RESPONSABILIDADES DOS GESTORES E AÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
CIRO EXPEDITO SCHERAIBERPROCURADOR DE JUSTIÇA
COORDENADOR DO CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA DE DEFESA DO CONSUMIDOR – MPPR
Av. Mal. Floriano Peixoto, nº 1.251 – Rebouças – CEP 80230-110 Curitiba – Paraná – (41) 3250-4912 – fax (41) 3250-4920
Seminário da Comissão de Segurança Alimentar e Nutricional de Produtos de Origem Animal do CRMV-PR – 17/05/2013
Tema: Implantação e Organização dos Serviços de Inspeção Municipal – Região Metropolitana de Curitiba
O que é consumir?
• Consumir é ato de satisfazer necessidades. E satisfazer necessidades é satisfazer interesses. Interesses de quem consome.
Histórico – Defesa do Consumidor lá fora
• Discurso Kennedy – 1962 – Senado: necessidade de defesa de princípios de proteção ao consumidor, principalmente o da educação e informação.
• Resolução 39/248, de 16 de abril de 1985 (normas da ONU / IOCU – órgão consultivo – Organização Internacional das Associações de Consumidores) – enfatizava o “desequilíbrio em termos econômicos, educacionais e poder aquisitivo”.
Já no Brasil...
• Sociedade brasileira estava sob o jugo da força militar: a defesa do consumidor era pouco propícia.
• Iniciou-se com os primeiros discursos do deputado Nina Ribeiro - 1971 e 1973 - e com o Procon de SP, criado em 1978.
• Mas, ainda, com a inflação elevada, as condições para o exercício do consumo eram poucos viáveis, já que o atrativo maior era o gerar dinheiro com o fato da inflação.
• Planos econômicos (frustrados) do governo Sarney – tentativas de estabilidade econômica
• Edita-se a Lei da ACP – 7347/85 – instituição no MP/Pr o SEDEC. Em 1994 passou a ser chamado de Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor.
• Governo Collor – 1989 – editado o Código de Defesa do Consumidor. - Planos Collor – abertura dos “portos” - carros russos em substituição às carroças – ponta pé inicial para as melhores condições de consumo.
Características da tutela coletiva do consumidor
• Com a inflação elevada - a defesa do consumidor era a defesa do
PREÇO // preço inflacionário // congelamento // sequestro de boi
no campo // tabelamento // tablita deflacionária // combate à
usura // alto e intenso comércio de terminais de telefones // a
eterna luta das mensalidades escolares // o ágio na compra e
venda de veículos // o comércio de imóveis com reajustes mensais
dos contratos.
Nessa época os planos econômicos se sucediam, visando o combate à
inflação.
Planos Econômicos – moeda história
• Essa história dos planos econômicos são bem narrados pela jornalista Miriam Leitão, no seu livro: “A SAGA BRASILEIRA, a longa luta de um povo por sua moeda”, Ed. Record, 2011, RJ
• Foram cinco moedas entre 1986 a 1994. Nos 15 anos antes do REAL, foram 13,3 trilhões por cento de inflação – e nos 15 anos depois foram apenas 196,87 %.
• Em resumo, desde 1979, foram: 16 ministros da Faz // 18 presidentes do BC // 06 moedas // 9 zeros retirados da moeda// divisão da moeda por 2.750 (conv. URV) // 2 calotes externos // e 1 calote interno.
• Governo Itamar Franco – PLANO REAL – volta do FUSCA (os carros
russos não davam certo) – ministro da Fazenda Fernando
Henrique Cardoso – mudança de mentalidade: uma sociedade de
consumo que deixasse de se preocupar com o preço.
• Proporcionou: atuação de outras frentes, principalmente a da
defesa da qualidade no fornecimento de produtos e serviços.
Interesses individuais x interessescoletivos
• Isso porque já desde antes da CF, já se apresentava a necessidade de defesa de interesses COLETIVOS, em sentido amplo. O sistema jurídico voltado à defesa do direito individual já não era suficiente para resolver a questão de ofensas generalizadas, que atingiam até milhares de pessoas. Esses interesses que os estudiosos definiam como difusos, coletivos ou individuais homogêneos, já era realidade.
