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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE ASTRONOMIA, GEOFÍSICA E CIÊNCIAS
ATMOSFÉRICAS DEPARTAMENTO DE GEOFÍSICA
BRENO RAPHALDINI FERREIRA DA SILVA
O Dínamo Terrestre e a Topografia da Interface Manto Núcleo
SÃO PAULO 2009
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BRENO RAPHALDINI FERREIRA DA SILVA
O Dínamo Terrestre e a Topografia da Interface Manto Núcleo
Dissertação apresentada ao Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas
da Universidade de São Paulo para obtenção do Grau de Mestre em Ciências Geofísicas.
Área de Concentração: Geofísica
Orientador: Prof. Dr. Igor Ivory Gil Pacca
SÃO PAULO 2009
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Professor Igor pela orientação e pelas
discussões proveitosas durante estes dois anos.
Aos meus familiares pelo apoio.
Aos membros do laboratório de paleomagnetismo com
quem convivi por vários anos, em particular aos colegas
Everton Frigo, Jairo Savian, Daniele Brandt, Gelvam Hartmann
e Elder Yokoyama e aos professores Ricardo Trindade e
Marcia Ernesto.
Gostaria ainda de agradecer às pessoas de diversas áreas
com que tive discussões que de forma direta ou indireta
beneficiaram este trabalho. Dentre eles cito os amigos Enver
Ramires (Dep. Ciências Atmosféricas) e Carlos Raupp (IFT-
Unesp) com quem aprendi muito durante nossos seminários
semanais. A professora Elisabete Dal Pino(Dep. Astronomia),
com quem aprendi muito no curso de plasma, e seus alunos
Gustavo Guerrero e Reinaldo Lima com quem por diversas
vezes discuti sobre teoria de dínamo e magnetohidrodinâmica
em geral. Ao professor Clodoaldo Grotta Ragazzo (IME-USP),
com quem aprendi sobre diversos assuntos em vários cursos
e também pois a idéia de estudar a topografia veio
acidentalmente de um artigo dele. Ao grande amigo Daniel
Takahashi (IME-USP) por nossas discussões e conversas
sobre matemática e outros assuntos.
4
Resumo
O campo geomagnético é extremamente complexo, tanto
em sua morfologia como em suas variações temporais, o
entendimento físico destes fenômenos não é ainda
satisfatório. Contudo sabemos que o campo é gerado no metal
liquido do núcleo externo da Terra em um processo de
dínamo.
Entre as características mais intrigantes do campo
geomagnético estão aquelas associadas à suas reversões de
polaridade, como as grandes variações em sua freqüência e o
fato de tenderem a ocorrer com maior probabilidade ao longo
de certas longitudes, os chamados caminhos preferenciais
para reversão. Acreditamos que a estrutura e as variações da
interface manto núcleo sejam responsáveis por tais
fenômenos.
A evidência para tal correlação é baseada na
surpreendente coincidência geográfica entre os caminhos
preferenciais para reversão e anomalias topográficas na
interface manto núcleo. Também surpreendente é a relação
entre as taxas de espalhamento das placas litosféricas do
Pacifico, que devem estar associadas à amplitude das
anomalias térmicas/topográficas na interface manto núcleo, e
as taxas de reversões geomagnéticas.
Propomos um mecanismo para explicar estes fenômenos
baseado nos efeitos que a topografia teria sobre o
escoamento. Em um dínamo do tipo variações na amplitude
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Abstract
The geomagnetic field is extremely complex, both in its
morphology and its temporal variations, the physical
understanding of these phenomena is not yet satisfactory.
However, we know that the field is generated in the liquid
metal of the Earth’s outer core in a dynamo process.
Among the most intriguing features of Earth’s field are
those related to its polarity reversals, namely the huge
variations in their frequency and the apparent tendency for
them to happen with more probably along certain longitudes,
the so called preferential paths for reversal. We believe that
the structure and variations in the core mantle boundary
(CMB) are responsible for these phenomena.
The evidence for such correlation lies in the surprising
geographical coincidence between preferential paths for
reversal and topographic anomalies at the core mantle
boundary region. Also surprising is the relation between
spreading rates for the Pacific litospheric plates, which may
be associated with the amplitude of thermal/topographic
anomalies at the CMB, and rates of geomagnetic reversals.
We propose a mechanism to explain these phenomena
based in the effects topography would cause on the flow, in a
dynamo of the kind. Variations in the amplitude of
topography would imply a reversal rate variation.
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Índice
Capitulo 1: Aspectos gerais do campo geomagnético e a
interface manto núcleo
1.1 Introdução e morfologia do campo...................................7
1.2Variações temporais do campo........................................20
1.3Estrutura interna da Terra..............................................30
1.4Interações manto-Núcleo................................................36
Capitulo 2: Magnetohidrodinâmica e a teoria de dínamo.
2.1 Equações Básicas..........................................................43
2.2 Ondas Magnetohidrodinâmicas.......................................56
2.3 Teoria de dínamo e eletrodinâmica do campo médio......66
2.4 Dínamos quase simétricos.............................................75
Parte 3: Variações no efeito e a interface manto núcleo.
3.1 Efeitos de campo médio e a interface Manto-núcleo. ......77
3.2 Dínamo com coeficientes estocásticos...........................85
4. Discussão e Conclusões...................................................90
Bibliografia...........................................................................92
Apêndices:
A.1 Teorema da decomposição de Mie..................................97
A.2 Teorema do Fluxo congelado.......................................100
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Capitulo 1: O Campo Geomagnético
O interesse da humanidade pelo campo geomagnético tem
longa data, alguns dos primeiros trabalhos do que se
considera ciência moderna versam sobre este assunto, entre
eles o trabalho William Gilbert, De Magnete, de 1600. Em seu
trabalho Gilbert propôs que a Terra era um imã gigante.
Contudo Edmund Halley descobriu que o campo
geomagnético variava com o tempo, portanto a possibilidade
de o campo geomagnético ser resultado de um imã estático foi
descartada.
Uma explicação satisfatória para a origem do campo
geomagnético só foi obtida no inicio do século XX. Joseph
Larmor, em 1919, propôs que o campo magnético das estrelas
é gerado por um processo de dínamo, foi natural adaptar essa
hipótese para o problema do campo geomagnético já que se
sabia que o núcleo da Terra é composto por um fluido
condutor.
Neste capitulo iremos explorar aspectos gerais do campo
geomagnético: sua morfologia, as variações; em seguida
serão abordados tópicos de interesse mais especifico para
este trabalho: estruturas recorrentes do campo e a interação
entre o campo geomagnético e a interface manto núcleo.
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Medidas do Campo
Há diversas fontes de informação sobre o campo
geomagnético, fontes com precisão bastante variável e que
dão informações do campo em diferentes épocas.
Tanto rochas sedimentares quanto ígneas têm capacidade
de registrar o campo magnético na época de sua formação.
Em rochas ígneas o campo é registrado, pois durante sua
formação as altas temperaturas fazem com que a agitação
térmica impeça que haja uma magnetização fixa
(magnetização remanente), em seguida o material resfria,
quando a temperatura se torna menor que a temperatura de
Curie do material ele se torna ferromagnético, e sua
magnetização permanece alinhada ao campo magnético
existente durante seu resfriamento.
Em rochas sedimentares as partículas que a formam
tendem a estar alinhadas estatisticamente com o campo
durante sua deposição, fazendo com que o campo
macroscópico da rocha esteja alinhado com o campo
magnético presente na sua formação.
Em ambos os casos pode-se, medir o vetor magnetização
da rocha e datá-la,e assim obter informação sobre o campo
geomagnético antigos, que podem chegar a bilhões de anos .
O campo de estudo do campo geomagnético registrado em
rochas é chamado paleomagnetismo.
Em estudos deste tipo obtêm-se apenas estruturas de
grande escala, em geral apenas o dipolo do campo
10
geomagnético, mas em estudos para campos mais recentes,
de poucos milhões de anos, é também possível obter
componentes quadrupolares e octupolares devido à maior
quantidade de dados.
Partindo-se do mesmo principio há estudos de campos
magnéticos registrados em artefatos arqueológicos,
artefados de argila e antigas fogueiras, dos quais pode-se
obter medidas de campos mais recentes, de centenas à
alguns milhares de anos.
Medidas diretas do campo geomagnético só passaram ser
feitas nos últimos séculos, com o advento da navegação
tornou-se necessário conhecer com certo detalhe o campo
geomagnético para fins de localização. Compilações de
registros de navegações dão informação mais detalhada do
campo em comparação com medidas em rochas ou artefatos
arqueológicos.
A partir do século XIX passou-se a fazer medições do
campo geomagnético em observatórios e em expedições e a
quantidade de dados cresceu enormemente, permitindo um
conhecimento cada vez mais detalhado do campo
geomagnético, contudo ainda havia problemas devido a má
distribuição espacial dos observatórios.
Nas ultimas décadas uma fonte precisa de dados tem sido
os satélites, já que estes fornecem uma quantidade muito
maior de dados comparado à outras fontes e fornece medidas
de regiões onde havia falta de dados.
11
1.1 Harmonicos esfericos e a morfologia do
campo
O campo geomagnético apresenta uma morfologia
bastante complexa, a fim de sistematizar a analise espacial do
campo convém introduzirmos a representação por
harmônicos esféricos, que nada mais é do que uma
representação em forma de serie de funções definidas numa
esfera, análoga as séries de Fourier para representação de
funções em coordenadas cartesianas.
Representação por harmônicos esféricos
O campo geomagnético pode ser representado
adequadamente utilizando-se funções especiais chamadas
harmônicos esféricos, propostas por Carl Friedrich Gauss
justamente com este intuito. Matematicamente harmônicos
esféricos podem ser vistos de duas maneiras: como
autofunções da parte angular do operador laplaciano em
coordenadas esféricas e como representação do grupo de
rotação na esfera. Adotaremos aqui o primeiro ponto de vista.
Se assumirmos que estamos em uma região livre de fontes
de campos magnéticos (correntes). As equações de Maxwell
que descrevem esta situação são:
(1.1)
(1.2)
A equação (2) implica que existe uma função escalar tal
que:
12
(1.3)
Inserindo (3) em (2) temos que:
(1.4)
Que é conhecida como equação de Laplace.
A equação de Laplace 2 0V em coordenadas esféricas
escreve-se da seguinte forma:
2 2
2 2 2 2 2
1 ( ) 1 1 1 1sin 0
sin sin
rV V V
r r r r
(1.5)
Neste ponto iremos supor que as soluções são da forma:
( , , ) ( ) ( ) ( )V r R r (1.6)
substituindo (2) em (1) obtemos três equações:
2
2 2
( 1)0
d R l lR
dr r
(1.7)
2
2
1sin ( 1) 0
sin sin
d d ml l
d d
(1.8)
13
22
2
1 dm
d
(1.9)
cujas respectivas soluções são da forma:
( ) l lR r Ar Br (1.10)
( ) (cos )m
lP (1.11)
( ) sin( )m ou cos( )m (1.12)
onde l e m são números inteiros com m l, chamados
respectivamente grau e ordem. (cos )m
lP são os polinômios
associados de Legendre, que são soluções da equação
diferencial associada de Legendre (4).
