“Escrever é traduzir.
Mesmo quando estivermos a utilizar a nossa própria
língua. Transportamos o que vemos
e o que sentimos para um
código convencional de signos, a
escrita...”
“...e deixamos às circunstâncias e aos acasos da comunicação
a responsabilidade de fazer chegar à
inteligência do leitor,
não tanto a integridade da experiência que nos
propusemos transmitir,...”
“...mas uma sombra,
ao menos,do que no fundo do
nosso espírito sabemos bem ser intraduzível,por exemplo...”
“...a emoção pura de um
encontro, o
deslumbramento de uma
descoberta,esse instante
fugaz de silêncio anterior àpalavra que vai ficar na memória como
o rasto de um sonho que o tempo não apagará por completo.”José Saramago
“Muito universo, muito espaço
sideral, mas o mundo
é mesmo
uma aldeia.”José Saramago
Estamos numa aldeia
chamada Azinhaga,
no Alentejo português,
a região sul do país onde se produzem azeitonas, cortiça
e trigo.
E nesta pequena aldeia,
modestas plantações
e criação de porcos é o que há para
ser feito.
Jerónimo e Josefa estão
particularmente felizes hoje, 16 de
novembro de 1922, pois é o dia que viu
nascer o seu mais novo neto,
a quem o destino conferiu o nome de
José Saramago.
Livros e letras não fazem parte da rotina deste
casal de camponeses,
bem como de tantos
outros vizinhos.As poucas palavras faladas lhes
servem aos propósitos, e o
seu mundo é o quintal
que em breves minutos
percorremos.
Na primavera de 1924,
os pais de Saramago,
Maria da Piedade e José de Sousa,abandonam o seio do campo e se
mudam para Lisboa,
onde ele conseguiuum novo trabalho como policial do
trânsito.
Em Lisboa, Maria da Piedade
passa a cuidar dos afazeres
domésticos, e se dedica aos
filhos, Francisco, de quatro anos,
e José Saramago, que conta com
dois anos de idade.
No mês de dezembro
do mesmo ano em que se mudam para
Lisboa, o filho mais velho
do casal, Francisco,com apenas quatro anos de idade,
morre de broncopneumonia.
Uma dor que Maria da Piedade
carregará pelo restante
dos seus dias.
Saramago passa afrequentar a escola
primária na capital, e já é fluente na leitura,
aos oito anos.
Sua mãe o envia nas férias para Azinhaga,
para o contato com o
campo e com os avós
maternos.
E nas temporadas que passa na aldeia dos avós,
o pequeno José sente-se feliz como um pássaro livre.
O contato com a Natureza – a inocência, cheia de beleza e serenidade, das
coisas puras.
Os peixes que, nadando velozes, mantêm-se,
por vezes, imóveis contra a força da corrente...
Anos mais tarde, recordará Saramago algumas lembranças do avô Jerónimo:...
“Recordo daquelas noites mornas de
Verão, quando dormíamos debaixo da figueira
grande, ouço-o falar da vida que teve,
das histórias e lendas
da sua infância distante.”
“Adormecíamos tarde,
bem enrolados nas mantas por
causa do fresco da madrugada...”
As lembranças da pequena aldeia
e o tempo passado na companhia dos
avós – as grandes
referências morais e sentimentais na sua vida –
acompanharão o pequeno José
pelosanos e décadas
vindouros.
O tempo passa e transforma crianças
em jovens adultos.
Por falta de recursos,
Saramago não chega a concluir
o secundário,trocando os
estudos acadêmicos pelo
curso de serralharia
mecânica numa escola técnica de
Lisboa.
Aos dezenove anos passa a trabalhar
num hospital, fazendo a
manutenção do maquinário.Com o trabalho a
consumir as horas do dia, cultiva a
rotina de dedicar a noite à leitura.
Todas as noites, depois de jantar,
vai a pé, apesar da longa distância, até a biblioteca
pública de Lisboa, onde permanece
até a hora de fechar,
lendo tudo o que pode.
São estas leituras as suas aulas, o seu professor,o seu mestre...
“Como gostava de, um dia, começar a
escrever, afinal, ser um escritor! E ser escritor era
para o jovem José
uma reflexão sobre a vida
e os seus absurdos...”
Sobre esta fase, recordará anos mais tarde:...
