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A Msica Popular num Romance Brasileiro de Trinta: Das "Memrias de um Sargento deMilcias a Marafa"Author(s): Charles A. PerroneSource: Latin American Music Review / Revista de Msica Latinoamericana, Vol. 3, No. 1(Spring - Summer, 1982), pp. 73-91Published by: University of Texas PressStable URL: http://www.jstor.org/stable/780244.
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Charles
A.
Perrone
A
Musica
Popular
num
Romance Brasileiro de
Trinta: Das Memorias de um
Sargento
de Milicias
a
Marafa
A
preocupa~ao
fundamental
que
informa
grande
parte
da obra
romanesca brasileira da
epoca
de
trinta
e a de
retratar
a
brasilidade
do
homem nacional e suas
estruturas
de
pensamen-
to
e
comportamento.
Nao
e de
estranhar,
portanto,
que
muitos autores
daquele
estagio p6s-Modernista
se valham
artisticamente
do
riquissimo
cancioneiro
folclorico. Pertencem
quase
exclusivamente ao chamado ciclo
nordestino
aqueles
ficcionistas
que
integram
cantorias
e
velhas
cantigas
na sua
narrative a fim de melhor
configurar
os
espacos
referenciais
humanos e
geograficos
que
fundamentam
a
visao ficcional.
Os
exemplos
do
aproveitamento
literario
de
textos
liricos
de can?oes de
fundo
folclorico
sao assaz
abundantes, e,
alem de
numerosos
enfoques
tradi-
cionalistas ou
enumerativos,
ja
existem
estudos
que
mostram tanto
a
presenca
quanto
a funcionalidade
textual de
tais
trechos nos
romances
de
escritores
exemplares
como
Jose
Americo de
Almeida,
Rachel de
Queir6s,
e
Jose
Lins
do
Rego.t
Em
termos
quantitativos
e
comparativos,
os romances brasileiros da
mesma faixa historica (1928-1945) que podem ser associados a um ciclo
urbano,
assim
como a
presenca
da
musica
popular
urbana em
obras
de
ficcao,sao
muito menos
freqientes. Apenas
para
assinalar
alguns
casos
indicativos,
poderiam apontar-se
o romance urbano de
Amado
Fontes,
Rua do
Siriri
(Rio
de
Janeiro:
Jose
Olympio,
1937),
e
os romances
in-
iciais do
baiano
Jorge
Amado.
Na
obra do
primeiro, aparece
tao so
um
trecho
de
cancao
sentimental,
que
corresponde,
alias,
ao
designio
global
da
narracao.
Em
O
paz's
do
carnaval
(Rio
de
Janeiro:
Schmidt,
1931),
Jorge
Amado,
cuja utilizacao de elementos do lirismo popular da sua terra natal e
not6ria,
faz
figurar,
para
fins
ambientais,
um
verso
da musica car-
navalesca
"Da
nela"-um dos
primeiros
sucessos musicals de
Ary
Latin American Music
Review,
Vol
3,
No
1,
Spring/Summer
1982
?1982
by
the
University
of
Texas Press
0163-0350/82/010073-19$01.70
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74
:
Charles
A. Perrone
Barroso,
compositor
monumental
da muisica
popular
urbana.2 Em
Jubiabd
(Rio
de
Janeiro: Jose Olympio,
1935)
e
Capitaes
da areia
(Rio
de
Janeiro: Jose Olympio,
1937)
inclui
fragmentos
de letra de samba urbano
e de valsa
que
nao encerram maior
importancia.
Em
contraste
com
uma
serie de romances de trinta nos
quais
a
cancao folclorica nordestina exerce
uma
funcao
apreciavel,
nestes
casos do
aparecimento
da muisica
popular
urbana o
papel
que desempenha
no
esquema
narrativo
e
pequeno
e
relativamente
insignificante.
Nesta
conjuntura
merece
especial
atendao o romance
Marafa
de Mar-
ques
Rebelo,
obra
destacada do ciclo urbano
do romance
de
trinta
no
Brasil.3
A
presenca
de
muisica
popular
da
epoca
e constante nesta
hist6ria
profundamente
carioca. Um dos elementos mais
coloridos no
painel
social
que
Rebelo
pinta
e
precisamente
o do lirismo
da
cancao
em suas diferentes
manifestaobes.
Muito mais do
que
um
componente
aleat6rio do mundo
ficticio,
este
aspecto
da
plasmacao
revela-se
como
um
fenomeno
significante
e
integrado
na
estruturacao
da obra. Ate certo
ponto, poderia
estabelecer-se um
paralelo
entre o
surgimento
desta obra
singular
e o florescimento
e a
sistematizaao
da musica
popular
carioca,
refletidos
apreciavelmente
no
universo
ficcional
de
Marafa.
Antes de
proceder
a
evidencia textual destas
asseveragoes, porem,
convem indicar os
paradigmas
da
historia literaria brasileira nos
quais
este romance
de
Marques
Rebelo se
insere. Tratando-se
de
uma
historia
que gira
ao
redor da vida
na
cidade do Rio de
Janeiro,
a obra
pertence
a
um ciclo criticamente
fixado
desde
as
observacoes
de
Astrojildo
Per-
eira no estudo "Romancistas
da cidade:
Macedo,
Manuel Antonio e
Lima Barreto."4 Os
parametros cronologicos
do livro
em
que figura
este
artigo
(1752-1930)
excluem
a
producao
de
Marques
Rebelo;
a
ausencia
do maior
dos romancistas
brasileiros,
Machado de
Assis,
teria
uma outra
explicagao. Afranio Coutinho, o organizador do mais amplo estudo da
hist6ria
literaria
brasileira,
apresenta
Marques
Rebelo como
"integrando
a familia dos ficcionistas
da vida
carioca,
Manuel Antonio de
Almeida,
Machado
e Lima Barreto."5
No
que
se refere
a
especificidade
do
presente
enfoque,
o
relacionamento
entre estes antecessores
e
o autor de
Marafa supera
a coincidencia do
espago
narrativo
escolhido,
pois
todos os
citados
assinaram romances
que
oferecem
algum
reflexo das
praticas
musicais
urbanas de
suas
respectivas
decadas.
O
recem
saido estudo
do
maestro
Baptista
Siqueira,
Fic;do
e
muisica
Rio
de
Janeiro:
Folha
Carioca, 1980), particulariza aspectos do gosto musical carioca do seculo
XIX
e de
comecos
do
XX,
conforme
lhe
possiblitam
faze-lo
passagens
de romances desde Teixeira
de Sousa ate Lima Barreto. Feita
desde o
angulo
da
historiografia
musicologica-com
escassos
julgamentos
literarios-a
monografia
do
pesquisador
estabelece
a
base,
delinea a
materia
bruta,
para aqueles
interessados
eventuais
que desejarem
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A
Mu'sica
Popular
num
Romance
Brasileiro : 75
investigar
a
funcionalidade
artistica destes fenomenos musicais
como
componentes
de
uma
estrutura
verbal
independente
da esfera
referencial
a qual pertencem em termos s6cio-hist6ricos.
A
questao
da
integracao
de tradi?5es
populares,
como as lirico-mu-
sicais,
no
processo
narrativo e abordada de
passagem por
Antonio
Can-
dido,
um
dos mais
distinguidos
criticos
do
Brasil,
em seu
estudo
de
Manuel Ant6nio
de
Almeida,
"Dialetica da
malandragem
(Caracteriza-
cao das
Memdrias de
um
sargento
de
milicias)."6
Em
termos
mais
especificos,
o
evoluido
sentido critico deste
artigo
apresenta
orienta?oes analiticas
assaz valiosas
para
a
apreciacao
dos
costumes
populares
como elementos
constitutivos
de
uma dinamica
ficcional. Mais
adiante voltar-se-a
sobre
este
particular.
Em
termos
mais
gerais,
o
trabalho
do Professor Candido estabelece as
caracteristicas
de
outro
paradigma
da hist6ria literaria brasileira:
o
ro-
mance malandro. Elaborado
a
partir
das
peripecias
e astuicias de um
her6i
que
opera
fora
da ordem social oficializada e
institucionalizada,
este conceito critico-analitico oferece ricas
possibilidades para
a
avaliaco
de
Marafa,
continuacao
de uma serie
literaria
gerada pelo
modelo das
Memorias de um
sargento
de
mil'cias.