Para m=0 tem-se a equação de Legendre, cujas soluções
são chamados polinômios de Legendre, estes estão
relacionados com os polinômios associados de Legendre
através da seguinte formula:
2( )
( ) (1 ²)m m
m l
l m
d P zP z z
dz (1.14)
14
Os polinômios de Legendre satisfazem a seguinte relação
de ortogonalidade:
1
1
2( ) ( )
2 1l n nlP z P z dz
n
(1.15)
onde lm é o chamado delta de Kronecker, que vale 1 caso
n=m e vale 0 caso contrario.
No caso dos polinômios associados de Legendre a
relação de ortogonalidade é:
0
2 ( )!(cos ) (cos )sin
2 1 ( )
m m
l k lk
l mP P d
l l m
(1.16)
Ainda existem mais algumas propriedades importantes:
( )
(cos ) sinm
m m l
l m
d P zP
dz (1.17)
que decorre de (7.9), e :
( )
( ) ( 1) ( )
( ) ( 1) ( )
m l m
l l
m l m m
l l
P P
P P
(1.18)
Voltando a solução da equação de Laplace, convém juntar
a parte angular
15
( , ) ( ) ( )Y (1.19)
Podemos então definir um conjunto de funções que é base
para as soluções desta equação:
2 1 ( )!( , ) ( 1) (cos )
4 ( )!
m m m im
l l
l l mY P e
l m
(1.20)
Estes são os chamados harmônicos esféricos de grau l e
ordem m, os harmônicos esféricos obedecem a seguinte
relação de ortogonalidade:
' * '
' '( , ) ( , )m m m m
l l l l
S
Y Y d (1.21)
Onde S denota a superfície da esfera, d sen d d , e *
denota o complexo conjugado.
Os harmônicos esféricos formam uma base completa para
as funções de quadrado integrável definidas na esfera, ou seja
qualquer função de quadrado integrável definida na esfera
pode ser escrita como uma combinação linear infinita de
harmônicos esféricos, este resultado é muito importante pois
16
dele decorre a utilidade para representar o campo magnético
terrestre.
Dada uma função qualquer de quadrado integrável
definida na superfície de uma esfera, tal função pode ser
escrita como:
0
( , ) ( , )l
m m
l l
l m l
f c Y
(1.22)
onde
( , ) ( , )m m
l l
S
c f Y d (1.23)
Em muitos casos convém separar os harmônicos
esféricos em sua parte par e impar, como acontece na maioria
dos textos em geofísica:
, ( , ) (cos )cosm m
l lY P m (1.24)
, ( , ) (cos )sinm m
l lY P m (1.25)
e
0
0
, , ,
0 1
( , ) ( , ) ( , ) ( , )2
m m m ml
l l l l l
l m
Af Y A Y B Y
(1.26)
17
em função dos chamados coeficientes de Gauss, a solução
da equação de Laplace fica:
0 0
( , , ) cos (cos )
l
m m m
l l l
l m
rV r h m g senm P
R
(1.27)
Componentes nas quais são chamados harmonicos
zonais, e apresentam oscilações apenas na coordenada
latitudinal, como pode ser visto abaixo para .
Figura1.1: Harmônico zonal
Componentes nas quais são chamados harmônicos
setoriais e apresentam oscilações apenas com a longitude,
como no exemplo abaixo com .
18
Figura1.1.2: Harmônico setorial
Por fim no caso em que correspondem às
componentes chamadas tesserais que apresentam oscilações
com a latitude e longitude.
Figura 1.1.3: Harmônico tesseral
A seguir apresentamos uma tabela contendo alguns
coeficientes obtidos a partir de medidas do campo Terrestre
para o ano de 1995:
19
Figura 1.1.4: valores dos coeficientes do campo
geomagnético para 1995,
Notamos nesta tabela que o dipolo axial é bem maior,
em modulo que os demais coeficientes, ou seja o campo
geomagnético é dominantemente dipolar, a orientação do
dipolo apresenta apenas um pequeno desvio com relação ao
eixo de rotação da Terra ( aproximadamente 11,5°). Acredita-
se que o dipolo axial seja dominante a maior parte do tempo.
Curiosamente na maioria dos planetas e satélites dos quais
se tem informações a componente dipolar axial é dominante, a
não ser em Urano e Netuno onde as componentes equatoriais
são muito intensas (Jones,2007).
Para avaliar energia contida em cada comprimento de
onda (dipolo, quadrupolo, etc...) é necessário estudar o
espectro do campo. Devido às relações de ortogonalidade a
energia do campo pode ser escrita como
(1.28)
20
Desta forma obtem-se uma representação espectral do
campo. O termo dipolar , é responsável por cerca de 85%
da energia do campo.
Medidas atuais obtidas a partir de satélites são capazes de
obter termos de grau bastante alto, contudo a partir do grau
13 a contribuição do campo devido à magnetização da crosta
fica muito importante, por este motivo estudos do campo de
origem interna se limitam à pouco mais que uma dezena de
graus na expansão.
Figura1.1.5: espectro do campo geomagnético (Merril et
Al.,1996)
21
1.2 Variações do campo
Sabemos desde o século XVII que o campo geomagnético
varia temporalmente, hoje sabemos que estas variações
ocorrem nas mais diversas escalas temporais, de meses a
dezenas de milhões de anos. Nesta seção discutiremos os
diversos tipos de variações do campo.
Jerks Geomagnéticos
Jerks geomagnéticos, ou impulsos geomagéticos, são
caracterizados como uma variação abrupta na variação
secular do campo geomagnético, sendo notada facilmente na
segunda derivada da componente Y do campo.
Até a década de 70 era consenso que variações com
período mais curto que 5 anos eram devidas ao campo
externo, acreditava-se que variações mais curtas deveriam
ser filtradas pelo manto. O primeiro jerk observado foi o de
1969 (Courtillot et. al.,1978), e trabalhos subseqüentes
mostram a ocorrência de outros Jerks como em 1901, 1913,
1925, 1932, 1949, 1958, 1978, 1986, 1991 e 1999.
22
Figura1.1.6: Variação na componente Y mostra a ocorrência
de alguns jerks, (Michelis et. al.,2005).
Uma característica notável dos jerks é que boa parte
deles não é observado globalmente, ou seja, podem ser
notados em observatórios em apenas algumas regiões do
globo.
Outro fato interessante é que cerca de seis anos antes da
ocorrência de um Jerk é observada uma variação da duração
do dia na superfície da Terra, que tem conseqüências para o
clima, como pode ser visto na figura abaixo.
23
Figura.1.1.7: gráfico relacionando variação da declinação
magnética (D), duração do dia (θ), e variação da temperatura
média na superfície terrestre (ΔT), (Michelis et. al.,2005).
A origem dos Jerks não é bem explicada. Uma sugestão é
eles estejam relacionados a oscilações torcionais (ver
capitulo 2) , tipos de ondas magnetohidrodinâmicas que
podem ocorrer no núcleo externo da Terra (Bloxham et
al,2002). Uma das críticas à esta teoria é que oscilações
torcionais são fenômenos que ocorrem globalmente, e
portanto deveriam ser observados globalmente. Um ponto a
favor desta hipótese é que sabe-se que as oscilações
torcionais estão relacionadas com a variação da rotação da
parte solida da Terra.
24
Variação Secular
Variação secular é o nome dado às variações do campo na
escala de décadas à poucos milhares de anos, ela ocorre em
estruturas de diversas escalas espaciais.
Entre as características mais notáveis da variação secular
está a chamada deriva para oeste, que é caracterizada pela
movimentação para oeste de feições do campo geomagnético.
A deriva para oeste é observada tanto em medidas recentes
do campo em observatórios, satélites e navegações, quanto
em medidas paleomagnéticas, ocorrendo tanto na
componente dipolar como na componente não dipolar.
Um exemplo claro de deriva para oeste da componente não
dipolar do campo é trajetória da anomalia magnética do
Atlântico Sul, região de baixa intensidade do campo, que
cruzou o oceano Atlântico nos últimos séculos [Hartmann,
2005].
25
Figura1.1.8: ilustração da deriva para oeste (Hartmann,
2005)
Mapas de intensidade do campo entre 1600 e 2000 onde
pode-se obvar a deriva para oeste da Anomalia do Atlantico
Sul [Hartmann, 2005].
Diversos estudos paleomagnéticos se destinaram a
estimar uma taxa média para a deriva para oeste, apesar de
haver flutuações entre os trabalhos todos indicam taxas da
ordem de poucos décimos de grau por ano, por exemplo
(Bullard et. AL, 1950), (Yukutake & Tachinaka, 1969).
26
Nesta escala são observadas variações da componente
dipolar do campo, tanto em direção como intensidade
Movimentação do polo norte magnético nos últimos 2000
anos [Ohno and Hamano ,1992].
Acredita-se que a variação secular, e em particular a
deriva para oeste sejam resultado de uma combinação dos
efeitos de ondas magnetohidrodinâmicas com o efeito de
advecção do campo magnético pelo fluido condutor (ver
capitulo 2) . (Hide, 1966) foi o primeiro a relacionar a variação
secular a ondas magnetohidrodinâmicas, notando que certos
tipos de onda se propagariam para oeste com períodos
bastante semelhantes aos observados, sendo então direta a
associação entre tais tipos de onda e a deriva para oeste.
27
Reversões
Sabe-se, desde o inicio do século XX, devido a medidas
paleomagnéticas que o dipolo do campo geomagnético
reverte de tempos em tempos.
Uma das evidencias mais claras da existência de reversões
do campo geomagnético no passado é o padrão da
magnetização medida no assoalho oceânico. O assoalho
oceânico está constantemente sendo criado em regiões
chamadas dorsais oceânicas, onde material novo é
constantemente depositado formando assoalho jovem e
empurrando o assoalho mais antigo para as laterais, desta
forma o assoalho oceânico é progressivamente mais velho a
medida que nos distanciamos das dorsais. Medições da
magnetização remanente nas rochas do assoalho oceânico
revelam um padrão zebrado, a magnetização é alternada em
regiões cuja polaridade é igual a atual e em regiões onde a
polaridade é oposta. Um esquema do padrão zebrado da
magnetização do assoalho oceânico pode ser vista abaixo:
28
Figura1.1.9: padrão zebrado de magnetização na dorsal
oceânica.
O dipolo do campo geomagnético permanece a maior parte
do tempo aproximadamente alinhado ao eixo de rotação da
Terra, isto é devido a predominância do dipolo axial
comparado aos outros termos, uma reversão é definida como
uma troca no sinal do parâmetro da expansão do campo em
harmônicos esféricos, que é justamente o termo associado ao
dipolo axial.
