NDICE
I. INTRODUO .................................................................................................. 1
1.1. OBJECTIVOS DO TRABALHO ..................................................................... 2
1.2. METODOLOGIA ............................................................................................. 2
1.3. ESTRUTURA DO TRABALHO ..................................................................... 3
II. ENQUADRAMENTO TERICO..5
III. DO CONTO ORAL AO CONTO ESCRITO .................................................. 8
3.1. A TRANSMISSO ORAL E A LITERATURA TRADICIONAL ................ 8
3.2. O CIRCUITO COMUNICATIVO E A ANONMIA .................................... 10
3.3. OS CICLOS TEMTICOS E A TIPOLOGIA DE CONTOS ....................... 12
3.3.1. OS CICLOS TEMTICOS ........................................................................ 12
3.3.2. TIPOLOGIAS DE CONTOS ...................................................................... 13
IV. A RECRIAO DO CONTO BLIMUNDO ................................................. 16
4.1. O CONCEITO DE CONTO16 4.2. ORIGEM TEMTICA DO CONTO ............................................................. 19
4.3. A ESTRUTURA DO CONTO ....................................................................... 21
4.4. OS PROCESSOS DE RECRIAO DA NARRATIVA...25
V. CONSIDERAES FINAIS ........................................................................... 38
VI. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 41
ANEXOS
1
I. INTRODUO
O conto popular BLIMUNDO: do texto oral ao texto escrito, o tema que
escolhemos para construir o nosso trabalho de fim de curso, uma exigncia acadmica
que coroa uma longa etapa de estudos e de vida acadmica.
Com esta proposta de tema, que ora se apresenta, no se almeja outra coisa a no
ser desenvolver uma leitura analtico-interpretativa da verso escrita do conto popular
BLIMUNDO, publicado em 1999, pelo artista plstico sovicentino Leo Lopes,
visando compreender no s o percurso que descreveu at actualidade, na forma de
texto oral, mas tambm as transformaes de que foi objecto ao se transferir para a
forma escrita. De entre as vrias verses deste conto que se conhecem, sobretudo orais
ou oralizantes, fez-se uma clara opo pela verso escrita que se justifica por se investir
de pretenses literrias.
Deste modo, e a fundamentar-se esta hiptese, este trabalho opta por desenvolver
uma anlise estrutural da narrativa, destacando as componentes diegticas sobre as quais
se estrutura e se organiza e os mecanismos e processos de recriao da diegese.
Partindo da concepo genolgica de texto, tentar-se- enquadrar o conto no
quadro da relao do binmio literatura oral e literatura escrita, procurando discutir as
fontes ainda que remotas deste texto, e problematizar as modalidades de transmisso e
difuso que lhe permitiram alcanar a actualidade uma vez que se integra na narrativa
oral cabo-verdiana, um importante campo de interpenetrao cultural.
2
1.1. OBJECTIVOS DO TRABALHO
A partir da definio da proposta de tema, desenharam-se alguns objectivos que se
propem alcanar, ao longo do desenvolvimento deste trabalho de pesquisa que, entre
outros, se centram nos seguintes:
i. tentar o enquadramento do conto popular Blimundo no domnio da literatura
oral e da literatura escrita;
ii. discutir a narrativa oral cabo-verdiana enquanto campo de interpenetrao
cultural;
iii. apresentar uma proposta de leitura analtico-interpretativa do conto a partir da
aplicao do modelo de anlise estrutural proposta por Propp e reelaborada por
Roland Barthes e Greimas em modelo de anlise actancial, destacando as
componentes diegticas sobre as quais se estrutura e se organiza e os
mecanismos e processos de recriao da histria.
1.2. METODOLOGIA
A leitura analtico-interpretativa de um texto impe ao estudioso o recurso a
mtodos especficos de abordagem textual e literria em funo da natureza do estudo
que pretende levar a efeito. Neste sentido, uma narrativa de transmisso oral exige uma
abordagem estrutural a partir das formulaes tericas proppianas e post proppianas
enunciadas na fundamentao terica.
A aplicao do modelo de analise impe a observao de determinados requisitos
que se traduzem em:
i. escolha do texto objecto de anlise - verso escrita do conto popular intitulado
Blimundo, recriado por Leo Lopes;
ii. construo da bibliografia de suporte terico atinente fundamentao e ao
enquadramento conceptual da pesquisa;
3
iii. construo do quadro terico referencial;
iv. aplicao ao texto do modelo de anlise estrutural proppiano.
1.3. ESTRUTURA DO TRABALHO
Este trabalho encontra-se estruturado em cinco captulos, correspondendo
cada um aos diferentes aspectos que este trabalho desenvolve.
Capitulo I: corresponde Introduo do trabalho onde se podem apreciar a
apresentao e a justificao da escolha do tema, se definem os objectivos, a
metodologia seguida e se apresenta a organizao interna do trabalho.
Captulo II: constri a Fundamentao Terica onde se conceptualizam e se
discutem os pressupostos terico-metodolgicos sobre os quais assenta o
desenvolvimento do tema. Sobre o eixo terico repousam os princpios inerentes
ao modelo proppiano de anlise estrutural da narrativa, destacando algumas das
componentes diegticas sobre as quais se estrutura e se organiza, sobretudo a
categoria personagem, e os mecanismos e processos de recriao da diegese.
Captulo III intitulado Do Conto Oral ao Conto Escrito prope uma definio
do conceito de conto, clarificar as circunstncias que presidem sua elaborao e
reflectir sobre o seu circuito especfico de transmisso, no quadro do circuito
comunicativo, bem como a noo de autoria annima e/ou colectiva das narrativas
populares. A partir do conceito de Literatura Tradicional problematizam-se as
origens genticas do conto, a tipologia de contos e os ciclos temticos.
Captulo IV este momento da pesquisa, de carcter mais prtico, centra-se em A
Recriao do Conto Blimundo e desenvolve uma leitura sobre o texto em estudo
pela reconstituio dos processos de recriao da narrativa. Partindo da origem
temtica do conto e da reconstituio do protagonista da histria, a figura possante
do boi Blimundo, analisa-se a organizao funcional da narrativa, restabelecendo
algumas das categorias diegticas.
4
Captulo V apresenta algumas Consideraes Finais decorrentes das reflexes
e da leitura textual realizada para alm de enunciar alguns caminhos a desbravar
futuramente em outros trabalhos sobre as narrativas orais cabo-verdianas.
Captulo VI rene a Bibliografia que serviu de suporte terico, literrio e
metodolgico ao trabalho. Organizada em bibliografia activa textos referenciais
objecto de uma anlise mais aturada e passiva que engloba os estudos crticos e
literrios utilizados.
5
II. ENQUADRAMENTO /FUNDAMENTAO TERICA
A importncia do estudo do conto popular repousa em dois aspectos essenciais.
Se, por um lado, o conto popular partilha das mesmas caractersticas que o conto
literrio consagrado, por outro, constitui uma modalidade especfica de discurso, que
merece a ateno dos estudiosos da literatura, j que encerra em si a aluso explcita
fonte responsvel pela sua produo e s formas especificas de transmisso e difuso.
Deste modo, a leitura e a compreenso deste subconjunto particular de textos
narrativos (no literrios) passam necessariamente pela discusso do funcionamento do
circuito comunicativo tendo em considerao que a instncia que detm o estatuto de
emissor, o povo, um ser colectivo, preferencialmente situado num espao rural
perifrico, pouco permevel a contaminaes urbanas1. Trata-se de um conceito em
torno do qual se concentram fortes divergncias conceptuais e, que no quadro da
comunicao literria, recoloca no s a questo da anonmia (uma espcie de sujeito
colectivo annimo), como a das divergentes recepes literrias.
Legitimado pela comunidade onde circula, que se encarrega de o (re) emitir, o
conto popular, juntamente com outras formas de manifestao de um povo, faz parte da
literatura tradicional de transmisso oral.2 Neste mbito, importa delimitar os
contornos do conceito de literatura tradicional e (re) estabelecer as articulaes
possveis com a noo de tradio, segundo a perspectiva adoptada por Roman
1 Reis, Carlos, Dicionrio de Narratologia, p.83 2 Literatura tradicional de transmisso oral uma designao polmica que encerra em si um princpio paradoxal, que
tem feito correr muita tinta no domnio dos estudos literrios, construda luz da dicotomia escrita/oralidade.
6
Jakobson3, ao analisar a relao tradio-interprete, forjando uma analogia com a
conhecida dicotomia saussuriana lngua/fala a partir da qual se concebe a existncia de
verses ou variantes de um mesmo conto-tipo.
A expresso conto popular recobre um vasto conjunto de narrativas bastante
diversificadas do ponto de vista temtico o que tem suscitado vrias propostas de
classificao de tipos de conto: contos maravilhosos ou de encantamento, contos de
exemplo, contos de animais, contos religiosos, entre outros. A propsito destes ciclos
temticos que esto representados em mltiplas reas geo-culturais, Carlos Reis4 avana
que, embora no exista uma teoria concludente sobre a origem desse tipo particular de
texto, a ocorrncia de uma espcie de fundo arquetpico universal, de se admitir
que:
Do ponto de vista histrico, os contos populares constituem resduos de
crenas e mitos primitivos que se foram progressivamente adaptando a novos
cenrios culturais;
Se assiste, hoje, procura do perfil matricial do conto popular (o que, desde
logo, dilui a importncia do estudo das origens do conto).
