PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Maria Izabel Costa Monte Alegre Toro
Um estudo de rede social como um caminho de
participação cidadã: a experiência da Rede Social Campo
Grande – São Paulo 2004-2008
MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL
SÃO PAULO
2009
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC -SP
Maria Izabel Costa Monte Alegre Toro
Um estudo de rede social como um caminho de
participação cidadã: a experiência da Rede Social Campo
Grande – São Paulo 2004-2008
MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Serviço Social, sob a orientação da Professora Doutora Maria Lucia Carvalho da Silva
SÃO PAULO
2009
Banca Examinadora
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Agradecimentos
À Deus em primeiro lugar, que me deu a oportunidade de experimentar as delícias e as durezas da vida. À minha amada mãe, que sempre me mostrou que as mais profundas alegrias vêm da alma. Ao meu pai, por me apresentar ao Serviço Social e me incentivar sempre e de tantas formas. Aos meus familiares e amigos, que de alguma forma perceberam minha ausência e compreenderam a importância desse Mestrado para mim. Em especial ao Paulo, meu irmão e amigo, pelo apoio técnico. Ao Senac - SP, por me mostrar o caminho das redes. Aos participantes da Rede Social Campo Grande, que me propiciaram a importante vivência de rede e se tornaram hoje, meus amigos. Aos sujeitos de pesquisa da Rede Social Campo Grande e do Senac - SP, que contribuíram com suas vozes, essenciais para o desenvolvimento desta dissertação. À CAPES, pelo apoio financeiro, através da bolsa. Especialmente, à minha queridíssima orientadora, Professora Doutora Maria Lúcia Carvalho da Silva, que me recebeu em seu lar e disponibilizou seu tempo e atenção de forma incrivelmente competente, sempre com rigidez e carinho. A todos, agradeço de coração.
RESUMO
O tema da presente dissertação foi analisar a formação de redes estratégicas
no contexto da globalização contemporânea, bem como suas implicações sociais
tecnológicas e econômicas. O estudo focalizou as redes sociais tendo como objeto o
processo participativo na Rede Social Campo Grande - SP, uma iniciativa fomentada
pelo Senac São Paulo e analisada no período de 2004 a 2008. O objetivo geral
procurou compreender e analisar a trajetória desta rede nos quatro anos de sua
atuação na zona sul de São Paulo, na perspectiva de um caminho estimulador do
processo de participação cidadã. Os referenciais conceituais adotados foram:
globalização, redes sociais e participação cidadã, fundamentados em autores
nacionais e estrangeiros, principalmente das Ciências Sociais. Os procedimentos
metodológicos utilizados neste estudo foram: reflexão e pesquisa bibliográfica sobre
a temática das redes sociais e da participação cidadã; pesquisa documental sobre o
Senac –SP e Rede Social Campo Grande – SP; pesquisa de campo, que incluiu a
construção de critérios e definição de nove sujeitos com os quais se realizou
entrevistas semi estruturadas, bem como observação participante da pesquisadora
nas reuniões da Rede em questão; transcrição e organização dos dados coletados a
partir do eixo central da participação cidadã. A pesquisa mostrou que a Rede Social
Campo Grande vêm lutando e conquistando a participação cidadã pelos seus
sujeitos, representantes de ONGs, Poder Público Municipal e moradores locais,
destacando-se a formação de vínculos sociais e atuação coletiva em projetos e
ações conjuntas que ampliam o processo participativo, e apresentando também
limites quanto a compreensão de participação cidadã enquanto direito social.
Palavras - chave: Globalização, Redes sociais e Participação cidadã
ABSTRACT
The theme of this dissertation is analysis of the formation of strategic networks in the
context of contemporary globalization and the resulting social, economic and
technological impacts. The study focused on social networks and the object was the
participatory process in Social Network Campo Grande - SP, an initiative promoted
by Senac São Paulo and analyzed in the period of 2004 through 2008. The general
goal was to understand and analyze the trajectory of the network in the four years of
its operations in the south of São Paulo, in relation to stimulation of citizen
participation. The conceptual frameworks were: globalization, social networks and
citizen participation, based on national and foreign authors, especially from the social
sciences. The methodological procedures used in this study were: reflection and
research literature on the topic of social networks and citizen participation;
documentary research about Senac-SP and Social Network Campo Grande – SP,
field research which included researcher participation in network meetings as well as
the development of criteria and definitions for nine participants to use in conducting
semi-structured interviews and transcription and organization of data collected on the
central question of citizen participation. The research demonstrated that the Social
Network Campo Grande struggles to integrate citizen participation through,
representatives of NGOs, municipal authorities and local residents, especially
through the formation of social ties and collective action in joint projects and actions
that expand the participatory process, and also presenting an understanding of limits
on citizen participation as a social right.
Key words : Globalization, Social Networks and Citizen Participation
Sumário
Introdução, 9
I Considerações sobre a formação de redes no contexto da globalização
contemporânea
1. Uma aproximação histórica à globalização, 14
1.1 Implicações econômicas, sociais e tecnológicas, 20
1.2 Relações entre o global e o local, 24
2. Gênese de redes na globalização
2.1 Transformações organizacionais e a constituição das
primeiras redes empresarias, 27
II Redes Sociais na globalização: construção coletiva de participação cidadã
1. Abordagens conceituais de redes sociais, 31
2. Reflexões sobre participação cidadã, 39
III Caracterização do Senac SP e o Programa Redes Sociais
1. Breve histórico dos campos de atuação do Senac SP, 48
2. Programa Redes Sociais, 53
IV Rede Social Campo Grande e o processo de participação cidadã
1. Antecedentes da criação da Rede Social Campo Grande e seu
processo organizativo, 59
2. Rede Social Campo Grande: vozes e significações de participação
cidadã, 63
Considerações Finais, 84
Referências Bibliográficas, 87
Anexos, 93
“Cumpre teu dever com alegria Orgulha-te da força que o bem traz Serve a Deus e a teu próximo auxilia Terás no fim sereno do teu dia A fronte altiva e o coração em paz” Celuta Costa
Introdução
O tema desta dissertação são as redes sociais e o processo participativo que
lhe é intrínseco, bem como as significações desta forma de atuação para os sujeitos
componentes da rede analisada.
As diversas possibilidades de atuação em rede tem sido tema recorrente na
discussão contemporânea acerca das relações sociais e de trabalho.
O Serviço Social já atua com a estratégia do trabalho em rede na Política
Nacional de Saúde através do SUS – Sistema Único de Saúde e na Política
Nacional de Assistência Social, através do SUAS – Sistema Único de Assistência
Social, no contexto dos processos de descentralização e territorialização.
Do mesmo modo, o Serviço Social também atua nas mais diversas redes da
sociedade civil, isto é, de ONGs, movimentos sociais, comunidades e outras.
Trata-se, portanto de um tema atual e de grande relevância para o Serviço
Social, uma vez que a articulação de redes sociais de apoio e de serviços pode
fortalecer a participação cidadã dos sujeitos envolvidos, desenvolvendo sua
autonomia e sua ação coletiva.
Enquanto Assistente Social, atuei como mediadora de redes sociais no Senac
São Paulo de 2004 até início de 2009. Mediei algumas redes, dentre elas a Rede
Social Campo Grande – SP e seu processo participativo, objeto deste estudo.
Como mediadora desta rede, pude vivenciar a “atitude participante” ao longo
dos anos, caracterizada por Chizzotti como “uma partilha completa, duradoura e
intensiva da vida e da atividade dos participantes, identificando-se com eles, como
igual entre pares, vivenciando todos os aspectos possíveis da sua vida, das suas
ações e dos seus significados”. (CHIZZOTTI, 2003:90)
A necessidade de buscar maior fundamentação teórica para analisar as
experiências vivenciadas, levou-me ao Programa de Estudos Pós Graduados em
Serviço Social na PUC-SP.
Esta dissertação de mestrado traz o desafio de identificar na atuação da Rede
Social Campo Grande os elementos de construção da participação cidadã.
Buscamos assim desenvolver referências conceituais sobre redes sociais no
processo de globalização contemporânea e a sua contribuição para a efetivação da
10
participação cidadã, na perspectiva de construção de uma sociedade mais
participativa.
Neste sentido, a montagem desta pesquisa se inicia com a formulação da
pergunta norteadora de todo o estudo, a saber: Como a atuação em rede, mais
especificamente, na Rede Social Campo Grande - SP, pode contribuir para o
desenvolvimento da participação cidadã pelos sujeitos envolvidos?
Em decorrência desta indagação geral, definiu-se a seguinte hipótese: A
Rede Social Campo Grande - SP, ao longo de sua trajetória, vêm lutando e
conquistando uma participação cidadã de seus sujeitos, construindo vínculos locais
com órgãos municipais, com algumas empresas e com organizações da sociedade
civil, se constituindo sujeitos coletivos em movimento, embora necessite de maior
expansão de conexões globais e locais e maior aprofundamento do processo
participativo.
O objeto da pesquisa constitui-se assim, no processo participativo na Rede
Social Campo Grande - SP, que iniciou suas atividades através de uma proposta do
Senac - SP em junho de 2004. Nesta trajetória são focadas sua criação, organização
e ações na direção da construção coletiva de participação cidadã.
O objetivo geral é compreender e analisar a trajetória da Rede Social Campo
Grande nos quatro anos e meio de atuação na região sul de São Paulo e como
nesse processo os sujeitos coletivos e individuais em movimento vivenciam o
processo de participação cidadã.
Os objetivos específicos desse estudo são:
- Analisar o processo de globalização contemporânea e a formação de redes
nesse contexto
- Analisar conceitos de redes e participação na sociedade atual
- Conhecer a analisar a trajetória da Rede Social Campo Grande desde 2004
até 2008
- Conhecer e interpretar os significados atribuídos pelos membros da rede
sobre os conceitos de rede social e participação cidadã, bem como os significados e
significações de fazer parte deste processo
Para a construção de referenciais teóricos, focalizamos os conceitos de
globalização, redes e participação cidadã. Para o estudo dos conceitos adotamos
principalmente Boaventura Souza Santos, Octavio Ianni, Elenaldo Teixeira, Manuel
Castells, Lia Sanicola e Ilse Scherer Warren.
11
Para esse estudo, os procedimentos metodológicos abrangeram quatro
momentos.
O primeiro momento refere-se ao levantamento bibliográfico, revisão da
produção acadêmica do Serviço Social e das Ciências Sociais da PUC - SP;
pesquisa eletrônica sobre redes em sites abertos e pesquisa eletrônica na intranet
do Senac – SP, tendo em vista conhecer os estudos já realizados e suas principais
referências teóricas.
O segundo momento diz respeito a pesquisa documental dos relatórios
relativos à formação, estrutura e campos de ação do Senac – SP, bem como
relatórios das reuniões da Rede Social Campo Grande - SP.
A pesquisa documental compreendeu também entrevistas presenciais com a
gerência social desta instituição. Foram entrevistados Cláudio Silva, Gerente de
Desenvolvimento do Senac - SP e Cecília Tavares, Técnica de Desenvolvimento da
área de Desenvolvimento Social do Senac - SP.
O terceiro momento contempla a pesquisa de campo, que incluiu os seguintes
passos:
- Construção de critérios para escolha dos sujeitos significativos da pesquisa,
a partir do universo de aproximadamente trinta organizações sociais participantes da
rede: tempo de atuação na rede; representação do gênero feminino e masculino e
membros com mais intensa participação.
Considerados esses critérios, foram selecionados nove sujeitos a serem
entrevistados. Esses sujeitos são:
- Heloísa, assistente social da Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Social - Macro Sul /Santo Amaro da Prefeitura de São
Paulo e atuante no Projeto MOTUCA da Rede Social Campo Grande - SP;
- Cristina, representante da ONG Centro Social Esperança e atuante no
Projeto ESPORTES da Rede Social Campo Grande - SP;
- Márcia, representante da ONG Mamae e atuante no Projeto OFICINAS e Dia
da Responsabilidade Social da Rede Social Campo Grande - SP;
12
- Eloísa, representante da ONG Grão de Mostarda e atuante no Projeto
OFICINAS da Rede Social Campo Grande - SP;
- Albino representante da ONG ABRACE e atuante no Projeto MOTUCA da
Rede Social Campo Grande - SP;
- Sônia, representante da ONG ASES e atuante no Projeto ReCiclo da Rede
Social Campo Grande - SP;
- Junzo Habiro, representante do Santo Amaro Nikkey Esporte Clube e
atuante no Projeto ESPORTES da Rede Social Campo Grande - SP;
- Gerson Bonilha, professor de gastronomia do Centro Universitário Senac e
atuante no Projeto OFICINAS da Rede Social Campo Grande - SP;
- Rafael, aluno do Centro Universitário Senac e atuante no Projeto OFICINAS
da Rede Social Campo Grande - SP.
Todos os sujeitos selecionados foram consultados sobre seu consentimento
em participar desta pesquisa, bem como autorizaram a divulgação de seus nomes
neste estudo;
Para a coleta de dados foram realizadas entrevistas semi estruturadas
gravadas e transcritas, sendo parte delas presenciais e outra parte, via telefone.
A participação da pesquisadora em reuniões mensais sistemáticas durante os
quatro anos de atividade da Rede Social Campo Grande - SP, através de
observação participante e olhar atento às nuances que precisavam ser anotadas,
além do uso de um caderno de campo e de registros eletrônicos das observações
efetuadas.
Os projetos pesquisados, por sua vez, foram escolhidos com base na sua
maior proximidade com o tema de estudo, que é a participação cidadã. Eles foram
analisados em dois blocos.
O primeiro bloco trata de projetos desenvolvidos autonomamente pela rede,
que são o projeto Reciclo, o MOTUCA e o Projeto de Esportes.
13
O segundo bloco diz respeito a projetos sugeridos pelo Senac, no qual serão
analisados os projetos de Desenvolvimento Local, o Dia da Responsabilidade Social
e o Projeto Oficinas.
O quarto momento diz respeito a transcrição e organização dos dados para a
construção da análise. A partir do eixo central da participação cidadã, foram
construídos três focos analíticos: O entendimento pelos sujeitos sobre o que são as
redes; o crescimento da participação dos sujeitos no processo de vivência em rede;
e os resultados atingidos através dos projetos da rede pelo seu caráter participativo
e os projetos da Rede Social Campo Grande – SP, que serão analisados nos dois
blocos já mencionados.
A dissertação está estruturada em quatro capítulos que se inter relacionam.
No capítulo I - Considerações sobre a formação de redes no contexto da
globalização, analisa-se o contexto geral da globalização, com enfoque na
globalização contemporânea, e como as implicações tecnológicas, econômicas e
sociais provenientes deste processo refletem na formação das redes na atualidade.
No capítulo II - Redes Sociais na globalização: Construção coletiva de
participação cidadã, contextualiza-se os significados e conceitos de redes, em
especial redes sociais e conceitos de participação e cidadania.
No capítulo III - Caracterização do Senac SP e o Programa Redes Sociais,
descreve-se o histórico do Senac e como surge o Programa Redes Sociais nesta
instituição, em um momento de globalização contemporânea no qual as redes
tornam-se padrão de organização.
No capítulo IV - Rede Social Campo Grande - SP e o processo de
participação cidadã, analisa-se a trajetória da Rede Social Campo Grande - SP no
período de 2004 a 2008, evidenciando os principais significados da participação
cidadã nesse espaço de atuação coletiva.
Nas Considerações Finais são realizadas reflexões sobre as questões que
permearam este estudo, bem como sobre outras questões a serem pesquisadas
para o aprofundamento do tema abordado.
14
I Considerações sobre a formação de redes no contexto da globalização
1. Aproximação histórica à globalização
São freqüentes os estudos sobre o tema da globalização devido a
complexidade e abrangência dos fenômenos que fazem parte deste processo.
A globalização pode ser entendida de diversas formas, entretanto, é
importante ressaltar que se trata de um fenômeno multifacetado, que impacta em
diversas dimensões, por isso seu entendimento deve ser multicausal.
Apesar de este ser um tema recorrente, é preciso uma abordagem conceitual
sobre o assunto uma vez que é o cenário de relações e desenvolvimento entre os
Estados, os mercados e as sociedades como um todo.
Embora as conceituações sobre a globalização venham quase sempre
acompanhadas de uma ideologia mercadocêntrica, a globalização não é um
fenômeno exclusivamente econômico, mas trata-se de um fenômeno de uma
mudança global na sociedade.
Ianni (1996) entende a globalização como um processo histórico-social de
vastas proporções, que redesenha o mapa do mundo, inaugurando outros processos,
estruturas e formas, um momento no qual os conceitos ganham novos significados,
os territórios mesclam-se e tencionam-se em outras direções e as pessoas e idéias
desterritorializam-se. Para o autor, está em curso a gênese de uma nova totalidade
histórico-social, um novo ciclo da história que ele chama de globalismo e que
representa uma nova lógica. Ianni afirma que “o globalismo compreende relações,
processos e estruturas de dominação e apropriação desenvolvendo-se em escala
mundial (...) todas as realidades sociais, passam a ser influenciadas pelos
movimentos e pelas configurações do globalismo; e a influenciá-lo. São articulações,
integrações, tensões e contradições, envolvendo uns e outros, organizações e
instituições”.
Para Boaventura (2005), trata-se de diversos processos de globalização, ou
seja, é um processo cheio de pluralidades e contraditoriedades, uma situação de
profundos desequilíbrios e que pode, ou não, conduzir a um novo sistema mundial.
Alguns autores defendem que a globalização é um fenômeno muito antigo,
15
Tilly (1995), por exemplo, distingue quatro ondas de globalização no passado, sendo
elas no século XIII, com a formação do Império Mongol que criou condições para
emergência do sistema de comércio mundial afro asiático, no século XVI, com a
expansão comercial e militar européia que liga o Oceano Indico ao Caribe por meio
de uma rede de trocas e dominação, no século XIX com o domínio europeu sobre
grande parte do mundo em o que ele chama de “impulso imperialista” e a atual
globalização que se inicia no final do século XX.
Magnólio (1997) também defende a mesma idéia, e afirma que “a
globalização não tem quatro ou cinco anos, mas quatrocentos ou quinhentos. A
geografia política do mundo no qual vivemos é fruto desse processo. A globalização
é o processo pelo qual o espaço mundial adquire unidade”.
O fato é que a globalização acompanha o capitalismo durante toda sua
trajetória, mas com diferentes características. Um primeiro movimento claro
acontece entre os séculos XV e XVI, com a transformação dos feudos em nações,
que expandiu a economia no sentido de estabelecimento de novas relações
comerciais.
A Revolução Industrial, iniciada em 1750 na Inglaterra, é também um
fenômeno global, mas que muda o curso do capitalismo ao desagregar o sistema
colonial e induzir o imperialismo. Alguns historiadores afirmam a existência de pelo
menos duas revoluções industriais, sendo que a primeira caracterizou-se pelas
novas tecnologias e máquinas, e a segunda pelo desenvolvimento da eletricidade.
Devido às novas tecnologias, a revolução industrial muda a localização das
riquezas e do poder no mundo, que ficaram com países e elites que podiam
comandar o novo sistema tecnológico.
A Revolução Industrial gerou desigualdades sociais e é neste contexto que
surgem movimentos contra hegemônicos de luta e resistência. Trabalhadores se
mobilizaram criando grupos organizados que atuavam em rede, chamados de
sindicatos. Surgem também pensadores como Karl Marx, Proudhon e Engels
disseminando idéias socialistas1 que se espalharam pela Europa e pelo mundo.
1 Com a revolução francesa em 1789, o modelo capitalista se afirma ideologicamente com base nos princípios do liberalismo (liberdade econômica, propriedade privada e igualdade perante a lei) e a grande massa da população proletária permanece excluída do cenário político. Nesse contexto, percebeu-se que a igualdade jurídica não significava igualdade social e política e surgem então as idéias socialistas. O socialismo é basicamente um sistema que propõe a extinção da propriedade privada ou particular dos meios de produção, onde a economia é controlada pelo Estado para promover uma justa distribuição das riquezas e a divisão de renda é igualitária.
16
Todas essas idéias floresceram de modo a dar origem, em 1917, a Revolução
Socialista na Rússia, até então um país feudal e capitalista.
Porém, esse sistema não perdurou e as explicações para a não continuidade
do socialismo são diversas, mas o fato é que o capitalismo gozava de mais força
naquele momento histórico e acabou por superar o modelo socialista.
Quase trinta anos depois, em 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial, é
criada a Organização das Nações Unidas (ONU) com o objetivo de garantir a paz
mundial e a cooperação entre os países. Atualmente, das 192 nações existentes,
185 integram a ONU. A declaração dos direitos do homem e o respeito aos direitos
humanos e liberdades individuais são os principais objetivos da Carta da
Organização das Nações Unidas, assinada por todos os países membros.