Em geral o pólo magnético observado de uma posição (a
direção para onde aponta a bussola) não coincide com o pólo
real. É dado o nome de pólo geomagnético virtual (PGV) ao
pólo magnético observado de uma determinada posição, que
não é necessariamente coincidente com o pólo geomagnético
real, devido à contribuição das componentes
29
O processo de reversões é bastante irregular,
aparentemente não há periodicidades no processo de
reversões, há registro de ocasiões nas quais o campo
permaneceu poucos milhares de anos em uma polaridade,
enquanto em outras ocasiões ele permaneceu em uma
polaridade dezenas de milhões de anos, como é o caso dos
superchrons.
A variabilidade da freqüência de reversões é facilmente
notada ao observarmos escalas de polaridade, como a de
(Cande & Kent, 1995) apresentada na figura abaixo:
Figura 1.1.10: Escala de Polaridade
30
Notamos que entre 118 e 83 milhões de anos atrás não
houve reversões, este é o chamado superchon do Cretáceo,
desde então tem havido um aumento na freqüência de
reversões.
Reversões são eventos relativamente rápidos, durando
poucos milhares de anos, enquanto a permanência do dipolo
em determinada polaridade é da ordem de centenas de
milhares a milhões de anos, por este motivo é difícil obter
informações sobre os campos transicionais e ainda há
controvérsia sobre a estrutura do campo durante as
reversões, e também sobre a duração precisa de um evento
de reversão.
Nas ultimas décadas descobriu-se que as reversões não
acontecem de forma homogênea (Laj et AL,1991) , foram
encontradas duas faixas longitudinais aonde há uma maior
concentração de PGVs, estas bandas situam-se na região das
Américas no leste Asiático.
Figura 1.1.11: “caminhos” para reversão do campo (Merril
& McFadden, 1995).
31
Existe ainda o processo de excursão do campo que pode
ser visto como um evento extremo de variação secular ou
como uma “reversão abortada”, ou seja, o dipolo do campo
distancia-se significativamente (mais que 45°) do eixo de
rotação sem, contudo completar uma reversão, voltando à
polaridade inicial.
1.4 Estrutura interna da Terra.
A Terra é um objeto esferoidal levemente achatado, seu
raio no equador é de aproximadamente 6378 Km, enquanto
que nos pólos seu raio é de cerca de 6357 Km.
Há importantes variações em propriedades físicas e
químicas em diferentes regiões do planeta, variações estas
que são muito mais importantes na direção radial do que nas
direções horizontais, isto justifica a divisão da Terra em
regiões em forma de cascas concêntricas.
As classificações são de dois tipos, baseadas nas
propriedades físicas e químicas.
Na classificação por composição a Terra é dividida em
crosta, manto, núcleo externo, núcleo interno.
Quanto às propriedades físicas (associadas a passagem de
ondas sísmicas) as camadas da Terra são litosfera,
astenosfera, manto inferior, núcleo externo, núcleo interno.
32
Figura1.1.12: Estrutura interna da Terra.
A camada superficial da Terra é chamada crosta com
espessura variando entre 7 e 70 km, é uma camada rochosa
composta por silicatos e heterogênea, sendo mais fina na
região dos oceanos e mais espessa na região continental.
Abaixo vem o manto que é solido e é composto
principalmente por peridotito. Apesar de solido o manto,
grande parte dele se comporta como fluido para tempos
muitos grandes, da ordem de dezenas de milhões de anos ou
mais.
Abaixo do manto encontra-se o núcleo externo que é
composto por uma liga metálica constituída principalmente
por ferro no estado líquido, cerca de 90%, e 10 % de um
elemento leve que não se sabe ao certo qual é, podendo ser
enxofre, oxigênio, silício entre outros.
33
A camada mais profunda da Terra é o núcleo interno, uma
esfera metálica com raio de aproximadamente 1220 km,
acredita-se que o núcleo interno seja formado devido ao
resfriamento e solidificação do núcleo externo, neste
processo o ferro, ao se solidificar, seria separado do elemento
leve ficando mais pesado que a liga no estado liquido, e
devido a atração gravitacional esta porção solidificada
migraria em direção ao centro, formando assim o núcleo
interno. Acredita-se portanto que o núcleo interno está
crescendo e que nem sempre existiu.
A litosfera é a camada mais superficial, segundo às
propriedades elásticas. É uma camada rígida e fria que
engloba a crosta uma e parte superior do manto.
A litosfera está associada a uma das maiores conquistas
da geofísica moderna, a Tectônica de Placas. Em meados dos
anos 60 descobriu-se que a litosfera é fragmentada em
placas. Estas placas se movem com o tempo, numa escala
longa, movimentos que são impulsionados pela convecção do
material que vem abaixo.
A medida que a profundidade aumenta também aumenta a
temperatura, fazendo com que ocorra um derretimento
parcial do material, de forma que abaixo de 150 km o manto
seja menos rígido que o manto litosférico.
Esta região do manto é chamada astenosfera. Apesar de
ser predominantemente sólida (resiste à tensões tangenciais)
ela se comporta como um fluido para tempos muito grandes,
apresentando convecção.
34
Devido ao aumento da pressão com a profundidade (que
acaba vencendo o aumento da temperatura) o material da
astenosfera se torna progressivamente mais rígido, até que a
cerca de 350 km de profundidade há uma descontinuidade
nas propriedades elásticas (uma transição de fase). A região
do manto compreendida entre 350 e 2890 km de profundidade
é chamada manto inferior ou mesosfera.
Tectônica de Placas
A idéia de que a camada superficial da Terra é
fragmentada e se movimenta foi proposta pela primeira vez no
início do século XX por Alfred Wegener. Ele foi motivado pela
semelhança no formato da costa de continentes diferentes,
como se estas regiões pudessem ser encaixadas. Contudo
esta idéia só passou a ser aceita nos anos 60 devido a uma
serie de observações indicando que ela estava correta, entre
elas o padrão de magnetização da crosta oceânica discutida
anteriormente.
A litosfera é fragmentada em 7 placas principais. Os limites
separando duas placas podem ser de três tipos divergente,
convergente e transformante.
35
Figura1.1.13: Placas listosféricas
O tipo convergente ocorre quando uma placa é empurrada
contra a outra. No caso em que uma placa é de litosfera
oceânica e outra de litosfera continental ocorre o processo de
subducção, ou seja, a placa oceânica é empurrada para baixo
da placa continental, entrando nas regiões mais profundas do
manto.
Bordas divergentes ocorrem quando uma placa se afasta
com relação a outra, isto ocorre nas dorsais oceânicas onde a
litosfera é criada constantemente.
Por ultimo as bordas transformantes, associadas a
movimentos laterais entre duas placas.
36
Figura1.1.14: subducção de uma placa oceânica em
contato com uma placa continental.
A Interface Manto-Núcleo
Na base do manto, separando o manto e o núcleo existe
uma camada limite térmica com cerca de 200 Km de
espessura chamada camada D”, acredita-se que haja
grandes heterogeneidades laterais nesta camada.
O contraste de densidade entre o material na base do
manto e a liga metálica do núcleo é de cerca de 4,3 g/cm³.
Este contraste de densidade favorece a estratificação do
material tanto na base do manto como no topo do núcleo,
contudo é desfavorável à existência de uma topografia estável
e de grande escala ( Young & Lay, 1987). Para suportar este
tipo de estrutura é necessário um processo dinâmico.
Observações da topografia da interface manto-núcleo por
tomografia sísmica (Morelli & Dziewonsky, 1987), (Boschi &
Dziewonsky, 2003), (Rodgers & Wahr,1993) indicam a
37
existência de estruturas topograficas com mais de 5 km de
altura.
Alguns modelos da dinâmica da camada D” (Hoffman &
White, 1982) indicam que crosta oceânica “subductada” pode
chegar até esta região, podendo ser responsável por grandes
anomalias topográficas e térmicas. Estas anomalias e sua
relação com a subducção inferida por dados da superfície
terá papel fundamental neste trabalho.
1.5 Estruturas recorrentes e interações manto-núcleo.
Analisando o comportamento do campo geomagnético em
diversas escalas notamos a existência de estruturas
recorrentes, estruturas persistem por um longo período e
violam a simetria meridional. Como as equações que
governam o dínamo são simétricas com relação à latitude
dever-se-ia esperar que o campo geomagnético tivesse esse
tipo de simetria, contudo diversas estruturas que violam essa
premissa são observadas, entre elas estão os caminhos
preferenciais para reversão do campo, lóbulos do campo
geomagnético e a janela do Pacífico. A seguir descreveremos
sucintamente estas estruturas.
Caminhos preferenciais para reversão do campo, como
discutido anteriormente, são faixas longitudinais nas quais
existe maior probabilidade de passagem das direções durante
reversões, sendo uma situada na região da America e outra na
região da Austrália e leste asiático.
38
Lobulos do Campo geomagnético são anomalias do campo
geomagnético facilmente observadas em mapas do campo
geomagnético na interface manto núcleo que encontram-se
aos pares, cada par está situado em longitudes bem próximo
às regiões das faixas de preferenciais de longitude para
reversões. Ao contrário da maior parte do campo os lóbulos
do campo geomagnético praticamente não variam de posição
com o tempo.
Figura1.15 : Campo geomagnético radial (nT) na interface
manto núcleo, circuladas em verde os lóbulos do campo
geomagnético.
Por fim a janela do pacifico é uma região cobrindo boa
parte do oceano Pacífico onde a variação secular é baixa
quando comparada com a variação secular observada em
outras regiões.
Apesar de não sabermos exatamente qual a origem destes
fenômenos é bastante razoável supor que eles estejam
relacionados a estruturas existentes na base do manto, já que
as propriedades desta região variam numa escala de tempo
bastante longa, da ordem de dezenas de milhões de anos.
Iremos a seguir discutir tal hipótese.
39
A interação entre o fluido no núcleo e a base do manto
pode ocorrer de diversas formas.
A primeira forma delas seria interação eletromagnética.
Regiões altamente condutoras de eletricidade na base do
manto poderiam ter importância dinâmica importante para o
fluido abaixo, já que correntes induzidas nestas regiões na
base do manto poderiam promover um acoplamento destas
com o fluido abaixo. O problema com está hipótese é que além
de ser discutível a existência de tais regiões altamente
condutoras temos muito pouca informação sobre a
condutividade no interior profundo da Terra, e menos ainda
sobre possíveis variações laterais desta propriedade.
A segunda forma seria relacionada a anomalias térmicas
presentes na base do manto. Isto poderia gerar ventos
térmicos no fluido além de promover movimentos
descendentes neste, já que uma anomalia fria teria o papel de
resfriar o fluido abaixo o tornando mais pesado e fazendo com
que ele afunde.
Por ultimo, a interação poderia ocorrer devido à topografia
presente na base do manto. “Montanhas” de material
mantélico para dentro do núcleo serviriam como obstáculo
para o fluido do núcleo, podendo perturbar de forma
importante seus movimentos. Este tipo de interação foi muito
pouco explorado na literatura.