Nesta procura da construo de uma matriz estrutural do conto pular, ressalvam-se
os trabalhos de Vladmir Propp5, na sua conhecida obra intitulada Morfologia do Conto,
que teve o mrito de propor uma descrio da estruturao dos contos, segundo as
componentes em que se organizam e das relaes que estas partes mantm entre si e
com o todo, introduzindo nos estudos de narratologia uma modalidade de anlise
designada por anlise estrutural.6
A anlise estrutural norteada pelos seguintes princpios: a concepo do texto
literrio como um todo acabado e a noo de relativizao que afecta os seus
componentes, isto , baseando-se em categorias tericas especficas, procura descortinar
3 Apud Reis, Carlos, Dicionrio de Narratologia, p.83 4 Ibid. p. 85 5 Muito embora o pioneirismo se tenha ficado a dever a Joseph Bdier que, procurou definir a essncia orgnica dos contos, a sua forma prototpica. 6 Esta modalidade de anlise proposta por Propp foi posteriormente retomada e alargada por vrios tericos como Roland Barthes, em 1966, com o seu modelo de anlise funcional, com Philipp Hamon e Greimas, com o modelo actancial, entre outros.
7
as relaes que os seus componentes entre si sustentam. O que quer dizer que tudo no
texto literrio relativo, no podendo ser isolado do que o rodeia.
Segundo o estruturalismo proppiano, o texto uma estrutura em que as partes
estabelecem relaes dinmicas entre si, dotadas de carcter sistmico e, como tal,
desempenham funes especficas, assim, a ausncia ou desvalorizao desses
elementos susceptvel de pr em causa o equilbrio e a estabilidade de toda a obra,
por isso no pode ser estudado por parcelas mas como um todo visto que o texto
literrio no uma soma de elementos ligados uns aos outros de uma forma
desorganizada, mas um tecido com uma estrutura linear em que os acontecimentos
narrados parecem ordenados segundo um fio condutor adoptado pelo autor com o
objectivo de atingir um determinado fim.
A proposta da anlise estrutural dos contos de transmisso oral edificada por
Propp consiste na constituio e leitura de um corpus textual 7 e na identificao de um
conjunto restrito de elementos invariantes as funes que se (re) combinam de
forma idntica, numa ordem rgida de sucesso cronolgica. A estrutura do conto
decorre deste conjunto de elementos solidrios e interligados. Tais funes esto
repartidas por sete esferas de aco inerentes a sete personagens-tipo.
A evoluo deste modelo de anlise conduziu-nos gramtica da narrativa, um
tipo de abordagem que privilegia o plano da histria em detrimento do discurso, seja na
perspectiva funcional, proveniente de Propp e reelaborada por Barthes, seja na
perspectiva sequencial.
7 Propp analisou um corpus constitudo por cem contos maravilhosos russos.
8
III. DO CONTO ORAL AO CONTO ESCRITO
3.1. A TRANSMISSO ORAL E A LITERATURA TRADICIONAL
Os textos orais apresentam um carcter efmero e fugaz. A palavra falada est
sujeita a modificaes por no se inscrever num espao de fixao e a linguagem
realizada oralmente submeter-se dinmica temporal, por isso estes textos tm a
particularidade de se alterar com o tempo, adequando-se s necessidades, desejos e
anseios das comunidades que os vo (re) actualizando segundo as conjunturas e as
circunstncias. Para alm de que, os sujeitos individuais tm a natural tendncia para
adulterar a sua substncia a favor das suas necessidades comunicativas.
Se bem que o estudioso da narratologia Carlos Reis8 de opinio que os
contedos da literatura de expresso oral tm permanecido ao longo dos tempos, dado
que a comunidade tem desempenhado um importante papel na preservao desse
patrimnio cultural, transmitindo-o de gerao em gerao. A sua perenidade deve-se ao
facto de retratarem os grandes problemas no s do homem antigo, como tambm os
problemas que continuam a acompanhar o homem de hoje e de sempre: a luta pela
autonomia, a rivalidade com as figuras parentais, a rivalidade fraterna, a construo
de uma identidade adulta, a solido do homem na terra, a realidade trgica e, por
vezes, cruel das relaes humanas.
8 Reis, Carlos e Cristina Lopes, Dicionrio de Narratologia, Coimbra, Almedina, 1987, p.83
9
Um outro estudioso da tradio oral africana, Loureno do Rosrio9, confirma que
as narrativas de tradio oral so o reservatrio de valores culturais de uma comunidade
com razes e personalidade regionais muitas vezes perdidas na amlgama da
modernidade. A narrativa funciona igualmente como um dos principais veculos de
transmisso do conhecimento, mantendo a ligao entre as geraes de uma mesma
comunidade.
Ao considerar a situao da oralidade nas narrativas africanas, aceita-as como um
dos mais poderosos meios pedaggicos. O seu funcionamento como tal estabelece-se em
torno de dois nveis que impem duas funes: i) a funo de nvel explcito atravs da
narrativa, a memorizao torna-se mais fcil em funo da curiosidade e do prazer. Deste
modo, a aprendizagem e a compreenso realizam-se de forma rpida e o acto de ensinar
torna-se fcil; ii) a funo de nvel implcito em que a narrativa no um simples
instrumento metodolgico de transmisso de conhecimentos, ela transporta em si prpria,
atravs da exemplaridade, o prprio objecto de ensinamento que se quer transmitir.
De um outro ngulo, discute-se o carcter universal das narrativas de transmisso
oral. A bem de verdade, todo o indivduo a quem se enderea uma narrativa, est apto a
compreender que os conflitos apresentados na intriga podem perfeitamente ter lugar no
prprio universo do grupo de que faz parte. So ao mesmo tempo, e em qualquer lugar, um
grande ponto de interrogao sobre os problemas com que o indivduo se defronta no dia-
a-dia na sua sociedade. Ao mesmo tempo, todos os elementos da comunidade percebem
que os conflitos veiculados pelas narrativas representam um universo simblico, o que lhes
permite criar a distino necessria para a reflexo.
Como actos de cultura e especificamente de criao as narrativas de expresso oral
so formas literrias transmitidas pelo sistema verbal oral. Embora no se conteste a
invaso do universo das narrativas pelo mundo real (que inevitvel), Rosrio considera
que tal facto no permite concluir que se possa estabelecer uma relao imediata entre os
ingredientes do mundo real e a prpria realidade. Por outras palavras, as narrativas orais
no sero propriamente fontes documentais de carcter histrico nem sociolgico. A
dimenso histrica aparece nelas como um desfasamento entre a narrao presente, que se
socorre de alguns elementos do real quotidiano, e um contexto etnolgico ausente,
9 Rosrio, Loureno J. da Costa. A Narrativa Africana de Expresso Oral, Lisboa: Instituto de Cultura e Lngua Portuguesa, (ICALP) 1 ed. 1989.
10
longnquo, fabuloso ou, at sobrenatural. No h uma referenciao de um contexto actual,
nem mesmo uma actualizao de situaes socialmente conhecidas, da a passagem para o
mundo simblico dos ingredientes realistas. No entanto, certo que a compreenso do
sentido das narrativas ou a correcta interpretao da simbologia dos seus elementos s
possvel desde que se conhea a geografia a histria, os hbitos sociais, econmicos,
culturais e morais da comunidade que as produz.
3.2. O CIRCUITO COMUNICATIVO E A ANONMIA
Tudo o que os seres humanos fazem no seu dia a dia envolve a comunicao, ou
seja, no convivem com seu semelhante sem se comunicar, pelo que s possvel viver
em grupos sociais, comunicando.
A ideia de que todas as coisas que o homem faz so construdas com o objectivo de
comunicar com os outros, com a inteno de comunicar, de dividir os sus sentimentos
com o semelhante, realada por Aguiar e Silva10
para quem todo o comportamento do
homem um comportamento sgnico e () todo o fenmeno artstico constitui um
peculiar fenmeno comunicativo.
O processo comunicativo tem merecido desde h muito tempo a ateno de alguns
estudiosos, apesar de no existir consenso entre eles. Eric Buyssens, citado por Aguiar e
Silva11
, assinalou, desde 1943, que o objectivo da disciplina cientfica que designa por
Semiologia, o estudo dos processos de comunicao, dos sinais convencionais,
voluntrios, intencionais, de carcter social. Buyssens abre a polmica em torno desta
questo, ao pretender defender uma concepo restritiva da comunicao que remete para
um plano secundrio os fenmenos de significao. No plo oposto surge Roland
Barthes que se distancia desta viso ao defender a semiologia da significao como o
domnio de investigao que estuda os fenmenos que no constituem formas de
comunicao voluntria e intencional, ao sublinhar o facto de que muitos sistemas
semilogicos se constituem mesmo em objecto de uso cuja razo originria de ser no
reside na significao, mas que sofrem, no mbito social, um processo de semantizao,
o mesmo dizer, de ressignificao. O terico italiano Umberto Eco solucionou este
problema de semitica da significao e da semitica da comunicao de uma forma
10 Aguiar e Silva, Victor. Teoria da Literatura, 8 edio, Coimbra, 1978 11 In op cit. p. 186
11
coerente. Segundo ele, teoricamente possvel estabelecer uma semitica da significao
independentemente de uma semitica da comunicao, mas no ser possvel o inverso.
