Programa de Governo
PSOL
Paulo Búfalo Governador Aldo Santos Vice
Apresentação
Propor um plano de governo para o estado de São Paulo exige firmarmos um compromisso
importante: nos colocamos ao lado da população que luta diariamente pela sobrevivência, ao
lado dos movimentos sociais que enfrentam a criminalização e lutam pela garantia e
ampliação de direitos, ao lado de todas e todos que são excluídos desse sistema desigual e
violento. E por saber de onde falamos e para quem queremos governar, nossos propostas
enfrentam os poderosos que historicamente lucram em nosso estado. Entendemos esse
programa de governo como propostas concretas para mudar a vida da população de São
Paulo e também com importante instrumento para fomentar o debate na sociedade e
fortalecer a luta por transformações.
Convidamos todas e todos para participarem de nossa campanha, debatendo temas
importantes e buscando uma alternativa efetiva que mude a curso de exploração de tantos e
privilégios de alguns que marca a história do estado de São Paulo.
Eixos de uma alternativa de esquerda para São Paulo:
1. Finanças públicas: enfrentando a Dívida Pública
2. Reforma agrária e urbana
3. Direitos Humanos
4. Meio-ambiente
5. Saúde
6. Educação
7. Cultura
8. Mulheres
1. Finanças públicas: enfrentando a Dívida Pública:
A implementação de qualquer programa de governo deve estar associada à sua capacidade
financeira de execução. Mas tal capacidade não pode se referir a números frios, à simples
questionamentos de se há ou não orçamento disponível. Uma análise financeira séria deve partir de
dois pontos fundamentais: qual(is) a(s) prioridade(s) de gastos e quais as possibilidades de origem
de receita. Iniciamos nosso programa com a análise da dívida pública para demostrar de que forma
o estado de São Paulo – como retrato do Brasil – organiza suas finanças de modo a assegurar, em
primeiro lugar, o retorno do capital e, secundariamente, realizar suas tarefas de gestor dos bens
públicos.
A situação das finanças públicas estaduais tem origem nos movimentos do setor público brasileiro
ao longo da década de 80. A obrigatoriedade de manter os compromissos financeiros e as
transferências de recursos ao exterior resultantes do golpe dos juros de 1979 e a consequente crise
da dívida que assolou os países da América Latina naquele período provocaram uma crise de todos
os segmentos do setor público brasileiro, inclusive no nível estadual. A solução encontrada pelo
Estado brasileiro foi a adesão aos planos de liberalização da economia, que inseriram o Brasil em
novos acordos financeiros e comprometiam o país com diversas medidas ditas de ―saneamento‖
econômico, dentre as quais se destacam o equilíbrio monetário e o controle fiscal.
No plano nacional, a principal versão dessas medidas ocorreu a partir do Plano Real. Para os
estados, o ponto fundamental foi a reforma financeira de 1997 e a Lei de Responsabilidade Fiscal
do ano 2000. Nesse período, com o saneamento das contas federais já em curso, os governadores
estaduais, ainda presos às crescentes dívidas públicas e aos problemas dos bancos estaduais –
ambos aprofundados a partir do fim da inflação e da alta de juros do Plano Real – viram-se
obrigados a aceitar todas as condições impostas pelo Governo Federal para a reorganização das
finanças dos estados. Assim, realizou-se um processo de renegociação da dívida pública dos estados
no qual estes foram obrigados a seguir plenamente a estratégia financeira adotada nacionalmente,
alinhando-se ao cumprimento de regras de ajuste fiscal bastante restritas. As medidas incluíam a
privatização de empresas e bancos estaduais, justamente as instituições que até aquele momento
tinham servido de instrumento de alavancagem financeiras e ampliação de gastos públicos. Ou seja,
a situação levou a que os estados, para livrarem-se de suas dívidas, tivessem que abrir mão de seu
quase todo seu aparato financeiro local.
A Lei de Responsabilidade Fiscal completou a construção desse novo arcabouço institucional para
as finanças públicas estaduais, aprofundando a ingerência sobre a definição de prioridades
orçamentárias através do estabelecimento de parâmetros legais para o gasto de pessoal e o
endividamento dos estados. A partir da promulgação dessa lei, os estados ficaram obrigados a
manter metas fiscais previamente anunciadas e a determinar garantias para sua implementação, sob
pena de sofrer sanções financeiras e bloqueio das transferências federais.
A nova estrutura das finanças estaduais possuía uma lógica simples: comprometer o orçamento com
a geração de superávits primários e com o pagamento do serviço da dívida. Em outras palavras,
colocar o pagamento de juros como prioridade número um do orçamento estadual. Todos os demais
gastos – saúde, educação, cultura, assistência social, etc. – ficaram sujeitos ao potencial de
ampliação da arrecadação do estado.
Vale ressaltar que, dada a estrutura tributária vigente – o ICMS correspondeu, em 2009, a 67% da
receita líquida disponível, enquanto a arrecadação sobre a propriedade não alcança 5% – o potencial
de arrecadação para os estados depende fundamentalmente da ampliação do volume de mercadorias
e serviços em circulação, ou seja, do crescimento econômico. Como a política de combate à
inflação manteve, e mantém até hoje, as taxas de crescimento da economia controladas para não
interferirem nos níveis de inflação, também a arrecadação apresentou taxas de crescimento pífias.
Entre os anos de 1998 e 2007, o crescimento real da arrecadação no estado de São Paulo foi de
menos de 2,6% ao ano.
O resultado é que o estado de São Paulo – assim como os demais da Federação – encontra-se
financeiramente refém da política de finanças federais, atualmente focada na estabilização
monetária, e portanto com baixa capacidade de investimentos e sujeito a um rígido controle de
gastos. Os dados mostram uma forte disciplina do governo ao novo regime financeiro. Os gastos
com pessoal caíram de 50% em 2001 para pouco mais 40% do orçamento em 2008. Enquanto isso,
o superávit primário cresceu de 4,97% para 8,32% do orçamento no mesmo período. De acordo
com os dados da Secretaria da Fazenda do estado, o valor destinado ao serviço da dívida em 2009
foi de mais 9 bilhões de reais. No mesmo ano, o valor total destinado à manutenção do ensino
público estadual foi de pouco mais de 5 bilhões de reais, enquanto o atendimento médico,
ambulatorial e hospitalar não alcançou 4,5 bilhões de reais e a produção de unidades habitacionais
ocupou apenas 682 milhões de reais.
Fica explícita, portanto, a fórmula para o cumprimento das metas de pagamento de juros: redução
de todas as demais ações do estado, o que é feito através de privatizações, programas de demissão
voluntárias, não reposição para aposentados e redução do número de funcionários, que caiu de 912
ativos em 1994 para 743 mil em 2005.
É importante lembrar que grande parte da dívida estadual – aquela que gerou a reformulação do
modelo financeiro a partir de 97 – tem origem em programas de ajuda e socorro do governo a
empresas e bancos privados. O total da dívida e a avaliação acerca da validade de sua aplicação até
os dias atuais nunca foi devidamente auditada e é provável, dados os altos níveis dos juros no país,
que boa parte da dívida legitimamente adquirida já tenha sido plenamente quitada.
O programa de governo do PSOL quer inverter o olhar sobre as finanças públicas e suas prioridades
atuais. A dívida pública estadual deve ser auditada e renegociada, com parâmetros
fundamentalmente distintos daqueles da renegociação de 1997, que partam da necessidade de
autonomia financeira do estado, e não do aprofundamento da dependência frente ao fluxo de capital
internacional. A renegociação da dívida deve ser complementada com uma nova lógica tributária,
que permita o aumento da arrecadação através de uma maior tributação da propriedade, da herança
e das grandes fortunas.
O PSOL quer uma profunda reforma financeira no estado: priorizando a gestão do bem público – e
não o pagamento de uma dívida pública – e arrecadando daqueles que tem muito, e não da
população que todos os dias luta para sobreviver em nosso estado.
2. Reforma Agrária e Urbana:
A re-estruturação produtiva neoliberal causou grande impacto sobre as formas de ocupação da terra
no Brasil e, em especial, em São Paulo, o centro produtivo e financeiro do país. Todo território que
ainda não estava plenamente mercantilizado, passou a ser incorporado à lógica do capital.
De um lado, o campo ampliou seu caráter latifundiário e monocultor, agora essencial para a
consolidação do modelo agroexportador do crescimento brasileiro. Na divisão internacional da
globalização neoliberal, cabe ao Brasil garantir a produção de grãos, carne, madeira, minérios,
celulose e álcool. Essa ampliação do carater latifundiário e monocultor pode ser percebida na tabela
abaixo, que aponta a evolução das três principais culturas em nosso estado:
Eucalipto Pinus Cana-de-açúcar Total
2001 733.207 165.077 3.090.808 3.989.092
2002 756.867 171.044 3.198.392 4.126.302
2003 776.973 178.245 3.394.228 4.349.446
2004 846.882 212.333 3.496.785 4.555.999
2005 887.929 210.686 3.752.448 4.851.063
2006 915.841 214.491 4.338.648 5.468.980
2007 962.006 188.798 4.914.069 6.064.873
2008 1.001.076 172.477 5.498.316 6.671.869
2009 983.920 158.708 5.624.500 6.767.128
Fonte: Instituto de Economia Agríco la (tabulação nossa)
Tabela - Evolução da área plantada de eucalipto, pinus e
cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, 2001 a 2009
Em São Paulo, de acordo com o Censo Agrícola de 2006, são 9,5 milhões de hectares de terra para a
agricultura. Seguindo a estrutura do agronegócio, o estado concentra sua produção em álcool, –
mais de 4,5 milhões de hectares de cana-de-açúcar – milho e soja – 1 milhão e 0,5 milhão de
hectares respectivamente – laranja – 0,6 milhão de hectares – e celulose – 15 milhões de metros
cúbicos de toras. Ou seja, mais de 70% do território agriculturável do estado é destinado
exclusivamente à produção agroexportadora.
A característica dessa produção é a concentração. O Censo Agropecuário de 2006, recentemente
divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística — IBGE1, comprova a manutenção da
inaceitável desigualdade na distribuição da terra no Brasil. O censo confirma a estabilidade do nível
da concentração fundiária em relação aos dois últimos censos (1985 e 1996). O indicador que
comprova este fato é o Índice de Gini para a concentração fundiária, cujos valores podem variar
entre zero (igualdade absoluta) e um (desigualdade absoluta). Pois bem, considerando-se os três
últimos censos, o referido índice apresenta os seguintes valores: 0,857 (censo de 1985), 0,856
(1995) e 0,854 (2006). Três valores expressivamente altos. Em 2006, 2,3% dos proprietários do
estado detinham 63% das terras agriculturáveis, em estabelecimentos considerados ―muito
grandes‖, com mais de 1400 hectares cada um. Enquanto isso, os restantes 187.209 produtores
rurais ficavam apenas com 37% das terras.
O período censitário aqui referido limita-se a 2006, no entanto a afirmativa de que a concentração
persiste até os dias atuais é evidente. Considerando-se os últimos três anos, não se verifica qualquer
fato que indique reversão desta tendência em favor dos pobres do campo. Pelo contrário, se indícios
há eles apontam para o crescimento da concentração em áreas de expansão das monoculturas. No
estado de São Paulo2 houve crescimento expressivo da lavoura da cana-de açúcar e alteração
significativa do índice de Gini — de 0.758 (censo de 1996) a 0,804 no censo de 2006. O grande
beneficiário continua a ser o latifúndio travestido de agronegócio com forte presença e associação
com as grandes companhias transnacionais.
O outro lado dessa concentração é sentida nas cidades. Segundo dados do DIEESE, o desemprego
no mês de maio de 2010 na região metropolitana de São Paulo é de mais de 1,4 milhões de pessoas,
que representam praticamente 15% da PEA (População Economicamente Ativa), de 10,7 milhões de
trabalhadores. A falta de acesso ao trabalho leva ao aumento significativo das favelas e de periferias
precariamente atendidas pelos serviços públicos, com impactos para a degradação social e
ambiental – mais de 50% das favelas na cidade de São Paulo ficam às margens de reservatórios de
abastecimento de água.
A política habitacional implementada para as cidades no estado vai na contramão de uma solução
efetiva. A intensificação de despejos de favelas, principalmente aquelas localizadas em áreas
centrais, tem como objetivo não a solução de um problema habitacional, mas a utilização das terras
como fonte de especulação imobiliária. O programa federal de construção de moradias, assim como
a política estadual que se vale de companhias sucateadas e descapitalizadas, mostram a
incapacidade do poder público de romper com os pesados interesses que se abrigam no ramo da
construção imobiliária. As inscrições ao governo federal superaram em quase 50 vezes a oferta para
1 No dia 06/11/2009, mais de um mês após a primeira divulgação, o jornal Folha de São Paulo
veiculou declaração do IBGE que afirma ter havido erro na estimativa do Índice de Gini para o país
como um todo. O valor anunciado anteriormente 0,872 deveria ser substituído por 0,854.
Considerando-se correta está última estimativa, implica em concluir, ao contrário do anunciado em
30 de setembro, que não houve agravamento da concentração de terras no período intercensitário.