Ao observarmos um mapa da topografia da interface manto
núcleo surge uma evidencia muito clara da importância que a
topografia da interface manto-núcleo pode ter para
explicarmos fenômenos como as longitudes preferenciais e os
lóbulos do campo geomagnético. Abaixo apresentamos um
mapa da topografia da interface manto-núcleo obtido por
tomografia sísmica (Boschi & Dziewonski,2000).
40
Figura 1.16: Topografia da Interface Manto Núcleo em Km
(Boschi & Dziewonski, 2000).
Notamos que as regiões que apresentam anomalias
topográficas mais significativas são justamente as regiões nas
quais se encontram os lóbulos do campo geomagnético e as
longitudes preferenciais para reversão do campo.
Estas regiões com significativa topografia na base do
manto coincidem com as bordas da placa tectônica do
pacifico, indicando que a subducção das placas deve ser
responsável pelas estruturas na base do manto (Romanowicz,
2003), possivelmente as placas descendentes estariam
forçando a interface manto núcleo para baixo gerando
“montanhas” para dentro do núcleo.
A partir desta ultima observação e sabendo que a o
movimento das placas varia com o tempo seria razoável supor
que anomalias topográficas mais importantes ocorreriam
quando a velocidade das placas descendentes fosse alta, e
41
que a topografia seria mais homogênea em épocas em que a
velocidade destas placas fosse baixa. Isto poderia ter uma
influencia a longo prazo no comportamento do campo
geomagnético.
Abaixo apresentamos um gráfico construído a partir dos
dados de espalhamento da placa do Pacífico tirados de
(Cogne & Humler, 2004) para os últimos 160 milhões de anos.
Figura1.17: taxa de espalhamento do litosfera oceânica do
Pacícifo (Cogne & Humler, 2004)
Este gráfico apresenta uma correlação surpreendente com
o gráfico da taxa de reversões do campo geomagnético como
pode ser visto abaixo
Figura1.18: Taxa de reversões (por milhão de anos).
42
Nota-se que em toda época em que há um impulso na taxa
de reversões há também um impulso na taxa de espalhamento
da placa do Pacifico, por volta de 160, 135, 25 e 10 milhões de
anos atrás. Por outro lado durante o superchron quando a
taxa de reversões do campo era nula a movimentação da
placa permaneceu baixa.
Um fato interessante é que por volta de 125 milhões de
anos atrás houve um impulso na velocidade de criação da
litosfera do Pacífico, contudo sem haver um impulso na taxa
de reversões nesta época. Foi por volta desta época que deu
inicio o superchron do cretáceo. Durante o superchron o
processo de criação de litosfera continuou, numa taxa
relativamente baixa. E durante todo o superchron foram
criados 2,5 Km de litosfera, valor muito próximo ao raio do
manto.
Em vista destas evidencias sugerimos que o aumento na
taxa de reversões está ligado diretamente à ocorrência de
faixas preferenciais para reversão. Ou seja, quando a
atividade tectônica é alta são geradas anomalias
(topográficas ou térmicas) na base do manto, estas propiciam
o aumento de ocorrência de reversões nestas regiões
gerando ao mesmo tempo bandas preferenciais onde ocorrem
reversões e um aumento como um todo da taxa de reversões
devido ao aparecimento destas bandas.
Acreditamos que o superchron do cretáceo tenha sido
resultado de uma época em que a interface manto-núcleo era
particularmente homogênea termicamente e
topograficamente. É possível que a litosfera do oceano
pacífico, em que sofre de contínua subducção, tenha em
algum momento parado de chegar às regiões mais profundas
do manto. O fato citado há dois parágrafos sugere que a
litosfera pode ter sido rompida em uma região superior do
manto por volta de 130 milhões de anos atrás. Notamos ainda
que foi nesta época que ocorreu a separação entre a America
e a África, já que a placa americana é adjacente a placa do
43
Pacífico, tal evento extremo pode ter sido responsável pelo
rompimento da placa do Pacífico na parte superior do manto.
Com rompimento da placa subductada o material
litosférico deixaria de chegar às regiões mais profundas do
manto fazendo com que as anomalias topográficas e térmicas
deixassem de existir. Contudo o processo de subducção
continuaria e grandes anomalias térmicas e topográficas
seriam geradas quando o material litosférico voltasse a atingir
a base do manto. O fato de que durante todo o superchron
terem sido criados 2,5 km está de acordo com esta hipótese já
que esta é aproximadamente espessura do manto inferior.
O restante desta monografia será dedicado a tentativa de
associar e interpretar todos estes fenômenos com base na
magnetohidrodinâmica e na teoria de dínamo.
Veremos como o efeito alfa da teoria de dínamo pode estar
associado à existência de feições topográficas e/ou anomalias
térmicas. Este efeito é responsável por transformar campos
toroidais, que estão confinados no núcleo, em campos
poloidais, que podem ser observados na superfície da Terra.
Um modelo de dínamo com variações temporais do efeito
alfa (associadas a variações na topografia/anomalias
térmicas) pode ser capaz de gerar importantes variações na
freqüência de reversões do campo. Isto pode ser uma
sugestão para explicar porque observamos uma relação entre
a taxa de reversões e a velocidade de espalhamento do
assoalho oceânico.
Por outro lado variações laterais da topografia e da
temperatura na interface manto-núcleo podem gerar
turbulência e excitar ondas magnetohidrodinâmicas no fluido
subjacente, isto provocaria amplificação do efeito alfa nestas
regiões, isto pode estar associado à existência das faixas
preferenciais para reversões do campo, que como vimos
coincidem com as regiões com topografia acentuada na
interface manto núcleo (que também coincidem com as
bordas as zonas de subducção ao redor do pacífico).
44
Capitulo 2. Magnetohidrodinâmica do Núcleo da Terra e
Teoria de Dínamo
2.1 Equações básicas e conseqüências
Como visto anteriormente o núcleo externo da Terra é
constituído por uma liga metálica no estado liquido, tal
material é bom condutor de eletricidade, correntes passando
neste fluido são responsáveis pela geração do campo
magnético que observamos. Por outro lado o campo
magnético é alterado pelos movimentos do fluído gerando um
sistema altamente complexo.
As equações que descrevem este sistema são as equações
da magnetohidrodinâmica: As equações de Maxwell, a
equação de Navier-Stokes, a equação de continuidade, a
equação de energia mais equação de estado.
Consideraremos aqui um sistema simplificado,
assumiremos que o fluído é incompressível e a equação de
Navier-Stokes será substituída pala equação de Boussinesq
(Pedlosky,1979), e os campos de velocidade, pressão e
magnético são substituídos por suas flutuações.
Tais aproximações são razoáveis já que movimentos
horizontais devem ser muito mais significativos que os
movimentos verticais, além disso, variações laterais de
pressão são bem menores que as variações radiais.
Equações do eletromagnetismo:
A evolução dos campos elétricos e magnéticos é dada
pelas equações de Maxwell:
45
0
.E
(2.1.1)
. 0B (2.1.2)
0B j (2.1.3)
BE
t
(2.1.4)
Onde E é o campo elétrico, B o campo magnético, j a
densidade de corrente elétrica, a densidade de cargas,a
permissividade elétrica, a permeabilidade magnética.
Em um meio isotrópico o comportamento das correntes
elétricas é descrito pela lei de Ohm:
( )j E v B (2.1.5)
Onde v é o campo de velocidades do meio condutor.
Na lei de Ampère foi desprezada a corrente de
deslocamento, já que as variações do campo são muito
pequenas para que sejam consideradas.
Combinando 2.1.5 e 2.1.3 e tomando o rotacional dos dois
lados temos que:
0 ( ( ))B E v B (2.1.6)
46
usando uma identidade vetorial do lado esquerdo e
combinando com 2.1.4 do lado esquerdo chegamos à equação
de indução magnética:
2
0
1( )
BB v B
t
(2.1.7)
O segundo termo do lado direito de 2.7 é o termo de
advecção que representa o arrasto das linhas do campo
magnético pelo movimento do fluido condutor, o primeiro
termo à direita é o termo da difusão, já que se o termo da
advecção for nulo a equação se reduz à equação de difusão
para o campo magnético, e representa a perda o campo, por
este motivo defini-se a difusividade magnética como:
0
1
(2.1.8)
Podemos ainda escrever a equação de indução na forma
adimensional:
2 ( )m
BR B v B
t
(2.1.9)
onde mR é o número de Reynolds Magnético: m
m
vLR
k , mede a
importância relativa entre a advecção e a difusão. Estima-se
que o número de Reynalds magnético seja da ordem de 10-2,
47
por isso justifica-se em primeira aproximação negligenciar o
termo de difusão. Neste caso as linhas do campo magnético
estão congeladas no fluido, esta afirmação será justificada a
seguir no teorema do fluxo congelado.
Sob este principio é possível determinar qual o movimento
do fluido necessário para gerar a variação secular observada.
A figura abaixo representa o caminho seguido pelo fluido
entre 1840 e 1990 (Jackson et al 1991).
Figura 2.1: caminho do fluido entre 1840 e 1990.
Equação de Momento:
O campo de velocidade do fluido é determinado pela
equação de Navier-Stokes incluindo os termos de força de
Coriolis e força de Lorentz:
48
(2.1.10)
Onde P é o campo de pressões, g a força gravitacional e
é a velocidade angular de rotação do referencial (no caso a
velocidade de rotação da Terra, a viscosidade do fluido . A
derivada do lado esquerdo da equação é a derivada material:
(2.1.11)
Equação de Continuidade
Em um meio contínuo seé a densidade do meio em um
dado ponto do espaço e em um dado instante então vale a
equação da continuidade:
(2.1.12)
Se é constante ao longo do fluido e não varia com o
tempo temos:
(2.1.13)
Esta ultima aproximação será utilizada na maioria das
analises feitas neste capitulo, deixaremos implícita esta
aproximação, e nos casos onde ela não se aplica avisaremos
ao longo do texto.
Aproximações comumente utilizadas:
Boussinesq: separa-se a densidade em uma parte media
constante, mais uma componente variando com a
profundidade, e mais uma parte flutuante
49
Onde .
Segundo está aproximação a equação de continuidade se
reduz a condição de incompressibilidade (ver equação de
continuidade abaixo)
Anelástica: Separa-se a densidade apenas em uma
componente variando apenas com a profundidade e outra
flutuante:
Onde .
A equação de continuidade se reduz à .
Água Rasa: consiste em, a partir da aproximação de
Boussinesq, considerar as componentes horizontais da
velocidade muito mais importantes que a componente
vertical. Desta forma elimina-se as variações com a
coordenada vertical na equação de momento.