Para Buyssens e Prieto e outros autores, o fenmeno da comunicao s ocorre quando
um emissor produz voluntariamente e intencionalmente sinais, com o objectivo de
influenciar o receptor.
Sabemos j que nem todas as artes tm o mesmo estatuto comunicacional, e esta
diferenciao funda-se na natureza diversa dos signos constituintes do sistema semitico
de cada arte, na heterogeneidade dos cdigos, dos canais, dos mecanismos de recepo e
dos factores pragmticos actuantes em cada arte.
A literatura ocupa necessariamente uma posio privilegiada entre todas as artes
devido sua essencial solidariedade semitica com o sistema da comunicao por
excelncia de que dispem os seres humanos a linguagem verbal.
H muito que Roman Jakobson assegurava que, para que houvesse a comunicao
verbal, pressupunha-se necessariamente a interaco de seis factores inalienveis que
esquematizou da seguinte forma:
Contexto
Emissor.Mensagem.Destinatrio
Contacto
Cdigo
Para este terico, a comunicao oral uma comunicao prxima e instantnea, e
realiza-se na presena dos interlocutores; bidireccional, pois o emissor e receptor
podem assumir alternadamente a funo um do outro durante o mesmo acto
comunicativo, ambos os interlocutores imitem e recebem informaes alternadamente.
Aguiar e Silva refora esta ideia, ao afirmar que o processo comunicativo entre o emissor
e o receptor realiza-se in presentia de ambos e in presentia de um determinado contexto
de situao.
De entre as vrias formas de comunicao, a nossa ateno centra-se na
comunicao literria uma vez que o conto literrio, escrito por um autor, se manifesta
atravs da comunicao literria, pese embora o facto de, na sua primitiva forma, o
conto popular fosse transmitido oralmente, de gerao em gerao. Assumindo a
12
comunicao literria como unidireccional, nela no possvel a reversibilidade das
funes do emissor e do receptor, o receptor e o emissor no trocam de papis durante o
acto comunicativo. uma comunicao do tipo disjuntivo e do tipo diferido, isto ,
realiza-se in absentia de uma das instncias - o emissor e receptor - e num lapso
temporal de maior ou menor amplitude entre o momento de emisso e os momentos de
recepo. Aguiar e Silva12
teoriza o processo comunicativo e apresenta-o como
funcionalmente defectivo, isto , como um processo em que a instncia emissora e a
instancia receptora no se encontram co-presentes fisicamente e em que, por
conseguinte, no podem ser esclarecidos e solucionados in pesentia de ambas as
dificuldades e os distrbios porventura ocorridos no acto comunicativo.
Relativamente propriedade autoral, ela no pode ser atribuda a um nico criador, mas a
toda uma comunidade. Neste sentido, a instncia emissora difere do conto literrio escrito, em
que a entidade responsvel pela enunciao se define intratextualmente bem como a instncia a
quem enderea a mensagem literria.
Carlos Reis quem afirma que ( ) bem mais complexo o estatuto do emissor do conto
popular, na medida em que estas narrativas so discursos annimos, legitimados pela comunidade em que
circulam.13
3.3. OS CICLOS TEMTICOS E A TIPOLOGIA DE CONTOS
3.3.1. OS CICLOS TEMTICOS
Porque no existe uma relao directa entre o conto e a realidade, torna-se difcil
indicar os temas absorvidos pelas narrativas que os contos configuram. Na verdade,
apresentam-se relacionados com pocas histricas e com particulares momentos
vivenciais. Os contos so recriados de acordo com os contextos socio-culturais e com as
exigncias de cada poca. Da a diversidade de temas que apresentam. De um lado,
figuras humanas, como heris ou anti-heris; do outro, aspectos da vivncia social:
religiosidade, aventuras, casos de amor; outras envolvem animais, o que representa, de
certo modo, a maneira como as comunidades convivem com estes seres: ora exaltando-
os, como o caso do boi Blimundo que, alm de protagonizar a histria narrada no
12 Aguiar e Silva, Teoria da Literatura, (8 edio), Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p.198 13
Reis, Carlos, op cit p 84
13
conto em estudo, confere-lhe o ttulo por que conhecido, ora envolvendo-os em lendas
que os pem em confronto com os seres humanos ou humanizados, como caso de
muitas estrias de Lobo e Chibinho que fazem parte do imaginrio popular cabo-
verdiano e do seu patrimnio cultural.
Os contos, ao serem transportados de regio para regio, sofrem adaptaes ou
reformulaes que os adequam ao novo ambiente; as personagens passam por
transformaes, ganham novas figuraes; a prpria histria altera-se de modo a
condizer com a nova situao criada pela mudana do meio ecolgico, social e cultural,
ou em funo do processo de construo em curso de novos espaos sociais.
3.3.2. TIPOLOGIAS DE CONTOS
Muito tem sido as classificaes a respeito do conto, se bem que no exista
consenso entre os autores no que diz respeito classificao deste tipo de texto.
A classificao elaborada por Aarne/Thompson divide os contos segundo
unidades temticas, ou seja, a identificao de cada conto baseia-se no tipo de enredo e
no tipo de personagem que encerra.
A classificao de Antti Aarne e Thompson a seguinte: i) Histrias de Animais
(Animal Tales); ii) Contos populares comuns (Ordinary Folktales); iii) Pilhrias e
Anedotas (Jokes and Anedotes); iv) Contos de Mentiras (Tales of Lying); v) Contos
Acumulativos ou de Repetio (formula Tales); vi) Contos no-classificados
(Unclassified Tales).
Para Propp, antes de se fazer qualquer estudo sobre o conto (estabelecer teses
sobre a origem dos contos e determinar tipos de contos), preciso, em primeiro lugar,
descrev-los, conhecer a sua estrutura. Com base neste princpio, Propp rejeita as
classificaes que dividem os contos em: histrias fantsticas, histrias tomadas da
vida quotidiana e histrias de animais (de U. F. Miller). Ou as que tentam dividi-los por
assuntos contos de animais, contos propriamente ditos, contos jocosos (de Antti
Aarne), sem especificar, na verdade, o que assunto e o que variao de um assunto,
de forma a possibilitar o enquadramento de um conto em mais de um tipo.
14
A uniformidade especfica do conto no se explica, pois, segundo Propp, por
temas (Antti Aarne), por motivos (Veselovski), por assuntos (Volkov), ainda que eles se
repitam, mas por unidades estruturais em torno das quais estes elementos se agrupam.
Propp acredita que todas as classificaes estariam inconscientemente baseadas
na estrutura do conto, quando esta no teria sido sequer definida, no se traduzindo
em sistemas de signos formais como o fazem outras cincias. Assim, a diviso dos
contos maravilhosos por temas resultaria absolutamente impossvel em virtude
mesmo da lei de permutabilidade vigente, segundo a qual as partes constitutivas de um
conto podem ser transportados para outro conto sem mudana alguma, o que torna falso
a premissa que considera cada tema como um todo orgnico, independente em si
mesmo.
Propp procede descrio do conto segundo as partes que o constituem e
segundo as relaes destas partes entre si e destas partes com o conjunto do conto.
Partindo da anlise da aco das personagens, destacam-se as aces constantes a que
ele chama de funes. Podemos observar que as personagens dos contos fantsticos, ao
mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparncia, idade, sexo, gnero
de preocupao, estado civil e outros estados estticos e atributivos, realizam, ao longo
da aco, os mesmos actos. Isto determina a relao das constantes com as variveis. As
funes das personagens representam constantes, todo o resto pode variar. Por exemplo,
o envio e a partida ligados s buscas so constantes. Aquele que envia e aquele que
parte, a motivao de enviar, etc., so variveis. Em seguida, as etapas de busca, os
obstculos, etc., podem coincidir sempre na sua essncia sem coincidir na sua aparncia.
Uma vez isoladas as funes, poder-se-o agrupar os contos que alinham as
mesmas funes. Podem ser considerados como contos do mesmo tipo. O que leva a
afirmar que todos os contos maravilhosos pertencem ao mesmo tipo no que diz respeito
estrutura.
O conto maravilhoso, do ponto de vista morfolgico, o desenrolar de qualquer
aco que parte de uma malfeitoria ou de uma falta e que passa por funes intermdias
para ir acabar em casamento ou em outras funes utilizadas como desfecho. A funo-
limite pode ser a recompensa ao alcanar o objecto da demanda ou, de maneira geral, a
reparao da malfeitoria, etc. chamamos a este desenrolar de aco uma sequncia. Cada
15
nova malfeitoria ao prejuzo, cada nova falta, d lugar a uma nova sequncia: um conto
pode ter vrias sequncias.
Segundo Propp possvel inserir todos os contos maravilhosos na seguinte
esquema ABCDEFGHMINKPrRsOLQExTUW; os contos que apresentam uma
sucesso invertida destas funes so variaes e no novos sistemas de composio. Este
esquema confirma a tese geral da uniformidade absoluta da estrutura dos contos
maravilhosos.
