Transcript

EducaçãoFOLHA DIRIGIDA

www.folhadirigida.com.br12 a 18 de janeiro de 2012

CA

DE

RN

O D

E

carentes de valorizaçãoProfessores

RENATO [email protected]

T em sido cada vez mais comuma realização, por secretarias deeducação, palestras para gru-pos de professores, como for-ma de contribuir para que os

profissionais tenham acesso a novas con-cepções educacionais. Com isto, algunsespecialistas têm a oportunidade de per-correr várias cidades e ter contato comdocentes de realidades e perfis os maisdiferenciados.É o que acontece, por exemplo, com oeducador João Beauclair, que é palestran-te e conferencista Internacional sobretemas motivacionais, organizacionais,educacionais e psicopedagógicos, e pro-fessor de cursos de pós-graduação, capa-citação e formação continuada de edu-cadores. Ao ser perguntado sobre do quepercebe que sentem mais falta os pro-fessores com os quais tem contato, elefoi categórico: valorização por parte dopoder público, não só em relação a sa-lários, mas em termos de qualificação.“O desafio, no que concerne à elabo-ração de políticas públicas efetivas, écriar novos modelos de formação emserviço, validando as histórias de vidados educadores e reforçando sua im-portante tarefa de formar pessoas”,destaca o educador.Autor do livro Do Fracasso Escolar ao Su-cesso na Aprendizagem: proposiçõespsicopedagógicas(Ed. WAK), João Beauclairaborda, nesta entrevista, os obstáculosque os estudantes enfrentam para alcan-çarem o aprendizado, analisa as relaçõesentre famílias e escolas e estudantes, edestaca a importância dos limites noprocesso educacional.“Sem limites, não há possibilidades deconstrução de bons hábitos, boas manei-ras, boas atitudes. Transferir este respon-sabilidade somente para os professoresé injusto”, destacou o especialista.

— O SENHOR É AUTOR DO LIVRO DO FRACAS-SO ESCOLAR AO SUCESSO NA APRENDIZA-GEM: PROPOSIÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS. NAESCOLA, O QUE PODE FAZER A DIFERENÇAPARA QUE O ALUNO REALMENTE CONSIGAAPRENDER?João Beauclair — Acredito que na es-cola e na prática educativa, sejam elasem qualquer nível e modalidade, o quepode fazer a diferença para que o alu-no efetivamente aprenda é a construçãode vínculos saudáveis com a informa-ção, com o conhecimento e com a sa-bedoria. Vivemos em um tempo ondehá excesso de informação, algum conhe-cimento e uma grande escassez de sa-bedoria. Desafios para as instituiçõesque educam e para os educadores é fa-zer a mediação desta tríade de modovincular e significativo.

— A SEU VER, QUE ASPECTOS SÃO DETER-MINANTES PARA O CHAMADO FRACASSOESCOLAR?A expressão “fracasso escolar” possui sen-tidos múltiplos, pois são aspectos mui-to diversos que, intervindo em nossosprocessos cotidianos de seguir na magiada aprendizagem humana, referem-se aotema. Questões relacionadas aos trans-tornos específicos na aprendizagem es-colar, aspectos vinculados disfunçõesneuropsicológicas e imaturidade, alémde demandas oriundas da própria vidaemocional dos aprendentes e de umasérie de outros fatores presentes na di-nâmica relação entre corpo, organismo,desejo e inteligência. A Psicopedagogiaque defendo é vital para nutrir os espa-ços do aprendere do ensinar,com umaDidática do Assombro, onde sejamoscapazes de perceber que aquilo que nãoconhecemos pode ser uma boa oportu-nidade de aprendermos juntos, uns comoutros, quando desejamos colaborar parao sucesso de nossos empreendimentose ações como educadores.

