadeiras de que mais gostam, apontaram
correr, “piuí” (trenzinho), pique-pega, amarelinha, pique esconde, pular corda, jogar bola e
boliche. Quatro crianças citaram algumas brincadeiras de que menos gostam: corre cutia,
pular corda e “piuí”. Os demais disseram que gostam de todas as brincadeiras. As crianças
dessa escola se movimentam bastante, são muito ativas, o que é uma vantagem muito grande,
pois, segundo Brikman (1989), o movimento constitui elementos que se integram e dão
suporte ao trabalho que compromete a totalidade humana. A pessoa que se movimenta
permanece em estado de contínua renovação e se torna transparente para sentir o que acontece
com ela nos níveis emocional, mental e corporal.
No colégio CESUT, esse tipo de atividade de imitação foi pouco observado,
apresentando-se mais em algumas variações de pique-pega, quando o professor dizia, por
exemplo, que eles seriam os “Elefantes narigudos”. Mas na maioria das vezes, apenas era
introduzida a atividade contando uma historinha, mas não era solicitado que as crianças
imitassem os movimentos, ou animais. Não foram observadas, em nenhum momento,
atividades que promovem uma expressão em relação aos sentidos e sentimentos, o que
permite dizer que o professor César quase não trabalha com atividades de dramatização, que
proporcionem o melhor desenvolvimento da expressão e linguagem corporal. Mesmo sendo
pouco trabalhada pelo professor César, as crianças disseram que gostam, dentre outras
atividades, daquelas brincadeiras de imitação, como mostram alguns depoimentos:
Eu gosto de imitar gente, bicho, eu imito minha mãe. Meu pai eu não imito porque ele é bravo. (C1 – 6 anos). Eu gosto de imitar cachorro, galo, galinha, gente. Minhas primas, meu avô e meu pai. (C2 - 5 anos). Imito elefante, onça, coelho, canguru, sapo e só. (C3 – 6 Anos) De imitar gosto também. Imitar macaco e porco e uma galinha. (C10 – 6 anos) Gosto de imitar elefante, gosto de imitar cobra, gosto de imitar cachorro, gato. (C11-5 anos) De imitação eu gosto, tem uma imitação que todo mundo começa a rir. Gosto de imitar o burro capeta. (C12 – 6 anos)
Das doze crianças, apenas uma disse que não gosta das atividades de imitar. Pude
observar ainda que todas as crianças disseram que gostam de brincar na escola e ocupam os
mais diversos lugares que conseguem explorar, como o pátio, a quadra, o parque, utilizando
113
os momentos de recreio e o horário de saída, para se divertirem. Dentre as brincadeiras
prediletas, foram citadas pular corda, pique-pega, correr e pular, mas o mais citado foi o
parquinho, pois todas as crianças disseram que gostam muito de ir para lá. Entre as atividades
de que menos gostam, uma citou o morto vivo; duas disseram que é o esconde-esconde; uma
disse que não gosta de correr e outra, que não gosta de pique-pega. Foi possível notar que
essas crianças são cheias de energia, por isso, acredita-se que estão abertas a muitas outras
atividades.
A expressão corporal funcionaliza a linguagem do corpo em suas estruturações, componentes e desenvolvimentos. Por isso, sua prática leva à manifestação da personalidade, a um conhecimento e uma consciência mais completos, para fora e para dentro de si mesmo e, enfim, a uma comunicação fluida, capaz de promover uma profunda transformação da atitude básica da personalidade. Esses fatos justificam uma cuidadosa atenção ao processo da expressão corporal e seu aprendizado. (BRIKMAN, 1989, p. 16).
Percebo, através da afirmação de Brikman, a necessidade de se trabalhar as atividades de
expressão corporal, para que a criança tenha uma aprendizagem que proporcione um
conhecimento de si mesma, permitindo adquirir novos símbolos para sua linguagem corporal.
Percebi que as crianças das duas escolas movimentam-se bastante, independentemente
da aula de Educação Física. Se há um espaço pelo qual podem se movimentar, elas o fazem.
Por isso, acredito que estão abertas a novos conhecimentos, só precisam da mediação de seus
professores para adquirirem novas capacidades. Isto coincide com a afirmação de Queirós
(2002) de que, ao utilizar atividades que sugerem a mímica, e mesmo deslocamentos com
gestos, é possível se chegar a uma expressão de conteúdo através do corpo.
Ao analisar como vem sendo tratada a questão da linguagem corporal da criança que
se manifesta através de suas expressões corporais nas aulas de Educação Física, busquei
observar o olhar do professor para essa linguagem do corpo da criança. Apresento, no tópico a
seguir, as cenas que mostraram essa sensibilidade e percepção dos professores durante as
observações.
114
1.2.2 A percepção e a sensibilidade dos professores: a linguagem corporal nas aulas
de Educação Física
Neste momento, procuro compreender como se dá a percepção e a sensibilidade dos
professores de Educação Física pesquisados, uma vez que eles estão a todo o momento
lidando com o corpo. Mesmo entendendo que cada um pode sentir e perceber de forma
diferente as manifestações corporais, é possível fazer essa observação perante a revelação dos
símbolos de linguagem do corpo. Segundo Seibert e Santos (2002), as percepções e os
sentidos são construídos historicamente e são inscritos nos indivíduos de maneiras diferentes;
alguns têm essas habilidades menos claras, ou menos exatas, outros não conseguem
compreendê-los. Nesse sentido, é necessário que sejam revistos e resignificados.