Mesmo com a criação da ONU, a disputa ideológica entre Estados Unidos,
representando o capitalismo e a União Soviética, representando o socialismo,
continuou e deu origem a Guerra Fria em 1947. O conflito gerou insegurança no
mundo inteiro, uma vez que essas superpotências possuíam tecnologia suficiente
para iniciar uma guerra nuclear.
Segundo Octavio Ianni (1996), a Guerra Fria desenvolveu-se como uma
contra revolução mundial destruindo experimentos políticos nacionais em todo o
mundo e contando com a cumplicidade de beneficiários de alianças com o
imperialismo. Dessa forma, desestabilizaram-se governos, partidos políticos,
sindicatos e movimentos sociais.
No pós-guerra a Europa Ocidental ainda estava arrasada pelos conflitos e
diante disso, os Estados Unidos, via Nações Unidas, com receio do avanço
socialista, elaboraram um plano de ajuda econômica a esses países.
Tratava-se do Plano Marshall (1948), que permitia que os países da Europa
Ocidental importassem produtos norte americanos a um preço baixo, abria créditos
para países europeus comprarem equipamentos pesados dos Estados Unidos e
François-Noël Babeuf, inspirado por Jean-Jacques Rousseau, foi um dos precursores do socialismo utópico. Já o Frances François-Marie-Charles e o escocês Robert Owen não obtiveram sucesso em suas tentativas de criar comunidades socialistas. Em meados do século XIX, duas vertentes do socialismo, o marxismo e o anarquismo polarizavam discussões ideológicas. Em 1848, Karl Marx e Friedrich Engels estabelecem bases cientificas para a transformação da sociedade através do Manifesto Comunista. Outros importantes autores socialistas foram Proudhon, que combateu o conceito de propriedade privada, Bakunin, que criticava o autoritarismo do pensamento marxista e Piotr Kropotkin, que apresentou o conceito de comunismo libertário, que aconteceria através da dissolução de instituições opressoras e da solidariedade. No Brasil, o primeiro partido socialista brasileiro foi fundado em 1902.
17
forneciam empréstimos. Porém, esse apoio dos Estados Unidos visava manter o
sistema capitalista nos países da Europa Ocidental, garantir o mercado consumidor
de seus produtos e com isso, impedir a penetração do socialismo.
Com o término da Guerra Fria e a dissolução do bloco soviético, o
desenvolvimento do capitalismo se intensifica e se estende. (Ianni X:109)
Por volta de 1970, percebe-se uma outra crise do capitalismo e com isso
inicia-se um novo movimento de globalização contemporânea.
Neste período, a crise do Estado de Bem Estar Social2 se manifesta quando a
inflação sai do controle. A partir daí, governos e empresas buscaram um processo
de reestruturação, muitas vezes em detrimento da proteção social.
Essa crise do capitalismo foi detonada pela crise do petróleo e foi provocada
pelo embargo ao fornecimento de petróleo aos Estados Unidos e às potências
européias. O embargo foi estabelecido em 1973 pelas nações árabes, membros da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep)3.
Somando-se a esse cenário os avanços tecnológicos e das comunicações,
deu-se o ambiente para a formação e a tomada de poder pelas facções neoliberais
das classes dominantes4. Essa crise gerou uma reestruturação drástica do sistema
capitalista global e induziu um novo modelo de acumulação.
A queda do Muro de Berlim em 1989 rompeu com o mais significativo símbolo
2 Enquanto o Brasil vivenciava a Revolução Liberal (1930) e mantinha uma fase sem grandes mudanças políticas por cerca de meio século, os Estados Unidos e Europa vivenciavam o modelo de Estado intervencionista e promotor do bem estar social. Esse modelo, chamado de Welfare State, se desenvolve pós Segunda Guerra Mundial, quando o modelo Keynesiano de crescimento capitalista levou prosperidade econômica e estabilidade social a muitas economias de mercado durante quase trinta anos. Durante os chamados “trinta gloriosos anos”, esse Estado de bem estar social representava agente regulamentador da promoção social, garantindo serviços públicos e proteção à população. De acordo com os princípios desta forma de organização política, todo o indivíduo teria o direito, desde seu nascimento até sua morte, a um conjunto de bens e serviços que deveriam ter seu fornecimento garantido seja diretamente através do Estado ou indiretamente, mediante seu poder de regulamentação sobre a sociedade civil. Esses direitos incluiriam a educação em todos os níveis, a assistência médica gratuita, o auxílio ao desempregado, a garantia de uma renda mínima e recursos adicionais para a criação dos filhos, dentre outros. 3 Essa medida foi tomada em represália ao apoio dos Estados Unidos e da Europa Ocidental à ocupação de territórios palestinos em Israel. Com o embargo, a Opep estabelece cotas de produção e quadruplicam os preços, medidas que provocaram uma desestabilização na economia mundial e recessão nos Estados Unidos e Europa. 4 O neoliberalismo, reação teórica e política contra o Estado intervencionista de bem estar, nasceu após a Segunda Guerra Mundial na Europa e na América do Norte, onde imperava o capitalismo. Friedrich Hayek foi o precursor deste estudo com seu texto “O caminho da servidão”, escrito em 1944, no qual Hayek ataca qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, que segundo ele seria uma ameaça letal à liberdade econômica e política. Para o autor, a democracia em si mesma, jamais havia sido um valor central do neoliberalismo, e a liberdade e a democracia podiam facilmente tornar-se incompatíveis, se a maioria democrática decidisse interferir com os direitos incondicionais de cada agente econômico de dispor de sua renda e de sua propriedade como quisesse.
18
da Guerra Fria: a bipolaridade que separava não somente uma cidade e um povo,
mas dividia o mundo pelos sistemas capitalista e socialista. Com a queda do muro,
as condições políticas permitiram que ocorresse o atual processo da globalização
contemporânea neoliberal.
O novo modelo hegemônico neoliberal sucede o antigo modelo regulador de
bem estar social. O neoliberalismo que se propõe a reordenar o sistema capitalista,
ainda se mantém hegemônico devido a ausência de algum projeto alternativo que
dispute sua hegemonia, embora suscite grandes mobilizações contrarias, tais como
os Fóruns Sociais Mundiais, que analisaremos mais adiante.
Segundo Friedman (1999) “o mundo vagaroso, estável e fragmentado da
Guerra Fria, que dominara o cenário internacional desde 1945, foi substituído por um
novo e bem lubrificado sistema interconectado, chamado globalização”. Para ele “a
globalização é o sistema internacional que substituiu o sistema da Guerra Fria”, no
qual os Estados-nação detinham em suas mãos a quase totalidade da capacidade
ordenadora.
No final do século XX emerge uma revolução tecnológica, que segundo
Castells (1999), começa a remodelar a sociedade. A economia por sua vez, mantém
cada vez mais a interdependência global. Nesse período, o capitalismo passa por
um processo de reestruturação que traz também a descentralização das empresas e
sua organização em redes, que podem ser internas ou com outras empresas.
Em 1985 o Banco Mundial cria a expressão “mercados emergentes” como
estratégia para atrair investimentos para o que era chamado até então de “Terceiro
Mundo”. Isso indicava, segundo Castells (1999), uma nova era de integração
financeira em todo o planeta.
Em resumo, após a Segunda Guerra Mundial uma nova sociedade começou a
se desenvolver, mas somente no final dos anos 80 obteve recursos técnicos e
condições políticas para o pleno desenvolvimento.
Em todas as fases do capitalismo é possível se perceber movimentos globais.
Sendo que os avanços tecnológicos foram, sem dúvida, o grande salto da
globalização. Sem a nova tecnologia da informação, o capitalismo global teria sido
uma realidade muito limitada. Portanto, pode-se afirmar que o informacionalismo
está ligado à expansão e ao rejuvenescimento do capitalismo.
O inicio do século XXI seria um período de transição, que Boaventura (2005)
chama de Sistema Mundial em Transição. Para ele, o que acontece são diversos
19
processos de globalização, resultado da interação entre três constelações de
práticas, entrelaçadas segundo dinâmicas indeterminadas, as práticas inter-estatais,
as capitalistas globais e as sociais e culturais transnacionais.
No interior dessas três constelações de práticas, existem tensões e
contradições. Nas práticas inter-estatais, por exemplo, os conflitos estão
relacionados à hierarquia do sistema mundial; nas práticas capitalistas globais, os
conflitos se dão entre a classe capitalista global e todas as outras classes; já nas
práticas sociais, os conflitos ocorrem em torno do reconhecimento e valorização de
recursos não mercantis, tais como etnias, culturas, etc.
“Pode-se afirmar, portanto, que existe uma transconflitualidade no Sistema
Mundial em Transição” (Boaventura, 2005:60).
As redes globais de produção atingem trabalhadores de todo o mundo, que
migram com grande facilidade para buscar melhores oportunidades. Com o passar
do tempo, eles criam redes de familiares, amigos e conhecidos, ampliando a
conexão entre pessoas, fronteiras e culturas.
E é neste contexto, onde o capitalismo é mundializado e a sociedade vive um
sistema ideológico baseado no consumo que o dinheiro, a informação e o consumo
são colocados em um patamar de internacionalização.
Ainda para Boaventura (2005), as transformações atuais podem ser
entendidas através de duas leituras diferentes:
A leitura paradigmática, que sustenta a idéia de que o final dos anos sessenta
e inicio dos anos setenta foi um período de crise que apontou para um novo
paradigma. A atual crise iniciada nos Estados Unidos e que eclode mundialmente
em 2008, por exemplo, pode vir a sustentar essa idéia de transição paradigmática,
pois essa leitura privilegia a ação transformadora, na qual as atuais transformações
seriam um prenúncio de rupturas radicais.
Já a leitura subparadigmática percebe o atual período como um importante
processo de ajustamento estrutural, ajustamento este que implica a transição de um
regime de acumulação para outro. Essa leitura privilegia a ação adaptativa e as
atuais transformações seriam apenas turbulências temporárias.
A primeira leitura é mais ampla, pois fala de uma crise civilizatória ou de uma
época, na qual a crise do regime de acumulação seria apenas um aspecto. E a partir
desta leitura a globalização é entendida como um fenômeno novo.
O mundo vivencia neste inicio do século XXI mais uma forte crise no
20
capitalismo que eclode inicialmente nos Estados Unidos, mas que tem impactos
globais.
Segundo Umberto Martins5 , a crise atual se manifesta através de quatro
características: Redução progressiva das taxas de crescimento econômico
(tendência à estagnação); Alto índice de desemprego estrutural; instabilidade
monetária mundial que gera crises recorrentes e declínio econômico do império
norte americano.
Dessa forma, a crise atual potencializa contradições do sistema capitalista e
gera uma perspectiva instável e conflituosa, expressando a dissonância entre
interesses humanos e capitalistas.
1.1 Implicações econômicas, sociais e tecnológicas
O novo sistema econômico surge, segundo Castells (1999), na década de
1990 nos Estados Unidos, graças a uma combinação de fatores tecnológicos,
econômicos, culturais e institucionais.
Essa nova economia global, constituída politicamente, evoluiu em
conseqüência da reestruturação de empresas e da evolução tecnológica acrescidas
das políticas de desregulamentação, privatização e liberalização do comércio e dos
investimentos.
A globalização é indispensável para o desenvolvimento da economia atual e
um diferencial que podemos perceber, são as redes, que se espalham por toda a
economia, trazendo flexibilidade aos processos. Este fato denota uma significativa
mudança estrutural.
Nesta economia, a produtividade e a competitividade dependem basicamente
de informação e as atividades produtivas se organizam em escala global, em uma
rede de conexões entre agentes econômicos.
As empresas também estão atualmente ligadas por redes globais de geração
de valor e apropriação de riquezas, conseqüentemente no momento em que algo ou
alguém não tenha mais valor, é excluído desta rede.
Segundo Castells (1999:175), esse novo sistema econômico é dinâmico,
5 Segundo artigo virtual de Umberto Martins, jornalista, retirado do Portal da CTB – Central dos trabalhadores e trabalhadoras do Brasil.
21
seletivo, exclusionário e instável ao mesmo tempo. A expansão da nova economia,
além de desigual, é inclusiva e exclusiva ao mesmo tempo e devido à volatilidade
financeira, traz consigo a possibilidade de grandes crises financeiras.
As crises que estão eclodindo pelo mundo neste início do século XXI,
mostram que essa globalização hegemônica que tem como base o sistema
financeiro, é um modelo bastante frágil. Joseph Stiglitz, norte americano e vice-
presidente do Banco Mundial, afirmou em 1998 (apud Boaventura 2002:83) que “o
modelo neoliberal causou muito sofrimento, agravou as desigualdades e é um
modelo cientificamente errado”. Ele também reforça a importância da intervenção do
Estado, garantindo que esta intervenção é mais eficiente que a "mão invisível do
mercado".
Segundo Boaventura (2002), existe hoje uma classe capitalista transnacional
emergente que está mais forte do que muitos Estados fracos e é a partir desse
fortalecimento do capitalismo que surgem fragmentações perversas na sociedade.
Para uns o Estado é obsoleto, mas para outros o Estado ainda é entidade
política central, o fato é que a globalização é um campo fértil para contestação social
e política. Para alguns ela é a vitória da racionalidade, inovação e liberdade, mas
para outros ela marginaliza e exclui.
Mas independente de ter perdido sua força ou não, o fato é que os Estados
não representam mais o único suporte dos sistemas econômicos, que hoje estão
submetidos a diferentes lógicas de funcionamento.
Como conseqüência dessa globalização contemporânea, as desigualdades
sociais estão se acentuando nas últimas décadas, inclusive em países que são
modelos neoliberais, como os Estados Unidos, tudo isso em conseqüência do alto
nível de desemprego, da minimização dos custos salariais e da destruição das
pequenas e até grandes empresas ou economias de subsistência que não
conseguem competir no âmbito do capitalismo globalizado.
Desta forma, a globalização neoliberal desarticula as forças populares e
mantém uma dinâmica política de acordo com interesses das classes dominantes e
do mercado. Sendo assim, as classes populares perdem o caráter de massa, de luta
e se despolitizam. Pode-se afirmar que a desorganização política do proletariado e
de seus aliados, é marca característica do Estado neoliberal6.
6 Outra característica do Estado neoliberal é a sua capacidade de controle social, que pode ser analisada através das privatizações. Hospitais, universidades, empresas e serviços antes estatais, foram privatizadas mas
22
Adeptos do neoliberalismo que ora afirmaram que o Estado havia alcançado
solidez, hoje estão vendo o que parece ser o encerramento de um império. Renasce
assim a esperança de um Estado social e democrático, que o neoliberalismo
considerou extinto.
Nesse contexto de grandes mudanças, as pessoas tendem a reagrupar-se em
torno de identidades 7 primárias, tais como as religiosas, territoriais, étnicas e
nacionais, como uma forma de reorganizarem seu significado com base no que são.
Embora a identidade tenha poder libertador, é preciso cuidado para não
caminhar em direção à individualização e fundamentalismos. O perigo é tornar a
identidade tão especifica e difícil de compartilhar que gere fragmentação social
Nesse cenário, “organizações e indivíduos ficam com o desafio de criar ou
recriar movimentos sociais, de forma que a sociedade civil possa influenciar,
conquistar ou educar duramente o poder estatal” (Ianni 1996:114). Trata-se de
fortalecer e dinamizar a globalização.
O Fórum Social Mundial – FSM é um bom exemplo de movimento de
globalização contra-hegemônica. Nas palavras de Boaventura Sousa Santos, “o
FSM mostra o quanto o mundo é uma totalidade inesgotável, dado que possui
muitas totalidades, todas elas parciais”. (Santos, 2005)
(...) “o sucesso do FSM assinala a emergência no seio dos movimentos
sociais de uma consciência, difundida e experienciada reciprocamente, de que o
avanço das lutas contra-hegemônicas assenta na possibilidade de partilhar as
práticas e os saberes de maneira global e intercultural. Com base nesta experiência
partilhada, torna-se possível construir a conjugação horizontal de tempos a partir do
qual pode emergir uma zona de contacto cosmopolita e o trabalho emancipatório da
tradução” 8 (Santos, 2005:16).
mantiveram a gestão do Estado. Dessa forma, o Estado diminui seus custos e mantém o controle, deteriorando a prestação de serviços. As piores conseqüências se dão para a classe trabalhadora que depende desses serviços. Outra forma de o Estado manter o controle social e diminuir os seus custos é o repasse de serviços sociais para as organizações não governamentais (ONG’s), que atuam localmente nas questões sociais podendo ou não ter o financiamento do Estado, mas sempre sob o olhar atento da legislação estatal. Essa situação mantém um estado que não cria políticas sociais democráticas amplas e sustentáveis. 7 Castells (1999:) entende identidade como “o processo pelo qual um ator social se reconhece e constrói significado principalmente com base em determinado atributo cultural, ou conjunto de atributos, a ponto de excluir uma referência mais ampla a outras estruturas sociais” 8 A tradução é o procedimento que permite criar inteligibilidade recíproca entre as experiências do mundo, tanto as disponíveis como as possíveis, tal como são reveladas pela sociologia das ausências e pela sociologia das emergências, sem pôr em perigo a sua identidade e autonomia, sem, por outras palavras, as reduzir a entidades homogêneas (Santos, 2005:06).
23
Segundo Appadurai (Boaventura 2005:45), saímos do período de
modernização e estamos entrando no mundo pós eletrônico.
A revolução da tecnologia mudou as relações sociais e teve papel
fundamental na reestruturação do sistema capitalista e na globalização, ela imprimiu
velocidade aos processos, assegurou a simultaneidade das ações e
desterritorializou idéias.
Estamos de fato, vivendo hoje uma Revolução Tecnológica que, segundo
Castells (1999) talvez seja um evento histórico tão importante quanto foi a
Revolução Industrial. E a tecnologia da informação representa para esta revolução,
o que as novas fontes de energia foram para as revoluções industriais sucessivas.
O impacto da tecnologia gera grandes mudanças para a sociedade, para com
as relações sociais que estão sendo estabelecidas e para o mercado que se torna
transnacional, mundializando seus processos de produção e venda.
As novas tecnologias integraram o mundo em redes, onde a comunicação é
mediada por computadores, fomentando grupos organizados em torno de novas
identidades e construindo assim novos significados numa velocidade incontrolável.
Esse fato é importante para a sociedade, mas não atinge a todos de forma
igualitária. Embora a tecnologia da informação e a Internet diminuam fronteiras
aproximando pessoas, o acesso é desigual, a começar pelas grandes metrópoles,
que são ambientes privilegiados da nova revolução tecnológica. A rapidez das
formas em se transmitir a informação é inegável, a questão é que as técnicas da
informação são usadas por poucos. Além do fato de que a maior parte das
informações que chegam a todos são manipuladas e massificadas, facilitando a
manutenção da apatia e controle social.
Essas mudanças têm uma aceleração por volta da década de 60, embora a
invenção mais significativa tenha sido em 1957, quando Jack Kilby criou o chamado
circuito integrado no mundo da Eletrônica. Neste período, vimos a criação da internet,
o mais revolucionário meio tecnológico da Era da Informação9.
A Apple, empresa tecnológica criada em 1976, popularizou o computador em 9 A criação da Internet foi conseqüência da integração de interesses entre cientistas e militares, que proporcionou a comunicação à distância, de forma rápida e horizontal, transmitindo informações com eficiência para os militares em guerra. Vale ressaltar que este também é o princípio básico das redes, onde a matéria prima é a informação. A partir de certo momento tornou-se difícil separar pesquisas militares, cientificas e conversas pessoais. Somando-se a isso, pressões comerciais, crescimento de redes de empresas privadas e outras redes cooperativas, foi necessário privatizar a Internet. Apesar de haver um órgão regulador nos EUA, não existia nenhuma autoridade clara sobre a Internet.
24
1982, seguida pela IBM. Na década de 90, a queda dos preços somada a mais
avanços, fez com que os microprocessadores estivessem presentes em máquinas
de uso rotineiro e caseiro. Dissemina-se então, o sistema de comunicação em rede.
Conforme argumentava Marx, (apud Singe, 2004) a tecnologia altera tudo, e
sendo assim, quando a tecnologia anulou a distância, deu-se terreno fértil para a
globalização econômica, como a conhecemos hoje.
A década de 1970 constituiu-se como um novo paradigma tecnológico que
concretizou uma nova forma de produção, de comunicação, de gerenciamento e de
vida. Hoje a tecnologia tem o poder de transformar as sociedades, depende de como
cada sociedade usa (ou não) essa tecnologia.
As novas tecnologias, somadas a nova economia, alteram a natureza do
Estado enquanto promotor e regulador das questões sociais e econômicas.
