Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
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PERFIL DOS INDIVÍDUOS EM PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO NO SUL
DE MINAS GERAIS NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XIX
Marcus Vinícius Fonseca1
Vanessa Souza Batista2
Introdução
A pesquisa que aqui apresentamos pretende identificar o perfil do alunado em
processo de escolarização na região sul de Minas Gerais, na primeira metade do século XIX.
A delimitação deste espaço foi construída através de uma abordagem regionalista, ou seja,
que define um espaço através de uma relativa homogeneidade interna, identificada com
relação a alguns critérios (Barros, 2006).
Como indica Gomes (2006), a ideia de região enquanto conceito científico da
geografia inicialmente foi considerada como delimitação da realidade concreta, baseada
principalmente em elementos físicos da região. Esta noção passou a ser revista quando se
compreendeu que a região só poderia existir no mundo científico se fosse submetida a
critérios explícitos, uniformes e gerais. Logo, a região não seria um espaço dado, seria
construída por meio de critérios particulares elencados a fim de compreender determinados
processos ou fenômenos. Nesta construção as divisões não são definitivas, pois a delimitação
não é algo absoluto sendo impossível abarcar a totalidade do espaço.
Estas considerações de Gomes (2006) são pertinente em relação à regionalização de
Minas Gerais, algo recorrente na historiografia referente os séculos XVIII e XIX, em um
processo de superação às divisões que levavam em consideração apenas limites político-
administrativos.
Neste sentido, destaca-se o pioneirismo dos trabalhos de Marcelo Godoy (1996) e
Clotilde Paiva (1996) que utilizaram os critérios físicos, demográficos, econômicos e
administrativos para identificar as singularidades entre os diferentes espaços que
compunham a província de Minas Gerais.3
1 Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo. Professor Adjunto no Departamento de Educação da Universidade Federal de Ouro Preto, Campus Mariana. E-Mail: < [email protected]>.
2 Mestranda do PPGE da Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: <[email protected]>. 3 Godoy (1996) utilizou os depoimentos dos viajantes que estiveram no século XIX em Minas Gerais e realizou a
divisão da província em 16 regiões. Considerou os elementos físicos, humanos, econômicos e histórico-
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É a partir desta perspectiva que buscamos compreender o perfil do alunado na região
sul mineira, considerando a hipótese de que esta região além das particularidades históricas,
econômicas e demográficas se diferenciava também em relação ao processo de escolarização.
Partindo desta abordagem regionalista utilizamos como principal fonte de pesquisa um
conjunto de listas nominativas de habitantes, que são fragmentos do recenseamento
realizado na província mineira, nos anos de 1830.
As listas nominativas são documentos manuscritos que foram elaborados por
iniciativas do governo provincial. Sua unidade básica de organização são os domicílios
(fogos) e o conjunto de indivíduos que nele habitavam. O primeiro indivíduo registrado em
cada domicílio era o chefe, em seguida listava-se os membros geralmente respeitando o nível
de proximidade com aquele que ocupava a chefia.
A documentação apresenta linha por linha informações sobre os indivíduos presentes
no domicílio. Estas são distribuídas a partir de seis campos específicos: nome, qualidade
(pardo, crioulo, branco, preto, africano), condição (livre, liberto, forro, escravo), idade,
estado civil (solteiro, casado, viúvo) e ocupação.
No campo ocupação é possível identificar as seguintes referências em relação aos
indivíduos que estavam em processo de escolarização: “na escola”, “escola”, “estudo”,
“aprende gramática”. Por meio destas referências foi possível inferir os sujeitos envolvidos no
processo de escolarização. Logo, delimitar o seu perfil considerando categorias como raça,
gênero e condição social.
É interessante destacar que neste período os governantes apresentavam uma
preocupação recorrente com a instrução, pois, após a independência a formação do povo se
tornou elemento presente nos debates políticos. Prova disso é o fato de que o direito à
instrução primária apareceu na primeira constituição brasileira, em 1824, em seguida foi esta
regulada pela Lei Geral da Educação, de 15 de outubro de 1827. O objetivo desta
normatização foi o estabelecimento de normas para criação de escolas e a demarcações mais
gerais para seu funcionamento. Houve, com isso, um movimento de valorização instrução,
sobretudo, em uma perspectiva de civilizar a população, principalmente as camadas mais
pobres.