Durante minhas observações de campo, percebi que os professores, sujeitos desta
pesquisa, não conseguem, ou não fazem questão, de realizar uma leitura dos corpos de seus
alunos, como demonstram as cenas e fotos a seguir:
CENA 24 – VER CLIPE E OUVIR MÚSICA, SEM PODER SE MOVIMENTAR
A professora Patrícia chega com os alunos no salão da igreja e diz que irão assistir ao vídeo da Xuxa, mas que deveriam permanecer sentados e em silêncio para prestar atenção e aprender as músicas; caso contrário, iria mandá-los de volta para a sala de aula. Eles ficaram quietos por algum tempo, mas não resistiram e logo começaram a cantar e seguir os passos da música, assim como ensina no vídeo, mas ainda sentados. Logo, alguns se levantaram e a professora mandou que sentassem e ficassem quietos. Levantaram-se novamente e a professora, mais uma vez, ordenou que se sentassem. Eles permaneceram uns dois minutos quietos e já começaram a se mexer novamente. Ao passar a música do “Thuthucão”, todos se levantaram, cantaram e dançaram, mas, ao término da música, a professora pediu que se sentassem novamente. Nesse momento, começaram a conversar, então a professora desligou tudo e disse que, se não prestassem atenção e ficassem quietos, iriam voltar para a sala. As crianças pareciam gostar muito, mas não podiam se levantar. Até os mais tímidos estavam mais soltos, e mesmo sem levantar continuavam fazendo os movimentos da música e cantando. Quando ainda faltavam treze minutos para o encerramento da aula, a professora os levou de volta para a sala. As fotos, a seguir, mostram como foi para as crianças esse dia.
115
Fig. 28 - As crianças sentadas assistindo ao vídeo da Xuxa.
Fig. 29 - As crianças dançando sentadas
116
A cena 24, bem como as imagens, apresenta a vontade das crianças de levantarem e
dançarem. A foto 28 mostra, através das expressões corporais, que as crianças pediam o
tempo todo para se levantar e dançar, mas elas não foram ouvidas. Mesmo quando não
agüentavam e começavam a se levantar e a se mexer, como mostra a foto 29, a professora
não lhes permitia isso, mandando que voltassem a se sentar e a ficarem quietos novamente.
Nesse sentido, percebo que a professora Patrícia, embora trabalhe bastante com atividades
que levem a uma expressão e linguagem corporal, não foi capaz, durante essa cena, de fazer a
leitura desses corpos infantis, ou mesmo não quis fazê-la, uma vez que era uma linguagem
tão clara. Essa situação também pode ser verificada na cena 19, descrita no tópico anterior -
que a linguagem do corpo dessas crianças não está sendo ouvida.
De acordo com Seibert e Santos (2002), essa situação de não aceitação/interpretação
da linguagem corporal da criança pode estar ligada à formação do professor:
O educador muitas vezes vem de uma formação segmentada, rígida, contaminada pelos juízos de valor construídos e consolidados culturalmente, o que pode levar a uma construção pessoal deficitária, que dissemina todas essas “cargas” pelo seu ambiente de trabalho, podando possibilidades inovadoras. (SEIBERT e SANTOS, 2002, p. 02).
Segundo essas autoras, as heranças sócio-culturais refletem sobre a compreensão do corpo e
como cada sujeito se vê e se relaciona com o próprio corpo. O medo, a alienação, o
preconceito, entre outros, estão fixados e tomam valor. Mudar significa, entre outras coisas,
reconhecer imperfeição, equívocos e incompletudes e, sobremodo, solicita coragem de
aceitar e conduzir perdas, e ousadia para se embrenhar em novas aprendizagens. Essa questão
da rigidez foi muito observada nas ações da professora Patrícia, durante muitas atividades, e
talvez isso, conforme as autoras ressaltaram, é que não tem permitido que ela enxergue seus
alunos de forma diferenciada, com um olhar mais atencioso para a linguagem corporal dessas
crianças.
No Colégio CESUT, a situação não foi diferente, uma vez que o professor César não
varia muito as suas atividades; todos os dias tem pelo menos uma ou duas brincadeiras de
pique-pega ou, quando trabalha outra atividade, ele permanece muito tempo na mesma, o que
acaba provocando o desinteresse das crianças. As cenas, a seguir, apresentam algumas
situações:
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CENA 25 – BOLA AO ALTO, BOLA AO TÚNEL, BOLA LATERAL
O professor César, do colégio CESUT, dispôs os alunos em uma única fila e lhes explicou a atividade, que seria bola ao alto, quando as crianças passariam a bola para o colega de trás, por cima da cabeça. Depois ele usou algumas variações: passar a bola por baixo das pernas (bola ao túnel) e pelo lado (bola lateral). Ele utilizou um tempo grande da aula com essa brincadeira, cerca de oitenta por cento. Logo as crianças ficaram inquietas, não prestavam atenção, conversavam, deixavam a bola cair, não pegavam a bola, faziam de qualquer jeito e saíam da fila a todo instante. O professor continuou a atividade, chamando a atenção das crianças para que prestassem atenção, ficassem na fila e fizessem o que lhes foi proposto.