Plano Beta:
Como estudamos movimentos em um corpo praticamente
esférico, é bastante natural adotarmos coordenadas
esféricas, contudo as expressões das equações tornam-se
consideravelmente mais complicadas quando comparadas à
coordenadas cartesianas. Há uma maneira de contornar este
50
fato, que pode ser utilizadas em diversas circunstancias em
estudos locais (na coordenada latitudinal).
A aproximação do plano beta consiste em linearizar a
expressão da força de Coriolis ao redor de uma dada latitude,
adotando coordenadas cartesianas locais no espaço tangente
à esfera.
Aproximações geostrófica e magnetostrófica:
A aproximação geostrófica consiste no balanço entre as
forças de gradiente de pressão e de Coriolis na equação de
momento. Apesar da simplicidade, ela descreve bem, em
primeira aproximação, a circulação do Oceano e da
Atmosfera, onde em geral as forças de Coriolis e de gradiente
de pressão são, em geral dominantes:
Aplicando esta aproximação as equações de momento e de
continuidade ficam, respectivamente:
(2.1.14)
(2.1.15)
(2.1.16)
(2.1.17)
51
Aplicamos na equação componente x da equação de
momento e então inserimos a equação para a componente z,
obtendo:
Procedemos da mesma forma com a componente y,
obtendo:
Vemos que a rotação induz uma invariância vertical na
estrutura do campo de velocidades, este resultado é
conhecido como teorema de Taylor-Proudman.
A equação de momento tem solução trivial:
(2.1.18)
(2.1.19)
Vemos que a divergência horizontal deste campo é nula:
Conseqüentemente:
(2.1.20)
Ou seja, a invariância vertical também se aplica a
componente vertical do campo de velocidades.
52
Vemos da solução da equação de momento que em cada
ponto o campo de velocidades é perpendicular ao gradiente
de pressão, além disso, a trajetória das partículas está
contida em superfícies isóbaras (de pressão constante).
Mais um efeito interessante surge quando consideramos
variações topográficas. Consideremos uma caixa com altura
onde o fluido está contido, sendo a região com fluido
limitada por baixo por uma parede rígida inclinada de altura
), e portanto a coluna de fluido com altura , como
ilustrado abaixo:
Neste caso segue da equação de continuidade:
(2.1.21)
Se a componente vertical se anula o topo deve também se
anular na base do fluido (Teorema e Taylor-Proudman) então
temos:
(2.1.22)
Esta relação garante que o fluido não irá “escalar” a
topografia, tendendo a contorná-la, ou seja, as trajetórias são
53
paralelas às isóbatas (curvas de altura constante), que neste
caso são chamadas também de contornos geostróficos.
Quando a força de Lorentz é significativa, como
acreditamos que seja, em geral, no núcleo terrestre a
aproximação geostrófica não é mais valida. Neste caso é
adotada a aproximação magnetostrófica:
(2.1.23)
Onde o campo magnético fica determinado pela equação
de indução magnética.
Teoremas da vorticidade e do Fluxo congelado:
Se aplicarmos o operador rotacional na equação de
Navier-Stokes, despresando-se os termos devidos à força de
Coriolis e força de Lorentz obtemos a equação da vorticidade:
(2.1.24)
Onde é a vorticidade, definida como o rotacional do
campo de velocidades.
Esta equação é completamente análoga à equação de
indução magnética já que podemos escreve-la na forma:
(2.1.25)
54
No caso em que estamos interessados os termos
dissipativos nestas equações são desprezíveis frente aos
demais termos, portanto faremos a aproximação de que o
fluido é invíscido e condutor perfeito. Com base nisto serão
tiradas conseqüências validas tanto para o campo magnético
como para o campo de vorticidade.
Consideremos uma superfície material limitada definida no
fluido.
Proposição 1: (teorema do fluxo congelado): Se o fluído é
condutor perfeito então tanto o fluxo do campo magnético
quanto o fluxo do campo de vorticidade por esta superfície é
constante ao longo do tempo.
Proposição 2: (teorema da vorticidade): Se o fluído é
inviscido então o fluxo do campo de vorticidade por esta
superfície é constante ao longo do tempo.
As proposições 1 e 2 são essencialmente a mesma, sendo
sua prova é encontrada no apêndice 1.
Esta proposição tem conseqüências muito interessantes
sobre a dinâmica dos campos de vorticidade e magnético:
primeiro estes campos são carregados junto com o fluido, se
sobre uma partícula do fluido passa linha de campo magnético
(de vorticidade) então não importa o que aconteça com o
movimento da partícula que ela vai continuar associada a
mesma linha para todo tempo. Outra conseqüência
interessante é que como o fluxo é constante se ocorrer uma
contração da curva que delimita a superfície aumenta a
intensidade do campo. Por este motivo a rotação de um
55
furacão é mais rápida em baixo (próximo ao centro) do que em
sua parte superior (afastada do centro).
Com relação ao comportamento da vorticidade mais
conseqüências interessantes podem ser obtidas se
considerarmos o termo associado à força de Coriolis.
Consideremos uma coluna de fluído com altura H definido
numa casca esférica em rotação. Denotemos por f a
velocidade angular local de rotação do referencial em rotação
junto a esfera.
Denominemos por q a vorticidade potencial definida da
seguinte maneira:
(2.1.20)
Esta é uma quantidade conservada (no caso inviscido), ver
(Pedlosky, 1979)
56
Figura 2.2: ilustração do estiramento do tubo de vórtice, o
fluido ganha vorticidade devido a mudança de espessura da
coluna
A conservação da vorticidade potencial implica que:
-se a coluna de fluido é comprimida o fluido ganhar
vorticidade (vai girar mais rápido), se ela é esticada vai perder
vorticidade (girar mais devagar).
-se o fluído é movido para uma posição onde a latitude é em
modulo maior ele ganha vorticidade, se ele for movido para
uma região onde o modulo da latitude é menor ele perde
vorticidade.
57
2.2 Ondas Magnetohidrodinâmicas
Ondas magnetohidrodinâmicas são perturbações que se
propagam por um fluido condutor na presença de campos
magnéticos, como as ondas em fluidos comuns do oceano e
atmosfera, só que com a ação adicional da força de Lorentz.
Dependendo do balanço de forças entre a força de
Lorentz, força de Coriolis e o empuxo pode haver diversos
tipos de ondas magnetohidrodinâmicas.
Quando a força magnética é muito maior que a força de
Coriolis a inércia é balanceada pela tensão magnética, são
geradas ondas chamadas ondas de Alfvén, em homenagem à
Hannes Alfven pioneiro no estudo da magnetohidrodinamica.
Caso a força de Coriolis seja muito maior que a força
magnética a inércia será balanceada pela tensão devido à
vorticidade, as ondas então são chamadas de ondas de
inércia.
Quando a força magnética e de Coriolis são da mesma
ordem de grandeza a inércia é balanceada por uma
combinação da tensão magnética com a tensão devido à
vorticidade, as ondas então se chamam ondas inerciais
magnéticas de Coriolis.
Quando movimentos são suficientemente lentos de forma
que a inércia não seja importante e as forças de Coriolis e
magnética são da mesma ordem as ondas geradas são
chamadas ondas magnéticas de Coriolis.
58
Existem, duas razões pelas quais se acredita que as
variações do campo magnético terrestre estão associadas à
ondas magnetohidrodinâmicas, principalmente ondas
magnéticas de Coriolis, primeiro devido ao fato de que os
períodos das ondas magnéticas de Coriolis são semelhantes
aos períodos de variação do campo magnético terrestre,
segundo porque tem tempos de dispersão semelhante ao
período da variação secular, as componentes com curto
comprimento de onda tem velocidades de fase mais alta assim
como as feições do campo magnético terrestre com
comprimentos de onda menor, que correspondem aos
harmônicos mais altos, se movem com maior velocidade.
Ondas magnetohidrodnâmicas podem ser essenciais, para
o processo de geração do campo magnético terrestre. No
contexto de dínamos quase-simétricos este tipo de onda
poderia ser o responsável pelas perturbações não simétricas,
podendo gerar helicidade, e consequentemente o efeito alfa,
que transforma campos magnéticos toroidais em poloidais,
como será discutido na próxima seção.
Força de Lorentz:
Antes de derivar as equações de ondas
magnetohidrodinâmicas é interessante entender o papel da
força de Lorentz sobre o fluido. Considere o seguinte tensor
de segunda ordem:
0
1 1[ ² ]
2ij i j ijM B B B
2.2.1
59
Este é o chamado tensor, onde ij é o delta de Kroneker, e
desprezamos os efeitos dos campos elétricos, já que estes
não têm importância dinâmica neste caso.
Mostremos que a densidade de força de Lorentz, em
componentes é dada por:
2.2.2
Notemos que a força de Lorentz pode ser escrita como:
2.2.3
Em notação tensorial temos:
2.2.4
Onde usamos uma identidade entre o tensor alternado e o
delta de Kroneker. Lembrando que e que
temos finalmente:
2.2.5
Vemos que o segundo termo do tensor é diagonal sendo
similar à pressão, enquanto o primeiro termo é interpretado
como uma tensão devido à curvatura das linhas do campo.
A ação da força de Lorentz é de resistir a movimentos que
comprimam as linhas de campo, devido à pressão e resistir a
movimentos que encurvem as linhas de campo.
Consideraremos apenas ondas influenciadas pela tensão
60
magnética, já que pelo fato de o fluido ser pouco compressível
ondas de pressão (magneto-acústicas) não tem muita
importância para a dinâmica do núcleo.
Ondas de Alfvén
Ondas de Alfvén são ondas que se propagam ao longo das
linhas do campo magnético, tendo sido deduzidas pela
primeira vez pelo físico dinamarquês Hannes Alfvén em 1942.
Este tipo de onda tem importância em diversos contextos, em
plasmas geofísicos, astrofísicos e de laboratório. Sua
importância para o campo geomagnético de origem interna é
que um tipo particular de onda Alfvén, as chamadas
oscilações torcionais, tem tem sido evocada para explicar o
fenômeno dos Jerks geomagnéticos (Bloxham et AL, 2002).
A analise feita na analise feita a seguir será baseada numa
analise assintótica, retendo apenas os termos de primeira
ordem, ou seja serão separadas em um estado básico mais
uma flutuação , onde , descartando sempre
produtos de flutuações (de segunda ordem). Desta maneira
as versões linearizadas das equações de movimento e de
indução ficam:
(2.2.6)
(2.2.7)
61
Então aplicamos em 2.2.7 e pressão e em 2.2.6.
Denotamos por a vorticidade, então inserimos a expressão
para em obtendo:
(2.2.8)
Supondo solução da forma obtemos a
relação de dispersão para ondas Alfvén no caso ideal:
(2.2.9)
Onde é a velocidade de propagação da onda
Álfvén. Vemos de 2.2.9 que de fato este tipo de onda se
propaga ao longo das linhas do campo magnético.
Poder-se-ia perguntar como este tipo de onda teria
relevância para a dinâmica no núcleo da Terra já que ela não
existe na ação da força Coriolis (neste caso aparecem ondas
mais gerais que serão discutidas em seguida). (Braginsky,
1970) propôs um tipo de onda chamada oscilação torcional.