As interações da globalização são muito maiores do que as interestatais, elas
atravessam fronteiras, assim como as pessoas, e tornam-se uma interação de idéias
e bens da qual nem o Estado nem ninguém tem controle.
Podemos afirmar que com a nova economia global, o Estado viu seu
patrimônio arruinado pelas privatizações e o aumento das diferenças entre países
ricos e países pobres cresceram. As fronteiras, por sua fez, foram abertas, mas de
forma muito desigual, beneficiando países hegemônicos e centrais.
Para Boaventura (2002), essa é a globalização da pobreza, e ela também
resulta no desemprego, na destruição das economias de subsistência e na
minimização dos custos salariais à escala mundial.
Na sociedade global, as mudanças sociais, tecnológicas e econômicas são
profundas. Os mercados financeiros se integram; as redes de computadores, que
crescem substancialmente, criam novas formas e novos canais de comunicação; os
sistemas políticos vivem uma crise de legitimidade e os movimentos sociais tendem
a ser fragmentados e locais.
1.2 Relações entre o local e o global
Augusto de Franco (2003) afirma que estamos vivendo, a partir dos anos
1980 e 1990 um processo de glocalização. Segundo o autor, glocalização seria a
25
formação de uma nova sociedade cosmopolita global e planetária como uma rede de
comunidades sócio-territoriais e virtuais, subnacionais e transnacionais
interdependentes.
Embora a glocalização colocada por Franco (2008) confira um novo status ao
local, processos de globalização e localização ocorrem simultaneamente. Ao mesmo
tempo em que se intensificam as interações globais e as relações sociais parecem
cada vez mais desterritorializadas, surgem também novas identidades locais.
Segundo Appadurai, (apud Boaventura 2005) “A característica central da
cultura global é hoje a política do esforço mútuo da mesmidade e da diferença para
se canibalizarem uma à outra e assim proclamarem o êxito do seqüestro das duas
idéias do Iluminismo, o universal triunfante e o particular resistente.”
Ou seja, globalização é de fato, um fenômeno bastante contraditório. Ao
mesmo tempo em que universaliza e elimina fronteiras, aumenta as desigualdades,
os particularismos e as diversidades locais. Produz, simultaneamente,
homogeneização e diversidade.
A globalização é mais bem sucedida em algumas localidades e campos.
Segundo Boaventura (2005), o “localismo globalizado” se refere ao processo pelo
qual um fenômeno é globalizado, e o “globalismo localizado” diz respeito aos
ambientes onde as condições locais são modificadas para se ajustar ao mercado
global.
Para Boaventura (2005) as diferentes formas de representação da identidade
social, presentes no espaço local, como por exemplo: a língua, a cultura, a
alimentação, a música, a religião, os padrões de consumo, tendem a sucumbir à
lógica hegemônica da globalização. Mesmo as formas de resistência e de
reafirmação da identidade local tenderiam a ser subsumidas ou adaptadas pelos
atores da economia global.
A rede de lanchonetes McDonald´s, é um exemplo de como foi possível obter
sucesso globalmente através de uma atuação que vislumbrou algumas questões
locais.
Em 1963, um franqueado do McDonald´s do bairro católico de Cincinatti, nos
EUA, verificando que nas sextas feiras a freqüência de consumidores diminuía na
sua loja, devido ao respeito pela abstinência à carne neste dia, criou produto que ele
chamou Filet-O-Fish a base de peixe e trouxe de volta sua clientela católica, não só
nas sextas feiras, mas também em outros dias. Hoje em dia, o Filet-O-Fish está em
26
quase todos os Mc Donald´s do mundo. O Uruguai lançou McHuevos, na base de
ovo poché. Nas Filipinas, criou-se o McSpaghetti. Em Hong Kong, desde 2002, as
fritas são substituídas por tigela de arroz para quem pedir. Em Israel, o Big
McCasher trouxe de volta os consumidores seguidores da religião judaica que não
podem comer carne e queijo ao mesmo tempo. (Gerteiny apud http://mercado-
global.blogspot.com/2007/06/mundializao-globalizao-localizao-e.html: 2008).
Foi, portanto esta política que permitiu ao McDonald´s, graças à sua atuação
local, alargar os horizontes e ganhar mais competitividade atraindo consumidores de
outras cadeias de fast food para as suas lojas, melhorando os resultados de forma
global.
A dimensão global é necessária para a definição da dimensão local e o local
só adquire sentido diante do global. A grande novidade do processo em curso é a
possibilidade da conexão global-local e quando uma localidade se conecta com
outra localidade, ela está acionando a conexão global-local.
Assim, o local se globaliza quando ativa suas conexões externas. E,
obviamente, tanto mais se globaliza quanto mais conexões externas estabelecer. Em
contrapartida, e isso está longe de ser tão óbvio, o global se localiza da mesma
maneira; ou seja, quanto mais localidades globalizadas existirem, mais o global
estará localizado.
Enquanto um coletivo humano se localiza em função de suas conexões
internas, o mundo se globaliza em virtude da localização dos seus componentes.
Nas palavras de Franco (2004), a globalização não leva a uma aldeia global,
mas a miríades de aldeias (unidades localizadas) globais.
Porém, é preciso estar atento, pois as diferenciações entre local e global são
uma das armadilhas da globalização neoliberal, pois o global acontece localmente,
mas o local contra hegemônico ainda não acontece globalmente e esse é o desafio.
Contudo, como respostas locais às pressões globais, emerge uma sociedade
civil e uma política global que atua no campo da luta e da resistência em uma
campanha contra hegemônica, em geral representados por movimentos locais,
campanhas globais e organizações não governamentais progressistas. Mas ainda
são apenas iniciativas locais de resistência e por isso são iniciativas internamente
um tanto fragmentadas.
Teixeira (2001) acredita que do final dos anos 1960 em diante, começou a se
desenvolver uma cultura de valorização da política como algo do cotidiano, ou seja,
27
“o local passa a ser o espaço onde melhor se pode desenvolvê-la”.
E essa cultura local, encontra nas redes um ambiente adequado para seu
crescimento e desenvolvimento
2. Gênese de redes na globalização contemporânea
2.1 Transformações organizacionais e a constituição das primeiras
redes empresarias
Existem diferentes abordagens que analisam as trajetórias organizacionais na
reestruturação do capitalismo, que acontece no momento transitório do
industrialismo para o informacionalismo.
Segundo Castells (1999), existem algumas coincidências nessas diversas
abordagens, dentre elas, o fato de que em meados dos anos 1970 a organização da
produção se fragmenta no mercado de forma global; as organizações10 por sua vez,
se transformaram devido à nova tecnologia e precisaram se adaptar às mudanças
econômicas, institucionais e tecnológicas causadas por ela.
Entre 1980 e 1990 o comércio internacional mostrou duas tendências
contraditórias, a liberalização crescente do comércio por um lado e projetos
governamentais para criação de blocos comerciais por outro.
Os blocos comerciais, como União Européia, MERCOSUL, Tratado de Livre
Comércio da América do Norte (NAFTA) e Cooperação Econômica da Ásia e do
Pacífico (APEC) mostram a forte tendência de regionalização da economia mundial.
E Castells (1999:152) aponta para a formação de uma nova forma de Estado, o
Estado em rede no qual a economia é unificada.
Produtos e produtores estão cada vez mais globalizados, mas o novo padrão
comercial aponta para diversas redes e nos mostra que as grandes unidades de
comércio são as empresas e as redes de empresas. Muitas empresas formaram e
10 Para Castells (1999:209): “organizações são os sistemas específicos de meios voltados para a execução de objetivos específicos, e instituições são as organizações investidas de autoridade necessária para desempenhar tarefas específicas em nome da sociedade como um todo”.
28
formam redes cooperativas para se tornarem competitivas no sistema globalizado de
produção.
Portanto, o padrão de produção global e comércio internacional são formados
por redes produtivas transnacionais, estabelecido por empresas multinacionais e
distribuído de forma desigual no mundo.
Neste novo sistema econômico, inovar é vital e as fontes de inovação
multiplicam-se quando as empresas estabelecem novas pontes e conexões, atuando
em forma de rede.
De todas as transformações organizacionais, a maior parece ter sido a
mudança de burocracias verticais para a empresa horizontal. Castells (1999:221)
cita sete tendências principais da empresa horizontal: organização em torno do
processo, não da tarefa; hierarquia horizontal; gerenciamento em equipe; medida do
desempenho pela satisfação do cliente; recompensa com base no desempenho da
equipe; maximização dos contatos com fornecedores e clientes e informação,
treinamento e re-treinamento de funcionários em todos os níveis.
As novas tecnologias da informação foram decisivas para as transformações
organizacionais e seu novo modelo flexível e é fato que as possibilidades de acerto
e os ganhos aumentam consideravelmente com a maior interconectividade entre as
empresas e a descentralização dos processos.
A primeira a propor o modelo de trabalho em rede foi a empresa norte
americana Cisco Systems, líder da categoria que fornece computadores. A Cisco11
descreve esse modelo empresarial, como se segue:
“...as relações que a empresa mantém com suas principais clientelas podem
tanto ser um diferencial de concorrência quanto seus produtos ou serviços principais;
o modo como a empresa distribui informações e sistemas é elemento essencial na
força de suas relações; estar conectada não é mais adequado: as relações
empresariais e as comunicações que as sustentam devem existir na trama da rede.
O modelo global em rede abre a infra-estrutura informática da empresa a todas as
11 A pioneira Cisco aplicou nela mesma, a lógica das redes que vendia aos clientes e hoje é a quinta maior empresa do mundo, chegando em 1999 a um valor de capitalização de mercado de US$220 bilhões. A empresa possui uma intranet que proporciona comunicação instantânea a mais de dez mil funcionários no mundo todo, de forma que as informações fluem livres e de forma imediata em toda a rede. A empresa também possui alianças estratégicas com grandes empresas do ramo, tais como Microsoft, Alcatel, Hewlett Packard e Intel, promovendo assim, fontes de informação compartilhadas.
29
principais clientelas, impulsionando a rede para conquistar vantagem perante a
concorrência”.
Cada vez mais, pequenas e médias empresas estabelecem relações com
outras pequenas e médias. Castells (1999) nos fala sobre o mercado de Hong Kong,
que se baseou, já nos anos 1950 até os anos 1980, em redes de pequenos negócios
domésticos que competiam na economia mundial através da atuação em rede,
sendo mais de 85% das exportações de produtos fabricados em empresas familiares
com menos de cinqüenta trabalhadores.
Na década de 1990 esse modelo empresarial difundiu-se rapidamente e se
tornou um modelo de administração, copiado pelos concorrentes mais bem
sucedidos.
As redes de produção e distribuição passaram então a se formar, sumir e
reaparecer de acordo com as variações e flexibilidades do novo mercado global.
Surgiram e surgem diversos exemplos de redes horizontais de empresas que se
baseiam em um conjunto de relações periférico-centrais em todo o mundo. Essas
empresas descentralizam suas unidades e promovem maior autonomia para cada
uma delas.
Segundo Castells (1999), os computadores pessoais e as redes de
computadores foram amplamente difundidos devido à necessidade da utilização de
redes pelas novas organizações. E devido a essas novas tecnologias, a integração
em rede torna-se chave da flexibilidade organizacional e do desempenho das
empresas.
As redes tornam-se o caminho mais fácil para sobrevivência no mercado atual
e o desempenho da rede, por sua vez, dependerá da qualidade e da quantidade das
suas conexões e da sua coerência, ou seja, deve haver na rede, parceiros que
compartilhem interesses e objetivos comuns.
As novas conexões que se estabelecem entre empresas, passam a ser
conhecidas como alianças estratégicas e as empresas perceberam que as conexões
cooperam no sentido de impedir o aumento da concorrência, tornando-se
instrumentos decisivos no ambiente empresarial competitivo.
A empresa que opta por trabalhar de forma autônoma, não sobrevive nesta
nova economia. As conexões e as redes são tão importantes na realidade
empresarial que algumas vezes, é possível constatar práticas de estratégia
30
competitiva que visam impedir o acesso a uma rede por empresas concorrentes.
Com isso observamos que as redes da nova economia, ao mesmo tempo em que
cooperam também competem entre si.
Por outro lado, as redes empresariais deste novo modelo econômico também
têm suas periferias, e quanto mais periférica é uma organização dentro da rede,
mais dispensável e substituível ela será.
Sobre a formação de redes entre empresas na economia global, Dieter Ernst
(apud Castells 1999) afirma que a maioria das atividades econômicas é organizada
em cinco diferentes tipos de redes: as redes de fornecedores, de produtos, de
clientes, de cooperação tecnológica e as redes de coalizões padrão, que são criadas
por aqueles que definem padrões para vincular empresas aos seus produtos.
As redes tornam-se, portanto, novos focos de inclusão e exclusão no mercado,
isso porque a participação nas redes estratégicas exige recursos financeiros,
tecnológicos e depende do grau de importância da empresa no mercado. Outra
opção para entrada na rede podem ser também as conexões com membros já
atuantes. Atualmente, as redes mais importantes são formadas em torno das
influentes multinacionais, detentoras de grande poder e riqueza.
Castells (1999) nos chama atenção para o fato de que, pela primeira vez na
história, a unidade básica da organização econômica não é um sujeito individual
(empresário ou sua família) nem um sujeito coletivo (Estado, empresa, classe
capitalista), a unidade é a rede, que é formada por vários sujeitos e organizações.
É importante relembrar que as redes se modificam continuamente, são
multifacetadas e refletem um grupo de interesses comuns em determinado momento,
elas são dinâmicas e qualquer tentativa de se cristalizar alguma posição dentro dela,
pode torná-la obsoleta.
A partir daí, as redes ampliam-se para outras dimensões dentro da
globalização contemporânea, tais como o Estado e a sociedade civil como um todo,
a serem tratadas no próximo capítulo.
31
II Redes Sociais na globalização: construção coletiva de
participação cidadã
1. Abordagens conceituais de redes sociais
A origem da palavra rede deriva do latim retis, que é o entrelaçamento de fios
com aberturas regulares que formam uma espécie de tecido. Com o tempo, esse
conceito de entrelaçamento ganhou novos significados, sendo então utilizado em
diversas situações.
Historicamente as redes sempre existiram, pois sempre houve laços de
solidariedade horizontal dentre as pessoas, mas o primeiro estudioso a tratar o tema
das redes como objeto de estudo foi o matemático e físico suíço Leonhard Paul
Euler (1707-1783). Ele criou a teoria das redes e a teoria dos grafos.
Para Euler, um grafo nada mais é do que um conjunto de nós, que são
conectados por uma aresta e que formam uma rede. Com essa teoria, o matemático
demonstra que as redes são elementos dinâmicos, em constante movimento.
Desenho de rede proposto por Euler
Nas décadas de 1920 e 1930, a Biologia conceituou as redes como sistemas
de laços realimentados após estudos ecológicos a respeito das teias alimentares e
ciclos de vida. Passou-se então a se utilizar o conceito de redes como sinônimo de
32
flexibilidade, conectividade e descentralização de articulações entre membros. Na
perspectiva da Biologia a rede é o único padrão de organização comum a todos os
seres vivos: "Sempre que olhamos para a vida, olhamos para redes." (Capra, 1996).
Segundo Ayres (2001) uma das características principais dessa rede na
Biologia nos fornece pista para a atual utilização do conceito nas relações pessoais,
que é a não-linearidade, pois a rede se estende por todas as direções e existem
formas de realimentação, que proporcionam a capacidade de auto-regulação.
O conceito de “rede social” foi utilizado pela primeira vez em 1954 pelo
pesquisador John Barnes, do Rhodes-Livingstone Institute, ao realizar um estudo
sobre as relações e interações existentes em uma comunidade de uma ilha
norueguesa. O conceito de rede foi útil, segundo o pesquisador, porque os laços
estabelecidos dentro da rede podem se estabelecer ou se desfazer sem obedecer a
limitações ou imposições. (Sanicola, 2008:15)
A teoria matemática dos grafos e a conceituação desenvolvida por biólogos e
outros estudiosos foram incorporadas pela Sociologia, como base de estudo das
redes sociais, por volta da década de 1960. Numa perspectiva sociológica, em uma
rede social, as pessoas são os nós, e os laços sociais são as arestas, portanto,
também em constante mutação.
Para Sanicola (2008:13), “rede é um objeto que cria uma relação entre pontos
mediante ligações entre eles que, cruzando-se, são amarradas e formam malhas de
maior ou menor densidade. No ponto de ligação, ou seja, no nó e por meio do nó,
acontecem trocas sinérgicas”.
O conceito de rede trata de uma possibilidade de organização, onde é
possível atuar com demandas de maior flexibilidade, conectividade e
descentralização das esferas de atuação e articulação social. Através da estrutura
de redes é possível reunir, de forma mais participativa e democrática, indivíduos e
instituições, desde que suas atuações estejam em torno de um objetivo comum.
Segundo Francisco Whitaker (1998:02), “o resultado da organização em rede
é como uma malha de múltiplos fios que pode se espalhar indefinidamente por todos
os lados, sem que nenhum dos seus nós possa ser considerado principal ou central,
nem representante dos demais. A rede é como um corpo: todos os seus membros a
fazem funcionar, todos são a rede, nas suas ligações uns com os outros”.
As conexões na rede que interligam seus membros são os elos básicos que
mantém o seu funcionamento, as informações que circulam através destas conexões
33
representam o cerne da rede. Informação é poder que circula de forma
descentralizada em uma rede e se não for dessa forma, a rede se dilui e se
transforma em uma hierarquia tradicional. Sendo assim, o poder se desconcentra
nas redes, assim como a informação, que transita de forma horizontal.
Whitaker (1998:04) faz um paralelo com a ação militar onde os exércitos
convencionais são necessariamente e rigidamente piramidais; os corpos
guerrilheiros tendem a se horizontalizar em rede. Ou seja, cada membro da rede é
ao mesmo tempo autônomo em suas ações e responsável pelo seu efeito na
realização dos objetivos do coletivo.
As redes se estabelecem por relações horizontais que através de sua
estrutura flexível, supõe a colaboração e participação entre seus membros. Pode-se
afirmar que as redes são um importante recurso organizacional para estruturação
social, reforçando a análise histórica dos arranjos sociais, que demonstra que a
cooperação, o fazer em conjunto, é próprio da constituição antropológica do ser
humano.
ABDALLA 2002:102 (apud Francisco) reconhece que “o estabelecimento do
princípio da cooperação como eixo racional fundamentador, em oposição ao da
troca competitiva, além de garantir a sobrevivência (seria melhor dizer: ávida) de um
grande numero de pessoas, possibilita uma maior aproximação do universo subjetivo
humano à práxis que, histórica e antropologicamente, possibilitou a existência do ser
humano como espécie e evitou a sua extinção. É a possibilidade de reencontro do
ser humano com a sua essência, perdida pelas conformações históricas
fundamentais na exploração”.
As redes sociais podem se estabelecer com o objetivo de organização e
defesa de suas comunidades ou grupos.
“Desde tempos imemoriais os seres humanos estabelecem vínculos entre si
visando o cuidado e a proteção recíprocos. (...) A solidariedade e a cooperação
sempre caracterizaram as relações e os laços sociais entre famílias, comunidades e
amigos. As preocupações e as obrigações que sentimos em relação a nossos
parentes, amigos e vizinhos não são determinadas por interesses próprios e nem
impostas por autoridade coercitiva externa. Ajudamos aqueles que nos cercam de
forma espontânea, solidária e recíproca”. (De Oliveira & Tandon 1995:12 apud
Francisco).
34
Organizar-se em rede é um padrão já vivenciado por sociedades anteriores e
graças às novas tecnologias da informação, mencionadas anteriormente, aparece
com nova configuração e penetração em todas as instâncias da estrutura social.
As redes não têm limites e podem se estruturar conforme sua dinâmica sem
alterar o equilíbrio da mesma.
De acordo com Guédon, 1984 e Besson, 1994 (Sanicola, 2008), as redes
podem ser divididas em duas categorias, as primárias e secundárias e as formais e
informais.
As redes primárias são basicamente constituídas pela história do sujeito, são
aquelas constituídas por laços familiares, de parentesco, vizinhança, amizades ou
trabalho.
Sendo a família a primeira rede experimentada, ainda constitui local
importante para o desenvolvimento da capacidade de estabelecer relações e, de
certa forma, torna-se determinante para as próximas relações que serão vivenciadas.
As relações de vizinhança também são um recurso importante, trata-se de alguém
que está próximo fisicamente para qualquer eventualidade ou emergência. Já as
relações de amizade expressam o vínculo através da escolha e a proximidade e a
possibilidade de ajuda é mais afetiva do que necessariamente física. A relação de
trabalho, por sua vez, mistura-se com o conceito de vizinho e amigo.