CENA 26 – BRINCADEIRA CHATA
O professor César iniciou a aula com a atividade “Coelho sai da toca” e foi utilizando diversas variações para a mesma. Quatro meninas não paravam quietas, estavam a todo instante se afastando do grupo e ficavam sentadas conversando; o professor as chama e elas voltam, mas, minutos depois, tornam a se afastar. Após mais ou menos 15 minutos, muda-se a atividade para “O lobo manco”, uma variação do pique pega. Nesse momento, as quatro meninas se afastam novamente e se sentam no muro da quadra. Não foi a primeira vez que fizeram isso. Em várias aulas verifiquei essa reação, não só essas meninas especificamente, mas outras crianças também. Nesse dia ouvi quando elas comentaram uma com a outra. Uma diz: “Essas brincadeiras tá muito chata, eu não quero brincar disso não”. A outra: “Nem eu, vou ficar aqui mesmo que tá melhor”. (Fotos 30 e 31)
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Fig. 30 - As meninas sentadas no muro por não gostarem da atividade.
Fig. 31 – Em outra aula, as meninas sentadas novamente.
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Através destas cenas e fotos apresentadas, foi possível notar mais uma vez, embora em outra
escola, que as crianças não foram ouvidas. Isso é perceptível não só pela expressão corporal,
mas também pela verbal, que as crianças não estavam gostando da brincadeira. Muitas vezes
foi possível presenciar as crianças dizendo verbalmente para o professor que não gostavam de
certa atividade e mesmo assim ele continuava, sem fazer alterações para as aulas seguintes.
De acordo com Schwartz (1997, p.105), talvez o fato de
não ter bem desenvolvido o processo de comunicação corporal e, a própria expressividade, é que o professor não seja estimulado a fazer uso de experiências mais prazerosas e menos agressivas, mais reflexivas e menos mecanizadas, levando a Educação Física a assumir um caráter mais de prática pela prática e não de práxis (prática reflexiva).
A autora aponta para a urgência de se tomar o corpo como veículo de comunicação e de
expressão, pois esta é uma maneira de se estar no mundo carregado de sentimentos, afetos e
buscas muitas vezes contidas durante o processo de escolarização, fato que vem ocorrendo
nas duas escolas pesquisadas.
Através do depoimento das crianças das duas escolas, percebi que a maioria delas
gosta das aulas de Educação Física, tendo como principais justificativas o fato de ser bom,
legal, divertido e porque brincam muito. Apenas uma aluna do colégio CESUT disse não
gostar das aulas, conforme mostra em sua fala:
Não, porque é enjoada, a aula é enjoada. Eu não gosto de nada, eu gosto de ficar no murinho. Porque eu acho chato. Não gosto de nada. Fico sentada lá no murinho, com minhas colegas. Se eu não gosto, eu não brinco, pergunto para o professor se eu posso ir beber água. (C1 – 6 anos).
Procurei saber, então, o que as crianças costumam fazer quando o professor passa uma
atividade de que elas não gostam. Na escola Pedacinho do Céu II, a aluna P4 de 5 anos disse
que, quando não gosta da brincadeira, ela não quer brincar, então se senta ou faz outra coisa;
P5 de 5 anos, disse: “Eu faço o que ela pede”; e as demais crianças disseram que brincam,
mesmo não gostando.
No colégio CESUT, quatro crianças disseram que não brincam, que ficam sentadas ou
encostadas no murinho olhando. As outras crianças disseram que brincam assim mesmo,
apenas outras quatro crianças responderam que fazem o seguinte: “Tem hora que eu fico
sentada lá olhando” (C3, 6 anos); “Eu falo assim: Eu quero ficar no último na fila!” (C4, 5
anos); “Eu tenho que brincar” (C6, 6 anos); “Só eu falo assim: Professor, eu não gosto desta
brincadeira. Mas ele não faz nada” (C12, 6 anos). Com isso, verifiquei que apenas duas
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crianças da Escola Pedacinho de Céu II disseram que não querem ou não brincam quando não
gostam, talvez seja devido à rigidez da professora que, quando percebe que as crianças não
estão afim da brincadeira, chama a atenção das mesmas e as fazem voltar para a atividade. As
crianças do colégio CESUT reivindicam quando não gostam da atividade, ou se expressando
verbalmente ou se expressando corporalmente, saindo da atividade, mas, pelo que foi
analisado, o professor não observa ou não se importa com essas manifestações, também não é
rígido quanto a isso; às vezes ele chama as crianças para a atividade novamente, mas, na
maioria da vezes, deixa as crianças quando estas dizem que não estão gostando da
brincadeira, só que não modifica nada, continua naquela atividade. De acordo com Goellner
(2003), a educação do corpo e suas manifestações devem ser entendidas como promotora do
desenvolvimento espontâneo da sensibilidade, permitindo a capacidade de o ser humano
sentir com o coração, ver com os próprios olhos, e não ser governado a não ser pela sua
própria razão.
Para averiguar melhor esta questão, procurei, através do depoimento dos professores,
analisar a compreensão deles a respeito da linguagem corporal, bem como verificar se eles
conseguem, através de sua sensibilidade, ler as mensagens produzidas pelo corpo das
crianças. Assim, foi possível verificar, através de suas declarações, que eles conseguem
identificar algumas mensagens, porém mais relacionado aos sentimentos, quando vêem que as
crianças estão gostando ou não da atividade.