• Então o direito começou a se aperfeiçoar, primeiramente com a Lei da Ação Civil Pública, depois com o Código de Defesa do Consumidor, para dar guarida aos interesses dessa natureza, tiradas de diversas áreas de interesses gerais, tais como: dos consumidores, como a do meio ambiente, dos interesses da criança de do adolescente, do patrimônio público, estético, cultural, paisagístico, turístico, e mais recentemente da ordem econômica e economia popular, e à ordem urbanística, sem prejuízo da defesa de qualquer outro.
DEFESA DO CONSUMIDOR SURGE DENTRO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – PRINCÍPIO DA ORDEM
ECONÔMICA
• No que se refere à defesa do consumidor, a Constituição Federal em 1988
trouxe expressamente a determinação de que fosse elaborado um Código de
Defesa do Consumidor, porque ela própria, a Constituição Federal, elevou a
“defesa do consumidor” a direito e garantia fundamental do cidadão, além de
elevar a defesa do consumidor a princípio da ordem econômica, no mesmo
nível de importância dos princípios da iniciativa privada ou da função social da
propriedade.
• Pode-se afirmar, a partir daí, que uma lesão ao interesse da relação de
consumo é uma lesão a princípio constitucional.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
• Surgiu a Lei 8.078, de 11 de setembro de
1990, denominado de Código de Defesa do
Consumidor, que entrou de fato em vigor em
11 de março de 1991, porque foi determinado
um período de 06 meses de vacância, para
então só após entrar em vigor de fato.
• A característica principal do CDC é o seu
princípio central da VULNERABILIDADE.
O que é vulnerabilidade do consumidor, em resumo?
• É a potencialidade de estar exposto a atitudes não
éticas do comércio, objetivamente.
– Em razão disso é que a ordem jurídica visa a sua proteção,
mediante o estabelecimento de prerrogativas legais
centradas no Código de Defesa do Consumidor, de várias
ordens: administrativa, civil (reparação de danos) e penal
(repressão criminal).
Enfim, todos somos consumidores, para merecer a tutela que a legislação oferece?
• Não. Só é aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final, ou seja, aquele que retira do mercado o
produto, destruindo-o;
• Quer dizer, aquele que provoca a quebra da cadeia econômica de
circulação do bem ou serviço, que pode ser definida como a:
criação, produção, distribuição, comercialização e consumo. O
“consumo” é o último elo da corrente econômica. E aquele que
participa desse último elo é o consumidor.
• O CDC tem 04 conceitos de consumidor:
– o standart (padrão);
– os equiparados: coletividade interveniente;
– vítimas do consumo (bystander);
– pessoas expostas às práticas comerciais e contratuais.
• Se não houver relação de consumo (relação de direitos e obrigações
entre consumidor e fornecedor), não há a aplicação do CDC, porque
estará presente uma relação diversa daquele de consumo.
Método de identificação – Insumo x Consumo
• Se não houver relação de consumo, não há a aplicação do CDC, mas o
Código Civil ou o Código Comercial, etc., porque estará presente uma
relação diversa daquele de consumo. Se o produto ou serviço não for
retirado do mercado, mas servir como insumo para a produção e
posterior comercialização, a relação não é de consumo. Só quando for
Destinatário final.
• A pessoa física ou jurídica como destinatária final - Exs. Construtora //
Sanepar, que compra produtos químicos para tratar a água (insumo).
• E Fornecedor?
– Aquele que exerce atividade econômica com objetivo de lucro,
com habitualidade e profissionalidade (pessoa física ou jurídica).
• Ex. Locador de imóvel. Pode ser ou não fornecedor. Se faz da locação
meio de vida, o seu ganha pão, sua atividade profissional principal, é
fornecedor. Se aluga esporadicamente o seu imóvel residencial porque
foi viver em outra cidade, por força do emprego, não é fornecedor,
embora quem alugue seja um consumidor. Aplica-se o C. Civil e a Lei
de Locações. Não o CDC.