De qualquer forma, seja lá qual for o valor correto, no mínimo, a concentração de terras foi mantida
em nível escandalosamente alto. Esperemos que o IBGE tenha mais cuidado em tratar seus
indicadores, em especial, aqueles de grande importância, como é o caso do Gini que mede a
concentração fundiária. 2 O IBGE não declarou erros nos cálculos do índice de Gini para os estados.
a população que recebe até 3 salários mínimos e o Governo Estadual, que se financia através da
arrecadação de 1% do ICMS (Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços), não abrigam no
horizonte a solução deste problema do povo paulista e brasileiro.
Em resumo, a lógica do lucro ao capital prevalece no campo e na cidade, disputando terras e
expulsando a população dos espaços de direito econômico e social. O programa do PSOL inverte
essas prioridades e afirma a necessidade de uma reforma agrária e urbana que ressignifiquem o
espaço e coloquem a sustentabilidade social e ambiental no centro da ocupação das terras no estado
de São Paulo, lutando contra a hegemonia do agronegócio no campo e da especulação imobiliária
nas cidades.
Nesse sentido, os eixos fundamentais para que o PSOL propõe são:
1. Regulação das atividades das monoculturas que caracterizam o agronegócio no Brasil –
Área Reformada ou ZONEAMENTO SOCIO-AGRO-AMBIENTAL (atenção para o sócio,
investimentos públicos em programas dirigidos aos agricultores mais pobres devem ser
protegidos)
2. Criação de uma política estadual de combate ao uso dos agrotóxicos, incentivando práticas
sustentáveis de manejo da terra e de produção de alimentos saudáveis .
3. Insistir na atualização dos índices de produtividade e efetivação dos demais aspectos da
função social — ambiental e trabalhista.
4. Atuação na luta pelo estabelecimento legal do limite máximo da propriedade.
5. Realização da reforma urbana com ocupação de edifícios desocupados e combate à
especulação imobiliária com penalização da manutenção de imóveis desocupados e da não
execução do plano de ocupação de moradias vazias.
6. Execução plena do artigo 186 da Constituição Estadual, responsabilizando o poder público
pelo cumprimento da função social da propriedade, destinando à reforma urbana e agrária
aqueles em falta com a lei.
7. Estabelecimento de um sistema de transporte prioritariamente público, com moratória da
expansão viária nas cidades e redirecionamento dos investimentos para o transporte público
coletivo.
3. Direitos Humanos:
Os Direitos Humanos têm sido tratados pelo Estado brasileiro, nos níveis municipal, estadual e
federal, sob forte influência do senso comum e dos setores conservadores da sociedade. Isso impede
o avanço nas políticas públicas, para além da retórica sobre a universalização e a igualdade de
direitos e garante a impunidade e a reprodução dos métodos violentos para contenção e repressão
sociais, aplicados ao longo da história do Brasil, sobretudo nos governos ditatoriais.
A construção política desta concepção nas últimas décadas conta com o uso do aparato de
comunicação social e se dá através da dispersão e da fragmentação dos Direitos Humanos nos
chamados ―segmentos historicamente vulneráveis e discriminados‖. Os segmentos oprimidos,
dispersos, batalham entre si tanto pela representação nos espaços de participação como também, por
políticas públicas, programas e ações afirmativas que atendam suas demandas específicas.
Esta fragmentação perde de vista a totalidade: ―as solidariedades se desfazem na decomposição do
‗eu múltiplo‘ e nas subjetividades pulverizadas de uma socialização em migalhas‖ (Daniel Bensaid).
Perde-se de vista principalmente a questão de classe e o papel da violência institucional, exercida
diretamente pelo aparelho repressor do Estado na criminalização dos habitantes dos territórios e das
populações submetidas à pobreza.
A violência institucional banalizou a tortura e o assassinato exercidos por agentes do Estado
brasileiro, tendo a seu favor uma opinião pública obscurantista, cínica e complacente com os crimes
dos ricos e da classe média e rigorosa na punição extraordinária dos pequenos delitos contra o
patrimônio que povoam as nossas prisões.
A impunidade e a prática do esquecimento pelo Estado brasileiro
As violações aos direitos humanos, no corpo e na vida dos oprimidos têm longa história no Brasil. A
tortura, que sempre existiu no nosso passado escravista, na Primeira República e nas ditaduras,
continua existindo e é cotidianamente praticada nas delegacias e presídios, mas são tornadas
invisíveis aos olhos da opinião pública. O mesmo acontece hoje com as execuções sumárias
praticadas por policiais.
A invisibilidade da violência institucional hoje tem a ver com a prática brasileira do esquecimento
que confronta os princípios da chamada ―Justiça de Transição‖ que é o conjunto de mecanismos,
judiciais e extrajudiciais, criados pelas sociedades para trabalhar com o legado histórico das
violações de direitos humanos e atrocidades cometidas em massa na passagem de um regime
autoritário ou totalitário para um Estado democrático de direito.
Esses mecanismos impõem como obrigação ao Estado, não apenas em relação às vítimas dessas
violações, mas a toda a sociedade: 1) investigar, processar e punir os violadores de direitos
humanos; 2) revelar a verdade às vítimas, seus familiares e a toda sociedade; 3) oferecer reparações
econômicas e simbólicas, desenvolvendo instituições de memória; e 4) afastar os violadores de
órgãos públicos e posições de autoridade. Na América Latina isso está condensado nas consignas de
Memória, Verdade, Justiça e Reparação.
O Brasil é o país mais atrasado na aplicação desses princípios, preservando a impunidade em
relação à violência institucional do Estado brasileiro em todos os níveis. As denúncias de agressões,
violações de direitos humanos, ações violentas e assassinatos praticados pelos agentes do Estado
contra a população submetida à pobreza e os movimentos sociais são cada vez mais freqüentes no
país.
Criminalização da Pobreza
Essas formas de violência institucional que acomete a população submetida à pobreza e os
territórios onde vivem têm raízes diretas com a violência repressiva da ditadura militar, que golpeou
os militantes políticos, boa parte deles oriundos da classe média.
É a impunidade e o esquecimento dos crimes de torturas, assassinatos e desaparecimentos de corpos
praticados durante a ditadura que estruturam a banalização do atual quadro violência institucional.
Na invisibilidade dos crimes atuais contra os habitantes dos territórios da pobreza está contido o
desprezo pelos marginalizados e excluídos da sociedade de mercado, mas também, a tolerância para
com as violações dos direitos humanos contra a vida e a integridade física, atingidas pela tortura e
pelas execuções sumárias.
É preciso romper a barreira do esquecimento e da verdade dos crimes cometidos pelo Estado ao
longo de nossa história e em particular na ditadura militar, para que haja tomada de consciência das
atuais violações e crimes que continuam progressivamente ocorrendo contra as populações
submetidas à pobreza, a ponto de transformarem-se em política de Estado.
Os habitantes dos territórios da pobreza, favelas e periferias, sobretudo a juventude negra são alvos
privilegiados de invasões e abordagens truculentas, seguidas de torturas e tratamentos cruéis e
degradantes, de encarceramento muitas vezes injusto e ―plantado‖, ou, no limite, de execuções
sumárias, às vezes com ocultamentos de cadáveres. Esse tratamento, ilegal do ponto de vista de
qualquer legislação, está banalizado, naturalizado, integrado à ―normalidade‖ da sociedade
brasileira.
A criminalização da pobreza é realizada essencialmente em dois eixos complementares e
simultâneos, um pela via legal e outro estritamente ilegal, porém tolerado pela sociedade.
O eixo legal é o encarceramento em condições totalmente degradantes. Dados do Departamento
Penitenciário Nacional apontam que a população carcerária do País saltou de 232.755 em 2000 para
473.626 em 2009, mais que dobrou, somando-se pessoas com penas definidas e que aguardam
julgamento. No mesmo período, a população brasileira total cresceu 11,8%. Pesquisas recentes
apontam que apenas 18% dessa população tem acesso a políticas de educação.
São Paulo congrega o maior número de presos do Brasil: mais de 150 mil, sendo que 50% tem entre
18 e 24 anos, com super representação da juventude negra.
Além disso, o cumprimento da Lei de Execuções Penais, que permitiria ao preso sair para o regime
semi-aberto depois de cumprida uma parte da pena, é dificultado ao máximo pelo Poder Judiciário e
pelas Administrações Penitenciárias, já que há poucas vagas em presídios especiais para isso.
Para os pobres também não vale a regra de que preso sem condenação em última instância pode
aguardar o julgamento em liberdade: quando o presidente do STF concedeu dois habeas corpus ao
banqueiro Daniel Dantas em menos de 48 horas, havia 211 mil presos na mesma situação. Injustiças
gritantes, presos indevidos por troca de nome, humilhação e arbitrariedades de toda espécie com os
parentes que os visitam, falta de assistência médica da qual decorrem graves seqüelas e às vezes até
a morte, falta de assistência jurídica e, além do mais, as torturas como castigo pelas denúncias das
más condições, este é o retrato do sistema carcerário feito para os pobres.
O eixo ilegal da criminalização da pobreza é realizado em flagrante contradição com a legislação:
são as execuções sumárias ou extrajudiciais realizadas por agentes do Estado – policiais militares e
civis, guardas municipais, agentes carcerários e outros – em serviço e fardados, ou fora de serviço,
contra pessoas descobertas em flagrante delito, contra suspeitos a partir de um ―padrão‖ pré-
determinado que tem a ver principalmente com sua condição social e sua raça ou etnia e ainda
contra os chamados ―inocentes‖, metralhados casualmente por se encontrarem em lugares onde a
pobreza é perseguida.
Apesar de ilegal, esta atividade é incentivada por uma parte da sociedade brasileira e sua mídia,
enquanto a opinião pública progressista ignora estes atos, tornados invisíveis. A justificativa para as
execuções sumárias é sempre a ―legítima defesa‖ jamais investigada ou provada. Os casos são
registrados nos boletins de ocorrência como ―resistência seguida de morte‖ ou ―auto de resistência‖,
a vida do assassinado é vasculhada na busca de razões que demonstrem um passado delituoso ou
obscuro e, o homicídio executado pelo agente do Estado não é registrado. A cena do crime é sempre
desfeita. Os mortos (ou semimortos) são jogados na caçamba do camburão policial e levados para
hospitais e as cápsulas das balas recolhidas.
Exemplos destas formas de execução foram os chamados ―Crimes de Maio‖ na suposta reação do
Estado contra o crime organizado em que mais de 490 pessoas foram assassinadas pelas forças
públicas sendo 60% com menos de 36 anos e apenas 94% sem qualquer histórico de passagem por
um distrito policial. Ou ainda as recentes mortes por espancamentos de dois jovens motoboys na
Grande São Paulo.
Além disso, em São Paulo, os policiais matam através dos chamados ―grupos de extermínio‖,
homens encapuzados executando chacinas, como forma de amedrontar as comunidades. A autoria
policial da maior parte das chacinas só vem a ser confirmada a contragosto das investigações
policiais, quando um grupo de extermínio torna-se tão saliente que não é mais possível esconder a
sua existência, como os ―Matadores dos 18″ (18º Batalhão da Polícia Militar) em 2007, os
Highlanders (que cortavam as cabeças dos assassinados), em 2008 e o grupo de Policiais acusados
pelos assassinatos de 23 jovens na baixada santista em 2010.
Por outro lado, não há estatísticas confiáveis das mortes por agentes do Estado, as instituições
acadêmicas e as autoridades se congregam em inépcia para obscurecer os crimes, enfiando-os na
categoria de ―homicídios‖ e transferindo-os para a ―violência da sociedade‖. As diversas contagens
variam pois os critérios inexistem, justamente como forma de impedir não apenas a investigação
policial, como também as análises acadêmicas que, na falta de um padrão confiável, se baseiam nas
estatísticas de saúde que distorcem a autoria do crime.
A criminalização dos movimentos sociais
O aprofundamento e continuidade das políticas neoliberais sob o governo Lula, a cooptação de
lideranças e de grande parte dos movimentos sindicais e sociais pelos aparelhos de Estado,
notadamente aqueles vinculados a CUT, têm favorecido na atual conjuntura o fortalecimento de
uma ofensiva de direita que aglutina partidos políticos tradicionais, poder judiciário, empresários e
a grande mídia comercial na propagação de uma ideologia que clama por repressão e criminalização
dos movimentos sociais combativos.
Exemplos disso são as perseguições e as tentativas de extinção judicial do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem-Terra MST e o fechamento de escolas vinculadas ao movimento em
assentamentos consolidados. Além da truculência com que são tratadas as ações do MST e do
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto MTST, em ocupações de terras rurais e urbanas que não
cumprem qualquer função social.
Em Americana no interior de São Paulo, a polícia militar sem qualquer decisão judicial que a
respaldasse, por duas vezes reintegrou a ―posse‖ de uma área pública ocupada pelo MST, para
devolvê-la à exploração ilegal por uma Usina no plantio de cana-de-açúcar.
Com o movimento sindical combativo, que ainda resiste à retirada de direitos sociais, demissões,
reduções salariais e ataques ao direito de greve, o processo de criminalização também vem
ocorrendo. Sofre pesadas multas, restrições de suas atividades através de ―interditos proibitórios‖
que, determinados pela justiça, impedem ações próximas das unidades de trabalho e a repressão
direta pela polícia militar.
Em conseqüência desta ofensiva conservadora, a impunidade e as ameaças de mortes e assassinatos
de lideranças de trabalhadores rurais e defensores de direitos humanos, principalmente no campo,
tem se intensificado. Desta forma os movimentos têm sido alvos constantes do poder judiciário e da
polícia em diversos estados do país e suas manifestações frequentemente são enquadradas pela
mídia comercial e pelo judiciário como similares ou vinculados com o ―terrorismo‖.