A linguagem corporal é a forma que a criança se expressa através do seu corpo. Fazer uma leitura corretamente, acredito que não, mas ajuda bastante. Nos gestos da criança, olhando, observando os gestos, às vezes você pergunta alguma coisa para confirmar aquilo ali ou então não afirmar. Consigo perceber se ela está sendo agradada pelo que está acontecendo, se está tendo prazer, se está irritada, ou achando aquilo chato, se ela quer que acabe logo, porque ela fica inquieta; quando a criança está gostando ela participa, então o corpo dela, os gestos dela estão voltados para acompanhar aquela atividade. Agora quando a criança..., se é uma coisa que ela não está gostando, e ela não tem interesse, ela fica inquieta e geralmente tudo que ela faz é pra atrapalhar a brincadeira. Ás vezes, tem uns que eu consigo, outros não. (Professora Patrícia). A criança vai te dizer, através de seus movimentos, seus comportamentos durante as atividades que você propõe nas aulas. Ela te diz como é que é o seu comportamento, temperamento, o que que aquela criança está vivendo no momento, tanto no âmbito escolar, quanto no âmbito familiar, se ela está tendo algum problema, tudo isso. Se você tiver um conhecimento mais aprofundado, não estou dizendo que eu tenha não, até falta um pouco, mas conversando muito com a coordenadora aqui do colégio, com a psicodedagoga, trocando uma idéia, me dando vários conselhos, eu cheguei a essa conclusão, junto com ela, que as crianças, através do movimento, tem como a gente observar muita coisa. Se você observar bem, você consegue chegar aos problemas que ela tem ou as inquietações, com as dúvidas com várias questões relacionadas a essas crianças. Já consegui várias vezes, já tem vários casos que consegui e têm outros que
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depois a própria professora que me ajudou com outro acontecimento dentro de sala que ela falou, que aí eu liguei um acontecimento ao outro, aí eu liguei e consegui entender. Eu tenho que aprofundar mais a respeito, porque eu não tenho tanto essa visão não, eu posso aprender mais a respeito. Eu vejo também da mesma forma, não é completo, mas eu vejo assim a preocupação, citando como exemplo meninas mais gordinhas preocupadas com a gordura, de não querer participar de uma determinada atividade por causa dela ser mais pesada, por exemplo, ter que correr. Já vi exemplo de meninos preocupados porque é magro de mais, no geral é superficialmente. (Professor César)
Percebi, através dessas declarações, que nenhum dos professores parece ter um conhecimento
mais sistematizado e aprofundado do assunto, o que me leva a dizer que, talvez, seja por isso
que não observam, não interpretam e não registram as mensagens que as crianças transmitem
através do corpo.
Seibert e Santos (2002) afirmam que é preciso alcançar a compreensão de que a
necessidade do aluno implica numa doação do nosso fazer pedagógico. A maneira que as
pessoas sentem sua consciência corporal e como elas vivem sua prática corporal é fator
determinante do modo como elas se incluem num grupo social. Então, os professores que
estão ensinando hoje foram educados através do modelo racionalista, no qual a questão do
corpo e da corporeidade não era valorizada. Mas isso não deve ser visto como um
impedimento, e sim como um meio motivador que possibilitará uma “qualificação da vida
pessoal e profissional do professor” (p.03).
Em atenção à importância da relação atividades rítmicas / linguagem corporal para o
desenvolvimento da criança, os professores proferem:
A criança, ela aprende a se organizar, ela aprende a trabalhar em grupo, exige dela, mesmo assim às vezes gestos, movimentos, que às vezes ela perde, mas às vezes ela aprende, que ela acha complicado, porque ela está trabalhando em grupo e é uma atividade dentro de um limite de tempo e espaço e depende de outra pessoa pra dar continuidade. Às vezes a criança tem essa dificuldade, umas aprendem, gostam, tentam em casa, outras já desistem e não querem fazer mais. (Professora Patrícia) Acho muito importante, ela faz parte desse conteúdo que vai auxiliar essa criança na maturação dela corporal, é muito importante. Através dessas atividades rítmicas elas conseguirão cada vez mais desempenhar movimentos mais elaborados e conseqüentemente vai auxiliar nessa linguagem corporal. (Professor César)
É possível notar que a professora Patrícia não conseguiu abordar mais profundamente a
relação existente entre atividade rítmica e linguagem corporal, bem como não fez referência
sobre a importância dessa relação. O professor César consegue ver a importância dessa
relação, no entanto, não consegue colocá-la em prática.
122
Mesquita (1997) entende que o reconhecimento pelo professor de Educação Física, da
existência e da importância de um modo não-verbal, expresso através do corpo e do
movimento do ser humano, é de fundamental importância para que se possa promover, assim,
a interação da criança com outras pessoas, através da relação corpo e movimento e cognitivo.
Percebo que os professores pesquisados reconhecem essa importância da linguagem corporal,
mas não conseguem abordar o assunto de forma mais aprofundada, como também não
conseguem aplicá-la em sua prática.
Em síntese, compreendi que as atividades rítmicas estão presentes na Escola
Pedacinho do Céu II, não só na aula de Educação Física, mas em outros momentos e que as
atividades de expressão corporal são bem exploradas. No Colégio CESUT, essas atividades
quase não aparecem, elas estão mais presentes em ensaios para apresentações festivas.
Também percebi que os professores das duas escolas não conseguem fazer uma leitura da
linguagem corporal de seus alunos, pois, mesmo afirmando em seus depoimentos que
conseguem perceber quando a criança está gostando ou não da atividade, que seus gestos e
suas ações corporais permitem perceber seus sentimentos, essa percepção, que disseram ter,
não foi observada em sua prática. Pelo contrário, nem a mais simples mensagem de que não
estão tendo prazer na atividade, ou a manifestação de suas vontades não foram observadas, e
por isso também não foram interpretadas e registradas pelos professores.
