Thais Borges Damacena
A singularidade dobra-dobra e o caos não determinístico
Campinas
2012
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iv
"Não sei se estou perto ou longe de-mais, se peguei o rumo certo ou errado.Sei apenas que sigo em frente, vivendodias iguais de forma diferente. Jánão caminho mais sozinha, levo comigocada recordação, cada vivência, cadalição. E, mesmo que tudo não ande daforma que eu gostaria, saber que já nãosou a mesma de ontem me faz perceberque valeu a pena."(Autor Desconhecido)
v
AGRADECIMENTOS
À Deus, pelo dom da vida e por todas as oportunidades que tem me dado.
À minha mamãe Maria, que partiu tão precocemente, deixando uma saudade imensa e
acima disso deixando um exemplo lindo. Um anjinho, que em tão pouco tempo me ensinou,
entre outras coisas, o signi�cado de amor incondicional.
Ao meu papai Edivaldo, por ser durante todos esses anos, pai e mãe. E por nunca
ter negado esforços e sacrifícios para que eu pudesse crescer espiritualmente, moralmente e
intelectualmente.
Ao meu irmão Igor e sua esposa Mariana, pelo encorajamento e carinho de sempre.
À todos os meus amigos que apesar de distantes, estiveram sempre presentes, encorajando
e incentivando durante esses dois anos. Em especial, Kétura, Raiany e Ítalo.
À família, que Deus preparou para mim aqui em Campinas. Pessoas as quais sem me
conhecer me acolheram com todo carinho do mundo e �zeram a saudade de casa suportável.
Aos amigos que �z durante esses dois anos. Estudantes de diversas áreas, que juntos a
mim enfrentaram a luta na Unicamp e que estavam sempre dispostos a um almoço, uma
conversa, ou simplesmente um abraço. Aqueles que �zeram desse, um momento inesquecível
na minha vida. Em especial, Fran, Vaninha, Vítor e Marcos.
Ao professor Marco, por ter aceitado me orientar nesse trabalho, pela atenção que sempre
demonstrou e pelos ensinamentos matemáticos.
Aos meus professores de graduação da Universidade Federal de Goiás, em especial à
professora Marina, pela iniciação a pesquisa, e por sempre estar disponível para um conselho
vi
ou uma conversa.
Aos meus colegas do IMECC, Wender, Juliana, Felipe, Jesus, Douglas, Douglas Maioli
pela companhia e por ter tornado agradável esse período. Agradeço em especial ao Ricardo,
pela ajuda imprescindível durante todo o mestrado.
Aos professores e funcionários do IMECC, especialmente ao pessoal da Secretaria de
Pós-Graduação, Tânia, Lívia e Ednaldo.
À Capes, pelo apoio �nanceiro durante o mestrado.
vii
RESUMO
Um campo vetorial descontínuo 3D sobre uma superfície suave de codimensão um, pode
ser genericamente tangente a ambos os lados da superfície em um ponto p. Os pontos onde
esse fenômeno ocorre são chamados de singularidade dobra-dobra.
Nesse trabalho, estudamos a dinâmica local de um sistema dinâmico suave por partes
tri-dimensional em uma dobra-dobra. Vimos que a dinâmica local depende principalmente
de um único parâmetro que controla uma bifurcação.
Especi�camente no caso onde as dobras são ambas invisíveis, a chamada singularidade
Teixeira, encontramos que o sistema pode admitir um �uxo exibindo dinâmica caótica, mas
não determinística.
viii
ABSTRACT
A 3D discontinuous vector �eld on a smooth surface of codimension one, can be generically
tangent to both sides of the surface at a point p. The points where this phenomenon occurs
are called two-fold singularities.
In this project, we study the local dynamics of a three-dimensional piecewise smooth
dynamical systems at a two-fold. We have seen that the local dynamics depends mainly on
a single parameter that controls a bifurcation.
Speci�cally in the case where the folds are both invisibles, the so-called singularity Teix-
eira, we �nd that the system can admit a �ow exhibiting chaotic but non-deterministic
dynamics.
ix
CONTEÚDO
Agradecimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . vi
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . viii
Abstract . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ix
Introdução 1
1 Preliminares 5
1.1 Campos Vetoriais de�nidos em variedades com bordo . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Campos Vetoriais Descontínuos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
1.2.1 Convenção de Filippov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
1.2.2 Singularidades de Z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.2.3 Estrati�cação de M . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.2.4 Estabilidade estrutural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
2 A singularidade dobra-dobra 16
2.1 O problema dobra-dobra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.2 Singularidade Teixeira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.2.1 Aproximação Local . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.2.2 Dinâmica nas Regiões de deslize e de escape . . . . . . . . . . . . . . 22
2.2.3 Dinâmica nas regiões de costura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.2.4 Dinâmica sobre a singularidade Teixeira . . . . . . . . . . . . . . . . 32
x
2.2.5 Caos não determinístico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
2.3 A dobra-dobra visível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
2.4 A dobra-dobra invisível-visível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
2.5 Observações sobre bifurcações deslizantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
2.6 Simulações numéricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
3 Singularidade dobra-dobra em sistemas elétricos não suaves 48
3.1 Um circuito com comutação de potência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
3.2 Um circuito resistivo com memória . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
Apêndice A 53
Apêndice B 56
Apêndice C 57
Apêndice D 60
Apêndice E 63
Apêndice F 65
Bibliogra�a 65
xi
INTRODUÇÃO
Um Sistema Dinâmico Suave por Partes é caracterizado por um conjunto �nito de
equações diferenciais ordinárias,
x = Gi(x) , x ∈ Ri ⊂ Rn, i = 1, ..., k (1)
cujo lado direito são campos vetoriais Gi de�nidos sobre regiões disjuntas Ri e que podem
ser estendidas suavemente para o fecho de Ri. Consideraremos o caso quando as regiões Ri
são separadas por um conjunto n−1 dimensionalM , chamado conjunto de descontinuidade.
A união de M e dos Ri cobre Rn.
Estaremos sempre considerando o conjunto de descontinuidade como sendo uma hiper-
superfície conexa M e assim podemos falar da variedade como localmente tendo dois lados.
Sistemas suave por partes surgiram ao longo da história dos sistemas dinâmicos como
modelo de dispositivos mecânicos e eletrônicos, e mais recentemente, tem tido crescente uso
em campos como a ecologia, economia e neurociência (veja por exemplo, [5, 22, 23, 24]).
Seu crescente uso foi também acompanhado pelo interesse em sua matemática genérica
e em suas propriedades dinâmicas, a qual tem sido o objeto de inúmeros livros (por exemplo
[16, 17, 18]). Um dos maiores desa�os tem sido estabelecer de forma consistente de�nições
e convenções.
Numerosas questões fundamentais surgem quando lidamos com sistemas dinâmicos des-
contínuos. A mais básica dessas questões é a noção de solução.
1
Consideremos por exemplo um sistema dinâmico da forma
x(t) = X(x(t)), x(t0) = x0, (2)
onde x ∈ Rn.
Nos referimos a uma solução continuamente diferenciável t 7→ x(t) de (2), isto é, uma
curva continuamente diferenciável cuja derivada segue a direção do campo vetorial, como
solução clássica.
Para um campo vetorial descontínuo, no entanto, a existência ou unicidade de uma
solução clássica passando por um ponto p ∈M , não é garantida.
Caratheodory generalizou a de�nição de soluções clássicas. Grosseiramente falando,
soluções de Caratheodory são curvas absolutamente contínuas que satisfazem
x(t) = x(t0) +
t∫t0
X(x(s))ds, t > t0, (3)
onde a integral é a integral de Lebesgue.
Soluções de Caratheodory enfraquece a exigência clássica de que a solução deve seguir a
direção do campo vetorial para todo tempo, isto é, a equação diferencial (2) não precisa ser
satisfeita em um conjunto de medida nula (para maiores detalhes, veja [2]).
Filippov [2], trocou a equação diferencial (2) por uma inclusão diferencial da forma
x(t) ∈ F(x(t)), (4)
onde F : Rn → B(Rn) e B(Rn) denota a coleção de certos subconjuntos de Rn. Em um
determinado estado x, em vez de focar no valor do campo vetorial em x, a idéia de soluções
de Filippov é introduzir um conjunto de direções que são determinadas pelos valores do
campo vetorial X numa vizinhança de x.
Soluções de Caratheodory são empregadas para campos vetoriais que dependem descon-
tinuamente do tempo, tais como sistemas dinâmicos envolvendo impulsos. Como aqui tra-
balharemos com sistemas autônomos, usaremos a formalização de Filippov [2].
2
Objetivos
A teoria de singularidades em sistemas suaves por partes tem mostrado ser uma rica fonte
de novas dinâmicas, particularmente próximo a pontos onde o campo vetorial é tangente à
superfície de descontinuidade, os chamados pontos de �dobras�.
Aqui, discutimos um problema particular da teoria da dinâmica não-suave, pontos onde
um campo vetorial é tangente a ambos os lados de uma superfície de descontinuidade em
sistemas tri-dimensionais. Esse problema dobra-dobra foi bem de�nido em [2]. Em [9], Teix-
eira exibiu um tipo especial de dobra-dobra, que mais tarde seria chamada de singularidade
Teixeira. Nesse trabalho, foi estudado algumas propriedades relacionadas à estabilidade
estrutural dessa singularidade.
Em [5], a dinâmica próximo a singularidade dobra-dobra foi estudada considerando uma
aproximação linear dos campos vetoriais acima e abaixo da variedade de descontinuidade.
Nesse trabalho, é mostrado que a dinâmica local depende principalmente de um parâmetro
que controla uma bifurcação, e dependendo desse valor é possível determinar se cada órbita
cruza a variedade de descontinuidade um número �nito ou in�nito de vezes.
Um resultado mais forte foi provado recentemente em [26]. De fato, nesse trabalho foi
demonstrado que sobre certas condições é possível determinar o número de vezes que a órbita
cruza a variedade de descontinuidade antes de entrar para a região de deslize (veja seção
(1.2.1) para a de�nição de região de deslize).
Aqui, analisamos a dinâmica próximo a singularidade Teixeira, considerando o sistema
truncado para terceira ordem. Tomamos como referência básica o artigo [1]. Estudamos a
dinâmica diretamente, revelando o comportamento explícito que deve ser re�etido nas teorias
gerais sobre estabilidade estrutural.
Estrutura dos Tópicos Apresentados
Esse trabalho está dividido da seguinte maneira:
• No Capítulo 1, de�nimos alguns dos conceitos que serão utéis no decorrer do texto.
Apresentaremos também alguns resultados sobre estabilidade estrutural de campos
vetorias de�nidos em variedades com bordo e de campos vetoriais suaves por partes.
3
• No Capítulo 2, nós de�nimos a singularidade dobra-dobra de campos vetoriais des-
contínuos tridimensionais e seus quatro tipos. Nós discutimos a primeira delas, a
dobra-dobra invisível, ou singularidade Teixeira, em detalhes na seção (2.2); Nós anali-
samos as dinâmicas deslizante e costurante separadamente nas seções (2.2.2)-(2.2.3) e
então reconstruimos o sistema completo na seção(2.2.4). Discutimos, mais brevemente,
os outros tipos de dobra-dobra nas seções (2.3)-(2.4) e comentamos sobre suas bifur-
cações na seção (2.5). Na seção (2.2.5), comentamos sobre a propriedade caótica de
uma classe de sistemas. Na seção (2.6), simulamos numericamente, algumas dinâmicas
particularmente interessantes preditas na seção (2.2).
• No Capítulo 3, apresentamos dois modelos de circuitos elétricos como exemplos de
sistemas físicos que possuem genericamente uma singularidade dobra-dobra.
4
CAPÍTULO 1
PRELIMINARES
Neste capítulo vamos introduzir alguns conceitos básicos e de�nições os quais nos serão
úteis no decorrer do texto.
Apresentamos alguns conceitos relacionados a estabilidade estrutural de campos vetori-
ais de�nidos em variedades com bordo. Posteriormente introduzimos algumas de�nições e
convenções para campos vetoriais descontínuos, bem como apresentamos alguns resultados
sobre estabilidade estrutural de tais campos.
1.1 Campos Vetoriais de�nidos em variedades com
bordo
Consideremos N uma variedade compacta C∞ orientável de dimensão três com fronteira
∂N = M e p ∈M .
De�nição 1.1.1. Dados X e Y campos de�nidos numa vizinhança Q de p em N , de�na a
seguinte relação de equivalência:
X ∼ Y ⇐⇒ existe vizinhança U de p (U ⊂ Q) talque X|U = Y |U .As classes dessa relação de equivalência são chamadas germes em p de campos de ve-
tores.
5
Denotemos por χr o conjunto de todos os germes em p de campos vetoriais de classe Cr
sobre (R3, p) dotados com a topologia Cr, com r su�cientemente grande.
Por simplicidade vamos considerar N mergulhada em uma variedade tridimensional N
sem fronteira.
Um campo de vetores X em N é por de�nição um representante da classe de campos de
vetores tangentes aN , de�nidos em N . Ele é dito ser de classe Cr se ele tem um representante
X de classe Cr sobre N .