Segregação social
A segregação social é imposta pelo Estado brasileiro, como forma de restringir a presença e a
circulação da população submetida à pobreza, a determinados territórios da cidade, contendo-a em
espaços ―destinados a ela‖ e também, para ―higienizar‖ totalmente os territórios de interesse do
capital imobiliário, viabilizando a ―circulação segura‖ de investidores e ou seus empreendimentos.
Expressando-se na imensa desigualdade social, com o aprofundamento da pobreza urbana e o
crescimento das favelas e periferização da população, a resposta do encarceramento em massa de
pobres já parece não ser suficiente. Agora se faz necessário o controle dos territórios pobres por
meio de barreiras e ocupações militares como as operações ―Saturação‖ em São Paulo, visando
reforçar a estrutura social estigmatizadora e segregacionista.
As ocupações militarizadas e permanentes refletem uma política vinculada à noção de extermínio.
O controle permanente da vida dos moradores pelas forças de segurança por meio de toques de
recolher, abordagens humilhantes, invasões de domicílios, criminalização das pessoas e da cultura
popular têm sido cada vez mais o cotidiano das populações mais pobres das favelas e das periferias
urbanas.
Os métodos utilizados pelo Estado no processo de segregação social, além daqueles já abordados,
envolvem políticas como:
os chamados ―toques de recolher‖ e programas de intolerância total ou ―tolerância
zero‖adotados em muitas cidades do interior paulista e na grande São Paulo, cerceando
liberdades em especial de moradores de rua, adolescentes e jovens;
intervenções urbanísticas e obras como remoções compulsórias e construções de verdadeiras
muralhas que separam as comunidades pobres dos bairros abastados e territórios de interesse
do capital;
crimes onde o Estado com operações variadas de sua máquina, expulsa comunidades inteiras
para fazer valer seus interesses e de seus aliados, como foi o caso dos alagamentos
provocados recentemente pelo governo do estado de São Paulo através do controle de vazão
das águas do Tietê na região do Jardim Pantanal;
negação do direito à cidade com elaboração de legislações restritivas e que ferem liberdades
individuais e coletivas, como as mudanças em padrões urbanísticos atendendo a especulação
imobiliária.
total desrespeito à função social da terra e ignorância dos dispositivos preconizados no
Estatuto da Cidade e que deveriam figurar nos Planos Diretores.
Discriminação
Embora as discriminações sejam tratadas em capítulos específicos deste programa, em relação aos
direitos humanos torna-se importante pontuar alguns dos aspectos desta construção histórica.
É preciso dedicar especial atenção ao combate de toda discriminação, tendo em vista que as
políticas públicas do Estado brasileiro são fortemente permeadas por discriminações de gênero,
raça, orientação sexual ou identidade de gênero, geração, religião, entre outras que permanecem
impregnadas nas instituições. Isso só faz agravar o conjunto das violações discutidas anteriormente,
contra determinados grupos sociais.
A população negra, sobretudo a juventude, são as principais vítimas do Estado brasileiro tanto por
ser a maioria da população submetida à pobreza, como pelo estigma carregado pela sua negritude.
O termo ―faxina étnica‖ usado no texto específico da comunidade negra, talvez seja o que melhor
denuncie a ampliação do extermínio de jovens negros nas periferias das cidades.
Os registros de ameaças, agressões e outras formas de violência contra mulheres vêm crescendo em
todo o país como crescem também os casos de violência fatal, originadas pela não apuração de
denúncias registradas junto aos órgãos de segurança e totalmente ignoradas pelos agentes do
Estado.
Aumentam também as agressões e assassinatos, motivados pela homofobia e pela intolerância
contra a população LGBT.
Essas são apenas algumas das formas de manifestações discriminatórias que deverão ser combatidas
frontalmente, por um Estado comprometido como o fim de toda forma de discriminação e
preconceito.
Desta forma ao traçar seu programa para o governo do estado de São Paulo o PSOL incorpora com
radicalidade e prioridade absoluta a temática dos Direitos Humanos, comprometendo-se com
políticas que levem a:
1. Fim do registro de ―Resistência seguida de morte‖ ou ―Auto de resistência‖ e pela investigação
do homicídio cometido pelos agentes do Estado;
2. Desmantelamento dos grupos de extermínio;
3. Desmilitarização das polícias e formação ideológica continuada da corporação;
4. Desmilitarização das periferias urbanas;
5. Julgamento e punição para os agentes do Estado que cometem tortura e execuções sumárias;
6. Aplicação aos presos da Lei de Execuções Penais e respeito à integridade física dos presos e de
suas famílias;
7. Não à anistia aos torturadores do período da ditadura militar
4. Meio-ambiente:
É no Estado de São Paulo que está situado o núcleo do sistema econômico e político nacional. As
opções tomadas no âmbito geográfico do estado moldaram o Brasil atual desde a época da
economia exportadora de café e da industrialização por substituição de exportações, impulsionada
entre 1930 e 1980-90.
Foi a industrialização que impulsionou a urbanização do país (e do estado) e a mudança da estrutura
econômica e social. Foi em São Paulo que se instalou o carro-chefe da industrialização depois a sua
fase inicial, a indústria automobilística.
E, cinqüenta anos depois, é a realidade criada pela interação deste processo com incorporação do
neoliberalismo pela burguesia brasileira depois de 1990 que deve ser repensada para propormos um
modelo de sociedade e de civilização alternativo ao desenvolvimentismo sustentado por Dilma (e
Lula), Serra e Marina (esta com uma pitada de verde).
Temos hoje uma sociedade complexa, altamente urbanizada, mas profundamente desigual,
carregando um legado histórico de exclusão.
Qualquer proposta de outra vocação para São Paulo (e para o Brasil) será cosmética se não alterar a
matriz de energia e transportes e as relações da economia nacional com o mercado mundial.
1) A matriz de transportes rodoviarista já atingiu seu ápice e qualquer expansão posterior envolve
uma regressão da sua funcionalidade. Isso vale tanto para os deslocamentos urbanos em automóveis
e ônibus como para o transporte de cargas por longas distâncias em caminhões. Os poderes públicos
tem reforçado automáticamente o parque industrial estabelecido em torno das montadoras: quando
estourou a crise econômica internacional em 2008, tanto Lula com Serra competiram nos incentivos
fiscais à produção de automóveis, sem exigir nenhuma contrapartida seja em eficácia energética
(como fez o governo norte-americano), seja em prioridade para o transporte coletivo.
A alternativa é estabelecer políticas de desestímulo ao uso do automóvel (impostos para os veículos
4x4, a diesel ou de maior cilindragem) e uma rápida expansão dos sistemas e deslocamentos por
trem, metrô e ônibus. Há um mito que afirma que a construção destes sistemas é uma tarefa de
longo prazo. Mas ele é desmentido em muitas partes do mundo: enquanto Xangai construiu, depois
de 1995, 420 km de linhas de metrô, a capital de São Paulo construiu depois de 1970 apenas 66 km.
Mas cidades como Seul e Madrid estão expandindo rapidamente seu transporte sobre trilhos.
Ora, hoje um sistema integrado e intermodal de transportes deve ser concebido em escala
intermetropolitana, abarcando não apenas a região metropolitana de São Paulo, mas também, como
mínimo, o Vale do Paraíba e a região de Campinas – que, de conjunto, compõem uma das maiores
manchas urbanas integradas do mundo.
O mesmo raciocínio deve presidir a organização do transporte interurbano de cargas, que pode ser
feito de forma muito mais racional pela articulação entre ferrovias e hidrovias.
Três questões pontuais e urgentes neste tópico são:
- banir o uso do diesel em todas as regiões urbanas – responsável por milhares de mortes de pessoas
com a saúde mais frágil;
- reverter a deterioração da qualidade de vida dos paulistanos em especial mas dos paulistas em
geral restringindo a expansão do sistema viário e o uso dos automóveis e das motocicletas – que,
novamente, ceifam a vida de milhares de pessoas. Isso requer introduzir todo tipo de normas e
fiscalizações que direcionem as necessidades de deslocamentos das pessoas para sistemas de
transportes públicos baratos e de qualidade, em especial sobre trilhos; e
- generalizar a criação de ciclovias e o deslocamento em bicicletas para trajetos curtos em boa parte
do estado.
2) Embora a matriz de energia tenha se apoiado na construção de hidroelétricas da Bacia do Paraná,
nas últimas décadas esse potencial se esgotou. Pouco ou nada tem sido feito em São Paulo para
evitar que essa matriz se torne cada vez mais suja, com a instalação de usinas termoelétricas, em
especial movidas a carvão ou diesel, altamente poluentes. Em muitas regiões do pais, isso pode ser
substituído pela geração de energia eólica e solar – ou ainda transitoriamente pela queima de
bagaço.
Mas a principal medida a ser tomada pelo governo estadual está em deslanchar uma política geral
de elevação da eficácia energética, estabelecendo padrões para a indústria, construção civil e
agricultura.
Uma medida pontual de racionalização nesta área está na desativação da Usina Edgard Borden,
construída pela Companhia Light entre 1926 e 1950, cuja manutenção exige hoje a reversão do
curso do Rio Pinheiros para o sistema Billings/Guarapiranga, aprofundando o comprometimento do
principal manancial de água potável – já profundamente deteriorado pela ocupação desordenada
estimulada por sucessivos governos da capital e do estado.
3) Isso está diretamente ligado à vocação da agricultura no estado reforçada pelas políticas dos
governos Serra (no estado) e Lula (no plano federal): a plantação de cana para a produção de açúcar
e etanol. Esta opção, alimentada pelo vicio rodoviarista, alimentou a transformação do interior do
estado em um imenso canavial, um vasto deserto verde nas mãos do agronegócio, altamente
dependente do uso de produtos químicos nocivos à saúde e profundamente destrutiva para as fontes
de água potável.
A reforma agrária que defendemos, estimulando a produção familiar, busca priorizar a produção de
alimentos e a agro-ecologia, bem com a redistribuição da riqueza acumulada na forma de
propriedade fundiária, em nosso estado, nas mãos de algumas dezenas de famílias (também
responsáveis pela plantação de laranja e exportação de seu suco).
A reorganização da agricultura no estado a partir de um programa de reforma agrária é, portanto,
ligada a uma opção econômica, social e ambiental que visa reinserir o tecido urbano em um terreno
rural cuja biodiversidade tenha sido, pelo menos em parte, restaurada e que seja cuidada por aqueles
que se dedicam a lavoura.
4) O Estado de São Paulo e seus municípios demanda hoje a estruturação de um vasto sistema de
tratamento de resíduos sólidos e líquidos. O lixo e o saneamento devem preservar e mesmo
recuperar os mananciais e os lençóis freáticos, ampliando a qualidade de vida de toda a população.
A universalização da coleta e tratamento de esgotos é inseparável da preservação das fontes de água
potável e recuperação dos rios e represas. A generalização da coleta seletiva e reciclagem de boa
parte do material descartado hoje como lixo permite incorporar importantes parcelas da população
marginalizadas em cooperativas além de criar as condições de gerar energia pela captação do
metano dos depósitos de lixo orgânico. Uma ampla educação ambiental, legislação e fiscalização
devem estimular a eliminação ou a reciclagem de produtos nocivos, como sacos plásticos, óleo,
pilhas e materiais eletrônicos, etc.
5) O projeto do PSOL para o Estado de São Paulo pretende reorganizar a economia a partir de um
olhar sócio-ambiental, cuja prioridade é a qualidade de vida da população. Temos uma estrutura
produtiva sofisticada, uma economia do conhecimento que deve ser alavancada para criar valor nos
ramos de ponta do desenvolvimento tecnológico da atualidade: informática, medicamentos, saúde,
educação e cultura, todos entendidos como setores da economia contemporânea. É esta
reestruturação do tecido produtivo e do território do estado que pode alavancar uma economia do
bem-estar e do direito a ter direitos para todos.
5. Saúde:
Saúde não se vende
Louco não se prende
Quem ta doente é o sistema social
(Bloco Suvaco de Cristo - 1990)
Filas gigantescas, demora no atendimento, falta de remédios, de médicos e profissionais de saúde,
trabalhadores doentes atendendo doentes... O quadro atual da saúde pública no Brasil exige uma
atuação dos socialistas e, por conseqüência, de nosso partido, o PSOL. A tarefa de elaborar um
projeto socialista para o tema da saúde não é dos mais difíceis, visto que no Brasil os movimentos
sociais já produziram um grande acúmulo sobre tema, em especial no fim dos anos 1970 e começo
dos 80. Esse acúmulo esteve sintetizado nos movimentos pelas reformas sanitária e psiquiátrica.
A proposta de saúde do PSOL está baseada neste acúmulo histórico. O maior acúmulo da reforma
sanitária brasileira aconteceu em 1986, na 8ª Conferência Nacional de Saúde, que votou propostas
que em sua maioria foram incorporadas na Constituição de 1988 e aprovou, entre coisas, que a
saúde no Brasil depende de vários fatores, entre eles a reforma agrária, o não pagamento da dívida
externa e a estatização da indústria farmacêutica.