16
IV. A RECRIAO DO CONTO BLIMUNDO
4.1. O CONCEITO DE CONTO: O CONTO ORAL E O CONTO ESCRITO
O conto foi, em sua primitiva forma, uma narrativa oral. Para preencher o tempo
de lazer, depois de um dia rduo de trabalho, as populaes rurais reuniam-se volta de
um contador de estrias, que animava as noites quentes de luar, com narrativas
ingnuas de bichos, lendas populares ou mitos arcaicos. de salientar que volta do
contador no se reuniam apenas crianas, tambm adultos da comunidade.
Carlos Reis refora esta ideia, ao afirmar que: tal como o romance, a novela ou a
epopeia, o conto pertence ao gnero narrativo, que se enraza em ancestrais tradies
culturais que faziam do ritual do relato um factor de seduo e de aglutinao
comunitria. O conto esteve originalmente ligado a situaes narrativas elementares:
nelas, um narrador, na atmosfera quase mgica instaurada pela expresso era uma
vez suscitava, num auditrio fisicamente presente, o interesse por aces relatadas
num nico acto de narrao e que no raro tinham, para alm dessa funo ldica,
uma funo moralizante.14
14 REIS, Carlos e Cristina Lopes, Dicionrio de Narratologia, Coimbra, Almedina, 1987, p.79
17
Tendo em conta estas duas funes presentes nos contos populares, Lopes Filho15
avana que, desempenham um papel pedaggico e asseguram a transmisso das
tradies. Atravs da interpretao simblica dos mesmos, possvel detectar-se o nvel
de representao dos valores morais e regras sociais presentes no imaginrio local e
possvel de serem transmitidas as geraes mais novas.
A palavra conto foi utilizada para designar uma forma popular folclrica, uma
criao colectiva da linguagem. Apontava para dois tipos de textos muito diferentes: o
conto popular ou tradicional, de origem popular e oral,16
transmitida de gerao em
gerao, que narrava as aventuras, frequentemente fantsticas, de um heri (ou herona);
e o conto de autor, com caracterstica e estilo personalizado, escrito por um autor que
um indivduo emprico, historicamente situado, que relata um episdio, um caso
humano ou uma situao exemplar.
A expresso popular remete-nos para a ideia de povo, o que no singular, mas
que engloba um colectivo. Para Carlos Reis, um conceito relativamente ambguo que
denota de forma difusas, um certo colectivo preferencialmente situado num espao
rural perifrico, pouco, permevel a contaminaes da cultura urbana. Sublinha,
assim, que o conceito popular tem as suas razes no no mundo letrado da cultura
consagrada, oficialmente reconhecida, e assegurada pelos livros, mas nas camadas
no hegemnicas da populao, onde a cultura transmitida de gerao em gerao
oralmente.
O conto popular enraizava-se na tradio oral dos povos, actuando como veculo
de transmisso de ensinamentos morais, valores ticos ou concepes de mundo. O
conto no se prestava apenas para divertir e fazer passar o tempo como tambm incutia
nos espritos humanos aspectos filosficos da vida, aprovados pela comunidade, e que
eram passados de gerao em gerao, uma espcie de legado passado de pais para os
filhos.
atravs desta estratgia de circulao na (s) comunidade (s) que o conto afirma a
sua especificidade, juntamente com outras manifestaes populares como as expresses
15 LOPES, Joo Filho, As estorias na Cultura Cabo-verdiana, Revista de Estudos Cabo-verdianos,
Comisso Nacional p/ a Instalao da Universidade de Cabo Verde, n 1, Julho de 2005, p. 19 a 34.
16 Estas narrativas eram posteriormente recolhidas em antologias e passadas a diferentes leitores ao longo
dos tempos.
18
proverbiais, os adgios, as adivinhas, as canes, os jogos de palavras, entre outras,
integrando-se na chamada literatura.
O conto popular transmitido oralmente de gerao em gerao, ou seja, o conto
no registado nos livros mas sim na memria e sem suporte material de fixao o conto
popular literalmente promovido existncia na e pela oralidade. Como a prpria
denominao diz, foram criados e narrados pelo povo, nasceram da oralidade (da boca)
e do esprito inventivo de muitos. Mas embora realizado oralmente, ele no se exaure no
momento da sua realizao: persiste no tempo, evidenciando de forma clara que a
pervivncia de um determinado cultural no passa inevitavelmente pelo o recurso a um
cdigo grafemtico. Como j foi referido acima o patrimnio cultural pode ser mantida
atravs da transmisso oral.
No sculo XIX o conto conhece a sua poca de maior esplendor, e passa a
ser cultivado por muitos autores que recriavam narrativas j existentes dando-lhes
roupagem nova. Segundo Moiss Massaud, alm de se tornar forma nobre, ao lado
das demais at ento consideradas, sobretudo as poticas, passa a ser larga e seriamente
cultivado. Abandona o seu estgio emprico, indeciso e por assim dizer folclrico, para
se ingressar numa fase em que se torna produto tipicamente literrio. O conto deixa de
ser uma criao colectiva para se tornar uma criao individual, de um autor com um
estilo literrio prprio. Muitos contos populares so recriados por autores que lhes
atribuem marcas individuais, passando assim a fazer parte da literatura escrita, onde j
vamos ter um autor conhecido (mesmo que no se conhea o nome, a autoria
reconhecvel pelo estilo e coerncia dos textos); origem mais ou menos recente, mas
geralmente atribuvel a datas relativamente precisas.
O conto atinge nos nossos dias o seu apogeu como forma literria, passa a ser
escrito em livros, j com uma formulao artstica, afastando-se do domnio colectivo
da linguagem. Passa a ser possvel identificar o autor atravs da sua forma peculiar,
individual de escrever e de recriar a narrativa.
19
4.2. ORIGEM TEMTICA DO CONTO
No existe um consenso entre os estudiosos quanto questo dos motivos
temticos dos contos pelo que no tem sido fcil explicar de forma clara esta matria.
Nem mesmo os estudiosos que adoptaram as perspectivas marxistas tm conseguido
explicar claramente a questo dos motivos temticos.
O estudo dos contos sob o ponto de vista da teoria marxista, segundo Rosrio,
pecam por se agarrar de uma forma linear aos modos de produo clssica
(comunitarismo primitivo, esclavagismo, feudalismo, capitalismo, socialismo) com as
correspondentes formas superestruturais da cultura e da sociedade. Se, por acaso na
narrao surgem elementos que nos remetem para esses modos de produo, trata-se
sobretudo de uma questo de assimilao ao nvel da actualizao da narrativa que
dinamiza o processo de transformao das narrativas, adaptando-as s situaes
concretas e actuais, sem que, no entanto, percam os valores e a linguagem que esto
para alm das realidades historicamente conhecidas. Por outras palavras, as narrativas
folclricas so recriadas conforme as exigncias socioculturais e politicas de cada
poca, o que leva introduo de elementos que nos remetem para uma poca
especfica como por exemplo: o colonialismo, o feudalismo, o capitalismo, o
socialismo, etc.
Hoje no mundo contemporneo, dominado pelas novas tecnologia pode verificar
que no h uma referncia directa ao sistema de produo actual, que praticamente
inexistente como motivo temtico. Mesmo nas sociedades modernas industrializadas o
motivo temtico continua sendo a caa, a agricultura e outras actividades a elas ligadas.
Os motivos temticos continuam a retratar as vivncias do homem rural e no do
homem citadino.
Segundo Propp, as narrativas conservam, atravs dos tempos, a memria das
crenas e rituais primitivos, ligados sociedade clnica de regime de recoleco e da
caa, embora a sua sistematizao e difuso se tenha desenvolvido com o surgimento da
fase agrcola da humanidade.
A origem do conto no esta ligada base econmica de produo em curso no
sculo em que se comeou a regist-lo ou a recria-lo. com a realidade histrica do
20
passado que devemos confrontar o conto e ali procurar as suas razes, determinar o que
precisamente nesse passado indispensvel para a explicao do conto.
Esta teoria de Propp sobre as origens do conto retomada por Lopes Filho17
para
explicar as origens da narrativa popular cabo-verdiana. Este antroplogo explica que
para se apurar a gnese das narrativas, devem equacionar-se as bases culturais da
respectiva sociedade, sem ignorar as relaes culturais, histricas, polticas e
econmicas estabelecidas entre povos vizinhos, bem como as influncias exercidas por
uns sobre os outros, devido a condicionalismos vrios, dinamismo e versatilidade de
cada grupo humano. Com base neste pressuposto, avana que a narrativa oral cabo-
verdiana (e mais concretamente as estrias) so basicamente testemunhos de uma
oratura18
nascida do tipo de povoamento que se processou no arquiplago, pois,
evoluiu em conjunto com a prpria sociedade. No entanto, uma leitura mais atenta dos
seus segmentos estruturais poder, possivelmente, revelar contribuies europeias ou
africanas e, por vezes, uma reapropriao simultnea de elementos de ambas as
culturas. Assevera ainda que, em boa parte, as narrativas orais cabo-verdianas
resultaram da coexistncia de elementos da cultura africana e da europeia que, depois
incorporados deram origem s novas verses pelo processo de adaptao e pela tcnica
do reconto.