123
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Nesse momento, não se visa oferecer respostas, mas sim sintetizar e sistematizar
algumas análises sobre as questões norteadoras do estudo que se referem aos elementos do
movimento rítmico e expressivo nas aulas de Educação Física para a Educação Infantil. O
objetivo inicial foi compreender como as atividades rítmicas, enquanto componentes
constituintes da linguagem corporal, vêm sendo trabalhadas na Educação Infantil. A partir
deste, surgiram outros objetivos, mais específicos, que foram de fundamental importância
para o desenvolvimento do estudo, pois busquei analisar onde e quando as atividades rítmicas
acontecem e estão mais presentes; a existência ou não da relação entre atividade rítmica e
linguagem corporal; se as crianças conseguem utilizar o corpo para se comunicarem; e a
percepção e a sensibilidade do professor em observar-interpretar-registrar as mensagens
produzidas pelo corpo da criança.
Para a realização desse trabalho parti do conceito de atividades rítmicas atribuído por
Queirós (2002), que são exercícios, cujo movimento natural é o princípio básico,
desenvolvidos naturalmente, com sons ou música. Busquei, na realidade pesquisada, a
possibilidade de algumas reflexões acerca das atividades rítmicas e da linguagem corporal.
Contudo, compreendi que, na escola Pedacinho do Céu II, as atividades rítmicas estão
presentes tanto nas aulas de Educação Física, como em sala de aula e em outros momentos
como o recreio, a chegada à escola e minutos antes da saída. Nas aulas de Educação Física,
essas atividades acontecem em diversos momentos da aula, não demonstrando ser apenas
atividades de aquecimento ou relaxamento, ou seja, elas fazem parte da aula como um todo.
Para a realização dessas atividades, a professora se utiliza das cantigas de roda, brinquedo
cantado e jogos ritmados que, conforme Queirós (2002), são apontados como diversos termos
para designar a atividade rítmica.
No colégio CESUT, percebi que as atividades rítmicas estão praticamente ausentes nas
aulas de Educação Física, pois, em quatro meses de observação, foi possível verificar que elas
ocorreram em algumas aulas, sendo observada uma cantiga de roda realizada como
relaxamento, um brinquedo cantado e uma atividade com música como parte principal da
aula, e as demais manifestações dessas atividades ocorreram em ensaios para a quadrilha. Foi
possível perceber que essas atividades estão mais presentes em ensaios de apresentação em
comemoração a alguma data festiva, e geralmente são realizadas por outro professor que não
o de Educação Física. Queirós (2002) aponta que, durante muitos anos estas atividades
rítmicas, enquanto conhecimento da área de Educação Física, não se efetivavam na prática
pedagógica dos professores, apresentando-se somente como atividades lúdicas eventuais ou
proposição para apresentações com fins artísticos em dia de comemorações. Isso me permite
125
dizer que esta forma de tratar as atividades rítmicas ainda ocorre em tempo presente, como foi
verificado no colégio CESUT.
Encontrei uma discrepância entre as duas escolas, pois entendi que a professora
Patrícia, apesar de trabalhar constantemente as atividades rítmicas, não apresenta uma opnião
formada sobre o que vem a ser essa temática, desconsiderando o brinquedo cantado e a
cantiga de roda como conteúdos de atividade rítmica. Ela somente considera as atividades de
jogos ritmados. O professor César, por sua vez, conceituou as atividades rítmicas de maneira
mais apropriada, mas em suas aulas verifiquei pouca ocorrência dessas atividades. O motivo
dessa pouca freqüência parece ser a dificuldade do professor com sua expressão corporal, fato
que o prejudica em seu trabalho com esse conteúdo. Ele explica e reconhece sua deficiência, e
ao mesmo tempo demonstra interesse e necessidade em buscar mais conhecimento a respeito
do tema.
Buscando respostas para essa discrepância ocorrida, foi necessário observar como se
deu a formação desses dois professores para um trabalho com a Educação Infantil, e o que
analisei foi que a professora Patrícia mostrou certa insatisfação com sua formação, dizendo
que o que sabe aprendeu com a prática e não em seu curso de graduação. O professor César
mencionou que teve contato com tal conteúdo, em seu curso de Educação Física, mas que não
se lembra mais, e que por isso precisa buscar mais conhecimento e assim, talvez, possa
superar suas dificuldades. A professora Patrícia demonstrou, ainda, através das cenas de
observação e da entrevista, certa insatisfação também com sua profissão, o que pode ser
provocado pela condição de trabalho e o bem-estar com a profissão. Essa questão foi
explicada no capítulo anterior por Gori (2000) quando aborda que as condições de trabalho, o
preparo para a profissão, bem como a aceitação de ser professor pode provocar rejeição,
desinteresse e desejo de abandono da profissão. Essa insatisfação pode provocar também uma
falta de interesse em buscar e aprofundar novos conhecimentos. O professor César, em
nenhum momento, demonstrou descontentamento ou desinteresse com a profissão e com suas
aulas. Ele apresentou interesse em buscar novos conhecimentos e superar suas carências.
O corpo é fruto da interação natureza/cultura e por isso precisa ser entendido em sua
totalidade. Soares (2001) aponta o corpo e seus gestos como instrumento e técnica que
permitem a compreensão dos códigos que são revelados através dos mesmos. E Daólio (1995)
corrobora com isso, afirmando que o corpo se expressa, ele fala, mesmo em diferentes
culturas, portanto é necessário conhecer os diferentes símbolos representados nos diversos
corpos de sociedade e cultura diferente. Então, ao compreender a importância da linguagem
corporal para o desenvolvimento de uma criança, procurei compreender como anda esse
126
conteúdo nas aulas de Educação Física para os pequenos, pois é através desse
desenvolvimento que a criança poderá libertar sua expressividade corporal.
