Teorias sócio-cognitivas
A teoria das concepções pessoais da inteligência pressupõe que a «actividade
cognitiva do sujeito é indissociável da motivação» (Fontaine, 2005: 75) e que «as
crenças orientam o comportamento» (Fontaine, 2005:137). A sua perspectiva centra-se
no presente, procurando explicar o comportamento dos sujeitos quando se encontram
envolvidos numa tarefa, nomeadamente, a tendência para maior persistência ou rápida
desistência.
A teoria da auto-eficácia remete-nos, para uma percepção pessoal da inteligência,
habilidades e conhecimentos, sendo as capacidades do indivíduo direccionadas para
organizar e executar determinadas linhas de acção.
Na teoria da avaliação cognitiva o ser humano é um ser activo, que inicia a sua
actividade através de interpretações subjectivas dos contextos próprios de
comportamentos que facilitem a obtenção do sucesso. Este, observa e analisa tendo
como referência os seus conhecimentos e a experiência adquirida e, a partir deste ponto,
inicia então a sua actividade.
Os pressupostos elaborados por Weiner, Frieze, Kukla, Reed, Rest e Rosenbaum (1971)
sobre a teoria atribucional permitiram concluir que o empenho do indivíduo na
realização de uma tarefa depende, em parte, das suas expectativas de sucesso ou
fracasso. Estas expectativas são determinadas pelas atribuições causais que
estabelecem para os eventos que se seguiram ao seu comportamento.
A motivação segundo Deci e Rayan é algo natural e inato. Para a teoria sócio-cognitiva,
existem dois subsistemas motivacionais. Um subsistema intrínseco com locus de
controlo interno (motivação por factores intrínsecos em que o indivíduo possui o
controlo do seu próprio comportamento) e um subsistema composto por factores
extrínsecos, com locus de controlo externo (atribuem o comportamento a factores que
não estão sob o seu controlo pessoal).
Carol Dweck, precursor das teorias pessoais sobre a inteligência, entende que a
motivação surge associada aos objectivos que orientam a acção, dependendo do valor
atribuído pelo indivíduo a esses objectivos. Aceita as diferenças entre os alunos
(persistentes ou habitualmente desistentes) e define dois padrões de realização:
“orientado para a mestria” e o “orientado para o abandono”, associados a dois tipos de
objectivos, respectivamente, «objectivos de aprendizagem» e «objectivos de
performance». Por sua vez, a definição de tais objectivos supõe diferentes concepções
de inteligência: a dinâmica no primeiro caso e estática no segundo.
A adopção de um ou outro padrão de realização não está directamente relacionada com
a capacidade da pessoa ou percurso escolar/resultados dos anos anteriores.
Para a teoria da avaliação cognitiva defendida por Weinberg & Gould (1995), a motivação é
algo que coordena e controla a direcção e a intensidade do esforço que é desenvolvido pelos
indivíduos, enquanto que para a teoria atribucional, as atribuições causais influenciam as
expectativas e, por conseguinte a motivação, com consequências ao nível afectivo,
cognitivo e comportamental. As causas e as consequências que determinam o
comportamento situam-se em três dimensões ou propriedade: o locus de causalidade, a
estabilidade e a controlabilidade.
A teoria das concepções pessoais de inteligência aceita que o bom aluno também
possa adoptar um padrão de abandono, quando confrontado com uma nova tarefa para a
qual não antevê de imediato uma estratégia de resolução bloqueia, temendo o fracasso.
A adopção de um padrão está associada às crenças interiorizadas sobre a natureza da
inteligência. O aluno que valoriza os objectivos de performance prefere tarefas que
promovam o sucesso com o esforço mínimo; por sua vez, o aluno que valoriza os
objectivos de aprendizagem prefere tarefas que permitam aprender algo de novo, tarefas
desafiantes em que possa ensaiar e treinar a aquisição de novas competências. Não teme
o fracasso já que não o entende como uma falha das suas capacidades, incapacidade ou
falta de inteligência.
Tal interpretação, implica conceber a inteligência como algo inato, estático, adquirido e
inalterável. Ao contrário desta ideia, Bandura explica o conceito de auto-eficácia como
uma apreciação das capacidades que cada indivíduo possui, centrando-se na crença de
que basta possuir capacidades e habilidades para se conseguir triunfar.
