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MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE30ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE NATALDefesa das Pessoas Portadoras de Deficiência e Idosos

Central do Cidadão do Praia Shopping – Av. Eng. Roberto Freire, 8790 Ponta Negra

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA 20ªOU 21ª VARA CÍVEL ESPECIALIZADA DA COMARCA DE NATAL/RN, A QUEMCOUBER POR DISTRIBUIÇÃO LEGAL:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DOESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, através de sua 30ª Promotoria de Justiça,no uso de suas atribuições que lhe são conferidas pelas disposições incursas nosartigos 1.177, inciso III e 1.178, incisos I e II, todos do Código de Processo Civil eartigo 74 da Lei Federal nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, na defesa das pessoasportadoras de deficiência e idosos da Comarca de Natal, vem promover

AÇÃO DE INTERDIÇÃO COM PEDIDO DE CURATELA PROVISÓRIA EM ANTECIPAÇÃO

DA TUTELA

a favor de RAULINO CLIMÉRIO DE OLIVEIRA, brasileiro, natural de___________, ____________ (estado civil), idoso, residente na Rua Tenente SáBarreto, nº ______, Quintas, nesta capital, pelas razões de fato e de direito quepassa a aduzir:

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I - DOS FATOS:

A 30ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal, através de reclamação formuladapela Sra. Maria da Glória Costa de Oliveira, no dia 13 de agosto de 2004, tomouconhecimento de que o idoso Raulino Climério de Oliveira está sendo vítima de umagiota conhecido por “Bomba”. Há aproximadamente dois anos, o Sr. Raulino Climério de Oliveira recebe de“Bomba” dinheiro emprestado a juros e este fica com o cartão da conta bancária doidoso. Em virtude deste fato, apesar de ser aposentado da Marinha, com proventosde R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), o Sr. Raulino Climério de Oliveira vive emcondições precárias, ficando sem dinheiro para atender às suas necessidades básicas.Atualmente, tendo em vista que o idoso entrega toda a sua aposentadoria para“Bomba”, as suas despesas são custeadas por sua filha, Sra. Maria do Carmo Costade Oliveira, que tem uma renda de apenas um salário mínimo. Além disso, o idosoestá se desfazendo de seus bens, já tendo vendido sua cama e cômoda. Na tentativa de impedir os prejuízos que o agiota vem causando, a Sra. Maria doCarmo Costa de Oliveira, filha do Sr. Raulino Climério de Oliveira, chegou a bloquearo cartão junto ao banco, mas, posteriormente, o próprio idoso compareceu à agênciae determinou o desbloqueio. Quando perguntado pelas filhas sobre os seus gastos, oSr. Raulino Climério de Oliveira diz apenas que “o dinheiro é meu e dou a quemquiser”.

Assim, considerando que o comportamento do Sr. Raulino Climério de Oliveira nospermite classificá-lo como pródigo, não tendo o mesmo condições de administrarseus próprios bens, faz-se necessária a propositura da presente ação de interdição, afim de impedir a ocorrência de danos ao seu patrimônio.

II – CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O Sr. Raulino Climério de Oliveiratem 79 (setenta e nove) anos de idade, incidindo, portanto, o artigo 74 do Estatutodo Idoso, que prescreve:

“Art. 74. Compete ao Ministério Público:

(...)

II – promover e acompanhar as ações de alimentos, deinterdição total ou parcial, de designação de curadorespecial, em circunstâncias que justifiquem a medida e oficiarem todos os feitos em que se discutam os direitos de idososem condições de risco.” (negrito acrescido).

No caso em apreço, pretende-se a interdição de pessoa que, em virtude de suascondições mentais, está sofrendo graves prejuízos financeiros causados pela condutade um agiota que aproveita-se da situação para locupletar-se, havendo, assim, umapatente ofensa à dignidade do idoso. Portanto, é imperativa a atuação do Ministério

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Público para que possa cumprir com seu dever de cuidar dos interesses dointerditando.

III - CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

Na exata lição da ilustre civilista MARIA HELENA DINIZ, “a curatela é o encargopúblico, cometido por lei, a alguém para reger e defender uma pessoa e administraros bens de maiores que, por si sós, não estão em condições de fazê-lo, em razão deenfermidade ou deficiência mental (In Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 5, Direitode Família, 11. ed. São Paulo, Saraiva, 1996, p. 433).