Apesar desse grande acúmulo, fruto também de um movimento social de bastante inserção, a
reforma sanitária estagnou-se após a Constituição de 1988, tendo em alguns momentos regredido.
Havia uma grande ilusão institucional no movimento, bastante influenciado pela política reformista
do PCB na época (partido de maior inserção no movimento) e pelo adesismo do PT a ordem
vigente.
As campanhas de Plínio Sampaio e de Paulo Búfalo em São Paulo re-afirmam as bandeiras das
reformas sanitária e psiquiátrica e contribuem para a re-construção desses movimentos. O PSOL
reivindica como sua proposta para a saúde a ideia da Reforma Sanitária.
Direito à Saúde e capitalismo: contradição solucionada pelo socialismo
Para o PSOL, o direito a saúde passa, fundamentalmente, pela garantia de trabalho em boas
condições e com com remuneração digna; pelo direito a moradia confortável com água encanada,
saneamento básico e energia elétrica; por condições de transporte civilizadas; pelo direito à
educação pública e de qualidade até a universidade; reforma agrária com o fim do agronegócio;
pelo uso do patrimônio natural em defesa da soberania nacional e respeito ao meio ambiente; que os
recursos utilizados no pagamento da dívida pública sejam transferidos para as políticas de saúde,
educação, previdência, moradia, entre outros direitos sociais. Neste sentido, os socialistas
asseguram que ter boas condições para desenvolver a saúde de nosso povo não significa ausência de
doença. Para nós, o capitalismo é a maior máquina de adoecimento que já existiu, e, embora tenha
criado soluções para diversos problemas de saúde, estas tendem a existir sob o domínio da forma
mercadoria. Neste sentido, o direito à saúde deve passar, em primeiro lugar, pela luta por condições
de vida que impeçam o adoecimento evitável, como o que é gerado pela dengue, pela obesidade,
pelo envenenamento por agrotóxicos, entre outros.
Entendemos que a doença (e o acesso a seu tratamento) é determinada por questões sociais. Uma
pessoa que trabalhe mais de 40 horas por semana, que more em local sem água encanada, sem rede
de esgoto, que ande em transporte coletivo demorado e lotado, tem mais chance e possibilidade de
contrair determinadas doenças do que uma pessoa que tenha uma situação de vida mais confortável.
Mesmo em doenças que tenham determinações genéticas, o acesso ao tratamento dessas doenças
estará relacionado com questões econômicas e sociais.
Assim, não devemos perseguir apenas um projeto técnico-gerencial para o SUS. Ele é necessário e
está na ordem do dia. Mas não adianta só tratar as doenças se as pessoas pobres voltam a viver nas
mesmas condições produtoras de agravos à saúde. Se não forem enfrentadas estas condicionantes
sociais, não haverá sistema público, por mais bem gerido que seja, que dê conta de uma demanda
cujo principal aspecto a ser enfrentado está no fato de convivermos com um modelo de sociedade
campeão na produção de doenças.
O Sistema de atenção à saúde no Brasil hoje
Sistema privado de saúde: muitas faces de um único problema
Nos países que conseguiram ter sucesso na implantação de um sistema de saúde universal e público
uma mesma trajetória teve de ser trilhada: enormes restrições ao setor privado (caso de Canadá e
Inglaterra, em maior grau, e da França, em menor grau) ou a estatização de todo o setor de atenção à
saúde (caso de Cuba, por exemplo). Em comum, esses países tem o fato de que não apenas gastarem
bastante em saúde, mas gastarem com qualidade – políticas de saúde que tem impacto na qualidade
de vida da população. Dentre as diferenças, o que mais salta aos olhos é o fato de que apenas Cuba -
um país periférico, com passado colonial como o Brasil– consegue romper com a situação de
dependência e garantir o direito à saúde à sua população. Todos os demais fazem parte do centro
imperialista dos dias de hoje. E mesmo estes países centrais tem promovido reformas que
privatizam parte do sistema de saúde e os colocam no circuito da mercantilização direta.
No caso do Brasil, como na maioria dos países latinoamericanos, vive-se o pior dos dois mundos.
Subfinaciamento do sistema público, que atende de modo exclusivo pelo menos 70% da população,
e um sistema privado com gastos elevados, altíssima incorporação tecnológica e baixa
resolubilidade, que é dependente de recursos públicos e atende a uma pequena fração da população
brasileira. Isto quer dizer o seguinte: em uma sociedade em que a regra, ao longo da história, é a
segregação da maior parte de sua população a uma situação de mínimos políticos, o direito à saúde
é sacrificado em detrimento de um sistema privado de atenção à saúde que é um negócio dos mais
lucrativos. Isso quer dizer que na sociedade dependente em que vivemos, na qual se lucra com o
corte de aposentadorias, com fábricas de diplomas, lucra-se também com um sistema de saúde que,
do lado público, carece de recursos financeiros e tecnológicos, e de força de trabalho; que, do lado
privado, drena os recursos estatais e da renda dos trabalhadores que pagam um plano de privado, em
sua maioria de péssima qualidade, para um grupo seleto de empresas cujo negócio é faturar sobre as
doenças do povo.
Isto quer dizer que o capitalismo brasileiro é duplamente perverso: gera adoecimento em uma escala
assustadora, bem como contém empresas que lucram com a doença das pessoas. É evidente que os
socialistas não admitem, por exemplo, que ―o tratamento do câncer dê lucro a um empresário‖,
como diz Plínio Sampaio.
Os limites do Sistema Único de Saúde na atualidade
O processo de saúde-adoecimento faz parte da natureza humana, em qualquer sociedade existente –
capitalista, feudal, em transição para o socialismo, etc. Por isso, a luta por políticas públicas que
lidem com as diversas formas de adoecimento é um capítulo importante da luta que trabalhadores
travam contra aqueles que vivem de explorar o trabalho alheio. No Brasil, as lutas em defesa pelo
direito à saúde estiveram entre as mais importantes do processo que derrubou a ditadura civil-
militar de 1964 e conseguiram emplacar, na Constituição de 1988, uma proposta de sistema de
saúde público que abrangesse toda a sociedade brasileira.
A legislação aprovada na Constituição de 1988 representou um avanço no que diz respeito ao
direito à saúde. Estes avanços, no entanto, não se traduziram em uma universalização dos preceitos
constitucionais, persistindo em outras bases, mesmo após a regulamentação do Sistema Único de
Saúde, em 1990, diversas características de um sistema de saúde que tende a perpertuar o padrão de
segregação social da sociedade brasileira.
É possível afirmar que mesmo o texto de 1988 não representou a síntese mais desejável do amplo
processo de luta em defesa da saúde de então, que foi o relatório da VIII Conferência Nacional de
Saúde de 1986. Pode-se dizer que a persistência de um setor privado na prestação de serviços de
saúde constitui um bloqueio estrutural à afirmação da saúde como um direito de todos no Brasil.
Assim, esse sistema privado que seria ―complementar‖, conforme diz a Carta de 1988, subordina o
conjunto das práticas de saúde e termina por distorcer as políticas públicas expressas no SUS.
Apesar de seus problemas de origem, o processo político de formação do SUS apontou para um
conjunto de diretrizes gerais muito importantes para o delineamento da ampliação do direito à
saúde. O seu conjunto de princípios bastante, entre os quais os chamados princípios doutrinários -
universalidade, integralidade, equidade – e os chamados princípios organizacionais -
descentralização, regionalização, hierarquização e controle popular – sintetizam as grandes virtudes
da proposta original do SUS. É preciso que nosso programa se debruce sobre o que é cada um
destes princípios e diretrizes e também como eles não vem sendo cumpridos. A despeito da
produção acadêmica e política ser bastante prolífica e polêmica, a breve explicação a seguir
pretende realizar uma síntese capaz de compreender quais são os maiores desafios no que diz
respeito a cada princípio. É conveniente lembrar que estes princípios se entrelaçam e, antes de se
constituírem em categorias arbitrárias, são linhas gerais que procuram garantir o direito à saúde
- Universalidade: garante o acesso de todos ao sistema de saúde. Até 1988, só aqueles que
tinham carteira-assinada é que tinham acesso ao INAMPS, ficando os demais relegados aos
―centros de caridade‖. A universalidade garante que haja acesso a saúde, independente de ser negro
ou branco ou índio, homem ou mulher, hetero ou homossexual, etc. Este princípio é ferido em
situações bastante simples e corriqueiras, como recusa de atendimento por não se ter comprovante
de endereço, chegando a situações estruturais graves como as desigualdades regionais e de classes
sociais no acesso a determinadas tecnologias – acesso a certos tipos de exames e ou medicações –
ou mesmo a inexistência de serviços de saúde por falta de profissionais, etc.
- Integralidade: este princípio, cujo conceito é o mais polêmico, visa à garantia do acesso à
atenção à saúde de maneira integral, desde, por exemplo, a prevenção até a assistência farmacêutica.
Além dos exemplos citados acima, em que o regime de segregação social opera no sentido de
bloquear o direito à saúde como um todo, existem políticas que atentam diretamente contra o
princípio em questão, como o caso do programa Farmácia Popular, criado pelo governo Lula, que
passou a vender, mesmo a custo baixo, medicamentos que já eram distribuídos gratuitamente nos
postos de saúde.
- Equidade: este princípio pretende garantir que o direito à saúde seja implementado de
acordo com as necessidades de cada indivíduo ou grupo social. Assim, como exemplo, deve-se
considerar que nem todos os cidadãos devem tomar medicações regularmente, mas apenas aqueles
que precisam fazê-lo; procedimentos com grande incorporação tecnológica devem ser direito de
todos, mas só aqueles que necessitam devem de fato ser submetidos a eles. Enfim, a equidade é a
garantia da igualdade de oportunidades, considerando as necessidades de cada grupo social. A
equidade não impede que os grupos sociais específicos, como negros e negras, surdos, índios,
mulheres, crianças, idosos, não tenham políticas próprias de saúde, sem prejuízo para o sistema
geral;
Com relação aos princípios organizacionais:
- Descentralização, hierarquização e regionalização: a descentralização garante que cada
esfera do sistema (municipal, estadual e federal) tenha atribuições específicas, com comando único
e interligadas; isso combina-se com a hierarquização, que visa distribuir responsabilidades em
níveis distintos de complexidade; ainda há a regionalização, que combina-se com os outros dois
conceitos ao garantir que municípios pequenos (e com menor arrecadação) não fiquem com
responsabilidades acima do que tem capacidade;
- Participação popular: Cabe um destaque neste ponto. Pensado como uma maneira de
fortalecer participação dos trabalhadores na implantação das políticas de saúde, este princípio
esbarra no caráter cada vez mais impermeável do Estado brasileiro em relação às demandas
populares. Seja porque as decisões mais importantes sobre as políticas de saúde são tomadas pela
cúpula dos governos, seja porque os governos tem uma tradição de desrespeitar as decisões das
instância de controle social (através da coerção, da cooptação ou de ambos), o fato é que os limites
para a participação popular vem se estreitando. Este princípio tem como carro-chefe a existência de
conferências e conselhos, da esfera local a nacional, passando pela municipal e estadual. Cada um
desses espaços deve ser composto por 50% de usuários, 25% de trabalhadores e 25% de gestores.
Além dos fatores citados, um dos problemas do controle social é que a sociedade não se divide
entre esses três segmentos, o que, de certa forma, borra a contradição fundamental entre
empresários e trabalhadores. Com uma política eficiente de cooptação, as prefeituras e estados
impedem a articulação independente de usuários e, mesmo quando as conferências aprovam algo
avançado, o gestor simplesmente não implementa. O maior exemplo disso é a resolução 322 do
Conselho Nacional de Saúde, que estabeleceu o que é saúde para efeitos de gasto, sistematicamente
descumprida. Em São Paulo, que é um dos estados em que ocorrem os maiores ataques ao SUS, o
governo estadual sempre afronta os mecanismos de controle social: em 2010, não convocou a
Conferência Estadual de Saúde Mental, o que faz parte de um processo de ataque sistêmico às
políticas públicas para o setor.
As ameaças ao SUS no Brasil e em São Paulo: Privatização e Reformas Neoliberais
Financiamento
Considerando que desde os princípios do SUS, nunca houve financiamento suficiente para que os
princípios constitucionais fossem colocados em prática. Isso, ao longo da história recente, quer
dizer que o padrão estrutural de subfinanciamento permaneceu o mesmo tanto nos governos FHC
como nos governos Lula. Para se ter uma ideia, o gasto em saúde em relação ao PIB tem se mantido
no mesmo patamar (de 3,2 a 3,4%) há mais de 10 anos. Isso é quase a metade do que recomenda a
Organização Mundial de Saúde (que é de 6%) e é bem menos do que a média latinoamericana
(4,5%). A partir de 2006 ocorre um fenômeno alarmante: a maior parte do gasto em saúde deixa de
ser público (cerca de R$79 bilhões) e passa a ser privado (cerca de R$ 88 bi).
Nas supostas explicações para o problema, PSDB e PT se equivalem. Ambos escondem do povo
que, somente no ano passado, o Estado Brasileiro pagou R$ 380 em títulos da dívida aos
banqueiros. Ambos omitem que a saúde pública recebeu R$ 59 bilhões, menos de 1/6 daquele valor.