“Guiado talvez pela
beleza da persistência, ainda
que trêmula,de uma daquelas estrelas que vira
no céu na casa do avô
Jerónimo e da avó Josefa, decidiu ser todo uma só vontade,
todo um atrevimento e
lançou-se no voo alto de
escrever...”
Em 1944, aos 22 anos
de idade, casa-se com a pintora Ilda
Reis,sendo que três anos mais tarde, em 1947, nasce
a filha, que recebe o nome Violante. Neste ano também
publica o seu primeiro
livro, ‘Terra do Pecado’.
José Saramago, Ilda Reis e a filha Violante, 1951
Pais e filhos – a convivência gera laços;
no entanto, o amor, a admiração e o carinho necessitam ser
construídos.
Leva tempo, atenção e cuidado arar a terra que fecunda
afeição e ternura, respeito e carinho.
Leva tempo, atenção e cuidado arar a terra que fecunda
afeição e ternura, respeito e carinho.
José Saramago e Violante
às margens do rio
Almonda Azinhaga,
1951
“A expressão vocabular humana
não sabe ainda e
provavelmente não o saberá
nunca,conhecer,
reconhecer e comunicartudo quanto é
humanamente experimentável
e sensível.”José Saramago
“A expressão vocabular humana
não sabe ainda e
provavelmente não o saberá
nunca,conhecer,
reconhecer e comunicartudo quanto é
humanamente experimentável
e sensível.”José Saramago
José Saramago e ViolanteAzinhaga,
1953
Embora tenha seu primeiro livro,
‘Terra do Pecado’, ignorado pela
crítica,Saramago continua a escrever, tendo diversos contos e
crônicas publicados em jornais e
revistas.
A sua paixão pela literatura leva-o
a conseguir posições
de certo destaque no meio editorial,
atuando comocolunista, revisor,
tradutor ecrítico literário.
Com aproximadamente quarenta anos de
idade, seu nome começa
a ser conhecido no
campo da literatura e
cultura em Portugal.
Saramago passa a ocupar diversas
funções, como coordenador do suplemento de cultura do jornal
‘Diário de Lisboa’, e diretor-adjunto do ‘Diário de Notícias’.
Em 1970, Saramago
e Ilda Reis se divorciam.
E em 1975, ao deixar afunção de
editorialista do jornal onde
trabalha,resolve dedicar-se exclusivamente
à literatura.
Em 1980, aos 58 anos de idade,
Saramago publica o seu segundo
romance, chamado“Levantado do Chão”.
Desta vez, a acolhida é
bem diferente; a obra é recebida com êxito, tanto
pela crítica, quanto pelo
público, em Portugal.
Aos sessenta e poucos
anos de idade Saramago dá início
a uma tardia e improvável carreira
literária.
Os livros que se seguem
nos anos seguintes são igualmente
aclamados pelo país afora.
Estamos em 1986, Saramago
encontra-se com 63 anos de
idade.Separado, com a
filha já adulta.Realizou o sonho de escrever e ser
lido.Com um sucesso considerável em Portugal , parece
um homem satisfeito com a
vida que lhe fora destinada.
“Aos 63 anos de idade, o que
um homem pode ainda esperar da
vida?...”afirmaria numa
entrevista, “Não muito...”.
Mas o futuro ainda lhe
reserva algumas
surpresas...
( fim da primeira parte desta
apresentação )
1986 - Sevilha, Espanha. Uma jornalista espanhola, nos seus
trinta e poucos anos, passeia por uma
livraria à procura de títulos interessantes.
Ao passar por uma estante que contém alguns livros separados
para serem devolvidos à editora, se depara com um
título que chama sua atenção.
Mesmo sem ter ouvido falar do autor,
ela resolve comprar o livro, sem poder imaginar
as consequências que tal decisão, aparentemente trivial, poderá ter.
Coincidências da vida, dirão alguns,enquanto outros atribuirão o
ocorrido ao destino, ao acaso, ao inevitável...
O livro se chama ‘Memorial do Convento’.E a jovem
jornalista que o
acaba de adquirir,
Pilar del Río.
Blimunda, a
protagonista de ‘Memorial do Convento’,
ocupa um lugar especial dentre
todos os personagens femininos
criados por Saramago.