Acerca do instituto da curatela, dispõe o art. 1.767 do Código Civil:

Art. 1.767 – Estão sujeitos à curatela:I- aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental,

não tiverem o necessário discernimento para atosda vida civil;

II- Aqueles que, por outra causa duradoura, nãopuderem exprimir a sua vontade;

III- Os deficientes mentais, os ébrios habituais e osviciados em tóxicos;

IV- Os excepcionais sem o completo desenvolvimentomental;

V- os pródigos.

No caso em tela, o interditando consente que outra pessoa fique com o seu cartãode conta bancária e utilize toda a sua aposentadoria, deixando a si mesmo numasituação de escassez de recursos financeiros, com dificuldades para atendernecessidades básicas, como alimentação e vestuário. É evidente que uma pessoa queage dessa maneira, sujeitando-se a viver da ajuda de uma filha que ganha umsalário mínimo, quando possui uma aposentadoria de R$ 1.200,00 (um mil eduzentos reais), não tem condições de administrar seus bens, devendo serconsiderado como pródigo, a fim de que seja interditado e possa viver dignamente,sujeitando o seu patrimônio à administração de um curador.

Na clássica lição de CLÓVIS BEVILÁQUA pródigo “é aquele que, desordenadamente,gasta e destrói a sua fazenda, reduzindo-se à miséria por sua culpa.” (apud MiguelMaria Serpa Lopes. Curso de direito civil. 7ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos,1989, v. 1, p. 276).Os limites da interdição do pródigo são estabelecidos pelo art. 1.782 do Código Civil,

que estatui o seguinte:

Art. 1.782. A interdição do pródigo só o privará de, semcurador, emprestar, transigir, dar quitação, alienar,hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, emgeral, os atos que não sejam de mera administração.

Na situação objeto desta ação, além dos atos mencionados no aludido dispositivo legal, faz-senecessário que o Sr. Raulino Climério de Oliveira receba seus proventos de aposentadoriaatravés de curador a quem incumbirá ter a posse do cartão de conta bancária e aadministração dos valores, porquanto os fatos já narrados nesta exordial demonstram que osprejuízos ao interditando são causados principalmente por meio da utilização de seu cartãopor outrem. Desse modo, a proteção ao patrimônio do interditando somente pode ser

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efetivada com a sua privação de uso do cartão, devendo todas as movimentações em suaconta bancária ser realizadas pelo curador.

Em relação aos idosos, a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar aspessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo suadignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida (artigo 230), pois oenvelhecimento é um direito personalíssimo e sua proteção é um direito social( artigo 8º do Estatuto do Idoso).

Portanto, se faz necessário a proteção ao idoso, especialmente nos casosem que seja incapaz para a prática de atos na vida civil, necessitando serinterditado, encontrando-se, por hora, em verdadeira situação de risco.

IV- DA CURATELA PROVISÓRIA

Considerando que o Sr. Raulino Climério de Oliveira é incapaz de cuidar de seusbens e que está, sendo seriamente prejudicado pela entrega de sua aposentadoria aum agiota, comprometendo a sua própria sobrevivência, é imperiosa a antecipaçãoda tutela ao final pleiteada, com a nomeação de curador provisório ao interditando,com poderes para administrar seus bens e gerir sua vida. O art. 273, incisos I e II, da Lei Instrumental Civil, assim dispõe:

“Art. 273 - O juiz poderá, a requerimento da parte,antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutelapretendida no pedido inicial, desde que, existindoprova inequívoca, se convença da verossimilhança daalegação e : I - haja fundado receio de dano irreparável oude difícil reparação, ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesaou o manifesto propósito protelatório do réu “( g.n.)

A possibilidade de deferimento de antecipação de tutela é perfeitamente compatívelcom o processo de interdição, consoante aresto a seguir transcrito:

“Interdição. Curatela Provisória. Admissibilidade.Proteção preventiva da pessoa e dos bens dointerditando, recomendável ao início da ação,havendo suspeitas e indícios de que o requeridonão detém plena capacidade de entendimento”(Bol. AASP 1.988/39j).