Destaca-se, que esse período de expansão das escolas coincide com a construção das
listas nominativas (1831/1832), momento que representa uma fase muito conturbada da
história brasileira, quando houve a abdicação de D. Pedro I e o início das Regências. Neste
administrativos. Paiva (1996), além dos depoimentos dos viajantes, utilizou as informações das listas de recenseamento de 1831, que possibilitou a incorporação dos aspectos demográficos na divisão da província, que culminou em 18 regiões.
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período, uma das principais demandas foi à construção do Estado Nacional, dentro disso, a
preocupação com a formação do povo (Mattos, 1987).
Podemos dizer que a produção de censos populacionais operou dentro desta lógica. Os
censos demográficos foram elementos integrantes do processo de reconhecimento da
nacionalidade brasileira, representavam mais do que uma simples contagem buscavam o
reconhecimento da composição do povo brasileiro.
Esta perspectiva aproxima-se do diagnóstico produzido por Foucault (1979) em
relação ao estado moderno que, entre outras coisas, se serviu de elementos como a estatística
para quantificar os fenômenos próprios da população e, assim, efetivar os mecanismos de
governo. Foi dentro desta perspectiva que Foucault (1979) cunhou o conceito de
governamentalidade, movimento de táticas e estratégias utilizadas sobre o controle da
população. Estas táticas permitem definir o que deve ou não competir ao Estado, o que é
público ou privado, o que é ou não estatal. Desta forma, conhecer a população era um
mecanismo essencial para propiciar condições de governabilidade.
É a partir deste conjunto de elementos que faremos considerações sobre duas
localidades do Sul de Minas que assinalaram a presença de crianças envolvidas com a
escolarização em suas listas nominativas: a Vila de Campanha e o Arraial de São Gonçalo4.
O atendimento à população em idade escolar em Campanha e São Gonçalo
As listas nominativas de habitantes de Campanha e São Gonçalo apontaram
indivíduos entre 5 e 19 anos com ocupações relacionadas à escola. O conjunto destes dados
indicam que havia uma concentração no grupo de idade entre 8 e 14 anos. Assim, avaliamos
que esta delimitação condiz como o período compreendido como a “ideal” para a frequência
das crianças às escolas, durante a primeira metade do século XIX. Portanto, definimos o
intervalo entre 8 e 14 anos como idade escolar relativa a este período5.
Quando consideramos todas as crianças de 08 a 14 anos que foram registradas nas
listas - inclusive escravos - chegamos a um atendimento de 15,8% da população em idade
escolar em Campanha e 4,1% em São Gonçalo. Contudo, nenhum indivíduo escravizado foi
assinalado “na escola”, nas duas localidades. Assim, quando consideramos apenas os
4 Lista nominativa dos habitantes de Santo Antônio do Vale da Piedade da Vila de Campanha. Arquivo Público Mineiro, Coleção Mapas de População. Documentos microfilmados, caixa 10, pacotilha 19. Lista nominativa dos habitantes do distrito de São Gonçalo. Arquivo Público Mineiro, Coleção Mapas de População. Documentos microfilmados, caixa 2, pacotilha 18. 5 Este intervalo de idade como período correspondente à idade escolar é reafirmado pela lei mineira que, em 1835,
definiu a obrigatoriedade escolar para os meninos livres, de 08 a 14 anos.
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indivíduos livres o atendimento à população em idade escolar sobe para 23,26%, em
Campanha, e 6,7%, em São Gonçalo.
Quando consideramos esta situação a partir da categoria gênero encontramos a
seguinte situação:
GRÁFICO 1
ATENDIMENTO À POPULAÇÃO LIVRE EM IDADE ESCOLAR (%)
Fonte: Lista Nominativa de Habitantes de Campanha e São Gonçalo, 1831.
Majoritariamente os meninos livres são os mais atendidos, mas, mesmo que a
presença destes seja majoritária, é significativa à participação feminina na escola de
Campanha. A Lei 15 de outubro de 1827 indicou que a prioridade era a criação de escolas
destinadas ao sexo masculino, as que se destinavam ao público feminino foram apresentadas
em segundo plano. Portanto, em 1831, o registro de 13,3% de meninas nas escolas de
Campanha representa um número expressivo dentro da realidade deste período.