Assim, associado ao padrão de realização orientado para a mestria e à valorização de
objectivos de aprendizagem encontramos uma concepção dinâmica de inteligência, vista
como um conjunto de competências em desenvolvimento, directamente relacionadas
com a importância do esforço. Nesta teoria, os indivíduos reconhecem as suas
habilidades e pontos fortes, aprendem a confiar em si mesmos, o que impede que os
sujeitos desistam ou se rendam perante o fracasso e consigam seguir em frente no
cumprimento das suas metas que normalmente são muito altas. “As acções e
julgamentos são parcialmente auto-determinados, as pessoas podem provocar mudanças
em si próprias e nas situações graças ao seu próprio esforço" (Brandura, 1989, citado
por Fontaine, 2005:18).
Para a teoria da avaliação cognitiva, a motivação intrínseca corresponde a um estado
de acção auto-determinado, onde uma acção só tem valor se resultar de decisão livre e
pessoal do indivíduo. Deci e Ryan assumem que a motivação intrínseca não resulta de
um processo construído, ocorre naturalmente, ou seja, é um processo espontâneo.
Constitui a base natural e o desejo para a aprendizagem, para o desenvolvimento, para
procurar a novidade e novos desafios e para a promoção de competências pessoais.
Na teoria das concepções pessoais de inteligência, Dweck considera que é a
vulnerabilidade face à ameaça de um eventual fracasso escolar, que explica o declínio
dos resultados escolares dos alunos com concepção estática de inteligência nas
transições escolares ou situações de mudança. O desenvolvimento de padrões de
persistência ou de desistência estão intimamente relacionados com as mensagens
veiculadas pelo feedback dos encarregados de educação e professores, em situação de
sucesso ou fracasso.
À luz da teoria de auto-eficácia, o indivíduo, na tentativa de evitar experiências
desagradáveis, antecipa, situações futuras, tendo em atenção os possíveis resultados e a
capacidade pessoal de fazer face às respectivas exigências. Um indivíduo que se
considera auto-eficaz traduz esse sentimento e age de acordo com isso; na situação
contrária manifesta-se em acções desconcertadas.
Segundo a teoria da concepção de inteligência, podem ocorrer contextos que
enfatizam a aprendizagem e outros que promovem a competição, centrando-se nos
resultados da avaliação. Este aspecto poderá ser considerado negativo no
desenvolvimento de características motivacionais dos alunos, podendo mesmo
promover uma redução progressiva da motivação em contexto escolar.
As estruturas competitivas valorizam o sucesso como um indicador da capacidade
intelectual, associando-o a sentimentos de competência dos alunos. Os alunos que têm
melhores resultados são mais elogiados, apreciados e reforçados pelos professores. O
sucesso de uns em contraste com o insucesso de outros cria uma interdependência
negativa. As experiências do fracasso são ameaçadoras, apelidadas de falta de
inteligência, podendo levar ao abandono.
Pela teoria da auto-eficácia uma experiência do sucesso, baseada na competência
individual, reforça o sentimento de poder, melhora o auto-conceito e motivação para a
realização, o que favorece a ocorrência de comportamentos proactivos e persistentes, no sentido
da consecução dos objectivos. Perante uma nova tarefa, uma pessoa com fortes crenças de auto-
eficácia mesmo que surjam dificuldades, tenderá a iniciar e persistir na sua realização com base
nas recordações de tarefas idênticas realizadas com êxito. As situações de fracasso, diminuem a
auto-eficácia e a motivação para realizar a tarefa é residual.
A auto-eficácia assume relevo por estar relacionada com o comportamento de escolha, com
esforço dispendido e a persistência face à existência de obstáculos e padrões de pensamento e
reacções emocionais. O padrão de comportamento é orientado para a mestria das tarefas
comuns. Os contextos de realização, mais centrados na aprendizagem do que na
performance, facilitam a procura de ajuda e se há procura de ajuda esta é funcional para
novas aprendizagens.
Os indivíduos com uma concepção estática de inteligência têm mais dificuldade em
lidar com a novidade, com acontecimentos inesperados e em adaptar-se à mudança.
Alunos com padrão de desistência desorganizam o seu comportamento perante a
ambiguidade e não procuram ajuda.
Os alunos que partilham uma visão dinâmica de inteligência parecem ser mais flexíveis
e capazes de adaptar o seu comportamento aos objectivos propostos, testam as suas
competências em certas circunstâncias e desenvolvem-nas. Estes lidam de igual modo
com tarefas que permitem atingir objectivos de aprendizagem como de performance e
são capazes de coordenar vários objectivos. Funcionam bem tanto individualmente, com
em grupo, e são capazes de criar uma atmosfera mais cooperante e de ajudar os outros,
porque se sentem à vontade com as suas próprias competências.