Se bem
que
o
desenvolvimento
cuida-
doso desta
abordagem
no caso do romance de
Marques
Rebelo
mereca
um estudo a
parte,
ha de
imp6r-se
aqui
a consideracao do fator da mal-
andragem
(como
fenomeno socio-cultural
e
literariamente
paradigma-
tico),
porquanto
representa
tambem em
Marafa parte
basica da materia
romanesca,
e
porquanto
esta tematica
implica
inexoravelmente a
pre-
senca
da musica
popular.
Sendo
elemento
constitutivo essencial
deste
setor
socio-cultural,
conforme elucida
a
"sociologia
do dilema
brasileiro"
cabalmente
desenrolada
por
Roberto da Matta
em
Carnavais,
malandrose
herois,7
o canto
representativo
da
malandragem
nao
poderia
faltar numa
criacao
literaria
da
natureza de
Marafa.
Em
qualquer
caso,
a
simples presenca
de cenas musicais
ou de trechos
liricos
em
um
texto
literario nao
garante
sua
efetividade
estetica contex-
tualizada.
Neste sentido convem
reproduzir
os
juizos
de
Antonio
Can-
dido sobre o valor
documentario
de costumes
e
tradi?oes
populares
no
romance celebre de Manuel
Antonio de Almeida. Considerando
que
fazer
figurar praticas
sociais reais na
obra "se
poderia
chamar de for-
malizacao
ou
reducao
estrutural dos dados
externos,"
o estudioso
passa
a
verificar tres niveis de
narracao:
(1)
os
pr6prios
atos dos
personagens;
(2) os
usos e
costumes da sociedade; e (3) comentarios judicativos.
Quando
Candido observa
resultados textuais no caso das Memorias de um
sargento
de
milicias,
oferece no
processo
modelos de
avaliacao
que poderao
servir no caso
de
Marafa.
Dirigindo-se
a
posicao
no texto dos usos
populares
e
costumes, diz,
Quando
o autor os
organiza
de
modo
integrado,
o
resultado
e
satisfat6rio
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76
: CharlesA.
Perrone
e
n6s
podemos
sentir a realidade.
Quando
a
integracao
e
menos
feliz,
parece-nos
ver uma
justaposicao
mais ou menos
precaria
de elementos nao
suficientemente
fundidos,
embora interessantes
e
por
vezes encantad6res
como
quadros
isolados. Neste ultimo caso
e
que
os usos
e
costumes
aparecem
como
documento,
rontos para
a
ficha dos
folcloristas,
curiosos
e
practicantes
da
petite
histoire.8
Reginaldo
Guimaraes
exemplifica
o
tipo
de
pesquisa
referido no
fim da
citacao,
havendo assinado
Ofolclore naficfdo
brasileira,
um
levantamento
das manifestacoes musicais
e
festivas no
romance analisado
por
Candido,
sem nenhuma
intencao
extra-documental.9
Perante o
texto
em
si,
a
distincao entre o documentario e o integrado e significativa. Por um
lado,
Candido ressalta
a
existencia
de uma
"desintegracao
dos elementos
constitutivos."
Esta ocorre no
capitulo
17
das
Memorias,
onde
e
tematizada
uma
procissao
tradicional como
bastidor
para intrigas
entre
personagens.
"Apesar
de
interessante,
tudo
nele esta
desconexo,"
con-
forme continua
observando
o
critico.
Em
contrapartida,
a
capoeiragem
[luta
corporal
afro-brasileira]
do
capitulo
15 "e
parte
constitutiva
da
acao,
de maneira
que
nunca
parece que
o
autor
esteja
informando
ou
desviando
a nossa atencao
para
um
traco
da sociedade."10 Assim o autor
consegue conciliar intencoes retratistas/costumistas e as exigencias de
uma
tecnica narrativa
consistente.
Esta
especie
de exito artistico identificado
por
Antonio
Candido em
determinados
quadros
deste romance
e
modelar,
por
assim
dizer,
e
con-
stitui um
marco de referencia
para
os momentos
musicalizados
em
Marafa,
romance
tambem escrito
a
base
de
uma
sucess5o
de
quadros.
Sendo
que
as
amplas
intencoes
criticas
de Candido trascendem
o nivel
especifico
da
musica
popular,
nao se
pode
senao
lamentar
que
ele nao
se
tenha
debrucado
em
particular
sobre
alguns
quadros
onde
aparecem
tex-
tos de canqoes, para verificar ate que ponto se da ali o feliz encontro da
funcionalidade
textual
e da
referencialidade
costumista.
Se bem
que
faltem
comentarios
especificos
dele
sobre uma
cena
em
que
a futura
namorada
do her6i canta
uma toada
sedutora,
pode
inferir-
se
que
Candido a consideraria um caso de
integracao, pois
pertence
a
parte
do
romance
onde
o
autor,
na
opiniao
do
critico,
supera
as
"descric6es
estaticas,"
dissolvendo usos
e
costumes
"na
dinamica
dos
acontecimentos'""
A
esta altura
do enredo
a linha
narrativa
se concentra
na
mudanca
afetiva do
her6i. Assim os
versos
que
lhe canta
uma
moca
cativante nao sao nada arbitrarios:
Se os
meus
suspiros pudessem
Aos teus ouvidos
chegar,
Verias
que
uma
paix.ao
Ter
poder
de
assassinar.'2
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A
Musica
Popular
num
Romance
Brasileiro
:
77
Um
pouquinho
antes desta
apresentasao,
sugere-se
que
ela cante
a
composicao
"Quando
as
glorias gozei."
A
personagem
decide
nao
canta-la,
e o texto da
cancao
nao e relatado. Se a
opcao porventura
parecer
arbitraria,
cotejem-se
os dois textos
reproduzidos por Baptista
Siqueira
e ver-se-a
que
o
sentido
do
que
o
romancista
escolheu cor-
respondia
muito mais aos
designios
do
quadro
e da linha
narrativa em
vias de
desenvolvimento.'3
Ao
mesmo
tempo
este
quadro
do romance oferece
um
ponto
de
refer-
encia valioso
para
quem
investiga
a
realidade musical das
primeiras
decadas do seculo
XIX
no Brasil. Ambos os titulos mencionados
por
Manuel
Ant6nio
de Almeida
sao modinhas-cancoes
amorosas
para
uma
voz e
acompanhamento
de
viola
que
comecaram
a
aparecer
na
corte de
Lisboa
nas uiltimas decadas do seculo
XVIII,
executadas
pelo
brasileiro
Domingos
Caldas
Barbosa,
autor e
interprete
de
cantigas
indecorosas
para
seu
tempo
que
ganhavam
cada vez mais o interesse de
compositores
(para
cravo
e
piano),
de
consumidores
de
salao,
e eventualmente
do
povo
comum.
4
Alem das naturais influencias da
metr6pole
sobre a
colonia-inclusive
em
gosto
musical-circunstancias
hist6ricas
im-
previstas
criaram
uma
situacao s6cio-musical
que
seria refletida
em
paginas
literarias.
O musicologo
brasileiro
Bruno Kiefer diz
ao
respeito:
"Certamente
a vinda da corte
portuguesa
muito contribui
para
a
difusao
da modinha nos sal6es
da nossa
terra.
E
deu-se
entao
um
fato notavel:
a
modinha,
originalmente
mulsica
de
saldo,
irradiou-se
rapidamente
ara
as camadas
populares
(grifo
original).
. . .
Leiam-se,
neste
sentido,
as Memorias
de
um
Sargent
de
Milz'cias
de Manuel
Ant6nio
de
Almeida,
notavel
pela
descricao
dos costumes
na
epoca
de D.
Joao
VI."'1
A
irradiaiao
da
modinha fora dos
saloes,
exemplificada
na
presenca
de
"Se
os meus
suspiros pudessem"
e
"Quando
as
glorias
gozei"
na
reuniao dos personagens literarios de estatura humilde, da lugar ao
chamado
"folclore de
absorcao":
a
transmissao
oral e
a
variacao
melodica ou
lexica de
cancoes
de
compositor
fixo
divulgadas
por
meios
escritos.