Seja φ o �uxo de um representante X de X. φ é de�nido sobre um conjunto
D(X) = {(x, t) ∈ N × R : t ∈ I(x)}, onde I(x) é um intervalo aberto com extremos α(x) e
β(x). O �uxo φ de X é de�nido por φ(x, t) = φ(x, t) para x ∈ N e t ∈ I(x), onde I(x) é o
intervalo maximal contendo t = 0 (φX(x, 0) = x) para o qual φ(t, x) ∈ N . Nós denotamos
por α(x) ( resp. β(x)) o extremo inferior (resp. superior ) desse intervalo. Esses extremos
podem ser in�nito. O �uxo φ e seu domínio D(X) não dependem da particular escolha do
representante X de X.
A órbita γ(x) de X passando por x ∈ N é por de�nição a imagem de I(X) pela curva
integral φX(., x) : t 7→ φX(t, x). Órbitas são orientadas pela orientação induzida por essa
aplicação via orientação positiva de I(x).
De�nição 1.1.2. Dois campos de vetores X, Y em N são ditos topologicamente equi-
valentes se existe um homeomor�smo ξ : N → N levando órbitas de X em órbitas de Y ,
preservando a orientação, isto é, dados p ∈ N e δ > 0, existe ε > 0 tal que se 0 < t < δ
então ξ(φX(t, p) = φY (t′, ξ(p)) para algum 0 < t
′< ε.
De�nição 1.1.3. Dizemos que X ∈ χr é estruturalmente estável em χr se existe uma
vizinhança B ⊂ χr de X tal que para todo Y ∈ B é equivalente a X.
Seja p ∈ M e considere Σ0 = Σ0(p) o conjunto de todos os campos vetoriais estrutural-
mente estáveis em χr.
Por simplicidade, assumiremos que existe uma função C∞, h : (R3, p) → (R, 0), tendo 0
como um valor regular, de forma que M é dada implicitamente pela imagem inversa de h
(ou seja, h−1(0) = M).
De�nição 1.1.4. Dizemos que p ∈ M é um ponto M-singular (resp. M-regular) de X se
LXh(p) = 0 (resp. LXh(p) 6= 0).
6
Denotaremos por SX o conjunto singular de X.
De�nição 1.1.5. Dizemos que p ∈ M é um ponto dobra (resp. cúspide) de X se LXh(p) = 0
e L2Xh(p) 6= 0 (resp. LXh(p) = L2
Xh(p) = 0, L3Xh(p) 6= 0 e {dh(p), d(LXh)(p), d(L2
Xh)(p)} élinearmente independente).
Observação 1.1.6. O símbolo LXh denota a derivada de Lie ao longo do �uxo de um campo
X, dada por LXh =< X,5h >.
Em [10] Sotomayor e Teixeira estudaram o conjunto de bifurcação que ocorre em M .
Neste trabalho está caracterizado o conjunto de campos em χr que é estruturalmente estável
em χr.
Teorema 1.1.1. Um campo X ∈ χr é estruturalmente estável se e somente se
1. X(p) 6= 0, para todo p ∈M ;
2. Para toda de�nição local de h em p, uma das seguintes condições é satisfeita:
(a) Caso regular : (LXh)(p) 6= 0;
(b) Caso dobra : (LXh)(p) = 0 e (L2Xh)(p) 6= 0
(c) Caso Cúspide: (LXh)(p) = 0 = (L2Xh)(p), (L3
Xh)(p) 6= 0 e o conjunto de vetores
{dh(p), d(LXh)(p), d(L2Xh)(p)} é linearmente independente;
Além disso, �xando h(x0, x1, x2) = x2, as formas normais dos campos de vetores em Σ0 são
dadas por:
1. Caso regular: X(x0, x1, x2) = (0, 0, 1);
2. Caso dobra: X(x0, x1, x2) = (1, 0, x0);
3. Caso cúspide: X(x0, x1, x2) = (1, 0, x20 + x1)
e Σ0 é denso em χr.
Considere χr1 = χr −Σ0 (r ≥ 3) o conjunto bifurcação de χr e Σ1 o conjunto dos campos
de vetores estruturalmente estáveis em χr1.
Observe que, χr1 = A ∪ B , onde, X ∈ A (respectivamente Y ∈ B) se X(p) = 0
(respectivamente X(p) 6= 0).
7
De�nição 1.1.7. UmM-ponto crítico hiperbólico de X é um ponto crítico hiperbólico p ∈Mde X tal que:
1. os autovalores de DX(p) são dois a dois distintos e os autovalores correspondentes são
transversais à M em p;
2. cada par de autovalores complexos não conjugados de DX(p) têm parte real distinta.
Denote por Σ1(a) a coleção de campos vetoriais X em A tal que p é um M -ponto crítico
hiperbólico de X.
De�nição 1.1.8. Chame Σ1(b) o conjunto de campos vetoriais X em B tal que X(p) 6= 0,
(LXh)(p) = 0, (L2Xh)(p) = 0 e uma das seguintes condições é verdadeira:
1. (L3Xh)(p) 6= 0, rank { Dh(p), D(LXh)(p), D(L2
Xh)(p) } = 2 e a função (LXh)|M tem
um ponto crítico não-degenerado em p;
2. (L3Xh)(p) = 0, (L4
Xh)(p) 6= 0 e p é um ponto regular de (LXh)|M
O seguinte resultado está provado em [10].
Teorema 1.1.2. As seguintes a�rmações são verdadeiras:
1. Σ1 = Σ1(a) ∪ Σ1(b);
2. Σ1 é uma subvariedade de codimensão 1 de χr;
3. Σ1 é aberto e denso em χr1 na topologia induzida de χr;
4. Para um conjunto residual de curvas suaves γ : R → χr, γ intercepta Σ1 transver-
salmente e γ−1(χr2) = ∅ onde χr2 = χr1 − Σ1.
Observação 1.1.9. Ressaltamos aqui que todos os resultados e de�nições não dependem
da particular escolha da função h.
8
1.2 Campos Vetoriais Descontínuos
Nessa seção introduziremos algumas de�nições e resultados acerca de sistemas descon-
tínuos. Nós vamos considerar equações diferenciais cujos termos do lado direito são funções
descontínuas. Vamos supor que tais descontinuidades são de primeira espécie e que elas estão
concentradas sobre uma superfície C∞, bi-dimensional M , contida em R3.
Seja p ∈ M e h : (R3,M) −→ (R, 0) uma representação C∞ local implícita de M em
p com dh(p) 6= 0. A superfície M representa a fronteira comum separando os domínios
M+ = {h > 0} e M− = {h < 0}. Nós podemos assim, via h, dar uma orientação para toda
curva em (R3, p) cruzando M .
Consideremos Gr o conjunto de todos os germes em p de campos vetoriais de classe Cr,
Z, sobre R3 satisfazendo:
Z(x) =
{X(x) se x ∈M+
Y (x) se x ∈M−(1.1)
onde X, Y ∈ χr.
Podemos considerar Gr = χr × χr e dotarmos esse conjunto com a topologia produto.
Assim nós denotamos todo elemento em Gr por Z = (X, Y ).
1.2.1 Convenção de Filippov
Dado Z = (X, Y ) em Gr , Filippov (em [2] ) descreveu três formas básicas de dinâmica
que ocorrem em M , dependendo da orientação do campo vetorial em ambos os lados da
superfície M . São elas:
1. Região de Costura (RC): Caracterizado por (LXh)(LY h) > 0. Nesse caso, a
componente do campo vetorial normal a M tem a mesma direção sobre ambos os
lados. Se um ponto está numa órbita de Z sobre M então ele cruza M para a outra
parte do espaço (Figura 1.2a).
2. Região de Escape (RE): Caracterizado por LXh > 0 e LY h < 0. A solução através
de um ponto p ∈ M segue a órbita do campo que tem a maior componente normal
com respeito a M (Figura 1.2c).
9
Observação 1.2.1. Observe que nesse caso o campo Z = (X, Y ) pode estar inde�nido
em alguns pontos de M . Assim, se em q ∈ M as componentes normal de X e Y
coincidem, convencionamos que Z(q) = X(q).
3. Região de Deslize (RD): Caracterizado por LXh < 0 e LY h > 0. Nesta região
de�nimos um campo vetorial fd = fd(X, Y ) (chamado campo vetorial deslizante asso-
ciado a Z = (X, Y )) de�nido da seguinte maneira: Se p ∈ RD, então fd(p) denota o
vetor no cone gerado por X(p) e Y (p) tangente a M (ou ainda, fd(p) = m−p, onde mé o ponto onde o segmento ligando p+X(p) e p+ Y (p) é tangente a M). Observe que
se X(p) e Y (p) são linearmente dependentes então p é um ponto crítico de fd (Figuras
1.1 e 1.2b).
p+ Y (p)
p+X(p)
fd(p)m
p
X
Y
Figura 1.1: O campo vetorial deslizante
Observação 1.2.2. Na região de escape de�nimos outro campo vetorial f e por
f e(p) = (−fd(−X,−Y ))(p). Usaremos a mesma notação f s(Z) para indicar fd e f e.
Observação 1.2.3. Se �xarmos um sistema de coordenadas local (x0, x1, x2) ∈ R3 em uma
vizinhança de p ∈ RD talque a aplicação h : (R3, p)→ (R, 0) é dada por h(x0, x1, x2) = x0,
então, a expressão do campo deslizante é dada por:
f s = (Y 0 −X0)−1(0, X1Y 0 −X0Y 1, Y 0X2 −X0Y 2), (1.2)
onde X = (X0, X1, X2) e Y = (Y 0, Y 1, Y 2).
O campo deslizante é topologicamente equivalente ao campo f s = (0, X1Y 0−X0Y 1, Y 0X2−X0Y 2), restrito a região de deslize. Assim, obtemos uma expressão mais simpli�cada a qual
10
f−
f+Regiao de Costura
(a)
fs
f−
f+ Regiao de Escape
(b)
f−
f+Regiao de Deslize
fs
(c)
Figura 1.2: Dinâmica na variedade de descontinuidade em um sistema tri-dimensional suave
por partes. Uma órbita que encontra a variedade pode: (a) atravessá-la, ou (b) escapar dela
em tempo �nito, embora possa deslizar sobre a variedade por algum tempo antes de escapar,
ou (c) alcançá-la em tempo �nito e então seguir o campo vetorial deslizante f s
.
possui a mesma dinâmica do campo deslizante e que pode ser Cr estendida a uma vizinhança
da origem em M .
Assim, a solução de (1.1) na variedade de descontinuidade incluem todas as soluções da
inclusão diferencial
x ∈ f := Y + λ(X − Y ), (1.3)
onde λ = 0 quando h(x) < 0, λ = 1 quando h(X) > 0, e λ ∈ [0, 1] quando h(x) = 0.
A dinâmica em um sistema suave por partes é então uma composição das dinâmicas de
X, Y , e f s. Faremos as seguintes distinções.
De�nição 1.2.4. (De�nição de órbitas e �uxo)
1. Um segmento de órbita orientado é todo caminho suave x = x(t) satisfazendo (1.3),
inteiramente contido em uma das regiões {x : h(x) > 0}, {x : h(x) < 0}, ou {x :
h(x) = 0}.
2. Uma órbita orientada é todo caminho suave por partes x(t) que satisfaz (1.3), formada
pela concatenação de segmentos de órbitas.
3. O �uxo de (1.3) através de um ponto x em um tempo t é dado por todos os pontos
x(t+ τ) com x(τ) = x para algum τ ∈ R, x(t) satisfazendo (1.3).
11
Uma importante consequência dessa de�nição é que o �uxo através de um ponto x na
região de deslize não é único, pois x sempre pertence a uma família a um parâmetro de
órbitas (exceto se x for um ponto de equilíbrio). Da mesma forma, para pontos na região de
escape. (Veja, por exemplo, as �guras (1.2b) e (1.2c)).
1.2.2 Singularidades de Z
Na seção (1.1) de�nimos os conceitos de M-singularidades e singularidades do tipo
dobra e cúspide. A seguir introduziremos o conceito de singularidade genérica para cam-
pos vetoriais descontínuos tri-dimensionais, que será utilizada no decorrer do texto. Antes
observamos que se p é um ponto crítico de f s, então p é chamado de pseudo singularidade
de Z.
Dizemos que p ∈ M é uma singularidade genérica de Z = (X, Y ) ∈ Gr se satisfaz
uma das seguintes condições:
1. p pertence a região deslizante e é uma pseudo singularidade hiperbólica de Z;
2. p é um ponto de dobra ou cúspide de X (respectivamente Y ) e ponto regular de Y
(respectivamente X).
3. p é um ponto M -singular de ambos os campos vetoriais X e Y satisfazendo:
(a) p é um ponto dobra de X e Y e
(b) SX é transversal a SY em p.