As redes primárias, portanto, não podem ser criadas, elas são naturais e
contam a história de nascimento, escolhas, vínculos, encontros e desencontros.
Ainda segundo os autores, as redes secundárias podem ser formais ou
informais.
As redes secundárias formais são os laços estabelecidos em três diferentes
tipos de redes, as institucionais estatais, as do mercado e as do terceiro setor,
entendido aqui como parte da sociedade civil.
As redes institucionais estatais são as que formam o sistema de bem-estar
social da população obedecendo a leis, ou seja, constituem obrigação para a
realidade social.
As redes de mercado, são aquelas pertencentes à esfera econômica onde o
objetivo é negociar e obter maior lucratividade.
As redes da sociedade civil e do terceiro setor são formadas por
organizações sociais e instituições que tem em comum o fato de não possuírem fins
lucrativo. Os membros desse tipo de rede se reúnem por vontade própria e
35
geralmente, devido a uma necessidade. Esse grupo compartilha, redistribui e se
solidariza em rede.
Por sua vez, as redes secundárias informais podem ser consideradas um
desdobramento das redes primárias, nesse tipo de rede os laços são estabelecidos
entre indivíduos que buscam resposta a uma necessidade imediata, ou seja,
podemos considerá-la como uma espécie de rede de ajuda mútua, como por
exemplo, um grupo de mães que se divide para cuidar dos filhos em forma de rodízio.
Essas pessoas criam uma rede para solucionar um problema, embora não se
incluam nas características de uma rede primária.
Sanicola (2008) afirma que, como já vimos, todo indivíduo nasce dentro de
uma determinada rede, que em geral trata-se da família e grupo social em que está
inserido e conforme as tendências à socialização se expressam, fica claro que as
opções de escolha do sujeito com relação às redes em que irá se inserir, podem, ou
não, levá-lo para muito longe do condicionamento inicial.
Não é possível viver (ou sobreviver) sem atuar em redes, elas são os elos
entre as pessoas desde que o mundo é mundo, embora seu estudo teórico ainda
seja recente.
Podemos compreender as redes sociais sob dois vieses: Como uma realidade
inconsciente de cooperação que se desenvolve naturalmente ou como uma ação
coletiva estratégica, produto de uma ação profissional que objetiva estabelecer
alianças de cooperação ou até mesmo uma tentativa de uma transformação social e
fortalecimento de comunidades ou grupos sociais.
Família, comunidade e organizações são exemplos de redes inconscientes ou
naturais. As redes conscientes, que derivam de uma ação coletiva estratégica
trabalham por maiores ganhos financeiros, ou no caso de uma rede social, pelo
empoderamento dos cidadãos envolvidos.
Em geral, o trabalho em rede se dá por uma necessidade ou um momento
crítico, no qual a resolução individual, sem parceiros, torna-se complexa e às vezes
até impossível.
Sanicola, (2008:8) ainda trabalha o conceito de vulnerabilidade, que pode ser
entendido como uma relação entre os recursos e os desafios disponíveis, ou seja,
“quando o equilíbrio entre desafios e recursos é rompido surge o risco da
vulnerabilidade, que pode ser atenuado por um aumento de recursos”.
36
As redes sociais, através de uma expansão das conexões entre seus
membros, atuam diretamente com o conceito de vulnerabilidade tentando minimizar
o desequilíbrio entre os desafios e recursos.
Além disso, devido às grandes mudanças enfrentadas pela sociedade
contemporânea, as redes, enquanto espaço de debate e participação, tornam-se
uma forma de resgate de organização de identidades, como as religiosas, étnicas,
territoriais e nacionais. Os grupos formados em torno de identidades são também,
formas de redes sociais.
A convivência entre os integrantes de uma comunidade, inclusive o
estabelecimento de laços de afinidade e de redes sociais, será definida a partir de
pactos sociais ou padrões de relacionamento. Nesse âmbito, a rede representa uma
comunidade, com identidades e padrões que serão acordados coletivamente, tal
como um contrato social.
Nesse sentido, o trabalho em rede pode possibilitar maior autonomia para
seus integrantes, desde que haja um grupo reflexivo e encorajado a uma
determinada mobilização.
Vale ressaltar que as redes sociais constróem sua própria cultura, e a cultura
é coletiva, é social. Dessa forma, uma rede não vive sem outras redes, ou seja, a
existência de uma rede perpassa pelas conexões de uma diversidade de outras
redes.
A atuação em rede mostra que a solidariedade e o trabalho em conjunto são
naturais aos seres humanos desde as suas redes primárias, ou seja, este tipo de
atuação não renunciaria a iniciativa e intervenção estatal e sim somaria esforços em
prol de um bem comum. Mas é preciso que o Estado valorize essas iniciativas e as
reconheça como estruturas colaborativas nas políticas sociais.
Para Sanicola (2008), as redes sociais se caracterizam por três dimensões:
sua estrutura, suas funções e sua dinâmica.
A estrutura da rede é dada pelas conexões estabelecidas entre pessoas; as
funções da rede se traduzem em apoio e contenção; e sua dinâmica são os
movimentos que geram os fluxos de informação.
Para não se tornar apenas um emaranhado de possibilidades, a rede precisa
ter uma intencionalidade. O objetivo comum e os valores estabelecidos manterão o
grupo coeso, pois são a base das ações e dos projetos. Mas ainda assim, a rede só
37
existe com o movimento dos integrantes, ou seja, a participação colaborativa é
elemento central para a rede fluir.
Dentro de uma rede, para que seja efetivamente uma rede, não deve haver
hierarquia e a liderança, assim como as decisões, devem ser múltiplas e
descentralizadas.
Outro aspecto essencial para o bom funcionamento de uma rede, é a
conectividade, afinal, somente quando os membros estão ligados uns aos outros é
que a rede se mantém. A informação deve circular de forma livre e deve ser
encaminhada de forma linear para o maior número de conexões possível. As
conexões funcionam como fluxos que se realimentam constantemente.
A Internet é uma importante ferramenta para as redes, uma vez que
representa um espaço (virtual) de conexões entre os participantes, o que otimiza a
comunicação e conseqüentemente, amplia as possibilidades.
A rede é descentralizada, isso significa que o centro da rede localiza-se em
cada ponto dela. Pode-se afirmar que as redes são estruturas multifacetadas e estão
diferentes a cada momento.
As redes possuem ainda múltiplas formas e podem ser classificadas em três
diferentes categorias:
As redes temáticas, que se organizam em torno de um tema, segmento ou
área de atuação das entidades e indivíduos participantes. Essa rede tem como
fundamento a temática definida, seja ela ampla, como a da criança e adolescente,
ou específica como a da amamentação.
Nas redes geográficas ou regionais, o ponto comum é uma região, que pode
ser um Estado, uma cidade ou um bairro.
E as redes organizacionais são as que reúnem instituições ou organizações,
tais como associações ou confederações, dentre outros.
Por mais diversas que sejam as temáticas trabalhadas em cada rede, o que
as une é o propósito de estender suas ações e idéias a um universo sempre mais
amplo de interlocutores.
Podemos afirmar que as redes sociais são também mutáveis, ou seja, a
entrada e saída dos seus membros é livre, portanto as redes estão em constante
movimento.
Na realidade das redes sociais é possível observar dois movimentos
dialéticos desenvolvidos em torno de dois eixos (Sanicola,2008). Esses movimentos
38
podem acontecer simultaneamente em uma rede sendo que em determinado
momento um pode ser mais intenso e visível que o outro. São eles:
O movimento que vai da dimensão individual para a partilha, que é o
sentimento de pertencimento que um indivíduo sente em relação a rede que
participa devido ao encontro com outros membros com os mesmos interesses. Esse
sentimento estimula o compartilhamento e a solidariedade, além de valorizar a
identidade de cada um e do grupo. Em um determinado momento de dificuldade,
uma rede pode trabalhar o tema de forma coletiva e compartilhar recursos e esforços
ou então a rede pode partir para o individualismo. Isso depende de cada rede e
neste momento o papel do mediador é fundamental.
O outro movimento é o que parte da dependência para a autonomia. Esse
movimento parte do sentimento de pertencimento e da experiência de partilha para o
momento no qual as redes tornam-se autônomas para assumir projetos e
responsabilidades.
As redes podem ser, portanto, mais individuais ou mais coletivas e mais
autônomas ou mais dependentes. Quanto mais coletiva e autônoma for uma rede,
mais e melhores projetos poderão ser desenvolvidos, mas como a rede é composta
por seres humanos, essas características dependem muito da cultura, das redes
primárias e de um esforço individual para atuar sob um paradigma coletivo.
Lembremos que os participantes de uma rede social atuam individualmente
pelo coletivo. Quando a responsabilidade não é assumida de forma coletiva pode
gerar uma acomodação e adaptação de alguns membros pouco ativos,
intensificando assim, o risco de perderem sua capacidade de iniciativa e de
criatividade perante um desafio. Para isso é preciso desenvolver uma abordagem
mais ampla e integrada, com foco na dimensão coletiva dos problemas.
“É preciso tempo para que algumas mudanças possam penetrar na cultura
dominante, marcada pela burocratização e pelo assistencialismo, que ao longo dos
anos legitimou e, em muitos aspectos, instituiu a dependência da população perante
as instituições, inibindo qualquer sopro de criatividade social das agremiações da
sociedade, portanto também das redes sociais, entre as quais a família representa a
ponta mais saliente”. (Sanicola, 2008:85)
39
As organizações sociais atuando em rede podem fortalecer um sentimento de
identidade e integração ao setor, embora este papel também encontre obstáculos
com a constituição de comunidades fechadas e fragmentadas, que são reflexos da
condição de desigualdades culturais, sociais e econômicas. Para o processo de
inclusão, portanto, a participação torna-se vital.
A rede pode ser o espaço no qual os interesses da sociedade civil, que é
fragmentada e heterogênea, se articulem com o Setor Público e com o mercado.
Enquanto parte das redes, as organizações não governamentais também podem ser
entendidas como espaço de interlocução entre o Estado e a sociedade civil, devido
ao aumento de parcerias entre os setores.
“Podemos entendê-las (ONGs) como entidades inseridas num conjunto de
atores e formas de participação que se interligam e integram redes. Estas redes
conformam um tecido movimentista, heterogêneo e múltiplo, que tem certa
permanência e articulação, com períodos de maior ou menor mobilização”. Alvarez,
1992.
As redes abrangem sujeitos coletivos e representam hoje novas formas de
participação ou manifestação cidadã, elas estendem-se de forma crescente não
apenas sobre o terreno da sociedade civil, mas abrangem também setores e
partidos do Estado. (Dagnino apud Albuquerque, XX).
Através das redes sociais constroem-se vínculos afetivos e de identidade e há
uma experiência de gestão comunitária e coletiva que tem um papel fundamental na
capacidade organizativa de uma comunidade.
A criação desses espaços de participação coletiva - que são as redes -
podem vir a contribuir para a formação de uma nova sociedade mais participativa e
mais integrada ao Estado.
2. Reflexões sobre a participação cidadã
Historicamente, o conceito de participação se origina na Antiguidade Clássica.
As cidades da Grécia antiga, também conhecidas como pólis, tinham um espaço
40
urbano chamado Ágora, que representava a expressão máxima da esfera pública.
Nesse espaço, apenas os cidadãos, entenda-se aqueles que possuíam propriedade,
deliberavam e discutiam questões relativas a pólis. Tratava-se, portanto de uma
democracia direta.
O conceito vem ganhando novas conotações na medida em que vem sendo
estudado e debatido ao longo dos anos.
Teixeira (1997) entende participação como um fenômeno bastante complexo
e contraditório, sendo que “sua efetivação depende de condições objetivas
decorrentes da estrutura econômico-social e política, da cultura política que se
constrói historicamente e de condições subjetivas em termos da organização e
mobilização da sociedade civil”.
Pedro Demo (1993) concebe a participação na perspectiva da emancipação,
ele a considera um antídoto contra a tendência histórica de dominação e exclusão
social características da nossa sociedade. Para Demo (1996) a participação é
conquistada historicamente. O autor acredita que a participação somente é revelada
por meio de canais que a sociedade disponibiliza.
Participação é uma das palavras mais utilizadas no vocabulário político,
científico e popular da modernidade. Para Gohn (2001), o tema participação se
conceitua segundo quatro interpretações.
Na interpretação liberal, a participação objetiva o fortalecimento da sociedade
civil, a desestimulação da intervenção governamental e a ampliação de canais de
informação aos cidadãos, de forma que eles possam manifestar suas preferências
antes que as decisões sejam tomadas.
Na interpretação autoritária, a participação é orientada para a integração e o
controle social da sociedade e da política, e essa integração se dá através de
políticas públicas que estimulam, de forma hierárquica, a promoção de programas
para diluir conflitos sociais.
Na terceira interpretação, a democrática, a participação é vista como um
fenômeno que se desenvolve tanto na sociedade civil quanto nas instituições, em
forma de políticas.
Na quarta e ultima interpretação, a revolucionária, a participação se estrutura
em coletivos organizados para lutar contra as relações de dominação e pela divisão
do poder político.
41
Neste estudo, devido a amplitude do tema, a abordagem da participação se
dá no contexto do Brasil, onde o conceito sempre esteve presente.
Albuquerque (2004) analisa a participação cidadã no Brasil em suas
diferentes fases, sendo que os primeiros movimentos sociais no país apareceram na
forma de resistências indígenas e negras, nas lutas abolicionistas e na busca por
independência.
A participação nos anos 1950 e 1960, tem caráter desenvolvimentista e torna-
se mais concreta. Ela é marcada por uma mais intensa mobilização social,
principalmente com o movimento sindical e suas reivindicações por reformas
políticas.
Com a ditadura em 1964, o país entra em um momento de forte repressão,
que por sua vez vem acompanhado de movimentos de resistência e enfrentamento,
tais como o Movimento Estudantil e outros movimentos sociais de luta que surgiram
à época.
Gohn 12 (apud Paz, 2000) define participação nas três ultimas décadas
enquanto participação comunitária nos anos 1970, participação popular nos anos 80
e participação social nos anos 1990.
Segundo Paz (2002) o conceito de participação nos anos 1970 foi bastante
influenciado por conceitos de comunidade e baseou-se em ideários comunitários e
de resistência política ao regime militar.
Nesta década de grandes mudanças econômicas, políticas e culturais, as
comunidades eclesiais de base atuaram fortemente enquanto agentes de formação
e organização
Doimo (1995) reitera este pensamento afirmando que juntamente com o
conceito de educação popular, a Igreja destaca-se como aliada na concepção de
participação popular no momento em que surge a Teoria da Libertação.
Para Paz (2000) a concepção de participação presente nestas práticas era a
da participação popular.
Paulo Freire13 traz neste momento o conceito de “educação popular”, que
propõe uma forma de educar-se mutuamente, construindo espaços não hierárquicos
nem autoritários para construção coletiva do conhecimento.
12 Apresentado em palestra proferida por Maria da Gloria Gohn, no Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Movimentos Sociais, no Programa de Pós Graduação em Serviço Social, PUC/SP, 1999.
42
Nesse âmbito, crescem no país os movimentos como os populares que
lutavam por creches e moradia, os clubes de mães e pastorais populares enquanto
espaços de recusa de hierarquias, rompendo subordinações e recusando-se a uma
“cidadania regulada”. (Santos apud Albuquerque, 2004)
No inicio da década de 1970 o Brasil vivenciou a fase que ficou conhecida
como “milagre econômico brasileiro”, período de intenso crescimento da economia.
Os movimentos participativos neste período, inspirados pela participação popular
atuavam, portanto, com novas demandas sociais.
“Na ausência de espaços legítimos de negociação de conflitos, o cotidiano, a
musica, o cinema, o local de moradia, a periferia, o gênero, a raça, tornam-se
espaços e questões publicas, lugares de ação política, construindo sujeitos com
identidades e formas de organização diferentes daquelas do sindicato e partido”.
Albuquerque (2004).
Segundo Albuquerque (2004), os anos 1970 e 1980 representam uma fase de
novos movimentos sociais enquanto espaços de construção de uma cultura
participativa e autônoma, multiplicando-se pelo país e formando uma rede de
organizações populares que se mobilizam pela conquista, garantia e ampliação dos
direitos.
Nos anos 1980 o conceito de participação esteve vinculado com a luta pela
redemocratização e as relações Estado – Sociedade.
Com os novos movimentos sociais emergindo no processo de
democratização, a sociedade civil se fortalece e traz novas dimensões para a
categoria de participação, abrindo canais de diálogo e negociação com o Estado.
Para Paz (2002), essa nova cultura participativa é o inicio de uma transformação
desta relação Estado – Sociedade, vista até este momento como uma relação
antagônica.
Mas é a partir da Constituição de 1988 que a idéia de participação torna-se
cada vez mais clara e os movimentos sociais não reivindicam mais somente a
condição de incluídos na sociedade, eles reivindicam também sua participação na
definição do tipo de sociedade em que querem ser incluídos, eles querem participar
da “invenção de uma nova sociedade”. (Dagnino, 1994).
13 Paulo Freire foi um grande educador brasileiro que se concentrou na educação popular para a cidadania. Uma de suas obras mais marcantes foi a Pedagogia do Oprimido, Educação como Prática da Liberdade, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.
43
Segundo Paz (2002), com a “Constituição Cidadã”, como ficou conhecida, a
participação direta dos cidadãos amplia-se para dimensões de direitos sociais e
cidadania, avançando de um período reivindicativo para um momento propositivo.
Paz (2002) ainda defende os anos 1980 como um período no qual a
sociedade civil brasileira se reorganiza e coloca em pauta um conjunto de temas
relativos à democratização e à reforma do Estado.
Como apresentado por Gohn (apud Paz, 2000):
“Nos anos 80, a temática da participação social era um ponto de pauta na
agenda política das elites políticas, denotando dois fenômenos: de um lado a crise
de governabilidade das estruturas de poder do Estado, desgastadas e
deslegitimadas pelo autoritarismo; de outro, a legitimidade das demandas expressas
pelos movimentos sociais – novos ou velhos – e a conquistas de espaços
institucionais como interlocutores válidos”.
As organizações de base, a pressão e ocupação de espaços continuam
sendo o eixo da participação, mas segundo Gohn (apud Paz), passa-se a falar em
participação popular, vinculada à organização e mobilização de setores populares.
Pontual (2000) defende a o processo de radicalização da democracia, no qual
a participação popular é elemento substantivo para possibilitar efetivamente uma
mudança na relação entre o Estado e a Sociedade em que esta ultima passe a
controlar e definir o Estado que necessita.
Segundo Gohn (1999), a partir dos anos 1990, com a dimensão dos direitos
de cidadania e participação, percebe-se com maior freqüência a utilização do termo
“participação social”.
Telles (apud Teixeira 2001) concorda e sugere a requalificação do conceito de
participação popular ou social, nos termos de uma participação cidadã que “interfere,
interage e influencia na construção de um senso de ordem pública”. E nesse sentido
este conceito (de participação cidadã) contemplaria dois elementos, o “fazer ou
tomar parte” e o elemento cidadania, no sentido cívico.
A criação e o exercício de direitos, deveres e responsabilidades fomentam a
organização e fortalecem a sociedade civil. Sendo assim, conforme argumenta
Teixeira (2001), a participação cidadã é diferente da participação social, popular e
comunitária por articular elementos de cidadania e de participação.
44
Um marco desta década foi a Eco 92, Conferência das Nações Unidas para o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento e que aconteceu em junho de 1992, na cidade
do Rio de Janeiro. Esta Conferência consolidou no Brasil o conceito de
desenvolvimento sustentável para a conscientização dos problemas relacionados ao
meio ambiente.
O evento, que contou com a participação de diversos chefes de Estado, teve
como principal resultado um documento chamado Agenda 21, que consiste em um
conjunto de ações e políticas a serem implantadas por todos os países participantes
da conferência com o fim de promover uma nova política de desenvolvimento,
pautada na responsabilidade ambiental. Até hoje é possível participar dos encontros
da Agenda 21, que trabalha ativamente com questões ambientais e sociais.
Além da Agenda 21, tomaram corpo durante as articulações da Eco 92, duas
importantes redes que atuam até o presente momento, a REBEA – Rede Brasileira
de Educação Ambiental, e a REPEA – Rede Paulista de Educação Ambiental. Essas
redes vem ao longo dos anos articulando outras redes, criando uma grande malha
nacional de educadores ambientais.
Estes são exemplos práticos de como se constituiu a participação cidadã na
década de 90.
Teixeira (2001) utiliza o conceito de participação cidadã para qualificar este
período enquanto “processo emergente (...) de uma sociedade civil plural que busca
criar espaços públicos em que se expressam interesses, aspirações, valores, se
constroem consensos, definem dissensos e regulam conflitos”.