A
ocorrencia hist6rica destes
fenomenos
pode
ser
colegida
apresentacao
literaria das
praticas
lirico-musicais do Rio de
Janeiro
da
epoca
do
rei,
marco
temporal
do romance
em
questao.
Baptista
Siqueira
comenta
detalhadamente
as
passagens
de modinha
na
obra de Manuel
Antonio.16
Ha
outras
instancias de trechos lirico-musicals
nas Memdrias
de
um
sargento
de milicias.
0 caso das modinhas
comentadas, todavia,
e o
que
melhor demonstra a riqueza potencial da obra para o pesquisador pro-
priamente musicologico
ao lado
de um
exemplo
cabal da
utiliza(ao
ar-
tisticamente
habil
do
repert6rio
do
povo
da
epoca.
Entre
a
fixacao
cronologica
das
Memdrias
(comecos
do seculo
XIX)
e a
de
Marafa,
decorrem mais de
cem
anos.
Manuel Antonio de Almeida
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7/20
78 : Charles
A.
Perrone
plasma
um
Rio de
Janeiro
em
que
a
diversao lirico-musical das massas
se mantinha
principalmente
no nivel
folclorico: o
batuque
e cantos afins
dos escravos africanos17
(praticamente
ausentes da narrativa conforme
cabal
observacao
de
Candido no trabalho
citado),
o
cancioneiro luso-
brasileiro
tradicional,
e
cantigas
de
tipo
religioso, por
exemplo.
A
musica
popular
urbana
por
si
apenas
esta em fase embrionica no
que
se
diz
respeito
a
definiaio
de
generos
e ao
amplo
reconhecimento de
autores.
Para
quando
Manuel
Antonio de Almeida escreve seu
romance
(1853)
versos
de
modinha
ja
circulavam
em folhetos
(lyras)
e
vendiam-se
regularmente partituras
de musicas
para
consumo
geral,
mas ele retrata
literariamente
a
cidade de
meio seculo antes.18
Marques
Rebelo,
em
contraste,
plasma
um
Rio de
Janeiro
em
que
estao
caracterizados
e
distinguidos
os
generos
da
muisica
popular:
o
sam-
ba,
estilizaao citadina de
velhas formas de
remota
raiz
africana,
de
for-
magao
muito
discutivel mas de
importancia
indiscutivel
para
as
camadas
sociais
retratadas no
romance;"9
a
marcha,
derivada da
polca europeia
importada
e
adaptada
as
exigencias
da
expressao
carnavalesca;20
a
sen-
timental valsa de serenata e
o
genero
afin,
a
modinha,
revitalizada nos
bairros
urbanos no seculo
XX
ap6s
uma
ampla
folclorizaao ao
longo
do
seculo
XIX.
Alem
do
Inais,
a
figura
e
concepgao
do "malandro" e
qualitativa-
mente
mais diferencial
no ambito
urbano
da
quarta
decada
deste seculo.
Na
epoca
das
Memorias,
"malandro"
ja
conota
aquele
que
nao trabalha
e
que
vive
deslocadamente,
conforme
presencia-se
no
comportamento
do
personagem principal daquela
obra.2'
Mas ate 1930
efetuam-se
grandes
transformao;es
na
sociedade
brasileira-formagao
da
republica,
abolicao
da
escravatura,
emigraao
massiva
para
as
cidades,
urbanizacao
e
estratificagao
social
gerais,
amplo
desemprego
e
subemprego, surgimento
de
subculturas urbanas (nas favelas, por exemplo)-e, como e de se
esperar,
a
imagem
do malandro vai
adquirindo
outras
associaSoes,
entre
elas a de
certo
comportamento
vital
(ostentagao, despreocupagao,
sobrevivencia
pela
astucia)
e
lirico-musical. Esta
ultima sera
amplamente
aproveitada
por
compositores
dos anos vinte e trinta
e,
como se con-
statara
em
seguida,
pelo
genio
literario de
Marques
Rebelo,
criador de
uma
nova
"dialetica da
malandragem"
em
seu
romance
Marafa.
Segundo
o
vocabulario
incluido
na
segunda
edicao
do
romance,
"marafa"
quer
dizer "vida
libertina,
desregrada.
"
Desta
maneira,
percebe-se a partir do titulo um dos dois eixos fundamentais do livro. Ot-
to Maria
Carpeaux qualifica
Marafa
como "a
epopeia
meio triste do
homem
comum,
do
povo
miudo do
Rio de
Janeiro"
(Marafa,
p.
18,
in-
trodugao).
Apresentam-se
em
quadros
curtos,
freqiientemente
alter-
nados,
duas linhas
de
desenvolvimento
fabular:
por
um lado as
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8/20
A
Mtsica
Popular
num Romance
Brasileiro :
79
peripecias
urbanas do
malandrao
Teixeirinha;
e
por
outro lado as am-
bicoes
e
aspira6ces
de
Jose Rodrigues,
funcionario
e
figura represen-
tativa da classe media.
O
magistral
final do romance esta no cruzamento
destes estratos
sociais. Ate
chegar
la,
a
muisica
popular
e
parte
essencial
da
configuracao
do mundo
carioca,
especialmente
no
que
diz
respeito
a
malandragem
e
ao
meio
festivo.
Desde a
abertura,
as
composicoes pop-
ulares
desempenham
um
papel importante;
a
musicalzacao
da
primeira
cena
ja
estabelece
um
tom
a
seguir
no
desenvolvimento
da obra. Esta
abre
com
uma
valsa
seresteira cantada
por
um
vadio
bebado
a
porta
de
uma
prostituta,
a
quem
dirige
a
serenata:
Com o vestido de baile das estrelas
vem a noite dancar no teu
jardim
abre
a
tua
janela para
ve-las
que
as
estrelas
do
ceu falam
de
nim.
(Marafa,
p.
21)
Este
trecho,
e os
que
seguem, plasmam
o
apelo
e o
humor
que
sao
basicos
a esta cena
incial
e
tamem
a
concepcao
geral
do
romance.
O
ex-
emplo
foi habilmente escolhido
do
repert6rio
da
epoca:
trata-se
da
com-
posicao
"Romance" de Francisco Alves
e
Orestes Barbosa.
Este,
poeta-
letrista,
assinou textos liricamente
singulares
e um
inusitado livro im-
pressionista
sobre a musica
popular
e os musicos
populares
cariocas. En-
tre suas observac6es
sobre
seu
tempo,
declara,
"Nao
ha
exagero
em
dizer
que
Francisco
Alves
e
o maior cantor de Brasil."22
Com
efeito,
"Chico Viola"
(seu
pseudonimo
de
palco)
era
dono de raro talento
vocal;
alem
do
mais
era
o
primeiro
idolo artistico do Rio
quando
do
lancamento
de
Marafa.
A
apresentacao
de uma
musica
interpretada por
ele
tinha,
naturalmente,
ressonancias imediatas
para
o
leitor
da
epoca.
Esta
primeira
cena da
comeco
a
serie
que
compoe
o livro. Adonias
Filho dedicou
consideracoes
perspicazes
a
construcao de
Marafa
em seu
estudo
da
narrativa da
epoca,
O
romancebrasileirode trinta.
Suas reflex6es
sobre
a
"personagem
social,"
ao
mesmo
tempo,
sao
perfeitamente
aplicaveis
ao
fenomeno da cancao
popular:
A
construcao
se
realiza em
cenas,
que
na enorme varia5c
(o
bordel,
o car-
naval,
a
batota,
a
rua)
se
condensam
afinal
em
um
bloco unico. Reflete-se
a
cidade-uma
parte rigurosamente
humana
da
cidade-em sua
conduta,
seus
sentimentos,
suas reacoes
psicol6gicas
mais livres. ...
O
compor-
tamento
decorre
de um ambiente
que
envolve
cada
personagem
....
Ela,
a personagem, encarna uma parte da cidade em seus problemas, sua con-
duta,
e suas
paixoes.23
Como no
primeiro
caso,
as
cenas liricas
do romance formam
parte
in-
separavel
do
bloco
uinico
ideado
por
Adonias Filho.