Considerando a idade de 8 a 14 anos, foram apontadas 161 crianças em Campanha e
32 em São Gonçalo envolvidas no processo de escolarização. Todavia, as listas não permitem
inferir se esses sujeitos estavam frequentando aulas públicas ou privadas. É preciso
considera que ambas se fazem presente em meio aos registros contidos nas listas.
Quando recorremos a outras fontes é possível encontrar registros de escolas públicas
e privadas em São Gonçalo e em Campanha. Em São Gonçalo encontramos em
funcionamento uma escola particular, em 1825, onde eram atendidos 20 alunos6; outra
indicação encontra-se nos registros do Conselho Geral da Província que, em 1828, aprovou
a criação de uma aula particular no arraial (SALLES, 2005).
6 A instrução pública e particular em Minas Gerais: nos anos de 1824 e 1825. Revista do Arquivo Público Mineiro. 1898, p. 639-673.
32,40%
13,30%
9,60%
0,37%
Meninos Livres
Meninas Livres
São Gonçalo
Campanha
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Em Campanha os registros de existência de escola apareceram nas primeiras
discussões da Câmara. Na vereação de 15 de fevereiro de 1800 foi registrado que a aula de ler
possuía 27 discípulos e a de gramática 11 estudantes7; em 17 de março de 1826, foi indicado à
existência de um mestre de Gramática Latina pago pela Fazendo Pública, sua aula contava
com 11 estudantes; havia também uma escola pública de primeiras letras com 50 alunos.
Em Campanha, havia outros dois estabelecimentos escolares que foram criados em
1831. O primeiro foi resultado de uma iniciativa da Sociedade Philantropica Campanhense,
criada com a finalidade de auxiliar as crianças desvalidas e promover a instrução. Esta
sociedade filantrópica também contava com a participação de mulheres que buscavam a
instalação de uma escola de primeiras letras destinadas ao sexo feminino (LAGE, 2007).
O segundo estabelecimento foi a Escola de Ensino Mútuo de Primeiras Letras,
dirigida por Venâncio Ferreira da Silva Castro. Venâncio foi descrito na lista nominativa
como mestre de primeiras letras, esse dado leva a crer que tal escola já estava funcionando
durante a realização do censo, em 1831. Outra referência a essa escola de método mútuo foi
registrada nas memórias de Francisco Rezende (1944, p.166), que a frequentou entre 1840 a
1842. Já neste período o autor aponta que “a frequência era muito grande; pois que a
matrícula era de cento e muitos meninos”.
Esses indícios ajudam a compreender melhor o alto número de indivíduos (161)
apontadas com ocupações relacionadas à escola nas listas nominativas de habitantes de
Campanha. Ao que parece, a Vila possuia um número significativo de escolas, principalmente
se comparada a localidades próximas. Quanto às escolas públicas, a própria Lei 15 de 1827 já
estabelecia a criação dessas em cidades, vilas e lugares mais populosos. Campanha era a
principal Vila da região sul-mineira, logo, com mais condições de receber um número elevado
de alunos. Juntamente com a criação de escolas públicas, houve também iniciativas
particulares, o que possívelmente representa o reconhecimento da importância dada a
escolarização pelos campanhenses
As listas nominativas indicam que a maioria das crianças entre 8 e 14 anos, tanto
livres como escravizadas, estavam envolvidas com o mundo do trabalho. Esse envolvimento
configurou-se como um dos principais empecilhos para a construção de uma tradição de
escolarização. Nos relatórios dos presidentes da província esta contestação é recorrente, pais
não enviavam os filhos às escolas por que necessitavam destes como trabalhadores para a
subsistência da família.
7 Vereação de 15 de fevereiro de 1800. Memórias Municipais- V Campanha. Revista do Arquivo Público Mineiro, 1896, p. 483-484.
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A instrução pública era algo incipiente em 1831, não havia escolas suficientes para
atender a toda à população e tão pouco existia uma tradição escolar de envio das crianças às
escolas. De outro lado, havia uma tradição de socialização das crianças a partir do trabalho.
Portanto, podemos dizer que são significativos os dados de São Gonçalo e, sobretudo, de
Campanha sobre a participação das crianças em processos escolares, principalmente das
mulheres, cujas limitações ao acesso às escolas eram ainda maiores.