A histria do boi Blimundo, consagrado pela escrita em dois textos at ento
conhecidos,19
constitui um conto tradicional cabo-verdiano cujas origens se perderam na
noite dos tempos.
Narrativa de transmisso oral chegou actualidade atravs do circuito
comunicativo especfico da literatura tradicional. Contada em todos os cantos dos pas,
onde recebe formulaes diversas, Blimundo tem conhecido uma infinidade de verses,
infelizmente no recolhidas, correndo o risco de se perderem para sempre. No sendo
objectivo deste trabalho nem a recolha destes textos nem o estudo comparativo das
diferentes verses, ainda possveis de resgatar, regista para futuras investigaes este
assunto.
17
LOPES, Joo Filho, As estrias na Cultura Cabo-verdiana, Revista de Estudos Cabo-verdianos,
Comisso Nacional p/ a Instalao da Universidade de Cabo Verde, n 1, Julho de 2005, p. 19 18
Ibid. p.20 19
So as verses escritas de Leo Lopes, objecto de anlise neste trabalho e de Aldnio Gomes
constantes da nossa bibliografia.
21
Leo Lopes, autor do texto publicado no h muitos anos, refere no prefcio do
livro que este conto ainda contado s crianas, pelas ribeiras do interior de Santo
Anto, onde conhecido, s vezes, com ligeiras nuances de pormenor, em quase todas
as ilhas com tradio de trapiche.
A literatura tradicional cabo-verdiana regista algumas composies versificadas
em torno da figura do boi. Publicadas nas Cantigas de Trabalho, recolhidas por
Oswaldo Osrio, constituem um corpus textual que nos remete para a presena de um
ciclo temtico em torno do boi, tendo como espaos referenciais as ilhas agrcolas onde
a prtica do fabrico do aguardente e do mel da cana do acar era uma actividade com
um peso econmico significativo referimo-nos sobretudo s ilhas agrcolas como
Santiago, Santo Anto, Fogo e So Nicolau.
Nestes textos, o boi um animal mitificado e constitui o tema central o que
demonstra a importncia deste animal no desenvolvimento das actividades agrcolas. A
partir destas narrativas e de outras formas poticas sobre este tema, pode estudar-se a
representao do ciclo do boi e a persistncia dessas manifestaes no imaginrio
popular cabo-verdiano.
4.3. A ESTRUTURA DO CONTO
Quanto estrutura, podemos dizer que o conto uma narrativa curta. Caracteriza-
se por uma forte concentrao da intriga unidade de aco, uma clula dramtica,
portanto, gravita em torno de um s conflito, um s drama e uma s aco; do espao
unidade de espao; do tempo unidade de tempo. Integra um nmero reduzido de
personagens, confere pouca importncia s pausas descritivas, mas cede um amplo
espao ao dilogo, a modalidade discursiva que predomina neste subgnero narrativo.
A unidade de aco corresponde unidade de espao, e esta decorre da
circunstncia de apenas determinado ambiente encerrar importncia dramtica. Da
mesma forma que uma nica aco possui relevncia dramtica, um nico espao serve
de teatro ou palco do conflito que o conto revela. Pode dizer-se, consequentemente, que
no conto se processa a determinao do tempo e do espao na medida em que os demais
22
momentos e lugares so vazios de dramaticidade. Do contrrio, pela criao de vrios
plos dramticos, haveria desequilbrio interno, e o conto perderia o seu carcter prprio
para se tornar esboo de novela ou de romance.
Poucas so as personagens que intervm no conto, como decorrncia natural das
caractersticas apontadas: as unidades de aco, tempo e lugar obrigam presena de
uma reduzida populao no palco dos acontecimentos.
Propp, em Morfologia do Conto, observou que as personagens dos contos
fantsticos, ao mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparncia, idade,
sexo, gnero de preocupao, estado civil e outros estados estticos e atributivos,
realizam ao longo da aco os mesmos actos. Assim, possvel estudar os contos a
partir das funes das personagens: o que muda so os nomes das personagens; o que
no muda so as suas aces ou as suas funes. O conto empresta muitas vezes as
mesmas aces a personagens diferentes. As personagens dos contos, ainda que
diferentes, cumprem as mesmas aces. O prprio modo de realizar uma funo pode
mudar: um valor varivel. Mas a funo, enquanto funo, um valor constante.
Propp chegou concluso de que, no conto maravilhoso, se observam trinta e uma
funes possveis, assinalando que a ausncia de algumas delas no compromete a
ordem das que permanecem nem o seu reconhecimento enquanto tipo estrutural. A lista
de funes representa a base morfolgica dos contos maravilhosos em geral. Os contos
comeam habitualmente pela exposio de uma situao inicial designa-se por .
A abertura seguida das seguintes funes:
I. Um dos membros da famlia afasta-se de casa (definio: afastamento, designado por
).
II. Ao heri impe-se uma interdio (definio: interdio, designada por ).
III. A interdio transgredida (definio: transgresso designada por ).
IV. O agressor tenta obter informaes (definio: interrogao, designada por ).
V. O agressor recebe informaes sobre a sua vtima (definio: informao, designada
por ).
VI. O agressor tenta enganar a sua vtima para se apoderar dela ou dos seus bens
(definio: engano, designada por ).
23
VII. A vtima deixa-se enganar e ajuda assim o seu inimigo sem saber (definio:
cumplicidade, designado por ).
VIII. O agressor faz mal a um dos membros da famlia ou prejudica-o (definio,
malfeitoria, designado pela letra A).
VIIIa. Falta qualquer coisa a um dos membros da famlia, um dos membros da famlia
pretende possuir qualquer coisa (definio: falta designada por ).
Alguns elementos prprios ao meio do conto, so transportados para o incio em alguns
contos.
IX. A notcia da falta ou da malfeitoria divulgada, dirige-se ao heri um pedido ou
uma ordem; este enviado em expedio ou deixa-se que parta de sua livre vontade
(definio: mediao momento de transio, designado por B)
Os heris dos contos so de dois tipos diferentes: 1 heris os que-demandam-alguem
ex.: se Ivan parte em busca de uma jovem raptada do horizonte paterno ele o heri do
conto e no a jovem; 2 heri-vitima no h ningum que vai demandar alguma coisa.
X. O heri que-de-manda aceite ou decide agir (definio: inicio da aco contraria,
designada por C).
XI. O heri deixa a casa (definio: partida, designada por )
XII. O heri passa por uma prova, questionrio, um ataque, etc que o preparam para o
recebimento de um auxiliar mgico (definio: primeira funo do doador, designada
por D)
XIII. O heri reage as aces do futuro doador (definio: reaco do heri, designada
por E)
XIV. O objecto mgico posto a disposio do heri (definio: recepo do objecto
magico, designado por F). os objectos mgicos podem ser 1 animais (cavalo, guia,
etc.), 2 objectos de onde saem auxiliares mgicos (o isqueiro e o cavalo, o anel e os
jovens) 3 objectos que tem propriedades mgicos: espada, violino, esfera e muitos
outros; 4 qualidades recebidas directamente como por exemplo a fora, a capacidade de
se transformar em animal.
XV. O heri transportado, conduzido ou levado perto do local onde se encontram o
objectivo da sua demanda (definio: deslocao no espao entre dois reinos, viagem
com um guia, designado por G)
XVI. O heri e seu agressor defrontam-se em combate (definio: combate, designado
por H)
XVII. O heri recebe uma marca (definio: vitoria, designado por I)
XVIII. O agressor vencido (definio: vitria, designado por J)
24
XIX. A malfeitoria inicial ou a falta so reparadas (definio: reparao, designado por
K)
XX. O heri volta (definio: volta, designado por )
XXI. O heri perseguido (definio: perseguio, designado por Pr)
XXII. O heri socorrido (definio: socorro, designado por Rs)
XXIII. O heri chega incgnito a sua casa ou a outro pas (definio: chegado incgnita,
designado por O)
XXIV. Um falso heri faz valer pretenses falsas (definio: pretenses falsas,
designadas por L)
XXV. Prope ao heri uma tarefa difcil (definio, tarefa difcil designado por M).
XXVI. A tarefa cumprida (definio: tarefa cumprida, designado por N)
XXVII. O heri reconhecido (definio: reconhecimento, designado por Q)
XXVIII. O falso heri ou o agressor, o mau desmascarado (definio: descoberta,
designado por Ex.)
XXIX. O heri recebe uma nova aparncia (definio: transfigurao, designado por T)
XXX. O falso heri, o agressor punido (definio: punio designado por U)
XXX. O heri casa-se e sobe ao trono (definio casamento, designado por Wo)
A aco de numerosos contos originrios das mais diversas naes, decorre entre
os limites destas funes.
A malfeitoria, o envio ou o apelo de socorro, a deciso de reparar o mal sofrido e a
partida (ABC) constituem o n da intriga. A prova a que o heri submetido pelo doador,
a sua reaco e recompensa (DEF) constituem um certo conjunto. Outras funes
aparecem isoladas (partida, punio, casamento, etc.).