Este tipo de onda seria um fenômeno global, ela seria
relacionada a oscilações na velocidade de rotação de
superfícies cilíndricas concêntricas orientadas paralelamente
ao eixo de rotação. Ao se propagar este mecanismo seria uma
forma eficaz de transportar momento angular, sendo uma
possível causa de variações na duração do dia na Terra na
escala de décadas (Bloxham, 2005).
62
Figura 2.3: Oscilação torcional se propagando no núcleo
externo.
Ondas Magneto-Coriolis/ Magneto-Coriolis arquimediana:
Devido a ação da força de Coriolis ocorre um desvio na
propagação de uma onda Alfvén, que neste caso passa a se
chamar onda magneto-Coriolis, se considerarmos ainda a
ação do empuxo a onda passa ser uma onda Magneto-Coriolis
arquimediana.
O sistema de equações linearizado que descreve é sistema
é dado por:
63
(2.2.10)
(2.2.11)
Aplicamos em 2.2.11 e pressão e em 2.2.10.
Denotamos por a vorticidade, então inserimos a expressão
para em obtendo:
(2.2.12)
Aplicamos novamente , e notamos que
, obtemos então:
(2.2.13)
Aplicamos então o operador dos dois lados
de 2.2.13 e usamos 2.2.12 para eliminar ficando com:
(2.2.14)
Supondo obtemos a relação de dispersão:
(2.2.15)
Com alguma manipulação algébrica simples obtemos as
quatro soluções desta equação algébrica de quarta ordem:
(2.2.16)
Esta onda apresenta dois modos, primeiro o modo rápido,
que ocorre ambos termos tem mesmo sinal, que corresponde
a dizer que a força de Coriolis reforça o efeito da força de
64
Lorentz, e modo lento, quando os sinais são contrários, ou
seja a força de Coriolis se opõe à força de Lorentz.
Ondas de Rossby magnéticas
Ondas de Rossby são de extrema importância no contexto
da oceanografia e meteorologia, contudo para aplicar seu
estudo à dinâmica do núcleo terrestre necessitamos
acrescentar à força de Lorentz na equação de momento,
neste contexto ela foi pela primeira vez estudada por (Hide,
1966), sendo mais recentemente aplicada ao Sol (Schecter et.
Al, 2001). Utilizaremos aqui a aproximação da água rasa,
descartando a componente vertical da equação de momento.
E ainda aproximação do plano beta.
Consideraremos ainda que o fluido está contido numa
camada de altura , cuja escala é muito menor que a escala
de estratificação do fluido.
Neste caso o sistema de equações linearizado fica:
(2.2.17)
(2.2.18)
Aplicamos à 2.2.17 e então inserimos nela a expressão
para , resultando em:
(2.2.19)
Onde é a componente vertical da vorticidade.
65
Vamos nos reter ao caso em que estamos distante do
equador de forma que , logo:
Aplicamos então na componente y de 2.2.18, e na
componente x, e aplicamos para eliminar obtendo:
(2.2.20)
Spupondo
Obtemos:
(2.2.21)
Ou:
(2.2.22)
De onde obtemos:
(2.2.23)
Dado que o parâmetro podemos expandir a raiz
em serie de Taylor no parâmetro e obtemos os dois modos:
(2.2.24)
E
(2.2.25)
66
O primeiro modo corresponde à ondas de Rossby comuns
(hidrodinâmicas), enquanto que o segundo modo correnponde
à ondas d Rossby modificadas pelo campo magnético.
O mecanismo de geração das ondas de Rossby está
associado à conservação de vorticidade potencial,
perturbações meridionais introduzem vorticidade à
perturbação devido a vorticidade potencial.
Como na expressão para a vorticidade potencial há um
termo “topográfico” uma onda completamente análoga à esta
pode ser gerada. Na literatura de oceanografia esta é a
chamada onda de Rossby topográfica (Pedlosky,1979),
(Cushman-Roisin, 1994). Aparentemente ondas de “Rossby-
magneticas-topográficas” nunca foram estudadas. Como
estas oscilações ficam confinadas à regiões onde há um
gradiente topográfico este mecanismo pode ser um candidato
para explicar oscilações in-situ do campo geomagnético. Um
exemplo deste tipo de oscilação ocorre na região da indonésia
(Jackson et al.,1989).
67
2.3 Teoria de Dínamo e a eletrodinâmica do campo
médio.
Por dínamo chamamos um processo que converte energia
cinética de um condutor em movimento em energia
magnética. É principio para o funcionamento de diversos tipos
de motores elétricos.
O primeiro a sugerir que a ação de dínamo era responsável
pelo campo magnético de um corpo celeste foi Joseph Larmor
em 1919, quando sugeriu que este mecanismo era
responsável pelo campo magnético solar.
A hipótese de que um dínamo era também responsável
pelo campo magnético terrestre seguiu da descoberta, por
Harold Jeffreys, que o núcleo da Terra era constituído por
metal em estado liquido. Walter Elsasser e Edward Bullard
foram alguns dos primeiros a trabalhar com o dínamo
terrestre ainda na primeira metade do século XX.
Entre as décadas de 30 e 50 muitos acreditaram que a
ação de um dínamo não era possível, isto se deve à um
importante teorema devido à Thomas George Cowling que é
enunciado a seguir:
Teorema (Cowling): Um campo magnético com simetria
axial não pode ser sustentado pela ação de um dínamo.
Este teorema não será provado, a prova pode ser
encontrada em (Backus & Chandrasekhar, 1956) e (Backus,
1996) em uma versão um pouco mais geral que a apresentada
68
originalmente por Cowling, supôs sem necessidades
movimentos com simetria axial.
Este teorema foi enunciado em 1934 e a ele seguiram-se
diversas tentativas de apresentar modelos de dínamo que
funcionam, ou seja que promovem crescimento do campo
magnético as custas do movimento do condutor.
Os primeiros exemplos de movimentos capazes de
promover a ação de dínamo foram apresentados
independentemente por (Backus,1958) e (Hezenberg, 1958),
contudo ambos são bastante improváveis como candidatos a
explicar o magnetismo terrestre.
A abordagem adotada aqui é originaria do trabalho de
Eugene Parker (Parker, 1955), aplicado originalmente para
explicar o fenômeno das manchas solares. Esta abordagem é
denominada eletrodinâmica do campo médio e foi extendida
na década de 1960 em (Steenback et al, 1966) e (Moffat,
1961).
O princípio é evocar movimentos helicoidais para
transformar campos magnéticos toroidais (por exemplo
perpendicular à direção radial, ver apêndice 2) para gerar
campos poloidais (radiais).
Esta proposta é bem razoável para corpos em rotação, já
que movimentos verticais seriam capazes de gerar
vorticidade devido à ação da força de Coriolis. Células
ascendentes (descendentes) de fluido entrariam em rotação,
este movimento iria arrastar e contorcer o campo toroidal
69
tornando-o poloidal, este mecanismo é o que chamaremos
mais a frente de efeito alfa.
Neste modelo o campo toroidal é gerado pelo efeito que
transforma campos poloidais em toroidais pela ação do
cisalhamento radial nos movimentos do fluido, a chamada
rotação diferencial. Como este dínamo é uma combinação dos
efeitos e este dínamo será denominado
Eletrodinâmica do campo médio
Partimos da equação de indução magnética:
2.3.1
Separemos os campos em suas partes médias e flutuantes:
'vvv 2.3.2
'BBB 2.3.3
Idealmente os operadores de média seriam médias de
ensamble, contudo é impossível utilizar isto na pratica já que
não existem varias Terras para que seja feita uma estatística.
Na pratica evocamos o princípio ergódico e substituímos as
medias de ensamble por médias espaciais ou temporais
definidas da seguinte forma:
2
0
1( )
BB v B
t
70
Ou
Onde e T são respectivamente escalas espaciais e
temporais intermediarias entre as estruturas de grande
escala e as estruturas microscópica (turbulentas).
É importante que os operadores de média satisfaçam as
chamadas regras de Reynolds:
R1- se f é constante no espaço e tempo então
R2-Linearidade:
R3-Comuta com a derivada temporal:
R4-Comuta com derivadas espaciais:
R5-
Onde a e b são escalares e f e g funções arbitrarias.
Na realidade, em geral, estas regras não são estritamente
obedecidas, apenas aproximadamente. Em geral, a media não
é feita em todo espaço mas numa região finita ( do espaço ou
tempo), de forma que o processo de aplicar medias
corresponde à uma suavização das funções por uma média
móvel, sendo assim os operadores de derivação e média não
comutam. Algumas exceções são abordagens em que a media
é feita em toda coordenada longitudinal, [0,2], de forma que
os operadores comutem, este é o caso dos dínamos quase-
simetricos. O caso de maior interesse para o presente
71
trabalho é baseado em assimetrias na longitude, e a
abordagem mencionada não se aplica, acreditamos que na
pratica o melhor a fazer é considerar medias no tempo, num
período grande o suficiente para conter oscilações, mas em
que a variação das propriedades não seja significativa.
Aplicando 2.3.2 e 2.3.1 à equação de indução magnética
temos:
2.3.4
Aplicando a média na equação de indução temos:
2.3.5
Vemos nesta equação que em principio a interação dos
campos flutuantes é capaz de gerar um campo magnético em
larga escala. O termo funciona como uma força
eletromotriz efetiva em larga escala. Contudo não é possível
medir os campos flutuantes, para estimar este termo faremos
uma expansão dele em função das quantidades conhecidas,
ou seja os campo médios:
(2.3.6)
Os termos esão pseudo tensores, e suas expressões
devem depender exclusivamente das propriedades da
turbulência. Separando em sua parte simétrica e
antissimetrica, o termo associado fica:
BBBBB
j
jiij
j
jiij
j
jiij
jij
222
72
(2.3.8)
E no geral a expressão para em componentes fica:
(2.3.9)
Onde é o tensor alternado.
Expressões para cada um destes coeficientes podem ser
calculadas por diversos métodos e dependem das
propriedades da turbulência (isotropia, homogeneidade,
estacionaridade) .
Expressões aproximadas para os coeficientes, são, para
turbulência isotrópica e homogênea:
2.3.11
2.3.12
E para turbulência não isotrópica vale ainda:
2.3.13
_
Onde é o tempo característico de giro da célula de
convecção, ver (Radler et al, 1980).
Para o coeficiente o termo mais importante está
associado à helicidade cinética do fluido. O efeito depende
essencialmente da intensidade da turbulência. O termo é um
vetorque aponta na direção contraria ao gradiente da
turbulência.