Brancos, pardos e crioulos nas escolas de Campanha e São Gonçalo
Um dos aspectos mais interessantes em relação às listas nominativas é a possibilidade
de tratar o pertencimento racial dos indivíduos que foram assinalados nas escolas. No
entanto, é preciso considerar que os registros relativos à qualidade (preto, pardo, crioulo)
não podem ser reduzidos a pigmentação de cor e nem tampouco a mestiçagem. Estas
terminologias definiam lugares sociais nos quais raça e condição social estavam associados.
Neste sentido, a proximidade ou distanciamento com a escravidão era essencial para a
designação do lugar social que, por sua vez, manifestava-se na classificação relativa a
qualidade (Castro, 1995).
Utilizamos os termos encontrados nas listas nominativas para promover a
classificação relativa ao pertencimento racial das crianças nas escolas:
GRÁFICO 2 ALUNOS EM CAMPANHA- POR RAÇA (%)
Fonte: Lista nominativa de Campanha - 1831.
GRÁFICO 3 ALUNOS EM SÃO GONÇALO- POR RAÇA (%)
71%
25%
4%
Brancos
Pardos
Crioulos
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Fonte: Lista nominativa de São Gonçalo, 1831.
Os dados de São Gonçalo indicam que os brancos compunham a maioria esmagadora
do alunado, ou seja, quase a totalidade, já que apenas 7% foram classificados como pardos.
Em Campanha encontramos a mesma situação, porém, os negros foram subdivididos em
pardos e crioulos chegando a compor 29% do alunado, o restante, 71%, era composto por
aqueles que foram classificados como brancos.
Para compreender esse predomínio de brancos é essencial lembrar que uma das
principais particularidades da região sul-mineira era o predomínio destes entre a população
livre. Logo, parece coerente inferir que o público escolar pudesse repercutir os dados gerais
da região.
Para demonstrar isso realizamos um levantamento da composição racial das crianças
livres em idade escolar, entre 8 e 14 anos, para realizar uma comparação entre os dados.
GRÁFICO 4 DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO LIVRE EM IDADE ESCOLAR DE
CAMPANHA - POR RAÇA (%)
Fonte: APM, Lista nominativa de Campanha, 1831.
93%
7%
Brancos
Pardos
63%
29%
8%
Branco
Pardo
Crioulo
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GRÁFICO 5 DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO LIVRE EM IDADA ESCOLAR DE SÃO
GONÇALO – RAÇA (%)
Fonte: Lista nominativa de São Gonçalo, 1831.
O público escolar das duas localidades se encaixa no perfil da região sul mineira, onde a
maioria dos indivíduos livres eram brancos. Em Campanha, o segmento composto pela
população em idade escolar era majoritariamente composto por brancos, 63%, número muito
próximo ao daqueles que encontramos no segmento atendido pelas escolas que, de acordo
com o gráfico 2, era de 71%.
Em São Gonçalo a situação é diferenciada, pois perfil racial dos alunos destoa muito da
composição da população em idade escolar. A escola era praticamente monopolizada pelo
segmento branco da população. Temos uma população em idade escolar diversa e
equilibrada, ou seja, quando agregamos as categorias de pardos, pretos e crioulos para
compor os negros temos exatamente 50% de cada um deles na população em idade escolar.
No entanto, temo 93% de brancos nas escolas contra 7% dos chamados pardos.
.
Perfil dos domicílios com crianças nas escolas de Campanha e São Gonçalo
Em Campanha, as 161 crianças registradas na escola estavam distribuídas em 106
domicílios. Em São Gonçalo, as 32 crianças estavam em 17 domicílios.
Na listas nominativas os domicílios reúnem um conjunto variados de indivíduos que
não podem ser reduzidos a lógica de um grupo familiar. Geralmente, há um grupo familiar
acompanhado por indivíduos livres e escravos que estão vinculados por relações de produção.
Havia correspondência entre a hierarquia domiciliar e a estrutura ocupacional do
estabelecimento produtivo. O chefe dedicava-se a uma atividade mais elaborada ou de maior
prestígio, ao passo que os demais membros (cônjuge, filhos, agregados e escravos)
50% 45%
3% 2%
Branco
Pardo
Crioulo
Preto
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geralmente estavam vinculados a ele. Desta forma, os domicílios possuíam uma natureza
dual, ou seja, eram ao mesmo tempo unidades de produção e moradia.