Devemos dizer mais sobre a última situação. É fácil checar que as curvas SX , SY deter-
minam 4 quadrantes: Q1 (RD), Q2 (RE), Q3 (RC, com a órbita de Z apontando para M+)
e Q4 (RC, com a órbita de Z apontando para M−). Além disso, é provado nesse caso que
o campo vetorial deslizante pode ser C1- extendido para uma vizinhança completa de p em
M e que p é um ponto crítico desse campo vetorial.
Devemos adicionar a seguinte hipótese extra nessa situação:
�O ponto p é um ponto crítico hiperbólico de f s e seus respectivos autoespaços são
transversais a SX e SY em p.�
12
X
Y
(a) Tipo 1
X
Y
(b) Tipo 2
X
Y
(c) Tipo 2
SX
SY
Q1
Q2
Q3
Q4
(d) Tipo 3
Figura 1.3: Exemplos de campos descontínuos que possuem a origem como uma singularidade
genérica
Na �gura (1.3) temos representado em:
(a) a dinâmica de um campo descontínuo onde a origem é um ponto crítico hiperbólico
para o campo deslizante f s (singularidade genérica do tipo 1);
(b) um campo descontínuo do tipo dobra-regular (singularidade genérica do tipo 2);
(c) um campo descontínuo do tipo cúspide-regular (singularidade genérica do tipo 2);
(d) um campo descontínuo do tipo dobra-dobra (singularidade genérica do tipo 3).
1.2.3 Estrati�cação de M
Seja p ∈ M uma singularidade genérica de Z = (X, Y ) ∈ Gr. Nessa seção iremos listar
algumas subvariedades de M que são distinguidas devido a sua persistência por pequenas
perturbações de Z. Além disso, toda equivalência entre Z e �Z deve necessariamente preservar
as correspondentes tais subvariedades.
Nós separamos os casos:
1. Se p é do tipo 1, distinguimos {p} e as separatrizes de sela de f s.
2. Se p é do tipo 2, ou seja, p é uma singularidade de Z do tipo tangencial e as componentes
conexas C(p) do conjunto de todas as singularidades genéricas de Z é uma curva regular
(isto é, C(p) é ou SX ou SY ), listamos somente C(p).
3. Se p é do tipo 3, listamos {p}, SX − {p}, e SY − {p}. Nós adicionamos nessa lista as
separatrizes de sela de f s se elas estão contidas em RD. Se os autovalores de df sp são
13
reais e tem o mesmo sinal então devemos distinguir a variedade invariante forte de df spse ela está contida em RD.
Em [4] é mostrado que os conjuntos acima são invariantes por equivalência entre campos
vetoriais em Gr.
1.2.4 Estabilidade estrutural
De�nição 1.2.5. Sejam Z, Z ∈ Gr. Nós dizemos que Z em p é C0 equivalente a Z em �p
se existem vizinhanças abertas V de p e V de p em R3 e um homeomor�smo M-invariante
f : V −→ V talque f(p) = p e f envia órbitas de Z em órbitas de Z.
De�nição 1.2.6. Dizemos que Z ∈ Gr é M-estruturalmente estável, ou simplesmente
estruturalmente estável, em p, se existe uma vizinhança U de Z em Gr tal que todo
Z ∈ U é C0 equivalente a Z em p.
De�nição 1.2.7. Consideremos os conjuntos
G0(a) = { Z = (X, Y ); X, Y são regulares em p ∈M} (caso regular-regular);
G0(b) = { Z = (X, Y ); X é dobra e Y é regular em p ∈M(ou vice-versa)} (caso dobra-
regular);
G0(c) = { Z = (X, Y ); X é cúspide e Y é regular em p ∈ M (ou vice-versa)} (caso
cúspide-regular);
G0(d) = { Z = (X, Y ); X, Y são dobras em p ∈M e p é uma singularidade genérica de
Z} (caso dobra-dobra); Nesse caso distinguimos os subconjuntos:
- Caso elíptico: G0(d.1) = {Z∈ G0(d); (L2Xh)(p) < 0 e (L2
Y h)(p) > 0};- Caso parabólico: G0(d.2) = {Z∈ G0(d); (L2
Xh)(p) > 0 e (L2Y h)(p) > 0 ou (L2
Xh)(p) <
0 e (L2Y h)(p) < 0};
- Caso hiperbólico: G0(d.1) = {Z∈ G0(d); (L2Xh)(p) > 0 e (L2
Y h)(p) < 0};
Seja, G0 = G0(a) ∪ G0(b) ∪ G0(c) ∪ G0(d). Segue do teorema (1.1.1) e das condições de
transversalidade que G0 ⊂ Gr é um subconjunto aberto e denso de Gr, relativo a topologia
de Gr.
14
No próximo capítulo, estudaremos o conjunto G0(d), com ênfase em G0(d.1), conhecida
como singularidade Teixeira. Veremos que a dinâmica local depende principalmente de um
único parâmetro que controla uma bifurcação e que no caso G0(d.1) o sistema pode admitir
um �uxo exibindo dinâmica caótica, mas não determinística.
15
CAPÍTULO 2
A SINGULARIDADE DOBRA-DOBRA
Nesse capítulo, estudamos campos vetoriais descontínuos que possuem uma singularidade
dobra-dobra em p ∈ M , ou seja, em p o campo vetorial é tangente a ambos os lados da
superfície de descontinuidade.
Estudamos a dinâmica em torno da singularidade caracterizando seu comportamento
local. Como antecipamos na introdução, estudaremos a dinâmica diretamente, abordando
os aspectos qualitativos do espaço de fase.
A�m de facilitarmos a notação, passaremos a denotar os campos X e Y por f+ e f−
respectivamente.
2.1 O problema dobra-dobra
Seja Z representado por um sistema tri-dimensional suave por partes de equações difer-
enciais ordinárias
x =
{f+(x) quando h(x) > 0,
f−(x) quando h(x) < 0,(2.1)
onde x ∈ R3 é o vetor de estado x = (x0, x1, x2) , h(x) é uma função regular escalar talque
M = {x ∈ R3;h(x) = 0} (ver seção [1.2]) e f+, f− são campos vetoriais suaves.
16
De�nição 2.1.1. Um ponto p ∈ M é uma singularidade do tipo dobra-dobra de Z ∈ Gr se
Lf+h(p) = Lf−h(p) = 0 e L2f+h(p) 6= 0,L2
f−h(p) 6= 0, (2.2)
ou seja, se p é uma dobra para ambos os campos f+ e f−.
O sinal da segunda derivada de Lie (L2f+h) determina se uma dobra é:
• visível, se L2f+h(p) > 0 ou L2
f−h(p) < 0 (signi�cando que o campo vetorial se curva
afastando da singularidade , veja �gura (2.1));
• invisível, se L2f+h(p) < 0 ou L2
f−h(p) > 0 (signi�cando que o campo vetorial se curva
em direção a superfície de descontinuidade, veja �gura (2.2)).
M
f+
(a) Dobra visível
para o campo f+
M
f−
(b) Dobra visível
para o campo f−
Figura 2.1: Singularidade dobra visível
M
f+
(a) Dobra invisível
para o campo f+
M
f−
(b) Dobra invisível
para o campo f−
Figura 2.2: Singularidade dobra invisível
Assim, existem 4 tipos possíveis de singularidade dobra-dobra, dependendo do sinal de
(L2f+h) e de (L2
f−h). Esses 4 tipos são mostrados na �gura (2.3).
Por simplicidade colocaremos h(x) = x0, pois todo sistema suave por partes, em uma
região onde h(x) = 0 de�ne uma variedade M , por uma mudança de variável apropriada
tem essa forma. Então, M = h−1(0) = {(x0, x1, x2) ∈ R3;x0 = 0}.
Assim, o sistema (2.1) �ca
x =
{f+(x) quando x0 > 0,
f−(x) quando x0 < 0,(2.3)
Seguindo a de�nição de Filippov [2], (2.3) admite uma solução que mora na variedade M
e satisfaz o sistema dado por:
17
f+
f−
(a)
f+
f−
(b)
f+
f−
(c)
f+
f−
(d)
Figura 2.3: Tipos de singularidade dobra-dobra: (a) dobra-dobra invisível-invisível, quando
(L2f+h) < 0 e (L2
f−h) > 0, (b)dobra-dobra invisível-visível, quando (L2f+h) < 0 e (L2
f−h) < 0,
(c) dobra-dobra visível-invisível, quando (L2f+h) > 0 e (L2
f−h) > 0 e (d) dobra-dobra visível-
visível, quando (L2f+h) > 0 e (L2
f−h) < 0.
x = f s(x) quando x0 = 0 (2.4)
onde o campo vetorial deslizante, f s, é de�nido por:
f s = f− +Lf−h
Lf−h− Lf+h(f+ − f−), (2.5)
No que segue, assumiremos que:
• ambos o campos f+ e f− tenham contato quadrático com a variedade na origem, isto
é,
Lf+h(0) = Lf−h(0) = 0 e L2f+h(0) 6= 0 , L2
f−h(0) 6= 0 (2.6)
• f+ e f− não tem equilíbrios próximos da origem, isto é,
f+(0) 6= 0 e f−(0) 6= 0 (2.7)
• e que o par de curvas dado por Lf+h = 0 e Lf−h = 0 sobre h = 0 se intersecta
transversalmente na origem, isto é,
det(dh(0), dLf+h(0), dLf−h(0)) 6= 0. (2.8)
18
Ou seja, estamos assumindo que p = 0 é uma singularidade genérica (dobra-dobra) do
campo Z = (f+, f−).
Observação 2.1.2. Podemos escolher coordenadas (x0, x1, x2) em R3 de forma que
S+ = {x ∈M ;x1 = 0} e S− = {x ∈M ;x2 = 0} (2.9)
sejam os conjuntos M -singulares de f+ e f−, respectivamente. Nas próximas seções, �xare-
mos este sistema de coordenadas.
2.2 Singularidade Teixeira
Nessa seção vamos estudar a dinâmica do sistema (2.3) quando L2f+h(0) < 0 e L2
f−h(0) >
0, ou seja, quando a origem é uma dobra-dobra invisível-invisível, conhecida como singula-
ridade Teixeira (veja �gura (2.4)).
RC2
RC1
RE
RD
f−
f+
x0x2
x1
RC1
Figura 2.4: Dinâmica próximo a uma singularidade Teixeira. Órbitas fora da variedade de
descontinuidade se curvam ao longo das dobras e cruzam a variedade em RC1 e RC2.
2.2.1 Aproximação Local
Para determinar o itinerário e destino das órbitas na vizinhança da singularidade, obte-
mos uma aproximação local para os campos vetoriais.
Como tangências cúbicas locais em M estão proibidas (pelas condições L2f+h(0) < 0
e L2f−h(0) > 0) e estamos assumindo que não existe equilíbrio local (ou seja, f+(0) 6=
19
0 , f−(0) 6= 0 ) numa vizinhança su�cientemente pequena da singularidade, a projeção
dos campos vetoriais sobre a superfície M é aproximadamente constante. Isto é, por uma
expansão de Taylor linear na direção x0 e de ordem 0 nas direções x1 e x2, podemos expressar
o campo vetorial próximo da origem como:
f+ =
−x1 +O(x0, ||x1, x2||2)
1 +O(||x||)V + +O(||x||)
, (2.10a)
f− =
x2 +O(x0, ||x1, x2||2)V − +O(||x||)1 +O(||x||)
, (2.10b)
onde V ± são constantes reais.
Para mais detalhes sobre essa troca de coordenadas veja Apêndice A.
Geometricamente, V +(respectivamente V −), mede a cotangente do ângulo θ+ (respecti-
vamente θ−) entre o campo vetorial f+ (respectivamente f−) e sua linha dobra Lf+h|x0=0
(Lf−h|x0=0). Estes, podem ser recuperados para um campo vetorial geral em uma singulari-
dade Teixeira de
V + = cot θ+ =Lf+Lf−h√−(L2
f+h)(L2f−h)
, (2.11a)
V − = cot θ− =−Lf−Lf+h√−(L2
f+h)(L2f−h)
, (2.11b)
avaliado em pontos do conjunto singular.
A dinâmica de (2.10) é ilustrada na �gura (2.4). O �uxo de f+ aplica pontos da região
{x0 = 0, x1 < 0} para a região {x0 = 0, x1 > 0}, afetando uma re�exão φ+ no plano x1 = 0
ao longo da direção (0, 1, V +) + O(||x||). Do mesmo modo, o �uxo de f− aplica pontos da
região {x0 = 0, x2 < 0} para a região {x0 = 0, x2 > 0}, afetando uma re�exão φ− no plano
x2 = 0 ao longo da direção (0, V −, 1) +O(||x||).
20
Como visto na seção (1.2.2), a variedade de descontinuidade é dividida em quadrantes
consistindo de região de deslize {x0 = 0, x1 > 0, x2 > 0} (RD), região de escape
{x0 = 0, x1 < 0, x2 < 0} (RE) e regiões de costura {x0 = 0, x1 > 0 e x2 < 0} (RC1) e
{x0 = 0, x1 < 0 e x2 > 0} (RC2), separadas pela dobra.