A participação cidadã também pode ser entendida através da suas várias
modalidades de ação, pois ela se efetiva em diferentes dimensões, tais como de
integração, decisória, educativa, expressiva simbólica, dentre outras.
“A participação cidadã, nas suas diferentes dimensões, utilizando
mecanismos institucionais, contribui para o fortalecimento da sociedade civil que
passa a exercer importante papel na democratização do Estado e das instituições”.
(Teixeira, 1997).
Mesmo utilizando diferentes terminologias, participação cidadã para Teixeira
(2001) e participação social para Gohn (1999), ambos concordam que participação
45
atualmente significa o fortalecimento de mecanismos democráticos e de
consolidação da cidadania.
As redes sociais manifestam-se como novos canais de participação cidadã
uma vez que a ação desses grupos podem influenciar a opinião pública e a cultura
da sociedade e em decorrência disso, relacionar-se com o Poder Público para
influenciar em questões políticas de forma democrática e participativa levando novos
temas e discussões à agenda publica.
Para Teixeira (1997), a existência de uma sociedade civil organizada e
autônoma em relação ao Estado e ao mercado constitui elemento importante para a
efetivação da participação. Isso requer a constituição de espaços públicos
autônomos em que as diversas organizações sociais e os indivíduos possam exercer
seus direitos de informação, de opinião e possam articular-se numa ação coletiva.
Desse modo, no contexto dos anos 1990 surge uma nova forma de
compreensão da participação social. Paz (2002) admite que a esfera local passa a
ser entendida como dinamizadora das mudanças sociais e como espaço de
“resistência aos efeitos devastadores da globalização”, sendo que a revalorização do
local representaria um contraponto às formas de dominação presentes na
globalização.
O processo de participação cidadã no Brasil encontra obstáculos como o seu
histórico sócio político e uma sociedade civil ainda muito frágil e fragmentada.
“Participação é fazer parte, tomar parte, ser parte de um ato ou processo, de
uma atividade pública, de ações coletivas. A referencia à parte implica pensar o todo,
a sociedade, o Estado, a relação entre as partes entre si e das partes com o todo.
Esse todo não é homogêneo (...). Diante disso coloca-se o problema de como atingir
interesses gerais numa sociedade dominada pelo particularismo e
fragmentação”.(Teixeira, 1997)
Para (Paz 2002) as mudanças mundiais, econômicas e sociais provenientes
da globalização, reconfiguram a participação nos anos 1990. Nesse contexto as
ações voltam-se para saídas mais individuais do que coletivas.
Surgem novas identidades nos movimentos sociais que passam a constituir-
se por temáticas como gênero, idade e territórios, por exemplo. A questão da
46
participação por sua vez, precisa de novos espaços de atuação devido a esses
novos sujeitos sociais e às mudanças globais.
Paz (2002:30) afirma que “as formas de organização construídas ao longo
destas três décadas já não dão conta de enfrentar as novas demandas de relação
com o Estado e de temas globais. Surge então o conceito de redes sociais,
enquanto um caminho para potencializar e articular as diferentes forças sociais (...)
enquanto possibilidade de romper com modelos tradicionais de estruturação de
movimentos, possibilitando uma maior democratização interna, ampliando suas
bases e a consecução de seus objetivos reivindicatórios”.
A participação cidadã não deve ser encarada como um fim, mas sim como um
meio para se construir uma sociedade mais democrática. As redes sociais podem vir
a contribuir com esta demanda enquanto uma lógica estratégica de transformação
individual, coletiva e social, elas podem, portanto ser espaços públicos propícios
para tal, desde que se dediquem a uma permanente reflexão critica e coletiva.
Deste modo, a participação entendida como confronto dá lugar a uma
participação entendida como negociação, embora seja importante lembrar que
espaços de participação sempre foram “ofertados” pelo Estado, até mesmo no
momento da ditadura, porém de forma muito restrita e privilegiada.
Um dos elementos fundamentais e determinantes para viabilizar a
participação é a informação. A qualidade da participação de uma sociedade é
proporcional à qualidade e quantidade das informações que cada um possui e as
redes sociais são mais um espaço para se compartilhar informações.
Enquanto meio de tornar públicas novas demandas e novos valores, as redes
sociais mostram seu possível caráter de transformação social. Ao se multiplicarem,
elas podem contribuir para a criação de diversos canais de democracia participativa,
reivindicando uma cidadania mais ativa.
A cidadania pode ser entendida como a relação entre o Estado e o cidadão.
Em uma definição fornecida pelas Ciências Sociais, “cidadania é a pertença passiva
e ativa de indivíduos em um Estado-nação com certos direitos e obrigações
universais em um especifico nível de igualdade”. (Janoski, apud Vieira 2001:34).
47
Desse modo, Vieira (2001) traz a idéia de que a cidadania é construída tanto
por direitos passivos de existência, que são legalmente limitados, como por direitos
ativos que propiciam a capacidade de influenciar o poder político.
Para Albuquerque (2004), garantir continuidade, permanência e
aperfeiçoamento da democracia participativa “é preciso priorizar praticas menos
dependentes da iniciativa governamental, buscar o fortalecimento do tecido social,
identificando e qualificando as organizações populares autônomas e outros atores
da sociedade civil, (...) enquanto promotores da cidadania”.
Como um canal de participação cidadã, as redes sociais precisam se
aperfeiçoar continuamente para dar conta dos novos desafios que se apresentam no
cotidiano.
É possível perceber ao longo da história do país que a mobilização social é
fator de transformação a partir de espaços de organização da sociedade, embora
uma nova concepção de democracia, mais participativa, ainda seja um processo
lento e complexo.
Nesse sentido de construção democrática, o conceito de participação cidadã
é estratégico enquanto promotor de cidadania e transformador das relações Estado
e Sociedade Civil.
É preciso, portanto, atenção com relação aos espaços de participação muito
segmentos e esvaziados de conteúdo democrático. Devido ao histórico de
autoritarismo que produziu uma sociedade frágil no que diz respeito a participação
cidadã, percebemos uma dificuldade da sociedade em se mobilizar com eficiência
para ocupar os espaços de forma realmente transformadora.
“... A apatia, a indiferença em relação a qualquer questão que não tenha
relação com os interesses próprios, (...) porque para uns são oferecidas muitas
oportunidades de desfrute, para outros, a luta pela sobrevivência não lhes dá
energia para sequer pensar em alternativas”. (Teixeira, 1997).
As redes sociais, enquanto atores sociais e políticos podem ser uma
possibilidade de incentivo para a participação cidadã, uma vez que podem favorecer
os processos de construção de identidade de um coletivo, que expressa suas
aspirações e necessidades, num primeiro momento através da convivência, da
tomada de decisão e, num segundo momento, trabalhando processos mais
complexos.
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III Caracterização do Senac SP e o Programa Redes
Sociais
1. Breve histórico dos campos de atuação do Senac SP
O Senac – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial é uma instituição
educacional de direito privado e sem fins lucrativos, criada pelo governo federal por
meio dos Decretos-Lei nº 8.621 e 8.622, de 10 de janeiro de 1946. Tal iniciativa
deveu-se ao esforço do empresariado do comércio que, inspirado na bem-sucedida
criação do Senai em 1942, na área da indústria, reivindicou e obteve do governo a
incumbência para organizar, manter e administrar um organismo nacional de
formação profissional para o setor terciário.
Dessa forma, foi atribuído à Confederação Nacional do Comércio o encargo
de implantar e desenvolver, em todo o País, escolas de aprendizagem comercial
para empregados e candidatos a emprego no setor comercial. Para viabilizar essa
tarefa, a legislação que deu origem ao Senac, e posteriormente ao Sesc 14 ,
determinou que o comércio contribuiria com o correspondente a 1% da sua folha de
pagamento para a manutenção do Senac e com 1,5% para o Sesc.
Atualmente o orçamento do Senac é misto, ou seja, metade da verba provem
da arrecadação dos comerciantes, que contribuem com 1% da sua folha de
pagamento, e a outra metade é proveniente das atividades e cursos desenvolvidos
pela entidade. Hoje, o orçamento anual total é de R$ 340 milhões e o próprio Senac
São Paulo gerencia estes recursos.
O Senac, por ser uma entidade privada que opera com recursos públicos
(arrecadação compulsória sobre a folha de pagamento das empresas de comércio e
serviços), é obrigada a cumprir a mesma legislação financeira, contábil e
orçamentária que rege as empresas públicas (Lei n° 4.320/64).
Assim, além do Orçamento Gerencial (planejamento financeiro), O Senac
deve elaborar um Orçamento Oficial, denominado “Orçamento-Programa”, que é
submetido à aprovação do Ministério do Trabalho, através do Departamento
Nacional do Senac. As características deste Orçamento são semelhantes às do 14 O Sesc – Serviço Social do Comércio visa à valorização do trabalhador, oferecendo atividades de caráter educativo nas áreas de esporte, saúde, cultura, lazer e cidadania.
49
planejamento financeiro, entretanto sua estruturação contém detalhamentos
específicos que são padrões a todos os órgãos de administração pública, devendo
retratar fielmente as ações a serem empreendidas nos Planos de Ação Nacional e
Regional e as possibilidades reais de execução dos diversos projetos e atividades,
para que estes se processem segundo as diretrizes estabelecidas15.
Por ter sido criado por decreto-lei, é comum pensar-se que o Senac seja uma
instituição pública. Entretanto, trata-se de uma entidade de direito privado, cuja
organização e administração estão delegadas, por lei, à Confederação Nacional do
Comércio, órgão máximo de representação sindical patronal do setor de comércio e
serviços.
Seis meses após o surgimento do Senac Nacional foi criado o Senac São
Paulo, o primeiro a iniciar suas atividades no País com a eleição do Conselho
Regional do Estado de São Paulo em 13 de julho de 1946. De início, a atuação do
Senac São Paulo estava voltada, exclusivamente, para a formação de aprendizes –
jovens a partir de 14 anos encaminhados pelas empresas. Por esse motivo, a
instituição manteve durante vários anos, como mais importantes títulos de sua
programação, o Curso Preparatório para o Comércio, com duração de dois anos, e o
Curso Básico de Comércio, de quatro anos. Essas atividades eram desenvolvidas,
principalmente, em instalações provisórias e de terceiros.
Numa segunda fase de sua história, entre 1954 e 1961, o Senac São Paulo
diversificou sua atuação, ampliando o atendimento a trabalhadores dos vários
setores de comércio e serviços. Com isso, passou a oferecer cursos também para
jovens que ainda não trabalhavam e queriam entrar para o comércio, bem como
para trabalhadores adultos já empregados ou à procura de emprego. Nessa época
foram implantados os ginásios comerciais – cursos regulares de formação
profissional com quatro anos de duração – e os cursos de formação acelerada, de
curta duração, destinados à clientela adulta. Esse período marca também o início da
construção de prédios próprios.
Na década de 1960, o Senac São Paulo continuou desenvolvendo essas duas
linhas de trabalho e, para dar continuidade ao chamado “ginásio comercial”, criou o 15 Para o acompanhamento das variações entre o previsto e realizado, mensalmente são encaminhados ao Departamento Nacional e ao Conselho Fiscal, relatórios específicos que obedecem às normas estabelecidas no CODECO – Código de Contabilidade e Orçamento. No Senac São Paulo, a Gerência de Finanças é responsável pela gestão desta atividade. Para elaboração do Orçamento Oficial, norteia-se pelo Orçamento Gerencial das Unidades e por orientações específicos do Departamento Nacional do Senac (previsão de arrecadação da receita compulsória).
50
Colégio Técnico Comercial, mantido até o final daquela década, com cursos de
Contabilidade e Secretariado, que seriam equivalentes, hoje, ao ensino médio.
Também foi criado o curso de Auxiliar de Vendas e Escritório, com três anos de
duração.
Nos anos 1970, a instituição ampliou o número de atendimentos, diversificou
seus serviços e sua clientela, incluindo agora empresas e, de forma geral, a própria
comunidade. Assim, a ação de suas unidades, então denominadas Centros de
Formação Profissional, foi ampliada com a atuação das Unidades Móveis, o uso da
metodologia de ensino a distância e das Empresas Pedagógicas.
A década de 1980 foi marcada por uma grande crise econômica nacional e
internacional, com muitas transformações sociais vindo a reboque do
desenvolvimento acelerado da alta tecnologia e da difusão da informação. O
mercado de trabalho passou por mudanças profundas, que alteraram muito o perfil
das ocupações dos diferentes setores da economia. Tudo isso afetou de forma
intensa o Senac São Paulo.
Essa necessidade de mudança resultou na elaboração da Proposta
Estratégica para o Senac São Paulo nos anos 1980. O documento propunha o
equilíbrio da situação financeira em curto prazo, assegurava um futuro mais estável
da instituição em longo prazo e redimensionava a estratégia de atendimento e
crescimento na capital e no interior. Em 1984 o Senac abriu a sua atuação para
todos os públicos.
Uma das conseqüências dessa proposta foi a expansão da rede física da
organização, principalmente na Grande São Paulo, com a implantação de um novo
conjunto de Unidades Operativas, a partir de então divididas em Especializadas e
Polivalentes.
A partir de 1989, com a implantação do curso superior de Tecnologia em
Hotelaria, o Senac São Paulo passou a atuar também no campo da educação
superior.
Nos anos 1990, a abertura econômica inseriu o Brasil no mundo globalizado,
inundado por produtos e serviços de toda a parte do mundo, transformando o
cenário nacional num ambiente extremamente competitivo para todos os setores da
economia. A busca da qualidade em produtos, processos e serviços tornou-se
imperativa para a sobrevivência dos negócios. Somado a isso, um movimento da
51
população em defesa da qualidade de vida, ecologia e cidadania revalorizou a
educação como fator fundamental para esse processo de mudança.
O Senac São Paulo respondeu a essas transformações com a definição da
sua Proposta Estratégica, que estabeleceu diretrizes e planejamento para suas
ações ao longo da década e contou com a participação de diversos setores da
organização, proporcionando um modelo de gestão mais moderno, descentralizado
e flexível. Com isso, a instituição pôde ter uma visão mais ampla do mercado,
diversificando seus produtos e serviços.
É importante salientar que o Senac São Paulo é uma instituição que atua em
rede. São mais de 50 unidades que oferecem, em geral, os mesmos cursos, que
devem ter a mesma qualidade seja em Botucatu, interior de São Paulo, ou em
Itaquera, bairro da zona leste da cidade. Para isso, sua atuação interna necessita de
pré requisitos de rede, como a comunicação horizontal, autonomia e co
responsabilidade.
Nos anos 1990 o Senac criou o Programa Senac de Educação e Cidadania,
que sistematizou e intensificou a atuação institucional no campo da responsabilidade
social. Esse Programava visou reunir todas as ações sócio comunitárias
desenvolvidas pela Instituição, como as campanhas de Amamentação, Diabetes,
Prevenção do Câncer de Pele, Boa Visão, além de programas de capacitação
profissional para populações de baixa renda e participação em movimentos sociais.
Neste período tiveram início as atividades do Canal Aberto, que sistematiza o
fluxo de comunicação e opinião dos clientes do Senac São Paulo através de caixas
de sugestões, bem como as atividades da TV Senac São Paulo, que iniciou sua
operação como canal educativo, levando ao ar uma programação com temas
voltados para o mundo do trabalho.
A partir de meados da década de 1990, multiplicaram-se os esforços para a
inserção decisiva da instituição no âmbito da educação superior. Até o final desta
década, são criadas as Faculdades Senac de Moda, Comunicação e Artes, Ciências
Exatas e Tecnologia, que se somam à Faculdade Senac de Hotelaria e Turismo.
Em 2002 o Senac lançou o site do Portal Setor 3, que foca o trabalho de
organizações de base comunitária e em 2005 lançou o Programa Voluntariado
Corporativo, que coordena e promove iniciativas em toda a rede, visando o incentivo
ao trabalho voluntário de funcionários, alunos e visitantes.
52
O Senac hoje conta com dois mil e setecentos funcionários diretos e está
estruturado organizacionalmente conforme organograma a seguir:
53
Em julho de 2008, o Governo Federal e o Sistema S16 fecharam acordo que
amplia as vagas em cursos e a gratuidade dos serviços de educação ofertados pelo
sistema.
Com o acordo firmado em nível nacional com o MEC, o Senac se
compromete a oferecer vagas gratuitas, relativas a parcelas de sua receita
compulsória em cursos de formação inicial e continuada e de educação profissional
técnica de nível médio.
Esse fato trouxe grandes mudanças internas para a Instituição, que se
comprometeu a cumprir o acordo de forma gradual, ou seja, no ano de 2009 o
Senac oferecerá gratuidade em 20% dos seus cursos, em 2010 será 25% até chegar
em 66,6% em 2014.
O Senac São Paulo decidiu incorporar as diretrizes desse compromisso na
sua Política de Concessão de Bolsas de Estudo, que para o Departamento Nacional,
fica conhecida como Programa Senac de Gratuidade (PSG), denominação que não
foi adotada pelo Senac São Paulo.
Até o ano de 2002, o Senac havia realizado 38 milhões de atendimentos,
entenda-se aqui alunos formados em diversos cursos dentre os cerca de dois mil
cursos oferecidos.
2. Programa Redes Sociais
O Senac - SP tem como objetivo tornar-se referência como uma organização
16 Sistema S é o nome pelo qual ficou conhecido o conjunto de onze instituições que, conforme instituido pela
União e estabelecido pela Constituição brasileira, são consideradas contribuições de interesse de categorias profissionais. As receitas arrecadadas pelas contribuições ao Sistema S são repassadas a entidades, na maior parte de direito privado, que devem aplicá-las conforme previsto na respectiva lei de instituição. Em geral, as contribuições incidem sobre a folha de salários das empresas pertencentes à categoria correspondente sendo descontadas regularmente e repassadas às entidades de modo a financiar atividades que visem ao aperfeiçoamento profissional (educação) e à melhoria do bem estar social dos trabalhadores (saúde e lazer). As entidades em questão são as seguintes: INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária; SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial; SESI - Serviço Social da Indústria; SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio; SESC - Serviço Social do Comércio; DPC - Diretoria de Portos e Costas do Ministério da Marinha; SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas; Fundo Aeroviário - Fundo Vinculado ao Ministério da Aeronáutica; SENAR - Serviço Nacional de Aprendizagem Rural; SEST - Serviço Social de Transporte; SENAT - Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte; SESCOOP - Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo. Uma vez que a maioria das instituições tem sua sigla iniciada pela letra "S" compreende-se o motivo do nome do Sistema S. Fonte: "http://pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_S"
54
do terceiro setor17 através de ações inovadoras e sua missão é “proporcionar o
desenvolvimento de pessoas e organizações para a sociedade do conhecimento,
por meio de ações educacionais comprometidas com a responsabilidade social”.
Como visto anteriormente, na década de 1990, o trabalho social desenvolvido
pelo Senac ganhou nova configuração com o fortalecimento do Terceiro Setor.
A partir desse momento, a instituição redirecionou seu foco no sentido de
promover o fortalecimento das organizações não-governamentais, mais
precisamente as de base comunitária, por meio da capacitação, integração e
mobilização.
Influenciado pelo novo modelo de gestão em rede, proposto pela globalização
contemporânea, o Senac passou a concentrar recursos no desenvolvimento de
lideranças, gestores e educadores de organizações sociais, que estão hoje
articuladas com a instituição, através do Programa Redes Sociais.
O Senac entende rede social como um “sistema capaz de reunir e organizar
pessoas e instituições de forma igualitária e democrática, a fim de construir novos
compromissos que beneficiem a vida das comunidades”.
Para Claudio Silva, a rede pode trazer “melhoria das condições econômicas
de uma comunidade solidária e de arranjos produtivos locais que permitam que a
cidade ou a região ou o bairro cresçam e abram espaço para emprego das pessoas
que moram naquela região (...) o Senac tem como objetivo a proposta
desenvolvimento de pessoas e organizações e o desenvolvimento só se da quando
existe o desenvolvimento da sociedade daquela comunidade. Desenvolver a
sociedade para que ela possa crescer de forma planejada, consciente e madura e
isso implica na participação das pessoas e instituições nas discussões dos seus
problemas. Essa idéia levou-nos a criar um projeto, uma proposta que é desenvolver
redes sociais”.
O Senac São Paulo desenvolve o Programa Rede Social desde 1997 a atua
em diversos municípios do Estado.
A missão do Programa Rede Social do Senac é “mobilizar, capacitar e
fortalecer as organizações sociais para implementar ações em rede que visam à
melhoria da qualidade de vida de suas comunidades e contribuem para o
17 Para o Senac SP, o Primeiro Setor é o Estados, que administra verbas públicas com finalidades públicas, o Segundo Setor é o mercado, que administra verbas privadas com finalidades privadas e o Terceiro Setor são as instituições que administram verbas privadas com finalidade pública, como é o caso do Senac e da maioria das ONGs. Fonte: Material Formatos Brasil – Formação de Atores Sociais, Senac SP, 2004.