Para a teoria da atribuição causal, a experiência de não controlabilidade de uma situação
negativa pode levar à convicção de não contingência entre o comportamento do sujeito
e os acontecimentos adversos e à atribuição destes a causas internas estáveis e globais,
com consequências emocionais, cognitivas e comportamentais associadas ao desânimo,
tristeza, expectativas negativas, passividade e inibição do comportamento. No domínio
académico, estas consequências negativas, manifestam-se por dificuldade em pedir
ajuda, revelar baixas aspirações ou alcançar fracos resultados escolares, reflectindo-se
frequentemente em abandono escolar.
Implicações na Prática Docente
Considerando a existência de dois modelos de docência: normativo e descritivo e tendo
em conta que o primeiro «associa a eficácia do ensino às características de
personalidade do docente, que se traduziriam por comportamentos e estratégias eficazes
em quaisquer circunstâncias.» (Fontaine, 2005:156), torna-se clara a articulação entre
este modelo e a crença numa concepção estática da inteligência e uma visão rígida da
competência. O modelo descritivo está associado à ideia de flexibilidade e à
necessidade do docente assumir uma postura investigadora e uma perspectiva mais
dinâmica das competências e da inteligência.
As concepções dos professores sobre inteligência e docência, reflectem-se no tipo de
ambientes de aprendizagem que proporcionam aos alunos em sala de aula e no modo
como o seu discurso e a sua acção reforçam nos alunos a crença numa ou noutra
concepção de inteligência (dinâmica ou estática), e o consequente comportamento de
persistência ou abandono.
Numa perspectiva de auto-eficácia, os docentes mais seguros, confiam nas suas capacidades,
conseguem resolver os conflitos com eficácia, são menos vulneráveis a conflitos e à
indisciplina, dominam as matérias e sabem trabalhá-las, segundo metodologias diferenciadas
adaptando-as aos seus alunos. São mais flexíveis e não têm medo de experimentar novas
metodologias.
A acção pedagógica do professor (Teoria da avaliação cognitiva) deve proteger a motivação
intrínseca do aluno e simultaneamente transformar a motivação extrínseca em intrínseca.
O funcionamento auto-determinado do aluno assenta na criação de condições ambientais que
permitam a satisfação das necessidades de: autonomia ( exercício da livre vontade, da escolha,
sem muita regulação ou controlo externo); competência ( experiência de percepções de eficácia
pessoal e de mestria na realização de actividades e no estabelecimento de objectivos);
relacionamento (necessidade de estabelecer relações interpessoais significativas em contextos
específicos, percepção de pertença e de apoio na realização de actividades e no estabelecimento
de objectivos).
A maioria das actividades propostas aos alunos não são intrinsecamente motivantes,
principalmente devido a regulações sociais a que estamos sujeitos, pelo que se torna necessário
proporcionar actividades que permitam o alcance de resultados socialmente valorizados e que o
aluno se envolva não pelo simples prazer que ela proporciona, mas também para atinjir um
determinado objectivo.
A compreensão das atribuições causais do sucesso e fracasso e da sua organização
reveste-se de importância fundamental por permitir compreender algumas das reações
manifestadas tanto pelos alunos, como pelos próprios professores, em situações como as
de indisciplina. A atribuição de causalidade influencia também as relações interpessoais,
interferindo no desempenho e aprendizagem do aluno. Também a comparação social
influencia as atribuições causais: quando um fracasso é geral, o aluno tende a atribuir as
causas a factores instáveis e externos; na situação de fracasso isolado, atribuirá as
causas a factores estáveis internos (falta de capacidade).
A análise das atribuições causais revela a sua organização em padrões atribucionais que
podem ser estimulantes (quando o sucesso é atribuído a causas internas ou estáveis e o
fracasso a causas instáveis ou externas) ou debilitantes (quando o sucesso é atribuído a
causas externas ou instáveis e o fracasso atribuído a causas estáveis ou internas).
Por vezes, os padrões atribucionais “caracterizam-se por uma discrepância nítida entre
as atribuições invocadas pelos sujeitos em caso de sucesso ou fracasso”, “devido a um
viés auto-protector” (Fontaine, 2005:92). Assim, o indivíduo que procura maximizar o
prazer e orgulho associado ao sucesso, tende a minimizar a vergonha ou culpa ligadas
ao fracasso. Este padrão atribucional pode ser estimulante nos contextos escolares por
favorecer expectativas positivas, projectar o conceito de competência, induzir um maior
investimento na tarefa e, consequentemente, conduzir ao sucesso escolar.
Bibliografia
Oliveira, J.B. (2007). Psicologia da Educação. Legis Editora. Porto.
Fontaine, A. (2005). Motivação em Contexto escolar. Lisboa:Universidade Aberta.
Hadji, C. (2001). Pensar e agir a educação. Porto Alegre: Edições Artmed.