Nas regiões de costura, CR1,2, a dinâmica pode ser analisada por uma aplicação �segundo
retorno�, a composição dos mapas re�exão φ+ e φ− (veja �gura (2.5) ). A sequência de
costuras será �nita se esta aplicar para a região de deslize RD (ou seja, para a região onde
f+ e f− apontam na direção da variedade de descontinuidade). Além disso, essa aplicação
tem pontos iniciais na região de escape RE (ou seja, na região onde ambos os campos vetoriais
apontam para fora da variedade).
RC2
RC1
RE
RD
x0x2
x1
RC1
f−f+
p
φ−(p)
φ+(φ−(p))
Figura 2.5: A aplicação φ+ ◦ φ−. Um ponto p ∈ RC1 é aplicado para RC2 pelo �uxo do
campo f− e então pode voltar a RC1 pelo �uxo do campo f+
Através das regiões de costura o �uxo é contínuo e inversível. Na região de deslize uma
órbita é de�nida unicamente no futuro, mas existirá um número in�nito de órbitas chegando
de M+ e M− no passado. Na região de escape o �uxo é de�nido unicamente no passado,
mas no futuro não o é, gerando uma in�nidade de órbitas que escapam para M+ e M−.
Vamos estudar as órbitas sobre a singularidade em termos de dois sistemas dinâmicos
sobre a variedade de descontinuidade:
1. um sistema dinâmico de tempo contínuo nas regiões de escape e de deslize (x = f s(x)),
cujas soluções são órbitas deslizantes que moram na variedade de descontinuidade, e
2. um sistema dinâmico de tempo discreto (x 7→ φ+ ◦ φ−(x)), cujas soluções são ór-
bitas costurantes, que envolvem a singularidade induzindo um mapa retorno sobre a
variedade de descontinuidade.
21
Nas duas próximas seções [2.2.2 - 2.2.3], analisamos essas dinâmicas separadamente e
então remontamos a dinâmica tridimensional na seção [2.2.4]. Na seção [2.6] apresentamos
algumas simulações numéricas feitas no software Matlab.
2.2.2 Dinâmica nas Regiões de deslize e de escape
Avaliando (2.10) em x0 = 0 e substituindo em (2.5) o campo vetorial deslizante é:
f s =
0
V −x1+x2+O(||x1,x2||2)d(x)
x1+V +x2+O(||x1,x2||2)d(x)
(2.12)
onde d(x) = x1 + x2 +O(||x1, x2||2).
Esse campo vetorial é inde�nido na origem, pois como f+ e f− são ambos tangentes a
variedade em 0, todos os vetores nas suas combinações convexas são tangentes a variedade
M .
Assim, para que possamos estudar o campo vetorial deslizante numa vizinhança da
origem, de�nimos um campo vetorial planar regularizado f s, multiplicando f s por d(x)
e omitindo a componente trivial x0,
f s =
(V − 1
1 V +
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2) (2.13)
Observe que d(x) > 0 para x ∈ RD e d(x) < 0 para x ∈ RE, assim, f s e f s tem o mesmo
retrato de fase na região de deslize (RD) e o mesmo retrato de fase com tempo invertido
na região de escape (RE). Além disso, como d(0) = 0 , temos que f s tem um equilíbrio na
origem, onde f s não é bem de�nido.
Dessa forma, além do tempo invertido na região de escape (observado acima), a outra
diferença entre o campo vetorial deslizante e o campo vetorial deslizante regularizado é que
enquanto as órbitas de f s que chegam a singularidade, a alcançam em tempo in�nito, as
mesmas órbitas para f s alcançarão a singularidade em tempo �nito. É importante ter isso
em mente para traduzirmos as dinâmicas de f s para o campo vetorial original f s.
22
Na origem, f s tem autovalores
µ± =1
2(V + + V − ±
√(V + − V −)2 + 4) (2.14)
e os autovetores associados são:
(µ± − V +
1
)(2.15)
Se o autovalor µ± tem parte real negativa (positiva), nós dizemos que ele, e seu autovalor
associado são estáveis (instáveis).
Observe que os dois autovalores são reais, pois ((V + − V −)2 + 4) ≥ 0.
Chame k± = µ±−V +, então k± representa a tangente do ângulo que o autovetor associado
ao autovalor µ± faz com o eixo x2.
Observe que k+k− = (µ+−V +)(µ−−V +) = −1, assim os autovetores são ortogonais, ou
seja, um autovetor está sempre nas regiões de deslize e de escape, e o outro está sempre nas
regiões de costura. Os autovetores nunca podem ser tangentes a uma das dobras, pois isso
corresponderá a uma tangência cúbica de f+ ou f− na origem (chamado um ponto cúspide),
excluído por (2.6).
Em particular, temos que k− < 0 < k+ e
1. se V +, V − > 0 e V +V − > 1, temos que 0 < µ− < µ+.
2. se V +V − < 1, temos que µ− < 0 < µ+;
3. se V +, V − < 0 e V +V − > 1, temos que µ− < µ+ < 0 ;
Ou seja, o autovetor associado com o autovalor µ+ está sempre em RD, e
1. se V +, V − > 0 e V +V − > 1, ambos os autovetores são instáveis.
2. se V +V − < 1, o autovetor de RD \ RE é instável e o outro é estável;
23
3. se V +, V − < 0 e V +V − > 1, ambos os autovetores são estáveis;
Logo, quando o autovetor em RD \ RE é estável, ele é associado com o autovalor estável
fraco, assim segmentos de órbitas deslizantes são assintoticamente atraídas para o autovetor
aproximando da singularidade. Os diferentes casos estão ilustrados na �gura (2.6).
RD
RE
(1)
RD
RE
(2)
RD
RE
(3)
Figura 2.6: Diagrama de bifurcação e retratos de fase da dinâmica deslizante.
Referindo as de�nições de órbitas e �uxo na seção [1.2] (de�nição (1.2.4)), os retratos de
fase ilustrados na �gura (2.6), implicam que no caso (3) , órbitas cruzam a singularidade
de RD para RE em tempo �nito, enquanto nos casos (1)-(2) elas cruzam de RE para RD.
Observe que na origem o campo vetorial deslizante f s não é único, quando V +V − > 1,
V +, V − < 0 (Região (3) na �gura (2.6)). Nesse caso, uma família a um parâmetro de órbitas
se intersectam na origem ao longo de uma única direção (um autovetor de f s). Nos outros
casos, somente uma única órbita intersecta a singularidade.
No caso (3), órbitas com condições iniciais longe da descontinuidade pode entrar na
região de deslize e evoluir para a singularidade (Figura 2.7), onde sua evolução futura é
multivaluada. Tais órbitas alcançam a singularidade em tempo �nito, e ao cruzá-la, todas
as informações sobre suas condições iniciais é perdida. Assim, unicidade no futuro é perdida
para órbitas que convergem para a singularidade.
Podemos estudar a estabilidade estrutural de f s considerando f s. E é o que faremos a
seguir.
24
RE
RD
Figura 2.7: Não-determinismo da singularidade Teixeira: Órbitas com condições iniciais
longe da descontinuidade podem entrar para a região de deslize e então seguir a órbita
deslizante aproximando da sigularidade. Dessa forma, a órbita alcança a singularidade em
tempo �nito e entra na região de escape. A partir daí, uma família a um parâmetro de
órbitas partem da região de escape.
A Jacobiana de (2.13) em 0 é singular quando V +V − = 1, e uma rápida inspeção de
(2.10a) e (2.10b), mostra que isso corresponde a f+ e f− serem antiparalelos (se V +, V − < 0)
ou paralelos (se V +, V − > 0) na origem (de fato, f+(0, 0, 0) = V +f−(0, 0, 0) se V +V − = 1).
O autovetor (−V +, 1) associado com µ− = 0, sempre aponta para a região deslizante se
V +, V − < 0, e para uma das regiões de costura se V +, V − > 0. Dessa forma somente o
caso quando V +, V − < 0 resulta em um retrato de fase estruturalmente instável do campo
vetorial deslizante, quando V +V − = 1.
Para V +, V − < 0 e V +V − ≈ 1 o comportamento das órbitas de f s ao redor da origem é
capturada pela dinâmica na variedade central unidimensional com expansão de Taylor
u = (V +V − − 1)u+ a2u2 +O(u3) (2.16)
que exibe uma bifurcação transcritical em V +V − = 1 (detalhes sobre essa forma normal são
dadas no Apêndice B). Observe que, para f s, isso signi�ca que existe um único equilíbrio
que cruza a singularidade quando V +V − = 1, trocando a estabilidade no processo.
Observe que (2.16) tem 2 equilíbrios:
25
u = 0 , (2.17a)
u = −(V +V − − 1)
a2(2.17b)
Mas u = 0 corresponde a origem nas coordenadas (x1, x2) e portanto (2.17a) não é um
pseudoequilíbrio de f s. Dessa forma, analisaremos apenas (2.17b).
Temos que:
1. Se a2 > 0 e
(a) se V +V − − 1 > 0, então (2.17b) é um nó estável para (2.16) e está no semi-eixo
negativo de u.
(b) se V +V − − 1 < 0, então (2.17b) é um nó instável para (2.16) e está no semi-eixo
positivo de u.
2. Se a2 < 0 e
(a) se V +V − − 1 > 0, então (2.17b) é um nó estável para (2.16) e está no semi-eixo
positivo de u.
(b) se V +V − − 1 < 0, então (2.17b) é um nó instável para (2.16) e está no semi-eixo
negativo de u.
Dessa forma, assumindo que o semieixo positivo u está em RD, o pseudoequilíbrio de f s
é:
• (s1) se a2 > 0 em (2.16), uma sela em RE para V +V − > 1 e V +, V − < 0, e um nó
estável em RD quando V +V − < 1 ou V +, V − > 0,
• (s2) se a2 < 0 em (2.16), uma sela em RD para V +V − > 1 e V +, V − < 0, e um nó
instável em RE quando V +V − < 1 ou V +, V − > 0.
Isso é ilustrado na �gura (2.8).
26
2.2.3 Dinâmica nas regiões de costura
Nas regiões costurantes, órbitas de f+ e f− induz aplicações φ+ e φ− da variedade M
nela mesma, através das dobras.
Os campos vetoriais ( 2.10a ) e ( 2.10b ) truncados para primeira ordem são facilmente
integrados obtendo
φ+ : R− × R 7→ R+ × R =
(−1 0
−2V + 1
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2), (2.18)
e
φ− : R× R− 7→ R× R+ =
(1 −2V−0 −1
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2). (2.19)
As aplicações completas φ+ e φ− , cujas expansões de Taylor para a terceira ordem
é reportada no Apêndice C, são então recuperadas como perturbações genéricas desses,
impondo que eles preservem a correspondente linha dobra, e que eles sejam involuções. Essa
última exigência segue, pela teoria de singularidades de aplicações, e do fato das linhas
x1 = 0 e x2 = 0 serem dobras das aplicações φ+ e φ− (veja, por exemplo [19]).
Para entender as dinâmicas das órbitas que enrolam sobre a singularidade, costurando
através de RC1 e RC2, podemos estudar a aplicação de Poincaré de uma região costurante
(RC1 ou RC2) nela mesmo. Essa aplicação é obtida como a composição de φ+ e φ−. Qualquer
ordem para essa composição irá descrever completamente a dinâmica do campo.
Nós consideraremos a aplicação φ = φ+ ◦ φ− (argumentos similares seguem se consider-
armos a composição φ− ◦ φ+).
O domínio de φ é o conjunto D ⊆ RC1 tal que φ−(D) ⊆ RC2. Órbitas com condição
inicial em D cruzam RC2 e retornam para RC1 ou RD. O complemento de D em RC1
consiste de condições iniciais que são aplicadas em RD por φ−. Isso implica que D está
entre o eixo negativo x2 e a pré-imagem do eixo positivo x2 pelo mapa φ−. Como φ− é uma
involução, a pré-imagem é uma curva dada por φ− (x1 = 0, x2 > 0).
A aplicação de Poincaré assim obtida é:
φ :
(x1
x2
)7→(−1 2V−−2V + (−1 + 4V +V −)
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2). (2.20)
27
Essa aplicação tem um ponto �xo na origem, com autovalores
λ± = (2V +V − − 1)± 2√V +V −(V +V − − 1) (2.21)
Os autovalores são reais quando V +V − > 1 ou V +V − < 0 , e complexos caso contrário.
Mais do que isso, temos que:
1. se V +V − > 1 ou V +V − < 0 o ponto �xo é do tipo sela;
2. se 0 < V +V − < 1 o ponto �xo é do tipo elíptico, sendo do tipo centro para a parte
linear, com autovalores conjugados complexos sobre o círculo unitário.
Os autovetores correspondentes são (2V −
1 + λ±
)(2.22)
O seguinte resultado está provado em [5]:
Teorema 2.2.1. Para um sistema dinâmico (2.3) onde os campos vetorias f+, f− estão na
forma (2.10) temos que:
1. Se V +V − > 1 e V +, V − < 0, toda órbita de (2.3) cruza M um número in�nito de
vezes. Existe um par de superfícies invariantes que se interceptam na singularidade.