Isto quer dizer que, da carga tributária elevada, que é paga majoritariamente pelo povo pobre, uma
vez que o sistema é altamente regressivo, a maior parte dos recursos é desviada dos direitos sociais
e vai direto para o bolso de uma classe parasitária. E nas supostas soluções defendidas por aqueles
partidos, nenhum deles toca nos mecanismos que garantem este desvio de recursos: a
Desvinculação dos Recursos da União, que confisca 20 % do orçamento da União para o pagamento
das dívidas; o superávit primário, que estrangula os gastos do setor público; as renúncias fiscais e de
contribuições previdenciárias dadas empregadores; as diversas formas de contingenciamento de
recursos, entre outros. Tanto PT e PSDB mentem ao dizer que são a favor de mais recursos para a
saúde ao defenderem a CPMF, pois este imposto é regressivo e só faz retirar mais recursos do povo
pobre.
Mesmo naquilo que dizem defender, PT e PSDB são esquivos. Veja-se, por exemplo, o caso da
Emenda Constitucional 29 (EC-29), que estabelece atribuições de financiamento por esfera de
governo. Aprovada em 2000, ela passou pelo 2o governo FHC e pelos dois governos Lula e não foi
regulamentada. Isto quer dizer que, na prática, nenhum dos dois blocos partidários da ordem
defende o financiamento necessário ao direito à saúde
No que diz respeito ao financiamento, São Paulo mais uma vez figura entre os campeões do descaso
com a Saúde. Os Ministérios Públicos Federal e Estadual condenam o governo estadual por não
cumprirem o mínimo definido pela EC-29. Para piorar, o estado é reconhecido como um dos que
menos apoia as diversas ações de saúde, focando-se apenas na atenção hospitalar, que, com a
expansão do modelo das Organizaçẽos Sociais (OSs), tem sido muito distorcido.
O sentido do processo não deixa espaço para dúvidas: o sucateamento do SUS tem como
pressuposto o incremento da privatização da atenção à saúde.
Privatização dos Modelos de Gestão
Sob a hegemonia de um processo de reformas neoliberais, o desenvolvimento truncado do SUS
esteve sempre na dependência da capacidade de o Estado investir na criação de unidades de saúde
(hospitais, postos de saúde, CAPS, etc), na aquisição de equipamentos. No entanto, o ponto mais
importante das políticas públicas de saúde é a contratação de trabalhadores capacitados para
defender o direito à saúde do conjunto da população brasileira. Esta necessidade, porém, tem se
mostrado incompatível com as políticas implementadas pelos governos pós 1989, de Collor a Lula.
Para se ajustar às necessidades de drenagem da renda nacional para o capital financeiro, diversas
reformar foram promovidas de maneira a estrangular o gasto público. Além das medidas citadas
acima, no item financiamento, há uma em especial que limita de forma decisiva a capacidade do
Estado brasileiro implementar políticas públicas: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Aprovada
em 2000, esta lei estabelece entre outras coisas que a administração pública deve ter um teto
(bastante restrito) para gastos com pessoal. A LRF tem um objetivo não declarado muito nítido:
impedir o crescimento da abrangência e da qualidade das politicas sociais, de forma a não deixá-las
―competir‖ pelos recursos que devem pagar os títulos da dívida.
Para complementar esta medida, os governos tucanos promoveram, a partir de fins da década de
1990 a ―reforma do estado‖, eufemismo criado para absorver os princípios administrativos das
grandes corporações privadas com vistas a criar ―agilidade‖ e ―eficiência no setor público, mas que
na verdade se prestam, fundamentalmente, a aumentar a exploração e a pressão sobre os
trabalhadores do serviço público, tornar a administração menos transparente e potencializar o
estrangulamento de recursos. É essa a matriz das ―inovações gerenciais‖ no serviço público criadas
por tucanos (em São Paulo, representadas pelas Organizações Sociais – OSs) e petistas (Fundações
Estatais de Direito Privado – FEDP, já funcionando na Bahia e em Sergipe).
Diversos questionamentos tem sido feitos a estes modelos, que não se mostraram mais ―eficientes‖
na gestão dos recursos; do contrário, muitos serviços (em especial hospitais, mas já há casos de
unidades básicas de saúde e CAPS) apresentam baixa resolubilidade, com escolha dos casos
―menos dispendiosos‖ e restrição de acesso, além de gestão obscura dos recursos financeiros e
ausência ou distorções do processo de controle social. Em São Paulo, o sub-relatório de OSs da CPI
dos Gastos em Saúde, feita pelo deputado estadual Raul Marcelo, demonstrou as dificuldades em
obter dados referentes aos serviços geridos por OSs.
Para piorar este cenário, quem trabalha nestes locais sofre com baixos salários, jornadas elevadas,
assédio moral, ritmo extenuante, insegurança sobre sua continuidade no emprego. Nada do que
precisa um servidor público para poder se dedicar ao cuidado à saúde da população.
Assim, o que se entende como ―novos modelos gerenciais‖ deve ser entendido como privatização
dos modelos de gestão. Nunca é demais lembrar que este modelo está em franca expansão, pois a lei
aprovada na Alesp tornou todos os serviços de saúde do estado suscetíveis a serem geridos por OSs,
e uma deputada da base do governo Serra fez uma emenda que permitia a cobrança por internações
e procedimentos nos hospitais públicos. Mais uma vez, o PSOL tem assumido a linha de frente
contra as privatizações, seja denunciando este processo na Alesp, seja se incorporando a iniciativas
como o Fórum Popular de Saúde de SP e a Frente pela Municipalização do Hospital Ouro Verde de
Campinas.
Políticas de atenção à saúde
As formulações iniciais dos defensores do SUS defendiam que fosse criada o sistema de atenção à
saúde no Brasil se organizasse a partir de uma sólida rede de atenção básica, isto é, uma rede de
postos de saúde com alto grau de resolutividade, nas áreas de prevenção, cura, reabilitação, que
tenha amplo acesso a atenção à saúde mental, atividades físicas, entre outras. Que ela fosse
integrada com uma rede de serviços de atenção secundária, onde há especialidades médicas e de
reabilitação, por exemplo. Que houvesse uma rede de atenção à urgência e emergência, com pronto-
socorros e ambulâncias integradas. Que todos estes serviços tivessem a retaguarda de um sistema
hospitalar bem equipado. E que os profissionais que trabalhassem neste sistema tivessem uma
formação desde o início voltada para o cuidado à saúde do povo brasileiro, fossem bem pagos e
tivessem boas condições de trabalho. Esses são, grosso modo, os traços gerais da utopia sonhada
por aquelas e aqueles que defendem o SUS como direito social universal.
Embora com grandes avanços, como o programa DST/AIDS ou a expansão da rede de Centros de
Atenção Psicossocial (CAPS), o que se observa atualmente, no que diz respeito às políticas de
atenção à saúde são grandes retrocessos. Passando pela falta de medicamentos para pacientes com
AIDS, pelos ataques sistemáticos (em especial por parte do governo do PSDB em São Paulo) aos
avanços da luta antimanicomial e da reforma psiquiátrica, pelas debilidades crônicas e estruturais do
Programa de Saúde da Família, chegando às políticas que nem chegaram a se constituir como tais,
como a Rede Nacional de Saúde do Trablhador (RENAST), as consequências do processo de
desmonte lento e gradual do SUS se fazem sentir de forma mais acentuada nos últimos anos. Se
considerarmos que o SUS já vai para 22 anos, e que o Programa de Saúde da Família, que tem 16
anos, cobre apenas 47,7% da população brasileira, vê-se que a situação é de uma calamidade
naturalizada por uma sucessão de governos sem compromisso com a atenção pública à saúde.
Por isso o PSOL defende a expansão da rede assistencial com qualidade e de forma a contemplar os
anseios do povo brasileiro e paulista pelo direito à saúde. Os eixos de nosso programa são:
1. Sistema Único de Saúde 100% público, que não seja refém do capital ligado aos
controladores de planos de saúde e das indústrias de equipamentos e farmacêutica;
2. Fim do estrangulamento financeiro do SUS;
3. Fim das terceirizações (seja via OSs, OSCIPs ou FEDP, entre outras);
4. Contratações imediatas de profissionais de todas as categorias da área da saúde por
concurso
público e de um plano de carreiras unificado para @s trabalhador@ s do SUS;
5. Autonomia do movimento e de democracia real nos espaços de controle social;
6. Universalização da atenção básica, cuja principal estratégia em nosso país é a Saúde da
Família;
7. Pelo aumento dos gastos em saúde no Estado de São Paulo
8. Expansão da rede hospitalar, de urgência e emergência e de atenção ambulatorial
especializada;
9. Ampliação e consolidação dos serviços de Vigilância à Saúde;
10. Acesso equânime às tecnologias que podem prevenir, curar e reabilitar brasileir@s que
sofreram agravos de saúde;
11. Sistema universitário público que forme profissionais em número suficiente e afinados
com as necessidades de saúde do povo;
12. Garantia de programas especiais destinados aos setores mais oprimidos como mulheres,
negros, indígenas, LGTTB, portadores de deficiência, idosos, crianças e juventude, e às
regiões onde a assistência é mais crítica, como o Vale do Ribeira;
13. Legalização do direito ao aborto garantido integralmente pelo SUS;
14. Defesa da saúde do trabalhador em seu processo de trabalho.
8. Educação
Enfrentando a tecnocracia em defesa da Qualidade Social
Todos os dados que podemos dispor sobre os recursos destinados a educação dão conta de uma
mesma linha mestra perseguida há tempos pelos sucessivos governos paulistas, mas não só, também
pelo governo federal: gasta-se muito com o pagamento da dívida pública e resta o pouco disponível
para custear as políticas sociais.
Mais do que isto, ocorre que as políticas adotadas operam visando uma enorme contenção de
recursos, reduzindo os custos correntes, em especial os gastos com pessoal, para mais uma vez
drenar os que for ―poupado‖ para os cofres de banqueiros e rentistas.
Enquanto isso, a educação vai de mal a pior. Para explicarem o mau desempenho da rede de ensino,
os governos fazem crer que o problema é apenas gerencial – dos ―recursos humanos‖ que dispõem,
isto é, os professores, considerados então como descompromissados ou incompetentes, ou da má
gestão da escola. Daí que as soluções que encontram são também de ordem gerencial: bonificação
para os melhores profissionais, premiação por mérito e que tais, fazendo valer nas escolas e nas
redes de ensino a lei fundamental da concorrência de mercado, como se gerenciassem uma grande
empresa.
O que temos observado nos últimos anos é o estabelecimento de uma relação contábil na educação,
com repasse de recursos de acordo com o número de matrículas, e a adoção de políticas públicas
que buscam acatar as exigências impostas pelos organismos internacionais de contenção de
recursos, em detrimento da ampliação necessária dos investimentos na área educacional e da
expansão do ensino público de qualidade.
Assim, buscam atender apenas os aspectos quantitativos em prejuízo dos qualitativos, demitem em
massa os profissionais da educação, em nome da ―racionalização de custos‖, do ―enxugamento da
máquina‖, superlotando as salas de aula, congelando a expansão da rede física e dispensando a
adequada relação que deve existir entre professor e número de alunos em sala de aula.
Tal tem sido a forma de pensar e agir daqueles que definem as políticas públicas – do PSDB ao PT,
cuja ―competência técnica‖ está à serviço dos mandamentos do mercado e cuja ―eficiência‖ levou o
ensino público à bancarrota pedagógica.
É necessário inverter a lógica do debate. Trata-se, antes, de firmar compromisso com as propostas
que surgiram dos movimentos em defesa da educação pública e criar melhores mecanismos para
uma gestão verdadeiramente democrática, com ampla participação popular. Educação, para o
PSOL, é um direito que deve ser garantido com qualidade para o conjunto da sociedade. Não se
pode confundir direito com serviço, mal barateado pelo mercado. A questão central continua a ser o
investimento público para a educação, bem como para todas as políticas sociais, cujo financiamento
têm sido drenado para o ajuste fiscal e pagamento da dívida pública. Para ampliar os recursos é
necessário enfrentar o problema da dívida.
Por outro lado, também é necessário reverter completamente as políticas educacionais
implementadas e vigentes. Há tempos a educação é arrochada por diversos instrumentos de
avaliação do sistema de ensino (IDEB, IDESP, SARESP, provinhas e provões) que orientam a definição
das políticas públicas, que convertem o direito à educação de qualidade em uma mercadoria, um
―serviço‖ a ser prestado, cuja qualidade pode ser demonstrada em índices, estatísticas e gráficos de
quanto o serviço ―rendeu‖ e estipulam metas de produtividade; exploram a simpatia dos
―consumidores‖ em belas campanhas publicitárias. Assim, se cria uma escola que se presta às
estatísticas, mas que desconhece a escola real, e aquilo que se passa em seu dia-a-dia.
Nada disto serve aos interesses da sociedade. Para nós, a educação como direito de todos se
inscreve em um contexto maior, em um programa político que pretende, a um só tempo, reverter a
barbárie e o processo de desumanização crescente; reduzir as desigualdades sociais e promover a
igualdade. E isto pressupõe a redefinição do papel do Estado e outro modelo de gestão, plural e
democrática.
Os eixos e princípios aqui defendidos não se pretendem novos, inéditos – pelo contrário: as
referências para a elaboração deste programa são duas: o Plano Nacional de Educação: Proposta
da Sociedade Brasileira [PNE, 1998], e o seu correlato paulista, o Plano Estadual de Educação:
Proposta da Sociedade Paulista [PEE-SP], ambos elaborados pela sociedade civil organizada, pelos
sindicatos, professores, especialistas, pais, mães, estudantes – tudo isto em meio a Congressos e
discussões de anos a fio.