As funes esto agrupadas segundo certas esferas de aco que correspondem s
personagens que cumprem as funes: 1) a esfera de aco do agressor (ou do mau)
compreende: a malfeitoria (A), o combate e as outras formas de luta contra o heri (H),
a perseguio (Pr); 2 - esfera de aco do doador (ou provedor) compreende a
preparao da transmisso do objecto magico (D), o pr o objecto magico disposio
do heri (F); 3- a esfera de aco do auxiliar, compreende a deslocao do heri no
espao (G), a reparao da malfeitoria ou da falta (K), o socorro durante a perseguio
(Rs), o comprimento das tarefas difceis (N), a transfigurao do heri (T); 4 - a esfera
de aco da princesa e do seu pai, compreende: o pedido para cumprimento de tarefas
difceis (M), a imposio de uma marca (J), a descoberta do heri (Q), a punio do
25
segundo agressor (U), o casamento (W); 5- esfera de aco do mandatrio, compreende
s o envio do heri. 6 - a esfera de aco do heri, compreende a partida para a
demanda (C), a reaco as exigncias do doador (E), o casamento (W); 7 - esfera de
aco do falso heri, compreende: a partida para a demanda (C) a reaco as
exigncias do doador, sempre negativa (Eneg), e, enquanto funo, especifica as
pretenses mentirosas.
H portanto sete personagens no conto. Alm disso existem personagens especiais
para as ligaes (queixosos, denunciadores, caluniadores tal como informadores
particulares para a funo informao obtida). Uma esfera de aco corresponde
exactamente a uma personagem; uma nica personagem ocupa vrias esferas de aco;
o caso inverso: uma s esfera de aco divide-se entre vrias personagens.
Quanto linguagem o conto deve ser objectiva e utilizar metforas de curto
espectro, de imediato compreenso para o leitor. Despe-se da abstraco e de toda a
preocupao pelo rendilhado ou pelos esoterismos. O conto, por seu estofo
eminentemente dramtico, deve ser tanto quanto possvel, dialogado. Os conflitos, os
dramas, residem na fala das personagens, nas palavras proferidas (ou mesmo pensadas)
e no nos actos ou gestos (que so reflexos ou sucedneos da fala); sem dialogo no h
discrdia, desavena ou mal-entendido, e sem isso no h conflitos nem aco.
4.4 OS PROCESSOS DE RECRIAO DA NARRATIVA.
A recriao da narrativa oral, transmitida de boca em boca, segundo Lopes Filho,
deve-se a no fixao das estrias tradicionais, atravs da escrita (como sabido a palavra
escrita esta associada imutabilidade), o que leva a que o seu primitivo autor passe ao
anonimato e, desta forma, cada contador possa ser visto como o possvel autor da narrativa.
Mas mesmo assim, esta liberdade de criao de que dispe o intrprete no pode
lev-lo a cair no exagero, no extremismo, o que conduziria obviamente a criaes
arbitrrias. Lopes Filho avana que a criatividade do narrador no arbitrria por estar
submetida ao sancionamento da respectiva sociedade, mas tal no impede que a
26
actualizao das estrias d lugar existncia de mltiplas variantes, por vezes em
resultado de adaptaes vivncia sociocultural de cada comunidade.
Se um indivduo produz inovaes ou variaes apreciadas pela comunidade, elas
sero imitadas e assim passaro a fazer parte do repertrio colectivo da tradio. Se suas
inovaes no so aprovadas, elas sero rejeitadas pela comunidade, no entrando assim
no repertrio colectivo da comunidade, morrero com o criador. Assim, sucessivos
pblicos decidem se uma determinada estria vai sobreviver e de que forma
sobreviver. nesse sentido que o povo participa da criao e transformao da cultura
popular.
Propp afirma que h domnios em que o narrador popular nunca inventa, e h
aqueles em que cria com maior ou menor liberdade. Segundo as anlises feitas por este
estruturalista russo, o narrador no livre nos seguintes domnios:
- na ordem das funes em que a cadeia se desenrola;
- nos elementos cujas espcies esto ligadas por uma dependncia absoluta ou
relativa.
- na escolha de algumas personagens em funo dos seus atributos, quando no
tem necessidade de uma funo determinada.
- na verificao de dependncia entre a situao inicial e as funes seguintes:
por exemplo quando necessrio ou quando se deseja utilizar a funo A2
(rapto do auxiliar) este auxiliar deve estar inserido na situao inicial.
Por outro lado segundo o mesmo autor o narrador livre nos seguintes domnios:
- na escolha das funes que omite ou que, pelo o contrrio, utiliza.
- na escolha do meio pelo qual a funo se efectua. precisamente este o
caminho que leva, criao de novas variantes, de novos assuntos, de novos
contos.
- na escolha da nomenclatura e dos atributos das personagens.
- na escolha dos meios que a lngua lhe oferece.
Propp acrescenta que, quanto s noes de tema e de variante, completamento
impossvel distinguir um tema de uma variante. H apenas duas maneiras de ver as
27
coisas: ou cada transformao origina um novo tema, ou todos os contos tm apenas
um nico tema sob diversas variantes. Na verdade, as duas formulaes exprimem a
mesma coisa. Deve considerar-se o conjunto dos contos maravilhosos como uma cadeia
de variante.
A nvel intratextual, os intervenientes na construo da mensagem literria so
entidades imaginrias, que no tm existncia real, s quais cabe a responsabilidade da
construo e organizao do universo imaginrio. A enunciao narrativa est a cargo
de um autor textual com funes narrativas que, em termos teorticos, no poder ser
confundido com o autor real. Na medida em que toda a mensagem literria tem um
destinatrio, a este nvel, endereada a uma instncia fictcia que assume as funes de
destinatrio intratextual da mensagem. Esta instncia presente, ausente ou virtual,
designada por narratrio. Assim, o circuito comunicativo intratextual estabelece-se entre
um narrador e um narratrio, duas criaturas fictcias com funes imaginariamente
diferenciadas.
Todo o texto narrativo, de ndole literria, institui um universo ficcional no qual
movem as personagens diegticas. Contudo, apenas a ficcionalidade no caracteriza
suficientemente o texto pertencente ao modo narrativo, h que ter em conta outras
propriedades textuais como a intertextualidade todo o texto pressupe um espao
intertextual virtual e amplo -, a coerncia tcnico-semntica e a estratificao o texto
narrativo por excelncia articulado em diversos estratos (Roman Ingarden).
Esse universo imaginrio ou quase-mundo, que o texto cria, articula-se com o real
a partir de um pretenso enraizamento num mundo emprico, com existncia histrica,
por um processo de pseudo-referencialidade ou auto-referencialidade, na medida em
que os objectos, os seres, os espaos presentes no mundo ficcional tambm se
encontram no mundo real. So representados literariamente sob a aparncia de
ingredientes do mundo real.
Leo Lopes, o autor do texto em estudo, afirma no prefcio da obra, que
Blimundo era um boi imaginrio, de grande estatura, smbolo da liberdade no
contexto rural das ilhas, contexto agrcola e com estruturas sociais ainda bem definidas
Trata-se de um universo e uma ambincia ruralizantes, em que as figuras de
destaque conformam plos opostos de um lado o boi e do outro o Rei, smbolos do
28
poder e da soberania e da opresso, resistncia e luta pela liberdade e a vida. Neste
sentido, constitui pano de fundo da aco o mundo rural, sendo descrito pela
enumerao dos elementos que o compem tais como ribeiras, campos, montanhas,
ruas, apresentando-se como o macro-espao. O espao da aco propriamente dito
extremamente concentrado, como convm ao conto, e resume-se ao micro-espao
relativo ao pequeno reino.
O narrador reafirma a apresentao feita do heri da histria. Ao construir o
enunciado literrio apropria-se da adjectivao j utilizada pelo autor do texto e
descreve a entidade imaginria que protagoniza a histria, sob uma figura taurina, mas
investido de profundos sentimentos humanos. Um boi, um boiona, um boi de trapiche
que, cansado da vida de trabalho e de cativeiro, ter-se- revoltado contra o seu amo e
senhor (o Senhor Rei) e fugido para se esconder nas muitas rochas e ribeiras da ilha
(Santo Anto). O Rei que no perdoa esta traio, move contra ele uma grande
perseguio, trazendo-o sua presena para ser severamente punido. As ordens do Rei
eram: Guarda, rene os soldados e que me tragam o Blimundo, morto ou vivo!
Enquanto heri da histria, Blimundo descrito como uma figura contraditria.
Se, de um lado, constitui um personagem filho das rochas, possante, calmo e sabedor
do mundo, amante da vida e da liberdade, boi respeitado por todos os seus iguais ()
amigo da harmonia () nada fazia que contrariasse a justia e a ordem natural da
evoluo da vida, por outro era visto, sobretudo aos olhos daqueles que representavam
a lei, a ordem e a justia, como irreverente em relao s leis estabelecidas ()
vagabundo, revoltoso.
Para alm da personagem principal acima descrita, fazem parte deste mundo
construdo neste conto outras personagens com estatutos e papis diferentes. Destacam-
se entre outras, o Rei que se ope directamente a Blimundo e o rapazinho que o co-
adjuva na captura de Blimundo.