• Então a “relação de consumo” tem dois elementos: o SUBJETIVO
(fornecedor e consumidor) e o OBJETIVO (produtos e serviços)
• PRODUTO: valor econômico (material ou imaterial – programa comp/arte
musical/ )
• SERVIÇOS: atividade remunerada (tb rem indireta) – serviços públicos
tarifados e serviços privados
• Para a tutela ou defesa COLETIVA do consumidor, a legislação legitimou
órgãos e entidades públicas e privadas, dentre os quais o MINISTÉRIO
PÚBLICO, que age por intermédio do seu representante: o Promotor de
Justiça e o Procurador de Justiça.
• O agente do MP – “Promotor de Justiça” (o Procurador de Justiça é a denominação
que se dá ao agente do Ministério Público no último grau da carreira, atua ao lado
dos desembargadores, nos mesmos processos, agora no Tribunal de Justiça) é aquele
que defende a sociedade, com ações em favor da afirmação dos direitos individuais
indisponíveis ou coletivos dos cidadãos, ou acusando criminosos nos tribunais.
• Novas atribuições da CF/88 - a defesa do regime democrático, dos interesses sociais
indisponíveis, além da já tradicional exclusividade do exercício da Ação Penal.
Também, por isso, podendo investigar, inclusive em situações de complexas
investigações, visando combater a IMPUNIDADE, o que, efetivamente não favorece a
chamada PEC 37!
• Também pode ingressar com a Ação Civil Pública, podendo instaurar e
presidir, só ele, o MP, o chamado Inquérito Civil Público, diante da notícia de
lesões de caráter difuso ou coletivo (individual homogêneo incluído), para
ingresso com ACP, ou firmar um Termo de Compromisso de Ajustamento de
Conduta.
• Ao MP na atividade de tutela dos interesses coletivos (em geral) – até porque
lhe foi dada a possibilidade de instaurar o Inquérito Civil, tem os poderes de
notificação, requisição, condução coercitiva e ainda de recomendação.
Macro temas de tutela de consumo
• O Ministério Público atua, portanto, na defesa do consumidor, quando ocorre
ofensa a interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, em ocorrendo
uma ou algumas das 06 categorias de macro temas, e que integram
ordinariamente 03 grupos de 06 letras:
• 02 SS (Saúde e Segurança); Saúde - dentro da defesa dos interesses da saúde,
as ações e serviços de vigilância e inspeção sanitárias, como a imposição e
fiscalização na comercialização de produtos de origem animal inspecionados
(sif, sip, sim ou sisbi) – ou seja, dotar os locais de abate de animais de serviços
de inspeção; 02 QQ (Quantidade e Qualidade de Produtos e Serviços); e 02 PP
(Publicidade e Práticas Comerciais).
O MP e os Serviços de vigilância e Inspeção de POA
• 1998 – Termo de Cooperação entre o MP, Secretaria da Agricultura,
Saúde, e Fazenda, com o MAPA e CRMV – OBJETIVO: fiscalização dos
POA, nos aspectos sanitário e tributário.
• Na época – 371 mun > 30 abatedouros dentro das normas > menos de
10% da carne era inspecionada ou com observâncias das boas práticas
de higiene para o correto abate.
• Metade (M. Agric) da carne consumida no PR era proveniente de MT e
MS – De tudo 45 % da carne consumida não tinha inspeção sanitária.
Isso pelas estatísticas oficiais, sem contar a carne CLANDENSTINA
Diagnóstico dos entraves à boa vigilância e inspeção
• A) ADMINISTRATIVAS – deficiências materiais, pessoais (poucos fiscais –
ausência de concursos), burocráticas, normatização assistemática;
• B) POLÍTICAS – cumplicidade eleitoral do segmento econômico com a
administração – alinhamento ideológico: prejuízo no controle do poder de
polícia administrativa (freios à iniciativa); (respaldo do MP).
• C) SOCIAIS – dificuldade do agente econômico manter-se na formalidade – a
informalidade gera desemprego formal, prestação de serviços
desqualificados, produtos e serviços inadequados e, ainda, dificultador de
ações oficiais saneadoras.
Inspeção e Vigilância – Problemas
• A) Defesa do Consumidor – produto impróprio para o consumo – artigo
18, § 6º do CDC – impropriedades formal e material – responsabilidade
administrativa, civil e penal;
• B) Patrimônio Público e Tributário: a carne clandestina, principalmente,
não gera o ICMS – sonegação fiscal; e a atuação nos casos de
improbidade administrativa dos gestores públicos;
• C) Meio Ambiente: abate irregular não oferece tratamento correto aos
resíduos e dejetos.