2. Se V +V − < 1 ou V + > 0 ou V − > 0, toda órbita de (2.3) cruza M um número �nito
de vezes.
Uma bifurcação toma lugar em V +V − = 1 para V +, V − < 0. Além disso,
1. Se V +V − > 1 e V +, V − < 0, uma das superfícies invariantes é assintoticamente atra-
tora, e encerra a região de escape RE dentro do domíno de repulsão da singularidade;
a outra superfície é assintoticamente repulsora e encerra a região deslizante RE dentro
do domínio de atração da singularidade.
2. Se V +V − < 1 ou V + > 0 ou V − > 0, órbitas deslizantes são repelidas da singularidade,
e
28
(a) se V + > 0, toda órbita cruza M no máximo uma vez de M− para M+,
(b) se V − > 0, toda órbita cruza M no máximo uma vez de M+ para M−, e
(c) se 0 < V +V − < 1 e V +, V − < 0, toda órbita cruza M no mínimo uma vez antes
de entrar na região de deslize.
Uma bifurcação da dinâmica costurante ocorre quando V +V − = 1 e V +, V − < 0. Na
bifurcação, o Jacobiano da aplicação de Poincaré na origem é não-diagonalizável, e tem 2
autovalores iguais a 1. Como uma consequência de φ+ e φ− serem involuções, isso corresponde
a uma bifurcação degenerada 1-1 do mapa.
Próximo a bifurcação, a aplicação pode ser reduzida a forma normal
u1 7→u2 7→
u1 + u2 +O(||u||4)4pu1 + (1 + 4p)u2 +B11u1u2 +B30u
31 +B21u
21u2 +B03u
32 +O(||u||4)
(2.23)
com
p = V +V − − 1, (2.24)
através de uma série de trocas de variáveis e parâmetros que são reportadas no apêndice D.
Na bifurcação e na origem, o eixo u1 �ca ao longo do vetor direção (1, 1V −
), o autovetor
singular do Jacobiano de φ, e a direção positiva de u1 aplica para dentro de (RC2), enquanto
o eixo u2 é tangente ao eixo x1 nas coordenadas originais.
A forma normal tem um ponto �xo na origem para todos os valores de p, enquanto mais
dois pontos �xos , localizados em
u1 = ±2
√−pB30
, u2 = 0 (2.25)
surgem quando −pB30
é positivo.
A positividade dos autovalores (2.21) implica que o eixo u1 negativo intersecta RC1, e �ca
dentro do domínio do mapa de Poincaré φ, implicando que o ponto �xo em u1 = −2√−pB30
corresponde a uma órbita periódica costurante próxima a singularidade.
29
Os autovalores desse ponto �xo são
1−B11
√−pB30
±√−pB30
(8B30 +B211) +O(p) (2.26)
Dependendo dos valores de B11 e B30 temos que:
• (c1) Se B30 > 0, os autovalores são reais, 1 positivo e 1 negativo;
• (c2) Se B30 < 0, e |8B30| < B211, ambos os autovalores são reais, e estão dentro do
círculo unitário se B11 > 0, ou fora do círculo, caso contrário;
• (c3) Se B30 < 0 e |8B30| > B211, os autovalores são conjugados complexos, e estão
dentro do círculo unitário se B11 > 0 e fora caso contrário.
As órbitas da aplicação (2.23) são aproximadas para p = 0, pela substituição de um �uxo
tempo-unitário que é equivalente a
v1 =
v2 =
v1 +O(||v||4)B11v1v2 +B30v
31 + (
B211
2+B21 − 3B30)v
21v2 +O(||v||4)
(2.27)
como explicado no apêndice E.
Assim, os casos (c1), (c2), (c3) origina os seguintes cenários de bifurcação da dinâmica
costurante numa vizinhança da origem:
• (c1) Para p > 0 a singularidade é um ponto sela do mapa φ. Para p < 0 um ciclo sela
emerge da singularidade , e a singularidade é um centro do mapa φ.
• (c2)Para p < 0 a singularidade é um ponto �xo do tipo eliptico do mapa φ. Para p > 0
um ciclo nó emerge da singularidade, e a singularidade é uma sela do mapa φ. Em
p = 0 o mapa costurante na singularidade pode exibir um setor elíptico ( uma região
para a qual toda órbita converge para a singularidade em tempo passado e futuro).
• (c3) Para p < 0 a singularidade é um centro do mapa φ. Para p > 0 um ciclo foco
surge da singularidade, e a singularidade é uma sela do mapa φ.
Os retratos de fase de cada tipo são mostrados na �gura (2.8)
30
RD
RE
(s1)
RD
RE
RD
RE
(s2)
RD
RE
RC2
RC1
(c1)
RC2
RC1
RC2
RC1
(c2s)
RC2
RC1
RC2
RC1
(c2u)
RC2
RC1
RC2
RC1
(c3s)
p < 0
RC2
RC1
p > 0
RC2
RC1
(c3u)
p < 0
RC2
RC1
p > 0
Figura 2.8: O catálogo completo da dinâmica local sobre a singularidade Teixeira, quando
p = V +V − − 1 ≈ 0, é obtida compondo um dos possíveis retratos de fase deslizante (s1),
(s2) com um dos retratos de fase costurante (c1),(c2s,u) ou (c3s,u).
31
2.2.4 Dinâmica sobre a singularidade Teixeira
Uma vez que as dinâmicas das regiões de deslize, de escape e de costura foram estudadas,
elas podem ser �coladas� para obter o retrato global de órbitas sobre a singularidade.
A dinâmica em RD foi completamente descrita na seção [2.2.2] e pode ser somente de 2
tipos, (s1) e (s2) na �gura (2.8), dependendo do sinal do parâmetro a2 em (2.16).
A dinâmica em RC1 e RC2 foram derivadas diretamente da aplicação (2.23). A troca de
variáveis que dá lugar a aplicação de Poincaré genérico (2.20) na forma (2.23) garante que,
para p su�cientemente próximo de 0, o eixo positivo u1 permanece completamente dentro do
domínio D do mapa φ. Assim, a origem e a solução negativa de (2.25) são pontos �xos do
mapa de Poincaré. Em particular, em termos das dinâmicas do sistema (2.1), a origem é um
ponto limite (tempo passado ou futuro) das órbitas costurantes, enquanto a solução (2.25)
corresponde a um ciclo costurante cujo tipo (foco/nó/sela, estável/instável) depende, como
nós vimos na seção [2.2.3], dos coe�cientes B30 e B11 da forma normal. Dessa forma, podemos
esboçar as órbitas costurantes do sistema (2.1), ou mais precisamente, suas interseções com
a variedade de descontinuidade, como os casos (c1)-(c3) na �gura (2.8). Os retratos de fase
descritos são obtidos tomando as dinâmicas do mapa (2.23), restritas a CR1, e re�etida na
linha x1 = x2. Nos casos (c2) e (c3) o mapa contém um nó ou foco, que pode ser estável
((c2s) e (c3s)) ou instável ((c2u) e (c3u)).
A dinâmica completa em torno da singularidade Teixeira é obtida então, �colando� um dos
retratos (s1), (s2) para a dinâmica deslizante, com um dos retratos (c1)-(c3) para a dinâmica
costurante. Dessa forma, temos um total de 10 retratos de fase qualitativamente diferentes,
(veja, por exemplo a �gura(2.9)). Observamos que não foram encontrada condições que
proibam alguma das 10 combinações desses retratos. De fato, em [1] foi exibido exemplos
de cada um dos 10 possíveis retratos de fase. Na seção (2.6), apresentamos esses exemplos.
Características qualitativas interessantes das dinâmicas podem ser diretamente deduzidas
da Figura (2.8).
Por exemplo, para p < 0, a dinâmica nos setores costurantes próximo da singularidade
é similar em cada caso (c1)-(c3). Aqui, um número �nito de costuras levam órbitas de RE
para RD. Uma vez que elas chegam em RD, os campos vetoriais em (s1)-(s2) entram em
32
cena. Nesse caso, todas as órbitas desenvolvem-se afastando da singularidade, convergindo
em direção de um pseudo-nó em (s1), ou deixando a vizinhança local em (s2).
Para p > 0 entretanto, (c1) é fundamentalmente diferente de (c2) e (c3). Em (c1), órbitas
costurantes deixam a vizinhança da singularidade no passado ou no futuro, e portanto não
existem localmente órbitas costurantes que passam de RE para RD. Em (c2) e (c3), sempre
existem órbitas costurantes que podem localmente passar de RE para RD. O mapa costurante
contém um ponto �xo do tipo nó ou foco. Se o ponto �xo é estável ((c2s) ou (c3s)), então
todas as órbitas costurantes que surgem de RE su�cientemente próxima da singularidade
convergem para o ponto �xo. Se o ponto �xo é instável ((c2u) ou (c3u)), então todas as
órbitas costurantes su�cientemente próximas da singularidade irão alcançar RD em tempo
�nito.
RDRE
RC2
RC1
(a) p < 0
RDRE
RC2
RC1
(b) p > 0
Figura 2.9: Composição do retrato deslizante (s1) e o retrato costurante (c3u) da �gura(2.8).
(a) Para p < 0 todas as órbitas alcançam a região deslizante, e uma órbita costurante é
mostrada. (b) Para p > 0 esse sistema tem um conjunto invariante próximo a singularidade,
gerado pela evolução futura da região hachurada de RE. O ciclo limite é mostrado em
vermelho.
2.2.5 Caos não determinístico
Um caso particularmente interessante é revelado se nós tomarmos os retratos costurantes
(c2u) ou (c3u) e combina-lo com o retrato (s1), como exempli�cado na �gura (2.9). Segue o
resultado.
33
Proposição 2.2.1. Se um sistema exibe uma singularidade Teixeira com retratos costurantes
(c2u) ou (c3u) com p > 0, e o retrato deslizante (s1), então localmente:
• todas as órbitas costurantes alcançam RD, com exceção do ciclo limite instável,
• todas as órbitas deslizantes alcançam RE via a singularidade, e além disso
• todas as órbitas visitam a singularidade recorrentemente.
A evolução no futuro da singularidade não é única, e portanto não determinística. Nós
podemos caracterizar esse comportamento dizendo que o sistema exibe uma forma não de-
terminística do caos.
O termo �caos não determinístico� apareceu anteriormente em [20] em uma colocação
um pouco diferente, embora que referindo a uma similar perda de unicidade na qual uma
in�nidade de órbitas recorrentemente passam através de um único ponto em tempo �nito.
Para de�nir essa noção não familiar, começemos de�nindo caos determinístico disponível
em muitos textos usuais. A de�nição que daremos a seguir foi dada em [21].
De�nição 2.2.2. Um �uxo ψ é caótico sobre um conjunto compacto invariante A se ψ é
transitiva e exibe sensibilidade em relação às condições iniciais em A.
De fato, o sistema descrito na proposição (2.2.1) tem um conjunto invariante A, próximo
da singularidade, gerado pela evolução futura da região em RE limitada pelas dobras e
pela variedade instável da pseudosela (incluindo a pseudosela; veja região hachurada na
�gura(2.9b)).
A seguir damos as de�nições de transitividade e sensibilidade à condições iniciais para
�uxos de sistemas não determinístico. Primeiramente, como em [21], dizemos que:
De�nição 2.2.3. Um �uxo ψ é topologicamente transitivo sobre um conjunto invariante
A se para todo par de conjuntos não-vazios, abertos, U e V em A, existe um t > 0 talque
ψt(U) ∩ V 6= ∅.
34
Isso é satisfeito pelo sistema descrito na proposição (2.2.1), pois todo ponto x ∈ U alcança
a singularidade em tempo �nito quando sua evolução futura gera o conjunto A.
E, �nalmente, a de�nição de sensibilidade em relação às condições iniciais em [21] foi
adaptada para ser aplicada no nosso caso como segue.
De�nição 2.2.4. Seja Bε(x) uma bola de raio ε centrado em x. Um �uxo multivaluado ψ
exibe sensibilidade sobre um conjunto invariante A se existe um r �xado tal que para cada
x ∈ A e todo ε > 0 existe uma vizinhança y ∈ Bε(x)∩A tal que o diâmetro de ψt(x)∪ ψt(y)
é maior do que r para algum t ≥ 0.
A única diferença entre essa de�nição e a em [21] é que essa usa o diâmetro de ψt(x)∪ψt(y)
no lugar da distância ||ψt(x)− ψt(y)||. As duas de�nições coincidem para �uxos no sentido
usual, fazendo com que essa seja uma extensão natural.
Para nosso �uxo, a evolução futura de algum ponto em A gera todo o conjunto invariante,
depois costurando a singularidade, assim o �uxo na proposição (2.2.1) exibe dependência
sensível em relação às condições iniciais , e A é um conjunto caótico não-determinístico.
A seguir, nas duas próximas seções descreveremos brevemente os outros possíveis tipos
de singularidade dobra-dobra.