O PSOL quer assim resgatar o sentido político da educação, no qual se projeta uma outra sociedade
possível e necessária, de homens e mulheres livres da domesticação de suas forças morais e
intelectuais, porque se reconhecem como sujeitos da história. Para isto se requer assumir a
educação como parte de um projeto estratégico, voltado para a mobilização das grandes maiorias do
povo. A educação deve estar a serviço da socialização dos meios intelectuais de compreensão crítica
da realidade, de formação e exercício do intelecto, autônomo e libertário do senso-comum –
concepção esta que norteará o projeto pedagógico a ser debatido e disputado em nossas escolas e
onde mais a prática educativa se dê.
Para tanto, é preciso reencontrarmos a autonomia do trabalho dos professores e professoras — e não
sujeitá-los a ―cartilhas‖ que nada dizem a respeito do que se passa no dia-a-dia da escola e da
comunidade.
A educação é um direito inalienável e cumpre ao Estado promovê-lo, garantindo o acesso de todos e
todas. Assim, educar as crianças, desde a primeira infância, mas também os que nunca passaram
pela escola; educar os jovens e adultos, que por quaisquer motivos abandonaram a escola ou foram
abandonados por ela. Promover as condições indispensáveis para que o trabalho dos educadores
possa ser desenvolvido com qualidade.
Reverter a política educacional do arrocho pressupõe repactuar com os municípios as
responsabilidades e redistribuir sob outros critérios os recursos da educação. A municipalização do
ensino deixou desassistida a educação infantil – historicamente vinculada aos municípios – e
também a educação de jovens e adultos. Para o PSOL, é de fundamental importância, para garantir
as reais necessidades da educação em nosso país, em cada etapa ou modalidade de ensino.
Isto nada tem a ver com a imposição de matricular uma criança de 5 anos no ensino fundamental. É
preciso respeitar a educação infantil e suas especificidades. considerando a adequação dos espaços,
da estrutura física, dos equipamentos e tudo o que for necessário para o desenvolvimento do
trabalho pedagógico, para poder oferecer uma formação adequada aos alunos. Significa criar as
condições para atender as crianças nas escolas e mantê-las na educação infantil até os 6 anos. –
Antecipar o ingresso das crianças no ensino fundamental (como foi induzido pela política de
―contabilidade‖ com os recursos) retira delas as possibilidades de construir conhecimentos de
maneira lúdica, num espaço e trabalho pedagógico mais adequados à essa faixa etária, respeitando a
especificidade da infância.
Para estabelecer as condições objetivas que ajudem a viabilizar o anseio da sociedade brasileira por
um ensino público, democrático e de qualidade, cumpre observar a limitação da quantidade de
alunos por professor. Ora, no raciocínio meramente contábil que vem sendo diuturnamente
aplicado, esta condição desaparece: são salas de aula abarrotadas de alunos, como um depósito de
crianças, em que o trabalho do professor e o acompanhamento zeloso com o processo de
aprendizagem dos alunos, o que cada um deles produz e o que poderia produzir, se vêem
inviabilizados. Nestas condições, não é surpresa que o desempenho dos alunos seja tão ruim.
Começamos a melhorar a qualidade do ensino ao dar condições, desde a sala de aula, para o
trabalho dos profissionais que ali atuam, reduzindo o número de alunos por professor, considerando
a respectiva faixa etária e seguindo as recomendações internacionais (até 20 crianças por sala na
educação infantil; 25 na fundamental e 35 no ensino médio).
Condições estruturantes para garantir educação de qualidade
A ampliação de recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino possibilitarão
iniciativas que visem a redução de alunos em sala de aula, a ousadia da experimentação de
alternativas educacionais, a ampliação do período escolar, a opção por uma jornada de trabalho dos
professores mais digna e dedicada aos problemas educacionais.
Salários – Em primeiro lugar, valorizar o magistério público passa por oferecer condições de vida
aos profissionais da educação, com uma política salarial decidida em garantir que progressivamente
possam ter segurança econômica em optar por uma única jornada de trabalho, exclusiva na rede
estadual, e não desdobrarem-se em várias escolas, acumulando vínculo com as redes municipal,
estadual e particular, o que compromete a saúde dos trabalhadores e a qualidade do ensino.
Jornada de Trabalho – Em segundo lugar, garantir aos professores o tempo necessário para o
planejamento das atividades pedagógicas, bem como de sua formação profissional continuada,
reduzindo o tempo em sala de aula com educandos, de modo que a cada hora com os alunos haja
também uma hora de trabalho pedagógico.
Plano de Carreira – Em terceiro lugar, rever o Plano de Carreira do Magistério com amplos
debates com a categoria, fazendo prevalecer os mecanismos democráticos de decisão. Cumpre
dizer, sobre este aspecto, que os governos têm sistematicamente definido e alterado a
regulamentação por decreto, sem sequer consultar os trabalhadores.
Tais iniciativas vão na contramão das políticas propostas e impostas pelo governo Serra, fundadas
na ideia de ―meritocracia‖, com um novo plano de carreira que nega qualquer reajuste linear para o
conjunto dos professores, pois o que vale agora é o ―merecimento‖, de uns poucos – quando o
direito já não é de nenhum. Para nós, o ―mérito‖ deve ser perseguido não a partir dos parâmetros
técnicos; o nosso mérito é político, e tem a ver com a qualidade socialmente referenciada: uma
escola que se abre para a comunidade, que transforma relações humanas, que ensina e aprende com
democracia e liberdade. E isto, obviamente, não pode ser avaliado em uma prova.
As políticas de alfabetização, de governo a governo, apelam para o regime de parceria,
―terceirizando‖ as responsabilidades do Estado para contar com a benevolente vontade de entidades
assistenciais, doações financeiras de empresas e particulares. Esta é uma manifestação do poder
público de absoluto descaso para com a questão, não encarando o problema do analfabetismo com
sua devida importância, aceitando que estes homens e mulheres terminem suas vidas na condição de
iletrados. O PSOL quer abrir salas de educação de jovens e adultos, e não fechá-las, como tem sido
a prática comum dos governos que aí estão. Queremos incentivar as pessoas a voltar para escola, a
fazer parte dela, para que construam novos saberes e possam ter mais ferramentas para intervir em
sua realidade e, conosco, possam ser protagonistas do seu próprio destino.
Para o PSOL, as Universidades Públicas, Centros Tecnológicos e os Institutos de Pesquisa em
Ciência e Tecnologia terão papel estratégico na formulação de propostas e alternativas para o
desenvolvimento do Estado. Para tanto, requer-se mais investimentos e financiamento público –
para que o conhecimento não seja uma propriedade privada. É preciso reverter a tendência a que
estas instituições foram induzidas com a criação das diversas Fundações.
Em relação às universidades públicas paulistas, é urgente oferecer novos mecanismos para que a
autonomia universitária se efetue, com transparência e – sobretudo – democratização dos seus
fóruns decisórios.
Mais do que isto, é preciso ainda garantir recursos para a ampliação do atendimento público no
ensino superior, de modo a fomentar uma política de acesso que corresponda aos anseios da
população.
O governo Serra, no entanto, fomentou o seu programa de ensino a distância dizendo promover com
isso a democratização do acesso, pelo incremento estatístico de jovens com ensino superior,
barateando os custos com a formação. Ao tomar esta iniciativa, ainda deixa aberto o campo para que
esta modalidade de ensino seja explorada pelo mercado, inclusive voltada à formação de
professores, sem nenhuma preocupação com a qualidade do que é ensinado.
7. Cultura
Vivemos um momento histórico do surgimento e difusão de tecnologias da informação que
permitem dois grandes avanços em termos culturais: o barateamento da produção cultural e o
aumento da capacidade de acesso aos bens culturais. No entanto, por conta de um modelo de
remuneração viciado e anacrônico (direitos autorais patrimoniais e patentes), a maioria da
população continua sem acesso ao saber, enquanto, contraditoriamente, computadores possibilitam
a conexão da humanidade em uma rede global, gerando novas capacidades produtivas e criativas
que não são plenamente aproveitadas. É um modelo de disseminação cultural que nos mantém
como espectadores passivos diante da televisão, quando poderíamos, através da digitalização, criar
e difundir ideias, imagens e pensamentos.
Mas a potencialidade da conjuntura atual não se restringe à difusão por meio da digitalização. O
barateamento das tecnologias de produção cultural também facilita e reduz o custo a implementação
de equipamentos públicos de produção cultural para as mais diversas linguagens artísticas, do teatro
à produção audiovisual.
Mas o apoio e o financiamento da cultura no estado não podem estar vinculados ao direcionamento
mercadológico e meritocrático de conteúdos. A diversidade e a abrangência que o desenvolvimento
cultural livre exige depende de um ambiente em que haja autonomia, acesso universal e livre
manifestação, sem direcionamentos e restrições mercantis, sem a vinculação com a sobrevivência
material do autor e sem qualquer outra forma de controle externo. O estado deve ser um agente
democratizador da produção de conhecimento e não concentrador.
Infelizmente, essa não tem sido a atitude da maioria dos programas de financiamento cultural no
Brasil. Nacionalmente, parte significativa do orçamento para a cultura está vinculada à Lei Rounet e
depende da aprovação dos setores de marketing das empresas privadas para serem implementados.
Nos níveis estaduais e municipais algumas leis de fomento possuem formatos e diretrizes de
financiamento mais amplos, mas um alcance bastante reduzido devido a seus limites orçamentários.
Em 2009, o estado de São Paulo disponibilizou apenas R$123 milhões para a formação cultural, um
volume de recursos correspondente a 0,1% da receita líquida disponível. Além do reduzido volume
de recursos, sua distribuição é bastante concentrada nas regiões metropolitanas, restringindo o
acesso cultural às regiões mais remotas do território.
O programa do PSOL quer transformar o olhar sobre a cultura, colocando-a como prioridade
orçamentária e promovendo a livre produção e o amplo acesso às atividades artísticas e culturais.
Com esse objetivo, defendemos:
1. Programas de financiamento da cultura livre, não vinculados à mecanismos de renúncia
fiscal, que garantam a emancipação da produção cultural em relação à lógica de mercado,
privilegiando o fomento ao livre funcionamento de grupos culturais e não à entrega de
produtos específicos, como livros, apresentações ou shows.
2. Controle social do orçamento de fomento à cultura, através da criação de conselhos não
estatais de seleção de beneficiários, como uma forma de mitigar o controle político sobre a
seleção cultural e permitir maior diversidade na produção cultural com apoio estatal.
3. Ampliação do acesso à internet e de sua utilização como ferramenta cultural, incentivando
redes de acesso abertas com desconto de IPTU, conexões nas escolas à internet, maiores
canais de comunicação com a prefeitura pela internet.
4. Descentralização das aparelhagens culturais, focando as construções no interior do estado
(centros culturais, salas de exibição etc.) e nas periferias das grandes cidades. É preciso
valorizar as produções locais, encontrando um equilíbrio na escolha do repertório, que deve
incluir produções de caráter mais claramente popular e trabalhos mais investigativos, além
de tentar abranger diversos gêneros e formas artísticas.
5. Incentivo às atividades de longa duração, evitando limitar a política cultural às produções e
eventos ocasionais, que muitas vezes absorvem recursos importantes do orçamento da
cultura, com escassos resultados à médio e longo prazo. Entre essas atividades, propomos a
organização de oficinas culturais, ciclos de palestras, publicações etc. Estas atividades
podem ser viabilizadas com relativamente poucos recursos e produzem conseqüências mais
duradouras.
6. Estimular a ocupação democrática e plural de espaços culturais administrados pelo
município, como o Teatro Municipal de São Paulo e o Centro Cultural São Paulo.
7. Viabilizar a publicação de livros (peças teatrais, poesias, ensaios etc.) através da imprensa
municipal ou de parcerias.
8. Elaboração de projetos voltados para a criação e formação de público, entre eles: ―Criança
no teatro‖, garantindo o acesso de alunos do ensino fundamental aos espetáculos infantis; e
―Trabalhador no teatro‖, projeto para estimular os trabalhadores a assistir espetáculos de
qualidade (isso pode ser feito com uma série de iniciativas, como a diminuindo do preço dos
ingressos, a circulação de informações e a organização de transporte gratuito).
9. Defesa de ações culturais inclusivas, reconhecendo a importância das ações afirmativas
defendidas pelos movimentos de mulheres, negros, indígenas, quilombolas, entre outros.
Garantir condições de acesso aos portadores de deficiências.
10. Defesa de um aumento significativo da participação da cultura no orçamento do estado.
8. Mulheres
A temática das mulheres perpassa os diversos aspectos de um programa de governo. Perceber a
realidade excludente e desigual vivida pelas mulheres no mundo do trabalho; no acesso a direitos
sociais como educação, saúde e moradia; no controle de sua sexualidade e direitos reprodutivos; e
no cruel cotidiano da violência doméstica nos obriga a enfrentar seriamente essa questão, buscando
caminhos para superar as relações sexistas em nossa sociedade.
O enfrentamento a opressão de gênero em todas as suas manifestações, revendo comportamentos e
a forma como a sociedade se organiza é imprescindível para a construção de uma nova sociedade e
para evitar a perseguição, humilhação, violência e morte de tantas mulheres.