A
reflexao
e a
encar-
nacao
a
que
se
refere
podem
encontrar-se na
expressao
lirico-musical das
figuras
criadas,
na
letra
das
musicas
populares
intercaladas na
narracao
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9/20
80 : Charles
A.
Perrone
desta
hist6rica
carioca.
Uma
serie de
exemplos
ilustra como
a
presenca
de
composicoes populares
bem selecionadas
(ou criadas)
e
colocadas,
e
capaz de sustentar a particular visao de mundo do romance.
O
personagem
Teixeirinha,
o seresteiro ebrio
da
abertura,
integra
tambem clubes carnavalescos
(gremios recreativos),
sendo
compositor
de
um samba de
enredo
cujo argumento
e
baseado
num
livro
de hist6ria ao
qual
falta
grande
parte
da
parte
introdutoria.
Ele nao so se desabafa
atraves
do
canto,
mas evoca
reacoes
musicals nos outros.
A
procura
de
dinheiro
emprestado
o leva
a um
bordel
do outro lado da
cidade,
onde
uma
amiga
prostituta,
tendo
que
ceder
inesperadamente
aos
desejos
dele,
empunha
o violao e comenta
sua
situacao
nos
seguintes
versos:
Mulher
e tua sina
Viver no meio
vagabundo
...
...
.
nao sei
pra
que
voce
nasceu assim.
A
tua
vida
e a
desgraca
do mundo.
(Marafa,
pp.
87-88)
O
que
os
versos
sugerem
vai alem
do
reduto reduzido
da
prostituicao
e da situacao pessoal da cantora. Implicam-se neste trecho duas quest6es
que
permeiam
o
romance:
a
posicao
submissa da mulher
e
a
avaliacao
do destino.
Em uma
descricao
anterior
apresenta-se
uma
personagem
menor,
celebre
pela "graca
triste com
que
cantava
a
canao
'Infeliz,'
rosario
das
desgracas
duma mulher
perdida" (p. 27).
Aqui, porem,
a
contextualizacao
e
projecao
de sentido sao
maiores.
A
cantora
refere seu
destino
individual,
mas os ecos
da
cancao
que
interpreta
no
caso
atingem
Rizoleta,
amasia de
Teixeirinha,
e
Sussuca,
inocente
noiva
de
Jose Rodrigues,
na medida em
que
tais ecos
significarao
os efetos do
"meio vagabundo" nas suas "desgracas" respectivas. Ate certo ponto,
todos os
personagens
de
Marafa
mostram
preocupa6ces
fundas
para
com
o futuro
e a vida
ja
vivida-dai
a
tensao narrativa-mas
no caso do
elemento
"lumpen," desprovido
de
maiores
expectativas
na sociedade
oficial,
a
inquietacao
revela uma
natureza
dialetica,
flutuando entre
uma
afliaio
apreensiva
e
uma
despreocupagao "irresponsavel."
Esta
dinamica
comportamental percebe-se
no
"samba triste"
que
Aristides,
vendedor de modinhas
e
grande companheiro
de
Teixeirinha,
entoa
numa outra situacao:
Fui
louco
.
. .
(Fui )
Resolvi tomar
juizo.
A
idade vem
chegando
e e
preciso.
(Marafa,
p.
152)
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10/20
A
Musica
Popular
num
Romance
Brasileiro
: 81
Esta
musica foi
composta
por
Armando
Maraal
e
Alcebiades
Barcelos.
Este,
apelidado
Bide,
foi
responsavel por
muitos sambas
de
grande
sucesso
naquela epoca,
entre eles "A
malandragem,"
tematizaao levada
a fama
na
voz
de Francisco
Alves. Por sua
parte,
"Fui
louco"
chegou
a
ser sucesso retumbante
do carnaval de
1934,
um
ano antes da
publicacao
de
Marafa.
No
contexto do
romance,
a
cancao
forma
parte
da
descricao
das atividades
dominicais
nos
botequins
e nas
esquinas
da
cidade,
descricao
que
figura
tambem
no
esforCo
costumista urbano do autor.
Um
outro samba
apresentado pelo personagem
Aristides,
caracteri-
zado como
"flor sonora
da
malandragem"
(p.
152),
da
motivo a uma
discussao sobre
um
curioso fenomeno
comum
da
epoca:
a
venda de
musicas. Ilustra-se a necessidade de
compositores
populares
venderem
os direitos
a sua obra
(ou
colecoes
de outras
composicoes
recentes)
para
poder
sobreviver. Pelo
menos
um
pesquisador
brasileiro tem-se
ocupado
desta
particularidade,
no caso relacionando-a
com
a
obra literaria de
Marques
Rebelo.24
Quanto
ao sentido da canSao em
relaqao
ao
texto em
que
se
encaixa,
nao e
obscuro,
uma vez
que
se
combina muito bem com
os
problemas
emocionais e economicos
que
Teixeirinha
vem
tendo com
sua amasia:
Esta mulher desmoralizao meu nome
Ela
anda de
porta
em
porta,
dizendo
que
nao come.
(Marafa,p.
162)
Ja que
quem
canta
declara
que
a
muisica
e
de outro
compositor,
pode
suspeitar-se
que
a letra foi fabricada
por Marques
Rebelo no
espirito
do
quadro
e
para
fins
especificos
textuais,
mas
nem
por
isso deixa de
refletir
tipicidade
nem
perde
sua eficacia no contexto.
O
relacionamento
desigual
entre Teixeirinha e
Rizoleta
ja
e
temati-
zado
num dos
primeiros capitulos
do
romance,
a
partir
tambem duma
cancao:
-Canta o
"Tormento,"
pedia
reclinando-se
sobre
a
mesa bamboleante.
Ele
abria
o
peito:
"Mulher,
o teu olhar maltrata tanto
..
."
(p. 39)
("Tormento"
de Francisco Alves
e
Luis
Iglesias,
gravaa5o 1932)
O
autor se vale dos versos
reconheciveis
dos
compositores populares para
ironizar a situacao narrada: na cena o olhar dele evidencia seu egoismo,
enquanto
os olhos dela revelam seu
empolgamento
no namoro e resul-
tam
provocativos
ate
dar motivo
a
uma
briga
cor uma
outra mulher.
Verifica-se outra vez
que
a
escolha
de
canbces
representativas
do
meio
e
da
epoca
nao
e
arbitraria;
elas se
integram
na
cena,
enfocam
a
atencao
do
leitor
no
que
acontece,
e
evitam assim
o desvio dessa
atencao
para
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11/20
82
: CharlesA. Perrone
algum
traco
especifico
da cultura
popular
com
intengoes
independentes.
E
nalguns
casos
pareceria pouco
arriscado
sugerir
que
determinadas
musicas servem ate de
inspiracao primordial para
a
pr6pria
cena.
O
escrutinio
dos
capitulos
dedicados ao
carnaval,
por
exemplo, podera
mostrar
a
possibilidade
de
que
alguns
versos
de
musicas
populares
tenham
dado
ideias narrativas a
Marques
Rebelo. Nao
e
de
estranhar
que
os
episodios
dedicados
a festa do Rei Momo
mostrem
a maior
quan-
tidade de musicas
populares
no decorrer do
romance,
pois
na
decada de
trinta
grande
parte
da
composiao
se destinava
aquele
acontecimento.
O
radio
ja
difundia
musica
popular
durante todo o ano no Rio de
Janeiro,
e
a
vitrola
ja
estava no
mercado
havia
tempo,
mas
a
receptividade
do
publico,
quanto
a
novas
musicas,
estava bastante concentrada
naqueles
dias em
que
se
cantava massivamente
pelas
ruas.25
Nestes momentos
verdadeiramente
antologicos
de
Marafa-os
capitulos
em
questao figuram
na coletanea de
Wilson
Louzada,
Antologia
do
cana-
val26-citam-se a cada
passo
sambas
e marchas da
epoca.27
As letras
in-
tercaladas
guardam
uma
relacao
engracada
com
o
acontecer
descrito,
conforme o
tom e
espirito
do momento
exigem.
Assim,
por
exemplo,
quando
o calor
comega
a
castigar
o
puiblico,
ouve-se cantar
o
verso
"Queria
te ver no
inferno sem ventarola"
da
cancao
"Boa bola" de
Lamartine Babo
(1933).