2.3 A dobra-dobra visível
Um campo vetorial intersectando transversalmente dobras visíveis genericamente satisfaz
(2.6)-(2.8), com L2f−h < 0 < L2
f+h na singularidade. Isso é ilustrado na Figura (2.10) e tem
forma normal
f+ =
−x1 +O(x0, ||x1, x2||2)
−1 +O(||x||)−V + +O(||x||)
, (2.28a)
f− =
x2 +O(x0, ||x1, x2||2)−V − +O(||x||)−1 +O(||x||)
. (2.28b)
35
RC2
RC1
RE
RD
f−
f+
x0x2
x1
RC1
Figura 2.10: Dinâmica próximo a uma singularidade dobra-dobra visível
Assim como para a singularidade Teixeira, geometricamente, os parâmetros V ±, mede
a cotangente do ângulo θ± entre o campo vetorial f± e sua linha dobra. Eles podem ser
recuperados para um campo vetorial geral com uma dobra-dobra visível por
V + =−Lf+Lf−h√−(L2
f+h)(L2f−h)
, (2.29a)
V − =Lf−Lf+h√−(L2
f+h)(L2f−h)
. (2.29b)
Dinâmicas costurantes nesse caso são triviais, pois em dobras visíveis, órbitas costurantes
se afastam da vizinhança da singularidade (veja �gura (2.10)).
Dinâmica deslizante pode ser entendida da mesma maneira da seção [2.2.2]. A expressão
explícita para o campo vetorial deslizante é:
f s =
0
−V −x1−x2+O(||x1,x2||2)d(x)
−x1−V +x2+O(||x1,x2||2)d(x)
(2.30)
onde d(x) = x1 + x2 +O(||x1, x2||2).
Como foi feito na seção [2.2.2], tomemos um campo vetorial planar regularizado, f s,
multiplicando f spor d(x) e omitindo a componente trivial x0,
f s =
(−V − −1
−1 −V +
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2 (2.31)
36
O equilíbrio na origem de f s tem autovalores
µ± = −1
2(V + + V − ±
√(V + − V −)2 + 4) (2.32)
(o negativo de 2.14) enquanto os autovetores associados são:(µ± + V +
−1
)(2.33)
(o mesmo como (2.15)).
Assim, a dinâmica deslizante é a mesma da singularidade Teixeira, mas com tempo
invertido (veja �gura 2.11).
Esse tempo invertido tem uma importante implicação para a complexidade da dinâmica
local. Similarmente a singularidade Teixeira, um pseudoequilíbrio cruza entre RD e RE
quando V +V − = 1, com V +, V − < 0. Entretanto, considerando que em uma singularidade
Teixeira uma família a uma parâmetro de órbitas em RD podem intersectar a singularidade,
em uma dobra-dobra visível somente uma única órbita em RD pode intersectar a singulari-
dade. Em todos os casos, todas as trajetórias desenvolvem afastando da singularidade para
os campos vetoriais superior ou inferior, partindo da variedade de descontinuidade ou de
uma dobra visível ou de RE.
Dessa forma, existem somente duas classes topológicas estruturalmente estáveis na origem
para o sistema (2.28a)-(2.28b), especi�cado pelas inequações:
1. V +V − > 1, V +, V − < 0
2. V +V − < 1 ou V − ≥ 0
A estabilidade estrutural foi provada em [2]. Para sistemas com V +V − = 1, V − < 0,
existe arbitrariamente próximo, sistemas que pertencem a qualquer uma dessas duas classes.
2.4 A dobra-dobra invisível-visível
Um campo vetorial intersectando transversalmente dobras visível e invisível generica-
mente satisfaz (2.6)-(2.8), com (L2f−h)(L2
f+h) > 0 na singularidade, sendo denominada uma
37
RD
RE
(1) (2)
RD
RE
RD
RE
(3)
Figura 2.11: Diagrama de bifurcação e retratos de fase da dinâmica deslizante de uma
singularidade dobra-dobra visível.
dobra-dobra visível-invisível (se L2f+h > 0 e L2
f+h > 0) ou invisível-visível (se L2f+h < 0 e
L2f−h < 0). Isso é ilustrado na �gura (2.12).
Consideraremos o caso quando L2f+h < 0 e L2
f−h < 0. (O caso L2f+h > 0, L2
f−h > 0, é
reduzido a esse trocando x0, x2, x1 por −x0, x1, x2).
RC2
RC1
RE
RD
f−
f+
x0x2
x1
RC1
Figura 2.12: Dinâmica próximo a uma singularidade invisível-visível
Esse caso tem forma local:
38
f+ =
−x1 +O(x0, ||x1, x2||2)
1 +O(||x||)V + +O(||x||)
, (2.34a)
f− =
x2 +O(x0, ||x1, x2||2)−V − +O(||x||)−1 +O(||x||)
, (2.34b)
Os parâmetros V ± podem ser recuperados para um campo vetorial geral com uma dobra-
dobra invisível-visível de
V + =Lf+Lf−h√
(L2f+h)(L2
f−h), (2.35a)
V − =Lf−Lf+h√
(L2f+h)(L2
f−h). (2.35b)
O campo vetorial deslizante regularizado f s nesse caso é:
f s =
(−V − 1
−1 V +
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2 (2.36)
O equilíbrio de f s na origem tem autovalores
µ± =1
2(V + − V − ±
√(V + + V −)2 − 4) (2.37)
enquanto os autovetores associados são:
(1
µ± + V −
)(2.38)
Seja k± = µ± + V − e observe que k+k− = 1.
Os autovalores são imaginários quando |V + +V −| < 2 e reais caso contrário. Além disso:
39
1. Se |V + + V −| < 2 então não existem direções nas quais trajetórias podem chegar na
singularidade.
2. Se |V + + V −| ≥ 2, V +V − < 1 e V + − V − > 0, então os autovalores são positivos e os
dois autovetores estão em RD/RE (µ+ > µ− > 0 e 0 < k− < 1 < k+). Dessa forma, a
origem é um nó instável.
3. Se |V + + V −| ≥ 2, V +V − < 1 e V + − V − < 0, então os autovalores são negativos e os
dois autovetores estão em RD/RE (µ− < µ+ < 0 e 0 < k− < 1 < k+). Dessa forma, a
origem é um nó estável.
4. Se |V + + V −| > 2 e V +V − > 1, então um autovalor é negativo e o outro é positivo
e ambos os autovetores estão em RD/RE (µ− < 0 < µ+ e 0 < k− < 1 < k+). Dessa
forma, a origem é um sela.
Figura 2.13: Diagrama de bifurcação da dinâmica deslizante de uma singularidade dobra-
dobra invisível-visível.
RD
RE
(1)
RD
RE
(2)
RD
RE
(3)
RD
RE
(4)
Figura 2.14: Retratos de fase da dinâmica deslizante.
40
Quando V +V − = 1, um autovalor vai a 0. Nesse caso, f s tem uma variedade central
uni-dimensional (veja Apêndice F) com dinâmica
u = (V +V − − 1)u+ a2u2 +O(u3) (2.39)
Com V +V − passando através da unidade com V +, V − > 0, um pseudoequilíbrio cruza a
singularidade ao longo do autovetor singular.
Como a origem é uma singularidade dobra invisível para f+, temos que próximo à origem,
as trajetórias da região x0 > 0 vão de RC1 = {x0 = 0, x1 < 0, x2 > 0} paraRD = {x0 = 0, x1 > 0, x2 > 0}. Podemos então de�nir uma aplicação primeiro retorno
φ+ : RC1 −→ RD dada por:
φ+ =
(−1 0
−2V + 1
)(x1
x2
)+O(||x1, x2||2), (2.40)
Observe que o fato da origem ser uma dobra visível para f− previne o início da dinâmica
costurante recorrente (�gura 2.12). No entanto, devemos observar também que a classe
topológica de trajetórias na região x20 +x21 +x22 < δ2 depende não somente da combinação de
trajetórias no plano x0 = 0, mas sim de combinações de trajetórias e de suas imagens pelo
mapa φ+. Dessa formas devemos estudar a imagem da aplicação φ+.
Em uma vizinhança pequena da origem, φ+ aplica uma linha y = ψ(x) com dydx
= k sobre
uma linha y = ψ1(x) com
dy
dx=
k
2V +k − 1+O(1) se 2V +k 6= 0, e
dx
dy= O(1) se 2V +k = 0 (2.41)
Assim as imagens dos eixos x1 e de trajetórias entrando na origem com inclinações k+ e
k− são curvas entrando na origem com inclinações
k∗ =1
2V +, k1+ =
k+2V +k+ − 1
=1
2V + − k−, k1− =
1
2V + − k+(2.42)
Consequentemente, a classe topológica depende da combinação dos números k+, k−, k∗,
k1+, k1−.
Assim, nós iremos encontrar os valores de bifurcação dos parâmetros V +,V −.
41
1. Colocando k∗ = k+ > 0, nós temos 2V + = 1k+
= k− > 0 e portanto 2V +(V + − V −) =
−1, V + > 0.
2. Colocando k+ = k− > 0 nós temos V + + V − = 2.
3. Colocando k+ = k1+ > 0 nós temos k− = 1k+
= 2V + − k+ > 0 e portanto V +V − = 1.
4. Colocando k+ = k1− > 0 nós temos k− = 1k+
= 2V +− k− > 0 e portanto V +−V − = 0,
V + > 0.
As relações obtidas de�nem as linhas que separam o plano dos parâmetros V +, V − em
11 regiões de dinâmicas estruturalmente diferentes (�gura 2.15). A estabilidade estrutural
dos sistemas dessas 11 classes e a ausência de outros sistemas estruturalmente estável está
provado em [2].
Figura 2.15: Diagrama de bifurcação de uma dobra-dobra invisível-visível
2.5 Observações sobre bifurcações deslizantes
Embora o comportamento local de dobra-dobra visível e invisível-visível ser menos com-
plexo do que o da singularidade Teixeira, eles podem ter implicações surpreendentes para a
dinâmica global.
Vimos nas �guras (2.10), (2.12) que não existem órbitas costurando a dobra-dobra da
região deslizante para a região escapante. Assim, localmente todas as órbitas eventualmente
42
partem da vizinhança da dobra-dobra, deixando a variedade de descontinuidade via uma
dobra visível.
No entanto, isso signi�ca que as dinâmicas deslizantes locais interagem com a dinâmica
global. Dessa forma, famílias a um parâmetro de órbitas podem sofrer bifurcações deslizantes
assim chamadas catastró�cas. Nessas bifurcações, por exemplo, órbitas periódicas podem ser
subitamente destruídas através de um encontro com uma dobra visível ou invisível-visível.
Isso ocorre quando elas cruzam a dobra-dobra de RD para RE, de modo que a geometria local
é dada pelos campos vetoriais nas seções (2.4)-(2.3). Em alguns casos, por exemplo em uma
dobra-dobra invisível-visível com V +V − < 1, V + + V − > 2, V + < V −, essas bifurcações são
provavelmente associadas com dinâmica caótica não determinística sobre uma escala global.
2.6 Simulações numéricas
Como vimos na seção (2.2.4), um caso particularmente interessante é quando tomamos
na �gura (2.8) os retratos (s1) para a dinâmica deslizante e (c3u) para a dinâmica costurante.
Tais retratos são obtidos tomando (2.5) e (2.20) com coe�cientes B11 > 0, B30 < 0, |8B30| >B2
11, e a2 > 0.
Um exemplo numérico desse caso é dado pelo sistema:
f+ =
−3 −1 0
−1 −3 0
0 1 −2
x0
x1
x2
+
0
1
V +
, (2.43a)
f− =
3 0 1
0 −2 0
1 0 3
x0
x1
x2
+
0
V −
1
, (2.43b)
com a variedade de descontinuidade sendo x0 = 0.
As formas normais deslizante e costurante (2.5) e (2.20) para esse sistema tem coe�cientes
B11 = −16, B30 = −1666, 93, a2 = 61.4, quando V + = −5 e V − = −1/5, e portanto, estamos
no caso (s1)− (c3u) da singularidade Teixeira.
Na �gura (2.16), simulamos o sistema usando o software Matlab, com um integrador
suave por partes introduzido por [13], com V + = −5.01, V − = −0.2. Nesse exemplo,
43
p = V +V − − 1 = 0.002 > 0. Tomamos a condição inicial (10−20,−10−6,−10−6). Assim, a
condição inicial está próximo da bifurcação e portanto os campos vetoriais abaixo e acima
da variedade de descontinuidade são aproximadamente antiparalelos na origem.
(a) (b)
Figura 2.16: Simulação do sistema (2.43) com V + = −5.01 e V − = −0.2, exibindo um
pseudoequilíbrio (mostrado em vermelho) em RD e um ciclo foco instável. Na �gura (b) é
mostrada interseções da órbita com a variedade de descontinuidade. O pseudoequilíbrio em
RE está mostrado em vermelho.