Pilar gosta tanto do livro que compra vários exemplares para
presentear às melhores amigas, comentando sua
grande vontadede conhecer esse homem
capaz de tocar tanto
a alma feminina
através de Blimunda.
Ela procura outros livros de Saramago, e diante
da revelação e fascinação sentida
após cada leitura, resolve entrar em
contato com o autor.
Pilar recordará mais tarde: “Senti que tinha a
obrigação moral de dizer a José Saramago o que tinha experimentado. Um autor
só acaba a sua obra quando o livro é lido e
entendido. E eu queria
dizer-lhe: completou-se o ciclo, li-o e
entendi.”
Uma bela tarde, toca o
telefone na casa de
Saramago.Pilar se identifica, dizendo ser uma leitora
e admiradora.Conversam sobre os
livros de Saramago, sobre a literatura,
sobre a vida...
E ao fim da conversa,
combinam de se encontrar numa cafeteria
em Lisboa, para uma entrevista
que Pilar propõe realizar para
o jornal em que trabalha.
Por ocasião do encontro,
aproveitam para passear pela
cidade de Lisboa, e falam de quase
tudo.Depois, ela
retorna para Sevilha.
“Com uma estranha
paz.”
No dia seguinte, Saramago retribui a visita de Pilar a Lisboa, enviando-
lhe uma carta, acompanhada de rosas.
Caminhos que se entrecruzam, vidas prestes a se mudar para
sempre...
Coincidências da vida, dirão alguns.O destino, o acaso, o
inevitável, afirmarão outros...
Há quem afirme que as histórias de amor, todas elas, desde o início dos tempos, se
parecem, se repetem.
O que muda são os nomes, os detalhes, os corações...
As idas e vindas entre Sevilha e Lisboa, onde Pilar e
Saramago residem, respectivamente, passam a se
tornar cada vez mais frequentes.
Os 28 anos de vida que separam Pilar, com 34 anos, e Saramago, 63, se tornam um
mero detalhe diante do amor que sentem.
Em outubro de 1988 celebram o casamento.
Ao lado de Pilar, Saramago inicia o que chama de sua
‘segunda vida’.
Saramago observa que aos 63 anos, “quando já não se espera nada”,
encontrou “o que faltava para passar a ter tudo” – Pilar.
Ela, espanhola: sonhadora, lutadora, vive a batalha de
mudar o mundo; Ele, português: melancólico, sereno...
Uma combinação perfeita.
Os livros que Saramago
passa a escrever
desde então são
todos dedicados
a ela.
“A Pilar, os dias todos”“A Pilar,
até ao último instante...”
“A Pilar, minha casa”
Com a mudança para Lisboa, Pilar abandona a carreira jornalística
que exercia na televisão espanhola.
É a primeira leitora dos textos de Saramago, e a
tradutora das obras do marido para o
espanhol.
Em 1991, Saramago publica o livro
“O Evangelho segundo Jesus
Cristo”, onde conta a
história de Jesus de forma moderna, sob um
olhar narrativo que
humaniza Cristo.
Em 1992, a Secretaria
de Cultura de Portugal veta a
inscrição do livro na disputa do
Prêmio Literário Europeu,
por considerá-lo “ofensivo para o catolicismo do povo
português.”
Em reação a tal veto, que
considera censório, Saramago se muda
de Portugal,
passando a fixar residência na ilha de Lanzarote,
Ilhas Canárias.
E é em seu escritório em Lanzarote que Saramago
escreve um de seus romances mais conhecidos – “Ensaio sobre a
Cegueira”.
Escrito em 1995, próximo à virada do milênio, o romance aborda uma epidemia de cegueira repentina que acomete a inteira população de
uma cidade.
A cegueira como uma alegoria para o estado
de crise por que passa a atual sociedade,
onde, frequentemente, os limites entre civilização e barbárie
são rompidos.
A cegueira como uma alegoria para o estado
de crise por que passa a atual sociedade,
...
A cegueira descrita no livro é uma “cegueira branca”, pastosa, como se alguém tivesse
mergulhado de olhos
abertos num “mar de leite”.
“Trevas brancas” a anuviar o
olhar daqueles
que, tendo olhos,
não conseguem
(ou se recusam a) enxergar.
Uma cegueira por vezes
associada ao avanço
irrefreado do consumismo e
do materialismo,que faz com
que os homens
percam a consciência
de si, se deformem,
se massifiquem
e se barbarizem.