Alem da
associacao
meteorologica,
o
verso
coin-
cide com o
desejo
reprimido
de
Jose Rodrigues
de
que
a
mae
da
noiva,
que
os
acompanha
na
rua,
se
afaste
para
que
os dois
jovens possam
realmente estar
juntos. Logo
mais,
quando
um cordao frenetico
ameaca
machucar varias
pessoas,
entoa-se uma marcha
que
Plinio
de Brito
fez
sobre motivo folclorico
mineiro
em 1930:
Quebra
quebra
gabiroba
Quero
ver
quebrar.
(Marafa,
p.
61)
A
presenca
de musicas
que
foram
verdadeiros sucessos de
carnaval em
1933 se
da em
"Fita amarela" de
Noel
Rosa e em
"Formosa"
(Nassara
e
J.
Rui),
que
alem
de
valor retratista
sugere
indiretamente a
admiracao
de
Jose por
Sussuca. Noel Rosa se destaca como
um
dos mais
requin-
tados de toda
a
hist6ria
da
musica
popular
brasileira. Ganhou o
apelido
do
"fil6sfo
do samba"
compondo
versos ironicos e
perspicazes
tais como
os
que
sao
relatados
em
Marafa:
Quando
eu
morrer
Nao quero choro nem vela
Quero
uma
fita amarela
Gravada cor o nome dela.
(p. 63)
A
letra intercalada serve
como uma
ligeira prefiguracao
da
tragedia
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12/20
A
Musica
Popular
num RomanceBrasileiro
:
83
que
encerra
o
romance.
Quando
o casal a
ouve
recitar,
repetida para
maior
enfase,
Sussuca
indica
que
seu
unico
desejo
e
que Jose
se manten-
ha
ao lado dela.
Assim
o autor tece elementos de enredo e
outros cos-
tumistas
ao
apresentar
uma
sensacao
musical
contemporanea.
Outros
versos
que
aparecem
nesta
parte
de
Marafa
mostram
um
lado
meramente tradicional. Ao
cair um
aguaceiro,
a
multidao
urra uma
"moda de forcada
rima"
que,
segundo
as
pesquisas
de
Edigar
de
Alen-
car
era contestaao
as
chuvas carnavalescas desde 1905:28
Sao
Pedro
nao
seja
mau
Guarde esta chuva
para
depois
do
Carnaval.
(p. 65)
Em
seguida
aparece
a
letra de
"Nao
paga
o
bonde"
no meio da
con-
fusao
que surge
quando
os transeuntes
procuram
abrigo
d chuva
no
carro eletrico.
A
musica
que Marques
Rebelo
inclui
aqui
talvez
seja
a
mais
conhecida das muitas
que naquela
epoca
tematizavam
a
figura
do
condutor
de
bonde. Esta
particularidade
do carnavel carioca
mereceu
uma
serao no
segundo
livro de
assunto
musical do
prolifico Jose
Ramos
Tinhorao.29
No fim dos
quadros
carnavalescos,
Marques
Rebelo ironiza
mais
uma
vez
quando
em
contraste com o cansaco
das
pessoas
e o ambiente
moribundo,
observa
uma
batucada:
As
escolas de samba
digladiavam
ao som morto
dos
tamborins.
"Vejam que
batucada,
que
ate
parece
metralhadora."
(p.
69)
Este
conjunto
de
musicas
populares apresentadas
nestes
epis6dios
com-
poe
um elemento
indispensavel
no
retrato da
tipica
festa
carioca e
oferece
uma
amostra
valiosa
da musica
popular
da decada de
trinta. No
que
se refere a seu
papel
literario, sao funcionais dentro do
esquema
de
ambientaao
desejada;
isto
e,
desempenham
funcao
referencial. Mas
tamb6m constituem instancias indicativas
do
tom
ironico-humoristico
fundamental no texto maior.
O
fen6meno
geral
da musica
popular-ninguem
o
negaria-e
de alta
importancia
socio-cultural no
contexto
brasileiro,
e mais
especificamente
no carioca.
O
carnaval
que
o autor de
Marafa
plasma
sinteticamente
representa
a
intensificaao
epocal
de
tendencias
generalizadas
da
figura
do
malandro,
conforme elucida a cabal
visao
antropologica
de
Roberto
da Matta:
O
malandro brasileiro
parece
introduzir no
mundo fechado da nossa
moralidade
uma
possibilidade
de
relativizacao. "Sou
pobre,
mas tenho
a
cabrocha
(a mulher),
o luar e
o
violao."
O
seu mundo
sendo intersticial
e
aquele
universo
onde
a
realidade
sempre
pode
ser lida e
ordenada
por
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13/20
84
: CharlesA. Perrone
meio de
multiplos c6digos
e eixos.
E
tais
relativizacoes
sempre
tendem
a
incidir
sobre o
canto,
a
danca,
a
alegria
e a
brincadeira,
area
que
e
deix-
ada aberta para os malandros e rigorosamentecodificadano carnaval.30
A
citaao de malandro
imaginada por
da
Matta lembrara a
primeira
e
outras cenas de
Marafa
nas
quais
estes
tres elementos se
conjugam
tanto
na
narracao
mesma
quanto
nos trechos liricos intercalados. Esta
caracterizacao
antropologica
tambem elucida
as estruturas
espaciais
e
temporais
do universo ficcional
de
Rebelo,
verificando-se assim
a
genial
captacao
literaria de
um
mundo
especifico.
Alem
das duas linhas
principais
do romance-a odisseia
urbana do
malandrao Teixeirinha e a carreira ascendente de Jose-Marafa contem
umas
poucas
est6rias
"independentes,"
intercaladas no marco
maior,
mas consistentes com o
desfgnio
geral
da obra. Entre elas salienta-se
uma leitura de cronica feita
por
um
personagem
menor,
o
jovem
escritor: "UM OLHAR DENGOSO
E
CHIQUE-Musica
de
senti-
mento e
pancadaria."
Merece
comentario este
quadro
porquanto sugere
aspectos
s6cio-psicologicos
do
fenomeno
da
cancao,
assim
como
o
significado
da
etiqueta
"malandro."31
Neste
suposto artigo jornalistico,
desenrola-se
a
hist6ria
da
vinganca
de
um morador do
bairro da
Saude,
cuja mulher e seduzida por um vizinho lirico a partir de uma modinha
conhecida:
O
seu olhar
dengoso
e
chique
assim,
Ha de
dar cabo
meu
anjinho
s6 de mim.
(p.
214)
Enquanto
"a
gente
da avenida
gozava
o
cantar," Antonio,
o futuro
ofendido,
"se
indignava":
"Malandro
Em vez de
trabalhar
vive
aqui
a
cantarolar todo santo dia "
(p.
214).
A
indignacao
inicial do marido se
torna violencia
quando
surpreende
os
amantes,
dando-se
no desenlace
uma
correspondencia
ironico-humoristica
entre
a letra da modinha en-
toada
e os
acontecimentos,
tal
como
se observa em muitas outras
instan-
cias ao
longo
do
romance. Neste
caso,
porem,
se
trata
de
um
evento
tex-
tualmente
unico,
uma
vez
que
acontece em um
bairro
pequeno-burgues
(e
nao
na
favela,
no
bordel,
ou
no
botequim
da
patota
do
centro)
cuja
visao
de
mundo difere
da dos
personagens indigentes.
A
cancao
que inspira
esta est6ria
intercalada
se
apresenta
simples-
mente como "a modinha do Catulo." De facil identificacao
para
o leitor
de
trinta,
trata-se do
compositor
e
interprete
Catulo da Paixao
Cearense,
figura
que
melhor
representa
o
fato
da modinha
continuar sendo
culti-
vada
no
seculo
XX.