“De um modo geral, coloca-se a culpa do fracasso dosaprendentes tão somente no sujeito que se deseja educare acaba-se por esquecer que todo processo deaprendizagem é dinâmico, sistêmico e interdependente.No entanto, família, sociedade, sujeito aprendente einstituições educacionais se integram neste processo”

Para João Beauclair, hoje, há excesso de informação e grande escassez de sabedoria

— EM SUA OBRA, O SENHOR SE PROPÕE AMUDAR O FOCO DAS DISCUSSÕES E APONTARNOVAS POSSIBILIDADES DE PERCEPÇÃO SO-BRE O FRACASSO ESCOLAR. QUE MUDANÇADE PERSPECTIVA EM RELAÇÃO AO PROBLEMASERIA ESSA?Tenho trabalhado com afinco, faz algunsanos, com estudos e pesquisas sobre estecomplexo tema em nossa Educação. Olivro Do Fracasso Escolar ao Sucesso na Apren-dizagem: proposições psicopedagógicasé fru-to deste movimento, pois como educa-dor sempre me incomodou ver as visõesdistorcidas a este respeito. um modogeral, coloca-se a culpa do fracasso dosaprendentes tão somente no sujeito quese deseja educar e acaba-se por esquecerque todo processo de aprendizagem édinâmico, sistêmico e interdependente.No entanto, família, sociedade, sujeitoaprendente e instituições educacionaisse integram neste processo e devemoscuidar, de mediações educativas quetodos se sintam envolvidos: afinal, edu-cação deve compromisso de todos nós.

— O PAPEL DO PROFESSOR, NATURALMENTE,DEVE SER FUNDAMENTAL PARA MOTIVAR OALUNO. MAS, E QUANDO ESSE PROFESSORNÃO ESTÁ DEVIDAMENTE MOTIVADO, ATÉ PORNÃO RECEBER O RECONHECIMENTO QUEMERECE? O QUE UM GESTOR ESCOLAR PODEFAZER PARA, MESMO EM UM QUADRO COMOESSE, MOTIVAR SEU PROFESSOR?Tenho defendido a seguinte ideia: se

assumo frente a mim mesmo que dese-jo continuar atuando em Educação, devome posicionar frente a isso com integra-lidade, em minha inteireza, propondofazer da melhor maneira possível aqui-lo que esta presente em tal assunção. Oreconhecimento do trabalho nosso emEducação será fruto de movimentaçõesnossas para que seja possível o resgateda dignidade do exercer a docência.Docentes são gestores de suas salas deaula e gestores de escola devem saber-se motivadores e convencer, a todos osenvolvidos, que só com parcerias e bus-cas por soluções coletivas poderão ge-rar melhores resultados.

— UM DOS PROBLEMAS APONTADOS PORMUITOS EDUCADORES ATUALMENTE É O DIS-TANCIAMENTO ENTRE ALUNOS E PROFESSO-RES. COMO APROXIMÁ-LOS, INCENTIVAR ORESPEITO MÚTUO ENTRE ELES, COMO EXIS-TIA EM OUTRAS ÉPOCAS? O QUE É FUNDAMEN-TAL PARA ISSO?Há, nesta questão, um belo desafio a servivido. Hoje, crianças e jovens vivem emum tempo novo, afinal estamos numnovo século e, o que é melhor, um novomilênio se inaugurou. As vivências emsala de aula serão significativas paratodos a partir do momento que pais, fi-lhos, educadores e gestores criarem es-paços de dialogicidade. É o resgate dodiálogo que fará com que valores huma-nos sejam ressignificados e projetos de

construção do novo ganhem visibilida-de e efetividade. O fundamental para issoé formação permanente para todos osenvolvidos no belo ato humano de educar

— E COM RELAÇÃO AO BULLIYNG: QUAL AESTRATÉGIA MAIS ADEQUADA PARA AS ESCO-LAS ENFRENTAREM ESSE PROBLEMA?O enfrentamento do bullying só será efi-caz à medida que estejamos em atençãoe disponibilidade para aprender a lidarcom este fenômeno, não recente na his-tória das relações humanas e nas intera-ções dentro das instituições. A grandequestão é buscarmos criar novas estra-tégias no que diz respeito ao dinamis-mo social que é a vida em grupo. Nocampo psicopedagógico, - principalmen-te com a Psicopedagogia Preventiva -,tenho atuado com uma oficina psicos-socioeducativa chamada “O bullying nos-so de cada dia”, onde vivenciamos de mododinâmico os conceitos de igualdade ediferença. A pergunta principal nestaintervenção é: -”Somos Iguais e Diferentes:em quê?”