Percebi que a professora Patrícia trabalha bastante atividades que levam a uma
experiência expressiva corporal melhor desenvolvida. Ela consegue isso através das
atividades rítmicas que utilizam tanto o ritmo e a música, como a dramatização corporal da
letra da música, o que viabiliza o melhor desenvolvimento da expressão corporal da criança.
Além dessas atividades, ela trabalha com mímica e imitações, as quais permitem incluir as
sensações, sentidos e sentimentos, componentes essenciais para o enriquecimento da
linguagem expressiva do corpo.
Quanto a essas atividades expressivas, o professor César não aborda as mesmas em
sua aula; ele utiliza mais a fantasia e a imaginação em algumas atividades de pique-pega,
quando explica/introduz essa atividade, inventando sempre uma história, o que permite que as
crianças se entusiasmem mais. Para algumas atividades como o “Elefante Narigudo” e “Lobo
Manco”, as quais são variações de jogos de pique-pega, o professor utiliza-se da expressão
corporal, porém, por serem atividades de corrida, as crianças não conseguem uma
coordenação para as mesmas, e por isso não conseguem permanecer na posição proposta.
Pode ser ressaltado, ainda, que nas duas escolas a linguagem corporal das crianças não foi
observada pelos professores, que dizem saber o que é, mas só conseguem identificar/perceber,
quando a criança gosta ou não de uma atividade ou outra. Isso no discurso, porque na prática
essa leitura não foi percebida. Nenhum dos dois professores demonstrou, durante a pesquisa,
que observam essa linguagem do corpo da criança, então, se não observam, possivelmente
não conseguem interpretar e nem registrar tais mensagens. E mesmo a professora Patrícia, que
trabalha muitas atividades, que desenvolvem a linguagem e expressão corporal, ela não
apresentou uma observação dos corpos infantis para depois realizar a leitura, mas diz saber
identificar algumas mensagens. E o professor César se atrapalhou com as palavras e não
soube dizer o que realmente consegue ver através das mensagens produzidas pelo corpo da
criança.
Segundo Schwartz (1997), o que falta para os professores é se encararem
“mimeticamente”, em absoluta “brincadeira séria” de ensinar, assim conseguirão encarar a
noção real do simples prazer da realização das atividades lúdicas, que são reafirmadas através
das experiências culturais das crianças, e também seu valor como recriador e questionador no
desenvolvimento do brincar, permitindo a redescoberta dos sentidos através do agrupamento
do “brincar aprendendo”.
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Assim, acredito que o professor, ao se envolver com afinco nas atividades que
trabalha, participando junto com as crianças, tem possibilidade de se deixar descobrir por si
mesmo, uma vez que com seu corpo, pensamento e emoções, o homem é capaz de constituir
seus valores e afirmar sua capacidade de elevação.
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133
SCHWARTZ, Gisele Maria. Linguagem corporal de expressão da criatividade e seu (des)envolvimento na educação física. Revista Motriz - Volume 3, Número 2, Dezembro/1997. SEIBERT, Flávia Regina; SANTOS, Suzana Schuch. A expressão corporal na formação de educadores. Buenos Aires: Revista digital, 2002, ano 8, n. 55. Disponível em: <http://www.efdeportes.com>. Acesso em: 25 fev. 2006. SILVA, Edilayne Fernandes da. PINHEIRO, Maria do Carmo Morales. A educação infantil como campo de conhecimento e suas possíveis interfaces com a educação física. Revista Pensar a prática, Goiânia: UFG, vol. 5, p. 39-57, Jul./Jun. 2001-2002. SOARES, Carmem Lúcia. Corpo, conhecimento e educação: notas esparsas. In. SOARES, Carmem Lúcia (Org.). Corpo e História. Campinas: Autores Associados, 2001. p.109-130. STOKOE, Patrícia. Tradução: CANNABRAVA, Beatriz A. Expressão corporal na pré-escola. São Paulo: Summus, 1987. STRAZZACAPPA, Márcia. A educação e a fábrica de corpos: a dança na escola. Cad. CEDES, abr. 2001, vol.21, n. 53, p.69-83. ISSN 0101-3262. TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em Educação. São Paulo: Atlas, 1987. VAZ, Alexandre Fernandes. Ensino e formação de professores e professoras no campo das práticas corporais. In: VAZ, Alexandre Fernandes; SAYÃO, Deborah Thomé; PINTO, Fábio Machado (Orgs.). Educação do corpo e formação de professores – reflexões sobre a prática de ensino de educação física. Florianópolis: UFSC, p.85-102, 2002. VIGOTSKI, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 121-137. WINNICOTT, D. W. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975. p.59-77. WOLCOTT, H. W. Criteria for na ethnograhic approach to research in education. Human Organization, 34, 1975. ZURAWSKI, Maria Paula. O corpo e o movimento da criança de zero a seis anos. In: Revista Criança. Brasília: MEC, 1998, p. 19-21.
134
ANEXOS
135
ANEXO A – PLANO DE ENSINO DA DISCIPLINA EDUCAÇÃO FÍ SICA DO COLÉGIO CESUT
PLANO DE CURSO
EDUCAÇÃO FÍSICA
“RECREAÇÃO DIRIGIDA”
EDUCAÇÃO INFANTIL
2005
136
PLANO DE CURSO: PLANEJAMENTO ANUAL:
Escola: COLÉGIO CESUT Séries: EDUCAÇÃO INFANTIL – JARDIM I, II e PRÉ. Disciplina: EDUCAÇÃO FÍSICA Professor: “César” Ano: 2005
Objetivo Geral: Promover o desenvolvimento dos domínios motores, cognitivos e afetivos através da linha pedagógica sócio-interacionista. Objetivos Específicos:
- Incentivar a criatividade; - Propiciar a sociabilização favorecendo as crianças e a convivência; - Ampliar e enriquecer a base de experiência das crianças; - Favorecer o crescimento físico-mental e emocional; - Assegurar um bom ajustamento ao ambiente escolar; - Desenvolver o interesse e aptidões recreativas que poderão ser usadas par atividades
sadias posteriores; - Explorar diferentes qualidades e dinâmicas do movimento, como força velocidade,
existência e flexibilidade; - Apropriar-se gradativamente da sua imagem de corpo em seu aspecto global.