Para uma melhor visualização do comportamento da órbita ampliamos a �gura (2.16),
obtendo (2.17). Observamos que após a última costura, a órbita alcança a região de deslize
(no ponto superior em RD). Depois, segue a órbita do campo vetorial deslizante (via uma
caminho aproximadamente reto, como mostrado na �gura). A órbita então segue para a
singularidade e a alcança após um tempo t ≈ 0.48. Nesse tempo o integrador falha, o que
é coerente com os resultados obtidos teoricamente, pois nesse tempo a órbita está entrando
em RE, onde sua evolução futura não é única.
Trocando V + para −4.99 no sistema (2.43), teremos que p = V +V − − 1 = −0.002.
Simulamos esse sistema na �gura (2.18). As órbitas se curvam ao longo da singularidade
um número �nito de vezes e alcançam RD. Nesse caso, (como vemos na �gura (2.18b)), a
órbita deslizante se afasta da singularidade sobre um caminho reto. A órbita termina em
um pseudoequilíbrio (ponto verde na �gura (2.18)).
44
Figura 2.17: Ampliação da �gura (2.16). Uma única órbita originando próximo de RE, com
condições iniciais (10−20,−10−6,−10−6) enrola sobre a singularidade e atinge RD, e então é
atraida para a singularidade e volta a RE.
Observamos que trajetórias do sistema truncado para primeira ordem em (2.10) são
curvas (x0(t), x1(t), x2(t)) cujas coordenadas satisfaz
(V +V − − 1)|x0| =
( 12V −
x21 + 12V +x
22 − x1x2 + c)V − se x0 > 0
( 12V −
x21 + 12V +x
22 − x1x2 + c)V + se x0 < 0
(2.44)
onde a constante c �xa a altura que a órbita alcança ao longo do eixo x0.
Quando V +V −(1 − V +V −) > 0, essas equações de�nem um par de paraboloides, um
acima e um abaixo da variedade de descontinuidade, unidos não diferencialmente, formando
uma bola com o equador achatado. Quando V +V −(1− V +V −) < 0, eles de�nem um par de
superfícies acima e abaixo da variedade , cada um dos quais faz parte de uma sela, novamente
unidas não diferencialmente.
Se c = 0, as superfícies formam um duplo cone não suave através da singularidade, que
sofre uma bifurcação, quando p = 0, veja por exemplo �gura (2.19).
A�m de exempli�car cada um dos 10 retratos de fase diferentes da �gura (2.8), conside-
remos o sistema (2.43), trocando a Jacobiana de f+ para
45
(a) (b)
Figura 2.18: Simulação do sistema (2.43) com V + = −4.99 e V − = −0.2. Uma única órbita,
com condições iniciais (10−20,−10−6,−10−6), enrola sobre a singularidade e alcança RD, e
então é repelidade da singularidade por uma pseudo singularidade (ponto verde).
a11 −1 0
−1 −3 0
0 a32 −2
(2.45)
Assumindo os valores da Tabela (2.1) para os parâmetros a11, a32, V + e V −, nós obtemos
um exemplo de cada cenário predito.
46
Retrato a11 a32 V + V −
s1-c1 -3 1 -1/20 -20
s1-c2s -3 1 -1/5 -5
s1-c2u 100 0 -20 -1/20
s1-c3s -3 1 -1 -1
s1-c3u -3 1 -5 -1/5
s2-c1 -3 10 -1/2 -2
s2-c2s -3 10 -2/3 -3/2
s2-c2u 100 100 -5 -1/5
s2-c3s -3 10 -1 -1
s2-c3u -3 100 -5 -1/5
Tabela 2.1: Lista de valores dos parâmetros a11, a32, V +, e V − usados para obter exemplos
de todos os retratos descritos na �gura (2.8)
12
3
U
S
Figura 2.19: Variedades Invariantes próximo a uma singularidade dobra-dobra. Os três tipos
qualitativamente diferentes de órbitas são mostradas. 1) Uma órbita começando próximo de
U (pelo lado de dentro), espirala em direção da singularidade e atinge a região deslizante
(região hachurada). 2) Uma órbita começando próximo a variedade U (pelo lado de fora)
inicialmente espirala em direção da singularidade e então espirala se afastando da singulari-
dade, e tende assintoticamente para S. 3) Uma órbita espirala para fora da região de escape
se afastando da singularidade, aproximando assintoticamente de S.
47
CAPÍTULO 3
SINGULARIDADE DOBRA-DOBRA
EM SISTEMAS ELÉTRICOS NÃO
SUAVES
Modelos não suaves são amplamente usados em engenharia elétrica e eletrônica para
capturar a dinâmica de um grande número de circuitos e dispositivos.
Nesse capítulo mostraremos que a singularidade dobra-dobra, mais precisamente a singu-
laridade Teixeira pode aparecer em sistemas elétricos não suaves. Para isso, apresentaremos
dois exemplos de circuitos elétricos que com escolhas adequadas dos parâmetros, possuem
genericamente a singularidade Teixeira.
3.1 Um circuito com comutação de potência
Como um primeiro exemplo nós consideraremos o circuito da �gura (3.1), onde a fonte
de energia à esquerda (ua, Ra) é selecionada quando v2 é negativo, e o da direita (ub, Rb) é
selecionada quando v2 é positivo.
O modelo é um sistema suave por partes cujas equações são:
48
v1 v2
C1 C2
R2
Li
RbRa
ua ub
Figura 3.1: Um circuito elétrico com uma fonte de força descontínua. A força da direita (ub,
Rb) é selecionada quando v2 é positivo, enquanto a força da esquerda (ua, Ra) é selecionada
quando v2 é negativo
dv2dt
dv1dt
didt
=
− ubC2− v1+v2
RbC2+ i
C2
− ubC1− v1+v2
RbC1+ i
C1
−v2L− iR2
L
se v2 > 0 (3.1)
dv2dt
dv1dt
didt
=
− uaC2− v1+v2
RaC2+ i
C2
− uaC1− v1+v2
RaC1+ i
C1
−v2L− iR2
L
se v2 < 0 (3.2)
Aqui, M = {v2 = 0} é a variedade de descontinuidade e portanto podemos tomar
h(v2, i, v1) = v2 como a função tal que h−1(0) = M .
Temos então que as linhas de tangência (Lf+h|v2=0) = 0 e (Lf−h|v2=0) = 0 dos 2 campos
vetoriais sobre o plano M tem equações:
i = ub +v1Rb
se v2 > 0 e i = ua +v1Ra
se v2 < 0 (3.3)
Essas linhas se intersectam em uma singularidade dobra-dobra em
i =uaRa − ubRb
Ra −Rb
, v1 = (ub − ua)RaRb
Rb −Ra
. (3.4)
Observe que na singularidade:
49
L2f+h =
(ubRb − uaRa)(L−R2RbC1)
C2Rb(Rb −Ra)C1L(3.5a)
L2f+h =
(ubRb − uaRa)(L−R2RaC1)
C2Ra(Rb −Ra)C1L(3.5b)
Assim, a dobra-dobra é uma singularidade Teixeira se as duas seguintes condições são
satisfeitas:
uaRa − ubRb
RaRbC1C2
< 0, eC1R2RaRb −RbL
C1R2RaRb −RaL< 0. (3.6)
Tomemos, por exemplo, Ra = 0.1, Rb = 10, R2 = 1, C1 = 1, C2 = 2, L = 1, ua = 1,
ub = 2.
3.2 Um circuito resistivo com memória
Circuito elétrico resistivo com memória é um circuito elétrico que além da tríade de
elementos fundamentais (o resistor, o capacitor e o indutor), possui um quarto elemento
elétrico que é chamado de �memristor� ou resistor com memória. Na prática, esse quarto
elemento atua como um resistor cujo valor de resistência elétrica pode variar segundo a
corrente elétrica que passa por ele, e que o mesmo se lembraria do valor da corrente mesmo
depois dela ter cessado.
O próximo exemplo é uma leve modi�cação do oscilador memristor canônico de terceira
ordem estudado em ([25]). O circuito está esquematizado na �gura (3.2).
A dinâmica do circuito pode ser descrita pelo modelo:
dvdt
didt
dϕdt
=
iC− W (ϕ,v)
Cv
RiL− v
L
v
(3.7)
onde nós de�nimos σ(υ, ϕ) := c0 + c1υ + ϕ e
50
C
L
R
i
v
Figura 3.2: Um oscilador memristive canônico de terceira ordem
W (ϕ, υ) =
{a+ϕ se σ(υ, ϕ) > 0
a−ϕ se σ(υ, ϕ) < 0(3.8)
Assim, a variedade de descontinuidade nesse caso é M = {(v, i, ϕ); c0 + c1v + ϕ = 0} eh(v, i, ϕ) = σ(v, ϕ).
Observe que:
Lf+h =c1Ci− a+c1
Cϕv + v e Lf−h =
c1Ci− a−c1
Cϕv + v (3.9)
Assim, as linhas de tangência (Lf+h|σ=0) = 0 e (Lf−h|σ=0) = 0 dos 2 campos vetoriais
sobre o plano M tem equações:
i =v
c1(a+c21v + a+c1c0 − C) se σ(v, ϕ) > 0, (3.10a)
i =v
c1(a−c21v + a−c1c0 − C) se σ(v, ϕ) < 0 (3.10b)
Essas curvas se intersectam nos pontos
p1 = (0, 0,−c0)
p2 = (−c0c1
,c0C
c21, 0)
Agora,
L2f+h = (−a
+c1C
ϕ+ 1)(1
Ci− a+
Cϕv) +
c1C
(R
Li− 1
Lv)− a+c1
Cv2 (3.11)
L2f−h = (−a
−c1C
ϕ+ 1)(1
Ci− a−
Cϕv) +
c1C
(R
Li− 1
Lv)− a−c1
Cv2 (3.12)
51
Assim,
L2f+h(p1) = 0 = L2
f−h(p1) (3.13)
e
L2f+h(p2) =
c0(CL+RCc1 + c21 − a+c1c0L)
LCc21(3.14)
L2f−h(p2) =
c0(CL+RCc1 + c21 − a−c1c0L)
LCc21(3.15)
Dessa forma o primeiro ponto não é uma singularidade dobra-dobra, enquanto o segundo
por uma escolha adequada de parâmetros é. Mais precisamente, podemos escolher valores
de parâmetros de forma que p2 seja uma singularidade Teixeira.
De fato, nesse caso, se T = (dh(p2), d(Lf+)(p2), d(Lf−)(p2)) então
det(T ) =c21c0c2
(a− − a+) (3.16)
e, portanto se c1, c0 6= 0, temos que a condição de transversalidade (det(T ) 6= 0) é satisfeita.
Assim, p2 corresponderá uma singularidade Teixeira se os parâmetros do circuito são tais
que:
a− <CL+ c1RC + c21
c0c1L< a+ (3.17)
assumindo que c0 > 0 e c0c1L > 0.
52
APÊNDICE A - UMA EXPRESSÃO
EXPLÍCITA PARA OS CAMPOS
VETORIAIS
Para encontrar a forma normal (2.10), observamos primeiramente que na singularidade a
componente x0 de ambos os campos vetoriais se anulam, e localmente nós podemos expandir
para primeira ordem nas coordenadas, dando:
f+(x) = f+(0) +Df+(0)x+O(2) e f−(x) = f−(0) +Df−(0)x+O(2), (3.18)
onde,
f+(0) = (0, c+1 , c+2 ) e f−(0) = (0, c+1 , c
+2 ) (3.19)
Df+(0) = (a+i,j) e Df−(0) = (a−i,j) (3.20)
Assim,
L2f+h(0) = a+12c
+1 + a+13c
+2 e L2
f−h(0) = a−12c−1 + a−13c
−2 .
Observe que se c± = (c±1 , c±2 ) forem paralelos, f±(0) também serão e como estamos
53
interessados somente em tangências quadráticas, vamos então assumir que c± = (c±1 , c±2 ) não
são paralelos.
Da mesma forma a transversalidade dos conjuntos S± exige que a± = (a±12, a±13) não são
paralelos. De fato, se a± = (a±12, a±13) forem paralelos teremos que a+12a
−13 = a−12a
+13. No
entanto, por (2.8) det{dh(0), dLf+h(0),Lf+h(0)} = a+12a−13 − a−12a+13 6= 0.
Agora faremos uma troca de coordenadas de forma que S± tome a forma (2.9).
Primeiro, observe que existem únicos (a menos de sinal) vetores unitários (0, s±) normais
a S±.
Os vetores s± satisfazem
s±.a± = 0,
e a escolha de coordenadas dando (2.9) é,
x1 = −x0a+11 − x1a+12 − x2a+13x2 = x0a
−11 + x1a
−12 + x2a
−13
Essa é uma transformação de coordenadas diferenciável dada a condição∣∣∣∣∣ s+.a+ s+.a−
s−.a+ s−.a−
∣∣∣∣∣ 6= 0.
A análise depois aplica-se numa vizinhança da singularidade satisfazendo:
s+.(x0a±21 + x1a
±22 + x2a
±23, x0a
±31 + x1a
±32 + x2a
±33) << c±1 ,
s−.(x0a±21 + x1a
±22 + x2a
±23, x0a
±31 + x1a
±32 + x2a
±33) << c±2 .