— OUTROS PÓLOS FUNDAMENTAIS DA EDUCA-ÇÃO QUE SE ENCONTRAM DISTANTES SÃO AFAMÍLIA E A ESCOLA. OS PAIS, POR EXEMPLO,RECLAMAM FREQUENTEMENTE DE FALTA DEINTERESSE E EXCESSO DE EXIGÊNCIAS DAPARTE DOS EDUCADORES. OS RESPONSÁVEISTÊM RAZÃO NESSA QUEIXA?A Educação é tarefa principal dos pais.Hoje, com todas as modificações soci-ais que a nós se apresentam cotidiana-mente, a família e a escola precisam re-visitar suas práticas e rever conceitosantigos e modos de ser e estar no mun-do, infelizmente definitivamente ultra-passados. Os pais, em suas queixas,podem ter muita razão, mas as exigên-cias aos educadores, em muitas situa-ções, beiram o absurdo. Sem sombra dedúvida, o novo assusta. Resta-nos ape-nas uma alternativa: a busca de soluçõescompartilhadas, “coopetentes” e coopera-tivas, que são possíveis quando existe,de fato, comprometimento com a forma-ção do sujeito aprendente, que somostodos nós ao longo da vida.

— DE OUTRO LADO, OS PROFESSORES TAM-BÉM RECLAMAM DA FALTA DE LIMITES, PORPARTE DOS PAIS, EM RELAÇÃO A SEUS FILHOS.E ARGUMENTAM QUE ESSA POSTURA EXCES-SIVAMENTE PERMISSIVA PREJUDICA O TRABA-LHO DOS PROFESSORES, NA MEDIDA EM QUEO ESTUDANTE TENDE A ACHAR QUE PODEFAZER TUDO O QUE QUISER NA ESCOLA, AS-SIM COMO FAZ EM CASA. OS EDUCADORESTÊM RAZÃO EM SUA QUEIXA?Questão polêmica e de extrema relevân-cia hoje: a construção dos limites. Semeles, os limites, a tendência do humanoé achar que tudo pode e que tudo lhe serápermitido. Houve, historicamente, umretrocesso. Depois de anos vivendo umahistória social repleta de autoritarismo,a tendência foi a de criar um tanto dejustificativas para deixar de lado a vozque deve comandar e o papel do sujeitoque educa. Sem limites, não há possibi-lidades de construção de bons hábitos,boas maneiras, boas atitudes. Transferireste responsabilidade somente para osprofessores é injusto, pois sistemicamen-te existem bases onde o caráter de cadaum de nós se constrói e reconstrói.

— POR QUE É TÃO DIFÍCIL APROXIMAR FAMÍ-LIA E ESCOLA NOS TEMPOS ATUAIS?Aproximar família e escola nos temposatuais é imenso desafio, visto que hojevivemos a emergência do agora, do hojee somos, em muitos casos, ocupadosdemasiadamente com múltiplas tarefasque exigem muitas horas de nosso coti-diano. Na verdade, o nosso movimentohoje deve ser o de dialogar, falar com

essência, verdade e profundidade sobreo que, de fato, estamos sendo: sujeitosque só consomem ou pessoas que sepreocupam com nosso destino humanocomum?

— O QUE AS ESCOLAS PODERIAM FAZER PARAAPROXIMAR OS PAIS E RESPONSÁVEIS DOCOTIDIANO ESCOLAR DOS ALUNOS?Seduzir pessoas e criar momentos deintegrar pessoas. Em nosso país, ummovimento bonito é o das Escolas dePais, um modelo de formação de pes-soas que lida com o desafio e a missãode apoiar pais, futuros pais e agenteseducadores a formar, com criticidade,cidadãos conscientes de suas ações einterações.