Este excelente
compositor
de
cancoes
romanticas
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14/20
A
Misica
Popular
num Romance
Brasileiro
:
85
era conhecido nos bairros
mais
humildes,
mas
segundo Jose
Ramos
Tinhorao,
o
mais
significante
era
que
"passava
a oferecer a modinha
popular
como um
espectaculo
curioso
ante o
publico
das
grandes
famil-
ias dos bairros aristocraticos do Rio
de
Janeiro, apresentando-se
com
seu
violao,
vestido
de casaca"
nas
primeiras
decadas do seculo XX.32
Para as
pessoas
circunspectas
entao a
modinha
suspirosa
ainda
podia
ser uma
coisa moralmente
suspeita;
a
atuacao
de Catulo muito
influiu
na
mudanca dessa situacao.
Face a
ocorrencia narrada em
Marafa
e cur-
ioso
reparar
nas
explica6ces
que
traziam seus livrinhos
de
modinha
que
se vendiam na cidade
naqueles
anos:
Lyra
dos
Saloes
(magistral
colecao
de
belissimasModinhas
Brasileiras,prdpriaspara
serem
cantadas
em
reunioesamili-
ares,
emfestas colegiais,
concertos,
etc.).33
A
estoria
da "musica de
sentimento
e
pancadaria"
termina na vin-
ganca
violenta do ofendido. O
climax
da
obra inteira
tambem
se
baseia
na
vinganca:
Teixeirinha reconhece
que Jose,
agora
o
bem sucedido box-
eador
Tommy
Jaguar,
e o
rapaz
que
lhe dera
um soco num
club
car-
navalesco
mais de um ano antes. Sendo-lhe
impossivel esquecer
a
ofen-
sa,
o
valentao,
acompanhado
do
parceiro
Aristides,
mata
a
navalhada
o
campeao
e
destroi o sonho matrimonial dele e da Sussuca.
A
respeito
deste desenlace e dos personagens que a ele sobrevivem, convem con-
siderar
as
observac6es
agudas
de
Jose
Ramos
Tinhorao,
feitas em um
momento
de feliz
percepcao
literaria:
Da
metade do
seu romance em
diante,
um
dos
personagens
mais
impor-
tantes e
mais
vivamente
retratados
e o
malandro Aristides
Paixao ....
E
seria
certamente
pela riqueza
humana
da sua
figura
de
vendedor de
modinhas,
que
o romancista
escolheria,
afinal,
esse seu
personagem
Aristides
para
encerrar o romance num
lance de
tragedia,
deixando-o livre
para
continuar sua
trajet6ria
de
personagem representativo
do
espirito
popular da cidade onde se desenrolaraa historia:
"Aristides
foi
detido como
cuimplice,
mas como nao havia
provas
contra
ele,
nao
pegou
nada. Livre de
culpas,
sem
inquietao6es,
sem
incertezas,
continua cantando
e
vendendo modinhas. As
esquinas
se
movimentam,
as
portas
e as
janelas
se
apinham para
ouvir o samba do dia na
cidade:
'Eu
quero
morrer cantando samba . .
.'
Faz um
breque
de
estilo,
estacando
o chocalho numa
sincope
de um
segundo. Depois prossegue.
E um desafio:
'Quero
zombar da
propria
morte.'
"
(Marafa,
p.
231)34
Nao
e
atrevido
dizer,
a
luz
das atuao6es
dos dois
parceiros, que
o
sucesso de
Marafa
como
obra literaria
carioca
deve
muito ao
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15/20
86 :
Charles
A.
Perrone
aproveitamento
dos malandros
liricos como
personagens
centrais. Nesta
cena final os versos de samba-alem
de fazer referencia ironica ao recem
perpetrado assassfnio e a liberdade do homem que os berra-encerram
toda uma caracterizacao de atitudes
e de
comportamento
desenvolvida
ao
longo
do romance. Para indicar um s6
aspecto
desta
sintetizaao,
e
proveitoso
recorrer
mais
uma
vez a
valiosa
contribuicao
de Roberto
da
Matta.
Para
o
"tipo
paradigmatico/her6i"
que
o malandro
representa
na sociedade
brasileira-e
na
(re)criacao
artistica de
Marques
Rebelo-
o
canto
e
um "instrumento
de
relacao
cor o
mundo"
que
encerra
certo
poder compensat6rio.
Ademais,
o
malandro,
ser deslocado nesse
mundo,
nao
quer
muda-lo.35
Quatro
decadas antes
da
publicacao
do
ensaio do
antropologo,
o autor de
Marafa
adivinhava a reaiao de um malandro de
morro as
propostas
de
melhoramento
social feitas
por
um visitante
politico:
"Mais coisas assim nao
adiantavam. Antes
ficassem como
estavam.
E
o melhor
era nao
pensar.
Era rir. Era cantar. 0 samba
alivia,
consola,
faz
esquecer.
A
batucada era
a
salvagao.
0 amor
facil,
a
finalidade
desta vida
pequenina,
que
e
preciso aproveitar " (p.
192)
A
vista destes
pensamentos
anteriores,
o
comportamento
de Aristides
na ultima cena do romance
fica esclarecido.
E
suas
ultimas
palavras
can-
tadas
ganham
sentido
paradigmatico.
Os trechos
liricos
atribuidos
a ele
se inserem tambem
num
paradigma
lirico-musical
da
epoca,
ja
aludido
nos
quadros
do
carnaval cor
a
transcricao
de um
sucesso
de Noel Rosa.
A
prop6sito
do
lendario
compositor
e
do
tema em
questao,
escreveu o
colunista
Jota
Efege (JFG)
em
Figuras
e
coisas da mutsica
opular
brasileira.
Qual
o malandro de morro
que pedia
o
enterrassem
no
terreiro,
deixando
um
brago
de fora
para
tocar
o
pandeiro,
ou
que
expressava
a
sua ultima vontade:
Quando eu morrer nao quero choro nem nada
Quero
um belo
samba ao
romper
da
madrugada
Ele
pedia
tambem como "bacharel"
saido da
mesma
escola:
Quando
eu morrer nao
quero
choro
nem vela
Quero
uma fita amarela
gravada
corn o
nome dela.36
Para
compreender
mais fundamente o carater
sintetico e
tipico
do
motivo mortuario
popular
utilizado
por Marques
Rebelo
para
dar
ponto
final ao romance Marafa, podem consultar-se outras
reminiscecias
de
JFG.
Na
materia
"Quero
morrer
no
samba"
chama a
atencao
para
a
popularizacao
desta frase tematizadora
dentro do ambito
da
muisica
popular,37
e
nas
pesquisas
reunidas sob
a
rubrica
"O
Quando
eu morrerno
folclore,
no
Parnaso,
e
na
bienal,"
JFG
traca
as
origens
folcloricas do
mote,
mostra seu
espalhamento
pelos
bairros
do
Rio
de
Janeiro
e
aponta
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16/20
A Musica
Popular
num
Romance
Brasileiro
:
87
ate
longinquas
fontes
cultas no
seculo
XIX,
que
incluem um
verso
que
ressoa na
boca do
personagem
de
Marques
Rebelo:
"Quando
eu
morrer
nao chorem minha morte Como agora a zombar me dizem vivo."38
A
cita~ao
deste verso
irmao
do seculo
XIX
permite,
por
um
retro-
specto
ainda
mais
largo,
remeter as
considerao6es sobre
Marafa
de novo
as
decadas
do
aparecimento
das Memorias de
um
sargento
de
miltcias,
obra
iniciadora
do
paradigma
literario
em
que
se
coloca o
romance
de Mar-
ques
Rebelo. Mas a
abordagem
hist6rico-comparativa,
e
claro,
nao
da
conta
da
solidez
e da
eficacia da
estruturacao
e
tensao literarias
da obra
em si.
Marafa,
romance em
que
a
presenca
integrada
da
musica
popular
e
constante desde a
abertura
seresteira ate
o
encerramento
desafiante,
destaca-se tanto como contribuigao artistica de seu
tempo
quanto
como
atualizaao
unica
de
paradigmas
literarios
profundamente
brasileiros e
cariocas.
Outras obras da
epoca
de
trinta
tem
gozado
de
maior
fama-a
obra de
Marques
Rebelo
esta
perto
do
esquecimento
quando
comparada
com a
de
outros
romancistas
que
nem
sempre
lograram
produtos
con-
sistentemente
integrados
ao tentarem
fazer
figurar
elementos
da
cultura
popular
na
narrativa.