Conteúdo:
Dever abranger os aspectos expressivos e instrumentos do movimento organizados num processo continuo envolvendo múltiplas experiências corporais. Os diversos constituintes da cultura corporal através de brincadeiras, jogos, danças, atividades esportivas. Bem como conhecimentos sensitivos, esquema corporal, orientação espaço-temporal, coordenação motora grossa e fina, lateralidade, agilidade, flexibilidade, força, resistência, velocidade e expressão corporal, por meio de atividades classificadas como:
1 – Atividades Motoras 2 – Atividades Ritmadas 3 – Jogos Imitativos e de Criação
Metodologia:
- Atividades que envolvam o canto e o movimento simultaneamente possibilitando a percepção rítmica, o descobrimento do seu corpo e o contato físico;
- Atividades que possibilitam o contato do aluno com vários instrumentos de diferentes superfícies, texturas, temperatura e plasticidade;
137
- Atividades que promovam à criança a descoberta da sua expressividade bem como a diferenciação do outro;
- Jogos e brincadeiras que envolvam a interação, a imitação e o conhecimento do corpo; - Brincadeiras com diferentes ritmos como rápido e devagar, forte e fraco; - Alteração do espaço físico, utilizando os mais diversos materiais.
Recursos Didáticos:
Bolas de borracha Cordas Bambolês Cones Colchonetes Balões (papo de anjo) Bastões (cabo de vassoura) Jogos pedagógicos Bolas de futsal infantil Bolas de voleibol infantil Bolas de handebol infantil Bolas de basquetebol Pneus Cd’s infantis Aparelho de som portátil
Avaliação:
Deve-se partir do pressuposto que todas as crianças tem sua individualidade resguardada, assim como as suas experiências anteriores, chegando a conclusão que cada aluno deve ter a sua avaliação específica.
É importante observar as condições oferecidas para o desenvolvimento a fim de que as atividades sirvam, de forma a acompanhar e conhecer cada criança ou grupo.
É pertinente ressaltar que seu empenho e suas conquistas devam ser valorizados em função de seus progressos e do próprio esforço, evitando coloca-las em situação de comparação.
PLANO DE ENSINO ANUAL
Objetivo Geral:
Promover o desenvolvimento dos domínios motores, cognitivos e afetivos através da linha pedagógica sócio-interacionista. Turmas: Jardim I “A” e “B”; Jardim II “A”, “B” e “C”; Pré “A”, “B”.
138
Atividades:
1º Bimestre: -conhecimentos sensitivos;
-esquema corporal;
-orientação espaço-temporal;
-coordenação motora;
-equilíbrio;
-lateralidade;
-ritmo e movimento criativo.
Atividades motoras:
Atividades ritmadas:
Jogos imitativos e de criação:
-jogos de corrida; -jogos em fileira e coluna; -jogos em círculo.
-brinquedos cantados; -exercícios ritmados.
-atividades de repetição de movimentos; -jogos de criação.
2º Bimestre:
-conhecimentos sensitivos;
-esquema corporal;
-orientação espaço-temporal;
-coordenação motora;
-equilíbrio;
-lateralidade;
-ritmo e movimento criativo.
Atividades motoras:
Atividades ritmadas:
Jogos imitativos e de criação:
-jogos de corrida; -jogos em fileira e coluna; -jogos em círculo.
-brinquedos cantados; -exercícios ritmados.
-atividades de repetição de movimentos; -jogos de criação.
3º Bimestre:
-conhecimentos sensitivos;
-esquema corporal;
-orientação espaço-temporal;
-coordenação motora;
-equilíbrio;
-lateralidade;
-ritmo e movimento criativo.
Atividades motoras:
Atividades ritmadas:
Jogos imitativos e de criação:
-jogos de corrida; -jogos em fileira e coluna; -jogos em círculo.
-brinquedos cantados; -exercícios ritmados.
-atividades de repetição de movimentos; -jogos de criação.
4º Bimestre: -conhecimentos sensitivos; Atividades
motoras: Atividades ritmadas:
Jogos imitativos e de criação:
139
-esquema corporal;
-orientação espaço-temporal;
-coordenação motora;
-equilíbrio;
-lateralidade;
-ritmo e movimento criativo.
-jogos de corrida; -jogos em fileira e coluna; -jogos em círculo.
-brinquedos cantados; -exercícios ritmados.
-atividades de repetição de movimentos; -jogos de criação.
140
ANEXO B – Matriz curricular da disciplina Educação Física das escolas municipais de Jataí
141
142
ANEXO C – Carta de autorização para uso de imagens.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO – INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
Jataí, 02 de Maio de 2005. Ilmo(a). Sr. e Sra.
Pais de
Nesta
Prezado(a) Senhor(a):
Dirijo-me a Vossa Senhoria a fim de solicitar sua permissão para incluir seu filho,
aluno da escola (...), como sujeito de minha pesquisa de Dissertação de Mestrado, intitulada:
Atividades rítmicas como linguagem corporal na Educação Infantil.