55
desenvolvimento local”.
Para Claudio Silva, gerente de desenvolvimento do Senac SP, este programa
“tem um papel bastante importante (...) que é de criar pontos de inclusão (...) e
pontes que permitam que as pessoas cruzem e passem para a parte da sociedade
incluída” .
A instituição propõe uma metodologia de trabalho em rede, que tem como
objetivo articular pessoas e organizações para propor soluções aos problemas
sociais das localidades de forma a otimizar recursos, conjugar esforços e favorecer o
intercâmbio de experiências para o crescimento comum.
O Programa Redes Sociais é também um trabalho educativo, no sentido de
orientar as pessoas e organizações a atuarem de forma participativa e coletiva para
a melhoria de suas comunidades. Para Cláudio Silva “a educação profissional não
se faz só de formação de pessoas ou de técnicos, ela vai muito além e permite que a
gente pense numa formação ou num trabalho que desenvolva comunidades também,
nesse sentido eu amplio as possibilidades que eu tenho em uma determinada
comunidade para o emprego. Se eu tenho uma melhor organização social, as
pessoas se juntam para estabelecer um plano diretor da cidade e certamente fazer
um plano diretor para crescimento econômico para desenvolvimento econômico
dentro da cidade”.
Atualmente no Senac SP são cerca de 700 organizações trabalhando em
rede e mais de 70 projetos em andamento nas seguintes localidades do interior de
São Paulo: Águas de São Pedro, Araçatuba, Araraquara, Barretos, Bauru, Botucatu,
Campos do Jordão, Carapicuíba, Catanduva, Guaratinguetá, Guarulhos, Itirapina,
Jaboticabal, Jaú, Jundiaí, Limeira, Marília, Miguelópolis, Osasco, Piracicaba,
Presidente Prudente, Rio Claro, Rio Preto, Santos, São Carlos, São João da Boa
Vista, São José dos Campos, Sorocaba, Taubaté e Votuporanga e nos seguintes
bairros da capital: Bela Vista, Campo Grande, Jabaquara, Itaquera, Lapa, Penha e
Vila Prudente.
Em cada uma das localidades onde o Programa está sendo implementado, o
Senac investe em um colaborador para articular e mediar a Rede Social. Dentre
suas atribuições, este colaborador que é chamado de mediador, deve inicialmente
identificar através de pesquisa de campo, os atores sociais da localidade.
Após o diagnóstico inicial, o mediador convida esses atores sociais, que são
em geral as lideranças comunitárias, representantes de organizações sociais, de
56
poder público e moradores representativos da localidade, para um primeiro encontro,
onde é feita a proposta de atuação em rede.
Aceita a proposta, os encontros tornam-se periódicos e o mediador incentiva
o grupo a identificar objetivos comuns, de forma a estabelecer compromissos,
responsabilidades e projetos comuns. O mediador deve assessorar na
implementação desses projetos que visam a melhoria da qualidade de vida da
comunidade envolvida.
Para Cecília Tavares, técnica de desenvolvimento do Senac SP, “o papel da
instituição é o da mediação e de organizar esse processo de forma democrática para
garantir a participação igualitária dos componentes (o Senac) também anima os
encontros e faz registros dos principais pontos debatidos e dos novos compromissos
que o grupo assume, influencia para a participação cooperativa e descentralizada
(...) anima pessoas para que esses novos compromissos se transformem em
projetos e cria veículos de comunicação eficientes que mantenham as pessoas
informadas e conectadas”.
O Senac utiliza uma metodologia para a formação e a articulação das Redes
Sociais, que é uma orientação bastante flexível, uma vez que a participação no
processo de formação de redes sociais deve ser livre, portanto a metodologia não
pode enrijecer o processo.
O primeiro passo para a formação de uma rede social é realizar um encontro
para a criação de um espaço comum. O objetivo neste momento é a formação de
elos entre os componentes.
Um segundo momento é o de identificação e conhecimento mútuo, onde os
participantes se apresentam e se reconhecem como atores sociais da mesma
localidade. Um fato curioso é que se percebe sempre um desconhecimento do
trabalho do outro, a falta de conexão entre trabalhos similares numa mesma
localidade fica bastante nítida e com isso evidencia-se a necessidade de um
trabalho mais integrado entre as pessoas e instituições.
Outra etapa diz respeito à proposição e estabelecimento das visões de mundo
dos componentes para efetuação de propostas comuns. Ou seja, depois de se
conhecerem e identificarem o trabalho dos outros membros da rede é necessário
diagnosticar se o grupo compartilha da mesma visão, dos mesmos objetivos. Mesmo
que executem trabalhos com temáticas diversificadas, é preciso que o grupo
compartilhe um mesmo objetivo amplo, como o desenvolvimento social da região
57
onde atuam, por exemplo.
Um quarto passo para formação da rede social é a composição e
estabelecimento de parcerias e é neste momento que o grupo começa o processo
de troca, que pode ser de informação, serviços ou objetos, por exemplo.
O quinto passo é a definição e execução de um projeto ou ação comum. Após
o grupo se conhecer, se conectar, compartilhar uma visão comum e realizar trocas,
os projetos surgem naturalmente com as demandas do grupo. Dessa forma eles se
organizam para o início de uma experiência participativa, que é a realização de um
projeto comum.
Esses passos não precisam seguir uma ordem rígida, apenas precisam
acontecer, uma vez que cada rede tem o seu perfil e a sua dinâmica.
A participação na rede é livre, gratuita e aberta a todos os interessados e o
Senac acredita que as redes sociais são ambientes democráticos, que prezam as
relações horizontais e igualitárias e acredita que as soluções e alternativas para os
problemas sociais devem ser construídas em conjunto.
Embora o Senac seja o fomentador dessas redes sociais, é sempre preciso
tomar cuidado com a questão da horizontalidade na rede. Como afirma Cecília
Tavares, "Pela expertise e pelo nome que o Senac tem no mercado (...) tem um
peso significativo nas decisões e proposição de projetos”.
Como o Senac tem um peso grande dentre as instituições do terceiro setor,
muitas vezes percebemos uma acomodação dos seus participantes, que esperam o
Senac trazer idéias e soluções.
Com o passar do tempo, e aí o papel do mediador é essencial, é preciso
mostrar aos participantes a importância da participação, da co-responsabilidade e da
autonomia. E isto não é simples de assimilar, devido ao histórico social já comentado
anteriormente, que incentiva o assistencialismo, o clientelismo e a burocratização.
Mas é função do mediador e de todos incentivar transformações não só
comunitárias, mas de mudanças de paradigmas individuais.
Para Claudio Silva, os resultados do Programa Redes Sociais tem sido
valiosos, em suas palavras: “tudo o que eu tenho lido, acompanhando os relatórios
que me vem das redes, acompanhando o site, tudo o que está acontecendo e
acontece e aconteceu dentro das redes, eu percebo como um trabalho que tem uma
qualidade um desenvolvimento, uma característica marcante que é o da autonomia,
que eu acho muito importante, a preocupação constante de que o Senac não é o
58
dono da rede, nem é o coordenador e nem é aquele que vai sustentar a rede
eternamente e a saída da instituição em algum momento não deve implicar em um
encerramento da atividade, é claro que em uma rede que se inicia ela necessita de
mais presença e mais apoio institucional, como uma criança que precisa de alguém
que possa ajudá-la a alimentá-la, mas a medida em que essa rede avança e ganha
maturidade elas passam a se auto gerir e as pessoas passam a entender desse
processo dessa discussão e dessa construção concertada. Então o grande mérito da
metodologia é fazer com que as pessoas entendam compreendam e aprendam a
trabalhar dessa forma ““.
59
IV Rede Social Campo Grande - SP e o processo de
participação cidadã
1. Antecedentes da criação da Rede Social Campo
Grande - SP e o seu processo organizativo
No período entre 1832 e 1935 Santo Amaro era considerado município e hoje
é um grande distrito do município de São Paulo, que abrange os sub distritos de
Campo Belo, Campo Grande e Santo Amaro.
O centro de Santo Amaro é principalmente voltado para o comércio, que se
desenvolveu rapidamente e hoje é uma região mista, com comércio, moradias e
indústrias.
Nos anos 1970, essa localidade prosperou muito devido às novas indústrias
que foram instaladas, especialmente no Campo Grande, por imigrantes europeus.
Nesta época, Santo Amaro chegou a responder por 50% do recolhimento de
impostos na cidade.
Com o passar dos anos, o bairro do Campo Grande perdeu muitas dessas
empresas, que migraram para o interior e hoje desenvolve principalmente atividades
do setor de comercio e serviços, embora ainda conte com multinacionais, como
Philips, Oracle, Pfizer, Deustche Bank e Schering do Brasil, além de hotéis de alta
categoria, voltados para o turismo de negócios, como o Transamérica e Melià.
Segundo dados da Prefeitura de São Paulo, a população do Campo Grande é
de 91.373 pessoas18 e 46,4% dos domicílios têm faixa de renda per capta superior a
cinco salários mínimos19.
No ano de 2004, o Senac - SP então com 58 anos de atuação na área da
educação técnica e profissionalizante, e desde 1989 atuando na educação superior,
trouxe para o Campo Grande o Centro Universitário Senac - Campus Santo Amaro.
A construção do Campus Senac se deu com o objetivo de promover
integração entre os alunos de todas as áreas em um ambiente acadêmico, pois
antes do campus os cursos universitários oferecidos pelo Senac estavam dispersos
nas diversas unidades da rede. 18 Dados referentes ao ano 2000, excluindo-se domicílios cuja espécie é do tipo coletivo 19 Salário mínimo de referencia do Censo 2000: R$151,00
60
O Campus Santo Amaro foi construído num terreno de 120 mil metros
quadrados que antes abrigava uma fábrica da Walita, empresa produtora de
eletrodomésticos. A obra contou com um projeto de ecoeficiência desenvolvido pela
área de Educação Ambiental do próprio Senac - SP. A inauguração oficial do
Campus Santo Amaro aconteceu em 22/03/2004.
Com esta obra em funcionamento, foi estratégico para a instituição que o
Programa Redes Sociais, atuante desde 1997, também acontecesse no campus.
Além de facilitar o bom relacionamento com a comunidade local, o Programa
cumpriria com o papel do Senac - SP de levar o desenvolvimento para as
comunidades onde atua.
A partir disso, foi designado um funcionário para implementar o processo, que
iniciou com um mapeamento e um diagnóstico sobre as organizações sociais
atuantes no sub distrito do Campo Grande.
Após o mapeamento foram realizadas algumas visitas às instituições
mapeadas, onde ocorreu uma exposição do Programa Redes Sociais e apresentou-
se um convite para participar de um primeiro encontro.
A rede social Campo Grande teve o seu primeiro encontro realizado no dia
27 de julho de 2004 no Auditório da Biblioteca do Centro Universitário Senac
Campus Santo Amaro.
Neste primeiro encontro, que contou com a participação de sete organizações
sociais não governamentais da região, foi feita a proposta de atuação em rede.
As organizações participantes deste primeiro encontro foram a Grão da Vida,
Lar da Criança da Congregação Israelita Paulista, Caminhando Núcleo Espírita de
Educação, Brascri, ASAM Centro de Apoio ao Jovem, Associação Maria Helen
Drexel, Ação Social Nossa Senhora de Fátima.
Das sete organizações iniciantes, quatro ainda são participantes ativas da
rede, Grão da Vida, Brascri, ASAM e Ação Social Nossa Senhora de Fátima.
Neste primeiro encontro, o grupo aceitou a proposta do Senac - SP para uma
atuação em rede e iniciou suas atividades a partir desse momento.
A rede social Campo Grande se encontra mensalmente, no Senac - SP ou em
alguma organização social participante. Em 2008, por exemplo, os encontros
61
aconteceram sempre na terceira quinta feira do mês. A divulgação das datas
também é feita através do site da rede20.
Os encontros da rede têm duração de no máximo três horas. Para que a
circulação de informação flua livremente e para estimular a horizontalidade na
atuação, os participantes sentam-se em cadeiras dispostas em forma de circulo.
O mediador conduz a reunião, respeitando a fala de todos. A pauta da reunião
é construída coletivamente, muitas vezes em conseqüência da pauta anterior, mas
todos podem acrescentar temas que gostariam de discutir naquele dia. A pauta por
sua vez, não deve ser encarada de forma rígida, procura-se trabalhar todos os
temas que lá estão, mas caso o grupo sinta necessidade de discutir mais
intensamente um dos temas, estes poderão ser tratados em um próximo encontro,
desde que haja concordância do grupo.
A idéia de consenso é muito trabalhada na rede. Na metodologia proposta
pelo Senac - SP, não deve existir votação em uma rede, pois a instituição acredita
que se existe votação, existirão aqueles perdedores que se sentirão insatisfeitos,
dessa forma não estarão inteiramente no processo. Chegar a um consenso em um
grupo de trinta ou quarenta pessoas é uma tarefa complexa, mas o grupo
compreende a proposta e sempre foi possível encontrar este ponto comum na Rede
Social Campo Grande - SP. Esse processo estimula o debate, a tolerância e a
participação.
A maioria das informações que circulam na rede são feitas via correio
eletrônico e via um site, que é de domínio do Senac. Todas as redes fomentadas
pelo Senac se utilizam desse site, que possui uma página principal na qual é
possível visualizar todas as redes que a instituição articula. Essa página principal
tem um link direto com as páginas de cada rede social. Dessa forma, qualquer um
pode saber sobre o andamento de todas as redes.
Para uma melhor compreensão do processo organizativo na Rede Social
Campo Grande, faz-se necessário observar a sua constituição e seu processo
formativo ao longo dos cinco anos de atividade.
20 O site é www.sp.senac.br/redesocial
62
SETORES PARTICIPANTES DA REDE SOCIAL CAMPO GRANDE 2004 – 2008:
0 5 10 15 20 25 30
2004
2005
2006
2007
2008ONGs
Poder Público
Mercado
Indivíduos
Fonte: relatórios no site www.sp.senac.br/redesocial
Como é possível observar no gráfico acima, desde sua formação em 2004, a
rede é composta majoritariamente por organizações não governamentais. Isso se
deve ao grande número de ONGs que são convidadas a fazer parte da rede,
segundo a metodologia proposta pelo Senac, que incentiva a participação deste
setor.
No primeiro ano a rede contou com cerca de dez organizações sociais
atuantes e a partir de 2007 esse número cresceu e se manteve em uma média de
vinte a vinte e cinco ONGs participantes na rede, sendo em sua grande maioria,
mulheres.
O mercado manteve uma participação limitada na rede, e esteve presente
através de duas empresas juniores do Campus Senac, que viram na rede uma
possibilidade de integração com a comunidade, uma ponte para a articulação de
seus projetos de trote solidário, dentre outros. Essas empresas juniores tiveram
participação instável ao longo dos anos, devido principalmente a mudanças anuais
na sua gestão. Outras empresas também participaram, mas sempre foi uma
participação pontual, pois seu interesse ao apresentar seu projeto era voltado para
captação de possíveis organizações sociais parceiras. Essa participação, porém,
não se manteve por um período mais duradouro.
63
Também existe na rede a participação dos indivíduos, que é representada
principalmente por alunos do Senac, mas também por algumas pessoas autônomas,
donas de casa, desempregados, dentre outros. Isso ocorre porque a rede é um
espaço de criação de vínculos e por vezes algum participante convida um amigo ou
conhecido que está precisando de um apoio para ir aos encontros. Muitas vezes
esses indivíduos se envolvem em algum trabalho voluntário desenvolvido por
alguma ONG e não retornam mais para a rede. Os alunos participam de forma
aleatória, às vezes por curiosidade e as vezes por estarem desenvolvendo alguma
oficina, projeto este analisado a seguir.
O Setor Público por sua vez, só aparece na rede a partir de 2007 quando a
rede já está mais fortalecida e começa a ter maior influencia na região. Com mais
projetos em andamento, a rede realiza mais contatos e parcerias e com isso chama
atenção da sub-prefeitura de Santo Amaro, que percebe muitas das suas
organizações sociais conveniadas falando da Rede Social Campo Grande.
Dessa forma, a sub prefeitura de Santo Amaro inicia sua atuação na rede em
2007, ciente de que este é um pólo de informação e participação na região. Sua
participação cresceu visivelmente em 2008, fortalecendo a legitimidade e a
credibilidade do trabalho da rede.
2. Rede Social Campo Grande - SP: vozes e significações de
participação cidadã
A função primordial de uma rede é manter um grupo de pessoas conectadas,
e com a informação fluindo de maneira mais rápida e eficiente, a rede torna-se um
pólo de atualização para seus integrantes.
Com a globalização contemporânea, as conexões tornam-se fundamentais
para a realização de um bom trabalho social, é preciso estar integrado com o Poder
Público, em sintonia com o mercado e em contato com outras organizações da
sociedade civil.
Em geral as ONGs são carentes de recursos e informações por viverem em
isolamento. Estar em rede é, portanto, um espaço para conhecer a questão social de
forma mais ampla e compartilhar recursos, que não são somente financeiros, mas
64
também humanos e sociais. Para as organizações sociais, atuar em rede significa
trocar, aprender e ensinar.
Segundo depoimento da participante da rede Social Campo Grande – SP, Sônia (ASES):
“a rede é uma união de forças entre as pessoas, é fortalecimento e
crescimento”. Rafael, (aluno do 3° ano do curso de design-comunicação visual do Campus
Senac), acredita que:
“a rede social é um ponto de apoio para divulgar atividades, buscar soluções
em diferentes visões de mundo, enfim, buscar meios para crescer cada um ajudando o outro (...) os grupos unidos conseguem uma visibilidade maior do que teriam se sozinhos, dá uma voz uníssona para os vários cantos das organizações”
Nas palavras de Albino (ABRACE), “os anos de experiência no 3º setor me trouxeram a convicção de que a
melhor alternativa para uma instituição é participar de redes. É assim que ela se fortalece. O intercâmbio provocado por este envolvimento propicia trocas de experiências riquíssimas e ambientes saudáveis e motivadores, que provoca nas pessoas um espírito aberto a idéias e bem participativo. Elas recebem ajudas verdadeiras e sentem vontade também de ajudar”.
Eloisa (Grão de Mostarda), afirma que não se enxerga sem ser uma
participante da rede,
“valorizo muito esse espaço, a rede fomenta em cada participante um
despertar para aquilo que muitos já trazem dentro de si, que muitas vezes não valorizamos e nem mesmo percebemos, a rede empodera as pessoas”.
Esse é um aspecto interessante da atuação em rede, as pessoas se sentem
mais fortalecidas e valorizadas em seu trabalho, é um espaço no qual elas podem
falar sobre as dificuldades que serão ouvidas e compreendidas. Ao perceberem que
os desafios e as dificuldades são comuns, as pessoas saem do isolamento para
pensar em soluções também comuns.
Essa atualização que a rede proporciona contribui para um processo de
percepção do outro, do Poder Público e da sociedade de forma mais ampla.
Através desse fortalecimento individual, a rede propicia a criação de vínculos,
conforme explicita Márcia (MAMAE):
65
“ele (o participante) percebe que unido a outros com objetivos semelhantes estará mais fortalecido”.
Para Cristina (Centro Social Esperança):
“...a rede é a tendência atual, não tem outro jeito, não dá mais para trabalhar isoladamente como antigamente. A rede representa um espaço de vivencia das organizações e das pessoas para se ter um contato mais próximo e para ter mais parceiros, mais relações e mais contatos. Nosso trabalho aqui na ONG cresceu bastante depois de entrarmos para a rede, conhecemos outras ONGs, outras oportunidades”.
Na medida em que os membros da Rede Social Campo Grande se
conheceram e trocaram informações, os recursos e as idéias surgiram naturalmente,
criando um espaço de debate e troca, que tornou as pessoas mais autônomas e
mais conectados entre si. Sendo assim, criou-se um ambiente que estimula o
processo participativo.
Há nesta rede uma relação de confiança que motiva as pessoas a
participarem de forma transparente, é um local onde eles falam das dificuldades e
oportunidades livremente, sem medo. Um dos fatores que estimulou e estimula essa
relação de confiança é a elaboração de projetos comuns.
Em seguida serão apresentados, em dois blocos, os projetos desenvolvidos
pela Rede Social Campo Grande - SP. Em um primeiro momento, analisaremos três
projetos desenvolvidos através de iniciativas da própria rede. No segundo bloco,
serão analisados projetos sugeridos pelo Senac SP.