Como se
espera
ter
demonstrado
aqui,
nenhum
escritor soube
aproveitar-se
literariamente
da
riqueza
s6cio-cultural
e das
potencialidades
artisticas
da
musica
popular
urbana,
melhor
do
que
o
autor de
Marafa
Notas
1.
Ver,
por
exemplo,
Charles A.
Perrone,
"O cancioneiro
popular
no romance
brasileiro
de
trinta,"
Cultura,
no. 33
(novembro-dezembro
1979):
40-47.
Para uma
introducao
geral
a
epoca
literaria em
questao,
ver Fred
Ellison,
Brazil's New Novel
(Berkeley
and
Los
Angeles:
University
of California
Press,
1954).
2.
Ver
Nancy
Baden,
"Popular
Poetry
in
the
Novels of
Jorge
Amado,"
Journal of
Latin
American
Lore
2,
no.
1,
(summer
1976):
3-22.
Apesar
do
enfoque
folcl6rico-
tradicionalista,
a
autora inclui
algumas palavras
sobre
estes
generos
urbanos. Ver
tambem
nota 30.
3.
Marques
Rebelo,
Marafa
(Rio
de
Janeiro:
Editora
Nacional,
1935).
Esta
primeira
edicao
6
resultado do
Grande
Premio
de
Romance
Machado de Assis
que
o
escritor
recebera
por
esta
obra
singular. Aqui
maneja-se
a
re-edicao
de
Edicoes
de
Ouro de
1966,
e todas
as
referencias sao
a
esta
edicao.
4.
Em
O
romancebrasileiro- de 1752 a
1930,
ed.
Aurelio Buarque de Hollanda (Rio de
Janeiro:
0
Cruzeiro,
1952),
pp.
36-73.
5.
Afranio
Coutinho,
ed.
A
Literatura no
Brasil,
2d
ed.
Vol. 5: 0 Modernismo
(Rio
de
Janeiro:
Sul
Americana,
1970),
p.
224.
6.
Em
Revista do
Instituto de
Estudos
Brasileiros
da
USP,
no. 8
(1970) (texto reproduzido
em
apendice
a Memdrias de um
sargento
de
milicias,
ed.
Cecilia de Lara
[Rio
de
Janeiro:
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17/20
88 : Charles
A. Perrone
Livros
T6cnicos
e
Cientificos,
1978]).
Aqui
as
referencias
sao ao
trabalho
original.
Ver
em
especial
a
secao
intitulada
"Romance
documentirio?"
7. Rio de Janeiro: Zahar 1979, passim. Ver especificacoes noutras notas.
8.
Candido,
"Dialetica da
malandragem," p.
75.
9.
Reginaldo
Guimaraes,
O
folclore
naficcao
brasileira.
Roteiro de
Memorias
de
um
sargento
de
mil'cias
(Rio
de
Janeiro:
Cgtedra,
1968). Segundo
a
apresentacao
de Elizeu
Maia da
segunda
ediaio
de
1977,
o
estudo
6
propositadamente
antisemiol6gico,
de
carater en-
ciclop6dico.
Na
pigina
15
apontam-se
as obras
do autor de
Marafa
como
"fontes
documentais da
tradicionalidade
popular
e urbana
do Rio
de
Janeiro." Aqui,
deseja-
se
poder
desempenhar
tarefas
critico-analfticas
sem excluir
o lado
docmental
preferido
por
Guimaraes
e outros
pesquisadores.
No
que
se
refere ao
relacionamento
entre Mar-
ques
Rebelo e o
autor das
Memorias,
note-se
que
em
1943
atrav6s do Instituto Na-
cional
do
Livro,
Rebelo
publicou
Vida e obra de
Manuel
Antonio
de
Almeida.
10. Candido, "Dialehca da malardragem," p. 75.
11.
Ibid.,
p.
76.
12.
Manuel
Ant6nio de
Almeida,
Memdrias de um
sargento
de milicias
(1854-1855; reprint
ed.,
Sao
Paulo:
Atica,
1973), p.
91
13.
Ver
Baptista
Sugueira,
Ficcao
e
musica,
pp.
41-43,
179,
e
197-200,
para
esclarecimen-
tos
detalhados
sobre as duas
cancoes.
14.
Ha
uma
extensa
bibliografia
sobre
este
genero
e sua
principal figura.
O debate
musicolo6gico
tem-se
centrado na
origem
lusa ou brasileira da modinha. Mario de
An-
drade,
o ilustre
escritor
brasileiro,
afirmava
que
"a
proveniencia
erudita
europeia
das
Modinhas 6
incontestavel"
(Modinhas imperiais
[Sao
Paulo:
Martins,
1964],
p.
8).
As
pesquisas
modernas,
por6m,
tem mostrado
a
improbablidade
dessa
asseveracao.
Ver:
Mozart
de
Araujo,
A
modinha e
o lundu no
seculo
XVIII
(Sao
Paulo:
Ricordi,
1963);
Bruno
Kiefer,
A
modinha e
o
lundu,
duas
raizes
da
musica
popular
brasileira
(Porto
Alegre:
Movimento,
1977);
Jos6
Ramos
Tinhorao,
Pequena
hist6ria
da musica
popular
(da
modinha
a
cancao
de
protesto)
(Petr6polis:
Vozes,
1974);
Gerard
Behague,
"Biblioteca
da
ajuda
(Lisbon)
MSS
1595-1596:
Two
Eighteenth-Century Anonymous
Collections
of
Modinhas," Anuario,
Yearbook
Tulane University)
4.
15.
Kiefer,
A
modinha,
p.
18. No estudo
deJ.
R. Tinhorao citado
na
nota
anterior,
afirma-
se
que
a
modinha
ji
existia
independentemente
no Brasil a nivel
popular
antes da
vin-
da da
corte.
16.
Em Modinas
do
passdo
(Rio
de
Janeiro: J.
B.
Editora,
1956),
p.
23,
assevera-se
que
a
modinha "Se os meus suspiros pudessem" podia representar um exemplo do
"principio
de
realizacao,"
isto
6,
o
povo
adota
como sua uma
composicao
de
autor
especifico,
sendo
que
a
pratica popular
nao
reconhece
quem
e.
Na
verdade,
mostra
alguma
duvida
no
que
se
refere a
procedencia
da modinha
transcrita,
mas as
infor-
macoes
apuradas
para
Ficcao
e
musica sio
mais
seguras:
era versio
fluminense
de
um
tema
variavel,
recolhida e
divulgada
em
1837,
comentada
nojornal
do
Come'rcio,
finalmente
publicada
no Correio das
Modas,
vol.
1,
1839.
Siqueira pergunta
numa
nota
a
pigina
43
de
Ficcao
e
musica sobre a
probabilidade
de
Manuel
Ant6nio
de
Almeida
ter
lido dita
fonte. Identifica
o outro titulo de modinha como
produgao
de
Candido
Ig-
naicio
da Silva
(ver
nota
13).
17.
Destaca-se
o
genero incipiente
do lundu. Ver
Kiefer,
A
modinha;
Mozart de
Arauijo,
A
modinha;J. R. Tinhorao, Pequenahist6ria, e Musica popular de indios, negros,e mesticos
(Petr6polis:
Vozes,
1975).
18.
VerJ.
R.
Tinhorao,
Pequena
histdria,
primeiro capftulo,
e "Da
valsa,
da
polca,
do
tango-a
historia
do samba"
Cultura,
no.
28
(janeiro
1978),
pp.
44-54.
19.
Abundam
estudos
hist6ricos e
reminiscencias
sobrfe
o
samba;
entre outras
monografias
recomenda-se
Baptista Siqueira, Origem
do termo samba
(Rio:
IBRASA-INL,
1977).
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18/20
A
Mu'sica
Popular
num
Romance
Brasileiro
:
89
20.
Para uma introducao as can6ces
carnavalescas,
ver
Edigar
de
Alencar,
0
carnaval
carioca
traves
a
mzsica
Rio
de
Janeiro:
Freitas
Bastos,
1965).
21. No seu livro (Carnavais,malandrosherdis),Roberto da Matta discute (pp. 204-205)
denotao6es
e
conotacoes
do
termo
e revela os
resultados
de uma
pesquis
s6cio-linguistica
efeituada no
Rio
de
Janeiro.