— O SENHOR REALIZA PALESTRAS PARA PRO-FESSORES EM TODO O PAÍS. EM SEUS CONTA-TOS COM OS PROFESSORES, DE QUE O SENHORPERCEBE QUE ELES SENTEM MAIS FALTA?É interessante perceber que de norte asul do país, o que eu percebo com mai-or falta e, portanto, desejo, reside naformação continuada relevante e aces-so aos estudos de aperfeiçoamento eespecialização adequados a cada reali-dade. O desafio, no que concerne a ela-boração de políticas públicas efetivas, écriar novos modelos de formação emserviço, validando as histórias de vidados educadores e reforçando sua impor-tante tarefa de formar pessoas e colabo-rar para a construção de uma sociedademais justa, fraterna e equânime. É vitalnos nutrir com campanhas governamen-tais que sigam valorizando os profissi-onais de Educação.

— MUITOS FALAM NA DESVALORIZAÇÃO E NODESPRESTÍGIO COM OS QUAIS VEM SOFREN-DO A CARREIRA DO MAGISTÉRIO. NO SEUCONTATO COM OS PROFESSORES, O QUE OSENHOR PERCEBE, NELES, A FRUSTRAÇÃO EA INSATISFAÇÃO POR NÃO SEREM VALORIZA-DOS COMO DEVERIAM?Tal percepção é bem real e, em minhaprópria história pessoal e biografia pro-fissional, em muitos momentos, perce-bo esta desvalorização e desprestígio. Noentanto, é uma opção que devemos fa-zer. Ficar esperando o grande dia de ser-mos reconhecidos é caminhar sem en-xergar possibilidades de luz. Ser e estaratuando em Educação, em sua possibi-lidade de evolução pessoal e autoconhe-cimento, é nossa maior validação, comosujeitos que desejam construir uma cul-tura de paz, de não-violência, de valo-res e direitos humanos, a partir do espa-ço mágico da escola.

— O QUE, A SEU VER, SERIA FUNDAMENTALPARA VALORIZAR O PROFESSOR NO PAÍS?A meu ver, o fundamental para a valoriza-ção nossa, enquanto profissionais da Edu-cação, está na elaboração de políticas pú-blicas que sejam eficazes na aplicação deverbas destinadas às escolas, aos planosde cargos, salários e funções, além da for-mação continuada. Continuar movimen-tos sociais efetivos que humanizem a pró-pria escola é outra importante tarefa a serrealizada. Lembrando e parafraseandoEdmund Spenser (1552 – 1599), poetainglês do Renascimento, acredito que osverdadeiros educadores “lutam por nós, (...)velam por nós e nos guardam devidamente. Tudopor amor, sem exigir recompensas”. O momentoé este: recompensar os esforços de todosnós, educadores e educadoras deste país,com a construção de uma Pedagogia daAmorosidade, que seja elaborada ocupan-do-se e preocupando-se com a Vida e a Edu-cação no Novo Milênio, dignificando, comsalários justos e condições de trabalhoadequadas, nossas intervenções e atuações.Atuemos com Amor, mas sejamos recom-pensados por isso.

“É interessante perceberque de norte a sul do país,o que eu percebo commaior falta e, portanto,desejo, reside na formaçãocontinuada relevante eacesso aos estudos deaperfeiçoamento eespecialização adequados acada realidade”

Nesta entrevista, o

professor João Beauclair,

palestrante e conferencista

Internacional sobre da área

de educação, salienta que,

em suas conversas com

professores de todo o país,

os profissionais sentem

mais falta de ações

voltadas para a valorização

e qualificação dos

profissionais do magistério

Professores

DIVULGAÇÃO

Imagem deprofissionais deeducação em atividade:para professor JoãoBeauclair, éfundamentaldesenvolver atividadesde interação eaproximação entreprofessores e alunos

Recommended