As listas não permitem uma identificação clara do grupo familiar, nelas sempre
encontramos um agrupamento variado de indivíduos que, na maioria das vezes, só pode ser
organizado através da lógica familiar por um processo rigoroso de análise.
Um indício importante para a construção do grupo familiar é o estado civil, ou seja,
quando o chefe é casado, sua esposa é apresentada logo em seguida, na sequência temos os
filhos do casal. Após estes temos os agregados e escravos, quando estes se faziam presentes
no domicílio. Agregados podiam ter alguma relação de parentesco com a família nuclear, o
mesmo não podemos dizer sobre os escravos.
Para uma classificação dos domicílios utilizamos uma classificação a partir de cinco
grupos específicos: grupo familiar simples, grupo familiar com agregado, grupo familiar
ampliado, grupo chefiado por homem e grupo chefiado por mulher.
O grupo familiar simples era aquele composto por um casal, um homem e uma
mulher acompanhado por seus filhos. O grupo familiar com agregado pressupõe a
organização do grupo familiar simples, com o acréscimo de indivíduos livres que não faziam
parte da organização familiar, cuja presença se justificaria pelo envolvimento com o trabalho.
O grupo familiar ampliado também pressupõe a existência do grupo familiar simples, mas
nele coexistem dois casais reconhecidos como legítimos. Grupo chefiado por homens e grupo
chefiado por mulheres são aqueles em que o chefia do domicilio não era ocupada por um
indivíduo designado como casado, mas sim uma pessoa solteira, ou viúva.
Classificamos os domicílios com crianças nas escolas, em seguida o restante dos
domicílios de Campanha e São Gonçalo para promover, em cada local, uma classificação que
permitisse avaliar a especificidade daqueles que tinham crianças em processo de
escolarização.
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GRÁFICO 6 PERFIL DOS DOMICÍLIOS COM CRIANÇAS NAS ESCOLAS – CAMPANHA (%)
Fonte: APM, Lista nominativa (1831) de Campanha.
GRÁFICO 7 PERFIL DOS DOMICÍLIOS DE CAMPANHA (%)
Fonte: APM, Lista nominativa (1831) de Campanha.
Ao comparar os dois gráficos identifica-se uma proximidade entre os domicílios com
crianças na escola e o total da população. Mais de 50% são constituídos por grupo familiar
simples, seguido de mais de 20% chefiados por mulheres.
53%
17%
1%
7%
22%
Grupo familiar simples
Grupo familiar com agregado
Grupo familiar ampliado
Grupo chefiado por homem
Grupo chefiado por mulher
54%
7%
1%
13%
25%
Grupo familiar simples
Grupo familiar com agregado
Grupo familiar ampliado
Grupo chefiado por homem
Grupo chefiado por mulher
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GRÁFICO 8 PERFIL DOS DOMICÍLIOS COM CRIANÇAS NAS ESCOLAS - SÃO
GONÇALO (%)
Fonte: APM, Lista nominativa (1831) de São Gonçalo.
GRÁFICO 9 PERFIL DOS DOMICÍLIOS DA POPULAÇÃO TOAL DE SÃO GONÇALO (%)
Fonte: APM, Lista nominativa (1831) de São Gonçalo.
Podemos dizer que encontramos em São Gonçalo e Campanha uma estrutura
semelhante em relação aos domicílios com crianças nas escolas, ou seja, havia um
predomínio do grupo familiar simples seguido por uma expressiva presença de domicílios
chefiados por mulheres.
71%
6%
23%
Grupo familiar simples
Grupo familiar com agregado
Grupo chefiado por mulher
52%
5% 1%
13%
29%
Grupo familiar simples
Grupo familiar com agregado
Grupo familiar ampliado
Grupo chefiado por homem
Grupo chefiado por mulher
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Posses de escravos nos domicílios com crianças nas escolas em Campanha e São
Gonçalo
A instrução pública surgiu com um discurso de civilizar as camadas mais pobres. No
entanto, é preciso problematizar até que ponto tal questão se concretizou. De acordo com os
relatórios dos presidentes da Província, a pobreza da população impedia muitas vezes os
alunos de frequentarem a escola, pois não possuíam as condições básicas, como vestuário, e
em alguns casos precisavam trabalhar para ajudar os pais. Veiga (2008) aponta que a
infrequência e evasão eram altos em razão da pobreza da população, do trabalho infantil e da
dispersão populacional. 8
Para conhecer a condição social das famílias que possuíam filhos na escola utilizamos
como indicador a presença de escravos nos domicílios. Como aponta Andrade (2008, p.71)
“um homem rico naqueles tempos evidentemente detinha a posse de ‘homens e terras”. Em
uma sociedade escravista o braço cativo era fundamental para o funcionamento do sistema
econômico e para a ampliação da riqueza dos senhores.