22.
Orestes
Barbosa,
O
Samba,
ua
historia,
eus
poetas,
seus
mzsicos
seus
cantores
1933;
reprint
ed.,
Rio de
Janeiro:
FUNARTE,
1978).
23.
Adonias
Filho,
O romance
rasileiro e trinta
(Rio
de
Janeiro:
Bloch,
1969), pp.
140-142.
24.
Ver
Jose
Ramos
Tinhorao,
Os sons
que
vem
da
rua
(Rio
de
Janeiro:
Edi6ces
Tinhorao,
1976),
parte
1,
capitulo
3,
e
nota
34
abaixo.
25.
Sobre o
radio,
a
ind6stria
gravadora,
e
o ambito
artistico,
ver as cronicas de
Almirante,
No
tempo
de
Noel
Rosa
(Rio
de
Janeiro:
Francisco
Alves,
1963).
26. Wilson
Louzada,
ed.,
Antologia
o carnaval
(Rio
de
Janeiro:
Cruzeiro,
1945).
O
organizador reconhece o valor destas passagens do romance, mas diz erradamenteque
as
descri6ces
sao dos anos
1927
e 1930.
A
presenga
de m6sicas do ano 1933
prova
o
equivoco cronol6gico.
27.
Roberto
da
Matta oferece
reflex6es
sobre o
significado
generico
do samba e da marcha
no
capitulo
que
dedica ao carnaval.
Ver
especialmente
as
paginas
110-115
sobre
sua
interpretacao
das
implica6ces s6cio-ideol6gicas
destas formas eminentemente car-
navalescas
(Carnavais,
malandros
herdis).
28.
O
carnaval
arioca,
p.
78.
Ver tambem nota 36.
29.
As
opini6es
do
autor
sobre
a bossa nova e
seus
interpretes
e
compositores
deram
motivo
a
muita discussao.
As
apuracoes
hist6ricas do livro Mztsica
opular:
Um tema m
debate ao verdadeiramente
complementares
ao
trabalho
de
pesquisadores
como
Edigar
de Alencar. Na
segunda
edicao
(Rio
de
Janeiro: JCM,
1966)
Tinhorao
dedica uma
secao
hs
curiosidades carnavalescas associadas
a
figura
do condutor do
bonde.
JFG,
nos
artigos
reunidos
de
Figuras
coisasda musica
opular
brasileira,
ol.
1
(Rio
de
Janiero:
FUNARTE,
1978),
comenta
o
"Condutor de
bonde,
personagem quase
classica" nas letras de
uma
serie de
musicas
da
epoca.
Ver
pp.
21-23 do livro
citado.
Segundo
a
mem6ria
do
jornalista,
a cancao carnavalesca da
dupla
Cascata e
Azevedo
lancada em 1937
rezava,
"Nao
pague
o
bonde." As informacoes dadas
pela
equipe
de
pesquisa
da Nova
histdria a musica
opular
brasileira
Sao
Paulo:
Abril
Cultural,
1971)
sugerem
que
a
dupla
gravou
a musica sob
o titulo de
"Nao
pago
o
bonde."
Marques
Rebelo nao indica titulo
quando
transcreve
a
letra
("nao
paga
. . .
"),
mas
escreve
dois anos antes do registrooficial da m6sica. Este fato indicaria que o tema era de
verdade
parte
de
um
folclore carnavelesco urbano. A nao ser
que
tivesse
algum
con-
tato com os
m6sicos
profissionais,
o autor de
Marafa
colheria os versos
na
boca do
povo.
30. da
Matta,
Carnavais,
malandros
herdis,
p.
133.
Embora
seja
material
para
um
outro
estudo,
deve
salientar-se
aqui
a
correspondencia
entre a
interpretacao
s6cio-
antropol6gica
de Roberto da
Matta
da
relativizacao
moral
e a
ideol6gico-literaria
de
Candido
em "Dialetica da
malandragem."
0
estudo do
antrop6logo
nao
deixa de
conter
algumas
reflex6es de valor
comparativo
para
um
investigador
da
literatura. A
pagina
69 do livro
citado,
por
exemplo,
reflete
sobre uma
caracterizacao
significativa
do
jovem
Jorge
Amado:
A frasee prenhe de significados.
No
primeiro
livro
de
Jorge
Amado
significativamente
intitulado Pais
do
Carnaval,
principal personagem
diz:
"S6
me
senti
brasileiro
duas
vezes:
uma,
no
carnaval,
quando
sambei
na
rua.
Outra,
quando
surrei
Julie,
depois que
ela
me traiu."
31.
Ver ainda em da
Matta, Carnavais,
malandros herdis
curiosa
relacao
entre
o
verbo
"cantar"
e
o sentido de
propor
relacoes a uma mulher
(p.
113),
assim
como a
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http://www.jstor.org/page/info/about/policies/terms.jsphttp://www.jstor.org/page/info/about/policies/terms.jsphttp://www.jstor.org/page/info/about/policies/terms.jsphttp://www.jstor.org/page/info/about/policies/terms.jsp7/21/2019 Perrone Musica Popular Romance
19/20
90 :
Charles
A. Perrone
importancia
de "voz
. . .
sentimento
. . .
coracao"
(p. 205)
no mundo
da malan-
dragem.
Mais uma
vez,
e
surpreendente
ate
que ponto
a
analise
de Roberto da Matta
elucida as declara6ces e implicacoesdo texto literario de Marques Rebelo.
32.
Tinhorao,
Pequena
istdria,
p.
18. Citado
por
Kiefer,
A
modinha,
.
26.
33. Ver
entre
outras cole6ces
as
seguintes:
O
cantor
e modinhas rasileiras
Rio
de
Janeiro:
Quaresma,
1927);
Novoscantares
or
Catullo
da PaixaoCearense
Rio
de
Janeiro:
Quaresma,
1927);
e Modinhas
Rio
de
Janeiro:
Imperio, 1973),
organizacao
de
Guimaraes
Martins.
A
sensibilidade
lirica
evidente
na modinha transcrita
em
Marafa
filia-se
a
um carater
geral que
a
revisao
de uma s6rie de tais can6ces
faz
patente.
34.
Tinhorao,
Os sons
que
vem
da
rua,
p.
46. Sendo Aristides um "vendedor
de modinhas"
seria
preciso
esclarecer
que
os folhetos
chamados
de
"jornals
de
modinhas"
que
cir-
culavam
no Rio
at6
a
decada
de
cinqfienta
(e
em
forma modificada ate
hoje),
compunham-se
nos
fins do seculo
XIX
e
principios
do
XX
principalmente
de letras do
genero hom6nimo. Para a decada de Marafa,todavia, este tipo de publicacao mostra
tambem
a
diversificacao
e
proliferacao
de outros
generos,
sobretudo
o samba. Ver
Os
sons,
pp.
35-48.
35. da
Matta, Carnavais,
malandvos
herois,
specialmente pp.
205-206,
quando compara
o
malandro com outros
tipos representativos
do homem brasileiro.
36.
JFG,
P.
20.
Sobre o sentido
filos6fico da misica
de Noel
Rosa,
recomenda-se o com-
entario
de
Edigar
de
Alencar,
p.
198. Tratando-se de um tema tao
comum,
nao
estranha haver ate acusacoes
de
plagio:
o
compositor Donga
ja
escrevera um
estribilho
praticamente
identico ao
primeiro
citado
por JFG
e
protestou
ao
ouvir
o samba
de
Noel. No
entanto,
ja
havia
outros
refraos muito
parecidos.
37. Titulo
original
da materia
de
OJornal(Setembro 20, 1964), reproduzida
nas
paginas
117-118 de
Figuras
coisas.
Oferece
outros
exemplos
do
paradigma,
como este
de
Walfrido
Silva,
gravada
em 1935:
"Quero
morrer cantando
um
samba / no meio de
uma roda bamba."
38.
JFG,
Figuras
coisas,
p.
235.
O autor
atribui os versos
ao
poeta
Laurindo
Jos6
da Silva
Rabelo
(m. 1864),
classificando-o de
"parnasiano"
quando
era
da
geraqao
romantica.
De toda
fo