O primeiro projeto a ser analisado é o Projeto Reciclo, que teve inicio com o
contato da Camisaria Colombo 21 com o Senac SP. O motivo do contato foi o
excesso de retalhos que eram jogados no lixo pela Camisaria, que gostaria de doá-
los para instituições sociais.
Ao saber disso, a rede social se organizou para fazer uma proposta mais
sustentável, e sugeriu um projeto de geração de renda.
21 A Camisaria Colombo é uma empresa especializada em moda masculina, que iniciou suas atividades em São Paulo no ano de 1917 e hoje conta com 125 pontos de venda no Estado.
66
Esse projeto propunha que a partir dos retalhos doados, as organizações
sociais interessadas desenvolvessem algum produto que pudesse ser vendido,
possivelmente até mesmo para a Camisaria Colombo.
O projeto teve uma importância grande para a Rede Social Campo Grande,
principalmente por tratar do tema sócio ambiental, bastante refletido no grupo.
Participaram deste processo quatro organizações sociais, representadas por doze
costureiras.
Para Sonia (ASES):
“este projeto reflete uma tendência do futuro, a reciclagem e as questões relativas ao meio ambiente são o nosso futuro, se não houver uma conscientização e uma participação de toda a sociedade, a gente não vai ter futuro”.
Para desenvolver uma peça interessante com fácil comercialização, a rede
abriu um concurso para que alunos do curso de moda ajudassem as organizações a
desenvolver uma peça dentro desses critérios. A peça vencedora do concurso foi
uma bolsa unisex feita inteiramente de retalhos provenientes de sobras de tecidos
doados pela Camisaria Colombo.
Bolsa vencedora do concurso ReCiclo
67
A fim de vender o produto a um preço justo, as costureiras fizeram uma
capacitação no SEBRAE para calcular o valor do produto e da mão de obra. Todo
esse processo demandou articulação e mobilização dos envolvidos, estimulando de
forma criativa o processo participativo na rede.
A Camisaria Colombo havia sugerido a possibilidade de comprar as bolsas e
entregá-las aos funcionários no período do natal, porém esta empresa optou por não
comprar as peças por motivo de redução de custos. As costureiras, por sua vez,
aprenderam a costurar a bolsa e puderam comercializá-la de outras formas, gerando
renda para suas comunidades.
Segundo Sônia (ASES):
“...este projeto foi um aprendizado, embora não tenha se desenrolado conforme previsto no que se refere a venda dos produtos para a Colombo, valeu a pena, é sempre um contato a mais, e se não foi dessa vez, pode ser da próxima”.
Costureiras aprendem a produzir a bolsa nas Instalações da Faculdade de Moda do Senac – SP.
Este projeto teve um grande envolvimento de toda a Rede Social Campo
Grande e deu origem a uma discussão a respeito da participação mais ampla de
empresas na rede. Essa reflexão gerou um projeto novo chamado MOTUCA.
68
O MOTUCA, que significa “Mostra Tua Cara”, é um projeto que foi elaborado
em 2007 mas que ainda está em andamento.
Além de expor os trabalhos da rede para as empresas, o objetivo deste
projeto é buscar novos potenciais de parcerias. Sua comissão organizadora conta
com a participação de quatro organizações sociais e um representante da
subprefeitura de Santo Amaro.
Para Albino (ABRACE):
“Hoje o 3º setor é muito carente de apoios da Sociedade e do meio Empresarial. O objetivo deste projeto é despertar este envolvimento dando visibilidade e transparência, provocando com esta aproximação, sensibilidades e conhecimentos, principalmente ao meio Empresarial”
Atualmente a rede está organizando um fórum voltado para organizações
sociais e empresas com o tema da responsabilidade social empresarial. Esse evento
é o primeiro passo para o estabelecimento de possíveis parcerias que beneficiariam
a rede como um todo.
Segundo Heloísa Previdello (Prefeitura Municipal de São Paulo):
“O MOTUCA é de extrema importância para um melhor conhecimento da
realidade local, por ser um facilitador na otimização de recursos e contribuir com
novos recursos e idéias, reforçando o papel da responsabilidade social na região”.
Trata-se de uma forma de globalizar a rede, de se mostrar ao mundo, de sair
da atuação local e expandir, inicialmente para o bairro, depois para a cidade e assim
por diante.
Cada membro da comissão deste projeto tem responsabilidades
compartilhadas na organização do fórum, bem como no convite de palestrantes e
captação de recursos.
Albino (ABRACE) também afirma que:
“existem muitas empresas que são instituições sérias e válidas e que poderão multiplicar a sua atuação na comunidade e garantir a sua sustentabilidade e perenidade, desenvolvendo projetos de parceria”.
69
Este projeto simboliza uma luta pela sustentabilidade da rede, uma forma de
agregar parceiros cada vez mais fortes que colaborem na manutenção da rede e no
desenvolvimento de projetos comuns.
Um terceiro projeto desenvolvido por esta rede é o Projeto Esportes, que
iniciou com a participação de Junzo Habiro na rede. Ele é treinador de softbol há
vinte anos, e participa da Rede Social Campo Grande, representando o “Santo
Amaro Nikkey Esporte Clube”, que foi fundado por descendentes da colônia
japonesa da zona Sul de São Paulo, com o objetivo de propiciar a prática de
esportes como beisebol e softbol.
“Na Rede, vislumbrei a possibilidade de fazer parcerias com as entidades sociais”, expõe Habiro.
Em 2006 é então iniciado na rede o projeto de esportes, uma parceira entre o
Centro Social Esperança e o Santo Amaro Nikkey Esporte Clube. Habiro afirma que
através desse projeto:
“meninas iniciantes, de 7 a 10 anos são encaminhadas pela ONG e praticam o softbol em um campo público, sendo que após os 10 anos, elas mudam de categoria e são encaminhadas, se viável, ao clube, onde o treinamento é intensivo e o enfoque é prioritariamente o esporte”.
Segundo Cristina (Centro Social Esperança):
“este é mais do que um projeto de esportes, é uma oportunidade para essas crianças vivenciarem uma experiência nova através do projeto, elas conhecem outras pessoas e outras realidades e já jogaram inclusive fora de São Paulo em um campeonato em Curitiba”.
“Procuramos participar de todos os torneios em que somos convidados, pois é uma oportunidade de aprender, além de servir de lazer. Nos eventos, as crianças aprendem pelo exemplo, observando o comportamento de outras equipes na hora do jogo, os rituais de respeito, de agradecimento, etc.”, afirma Habiro (Clube Nikkey).
Essa iniciativa, que está em andamento há mais de dois anos surgiu de uma
conexão da rede, que soube se apropriar dos recursos físicos e humanos
disponíveis, a fim de desenvolver e melhorar a qualidade de vida de algumas
crianças.
70
Conforme argumenta Cristina:
“as crianças seguem um ritual de disciplina através do esporte que também reflete no comportamento deles”.
Para Habiro:
“através do esporte pregamos às crianças que o seu valor está no que você é e não no que você possui, e que é preciso mudar o comportamento para ter uma situação diferente da atual. Acho que a mensagem é assimilada, pois se nota uma diferença comportamental entre as crianças que estão no projeto desde o início e aquelas mais recentes”.
Através de projetos como esse, a rede se fortalece ao perceber que com
poucos recursos materiais, mas com alguns recursos humanos, é possível ter idéias
e implementá-las em prol de objetivos comuns. Desse modo, os participantes se
sentem estimulados a participar mais ativamente da vida de suas comunidades,
buscando enfrentar as dificuldades coletivamente, construindo vínculos e parcerias.
Meninas em treino de Softbol - Projeto Esportes
71
A seguir, neste segundo bloco, analisamos os projetos desenvolvidos pela
rede que foram sugeridos pelo Senac, pois esta instituição, enquanto participante da
rede, é também um grande propositor de projetos. Os projetos incentivados pelo
Senac estão de acordo com seus objetivos estratégicos da área de Desenvolvimento
Social.
O projeto de Desenvolvimento Local é incentivado pelo Senac como
objetivo principal das redes sociais.
Quando uma rede social está mais fortalecida, o Senac acredita que também
estará pronta para começar o Programa e é oferecida a proposta de implementação
da metodologia.
A metodologia, desenvolvida pelo Senac, segue as seguintes etapas: Escolha
do local (que pode ser feita pela rede social, pode surgir de uma demanda externa
ou ser escolhido conforme estratégia da instituição Senac); criação de uma rede
social comunitária (que é uma rede social dentro da localidade escolhida, composta
por moradores da região); elaboração de uma visão de futuro da comunidade
escolhida; elaboração de um diagnóstico participativo e elaboração de um plano de
ação local que servirá de guia para a realização dos projetos pensados pela
comunidade.
Para o Senac- SP, a idéia central de desenvolvimento social é “passar de
uma configurada situação para outra melhor, planejada por uma visão coletiva,
integrada com todos os setores da sociedade e todos os ativos de uma comunidade
(...) uma situação que gere crescimento econômico promova o desenvolvimento
social e preserve o meio ambiente levando em conta as gerações futuras”. (Site do
Programa Redes Sociais do Senac – SP)
Os objetivos do Programa de Desenvolvimento Local são a melhoria das
condições de vida e de convívio social de uma localidade.
Na visão de Eloísa (Grão de Mostarda):
“o projeto trata-se de uma mobilização de um grupo, de uma comunidade a fim de juntos buscarem uma melhor qualidade de vida e chegar a um denominador comum, não para um nem para outro, mas o que é melhor para o todo”.
72
Com o consenso dos participantes da Rede Social Campo Grande, foi
escolhida uma comissão de desenvolvimento local cujo papel principal foi escolher
os locais e implementar Planos de Ação.
A escolha do local foi realizada pela rede e iniciou-se com a inscrição das
localidades que desejariam ser o piloto do projeto. Após a demonstração de
interesse, os integrantes da rede optaram por iniciar o trabalho na Favela do Campo
Grande22, localidade considerada mais vulnerável pelo grupo.
A comunidade é representada na rede social pela Eloísa, uma moradora que
é líder comunitária e fundadora da ONG Grão de Mostarda, que atende a região.
Para Eloisa (Grão de Mostarda):
“Este projeto é primeiro um projeto de crescimento pessoal, depois local, pois quando é permitido ao individuo crescer, automaticamente seu entorno é afetado.”
Promover o desenvolvimento de uma localidade gera o desenvolvimento dos
próprios indivíduos porque amplia as relações, aumenta as oportunidades, gera
novos negócios e contribui com a sustentação das organizações e de toda a
sociedade.
O processo de implementação da metodologia de desenvolvimento local
nesta comunidade teve inicio com a criação da rede comunitária, que é composta
por moradores da Favela do Campo Grande. Inicialmente o grupo era formado por 9
moradores, sendo 1 homem e 8 mulheres. Em sua maioria, os integrantes são
representantes da igreja evangélica, desempregados ou profissionais autônomos.
Segundo Eloisa (Grão de Mostarda):
“esse ajuntamento de pessoas é justamente para pesquisar o máximo possível, tentar descobrir e sondar (...) com a participação de todos”.
Várias reuniões foram realizadas com esta comunidade e durante esses
encontros muitas idéias surgiram e novas pessoas começaram a participar do grupo:
donas de casa, desempregados, autônomos ou membros da igreja. A visão de futuro,
construída com cerca de 15 participantes é que “em 2018 a Comunidade da Favela
22 A Favela do Campo Grande surgiu de uma ocupação ilegal na década de 60, inicialmente tinha apenas nove barracos e hoje possui
pelo menos mil barracos e cerca de três mil moradores. Os primeiros moradores vieram para este local para plantar, mas hoje não existe mais espaço para isso. O local possui muitas minas de água, mas o que chama atenção hoje é o córrego, extremamente poluído que passa por entre os barracos.
73
do Campo Grande terá melhor infra-estrutura, espaço de lazer e cultura e moradores
mais pró ativos”.
Rede Comunitária na igreja, em reunião com a comunidade
A comunidade sonha com um bairro que possua infra estrutura capaz de
comportar um centro Comunitário e de convivência exclusivo para moradores (o
espaço seria destinado para venda de produtos, casamentos, eventos, vacinação,
etc); urbanização da favela; posto de saúde; uma sede para Associação Grão de
Mostarda (já conquistada através de uma doação de outra ONG que encerrou sua
atuação); retorno do Programa Saúde da Família; melhor atendimento no hospital
público; Saneamento básico; Ruas recapeadas; Ampliação das linhas de ônibus;
Creche; Segurança / Posto policial; Transporte gratuito para crianças (trajeto escola-
casa); gás e mais escolas
A comunidade também quer lutar por melhorias na economia, através de um
melhor relacionamento e participação com o comércio local e moradores da região.
74
Nas questões ambientais os moradores mostraram interesse em efetivar o
parque Linear23 e cuidar da limpeza e coleta seletiva.
Também manifestaram interesse em criar um espaço permanente de lazer ou
uma praça e espaço profissionalizante e de cultura, biblioteca, Internet, Universidade
pública ou convenio com universidades e cursos para a terceira idade.
Essa etapa do projeto visa estimular o sonho da comunidade antes da etapa
de diagnóstico. A rede comunitária da Favela do Campo Grande está iniciando o
diagnóstico em 2009 e ao ser concluído, será confrontado com os sonhos
levantados na visão de futuro. A partir disso será desenvolvido o plano de ação.
Esse projeto já trouxe resultados como uma maior articulação entre os
moradores da comunidade e o estabelecimento de parcerias com o Programa Saúde
na Família e a escola local.
Objetiva-se que através do Desenvolvimento Local, a comunidade se torne
mais participativa na conquista por seus direitos sociais, ampliando relações com o
Poder Público e com outras organizações do seu entorno.
Outro projeto desenvolvido pelo Senac é o Dia da Responsabilidade Social,
que se refere a um evento anual, promovido pela Extensão Universitária do Centro
Universitário Senac por desdobramento da relação com a Associação Brasileira de
Mantenedoras de Ensino Superior, que estimula a promoção do Dia da
Responsabilidade Social do Ensino Superior Particular em todas as Instituições do
Ensino Superior filiadas.
A participação da rede neste evento é fundamental e inclui o planejamento
conjunto com o Senac, a participação da rede ministrando oficinas e a divulgação na
comunidade local. Trata-se, portanto de um evento realizado em parceria entre o
Senac e a rede.
Márcia (MAMAE), afirma:
“Este é um super projeto, quando temos a possibilidade de medirmos o quanto somos fortes e capazes quando nos unimos enquanto rede, para organizamos um mega evento como esse. Vejo como um projeto de divulgação da Rede e das ONGs, e integração com a Comunidade”.
23 Segundo site da Sub Prefeitura, o conceito “Parque Linear” é referente à necessidade de recuperação dos córregos e fundos de vale, permitindo
garantir ajardinamento e/ou arborização de faixa mínima ao longo das margens, como preservação dos recursos hídricos.
75
Para Albino (ABRACE):
“A visibilidade que este evento possibilita à Comunidade é uma excelente forma de provocação de um maior envolvimento (...) com um mútuo interesse”.
A idéia do evento, que aconteceu pela primeira vez em outubro de 2007, é
realizar num só dia, uma programação voltada para a comunidade local, oferecendo
serviços gratuitos, oficinas, palestras, campanhas, doações, bazares, apresentações
culturais, capacitações, atendimentos e atividades que beneficiem as comunidades
de forma geral.
Em 2007, o evento reuniu 2000 pessoas no Centro Universitário Senac, no
bairro do Campo Grande, e a rede propiciou para a comunidade jogos de Beisebol,
apresentação musical, aulas de tênis, jogos escoteiros, reciclagem criativa de CD’s,
trabalhos manuais, bijuteria com miçangas, e a peça teatral Orfeu do Morro. Todas
essas atividades foram oferecidas gratuitamente por organizações sociais e
empresas participantes da rede.
Em 2008 foram oferecidos à comunidade serviços gratuitos, oficinas,
palestras, campanhas, doações, bazares, apresentações culturais, capacitações e
atendimentos. Neste ano o evento reuniu 3.000 pessoas e contou com a
participação de 30 organizações sociais ativas da rede social Campo Grande, que
trouxeram a comunidade na qual atuam e ofereceram as atividades mencionadas.
Essa ação promovida pelo Senac - SP propicia a mobilização de toda a rede,
na qual as organizações têm a oportunidade de vivenciar uma experiência de grande
relevância participativa para todos.
Os membros da rede participam do planejamento, do dia do evento e da
avaliação do mesmo. Esse processo estimula a troca, e ensina as organizações
sociais envolvidas a atuarem na prática de forma co responsável.
76
Dia da Responsabilidade Social no Centro Universitário em outubro de 2008
Um terceiro projeto desenvolvido pela rede, proposto pelo Senac - SP são as
Oficinas, que surgiram através da participação dos professores do Senac - SP na
Rede Social Campo Grande - SP.
Essa participação dos professores nos encontros da rede social foi uma
conquista, que aconteceu depois de muitos convites, e-mails e apresentações da
proposta. Apenas depois de dois anos de trabalho da rede, os professores
começaram a participar dos encontros.
Com a participação deles surgiu uma idéia de integração entre alunos e rede
social, que aconteceria através de oficinas de capacitação.
Dessa forma, a Rede Social Campo Grande deveria expor suas fragilidades e
necessidades, de forma que os professores transformassem essa demanda em
capacitações ministradas por alunos para as organizações sociais, com a supervisão
dos professores.
A rede acredita que através deste projeto todos ganham, as organizações
sociais porque são capacitadas em temas de seu interesse, os alunos porque
aprendem na pratica como aplicar seu conhecimento em situações reais e os
professores porque podem trabalhar conceitos teóricos baseados nas experiências
77
práticas dos alunos. As oficinas são um espaço para troca de conhecimento entre
alunos, professores e a rede social.
Segundo Eloisa, (Grão de Mostarda):
“as oficinas são espaço de crescimento (...) e propiciam acesso às informações, aprendizagem e troca de saberes.”
Para Rafael (aluno do 3° ano do curso de design-comunicação visual do
Campus Senac - SP):
“as oficinas são de extrema importância para a manutenção da cultura e para a capacitação profissional, muitas vezes é na oficina que se tem o primeiro contato com algo, então se desmitificam visões e idéias pré-concebidas (...) fico feliz em ver essa linguagem, que é universal, chegar até às pessoas, principalmente quando não se tem isso nas escolas. Tem-se a idéia que é algo muito distante da realidade das pessoas e as oficinas só tem a ampliar os horizontes”.
Em alguns momentos desse projeto, alguns membros da rede acomodaram-
se, sempre aguardando a sugestão dos professores e não construindo o projeto
coletivamente, como haviam proposto. A idéia era que as oficinas fossem espaços
de troca e não de capacitações gratuitas.
Esse fato também é percebido por alguns integrantes mais críticos, como é o
caso de Márcia (Mamae):
“vejo um pouco de falta de comprometimento por parte de algumas pessoas, creio que é falta de amadurecimento enquanto participantes e responsáveis pela rede”.
Com o tempo e com a intervenção de membros mais participativos, a rede
compreendeu a necessidade de maior envolvimento nestes projetos, embora ainda
de modo insuficiente.
As oficinas podem ser uma forma de melhorar a situação de uma pessoa
através do aprendizado e Flavio é um exemplo de como as oficinas propostas pela
rede podem de fato trazer resultados concretos.
Indicado pela ONG que freqüenta (Mamae), Flávio foi um dos participantes da
oficina de Copa e Governança em 2007 e passou 4 dias aperfeiçoando técnicas e
práticas nas áreas de hotelaria, gastronomia, e governança.
78
Após participar desta oficina, ele foi indicado pelo professor responsável, para
trabalhar no stand do Senac - SP dentro do evento de moda mais importante do
Brasil, o São Paulo Fashion Week (SPFW).
Conforme conta o professor Bonilha:
“Por já ter experiência na área e também por ser um rapaz muito esforçado
que tem iniciativa, convidei o Flávio para participar de um evento dentro do Senac. Ele trabalhou muito bem, então, na seqüência, o convidei para participar da São Paulo Fashion Week”.
Após o evento SPFW, Flavio foi chamado para trabalhar no tradicional
Bourbon Street Festival24, no bairro de Moema (SP).
As oficinas capacitaram 446 pessoas em 2008 nos seguintes temas:
Representação e identidade - A inserção do local no global através da
cartografia; Oficinas solidárias de informática e matemática; Fotografia para
deficientes visuais: Registros de Santo Amaro; Moda na Rede Social Campo
Grande ; Oficinas de Hotelaria e Gastronomia; Oficinas de Receptividade e
atendimento ao cliente; Oficinas de Currículo e postura em entrevista. Seguem
abaixo fotos de algumas oficinas realizadas em 2008:
24 O Bourbon Street Festival é um evento musical anual, que acontece no Rio de Janeiro e em São Paulo. O objetivo é trazer a diversidade cultural de New Orleans, através do Jazz moderno e tradicional, Blues, Zydeco, Soul, R&B, Funk, Brass Band e todas as suas vertentes. O evento é gratuito e em 2008 reuniu mais de 30 mil pessoas em São Paulo.