Uma cegueira
que promove a
ruptura com a nossa
própria essência –
a compaixão, o cuidado,
a solidarieda
de...
“Penso que estamos cegos,
José Saramago
Cegos que vêem,
Cegos que, vendo, não
vêem.”
“Se podes
olhar, vê.
Se podes
ver, repara”.
(epígrafe do livro “Ensaio sobre a
Cegueira”)
“Somos a memória
que temos e a
responsabilidade que
assumimos. Sem memória
não existimos,
sem responsabilidade talvez não mereçamos
existir.”José Saramago
1995 – Saramago recebe o Prêmio
Camões, o mais
importante da literatura da
língua portuguesa.
1998 – Recebe o Prêmio Nobel de
Literatura, tornando-se o primeiro autor
da língua portuguesa a
receber a homenagem.
1998 – Recebe o Prêmio Nobel de
Literatura, tornando-se o primeiro autor
da língua portuguesa a
receber a homenagem.
Saramago, aos 76 anos de idade, recebe o Prêmio
Nobel das mãos do rei da Suécia.
Estocolmo, 1998
Ao receber o prêmio, Saramago inicia seu discurso com uma homenagem
ao avô, o camponês Jerónimo Melrinho, o que também pode ser visto
como uma crítica à pompa das instituições literárias:...
“O homem mais sábio que conheci em
toda minha vida não sabia ler nem
escrever...”
E passa a discorrer sobre memórias de sua infância, suas fontes de inspiração e formação, e sobre
alguns de seus principais livros e personagens.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se
uma nova fase na vida de Saramago e Pilar.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se
uma nova fase na vida de Saramago e Pilar.
O público leitor de Saramago multiplica-se.Os livros são traduzidos em 42
línguas, publicados em 53 países, e vendem milhões
de exemplares mundo afora.
Com a conquista do prêmio Nobel, inicia-se uma nova fase na vida de
Saramago e Pilar.
O público leitor de Saramago multiplica-se.Os livros são traduzidos em 42
línguas, publicados em 53 países, e vendem milhões
de exemplares mundo afora.
Plateias numerosas, por vezes superiores
a mil pessoas, ouvem avidamente suas palavras.
“Acho que na sociedade actual nos falta filosofia...”
“Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar,
e parece-me que, sem idéias, não vamos a parte
nenhuma.”
“Falamos muito ao longo destes últimos anos dos direitos humanos; simplesmente deixamos de falar de
uma coisa muito simples,...”
“...que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo. E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro,...”
“...que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional.”
“...que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional.”
“O egoísmo pessoal, o comodismo, a falta de generosidade, as pequenas
cobardias do quotidiano, tudo isto contribui para essa
perniciosa forma de
cegueira mental...”
“...que consiste em estar no
mundo e não ver o mundo ou só ver
dele o que, em cada
momento, for susceptível de
servir os nossos interesses.”
“Temos que acreditar nalguma coisa e, sobretudo, temos de ter
um sentimento de responsabilidade
colectiva, segundo o qual cada um de
nós será responsável por todos os outros.”
“A prioridade absoluta tem de
ser o ser humano.Acima dessa não
reconheço nenhuma outra
prioridade.”José Saramago
E fazendo uso do espaço, da
atenção e notoriedade
conferidos pelo prêmio Nobel,
Saramago denuncia as
injustiças sociais, e
defende com coração e alma as causas que
abraça:...
Os cuidados com a infância;
A educação de qualidade;
Os direitos dos povos nativos da América
Latina;O combate à
violência doméstica;
A luta pelo fim dos maus-tratos contra
animais;A questão dos
refugiados;O sofrimento do povo
palestino;dentre tantas outras.
Aos oitenta anos de idade,
guarda o vigor juvenil de se
revoltar contra toda injustiça, e não permite que
se morra nele o desejo de mudar o mundo.
O engajamento sempre em prol do
humanismo.
“Estou convencido de que é preciso continuar
a dizer não, mesmo que se
trate de uma voz pregando no deserto.”José
Saramago
“Estou convencido de que é preciso continuar
a dizer não, mesmo que se
trate de uma voz pregando no deserto.”José
Saramago
Em 2007, aos 85 anos, Saramago é agraciado com
o prêmio “Amigo das Crianças”, concedido pela fundação
‘Save the Children’.