Ad argumentandum, é de bom alvitre citar a brilhante e didática explanação deHUMBERTO THEODORO JÚNIOR1 a respeito dos princípios que norteiam a aplicaçãodo Instituto em comento, senão vejamos:

1 JÚNIOR, Humberto Theodoro, in “Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed. Ver. Ampl. Atual., Forense,Rio de Janeiro: 1996, p. 124

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“Verossimilhança: em esforço propedêutico, que sequadre com o espírito do legislador, é a aparência deverdade, o razoável, alcançando, em interpretaçãolato sensu o próprio fumus boni iuris e,principalmente, o periculum in mora.

Prova Inequívoca: é aquela clara, evidente, queapresenta grau de convencimento tal que a seurespeito não se possa levantar dúvida razoável,equivalendo, em última análise, a verossimilhança daalegação, mormente no tocante ao direito subjetivoque a parte queira preservar.”

Não há de olvidar-se presentes os dois princípios enunciados, uma vez que, éverossímil a necessidade de proteção imediata para uma pessoa idosa que permiteque outrem se aproprie de seus rendimentos, sujeitando-se a viver em precáriascondições financeiras, incumbindo ao Ministério Público buscar a prestaçãojurisdicional célere, cogente, adequando perfeitamente as exigências da tutelapretendida, bem assim, presentes os motivos que ensejariam, analogicamente, acautelaridade, com fincas no periculum in mora e no fumus boni iuris.

Por seu turno, com base nos documentos acostados, está mais do que veemente aqualidade de pródigo do interditando, o que o impossibilita de ter plena capacidadede gerir a sua vida e seus bens, de forma independente.

O próprio Estatuto, em seu artigo 82, além de referir que para a defesa dosinteresses e direitos protegidos por aquela lei, são admissíveis todas as espécies deação pertinentes, já previu, em seu artigo 83 e parágrafos, também que na ação quetenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não-fazer, o juiz concederáa tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem oresultado prático equivalente ao adimplemento. E mais, sendo relevante ofundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia doprovimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou apósjustificação prévia, na forma do artigo 273 do Código de Processo Civil.

Por outro lado, a própria Lei Federal nº 8.842/94, que dispõe sobre a políticanacional do idoso, em seu artigo 10, §2º, já explicita a possibilidade de se nomear,em Juízo, um curador especial àquele idoso que, comprovadamente, temdemonstrado a sua incapacidade fática de gerir seus bens, sendo seu representantede direito material enquanto perdurar a situação de risco que se encontra.

Lançadas às premissas necessárias a antecipação do pedido de tutela, podemosavançar no escopo obviado nesta demanda, qual seja a nomeação de curadorprovisório ao interditando na pessoa de ______________________, cujo endereçoé _____________________, restando a mesma responsável pelo recebimento dasua aposentadoria e/ou proventos, gerenciamento de seus bens, devendo,mensalmente, ser feito a devida prestação de contas.

V - DO PEDIDO

Diante do exposto, requer o Ministério Público a Vossa Excelência:

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a) a concessão de liminar de antecipação dos efeitos da tutela, com a nomeaçãode curador provisório ao interditando na pessoa de _______________, cujoendereço é _____________________________, a fim de determinar que ointerditando seja privado de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação,alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atosque não sejam de mera administração (art. 1.782 do Código Civil), bem comoreceber seus proventos de aposentadoria somente através de curador a quemincumbirá a administração dos respectivos valores;

b) concedida a antecipação da tutela, que seja oficiado ao Banco __________,agência ____________, para a adoção das medidas necessárias aorecebimento da aposentadoria do interditando através de curador;

c) a citação do interditando para que, em dia a ser designado, seja efetuado o seuinterrogatório;

d) a realização de exame pericial no interditando; e) seja julgado procedente o pedido, confirmando-se a antecipação da tutela, para

interditar o Sr. RAULINO CLIMÉRIO DE OLIVEIRA, como pródigo, nomeando-lhecurador, em caráter definitivo, na pessoa de _____________________,limitando os atos praticados pelo interditando, nos termos formulados no item“a”;

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos,especialmente, a documental, a pericial e a testemunhal, cujo rol segue em anexo.

Dá-se ao presente pedido o valor de R$ 260,00 (duzentos e sessenta reais).

Pede deferimento.

Natal (RN), 07 de outubro de 2004

IADYA GAMA MAIO,Promotora de Justiça

ROL DE TESTEMUNHAS

1. __________________________

2. __________________________

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