73
Veremos a seguir o papel que cada um desses termos
exerce nas equações:
O Dínamo
Vamos considerar primeiramente o caso mai simples de
dínamo em coordenadas cartesianas e coeficientes
constantes. Nosso campo de velocidades será da forma
, e o campo magnético será decomposto em suas
componentes toroidal e poloidal:
2.3.14
A equação para o campo toroidal fica:
2.3.15
Usando as propriedades dos campos poloidais e toroidais
escrevemos,(vide apêndice 2):
(2.3.16)
Como o campo de velocidades é toroidal o primeiro termo
do lado direito é nulo, podemos fatorar o rotacioal nesta
ultima equação, obtendo:
(2.3.17)
Esta equação tem a forma de uma equação do calor, com
termo de fonte, vemos então que o termo associado a gera
campo poloidal, enquanto o termo associado a é um termo
que ajuda na difusão do campo.
74
Escrevamos a equação para :
(2.3.18)
Usando novamente as propriedades dos campos toroidais
e poloidais temos:
(2.3.19)
O primeiro termo desta equação tem contribuição apenas
de já que , o restante pode ser escrito como:
(2.3.20)
Onde vemos que este termo está associado ao
cisalhamento do campo de velocidades. De 2.3.19 e 2.3.20 e
das definições de e concluimos:
(2.3.21)
Nesta equação vemos que o cisalhamento (rotação
diferencial) gera campo toroidal a partir do poloidal, ainda o
efeito alfa também é capaz de regenerar campos toroidais a
partir de campos poloidais.
Dínamos nos quais a transformação de campos poloidais
em toroidais ocorre pelo efeito são denominados dínamos
enquanto dínamos nos quais a rotação diferencial (efeito
é responsável pela conversão dos campos toroidais em
poloidais são denominados dínamos
75
Para reduzir o sistema a uma equação introduzimos 2.3.17
em 2.3.21:
(2.3.22)
Supondo que é constante e , após
alguma álgebra obtemos uma freqüência de oscilação para o
dínamo:
(2.3.23)
Notamos que a freqüência de oscilação é maior quanto
maior for , mas diminui com o aumento de
Soluções deste tipo são denominadas ondas de dínamo, e
reproduzem qualitativamente bem o comportamento do
dínamo solar, mas não tem sido bem sucedida para explicar o
comportamento do campo geomagnético, já que as oscilações
do campo, ou as reversões, não são periódicas.
Interpretação dos coeficientes da eletrodinâmica do
campo médio:
Efeito vemos que este efeito está associado à uma
produção de campos poloidais a partir de toroidais.
Efeito assim como um escoamento médio, o efeito
pumping tem o papel de advectar o campo, como vimos a
direção da advecção é contrario ao gradiente da turbulência.
Efeito o efeito beta gera uma condutividade magnética
efetiva, não necessariamente isotrópica, levando à uma
difusão do campo magnético.
76
2.4 Dínamos quase axi-simétricos
Um tipo de dínamo bastante semelhante ao estudado na
seção anterior é o dínamo quase simétrico com relação ao
eixo. Este tipo de dínamo foi proposto por Stanislav Braginsky
numa série de artigos publicados em 1964 (Braginsky, 1964a,
b, c, d).
A idéia é que apesar do teorema de Cowling garantir a
impossibilidade da existência de dínamos com simetria axial
no campo magnético, se houver uma difusividade fraca,
pequenos desvios não simétricos podem ser capazes
regenerar o campo magnético.
O formalismo é bem semelhante ao formalismo da
eletrodinâmica de campo médio, e em até certo ponto pode
ser visto como um caso particular desta teoria. A diferença
básica é que na teoria de dínamos quase simétricos as medias
espaciais não são efetuadas mais em uma região, mas em
toda coordenada longitudinal, ou seja, se é um escalar
qualquer, sua média é dada por.
Note que neste caso as regras de Reynolds se aplicam
exatamente.
As quantidades são separadas então em suas partes média
e flutuante. Resultando em equações basicamente iguais
àquelas apresentadas na seção anterior.
77
A idéia de Braginsky é que ondas magnetohidrodinâmicas,
como aquelas citadas na seção 2.2 são responsáveis pelas
flutuações não simétricas.
A vantagem desta teoria é que não há necessidade de o
escoamento ser turbulento.
78
Capitulo 3: Modelos de dínamo com variável
No ultimo capitulo vimos que soluções do dínamo
apresentam oscilações periódicas. Este modelo de dínamo,
descreve qualitativamente bem o comportamento do dínamo
solar, já que este é aproximadamente periódico, de com ciclos
aproximadamente de aproximadamente 11 anos, modelos não
lineares de dínamo são capazes de reproduzir com mais
precisão o comportamento do dínamo solar, dando conta das
pequenas variações no período do processo, variações estas
de até 2 anos, ou seja ciclos variam de 9 à 13 anos
(Ossendrijver, 1996).
Nestes modelos o efeito não mais é considerado como
constante no tempo e/ou espaço.
Modelos cinemáticos são lineares, com isto é permitido um
crescimento ilimitado no campo magnético, contudo quando
o campo é muito intenso a força de Lorentz passa a ter um
importante papel dinâmico, com isto o regime cinemático
deixa de ser uma boa aproximação. Este fato pode ser
incorporado aos modelos de campo médio, num processo
chamado “-quenching” (Ossendrijver, 1996), baseado no fato
que quando o campo é muito intenso o efeito perde
eficiência, processos deste tipo também podem ocorrer com
efeitos associados a outros coeficientes da teoria de campo
médio.
Contudo na Terra a situação parece ser bem mais
complicada, os períodos de reversão do campo variam em
três ordens de grandeza. Apesar de provavelmente
79
acontecerem processos do tipo “quenching” não parece ser
razoável para explicar tal disparidade de escalas.
Como vimos no capitulo um parece haver uma correlação
muito grande fenômenos geomagnéticos e inomogeneidades
térmicas e topográficas na interface manto-núcleo. Vimos que
nas mesmas latitudes onde estas inomogeneidades ocorrem
também ocorrem os lóbulos do campo geomagnético e as
bandas preferenciais para reversão do campo.
A principio já era razoável supor que estes fenômenos
estejam associados a variações das propriedades desta
interface, já que as equações apresentam simetria azimutal e
é bem difícil imaginar como um sistema como este poderia
suportar tais tipos de estruturas não simétricas e que
aparentemente persistem por milhões de anos
(Constable,2002).
Discutiremos a seguir como estas inomogeneidades
térmicas e topográficas podem influenciar os coeficientes da
teoria do campo médio.
3.1 Teoria do campo médio e a interface manto núcleo.
Diversos importantes pesquisadores do geomagnetismo e
teoria de dínamo parecem ser críticos quanto a relevância e
aplicabilidade da teoria do campo médio para o geodínamo
(Braginsky, 1990), (Glatzmaier & Roberts, 2000), alegando que
a turbulência, apesar de certamente existir no núcleo terreste,
não seria suficientemente intensa para justificar esta
abordagem.
80
No Sol, onde a teoria do campo médio parece ser
incrívelmente bem sucedida o número de Reynolds magnético
é da ordem de 1010, enquanto que na Terra é da ordem de
103.
Contudo lembremos que a topografia para o fluido é um
obstáculo, desta forma é natural se esperar que ele promova e
amplifique a turbulência no escoamento do fluido ao seu
redor. Ou ainda, se houverem regiões significativamente mais
frias na base do manto (como deve ser o caso das regiões
abaixo das Américas e da Australia/leste Ásiatico) os
graditentes verticais de temperatura do núcleo para o manto
seriam maiores que nas outras regiões formando, deste modo,
regiões com convecção mais intensa. Isto pode indicar que a
ação do que chamaremos de Dínamo Raso, ou seja, um
dínamo fortemente dependente da turbulência gerada pelos
contornos.
Veremos como diversos coeficientes seriam afetados:
Efeito A idéia de que a topografia poderia influenciar o
efeito alfa já tinha sido considerada anteriormente
(Moffat,1976/Moffat,1978).
Primeiro, se a turbulencia é gerada pela topografia a ação
da força de Coriolis cumpriria o papel de torna-lá uma
turbulencia “helicoidal”.
É interessante notar que a topografia também é capaz de
gerar movimentos helicoidais em larga escala, como ocorre
81
na atmosfera no fenômeno denominado ciclogênese de Lee
(Smith,1984).
Mesmo que a turbulência não seja importante para
regeneração do campo poloidal pelo toroidal, veremos que a
topografia é capaz de gerar um tipo de efeito alfa em larga
escala.
Descrevamos agora a analise de (Moffat, 1978):
Exibiremos agora um modelo teórico simples mostrando
como a topografia da interface manto-núcleo pode gerar
helicidade e conseqüentemente efeito alfa. Como a escala de
variação da topografia deve ser de milhões de anos, uma
região com este tipo de estrutura poderia concentrar a ação
do efeito alfa.
Consideraremos que tanto o campo magnético quanto o
campo de velocidades é horizontal no infinito e que a
topografia seja dada pela função , e que a rotação seja
dada vertical
Procuraremos soluções estacionarias, fazendo a
aproximação magnetostrófica na equação de momento
(balanço entre as forças de Lorentz Coriolis e de pressão), e
descartaremos o termo com derivada temporal na equação de
indução. O sistema resultante, linearizado, é o seguinte:
82
Onde a pressão é a soma das pressões térmica e
magnetica dividida pela densidade.
Consideraremos que tanto o campo magnético quanto o
campo de velocidades é horizontal no infinito e que a
topografia seja dada pela função , e que a rotação
tenha direção vertical .
Figura 3.1: ilustração da situação considerada no
problema.
Denotemos por “^” a transformada de Fourier das
variáveis. O sistema admite soluções da forma:
Onde , pois as perturbações devem se
anular no infinito.
83
Substituindo este ansatz nas equações obtemos uma
equação cúbica para .
Que possuí seis soluções, sendo que três satisfazem
e serão denotadas por , . As raízes podem
ser obtidas por métodos assintóticos, e na ordem dominante
são:
Neste caso as variáveis podem ser obtidas:
Onde denota a amplitude
O manto é isolante elétrico, logo nesta região podemos
escrever e
84
As amplitudes podem ser obtidas em função da
transformada de Fourier de .
O primeiro modo não apresenta helicidade, enquanto os
outros dois são fortemente helicoidais. Com a helicidade dada
por
Notamos que como a transformada de Fourier é uma
operação linear a helicidade será maior quato maior for a
amplitude da topografia.
Este resultado é interessante por dois motivos: por ser
uma solução estacionaria ela diz que pode haver regiões onde
a helicidade seja anomalamente alta. Isto pode ter relação
com os chamados caminhos preferenciais para reversão.
Se há uma dependência da helicidade com a longitude é
natural que as soluções da equação de indução em forma de
ondas de dínamo tenham oscilações que variem com esta
coordenada devido à dependência com relação ao parâmetro
, podendo gerar os chamados caminhos preferenciais.