Segundo a fundação, o prêmio é um reconhecimento ao grande
empenho na procura de “um mundo melhor em que todas as crianças
tenham esperança e oportunidades”,...
...salientando, ainda, o “compromisso ativo pela paz” e o
“apoio continuado às campanhas e projectos relacionados com a
infância e com os mais desfavorecidos”.
Dentre os livros de Saramago encontra-se
um dedicado ao público infantil – “A Maior Flor do Mundo”.
Foto tirada em novembro de 2005.
Pilar é uma companhia constante nos
intermináveis compromissos e viagens.
Igualmente defensora de inúmeras causas humanitárias, atua como
confidente, conselheira, tradutora e é quem organiza a agenda do marido.
Estão sempre juntos – em Lisboa e Lanzarote
ou pelo mundo – e de mãos dadas.
Estão sempre juntos – em Lisboa e Lanzarote
ou pelo mundo – e de mãos dadas.Um amor e uma admiração
singulares – a aura envolvente que raros casais
emitem...
“Pilar, se eu tivesse morrido aos 63 anos, antes de te conhecer, morreria
muito mais velho do que serei quando chegar a minha hora.”José Saramago
“Pilar, se eu tivesse morrido aos 63 anos, antes de te conhecer, morreria
muito mais velho do que serei quando chegar a minha hora.”José Saramago
Em meio às constantes viagens, é na residência
em Lanzarote, com vista para o mar, que
Saramago recompõe as energias e se restabelece.
E mesmo com a agenda corrida, ele reserva tempo para escrever ao menos duas páginas diárias – que totalizará um
livro ao fim de um ano, conforme observa.
Por diversas vezes,
Saramago e Pilar visitam o Brasil, onde
cultivam muitas
amizades.
Jorge Amado, Chico Buarque,
Leonardo Boff, Sebastião
Salgado, Lygia Fagundes Telles
Paulo Freire, Betinho, Frei Betto, entre
tantos outros.
A calorosa acolhida dos intelectuais brasileiros também se reflete na
relação de Saramago com o seu público leitor no país.
Certa vez, diante da cativa platéia e da efusão de beijos e abraços que se
seguiram, exclama:...
Certa vez, diante da cativa platéia e da efusão de beijos e abraços que se
seguiram, exclama:...
“Esta gente quer me matar de amor!”
Saramago também manifesta um carinho especial pelos
jovens e adolescentes.
Frequentemente aceita convites para visitar
escolas, proferir palestras e participar de debates.
“Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice
pode o que sabe.”José Saramago
Saramago, rodeado pela família – foto tirada em 1993, na varanda da casa de
Lanzarote.
A filha, Violante,
e o genro, Danilo;
os netos, Ana
e Tiago. Pilar e Juan Jose –
filho do primeiro casamento, (que segura o
cãozinho Camões).
Ao mesmo tempo
em que cultiva a conhecida
seriedade,
Saramago também nutre uma notória leveza e um bom-humor constante.
Certa vez, declara gostar da seção de quadrinhos dos jornais.“Confesso que
gosto muito do Calvin e do
Hobbes, do Snoopy,
do Garfield,...”
“...daquela Mafalda sábia e subversiva, de quem continuo a ser discípulo
fiel.”
José Saramago
mas cabe nela muito
mais do que somos
capazes de viver.”
“A vida é breve,
José Saramago
“Fugir da morte pode tornar-se
num modo de fugir da
vida.”
“O homem é o único
animal capaz de chorar.É diante do mar que o
riso e a lágrima
assumem uma
importância absoluta.”
E de sorrir.
“Dir-se-á que mais
profundamente a
assumiriam diante do universo,
mas esse, digo eu, está demasiado longe, fora do alcance
duma compreensão comum.”
“O mar é o universo
perto de nós.”José Saramago
Em 2007, Saramago é hospitalizado durante longos meses, devido a uma
grave doença respiratória.
Tão logo se recupera, conclui o livro “A Viagem do Elefante”,...
...e faz questão de viajar para o Brasil, aos 85 anos de idade, para o lançamento mundial da obra.
...e faz questão de viajar para o Brasil, aos 85 anos de idade, para o lançamento mundial da obra.