79
Oficina de Currículo e Postura em Entrevista ministrada em 2008 pelo Prof. Fernando na ONG ASAM
Oficina de Gastronomia ministrada por alunos do Senac para ONGs da Rede Social Campo Grande
80
Oficina de Hotelaria ministrada por alunos do Senac para ONGs da Rede Social Campo Grande
Os dados da pesquisa permitiram construir sua análise, com base no eixo
central da participação cidadã, à luz de três focos analíticos.
O primeiro foco analítico, referente ao entendimento dos membros da Rede
Social Campo Grande – SP sobre o que é rede, demonstrou que estes a
compreendem fundamentalmente como um espaço de união entre as pessoas.
A rede de fato, une as pessoas, ela as conecta com outras interessadas em
um mesmo objetivo. Essa é a primeira função de uma rede, ou seja, agrupar
pessoas e instituições. A união por si só, porém, não conota uma rede social , é
apenas o primeiro passo para que ela aconteça.
Além do aspecto da união, os sujeitos indicaram a rede como um espaço de
força, no qual as pessoas tornam-se mais fortes para executar seu trabalho nas
comunidades onde estão inseridos.
Essa força explicitada pelos sujeitos é uma segunda função da rede, ou seja,
depois de colocar as pessoas em contato, criam-se vínculos que as fortalecem pelas
trocas ocorridas.
Esses vínculos também são entendidos pelos sujeitos como possibilidades de
apoio e ajuda no nível das relações interpessoais e organizacionais.
81
Outro entendimento comum aos sujeitos, explicita a rede enquanto uma
tendência mundial de organização. Isto é, reconhecem que em tempos de
globalização contemporânea, é mais estratégico atuar coletivamente em rede.
Os sujeitos apontaram também que se organizar em rede na atualidade,
significa conseguir maior visibilidade aos trabalhos por eles desenvolvidos.
As falas dos sujeitos em relação aos diferentes entendimentos de rede,
demonstraram que os sujeitos possuem ainda uma compreensão parcial do conceito
de rede social, que não é somente um espaço de união, força, troca, formação de
vínculos, apoio ou ajuda.
Falta-lhes compreender que uma rede social pode também ser um espaço de
luta coletiva por interesses coletivos. Um espaço de conquista de direitos sociais.
Os membros da Rede Social Campo Grande não possuem uma percepção de
que esta rede pode ser um espaço participativo no qual podem se fortalecer e atuar
coletivamente, por exemplo, pela conquista, ampliação e efetivação de direitos
sociais.
Quanto ao segundo foco analítico, o crescimento da participação dos sujeitos
no processo de vivência na Rede Social Campo Grande, inicialmente constatou-se
um crescimento numérico dos membros da rede ao longo dos anos.
Em 2004 a Rede Social Campo Grande contou com uma média de dez
membros, e ao final de 2008, conta com cerca de vinte e cinco membros ativos. Ao
longo dos quatro anos de atividade, já fizeram parte desta rede, quarenta e seis
organizações.
Esse crescimento quantitativo evidencia que esta rede tem sido um espaço
contributivo e significativo para a região do Campo Grande, atraindo a entrada de
novos membros, tanto de organizações sociais, como do Poder Público Municipal,
embora seja preponderante a presença de organizações da sociedade civil e de
mulheres.
Vale ressaltar que sendo a maioria da rede composta por mulheres, como
ocorre em geral em programas de atividades sociais entre nós, observou-se que isso
reforça o caráter das relações e vínculos afetivos inter pessoais.
Verificou-se que a vivencia na Rede Social Campo Grande, vem contribuindo
para o crescimento da participação de seus membros no tocante ao aprendizado e
incorporação de valores como a co responsabilidade, o trabalho coletivo e a
solidariedade.
82
Esse crescimento do processo participativo vem se traduzindo na construção
de uma identidade coletiva da rede, na qual os sujeitos não se percebem mais como
concorrentes, mas como diferentes na luta por objetivos convergentes em um
território comum.
Outro fator que contribuiu para o crescimento do processo participativo, e
expresso nos depoimentos coletados, foi a importância da troca de informações
dentre os membros da rede, propiciando a circulação de conhecimentos e
oportunidades de novas conexões.
No que diz respeito ao terceiro foco analítico, os resultados atingidos através
dos projetos da rede pelo seu caráter participativo, demonstraram um avanço neste
processo.
Este avanço se deu na medida em que os sujeitos da pesquisa atuaram
coletivamente através de ações concretas.
A participação dos sujeitos nos projetos desenvolvidos pela Rede Social
Campo Grande, o ReCiclo, Motuca e Esportes, se deu em todos os momentos de
seu planejamento, organização e execução, o que lhes conferiu confiança e
empenho para alcançar os resultados propostos pelos referidos projetos,
desenvolvendo nesses sujeitos capacidades de diálogo e articulação, essenciais
para o processo participativo.
Quanto aos projetos Desenvolvimento Local, Dia da Responsabilidade Social
e Oficinas, propostos pelo Senac, a participação dos membros da rede não foi
condição para sua criação, mas foi relevante para sua concretização. Contudo, cabe
reconhecer que esta participação foi mais quantitativa, com a atuação de todos os
membros da rede mobilizando suas comunidades, que se envolveram nos referidos
projetos. É ilustrativo deste fato, o projeto “Dia da Responsabilidade Social”, que
congregou mais de 3000 pessoas do Campo Grande no Centro Universitário Senac,
em 2008.
Outro aspecto que os dados revelaram foi a relação da Rede Social Campo
Grande com o Senac- SP.
Como exposto, o Senac - SP é fomentador, articulador e animador da rede,
ou seja, cria as redes e mantém seu funcionamento ativo através de um mediador
designado exclusivamente para essa função.
Na Rede Social Campo Grande, essa mediação não tem sido compartilhada
por seus membros, ficando permanentemente sob responsabilidade do Senac – SP.
83
Essa situação gera na rede algumas atitudes de acomodação por não dividir com
esta instituição as responsabilidades de mediação.
A rede visualiza o Senac principalmente como seu mantenedor e grande
propositor de projetos, o que cria um desequilíbrio relacional entre ambos.
Desse modo, o Senac - SP cumpre nas redes que fomenta, um papel
contraditório: ao mesmo tempo em que estimula o processo participativo nelas, pode
também imobilizá-las diante de seu grande potencial.
No entanto, nota-se um esforço do Senac – SP no sentido de adequar seu
trabalho constantemente, visando o empoderamento das pessoas e organizações
sociais participantes da rede.
Recai sobre o Senac - SP, portanto, a responsabilidade de ensinar os
participantes das redes sociais, especificamente da Rede Social Campo Grande, a
se tornarem cidadãos mais participativos e isso é uma tarefa complexa que exige,
inclusive, mudanças de valores e comportamentos, radicalmente democráticos.
A análise do processo participativo da Rede Social Campo Grande, na
perspectiva da dimensão local – global na globalização contemporânea, revelou que
têm se restringido às práticas locais, sem conseguir visualizá-las no contexto global.
Isso significa que a rede não está ainda se conectando com outras rede
similares ou outras redes de movimentos sociais de luta e resistência sobre
questões sociais coletivas e comuns.
Isso evidencia que o processo participativo da rede Social Campo Grande
necessita se ampliar e se aprimorar enquanto um caminho de participação cidadã na
construção de uma sociedade democrática participativa.
A Rede Social Campo Grande tem no futuro, esse desafio.
84
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante o processo de pesquisa e elaboração da presente dissertação,
procurou-se compreender e analisar a trajetória da Rede Social Campo Grande, na
cidade de São Paulo, enquanto sujeito coletivo na construção de uma participação
cidadã, no período de 2004 a 2008.
Em tempos de globalização contemporânea, observamos governos,
empresas e sociedade civil atuando entre si, de forma coletiva, através de redes,
como condição para um melhor desenvolvimento de suas ações.
Analisamos a gênese de uma globalização contemporânea que foi
desencadeada principalmente pelas novas tecnologias como o advento da internet.
Essas transformações alteraram a economia e a sociedade de tal forma que não é
mais possível atuar isoladamente.
A relação entre o global e o local, é premissa básica para entendimento das
novas questões sociais trazidas no bojo da globalização contemporânea.
As questões globais passam a ter um efeito quase que imediato nas
localidades, assim como as questões locais também podem ter efeitos globais,
embora em menor escala.
As novas tecnologias propiciaram um avanço na velocidade de transmissão
de informações, conectando o mundo de forma global. Na sociedade capitalista e
neoliberal, essas conexões representam poder, ou seja, quem está mais conectado
é mais forte. Quanto mais conexões, maior inclusão, ou seja, para os negócios, para
o poder político ou até mesmo para sociedade civil e indivíduos, quanto mais
conexões globais, maior chance de estar incluído em sua localidade.
Nesse contexto, formam-se as primeiras redes estratégicas que se organizam
de maneira a manter grupos mais conectados e conseqüentemente mais fortes. Com
as novas tecnologias o mundo diminui de tamanho e diversas empresas, inclusive
instituições como o Senac SP, passam a atuar de forma mais global, conectadas as
suas filiais através deste novo formato organizacional, que são as redes.
Através dessa forma de atuação não hierárquica, ou menos hierárquica, as
informações fluem livremente e de forma mais rápida, colaborando para o sucesso
dos seus negócios em nível mundial.
85
A organização e a atuação em rede tornam-se pontos de inclusão
fundamentais na nova sociedade, ou seja, está de certa forma, excluído, aquele que
está fora das redes.
A luta por uma outra globalização contra hegemônica, entre outras formas de
atuação, tem se expressado através de redes, que chamamos redes sociais. Nas
palavras de Boaventura (74:2005):
“...é preciso (...) criar inteligibilidade recíproca entre as diferentes lutas sociais,
aprofundar o que têm em comum de modo a promover o interesse em alianças
translocais e a criar capacidades para que estas possam efetivamente ter lugar e
prosperar”
Uma vez já organizado em forma de rede e influenciado pelo novo padrão
organizacional mundial, o Senac – SP desenvolve o Programa Redes Sociais, como
uma estratégia de Desenvolvimento Social, que prevê levar o desenvolvimento para
as comunidades onde atua. Dentre as redes fomentadas por esta instituição, o
estudo focou a Rede Social Campo Grande
A hipótese de que a Rede Social Campo Grande, ao longo de sua trajetória,
vêm lutando e conquistando uma participação cidadã de seus sujeitos, construindo
vínculos locais e se constituindo em sujeitos coletivos em movimento, se confirma.
Através da análise realizada, foi possível compreender como os sujeitos
vivenciam o processo de participação cidadã, embora de forma parcial e limitada,
expressando-se principalmente através dos projetos realizados.
Os dados da pesquisa mostraram que a Rede Social Campo Grande vêm
contribuindo para o desenvolvimento da participação cidadã pelos sujeitos
envolvidos através inicialmente da realização de práticas sociais, que se dão através
de integração entre grupos antes desarticulados, construindo assim pontes culturais,
sociais e políticas e propiciando aproximação dos grupos de pessoas no universo
social.
A Rede Social Campo Grande tem se mostrado como uma forma de
organização que vêm possibilitando uma maior participação para seus membros.
Neste espaço, esses membros atuam livremente, através de opiniões, sugestões e
propostas. Com isso, desenvolvem projetos também de forma autônoma, que
estimula o processo participativo.
86
A rede representa, portanto, um canal estratégico para a constituição de um
processo de participação cidadã, no qual seus integrantes deliberam conjuntamente
sobre questões comuns ao território em que se incluem.
Contudo, é preciso reconhecer que para o aprofundamento do processo de
participação cidadã nas redes sociais, é necessária a construção de uma nova
cultura política de seus membros, que se insira em um projeto de uma sociedade
democrática, participativa, justa e solidária que queremos para o Brasil.
87
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ANEXOS
94
95
PÁGINA PRINCIPAL DO SITE DO PROGRAMA REDES SOCIAIS DO SENAC SP
MARÇO/2009
96
REDES SOCIAIS NA CIDADE DE SÃO PAULO SITE DO PROGRAMA REDES SOCIAIS DO SENAC SP
MARÇO/2009
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PÁGINA PRINCIPAL DA REDE SOCIAL CAMPO GRANDE SITE DO PROGRAMA REDES SOCIAIS DO SENAC SP
MARÇO/2009
98
Conceito de Rede Social disponível da página do
Programa Rede Social do Senac – SP:
Rede Social
O mundo globalizado pede um novo padrão de organização. Se pararmos
para refletir sobre as atuais circunstâncias sociais, econômicas e ambientais, logo
percebemos a insustentabilidade do atual modelo e a necessidade de buscar
alternativas para um mundo mais humano e menos individualista.
Uma das alternativas, na nossa concepção, é o trabalho em Rede, que está
ganhando força em diversas localidades ao redor do mundo. Ancorada a valores de
igualdade, democracia, cooperação e construção coletiva, a Rede propicia uma
grande articulação entre as várias esferas da sociedade civil (organizações, poder
público, cidadãos etc), potencializando sua capacidade de mobilização coletiva e a
realização de suas ações.
Programa Rede Social do Senac São Paulo
O Senac São Paulo desenvolve o Programa Rede Social em diversos
municípios do Estado. A partir de uma experiência de mais de 35 anos em ações
socioeducativas em comunidades onde o Senac mantém unidades, criou-se uma
metodologia de trabalho em rede, que visa articular pessoas e organizações para
propor soluções aos problemas sociais das localidades.
Em cada uma das localidades onde o Programa está sendo implementado, o
Senac investe em um colaborador especialmente designado para articular e mediar
a Rede Social. Dentre suas atribuições, o mediador identifica os atores sociais da
localidade e os convida para encontros periódicos e fóruns temáticos, buscando
identificar objetivos comuns, estabelecendo compromissos e responsabilidades e
assessorando na implementação de projetos para a melhoria da qualidade de vida
da comunidade.
CONCEITO DE REDE SOCIAL
99
Sistema capaz de reunir e organizar pessoas e instituições de forma
igualitária e democrática, a fim de construir novos compromissos que beneficiem a
vida das comunidades.
MISSÃO DO PROGRAMA REDE SOCIAL
Mobilizar, capacitar e fortalecer as organizações sociais para implementar
ações em rede que visam a melhoria da qualidade de vida de suas comunidades e
contribuem para o desenvolvimento local.
Sucintamente, a metodologia que o Senac utiliza para a formação e a
articulação das Redes Sociais:
Passo 1 - Reunião/ Espaço comum (presencial ou virtual)
- Formação dos elos entre os componentes
Passo 2 - Identificação/ Conhecimento mútuo
- Estabelecimento de diagnósticos
Passo 3 - Proposição/ Estabelecimento das visões de mundo
- Propostas
Passo 4 - Composição/ Estabelecimento de parcerias
- Definição da missão, busca de consenso e objetivos comuns
Passo 5 - Novo Compromisso/ Definição do projeto ou ação
- Formação do compromisso conjunto
- Estabelecimento de objetivos e metas
- Ação/ Realização do planejamento
- Avaliação dos resultados
100
Conceito de Desenvolvimento Local disponível da
página do Programa Rede Social do Senac – SP:
Programa de Desenvolvimento Local do Senac São Paulo
A Rede Social fortalecida está pronta para começar o Programa de
Desenvolvimento Local. Com o consenso dos participantes da Rede, é escolhida
uma comissão de desenvolvimento local cujo papel principal é escolher os locais
para implementar Planos de Ação na comunidade.
Os objetivos do Programa de Desenvolvimento Local são a melhoria das
condições de vida e de convívio social de uma localidade.
A idéia central de desenvolvimento é passar de uma configurada situação
para outra melhor, planejada por uma visão coletiva, integrada com todos os setores
da sociedade e todos os ativos de uma comunidade. Uma situação que gere
crescimento econômico, promova o desenvolvimento social e preserve o meio
ambiente levando em conta as gerações futuras.
Promover o desenvolvimento do meio onde se está inserido é promover o seu
próprio desenvolvimento: amplia as relações, aumenta as oportunidades, gera novos
negócios, contribui com a sustentação das organizações e de toda a sociedade.
Metodologia para implantação de Desenvolvimento Local no município
1. Estratégias de mobilização
Cursos, encontros e criação de espaço para debates
2. Concepção de Rede como comunidade de projetos
Realização de projetos junto com a comunidade
3. Construção do local (para implementação do Desenvolvimento Local em
bairros)
3.1 Escolha do local
101
3.2 Articulação das principais lideranças
Construção da governança comunitária local
3.3 Visão de Futuro
Onde queremos chegar e como queremos estar nos próximos 10 anos
3.4 Diagnóstico Participativo
Mapeamento de Ativos e Necessidades no bairro escolhido
3.5 Plano de Ação Local
Em um ano: até 3 projetos contando com o protagonismo local e realizados
com recursos próprios e por meio de parcerias;
Em dois anos: até 2 projetos em parceria com poder público e mercado;
Em três anos: 1 projeto de dimensões maiores, infra-estrutura e
investimentos.
3.6 Monitoramento e avaliação e reorientação do Plano de Ação do bairro
4. Diagnósticos Participativos (somatória dos diagnósticos participativos nos
bairros)
Mapeamento de Ativos e Necessidades no município
5. Articulação com poder público e mercado
Pacto dos segmentos para realizar Plano de Ação Local (3.5)
6. Plano Estratégico do Desenvolvimento Local do município
Metas para os 10 próximos anos
7. Definição das dimensões (econômica, social e ambiental) do
Desenvolvimento
8. Agendas de Prioridades
Quais projetos são realizados antes, com recursos próprios ou externos
102
9. Sistema de avaliação do Plano Estratégico de Desenvolvimento Local do
município
Monitoramento e avaliação e reorientação do plano
10. Plano de Captação de Recursos para viabilizar projetos de médio e longo
prazos
11. Realização de Fórum do Desenvolvimento Local para disseminar a
informação
103
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS PARTICIPANTES DA REDE
SOCIAL CAMPO GRANDE
2004 - 2008
1. ABPA – Centro Social Esperança
2. Abrace
3. Ação Social Nossa Senhora de Fátima
4. ACHAVE – Associação Comunitária Habitacional Vargem Grande
5. Afago
6. Alquimia
7. ASAM Centro de Apoio ao Jovem
8. Associação Amigos Jardim Noronha
9. Associação de Ajuda à Pessoa Carente Grão de Mostarda
10. Associação de Mulheres do Grajaú
11. Associação Desenvolvimento Futura
12. Associação dos Amigos da Vila Isa e do Conjunto Residencial Sabará
13. BRASCRI – Associação Suíço-Brasileira de Ajuda à Criança
14. Centro Educacional Gotas de Cristal
15. Caminhando Núcleo de Educação e Ação Social
16. Capital Social Instituto de Pesquisa, Desenvolvimento e Fortalecimento das
Ações Sociais
17. Cáritas Diocesana de Campo Limpo (Instituto Cardeal Rossi)
18. Casa Transitória do Caminho
19. CEDECA – Centro de Desenvolvimento da Criança e do Adolescente
20. Centro Convivência Infantil Filhos de Oxum
21. Centro de Cidadania de Mulheres de Santo Amaro
22. Centro Educacional Infantil Creche Mãe Operária
23. Centro Santa Marta
24. Centro Social Rio Bonito
25. Consulth Jr. - Empresa Junior de Turismo, Hotelaria e Gastronomia
26. Coordenadoria da Mulher - Secretaria de Participação e Parceria-PMSP
27. Gaia - Grupo de Apoio ao Idoso, à Infância e ao Adolescente
28. Grão da Vida
104
29. Grupo de Apoio Dona Benedita
30. Grupo Escoteiro Ibiraguaçu
31. Lar Girassol
32. Limiar Associação de Apoio à Criança e Família Substituta
33. Mamãe Associação de Assistência à Criança Santamarense
34. Núcleo de Proteção Especial Jardim São Luiz
35. Núcleo de Proteção Especial Angela I
36. Núcleo de Proteção Especial Campo Limpo
37. Núcleo de Proteção Especial I - Capão Redondo
38. Núcleo de Proteção Especial Pedreira
39. Projeto Casulo
40. Projeto Ligação
41. Recanto Santo Amaro
42. Santo Amaro Nikkey Esporte Clube
43. Secretaria de Assistência Social de Santo Amaro
44. Secretaria de Assistência Social Observatório de Políticas Publicas
45. Sub Prefeitura Santo Amaro
46. Unidade Básica de Saúde (UBS) Parque Dorotéia
105
LOGOMARCA DA REDE SOCIAL CAMPO GRANDE