Como atuar
• Iniciativa de execução do Projeto Segurança Alimentar – Inspeção e Vigilância Sanitárias
– Produtos de Origem Animal - Pelos Promotores de Justiça de Defesa do Consumidor de
cada comarca onde houver o descumprimento das normas.
• Providências que vislumbramos: - levantamento dos Serviços de Inspeção de cada
Município da Comarca; instauração de procedimentos (PP e/ou Inquérito Civil e se
necessário Ação Civil Pública) para:
• 1. Realização de fiscalização da vigilância sanitária no comércio e inspeção sanitária nos
locais de produção e manuseio (derivados);
• 2. criação do SIM (sugestão de legislação);
• 3. construção de matadouros oficiais ( com SIM, SIP ou SIF);
• 4. Subscrição de Termos de Compromisso de Ajustamento - fixação de prazo.
Estratégias
• Audiências Públicas ou reuniões entre gestores públicos locais,
serviços de vigilância e inspeção municipais, estadual e Federal
e comunidade;
• Fixação de prazo para adequação (obrigação de fazer ou não
fazer – suspensão da atividade, interdição ou cessação das
atividades);
• Responsabilização civil – fixação de indenização por danos
materiais e morais;
• Ações penais visando a condenação por crime.
Legislação aplicável – inspeçãoindustrial e sanitária de POA
• Lei Federal n. 1283, de 18/12/1950
– Art. 2.: Aplica-se à fiscalização de:• Animais, pescado, leite/derivados, ovo/derivados, mel/cera/derivados.
• Regulamento:
– Decreto n. 30.691, de 29/03/1952• Art. 878: Impróprio para consumo – POA – desconformidade com o
regulamento.
• Art. 2º, § 1º - inspeção ante post mortem de animais de açougue destinado
ao abate; caça; pescado; leite; ovo; mel; e cera.
Sistemas de inspeção industrial e sanitáriade POA – SIF / SIP / SIM
• Lei Federal n. 7.889, de 23/11/1989
– Alterou a lei 1.283/50 para instituir no art. 4º:
• Sistema de fiscalização / inspeção federal – SIF o MAPA – para
comércio interestadual ou internacional.
• Sistema de fiscalização / inspeção estadual – SIP as SEABs (estados
e DF) para comércio intermunicipal.
• Sistema de fiscalização / inspeção municipal – SIM as SEABs
municipais para comércio municipal.
Sistema Legislativo – Infrações Administrativas, Civis e Penais
• Lei n. 8.137/90
– Art. 7º, IX c/c art. 18, §6º, inc. I e II, do CDC.
• Definição de produto impróprio ao consumo:
– Formal
– Material
POA – Aplicação Prática
• Inquérito civil – Apucarana / Cambira
– Órgãos de fiscalização – interdição de todos os
estabelecimentos de abate.
– Ministério Público – requisição de inquérito policial.
– Ministério Público – TAC – Adaptação das condições do
matadouro municipal (construção).
– Utilização de matadouro particular provisoriamente.
– Criação da Associação de Açougueiros de Apucarana.
Aplicação prática - IIi. Jurisprudência – Crime – Lei 8137/90, 7, IX – impropriedade formal –
desconformidade com regulamento – laudo da vigilância e inspeção sanitária – suficiência – entendimento do artigo 8º da L 1521/52 – art. 8º “Nos crimes contra a saúde pública, os exames periciais serão realizados, no Distrito Federal, pelas repartições da Secretaria-Geral da Saúde e Assistência e da Secretaria da Agricultura, Indústria e Comércio da Prefeitura ou pelo Gabinete de Exames Periciais do Departamento de Segurança Pública e nos Estados e Territórios pelos serviços congêneres, valendo qualquer dos laudos como corpo de delito”.
ii. Recomendação: autos-termo de infração – preenchimento – constar expressamente a normatização (com indicação de artigos se possível), além da descrição do fato que configura a irregularidade – facilitação para o MP na investigação e oferecimento de Denúncia – Crime.
iii. Crimes formais – tendência jurisprudencial de exigir exame pericial – comprovação de impropriedade material - decisão do STJ
Obrigado