A apresentação de dados e a defesa demagógica da igualdade de gênero apenas no viés da ocupação
de espaço pelas mulheres na política não é suficiente para dar as respostas necessárias a situação das
mulheres brasileiras. A rotina e a naturalização da desigualdade e violência contra a mulher exige
um compromisso contundente com essa luta. Exige enfrentar forças poderosas como a Igreja
Católica e os donos do capital, contestando os costumes mais arraigados transmitidos secularmente
as novas gerações.
O nosso programa de governo, formulado a várias mãos, reafirma o compromisso de nosso partido
com a autonomia e dignidade das mulheres e apresenta contribuições para o enfrentamento do
machismo em nosso estado e país.
Esta é uma contribuição do Coletivo de Mulheres do PSOL aos debates sobre Programa.
Compreendemos esta contribuição como essencial para um projeto que se dispõe a lutar pela
emancipação humana – de homens e mulheres, que sonham e caminham juntos na direção de outra
sociedade. Para a nós, a construção de um programa do Partido Socialismo e Liberdade não pode
colocar em segundo plano o debate a cerca da opressão sexistas, pois a opressão às mulheres é
elemento constituinte deste sistema que não apenas explora como também oprime todo o conjunto
da classe trabalhadora. Esta construção deve incorporar a reflexão de nosso ponto de vista, das
mulheres organizadas no Partido Socialismo e Liberdade.
Centramos a nossa contribuição em cinco pontos que avaliamos estruturantes para um programa
que discuta política para mulheres hoje:
1- Saúde da Mulher
2- Luta contra a violência sexista
3- Educação não sexista
4- Mulher e o mundo do trabalho
5- Mulher mídia
O feminismo como elemento necessário para o socialismo que devemos construir
Tradicionalmente os partidos ditos de esquerda apresentam dificuldades para incorporar a luta pela
libertação das mulheres ao seu programa. Os que o fazem, na maioria das vezes, agem por puro
exercício de retórica. A opressão às mulheres está presente em todas as esferas da nossa sociedade.
Está no seio da classe trabalhadora e de suas organizações políticas. No entanto, constatar que esta
realidade deve ser a mola propulsora para compreender o papel que cumpre esta opressão específica
no capitalismo e os mecanismos de que devemos lançar mão para superá-la. Esta é uma tarefa
histórica do movimento feminista classista.
Estamos em pleno século XXI ainda debatendo e lutando pelos direitos das mulheres, para que as
mesmas sejam reconhecidas, para além da formalidade legal, como ―sujeitas‖ da sua história e da
historia da humanidade. Toda esta modernidade e avanço da técnica não mudaram substancialmente
a situação das mulheres em todo o mundo. Ainda hoje compomos 70% da população mais pobre do
mundo, segundo dados da ONU. Somos vitimas de violências brutais e ganhamos os piores salários
no mercado de trabalho.
Discutir a opressão da mulher na sociedade capitalista não é uma tarefa simples e fácil de fazer,
sobretudo por vivermos num sistema que trata de naturalizar as agressões, a exploração, a opressão
e outras formas que degradam a figura humana, particularmente a feminina. Ao naturalizar estas
opressões, colocam-nas como imanentes à Ordem, necessárias para a reprodução da humanidade,
escondendo sua função essencial para a reprodução do capital. O fato da opressão sofrida pela
figura feminina ao longo da história não ser precisada com o início do capital não impede que o
próprio a assimile com o objetivo de se tornar mais forte.
A sociedade capitalista se baseia no mito da divisão sexual do trabalho, tratada no interior desta
sociedade como um processo natural e inquestionável. A nossa tarefa, enquanto socialistas
marxistas e revolucionárias, é desnaturalizar estas relações.
A constatação de que o atual sistema depende também da opressão das mulheres para se perpetuar,
nos leva à conclusão lógica de que não há lugar para a emancipação feminina nos marcos do
capitalismo e que o discurso liberal de igualdade e liberdade nunca passará de uma farsa. Portanto, a
luta feminista deve ser, antes de tudo, uma luta anticapitalista, uma batalha junto às classes
trabalhadoras pela construção de uma sociedade radicalmente diferente que elimine a propriedade
privada e se baseie em princípios de solidariedade e liberdade.
As mulheres do partido socialismo e liberdade reforçam esta aposta. Para nós, deve ser defesa
intransigente de toda nossa militância a desconstrução desses papéis.
1. Saúde da Mulher
Saúde Integral da Mulher
A participação dos usuários do SUS tem sido reivindicada para melhor estabelecer o controle da
qualidade dos serviços de saúde. Setores ligados aos movimentos sociais têm se articulado e
mobilizado para que a saúde seja realmente de qualidade e para todos e todas, participando do
controle social e propondo políticas específicas. A maioria dos usuários dos SUS nacionalmente são
as mulheres e a população negra.
No entanto, diferentes fatores, desde resistências interpostas pela presença do racismo, como
principalmente o desconhecimento acerca dos seus impactos, aliados aos demais determinantes
sociais sobre a saúde da população e das ferramentas necessárias para seu enfrentamento no âmbito
do Sistema Único de Saúde e o exercício profissional e de controle social cotidianos, podem
dificultar o desenvolvimento das diferentes etapas necessárias a implementação da Política, bem
como a realização efetiva do direito à saúde da população. Fortalecimento da Política Nacional de
Saúde da População Negra e da discussão sobre o racismo institucional para evitar a atenção
discriminatória na saúde e inclusão dos dados do quesito cor/raça.
As condições de vida das mulheres negras contrariam a tendência mundial que as mulheres vivem
mais que os homens. A expectativa de vida para as afrodescendentes é de 66 anos, está alguns
meses abaixo da média nacional que é de 66,8 anos.
A precária situação da saúde das mulheres negras está diretamente relacionada à desigualdade de
acesso aos serviços de saúde de qualidade. As principais causas de mortalidade materna são
hemorragias, hipertensão, infecções puerperais, doenças do aparelho circulatório complicadas pela
gestação, parto, puerpério e abortamento inseguro. Supõe-se que em 92% dos casos, os ditos óbitos
maternos poderiam ser evitados.
Em 1998, no Brasil, entre as causas diretas de morte materna, o aborto era a quarta causa, com
4,7%, sendo 1,3 % de abortos espontâneos e 3,4 % de provocados, conforme Tanaka (2001).
Além da predisposição biológica para algumas doenças, as dificuldades de acesso aos serviços de
atendimento ginecológico e obstétrico são maiores para as mulheres negras: são constatadas
diferenças relacionadas com número de exames ginecológicos, consulta pré-natal e até mesmo com
a proporção de parturientes que receberam ou não anestesia.
Não dá para fechar os olhos quando os dados indicam que meninas de 10 a 15 anos e mulheres entre
30 e 39 anos aparecem com maior peso na mortalidade por aborto e que os óbitos por aborto, em
sua maioria, são de solteiras ou separadas judicialmente.
O Estado brasileiro é responsável pelas seqüelas e mortes decorrentes do aborto inseguro ao
permitir que pobres, negras e jovens só encontrem guarida para interromperem uma gravidez
indesejada no aborto inseguro.
E neste cenário o PSOL faz a defesa da integralidade de políticas que possibilitem a saúde da
mulher com as defesas de:
9. Retirada do Acordo com o Vaticano
10. Defesa da Legalização do aborto legal, como questão da saúde pública, evitando a morte de
mulheres pobres, principalmente negras, além da autonomia - direito ao próprio corpo
11. Defesa e efetivação da Política Nacional de Saúde da População Negra, com a incorporação
desta temática nos cursos de graduação de saúde.
2. A luta pelo fim da Violência contra a mulher
As mulheres não têm seus corpos resguardados. De acordo com a Anistia Internacional, uma de
cada três mulheres no mundo foi agredida, obrigada a manter relações sexuais ou submetida a
algum outro tipo de abusos na vida. No Chile, segundo dados do Centro de Análise de Políticas
Públicas da Universidade do Chile, na região metropolitana de Santiago, 50,3% das mulheres já
foram violentadas.
Como bem nos lembrou Plínio Sampaio, na última conferência eleitoral, estamos no fim do início
da crise, mas o pior infelizmente ainda esta por vir. Ano que vem os ataques ao conjunto da classe
será ainda mais brutal, como forma de tentar minimizar os danos de uma economia global em
colapso. Isso significa mais ataque, mais precarização, mais barbárie e conseqüentemente mais
violência.
Os números que denunciam a violência sofrida pelas mulheres no Brasil não são diferentes.
Milhares de mulheres no Brasil vivem abaixo da linha da pobreza; não têm direito à educação;
morrem nas filas dos hospitais sem assistência médica e sem medicamentos; recebem salários até
40% a menos desempenhando a mesma função que os homens; são maioria entre os
desempregados, entre os sem-carteira assinada; muitas se submetem ao trabalho escravo, sem
qualquer remuneração apenas para terem ―guarita‖, um lugar para comer e dormir. Caracterizando
como a feminização da pobreza.
Além disso, sofrem com o permanente assédio sexual e moral presentes em todos os locais nesta
sociedade, estampado nas bancas de jornal, nos programas televisivos que ‗coisificam‘ as mulheres,
transformando-nos em objetos sexuais e/ou escravas domésticas, feitas para o consumo. A
prostituição infantil de nossas meninas é outra forma bárbara de expor a violência, bem debaixo dos
narizes de nossos ilustres políticos, assim como o tráfico internacional de mulheres, cujo negócio só
perde em rentabilidade para o tráfico de drogas e de armas.
São inúmeras as formas de violência as quais nos mulheres brasileiras trabalhadoras estamos
submetidas. Não precisamos ir muito longe, para ter um exemplo de um escândalo de mulher
violentada, ainda esses dias vimos uma estudante negra ser violentada em uma universidade
justamente por ser negra e ser mulher, o agressor, no entanto, não foi detido por racismo nem por
machismo, mesmo tendo agredido- a verbalmente. Casos como esse são comuns em todas as partes
do mundo. Entretanto segundos dados da ONU a violência doméstica é a principal causa de lesão
entre as mulheres de 15 a 44 anos.
No Brasil uma em cada quatro mulheres já foi vítima de violência doméstica (se consideramos
todos os tipos de violência este número é ainda maior). Em cada 100 brasileiras assassinadas 70 são
no âmbito das suas relações domésticas, como pai, tio, marido, etc. (Dados da ONG Pagu)
Vejam por exemplo o caso do Maranhão, onde o pai manteve a filha presa em casa por 17 anos e
durante todo esse tempo manteve relações sexuais com a mesma e tiveram 7 filhos, e casos assim
estão espalhados pelo mundo a fora e vem sendo mascarados pela justiça.
Segundo pesquisas apenas 10% das vítimas de violência sexual prestam queixa a policia. As
mulheres vítimas deste tipo de violência sentem-se constrangidas em estar em uma delegacia onde
devem provar que foram agredidas, para além de tudo que sofreram. Outro elemento é a
inexistência de serviços capazes de assistir as mulheres nesta situação. Não existem delegacias de
mulheres suficientes e as poucas que há, devido à falta de verba, não têm estrutura e tampouco
funcionários capacitados para atenderem este tipo de situação.
A dependência financeira é um dos agravantes nestes casos, pois a mulher acaba não tendo para
onde ir nestes momentos de agressão. Não temos uma política estatal conseqüente, mesmo
paliativa, capaz de garantir abrigos públicos, ―casas abrigo‖ para as vítimas e seus filhos.
A promulgação da Lei nº. 11.340, de 7 de agosto de 2006, batizada de Lei Maria da Penha, em
homenagem a Maria da Penha Fernandes, vítima de duas tentativas de homicídio por parte do ex-
marido e que acabou paraplégica, constitui um avanço no âmbito jurídico ao combate da violência
doméstica e familiar contra a mulher. A lei reconhece a gravidade do problema e o caracteriza como
crime; corrige distorções até então presentes no Código Penal; para além do caráter punitivo,
apresenta preocupação em prevenir a violência contra a mulher; garante assistência e proteção à
ofendida, independente de sua orientação sexual, e a seus dependentes menores; aponta para a
criação de centros de educação e de reabilitação para os agressores.
Apesar do avanço jurídico, a efetivação da lei ao longo destes anos já se mostrou insuficiente. O
governo Lula se mostrou incapaz de garantir às mulheres brasileiras o que se apresenta nas
disposições preliminares da lei, precisamente o artigo 3º que diz:
“Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à
segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, à justiça, ao esporte, ao
lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e
comunitária”.
Segundo pesquisa do Instituto Patrícia Galvão, o número de entrevistadas que conhecem vitima de
violência contra a mulher subiu entre 2006 e 2009 (anos em que foi realizada a pesquisa) de 51 para
59%. A maioria das vitimas não tomam atitudes porque não confiam na efetividade da lei Maria da
Penha.
O governo de Lula, ao sequestrar os recursos destinados às áreas sociais como a saúde, a educação,
a moradia, o transporte e transferi-los para o pagamento de juros aos banqueiros, afeta
principalmente as mulheres. Ironicamente, assim que a lei foi promulgada o governo federal
cortou 30% do orçamento destinados ao combate à violência contra a mulher.