Do ponto de vista terico, os papis distribudos aos personagens constroem-se
em funo da teia de relaes que se tece em torno das diferentes personagens que
povoam esse universo ficcional. Assim, definem-se em termos de protagonismo e
secundariedade. Aguiar e Silva estabelece a figura do deuteragonista em relao ao
protagonista, referindo-se personagem secundria de maior destaque na narrativa. No
29
caso concreto de Blimundo, este papel caber ao Rei, muito embora acumule tambm o
papel de antagonista, partilhado com o do rapazinho, que tem exactamente a mesma
funo. Contudo, se entendido na sua relao com o Rei, este funciona como adjuvante
opondo-se a Blimundo.
As demais personagens, se bem que com alguma importncia na histria,
integram uma outra categoria identificada por este mesmo estudioso qual confere a
designao de figuras esparsas ou episdicas. So identificadas como: filhinha do Rei
(codezinha), a vaquinha da praia, a filha do Rei Vaquinha da praia, os soldados, outros
bois e convivas.
30
3.4. Perspectiva estruturalista sobre a verso do conto Blimundo recriado por Leo Lopes: uma aproximao
1 Sequncia:
Era uma vez um boi. Um boi grande, um boiona que se chamava Blimundo.
Blimundo, filho das rochas, possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da liberdade, era boi respeitado
por todos os seus iguais, e no s, pelas ribeiras, campos e vertiginosas montanhas. Amigo da harmonia em todas as
coisas, Blimundo nada fazia que contrariasse a justia e a ordem natural da evoluo da vida. Tinha o seu prprio
entendimento do mundo e da liberdade, que ele defendia no quotidiano pelos picos, bordeiras e assomadas.
Situao inicial
Senhor Rei, ao saber das existncia de Blimundo e do seu comportamento, que ele considerava irreverente em relao
s leis estabelecida no seu reino, no admitia que boi algum do seu territrio fugisse obedincia, s demandas dele
senhor todo poderoso, dono das ribeiras, campos, lombos e vertiginosas montanha, dono das aguas e dos trapiches.
y1
Interdio
Que boi julgava ser Blimundo, que procurava com o seu exemplo, tornar irreverente ao Rei, todos os outros bois do
territrio real? Que bicho depois fazia os trabalhos do campo, faria andar o trapiche para o mel e para o grogue, daria
carne para o sustento grande e pomposa mesas real? Ainda por cima ele no queria vagabundos no reinado,
revoltosos e bichos que no acatassem s ordens!
1
Transgresso da
interdio
Um Rei um Rei!Um boi um boi!
- E, se mando cortar a cabea de um boi para o meu jantar, tm que me obedecer! Pensava alto e irritado o
senhor Rei.
- Guarda, rene os soldados e que me traga Blimundo, morto ou vivo! Ordenou o Rei.
y2
Ordem
31
Saiu a tropa armada de machados, machadins, coletes de ferro, capacete, arpes e afins, espumando, na sede de
cumprir a to real misso.
Subiram rochas, desceram ribeiras, rebuscaram campos, em busca de Blimundo. A um dado momento da penosa
busca e dum lombo estratgico este os detectou e aguardou.
2
Execuo da ordem
No momento decisivo, pensando os heris do reino dentro dos seus fatos de ferro e cravo apanhar o
possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da liberdade que era Blimundo, no tiveram mais tempo para
saber contar a histria depois.
Blimundo deu conta deles, num estilhaar de machados, coletes de ferro, capacetes, arpes e afins, com a
sabedoria das rochas que aprendera!
A
Malfeitoria
No descansou senhor Rei, quando soube da notcia.
B
A notcia da
malfeitoria
divulgada
2 Sequncia:
O reino est ameaado por Blimundo, que arrastando na sua irreverncia outros bois dignos servidores do reino podero levar-nos a misria e a fome! A conduta deste Blimundo e verdadeiramente perigosa para nossa
sobrevivncia nesses lombos e ribeiras! Quem depois poder reinar quando todos os bois tomarem a liberdade?
- Quem far andar os trapiches?
- Quem fornecer carne a minha mesa?
- Quem?
- Respondam!
- Quem?
Falta
1. Sequncia (cont.)
32
- Morte o Blimundo e viva o Rei! - Berrou senhor Rei.
- Viva senhor Rei, Secundaram os sbditos
y2
Ordem
Estes, fiis servidores do Rei, obedientes e tementes ao senhor, armaram-se de facas e faces, paus e forquilhas,
fisgas e enxadas e saram a cata de Blimundo, o possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da
liberdade, e amigo da harmonia em todas as coisas.
Os sbditos, ingnuos e obedientes, galgaram lombos, desceram encostas, palmilharam ribeiras, revolveram
furnas, ate que encontraram o procurado.
2
Execuo da ordem
Blimundo j os esperava. Sabia que a liberdade que ele tanto amava teria que passar por to altos preos e que
o senhor Rei no desistiria do intento de o transformar, morte ou vivo, num boi que tivesse que acatar s demandas e
aos abusos do Rei, sem se revoltar.
Deixou os sbditos aproximar e esperou pelo ataque. Foi um encontro rpido e decisivo. No ficou inteiro um
s homem valente do reino, nem faca nem faco, nem pau nem forquilha, nem fisga nem enxada, em postura de vir a
contar como foi.
Blimundo respirou fundo e angustiado, afastando-se da cena.
A
Malfeitoria
Quando chegaram as notcias ao palcio, Senhor Rei caiu em desespero.
B
Noticia da
malfeitoria
2 Sequncia (cont.)
33
3 Sequncia:
No tinha mais estratgia de combate ao Blimundo, e no podia suportar a ideia de to perigoso desafiador solta.
nisto que lhe chega a notcia de um rapazinho criado no borralho de cinza que lhe promete ir buscar Blimundo.
C
Inicio da aco
contraria o heri
decida agir.
- Quero v-lo j! Ordenou Senhor Rei.Trouxeram o rapaz, e o Rei espantado pergunta:
- Tu menino Trazer Blimundo? Esse maldito que me desfez um exrcito e os meus melhores homens do
reino? Como podes trazer-me Blimundo?
D
O heri passa por um
questionrio
- Senhor Rei: d-me um cavaquinho, um bli dgua e uma bola de prentm que eu lhe trago
Blimundo e, como recompensa, quero a metade da riqueza do reino e sua codezinha * para com ela casar!
F
Recepo do objecto
magico (objecto que
tem propriedades
magicas)
E assim fez Senhor Rei, comprometendo com a recompensa. w
1
Promessa de
casamento
Com o seu saco de pretm, bli dgua a tiracolo e seu cavaquinho ao peito, saiu o rapazinho do
palacio, rumo aos campos e ribeiras, lombos e furnas, picos e atalhos, cata de Blimundo, com todo o sentimento
e sem parar:
Partida do heri
** Oh Blimundo
Senhor Rei mend-me bem shcbe
pabo b b cas qVequinha de Praia
Tim-Tim ne nh cavequim
Cp-cp ne nh prentm
Gl-Gl ne nh bli dga
Oh Blimundo
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Senhor Rei mend-me bem shcbe
pabo b b cas qVequinha de Praia
Tim-Tim ne nh cavequim
Cp-cp ne nh prentm
Gl-Gl ne nh bli dga
A dada altura, Blimundo do seu esconderijo, ouve a cano que o encanta. Levanta as grandes orelhas e se pe a
escuta com mais ateno. Quando entende bem a mensagem, deixa o rapazinho aproximar:
Canta, canta outra vez! Toca o teu cavaquinho!
Oh Blimundo
Senhor Rei mend-me bem shcbe
pabo b b cas qVequinha de Praia
Tim-Tim ne nh cavequim
Cp-cp ne nh prentm
Gl-Gl ne nh bli dga
B7
Canto de lamento
- verdade que eu vou casar com a Vaquinha de Praia?
- No me ests a enganar?
- No! Respondeu o rapaz.
1
O agressor interroga
o heri
3 Sequncia: (cont.)
35
- Ento vou contigo!
O rapaz pede ao Blimundo que se abaixe todo e que o deixe ir montado porque o caminho longo e duro.
K7
Captura imediata
utilizando astcia
Blimundo obedece, mais exige:
- Mas... vais a cantar! to bonita esta canlo...
E assim foram:
Oh Blimundo
Senhor Rei mend-me bem shcbe
pabo b b cas qVequinha de Praia
Tim-Tim ne nh cavequim
Cp-cp ne nh prentm
Gl-Gl ne nh bli dga
B7
Canto de lamento
De vez enquanto Blimundo confirmava:
- Mas... eu vou casar com a Vaquinha de Praia?
Foram andando, andando, em direco ao palcio do Rei.
1
O agressor interroga
o heri
No pares de cantar! Canta mais perto do meu ouvido! Pedia Blimundo:
Oh BlimundoSenhor Rei mend-me bem shcbepabo b b cas qVequinha de Praia
Tim-Tim ne nh cavequim
Cp-cp ne nh prentmGl-Gl ne nh bli dga
B7
Canto de lamento
3 Sequncia: (cont.)
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Entretanto Senhor Rei, pelo sim, pelo no, e com medo do que viesse a acontecer, mandara a tropa colocar-se em
pontos estratgicos do lugar real e ordenara aos sbditos que ningum se mostrasse quando o rapaz aparecesse com
Blimundo.
y2
Ordem
J o sol tinha passado para a outra ribeira, quando entrada do lugar real surgiu Blimundo, pachorrento e
feliz, e sobre ele o rapazinho com o seu cavaquinho.