A escolha do Brasil para o lançamento
mundial é um presente ao carinho e
amizade dos brasileiros.
16 de novembro, 2008, aniversário
de 86 anos.
A notória lucidez e a
acuidade da sua reflexão
filosófica permanecem inabaláveis,
contrastando cada dia mais com a saúde
física debilitada.
“A vida é como uma vela
que vai ardendo,
quando chega ao fim lança uma chama mais forte
antes de se extinguir.”
“Creio que estou
no período da última
chama...”,afirma Saramago diante das crescentes limitações
impostas pela saúde frágil .
Janeiro de 2010 – Haiti é sacudido
por um forte tremor, que deixa
milhares de mortos, feridos e desabrigados.
Saramago, aos 87 anos de idade,
já não tem a força nem a saúde para
empreender viagem, de modo a levar a sua
solidariedade àqueles que sofrem.
Apesar da distância, desde a
ilha de Lanzarote, encontra
um meio de contribuir, e de lançar o seu
incansável apelo para a humanidade.
Ele convence sua editora a
publicar uma edição especial do livro “Jangada
de Pedra”, que terá a renda revertida
integralmente em prol do povo haitiano.
Mais que um gesto de ajuda,
um sopro de alento, nestes
dias de fria indiferença,nestes tempos tão
desprovidos de compaixão social e
caridade.
– Uma ‘Jangada de Pedra’a caminho do Haiti –
“Porque todos temos
uma obrigação.”José Saramago
Abril de 2010, a saúde física de Saramago
a tal ponto está debilitada que o seu médico
lhe impõe repouso absoluto.
O repouso absoluto, observa o médico,
abrange também a escrita, ou seja, Saramago deverá parar de escrever.
Diante da renúncia derradeira à escrita
que acaba de ser imposta ao esposo, Pilar sente que a recuperação será
um milagre.
“...enganadora é sim a luz do
dia, faz da vida uma
sobra apenas recortada,só a noite é
lúcida,porém o sono a vence,...”
“...talvez para nosso sossego e
descanso, paz à alma dos vivos.”
(em ‘O Ano da Morte
de Ricardo Reis’)
José Saramago
Mês de maio, 2010
Durante as últimas semanas, Saramago quase não fala, mas ri, e
segue rindo.
Embora participe dos jantares e cafés da manhã
que Pilar carinhosamente lhe prepara,...
...parece nutrir outras fomes e outras necessidades,
anseios que a este mundo já não mais pertencem.
Ele está aqui e não está, mas sorri.
Ele está aqui e não está, mas sorri.
“...o espírito não vai a lado nenhum sem as pernas do
corpo,
José Saramago(em ‘Todos os Nomes’)
e o corpo não seria capaz de
mover-se se lhe faltassem as
asas do espírito.”
No dia 18 de junho,
depois de uma noite serena
e tranquila,Saramago falece na sua residência
em Lanzarote, acompanhado de
Pilar e de sua família, “despedindo-se de
forma serena e plácida.”
Em se havendo outros mundos,
e havendo lá também
oprimidos e necessitados, estes ganharam
uma voz a defendê-los e
quem se importe com eles...
estes ganharam uma voz a
defendê-los e quem se importe
com eles...
E em se havendo outros mundos
ainda, talvez lá tenham se reencontrado o pequeno José
e os avós tão amados, Josefa e
Jerónimo.
“Dentro de nós há uma coisa que
não tem nome,essa coisa é
o que somos.” José Saramago
Segundo o amigo e teólogo
Leonardo Boff,Saramago cultivava
“a espiritualidade como sentimento
do mistério do mundo, ,
da profundidade humana
e do amor aos oprimidos.”
Leonardo Boff descreve a tarde
que ele e a esposa, Márcia,
passaram na companhia de Saramago e
Pilar como “um festim
de espiritualidade”.
“Ganhamos um amigo
e a fé me diz que ele agora
mergulhou naquele Mistério
de amor que sempre buscou.”
Leonardo Boff
“Quando me for deste mundo, partirão duas
pessoas.José Saramago
Sairei, de mão dada, com essa criança que fui”.
Formatação: [email protected]
Tema musical:Primeira Parte: ‘Illumination’, White StonesSegunda Parte: ‘Moment musical n.3’, Schubert
Obrigado, Saramago.