As recentes pesquisas nos mostram o descaso deste governo, sobretudo no que se refere ao combate
a violência sexista. Segundo dados do IBGE e do Ministério do Desenvolvimento Social em
pesquisa publicada em 2010 sobre informações municipais, evidenciam que somente 2, 7% das
cidades brasileiras possuem abrigos institucionais. Outro dado do IBGE é que apenas 7% das
cidades terem uma delegacia especializada para mulheres e, desses 7%, nenhuma tem o
atendimento adequado e a orientação é sempre que a vítima volte para a casa e retire a queixa, pelo
bem estar da família.
Estes números revelam os limites da Lei Maria da Penha, que apesar de contemplar no papel as
exigências para o combate a violência contra a mulher, como casas abrigos e delegacias especificas,
não possui verbas destinada a tal combate. Uma lei ―para inglês ver‖. Neste sentido, os avanços
conquistados formalmente não são revertidos em soluções para este grave problema. Vale dizer que
em São Paulo, o governo estadual assinou o Pacto de enfrentamento à violência contra a mulher e
não apresentou recursos e ações concretas para enfrentar essa questão.
• Combate ao sexismo, ao racismo, à homofobia e à xenofobia
• Acesso aos métodos contraceptivos e à gravidez assistida
• Aborto legal garantido em hospitais públicos
• Ampliar e equipar as delegacias de defesa da mulher
• Criação emergencial de Casas de Abrigo
3. Educação não sexista
Entendemos a temática da educação em duas frentes: enquanto direito universal para todas e todos,
especialmente para as crianças pequenas historicamente negligenciadas pelo poder público e como
prática social fundamental para a construção de novos valores e condutas entre homens e mulheres.
Defendemos uma educação não sexista, que busque socializar nossas crianças e jovens sob uma
nova perspectiva, desconstruindo a imagem estereotipada do que é ser homem e ser mulher e todas
as suas decorrências. Para tanto, é necessário reconhecer a escola como espaço privilegiado para
combater a reprodução de preconceitos, invertendo a seu atual papel de formar as crianças e jovens
sob um olhar sexista que naturaliza as desigualdades.
Essa não é uma tarefa fácil, especialmente no Estado de São Paulo que mantém um sistema de
ensino reduzindo os investimentos em educação, com condições precárias e profissionais mal
remunerados. Estes profissionais ainda são culpabilizados pelas mazelas da escola pública. A
política de sucateamento da educação pública promovida por anos de gestão tucana no estado tem
inviabilizado uma ação de formação das educadoras e educadores, bem como de toda a comunidade
escolar, que possa refletir a cerca de suas práticas e as reformularem na direção de uma ação
pedagógica mais igualitária entre meninos e meninas. É preciso investir em formação, de maneira
consistente, reconhecendo os saberes dos profissionais e abandonando a homogeneização das
opiniões e apostilamento dos conteúdos vinculados a avaliações que premiam ou punem os
profissionais. Redirecionando a formação para buscar uma escola pública de qualidade. Qualidade
essa percebida na formação de homens e mulheres livres, sem o peso da cultura patriarcal, machista
e desigual.
A valorização do trabalho docente implica salário justo (hoje de 1800reais, conforme pauta do
movimento sindical e do CONAE), na defesa dos planos de carreiras, em melhores condições de
trabalho, a garantia de horas-atividades, a garantia da formação permanente da professora, pelo
Estado, dentro de sua carga-horária e saúde às mulheres trabalhadoras e servidoras na/da educação.
Além da formação dos profissionais é necessário colocar em prática ações de educação sexual nas
escolas. Substituir o olhar moralizante que só traz ignorância e preconceitos, pelo olhar e práticas
formativas, favoráveis a autonomia e saúde de todas e todos. Defendemos a educação sexual para
que a juventude possa construir sua sexualidade com informação, livre de estereótipos e que previna
doenças sexualmente transmissíveis ou gravidez indesejada. Este tipo de educação só pode ser
garantido com um Estado democrático e laico. Garantir a laicidade do Estado, respeitando toda a
forma de manifestação religiosa, não interferindo na liberdade sexual.
A Educação como direito. O acesso a educação pública gratuita e de qualidade, para todas e todos
ainda é uma reivindicação distante de ser atendida. Especialmente para as crianças pequenas, que
não têm vagas nas creches e têm sido submetidas a uma concepção que não reconhece seu direito a
infância, e ―inseridos‖ sem qualquer cuidado nas escolas, sem nenhuma alteração em sua dinâmica
e estrutura física.
É importante destacarmos que as mulheres continuam tendo maior nível de escolaridade entre os
homens. Entre as mulheres trabalhadoras, em 2008, cerca de 60% possuíam 11 anos ou mais de
estudos em relação aos homens. Defendemos uma educação para ―toda a vida‖. É igualmente
necessário garantir políticas de assistência estudantil aos/as jovens universitários/as (moradia,
transporte, alimentação, etc); defendemos a instalação e funcionamento de creches e lavanderias
públicas.
• Creches públicas para atender toda a demanda necessária
Educação Pública, gratuita, laica e não sexista.
4- Mulher e o mundo do trabalho
Em tempos de crise, fica ainda mais evidente o ataque da sociedade capitalista contra nós e mais
claro também a necessidade de construção da luta pelo socialismo. O capitalismo mostra a
impossibilidade de garantirmos justiça e direitos nesta sociedade que utiliza a nós, mulheres, como
mercadoria e mão-de-obra barata.
Segundo dados da OIT (Organização Internacional do Trabalho), 2,4 milhões de empregos serão
perdidos na America Latina, neste momento seríamos cerca de 15,7 milhões de desempregados na
região. As mulheres e a juventude seguem sendo os mais atingidos, sendo as trabalhadoras 1,6
vezes mais desempregadas do que os homens.
Considerando que ganham menos em relação aos seus companheiros e que continuam exercendo a
dupla ou tripla jornada de trabalho, não temos como desconsiderar que a crise esta caindo
pesadamente sob as nossas costas. Em ambos os casos as mulheres são as mais atingidas, seja por
terem que chefiar as famílias em condições mais precárias ou mesmo arcar com o desemprego e
com a ausência de renda, um retrocesso que condena a mulher à esfera da vida privada.
O número de demissões no Brasil ultrapassou 700 mil. A Folha de São Paulo em 2009 nos revela
que 58,1% dos postos de trabalho perdidos até agora são postos femininos. Entre os desempregados,
cerca de 52% são negros e pardos ou ainda negras e pardas. Com a escassez de emprego a exigência
aumenta, mesmo com valores de mão-de-obra mais baixa, contratam em grande maioria homens
brancos.
De acordo com o IBGE (Pesquisa Mensal de Emprego) as mulheres são a maioria da população e
predominam entre os desocupados, ou seja, ainda são menos numerosas que os homens na
população ocupada. Já, dentre aquelas que possuem alguma ocupação o rendimento das
trabalhadoras com nível superior equivale a 60% do recebido pelos homens com a mesma
escolaridade! Ainda assim, entre as mulheres trabalhadoras, 59,9% tinham 11 anos ou mais de
estudo (isto, em janeiro de 2008), contra 51,9% dos homens. Por outro lado, enquanto o percentual
de trabalhadoras com carteira assinada era de 37,8%, entre os homens ele já atingia 48,6% em 2008.
As mulheres trabalham muitas vezes sem regulamentação de jornada, sem férias e sem direitos. São
elas, portanto, que vivem e sentem a desigualdade em relação aos homens, com diferenças salariais
e discriminação nas promoções em seus ofícios.
Em termos regionais, a maior concentração de mulheres ocupadas com carteira assinada encontra-se
na região metropolitana de Porto Alegre (42,4%); já na região metropolitana de Salvador, o maior
percentual das mulheres ocupadas em trabalhos domésticos (18,9%)!
Como medidas concretas desse enfrentamento, nós mulheres, devemos exigir:
(1)Que o Estado deve garantir fiscalização e proteção eficaz contra toda forma de exploração
econômica sobre as mulheres, como os trabalhos forçados e escravo. Salário; (2)Defender a
igualdade de salários entre homens e mulheres e todos os direitos sociais e trabalhistas garantidos!
O assédio moral e sexual são formas de violência que tem como campo privilegiado o ambiente de
trabalho; não trata-se de um fenômeno novo. Sabe-se que as leis que tratam deste tema não
resolveram o todo. As mulheres tem sido as maiores vítimas, sobretudo as mulheres negras, de
acordo com o MTE. Defendemos campanhas públicas nos meios de comunicação contra o assédio
moral e sexual. Mas uma campanha que eduque e incentive o debate na sociedade sobre as formas
de opressão de gênero.
As mulheres predominam entre os trabalhadores com jornadas menos extensas. Cerca de metade de
homens e mulheres ocupados, 51,6% e 49,5%, respectivamente, trabalham entre 40 e 44 horas
semanais. No entanto, em faixas menores ou iguais à 39 horas, a população ocupada feminina
predomina, com 26,4%, contra 10,1 % dos homens. O inverso se verifica na faixa de trabalho maior
que 45 horas semanais, com percentuais de 38,2% para homens e 24,1% para as mulheres.
Defendemos a redução de jornada de trabalho, sem a redução do salário, conforme reivindicações
do movimento sindical.
As mulheres predominam nos Serviços Domésticos e na Administração Pública. De acordo com a
análise de distribuição das atividades econômicas, em janeiro de 2008, verificou-se que 16,5% das
mulheres ocupadas realizam Serviços Domésticos e que 22% estão na Administração Pública,
Educação, Defesa, Segurança, Saúde. Há pelo menos 13,3% nos Serviços prestados às Empresas e
13,1% se encontram na Indústria e pelo menos 0,6% na Construção, 17,4% no Comércio e 17% em
Outros Serviços e Outras Atividades, segundo o IBGE. Já, entre os homens ocupados predomina a
participação na indústria, 20,0%, e diferentemente das mulheres, eles têm um maior percentual de
ocupação na construção, 12,0% e presença reduzida nos Serviços Domésticos, somente 0,7%.
É preciso que a legislação existente e específica ao trabalho doméstico seja cumprida e estendida
(FGTS para todas as trabalhadoras), fiscalizada de forma que estejam asseguradas DE FATO todos
seus direitos sociais (13º salário, férias de 30dias, estabilidade para gestantes, direito aos feriados
civis e religiosos, além da proibição de descontos por moradia, alimentação e pelo uso de produtos
para sua higiene pessoal, entre outros).
As políticas públicas voltadas para crianças e adolescentes, idosos e mulheres devem ser
EFETIVADAS; para tanto, é necessário não só prever recursos no orçamento público par tais, mas
deve-se fazer chegar aos seus destinos, serem aplicados e fiscalizados pelo poder popular. Os
cuidados para a reprodução da sociedade e cuidado dos idosos é de responsabilidade do Estado.
• Salário igual para trabalho igual
• Redução da jornada sem redução do salário
Restaurantes e lavanderias públicas
5- Mulher na Mídia
O corpo da mulher não é mercadoria e não deve ser tratado como tal. A publicidade expõe as
mulheres como um produto para consumo. Geralmente são representadas como um objeto deste
consumo; logo, para se ter algum valor, tem que seguir um determinado padrão de beleza. E,
inevitavelmente, elas devem aceitar as condições do mercado e consumir uma enorme quantidade
de produtos e serviços. As jovens são as que estão mais expostas à pressão da mídia, à imposição
dos padrões de beleza, do mercado de consumo. Defendemos o controle público sobre as
concessões e conteúdos difundidos pelos meios de comunicação numa perspectiva de gênero.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, a bulimia e a anorexia são doenças que se encontram
como as principais causas de morte entre as mulheres jovens! As cirurgias plásticas por motivo de
estética vêm crescendo assustadoramente no Brasil. Em 2006, o número de cirurgias desta natureza,
realizadas por jovens mulheres cresceu 300%, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cirurgia
Plástica. O agravante se encontra nas formas facilitadas de acesso a tais procedimentos, através de
parcelamentos e mesmo financiamentos ou consórcios, por exemplo! É preciso romper com os
padrões de beleza, impostos!
Os meios de comunicação de massa são controlados por um setor da burguesia e operam sobre as
leis do mercado. Produzem, portanto, uma comunicação comprometida com a manutenção dos
pressupostos do sistema capitalista. Para contribuir com a lógica de dominação, os meios de
comunicação massa contribuíram sempre que possível para negar as idéias de classes sociais em
conflito e de dominação de gênero. As novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC),
ainda que possibilitem ampliar as vozes dissonantes, não revogam as leis da exploração do trabalho
e acúmulo de riqueza desta sociedade. Assim como os velhos meios de massa, muito do conteúdo
das redes sociais e da internet reproduz regras da sociedade capitalista e patriarcal.
Devemos defender a democratização da comunicação, fomentando a organização de rádios, TVs e
outras formas de mídias com caráter comunitário. Nossa campanha deve estar comprometida na luta
contra o assédio e a exploração sexual de mulheres e gurias, fiscalizando e combatendo as redes de
turismo sexual e de exploração de mulheres, crianças e adolescentes.
Os meios de comunicação devem ser responsáveis na transformação do imaginário coletivo no que
se refere ao machismo, ao sexismo, ao racismo e a homofobia.
Estes meios devem implementar programas/campanhas de informação de longo ao alcance
oferecendo informação sobre direitos e saúde das mulheres.
Fortalecer e incentivar a organizar de rádios e TVs comunitárias, como garantias de acesso à
informação às mulheres.