Regresso do heri
Senhor Rei que esperava no sobrado, no queria acreditar no que estava vendo. Impressionado pela
grandeza do Blimundo, perguntava para si mesmo, como conseguiu o rapaz trazer-lhe o to arrostado e temido
personagem que muitas noites de sono lhe roubara e muitos estragos ao reino causara.
N
Realizao da tarefa
difcil
Blimundo seguiu pela rua principal crivado de olhares de medo atravs das frestas as portas e janelas,
devidamente trancadas.
S um amor s uma velha paixo; s esta grande fora arrastaria Blimundo, feliz, calmo e confiante, pela
rua que o levaria a enfrentar o Rei que sempre o perseguira pelos seus ideais de amor e de liberdade.
S a correspondente paixo da Vaquinha de Praia e da enorme vontade de libertar das garras do Rei, o
levaria a enfrentar com suficiente tranquilidade, esse chamado dono das terras, guas, ribeiras, atalhos, furnas e
campos, rochas e lombos.
K4
Reparao da
malfeitoria
Chegados juntos a entrada do palcio, o rapazinho pediu ao Blimundo que o deixasse descer e que o esperasse, pois
tinha que pedir o barbeiro ao Rei para lhe fazer a barba, antes de o apresentar a Vaquinha da Praia.
O rapaz entra pelo palcio dentro e explica ao Rei o seu plano. Veio com ele um barbeiro e seus
apetrechos. Atrs, Senhor Rei, ansioso pelo o desfecho do plano concebido pelo o rapaz.
Blimundo, paciente, deixa-se envolver pela a toalha e ensaboar, enquanto o rei e o rapaz assiste com ar
triunfante a cerimonia.
Blimundo fecha os olhos imaginando a impacincia da Vaquinha de Praia esperando, enquanto o pincel de
barba envolve deliciosamente, com espuma branca e fresca, a sua barba selvagem.
Blimundo deixa-se embalar quase que num sonho e, num pice, num terrvel e certeiro golpe de navalha de
U
Punio do agressor
3 Sequncia: (cont.)
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1 Sequncia: y1 1 y2 2 A B
2 Sequncia: y2 2 A B
3 Sequncia: C D F w1 B7 1K7 B71 B7 y2 N K4U neg pos
Forma final do conto: y1 1 y2 2 A B y2 2 A B C D F w1 B7 1K7 B71 B7 y2 N K4U neg po
barba do barbeiro-carrasco, fica o plano consumado. traioeiramente assassinado Blimundo. Seu corpo cai por
um lado e, nu estrebuchar de revolta e violncia, uma bela patada traseira de toneladas de fora, atinge o Senhor
Rei que acaba a o seu reinado.
O rapazinho e o barbeiro fogem espavoridos, mas jamais iam esquecer o ltimo olhar de revolta de
Blimundo, o ultimo olhar que os havia de perseguir eternamente
Blimundo cantou no seu derradeiro flego. Cantou na agonia do momento a sua ltima cano uma cano profunda condenadora, bela e terrivelmente melanclica que j mais deixaria de condenar os seus
assassinos.
neg
Resultado negativa
da funo
E, no grande banquete a seguir a tragdia, cada bocado de carne no prato dos convivas, levava o sabor de
revolta e da bela e condenadora cano que imortaliza Blimundo, esse sabedor do mundo e das coisas, amante da
vida e da liberdade, amigo da beleza e da harmonia e que nada fazia que contrariasse a justia e as leis da prpria
natureza.
pos
Resultado positiva
da funo
3 Sequncia: (cont.)
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V. CONSIDERAES FINAIS
Para finalizar o nosso trabalho, podemos afirmar que o conto foi em sua primitiva
forma, uma narrativa oral, circulando ao longo das geraes, pela voz de um conjunto
indefinido de sujeitos individuais, funcionando como um dos principais veculos de
transmisso do conhecimento, mantendo a ligao entre as geraes de uma mesma
comunidade. Posteriormente, os contos orais passam a ser recolhidos e fixados pela escrita
em acto de (re)criao, adquirindo assim uma formulao artstica, literria, afastando-se
do domnio colectivo da linguagem para o universo do estilo individual de um certo
escritor, que um indivduo emprico, historicamente situado.
Roman Jakobson foi um dos tericos da literatura que se debruou sobre a relao
que o intrprete estabelece com a tradio. Conclui que, tal como a lngua, tambm os
contos constituem um tesouro colectivo armazenado na mente dos membros de uma
comunidade. So esquemas relativamente abstractos que sofrem concretizaes
diversificadas ao serem actualizados pelos intrpretes.
A narrativa transmitida oralmente est sujeita a modificaes, muitas vezes
voluntrias do intrprete. impossvel evitar que toda a vez que o contador conte, pela
repetio habitual dos mesmos episdios, no os v dispondo e modificando a seu bel-
prazer, apagando-lhes cada vez mais o cunho pessoal e annimo, para lhes dar carcter
individual, realizando assim o que o prolquio portugus ensina: quem conta um conto
acrescenta-lhe um ponto ou retira-lhe um ponto. Pode introduzir-lhes inovaes
pontuais, ditadas pela sua imaginao criadora ou pelo prprio contexto situacional,
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pode reordenar parcialmente os elementos constitutivos do conto e adicionar novos
elementos figurativos, mas, no essencial, o intrprete tem de se submeter lgica
profunda dos esquemas prescritos pela tradio. Ou seja, pode no alterar
profundamente a fisionomia do conto, o que seria condenado pela comunidade.
de salientar que estes recursos criativos tambm podem ser utilizados na
passagem do conto oral ao conto escrito, qualquer mudana feita interfere no conjunto da
narrativa dando assim origem a diferentes verses do conto, tal como acontece com o
conto Blimundo que j foi recriado por alguns autores a partir da verso oral annima
existente.
Podemos observar que as personagens dos contos maravilhosos segundo Propp, ao
mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparncia, idade, sexo, gnero de
preocupao, estado civil e outros estados estticos e atributivos, realizam, ao longo da
aco, os mesmos actos. Isto determina a relao das constantes com as variveis. As
funes das personagens representam constantes, enquanto que a forma de realizar esta
funo varivel.
Podemos isolar as funes das personagens. Os contos fantsticos conhecem trinta
e uma funo. A ausncia de alguma delas no compromete a ordem das que
permanecem nem o seu reconhecimento enquanto tipo estrutural, como observamos nas
verses recriadas do conto em estudo as veres no apresentam todas as funes, mas a
ausncia de algumas delas no influencia a ordem de sucesso das outras. A ausncia de
algumas funes no impede que seja feita um estudo comum.
A literatura tradicional cabo-verdiana regista algumas composies versificadas
em torno da figura do boi. Publicadas nas Cantigas de Trabalho, recolhidas por
Oswaldo Osrio, constituem um corpus textual que nos remete para a presena de um
ciclo temtico em torno do boi, tendo como espaos referenciais as ilhas agrcolas onde
a prtica do fabrico da aguardente e do mel da cana do acar era uma actividade com
um peso econmico significativo referimo-nos sobretudo s ilhas agrcolas como
Santiago, Santo Anto, Fogo e So Nicolau.
Nestes textos, o boi um animal mitificado e constitui o tema central o que
demonstra a importncia deste animal no desenvolvimento das actividades agrcolas. A
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partir destas narrativas e de outras formas poticas sobre este tema, pode estudar-se a
representao do ciclo do boi e a persistncia dessas manifestaes no imaginrio
popular cabo-verdiano.
Enquanto heri da histria, Blimundo descrito como uma figura contraditria.
Se, de um lado, constitui um personagem filho das rochas, possante, calmo e sabedor
do mundo, amante da vida e da liberdade, boi respeitado por todos os seus iguais ()
amigo da harmonia () nada fazia que contrariasse a justia e a ordem natural da
evoluo da vida, por outro era visto, sobretudo aos olhos daqueles que representavam
a lei, a ordem e a justia, como irreverente em relao s leis estabelecidas ()
vagabundo, revoltoso.
Recorrendo ao processo de antropomorfizao e partindo de uma concepo
antropocntrica da narrativa, o narrador coloca um boi no centro da histria, a
representar a figura central, qualidade que o destaca dos demais personagens humanos
que povoam esse universo. Na verdade trata-se de o nico animal com forte presena na
histria e em forte contraposio aos humanos.
Do ponto de vista simblico, as imagens dos animais so muito frequentes e
comuns nas narrativas populares. O boi, neste caso, representa o esprito macho
combativo, fora fertilizante que ambiguamente pode referir-se tanto sexualidade
como perfeio espiritual. Em outros contos populares, o boi, por vezes, evoca a
sensualidade e a impetuosidade masculinas, o poder fertilizante que, ao mesmo tempo,
atrai e mete medo; a energia animal que precisa ser alquimicamente transmutada em
sentimento, para possibilitar o encontro de amor e o restabelecimento da condio
humana plena do ser metamorfoseado.
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VI. BIBLIOGRAFIA
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