Informo-lhe que a pesquisa em questão necessitará de observação das aulas, registro
das atividades em diário de campo, imagens fotográficas e/ou de vídeo, como também
entrevista com os alunos, professores e gestores da unidade, além de outros que se fizerem
convenientes. Informo-lhe ainda que a dissertação em questão, assim que for defendida
poderá ser publicada em forma de livro ou em outra mídia disponível no momento.
Asseguramos que por respeito à privacidade dos sujeitos – alunos, professores e
gestores – que os dados da entrevista e imagens, ficarão sob o mais absoluto sigilo.
Informo para qualquer dúvida, entrar em contato pelos telefones 636-2107 ou 9988-5033.
No aguardo da prestimosa atenção e anuência de Vossa Senhoria, apresento-lhe meus
sinceros agradecimentos.
Respeitosamente,
_____________________________
Lílian Ferreira Rodrigues Brait Profª. do Curso de Educação Física
Campus Avançado de Jataí/UFG. De acordo _______________________________________________________________________________ (Pais ou responsável)
143
ANEXO D – ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PROFESSORES.
ROTEIRO DE ENTREVISTAS Professores de Educação Física
Nome / Idade / Formação/ Especialização/ Escola
1- Você trabalha a Educação Física com crianças de que faixa etária? a. Só dá aulas pra esse nível de escolaridade ou trabalha com crianças maiores e
adolescentes? b. Gosta do que faz? De trabalhar com crianças nessa faixa etária?
2- Trabalha em quantas escolas? a. Em todas as escolas trabalha com o mesmo nível de escolaridade? b. Quais as maiores dificuldades encontradas e que prejudicam o seu trabalho?
3- Para a realização de uma aula, como organiza as atividades, o espaço e o tempo de uma aula com uma turma?
a. As atividades planejadas são as mesmas para turmas de mesma série? 4- Você acredita que a Educação Física pode contribuir no ensino de outras disciplinas?
Por que? Em que sentido? 5- Na grade curricular de sua formação, teve alguma disciplina que te orientou sobre a
Educação Física para Educação Infantil? a. O que você aprendeu que deve ser as aulas de Educação Física para essa faixa
etária? b. Viu alguma coisa sobre corporeidade/ linguagem corporal / ludicidade/ ritmo/
e atividades rítmicas? 6- Quais os conteúdos que você trabalha para crianças na fase de Educação Infantil?
a. Qual a proporção, em relação aos outros conteúdos trabalhados, do conteúdo dança? Ou você não trabalha com esse conteúdo?
7- O que você entende por linguagem corporal? a. Consegue fazer esta leitura do corpo do aluno, através de sua expressão?
Como? O que consegue ver? b. Consegue perceber como os alunos vêem seu próprio corpo? Eles conseguem
se comunicar somente através da expressão corporal, sem o uso da linguagem oral?
8- O que entende por atividades rítmicas? a. Trabalha com esse tipo de atividade? b. Qual atividade acredita ser uma atividade rítmica? c. Que importância vê nas atividades rítmicas e linguagem corporal para o
desenvolvimento da criança? 9- O que mais gosta de fazer junto com os alunos em suas aulas? 10 - Qual sua opinião sobre o toque corporal dos alunos durante as aulas?
a. Que importância vê nesse toque? Por que? b. Toca seus alunos e permite que eles o toquem? Por que?
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ANEXO E – Roteiro de entrevista para as crianças.
ROTEIRO DE ENTREVISTAS
Crianças Nome / idade / Escola / Turma 1 - Gosta das aulas de Educação Física? Por que?
a- O que você mais gosta nas aulas de Educação Física? b- E o que você não gosta ou que menos gosta? c- O que você faz quando tem uma brincadeira que você não gosta na aula? d- Você brinca assim mesmo? Faz outra coisa? O que?
2- Que tipo de música você gosta? a) Você gosta de dançar? b) Onde você dança? c) Quando? d) Na escola pode dançar? Quando? Onde?
3 – Nas aulas de Educação Física tem alguma coisa que é proibido fazer? O que? Por que? 4 - Você dança e canta nas aulas de Educação Física? Quais músicas?
a- Você gosta? Qual você gosta mais? b- Quando você canta, você faz os movimentos que a música fala (vai imitando,
dançando?) Você gosta dessa atividade? c- E na sala de aula, você canta também?
5- Você brinca na escola? De que? Onde? Com quem? Quando? Nas aulas? Quais aulas? Na sala? Com os professores?
a- Do que você mais gosta de brincar na escola? b- Do que você não gosta de brincar?
6 - Você gosta das brincadeiras que tem que bater palmas, bater pés e de imitação? 7- Nas aulas de Educação Física tem alguma atividade que você deve correr andar ou passar um objeto para outro colega no ritmo de uma música ou de palmas? Você gosta? Por que? 8- Tem cantigas de roda nas aulas de Educação Física? (Aquelas que faz um círculo de mãos dadas e todos cantam uma música) Você gosta dessa brincadeira?
a) Qual você gosta mais? b) Vocês cantam sempre? ou c) Vocês não gostam dessas brincadeiras? d) Por que vocês não cantam?
9 – Durante as aulas de Educação Física você toca (pega) nos seus colegas? E eles pegam em você? E no(a) professor(a) você pega? e ele (a) toca em você? 10– O(a) professor(a) brinca com vocês na aula? De que? a)Você gosta quando o professor brinca com vocês? B)Ele brinca sempre (todas as aulas, ou só de vez em quando)?
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