Escrevendo,
f+ ≈ (−x1, c+1 , c+2 ) e f− ≈ (x2, c−1 , c
−2 ),
podemos reescalonar o tempo separadamente acima e abaixo da variedade de descontinui-
dade, isso troca as velocidades das trajetórias de f+ e f− mas preserva seus retratos de fase
e também o de f s.
54
Façamos então t 7→ tc+1
para x0 > 0 e t 7→ tc−2
para x0 < 0, resultando em
f+ ≈ (−x1, 1, V +) e f− ≈ (x2, V−, 1).
55
APÊNDICE B - FORMA NORMAL DE
REDUÇÃO DO CAMPO VETORIAL
DESLIZANTE DE UMA
SINGULARIDADE TEIXEIRA
A forma normal (2.16) é obtida multiplicando (2.13) pela quantidade (V + + 1V + ), e
então tomando a dinâmica sobre a direção (−V +, 1) do autovetor singular, de�nindo x = pu
e u = qf s(pu), com p e q respectivamente os autovetores da direita e da esquerda da
jacobiana de f s na origem, quando V +V − = 1 e V +, V − < 0. Chamando a+i,j e a−i,j, i, j ∈
{1, 2, 3}, os coe�cientes da Jacobiana de f+ e f−, para essa transformação nós obtemos
u = (V +V − − 1)u+ a2u2 +O(u3), com
a2 = a+22V+ − a+23 − a+32 +
a+33V +− a−22(V +)2 + a−23V
+ + a−32V+ − a−33.
56
APÊNDICE C - PERTUBAÇÃO
GENÉRICA DA APLICAÇÃO DE
POINCARÉ
Assumindo analiticidade das aplicações retorno, φ+ pode ser expandida em torno da
singularidade produzindo
x1 7−→ −x1 +α20x21 +α11x1x2 +α02x
22 +α30x
31 +α21x
21x2 +α12x1x
22 +α03x
32 +O(||x1, x2||4),
x2 7−→ −2V +x1 + x2 + β20x21 + β11x1x2 + β02x
22 + β30x
31 + β21x
21x2 + β12x1x
22 + β03x
32 +
O(||x1, x2||4),
enquanto φ− é igual a
x1 7−→ x1 − 2V −x2 + γ20x21 + γ11x1x2 + γ02x
22 + γ30x
31 + γ21x
21x2 + γ12x1x
22 + γ03x
32 +
O(||x1, x2||4),
x2 7−→ −x2 + δ20x21 + δ11x1x2 + δ02x
22 + δ30x
31 + δ21x
21x2 + δ12x1x
22 + δ03x
32 +O(||x1, x2||4),
Entretanto, os possíveis valores dos coe�cientes das aplicações são restritos, pois as duas
aplicações são involuções e o �uxo induzido é quadraticamente tangente aos eixos x1 e x2.
Impondo então que φ+ e φ− preservam os eixos x2 e x1, respectivamente, temos que:
57
α02 = α03 = β02 = β03 = γ20 = γ30 = δ20 = δ30 = 0
Pela condição de involução, podemos impor que φ+◦φ+ e φ−◦φ−, truncados para terceiraordem, é a identidade. Daí concluímos que:
α11 = α12 = δ11 = δ21 = 0
α30 = −(α220 + α21V
+)
β21 = 12(−α20β11 + β2
11) + (α21 − 2β12)V+
β20 = (α20 − β11)V +
γ02 = (δ02 − γ11)V −
γ12 = 12(−δ02γ11 + γ211) + (δ12 − 2γ21)V
−
δ03 = −(δ202 + δ12V−)
Assim, reduzimos o número de coe�cientes independentes de cada mapa de 15 para 6,
produzindo:
x1 7−→ −x1 + α20x21 + α21x
21x2 − (α2
20 + α21V+)x31 +O(||x1, x2||4),
x2 7−→ x2 − 2V +x1 + β11x1x2 + (α20 − β11)V +x21 + β12x1x22 + (1
2(−α20β11 + β2
11) + (α21 −2β12)V
+)x21x2 + β30x31 +O(||(x1, x2)||4)
para φ+ e
x1 7−→ x1 − 2V −x2 + γ11x1x2 + (δ02 − γ11)V −x22 + γ21x21x2 + (1
2(−δ02γ11 + γ211) + (δ12 −
2γ21)V−)x1x
22 + γ03x
32 +O(||(x1, x2)||4),
x2 7−→ −x2 + δ02x22 + δ12x1x
22 − (δ202 + δ12V
−)x32 +O(||(x1, x2)||4)
para φ−.
Finalmente, compondo φ− ◦ φ+, nós obtemos a expansão de terceira ordem geral da
aplicação de Poincaré φ:
x1 7−→ −x1 + 2V −x2 + a20x21 + a11x1x2 + a02x22 + a30x31 + a21x21x2 + a12x1x22 + a03x32 +
O(||(x1, x2)||4),
58
x2 7−→ −2V +x1 +(−1+4V +V −)x2 + b20x21 + b11x1x2 + b02x22 + b30x31 + b21x21x2 + b12x1x22 +
b03x32 +O(||(x1, x2)||4),
com
a20 = α20,
a11 = −γ11 − 4α20V−,
a02 = V −(−δ02 + γ11 + 4α20V−),
a30 = −(α220 + α21V
+),
a21 = 2α20γ11 − γ21 + 6α220V
− + α21(−1 + 6V −V +),
a12 = −γ2112− 6α20γ11V
− + δ022
(γ11 + 4α20V−) − V −(−4α21 + δ12 − 2γ21 + 12α2
20V− +
12α21V+V −),
a03 = −γ03 + 4(V −)2(α20(−δ02 + γ11 + 2α20V−) + α21(−1 + 2V −V +)),
b20 = (−β11 + α20V+),
b11 = −2(γ11 + 2α20V−)V + + β11(−1 + 4V +V −),
b02 = δ02 − 2δ02V+V − + 2V −(β11 − 2β11V
+V − + (γ11 + 2α20V−)V +),
b30 = β30,
b21 = −β211
2− 6β30V
− − α21V+ + 2β12V
+ − 2β11γ11V+ − 2γ21V
+ + α20
2(β11 + 4γ11V
+),
b12 = β12 + δ12 + 2β211V
− + 12β30(V−)2 + δ02γ11V
+ − γ211V + + 4α21V−V + − 8β12V
−V + +
2α20δ02V−V +−2δ12V
−V +−6δ20γ11V−V ++4γ21V
−V ++β11(δ02−γ11−2α20V−−2δ02V
−V ++
6γ11V−V +),
b03 = −δ202 − 2β12V− − 3β11δ02V
− − δ12V− + β11γ11V
− + 2α20β11(V−)2 − 2β2
11(V−)2 −
8β30(V−)3− 2γ03V
+− 4α21(V−)2V + + 8β12(V
−)2V +− 4α20δ02(V−)2V + + 4β11δ02(V
−)2V + +
4α20γ11(V−)2V + − 4β11γ11(V
−)2V +.
59
APÊNDICE D - FORMA NORMAL DA
APLICAÇÃO DE POINCARÉ
Quando
p := V +V − − 1 = 0,
a aplicação de Poincaré tem um ponto �xo, na singularidade, com uma linearização não-
semisimples duplo 1.
Isso pode ser colocado em uma forma normal de ressonância 1 : 1 que é simétrica, devido
às restrições impostas pelo pressuposto de involução (veja Apêndice C).
A forma normal da aplicação (2.20) é encontrada, através de uma transformação linear
seguida por uma sequência de transformações próxima a identidade, eliminando os termos
não ressonantes de diferentes graus iterativamente.
Primeiro, a parte linear da aplicação (2.20) é simpli�cada através de uma troca de vari-
áveis dependendo dos parâmetros(x1
x2
)=
(2− 4V +V − 1
−2V + 0
)(ξ1
ξ2
)tornando-se
ξ1 7→ ξ1 + ξ2
ξ2 7→ 4pξ1 + (1 + 4p)ξ2
60
Isso corresponde a forma de Jordan do sistema linearizado quando p = 0.
Nas coordenadas (x1, x2) e na bifurcação, o eixo coordenado ξ1 aponta na direção do
autovetor singular (−1, V +) de φ|p=0, enquanto o eixo ξ2 aponta na direção x1. Assim, a
troca de coordenadas alinha o autovetor singular com a direção ξ1, e nas novas coordenadas
o eixo ξ1 está estritamente dentro da região costurante. Isso é uma observação importantes,
pois os mapas costurantes está de�nido somente nas regiões escapante e costurantes.
Agora, a troca de variáveis de segunda ordem, próximo a identidade
ξ1 = µ1 + c20µ21,
ξ2 = µ2 + d20µ21 + d11µ1µ2 + d02µ
22,
com
c20 = − b20+2b02(V +)2+b11V +−a20V +
V +(12p+16p2+2),
d20 = 16b20p+4b20+16b20p2+4b02(V +)2+4b11V ++8V +b11p2V + ,
d11 = −6b20+4b02(V +)2+4b11V +−2a20V ++32b20p+80b20p2+64b20p3+12V +b11p+16V +b11p2
V +(12p+16p2+2)
d02 = −4b02(V +)2−2b11V ++2a20V ++12b20p+16b20p2
2V +(12p+16p2+2)
simpli�ca os termos quadráticos, obtendo
µ1 7→ µ1 + µ2
µ2 7→ 4pµ1 + (1 + 4p)µ2 +B20µ21 +B11µ1µ2
com
B20|p=0 = 4(a20 − b11 − b20V − + a11V+ − b02V + + a02(V
+)2)
B11|p=0 = −4b02V+ − 2b11 − 2a11V
+ − 4a20
Devido a condição de involução, o termo B20 é identicamente nulo próximo a p = 0, e
essa expansão em segunda ordem é estruturalmente instável. Para obter a forma topológica
da aplicação de Poincaré, a expansão em terceira ordem deve ser considerada.
Mais uma vez, através de uma transformação próxima a identidade
61
µ1 7→ u1 + e30u31 + e21u
21u2
µ2 7→ u2 + f30u31 + f21u
21u2 + f03u
32
nós simpli�camos os termos de grau 3 na expansão da aplicação, obtendo a forma normal
u1 = u1 + u2 +O(||u||4),u2 = 4pu1 + (1 + 4p)u2 +B11u1u2 +B30u
31 +B21u
21u2 +B03u
32 +O(||u||4).
62
APÊNDICE E - APROXIMAÇÃO POR
UM FLUXO
Um �uxo cujo shift tempo-unitário aproxima a aplicação (2.23) é facilmente encontrada
por meio de sucessivas iterações de Picard. Para p = 0, isto é
u1 = u2 − B11
2u1u2 + B11
3u22 + C30u
31 + C21u
21u2 + C12u1u
22 + C03u
32
u2 = B11u1u2 − B11
2u22 +D30u
31 +D21u
21u2 +D12u1u
22 +D03u
32
com
C30 = −B30
2, C21 =
B211
3− B21
2+B30, C12 = −2B2
11
3+ 2B21
3− B30
2,
C03 = −B03
2+
3B211
10− B21
6+ B30
30, D30 = B30, D21 = −B2
11
2+B21 − 3B30
2,
D12 =5B2
11
6−B21 + B30
2, D03 = B03 − B2
11
3+ B21
6.
Os termos quadráticos podem ser simpli�cados seguindo a redução à forma normal
genérica de Bogdanov-Takens, de�nindo
u1 = ξ1
u2 = ξ2 + B11
2ξ1ξ2 − B11
30ξ22 ,
multiplicando o �uxo resultante por uma função escalar 1 +B11ξ1, e então de�nindo
ξ1 = µ1,
ξ2 = µ2 −B11ξ1ξ2.
63
Então os termos cúbicos não ressonantes são eliminados de�nindo
µ1 = υ1 + 136
(2B211 − 12B21 + 15B30)υ
31 + 1
12(6B03 − 5B2
11 + 5B21 − 3B30)υ21υ2,
µ2 = υ2 + B30
2+ 1
12(13B2
11 − 6B21 + 3B30)υ21υ2 + 1
6(6B03 − 4B2
11 + B21)υ1υ22 +
190
(45B03 − 7B211 + 15B21 − 3B30)υ
32.
O �uxo resultante tem equações
υ1 = υ1 +O(||υ||4),υ2 = B11υ1υ2 +B30υ
31 + (
B211
2+B21 − 3B30)υ
21υ2 +O(||υ||4).
64
APÊNDICE F - FORMA NORMAL DE
REDUÇÃO DO CAMPO VETORIAL
DESLIZANTE DE UMA
DOBRA-DOBRA VISÍVEL-INVISÍVEL
A forma normal (2.39) é obtida da mesma maneira do Apêndice B, multiplicando f s pela
quantidade (V + − 1V + ), e então tomando a dinâmica sobre a direção (V +, 1) do autovetor
singular. O coe�ciente do termo de segunda ordem em (2.39) é
a2 = −a+22V + − a+23 + a+32 +a+33V +− a−22(V +)2 − a−23V + + a−32V
+ + a−33.
65
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