Em Campanha 55% dos domicílios com crianças na escola possuíam escravos. Em São
Gonçalo, o número era ainda mais representativo chegando a 95% os domicílios. Este é um
dado importante do público presente na escola, pois a totalidade dos domicílios de cada
localidade era compostas por domicílios que não tinham escravos: em Campanha 33% e em
São Gonçalo são 29%. Esses dados indicam que foi uma camada muito específica da
sociedade que participou do processo de escolarização, principalmente em São Gonçalo.
Paiva (1996) e Bergad (2004) apontam que em Minas havia um predomínio absoluto
de domicílios sem escravos. Apenas 32,5% dos domicílios tinham pelo menos um escravo
listado dentro da unidade.
Portanto, para refinar a análise procuramos dimensionar a presença dos escravos nos
domicílios com crianças nas escolas. Para isso, utilizamos quatro intervalos para construção
desta mensuração: um a três escravos; três a nove escravos; dez a dezenove escravos e mais
de vinte escravos.
8 Veiga (2008) chega a essas conclusões por meio da análise de diversos documentos - relatórios dos visitadores, delegados literário e /ou inspetores de ensino, ofícios e correspondências diversas entre pais, ou responsáveis, professores e governo, mapas de frequência de alunos.
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GRÁFICO 10 NÚMERO DE ESCRAVOS NOS DOMICÍLIOS COM CRIANÇAS NA ESCOLA
– CAMPANHA (%)
Fonte: APM, Lista nominativa de Campanha, 1831.
Em Campanha, o dado que mais chama a atenção é o elevado número de escravos nos
domicílios pois 29% deles possuíam mais de dez e 9% mais de vinte escravos. Quando se
analisamos o caso de São Gonçalo os números são ainda mais elevados.
GRÁFICO 11 NÚMERO DE ESCRAVOS NOS DOMICÍLIOS COM CRIANÇAS NAS
ESCOLAS - SÃO GONÇALO (%)
Fonte: APM, Lista nominativa de São Gonçalo, 1831.
Em São Gonçalo 36% possuíam mais de dez escravos e 14% mais de vinte escravos, ou
seja, se consideramos o segmento que possuía mais de dez escravos como segmento que
compunha uma elite constatamos sua forte presença nas escolas de São Gonçalo e de
Campanha.
21%
41%
29%
9%
Um a três
Quatro a nove
Dez à dezenove
Mais de vinte
21%
29% 36%
14%
Um a três
Quatro à nove
Dez à dezenove
Mais de vinte
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Considerações finais
Os dados apontados possibilitam identificar que aqueles que frequentaram as escolas
de instrução primária em Campanha e São Gonçalo possuíam um perfil muito específico,
sendo parte de uma pequena camada da sociedade. Eram em sua maioria os filhos de
escravistas, com atividades ligadas a agricultura e ao comércio.
Especificamente, o Arraial de São Gonçalo apresentou um perfil de alunado
totalmente elitizado, no qual, apenas brancos, em sua grande maioria homens, e pertencentes
as camadas mais ricas foram indicados como participando do processo escolar. Em
Campanha, mesmo acontecendo uma maior diversidade no perfil do alunado, sendo possível
identificar um número maior de pardos, crioulos e mulheres participando do processo de
escolarização, também encontramos uma presença expressiva de filhos de senhores de
escravos.
Referências
ANDRADE, Marcos Ferreira de. Elites regionais e a formação do Estado Imperial Brasileiro: Minas Gerais-Campanha da Princesa (1799-1850). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2008. A instrução pública e particular em Minas Gerais: nos anos de 1824 e 1825. Revista do Arquivo Público Mineiro. Ouro Preto, v.3, p. 639-673, 1898
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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
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