Possivelmente existem efeitos das inomogeneidades da
interface manto núcleo sobre outros efeitos da teorira de
dínamo:
85
Efeito pumpingUma interpretação bem interessante
surge da interação do efeito pumping com a
topografia/anomalias térmicas. Como a turbulência seria mais
intensa nestas regiões que no entorno, já que a turbulencia
serve como um obstáculo, haveria um transporte de campo
magnético para fora destas regiões. Isto é particularmente
animador se nos lembrarmos que a reversão do campo ocorre
preferencialmente justamente onde o pumping seria mais
efetivo. O pumping aparece como um forte candidato como
responsável pelas reversões do campo.
Isto poderia ocorrer de duas maneiras: se o pumping for
capaz de expulsar campos de escala dipolar, ou, o que nos
parece mais razoável, que uma interação entre o pumping e
um cascateamento inverso de helicidade magnetica
associado ao efeito Este processo que transfere é
responsável pela “construção” de campos de larga escala
(Frisch,1975), ou seja o dipolo, em ultima intancia o dipolo.
Efeitocomo a turbulência deve ser mais intensa nas
regiões próximas à topografia esperamos que a difusividade
efetiva do campo geomagnético seja mais intensa nessas
regiões. Isto é de fundamental importância já que a difusão do
campo tende a torná-lo mais suave, ou seja, campos de
pequenas escalas serão destruídos mais facilmente nas
regiões consideradas.
86
3.2 Dínamo Estocástico
Nesta seção apresentaremos um modelo de dínamo
baseado em variações estocásticas que surgiu recentemente
(Hoyng et. al., 2001a). Este modelo além de apresentar
resultados bastante realistas é bastante simples, suas
equações são as mesmas que governam o movimento de uma
partícula com uma forçante estocástica em um potencial com
dois mínimos. Esta analogia deixa bem claro quais seriam os
efeitos das alterações nas condições da interface manto
núcleo.
Começamos com a equação de indução resultante da
aproximação de campo médio:
3.2.1
Ao contrario da seção 2.3 adotamos coordenadas
esféricas. Separamos em suas componentes poloidal
(perpendicular ao versor ) e toroidal ( paralela a :
3.2.2
Onde e tomam forma de ondas esféricas,
respectivamente:
3.2.3
3.2.4
Para representar a rotação diferencial utilizamos um
campo de velocidades da forma .
87
Desta forma a evolução dos escalares poloidal e toroidal
ficam determinados pela equação:
3.2.5
Onde é um vetor contendo os escalares toroidal e
poloidal como componentes:
3.2.6
E é um operador da forma:
3.2.7
é o operador de difusão:
3.2.8
O coeficiente é dado por:
3.2.9
é o valor de nos pólos, sendo que .
Se denotarmos por e respectivamente os autovalores
e autofunções do operador podemos expandir qualquer
vetor em autofunções de :
3.2.10
Onde o coeficiente é dado pelo produto escalar:
3.2.11
Até aqui apenas construímos um modelo em geometria
esférica análogo ao que construímos em geometria cartesiana
na seção 2.3. A diferença é que consideraremos variações de
88
com a coordenada (proporcinais a ) e flutuações
estocásticas com o tempo, denotadas por .
Desta forma a evolução do campo é determinada pela
equação:
3.2.12
Onde e representam respectivamente a variação
espacial e as flutuações temporais de :
3.2.13
3.2.14
A introdução do termo que representa flutuações de foi
motivado pelo chamado “quenching”. O problema do
dínamo cinemático é linear, e permite portanto crescimento
ilimitado do campo. Na realidade as não linearidades são
responsáveis pela saturação no crescimento do campo, o
“quenching” é uma maneira de corrigir introduzindo este
fato em modelos cinemáticos de dínamo, isto é feito fazendo
com que diminua com o aumento da intensidade do campo.
Este mesmo modelo foi capaz de explicar a variabilidade
no período dos ciclos solares (Ossendrijver et al., 1996).
Nosso ponto é que também pode representar variações
do efeito devido à variações na topografia e/ou temperatura
da interface manto núcleo.
A evolução para cada modo (em particular o dipolo), é
obtida facilmente fazendo e utilizando
3.2.12 e 3.2.10, resultando em
89
Onde,
A evolução da distribuição de probabilidade da amplitude é
dada por uma equação de Fokker-Planck (Hoyng,2001a):
Onde e são coeficientes que representam
respectivamente a advecção e a difusão da densidade de
probabilidade.
Esta equação é a mesma que modela a densidade de
probabilidade para a posição de uma partícula em um
potencial sujeita à uma forçante estocástica (térmica, por
exemplo) e com efeitos difusivos (atrito por exemplo), ver
(Risken, 1984), por exemplo. No caso particular da evolução
do modo fundamental (dipolo) a equação é análoga a de uma
partícula com forçante estocástica em um potencial bi-estável
( com dois mínimos locais) como ilustrado abaixo.
90
Figura 3.2: partícula em um potencial bi-estavel (Hoyng et.
al.,2001a).
A reversão do campo seria análoga à situação da partícula
atravessar a barreira de potencial passando de um poço de
atração para outro. Os mínimos do potencial representariam
para o campo magnético os pólos.
Naturalmente se a forçante é grande há uma alta
probabilidade da partícula atravessar a barreira de potencial.
Para o campo geomagnético este seria o caso análogo ao de
uma época com grandes anomalias topográficas/térmicas que
gerariam uma alta probabilidade do campo reverter sua
polaridade.
Simulações baseadas neste modelo foram capazes de
reproduzir os principais aspectos da evolução do dipolo
terrestre (Hoyng 2001a, b), quando comparados com o
modelo de evolução do momento de dipolo para os últimos 4
milhões de anos (Valet, 1999).
91
4.Discussão e conclusões
O campo geomagnético é gerado por um processo de
dínamo, que acreditamos ser do tipo , alimentado pelo
efeito que estica as linhas de campo na forma toroidal
devido a uma rotação diferencial do fluido e pelo efeito que
transforma campos toroidais em poloidais. O efeito por sua
vez está ligado diretamente à propriedade de helicidade do
escoamento, que surge naturalmente em fluidos em rotação
devido à convecção associada à turbulência (na
eletrodinâmica do campo médio) ou à ondas
magnetohidrodinâmicas (teoria de Braginsky). Soluções em
forma de ondas em dínamos do tipo produzem oscilações
cuja freqüência depende da intensidade do efeito A
dificuldade de associar diretamente este tipo de dínamo ao
comportamento observado do campo geomagnético é devido
à alta variabilidade na freqüência de reversões.
Neste trabalho tentamos associar a variabilidade na
freqüência de reversões com as variações de longo período
nas propriedades da interface manto núcleo, principalmente a
topografia.
Foi mostrado que há uma coincidência entre as longitudes
preferenciais para reversão do campo geomagnético e
regiões na interface manto núcleo com feições topográficas
acentuadas. Há também coincidência entre a velocidade de
espalhamento da litosfera oceânica do Pacífico e a taxa de
reversões. Aparentemente, em épocas em que há um impulso
na velocidade das placas há também um aumento drástico na
92
freqüência de reversões. Acreditamos que estes fatos estão
relacionados e sugerimos um mecanismo para explicá-los.
Placas oceânicas subductadas podem chegar a regiões
profundas do manto, o que pode causar tanto anomalias
topográficas quanto térmicas na base do manto. Este tipo de
anomalia é capaz de gerar helicidade no fluido presente no
núcleo externo, e conseqüentemente efeito
Uma maior velocidade de espalhamento do assoalho
oceânico implicaria em mais material litosférico nas regiões
inferiores do manto que levariam à existência de grandes
anomalias na base do manto, estas anomalias aumentariam o
efeito acarretando numa maior freqüência de reversões.
Analogamente, baixas taxas de espalhamento no assoalho
oceânico acarretariam numa taxa de reversões baixa.
Em particular, acreditamos que o superchron do cretáceo
tenha sido resultado de um período em que a interface manto
núcleo era particularmente homogênea.
Longitudes preferenciais para reversão apareceriam
nestas regiões anômalas na interface manto núcleo já que
estas regiões seriam fontes de campo poloidal, sendo natural
que os dipolos geomagnéticos virtuais se concentrem nestas
regiões.
Diversos aspectos associados à influencia de anomalias
topográficas/térmicas ainda necessitam de investigação, em
particular o papel dos demais efeitos da eletrodinâmica do
campo médio.
93
Bibliografia
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Apêndice 1: Teorema do fluxo congelado
Proposição: Seja um campo solenoidal que satisfaz a
equação:
(A.1)
Onde é um campo de velocidades. Então se é uma
superfície orientada material (constituída pelas mesmas
partículas do fluido) então o fluxo de através de S é
constante.
Podemos reformular a proposição da seguinte maneira:
Sendo solenoidal existe tal que:
(A.2)
Sejam e superfícies (materiais) orientadas delimitadas
pela curva (também material) fechada .
O teorema de Stokes garante que o fluxo de através das
duas superfícies é o mesmo. Logo podemos dizer que o fluxo
é uma função da curva que delimita a (classe de) superfícies:
(A.3)
Como se move junto com fluido denotaremos por .
Neste caso o teorema diz que:
(A.4)
Prova:
Seja uma parametrização de , de forma que
, onde denota a posição em da
partícula sobre a curva cujo parâmetro é . Podemos
considerar a mesma parametrização para todo tempo fazendo
, onde o índice denota referencial
lagrangiano.
98
Notemos que se é uma propriedade física das partículas
em podemos considerar como uma função de e .
(A.5)
Onde o índice refere-se à referencial Euleriano. Então
(A.6)
(A.7)
E ainda
(A.8)
Podemos então escrever (A.3) como:
(A.9)
Logo:
(A.10)
Computemos o segundo termo dentro da integral.
Definimos: , em componentes:
(A.11)
Pela lei de Faraday vale:
(A.12)
Logo
Que em componentes fica:
(A.13)
Combinando (A.11) e (A.13) temos:
(A.14)
99
De forma que
(A.15)
Logo
Introduzindo em (A.10) temos:
(A.16)
Mas como é fechada e corresponde ao mesmo
ponto, logo a integral se anula e está provado o teorema.
100
Apêndice 2: Representação de Mie para campos vetoriais
Assim como o teorema da decomposição de Helmholtz
garante que um campo vetorial pode ser decomposto em uma
componente solenoidal e outra irrotacional, o Teorema da
decomposição de Mie (Mie, 1908) garante que campos
solenoidais podem ser decompostos em componentes
chamadas toroidais e poloidais.
Mais precisamente, se é um campo vetorial,
diferenciavel quantas vezes forem necessárias, tal que
, então pode ser escrito como:
(B1)
Onde o um vetor radial, e são campos escalares.
Para demontrar esta afirmação comecemos com a
representação arbitraria:
(B2)
Onde novamente e são campos escalares, e
mostremos que , onde é um escalar
qualquer.
Como segue que . Ou seja:
(B3)
Que implica:
(B4)
Onde é função de e apenas.
Separamos em uma parte media e uma flutuante:
(B5)
Substituindo em (2) obtemos